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quanto Thomas e Znaniccki :ilcrt:ivam para as aificuldadcs que np:·c-
scntavam.
Pnrn estes dois últimos, a hisló(·ia de viela mostrava apenas u:n
aspecto parcial da r..!?.lidad ~. ::ss:~1 si:ndc, não potl:::i se~ utiliznc!.a is,,-
ladamente, nrns devia ser ccmpletnda e esciarccida por toda a sorte
de dados colhidos segundo outras técnicas. O mcnument::il trnbalho
que empreenderam sobre o cnmpo11~s da Polv:1ia, imigr:rntc e cm sc11
RELATOS ORAIS: p:iís de origem encerra, com efeito, coletas realizadas por meio de
DO "INDlZÍVEL" AO "DIZÍVEL" instrumentos de pesquisa os mais variados. Quanto a John Dollard .
sua preocupação er~s implicaçõe:; psicológicas das histórias de vida.
Maria Is.aura Pereira de Queiroz Considerava-as como aptas parn se conhecei· como se dcscnvolvií! um
indivíduo cm seu meio sócio-cultural; estariam, portanto, muito colo-
ridas pelo subjetivismo do informante, o que deturparia sua narra tiva.
Porém, para estes autores, o relato oral se apresentava como técnic:i
útil para registrar o que ainda não se cristalizara _cm documentação
escrita, o não conservado, o que desapareceria se não fosse anotndo:
Rcrnlorizaçiio <lo rclnlo orol servia, pois, para captar o n:io explícito, quem snbc mesmo o
indizível. 1
Nüo faz muitos nnos, o "rcbto", denon::;;.,do agora "história O grnndc descnvolvimc1~to das técnicas estatísticas, cm fins elos
oral", fez seu rc:iparecimc:nlo rntre as técnicas <lc coktJ de m:i'.crial anos 1,0, rclcgoi.l p:i;·a a ·penumbra rclnt1..,S :Jrni~ ::: históri;.s cic vida,
que pareciam demasiadamente ligadas ;)s i:ifluênci:is da psique i:1di-
empregadas pelos cientistas sociais com tanto sucesso que, por 1mii-
vi<lual. A técnica de amostragem com a cplieaçiio de ql!cstionnrio
tos deles, foi encar:itlo como "a" t6cnica por c-xcelência, e até mesmo
surgia agora como a maneira mais r.dcqu:.!di! àc se obter dados inqUi.:s-
a única válida pnra se contrapor ltS quantitativas. Enquanto estas
tionavclmcntc objeti'.'CS.
t1lti111ns - reduzindo n realidade social 11 aridc7. dos números - pare-
Pouco a pouco se percebeu, no entanto, f!UC vak~e~ e cmoç6cs
ciam amputá-la de seus significnc.los, a primeira cnccrrwa n vivnei-
da<:c dos sons, a opulência dos c.leta:hcs, a q-1nsc totalióadc <los flngu-
I11cruumeciam escondidos nus próprios dados estatísticos, j:í qur, as
<ldiniçõcs dns finnlicln<les tia pcsqtii!ifl e :1 forn1ul:iç.íill tias pcq_;un t:i:;
los que nprcscntn toclo foto so-:ial. cstnvnm prof undamcnte ligadas ;1 m:111eir:i de pcmnr e de sentir cio
Dil•Se rcnparecimcnto porque, Jo começo do stculo ao início pesquisador, o qual transpunha assim para os dados, de maneira
<los anos 50, a "história oral" fora utilizada por sociólogos como p~rigosa porque invisível, sua própria pcrccpçfo e seus p;:cconccitos.
W. 1. Thomas (1 863-1947) e f. Znaniccki (18S2-1 958) cm sua pes- Os números perdiam sua auréoln de pum objetividade, p:itentcnnclo-
quisa conjunt:i, datada de 1918- 1920 ; ou como John Dollnrd (1900) sc <lotados de viczcs anteriores no mome::to da coleta, csco~didos
que prctemlcu traçar-lhe as rcgr:is de aplicação; e também por nntro- na formulação _do problema e do C]l!Cstion::rio; o-:ultos, pan~ci:111:
p61ogos, entre o~ quai$ h:i!lz l3ons (!858-19.,2), gcót;rnfo alemão inexistentes . .. . .Por~m infl uc1,ci:ivam o levantamento, desvini1do-o
\ convertido 11 antropolo!iia e 11:ituralizado americano e:~1 1886, que muitas vezes do ru r.10 que devia segu ir.
1ccolhcu relatos e <h:poimcntos de velhos cnciq;ics e paj~s n fi m de O desenvolvimento tccnolór,ico , c0lo::a:1do '.! disposiçfo do cien-
preservar do dcs.iparccimcnto a memória da vi:b tribal. Estes cien- tista social novos i;1eios de captar o real, cc::10 o r,rnvndor, rc::vi-.·0,1
tistas sociais c11cnravam a história oral e pri1::ij1nlmcn1c a história novnmcntc o reloto orill. As fil as p:i:·c.:i.,:n n~orn o meio mi!~,;roso
\ c.lc vida como u111 instrumento fundam::ntal <l~ suas <li;ciplin:is. Po- de conservar l\ nnrrnç:io uma vivacidade de ouc e sim!.lks rci:;(,t;:o nc
rém, enquanto Bo:1s a cmpregav,1 sc111 grnndcs dis::ussõcs, tanto Dollard papel as d:::spojava, uma vez que a voz do · cntrc-.'iSt;do, su:L c;1t0-
\ nações, suas pnus:is, ~cu vaivém no (]lt•~ co:1tw:i, ccnstituL1:11 e;,:'.1,,s

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tantos dados preciosos parn estudo. Sem dúvidn, Oscar Lewis foi um Desde que o pr0C;!SS0 de transmissão do saber se instala, implica
pioneiro neste sentido. Muito embora se considere b•.:jc cfücutívcl a imediatamente na existência de um narrador e de um ouvintt:: ou de
maneira pela qual ngiu, ao colher as várias histórias ele vida de mem- um público, Ao se op-~ror a passagem <lo oral para um signo que o
bros <ln familia Snnchcz, mostrcu.1. como utiliinr um novo meio <le "solidific:i", seja ele desenho ou escrita, instala-se novo intermediá-
registro, recolheu precioso repositório de dados, criou documentos rio entre narrador e público. O intermediário pode ser também um
cuja explornção é nin<la possível, npesnr das dúvidas lcvnntn<las. ~ indivíduo que funcione como transmissor dos conhecimentos que
Como que se redescobriu nesse momento o relato oral e se aquilatou ouviu de outrem. Da mesma forma que desenho e palavra escrita
de maneiro positiva sua grande importância. constituem urna reinte~pretação do relato oral, também o indivíduo
; . intermediário, por mais fiel, acrescenta sua própria interpretação
Reloto ornl e trnnsmissiío ele conhecimentos àquilo que está narrando.
O gravador p.:irece, a primeira. vista, um instrumento técnico
No entanto, através dos séculos, o relato oral constituíra sempre próprio para anular, ou pelo menos para diminuir o possível desvio
a maior fonte humana de conservação e di[usão do saber, o que cqui- . trazido pela intermediação do pesquisador. Logo se viu, no entanto,
vale a dizer, fora a maior fonte de dados para as ciências cm gemi. ' que o poder da máquina não cm tão absoluto, e nem mesmo tfio
Em todas as épocns, a educação humana (ao mesmo tempo formação grande quanto se havia suposto, uma vez que a utilização dos dados
<lé hábitos e transmissão de conhecimentos, nmbos muito intcrlig:i- nns pesquisas exigia, cm seguida, a transcriç1ío escrita. Uma parle do
<los) se baseara na narrativa, que encerra uma primeira transposição: registro se perdia na passagem do or:il para o texto, e este [icav:1
a da experiência indizível que se procura traduzir cm vocábulos. Um igualado a qualquer o:::ro docua;cnto. ·1 A va ntai.tm era co:1servnr
primeiro cr.frnquecimento ou uma primeira mutilação ocorre cntiío, com maior precisão a iinguagc1~1 do narrador, suas paus:1s (que p )·
com a passagem daquilo que está obscuro para uma primeira nitidez., dinm ser simbolicarr:cnt.: trnnsformadas cm sinais convcn:::ionais), n
- a nitidez da palavra, - ró:ulo classi[icatório colocado sobre uma ordem que davn às i;l.;::1s. O documento resultante era sem dúvida
ação ou uma emoção. mnis rico cio que nquc!c registrado pela miio do pcsquis:idor, mas
A transmissão tanto diz respeito ao passado mais longínquo, que apesar de tudo havin ui:1 empobrecimento quando comparado com a
pode mesmo ser mitológico, quanto ao passado n1uito recente, à expc- íitn gravncln, e de norn o pesquisador se tornava um intermediário
rii:ncia do <lia-a-<lin. Ela se refere no legado dos antepassados e tam- 4uc podia deturpar de :ilguma fom,'1 o que for:: rq;istrndo.
bém à comunicação da ocorrência próxima no trmpo; tanto veicula A fita, porém, nfo é passível de ser gunrd~<la indefinidamente.
noçücs adquiridos diretamente pelo narrn<lor, que pode inclusive ser Se repetidas vezes cm;,regndn por um mesmo O'.! por suc(;ssivos pc,;-
o ngcnte dnqui\o que está relnlnn<lo, qunnlo tr:rnsmite noções adquiri- quisndores que quiserem evitar n transcrição escrita, logo se deteriora;·
das por outros-meios que niio a cxpcrii:ncin direta, e também antigas obter dela cópias cm quJntidade leva a despesas apreciáveis, cmborn
tradições do grupo ou da colcti\'idade. concorra para conserú-la. Toda fila, mesmo quando utilizada com
O relato oral está, pois, na bnse <ln obtenção de toda a sorte de parcimônia, ainda assi:;1 é frágil, exige cuidados cspccinis para mnior
in[orm.içõcs e antecede a outr::s t1.:cnicns de obtcnçi!o e conscrvnção <lurnbilidadc, e armazc::agem b:ist:?:1te cara. A única forma de se con-
do saber; a palavra parece ter sido sen[ío a primeira, pelo menos uma servar o relato por lo:1go tempo está ainda cm sua transcriçiío. Vo!t:i-se
, d:is mais antigas t1.:cnicas utilizad.is pnr:i tal. Desenho e cscritn lhe ao que se acreditara cvi:ar co:n o gr:wador, isto é, t, intcrmcdin;::ío
succdcrnm. Quando o "homem das cavernas" deixou, nas parceles escrita entre o narrador e o público para n utiliz.içfo do rc!nto, e ~s
e.lesta, fi~urns que se supõe form:ircm um sentido, estava transmitindo possíveis deturpações :.:~::i dc:o:rcã:tes. ;,'

um conhecimento que possuía e que talvez. j{1 tivesse recebido um Tnl constatação c:õ:,:ribui pnra cksf.lzcr nov:t ilusão: a <lc qu.: se
J!omc, cst:indo jú dcsii;nado pela p:lla\'rn. 3 O fruto de suas cxpcrii:n- deveria conscrrnr a m:·:·:::i·;a o mai, p1ú:imo possívd de sei: rcc.is:ro,
cias e descobertas ficava assim concretizado e passam aos demais, evitando a intervcnçüo c:o p:squisdor e a ocoríê:lci:i de cortes que
inclusive aos pósteres. ?-.fois tarde a escrita, quando inventada, nfio prcjudicarinr:1 o conh~ci:::~n'.o intq~ral ck, d.ido recolhido. Trop~~-:i-s,' ' \
foi mais cio que uma nova cristaliznçiio do rcl:1to oral. oc!ui com nl~o que p;::::.:: c:i: '.::ct:!o intrJnsponívc:: n níticl., distir-ç::-:>

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fnzer; e não é por esta razão que devam ser afastados como menos
entre narrador e pesquisador, que é fundamental. O pesquisador é úteis. Pelo contrário, constituem hoje, como constituíram no p:issa-
guiado por seu próprio interesse ao procurar um narrador, pois pre- clo, n bnsc mais sólidn sobre n qual se crgucríÍ o edifício dít investi•
tende conhecer mais de perto, ou entiío csclorcccr nlgo que o preocupa; gaçüo. É sobre eln que se realizará _o procedimento primordial de
o n:irraclor, por sua vez, quer transmitir sua experiência, que considera toda pesquisa - análise. E análise, cm seu sc:1liclo essencial, signi-
digna de ser conservada e, ao fazê-lo, segue o pendor de sua própria fica decompor um texto, fragmentá-l o cm seus elementos fund:imcn-
valorização, independentemente de qualquer desejo de auxiliar o pes- tais, isto é, separar claramente os diversos componentes, recortá-los,
quisador. Procurará 'por Lodos os meios relatar, com detalhes e da n fim de utiliznr somente o que é compatível com a sínlC$t: que se
forma que lhe parece mnis snlisfnl6rin, os fnlos que respondem nos busca. Assim, di:intc destas considerações, o escrúpulo cm relação
seus próprios intentos, e tudo isto pode convir ou não ao pesquisa- nos recortes das histórias orais e à sua utilização parcial, se afigura
dor, o qual lentará então trazer o narrador ao "bom cominho", isto é, nitidamente como um fnlso problema.
ao nssunto que estudo.
