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OS QUATRO HUMORES

1. Introdução

A Teoria Humoral ou Teoria dos Quatro Humores constituiu o principal corpo de


explicação racional da saúde e da doença entre o Século IV a.C. e o Século XVII.
Também conhecida por teoria humoral hipocrática ou galênica. Segue as teorias
segundo as quais a vida era mantida pelo equilíbrio entre quatro humores: sangue,
Fleuma, Bílis Amarela e Bílis Negra, procedentes, respectivamente, do coração,
cérebro, fígado e baço.

Cada um destes humores teria diferentes qualidades: o sangue era quente e úmido,
a fleuma era fria e úmida, a bílis quente e seca, e a bílis negra fria e seca. Segundo
o predomínio natural de um destes humores na constituição dos indivíduos,
teríamos os diferentes tipos fisiológicos: o sanguíneo, o fleumático, o bilioso ou
colérico e o melancólico. A doença seria devida a um desequilíbrio entre os
humores, tendo como causa principal as alterações devidas aos alimentos, os quais,
ao serem assimilados pelo organismo, davam origem aos quatro humores.

Entre os alimentos, Hipócrates incluía a água e o ar. A febre seria devida à reação
do corpo para cozer os humores em excesso. O papel da terapêutica seria ajudar a
physis a seguir os seus mecanismos normais, ajudando a expulsar o humor em
excesso ou contrariando as suas qualidades.

2. Simbologia

Desde a Antiguidade e em várias civilizações, o número quatro tem um simbolismo


especial: o da plenitude, da totalidade, da abrangência, da universalidade.
Expressa, em simultâneo, o concreto, o visível, o aparente, o criado, ao contrário do
número três, que espelha o transcendental, o espiritual, o abstrato, o divino.

O cruzamento de um meridiano com um paralelo divide à Terra em quatro partes.


Por isso encontramos na história referências aos quatro mares, quatro reinos,
quatro ventos, quatro partes do mundo. Quatro são os pontos cardiais: norte, sul,
leste, oeste; (que por acaso as casas angulares são análogas ao simbolismo
cardinal, pois mostram mais ação na vida da pessoa) quatro são as estações do
ano: verão, outono, inverno, primavera; quatro são as fases da lua: cheia,
minguante, nova e crescente; quatro são as fases da vida: infância, juventude,
maturidade e velhice, aos quatro gigantes da alma: o medo, a ira, o amor e o dever.

É natural, portanto, que os filósofos gregos da escola pitagórica tenham imaginado o


universo formado por quatro elementos: terra, ar, fogo e água, dotados de quatro
qualidades, opostas aos pares: quente e frio, seco e úmido. A transposição da
estrutura quaternária universal para o campo da biologia deu origem à concepção
dos quatro humores do corpo humano.

3. Os humores

O conceito de humor (khymós, em grego), na escola hipocrática, era de uma


substância existente no organismo, necessária à manutenção da vida e da saúde.
Inicialmente, em número indeterminado de humores. Posteriormente, verifica-se a
tendência de simplificação, reduzindo-se o número de humores para quatro, com
seu simbolismo totalizador: o sangue, a fleuma, a bile amarela e a bile negra.

O corpo do homem contém sangue, fleuma, bile amarela e bile negra – esta é a
natureza do corpo, através da qual adoece e tem saúde. Tem saúde, precisamente,
quando estes humores são harmônicos em proporção, em propriedade e em
quantidade, e sobretudo quando são misturados. O homem adoece quando há falta
ou excesso de um desses humores. Admite-se que a crença na existência de uma
bile negra tenha sido fruto da observação clínica nos casos de hematêmese, melena
e hemoglobinúria.

