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Revista Caderno de Relações Internacionais, vol. 4, nº 7, jul-dez. 2013.

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INTEGRAÇÃO pressuposto o regionalismo, os


preceitos em acordos
REGIONAL: OS internacionais, em abordagem
FUNDAMENTOS, AS exploratória, baseada em dados
FORMULAÇÕES secundários.
JURÍDICAS E AS
Palavras-chave: Direito
NORMATIVAS DO Internacional de Integração;
PROCESSO Integração regional; Direito
REGIONAL Comunitário.
INTEGRATION: THE
FUNDAMENTALS, THE Abstract

LEGAL FORMULATIONS The study is to analyze regional


AND REGULATORY OF integration proposal from the idea,
THE PROCESS with a focus on the theoretical
Eugênia Cristina Nilsen foundations nuances of the
Ribeiro Barza1 European process, compared to
Paul Hugo Weberbauer2 Hispanic, to study the formulas and
standards of process steps. Takes for
Resumo granted regionalism, the precepts of
O estudo tem por proposição international agreements in
analisar a integração regional a exploratory approach, based on
partir da ideia, com fundamentos secondary data.
teóricos centrados nas nuances Keywords: International Law Integration; Regional
do processo europeu, integration; Community law.
comparativamente ao latino-
americano, para estudar as 1. NOÇÕES GERAIS
fórmulas e normativas das etapas SOBRE A IDEIA
do processo. Toma por DE INTEGRAÇÃO

1 Professora Associada de Direito Econômicos Internacionais e Teoria


Internacional Privado, Direito das Relações Internacionais na
Comercial Internacional e Direito Faculdade de Direito do Recife/
Comunitário na Faculdade de Centro de Ciências Jurídicas –
Direito do Recife/ Centro de Universidade Federal de
Ciências Jurídicas – Universidade Pernambuco (UFPE).
Federal de Pernambuco (UFPE).
2 Professor Adjunto de Direito
Internacional Privado, Contratos
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O projeto de
As ações fundadas na integração econômica se
ideia de integração econômica perfaz em fases ou etapas
têm sido cada vez mais distintas, cada uma das quais
comuns, alcançando também é considerada como
relevância após algumas modelo de integração. Nesta
interessantes experiências perspectiva de análise a
ocorridas desde as últimas orientação vem de teóricos
quatro décadas do século 20, econômicos, como Bela
todas fundadas em propostas BALASSA (1961), para quem
de reformulação da ordem a integração econômica é um
internacional, considerada a processo, seguindo critérios e
perspectiva econômica. Na parâmetros de eficiência
base de tais projetos e ações econômica baseados no livre-
voltadas à integração está o comércio, o que explica e
entendimento de que os fundamenta a experiência
problemas comuns de europeia, bem como serve de
determinada região geográfica parâmetro para outras
podem ter soluções comuns experiências.
se formuladas pelas nações É possível também
que a compõem (LAFER: utilizar a perspectiva
1982; DEUTSCH: 1982). histórico-geográfica para
É o que temos do analisar o processo de
processo de integração integração econômica. Neste
econômica regional, caso pode-se compreender
formulador de ações segundo como os elementos de certa
teorias econômicas do pós- região geograficamente
Segunda Guerra (1945) que definida propiciaram ou
tinham como meta a poderão propiciar iniciativas
reconstrução, o crescimento e de criação de espaço regional
o desenvolvimento eficiente, aqui possível meio
econômico com fins de de compreender a realidade
construção de uma nova latino-americana.
ordem econômica Isto porque se para a
internacional. Europa a ideia de integração
começa efetivamente com os
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projetos de reconstrução da instituições. Também é