Mnis tarde, no utilizar o reloto, o pesquisador o fará de acordo História ornl, história de vidn
com suas preocupações e não com as intenções cio narrador, isto é, .
as intenções cio narrador. serão forçosamente saerificndas. Assim, o "História· oral" é termo amplo que recobre uma quantidade de
propósito deste último ficn sempre cm segundo plano, desde o início relatos a respeito de fatos não registrados por outro tipo de documen-
da coleta de dndos. Em primeiro lugar, porque não coincide nunca tação, ou cuja documentação se quer completar. Colhida por meio
inteiramente com os propósitos do pesquisador; foram os desejos de entrevistas de variada forma, ela registra a cxperiêncin de um só
deste que cleslancharnm o rclnlo, sendo então predominantes sobre o · indivíduo ou de cli\'Crsos indivíduos de u111a mesma coletividade.
i:1tc;1to cio narrador. Em scgl!nclo lugnr, porque o pesquisador utilizará Nes te último caso, busca-se um::i convergênci:: de reb'.os so~re ur..
c;-:1 seu trabalho :,s partes do relato que sirrnm aos objetivos fixados, mesmo acontecimento ou sobre um período do tempo. A história oral
destacando os tópicos que considcrnrú úteis e desprezando os demais: pode cnptnr a cxpcriên.::ia cfctivn elos narradores, mas também recoll1c
Noutras p:ilavrns, desde o início dn coleta do material, quem destes tradições e mitos, narrativas ele ficção, crenças existentes no
comanda todn a ntiviclnclc é o pesquisador, pois foi devido a seus grupo, nssim como relatos que contadores de históri::is, poctns, canta-
interesses específicos que se de terminou a obtenção do relato. Durnntc dores· inventam num momento dado. Na verdade tudo quanto se narra
a entrevista, portanto, por mais que se procure deixar o narrador oralmente é históri.:, seja a história de algulm, _cja a história de um
ccmo senhor cio que está expressando, o pcsquis:idor lerá sempre uma grupo, seja história real, seja cb mítica.
posiç~o dominante. Que este mnis tarde recorte o material segundo Dentro do qundro nmplo da histúrin ornl, 11 "hbtória de vida"
suas finalidades, nfim de nprovcit(1-lo dn mnncirn que melhor conve- constitui uma espécie ao lado ele outras formas de informação tam-
nha a estas, não estará senão seguindo a mcGna linha de dominação b6m cap_tadas ornlmcnt:::; porém, dada sua cspcci[icidade, pode ig_ual-
tom:ida desde o início e agora rca[irmacla de maneira mais clara. mentc encontrar um símile cm clocumcnt::iç1io escrita. Trnta-sc de tipos
N:i verdade, a narrativa oral, uma vez transcrita, se transforma de documentos próximos uns dos outros, mas que é ncccss:\rio dis-
num documento semelhante a qualquer outro texto escrito, diante do tinguir pois cada qunl tem sun peculiaridade de col~ta e de final!-
l qu:?l se cncontrn um estudioso e que, ao ser fabricado, não seguiu <ladc. Assemelham-se i1s histó:·ia~ de vicia, as entrcv1stns, os depoi-
forçosnmcntc ns injunções do pesquisador; de foto, o cientista soci:il mentos pessoais, as autobiografias, :is biografins; fornecem tod:is ebs
interroga uma enorme série de escritos, contemporâneos ou não, que material para a pcsqui~a so::iológicn. porém diferem Ci.1 sul1 dcfü1iç:io
coilstituem a fonte ele dados cm que npóia seu trab:ilho. Recortes e carnctcrísticas.
<l; jornal relativos :1 atualidade, documentos históricos de v:iriado A forma mais an:ig:i e mais difundicb de caba de cl,?d:Js o~ais,
\ tijJO e de diversas épocas, corresponclêm:ia hodierna ou passada, rc-
i;isiros os mais diversos - sem esquecer as estatísticas estabelecidas
nos ciências sociais, é n cntrc\'ista; considerada m~i:.?s vezes co::10 su::
técnica por cxcclí:nci;i, tem sido, no contr~rio, cnc:nacb como desvir-
L pc;os governantes ou por instituições espccíficns - foram redigidos tuadorn dos relatos. Nunca chegou, porém, a ser totalmente post:i de

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COill inten,iõcs que nada tinham a ver com a pesquisa que decidiu
lado, o que demonstra sua i111porlfü1cia. A entrevista supõe uma con- Toda história de vida cnccrr::? um conjunto de dcpoimcn'tos. O
versação continuada entre informante e pesquisador; o tema ou o termo foi muito cedo definido juridicamente, significando inlerroga-
aconlccimcnto sobre que versa foi escolhido por cslc úllimo por con- çõcs com a finalidade de "estabelecer a verdade dos fotos". Perde,
vir ao seu trabalho. O pesquisador dirige, pois, a entrevista; esta por6m, esta conotação nas ciências sociais, para significar o relato
pode seguir um roteiro previamente estabelecido, ou operar aparente- de algo que o informante efetivamente presenciou, experimentou, o~
mcnt(: sem roteiro, porém 1m verdade se desenrolando conforme uma de alguma forma conheceu, podendo assim certificar. O crédito a.
sistematização de assuntos que o pesquisador como que decorou. A respeito do que é narrado scrií tcslado, não pela credibilidade do
cnplaçiio dos <lados decorre de sua maior ou menor habilidade cm nórrador, mas sim pelo cotejo de seu relato com dados oriundos de
orientar o informanlc para discorrer sobre o tema; 6 este que conhece outras variadas fontes, ql!c mostrará sua convergência ou não. Desta
o acontcci111cnto, suas circunstâncias, as condições atuais ou .histó- forma, i:ias ciências sociais, o depoimento perde seu sentido de "esta-
ricas, ou por tê-lo vivido, ou por deter a respeito informações pre- belecimento da verdade': para manifestar somente o que o informa nte
ciosas. Elas· ora fornecem dados originais, ora complementam dados pr<;scnciou e conheceu)( ·
já obtidos· de ou\ras fontes. Na ve rdade, ªvntrcvista está presente cm A ·diferença entre história de vida e depoimento csti! na form:i
todas as formas de coleta dos relatos orais, pois estes implicam sem- específica de agir do pesquisador ao utilizar cadn urna destas t6cni-
pre num colóquio entre pcsquisaclor e narrador. cas, duranle o diálogo com o informante. Ao colher um depoimento,
A história de vida, por sua vez, se dcíinc como o relato de um o colóquio é dirigido diretamente pelo pesquisador; pode fazê-lo com
narrador sobre sua existência através do tempo, tentando reconstituir maior ou menor sutileza, mas na verdade tem nas mãos o fio ela
os acontecimentos que vivenciou e transmitir a experiência que adqui- meada e conduz a entrevista. Dn "vida" ck seu inforn,:::,te ;ó l!1c
riu. Na rrati va linear e individual dos acontecimentos que nele consi- interessam o~ acontccimcntos que venham se in~crir dirctam;·it-: no
dera ~i1;nific:1 tivos, através dela se delineiam as relações com os mem- trabalho, e a escol!,'\ é unicamente efetuada com este critério. Se o
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bros de seu f;r1.:po, de su:; profissão,· de sua camada social, de sua
sociedade global, que cabe ao pesquisador desvendar. Desta forn1:1,
narrador se afasta cm digrcssões, o pesquisador corta-as p:ira t:·azê-lo
de novo ao seu as:unto. Conhcceado o problema, b..:sca oo:cr do
o interesse deste último está cm captar algo que ultrapassa o caráter narrador o essencial, fugindo do que lhe parece supérfluo e desne-
individual <lo que é transmitido e que se insere nas coletividades a cessário. E é muito mais fácil a colocação <lo ponto final neste caso,
que o narrador pertence. Porém, o relato cm si mesmo contém o que assim que o pesquisador considere ter obtido o que dcsc_i~. A obe-
o informante houve por bem oferecer, para dar idéia do que foi sua diência do narrador é patente, o pesquisador tem as rédc:is nas mãos.
vida e do que ck mesmo é. Avanço,· e recuos marcam as histórias de A entrevista pode se esgotar num só encontro; os (kpoi:11entos podem
vida; e o bom pesquisador não inlcrfcrc para restabelecer cronolo- ser muilo curtos, residindo aqui uma de suas grandes difcrcnç,:s par:i
i::ias, pois sabe que também cst:1s variações IH) tempo podem constiluir
imlícios de ali::o que per111itirií a formulação de inferências; na coleta com as histórias de Yida . )( .
Voltando novamente i1s hi$IÓ;ias de vida, embora o pesquisador
ele histórias de vida, a interferência cio pesquisador seria preferencial-
subrepticiamcnte dirija o colóquio, qllem decide o que vai rcl.::t::r é o
mente mínima.
narrador,. diante do qual o pesquisador. deve se co:1se,·v:ir ta:1to
Oulro aspecto fundamental ela história de vida é ser ela uma téc-
nica cuja· aplicação clc111anda loni::o tempo. Não é cm uma ou duas quanto possívcl,.sil.::r.cioso. N:io qu.:: permane~a ausente; do co!óqllio,
,. entrevistas que se esgota o que um informante pode contar de si porém suas interfcr~:1cins d.::vem ~cr recluzicl:is, pois o imj)o:·tailtC é
'
1 mesmo, lan to mai5 que :1 du ração del:is é limitada devido ao cans:iço. que sejam captadas n, c:-:pcri0nc:i;:s do cntr.::vis:ndo. Este é q,:;;m de-
; termina o que é rclcv~ntc m1 niio n;,.r,:1r, ele é quem dct~m o f:o u1:1-
j•:
Além de exigir muitos encontros com o narrador, tamb6111 deve-se
t contnr quanto lcrnm O$ relatos para se1em transcritos . Finalmente, dutor. Nnda do que 1cla1a pode~.::· con~iclcra,ki supérfluo, poi:; tudo
1 se encadeia para co::1por e cxplic.1:- sua existência. Pode ser (:ifícil
1
uma das dificuld:Hks consiste em se chegar a pür ponto final nas
1
1 entrevistas, pois o 11:irrador cm i::eral afirma que tem sempre novos fazê-lo concluir, pois há sempre m:1is e 111:iis acontecimc::tos, 1:1::i:. e
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,, mois dctnlhcs, mais e mais rcflc:,Ül:~ que a 1,H:rnúri·1 v:,i rc~t; ·... :..!.J.
