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FILOSOFIA
SUMÁRIO
1. O que é a filosofia...........................................................................................................................................4
1.1 Psicologia e filosofia...................................................................................................................................................... 4
1.2 Uma definição de filosofia........................................................................................................................................ 4
1.3 Filosofia e visão de mundo....................................................................................................................................... 5
1.4 Visão de mundo em diferentes sociedades.................................................................................................. 5
1.5 Quando há filosofia?...................................................................................................................................................... 6
1.6 Demarcação da filosofia............................................................................................................................................. 7
3. Bondade e verdade.....................................................................................................................................14
3.1 Perfeição e completude........................................................................................................................................... 14
3.2 Finalidade e bem.......................................................................................................................................................... 14
3.3 O ser humano e a busca pelo bem................................................................................................................... 15
3.4 O equívoco do relativismo...................................................................................................................................... 15
3.5 A perda da ideia de finalidade objetiva..........................................................................................................16
3.6 O bem absoluto............................................................................................................................................................. 17
4. Virtudes intelectuais.................................................................................................................................. 18
4.1 Virtudes morais versus intelectuais..................................................................................................................18
4.2 Ciência ...............................................................................................................................................................................18
4.3 Sabedoria...........................................................................................................................................................................19
4.4 Inteligência.......................................................................................................................................................................19
4.4.1 O princípio de não-contradição............................................................................................................................................. 19
4.4.2 O princípio do terceiro excluído...........................................................................................................................................20
4.5 Arte .................................................................................................................................................................................................... 20
4.6 A prudência.................................................................................................................................................................... 20
5. Graus de certeza..........................................................................................................................................22
5.1 A distinção entre demonstração e argumentação................................................................................. 22
5.2 A precariedade do ente material....................................................................................................................... 22
5.3 A realidade não é matemática............................................................................................................................ 23
5.4 O risco inerente à existência................................................................................................................................ 24
5.5 Para além do antagonismo entre racionalidade e irracionalidade............................................. 25
Referências bibliográficas...........................................................................................................................26
1 O QUE É A FILOSOFIA
Segundo certas definições, como será visto, a filosofia sequer teria um objeto próprio.
Ainda falando de Aristóteles: dizia este filósofo que, se não houvesse entes ima-
teriais, a principal das ciências seria a física (Met. 6. c.1. 1026, a, 27 - 32). É importante
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ressaltar, no entanto, que o sentido de física para este autor é diferente do encon-
trado no uso atual: trata-se, na verdade, do que se chama de filosofia da natureza.
Ou seja, não havendo imaterialidade, o principal conhecimento humano seria preci-
samente os ensinamentos de filosofia da natureza — da física enquanto estudo dos
entes dotados de matéria.
Aristóteles defende, contudo, que este não é o caso. Segundo ele, existem entes
imateriais e, portanto, a física não é a primeira e mais importante das disciplinas filo-
sóficas: este é o lugar da metafísica.
Note-se que alguém que defenda a inexistência de realidades imateriais neces-
sariamente terá uma concepção de filosofia inteiramente distinta. Parece que, para
esta pessoa, seria inevitável que a filosofia se visse reduzida a um apêndice absorvido
pelas ciências naturais, que abrangem medições, sensações e aspectos quantita-
tivos. Neste caso, portanto, seria válida a hipótese de Aristóteles, de que a filosofia
seria fundamentalmente reduzida à física.
Na verdade, esta é uma definição defendida por muitos autores que consideram
que a filosofia não traz conhecimento positivo acerca das coisas, mas tão somente
uma conversa interessante, instigante ou bela, com pouco reflexo de verdade. A con-
cepção de mundo que determinada pessoa possua deve conduzi-la a uma determina-
da definição de filosofia, e vice-versa.
mundo. Mais uma vez, nota-se a ideia do castigo pela desobediência à ordem divina
(Hesíodo, Trabalhos e dias, vs. 60-105).