economia e a criação das característico da criação de
Comunidades Europeias, para laço de solidariedade e da
a América Latina é possível formação de diretrizes,
constatar o processo de resultado de encontros ou
integração como parte da congressos reunindo então
construção de um ideário de novos chefes de Estado,
solidariedade para alcançar a conscientes do novo cenário
noção de espaço econômico, político regional (ACCIOLY:
no qual os propósitos do Pan- 1996, 59).
americanismo serão Independente da
fundamento para o perspectiva econômica de
surgimento de associações crescimento ou formação de
regionais com vistas ao mercados, a integração
desenvolvimento regional. regional propicia a criação das
Na América Latina é associações regionais com
com a consolidação do Pan- objetivos mais definidos e
americanismo que teremos a tratados vinculativos
primeira fase do processo de prevendo soluções para
integração. Caberá ao ideário problemas comuns. Nisto o
construir a noção de América contexto europeu e o
Latina, cujas nações contexto latino-americano se
enfrentam com mesmos equivalem: a estratégia de
problemas estruturais do associações ou de
período pós-emancipação organizações internacionais de
política das metrópoles alcance regional comporta
europeias, mas que podem soluções práticas para os
propiciar fórmulas de solução problemas de integração,
de controvérsias. todas dotadas de
O período histórico normatividade e fundamento
entre fins do século XIX até jurídico com amparo nas
início do século XX foi regras de comércio
importante para as nações internacional. Assim sendo, as
latino-americanas pela associações de integração têm
construção de seus Estados- sido responsáveis pela
nacionais e de suas ordenação das relações
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internacionais, além da americanos possui esta


reestruturação econômica, característica.
política e jurídica tanto para a Em uma segunda fase,
Europa quanto para a dos modelos conhecidos de
América Latina (FURTADO: integração econômica das
1976: 90; KRAMER: 1969, campanhas
49-50). desenvolvimentistas dos anos
50 do século 20, as regras são
2. OS voltadas ao sistema de trocas
FUNDAMENTOS comerciais (FURTADO:
JURÍDICOS DA 1981, 22-23). Há nas regras
INTEGRAÇÃO dos acordos nítida intenção de
LATINO- diminuir as desigualdades
AMERICANA regionais, com menção às
questões de livre-comércio,
Em âmbito latino- sendo respeitados os espaços
americano o fundamento para de competência do Estado-
a integração regional utiliza nacional.
várias formulações jurídicas Nesta etapa a
do Direito Internacional, inspiração para as ações
especializado em função das latino-americanas de
temáticas regionais postas em integração vinha das
forma de acordos comerciais. campanhas de reconstrução
Na fase inicial, de europeias, dos estudos sobre
integração regional ainda sob viabilidades econômicas como
a influência do Pan- pressuposto para o pretendido
americanismo, os acordos desenvolvimento regional.
internacionais tomam por Novamente é destacada a
fundamento os preceitos mais importância de teóricos da
elementares do Direito reconstrução europeia, de que
Internacional, embora com o acordo político firmado é
forte tendência aos indicativos essencial para o modelo
de lei aplicável. Um grande pretendido. A partir do
conjunto de regras resultantes conteúdo do compromisso
dos congressos Pan- firmado poderá ser avaliado o
progresso da integração
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alcançado, no que se constata admitir as condições em que


uma aparente fragilidade das será aplicada uma determinada
iniciativas latino-americanas, regra, sem afastar as de direito
ao contrário das formulações interno existentes (REIS:
europeias desde o Tratado de 2001, 60).
Roma de 1952 (BORGES: Não restam dúvidas
2005, 120). de que é requerido um
Mas, ainda que a formalismo para estabelecer
proposta de integração vise um projeto de integração. O
apenas redução de barreiras processo de negociações
comerciais é importante progressivas, ao final do qual
destacar que a participação do será assinado um tratado
Estado-nacional será decisiva internacional de alcance
para a eficácia às regras de regional, destacará se a
alcance parcial firmadas em finalidade econômica ou
acordos internacionais. Ao comercial irá necessitar de
Estado cabe tornar o normas regionais indicativas
compromisso firmado ou meramente programáticas.
passível de cumprimento nos Também irá determinar se
termos em que foi teremos um Direito
estabelecido, porque será Comunitário ou um Direito
graças às regras firmadas que Internacional de Integração.
o empresariado terá a certeza O Direito
de que as propagadas Comunitário é a formulação
oportunidades de expansão de jurídica para a integração da
seus negócios são reais. Europa a partir do Tratado de
Para as nações da Roma de 1952, instituidor da
América Latina este propósito Comunidade Europeia. Tem
será alcançado se em termos por fundamento a
jurídicos for consolidada a comunidade, fórmula de uma
ideia de um Direito organização internacional
Internacional de Integração, especializada em função de
mais especificamente pelo um ideal de construção de
fundamento de indicação de espaço econômico, cujas
lei aplicável. É o recurso mais regras serão aplicáveis de
atrativo, mais confiável por imediato e cujo direito
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fundamentará uma ordem comprometimento preten-