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dctnlhes n ncrcsccntar. Não quer perder seu pnpcl de pcrso:rngem ....

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. Vê-se, ~ortanto, que estabelecer cliferenças entre histórias de
vida ~ depoimentos pessoais não constitui exagero de pesquisador rio. No caso da pesquisa para esclarecer o cotidi:1:10 paulist:ino de
denrnsiadamente escrupuloso. A escolha de uma ou outra técnica n5o pessoas de baixa renda entre 1920 e 1937, umn das questões que o
pressupõe ape~as difere nças na mancirn de oplicá-Ias, mas inclusive, pcsquisndor tinha cm mente cru saber como os informantes haviam
e sobretudo, diferença nas preocupações do pesquisador com relação vivenciado ocorrências como as revolúções de 1924, 1930, 1932. To-
,,os dado~ que pretende obter. Noutras pnlovros, os difcrenços recoem davin, se o informante nnda dizia a respeito, também nada pergun-
'•: sobre o t1_p? _de pesquiso que se quer reolizor, pesquisa esto que, no tava· o pesquisador, não tentando "avivar a rncmórin" dt: seu inter-
sua espec1f1c1dodc, deverá requerer n uplicuçüo do históriu de vida, locutor. Ao contrário, n "falha da mcmóri;i", encontrada cm vários
ou n coleto por meio de depoimentos. . . casos, podia ser reveladora da forma de participação desta parcela
Dois cxempl_os podem esclarecer estas divergências. Quando se de população em tais acontecimentos. Verificar também se a "falha"
buscou conhecer como se desenrolava a existência cotidiano de indiví- ocorria mais nos relatos femininos, e muito menos nos masculinos
duos de baixa renda , na cidade de S. Paulo, durante os décadas de também era algo que não podia ser desprezado. '
20 e 30, a técnica escolhida foi a das histórias de vida de indivíduos - · Além de distinguir histórias de vida e depoimentos pessoais, é
que tivessem sido adolescentes ou jovens 1?aquele período; e, como , preciso ainda destacar a diferença para com autobiografias e biogra-
se tratava de histórins ele vida, não fornm elns limitadas no tempo, fias. Nnrror sun próprio existência consiste num n nutobiogrn(ia, e
m~s, nas idas e vindas <lo narrndor, chcgarnm sempre nté os dias de todo história de vida poderia, a rigor, ser enquadrada nesta categoria
hoJe. No e~1tanto, justamente porque se tratava de velhos, às vezes tomada em sentido Jato. Mas no sentido restrito a autobiografia existe
mesmo anciãos de muita idade, a atcnç5o deles naturnlmcnte se vol- sem nenhum pesquisador, e é essa sua forma específica. 1: o nnrrndor
tou pnra infância e moci<ladc, t rnzcndo no pesquisador a.quilo que que, sozinho, manipula os meios ele registre, quer seja u escrita, quer
estava huscanclo. G No cntnnto, no se estuda, o carnaval da cidade de o gravador. Foi cic também que, por motiv.-:>s estritamente oessoais,
S. Paulo, _tal como se realizara em variadas épocas ::!é 30/110, através se dispôs a narrar sua e:üstência, fixar sua~ recordações; d;u-lhcs o
ele cntre~'.stas com velhos foliões, a técnica escolhida foi a dos depoi- encaminhamento que melhor lhe pareceu e, se utilizou o gravador,
mentos. l ra tava-se de conhecer não a seqüência da vida dos ;i1csmos, não raro ele mesmo cíetua cm seguida a tr.:inscrição, ou pelo menos
porém as forma~ que havia tomado o folguedo no decorrer do tempo; n corrige. Na autobiografia não existe, ou se reduz ao mínimo, a inter-
pa~a tanto, urgia conhecer também o que havia sido contado por mediação de um pesquisador; o narrador se dirir,c di retamente :io
pais e avós, além de saber como todos se diverti:im durante as folias público, e a única intermediação está no registro escrito, quer se
~c_Mo110. Un_1 _aspecto era mesmo essencial : quais os grupos e· -c"'11·- destine ou não o texto n. publicação.
t1V1dades part1cqrnntes, a que cnmadas sociais pertenciam, quem ériim A biografia, por sua vez, é a história de um indivíduo rcdir,id:i
os líderes na organização da fc~tn. Niío era possível deixar a inicia- por outro. Existe aqt:i o dupla intcrmcdiaçiio que a aproxima da his-
tira do diálogo aos informantes; cabia ao pesquisador orientá-lo de tórin ele vida, consubstanciada na presença do pesquisador e no relato
modo ª. colher ~ maior quantidade possível de material. o O pesquisa- escrito que sucede às entrevistas. O objetivo do pesquisador é desven-
dor guiava, pois, a narrativa do informante. Como se veri fica na dar a vida particular daquele que está entrevistando ou cujos documen-
história_ de vida o colóquio é conduzido pelo narrador, que deté;n a tos está estudando, mesmo que neste cstud.-:> atinja a sociedade cm
con<luçao do relato, enquanto nos depoimentos é o pesquisador que que vive o biografado, o intuito é, através dc}a, explicar os comporta-
abertamente o dirige. mentos e as fases, da existência individual. A íina\i(bdc é sempre Ulll
Embora nn história de vida o pesquisador se abstenha de intervir personagem, isto é, uma pessoa cnc,irada c.:1 suas ações e cm suas
e a m~neirn de se realizar caiba no narrador, na verdade o pesquisa- qualidades, naquilo que faz e diz através do tempo, cm variad:is
do:- :º1 quem escolheu o tcm::i d::i pesquisa, forml!lou as questões que situações e circunstf:nc;~s. Buscn-sc conhecê-lo atra'.'és ela sucessão
d~scp esclarecer, prop0s os problemas. O comando é dele, muito de suns condutas e segundo dois princípios fu.idamcntais, que o:-icn-
c_mbo1n procure nií? intervir durante a nairaç~o; não impõe, por- t:im tanto as entrevistas quanto o relato postc:-ior: o pcrson:igem sem-
t,rnto, os lemns no rnformnntc, que os abonlar,í ou não, a seu crité- pre se revela cm seus comportamentos que compõem um todo int.;-
grado, de tal maneira que este todo não pod~rin ser dividido ser:, se
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vcl, agora, como até mesmo imperioso, pois são facetas do mesmo
encontrar imediatamente destruído; o personagem é um indivíduo que serão utiliz:idas.
especial e particular, diferente de todos os outros, dos quais se Emborn colhidas com finaliclnclcs muito diferentes, autobiogra-
destaca. fias e biografias s:io perfeitamen te utilizáveis pelos cientistas sociais
Uma vez que estas são as características de um personagem, a como material de anál ise. Am bas, p1:incip:ilmcntc se bem feit as, podcm
finalidade de um biGg:afo, ao escrever-lhe a história, é oposta à de constituir excelentes repositórios de dados que, no entanto, devem
um pesquisador ao utilizar a técnica de histórias de vida. O primeiro ser verificados e complel,!clos por informações de outras fontes. Po-
fará ressaltar cm seu trabalho os aspectos marcantes e inconfundí- de-se dizer que autobiografias e biografias, desse ponto de vista, estão
veis do indivíduo cuja existência decidiu revelar ao público. O se- cm convergência com histórias de vida e depoimentos pcsso:iis pua
~· gundo busca, com as histórias de viela, atingir a colctividndc de que o esclarecimento de um dado ou de· um momento histórico; porém
seu informnnlc faz parle, e o encara, pois, como mero representante não se confundem com estes. Tamb6m devem ser manuseadas co;n
1 da mesma ntravés do qual se revelam os traços desta. Mesmo que o muito cuidado. Justamente por se tratar da análi;;c de uma pcrso:1:1-
l1
cientista social registre somente uma história de vida, seu objetivo é lidade, não raro encarecerão o que é peculiar ao indivíduo estudado.
captar o grupo, a sociedade de que ela é parte; busca encontrar a Ora, o que o sociólogo trnbalha vai na direção do que é coletivo, isto
coletividade a partir do indivíduo. O biógrafo, mesmo que retrate a' é, do que é geral, não se detendo nos particularismos. Sua dircçi!o é
sociedade de que seu personagem participa, o faz com o intuito de opo~ta à dos biógrafos e dos psicólogos.
compreender melhor a existência do biografado.
Umn segunda diferença, agora na mnncira de serem utilizadas Histórias de vida: cnractcrísticns
biografias e histórias de vida, se depreende aqui também. Justamente
porque se trnta de um indivíduo considerado cm sua integralidad~, a Quando John Dollard e>:aminou os cntcnos que tori:a:i:i::: acc:-
biografia não pode ser decomposta cm elementos ou utilizada cm tàvc.:is as histórias de vida como fornecedoras ele dados p:ir:i o so::i5-
fragmentos, sob pena de se perder completamente o sentido de qc1c logo, tropeçou justamente com o problema de estar lid:mdo co::: o
se procurava: o desenvolvimento da perso:ialidadc, islo é, do "cu" desenvolvimento de um indivíduo dentro de dctermin::ida socieóé::: e
único e permanente que, embora evoluindo através do tempo, mantém portanto, de estar abarcando o comportamento deste, e nfo di::::ta-
certa linha constante que o distingue dos demais. t csle o caso da mente os dados sobre a colctiviclac!c cm foco. E quando, no pdoco
biografia, mas também da utilifr ção da história de vida pela psicolo- cm que publicou seu livro, outros cientistas· s)cinis co6itara:n do ap:0-
gia, mesmo quando trata das rcbçõcs entre um indivíduo e sua socie- vcitamcnto deste ti po de material, assim como dos depoimentos o:nis,
dade. Por isso, quando apenas parle dela é utilizada, pode induzir a pareceu a muitos deles que a interfcr~ncia ela subjetividade do r.::irr:!-
i:ravcs falhns na análise e na comprccnsiio do que si! quer cstu<lnr. <lor falseava uc maacira pcrnicios:i as entrevistas. Franz Boas, f::lr~:n,
Esln exigência niio tem rnzão de ser quando se trata de um colhendo os rel:itos de an.:iãos das tribo5 ;1orte-amcri::anas, r.~o S'.:
estudo sociológico ou antropolóeico. Neste caso, o aproveitamento dn deixou -deter por este aspecto. Tcocio:1::iva reconstruir, atrav~s do qt::::
biografia ou da autobiografia se faz no sentido de buscar como estão reunia, a organiz:1Ç~O dcliqücscentc dos grupos a fim d~ comprcendê-
:ili operantes as relações do indivíduo com seu grupo, com sua socie- los. O que lhe chamou ;i atenção foi a relativa indepc:1dênci:i d::: cer-
dade. Nfo se trata de considerá-lo isol:idamcnle, nem de compreen- tos fatos cultur;iis, que os fozia per~istir m~sn:o quando dcsorga:.!z:ido
dê-lo cm su:i unicidade; o que se quer é capt:ir, através de seus com- o grupo cm que lrn\'iam prcvi:11m:nte existido. Descobria :issim :i co:1-
portamentos, o que se pnssa no interior dos colclivida<lcs de que par- diçiio si11e qua 11011 para que a história de vid:! e os rcla'.os orais !O:i:.:
ticipa. O indiví<luo não é mais o "único"; ele ogorn é uma pessoa o passado pudcsscr.1 ser u:iliz:iJos: compc:tnmcntos e v:ilo,·cs s:.:>
indeterminada, que nem mesmo é necessário nomear, é somente uni- encontrados n:i mcr.16ri::i cios m:!is velhos, 1:1:smo q:i:ií.du cs:c~ ;: -.'.)
