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HISTÓRIA DA TEOLOGIA
AULA 1

Prof. Roberto Luis Renner


CONVERSA INICIAL

Nesta aula, temos por objetivo apresentar temas relacionados aos cristãos do primeiro e

segundo século, ressaltando a importância do estudo da história da teologia. A história da teologia

auxiliará a esclarecer pontos que até então eram obscuros, nos conduzindo a reflexões sobre a vida

cotidiana dos cristãos, trazendo também reflexões sobre a natureza de Deus.

Outro ponto relevante é que nenhuma teologia nasce no vácuo. Dessa maneira, ela precisa de
alguma base que dê sustentação para ela. Em se tratando de uma teologia bíblica, ela se baseia em

três pilares. Cada um desses pilares tem sua relevância na construção da teologia. Os três pilares
sob os quais consolidamos nossa teologia são a bíblia, a tradição e a cosmovisão.

Finalizando nossa aula, estaremos discutindo sobre os pais apostólicos, que são os mais

antigos escritos cristãos remanescentes, à parte daqueles que agora fazem parte do cânon do Novo
Testamento. Eles receberam esse nome pois pensava-se que tinham conhecido os apóstolos. Em

alguns casos, isso aconteceu.

TEMA 1 – A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA HISTÓRIA

Estudar a história e seus diferentes aspectos contribui para que possamos compreender o que

ocorreu em um passado mais longínquo ou recente. O estudo da história contribui para “livrar-nos
não só da influência indevida de outros tempos, mas da influência indevida de nosso próprio tempo,

da tirania do ambiente e da pressão do ar que respiramos” (Lindberg, 2001, p. 16). Por essa razão,
não podemos negar a importância da história em nossas vidas, bem como para a humanidade.

Aquele que ignora a história fatalmente está preso aos dias de hoje, não consegue se distanciar um
pouco e ver como está sendo manipulado pelas situações que lhe são impostas no presente. Para

algumas pessoas, falar da história significa voltar ao passado de onde não existe nada de bom. Essa
análise é muito ingênua e equivocada, pois para esses o que importa é o presente. O conhecimento
da história é fundamental para a compreensão do presente.
Todo ser humano conhece algo da história e também tem sua própria história, que é chamada

de identidade histórica, como afirma Lindberg (2001).

A identidade histórica nos é transmitida através de nossas conversas com as mães e os pais que

nos precederam. [.…] Quando não conversamos mais com nossos pais e filhos começamos a
esquecer quem somos. Isso não quer dizer que a conversa entre gerações seja sempre agradável,

mas sim que ela é importante para aprender como chegamos onde estamos. Sem tal conversa
estamos condenados ao “presentismo”, que é um termo extravagante usado para descrever o

solipsismo[1] de uma contínua “geração do eu”. (Lindberg, 2001, p. 16)

Todos nós temos uma identidade histórica. Para alguns, essa está bem mais presente no seu
cotidiano do que outros, mas não podemos negá-la. As contribuições dos diálogos familiares que

ressaltam a identidade histórica levam as pessoas a não apenas compartilhar algo que aconteceu
com elas, mas ao ouvinte reconhecer que ele faz parte da história de alguém, além de contribuir para
a superação do seu individualismo, pensando que somente sua realidade é a que importa.

TEMA 2 – COMPREENDENDO A TEOLOGIA NA HISTÓRIA

Ao olharmos para história do mundo ou a nossa em particular, perceberemos a ação humana

em ação, ou seja, nos daremos conta de que aquele fato histórico está repleto das decisões e
desejos do homem. Entretanto, quando olhamos para a história da teologia cristã, algo mais está

presente do simplesmente o ser humano agindo. Conforme afirma Olson (2001), é a interação divina
na história do seu povo.

