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AO JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CAPINZAL –

SANTA CATARINA.

Processo Crime nº 5001084-25.2021.8.24.0016

ALEXANDRE DE FREITAS, brasileiro, solteiro, inscrito no


PPF nº 015.358.949-38, portador do RG nº 3620552 SSP/SC, residente e
domiciliado na Rua 442, nº 859, Morretes, Itapema/SC, CEP: 88220-000,
vem, respeitosamente perante Vossa Excelência, por meio de suas
procuradoras infrafirmadas, apresentar DEFESA PRÉVIA, com fulcro no
art. 55 da Lei de nº 11.343/2006, pelas razões de fato e de direito a seguir
expostas:

CAÍTULO 01 – DOS FATOS:

O réu Alexandre de Freitas foi acusado pela suposta prática


de tráfico de drogas e associação para o tráfico em concurso material,
condutas tipificadas pelo art. 33, caput e art. 35, caput, ambos da Lei de nº
11.343/2006, e art. 69 do Código Penal.

Segundo o Inquérito Policial sob os autos de nº 5000009-


48.2021.8.24.0016, foi lavrado Termo Circunstanciado para apurar a

GSJ
prática, em tese, do crime previsto no art. 28 da Lei de nº 11.343/2006,
tendo como noticiado Renato César de Oliveira, apenas.

No referido Termo Circunstanciado registrou-se que no dia


18/03/2018, foi encontrado na posse de Renato César de Oliveira a quantia
de 1,7g de cocaína e um telefone celular, e com o réu Alexandre de Freitas
apenas um aparelho celular.

Na ocasião, Renato César de Oliveira foi tratado como autor


do fato, vez que assumiu a posse da droga, enquanto o réu Alexandre de
Freitas foi tratado apenas como outro envolvido e foi liberado. Todavia, de
maneira totalmente desarrazoada, foi apreendido o telefone celular do réu
Alexandre de Freitas, e realizada perícia.

Assim, em 14/04/2021, o Ministério Público ofereceu


denúncia, acusando o réu Alexandre de Freitas de associação para o tráfico
junto de Jackson de Jesus Betim, pela suposta comunhão de esforços para
a venda de drogas por meio do aplicativo de mensagens whatsapp, no final
do ano de 2018. Bem como, ofereceu denúncia imputando a prática de
tráfico de drogas pela suposta venda de entorpecentes a Cristian Rosenei,
Deivid Lopes, Ronei Alves, Lucas Scmidth, Luan Carlos Masson e Juliana
Grazieli Szemansqui, entre fevereiro e março de 2018.

Todavia, o réu Alexandre de Freitas nunca praticou qualquer


comércio de drogas ilícitas. Em verdade, o acusado era dependente
químico, sempre adquiria a droga de Jackson de Jesus Betim para consumo
pessoal, nunca comprou drogas para revender, apenas usava entre amigos,
prática muito comum nesse meio.

GSJ
Os depoimentos tomados na fase policial não expressam a
verdade e são facilmente mal interpretados, duas das quatro testemunhas
afirmam não ter conhecimento quanto ao réu ser traficante ou vender
drogas com o objetivo de auferir lucro, sempre procuravam o réu para que
usassem cocaína juntos.

O réu Alexandre de Freitas tinha problemas com o abuso de


drogas, o que prejudicou seu relacionamento com amigos, no trabalho, com
sua família tendo em vista que chegou a se divorciar, até ser internado.
Hoje o réu está livre do uso de entorpecentes, trabalhando como
caminhoneiro e batalhando para manter-se em eterna reabilitação.

Apesar da ausência de justa causa, a denúncia foi


indevidamente oferecida pelo órgão ministerial, o que merece ser revisto,
uma vez que há nulidade da apreensão do telefone celular de Alexandre de
Freitas, e ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade,
conforme passa a demonstrar a seguir.

CAÍTULO 02 – DA REJEIÇÃO DA DENÚNCIA – FALTA DE JUSTA


CAUSA PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL – NULIDADE DA
BUSCA E APREENSÃO TELEFÔNICA – AUSÊNCIA DE INDÍCIOS
MÍNIMOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE:

Dispõe o art. 195 do Código de Processo Penal que a justa


causa é imprescindível para o recebimento da denúncia pelo magistrado,
assim, ausente os fundamentos que levaram o órgão ministerial ao
oferecimento da acusação, esta deve ser rejeitada. In verbis:

GSJ
Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:
[...]
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Entende-se por justa causa aquele mínimo suporte fático, o


início da prova, capaz de justificar o oferecimento da acusação em juízo.
Portanto, a denúncia não pode surgir de mera suspeita ou de conjecturas,
e, sobretudo, em provas ilícitas.