É belo o fato de que vários mitos portam aspectos semelhantes, como a ideia de
que uma falha na humanidade ocasionou um castigo cujas consequências marcam a
origem do mal no mundo — a narrativa de Adão e Eva traz a mesma mensagem (Gn 2,
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15-25; 3, 1-24). Salta aos olhos a repetição de alguns desses elementos fundamentais
em sociedades distintas. Naturalmente, há muitos elementos diferentes entre cada
uma delas; percebe-se, porém, a existência de um núcleo significativo de verdades e
convicções compartilhadas de época para época e de povo para povo.
A filosofia propriamente dita surge e se distingue das concepções de mundo
quando o homem começa a explicar por meio da razão o que vem a ser estas ver-
dades compartilhadas pela humanidade. Aristóteles diz na Metafísica que a filosofia
surgiu da admiração e também do desejo de conhecer. É famosa a sua frase: “todos
os homens desejam saber” (Met.1, c. 1; 980a); é uma inclinação do ser humano a bus-
ca pelas causas do que acontece.
A procura da verdade é despertada pela admiração; esta última surge de certa
ignorância. A partir do momento em que o homem busca explicar o que ocorre à sua
volta por meio do emprego da inteligência — ainda que existam as influências da
cultura e sociedade na qual está inserido — pode-se dizer que há filosofia. É nisto
mesmo que ela consiste: na tentativa de explicar a realidade através da razão.
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SAIBA MAIS
Estes conceitos podem ser melhor ilustrados com um exemplo: a água em um
copo, naturalmente, possui uma temperatura atual; potencialmente, contudo,
o líquido está em uma temperatura mais alta ou mais baixa, já que pode cair
— chegando mesmo a zero graus — ou subir, atingindo os cem graus que o
fariam evaporar. Sabe-se que a água congela a zero graus e torna-se vapor
aos cem: esta é uma potencialidade própria da água.
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2 A TEORIA DAS QUATRO CAUSAS
2.1 O ente
A teoria das quatro causas foi proposta na Física de Aristóteles, que posterior-
mente a retomou e desenvolveu em sua Metafísica. Para melhor entendê-la, é impor-
tante saber o que se pretende dizer ao usar a palavra “ente”: trata-se daquilo que é.
Tudo o que existe é um ente.
Ressalta-se que há entes ficcionais e reais. Dom Quixote é um ente ficcional; o
unicórnio é um ente mitológico. A pessoa que um homem cumprimenta ao ir para o
trabalho, por outro lado, é um ente real, assim como o é o carro utilizado por ele no
percurso; nesse mesmo carro, há vários elementos que constituem entes reais e as-
sim sucessivamente.
O homem descobre o verdadeiro sobre a natureza do ente ao compreender suas
causas. Como será visto, todas as perguntas que podem ser feitas a respeito das coi-
sas buscam saber precisamente uma das quatro causas identificadas por Aristóteles,
já que estas se relacionam com toda a realidade que há.
A busca empreendida por este filósofo foi bastante ambiciosa: elencar as noções
fundamentais que servem para dar o fundamento de todas as coisas. Como já discu-
tido, trata-se de uma abordagem diferente daquela feita pela biologia ou pela quími-
ca. Naturalmente, um cientista pode refletir sobre esses temas; todavia, caso o faça,
estará agindo como filósofo — e os grandes cientistas de algum modo souberam
relacionar importantes noções filosóficas ao seu trabalho.
comida não é afetada propriamente pelo preço do ingrediente, para um mesmo nível
de qualidade deste.
Por outro lado, se em vez do preço, a qualidade do tempero for maior, seu efei-
to será melhor percebido na preparação da receita. É importante notar que há uma
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relação de proporção entre o efeito e a causa: quanto melhores forem as causas,
maiores serão as chances do efeito produzido ser também melhor.
Há, portanto, proximidade entre causa e efeito. Uma das maneiras de conhecer
as causas é, inclusive, por meio de seus efeitos. Esta, contudo, não é a melhor forma:
um pintor capaz de produzir belíssimas obras poderia traçar um rabisco no papel, e
faria dele um juízo muito imperfeito aquele que julgasse suas habilidades por esse
rabisco. Sabendo algo dos efeitos, é possível dizer algo sobre as causas; todavia, não
é possível fazê-lo perfeitamente.
