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Isto não é Filosofia

Curso Encontre Sua Voz Política


Módulo 3 – Ideias Políticas Fundamentais
Prof. Vitor Lima

Sumário
1. Teoria e ideologia................................................................................................................... 4
Teoria ....................................................................................................................................... 4
Ideologia................................................................................................................................... 5
2. Democracia ............................................................................................................................. 7
Três tradições históricas........................................................................................................ 7
Democracia liberal e social ................................................................................................... 8
Democracia e teoria das elites ............................................................................................. 9
3. Demagogia e Populismo ..................................................................................................... 11
Demagogia ............................................................................................................................ 11
Populismo .............................................................................................................................. 11
4. Autoritarismo e totalitarismo ............................................................................................... 13
Autoritarismo ......................................................................................................................... 13
Totalitarismo .......................................................................................................................... 13
5. Liberalismo e neoliberalismo .............................................................................................. 15
De Locke ao Iluminismo ...................................................................................................... 15
De Bentham ao séc. XIX ..................................................................................................... 16
De Mill ao séc. XX ................................................................................................................ 17
Do liberalismo clássico ao social-liberalismo ................................................................... 18
O neoliberalismo ................................................................................................................... 18
6. Capitalismo ........................................................................................................................... 20
Origens do conceito ............................................................................................................. 20
Interpretação marxista do capitalismo........................................................................... 20
Interpretação weberiana do capitalismo ....................................................................... 21
Aspectos controversos ........................................................................................................ 22
7. Anarquismo, Libertarianismo e Anarcocapitalismo......................................................... 23
Anarquismo ........................................................................................................................... 23
Libertarianismo ..................................................................................................................... 25
Anarcocapitalismo ................................................................................................................ 25
8. Nacionalismo e Patriotismo ................................................................................................ 26
Nacionalismo ......................................................................................................................... 26
Principais teorias .............................................................................................................. 26
Patriotismo ............................................................................................................................. 27
Patriotismo e Nacionalismo ................................................................................................ 27

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9. Marxismo ............................................................................................................................... 29
Crítica à teoria hegeliana do Estado ................................................................................. 30
Teoria geral do Estado ........................................................................................................ 30
Estado burguês ..................................................................................................................... 31
Estado de transição ............................................................................................................. 31
Extinção do Estado .............................................................................................................. 31
10. Socialismo e Comunismo ................................................................................................. 33
Socialismo ............................................................................................................................. 33
As teorias socialistas ........................................................................................................... 34
Socialismo utópico............................................................................................................ 35
Anarquismo ........................................................................................................................... 35
Socialismo científico ou comunismo.............................................................................. 35
Socialismo e Comunismo .................................................................................................... 35
11. Fascismo ............................................................................................................................. 37
Contexto histórico ................................................................................................................. 37
Muitas definições .................................................................................................................. 38
Quem é fascista hoje ........................................................................................................... 40
12. Nazismo............................................................................................................................... 41
Contexto histórico ................................................................................................................. 41
Nazismo e socialismo (o nazismo é de esquerda?) ....................................................... 42
13. Social-democracia ............................................................................................................. 45
Conceito ................................................................................................................................. 45
História ................................................................................................................................... 45
14. Direita e Esquerda ............................................................................................................. 47
Definição inicial ..................................................................................................................... 47
2. Dimensão histórica .......................................................................................................... 48
3. Diferenças quanto a visões de mundo ......................................................................... 48
3.1 Política ......................................................................................................................... 48
3.2 Economia .................................................................................................................... 48
3.3 Sociedade ................................................................................................................... 49
4. Diagramas políticos ......................................................................................................... 50
4.1 Plano de Pournelle (1963) ........................................................................................ 50
4.2 Plano de Nolan (1969) .............................................................................................. 51
4.3 Compasso político ..................................................................................................... 51

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15. Conservadorismo e Progressismo .................................................................................. 53


Conservadorismo ................................................................................................................. 53
Doutrinas centrais............................................................................................................. 54
Conservadorismo e ideologia ......................................................................................... 55
Progressismo ........................................................................................................................ 55
16. Coletivismo e Individualismo ............................................................................................ 57
Bibliografia ................................................................................................................................. 59

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1. Teoria e ideologia
Teoria

A palavra “teoria” vem do grego – theoria deriva de theion, divino, e orao, visão.
Etimologicamente, então, significa contemplar aquilo que é divino. Por derivação de
sentido, designa a contemplação daquilo que há de mais essencial, mais significativo,
mais importante na realidade.
O procedimento teórico, então, parte de interrogações sobre como se estrutura
o objeto de estudo. No que diz respeito à política, pode fazer isso de modo filosófico e
de modo científico1.
A Filosofia Política compreende três tipos de investigação:

• A melhor Forma de Governo.


• O fundamento do Estado e a justificação da obrigação política.
• A essência da política, na distinção entre ética e política.
Respectivamente, estas três categorias são representadas por três livros:

• Utopia (1516), de More.


• Leviatã (1651), de Hobbes.
• O príncipe (1513), de Maquiavel.
A Ciência Política é uma investigação no campo da vida política, capaz de
satisfazer a estas três condições:

• O princípio de verificação ou de falsificação como critério da aceitabilidade


dos seus resultados;
• O uso de técnicas da razão que permitem dar uma explicação causal em
sentido forte ou mesmo em sentido fraco do fenômeno investigado;
• A abstenção de juízos de valor, a assim chamada “avaloratividade”, isto é,
ausência de discursos sobre o que deve ser, apenas sobre o que é.
Comparando a Filosofia Política com a Ciência Política, percebe-se que não
possuem características idênticas entre si. A Filosofia,

• como investigação da melhor Forma de Governo, não apresenta caráter


avalorativo – ao contrário, diz o que deve e o que não deve ser adotado;
• como investigação do fundamento último do poder, não deseja explicar
causalmente o fenômeno do poder, mas justificá-lo – isto é, argumentar e
convencer a respeito de uma tese;
• como investigação da essência da política, escapa a toda a verificação e
todo o falseamento, porque vai em busca de uma definição, que, por si só,
não é verdadeira, nem falsa.
Nesse sentido, fazer teoria não implica agir de modo neutro ou imparcial – afinal,
a Filosofia Política pode ser teórica, mas não é neutra, nem imparcial. Fazer teoria é tão

1
BOBBIO, 1986 p. 55.

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somente investigar os aspectos mais fundamentais da realidade, seja de modo


científico, seja de modo filosófico.
Em outras palavras, a teoria pode ser descritiva, quando seu objetivo é
somente descrever a realidade, sem julgá-la – é o que faz a Ciência. Porém, também
pode ser normativa, quando sua finalidade é também prescrever como deveríamos nos
comportar perante a realidade e qual aspecto da realidade é melhor, pior, justo, injusto
– é o que faz a Filosofia.

Ideologia2

A ideologia é uma elaboração intelectual (descritiva ou normativa do


funcionamento social), elaborada a partir de um ponto de vista, incorporada pelo senso
comum como se fosse o ponto de vista.
Na perspectiva marxista – a mais famosa e usada – trata-se de um ocultamento
da realidade, em que o ponto de vista da classe dominante é adotado como se fosse a
própria realidade.
Por exemplo, a explicação e a justificação da pobreza. O pobre se encontra
na condição de pobreza, segundo a ideologia, por sua própria responsabilidade
individual. Passam a não ser importantes fatores históricos, econômicos, políticos e
sociais.
A ideologia oculta a divisão existente entre as pessoas e os grupos e faz parecer
que o estado de coisas atual é simples resultado da vontade de cada um. Sua função
primordial é fazer com que cada um aceite as condições atuais em que vive,
considerando-as naturais e, portanto, moralmente justificadas e metafisicamente
explicadas.
A ideologia opera invertendo os efeitos e as causas, isto é, o que é causa
passa a ser visto como efeito, e o que é efeito passa a ser visto como causa.
Ideologicamente, acreditamos que a mulher é um ser frágil, sensitivo, intuitivo,
feito para as doçuras do lar e da maternidade e que, por isso, foi destinada à vida
doméstica, ao cuidado do marido e dos filhos. Ideologicamente, acreditamos no ser
feminino, que seria a causa de as mulheres serem como são.
Historicamente, porém, o que ocorre é o contrário. Na divisão do trabalho,
ocorreu uma divisão sexual, conferindo menos poder à mulher no âmbito público e lugar
de destaque no âmbito privado. Entendeu-se este como subordinado àquele: auxiliar,
complementar. Com o número de homens para o trabalho e para a guerra ficou cada
vez mais necessário, a função reprodutora tornou-se imprescindível, colocando ênfase
na maternidade como sua principal característica.
A partir desse arranjo, as narrativas de explicação e justificação surgem para
consolidar o estado de coisas como natural – produzidos por divindades, pela natureza
e pela razão. Produz-se o ser feminino – não como causa, mas como consequência das
condições materiais.