Segundo a doutrina dos quatro humores, o sangue é armazenado no fígado e


levado ao coração, onde se aquece, sendo considerado quente e úmido; a fleuma,
que compreende todas as secreções mucosas, provém do cérebro e é fria e úmida
por natureza; a bile amarela é secretada pelo fígado e é quente e seca, enquanto a
bile negra é produzida no baço e no estômago e é de natureza fria e seca.
O número quatro está presente no macro e no microcosmo. A doutrina dos quatro
humores encaixava-se perfeitamente na concepção filosófica da estrutura do
universo. Estabeleceu-se uma correspondência entre os quatro humores com os
quatro elementos (terra, ar, fogo e água), com às quatro qualidades (frio, quente,
seco e úmido) e com às quatro estações do ano (inverno, primavera, verão e
outono). Terra outono, ar primavera, Bile Amarela Colérico, Melancólico Bile Negra,
Sangue Sanguíneo, Fleuma Fleumático, fogo verão quente seco, água inverno
úmido frio.

4. A saúde e os humores

O estado de saúde dependeria da exata proporção e da perfeita mistura dos quatro


humores, que poderiam alterar-se por ação de causas externas ou internas. O
excesso ou deficiência de qualquer dos humores, assim como o seu isolamento ou
miscigenação inadequada, causariam as doenças com o seu cortejo sintomático.

Segundo a concepção hipocrática da patologia humoral, quando uma pessoa se


encontra enferma, há uma tendência natural para a cura; a natureza (Physis)
encontra meios de corrigir a desarmonia dos humores (discrasia), restaurando o
estado anterior de harmonia (eucrasia).

Este processo se realiza em três etapas nas doenças agudas: apepsia, pepsia
(cocção) e crisis. A crisis tem tendência a ocorrer em dias certos, o que levou
Hipócrates a estudar os dias críticos de várias enfermidades.

Os médicos medievais usavam astrologia horária, faziam (horária médica) para ver
qual desequilíbrio no humor havia. A recuperação do enfermo acompanha-se da
eliminação do humor excedente ou alterado. O médico pode auxiliar as forças
curativas da natureza, retirando do corpo o humor em excesso ou defeituoso, de
modo a restaurar o equilíbrio. Com esta finalidade, surgiram os quatro principais
métodos terapêuticos: sangria, purgativos, eméticos e clisteres.

Galeno, no século ii d.C., com o prestígio de sua autoridade, revitalizou a doutrina


humoral e ressaltou a importância dos quatro temperamentos, conforme o
predomínio de um dos quatro humores: sanguíneo, fleumático, colérico (de cholé,
bile), melancólico (de melános, negro + cholé, bile). Colérico, portanto, é aquele que
tem mais bile amarela, e melancólico, o que tem mais bile negra.

Transfere-se, desse modo, para o comportamento das pessoas, a noção de


equilíbrio e harmonia dos humores. As expressões “bom humor”, “mau humor”,
“bem-humorado”, “mal-humorado” são reminiscências dos conceitos de eucrasia e
discrasia.

5. Os Alimentos e Temperamentos

As doenças são causadas por desequilíbrios nos temperamentos, o excesso de um


temperamento causa as doenças ligadas a ele. É comum as pessoas gostarem de
alimentos com a mesma natureza de seu temperamento, mas isso é ruim porque
piora o excesso desse temperamento e o desequilíbrio dele.

Uma das formas de amenizar esse problema é comendo alimentos de


temperamento oposto daquele que está em excesso no corpo. Coléricos devem
comer alimentos frios e úmidos (fleumáticos), sanguíneos devem comer alimentos
frios e secos (melancólicos), melancólicos alimentos úmidos e quentes
(sanguíneos), fleumáticos alimentos quentes e secos (coléricos). Nos tópicos a
seguir, estão listados os principais alimentos de cada temperamento.

5.1 Alimentos frios e secos

São os associados à terra, ao humor melancólico. O raciocínio básico: alimentos


duros, escuros, pesados, ou de sabor adstringente, digestão lenta, azedos/amargos,
associados a Saturno e Mercúrio.

Então, carne de vaca, lentilha, raízes de forma geral (aipim e derivados,


principalmente; mas as batatas todas são frias, algumas mais secas, algumas mais
úmidas), centeio; alimentos azedos/amargos como tamarindo, vinagre, azeitona
verde, maçãs (e peras) azedas, limão e laranja (principalmente, como disse antes, o
suco), alcaparras (conservas em vinagre de forma geral); vegetais duros, caulosos,
e/ou escuros, como brócolis, couve-flor, chicória, endívia; bebidas amargas em geral
(as alcóolicas tendem a ser quentes, porque são fortes e destiladas). O preparo
mais "melancólico" que existe é... servir o alimento cru.