d:idc dentro da coletividade. Todavia, cm seu anonimato, contém o viYcm m:iis r.:i oq_::111ização ck que: haviam p:irticipado no p::s~:~:::.
indivíduo num microcosmo as confieurnções que sua coletividade e assim se pode co:1hccer i;:.rtc cio que cxistir:i ,1ntcrio:mc:ntc e ~~
nbarc:i, :io ordenar umas cm rcl:ição i\s outras unidades, de que se esmncccrn nos cmb:::::s elo t..:mjJO. ltt.::ilmentc, se a mci:,0:·ia e:..: e:::::-
compõem o i.:rupo. O recorte do malcrinl n:io somente se torna viá-
minados valores e comportamentos se desfizesse com o desapareci-
,: mento das organizações sociais, então seria imposs{vcl a utilização n esse respeito tem sido constante; 8 mesmo aqueles que se manifesta-
dos relatos orais cm geral, e das histórias de vida cm particular, na ram de modo muito entusiástico a respeito das histórias de vida reco-
an61isc de coletividades e sociedades. nheceram que a utilização somente dela:, rcsultavn cm trabnlho~ limi-
I\1uito nntcs de Dollnrd e de l}ons, o; sociólogos Thomas (ame- tados. A mnior dificuldade eslavo cm que o coleta de uma história
ricano) e Znaniecki (polonês) hafiam utilizado história de vida cm de vidn é de duração lo:1ga; as entrevistas não podem ultrapassrir
seu célebre trabalho sobre os camponeses poloncscs que pcrm:meciam certo lapso de tempo porque são cans:itivas, devendo ser empregadas
cm sua pátria e os que haviam emigrado para os Estados Unidos. com intervalos. Para os idosos, a quantidade de colóquios deve ser
Porém, as preocupações de Dollar<l não haviam constituído dificul- grande quando se revelam bons informantes, a fim de se coletar 0
dades para ambos, que consideraram, ao contrário, ·a história de maior número possível de informes. Este alongamento no tempo é.
vida como excelente técnica de coleta de material. Chamaram a aten- acrescido por uma transcrição (que consome horas e horas, sendo tra-
ção, todavia, para o fato de não poder ela ser utilizada sozinha numa balhosa e aborrecida), assim como por uma análise forçosamente
pesquisa, pois não fornece base empírica suficiente para se levantar demorada. Desta forma, é muito difícil conseguir muitas histó"rias de
inferências; deve, portanto, ser sempre completada por material cole- vida que forneçam base empírica suficientemente larga para se chegar
tado de outra maneira. De fato, estes autores trabalharam com grande o algum grau de certeza, a n5o ser por meio de uma pesquisa que
cópia de documentos escritos, como por exemplo a correspondência demore vários anos. O meio de se fugir a este obstáculo estava cm
entre os imigrantes e seus parentes que haviam permanecido no junt&r à técnica cm pauta uma coleta de dados utilizando outros pro-
Polônia. 7 cedimentos.
A constntnçiio destes dois cientistas socin1s, proveniente da cx- Mesmo n utiliznçiio de depoimentos orais, cujn obtcnçüo 6 mais
p::-ri~ncia que rcalizaroll!, chama a atenção para um nspccto que foi breve, aponta para di(iculdadcs incrc:llcs f1 própria n;,tureza do in-
cm seguida retomado por muitos outros pesquisadores: o da nccessi- forme. Nunca é demais !c:.1b~ar o belo trab:ilho de Gc~maine Tillioa
dnde de uma complementação proveniente de outras fontes. A justi- sobre os campos de ·concentração nazista cm que esteve detida dur:mte
fica tiva deles era de que nunca se poderia obter grandes quantidades n 2.• Grande Guerra, e q:.;c teyc como uma das fontes de dados, :ilém
de histórias de vida suficientes para dar embasamento empírico satis- da vivência da autora, u::ia larga col::t:i de depoimentos orais. 9 Seu ....
1,, . •.

fatório e amplo que permitisse chegar a conclusões. Nn verdade, todo intuito era desvendar o destino dado a prisioneiras que pcrioclicamcnte
registro de um:i história ele vidn, mesmo quando hoje é feito por crom retiradas do campo. Verificou que o~ ~cpoimcntos e que su:i
intermédio do 1:~avador, <lcsli;;a-a do contexto cm que se deu a cnt1 c- própria n:cordação do qi.::: fora viv::nciado se orientavam cm direções ...
...
Yista; e esta fnlh;i é mais grnvc se a entrevista teve lu[lar fora dos lu- diferentes e não raro con:raditórias. Rcsultnvam cio fnto ele qur., incli-
g:in:s cm que o informante habita ou trnlinlhn. De fato, nem II escrita vidunlmentc, hnvinm os informnnlc~ captado ~0111cnlc uma parcela
do pcsquis:idor, nem o gravador registram o local on<lc se passa o da realidade de Ravcnsbrück, e a narrativa de cada acontecimento era
co16quio, ou o loc:il onde o inform:rntc habita, amputando o material diversa ou conforme cada indivíduo se encontrasse numa ou noutra
de um:i preciosa méssc que pode encerrar detalhes primordiais. A situação, ou de acordo com a sensibilidade e a cxpciiência passndn
falha 6 muito mais importante na colct:i de histórias de vida do que de cada um. Verificou assi::1 a autora a impossibilidade de basear su:i
nos depoi mentos orais; n focnlização destes sobre determinado ponto, análise - que descj,wa scciológica - simplesmente nos relatos d:
sua concentração sobre um dado preciso, excluem a utilizaç~o de ele- seus companheiros e cu rn:i experiência pessoal. Orr;:1nizou cnt:io
mentos circundantes, que, pelo contrário, scrinin esclarecedores no umn coleta de dados n~ui:o m:1:s ampb, n fim de que da complemen-
caso de histórias de vida , como comprovantes, ou como dcmonstrn- tnçiio e do cotejo entre c'.~s, s: re:or:nu'.~ssc uma im:i$Clil do campo
dorcs de contradições. de concentração cuja co;.:·i~bi\;d:ide fosse muito maior do qu:: a que
Na rcrdadc, é específico das ciências sociais necessitar sempre resultava dos dcpoime:1'.:-s.
o pesquisado:- de dados colhidos de fontes as mais v:iriadas, qunndo Há que se obscrv:1r, :::> C:-?lanto, qt:c a i;ccessidadc dc s:: ;,:::rc;-
quer abarcar de forma ampla a rcnlidaclc que estuda. A unanimidade ccnlar outrns fontes às hi;:órias de vida nüo invalida a possibilid:idi:
de utilização de um:i úni.::1 c.!:::trc elas, para o conhccimcnlo d~ p;·o•
2G
Na verdade, tudo quanto recolhe o cientista social se compõe
blcmas de uma coletividade. C certo que todo pesquisa sociológica, de histórias, ou de parte de histórias de indivíduos, ou pod;: nclns
quer utilize técnicas como a história de viela, quer outras técnicas ser transformado. No entanto, encontrar histórins de vidn í1 partir ele
diversos (inclusive e principalmente os quantitativns), ganha novas mnlerinl colhido cm pesquisa 11:iu potk. ser confundido com a técnica
climcnsúcs, mnior profuncliclade, maior envergndurn, des<lc que uc~m- empregada pnra registrar a rc,,li<lade, isto é, com modos cc agir
pnnhadas e complementadas por outras maneiras ele col~ta. Porem, peculiares à coleta de material. De quase todos os documen!os podem
uma único história de vida, dcsacompanhodn de coptaçocs comple- ser extraídas histórias de vidn; mas isto niío quer dizer que o cicnti:.líl
mentares de mnterinl, desde que convenientemente nnnlisnda, pode socinl cstcjn a lodo o momentn utiliznndo 11 tée11ic11 dn~ hi~túrias ele
ser dn moior importfincin pnrn n dcíiniçiío de problemns <le umn cole- vidn. ·
tividade, principolmenle se o pcsquisndor niío conhece b~m a estu; Técnica é procedimento ou conjunto de procedimentos, de modos
e, caso já possua uma visão da mesma e dados cm quantida~e ap:e• de fazer bem definidos e transmissíveis, dcstin:idos :i alcnnç3r deter-
ciávcl, serve ela para um refinamento dos observações e da~ in~ercn- minados objetivos; como todo procedimento, é ação específica, sistc-
cins, ossim como pnrn um controle. Certamente umo s? h1stóna _de máiica e consciente, obedecendo a determinadas normas e Yisando
vida não esgotará todos os aspectos e nem todas as mlerpretaçoes determinado fim; é conservada e rcpc[idn se sua eficiência for com-
dos fenômenos que se pretende esclarecer mas sc~prc l~vanta .rele-· provada pelos resultndos obtidos . Toda técnica é mecanismo de capta-
vantc série de questões acerca das quais não se havia cog1tad~ amd.a, ção do real, cm sociologin, e não pode ser confundida com o rr:aterial
ou fornece novns perspectivas n respeito do que jú se conhecia: 1-lls• reunido, isto é, com os dados. A ~aptação ele cl:idos nas ciê.1cias so-
t6rins devido de indivíduos de camadas sociais diversos a respeito de ciais pode servir para a construção <lc biografias por~m, n~o é esse
um mesmo momento ou acontecimento são, por exemplo, preciosas o trabalho do pcsquisndor. A atividade que ::~te dcsc1wolvc nú tcmp:i
como fontes <lc dndos e controle. e no espaço se destina n resolver questões propostns po, ;·c!açõa:s
O levantamento da história de vidn tem sido ora remetido para cxi~1cntcs no intcriur de coletividades. Pnrn ele, o lcvantn:n~a:o de
o início da pesquisa, a fim de se formularem questões pcrtincnt:s ~-·.1ja dados é o primeiro momento ele um processo que se é•~scn:·0'.a cm
investigação serio cfctuadn por meio de emprego de outras tec111cas várias fases, isto é, de modificações cm seqüência, se csc:!lor:aado a
ora é empregado como elemento de controle para certos resultados partir elo projeto ele trabalho, passnndo pela coleta cio m:itc:i~!, pcl:i
obtidos através de outros procedimentos. Num e noutro caso, chega-se sua ·análise, até chegar ao término com o rclntório final oc1 n publicação
por meio dela aos valores increntes nos sistemas sociais cm q~c vivem do livro. A coktn <lo material atr,wés de histúrins de vi<la E::1ita-sc
os in[ormant~s, que dados como os estatísticos certamente nao forne- n um momento específico <ln pesquisa e não perdura pcb total:d:idc
cem. No cnlnnto, uma vez captada e nnalisada uma história <lc vida, <la realização destn, nem é representativa da totalid:idc da mcsm:i.
apresenta ela informações cuja amplitude pode ser cm seguida p~s- O material lcvantndo é, por s11a vez, um co?1junto de inform<!ç.úcs
quisada por meio de amostrar;em estatística e utilização de qucst10- reunidas de m;ordo com um ponto de vi~la e um ~isicma - co:1junto
núrios. . cmpírico'quc deve, cm seguida, ser trabalhado por 011tros procedimen-
A divcrsi<la<le de modos de emprego das histórias de vida e dos tos como n descrição, a análise, o levantamento de i:1fcr:;nc!JS, n
depoimentos orais mostra a riqueza dos dados que captam ~ ~ cs:c compreensão, a cxplicaçfo, os quais se sucedem como fase; di:cre11-
respeito, utualmcntc, mnis ou menos todos os cientista~ ~oeia~s s~o 1cs e inconfundíveis. O material uma vez n.:colhido pcrm:111ccc igual
concor<lcs. Niio se nega mais também, que mesmo uma umca h1stórn1 n si mesmo no tempo e no espaço, desde que conservado c::-m o d::·:ido
<lc vida possa ser objeto <le um cstu<lo sociológico aprofundado e cuidr.do. Ao correr cio:; anos, cncerritr.Í s;:mprc as mcsr:::?s ir.:c:·ma-
ç0cs, servindo para outrns pcsquis:1s qué' lcvnr:10 :i confin:1:1~:c~s ol: a
frutífero. Todo fenômeno social é tola\, Slzia l\larccl l\lauss nas <lé-
noyos conhecimentos e comprovaç0cs. Fruto de p:·o(c;!i:ncn::::; do
endas de 20. O indivíduo é também um fenômeno social. Aspectos
pc~quisaclo:·, nfto pode ser coní1111clido eo:n as técnicas ut:lizé!<l~,; ;J:tra
importantes <lc su;: sociedade e <lo seu grupo, comportamentos e
n colctn, e nem com qualq11er moillento cln pr.~quis:i. A :é;:;1ic:1, L0::10
técnicas, valores e iclcoloi.;ias podem ser apanhados .il ravés de sua
se v2, nadn mnis é qt:c n fc1-r .. m..:?1ta dcs: inach a tks::11c::'.':1r <• t' ,do.
histúrin.