2
CHAUI, 2002.

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Invertida a ordem das coisas, a ideologia produz um imaginário social,


mediante a imaginação reprodutora humana.
Em primeiro lugar, a ideologia transforma a experiência social em um conjunto
coerente, lógico e sistemático de ideias que funcionam em dois registros:
1. Representações da realidade (sistema explicativo)
2. Princípios e normas de comportamento (sistema prescritivo)
A ideologia assegura a todos modos de entender a realidade e de se comportar
diante desse entendimento, eliminando as dúvidas, as ansiedades e as
contradições da vida social – sem mencionar as contradições entre a vida
propriamente dita e as ideias que deveriam explicá-las.
Ideologicamente, acreditamos que constar na lei que todos são iguais perante
a lei, ser eleitor e pagar impostos são suficientes para todos serem cidadãos.
Materialmente, no entanto, alguns disfrutam mais da cidadania que outros –
alguns tem mais direitos que outros, alguns – parafraseando o livro “A revolução dos
bichos”, de George Orwell, são mais iguais que outros.
Constituído o imaginário a partir da inversão, importa silenciar tudo o que pode
tornar incoerente a ideologia instituída. Se tudo fosse dito, o conjunto de crenças
perderia seu poder explicativo e prescritivo.
Ideologicamente, alguns acreditam que a homossexualidade é uma perversão e
uma doença grave. O que está sendo silenciado pela ideologia?
Historicamente, a reprodução da força de trabalho se faz pelo aumento do
número de trabalhadores. A procriação, nesse cenário, é fundamental para o aumento
do capital que precisa de mão de obra. Por esse motivo, toda sexualidade que não se
realizar com finalidade reprodutiva é considerada anormal, perversa e doentia. Se
declarasse isso abertamente, no entanto, a ideologia perderia sua força.

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2. Democracia3
Três tradições históricas

Na teoria da democracia confluem três tradições históricas: a teoria clássica


das três Formas de Governo, a teoria medieval da soberania popular e a teoria moderna
das duas Formas de Governo.
Na teoria clássica, quatro nomes se destacam: Heródoto (485-425 a.C.),
Platão (428-348 a.C.), Aristóteles (384-322 a.C).
Heródoto (III, 80-83) narra a primeira disputa entre as três Formas de Governo
de que temos notícia. Otane, Megabizo e Dario discutem sobre a futura Forma de
Governo da Pérsia. Megabizo defenda a aristocracia; Dario, a monarquia, Otane, a
isonomia – uma forma de governo popular em que prevalece a igualdade perante a lei.
Diz este último: “Como poderia a ser coisa perfeita, se lhe é lícito fazer tudo o
que deseja sem o dever de prestar contas?”
E a resposta dos defensores das formas alternativas respondem: “Não há coisa...
mais estulta e mais insolente que uma multidão incapaz.” Como pode governar bem
“aquele que não recebeu instrução nem conheceu nada de bom e de conveniente e que
desequilibra os negócios públicos intrometendo-se sem discernimento, semelhante a
uma torrente caudalosa?”
Platão, em A República, descreve cinco Formas de Governo: aristocracia,
timocracia, oligarquia, democracia e tirania. Para ele, apenas a aristocracia é
recomendável. A democracia “nasce quando os pobres, após haverem conquistado a
vitória, matam alguns adversários, mandam outros para o exílio e dividem com os
remanescentes, em condições paritárias, o Governo e os cargos públicos, sendo estes
determinados, na maioria das vezes, pelo sorteio.” (557a)
Aristóteles, em Política, distingue três formas puras e suas respectivas formas
corruptas, conforme o detentor do poder governa no interesse geral ou no interesse
próprio: o governo de um, de poucos e de muitos. Quando puras, as formas são
respectivamente, chamadas de monarquia, aristocracia e politeia. Quando
corrompidas, são chamadas, de tirania, oligarquia e democracia.
Com poucas exceções, é a tripartição aristotélica que se torna mais célebre na
tradição ocidental.
Na teoria medieval, os juristas elaboraram a teoria da soberania popular,
partindo de algumas conhecidas passagens do Digesto, tiradas de Ulpiano
(Democracia I, 4, 1), segundo o qual o príncipe tem autoridade porque o povo lhe deu.
Além dele, Juliano (Democracia I, 3, 32), para quem o povo cria o direito não apenas
mediante o voto, que dá origem às leis, mas também por meio dos costumes.
Nesse sentido, não importa qual fosse o efetivo detentor do poder soberano, a
fonte originária deste poder seria sempre o povo. Surge, assim, a distinção entre
titularidade e exercício do poder, desde então uma das bases do princípio

3
BOBBIO, Norberto, “Democracia” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 319-329

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democrático. Além disso, cabe ao povo e não só às instituições regular a conduta social,
por meio dos usos e costumes e não apenas das leis oficiais.
É Marsílio de Pádua (1275-1343), em Defensor pacis, que diz que dos dois
poderes fundamentais do Estado – o legislativo e o executivo – o primeiro pertence
exclusivamente ao povo e subordina o segundo, que o povo delega a outros sob forma
de mandato revogável.
Na teoria moderna, o debate acontece em termos de reino ou principado e
república.
Maquiavel (1469-1527), em O príncipe, proporá que todos os Estados se
dividem em repúblicas ou principados. Por república, o autor entende os governos
baseados em assembleias. Portanto, nesse rótulo, coloca tanto as aristocracias, quanto
as democracias.
Montesquieu (1689-1755), em O espírito das leis, retoma os três conceitos, de
inspiração aristotélica: monarquia, república e despotismo. Combina a definição de
Aristóteles com a de Maquiavel, inserindo um terceiro conceito. Define “despotismo”
como o governo de um só “sem lei, nem freios” – isto é, uma forma degenerada de
monarquia.
Rousseau (1712-1778), em Do contrato social, faz com que o ideal republicano
e o democrático se fundam na doutrina da soberania popular. É por meio da “vontade
geral” – intransferível, indivisível e infalível – que o poder de fazer leis deve ser
conduzido. Funda-se, assim, a política no ideal igualitário e consensual, contra a
desigualdade dos regimes monárquicos e despóticos.

Democracia liberal e social

Ao longo do séc. XIX, a discussão em torno da democracia se desenvolveu a


partir das doutrinas políticas do tempo: liberalismo e socialismo
Do ponto de vista liberal, costuma-se remeter a origem à Benjamim Constant
(1767-1830), em A liberdade dos antigos e dos modernos.
Para o filósofo, a liberdade dos modernos, que deve ser promovida e
desenvolvida, é a liberdade individual em sua relação com o Estado. Trata-se das
liberdades civis e políticas, ainda que não necessariamente estendida a todos. A
liberdade dos antigos é aquela entendida como participação direta na formação das
leis por meio da assembleia de cidadãos, cada vez menos possível nos estados
modernos.
Nesse sentido, foi-se firmando entre escritores liberais, de Alexis de
Tocqueville (1805-1859) a John Stuart Mill (1806-1873), que a única forma de
democracia era a democracia representativa, baseada em direitos fundamentais:
liberdade de pensamento, de religião, de imprensa, de reunião etc. A participação
política é definida no seguintes termos: votar, eleger-se, expressar-se publicamente,
reunir-se e associar-se para influir na política.
Em geral, a democracia da perspectiva liberal corre em duas direções:
alargamento do direito ao voto, ainda que gradual, e multiplicação dos órgãos

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representativos. Inicialmente, apenas poucos cidadãos tinham direito de eleger seus


representantes, com critérios baseados na riqueza, na propriedade, no gênero, na etnia.
Progressivamente essa condição vai mudando até chegar no sufrágio universal, isto
é, no direito ao voto a todos. Originalmente, a representação se dava apenas em
algumas assembleias até que, aos poucos, foi conquistando todas as assembleias e,
inclusive, a escolha do representante maior do poder executivo.
Por seu turno, do ponto de vista do socialismo, o ideal democrático é um
elemento integrante, mas não constitutivo. Isso porque sua essência é a revolução das
relações econômicas, visando a emancipação política mais fundamental do homem. Se
a forma de governo tiver que ser menos democrática, no sentido formal, então
historicamente o socialismo não precisa ser democrático.
Na teoria de Marx (1818-1883) e Engels (1820-1895), o sufrágio universal é o
ponto de partida não e chegada, como é para o liberalismo. Além dele, há outras duas
reivindicações: a crítica da democracia apenas representativa e o controle, a partir
do próprio povo, da estrutura do Estado.
O que caracteriza a democracia socialista é o reconhecimento de que, na
sociedade capitalista, houve um deslocamento dos centros de poder dos órgãos
tradicionais do Estado para os grandes capitalistas. Nesse sentido, o controle que
os cidadãos podem exercer por meio dos canais tradicionais da democracia não é
suficiente para impedir os abusos de poder, cuja abolição é o objetivo mais fundamental
da própria democracia.

Democracia e teoria das elites

Segundo Gaetano Mosca (1858-1941) – junto com Ludwig Gumplowicz (1838-


1909) e Vilfredo Pareto (1848-1923) – a soberania popular é um ideal que não
correspondeu, nem corresponderá à realidade. Em qualquer regime político, é sempre
uma minoria de pessoas que Mosca chama de “classe política”, a que detém o poder
efetivo. Em todas as sociedades, em todos os tempos, em todos os níveis de civilização,
o poder está nas mãos de uma minoria. Por isso, não existe outra forma de governo
senão a oligárquica. Nesse sentido, a teoria das elites tem por consequência não tanto
a negação da democracia, mas a visão mais próxima ao modo como os meandros do
poder realmente acontecem.
Joseph Schumpeter (1883-1950), em Capitalismo, socialismo e democracia
(1942), defende que existe democracia onde há vários grupos concorrendo pela
conquista do poder, mediante uma luta que tem por objetivo o voto popular. Trata-se de
um ponto de vista formal, em contraposição ao ideal em que o povo detém o poder, e o
governo trabalha para o bem da maioria. Democracia é aquele regime em que a luta
pela conquista de poder por quem o conseguir obter o maior número de votos, numa
disputa livre.
A democracia, enquanto conceito, deve abarcar, assim, a disputa de o maior
número de grupos pelo poder. Há três pontos para analisar esse eixo.
Quanto ao recrutamento, uma classe política é democrática quando os
escolhidos são por meio de uma competição eleitoral livre, ao invés de transmissão
hereditária.