acima da nacional, dido, como a possibilidade de
especializada da internacional. criação de espaço econômico,
O Direito dando ensejo às formulações
Internacional de Integração, jurídicas, o direito indicado, o
por outro lado, é a fórmula da vínculo firmado e a disposição
integração econômica latino- de regras regionais (VA-
americana iniciada com RELLA: 2006, 30).
organizações regionais, que Entre integração e co-
têm nos seus tratados operação há o elemento co-
instituidores as regras gerais mum que é a finalidade de cu-
do projeto pretendido. Assim, nho econômico, cabendo uma
há traços deste Direito na diferença, o grau de intensi-
Associação latino-americana dade com que serão firmados
de Livre Comércio (Tratado acordos de complementação
de Montevidéu de 1960) e na econômica ou de estabeleci-
Associação Latino-Americana mento de áreas de tarifas pre-
de Integração (Tratado de ferencias. Se ficar patente a
Montevidéu de 1980), cujos existência de ações coordena-
suportes são importantes para das, porém evidenciado que
o MERCOSUL (Tratado de uma das partes goza de posi-
Assunção de 1991), por ção hegemônica (e faz claro
firmarem preceitos gerais, de uso disto), não há pretensão
Direito Internacional, para de consolidação de projeto
realizar a integração de bases maior, tão somente um pro-
cooperativas, dependentes de jeto de cooperação pura e sim-
processos internos de cada um ples. Neste caso o direito será
dos signatários. de cooperação, que poderá
Tanto o Direito Co- conduzir a integração (COO-
munitário quanto o Direito NEY, LANG: 2007,
Internacional de Integração 523−551).
empregam métodos de inte- No projeto de integra-
gração quanto de cooperação, ção há o objetivo de criar e de
cabendo comparações a partir consolidação de um vínculo
dos projetos. O ponto princi- novo em certa região geográ-
pal de comparação é o grau de fica, sendo requerido que o
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grau de comprometimento estrangeiros ou cumprimento


seja posto em regras jurídicas de rogatórias e isto já na
dotadas de validade e passíveis Conferência ocorrida em
de aplicação por parte de cada Santiago do Chile em 1856
Estado, membro do acordo (HARGAIN: 2003, 150).
(GOLDRING: 1998, 435- Não há como negar
451). que em tais reuniões boa parte
Nas formulações das normativas com fins de
jurídicas de acordos de integração (termo aqui
cooperação e nos projetos de entendido no sentido mais
integração regional as regras e amplo) propiciaram
as normativas possuem verdadeiras formulações
alcances distintos daqueles jurídicas de integração
nacionais, mas adequados aos regional. Um conjunto de
propósitos firmados, preceitos, notadamente de
contando com duas feição regional foi firmado,
características, ser adequadas incentivando um contínuo
às regiões geográficas diálogo entre as nações. A
definidas e estar centradas em recepção de tais normas foi
princípios de comércio facilitada pelo fato de serem
internacional. cuidadosamente formulados
As experiências de de modo amplo, respeitando
integração latino-americanas limites de competência e de
possuem ambas as soberania de cada Estado
características, de cooperação (WEILER, PAULUS: 1997,
pura e simples e de integração 565).
econômica com fundamento
na cooperação. As primeiras 3. AS
formas de cooperação estão FORMULAÇÕES
evidenciadas em acordos JURÍDICAS DA
firmados em Congressos Pan- INTEGRAÇÃO
americanos, muitos dos quais REGIONAL
versaram sobre métodos para
cooperação administrativa e Para efetivar a
jurisdicional, como critério integração normas contendo
para validação de diplomas preceitos regionais e
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princípios de comércio político normatizado do