?R
vação haviam constituído valores muito importantes para a orien_taçfo
A história de vida, como qualquer outro procedimento empre- dos comportamentos; na sociedade que agora despontava, a atcnç:io
gado na coleta de dados, é pois, um instrumento, não ~ nem coleta, . de adultos e jovens focaliznvn moclificnçõcs e transformações como
nem produto final da pesquisa; ela recolhe um matcnal br~to que atributos fundnmentais de uma vi e.la que se queria moderna.
necessita ser analisado. Porém, o material bruto, uma vez rcg1straclo, O elesapurecimcnto ele sistemas é valores que acompanhavam 2
permanece inerte e imutúvel a:rnvés elo tempo, tendo as mesmas ca- estrutura de uma socicclaele "tradicional", a anulação da própri:i lem-
racterísticas ele persistência e identidade que possue qualquer outro b°rança deles, parecia iminente. Os anciãos seriam as últimas testemu-
!; . documento e, como estes, durando atrnvés elas iclneles desde que conve- nhos oindn existentes de um estilo c.le vicia que se dcsfazia, e esta cons-
nientemente ormazcnado. tatação levou cientistas sociais franceses a se interessarem pela histó-
O início do utilização elas histórias ele viela como técnica ele coleta ria oral cm todas as suas formas. Dn década de 50 em diante, foram
' .,.
cm regiões diferentes mostrou convergências interessantes. Nos Esta- elas complementadas por filmes, por audiovisuais, por vidco-cassctcs .
. dos Unidos, o desaparecimento ele tribos indígenas levou ao emprego Tratava-se de resguardar falas, opiniões, aspecto físico, gestos dos
ele variadas formas de· história oral, com o objetivo de se conservar idosos, além e.los discursos, pois tambt;m constituíam algo do pass::ido.
pelo me.nos n lembrnnçn ,de sua organização_ e costun~cs. Na ~uropa, A organização de arquivos e museus foi muitas vezes paralela à uti-
e principalmente na França, a transformaçao do estilo ele viela dos lização destas técnicas, que armazenavam documentos sobre os anti-
camponeses a partir de fins do séc. ~IX fo~cnt~u tamb~m a _coleta gos modos de vid::i.
de relatos orais, de depoimentos pcsso:us, de histórias de vida, v1_san~o No entanto, para as c1encias soc1ms, o importante não é nem
registrar as maneiras c.le ngir e ele pensar existentes numa organiz~çao ormazênar documentação, nem rccoi,Stituir nntigas sociedades ou épo-
meia\ m:e se apagava. A quase inexistência ele elocumcnlos cscntns, cas, mas atingir um problemn ele estrutura social por meio de mecfi-
~ssim ~omo de outrcs form as de conservaçiío c.lc informações, deter- nicas específicas de coleto de dados. Thomas e Znnr:iecki, dos primei-
minou o c.lescnvolvimento c.le técnicas que pcrmitis5cm o arma?na- ros n utilizar histórias de vida, pretendiam esclarecer questões ligadas
i:icnto de e.lados e.lo passado e também de costumes que, ainda cx1s'.cn- à integração de imigrantes europeus e de outr::is proveniências, que ::i
tcs, iam pouco a pouco caindo cm desuso. partir ele mcac.los do séc. XIX p::issnr,im ::i chegar cm grande quantida-
Em muitas regiões dn França, por exemplo, vivcrnm o~ camp~- de nos Estados Unidos. Procuravam, vor meio da história oral, co-
ncscs, nté a década de 20, cm cstrutmas socio-cconumicas e culturais nhecer as mudanças ocasionadas na sociedade de chcg::ida e n::i~ p:·ó-
oue persistiam havia longo tempo. Continu:w:11n mnito importantes prins sociceladcs de origem elccorrentcs e.la p::irtida dos que migravam.
~ 5 liames do parentesco, as alianças matrimoniais tr~dicionais; _valo-
Trotava-se de um problema contemporâneo e não mais de tima tenta-
rizavn-se a experiência elos mais velhos, sempre rcspe1taclos; na mfr~- tivo c.le recuperação elo passado.
cstrutura material elo cotidi:rno inexistiam água corrente, luz elétri- Mais tarde, também Oscar Lewis se preocupou cm co:1hccer as
ca, estradas nsfaltacl::is; e apesar da leitura e da escrita se terem· clif un- relações familiares de indivíduos de bai>:a renda no México, sobic os
dido desde n scgundn mctudc do séc. XIX, a transmissão de conhe- quais ou escasseavam ou inexistiam claelos. O simples arquivamc1~to
cimento; por vi::i ornl e pdn experiência direto continuava ele grande Jo material, nestes casos, p::issa a constituir um derivado interessante,
rclevilncia, sob a orientação elos mais velhos que detinham o saber porém o objetivo principal é outro. Para esclarecer a qucst:\0 esco-
nrálico referente às ntivicladcs agrícolas e ::ios ofícios. lhida pelo pesquisador não é neccss,írio recorrer a pessoas idos:is;
· A rcformulnção c.l:i inf ra-cstrutura material, a cxp::insão cl?s meios torna-se primordiâl destacar informnntes cujos rcbtos cubram o cam-
1: c!c conn:nicnção, cleterminnram n ntiliznção crescente ela cscnln como po investigado. Em se tratando c.lc Oscar Lewis, foi imprescindível
l, vdculo de registro e trnnsm1ssao ele conhccimc11los; os livros foram
l entrevistar também jovens, para se perceber, no interior da família,
s:.;bstituir:do cada vez mais os ensinamentos dos velhos. A transmissão como se estabeleciam as relações entre clivcrs~s faixas ele idade. Con:1.:-
cral pcrd:n paub'.inamcntc importância; com ela decaiu a influência ccr o relacionamento no interior da constelação familiar se torn:!va
cbs idosos, cujos conhecimentos niio crnm mais tão nclcquados no possível através das narrativas ele p::iis. de filhos, de p:ircntcs qt:c c:,:~1
1;ovo contexto sócio-econômico que emanava cbs ernnclcs aglomcra- eles convivessem.
ç3cs urb:i:ins. N::i ::mtign sociedade camponesa, continuidade e nrcscr- .
.. ,

Todavia, cnquunto Thomas e Znaniccki u_tilizaram os. rcl_atos geral, o relato oral, se apresentavam "cheios de subjetividade", t_anto
orais como documentos iguais a quaisquer outros, Oscar Lewis ficou do narrador quanto do pesquisador, constituindo assim instrnmcnto
de tal modo fascinado pela riqueza das histórias de vida que julgou que não raro levaria a desvios ele observnçüo e a interpretações
nfto ncccssitor o sociólogo de aniíliscs e inferências; bastava que to- errôneas.
masse conhecimento <lo material empírico cm seu estado "natural". A revalorização da história oral ocorrida recentemente na Europa
Não desenvolveu, pois, um estudo, mas quis levar ele maneira direta despertou o interesse dos cientistas nacionais. Primeiramente foi a .
aos intcrcssodos o conhecimento de seus dados, rcalizanelo tão somente história oral que ressurgiu, susci tando inicintivas tr;iduzicl:1s na fun-
n transcrição das· fitas gravadas; efetuou, isso sim, uma limpczn e dnçüo dos Museus da Imaeem e do Som, e tam bém <lc grandes arqui-
orelenaçfio dos relatos pnrn compreensiío mnis fncil e nmcnn por pnrte vos que armnzenasscm entrevistas com personalidades políticas fa.
' •' elo leitor. E quase transformou seu mntcrinl cm literatura .... rnosas. Nestes repositórios se encerra a "memória" de algo que se
· O respeito à integridade das histórias de viela não foi s~mcnte perderia com o desaparecimento de pessoas mais velhas, num país
praticado por Oscar Lewis; vários pesquisadores também l_1cs1taram cm que sempre se deplorou a falta de documentação para estudo. l:!
cm nprovcitar pnrtcs do mntcrial colhido, como se o dcsvll'tuassc_m · Além disso, o ritmo extraordinariamente rápido de mudanças na
se não o conservassem cm sua inteireza; apresentaram portanto a his- sociedade brasileira devia forçosamente contribuir pnra a difusão da
tória ou as histórias colhidas, tanto quanto possível, cm sua totalidade. técnica. Quando se dá conta, por exemplo, de que cm 1950 o meio
Niio se elnvam conto de que reloto escrito ou fita gravada constituem rural era habitado por 70% da população e de que cm 1980, num
registro semelhante n qualquer outro dos habitualmente analisados. período de 30 anos, as proporções se invcrternm intciramcnle, os habi-
Se não se furtnvnm n utilizar destacndamentc umas das outras, as a,ntcs do mcic urbano passando então a 70 % , cumprcendc-sc que a
r~spostas n um questionário, não havia r~z~o P'?ª r.ão rccortare~1, conservação do que "foi" ndquiria importância nos olho~ cos l;Stu-
d:is histórins de vida, ns passagens que d11.1am d1rcta:nentc respeito diosos. Recolher a maior quantidade possível de testemunhos sobre
ao que estavam estudando. Tal utiliznção não ir.iplica!a c~1 mutilações formas de vida parn as quais nüo existam scn:io parcos rceistros ; saber
do material· relato escrito ou fita gravada, pcrmanec1a;:1 111tactos para como agiam os "silenciosos", aqueles que pouco apnrcccm na documen-
serem emp;cgados por outros pesquisadores. Desde qu~ a história ele tação escrita, isto é, as camadas de buixa rcnd:i; snbcr como encaram
vida ou os relutas orais niio tinham sido colhielos meramente para sua existência diante das modificações velozes cm curso, constituiu
serem arquivaelos, urgia analisar os dados neles encontrados, esco- uma· larga abertura p:ira a utilização de relatos ornis e de histórias
lhendo-os na rnnssa bruta do material coletado. A m,ma bruta com-
de vida.
