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Isto não é Filosofia

Curso Filosofia Prática


Módulo 1
Como iniciar a estudar Filosofia por conta própria
Prof. Vitor Lima

Sumário
1. O que é Filosofia .................................................................................................................... 3
1.1 Etimologia ......................................................................................................................... 3
1.2. Atitude filosófica .............................................................................................................. 3
1.2.1 Sócrates: o primeiro modelo ................................................................................... 3
1.2.2 A vida cotidiana......................................................................................................... 4
1.2.3 Distanciamento da vida cotidiana .......................................................................... 4
1.2.4 Atitude negativa ........................................................................................................ 5
1.2.5 Atitude positiva .......................................................................................................... 5
1.3 Reflexão filosófica ............................................................................................................ 6
1.3.1 Conteúdo: os três grandes campos ....................................................................... 6
1.3.2 Forma: clareza e encadeamento ........................................................................... 7
1.4 Filosofia hoje..................................................................................................................... 8
2. As quatro grandes áreas da Filosofia ................................................................................. 9
2.1 Metafísica .......................................................................................................................... 9
2.1.1 Etimologia .................................................................................................................. 9
2.1.2 Metafísica hoje .......................................................................................................... 9
2.1.3 Metafísica e Ontologia ........................................................................................... 10
2.2 Epistemologia ................................................................................................................. 11
2.1.1 Etimologia ................................................................................................................ 11
2.3.2 Epistemologia hoje ................................................................................................. 11
2.3.3 Empirismo e racionalismo ..................................................................................... 11
2.3 Ética ................................................................................................................................. 12
2.3.1 Etimologia ................................................................................................................ 12
2.3.2 Ética hoje ................................................................................................................. 12
2.3.3 Ética normativa, Metaética e Ética aplicada....................................................... 13
2.4 Existência ........................................................................................................................ 14
2.4.1 Etimologia ................................................................................................................ 14
2.4.2 Existência hoje ........................................................................................................ 14
2.4.3 Existência e existencialismo ................................................................................. 14
3. Três grandes abordagens da Filosofia ............................................................................. 15
3.1 História............................................................................................................................. 15
3.2 Temas .............................................................................................................................. 15

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3.3 Problemas ....................................................................................................................... 16


4. Tabelas .................................................................................................................................. 17
Tabela dos níveis de conhecimento em Filosofia .................................................................. 17
Tabela dos Períodos da Filosofia Ocidental ........................................................................... 18
Tabela dos Problemas da Filosofia......................................................................................... 20
Tabela de como formar bibliografia básica sobre Filosofia .................................................. 21
Bibliografia comentada ............................................................................................................ 22

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1. O que é Filosofia
1.1 Etimologia

A palavra “filosofia” vem de “filos”, amizade, e “sofia”, sabedoria. O filósofo é,


portanto, um amigo do saber. A expressão é atribuída a Pitágoras de Samos (~570
a.C-495 a.C). Considerado sábio por seus concidadãos, teria dito que apenas se limita
a cultivar uma amizade com o saber. O sentido etimológico, no entanto, não esgota todo
o significado do vocábulo.

1.2. Atitude filosófica


1.2.1 Sócrates: o primeiro modelo

Sócrates (~469 a.C-399 a.C) é retratado por seu aluno, Platão (~428 a.C-348
a.C), como o modelo de filósofo. Um filósofo que não dissociava vida cotidiana de
pensamento, de modo que não fornece uma teoria sobre a totalidade das coisas – como
o fizeram seus predecessores –, mas uma prática filosófica. Vivia a perambular pelas
ruas da cidade, seguido por ouvintes e amigos que se deleitavam com seus discursos
e com suas longas conversações.
Sua atitude fundamental era a de indagar as pessoas das questões mais
básicas. Sócrates insiste que sua posição é examinar a si mesmo e os outros, de modo
a colocar em teste aqueles que alegam ter conhecimento das coisas mais importantes.
Sua prática filosófica, segundo seu próprio relato, inicia quando um amigo seu,
Querofonte, retorna do Oráculo de Delfos1, tendo-lhe perguntado se alguém seria mais
sábio que Sócrates, ao que retrucou a Pítia, sacerdotisa de Apolo, que não havia
ninguém mais sábio. A partir daí, considerando-se não mais sábio que seus
concidadãos, passou a tentar entender o que o Oráculo teria afirmado com aquela
posição. Esse procedimento caracteriza a quase totalidade do enredo básico em que
Sócrates aparece como protagonista.
Em uma situação, interroga pessoas envolvidas com a política de modo mais
direto, em busca de saber o que é a virtude. Em outra, interroga os poetas, em busca
de saber o que é beleza. E em uma terceira, interroga os artesãos, em busca de saber
o que é a verdade. Em todas essas categorias (amplamente respeitadas em Atenas),
chega à seguinte conclusão: sobre o que diziam saber – e pelo que eram também
conhecidos e louvados – na verdade nada sabiam. Ao que desabafa Sócrates:
A partir daí me tornei odioso [a eles e] a muitos dos circunstantes e, indo embora, fiquei então
raciocinando comigo mesmo – “Sou sim mais sábio que esse homem; pois corremos o risco de
não saber, nenhum dos dois, nada de belo nem de bom, mas enquanto ele pensa saber algo, não
sabendo, eu, assim como não sei mesmo, também não penso saber... É provável, portanto, que

1
Localizado na cidade de Delfos (que hoje já não existe), região central da Grécia, há cerca de 2500 anos,
foi uma das mais influentes e poderosas instituições do mundo grego antigo. Destino de grandes
personagens da história, o Oráculo de Delfos recebia visitas não só de nomes célebres, como Alexandre,
o Grande, mas também de cidadãos comuns e embaixadores das cidades-estado gregas e dos impérios
próximos buscando por conselhos, tanto para problemas pessoais como para grandes e complexas
questões políticas e de relações exteriores

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eu seja mais sábio que ele numa pequena coisa, precisamente nesta: porque aquilo que não sei,
também não penso saber”. (Platão, Apologia de Sócrates, 21b)

A famosa frase “Só sei que nada sei” nunca foi dita por Sócrates. O que ele disse
foi: “corremos o risco de não saber [...] mas enquanto ele pensa saber algo, não sabendo
eu, [...] também não penso saber”. Em outras palavras, o filósofo expressa os limites
do seu conhecimento, não sua ausência total. Não se trata de uma ignorância no
sentido banal, trata-se de uma constatação de o quanto ainda não se sabe sobre o que
se assumia saber.
Em uma só postura, aponta para as atitudes filosóficas negativa e positiva.
Primeiro, desconfiança do conhecimento que pretensamente sabe. Segundo,
investiga-o em busca de seu conceito, causa e estrutura. As duas posturas em direção
à realidade abrangente: beleza, justiça, virtude etc.