Quanto à nulidade da apreensão do telefone celular do réu


Alexandre de Freitas, tem-se que, sob a luz do Art. 5º, inc. X e XII da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, são direitos
fundamentais a inviolabilidade à intimidade e a vida privada, bem como
inviolabilidade às comunicações telefônicas, resguardando o sigilo de dados,
veja-se:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a


imagem das pessoas, [...]; (grifou-se).

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das


comunicações telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de
investigação criminal ou instrução processual penal; (Grifou-
se).

Apesar de o sigilo telefônico e a interceptação telefônica não


serem a mesma coisa, é de se esperar a necessidade de ordem judicial para
a realização de perícia técnica em aparelho celular, não sendo admitido
quebra do sigilo telefônico quando ausentes indícios mínimos de autoria e
materialidade, em alusão ao art. 1º e art. 2º, inc. I, ambos da Lei de nº
9.296/1996.

GSJ
No caso vertente, verifica-se que Alexandre de Freitas e
Renato César de Oliveira, foram abordados pela polícia militar e, em busca
pessoal e veicular, encontraram 1,7g de cocaína no bolso de Renato César
de Oliveira. Nada foi encontrado no interior do veículo, mas tão somente na
posse exclusiva de Renato César de Oliveira.

Daí já é facilmente possível verificar a completa ausência de


qualquer indício mínimo de autoria e materialidade do réu Alexandre de
Freitas tanto para o crime previsto no art. 28 quanto para o art. 33, ambos
previstos na Lei de nº 11.343/2006. Tanto é verdade que o réu Alexandre
de Freitas foi conduzido à delegacia como “outro envolvido”, apenas Renato
César de Oliveira foi conduzido como autor para investigação da prática de
tráfico ou de posse para consumo pessoal.

Ora, conclui-se, desse modo, que não havia indício mínimo


de autoria e materialidade delitiva para a apreensão e quebra do sigilo
telefônico de Alexandre de Freitas. A produção da referida prova é
totalmente nula, pois viola diretamente a constituição federal e deve ser
desentranhada dos autos, nos termos do art. 157 do Código de Processo
Penal:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do


processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em
violação a normas constitucionais ou legais.

A propósito, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça


é no sentido de que a quebra de sigilo telefônico sem autorização judicial é
prova ilícita, veja-se:

GSJ
PROCESSO PENAL. NULDADE. PROVA ILÍCITA. LAUDO
PERICIAL ELABORADO EM APARELHO CELULAR SEM
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. PESQUISA DE REGISTROS DE
CHAMADAS, CONTEÚDO DE AGENDA, MENSAGENS DE TEXTO
SMS, ETC. VIOLAÇÃO DO SIGILO DE DADOS. ART. 157 DO
CPP. 1. É inequivocamente nula a obtenção de dados
existentes em aparelhos de telefonia celular ou em outros
meios de armazenagem de dados, sem autorização judicial,
ressalvada, apenas, excepcionalmente, a colheita de prova
através do acesso imediato aos dados do aparelho celular, nos
casos em que a demora na obtenção de um mandado judicial
puder trazer prejuízos concretos à investigação ou
especialmente à vítima do delito. 2. É nulo o laudo pericial
elaborado por requisição direta da autoridade policial no curso
da investigação, sem autorização judicial, com obtenção de
registros pessoais, tais como, agendas, mensagens sms, etc,
em verdadeira devassa de dados provados. 3. Ordem
concedida para anular o acórdão da apelação e permitir que
outro seja proferido, uma vez retirado dos autos o laudo
pericial 57/2007. (Superior Tribunal e Justiça STJ – HABEAS
CORPUS: HC 388008 AP 2017/0028187-0). (Grifou-se).

Desse modo, o reconhecimento da violação inconstitucional à


garantia fundamental da inviolabilidade da intimidade, vida privada e
violação ao sigilo de dados, é medida que deve ser reconhecida em máximo
respeito ao Estado Democrático de Direito, pois um crime acontece num
determinado espaço e tempo.