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Quanto à extensão, os grupos políticos precisam ser numerosos a ponto de se


dividirem em classe do governo e classe da oposição, em governo central e governo
local, jamais em um grupo tão pequeno e fechado que consiga dirigir um país apenas
com poucos integrantes.
Quanto à fonte do poder, uma classe política é democrática quanto exercida
de modo representativo, renovável e obediente a regras fundamentais (uma
Constituição), ao invés de ser fundada em dotes carismáticos do líder e de tomada
violenta do poder.
Não é possível estabelecer quantas regras devem ser observadas para que um
regime possa dizer-se democrático. Um regime que não observa nenhuma dessas
regras, no entanto, dificilmente, seria considerado democrático.

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3. Demagogia e Populismo
Demagogia4

A demagogia é uma prática política, que se apoia nas massas, estimulando suas
aspirações irracionais e elementares, desviando-a de sua participação consciente e
ativa na vida política.
Não é uma Forma de Governo no sentido técnico. Está presente, no entanto, em
diversas Formas de Governo. Realiza-se mediante fáceis promessas impossíveis de ser
mantidas – “Vou acabar com o problema da segurança pública, da educação e da saúde
em apenas 4 anos!”.
Na Grécia Antiga, era chamado de demagogo (de demos, “povo”, e gogos,
“condutor”) aquele que, sendo hábil orador, sabia conduzir o povo. É com Aristóteles,
em sua Política, principalmente no Livro IV, que o termo assume carga negativa. Trata-
se da prática corrupta pela qual se chega a instituir um governo despótico das classes
inferiores, em que tudo é decidido por assembleia e não pelas leis. O problema maior
identificado por Aristóteles é que se tudo for decidido por assembleia, não há como
haver uma comunidade política estável, uma vez que decisões de assembleia são
particulares, e não é possível regular uma cidade por decisões particulares.

Populismo5

Populistas são as fórmulas políticas, cuja fonte principal de inspiração e termos


constante de referência é o povo, considerado como agregado social homogêneo e
exclusivo depositário de valores positivos e permanentes.
Não se trata de uma doutrina teórica, mas de uma disposição de comportamento.
Muitas vezes, apresenta-se mais de modo latente que de modo explícito.
Uma tirada de estilo populista é o que se encontra na frase de Eva Duarte: “um
dia afirmou sabiamente Perón que, tendo percorrido o país de um cabo a outro, e tendo
conhecido todas as belezas e maravilhas, ao fim teve de se encontrar com a sua maior
e mais alta beleza, o povo” (Eva Peron, 1952)
Mas o que significa povo?
Costuma ser evocado como representante do povo, aquele elemento social que
supostamente aparece menos contaminado por ingerências exteriores e que se pode
identificar com a população rural, em países predominantemente agrícolas, e com a
população de periferia, em países predominantemente urbanos.
Considerado como uma massa homogênea, o povo não se apresenta no
populismo como classe ou agregação de classes.
E o que é o não-povo?

4
ZUCCHINI, Giampaolo, “Demagogia” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 318-319.
5
INCISA, Ludovico, “Populismo” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 980-986.

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É tudo aquilo que é extrínseco a um povo histórica, territorial e qualitativamente


determinado. Geralmente é designado pelo termo genérico elite – ora acusada de
cosmopolita, ora acusada de plutocrata.
O maior perigo do populismo é que se alimenta de crenças messiânicas,
apoiadas geralmente em líderes carismáticos que, aproveitando-se do favor popular,
conduzem demagogicamente as massas para onde querem.

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4. Autoritarismo e totalitarismo
Autoritarismo

A centralidade absoluta do princípio da autoridade é um caráter comum do


autoritarismo. Trata-se da relação entre, de um lado, um comando inquestionável e,
de outro, obediência incondicional.
Não se trata de qualquer autoridade, mas de uma autoridade inserida num
contexto em que a hierarquia é fundamentada numa visão de mundo em que a relação
entre os homens é não só naturalmente desigual, mas desejavelmente desigual,
porque instaura a ordem e a segurança – de modo que não poderia ser diferente. A
participação popular, assim, é desestimulada, e a legitimidade popular dos órgãos
de direção social não é um valor.
Empregam-se o adjetivo “autoritário” e o substantivo “autoritarismo” em três
contextos: sistemas políticos, disposições psicológicas e ideologias políticas.
Nos sistemas políticos, autoritários são os regimes que privilegiam a
autoridade governamental e diminuem de forma mais ou menos radical o consenso,
concentrando o poder político nas mãos de uma só pessoa ou de um só órgão,
colocando em condição secundária as instituições representativas. Subsistemas
políticos autônomos e de oposição ao central são aniquilados ou, quando tolerados,
esvaziados de verdadeira capacidade de influência.
Em sentido psicológico, autoritária é a personalidade formada por traços
duplos: de um lado, disposição à obediência cega a quem ocupe cargos superiores –
incluindo a prática da adulação em relação a poderosos; de outro, a disposição de tratar
com desprezo cargos em inferioridade hierárquica e aqueles que não possuem
autoridade.
Em sentido ideológico, autoritária é a ideologia que nega a igualdade dos
homens e coloca em destaque o princípio de hierarquia, além de exaltar com frequência
a personalidade autoritária, como vista acima.

Totalitarismo

Começou-se a falar de Estado “totalitário” por volta da metade da década de


1920, para caracterizar o Estado fascista, em contraposição ao Estado liberal. A
expressão começava a ser usada para expressar todas as ditaduras monopartidárias,
abrangendo tanto as fascistas, quanto as comunistas.
Esse uso, todavia, somente se generalizou após a 2ª Guerra Mundial. É nesse
período que foram formuladas as teorias mais completas sobre o conceito, como As
origens do totalitarismo, de Hannah Arendt.
Segundo a autora, totalitarismo é uma forma de domínio radicalmente nova,
porque não se limita a destruir as capacidades políticas do homem, isolando-o em
relação à vida pública, como faziam as velhas tiranias e os velhos despotismos. Tende
a destruir os próprios grupos e instituições que formam o tecido das relações

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privadas do homem, tornando-o estranho ao mundo, privando-o até de seu


próprio eu.
Nesse sentido, o objetivo do totalitarismo é a transformação da natureza
humana, a conversão dos homens em autômatos obedientes. Tal objeto é
perseguido mediante uma combinação específica de ideologia e terror.
A ideologia totalitária pretende explicar de maneira total o curso da história.
Torna-se, por isso, independente de toda experiência ou verificação factual e constrói
um mundo fictício e logicamente coerente do qual derivam diretrizes de ação cuja
legitimidade é garantida pela conformidade com a lei da evolução histórica.
O terror totalitário, por sua vez, serve para traduzir na realidade o mundo fictício
da ideologia e confirmá-la, tanto em seu conteúdo, quanto, e sobretudo, em sua lógica
deformada. Isso atinge não só os inimigos reais, mas os fabricados, ou seja, aqueles
que são considerados contrários à política ideológica do partido no comando.

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5. Liberalismo e neoliberalismo

De acordo com Michael Freeden6, existem três liberalismos distintos: o


liberalismo clássico, o social-liberalismo, e o neoliberalismo. E um dos três, em sua
classificação, não pode ser considerado de fato descendente das ideias liberais.
O liberalismo não tem um só pensador.
Apesar disso, alguns deles representam pontes entre as tendências
predominantes desse tipo de pensamento. John Locke leva aos iluministas. Jeremy
Bentham avança do iluminismo para o século XIX. E John Stuart Mill faz a transição
para o século XX e a geração seguinte de liberais.
De Locke ao Iluminismo

O termo liberal nasceu, provavelmente, na Espanha durante os primeiros anos


do século XIX. Os liberales não formavam propriamente um partido, dividiam-se em
facções, mas em comum tinham o fato de se sentirem representados por ideias que
vinham do Iluminismo e da Revolução Francesa.
O inglês John Locke (1632-1704) é talvez o primeiro liberal – antes do termo
ser inventado. Morreu aos 72, em 1704, um século antes de a palavra ‘liberal’ ser usada
para sugerir ideias como as dele. Mas Locke falou em tolerância religiosa quando raros
falavam. Foi quem sugeriu que propriedade é um direito natural que deriva do
trabalho – um direito inerente ao homem, não é concedido pelo governante, e, portanto,
não pode ser tirado. Direitos naturais, para o filósofo, eram também a vida e a
liberdade.
Ele compreendia que cada pessoa agirá de acordo com seus interesses e, por
isso, o conjunto de pessoas forma uma sociedade civil com governo para que os
conflitos sejam resolvidos com civilidade. Chamava este acordo de contrato social.
Para Locke, se revoltar contra um governo que agrida os direitos naturais de cada um é
direito do homem – chamamos isso em Filosofia Política de desobediência civil.
Acreditava que a educação fazia a pessoa, formava seu caráter, e quão mais
bem educado, mais apto como cidadão.
A Europa começava uma lenta urbanização e, com ela, nasceu uma classe
média formada, em geral, por comerciantes – não nobres e não servos. Por isso,
estavam submetidos às mesmas violências por parte de governos autocráticos típicos
do absolutismo. Porém, por terem dinheiro, conseguiam garantir a si mesmos ao menos
espaço para se manifestar. Diferentemente dos nobres, suas posses não vieram por
herança, haviam sido construídas com trabalho.
Tributos aleatórios, invasões de propriedade, ameaças constantes à liberdade
faziam parte da rotina. Nesse contexto, o que Locke pôs no papel era um sentimento já
compartilhado por uma parte crescente da sociedade. Liberdade econômica, que em
essência quer dizer a liberdade de poder dispor ao máximo do fruto de seu próprio
trabalho, surge assim como ideia ao mesmo tempo em que se concebe também as
liberdades de ir e vir, de se manifestar, de viver sem opressão.