Ainda que seja legítimo tentar chegar às causas através de seus efeitos — em al-
guns casos, este é mesmo o único meio disponível —, o conhecimento mais perfeito
se dá através da própria causa. Conhecendo-a diretamente, é possível prever seus
efeitos com exatidão.
Quatro são as causas: material, formal, eficiente e final. Estas dividem-se entre
causas intrínsecas ao ente (material e formal) e extrínsecas ao ente (eficiente e final).
As duas primeiras explicam a constituição dos seres ou entes, ao passo que as últi-
mas explicam seu movimento e mudança. Há relações de dependência e preponde-
rância entre elas, como será melhor visto adiante. Ademais, nos variados entes, todas
as causas estão presentes de maneira diversa.
Para a psicologia, o conhecimento das quatro causas é particularmente impor-
tante no entendimento de desordens e problemas humanos. A noção das causas é
importante para analisar tais questões de forma completa, evitando as dificuldades
ou mesmo danos que seriam causados por entendimentos unilaterais e amputados
de seus aspectos.
SAIBA MAIS:
Note-se que o que ocorre nestes casos é um ciclo no qual a materialidade se
mantém, mas a matéria é a cada momento organizada segundo uma forma
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2.4 Causa material
A causa material talvez seja a mais simples de entender: é aquela referida quando
o homem se pergunta de que algo é feito. Uma estátua grega é feita de mármore;
uma mesa é feita tipicamente de madeira. A matéria é pura potência e só será um
ente material propriamente dito quando for atualizada pela forma.
A madeira, antes atualizada como um pedaço de madeira, sofre uma modificação
que dá a ela forma de mesa. Caso essa mesa seja queimada, por exemplo, sua forma
será atualizada e esta se transformará em cinzas.
REFLITA:
Não existe, de fato, “matéria-prima”, ou seja, a matéria não atualizada ou deter-
minada por qualquer forma. Este é um conceito puramente intelectual, já que
na realidade nunca se viu matéria sem forma alguma. É importante destacar,
contudo, que mesmo uma matéria disposta de determinado modo pode ser-
vir de causa material para realidades muito diferentes. É curioso — e até belo!
— pensar que mesmos os entes vistos pelo homem como os mais materiais,
como um carvão, uma pedra ou um copo d’água, não são apenas matéria: ain-
da que dois entes materiais sejam formados pelos mesmos componentes, as
formas os distinguem e os atualizam de modo variado.
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que será, então, sua causa eficiente. Um movimento produz outro, de modo que há
causas mais próximas ou mais distantes de um determinado efeito.
Há uma ideia importante subjacente à noção de causa eficiente: a de que as coi-
sas não se movem por si mesmas. É necessário, portanto, que algo as mova. Nos seres
vivos, é possível buscar explicações biológicas para o movimento; todavia, mesmo
essa sucessão de causas suficientes do ponto de vista fisiológico levaria a alguma es-
pécie de princípio vital. Trata-se de um salto para o aspecto filosófico — a alma — que
não é aceito pelos materialistas. É importante ressaltar, no entanto, que este passo
não diminui a importância da explicação científica — somente destaca sua insuficiên-
cia como explicação isolada.
Há vida no homem quando seu coração bate, mas por que seu coração bate?
Pode-se dizer que há um conjunto de condições fisiológicas que permitem o bom
funcionamento deste órgão, o que é verdade. Mas por que em um corpo idêntico a
outro, um pode ter vida e outro não? Parece haver algum princípio intrínseco do pró-
prio ente que originou este movimento: este seria a alma.
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O que isto significa? Diz-se que a substância é o ser em concreto, que existe em
si mesmo; não existe, portanto, somente em outro ser. O acidente, por outro lado, é
aquilo que não existe por si mesmo, mas apenas em outro ser. A forma acidental é
aquela que se une a um sujeito autônomo, a substância.