pleta ficarin arquivada, :1 disposição de outros cic.U.L.islas.. p&ra- nova~
Poréni, desse ponto ele vista, não se tratava scnüo ele armazenar
pesquisas, cm absoluto não se pcrdcrin. /Utiliz.ida co1~10 instrumento
n memórin. A vcrdndcirn utilizHç~o das histórias de vida como t6cnica
llc coleln <le dn<los cm dêncins sucinis, n hisiúrin de vida deve for- específica de pesquisa neste país, nüo fez seu rcapnrccimcnto nem

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çosamcntc ser analisada e, portanto, fraemcntada. na sociologia, nem na antropologia, e sim na psicologia social. A fina-
j
lidodc foi o esclarecimento de problemas da mcmórin enquanto atri-
lfotórins ele vieln no pes11uiso brnsileirn buto humano estreitamente dependente da vidn soei:\! e por esta ali-
mentada. 13 O trabalho pioneiro se desenvolveu cm S. Paulo, cidade
No Brasil, a técnica de hi stórias de y.\da, depois C:c brc\'C aparc- cujo crescimento· acelerado e transformnçõcs radie:iis constituem
c1mcnto cm fins dos anos 40 e início da -elécada de 50 10 permaneceu grandes provocações parn se inquirir o que sucede com os processos
ii;1:or:ida. No entanto, as carnctcrísticas gerais d:i socb!adc brasileira de conservação das lcmbrnnças . Somente cm seguida :i esta pri:11cira
e principalmente o rapidez ele suas trans formaç6cs, tleY.::ria1:1 ter lc:a· oplicação dn técnica, foi ela estendida a investir,:içõ..-:s sobre :1spcctos
do mais cedo os pesquisadores ü utilizaçiio dcs'.a técni~a. 11 Sua eclip- prop;inmenlc socinis para os quais n~o se possuía fartn documcnt,~çüo,
se durante tanto tempo deveu-se ~ espécie de cnc;ii.tamcnlo pelas fosse cm cnmn<las sociais inferiores, fosse cm determinados r,:-upos
técnicas estatísticas de amostragem com o emp:·q;o de qucs'.io11úrio:.. étni;:os, fosse c;n certas cater,orias profission:i:s, 11 t:mto no mt:io
:\o; olh~s dos cicnti~tas sociais, as 'hist6rins d:: \ ida e, d~ l! m modo
Nestes casos, é agorn a sociologia que está cm jogo. Os meca- dados assim obtidos, é possível construir um primeiro diagnóstico
nismos da memória, sun ligação com a base biológica e com o con- dos processos cm curso. Alcnnça-sc entiio uma vis5o <lo que ocorre,
texto sócio-econômico cm que se dão as experiências individuais, não cuja extensão seria a seguir, numa outra pesquisa, investigada por
constituem para ela questões fundamcntais. A organização de arq ui- meio de técnicas estatísticas de nmostrngcm, por exemplo. Vive-se
vos, a constituição ele acervos ele elocumcntação, o armazenamento hoje um momento privilegiado pnrn se· enptar, por meio de histói:iu
ele elados, tombém por si sós n1io se colocam diretamente como meta oral, e mais parlicularmcntc por intermédio ck histórias de vida ou
a ser olconçoclo. O que se busca é o esclarecimento de relações cole- ele depoimentos pcsso.iis, a maneira pda qual diferentes _camadas so-
tivas entre indivíduos num grupo, numa camada social, num con texto ciais, diferentes grupos, homens e mulheres , várias faixas de idade
! profissional, noutras épocas e também agora. estão experimentando as mudanças que ocorrem, seeun<lo que valo-
!. ~
I ' Nenhumo soci~dade é um todo monolítico; cin seu interior coe- res os estão enenran<lo, quais as normas que aceitam para seus com-
!; xistem grupos e camadas sociais de diversos tipos, divisões por sexo portnmcntos e quais as que rejeitam.
'• .
1
e idade, coletividades variadas. Histórias de vida de indivíduos com Uma técnica qualitativa como a das histórias de vida pode coe-
posições diferentes dentro de um grup&; quer sejam membros da xistir- tranquilamente com técnicas quantitativas como a da amostra-
mesma família (como já colhem Oscar Lewis), quer se trate de homcn_s gem, desde que cada uma delas seja aplicadn a um momento especí- -(\.
e mulheres, quer diga respeito ao contraste entre os mais velhos e os fico da pesquisa. A técnica de his1ória de vida é, cm geral, muito
mais jovens, servem para dirimir dúvidas e aprofundar conhecimentos. útil parn um primeiro levantamento de questões e de problemas, ao \R\.S~
E estas investigações transbordnm das camadas inferiores pera todas se notar a inexistência ele conhecim:::ntos a respeito. Também é da '\ JC
as demais, uma vez que cm todas clns os mesmos problemas se colo- maior utilid ade como meio d:: yerifi::~:ção e de controle do que já foi
cam ele clcsc0lnir relações ignoradas. colhido por outros meios. A técnica quantitativa, seja n ela :imos- \-\ , :i-16,v <- ~
No meio rum!, por exemplo, os mudanças cxtrcm:uncnte rápidos trngcm ou outrn , serve principalmente para se conhecer a intensi-
ocorridas cm S. Paulo atingem indivíduos ele todns as cam:iclas so- dade de um fenômeno, o quanto se espraia p0r um grupo ou camada,
cinis; no entanto as pesqu isas utilizem ou não histórias de vida, t~m como atinge grupos e c.imad:!s difcr:.:ntcs. Os dois conjuntos de téc-
se voltado quase que somen te para as camadas inferiores. Não se nicos não são opostos ou mutuamente exclusivos; são procedimentos
.ilcnta para que, ainda há poucos anos, havia também, habitando em a serem empregados cm dctcrrnin:idos tipos de pesquisa, ou cm de-
suas propriedades, grandes e médios proprietários, e dcsconhccc-s:: · ·1crmin:::dos momento, da me.;:-na . ic :'ião tem sentido, nas ciências
corno vivenciaram a transformação que se operou cm suas existên- sociais, se tornar partido por este ou aquele procedimento, tanto mais
cias com sua implan tação nas cidades. IG Além deles, toda uma gama que a obtenção de dados de fontes variadas, que enriquece uma pes-
de indivíduos citadinos está ligncla nos habitantes do meio rural, não quisa, detcrminn n ncccssiclncic de se util izarem lfo1icas tamb~m va-
por auferirem diretamente do solo seu sustento, porém para servirem rioclus. A querela é v:í; o imµortantc é saber escolher a técnica ade-
aos moradores urbanos: funcionários públicos (professores primúrios, quada no ti po de problcnrn, i1 cspedicidadc do dado e ao momento
t:ibcliãcs, delegados, etc.), gente do setor tcrci:írio (pequenos e mé- preciso da investigaçiio.
dios comerciantes, pequenos industriais, artesãos, etc.). Como vivem
eles as reviravoltas havidas com o êxodo dos campos e com as mu- Histórias de vidn: do individunl no colctirn
danças de relações de trabalho ali acontecidas? O esvaziamento cio
meio rural tem determinado também o esvaziamento das cidades dele A história ele vida é co:itada i;0r um personagem e girn cm
dependentes - t!Spccto do problema que permanece ignor:ido e pra- torno deste. À primeira vistn, dir-sc-i~ que é :!lgo eminentemente indi-
ticamente não cstu<lac.lo.
vidual, sofrendo as distorções trazid .:!s pela ~ubjctividndc cio narrador.
Constituem as histórins de vida, nestes casos, c>:cclcntcs técnicas Estu coloeaçfio tem st;n raziio ele ser; no rel:ito ele uma história de
p:ira se efetuar um primeiro levantamento de questões, pois aind:i vida, o pesquisador colhe dados qu::: indicam como se formou a per-
faltam dados a respeito destas; revclnm o cotidiano; o tipo de rcla- sonalidade de um indivíduo, ntravés e; scqü~ncins de cxpcricncias no
cion:imcnto entre os indivíduos, as opiniões e valores e, atra,ú dos decorrer do tcmn0. "lndi..-ídu0" ~i1,1~::icn a!r•t:ém oue se lomm: isola-
\

e
damente, extraindo-o do interior ck umu c:olctividudc pura c:onsidcrá- estudiosos, justamente por se encontrar no cruzamento <las duas àis-
lo cm si mesmo, naquilo que o._dist,inguc dos demais. Quando se estuda ciplinns a que se voltaram. Di.intc elo material colhido pelo psicó-
n personalidade do indivíduó; admite-se que os predicados cncontr?·
dos são exclusivamente seus e não oc:orrcm cm nenhum outro, por mms
logo, o sociólogo naturalmente se qucixar:í <lc falhas; e vice-versa.
Mas as lamentações não invalidam a utilizi!ção do material pelos dois.
\
semelhante que possa ser; isto é, tanto sua constituição quanto suas No entanto, embora muitos cientistas sociais tenham alertado parn. as
qualidndes o mnrcnm como único, o distinguem dos demais ele seu limitnções da técnica cm sociologia, consicleran<lo até que seu emprego
grupo, de sun socicdndc. Indivíduo e pcrsonalidncle seriam noções ~ue deveria ser evitado, na vcrclacle ela foi se apresentando como cnda vez
recobririam nquilo· que existe de mais íntimo e ele mais inconfund1vel mais relevante para esta ciência, justamente cm funçfio <la :írca cada
1
cm ulguém. vez maior que foi a sociologia abarcando no correr do tempo. 18
Se o indivíduo obedecesse a determinações ·exclusivamente suas No século atual a sociologia, apoderando-se da psique também
e inconfundíveis, então realmente as histórias ele vida seriam impró- como seu campo de estudos, estendeu seu âmbito até os sonhos, du-
prias pnrn umn nnúlisc sociológica. 17 No entanto, o que existe ele rante muito tempo consicleraclos algo de exclusivamente pessoal;
individual e únic:o numa pessoa é cxcccliclo, cm todos os seus aspectos, enc~rou-os como rcp:·escntaçõcs simbólicas do relacionamento do in-
por uma infinidade de influências que nela se cruzam e ~1s quais n,ão divíduo com seus semelhantes e com sua soeiecla<lc. Englobou cm se-
pode por nenhum meio escapar, de ações que sobre ela se exercem guida cm seus cstudoz, o inconsciente, vendo-o como o repositório
que lhe são inteiramente exteriores. Tudo i5to constitui o meio cm <lns agressões e das opressões <lo meio soei.:!, e portanto material reve-
que vive e pelo qual é moldada; finalmente, sua personalidade, apa- lador para a análise de controles e cocrçõ:s. Finalmente foi se orien-
rentemente tão peculiar, é o resultado ela interação entre suas cspc- tando também para :i subjct;viclad-:, isto i::, para :! fai:-.a interior que
cificidaclcs, todo o seu ~1::bicntc, todas as coletividades cm que se parecia mais próxima do biológi::o porque carregada de afetividade,
i?iscrc. Não é novidade alguma afirmar que o indivíduo cresce num implicando por isso mesmo num caráter marcadamente individual.
meio sócio-cultural e cst.í profundnmcntc mnrcaclo por ele. Sua his- Com efeito, "subjeti;-o" significou primcirnmcntc aquilo que per-
tória de vicia se encontra, pois, a cavaleiro ele <luas perspectiva:..: a tence a um indivíduo e somente aquele, distinguindo-o dos demais;
do indivíduo com sua herança biológica e suas peculiariclacles, a de negava-se assim que a forma tomada pelas manifest.içõcs dele puclc~sc
sua socie<lacle com sua organização e seus valores específicos. A his- ser igualada pela dos demais. Nesta caractcrizaç;io se consubstanciaria
tória de vida, cm resumo, se encontra apoiada cm duas disciplinas, a
a oposiçiio entre subjetivo e objetivo; es!e último encerrava caracte-
psicologia e a sociologia. rísticas válidas para todos os indivíduos porque exterior a eles, en-
A história de vicia é portanto técnica que capt:i o que sucede
quanto o primeiro pt:r111ancccd:1 cn~crrado no íntimo cio indivíduo,
11;1 cncn1;_ilhad:1 da vitla individual com o social. Conformc scjn o

pesquisa dcsenvolvida por um sociólogo ou por um psicólogo, assim formado pelas qualidades que lhe seriam exclusivamente peculiares.
a orientação <la c:okta de <lados lcvarú uma ou outra ac;cntuação. No No julgamento subjetivo de um indivíduo estariam as marcas de suas
primeiro caso, scr:10 procuradas no informante as marcas <lc seu gru• impressões, de seus gostos, seus hábitos, seus desejos e nspiraçõcs,
po étnico, cle sua camada social, de sua sociedade global - vári_os única e fundamentalmente seus, inconfund íveis com os dos demais.
níveis que apresentam estruturr.s, hierarquias, valores ora harmonio- Apesnr <lc todas estas definições, no entanto, a sociologia atual•
sos, ora cm desacordo. o que tudo se reflete no seu interior. No se· mente se orientou tamb.;m p:irn o subjctiyismo, coasiderando que ck
gundo caso, são buscadas as particulari<laclcs que singularizam o_i ncli- n~o dccon·e exclusivamente de bases biológicas e psicológicas, po:é:n
vícluo Jdincia-sc o caminho seguido na foi mação ele sua personalidade que se desenvolve numa coletiviclac!c, sendo portanto revelador desta .