A história da teologia cristã é, segundo acredito, mais do que um a história humana. Ela faz parte
da história da interação de Deus com seu povo, o corpo de Cristo. Assim com o teólogo

contemporâneo Hans Küng, creio que Deus mantém a Igreja na verdade, mas não na evolução
tranquila da sua descoberta progressiva. Deus opera através de agentes hum anos cuja m ente e

coração são anuviados pelo pecado. Há períodos na história da Igreja e de sua teologia nos quais
perceber a mão de Deus m mantendo-a na verdade é puro ato de fé. Existem outro s períodos ou

capítulos da história que não exigem muita fé para perceber Deus operando na restauração da

verdade. (Olson, 2001, p. 21)

A apropriação do termo teologia pelo cristianismo ocorreu entre os séculos IV e V, destacando-

se como o entendimento do saber ou do conhecer as coisas acerca de Deus. Uma das tarefas dos
primeiros escritores cristãos era separar o Deus apresentado pelo cristianismo dos demais deuses,

pois o cristianismo desenvolveu-se em uma atmosfera politeísta, ou seja, uma compreensão de


vários deuses. Refletir sobre a história da teologia contribui para a compreensão do pensamento
cristão e como esse se desenvolveu, pois, para Gonçalvez (2004, p. 13), “a história do pensamento

cristão é o registro da luta do homem com as implicações da auto revelação de Deus no homem

Cristo Jesus”. Estudar a história do pensamento cristão é ir a busca do entendimento daquilo que foi

registrado sobre a revelação de Deus na pessoa de Jesus Cristo.

É essencial compreender como os fatos históricos ocorreram e quais as suas consequências

para aqueles que vivenciaram o ocorrido, bem como para nós, que olhamos para a história como

alguém olha pelo retrovisor. O início da história da teologia cristã ocorreu logo que o cristianismo foi
se desenvolvendo e ocupando seus espaços. “A história da teologia cristã começa no século II, cerca

de 100 anos depois da morte e ressurreição de Cristo, com o início da confusão entre os cristãos no

Império Romano, tanto dentro quanto fora da Igreja” (Olson, 2001, p. 21). O cristianismo surgiu num

contexto histórico bem complexo, pois por um lado estava atrelado à cultura judaica, e por outro ao
império romano, que subjugava os judeus e os primeiros cristãos. O cristianismo surge dentro um

turbilhão de questões sociais e políticas.

Com o passar dos anos, o cristianismo começou a ter um papel importante não somente na
vida dos seus seguidores, mas na sociedade como um todo.

Um episódio importante na história da teologia cristã é a transformação da religião cristã de uma

seita relativamente, desunida, […] praticamente clandestina do Império Romano, em uma instituição
altamente organizada, hierárquica e visível que, no fim do século III, era um objeto que já fazia parte

da paisagem do império. (Olson, 2001, p. 21)

Essa transformação da religião cristã produziu um impacto grande na sociedade da época. O

cristianismo logo se tornaria a religião oficial do império. Essa transformação ocorreu no século III,

ou seja, não foi algo tão rápido. Outro aspecto importante é o fato de que até o cristianismo ser a

religião oficial do império, muitos cristãos foram perseguidos e mortos.

Com o cristianismo tendo o apoio do Estado, houve o surgimento dos mosteiros, que no início

se preocupavam com assuntos práticos, como oração e espiritualidade. Porém, com o passar dos

anos, os assuntos teológicos eram debatidos e estudados nos mosteiros. Juntamente com os
mosteiros, as universidades foram surgindo. Com as universidades, o estudo da fé cristã foi levado

através dos séculos a ser vista como uma área teórica ao invés de prática. No século XIII, alguns

teólogos estavam preocupados com a negligência do aspecto prático da fé. Com o Iluminismo[2]no
século XVIII, questionou-se o lugar da teologia na universidade, já que se achava que o saber deveria

ser buscado sem qualquer autoridade externa. A teologia era vista com suspeita, já que era

considerada baseada em “artigos da fé”.

Ao se debruçar sobre a história da teologia cristã, o estudioso irá se envolver em questões

pertinentes a natureza divina e a salvação humana.