É importante estabelecer estas definições para melhor entender o que é uma
mudança substancial. As transformações substanciais são aquelas nas quais a ma-
téria passa a integrar um novo ente diferente do anterior: há, desse modo, uma outra
substância que ela passa a compor. A madeira que vira cinza sofreu uma mudança
em substância; o homem que perde um dedo sofre uma mudança acidental (isto é,
não perde sua substância de homem após esta transformação).
Ilustrando ainda com outro exemplo: se uma maçã era verde e se torna vermelha,
trata-se de uma mudança acidental, pois sua substância enquanto maçã se man-
tém; por outro lado, se esta for comida, sofre uma mudança substancial — já não há
mais maçã.
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3 BONDADE E VERDADE
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é próprio. Note-se que a palavra “saudável” costuma ser utilizada tanto para indicar o
que causa saúde como para denotar aquilo que manifesta o efeito da saúde.
Considera-se, por exemplo, que uma temperatura corporal de 36,7° é saudável.
Naturalmente, a temperatura em si mesma não pode ser dita saudável — trata-se
simplesmente de uma temperatura como qualquer outra. Por que, então, é assim
designada? Porque uma pessoa saudável com esta temperatura não está com febre,
e a febre é um indicativo de que algo no corpo não vai bem.
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O bem e o mal são objetivos no sentido de que há respostas certas ou erradas
para atingir certa finalidade. Estas são realidades que persistem, ainda que o homem
decida fazer algo contra a natureza da coisa e impedir que ela atinja aquilo para o
qual se inclina — o que pode, na verdade, ser necessário em casos nos quais se tem
em vista outro bem maior.
Um exemplo esclarecedor desta última situação é o do homem que impede que
seu cachorro ataque um convidado que entra em sua casa à noite. Ao fazê-lo, o su-
jeito impede que a natureza do cachorro atinja a sua finalidade própria, considerando
para isso que zelar pela vida de seu convidado é um bem maior.
Note-se mais uma vez que, embora os conceitos de bem e mal possam variar de
acordo com a situação, não se trata de algo arbitrário; pode-se considerá-los relati-
vos somente no sentido de que estão numa relação específica dada por uma circuns-
tância concreta, mas não no sentido de não haver para eles um fundamento real.
A dúvida sobre formar ou não uma família, por exemplo, não possui solução uní-
voca: a depender da circunstância específica, qualquer das alternativas pode ser le-
gítima e boa. Uma vez feita a escolha, no entanto, agir em desacordo com suas con-
sequências não terá nenhum efeito além de gerar sofrimento.
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3.6 O bem absoluto
Aristóteles, Platão e os adeptos da tradição de pensamento medieval afirmam
que Deus é o único bem absoluto. Caso o homem O conhecesse, perceberia imedia-
tamente sua perfeição e não consideraria deixar de escolhê-Lo.
Com as outras realidades, no entanto, não é assim. Seria, aliás, incorreto concluir
a partir da noção de objetividade do bem que há uma única escolha correta que
deve ser objetivamente preferida por todos os indivíduos em cada situação. Afinal,
os sujeitos são diferentes, em termos de temperamento, história, preferência e com-
promissos. Para uns, casar pode ser a melhor opção; para outros, não. O mesmo vale
para inúmeras decisões de maior ou menor relevância. A divindade é o bem absoluto;
porém, no mundo não se vê a Deus diretamente, vê-se apenas Seu reflexo nas várias
coisas.
É importante para o profissional de saúde mental ter em vista as nuances desta
questão. Há, de fato, um leque de dilemas que são opináveis e para os quais pode-se
respeitar preferências individuais sem prejuízo. Porém, isso não significa que todas as
opções sejam igualmente boas sempre. Por isso, há vidas felizes e plenas, enquanto
outras podem tornar-se tragicamente incompletas, tristes e fracassadas.