.itravds cio emaranhado <las rclu~õcs variadas tec:iclas p:la sua colcti• O subjetivismo deixa assim de ser, p:na cs'.a discip!in:i, a marca ir:di-
vicladc, e é o produto final, consiclcrado como ú:1ico. que se quer vidual intraduzível e i:1cxplicá\'cl, cujo vislumbre de alguma intcrp:c-
comprccnclcr e explicar. tnçfio só poderia ser captado atr:m:s d:i biologia e dn psicolo;;ia ; ::
Sociólogo e p5icólogo poderão utilizar uma história de vida que wciologi:i também te:n sua p:ilaYr:i a dizer a rcsr,ci to dess-:s p:o~'.c-
tenha sido colhida por um deles. O material é v(iliclo para ;111160~ os m:is. aue ooclem ser obicto de seu estudo. Tanln m:1i, rn1" ,,, m~ ·,i .
fcslaçõcs do subjetivismo rcspondclll sempre a algo que é exterior sonho pode ser abarcado pelo estudo sociológico; qu:111to ::o aspecto
aos indivíduos. cinestético, somente quando, como j:í se disse, de scnsaçi1u p:1ss:m;;
Necessidades físicas, inclinações, patõcs, prazer e dor, signifi- a percepçiio.
cam reações da parle do indivíduo a algo que captou a partir do Ainda que o subjetivo seja c11te:1dido como ;is scns.?çõcs intrach.s-
exterior, e que só adquirem significac.lo através e.la mediação do exte- zívcis, ainda assim é próprio elo~ indivíduos lentar comprce:nd~-la~
rior; conforme a sensibilidade <lclc, serão mais ou menos intensas, primeiramente, e transmit ir aos outros o que compreendeu; porém
<lcscnca<lcarão ou 1_1ão ações <lc variado tipo. Uma vez existindo n ao ~azê-lo forçosamen te utiliza O$ mcc:rnismos lJllC tem :1 sua 1fopn-
mc<lia\'.iiO exterior (e n palavra é ullln delas, provavelmente a mais siçiío e que lhe foram dados pela fainília, pelo grupo, pcl:t sociedack.
.J
importnnle) para que se expresse o purall\cnle in<livi<lual, este fica A história cle vida pode lentar desvendar o ponto cm que çarnctcrís-
já comprometido com o exterior, sempre mcrguihado numa atmosfera ticas <lestas colctivi<l:ides se juntam às sensações cincstésicas. buscando
plenamente coletiva. Mesmo que se lrnlc <lc sensações térmicas, res- a interação entre ambas, e csclarcccnclo quais os instrumentos sociais
piratórias, circulatórins_. isto é, <lo conjunto de sensações internos de utilizados para a tradução.
que trata a ccnestcsia - sensações que parecem independer até da A esta maneira mais antiga de compreender o subjetivismo veio
intermediação dos sentidos para serem percebidas - ainda assim se juntar outra mais recente, baseada na teoria de Jung, dos arqué-
sun nprccnsão pelo indivíduo forçosnmcntc passa pela conscientização tipos enraizados na própria natureza do ser humano; isto é, existiriam
(ou pelo menos pela tentativa <lc conscicntiznção) através da palavra; representações simbólicas comuns a todos os indivíduos atrnvés <los
o que significa através de um instrumento forjado pela realidade so- tempos, sejam quais forem as raçns e os momentos. A semc!h:?,1,.a
cial. Não escapa, portanto, de se tornar cm prle, também, objeto de <las estruturas nv.:ntais seria fun c!.?mcnlal, e dela cmanari:1111 rqm.:~cn-
estude sociológico. . laçõcs similares bnnh:idas sempre numa dominante ele 10:1alidacic afe-
Assim, ainda quando o subjetivo seja entendido como as sen- tiva. Assim, modelos de açiio e de comportamento se encontrariam cm
sações incfúveis provenientes <los órgãos internos, da circulação, _da povos muito diversos, muito nfnsta<los no tempo e no espaço, que nf10
nutrição celular, etc., constituindo um estado psíquico proveniente teriam desenvolvido nem conli.llo:;, 111..:m influências recíprocas.
da ação interna deles e resultando cm confusas impressões internas, Este conjunto comporia o "i11co11scicntc coletivo'' e cuns:ituiria
e desde que se admita que estas sensações podem chegar ao estado o f~n<lamenlo do subjetivismo individual na medida c-m c;ue c~tari:i
de pcrccpçiío, neste momento sua formulaçfio ~e op~ra por meio ele unido ao conjunto que, no plano biológico, ioi ch::ima<lu d,.: "insti:1-
manifestações que deixam ele ser puralllenlc subjetivas; pois as sen- to". Nesta mnncira ele ver, a conccpç5o de subjetivismo se inn:rtc.,
sações confusas provenientes <lc locl::is as parles do corpo estão sendo j:í que ele não tem mais por base o que seria C$Se11cialme11k indivi-
conslanlcmenlc lrnnsmitidas nos sentidos e, ao se lransformnrem cm dual, m.is repousaria cm materi:ii:, culelivos incu11s1.;i1.:1lll'~; li1.;rdado~
111.:n:ep\·ves, suf rem ns imposi~õcs du contexto cin:un<lante e perdem juntamente com as estruturas mentais, representariam o asp.:cto psí-
seu carúlcr de exclusiva subjcliYic.ladc. Pela formubção que então quico destas. Todo o psiquismo seria, então, menos individu:il do que
adquirem, entram p:iru o domín io dos falos passíveis de serem anali- coletivo, pois cslmia sempre sub a influém:ia clns n.:pr~·scnt;!çÕ:.:~ 1.:
sados pela socioloeia. im::igens arcaicas reunidas no incoi1scirnlc coletivo.
Nesta maneira de se comprecn<lt:r o subjetivismo, permanece ele Se aceita esta segu11cla concepção cio st.:bjeLivismo, co111 mai$ ra-
como puramente individual, e 1\1cs1110 co:no essencialmente individual. ,.ão então recai ele 110 campo de estudos da anlropolo~ia e cl:i ~o-:iolo-
enquanto não é apanhado nas ~1alh::is cln percepção. Sua base seriam ein. O conhecimento dos arquétipos, fi guras din~micas com csirutur.:
as funçêks vegetativas que dariam lugar a scnsaçücs vagas e difusas relativamente geral, estariam prcsc;-it•.:s 110 inconscil'.tilc J:.: qt.::i!q1:cr
de bem-estar ou de mal-eslnr, cuja influ~ncia se fnria sentir fora elos indivíduo. Uma an.ílisc que clcsvcncla:,~c estas confiGur.i\·õ:.:s i:~v:iria,1-
úrgiios <los sentidos, porém que constituiriam uma das causas físicns tcs, vcln<las pelos si,in i fic:idos ~i m '.;,JI icos ,,cumula dos :: t rJ ,.-~s eos
importantes dos sonhos, por exemplo, mns causa exclusivamente física, tempos, constituiria u:n objdivo claqudas duas ciisciplin:i~. ,-\s v::,s e!;;
o sonho lendo também um conteúdo que se li1;a cstrcitamcnle ao con- ;icesso parJ <lcsc.::rrar os yéus que ocull:1ri::m as in 1ai_;..:11s :11c1:~;:s s,-
texto 56cio-cullural do indiyíduo. Em l:,I pcrspccli\·a, o conteúdo do ri:un variadas: arníli~a cios sistcm:1, m:í11i:·ns , .1;.~: , .. .-, r:: -· •~: ·-
intcrprclução elos sonhos inclivicluais, ele. As histórias ele vida apare- 6. A técnicn <lc depoimentos foi nbun<lnntcmcnlc emprcr.ntln por Olga
cem cntiio como instrumentos <le grnncle utilida<lc p,1ra atingir, sob Rodrigues de Mornes VON SIMSON, cm suas p~squisas sobre o carnnv;i!
a gama dos modelos de pensamento e de ação mais recentes, ndquiri- paulista, ninda cm curso, de ·que se pode ler lllll íl primeira iMia utrnv~s do
<lo~ no contato com a realida<lc sócio-cultural cotidiana, ;1s estruturas nrtigo "Trnnsforlllnçõcs culturois, crintividn<lc popu!nr e comunicação <le mas~a:
mcnwis mais antigas. o Cornnvnl Ilrnsilciro no longo <lo tempo" ·- S. Paulo, Cadcmos. Centro. cic
Estudos Rurais e Urbanos, n. 14, !.' série, clc:ccmbro, 1981.
Aclotc-se uma ou outra maneira de compreender o subjetivismo.,
7. THOMAS, W. !. e ZNANI ECKI, r-. 'J'/rc l'o/isli l'casm1: i11 E11ropc
cabe sempre submetê-lo 11 perspectiva sócio-antropológica a fim de imd Amarica (1918-1920) Ncw York, Oovcr, 2.' cd., 2 veis., 1927.
· aprofundar sua comprccns~o. Niio foram muitos, porém, os estudio- 8. POIRIER, J., CLAPIER-YALLADUN, S. et RAYIJAUT, !'. "Lcs Récils
sos <lestas disciplinas que se abalaram 11 exploração ampla <lestas pro- tlc vie (Théoric ct prntiquc)" l'nris, l'rcsscs Universitaires de Froncc, Col. Lc
fundezas dos seres humanos e das sociedades. Sem dúvida há a ne- Sociologuc, 1983.
cessidade de um refinamento elos instrumentos de trabalho para 9. TILLION, Gcrmainc. Ravcnsbriick. Paris, Eclitions du Scuil, 1973.
10. No Ilrnsi!, Reger BAST!DE puccc ter sido o primeiro a utilizar as
poderem ser levada a deito com suficiente êxito. Mas pergunta-se:· é
históri_ns de vidn como técnica de estudo, lendo suscilodo também as primeiros
possível refinar mecanismos sem ao mesmo tempo exercitá-los? 1 reflexões metodológicas n respeito. Ver na revista Sociologia, v. XV, n. 1, r:1arço
As histórias de vida pócleriam constituir ferramenta valiosa pa~.a de 1953, seu artigo "Inlroduçiio a dois estudos sobre a técnica das histórins de
a intensifieai,:iio de tais estudos, uma vez que se colocam justamente l vida". Os dois estudos, constantes <ln mesma revista, foram: PEREIRA DE
QUEIROZ, Morin Isaura, "Histórias clc Vidn e Dcpoimcnlos Pessoais" e
no ponto de intersecção das relações entre o que é exterior ao indi-
víduo e o que ele traz cm seu íntimo. Tais observações reforçam _as JARDIM MOREIRA, Rcnnlo, "A história <lc vida na pesquisa socio!6gica".