1.2.2 A vida cotidiana

A vida cotidiana é plena de pressupostos filosóficos. Diferente de Sócrates, as


pessoas comuns não costumam questionar esses pressupostos – são simplesmente
aceitos como naturais, evidentes, óbvios. Porém, para dar razão às pessoas comuns,
não a Sócrates (ao menos por enquanto), na maioria das vezes, não precisamos saber
o teor desses conceitos para lidar com a realidade.
Utilizamos vários deles em nossos atos e comunicações sem maiores
problemas, sem ter que parar a cada segundo para fazer uma indagação profunda a
respeito do que significam. A vida cotidiana, em grande parte, funciona – e funciona bem
– sem esses questionamentos. Ao senso que cada um possui sobre a realidade, sem
precisar dominá-la conceitualmente para – por assim dizer – viver bem, chamamos bom
senso.
Entretanto, em outras situações, essa postura se revela problemática. Não é
incomum que conduzamos nossa ação irrefletidamente, baseados apenas na imitação
do que comumente se faz. Nesse panorama, somos atravessados por preconceitos que
passam por verdades, apenas porque não os questionamos. Assumimos que a
realidade é tal qual nos aparece, visto que costumeiramente se apresenta dessa forma.
Tal postura é o que chamamos de senso comum.
Existem duas maneiras, portanto, de encarar nossa postura frente à realidade
quando não nos colocamos a questionar nossos pressupostos. Uma indica uma postura
favorável ao que fazemos, na maioria das vezes. Outra aponta uma postura ingênua e,
até mesmo, preconceituosa. Diante dessa distinção, o que não podemos é reduzir todas
as situações pré-reflexivas a um significado só, como se uma pessoa que não se põe a
questionar a si mesma fosse necessariamente alguém com uma postura simplória
diante da vida.

1.2.3 Distanciamento da vida cotidiana

Diferente do bom senso e do senso comum, a atitude filosófica não se contenta


em agir sem se questionar – aqui entra em jogo novamente a atitude socrática. Assim,

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pergunta-se pelos pressupostos sobre os quais ninguém mais se pergunta, a realidade


abrangente. Que significa isso?

• Em vez de perguntar e responder “Que horas são?”, perguntar e responder


“O que é o Tempo?”,
• Em vez de perguntar e responder “O que está acontecendo é possível?”,
perguntar e responder “O que é a Realidade?”,
• Em vez de perguntar e responder “Você acha que eu estou bonita neste
vestido?”, perguntar e responder “O que é a Beleza?”.
Lembra-se de Sócrates indagando os cidadãos atenienses sobre a verdade, a
justiça e a beleza? Nesse sentido, a primeira característica da atitude filosófica é um
distanciamento da vida cotidiana. Vale dizer, afasta-se do bom senso e do senso
comum, na medida em que não se contenta em ser uma atitude irrefletida, ainda que
com a razão, como é o caso do bom senso. Agir filosoficamente implica não se limitar
ao contexto particular em que uma situação acontece, nem ao fluxo normal dos
acontecimentos. Para utilizar uma situação cotidiana, filosofar é, diante da pessoa
amada, perguntar “O que é o amor?” e não apenas se entregar ao arrebatamento do
sentimento.

1.2.4 Atitude negativa

Uma segunda característica da atitude filosófica é negativa. O que isso quer


dizer? Quer dizer que, diante de uma situação dada, a pessoa filósofa desconfia se o
que está diante de si é dado mesmo. Trata-se de uma decisão de não aceitar como
óbvio, como evidente as ideias, os fatos, os valores, os comportamentos do fluxo usual
da vida.
Trata-se de uma atitude negativa, porque é uma postura de não aceitar como
óbvio aquilo que é corriqueiro só porque é corriqueiro. Para a pessoa filósofa, ao
menos no início, não existe óbvio.

1.2.5 Atitude positiva

A terceira característica da atitude filosófica é positiva. Explico. Após ter


desconfiado do óbvio e ter se recusado a seguir o caminho que usualmente as pessoas
seguiriam, a pessoa filósofa investiga a questão que se colocou em busca de
justificações e explicações.
Se a atitude negativa era a de interromper o fluxo normal, a atitude positiva é de
iniciar novamente o fluxo, mas dessa vez com uma estratégia diferente – a de se
perguntar “O que é?”, “Por que é?” e “Como é?”.
Perguntar “O que é?” implica investigar a essência, o significado.
Perguntar “Por que é?” implica investigar sua origem e seu propósito.
Perguntar “Como é?” implica investigar seus componentes e as relações entre
seus componentes.

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Em outras palavras, a atitude filosófica positiva também indaga pelo conceito,


pela causa e pela estrutura da realidade em sentido abrangente, tal como antes
designamos.