6
FREEDEN, 2015.

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Mas não era só. Além de estar se urbanizando, surgiam também na Europa cada
vez mais universidades. E, com a distribuição de universidades, portanto o aumento do
número de pessoas engajadas no debate intelectual, a lida com o conhecimento mudou.
Atrelou-se ao método científico, por um lado. E porque o método científico exige o
debate e o questionamento de ideias, firmou-se a convicção de que a liberdade para
pensar era fundamental para o avanço do conhecimento.
Foi neste cenário que, nas décadas seguintes após sua morte, surgiu a Idade
das Luzes ou Iluminismo.
Do suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) ao francês Voltaire (1694-
1778), do escocês Adam Smith (1723-1790) ao alemão Immanuel Kant (1724-1804),
todos se debruçaram sobre o que Locke escreveu.
Concordaram e discordaram, discutiram, mas em comum todos abraçavam
aquele pacote de princípios novos. Liberdade cresceu como valor. A ideia de um Estado
autocrático passou a ser vista como repulsiva. E aqueles debates não ficaram isolados
entre pensadores. Desembocaram na Revolução Americana (1776) e na Revolução
Francesa (1789).
De Bentham ao séc. XIX

Pensadores e políticos se encontraram de vez na Inglaterra, em princípios do


século XIX, com um movimento que com o tempo passou a ser lembrado como
utilitarista. Eram radicais porque propunham uma completa reforma do Estado.
O principal deles, Jeremy Bentham (1748-1832), na virada do século XVIII para
o XIX, não só falou de valores já postos como separação de Igreja e Estado,
liberdades econômica e de expressão, como propôs o sufrágio universal, o
divórcio, a abolição da escravatura, o fim da pena de morte, da punição corporal,
direitos de animais e até a descriminalização da homossexualidade.
Sua maior contribuição se deu com o questionamento da ideia de direitos
naturais. Para ele era, na melhor das hipóteses um truque de palavras com pouco
significado e, na pior, uma referência a algo concedido por Deus.
Ele defendia uma linha pragmática. Direitos não são naturais. Se existem é
porque antes há um governo que os garante. Então é necessário um sistema moral no
qual um bom governo se baseie para estabelecer tais direitos. Seu critério era o da
felicidade e o da dor. A missão de um governo é criar um sistema que garanta o máximo
possível de felicidade para o maior número de pessoas, enquanto evita ao máximo
a dor. Por isso, utilitarista. As ações de governo têm por propósito ser úteis à população.
Quando se fala de liberalismo clássico, com frequência se fale também de
liberalismo inglês. No Iluminismo, ideias que compõem o liberalismo surgiram de toda
a Europa. Mas, na sequência, seu avanço foi na Inglaterra.
A Inglaterra abraçou os princípios desta segunda geração de pensadores liberais
pós-iluminismo. Em 1832, um Ato do Parlamento redesenhou todo o processo eleitoral,
distribuindo por critérios demográficos os assentos na Câmara dos Comuns e ampliando
para todos os homens proprietários de terras, também para aqueles que pagassem
aluguel acima de um determinado valor o direito ao voto. Um segundo Ato, em 1867,
levou a todos os homens ingleses chefes de família o direito ao voto. Eram políticas
defendidas pelo que já era chamado Partido Liberal.

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Em meados do século XIX, duas questões pressionaram os liberais, obrigando-


os a se debruçar novamente sobre seus princípios. Uma foi o estado de penúria
imposto a uma vasta quantidade de pessoas nos centros urbanos e industriais. A outra
foi o surgimento de um forte nacionalismo na Europa e Américas.
Essencialmente, a ideia de nacionalismo confronta princípios liberais. Privilegia
os interesses da nação em detrimento dos de cada indivíduo da sociedade.
Nacionalistas tendem a cultuar líderes. Nacionalistas enxergam no governo a
representação de algo maior que a soma dos indivíduos enquanto liberais submetem o
governo ao serviço do bem-estar de cada cidadão. Porém movimentos nacionalistas,
principalmente nas colônias europeias, representaram os anseios de liberdade de
povos em relação a governos autocráticos. A questão social foi mais séria. Porque no
debate a respeito de nacionalismo era possível encontrar um ponto de equilíbrio entre
formas leves — úteis — de nacionalismo que levavam a liberdade, e as formas que
davam em governos fortes e, portanto, com tendências autoritárias.
Mas no debate sobre a pobreza não era tão simples. Até ali, já há bem mais de
um século, liberais quase sempre defendiam o laissez-faire – a liberdade econômica
sem intervenção do Estado. Se liberais não se recusam a enxergar a realidade e refletir
baseando-se nela, parecia óbvio que a distribuição ampla de felicidade não estava
ocorrendo. E, àquela altura, as ideias de Karl Marx já pautavam debates.
O que é liberdade da perspectiva do liberalismo clássico?
A resposta é um conceito que abarca outros dois:
• Ausência de restrições à autodeterminação de cada indivíduo.
• Cultivo do potencial de cada indivíduo para que seja o melhor que conseguir.
Os dois conceitos estão em tensão um com o outro. Num ambiente em que
ninguém sofre restrições, os mais poderosos tendem a submeter os menos.
De Mill ao séc. XX

John Stuart Mill (1806-1873), filho de um dos alunos de Bentham, encarou a


questão de frente e, assim, apresentou dois novos conceitos: igualdade de
oportunidades e ditadura da maioria.
Pessoas serão diferentes, terão capacidades distintas, e, portanto, se
desenvolverão de forma desigual. Mas um Estado precisa garantir igualdade de
oportunidades para todos.
Conforme se expandia o direito ao voto que ia terminar no sufrágio universal,
que Mill defendia ardorosamente, ele também chamava atenção para um risco: a
ditadura da maioria. Democracias não deviam se tornar uma nova forma de autocracia
em que os eleitos pela maioria sufocassem os minoritários. Defendeu como pôde a ideia
de um governo representativo, no qual mesmo as minorias teriam espaço. Stuart Mill
temia que quando a massa votasse, deseducada, escolhesse governos medíocres. Por
isso, defendia educação universal. Assim como acreditava que, quando as massas
começassem a participar do governo, se sofisticariam politicamente.
Nos últimos anos dos 1800 e primeiros dos 1900, uma série de pensadores
encarou a questão da desigualdade.
Não era simples o problema que tinham de resolver. A base do pensamento
liberal era o indivíduo, de um lado, e o combate a toda tirania, de outro. No momento

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em que se enxerga a pobreza como uma forma de tirania, algo que tira do indivíduo sua
liberdade, como argumentar por uma intervenção do Estado sem promover o fim da
liberdade de outros?
John Atkinson Hobson (1858-1940), um economista, rearranjou o argumento.
Se a sociedade é o conjunto de indivíduos, o bem da sociedade é do interesse de cada
indivíduo. Com este objetivo, faz sentido que o Estado faça determinadas intervenções
na economia. O terreno para este argumento havia sido aberto por Stuart Mill ao falar
de igualdade de oportunidades. Hobson estava participando, ali, da fundação de uma
nova corrente que, na Inglaterra, seria batizada New Liberalism e que atende hoje por
Social-Liberalismo.
Tais ideias, no governo de David Lloyd George (1863-1945), deram origem ao
Estado de Bem-Estar Social britânico, que teve por principal teórico o jovem
economista John Maynard Keynes (1883-1946). As ideias de Keynes, por sua vez,
quando aplicadas aos EUA da Grande Depressão (Crise de 1929) formaram a base
para o país que chegou ao pós-Guerra como a maior democracia do planeta.
Do liberalismo clássico ao social-liberalismo

A fronteira entre liberalismo clássico e social-liberalismo não é rigidamente


desenhada.
Em comum, ambos têm um profundo respeito por liberdade. Ambos abraçam a
lição dos utilitaristas: compreendem que o Estado é necessário como garantidor desta
igualdade, tem o papel de resolver conflitos, e a atribuição de levar educação a todos.
Ambos concordam que indivíduos com liberdade para criar e produzir levam à frente o
desenvolvimento humano e que o Estado deve se meter o mínimo possível neste
processo.
Como a tensão não vai embora, e os problemas que o avanço tecnológico traz
são sempre novos, o momento em que o Estado interfere ou não, no equilíbrio entre
liberdade do indivíduo e bem-estar da sociedade, é o debate sem fim que move liberais.
O que os ingleses chamam de liberal, hoje, é o liberalismo clássico. O que os
americanos chamam de liberal, hoje, é o social-liberalismo.

O neoliberalismo

Na visão de Freeden, no século XXI, liberais enfrentam dois desafios.


