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ESTUDO BIOGRÁFICO INDUTIVO:

Abraham Kuyper

Biografia

Abraham Kuyper nasceu em em 29 de Outubro de 1837, na Holanda, filho de uma


típica família tradicional calvinista da época. Seu pai era ministro da igreja reformada
holandesa. É preciso dizer que Kuyper é fruto de um tempo de instabilidade, trazida pela
influência do iluminismo francês na vida e na teologia da época, gerando um intenso
processo de secularização. Esses são pontos importantes para entendermos a postura de
Kuyper, quando começa a estudar na Universidade de Leiden, em 1855. Com religião em
declínio, Kuyper, no seminário, acompanhou a corrente moderna. Relatos mostram que ele
chegou “a aplaudir o professor Rauwenhoff, que abertamente negou a ressurreição corporal
de Jesus.” Contudo, algumas experiências o impressionaram profundamente, levando-o a
repensar sua posição: Uma pesquisa acadêmica, a leitura de uma novela inglesa e
principalmente, a convivência com o povo da comunidade rural na qual Kuyper serviu como
pastor. Abraham Kuyper chegou a conversão, e no resgate de sua tradição reformada
encontrou uma resposta satisfatória para as inquietações de sua alma.
Agora em Amsterdã, Kuyper começa a sentir necessidade de explorar as dimensões
públicas de sua fé. Sob a influência do historiador Guillaume Van Prinsterer, Kuyper funda o
movimento antirrevolucionário (que se torna partido) e assume a liderança, após a morte de
Van Prinsterer. A partir de então, sua atuação política se tornou intensa, tornando-se editor
de 2 jornais, assumindo cadeira no parlamento, e posteriormente fundando a Universidade
Livre de Amsterdã (1980), sendo primeiro ministro da Holanda (1901-1905) e autor de
diversas obras, sendo praticamente impossível falar sobre a Holanda do final do séc. XIX e
início do séc. XX, sem mencioná-lo.
Kuyper dedicou-se a restaurar a visão cristã para a cultura de seu país. Envolveu-se
em diversas frentes e ocupou diversas funções, desde pastor até primeiro ministro da
Holanda, a fim de resgatar a compreensão do Cristo que tudo converge e redime em e por
meio de si. Sua realidade frente ao modernismo da época impulsionou sua busca por fazer
com que a consciência pública e nacional tivesse novamente a influência e o testemunho
cristãos.

Neocalvinismo e suas contribuições

De forma geral, o neocalvinismo pode ser visto como uma leitura do calvinismo para a
realidade do seu tempo, no que diz respeito à atuação do cristão em todas as esferas.
Kuyper procurou atualizar o calvinismo para o contexto de sua época, afirmando a soberania
de Cristo sobre todos os aspectos da vida humana, o que passou a se configurar como o
centro da visão neocalvinista. Dentro dessa perspectiva, o cristianismo precisava ser visto
não apenas como dogmas da igreja, mas como uma forma abrangente de ver a vida e o
mundo, ou seja, uma cosmovisão, aplicando os princípios calvinistas em todas as disciplinas
científicas; enfatizando conceitos teológicos centrais para a cosmovisão calvinista, mas não
tão explorados por Calvino.

Consideradas por Kuyper como uma visão autoritativa de suas visões, as ​Stones Lectures
(ministradas no Seminário Teológico de Princeton, no qual aborda a relação do cristianismo
com áreas do conhecimento - e que vieram a ser compiladas em seu livro ​Palestras sobre
o Calvinismo​) tiveram grande influência na divulgação e desenvolvimento da noção de uma
cosmovisão cristã abrangente. Dessa forma, Kuyper realizou um papel fundamental na
consolidação do neocalvinismo como uma resposta às demandas do seu tempo.

Uma das contribuições do neocalvinismo diz respeito à forma de entender cultura. Os


neocalvinistas compreendiam que o avanço humano na cultura e na sociedade é algo
positivo, no chamado mandato cultural. O ser humano é criado à imagem e semelhança de
Deus e recebe a ordem para desenvolver cultura, explorando e desenvolvendo, de forma
consciente os potenciais da criação. Essa atuação na cultura, por parte dos cristãos, reflete
a dimensão pública da fé, sendo desafiados a trazer todas as coisas ao senhorio de Cristo
até a restauração de toda a criação de Deus.

Soberania das Esferas e Teologia Pública

Uma das principais contribuições de Kuyper foi a desenvolvimento de uma teoria social -
uma forma de enxergar a sociedade - baseada na noção do Senhorio de Cristo, um Cristo
que é Senhor sobre todo o Cosmos, a chamada Soberania das Esferas.