Totlo o conjunto está rc-cclita<lo cm PEREIRA DE QUEIROZ, M~ria I~at.~~.
,ifirn1nções de que h:í nesla técnica uma riqueza potencial ainda niio
"Vnriaçõcs sobre a técnica de grnvndc.,; no registro <ln informação vim", S.
utilizada pelas ciências sociais, e de que seu refinamento enquanto Paulo, CERU/FFLCH/USP, Co!. Textos 11. t,, 19S3. Dessa ri1csmn épo~a. liiadas
mccf1nicn de pesquisa, para ser alcançado, necessita de uma utilização b. mesmn pesquisa sobre ;is relações ra ci:iis entre negros e brancos cm S. Pnulo,
µrnli ca devidamente acompanhada de uma rcílexiío metodológica cada Hr NOGUEIRA, Oracy, "A hislória de vida como técnica clc pesquisa", S.
vez mais aprofundada. Paulo, Sociologia, v. XIV, n. 1, março de 1952.
1t. Florcslnn FERNANDES utilizou a lc:cnicn de histórias de vida n partir
t!c outros documentos, numa <lircç~o pouco usual nas ciencias sociais: fez a
Notas onrllisc <la história de vida de Tiago Marques Aipoburcu, rcco!hi<ln pe!o ctnó-
lo,;o Prof. Herbert IlALDUS e figur.indo c111 seus "Ensuios de Etnologin Brnsi-
1. THO!IIAS, \V. 1. e ZNANIECKI, F. T/Jc l'olish l'ca,11111 i11 E11ropc lcirn", S. Puulo, 1937; completou o trabalho com ~s observações cfclu.i<l:is pelos
w11l ,\11;crica. (1918-l920) - Ncw York, Dovcr, 2/ ctl., 2 vols., 1927; DOLLARD, pcsquisaclores Antonio COLUACCHINI e Cesar ALDISETTI, registrndns cm
)oli11. Cri/cria for lhe Li/e llistory. Ncw Yol'!!, Ynlc U11ivcrsity l'rcss, 1935; "Os bororo orienl;iis, orarimogo<loquc do pl.innlto oricntnl de t-fo:o Gro::~o",
!IOi\S, Frn111.. Roc:c, Lm1~11a1:c m1d C11U11rc.:. 19·12. S. !'nulo, 1912. Trnla-sc 11111161:111 cli.: ci:cckntc exemplo <lc cor.10 un\a única
2. LE\VJS, Oscnr. Os Jilhos de S,11:c/ic::. Lisbo:i, /llor:1cs E<l., 1970. história de vi<ln pode ser utilizada cm profundidade para o csclarccimcnlo de
3. LEROJ-GOURHAN, A11tln:. Lc Gcslc ct la Parole. l'nris, Etl. Albi:1 p:ob!cr.i;is s6cio-n11lropológicos. FERNANDES, F!oreslan, "Tin,:o l'vfarqucs Aip0-
Mid1el, 2 vols., 1964. burcu: um bororo mnrginal", "in" M11dm1çfü Sociais 110 TJrasil, S. !'nulo. Difu-
t.. PEREIR,\ DE QUElllOZ, /llnria lsnur;1. " Vnrinç.ões sobre a t1:c11icn 150 Européin do Livro, 1950. Tiago /\!arques Aipoburcu fnlcccu cm 1 95◊.
Jc gríl', a<lor 110 registro tia inforniaç~o viva". S. !'nulo, Cc11tro <lc Eslu<los 12. Cite-se os Museus dn !111::gc111 e do Som, no Rio de Janeiro e cm
l\urai; e Urbanos e Fncul<ln<lc tlc Filosofia, Letras e Ciências l [uma:ins, USP, Siío Pnulo, que encerram hoje farlissii11a <locumcnlaçiío. Nn Fundnç.fo Getúli.:>
Colcçiio Textos, n. 4, 1983. Vnrgns, o Centro dé Pesquisas e Doc·11111c11i'.ir,ão-(CPDOC) foi fundaclo com
'.i. PEREIRA DE QUEIROZ, /11:irin lsnurn; ALVES DE OLIVEIRA, <lup!o objetivo: o de arquivo de história tmd $Obre-as cl~cJdas que r~~cc<leram
,\11t011in; RODIUGUES, Dircc Spc<lo; t.lACEllON, Vivin11c Galistcu - "S. e se seguirnm imc<liatnmcnlc à ltcvo!u~~o de 30, e o de centro de es:udos
l'n:ilo, 1920-1930: tlepoimc11tos <lc trabnlho<lores tlc b;iixos recursos" - S. ~obre essn mesmo <locumcnlaç:io. ?\ele se imprimia o desejo de co,1s:rvar :i
l'oulo, Cariemos, Cc11tro de Estudos lturnis e Urbn11os, 11. 15, !.' s1:ric, nzoslo hlitórin vivo ntrnvés de dcpoi111cn1os e hi~!~irins de vida <los rcn,anesccnlcs
<l.: 1951. - 1:. intcressa11tc veriíicnr que, n orienlnr cs:a pesquisa, nüo haviJ dessa época. Tnmbém tem cstudaclo a léc1::cn cla história de vida. Ver C:\\fAR-
~in<ln a aulorn refle tido suíicic11tcme11tc sobre n tcr111i11ologin e ;i técnica que GO, Asp~sia; ROCHA Ll!\fA, Va!cntin:i d:1, e l l!PóLITO, L<:cia - " O 1,:é:ocv
cstnn ernprcgn:1Jo, lcn<lo ulili1.n<lo nssi111 "<lepoi111cnlos" como sinônimo d: 1bs histórias de vi<la na /,:néric.i La!ina", S. P.iulo, Cnd,:n:os. Ccn:ro e~ Est'1-
"1:!stúri:?s ele vic!:i" Nn vr-rdndr rch t,1,:1nn h~ r n; ,~'l r,.,,; n l"•H•~ .. ,.,.. .... 1 ...
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~ li. llO~I. Ec.:lé:1, ,lfr1111fric1 .e :,uâcclw/c: lc111/m111ças ele 1•clhu,. S. l'uulo. CIPRIANI, Roberto. "li caso di V:!llc Aurclia". La Crilica socioloeicc:, 11. 63-64,
T."':J\. Queiroz Ed., 1~79. Roma, 1982-1983.
"::.1-1·. Um bom exemplo süo ns pcs4uisas em curso de Zdla de llrito F. CRESPI, P. "Narrazione e ascolto. Aspelli e problcmi dcll'approccio oralc in
DEMARTINI: "Velhos mestres de 1101•as escolas: professores prim;irios rurnis sociologia". La Critica sociologica, n. 70, Eslole, Roma, apri!...-i;iugno 198-;.
1ia 1.• República (S. Paulo)" - S. Paulo, Centw <lc Estudos Rurais e Urbonos, DESROCHE, Henri. Apprcntissagc e11 Scie1iccs Socialcs e/ édC1catio:: pm::.-
mimcoir:ifo<lo, 1985. 11c11/c. Paiis, Le~ !:.ditions OuYricres, l 971. ·
15. Um exemplo nuncn é demais. Em pequeno wrvcy, efetuado no muni- FERRAROTI, F. "Appunti sul metodo biografico". La Critica ~uciolugicc:, n. 47,
ripio <le Torri11hu (S. l'uulo) , nu d6:acb de 60, pelo Cenlro <lc Estudos Hurnis Romn , 1978.
l' Urbanos, verificou-s~ que recentemente a irnn<le maioria de fnzcncleiros, Vitc ela /Jamccc:ti. Nápoles, Liguari Ed., l974.
~itinntcs, ngricultorcs, pa~sara n habitar na ci<lodc. Contavam que trnbalhar - - - Vite cli periferia, Mil:io. Mondadori Ed., 19S1.
era "como ir ao escritório": saíam de manhã parn a propric<la<le e regressnvan\ - - - Storia e storic di vita. lfari, Ed. Latcrza, 1981.
:1 la1c.k, utilizando variados meios de locomoçiio de sua propriedade - tanto FROTA, Luciara Silvcirn de Aragão e. "O documento or:il e algumas de su:is
o cavalo, a charrete, quanto o autom(ivel e o jipe. Esper,wa-se efetuar cm fontes". Caclcmos, Centro de Estudos Rurais c Urbanos, 11. 16, l .' súic,
~cguida uma série de histórias de vida com produtores de variado nível econô- S. Paulo, novembro de 19S1.
mico, tanto os que tivessem mudado de habitat quanto os que nüo o tivessem FROTA, Luciarn Silveira de Aragão e. Dow111e11tuç,io urul e a tc111,ítirn ela seca.
feito. para verificar o c1ue e.,pcrimenlav~1n de material e concreto, e também ilrasília (Df-). E<l. do Senado Fcclcral, 198G.
psicológica e valoratil'amcnle, com a n1u<la11ça. Porém, os "nzares" ela época IIALDWACHS, M. Les Cadrcs suciaC1x ele la 111é111oirc. Pnris, l'n:sscs Unil'ersi-
cm <JUC se vivia então, impos.;ibilitarnm o prosseguimento da pesquisa. laires <le f-ra n:c , 1952.
lú. As pesquisas utilizando lécni.:as quantitativas preconizam a realiznção IIAL13WACHS, M~urice. La Mémoire collecti11c. Paris, l'resses Univcrsitai:·cs
de Ulll pn:-lcvanla111enlo, ou pcscffsa-pjloto, para se tomar co11hecimc11to <los <le Frnnce, 1550. (Ed. bras. no prelo, Edições Vértice).
probicn1as e:'lislcnlcs dctivamc11tc. Histórias de vicb são sem;,rc :eposil6,ios IGLESIAS, Esthc:. "Rcllexões sobre o que fner da hi~tória 01·al no mundo
ckstcs problcm:1s, podrnclo-se pn1n tal consultar p1cvi:11ncnle as j;', existentes rural". Dados (R.cvist~ <le Ciências Sociais). v. 27, 11. 1, Rio de Janeiro. !9S-L
com o mesmo intuito <la pesquisa-piloto. I.EJAUNE, Ph. Lc Pactc m,tobiograp/ziqw:. Paris, Ed. du Scuil, 1975.
17. Veja-se :i rcspeiro o artigo de MOREIRA, llcn:ilo Jarúim citado 11.l LEVY, R. "Per ui:c riccrc~ biografica integrala". La Crilica socio!ogicct, n. 70,
1101a n. 10. Estale, Roma, aprilq;iuzno/19S•L
18. Para melhor co111prcensão <lestes aspectos, consultar a bibliografia · MACIOTI, Ma:-i~ 1. lliogr,:Jia, storia e societci (L'uso dcllc stork di vita ncl!c
ele apoio, cm anexo. Os leXlO$ citados nestas notas não se c11conlra111 nela repe- scicnze socia!i). N:ípolcs, Liguori E<l., 1985. ,...
tidos poc ter sido apresentada aqui a cilnç:iu co111plcla. llt\VIS GIORDAl\l, Gcor;;es. "De u'utilisation dcs témoign:iges oraux: aspccts
1

déontologiques". Etlmo!oe,ic Jr,:11çaise, Nouvellc Série, to:n~ S, n . .;, l'a:is,


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