No caso em apreço houve a realização de perícia técnica e


quebra de sigilo de dados telefônicos sem que houvesse indícios mínimos
de autoria e materialidade delitiva do réu Alexandre de Freitas. Oportuno
ressaltar, o réu Alexandre de Freitas não foi flagrado em posse de qualquer
substância ilícita.

Aliás, é manifesta a ausência de justa causa para o


exercício da ação penal instaurada para apurar a prática do delito de tráfico

GSJ
de drogas, por flagrante ausência de demonstração da materialidade do
fato, se nenhum entorpecente cuja posse ou propriedade é atribuída ao
paciente foi apreendido.

É o entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina


em julgado de caso análogo, veja-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO


ILÍCITO DE DROGAS. APREENSÃO DE SUBSTÂNCIAS
ENTORPECENTES. IMPRESCINDIBILIDADE. PROVA DA
MATERIALIDADE. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO. 1. "Nos termos da jurisprudência pacificada
desta Corte Superior, é imprescindível a apreensão da droga
para que a materialidade delitiva, quanto ao crime de tráfico
de drogas, possa ser aferida, ao menos, por laudo preliminar"
(AgRg no AREsp n. 1.341.356/SC, relator Ministro SEBASTIÃO
REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 5/5/2020, DJe
11/5/2020). 2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1655529/ES, Rel. Ministro ANTONIO
SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em
06/10/2020, DJe 13/10/2020). (Grifou-se).

Por fim, vale concluir que, se a colheita da prova pericial foi


irregular, toda a suposta autoria delitiva identificada por meio das
mensagens via aplicativo whatsapp está maculada, e consequentemente
todas as provas decorrentes estão contaminadas, devendo ocorrer o
trancamento da presente ação penal.

CAPÍTULO 03 – DOS PEDIDOS:

Diante de todo o exposto, requer Vossa Excelência receba a


presente Defesa Prévia, bem como requer:

GSJ
a) A rejeição da denúncia por falta de justa causa, nos termos
do art. 395, inc. III do Código de Processo Penal, tendo
em vista a nulidade da apreensão e quebra do sigilo
telefônico, e ausência de indícios mínimos de autoria e
materialidade;

b) Sejam todas as intimações sejam feitas de forma conjunta


em nome da sociedade de advogados MASUDA & FRANKEN
ADVOGADOS ASSOCIADOS OAB/SC 2696 - OAB/PR 7664
e das advogadas JULIANA FRANKEN OAB/ SC 42.833 e
MARI B. A. MASUDA FRANKEN OAB/SC 42.832, sob pena
de nulidade.

Nestes termos, pede deferimento.

Itapema, 21 de fevereiro de 2022.

MASUDA & FRANKEN ADVOGADOS ASSOCIADOS


OAB/PR 7664

MARI BEATRIZ ABREU MASUDA FRANKEN JULIANA FRANKEN


OAB/SC 042.832 OAB/SC 042.833

GSJ
ROL DE TESTEMUNHAS:

MICHELI TORRIANI, inscrita no PCF nº 005.251.139-16,


residente e domiciliada na Rua Domingos Omizzollo, Capinzal/SC, CEP:
89665-000;

MARCELO GUSTAVO TORRES, inscrito no CPF nº


718.765.021-34, residente e domiciliado na Rua 442, nº 1084, Morretes,
Itapema/SC, CEP: 88220-000;

ROSENI DE FREITAS, inscrita no CPF nº 637.514.029-34,


residente e domiciliada na Rua 442, nº 1191, Morretes, Itapema/SC, CEP:
88220-000;

GEMIR LUIZ MASCARELLO, inscrito no CPF nº 671.324.139-


53, residente e domiciliado na Rua Frei Constantino João Guzzo, nº 334,
Capinzal/SC;

VANDERLEI ALVES GARCIA, inscrito no CPF nº 743.939.369-


49, residente e domiciliado na Rua Maximo Toaldo, nº 1289, São Cristovão,
Capinzal/SC;

JUALIANA GRAZIELI SZEMANSQUI, inscrita no CPF nº


005.251.139-16, residente e domiciliada na Rua Domingos Omizzollo,
Capinzal/SC, CEP: 89665-000.

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