O primeiro é o que ele batiza de ofensiva neoliberal. Em um determinado
momento, uma vertente do conservadorismo se apropriou do nome “liberal” para se
legitimar.
Formou, assim, uma caricatura do liberalismo que ignora o conjunto da
sociedade, minimiza as liberdades sociais do indivíduo, enquanto prioriza a ideia de um
Estado que não se mete no mercado e não se preocupa com o bem-estar humano. O
governo ideal desta vertente se limita a um facilitador de comércio e, se regula o setor
financeiro, é só minimamente. Enquanto isso, todo o resto do comportamento será
regulado.
A ideia do neoliberalismo, porém, se tornou particularmente atraente para dois
grupos. Por um lado, dá uma aura nova a uma vertente do conservadorismo,

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permitindo-lhe alcançar novos grupos de eleitores. Por outro, oferece a críticos vindos
da esquerda uma caricatura do liberalismo mais fácil de atacar.
O segundo desafio não é externo, é inerente ao liberalismo.
Há cinco fases na história deste conjunto de ideias.
1. Ele nasce, após a Renascença, como uma resistência à tirania. É onde está
Locke, que propõe a ideia de que o Estado não deve perturbar a autonomia de
cada indivíduo.
2. Na segunda fase surge o conceito de mercado — este espaço onde indivíduos
se relacionam uns com os outros. Agora, o Estado não deve perturbar as inter-
relações entre indivíduos.
3. Mill apresenta a terceira fase, tirando o foco do mercado — sem ignorá-lo — e o
trazendo para uma sociedade capaz de despertar o potencial máximo de cada
indivíduo.
4. A quarta fase é aquela que percebe, na pobreza, uma forma de tirania que deve
ser combatida.
5. E a quinta fase, já na segunda metade do século 20, observa de forma mais
complexa a sociedade. Pois, entre o indivíduo e o todo desta sociedade há, no
intermediário, grupos que reúnem pessoas com interesses comuns. O
movimento de mulheres, de negros, o movimento LGBTQIA+, que buscam a
expansão de direitos individuais para os seus.
Mas um problema se coloca: em que momento, nesta fragmentação da
sociedade em grupos, não começam a se perder os indivíduos?
Avanço de nacionalismos populistas pela direita, pressão via esquerda de um
discurso que enxerga a sociedade, mas não as pessoas, e o debate interno continuado
sobre as tensões inerentes às contradições sempre presentes no conjunto de suas
ideias. Às vezes acuado, às vezes à frente das transformações da sociedade, o
liberalismo é uma das doutrinas políticas mais influentes hoje.

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6. Capitalismo7

Capitalismo é um sistema econômico originado no Ocidente, baseado no


intercâmbio comercial e na geração de lucro, visando ao reinvestimento e crescimento
dos negócios.
Há duas grandes acepções do termo.
A primeira o localiza como uma forma particular, historicamente específica, de
agir econômico, ou um modo de produção em sentido estrito dentro de um sistema
maior. Fala-se, por exemplo, de sociedade industrial, sociedade liberal-democrática ou
sociedade complexa – das quais o capitalismo seria um subsistema econômico.
A segunda o localiza como uma formação social abrangente, determinada
pelo modo sistema econômico específico. Capitalismo seria mais que um subsistema
econômico, mas um modo de a sociedade como um todo se relacionar.
Algumas características distinguem o capitalismo dos demais modos históricos
de produção:

• Propriedade privada dos meios de produção, cuja movimentação necessita


do trabalho assalariado formalmente livre.
• Sistema de mercado, baseado na livre iniciativa e na empresa privada, não
necessariamente centrada em uma pessoa física.
• Processos de racionalização dos meios e métodos diretos e indiretos para a
valorização o capital e a exploração das oportunidades de mercado visando ao
lucro.

Origens do conceito
Interpretação marxista do capitalismo

O termo “capitalismo” surgiu em meados do séc. XIX, quando Marx e Engels


discutiam o modo capitalista de produção. Uma obra central é o Manifesto do partido
comunista, de ambos, e O Capital, de Marx.
Para Marx, o capitalismo é um sistema econômico explorador, baseado na
produção de mercadorias para comercialização no mercado, a fim de gerar lucros para
uma classe específica: a burguesa ou capitalista.
Ainda hoje, a mais influente teoria do capitalismo é a marxista, segundo a qual o
capitalismo surge da sociedade feudal como último estágio da história das sociedades
humanas.
Os estágios progressivos são estes. Primeiro, as sociedades comunistas
primitivas dos caçadores-coletores. Depois, os antigos sistemas de propriedade de
escravos. Após, os sistemas feudais baseados na divisão entre servos e proprietários

7
RUSCONI, Enrico Gian, “Capitalismo” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 141-148; GIDDENS, Antony,
“Capitalismo” (verbete) In: GIDDENS [et. al.], 2017, p. 112-117.

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de terras. Enfim, o surgimento dos mercadores e artesãos marca o início da classe


comercial ou capitalista, que substitui a nobreza grande proprietária de terras.
Marx identificou dois elementos no capitalismo: capital e mão de obra
assalariada.
Capital é qualquer ativo, incluindo dinheiro, máquinas e fábricas, que pode ser
usado ou investido para produzir ativos futuros.
Mão de obra assalariada é um conjunto de trabalhadores que não são donos
dos meios de produção e dependem de empregos remunerados.
Os detentores do capital constituem a classe dominante, enquanto a maioria é
formada pela classe trabalhadora ou proletariado. Apesar de serem mutuamente
dependentes, trata-se de uma relação de exploração. Por isso, o conflito de classes é
incontornável no capitalismo.
Apesar disso, Marx não foi exclusivamente crítico: via no capitalismo uma
produtividade sem igual na história, libertando as pessoas da desnecessária opressão
da autoridade religiosa e da vida do campo. Nesse sentido, demonstrava o enorme
poder da humanidade para formar seu próprio futuro em vez de ficar à mercê de forças
naturais.
O problema era que as relações sociais capitalistas competitivas se tornam um
obstáculo à cooperação, necessária para as pessoas controlarem seu próprio destino.
A contradição entre as forças produtivas e seu uso competitivo, em vez de cooperativo,
teria que ser solucionada por um processo revolucionário, em que a classe trabalhadora
tomaria o poder e, progressivamente, instauraria a sociedade comunista.
Interpretação weberiana do capitalismo

Max Weber oferece uma interpretação alternativa ao capitalismo. Nele, a


centralidade marxista da relação capital-trabalho é substituída pelo procura de
esquemas de comportamento individuais e coletivos, atribuíveis ao processo histórico
da racionalização de todos os setores da vida, que caracteriza o Ocidente.
A contribuição de Weber para a definição de capitalismo se coloca a partir de
duas questões: as origens do capitalismo moderno e a especificidade do capitalismo
moderno.
Em A ética protestante e o espírito do capitalismo, Weber defende que a ética
calvinista, graças à ideia de profissão como vocação, é vista como fator decisivo para
a difusão de uma conduta de vida disciplinada e austera, pressuposto para o espírito
capitalista moderno.
A partir do séc. XVI, nas áreas geográficas visadas pela Reforma Protestante,
se instaura um nexo preciso entre credo religioso, conduta moral de comportamento
econômico, que pode ser defendido como racional do ponto de vista capitalista. Mas o
que isso significa?
Com o tempo, esvaziando-se de conotações estritamente religiosa, o capitalismo
é a etapa econômica da racionalização da vida moderna. Basicamente, controle e

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domínio dos meios em relação ao fim, por meio de três princípios: calculabilidade,
generalizabilidade e previsibilidade.
Em termos weberianos, falar de essência do capitalismo é falar de
racionalização e otimização das oportunidades do mercado de trabalho livre.

Aspectos controversos

O debate entre os pontos de vista weberianos e marxistas envolve julgamentos


morais e não apenas de diagnóstico de como funciona a realidade.
Para os marxistas, o capitalismo é um sistema econômico que produz e prospera
com a desigualdade, portanto precisa ser ultrapassado historicamente.
Em contrapartida, para os weberianos, o capitalismo pode ser explorador, mas
todas as alternativas se mostram menos produtivas e mais autoritárias, oferecendo
menos democracia e exercício de liberdade pessoal
Até hoje não há acordo entre sociólogos quanto a um diagnóstico geral das
economias capitalistas.
Em estudos acadêmicos recentes, explora-se a diferença entre economias
capitalistas nacionais. Muitas vezes, considerou-se que a economia capitalista
funcionam com mais eficácia com o mínimo de regulamentação econômica, baixos
regimes tributários e um Estado pouco assistencialista.
Contudo, a Dinamarca desafia esse receituário. Sua versão de capitalismo se
fundamenta em impostos relativamente altos, enorme orçamento estatal, altos níveis de
regulamentação e economia aberta. Ainda assim, compete com eficácia contra
variações muito mais adequadas ao modelo de baixa regulamentação.
Segundo Campbell e Pedersen (2007), a Dinamarca é bem-sucedida porque as
empresas obtêm vantagens das instituições do país, as quais coordenam os mercados
de trabalho, gerenciam treinamentos vocacionais e capacitadores e adotam uma política
industrial. Tudo parece indicar que há mais de uma forma de ter sucesso em mercados
globais.
Além disso, dada a atual preocupação com a questão do aquecimento global,
a questão de o capitalismo poder ou não ser sustentável também é séria. Pesquisadores
como Markandaya (2009), acredita que isso é possível apenas se medidas
mercadológicas forem tomadas para que haja um forte empenho na redução de emissão
de carbono.