1.3 Reflexão filosófica


1.3.1 Conteúdo: os três grandes campos

Por fim, para responder à pergunta “Mas sobre que tipo de coisas é possível
filosofar?”, gosto da abordagem de Luc Ferry (1951-), filósofo francês contemporâneo.
Sua proposta é dividir a Filosofia em três dimensões: Teoria, Ética e Sabedoria, que
se desdobram nas seguintes perguntas:

• O que existe?
• Como sabemos que existe?
• Como devemos nos comportar em relação aos outros?
• Que sentido atribuir à nossa própria vida?
A primeira é elaborar uma Teoria. Em grego, theoria deriva de theion, divino, e
orao, visão. Etimologicamente, então, significa contemplar aquilo que é divino. Por
derivação de sentido, designa a contemplação daquilo que há de mais essencial, mais
significativo, mais importante na realidade. Nesse sentido, a teoria filosófica se divide
em duas: a compreensão da natureza do mundo e os instrumentos que temos para
conhecê-la. O procedimento filosófico, então, parte de interrogações sobre como se
estrutura a realidade – como fizeram os pré-socráticos, por exemplo, dos kosmólogos
aos matemáticos. Além disso, interroga-se sobre os meios que dispomos para acessar
essa estrutura. As investigação filosófica, assim, pergunta-se sobre se podemos captar
a realidade nela mesma ou se tudo o que temos são aparências – como procederam os
céticos, acadêmicos e pirrônicos, por exemplo.
A segunda etapa é a Ética. Esse campo surge quando nos perguntamos como
viver com os outros humanos, que regras adotar, que comportamentos cultivar de modo
a sermos justos. Trata-se de uma demanda não mais teórica – contemplativa –, mas
prática. É o que fez Sócrates, quando resolveu ignorar a phýsis e o kósmos e investigar
os limites de sua própria conduta na pólis, inquirindo seus pares sobre as virtudes que
diziam possuir.
A terceira é a sabedoria – ou salvação, como Ferry2 a denomina. E ela assim
se justifica:
Se a filosofia, assim como as religiões, encontra sua fonte mais profunda numa reflexão sobre a
“finitude” humana, no fato de que para nós, mortais, o tempo é realmente contado, e de que somos
os únicos seres neste mundo a ter disso plena consciência, então, é evidente que a questão de
saber o que vamos fazer da duração limitada não pode ser escamoteada. [...] Em outras palavras,
a equação “mortalidade + consciência de ser mortal” é um coquetel que carrega em germe a fonte
de todas as interrogações filosóficas.

2
FERRY, Luc. Aprender a viver. Tradução de Vera Lucia dos Reis. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007, p. 13.

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Voltaremos à concepção de Ferry, quando analisarmos a parte da Filosofia que


trata da Existência (ver 2.4.3 abaixo).

1.3.2 Forma: clareza e encadeamento

A reflexão filosófica não acontece de qualquer maneira. É isso que a distingue


do que o senso comum reage quando alguém diz algo pretensamente inteligente:

• “Nossa! Você filosofou agora!”


É a famosa “viagem”. Quando alguém “viaja” nesse sentido é porque expressou
algo que pareceu impressionante, mas quase sempre foi só confusão mental de quem
expressou e incapacidade intelectual de quem recebeu a mensagem.
Ao contrário dessa situação, em primeiro lugar, a reflexão filosófica busca
trabalhar com clareza conceitual. Isso quer dizer que opera por procedimentos de
significação claros e acessíveis sobre os termos que utiliza.
Isso não implica que se saiba absolutamente tudo a respeito do que se investiga
– afinal, se já se soubesse, não haveria por que iniciar a investigação. Significa, sim,
que há um esforço para tornar claro, inclusive, aquilo sobre o que ainda não se
sabe.
Em segundo lugar, a reflexão filosófica busca trabalhar com encadeamento de
raciocínios. Em outras palavras, constitui-se a partir de procedimentos de
demonstração encadeados de modo claro e acessível. Se o passo a passo do
raciocínio não pode ser acompanhado por outras pessoas, então o problema do
dogmatismo retorna.
Novamente, não é necessário ter o caminho antes de finalizada a investigação
– se é que é possível finalizá-la. Ainda assim, é preciso ter raciocínios encadeados,
inclusive, para que outros agentes racionais tomem parte na investigação e a
acompanhem, apontando erros e implementando acertos.
De modo encadeado, é possível compreender sobre o que se fala e questionar
o que se fala, a fim de implementar a reflexão, isto é, torná-la mais próxima daquilo que
se quer compreender. Pode-se apontar em que ponto do raciocínio não há clareza, em
que ponto do raciocínio há uma inferência que não deveria ter sido feita. Somente assim
é possível abrir espaço para a comunicação e, ao mesmo tempo, para possíveis
questionamentos. Sem esclarecer sobre o que se fala, a reflexão filosófica facilmente
se torna dogma, isto é, algo que depende única e exclusivamente da aceitação baseada
na confiança em quem comunica e não na capacidade cognitiva das pessoas que
querem investigar a realidade conjuntamente.
Em suma, a reflexão filosófica não é

• “Eu gosto de”: preferência de cada um.


• “Eu acho que”: opinião de cada um.
• “Dizem que”: opinião de muitos.
• “O filósofo x diz que”: opinião de uma autoridade.

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A reflexão filosófica é um questionamento inicial sobre um aspecto abrangente


da realidade em busca de respostas, por meio de um discurso com clareza conceitual e
encadeamento de raciocínios. Isso acontece, hoje, em quatro grandes áreas.