internacional são indicados, criado sistema internacional
sendo que tais normativas são que é posto em termos de
encontradas nos projetos direito interno. Mas mesmo
regionais, amparados em resultando de rodada de
formulações teóricas das negociação, se ficar evidente
distintas experiências europeia efeito prejudicial à indústria
e latino-americanas. nacional, ou ficar patente o
A integração é favorecimento de uma nação
considerada a partir de etapas em detrimento de outra, será
ou modelos, no que as com possível argumentar em favor
normativas são postas como de normativa interna, sem
mecanismos jurídicos nos comprometimento do sistema
acordos firmados no âmbito normativo internacional,
do comércio internacional. As como um todo.
origens constam do texto do Tem-se constatada a
Acordo Geral de Tarifas e necessidade de adequação das
Comércio (GATT) de 1947, normativas internas aos
de elementos disciplinadores princípios do GATT e às
do sistema de trocas normativas da Organização
comerciais, cujos elementos Mundial de Comércio (OMC),
são de observância, admitidas para expansão de produção e
as possibilidades de indicação de bens, objetivando a
de lei aplicável às relações segurança do sistema
comerciais criadas internacional. Se a normativa é
(VANGRASSTEK, SAUVÉ: internacional, há a conjugação
2006, 837–864). de elementos característicos
No Acordo Geral de do Direito Internacional, dos
Tarifas e Comércio (GATT) fundamentos da observância
de 1947 a regra de tratamento ao pactuado aos métodos para
preferencial dado a solução de conflitos de lei.
determinados produtos Para fins de integração
constando de listas nacionais é regional, independente do
ao mesmo tempo de alcance resultado ou objetivo
internacional e interno, já que pretendido, como o modelo
indica um compromisso mais simples, o
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estabelecimento das tarifas normativas, em um


preferenciais, há duas compromisso próximo do
características nas contratual posto nas
formulações jurídicas: a obrigações impostas os
observância dos preceitos da membros. Já as experiências
Convenção de Viena sobre o latino-americanas, incluindo
Direito dos Tratados, na as propostas para
proposta de criação e de consolidação de um mercado
estabelecimento de comum sul-americano
obrigações, bem como as (MERCOSUL) sendo as
regras sobre a possibilidade de regras programáticas, gerais,
invocar uma determinada as formulações não possuem
regra a reger e disciplinar a esta característica de sempre
questão (BAHIA: 2000, 58). imediatamente aplicáveis, no
A dificuldade é como que requerem incorporações
tornar efetivos e obrigatórios ou referenciais indicativos do
os preceitos firmados no âmbito de aplicação espacial,
acordo e natureza do tratado atendidas as normas de
poderão influir na imediata direitos nacionais dos
aplicabilidade ou na membros para a solução de
necessidade de interveniência controvérsias regionais de
dos legislativos para a cunho comercial (CHIMNI:
exigibilidade do conteúdo 2004, 25).
firmado (VARELLA: 2005,
135-170).
É o que diferencia os
modelos europeu e latino- 4. AS NORMATIVAS
americano em termos de NAS ETAPAS DA
normativas ou de formulações INTEGRAÇÃO
jurídicas para integração. REGIONAL
Ainda que em ambos esteja
presente a proposta de As diretrizes do
integração, na europeia os Acordo Geral de Tarifas e
acordos contam com a Comércio, firmadas em 1994,
possibilidade de aplicabilidade foram responsáveis pelas
imediata das formulações concepções normativas de
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modelos de integração como espaço econômico que poderá