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7. Anarquismo, Libertarianismo e Anarcocapitalismo


Anarquismo8

O termo “anarquismo”, ao qual é associado o de “anarquia”, tem uma origem


precisa das palavras gregas ana-, “partícula de negação”, e arkhé, “governo” – ausência
de governo.
Por esse vocábulo, designa-se uma sociedade livre de todo domínio político
autoritário, na qual o homem se afirma apenas por meio da própria ação, exercida
livremente, num contexto em que todos são igualmente livres.
Anarquismo, portanto, é a liberação de todo poder superior à própria deliberação
do indivíduo, seja consigo mesmo, seja em comunidade. Toda imposição de ordem
ideológica (religiões, doutrinas, filosofias), política (estrutura, administração, hierarquia),
social (grupo, classe, tribo) e jurídica (lei) tende a ser vista como ilegítima.
Daí vir a associação com outras doutrinas que colocam a liberdade como valor
fundamental: libertarianismo, por exemplo.
A História fornece três formas diferenciadas de anarquismo: puramente
intelectual, religioso e histórico.
Do ponto de vista puramente intelectual, as propostas são genericamente
definidas como utópicas, no sentido de que não têm compromisso com sua realização.
Do ponto de vista religioso, remonta-se ao milenarismo (do latim tardio
milenares), doutrina inspirada na crença medieval do místico italiano Joaquim de Fiore
(1145-1202) que anunciava o advento do milênio, período de mil anos, durante o qual,
segundo o Apocalipse (20, 1-3), o mal seria vencido. Por extensão de sentido, toda
doutrina que anuncia ou promete o advento de um período que anuncia ou promete o
advento de um período de perfeição e bem-estar geral.”
Do ponto de vista histórico, houve protestos coletivos e contestadores de
autoridades políticas e estruturas sociais vigentes.
No campo do debate conceitual, é no fim do séc. XVIII que nasce a primeira obra
de cunho anarquista. Chama-se Investigações sobre a injustiça política, de William
Godwin (1756-1846). Nessa obra, a recusa de autoridades governantes e da lei, a
demanda de uma liberdade total no campo ético-político, mediante um regime
comunitário sem propriedade privada são os principais assuntos. Trata-se da gênese do
anarquismo comunista.
Como Rousseau, os anarquistas de orientação comunista acreditam na
liberdade natural e na bondade natural dos seres humanos e em sua capacidade para
viver felizes em comunidades, atribuindo a origem da sociedade (os indivíduos isolados
e em luta) à propriedade privada e à exploração do trabalho, e a origem do Estado ao
poder dos mais fortes (os proprietários privados) sobre os fracos (os trabalhadores).
Contra o artificialismo da sociedade e do Estado, propõem o retorno à vida em
comunidades autogovernadas, sem a menor hierarquia e sem nenhuma autoridade com

8
BRAVO, Gian Mario, “Anarquismo” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 23-29

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poder de mando e direção. Afirmam dois grandes valores: a liberdade e a


responsabilidade, em cujo nome propõem a descentralização social e política, a
participação direta de todos nas decisões da comunidade, a formação de organizações
de bairro, de fábrica, de educação, moradia, saúde, transporte etc.
Propõem também que essas organizações comunitárias participativas formem
federações nacionais e internacionais para a tomada de decisões globais, evitando,
porém, a forma parlamentar de representação e garantindo a democracia direta.
As comunidades e as organizações comunitárias enviam delegados às
federações. Os delegados são eleitos para um mandato referente exclusivamente ao
assunto que será tratado pela assembleia da federação. Terminada a assembleia, o
mandato também termina, de sorte que não há representantes permanentes. Visto que
o delegado possui um mandato para expor e defender perante a federação as opiniões
e decisões de sua comunidade, se não cumprir o que lhe foi delegado, seu mandato
será revogado e um outro delegado será eleito.
Como se observa, os anarquistas procuram impedir o surgimento de aparelhos
de poder que conduzam à formação do Estado. Recusam, por isso, a existência de
exércitos profissionais e defendem a tese do povo armado ou das milícias populares,
que se formam numa emergência e se dissolvem tão logo o problema tenha sido
resolvido. Consideram o Estado nacional obra do autoritarismo e da opressão capitalista
e, por isso contra ele, defendem o internacionalismo sem fronteiras.
No séc. XIX, uma série de autores surgem, nem sempre concordando entre si.
Alguns nomes importantes são Proudhon (1809-1865), Bakunin (1814-1876),
Kropotkin (1842-1921), Tolstói (1828-1910), Max Stirner (1806-1856) e Malatesta
(1853-1932).
A cisão passa a se localizar entre o anarquismo individualista e o anarquismo
comunista.
Como exemplo do anarquismo individualista, encontra-se Max Stirner (1806-
1856). Segundo o autor, o indivíduo, por meio do próprio egoísmo, afirma-se a si mesmo
e a sua própria liberdade apenas na situação em que não há componente autoritário,
em balanço com a força de todos os outros egoísmos dos demais indivíduos. A
finalidade última é a realização do EU, numa sociedade não organizada e independente
de todo vínculo exterior.
Por sua vez, o anarquismo comunista vê a realização plena do EU numa
sociedade em que cada um sacrifica parte da liberdade pessoal, pela vantagem da
liberdade social. Tal ideal poderia ser alcançado por meio de uma organização
comunitária dos meios de produção e do trabalho e numa distribuição comum dos
produtos, na proporção das necessidades de cada um, desde que seja salvaguardada
a liberdade plena do indivíduo.

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Libertarianismo9

O libertarianismo é uma doutrina que defende a liberdade como um princípio


fundamental. A palavra é geralmente utilizada em países de língua inglesa.
Os libertários buscam maximizar a autonomia, enfatizando a livre associação,
liberdade de escolha, individualismo e associação voluntária. Além disso, compartilham
um ceticismo em relação à autoridade e ao poder do Estado, mas alguns libertários
divergem quanto ao escopo de sua oposição aos sistemas econômicos e políticos
existentes.
Várias escolas de pensamento libertário oferecem uma gama de pontos de vista
sobre as funções legítimas do Estado e do poder privado, muitas vezes clamando pela
restrição ou dissolução de instituições sociais coercitivas.
Diferentes categorizações foram usadas para distinguir várias formas de
libertarianismo. Os estudiosos distinguem visões libertárias sobre a natureza da
propriedade e do capital, geralmente ao longo das linhas esquerda-direita ou socialista-
capitalista.
O libertarianismo originou-se como uma forma de política de esquerda, como
socialistas antiautoritários como anarquistas de cunho comunista. Esses libertários
buscam abolir o capitalismo e a propriedade privada dos meios de produção, ou então
restringir seu alcance ou efeitos para usufruir as normas de propriedade, em favor da
propriedade e administração comum ou cooperativa, vendo a propriedade privada como
uma barreira à liberdade. As ideologias libertárias de esquerda incluem escolas de
pensamento anarquistas, em torno do igualitarismo econômico, bem como políticas em
prol do meio ambiente.

Anarcocapitalismo
Em meados do século XX, os defensores da direita libertária do
anarcocapitalismo cooptaram o termo libertário para defender o capitalismo laissez-faire
e fortes direitos de propriedade privada, como terras, infraestrutura e recursos naturais,
liberdades civis, lei natural, capitalismo de livre mercado e uma grande reversão do
moderno estado de bem-estar. Afirma um de seus principais representantes, Murray N.
Rothbard (1926-1995), em seu livro Betrail of the American Mind, p. 83:
“Um aspecto gratificante de nossa ascensão a algum destaque é que, pela primeira vez
em minha memória, nós, “nosso lado”, capturamos uma palavra crucial do inimigo.
Outras palavras, como "liberal", foram originalmente identificadas com libertários laissez-
faire, mas foram capturadas por estatistas de esquerda, forçando-nos na década de 1940
a nos chamarmos de liberais, um tanto quanto debilmente, "verdadeiros" ou "clássicos".
“Libertários ”, em contraste, há muito tem sido simplesmente uma palavra educada para
anarquistas de esquerda, ou seja, para anarquistas antipropriedade privada, seja do tipo
comunista ou sindicalista. Mas agora tínhamos assumido o controle, e mais
apropriadamente do ponto de vista da etimologia; uma vez que éramos defensores da
liberdade individual e, portanto, do direito do indivíduo à sua propriedade 10.

9
Ver WOODCOCK, 1962.
10
One gratifying aspect of our rise to some prominence is that, for the first time in my memory, we,
“our side,” had captured a crucial word from the enemy. Other words, such as “liberal,” had been

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8. Nacionalismo e Patriotismo
Nacionalismo

Para Michael Hechter11, cientista política da Universidade do Estado do Arizona,


o nacionalismo é a ideia de que a nação deve ser congruente com o Estado. Como
movimento, o nacionalismo tende a promover os interesses de uma determinada nação,
especialmente com o objetivo de ganhar e manter a sua soberania a fim de criar um
Estado-nação.
O nacionalismo sustenta a autodeterminação, isto é, a tese de que cada nação
deve governar a si mesma, livre de interferências externas. Além disso, defende a
nação como base natural para a política e que a nação é a única fonte legítima de
poder político. O fundamento é construir e manter uma única identidade, com base
em características culturais compartilhadas – etnia, localização geográfica, língua,
religião, tradições, história singular compartilhada, a fim de promover a unidade ou
solidariedade nacional.
Existem várias definições de "nação", o que leva a diferentes tipos de
nacionalismo. As duas principais formas divergentes são o nacionalismo étnico –
baseado em traços culturais e o nacionalismo cívico – baseado no território e no
governo. O consenso, porém, entre os estudiosos é que as nações são socialmente
construídas e historicamente contingentes12.