1.4 Filosofia hoje

Diferente da época de Sócrates, os filósofos hoje exercem sua atividade de


inúmeras maneiras. Para ser breve: não existe Filosofia, existe filosofar. Ou melhor:
filosofares.
Não existe o substantivo porque ele denota que há um corpo consolidado do
conhecimento a ser aprendido, tal qual acontece, por exemplo, com a Biologia, a
Química e a Física que aprendemos no Ensino Básico. Não há. Sempre desconfie de
um filósofo ou professor que começa uma frase dizendo “A Filosofia defende que...”. É
possível dizer “O filósofo x defende que....”, mas isso é muito diferente de pronunciar a
oração passada.
O que temos é o verbo, entendido como um esforço em realizar perguntas,
fornecer respostas, argumentar e contra-argumentar perante os amigos do saber, que
raramente concordam (mas, de fato, em algumas questões entram em acordo) entre si
nas especificidades do que dizem. Portanto, não existem características necessárias,
nem suficientes para o que façam os filósofos.
Por isso, defendo as seguintes características – transitórias, que fique claro –
para abarcar o que tentamos fazer nós que nos dedicamos a esse ramo do saber
humano.
A primeira é exatamente esta: ausência de consenso na maioria das questões.
Isso torna a disciplina filosófica uma das mais plurais já existentes. É um valor para um
filósofo participar da prática agônica de dar e receber justificativas, refutar e ser refutado.
Tudo o que vem a seguir, portanto, é uma visão entre várias. É, no entanto, a
minha visão. E eu fornecerei razões para a sua defesa.
A segunda é o procedimento majoritariamente conceitual e não experimental
para constituição e defesa das teses que propomos. Os instrumentos que utilizamos são
diferentes daqueles utilizados pelos cientistas. Isso não significa dizer que o que
fazemos é menos importante. Experimento de laboratório algum chegará à conclusão
de perguntas como “O que é conhecimento?”, “É justificável sacrificar a minoria em
benefício da maioria?” e “Qual o significado e o valor da arte?”.
O terceiro é o aspecto argumentativo. Por mais que haja filósofos que neguem
o argumento como base de seu filosofar, caso pretendam defender sua abordagem e
não outra qualquer, acabam por se autocontradizer, porque a própria ideia de defender
uma abordagem pressupõe a noção de argumentação. A intenção de provar que o
argumento não é importante implica argumentar.
A quarta é o ímpeto por fiscalizar, seja o conhecimento humano, seja a conduta
humana, seja a realidade em seu aspecto mais abrangente e não abarcado pelos
campos já constituídos. Daí os filósofos não se intrometerem nos assuntos técnicos da
Biologia, da Química e da Física, mas se perguntarem questões que as atravessam, tais

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como “O que é o método científico?”, “De que é constituída a realidade?”, “Podemos ter
acesso ao conhecimento sobre o qual pretendemos pesquisar?”. Daí os filósofos não
se intrometerem nos assuntos processualmente jurídicos, mas ainda assim
questionarem “O que é justiça?”, “O que significa viver uma vida boa?”, “Até que ponto
devemos lealdade ao Estado?”.
Assim, uma conceituação provisória, mas possível, poderia ser feita da seguinte
maneira:
A Filosofia é filosofa (ou melhor, filosofares), isto é, a prática conceitual e
argumentativa acerca dos aspectos mais abrangentes da realidade, da ação
humana e de sua existência. Não se confunde com as ciências, nem com a lógica
em sentido estrito, mas acontece de modo racional discursivo e apresenta um
ímpeto por fiscalizar as mais diversas áreas do saber e do mundo – natural e
humano.

2. As quatro grandes áreas da Filosofia


2.1 Metafísica
2.1.1 Etimologia

A Palavra “metafísica” vem do grego ta meta ta physica (as coisas depois da


física). Originalmente, o termo se referia à sequência de obras de Aristóteles,
catalogadas não pelo discípulo de Platão, mas por Andrônico de Rodes, no séc. I a.C.
Existe a obra Física, e a obra sem nome que se localizava após a Física. Por
influência desse fato bibliotecário, mais tarde passou a designar, por derivação de
sentido, a investigação das coisas que transcendem, vão além do que é meramente
natural, material, físico.
Tempos depois, passou-se a confundir, no senso comum, metafísica com
misticismo, ocultismo, espiritismo e discurso sem lastro na realidade concreta. Esse,
porém, não é o sentido mais próximo ao termo, tal qual os filósofos o utilizam hoje.

2.1.2 Metafísica hoje

Para os filósofos que se dedicam a esse campo no mundo contemporâneo,


Metafísica significa a investigação filosófica dos aspectos conceituais mais gerais
acerca da estrutura da realidade (existência, essência, causas, princípios, possibilidade,
necessidade etc.).
Exemplos de perguntas metafísicas:

• Existe livre-arbítrio ou somos determinados?


• Como a mente se relaciona com o corpo?
• Há um sentido para a vida?
• Entidades abstratas (por exemplo, números) existem fora da mente ou são
meras construções mentais?

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Uma maneira simples de expressar a pergunta metafísica fundamental é dizer


que ela se resume à questão: “o que é?”.
Em primeiro lugar, “o que” significa se perguntar “Qual a essência da realidade?”.
Em outras palavras, é a indagação pela natureza, estrutura, constituição, causas,
princípios próprios das coisas em seu aspecto mais fundamental.
Em segundo lugar, “é” significa se perguntar “O que existe?”, isto é, de que
coisas mais fundamentais se constitui a realidade em seu aspecto mais abrangente.

2.1.3 Metafísica e Ontologia

Ontologia é a parte da Metafísica que estuda que categorias de coisas há. Se


pudermos associar a uma daquelas perguntas fundamentais, poderíamos fazê-lo à
questão acerca de “O que existe?”
A palavra vem do grego e pode ser dividida em outras duas. Primeiro, o vocábulo
ta onta (os seres); depois, o vocábulo logos (estudo, ciência, teoria). A ontologia é, em
sua raiz, Teoria da Existência, do Ser, da Realidade.
A Ontologia estuda as categorias dos seres em geral, não em específico. A
Biologia estuda e categoriza os seres na Taxonomia; a Química estuda e categoriza os
seres na Tabela Periódica. A Ontologia estuda as categorias dos seres em geral:
materiais, imateriais, intermediários etc.
Exemplos de perguntas ontológicas:

• Quais são as partes fundamentais da realidade?


• Como se relacionam as partes fundamentais da realidade (e.g., entidades
materiais são o fundamento de entidades imateriais ou é o contrário)?
• As partes materiais (e.g., sapatos) são mais reais que as partes imateriais
(e.g., o conceito de sapato)?
O materialismo ontológico pode ser entendido a partir da defesa da seguinte
alegação: entidades materiais, e.g., partículas, processos químicos e energia são mais
reais que, e.g., a consciência humana. Em outras palavras, a alegação básica do
materialismo ontológico é que a realidade existe de modo independente da observação
consciente humana.
O idealismo ontológico, por sua vez, pode ser entendido a partir da defesa de
outra alegação: fenômenos imateriais, e.g., mente humana e consciência são mais reais
que entidades materiais, e.g., quarks, prótons, nêutrons etc. Vale dizer, a alegação
básica do idealismo ontológico é que a realidade existe à medida em que é construída
na mente humana que a observa.