REFLITA:
A alma sempre é unida a um corpo concreto com suas próprias características
e particularidades. É fundamental ter simultaneamente em vista a dignida-
de que caracteriza todo ser humano e as diferenças individuais entre cada
pessoa. Há, nos homens, variadas cores de cabelo, de olhos, de pele, bem
como variados temperamentos e capacidades de inteligência. Algumas pes-
soas tenderão mais à saúde que outras. Cada humano é irrepetível, ainda que
compartilhe da mesma forma dos demais.
Em seu livro Ética a Nicômaco, Aristóteles destaca que a finalidade mais nobre
para o ser humano é a própria visão da divindade; todavia, tal contemplação não é
possível neste mundo. A felicidade seria possível, então, em uma forma precária e
incompleta. Tomás de Aquino, que aborda a mesma temática utilizando-se do termo
“bem-aventurança”, aceita a imperfeição da felicidade humana no mundo, mas diz
que a contemplação do divino é possível no céu.
Tais exemplos teológicos estão profundamente relacionados com a noção de fi-
nalidade: ver a Deus é a finalidade última porque a faculdade mais nobre do homem
é a razão e o objeto mais alto ao qual a inteligência pode se dedicar é a própria
divindade.
O indivíduo, assim, terá suas inclinações e tendências próprias dadas pela for-
ma da humanidade, mas também suas inclinações individuais dadas pela sua cir-
cunstância específica e única. Ao final, seu caminho será bom se, com todas as suas
FILOSOFIA
SAIBA MAIS:
As virtudes intelectuais, que aprimoram a razão humana e são desenvolvidas
pela educação, são cinco e dividem-se ainda em dois tipos: três são as ditas
especulativas teóricas, para as quais o conhecimento em si mesmo é a única
finalidade, e duas práticas, que abrangem conhecimentos que são utilizados
para fazer algo. As especulativas teóricas são a ciência, a sabedoria e a inteli-
gência; as práticas são a arte e a prudência.
4.2 Ciência
Esta virtude (do grego ἐπιστήμη, ou episteme) possui como característica principal
o fato de consistir em um conhecimento universal e necessário. No caso da física, por
exemplo, é possível determinar a temperatura de solidificação e de evaporação da
água de acordo com uma fórmula fixa que tem como variável a pressão.
As conhecidas temperaturas de zero graus para solidificação e de cem graus para
evaporação da água funcionam nas chamadas CNTP (condições normais de tempe-
ratura e pressão); no entanto, por meio desta fórmula, é possível determinar as tem-
peraturas de mudança de estado da água para quaisquer níveis de pressão. Trata-se
de uma fórmula que estabelece uma generalização que sempre funcionará.
O mesmo se aplica para a lei da gravidade, que estabelece uma relação fixa e uni-
versalmente válida entre um grupo de variáveis, ou para a capacidade de condução
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4.3 Sabedoria
A ciência costuma dizer respeito ao que é particular, tratando de certo recorte
da realidade e não desta como um todo; reside nesta característica sua principal
diferença em relação à sabedoria. Esta última virtude, por sua vez, volta-se para os
objetos mais elevados e valiosos, envolvendo a busca pelo conhecimento das cau-
sas primeiras e do que é fundamental. A sabedoria — em grego σοφία ou sophia — é
justamente a filosofia, enquanto fornecedora dos conhecimentos que posteriormente
são utilizados nos variados campos do saber.
A sabedoria, portanto, é o campo das explicações mais profundas e gerais que
podem ser alcançadas pela razão. Não obstante, a relação entre o sábio e o cientista
é de complementaridade e não de competição: o filósofo oferece seus conhecimen-
tos para uso do cientista. A própria ideia de que o ser humano é capaz de conhecer a
realidade é um pressuposto filosófico reconhecido por qualquer ciência. O contrário
também ocorre: por vezes, os conhecimentos trazidos pela ciência provocam novas
reflexões filosóficas.