Ler e compreender a história da teologia cristã requer a consciência prévia de que os cristãos das

eras passadas que se debatiam com as questões doutrinárias realmente se preocupavam em crer
as coisas certas a respeito de Deus. Este era o caso não somente dos bispos e teólogos

profissionais, mas também dos leigos dentro das igrejas. (Olson, 2011, p. 16)

É importante que aquele que se debruça para estudar a história da teologia ter consciência do

esforço e dedicação de muitos bispos, teólogos profissionais e também dos leigos, que lutaram para
que questões doutrinárias realmente fossem observadas e entendidas de maneira correta.

TEMA 3 – A TEOLOGIA: DEFINIÇÕES E EXPLICAÇÕES

A palavra teologia é composta por dois termos. O primeiro é theos, que é compreendido como

“divindade”. O segundo termo é logos e tem o significado de “palavra”. Com isso, podemos

compreender, no sentido literal, o estudo sistemático acerca da divindade e seus atributos. Assim,

estudar a teologia é se debruçar sobre aspectos ligados divindade.

Ter a compreensão da teologia e de sua relevância para a vida particular de cada cristão, bem

como do coletivo, é importante, pois contribuirá para a resposta do cotidiano.

A teologia não é, como muitos presumem injustamente, uma espécie de conhecimento esotérico
acessível apenas a uns poucos intelectuais superiores. É simplesmente fé em busca de

entendimento. E, se cristãos comuns buscam respostas a perguntas que naturalmente brotam da

fé, já estão fazendo teologia. (Grenz; Olson, 2001, p. 27)

A teologia não é privilégio de uma classe de intelectuais, somente daqueles que se debruçam

horas e horas sobre os livros, mas ela é também, como afirmam Grenz e Olson (2001), fruto das
reflexões que buscam respostas para as questões simples ou complexas do cotidiano.

Conforme afirma Olson (2001), “a teologia nasceu à medida que os herdeiros dos apóstolos

começaram a refletir sobre os ensinamentos de Jesus e deles a fim de explicá-los em novos


contexto e situações e resolver controvérsias quanto à crença e conduta cristã” (Olson, 2001, p. 24).

Os “herdeiros dos apóstolos”, ou seja, aqueles que receberem ensinamentos de maneira direta ou
indireta dos apóstolos, precisam refletir a respeito dos ensinamentos que receberam para que

pudessem transmitir a outros de maneira clara e contextualizada.

TEMA 4 – ASPECTOS RELEVANTES NOS QUAIS A TEOLOGIA É


BASEADA

Nenhuma teologia nasce no vácuo. Ela precisa de alguma base que lhe dê sustentação. Em se

tratando de uma teologia bíblica, ela se baseia em três pilares. Cada um desses pilares tem sua

relevância na construção da teologia. Cada grupo religioso ou indivíduo considera um desses pilares
mais importante do que o outro. Os três pilares sob os quais consolidamos nossa teologia são a

bíblia, a tradição e a cosmovisão.

4.1 A BÍBLIA: PILAR SOBRE O QUAL A TEOLOGIA SE APOIA

A teologia precisa basear-se sobre a escritura, pois através das escrituras que a teologia vai se

apoiando. No início do cristianismo, o cânon bíblico como o conhecemos não estava fechado ainda.

Entretanto, os primeiros cristãos tinham os ensinamentos de Cristo e também dos apóstolos. Nos

dias atuais, a Bíblia deve servir sim como ponto de partida da teologia contemporânea.

No que diz respeito à Bíblia ser a fonte primária da teologia, é necessário definir os seus

métodos de interpretação. A hermenêutica, que estuda a teoria da interpretação, deve ser aplicada

de maneira correta. Deve ser observado sempre o contexto em que o texto foi escrito, bem como a

intencionalidade do autor. Nos dias atuais, algumas teologias têm surgido mais em conformidade

com a desejo daqueles que a criam do que com a real e correta interpretação das escrituras.

Com respeito ao uso das escrituras, com o primeiro pilar da teologia é importante que se defina

como será lidado com as aparentes contradições. Quando olhamos para os textos sagrados

aparentemente no primeiro olhar existe alguns pontos que são controversos. Outro aspecto

importante é o fato de saber lidar com o divino e humano no que diz respeito às escrituras. Ela foi
escrita por homens sobre a inspiração divina para nos ensinar preceitos e valores divinos.