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2.2 Epistemologia
2.1.1 Etimologia

A palavra “epistemologia” vem do grego e pode ser dividida em outras duas:


episteme (conhecimento, entendimento) e logos (estudo, ciência, teoria). A
epistemologia é, em sua raiz, Teoria do Conhecimento.

2.3.2 Epistemologia hoje

Há duas grandes tradições divisões na Filosofia Contemporânea: Filosofia


Analítica e Filosofia Continental.
Os filósofos analíticos são os herdeiros de Gottlob Frege (1848-1925) e
Bertrand Russell (1872-1970). Sua abordagem é parecida à abordagem da lógica, sua
linguagem é mais enxuta, direta e se expressam principalmente por meio de artigos
científicos, publicados em revistas especializadas.
Os filósofos continentais são os herdeiros de Friedrich Nietzsche (1844-1900)
e Martin Heidegger (1889-1976). Sua abordagem é mais histórica, sua linguagem é
mais literária, indireta e se expressam principalmente por meio de livros
interdisciplinares com a História, Antropologia, Sociologia.
Os analíticos adotam o termo Epistemologia como eu adoto: sinônimo de Teoria
do Conhecimento. Para eles, uma coisa é Epistemologia, outra é Filosofia da Ciência.
A primeira trata de questões como estas:

• O que significa conhecimento?


• Como alguém conhece algo?
• Qual o fundamento do conhecimento verdadeiro?
A segunda trata de questões relativas a

• O problema da demarcação entre ciências e pseudociência,


• O conceito de método científico,
• O conceito de racionalidade científica.
Os continentais adotam o termo Epistemologia como sinônimo de Filosofia da
Ciência. Um representante dessa linha é Gaston Bachelard (1884-1962). Manuais
brasileiros de Filosofia, como o de Marilena Chaui (1941-), são herdeiros dessa
tradição, por isso, em seus textos, costuma aparecer essa última nomenclatura.

2.3.3 Empirismo e racionalismo

Quando conhecemos algo, podemos fazer isso de diversas maneiras. Podemos


estar diante do objeto de conhecimento. Posso afirmar, “Este notebook está diante de
mim”, porque de fato este no notebook está diante de mim. Além disso, podemos inferir
conclusões de informação que já possuímos. Posso dizer “Este notebook é de
qualidade”, porque foi caro (e sei que produtos caros costumam ser melhores que
produtos baratos, embora nem sempre o sejam) e foi bem recomendado (e confio na

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pessoa que o recomendou, dado que ela nunca me decepcionou). Porém, permanece
a pergunta: de onde vem a primeiro tijolo de informação de onde todo o resto do edifício
de conhecimento é construído?
Para o empirismo, a fonte primária do conhecimento são os dados provenientes
dos sentidos (em grego, empiria, por isso empirismo). Nesse âmbito, é importante se
referir a experiências e observações quando se quer justificar alegações e construir
conhecimento novo. Ideias, portanto, são relevantes para classificar os elementos
físicos, por exemplo, mas não são fonte original de conhecimento.
Para o racionalismo, a fonte primária do conhecimento são as ideias da razão.
Nesse sentido, a fonte original para novos conhecimentos não é o mundo material, mas
a mente humana racional (por isso, racionalismo). Os dados dos sentidos, então, são
relevantes, mas os resultados de investigativas são avaliados pela razão
principalmente.

2.3 Ética
2.3.1 Etimologia

Vamos partir da confusão usual entre ética e moral. Etimologicamente, o


significado é o mesmo: costumes. Em grego, costume é ethos; em latim, mores. Há
uma peculiaridade, entretanto, relativa à origem grega.
Há duas maneiras de escrever o vocábulo em caracteres gregos que não são
plenamente traduzidas: ἔθος e ἦθος. Transliteradas para os caracteres latinos, ambas
se tornam ethos. Isso significa que o épsilon (ἔ) e o eta (ἦ) se perdem na tradução,
porque não a outra letra para substituí-los além da letra (e). Por isso, uma diferença
semântica significativa se perde: ἔθος significa costumes (o conjunto de hábitos e
valores de uma coletividade), ao passo que ἦθος significa caráter, temperamento, índole
(o conjunto de hábitos e valores de um indivíduo).
Por esse motivo, por vezes, em textos mais acadêmicos, utiliza-se a palavra
“ethos” para se referir aos costumes de um grupo cultural – por exemplo, “Ser cordial
faz parte do ethos do povo brasileiro”. Sem nenhum prejuízo semântico, na mesma frase
a palavra “ethos” poderia ser trocada pelo vocábulo “moral”.

2.3.2 Ética hoje

Porém, é preciso dar bastante ênfase a este ponto: o último parágrafo não é o
do uso propriamente filosófico da palavra “ética”. Em Filosofia, é preciso estabelecer
uma distinção: de um lado, como é usado nos manuais contemporâneos; de outro lado,
como é utilizado por filósofos específicos em momentos diferentes da história do
pensamento ocidental.
Em primeiro lugar, nos manuais contemporâneos, principalmente os de tradição
analítica, ou não se faz distinção entre uma e outra, ou, quando se faz, é para
estabelecer que moral se refere aos costumes localizados em certo grupo – portanto,
algo variável no tempo e no lugar –, e que ética se refere à Filosofia Moral, isto é, à
reflexão, análise, interpretação e crítica da moral.

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Em segundo lugar, alguns filósofos partiam do fato de que há duas origens


etimológicas para estabelecer diferenças semânticas. Um exemplo é Kant, para quem
“moral” designa o conjuntos dos princípios gerais, e “ética”, sua aplicação concreta. É
possível que este ou aquele filósofo utilize a palavra “moral” como teoria dos deveres
em relação aos outros, ao passo que “ética” designa a doutrina da salvação e da
sabedoria.
A questão é: nada impede de se utilizarem as duas palavras em diferentes
acepções. Questão mais fundamental ainda para mim é: nada impele que seja utilizadas
em diferentes acepções. Por esse motivo, eu as utilizarei como sinônimas perfeitas e,
quando houver diferença, Ética será a parte da Filosofia que investiga a Moral – daí
Filosofia Moral.