4.4 Inteligência
A inteligência (em grego νοῦς ou nous) diz respeito à faculdade da alma de intuir
os princípios indemonstráveis. Trata-se, portanto, de um hábito relativo aos primeiros
princípios, que não são deriváveis por constituírem as fontes do conhecimento e da
verdade. Um de seus exemplos é a proposição de que é preciso fazer o bem e evitar
o mal: a própria ideia de bem e de mal já permite a obtenção desta conclusão. O bem
é a perfeição e o mal é o irracional e absurdo; naturalmente se sabe, assim, que se
deve evitar o mal e buscar o bem. O ser humano não consegue fazer o mal, enquanto
mal e por ser mal.
Mesmo aqueles que “buscam o mal”, na verdade, assim o fazem porque vêem nis-
so um bem. O homem sempre age buscando algo que crê que possa trazer-lhe algo
positivo. Naturalmente, é possível errar nas escolhas que são feitas visando este bem;
todavia, mesmo no caso do homem que erra a ponto de atentar contra a própria vida,
por exemplo, existe a busca desordenada pelo bem que seria o cessar do sofrimento.
Os primeiros princípios não são provados por nada; ao contrário, são a base para
provar todo o resto. Se tudo precisasse ser provado por algo anterior, haveria uma
cadeia infinita de proposições: A seria provado B, que seria provado por D e assim
sucessivamente, sem jamais chegar a algum conhecimento que seja, de fato, confi-
ável. Felizmente, o homem alcança alguns princípios que não necessitam de prova
alguma, pois se impõem pela sua própria natureza. São como os axiomas dos quais
serão derivadas as demais proposições.
4.5 Arte
A arte ou técnica (do grego τέχνη ou techne) é a reta razão para produzir delibe-
radamente algo exterior ao indivíduo; o bem desta prática é determinado pelo bem
daquilo que foi feito. Se o que foi feito é bom, a produção foi boa. Não se pergunta,
portanto, a respeito do efeito daquela ação no interior do próprio agente.
Uma pessoa que compre um pão pode julgar o emprego da técnica utilizada para
produzi-lo como bom ou ruim somente observando o próprio pão; não é necessário
para tanto investigar a bondade das intenções do padeiro. Em termos de arte ou téc-
nica, o que importa é o resultado: se o resultado é bom, a técnica foi bem empregada.
Trata-se, portanto, da produção de coisas (não necessariamente materiais) que
requerem o talento do artista. A arte da marcenaria para produzir ótimos móveis, a
do músico para produzir belas músicas, do escritor para produzir bons livros ou a do
retórico para produzir discursos convincentes.
A técnica permite que o artista faça, mas não necessariamente dá regras absolu-
tas e de funcionamento universal. Nas ciências, é possível estabelecer fórmulas que
associam mudanças de estado da água a certas temperaturas e pressões fixas. Nas
coisas humanas e nas coisas concretas, não é possível obter este tipo de exatidão.
Um cozinheiro, por exemplo, deve considerar em suas preparações o estado dos
ingredientes, o gosto dos que provarão o prato, a ocasião e uma série de outras su-
tilezas inexatas para exercer bem sua arte. Trata-se, portanto, de considerar as cir-
cunstâncias concretas e adaptar-se visando produzir o melhor produto viável nestas
mesmas condições.
Naquilo que é humano e naquilo que é concreto, e neste âmbito é incluída a pró-
pria psicologia, não há exatidão ou relações necessárias; figura, ao contrário, o con-
tingente, domínio da técnica.
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4.6 A prudência
Esta virtude (do grego φρόνησῐς ou phronesis) trata-se da reta razão no agir. Ao
passo que a arte implica na reta razão na produção de algo exterior, a prudência diz
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respeito à aplicação da reta razão nas ações, tendo em vista o objetivo de viver bem.
Importa, neste caso, não propriamente o efeito exterior do ato, mas dizer se este con-
tribui para tornar o agente uma pessoa melhor.