uniões aduaneiras e zonas de ser mercado comum ou união
livre comércio, importantes econômica. Sendo sucessão de
elementos para etapas implica dizer que é
disciplinamento do comércio necessário que estas sejam
internacional e dos processos devidamente completadas,
de integração econômica com objetivos pretendidos
(ACCIOLY: 1996; CAMPOS: devidamente cumpridos. Mas
1997, 1- 45). não tem sido este o
Embora cada etapa do entendimento recente, dado
processo de integração que cada etapa poderá
contenha normativas jurídicas implicar em um tipo de
específicas, os resultados compromisso que se perfaz na
diferem por questões etapa, aqui entendido como
conjunturais ou históricas. As modelo, estudado a seguir.
diferenças entre a experiência A primeira etapa do
europeia e a latino-americana processo de integração
residem neste ponto, fazendo econômica é o
com que sejam apontados estabelecimento de uma área
acertos e erros, ao invés de de tarifas preferenciais. Trata-
observar as nuances de cada se de acordo que toma uma
processo a partir de área que corresponde às áreas
normativas. geográficas dos membros do
Importa compreender acordo, denominado de
as características de cada território aduaneiro, fazendo
etapa, para observar o com que os determinados
conteúdo normativo da produtos obtenham uma
integração regional antes de tarifa diferenciada,
destacar a experiência como preferencial.
um completo êxito ou um A indicação de quais
projeto cuja finalidade será produtos deve ter um
inalcançável. Também é tratamento preferencial
relevante destacar que a dependerá do rumo de
integração tem sido estudada negociações, dependendo da
como uma sucessão de etapas, disposição de produtos nas
para estabelecimento de um listas nacionais. É exigível que
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este tratamento não acarrete formulações normativas que


prejuízo à indústria nacional, ampliam o alcance do acordo
seguindo aos preceitos que visava tarifas
fundamentais do preferenciais. Funciona como
GATT/OMC. se das negociações anteriores
Nesta primeira etapa as alíquotas fossem da ordem
nada de mais extraordinário de 20 ou 40 por cento do valor
em termos normativos ocorre, dos produtos, periodicamente
não é necessário tratativas negociadas e que nesta fase
para incorporação de texto pudesse ser uniformizadas ou
convencional porque a prática ter um tratamento uniforme.
demonstra ser apenas um Em uma primeira
ajuste ou arranjo que nem abordagem, a considerar a
sempre envolve uma dimensão pretendida, é bem
quantidade expressiva de complexo o pronto
signatários, até para facilitar a estabelecimento de um
execução ou cumprimento do comércio tão livre assim em
acordo firmado. A adequação poucos anos (HILF:
é às regras de comércio 2001,111–130). Mais
internacional, sendo complexo ainda ficará se for
precipitado mencionar que acrescentado o elemento
este é um processo de fortalecimento de laços entre
integração, a não ser que tenha os partícipes com fins de
sido esta a menção expressa entendimento e acordo de
nos termos do acordo tratamento uniforme a
firmado. terceiros se estes não tiverem
Se com o êxito da área parcerias comerciais
de tarifas preferenciais for históricas.
ponderada a possibilidade de No final de contas o
aprofundar as relações livre comércio não é tão livre
regionais é quando será como poderia deduzir o
negociada a formação de uma termo. A necessidade de haver
área de livre comércio. Os um comprometimento de
estudiosos da integração governos (o que se
admitem ser esta a primeira convencionou a denominar de
fase do processo, com vontade política dos
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governantes) induz a nacionais deve alcançar os


coordenação de políticas setores industrial e agrícola,
cambiais, que pode trazer participação de setores
prejuízos aos terceiros, os produtivos de cada nação. O
parceiros comerciais que ainda disciplinamento normativo
não aderiram ao acordo. passa pelo processo de
Neste estágio de harmonização tributária, algo
integração o Direito que suscita muitas
Internacional especializa-se, controvérsias.
sendo o início de um direito O melhor exemplo de
de integração, que é união aduaneira é o acordo
embrionário, seguindo os base da hoje União Europeia,
preceitos do GATT, que BENELUX, bem como o
quando são obedecidos estágio em que temos o
fundamentam esta MERCOSUL. Diferem os
regulamentação jurídica. É o dois não apenas pelo
que temos nas experiências da contexto, mas pelo fato de em
América Latina, como um contexto latino-americano a
todo. pretensão de um mercado
Na terceira etapa do comum ser possível apenas
processo, a união aduaneira, quando a união aduaneira se
há regulamentação do tornar perfeita, contendo
comércio na área constituída tarifa única e código aduaneiro
com o acordo para tarifas único, algo ainda não
preferenciais, consolidada realizado (LOBO: 2004, 59).
com o livre comércio. Nesta O mercado comum é
etapa há um código aduaneiro, considerado objetivo
em que consta a forma de principal, a quarta etapa do
redução total de tarifas até o processo de integração
estágio de alíquota zero, além econômica regional. É a etapa
do uniforme tratamento para ou o modelo que consolida
os demais produtos (LAMY: todos os pressupostos da
2007, 969–984). integração, com ajustes para a
Seguindo as regras mobilidade dos fatores de
postas no GATT a produção, estágio alcançado
harmonização entre políticas pela Europa e pretendido em
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experiências latino- ajustes serão feitos com