5.2 Alimentos quentes e secos

Alimentos que aumentam o fogo, ou a cólera, e diminuem a água ou fleuma. Eles


são os mais fáceis de perceber. São os alimentos que queimam ou esquentam; os
que tem associação óbvia com Marte ou o Sol.

Dos modos de preparar alimentos, o que esquenta e seca é fritar e/ou grelhar (e
qualquer método que seja passar no fogo de forma geral, como em maçaricos). É
mais difícil termos alimentos principais que sejam quentes e secos: temos o bacon,
peixes salgados como o bacalhau, carne de sol, carneiro e bode, aspargos,
chocolate puro, azeitonas pretas, rabanete, rábano picante, algumas frutas secas
(como tâmaras secas), pistaches, alcachofras, milho.

Por outro lado, a maior parte dos temperos e especiarias é quente e seca: pimenta,
pimentões, alho, cebola, raiz-forte, gengibre, curry, canela, páprica, sal
(especialmente o marinho), mostarda, noz-moscada, salsinha, orégano,
anis-estrelado, coentro, sal, cebolinha, alho-poró, funcho (essas coisas têm níveis -
o orégano e o coentro estão no topo da lista, abaixo só de algumas pimentas, o
alho-poró e a cebola estão mais abaixo, etc).

Das formas de adoçar, o açúcar mascavo e o mel. Das bebidas, vinho tinto (seco,
claro) e bebidas destiladas de forma geral - o álcool em si é obviamente quente e
seco.

5.3 Alimentos Quentes e Úmidos

São os associados ao ar, ao humor sanguíneo, a Júpiter. O raciocínio básico é: são


alimentos macios, ou que aumentem as formas, ou que nutram e curem. Assim,
todas as gorduras são quentes e úmidas: manteiga, azeite, óleos em geral (embora
alguns tenham outras assinaturas - óleo de girassol é seco, óleo de coco frio e
úmido. E FRITAR em óleo é quente e úmido), a gema do ovo. Frutas de árvores que
deem frutas em abundância, com gosto doce e leve: figos, uvas (e uvas-passas),
cerejas, romã.

Alimentos bons para o sangue, como a beterraba. A cenoura, o nabo. Manjericão é


um tempero quente e úmido. Fígado; carnes de aves (pato, galinha, ganso), ovelha,
coelho, camarão, frutos-do-mar, truta.

Massas e derivados de trigo em geral, incluindo o pão; requeijão, queijos moles e


novos. Bebidas: cervejas e vinho branco. Alimentos cozidos - principalmente em
pouco cozimento - tendem a ficar mais quentes e úmidos.

5.4 Alimentos frios e úmidos

A última categoria é a dos alimentos associados à água, ao humor fleumático. O


raciocínio por trás: são alimentos suculentos, com muita água, de sabor fraco ou
doce, associados a Vênus e à Lua.

Peixes frescos em geral (exceto a truta), carne de porco, vitela; cogumelos em


geral, algas, tofu, soja, clara de ovos, ricota; vegetais como pepino, feijão, ervilha
fresca, abóboras, tomates, folhas de salada em geral (quando o gosto da folha for
claramente "aberrante", ela pode ser de outro grupo), alface, repolho. As sementes
(não salgadas) da abóbora.

Frutas suculentas como o melão e a melancia, ou doces e moles como manga,


mamão, abacate, banana e seus sucos; maçãs e peras doces (as azedas são frias e
secas); Bebidas: água (fria), cidra, leite, leite de soja, soro do leite, cervejas mais
leves.

O método mais "fleumático" de preparar alimentos é ensopado. De forma geral,


sopas esfriam e umedecem. Alimentos refinados e moídos de forma geral também
ficam mais frios e úmidos do que integrais e inteiros.

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