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Bioenergética - exercícios

Não posso apresentar aqui o repertório completo dos exercícios utilizados na bioenergética,
mas espero poder concretizar esse plano num outro livro. Devo acrescentar que estes não
são formalizados e que podem ser improvisados de modo a se ajustarem à necessidade e à
situação do indivíduo. Descreverei um número suficiente dos mesmos para demonstrar os
dogmas básicos e seus objetivos. Um dos exercícios fundamentais foi por mim
desenvolvido logo no início, como auxílio para uma maior entrega das pernas e pés, e para
sentir-me mais firmemente apoiado no chão. É chamado de arco ou curvatura e é também
tido como posição fundamental de tensão.

A linha sobreposta à figura indica o arço ou curvatura correta do corpo. O ponto médio dos
ombros está posicionado diretamente acima do ponto médio dos pés, e a linha que une esses
pontos é um arco quase perfeito que passa através do ponto central da articulação do
quadril.

Quando um corpo está nesta posição, suas partes estão em perfeito equilíbrio.
Dinamicamente, a curvatura (arco) está formada e pronta para agir. Energeticamente, o
corpo está carregado da cabeça aos pés. Isso significa que existe um fluxo de excitação
através do corpo. Pode-se sentir os pés no chão e a cabeça no ar, ao mesmo tempo em que
há a percepção de uma total integração e conexão. Por ser uma posição de tensão
energeticamente carregada, as pernas começarão a vibrar.

Utilizamos esta posição para fazer com que as pessoas sintam-se integradas e conectadas,
seus pés firmemente plantados e sua cabeça levantada. Mas usamo-la também
diagnosticamente, pois que revela, de imediato, a falta de integração do corpo, indicando
com precisão o local e a natureza das principais tensões musculares. Descreverei a seguir
como estas tensões podem afetar o arco.

Temos utilizado esta posição e este exercício em nossos trabalhos há mais de dezoito anos.
Imaginem a minha surpresa quando um paciente mostrou-me uma foto da AP (Associated
Press), de chineses praticando exatamente o mesmo exercício (foi publicada a 4 de março
de 1972).
A legenda e o comentário é o que há de mais importante. o caminho do tao é através da
harmonia, tanto dentro do ser quanto com o meio ambiente e o universo. A harmonia com o
mundo externo depende, na realidade, da harmonia com o meio interno, que pode ser
alcançada através da "combinação dos movimentos do corpo com a técnica da respiração".
A bioenergética busca a mesma harmonia através dos mesmos meios. Muitos de nossos
pacientes utilizaram os vários exercícios de t'ai chi concomitantemente à bioenergética. Os
chineses, entretanto, partiram da suposição de que não possuíam maiores distúrbios
corporais que os impedissem de praticar os exercícios corretamente. Já os ocidentais não
podem pressupor algo semelhante e há margem também para questionar se tal pressuposto
se aplicaria aos chineses de hoje em dia.

Um problema que venho comumente encontrando nas pessoas é uma rigidez que domina
todo o corpo e que não as deixa curvar-se. A linha que liga o ponto médio dos ombros ao
ponto médio dos pés é uma linha reta (ver ilustração à página 66). Existe uma notória
inflexibilidade das pernas, o indivíduo é incapaz de fletir completamente o tornozelo. Uma
tensão na região inferior as costas impede a sua curvatura é a pelve fica ligeiramente
retraída.

A condição oposta é a hiperflexibilidade das costas que se inclinam em demasia, indicando


uma fraqueza nos músculos das costas. Relacione este fato com a falta do sentimento de
firmeza e determinação. Enquanto o corpo e a personalidade rígidos são excessivamente
inflexíveis, esse tipo de corpo e personalidade são por demais maleáveis. Em ambos os
casos, a curvatura é feita de maneira imprópria, de modo que não existe qualquer senso de
integração ou fluxo e nenhuma harmonia interna ou externa. A linha do arco se inclina para
o ponto de ruptura. A região inferior das costas não funciona como suporte para o corpo;
essa função é assumida pelos músculos abdominais que se contraem muito (vide figura
abaixo).
Outro distúrbio comum é uma ruptura na linha do arco que se deve a uma severa retração
da pelve. Esse exemplo contrasta com a condição anterior na qual a pelve é impelida à
frente em demasia. Esse distúrbio pode ser visto na figura abaixo.