americanas como o relação a terceiros, que devem
MERCOSUL por questões a atender uma série de
explicar. exigências, quase todas de
Como o mercado ordem tributária e de ordem
comum pressupõe a livre comercial. Mas entre os
circulação (ausência de signatários do acordo os
entraves) de mercadorias, de ajustes serão de tal natureza
trabalhadores, de capital e de que a supressão de barreiras
estabelecimento nesta etapa políticas para as mercadorias
deverá haver normativas será considerada não como
condizentes com um direito importação ou exportação e
da integração, efetivo entre as sim transação
nações daquela porção intracomunitárias, como
regional. Os integrantes ocorreu na prática europeia da
formam laços estreitos que é Sexta Diretriz, com uma
próprio tratar como uma regulamentação precisa com
comunidade, tanto que nos vistas à harmonização
termos do acordo há menção tributária, evitando a dupla
do objetivo do mercado tributação.
comum, sedimentar o A livre circulação no
desenvolvimento econômico mercado comum enseja
equilibrado e o bem-estar especulações sobre as
social (STELGES: 2002). repercussões, os modelos
No contexto latino- teóricos, e a questionamento
americano a dificuldade sobre a lei aplicável às
residirá em diversos fatores, transações. Não há ainda a
os que são identificados como uniformidade legislativa,
liberdades, segundo o modelo apenas uma coordenação de
europeu. políticas legislativas, como foi
A livre circulação de e tem sido observado na
mercadorias será sempre Europa integrada.
referida, embora seja uma Na América Latina
prática e realidade consolidada será possível admitir algumas
desde a união aduaneira, normativas, mas não
devidamente consolidada. Os identificar completa e ampla
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livre circulação porque esta de harmonizar as regras exis-


normativa implicará em tentes, relativamente ao traba-
complexa transferência de lhador ou ao estabelecimento
competências funcionais. das empresas. Enquanto o dis-
Assim, por exemplo, ciplinamento da atividade do
para haver livre circulação de trabalhador tem constituído
trabalhadores é necessário um uma tarefa relativamente fácil,
pouco mais que mesmas a normatização tendendo a
oportunidades e garantias uma uniformização dos cur-
trabalhistas. A possibilidade sos profissionalizantes e uni-
de indivíduos escolherem as versitários tem dividido os es-
condições pelas quais pecialistas do Direito Comu-
poderiam exercer determinada nitário no contexto europeu
atividade, sujeitando-se aos (SPINEDI: 2002, 1111).
preceitos do local de execução A possibilidade de
desta atividade, mas continuar havendo diversas
resguardando direitos normativas e a possibilidade
adquiridos em matéria de um modelo único divide os
trabalhista é possível se estudiosos também para
houver conjunto garantidor empresas, no que se menciona
de direitos. Na Europa há que a liberdade de
contar com o Direito estabelecimento, aqui também
Comunitário, mas na América compreendido como
Latina o tratamento será investimento. O
considerado as peculiaridades entendimento é a
da condição do estrangeiro em possibilidade de ser indicada
cada Estado, dificultando a uma lei reguladora da
normatização desta que é uma atividade, que não traga
das liberdades a consolidar prejuízo à indústria ou
(LOBO: 2003, 69). atividade comercial de onde
Todavia para ser al- pretende a empresa
cançada de modo pleno é pre- estabelecer-se, para que na
ciso haver coordenação de po- ideia de integração prevaleça
líticas macroeconômicas, estu- equilíbrio.
dos profundos de especialistas O disciplinamento
em cada área com o propósito normativo contempla mais de
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um direito aplicável na região, conjunto de aceitá-las como