4.2 A TRADIÇÃO: PASSAR ADIANTE


Toda vez que passamos a palavra adiante, ou seja, quando repassamos para alguém um valor

uma ideia que nossos pais nos passaram, a tradição entre em ação. A tradição é a continuidade ou a

permanência de uma ideia de um costume e princípios de uma pessoa ou de um coletivo. “É

impossível para qualquer grupo, por mais informal que seja, existir por um período de tempo sem a

tradição, tampouco isso seria aconselhável” (Lane, 2000, p. 11).

Antes de termos a Bíblia escrita, ela era passada adiante somente pela tradição. O apóstolo

Paulo disse para Timóteo que deveria passar adiante a palavra que recebeu. Na Idade Média, a

tradição passou a ser usada como meio de justificar crenças que não se encontravam na Bíblia.

Entretanto, os reformadores já tinham o entendimento de que a tradição precisava estar em


conformidade com as escrituras. A tradição não poderia estar em pé de igualdade com a Bíblia. Os

reformadores não desconsideravam a tradição, mas insistiam que fosse provada pela Bíblia. Os

católicos, no entanto, colocaram a tradição em pé de igualdade com a Bíblia, o que causou muitas

diferenças com os Protestantes (Lane, 2000, p. 11).

Nos dias atuais, a Igreja está impregnada de tradições, ou seja, qualquer grupo tem suas

tradições e as valoriza. Não há mal nenhum em seguirmos algumas tradições, entretanto, o perigo é

quando elas sobrepõem as escrituras — o que precisamos cuidar para não nos tornarmos escravos

de nossas tradições. Em muitos casos, as tradições nos sãos passadas como verdades absolutas, e

muitas vezes passamos essas para outras pessoas sem questionar mais aquilo que nos passam.

4.3 A COSMOVISÃO: A MANEIRA DE PENSAR DO MUNDO

Somos influenciados pelo mundo e de sua maneira de ver as coisas. A cosmovisão nos fornece

a base de nossos pensamentos sobre a qual construímos nossa teologia. Quando falamos em

cosmovisão, logo entendemos que é a maneira que temos em perceber o mundo. A visão de mundo
que temos hoje geralmente não é a mesma que nos foi passada alguns anos atrás. O que

precisamos cuidar é para não sermos engolidos pela visão de mundo que nos passam.

A nossa visão de mundo que nos foi passada, muitas vezes tende a controlar nossa maneira de
interpretar a Bíblia. O importante é estarmos conscientes disso para podermos lutar contra essa

tendência que sempre que sobrepor. A teologia ajuda a Igreja em cada geração (que está inserida

em um contexto cultural) a refletir sobre e aplicar a fé que está presente na Igreja para o mundo

(Grenz; Olson, 1992, p. 9).


Sobre os três pilares, a Bíblia, a tradição e a cosmovisão, cada um de nós forma nossa própria

teologia. Por essa razão, precisamos ter o cuidado para que nem as tradições ou a cosmovisão

venham a ocupar o lugar central de nossa teologia. A centralidade de nossa teologia deve estar na

correta interpretação das escrituras.

TEMA 5 – OS PAIS APOSTÓLICOS

Com a morte do último apóstolo, João, termina a era apostólica. Os pais apostólicos foram os

mais antigos escritores cristãos fora do Novo Testamento, conforme afirma Gonzales (2004, p. 61).

Os mais antigos escritos cristãos remanescentes, à parte daqueles que agora fazem parte do

cânon do Novo Testamento, são os escritos dos assim chamados pais apostólicos. Eles

receberam esse nome, “[…] porque, na ocasião, acreditava-se que eles tinham conhecido os
apóstolos. Em alguns casos, isso parece realmente possível, enquanto que em outros foi um mero

produto de imaginação”. (Gonzales, 2004, p. 61)

Os pais apostólicos escreveram cartas e livros com o objetivo da edificação da Igreja, sendo que
eles viveram entre o primeiro e segundo século.