A realidade seria formada por várias esferas, áreas que possuem sua própria autoridade,
independente uma das outras, nas quais Deus é soberano sobre cada e possui uma
lei/norma para reger cada uma dessas sob sua autoridade. Cada uma dessas esfera detém
sua autoridade derivada do próprio Deus, ao passo que nenhuma delas pode arrogar para si
o domínio sobre outra. Kuyper, com a noção de graça comum e mandato cultural, entendia
que Deus governava a realidade, refreando os efeitos destrutivos do pecado, permitindo que
cristãos por meio de uma atuação fiel pudessem trabalhar para promover a vontade de Deus
para toda a realidade. Como ele escreve no livro Calvinismo, baseado nas suas Stones
Lectures:

a família, os negócios, a ciência, a arte e assim por diante,


todas são esferas sociais que não devem sua existência ao
Estado, e que não derivam a lei de sua vida da superioridade
do Estado, mas obedecem a uma alta autoridade dentro de
seu próprio seio; uma autoridade que governa pela graça de
Deus, do mesmo modo como faz a soberania do Estado.

O desenvolvimento do pensamento da teologia pública também foi um de seus


ideais, de que o Cristianismo não deveria ser apenas um conjunto de doutrinas tradicionais,
em específico o calvinismo, e defendidos como dogmas da igreja, mas sim como princípios,
que pudessem ser aplicados em qualquer esfera da sociedade, seja na economia, política,
na arte e cultura.
Mesmo que defasada a participação cristã, no contexto de sua época, Kuyper
acreditava que o Cristianismo deveria ser capaz de oferecer respostas, e principalmente
causar transformação em qualquer um desses aspectos. Exemplo disso, é um de seus
escritos, que ele comenta sobre o problema da pobreza, mostrando que a ideologia política
vigente era mais causadora que redutora, e também que o chamado de Deus para os
cristãos de cuidar dos que sofrem estava sendo ofuscado.
Ele tinha conhecimento de que os cristãos ocupavam muitos lugares da sociedade,
porém não exerciam sua fé, muitas vezes sendo incentivados a isso dentro de suas próprias
igrejas, e pela forte influência iluminista na teologia, colocando de lado suas próprias
crenças, para seguir outras ideologias, que supostamente eram neutras.

Atuação cristã na política

Como cristão, Kuyper entendia seu papel na construção da vida política por meio de uma
cosmovisão cristã. Diante de um cenário dividido entre ideologias conservadoras, liberais e
socialistas, profundamente enraizadas no pensamento humanista, o qual tira o domínio de
Deus sobre a realidade, se colocou crítico a todo tipo de pensamento que buscou apenas
interesses próprios e soberania política, sem real mudança na realidade.

Para Kuyper, o medo da política não era nem cristão nem ético. Em um tempo em que os
aspectos religiosos foram essencialmente privatizados, Kuyper lutou para que a visão cristã
da realidade voltasse aos espaços públicos e norteasse as atividades políticas da época,
longe de uma atitude de evasão ou distanciamento, mas num chamado para promover o
desenvolvimento deste mundo a um estágio mais elevado e fazê-lo de acordo com as
ordenanças divinas e em santidade em todas as áreas da existência humana, demonstrando
a força da fé cristã para transformação social.

É importante dizer que com isso, Kuyper não queria instituir uma teocracia em território
neerlandês; pelo contrário, deixava clara sua intenção de formar um ambiente pluralista que
respeitasse a liberdade de consciência, seja individual ou coletiva, a liberdade religiosa e o
desenvolvimento da sociedade em sua forma variada. Kuyper entendia e se empenhava
para alcançar tolerância e aceitação do pluralismo político no seio social, e não excluir
mentalidades divergentes que sabia serem constituintes da realidade vivida.

“Não há um único centímetro quadrado, em todos os domínios de nossa existência, sobre os quais
Cristo, que é soberano sobre tudo, não clame: ‘É meu!’.”

Perguntas​:
1) Quais os paralelos que podemos traçar entre o contexto cultural holandês em que
Kuyper estava inserido e o contexto brasileiro contemporâneo?
2) Como as doutrinas apresentadas por Kuyper de mandato cultural, graça comum e
soberania das esfera contribuem para uma visão cristã da cultura e da sociedade?
3) Em um tempo onde muito acreditam não existir relação entre política e religião e os
exemplos da nossa política brasileira, como a atuação de Kuyper como político nos
ajudar a entender a atuação do cristão na política?
Referências:
KUYPER, Abraham. ​Calvinismo: o canal em que se moveu a Reforma do século 16,
enriquecendo a vida cultural e espiritual dos povos que o adotaram. O sistema que hoje a
igreja cristã deve reconhecer como bíblico. São Paulo: Cultura Cristã, 2003.

Moreira, Thiago. ​Abraham Kuyper e as bases para uma teologia pública​: A soberania
divina e o desenvolvimento humano nas esferas da existência. Editora Monergismo. Edição
do Kindle.

RAMLOW, Rodomar Ricardo. ​O Neocalvinismo Holandês: Autores e Temas. Anais do


Congresso Internacional da Faculdades EST. São Leopoldo: EST, v. 1, 2012. p.1701-1716.

Estudo produzido por Daniel Amaral C. dos Santos. E-mail:


daniel.santosamarall@gmail.com​; Débora Lima de Jesus. E-mail:
debbie.fromtheinside@hotmail.com​; Emilly Silva. E-mail: ​emillysilvaa25@gmail.com
Lucas Raphael de Jesus da Silva. E-mail: lucasrph2000@gmail.com

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