Pela prudência, portanto, busca-se o aprimoramento não enquanto artista ou téc-
nico, mas enquanto ser humano. A prudência é a razão que ilumina a conduta do
homem de modo que esta possa ser virtuosa. Neste caso, a bondade nas intenções
do agente importa; é a melhor forma de agir, não somente de fazer. Naturalmente,
agir bem implica em procurar realizar uma dada tarefa do melhor modo possível; no
entanto, somente produzir um bom resultado com o próprio trabalho não é suficiente
neste caso. São necessários, também, os bons motivos.
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5 GRAUS DE CERTEZA
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REFLITA
As próprias ciências relativas à natureza, como a química, física ou biologia
trabalham com modelos extraídos de observações da realidade, mas que são
eles próprios abstrações. Com as devidas adaptações, é possível explicar bem
o que ocorre no mundo: na física, por exemplo, é possível usar fórmulas para
prever o comportamento de algo que está em movimento retilíneo uniforme;
no entanto, nada está de fato em movimento retilíneo uniforme de modo per-
feito, devido às inúmeras forças que influenciam o movimento e impedem sua
perfeição.
Naturalmente, as aproximações feitas pelos cientistas são boas e muito úteis. Por
meio delas, é possível estabelecer previsões e explicar certas relações. Seria incorre-
to, no entanto, confundir tais modelos com a realidade em toda a sua complexidade.
Tome-se por exemplo o caso do engenheiro: embora este seja um profissional
versado nas ditas ciências exatas e familiarizado com diversos modelos científicos,
seu trabalho se dará com o mundo prático. Cada construção específica exigirá, por
isso, projetos que serão ajustados de acordo com a acurácia do olhar do profissional.
A engenharia é um saber próximo e incompleto, não absoluto; isto é, uma técnica.
Assim o são, também, a medicina e a advocacia, por exemplo.
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de suas obras, mostrando aspectos que fundamentam as afirmações propostas; no
entanto, não há fórmula que contenha uma relação exata e quantificável para dizer
quão bom é Machado de Assis em comparação a Shakespeare.
A proposta de Descartes para a reflexão filosófica incutiu na modernidade o senso
de que aquilo que não pode ser provado deve ser descartado, independentemente
do objeto analisado. Para muitas pessoas, causava estranhamento a exigência de
julgar como conhecimento somente aquilo que pudesse ser respaldado por provas
lógicas, claras e irrefutáveis. O chamado Círculo de Viena, no início do século XX,
constituiu-se em um grupo de filósofos que visavam reconceituar o empirismo — o
conhecimento obtido pelos sentidos — e a lógica como os únicos saberes efetivos.
O resultado deste esforço foi uma profunda reação contra a metafísica, pauta-
da pela crença de que todo o conhecimento que não pudesse ser percebido pelos
sentidos ou que não derivasse de uma verdade lógico-matemática não seria uma
verdade que merecesse consideração. Tal recorte terminou por produzir uma visão
mutilada do ser humano: este só poderia ser entendido segundo o âmbito abstrato
sistematizável de forma científico-matemática.
Além do cientificismo, a não aceitação de verdades compreensíveis por métodos
de fora da esfera de influência das ciências exatas deu lugar também ao naturalismo,
no sentido desta palavra que se refere à crença de que a realidade só abrange ele-
mentos apreensíveis pelos sentidos.
A escalada da valorização da racionalização de toda a realidade avançou até ir-
romper em seu extremo oposto: a negação da própria racionalidade, verificada em
autores como Friedrich Nietzsche. O erro anterior, do apego irrestrito à lógica analíti-
ca, deu lugar então ao assentimento ao absurdo.
O casamento é sempre uma aposta. É inevitável que, no decurso dos anos, ambos
os cônjuges mudem. A natureza desta mudança jamais pode ser inteiramente pre-
visível: é precisamente na solidez do compromisso permanente do matrimônio que
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o homem pode estabelecer a fixidez mínima para construir uma família e toda uma
vida. Naturalmente, desta incerteza não se supõe que a escolha do futuro marido ou
esposa seja arbitrária. A seleção da pessoa com quem se deseja casar possui grande
importância, mesmo com os riscos inerentes a qualquer escolha.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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