O primeiro grupo de pais da Igreja que começaram a responder aos hereges foi o dos pais

apostólicos. Alguns chegaram a conhecer pessoalmente os apóstolos. Outros eram simplesmente

contemporâneos deles. Eles formaram elos importantes com os apóstolos no período de transição
do fim do século I e início do século II, quando os cristãos ficaram sem os apóstolos e ainda sem o

retorno de Cristo. (Olson, 2001, p. 34)

Os pais apostólicos tiveram uma grande importância para o cristianismo, pois muitas heresias
foram surgindo. Essas heresias surgiram de dentro da própria Igreja para fora dela. E através dos

escritos dos pais apostólicos, os cristãos da Igreja primitiva tinhas as orientações necessárias para

se manterem no evangelho. Segundo Gonzales (2004, p; 61), “a natureza literária desses escritos não

é uniforme. Entre eles, existem várias epístolas, um tipo de manual de disciplina, um tratado

exegético e teológico, uma coleção de visões e profecias e uma defesa do Cristianismo”.

Atualmente, são considerados oito os escritos dos pais apostólicos Clemente de Roma, Didaquê,

Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna, Pápias de Hierápolis, a epístola de Barnabé, o Pastor de


Hermas, e a epístola a Diogneto.

Temos por pretensão de mostrar a vida e a obra de quatro desses importantes personagens da

Igreja cristã em seu início: Clemente de Roma, Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna e Pastor de
Hermas. São personagens que influenciaram o cristianismo nos primeiros séculos de sua existência.

5.1 CLEMENTE DE ROMA (30-100 D.C.)

Sobre a juventude de Clemente, pouco se conhece. Entretanto, ele foi colaborador de Paulo,

sendo que Filipenses 4: 3 menciona: “E a você, meu fiel companheiro de trabalho, peço que ajude

essas duas irmãs. Pois elas, junto com Clemente e todos os outros meus companheiros,
trabalharam muito para espalhar o evangelho. Os nomes deles estão no Livro da Vida, que pertence

a Deus”. Podemos compreender que ele tinha um relacionamento bem próximo com o apóstolo

Paulo. Ele foi um líder bastante dedicado na Igreja cristã que estava em Roma. Para Olson (2001, p.

41), “Clemente foi bispo de Roma, superintendente das Igrejas nas casas de Roma na última década

do século I”. Além de cuidar da Igreja em Roma, ele se posicionou de maneira firme, escrevendo uma

carta para a Igreja de Corinto, que estava enfrentando um problema. O conteúdo dessa carta é muito

semelhante às cartas do apóstolo Paulo.

Sua carta escrita da Igreja em Roma para a Igreja cm Corinto, que é comumente chamada 1

Clemente (para distingui-la da Segunda epístola de Clemente), é provavelmente o primeiro


documento cristão escrito que foi preservado, fora o que hoje chamamos de NT. Ela foi escrita por

volta do ano de 95. (Olson, 2001, p. 41)

Clemente, nessa carta, teve uma posição bem firme para com a Igreja de Corinto. Havia na

ocasião discórdia entre aqueles irmãos. Conforme afirma Gonzalez (2004, p. 63), “novamente os

cristãos daquela cidade estão divididos, e alguns deles tinham assumido uma atitude de rebeldia”, e

Clemente escreve que esses deveriam obedecer ao bispo, sendo sua postura mais enfática do que a

de Paulo. De acordo com Olson (2001, p. 42), “enquanto Paulo tinha dado ênfase para sua união num
só Espírito e num só batismo mediante a fé em Cristo, Clemente ordenou que obedecessem ao bispo

que Deus nomeara com o seu superior”. A atitude de Clemente diante da postura de rebeldia de

algumas pessoas da Igreja de Corinto para com seu líder foi de que esses respeitassem a liderança

que Deus havia colocado naquele local.