Principais teorias

Ao longo da história, as pessoas tiveram um apego a seu grupo de parentesco


e tradições, autoridades territoriais e sua pátria, mas o nacionalismo não se tornou uma
ideologia proeminente até o final do século XVIII. Há três perspectivas proeminentes
sobre o nacionalismo.
O primordialismo, que reflete as concepções populares do nacionalismo,
propõe que sempre existiram nações e que o nacionalismo é um fenômeno natural.
O etnosimbolismo explica o nacionalismo como um fenômeno dinâmico e
evolutivo e enfatiza a importância dos símbolos, mitos e tradições no desenvolvimento
das nações e do nacionalismo.
A teoria da modernização, que substituiu o primordialismo como a explicação
dominante do nacionalismo, adota uma abordagem construtivista e propõe que o
nacionalismo surgiu devido a processos de modernização, como industrialização,
urbanização e educação de massa, que tornaram a consciência nacional possível.

originally identified with laissez-faire libertarians, but had been captured by left-wing statists, forcing us
in the 1940s to call ourselves rather feebly “true” or “classical” liberals.15 “Libertarians,” in contrast,
had long been simply a polite word for left-wing anarchists, that is for anti-private property anarchists,
either of the communist or syndicalist variety. But now we had taken it over, and more properly from
the view of etymology; since we were proponents of individual liberty and therefore of the individual’s
right to his property.
11
HECHTER, 2004.
12
MYLONAS, TUDOR, 2021.

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Os defensores desta última teoria descrevem as nações como "comunidades


imaginadas" e o nacionalismo como uma "tradição inventada" na qual o sentimento
compartilhado fornece uma forma de identidade coletiva e une os indivíduos em
solidariedade política. A história de uma nação pode ser construída em torno de uma
combinação de atributos, valores e princípios étnicos, e pode estar intimamente ligada
a narrativas de pertencimento.
O nacionalismo pode ser combinado com diversos objetivos políticos e
ideologias, como conservadorismo (conservadorismo nacional e populismo de direita)
ou socialismo (nacionalismo de esquerda).
Na prática, o nacionalismo pode ser positivo ou negativo, dependendo de sua
ideologia e resultados.
Do lado positivo, o nacionalismo tem sido uma característica dos movimentos
por liberdade e justiça, tem sido associado a renascimentos culturais e incentiva o
orgulho pelas conquistas nacionais.
Também tem sido usado para legitimar divisões raciais, étnicas e religiosas,
suprimir ou atacar minorias e minar os direitos humanos e as tradições democráticas. O
nacionalismo radical combinado com o ódio racial foi um fator chave no Holocausto
perpetrado pela Alemanha nazista.

Patriotismo

Patriotismo, em poucas palavras, é orgulho nacional. Trata-se de sentimentos


de amor, devoção e apego a pátria, país e aliança com outros cidadãos que
compartilham o mesmo sentimento para criar um senso de unidade.
Esse apego pode ser uma combinação de muitos sentimentos diferentes,
linguagem relacionada à própria terra natal, incluindo aspectos étnicos, culturais,
políticos ou históricos. Engloba um conjunto de conceitos intimamente relacionados ao
nacionalismo.

Patriotismo e Nacionalismo

O patriotismo pode ser fortalecido pela adesão a uma religião nacional (uma
religião civil ou mesmo uma teocracia). Isso é o oposto da separação entre Igreja e
Estado exigida pelos pensadores iluministas, que viam o patriotismo e a fé como forças
semelhantes e opostas.
Nesse sentido, em geral, a distinção entre patriotismo e nacionalismo não é tão
nítida e teoricamente estabelecida. Para sair da discussão acadêmica, que ainda não é
consensual sobre esse assunto, apresento a visão de George Orwell, que, mesmo não
amplamente aceita, pode servir de esclarecimento provisório.
Orwell, em seu influente ensaio Notes on Nationalism13, distinguiu patriotismo de
nacionalismo:

13
ORWELL, 2021.

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Por "patriotismo", quero dizer devoção a um determinado lugar e a um determinado modo de


vida, que alguém acredita ser o melhor do mundo, mas não deseja impor a outras pessoas. O
patriotismo é, por natureza, defensivo, tanto militar quanto culturalmente. O nacionalismo, por
outro lado, é inseparável do desejo de poder. O propósito permanente de todo nacionalista é
garantir mais poder e mais prestígio, não para si mesmo, mas para a nação ou outra unidade
na qual escolheu afundar sua própria individualidade.

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9. Marxismo

De acordo com Norberto Bobbio14, entende-se por marxismo o conjunto das


idéias, dos conceitos, das teses, das teorias, das propostas de metodologia científica e
de estratégia política e, em geral, a concepção do mundo, da vida social e política,
consideradas como um corpo homogêneo de proposições até constituir uma verdadeira
e autêntica "doutrina", que se podem deduzir das obras de Karl Marx e de Friedrich
Engels.
Identificam-se diversas formas de Marxismo, quer com base nas diferentes
interpretações do pensamento dos dois fundadores quer com base nos juízos de valor
com que se pretende distinguir o Marxismo que se aceita do Marxismo que se rejeita:
por exemplo, o Marxismo da Segunda e da Terceira Internacional, o Marxismo
revisionista e ortodoxo, vulgar, duro, dogmático etc.
Para os estudos sobre política, interessa mais a teoria marxista do Estado.
No Prefácio a Para a crítica da economia política (1859), contando a história de
sua formação, relatou como passara dos primeiros estudos jurídicos e filosóficos para
os estudos de economia política e como, através destas pesquisas, chegara à conclusão
de que
"tanto as relações jurídicas quanto as formas do Estado não podem ser compreendidas
nem por si mesmas nem pela chamada evolução geral do espírito humano, mas antes
têm suas raízes nas relações materiais da existência".

A crítica da economia política consiste em mostrar que, apesar das afirmações


greco-romanas e liberais de separação entre esfera privada da propriedade e a esfera
pública do poder, a política jamais conseguiu realizar a diferença entre ambas.
Nem poderia. O poder político sempre foi a maneira legal e jurídica pela qual a
classe economicamente dominante de uma sociedade manteve seu domínio. O aparato
legal e jurídico apenas dissimula o essencial: o poder político existe como poderio dos
economicamente poderosos, para servir seus interesses e privilégios e garantir-lhes a
dominação social. Divididas em proprietários e não proprietários (escravos, servos,
trabalhadores livres), as sociedades jamais foram comunidades de iguais e jamais
permitiram que o poder político fosse compartilhado com os não proprietários.
Nesse sentido, para Bobbio, para uma exposição tanto quanto possível
sistemática das linhas gerais da teoria marxista do Estado parece oportuno focalizar os
cinco pontos seguintes:
1. Crítica das teorias anteriores, de modo particular da teoria hegeliana
2. Teoria geral do Estado
3. Teoria do Estado burguês
4. Teoria do Estado de transição
5. Teoria da extinção do Estado

14
BOBBIO, Norberto, “Marxismo” (verbete) In BOBBIO [et. al], 1987, p. 738-744.

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Crítica à teoria hegeliana do Estado

As críticas mais importantes são as que dizem respeito à concepção do Estado


como organismo, à exaltação da monarquia constitucional, à interpretação da
burocracia como classe universal. Enquanto Hegel centra sua análise no Estado, Marx
foca na sociedade civil.
Mas o que é a sociedade civil?
Não é uma manifestação de uma ordem natural e racional, nem o
aglomeramento conflitante de indivíduos, famílias, grupos e corporações, cujos
interesses antagônicos serão conciliados pelo contrato social. Nesse sentido, o Estado
é apenas a instituição que regula e ordena a expressão dos interesses individuais e da
vontade geral.
A sociedade civil é o sistema de relações sociais que organiza a produção
econômica (agricultura, indústria e comércio), realizando-se por meio das instituições
sociais encarregadas de reproduzi-la (famílias, igrejas, escolas, polícia, partidos
políticos, meios de comunicação etc.). É o espaço onde as relações sociais são
pensadas, interpretadas e representadas por um conjunto de ideias morais, religiosas,
jurídicas, pedagógicas, artísticas, científico-filosóficas e políticas.
A sociedade civil se realiza como luta de classes. Os proprietários privados dos
meios de produção e os trabalhadores ou não proprietários, que vendem sua força de
trabalho como mercadoria submetida à lei da oferta e da procura. Essas classes sociais
são antagônicas, e seus conflitos revelam uma contradição profunda entre os interesses
irreconciliáveis de cada uma.

Teoria geral do Estado

A inversão das relações entre sociedade civil e Estado, realizada por Marx
representa uma ruptura com a tradição da Filosofia Política moderna.
A Filosofia Política moderna tende a ver na sociedade pré-estatal uma
subestrutura, real mas efêmera, destinada a ser absorvida na estrutura do Estado.
Somente neste último, o homem poderia conduzir uma vida racional. Nesse caminho
vão o estado de natureza de Hobbes, a sociedade natural de Locke, o estado primitivo
de natureza de Rousseau, o estado das relações de direito privado-natural de Kant, a
família e a sociedade civil do próprio Hegel.
De modo diferente, Marx considera o Estado — entendido como o conjunto das
instituições políticas onde se concentra a máxima força imponível e disponível numa
determinada sociedade — pura e simplesmente como uma superestrutura em relação
à sociedade pré-estatal, que é o lugar onde se formam e se desenvolvem as relações
materiais de existência. Sendo superestrutura, é destinado, por sua vez, a desaparecer
na futura sociedade sem classes.
Enquanto a Filosofia da História dos escritores anteriores a Hegel (e
especialmente no próprio Hegel) caminha para um aperfeiçoamento cada vez maior do
Estado, a Filosofia da História de Marx caminha, ao invés, para a extinção do Estado. O
que, para os escritores precedentes, é a sociedade pré-estatal, ou seja, o reino da força

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irregular e ilegítima. Para Marx, ao contrário, o Estado é nada mais que o prolongamento
do estado de natureza como estado histórico real da humanidade.