2.3.3 Ética normativa, Metaética e Ética aplicada

Costuma haver uma divisão tripla na Ética entendida desse modo: Ética
normativa, Metaética e Ética aplicada.
Ética normativa é o estudo de como devemos agir, isto é, em que normas
basear a ação. A preocupação central é tentar encontrar critérios para o que é
moralmente bom e o que é moralmente mal. Por vezes, é também chamada de Ética
prescritiva, porque não se trata de algo que naturalmente se faça, mas que é
necessário, para agir conforme o bem, fazer. Perguntas desse campo são, por exemplo:

• Como reconhecer uma pessoa moralmente correta?


• É moralmente correto mentir?
• Tenho um dever de ajudar pessoas mais pobres que eu?
Metaética é o estudo acerca do que é são a moralidade e os julgamentos morais.
Usa de abordagem teóricas e descritivas para entender os compromissos e
pressupostos que subjazem nosso pensamento sobre essas duas instâncias. Quando
dizemos que é preciso haver consciência e liberdade para haver um sujeito moral,
estamos fazendo metaética. Perguntas desse campo são, por exemplo:

• O que é um valor moral precisamente – algo que existe no mesmo sentido


que existem entidades como pedras (objetos) e frio (atributos)?
• De onde tiramos os valores morais que adotamos – cultura, natureza,
transcendência?
• Valores morais são subjetivos, intersubjetivos ou objetivos?
Ética aplicada estuda questões controvérsias envolvendo julgamentos morais.
Os estudos normativos e os metaéticos são utilizados para debater temas como aborto,
infanticídio, eutanásia, pesquisa com células-tronco, pena de morte, casamento
homossexual, legalização das drogas, discriminação, direito dos animais.

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2.4 Existência
2.4.1 Etimologia

O conceito de existência provém do latim ex-sistere, isto é, um ser saído de outro


ser. Por derivação, existência é algo que foi criado. Porém, o termo ganhou as
conotações que aqui são usadas com Martin Heidegger (1889-1976) e os filósofos do
séc. XX.

2.4.2 Existência hoje

Para Heidegger, o ser humano não pode ser entendido se não for em relação à
sua circunstância. Não qualquer circunstância – política, cultural, social etc. A
circunstância humana a ser considerada é sempre singular, não particular (pertencente
a um grupo), nem universal (pertencente a todos). Em outras palavras, não se trata de
investigar o que é o ser humano em abstrato (universal), nem o cidadão, o brasileiro, o
amazonense (particular), mas aquele que se encontra só, pensando em como conduzir
sua vida não em relação aos outros – o que seria da preocupação da Ética –, nem
enquanto cidadão – o que seria preocupação da Filosofia Política –, mas enquanto ser
singular. Essa é a existência.
As perguntas existenciais são, por exemplo:

• Quem sou eu, fora os aspectos particulares e universais que há em mim?


• Como orientar minha vida singular?
• Há um sentido na vida em relação ao qual se orientar?

2.4.3 Existência e existencialismo

O existencialismo é uma forma de investigação filosófica, surgida no séc.


XX, que explora o problema da existência humana e centra-se na experiência, vivida,
do indivíduo que pensa, sente e age. Porém, a preocupação com a existência não é
exclusiva do existencialismo.
Na nomenclatura de Ferry, trata-se da sabedoria. O filósofo é aquele que, a
princípio, não encara a vida como um turista, mantendo relações superficiais com os
lugares em que habita. Nesse sentido, pode até optar por ser um turista, para ficar com
a metáfora, porém essa opção é necessariamente fruto de um pensamento, de uma
reflexão, não da inércia em agir como sempre se agiu. Depois de se perguntar – ou ao
mesmo tempo em que se pergunta – pela Metafísica, pela Epistemologia e pela Ética,
o filósofo se pergunta pela finalidade ou o sentido de todas as coisas, inclusive de sua
própria vida.
É aqui que o filósofo passa a dispensar a vida filosófica (que nada mais é que a
vida de amor pela sabedoria, cuja busca é incessante) e passa a querer cultivar a vida
sábia. Porém, o sábio, por definição não mais busca e sim encontra – vive conforme a
sabedoria que encontrou e vence, enfim, o medo que a finitude desperta no ser humano.

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Há algumas filosofias que subordinam a Ética e a Sabedoria à Teoria. Outras


que subordinam a Teoria e a Sabedoria à Ética. Há outra espécie de Filosofia, ainda,
cujo principal objetivo é garantir a Sabedoria, a salvação da finitude. E, para alcançar
esse objetivo, subordinam seja o que for. A Filosofia não apresenta uma resposta única.
Como já dissemos, não há Filosofia, mas filosofar – na verdade filosofares. E
praticar o seu é um caminho que se faz acompanhado – é, por isso que estamos
oferecendo o curso –, mas cuja decisão é individual – é, por isso, que a última palavra
é sempre sua.

3. Três grandes abordagens da Filosofia


3.1 História

A abordagem centrada na História da Filosofia ressalta os pensadores no tempo


em que viveram e as variáveis que sobre ele recaíram para que o seu modo de filosofar
fosse constituído: a política, a sociedade, a cultura, a biografia.
Nesse abordagem, por exemplo, ao estudar Aristóteles, uma aula típica se
estruturaria da seguinte maneira:

• Vida (biografia)
• Obra (textos)
• Época (período histórico geral)
• Sociedade (valores e hábitos específicos da sociedade)
• Principais conceitos (entendidos a partir dos elementos anteriores)
As quatro grandes épocas são (veja tabela anexada no final):

• Filosofia Antiga
• Filosofia Medieval
• Filosofia Moderna
• Filosofia Contemporânea

3.2 Temas

A abordagem centrada nos Temas da Filosofia ressalta grandes conceitos e o


que cada filósofo tem a dizer sobre eles. É uma perspectiva centrada em reunir a opinião
dos pensadores clássicos sobre determinado assunto.
Nessa abordagem, por exemplo, ao estudar o tema da Verdade, uma aula típica
se estruturaria da seguinte maneira:

• Parmênides e a viagem em direção à verdade


• Protágoras e o homem como medida de todas as coisas
• Górgias e a negação da existência das coisas
• Sócrates e a busca da verdade de si mesmo
• Pirro e os dez argumentos contra o acesso à verdade

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Outros temas que poderiam ser estudados são estes:

• Razão
• Linguagem
• Mente
• Conhecimento
• Homem
• Beleza
• Bondade
• Vida

3.3 Problemas

A abordagem centrada nos Problemas da Filosofia ressalta as respostas dos


pensadores e a interação entre eles, com base nas grandes questões do pensamento
filosófico. Passa a ser mais relevante que a Época em que viveram formular as
perguntas a que respondem (problemas), a resposta que fornecem (teses), os
raciocínios que estabelecem (argumentos) e os significados de que fazem uso
(conceitos e teorias).
Nesse abordagem, por exemplo, ao estudar o problema do livre arbítrio, uma
aula típica se estruturaria da seguinte maneira:

• Formulação do problema
• Conceitos e teorias envolvidos
• Respostas ao problema
• Contra-argumentos às respostas
• Réplica das respostas
As quatro grandes áreas já foram vistas por nós (veja tabela anexada no final):

• Teoria (realidade e conhecimento)


o Metafísica
o Epistemologia
• Prática (ação humana)
o Ética
o Existência
• Aplicada
o Filosofia Política
o Filosofia da Arte
o Filosofia da Religião
o etc.

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4. Tabelas

Tabela dos níveis de conhecimento em Filosofia


Eu sei expressar o que é Filosofia para mim,
no atual estágio de vida em que me
Nível 1 Conceito de Filosofia encontro?
(iniciante) (subjetivo e particular) Eu sei esboçar que necessidade existencial
me aproxima da Filosofia, no atual estágio
de vida em que me encontro?
Eu sei enumerar quais são os principais
períodos da História da Filosofia Ocidental,
História da Filosofia suas subdivisões e os filósofos que nelas se
Ocidental enquadram?
Eu sei explicar os conceitos principais de
cada período da História da Filosofia?
Eu sei enumerar os principais problemas da
Filosofia?
Problemas da Filosofia
Eu sei explicar em que consistem os
Nível 2 principais problemas da Filosofia?
(intermediário) Eu sei enumerar quais são as principais
respostas aos problemas da Filosofia?
Debate em torno dos Eu sei explicar como uma se contrapõe a
problemas filosóficos outra, quais as teorias, conceitos,
argumentos e contra-argumentos
envolvidos?
Eu sei enumerar quais são os livros e textos
Livros e textos clássicos da Filosofia?
de Filosofia Eu sei falar sobre o que são esses livros e
textos clássicos?
Eu sei expressar o que é Filosofia para mim,
em comparação com o modo como os
clássicos filosofaram e os contemporâneos
filosofam?
Nível 3 Conceito de Filosofia
Eu já li suficientes livros de Filosofia?
(avançado) (comparativo e singular)
Eu já respondi a algum problema filosófico?
Eu já encontrei como conciliar o meu
filosofar com uma necessidade existencial
minha?

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Tabela dos Períodos da Filosofia Ocidental


Categoria
Categoria específica Principais nomes
Geral
Tales
Anaxímenes
Anaximandro
Período Anaxágoras
Pré-socrático Heráclito
Parmênides
Zenão de Eleia
Filosofia Demócrito
Protágoras
Antiga Período Górgias
Sócrates
Clássico Platão
Aristóteles
Diógenes
Período Pirro
Helenístico Epicuro
Zenão de Cítio
Agostinho
Patrística Boécio
Filosofia Abelardo
Anselmo
Medieval Escolástica Tomás de Aquino
Guilherme de Ockham
Nicolau Maquiavel
Erasmo de Roterdã
Humanismo
Tomás Morus
renascentista Pico dela Mirandola
Nicolau de Cusa
Reforma Martinho Lutero
Protestante Calvino
Revolução Johanes Kepler
Científica Galileu Galilei
Michel de Montaigne
René Descartes
Francis Bacon
Filosofia David Hume
John Locke
Moderna George Berkeley
Thomas Hobbes
Bento Espinosa
Jean-Jacques Rousseau
Filosofia/Ciência Voltaire
Diderot D’Alembert
Immanuel Kant
Fichte
Schelling
Hegel
Karl Marx
Sigmund Freud
Schopenhauer
Nietzsche

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Edmund Husserl
Fenomenologia Merleau-Ponty
Max Scheler
Friedrich Schleiermacher
Hermenêutica H. G. Gadamer
William James
Charles Peirce
Pragmatismo John Dewey
Richard Rorty
Hilary Putnam
Gottlob Frege
Bertrand Russell
George Edward Moore
Ludwig Wittgenstein I
Filosofia Analítca Paul Kripke
P.F. Strawson
Donald Davidson
Karl Popper
Rudolf Carnap
Círculo de Viena Moritz Schlick
Søren Kierkegaard
Fyodor Dostoevsky
Existencialismo Jean-Paul Sartre
Albert Camus
Louis Althusser
Michel de Foucault
Jacques Lacan
Filosofia Jacques Derrida
Contemporânea Pós-estruturalismo
Roland Barthes
Gilles Deleuze
Judith Butler
Jean Baudrillard
Julia Kristeva
Jacques Rancière
Paul Ricoeur
Herbert Marcuse
Max Horkheimer
Teoria Crítica Theodor Adorno
Jurgen Habermas
Jacques Maritain
Neotomismo Étienne Gilson
John Rawls
Filosofia Política Robert Nozick
Hannah Arendt
Martin Heidegger
Inclassificáveis Ludwig Wittgenstein II
Thomas Kuhn
Miguel Reale
Oswaldo Porchat
Gerd Bornheim
Bento Prado Júnior
Filósofos brasileiros Sérgio Paulo Rouanet
contemporâneos Newton da Costa
Roberto Mangabeira Unger
Paulo Freire
Marilena Chaui
Scarlett Marton

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Tabela dos Problemas da Filosofia