5.2 INÁCIO DE ANTIOQUIA

Existe uma certa dúvida com respeito à data de nascimento de Inácio. Ele

foi bispo dos cristãos em Antioquia, uma cidade muito importante do Império Romano na Síria,
além de ser um a cidade importantíssima para os cristãos. Foi ali que receberam, pela primeira vez,
o nome de cristãos e foi a partir dali que Paulo iniciou as primeiras viagens missionárias. (Olson,

2001, p. 45)

Inácio foi “condenado a morrer na capital imperial, provavelmente devorado por feras. Enquanto

era levado à capital como prisioneiro pelos soldados romanos, escreveu as sete epístolas que

sobreviveram” (Gonzalez, 2004, p. 63). Olson (2001, p. 45) cita que ele escreveu cartas aos cristão
em Éfeso, Magnésia, Trália, Roma, Filadélfia e Esmirna, […] uma carta a Policarpo.

Inácio enfatiza fortemente a encarnação de Jesus diante das ideias gnósticas de que Jesus

somente parecia humano. Ele não procura explicar como Jesus pode ser Deus e homem ao mesmo
tempo mas ensina isso. Ele aborda a cristologia de acordo com a tendência de seus dias. Contra o

docetismo, vai afirmar que Jesus é verdadeiro homem. Inácio também enfatizou a cristologia do

martírio. Ele antevê o seu martírio diante das feras como o momento aonde vai se tornar verdadeiro

discípulo de Jesus. Essa teologia do martírio vai se tornar muito forte nos séculos II e III, mas o

ponto mais importante de Inácio é sua descrição de Jesus como Deus (Hurtado, 1997, p. 182).

Inácio está lindando com alguns problemas de sua época, que estavam intimamente ligados na

pessoa de Jesus Cristo. Conforme afirma Gonçalvez (2004, p. 73),“por um lado, havia alguns que

negavam a vida física de Jesus Cristo e se abstinham de participar da comunhão . […] tais pessoas

pensavam em Jesus como um ser celestial, sem nenhum contato com as situações concretas da

vida humana”. Entretanto, havia um segundo grupo de pessoas que tinham uma outra tendência:

“havia algumas tendências judaizantes que transformavam Cristo em um mero mestre nos moldes
do Judaísmo” (Gonçalvez, 2004, p. 73).

5.3 POLICARPO DE ESMIRNA (69-155 D.C.)

Policarpo de Esmirna nasceu no ano 69 d.C. na cidade Esmirna, na Turquia. Morreu em 155 d.C.

na mesma cidade, como afirma Olson (2001, p. 47): “Policarpo morreu de modo semelhante a Inácio

na cidade de Esmirna, por volta de 155”. Foi instituído bispo da Ásia pelos apóstolos, na Igreja de

Esmirna. Ele escreveu uma carta ais cristão em Filipos. É conhecida por carta de Policarpo aos

filipenses, entretanto, o escrito de Policarmo “não alcança a profundidade do quarto evangelho, nem

a de Inácio, mas os segue em sua ênfase na realidade da humanidade de Cristo, que ele coloca no

centro de sua doutrina da salvação” (Gonçalvez, 2004, p. 80).


Quando Inácio de Antioquia escreve uma das suas cartas, esta endereçada a um amigo mais

jovem, uma pessoa que ele tinha um grande apreço e que tomemos considerar seu discípulo.

Inácio escreveu às Igrejas a maioria das suas cartas, mas uma foi dirigida ao seu colega mais

jovem, Policarpo de Esmirna. Aconselhou a Policarpo: “Se você amar bons discípulos, não é crédito
para você; pelo contrário, com mansidão, leve os mais problemáticos à submissão”. (Olson, 2001,

p. 47)

Inácio aconselhou o jovem Policarpo a ter uma postura de amor com seus discípulos, aspecto
esse de muita relevância do que diz respeito à relação que o mestre deve ter com seus discípulos;

uma postura de amor, e não de indiferença. Policarpo não tinha uma profundeza teológica como os

autores dos evangelhos e nem como Inácio de Antioquia, mas foi um personagem que teve seu

destaque na história da Igreja primitiva. Esse reconhecimento de suas contribuições o levaram a ser

considerado um dos pais apostólicos da Igreja.