sendo este o Direito válidas naquele contexto.
Comunitário. A integração É a diferença entre o
regional terá normativas contexto europeu do latino-
regulamentadoras de como americano. Para o contexto
ocorrerá e em que proporções latino-americano é possível
a norma de direito interno haver regras gerais, mas alguns
poderá ser invocada temas permanecerão de
(WEILER, PAULUS 1997: competência exclusiva de cada
545-565). Estado, tomando aqui o
As normativas da conceito de soberania
integração são eficazes, sendo (MOON JO, SILVA
o Direito Comunitário o SOBRINO: 2004, 17- 30).
melhor exemplo disto pelo O fato é que o
âmbito de aplicação e matérias estabelecimento do mercado
que disciplina. Há referência comum e das quatro
aos aspectos tributários, liberdades fundamentais força
trabalhistas e comerciais, ao debate sobre soberania
contribuindo para o estatal, pelas implicações que
disciplinamento do comércio uma associação de Estados
intra-regional (GOLDRING: com fins de integração terá. O
1998, 445). conteúdo do acordo implica
Nos acordos de em compromissos, em
integração constará menção mudança do tratamento do
ao desenvolvimento estrangeiro, algo que tanto o
econômico e aos mercados direito interno quanto o
regionais, sendo que os ajustes Direito Comunitário e o
farão com que o comércio Direito Internacional de
regional conterá regras bem Integração terá
específicas, de alcance (LITRENTOS: 1991, 86).
regional. Equivalerá o Direito O mais alto grau de
de Integração ao Direito complexidade reside na etapa
Comunitário porque as considerada final do processo
normas jurídicas possuirão de integração econômica
eficácia, dado que há esforço regional, a união monetária ou
econômica, estágio alcançado
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apenas pela Europa. O É certo que não foram


pressuposto é que a devidamente ajustadas as
associação cujo propósito é a normativas em estágios que
liberdade de circulação dos preveem a liberdade de
fatores de produção deverá circulação ou plena
contar com um conjunto de mobilidade, como idealizada
regras consolidada desde a no plano teórico. Para a
primeira fase. circulação alguns fatores têm
A união monetária encontrado dificuldades,
coincide com a concepção de como as normativas regionais
bloco econômico, tornando a questionáveis e a incipiente
negociação com outras coordenação de políticas
economias em bloco possível legislativas.
em termos regionais. As Havendo
vantagens de uma associação coordenação de políticas, o
regional de tais proporções direito resultante, quer de
esbaram em algumas feição comunitária, quer na
dificuldades, como a noção de feição internacional de
constituição de uma entidade integração poderá ser aplicado
supranacional que necessita de e devidamente exigível. Em
uma constituição e que paralelo, mesmo com um
derrogará as outras existentes pretenso espaço único, ou que
nos Estados-membros. tende ser unificado, os
problemas relativos aos
CONSIDERAÇÕES conflitos de lei no espaço
FINAIS persistem, devendo ser
encontrados elementos que
Mesmo considerando resolvam as questões.
a utilidade e a importância dos A nova disciplina
processos de integração jurídica que lidará com as
regional pela necessidade de questões resultantes da
reordenação do comércio sem formação de um espaço
as normativas regionais o econômico regional poderá
projeto padeceria de um ser comprometida com o
sustentáculo. estabelecimento da livre
circulação de mercadorias, de
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pessoas, de serviço, mas com brasileiro. Rio de Janeiro: Fo-


regulamentação especial. rense, 2000.
Cada partícipe do
acordo continuará no domínio BALASSA, Bela. Teoria da Inte-
de suas funções legiferantes, gração Econômica. Tradução de
mesmo havendo laços Maria Poupa Gonçalves e Ma-
estabelecidos para fins de ria Elisa Ferreira. Lisboa: Li-
comércio internacional. É vraria Clássica Editora. 1961.
preciso, então, que o processo
de integração regional seja BORGES, José Souto Maior.
compreendido por outra Curso de Direito comunitário: ins-
dimensão, que não apenas a tituições de direito comunitário com-
política ou econômica, mas parado. União Européia e Merco-
uma jurídica. Por esta sul. São Paulo: Saraiva, 2005.
dimensão é possível
compreender compromissos CAMPOS, João da Mota. Di-
nem sempre estão previstos reito Comunitário. vol.1 e 2. Lis-
nos ordenamentos jurídicos, o boa: Calouste Gulbenkian,
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