Nessa condição, se a pessoa empurra sua pelve para a frente, seus joelhos tornam à posição
vertical. Pode-se dobrar os joelhos apenas se as nádegas forem jogadas para trás. Existe aí
uma marcante tensão na região inferior das costas, assim como ao longo da parte posterior
das pernas.

Quando vemos o corpo de frente, às vezes é possível notar algumas rupturas nos segmentos
do corpo. As principais partes, ou seja, a cabeça, o pescoço, o tronco e as pernas
simplesmente não 'se alinham. A cabeça e o pescoço fazem um ângulo anormal para a
direita ou para a esquerda, o tronco inclina-se na direção oposta e as pernas acabam por ir
em sentido contrário ao do tronco. Esbocei esta posição no desenho abaixo, por meio da
linha que mostra as angulações.
Essas angulações revelam que o corpo não flui simultaneamente. Representam uma
fragmentação da integridade da personalidade, típica do esquizóide ou do esquizofrênico. O
termo esquizóide significa ruptura, cisão. Se a cisão incide na personalidade, deve existir
também a nível corporal, energético. A pessoa é seu corpo. Há alguns anos atrás, meus
colegas e eu fomos convidados a fazer uma palestra e uma demonstração da bioenergética
para um grupo de médicos e estudantes do National Institute of Mental Health (Instituto
Nacional de Saúde Mental). Em minha palestra, discuti a relação íntima existente entre o
corpo e a personalidade.

Após as palestras, fomos solicitados a demonstrar nossa capacidade de fazer um


diagnóstico psiquiátrico do corpo, sem conhecer coisa alguma a respeito do indivíduo.
Fomos apresentados sucessivamente a várias pessoas que estavam sendo estudadas pelo
grupo de NIMH. Pedi a cada uma delas que assumisse a posição de tensão fundamental
descrita acima, para que pudesse avaliar a forma de alinhamento do seu corpo. Após ter
observado o corpo por um breve período de tempo, meus companheiros e eu fomos
colocados em salas separadas, e chamado sim por vez, para fornecer o diagnóstico, de
modo que não podíamos nos consultar.

Todos nós fizemos o mesmo diagnóstico o que, por sua vez, coincidiu com os dados dos
grupos do NIMH. Em dois dos pacientes, a ruptura das linhas do corpo era tão clara que a
diagnose de personalidade esquizóide fora uma questão simples. No terceiro caso, uma
rigidez excessiva fora a qualidade predominante. Um dos indivíduos esquizóides tinha uma
condição estranha: os olhos eram de cores diferentes. Quando ressaltei esse fato, fiquei
surpreso ao ver que nenhuma das pessoas da sala o havia notado. Como tantos outros
psicólogos e psiquiatras, haviam sido treinados para ouvir e não para ver. Estavam
interessados na mente e na história do paciente, não no seu corpo e na sua expressão. Ainda
não haviam aprendido a ler a linguagem do corpo.

Os distúrbios do corpo, tal qual foram esboçados acima, formam a base dos sintomas que
fazem com que o indivíduo busque a terapia. O indivíduo rígido será inflexível e fechado
em situações que pedem brandura e generosidade. Ao indivíduo cujas costas são
excessivamente moles faltará a agressividade necessária a certas situações. Todos os
pacientes sentem uma falta de harmonia consigo mesmos e com o mundo. Nestes casos, a
prática do exercício da curvatura não irá restaurar tal harmonia, dado que não podem
praticá-lo corretamente, mas irá ajudar a fazer com que sintam as tensões do corpo que não
permitem uma execução correta. Tais tensões podem ser relaxadas através de outros
exercícios bioenergéticos, alguns dos quais serão descritos em capítulos subsequentes deste
livro.

Não hesito nem vacilo quando digo que uma pessoa que pratica corretamente a curvatura
está em harmonia com o universo; jamais vi alguém com um sério problema emocional que
fosse capaz de executá-la corretamente. Não é uma questão de prática, pois tal posição não
pode ser aprendida. Não é uma posição estática, pois nela a pessoa deve respirar profunda e
plenamente. Deve-se ser capaz de manter o funcionamento e a integridade do corpo sob
pressão. A prática regular do exercício, entretanto, ajuda bastante no sentido de manter a
pessoa em contato com seu corpo, de fazê-la sentir seus distúrbios, compreendendo-lhes o
significado. Além disso, ajuda-a a manter a sensação de harmonia com o universo, uma vez
que realmente a tenha alcançado. E esse é um grande desafio numa cultura tecnológica.

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