5.4 PASTOR DE HERMAS

Para Olson (2001, p; 48), “o último pai apostólico a ser considerado aqui é um documento
chamado o pastor de Hermas, cujo autor pode ter sido irmão de Pio, o bispo de Roma por volta de

140 a 145”. O nome e a data do escritor desse documento ainda têm surtido muitas dúvidas sobre
quem foi esse personagem importante na história da Igreja primitiva. O autor ainda cita que “Hermas

é especialmente importante em nossa história porque, de todos os escritos cristãos que estiveram a
ponto de entrar para o NT, mas não entraram, enquanto o cânon das Escrituras estava sendo

determinado, este foi o que mais se aproximou” (Olson, 2001, p. 48).

A influência que pastor de Hermes teve na Igreja primitiva foi grande, já que “exerceu muita

influência sobre os cristãos subapostólicos em várias partes do Império Romano, porém, é


praticamente desconhecido pela maioria dos cristãos atualmente” (Olson, 2001, p. 49). Essa

influência pode ser percebida, pois a aceitação de seus escritos na Igreja do primeiro e segundo
século foi grande.

O entendimento de Hermes sobre a pessoa de Jesus Cristo é que “se refere ao salvador como o
‘Filho de Deus, e o identifica com o Espírito Santo. O Espírito Santo preexistente habita no salvador, e

o último obedeceu de tal modo a vontade divina que foi feito coparticipante do Espírito Santo”
(Gonçalvez, 2004, p. 87). O entendimento de Hermes é que “o cristianismo é, antes de tudo, uma
série de preceitos que devem ser seguidos” (Gonçalvez, 2004, p. 87). Preceitos esses que são
estabelecidos como proibições ou a descrição de algo que podemos fazer ou deixar de fazer. Está

mais atrelado a um conjunto de ordens do que um relacionamento pessoal com Deus. A contribuição
literária do pastor de Hermes é algo muito relevante para o cristianismo.

A obra mais extensa no corpo de literatura reunida sob o título de “pais apostólicos” é o Pastor de

Hermas, que provavelmente viveu por volta do final 1º do século primeiro e a primeira metade do
segundo, e cuja obra consiste numa coletânea de materiais produzidos em diferentes estágios

durante sua carreira como profeta na Igreja Romana. Sua principal preocupação parece ter sido a
falta de zelo e dedicação de alguns crentes e especialmente o problema que se apresentava na

forma dos pecados pós batismais, isto é, os pecados cometidos após a conversão e batismo.

(Gonçalvez, 2004, p. 85)

A preocupação maior de acordo com o autor supracitado é a falta de zelo e dedicação dos

cristãos. Por ele ser uma pessoa muito zelosa e piedosa, essa era um aspecto bem presente em
seus escritos, já que o cristianismo era um conjunto de preceitos, como já mencionamos

anteriormente.

5.5 DIDAQUÊ

A palavra grega didache significa “doutrina”. No caso de Didaquê, essa doutrina é compreendida

como um documento, um escrito que faz parte dos pais apostólicos. Foi descoberto “em Istambul
em 1875. Ao lado deste texto grego, há fragmentos de traduções em latim, árabe, cóptico, geórgico e
siríaco” (Gonçalvez, 2004, p. 67). É, sem dúvida, uma das mais importantes descobertas literárias

dos tempos modernos. A importância desse documento para Igreja é um achado muito relevante.

O Didaquê teve seu papel importante na Igreja primitiva, sendo que foi escrito no fim do século
1º, contendo importantes ensinamento para Igreja.