Categoria Categoria Perguntas Conceitos
Geral específica centrais principais
Ser
Essência
Quais os aspectos mais Substância
Categorias
fundamentais da realidade?
Metafísicos Tempo
Por que existe algo em vez de Espaço
nada? Liberdade
Deus
Teoria etc.
(realidade/ Razão
conhecimento) Entendimento
Como conhecemos – se é que Sensibilidade
conhecemos – a realidade? Crença
Verdade
Epistemológicos Quais instrumentos mais confiáveis Justificação
dispomos para conhecer a Erro
realidade? Confiabilidade
Vagueza
etc.
Bem
Que ações tomar em face da Mal
coletividade? Virtude
Como reconhecer uma boa Vício
Éticos Prazer
pessoa?
Como saber quando uma ação é Conduta
Hábito
Prática boa? etc.
ação, Sentido
vida coletiva Significado
e vida singular O que fazer diante da consciência e Absurdo
inevitabilidade da morte? Ordem
Existenciais Como conduzir a própria vida de Caos
modo que ela tenha significado – Trabalho
Obra
se é que é possível ter significado? Voz
etc.
Artísticos Arte
Literários Literatura
Científicos Ciência
Médicos Em que medida problemas Saúde
Aplicação Políticos metafísicos, epistemológicos e Política
inter-, trans-, Psicológicos éticos auxiliam questões regionais Psique
disciplinaridade Sociais Sociedade
de outras áreas do saber?
Culturais Cultura
Jurídicos Justiça
etc. etc.

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Tabela de como formar bibliografia básica sobre Filosofia


Passo 1 Defina o assunto sobre o qual você quer livros básicos
Passo 2 Abra o https://www.google.com.br/
No campo de pesquisa, você escreverá as palavras nesta ordem:
- Assunto
- Ementa ou Plano de Ensino ou Plano de aula
- pdf
Passo 3 - edu
Por exemplo:
- Filosofia Política Ementa pdf edu
- Filosofia Política Plano de Ensino pdf edu
- Filosofia Política Plano de aula pdf edu
Passo 4 Baixe mais de uma Ementa/Plano de Ensino/Plano de aula
Passo 5 Compare a bibliografia de todas as Ementas/Plano de Ensino/Plano de aula
Passo 6 Compare os livros que se repetem
Passo 7 Os livros que se repetem são sua bibliografia básica

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Bibliografia comentada

Para iniciar na abordagem histórica:

• MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a


Wittgenstein. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.
(é o livro mais breve e profundo que conheço sobre História da Filosofia. Em
alguns períodos, traz mais esclarecimentos que em outros, porém, ao final de
cada um, há indicação de livros que são preciosos para quem quer continuar
os próprios estudos por conta própria.)
• FERRY, Luc. Aprender a viver. Tradução de Vera Lucia dos Reis. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2007.
(é o livro mais didático sobre a História da Filosofia ocidental que conheço.
Diferente do livro do Marcondes, seu objetivo não é apresentar os detalhes, mas
o panorama e a ideia central de cada uma das épocas a partir dos três grandes
conceitos que você viu acima: Teoria, Ética e Sabedoria. Ao final, o autor expõe
a sua própria visão sobre a História da Filosofia e sobre a Teoria, Ética e
Sabedoria para o tempo atual.)
Para iniciar na abordagem temática:

• NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada de filosofia: das origens à Idade


Moderna. Tradução de Maria Margherita De Luca. 1ª ed. 2ª reimp. São Paulo:
Globo, 2005.
(o livro é ao mesmo tempo histórico e temático. Seu diferencial é, no início, fazer
um índice com grandes temas e indicar a página precisa onde cada filósofo fala
sobre aquele conceito. Temas presentes no livro são: origem de tudo, verdade,
pensamento, linguagem, mente, conhecimento, realidade, método científico,
homem, corpo humano, existência, tempo, matéria, vida, amor, loucura, estado,
deus, beleza etc.)
• CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. 12º ed. 5ª imp. São Paulo: Editora Ática,
2002.
(é um dos primeiros livros didáticos a serem democratizados no Brasil. Tem uma
abordagem ao mesmo tempo histórica e temática. A principal qualidade do livro
é a sua didática. Chaui prioriza a abundância de exemplos e de alternativas
explicativas para o mesmo conceito. Não bastasse isso, é bastante minuciosa
na organização interna do livro, o que fornece a ordem tão buscada por quem
está iniciando. Os temas em que se concentra são: Filosofia, razão, linguagem,
lógica, metafísica, cultura, artes, ética e política)
Para iniciar a abordagem problemática:

• NAGEL, Thomas. Uma breve introdução à Filosofia. Tradução de Silvana


Vieira. 3ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011.
• (é um dos livros modelo nesse tipo de abordagem. A partir de problemas como
“Como sabemos alguma coisa?” e “O que é Justiça?” explica os principais
conceitos e os principais argumentos e contra-argumentos de modo didático,
sem recorrer a inúmeras citações. A melhor introdução possível nessa categoria)

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• MURCHO, Desidério. Filosofia ao vivo. Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2012.


(o livro do professor português, que leciona na Universidade de Ouro Preto, no
Brasil, é o melhor manual da categoria em Língua Portuguesa. O estilo é similar
ao de Nagel: direto, didático e sem citações. Uma aula a cada capítulo – para
novatos e para iniciados.)
Para consultar termos técnicos:

• ALMEIDA, Aires de (org.). Dicionário escolar de Filosofia. Disponível em:


https://criticanarede.com/dicionario.html.
(Esta é a versão on-line e gratuita da versão de 2003 do Dicionário Escolar de
Filosofia, org. por Aires Almeida (Lisboa: Plátano Editora). Trata-se de um
dicionário escolar por ter sobretudo em conta os estudantes do ensino
secundário português (alunos entre 15 e 16 anos). Não apenas pela linguagem
acessível e direta, mas também pela seleção de conteúdos, este dicionário serve
a todos que estudam filosofia pela primeira vez. Uma segunda edição (Lisboa:
Plátano Editora, 2009), muitíssimo alargada, foi publicada.)
• JAPIASSÚ, Hilton, MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de Filosofia. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.
(é o segundo dicionário mais acessível em termos didáticos em Língua
Portuguesa)

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