O Didaquê, por exemplo, é um documento descrito como um dos pais apostólicos porque, embora

o autor seja desconhecido, contém características da vida e do pensamento cristão do início do

período pós-apostólico e foi preservado pelas Igrejas por sua idade e relevância na instrução das
Igrejas quando já não havia mais apóstolos. (Olson, 2001, p. 40)

O Didaquê é também conhecido por o ensino dos 12 apóstolos. O autor desse documento é

desconhecido. O objetivo do escrito desse era com “o intuito de reforçar a moralidade cristã e instruir
os cristãos a respeito de como tratar os profetas que os procurassem alegando falar em nome do
Senhor” (Olson, 2001, p. 40). Essa característica moralista dos pais apostólicos também está bem
presente no Didaquê.

Conforme Gonçalvez (2004, p. 87-70), a divisão da Didaquê segue a seguinte sequência:


dezesseis capítulos, os quais podem ser divididos em três seções principais. A primeira dessas

seções (1: 1-6.2) geralmente é chamada de Documento dos Dois Caminhos. Nessa parte, são
apresentados dois caminhos: o da vida e o da morte. A segunda parte (6: 3-10.7) contém uma série

de instruções litúrgicas. Um ponto importante nessa parte a ser destacado é o batismo. São dadas
algumas orientações como deve ser realizado o batismo. A terceira parte da Didaquê (capítulos 11-

15) é um tipo de manual de disciplina: assuntos relacionados aos falsos profetas e como a Igreja
deve lidar com isso.

NA PRÁTICA

Algumas pessoas se preocupam somente com as questões do seu cotidiano, não dando o
devido valor para as diferentes questões históricas que fazem parte de sua vida, nem de questões

históricas que marcaram a humanidade e o cristianismo em si. Dessa maneira, surgem alguns
questionamentos. Será que realmente é relevante o estudo da história da teologia? Quais seriam
algumas contribuições que a Igreja contemporânea poderá desfrutar com um estudo da história da

teologia?

FINALIZANDO

É importante que ao estudarmos a teologia, precisamos ter a consciência que ela teve um
passado marcante até que chegasse aos nossos dias. Aqueles que em um passado mais distante
ou não tiveram suas contribuições para que hoje tenhamos condições de compreender as escrituras

com uma visão mais apurada e madura.

Compreender que a teologia não é algo somente dos nossos dias, mas que tem uma história e
várias pessoas como os pais apostólicos deram suas vidas para que a teologia ficasse centrada nos
princípios repassados por Jesus e os apóstolos. Os escritos e ensinamentos dos pais apostólicos

marcaram a história da teologia nos primeiros séculos do cristianismo.


É importante refletirmos sobre quais sãos as contribuições que o estudo da história da teologia
traz para o curso de teologia? Sabemos que o estudo da história da teologia é importante para a

formação pessoal de cada um de nós.

REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

GONZÁLEZ, J. L. Uma história do pensamento cristão. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. v. 1.

GRENZ, S. J.; OLSON, R. E. 20th century theology. God & the world in a transitional age. Downers
Grove, Ill.: InterVarsity, 1992.

HURTADO, L. W. Christology. In: MARTIN, R. P.; DAVIDS, P. H. (Ed.) Dictionary of the later New
Testament & its developments. Downers Grove, Ill.: InterVarsity, 1997, p. 170-184.

LINDBERG, C. As reformas na Europa. São Leopoldo: Sinodal, 2001.

OLSON, R. História da teologia cristã: 2.000 anos de tração e reformas. 4. ed. Tradução de
Gordon Chown. São Paulo: Vida, 2001.

SHELLEY, B. L. História do Cristianismo: ao alcance de todos. Tradução de Vivian Nunes do


Amaral. São Paulo: Shedd, 2004

TILLICH, P. História do pensamento cristão. Tradução de Jaci Maraschin. São Paulo: Aste, 2000.

[1] Tese de que só eu existo e de que todos os outros entes (homens e coisas) são apenas

ideias minhas. Os termos mais antigos para indicar essa tese são egoísmo […]. O egoísmo

metafísico ou o egoísmo teórico (Abbagnano, 2007, p. 1086).

[2] Linha filosófica caracterizada pelo empenho em estender a razão como crítica e guia a todos

os campos da experiência humana (Abbagnano,2007, p. 618).

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