Estado burguês

O condicionamento da superestrutura política por parte da estrutura econômica,


isto é, a dependência do Estado da sociedade civil, se manifesta nesta situação. A
sociedade civil é o lugar onde se formam as classes sociais e se revelam seus
antagonismos. Nesse sentido, o Estado é o aparelho ou conjunto de aparelhos dos quais
o determinante é o aparelho repressivo (o uso da força monopolizada), cuja função
principal é de impedir que o antagonismo degenere em luta perpétua. Isso aconteceria
não mediando os interesses das classes opostas, mas reforçando e contribuindo para
manter o domínio da classe dominante sobre a classe dominada.
No Manifesto do partido comunista, o "poder político" é definido com uma fórmula
que já se tornou clássica: "o poder organizado de uma classe para oprimir uma outra".
Marx não desconheceu as formas de poder político existentes em outros tipos de
sociedade diferentes da sociedade burguesa, mas concentrou sua atenção e a grande
maioria de suas reflexões sobre o Estado burguês.
Quando ele fala do Estado como "domínio" ou "despotismo" de classe, ou como
"ditadura" de uma classe sobre a outra, o objeto histórico é quase sempre o Estado
burguês.

Estado de transição

Marx confirma com precisão a dependência, muitas vezes afirmada, do Estado


da sociedade civil e do poder político da classe dominante, quando põe o problema da
passagem do Estado, em que a classe dominante é a burguesia, para o Estado, em que
a classe dominante é o proletariado.
Em certo sentido, para Marx, a dependência do poder estatal do poder de classe
é tão estrita que a passagem da ditadura da burguesia para a ditadura do proletariado
não pode acontecer simplesmente através da conquista do poder estatal, isto é, daquele
aparelho de que a burguesia se serviu para exercer seu domínio.
Exige, antes, a destruição das instituições e sua substituição por instituições
completamente diferentes. Se o Estado fosse somente um aparelho neutro acima dos
partidos, a conquista deste aparelho ou a mera penetração nele seriam suficientes para
modificar a situação existente.

Extinção do Estado

Todos os Estados que existiram foram sempre ditaduras de uma classe, nessa
visão apresentada. A esta regra não faz exceção o Estado em que o proletariado se
torna classe dominante. Porém, diferentemente das ditaduras das outras classes, que
foram sempre ditaduras de uma minoria de opressores sobre uma maioria de oprimidos,
a ditadura do proletariado, sendo ditadura de uma enorme maioria de oprimidos sobre
uma minoria de opressores destinada a desaparecer, é ainda uma forma de Estado,

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mas tal que, tendo como objetivo a eliminação do antagonismo das classes, tende à
gradual extinção daquele instrumento de domínio de classe que é o próprio Estado.
O primeiro indício do desaparecimento do Estado se encontra na última página
da Miséria da filosofia: "A classe operária substituirá, no curso de seu desenvolvimento,
a antiga sociedade civil por uma associação que excluirá as classes e seu antagonismo
e não existirá mais poder político propriamente dito" (p. 140).
O Manifesto inclui o tema do desaparecimento do Estado no próprio programa: "Se o
proletariado, na luta contra a burguesia, se constitui necessariamente em classe, e, por
intermédio da revolução se transforma a si mesmo em classe dominante destruindo
violentamente, como tal, as antigas relações de produção, ele elimina também, junto
com estas relações de produção, as condições de existência do antagonismo de classe,
das classes em geral e, portanto, também do seu mesmo domínio de classe".

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10. Socialismo e Comunismo


Socialismo

De acordo com Cesare Piancola15, socialismo tem sido historicamente definido


como programa político das classes trabalhadoras que se foram formando durante a
Revolução Industrial.
Da perspectiva social, a base comum das múltiplas variantes do socialismo
pode ser identificada numa organização social em que:
1. O direito de propriedade seja fortemente limitado.
2. Os principais recursos econômicos estejam sob controle da classe
trabalhadora.
3. A sua gestão tenha por objetivo promover a igualdade social (não somente
jurídica e política), mediante a intervenção dos poderes públicos.
Além disso, da perspectiva econômica, o socialismo pode ser entendido como
contraposto ao capitalismo. Para efeitos de contraste, o capitalismo, enquanto sistema
econômico, pode ser localizado nestes pontos, segundo Samuel Arnold16,:
1. Os meios de produção são, em grande parte, de propriedade privada.
2. A força de trabalho pertence às pessoas, que são legalmente livres para
vende-la ou negá-la a outros.
3. A produção econômica é orientada ao lucro, em vez do uso – as empresas
não produzem em primeira instância para satisfazer necessidades humanas,
mas para maximizar seus ganhos.
4. O mercado desempenha um papel primordial em alocar recursos na
produção de mercadorias primárias e determinar a quantia direcionada aos
investimentos.
Um sistema econômico é socialista quando rejeita (1) – a propriedade privada
dos meios de produção, em favor da propriedade pública ou social dos meios de
produção. A pergunta que resta é esta: é preciso rejeitar de (2)-(4) também? Aqui, as
várias vertentes do socialismo divergem.
Alguns declaram-se socialistas a favor do mercado. Sustentam que o
socialismo é compatível, em princípio, com empresas que buscam o lucro, com trabalho
remunerado pelo mercado, que decide e organiza questões relativas à produção e ao
investimento.
Por outro lado, os socialistas clássicos tendem a considerar que aceitar essas
premissas não é distinto de aceitar o capitalismo. Nesse sentido, socialismo seria
também exigir não só prioridade social dos meios de produção, mas produção planejada
da economia voltada para o uso, não para o lucro – em vez de confiar na ausência de
leis do mercado.

15
PIANCOLA, Cesare, “Socialismo” (verbete) In BOBBIO [et. al], 1987, p. 1196-1202.
16
ARNOLD, Samuel, “Socialism” (verbete) In Internet Encyclopedia of Philosophy. Disponível em:
<https://iep.utm.edu/socialis/>. Acesso em 22/11/2021.

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A partir da década de 1840, as palavras “comunismo” e “socialismo” acabaram,


pelo menos em parte, por indicar variações diversas do movimento que denunciava as
condições dos operários no desenvolvimento da sociedade industrial, se opunha ao
liberalismo político e econômico e ao individualismo, apresentava um projeto de uma
reconstrução da sociedade em bases comunitárias e promovia formas associativas de
vários tipos para realizar suas ideias: sindicais, cooperativas, comunidades etc.
No prefácio do Manifesto do Partido Comunista, por exemplo, diz Engels:
“Em 1847, apontavam-se como socialistas, de um lado, os seguidores de diversos
sistemas utópicos: discípulos de Owen na Inglaterra, de Fourier na França, uns e outros
já reduzidos ao estado de simples seitas em vias de gradual extinção; de outro, os
charlatanismos sociais mais diversos... em ambos os casos, tratava-se de homens
alheios ao movimento operário que procuravam mais que tudo o apoio das classes
‘instruídas’. Toda a fração da classe operária que se tinha convencido da insuficiência
das revoluções unicamente políticas e proclamara a necessidade de uma transformação
geral da sociedade, dizia-se comunista. Era um tipo de comunismo grosseiro, apenas
esboçado, puramente instintivo: visava, todavia, ao essencial e teve força suficiente entre
a classe operária para dar origem ao comunismo utópico, ao de Cabet na França e ao
de Weitling na Alemanha. Portanto, em 1847, o socialismo era um movimento burguês,
o comunismo um movimento de classe operária.”

A contraposição entre “socialismo” e “comunismo” perdeu centralidade na


metade do séc. XIX. Aconteceu a Revolução Francesa de 1848, que derrubou a
Monarquia de Julho (1830-1848) e conduziu à criação da Segunda República Francesa.
Em termos simbólicos, representou o fracasso de colocar em prática os programas
socialistas, em voga até então.
O problema principal passou a ser o de constituir organizações operárias
autônomas e de obter reivindicações básicas: direito à associação, à imprensa, à greve,
ao voto para além dos limites censitários dos regimes liberais de então.
A Associação Internacional dos Trabalhadores se chamou Primeira
Internacional, fundada em 1864. As demais associações de trabalhadores foram
formadas com nomes de partidos operários, trabalhistas, socialistas e social-
democráticos. A partir dos anos 1870, essas associações foram se juntando à Primeira
e formaram a Segunda Internacional, em 1889.
Com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e a Revolução Russa (1917), a
frente socialista se desintegrou e deu lugar ao leninismo. O partido bolchevique
assumiu a denominação de Partido Comunista em 1918, invocando o conteúdo
revolucionário do Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels. Rompia, assim,
com as posições reformistas até então majoritárias dos partidos europeus.

As teorias socialistas

São três as principais correntes socialistas modernas. Vejamos, a seguir, o que


cada uma defende.

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Socialismo utópico

Essa corrente socialista vê a classe trabalhadora como despossuída, oprimida e


geradora de riqueza social sem dela desfrutar. Para elas, os teóricos imaginam uma
nova sociedade onde não existam a propriedade privada, o lucro dos capitalistas, a
exploração do trabalho e a desigualdade econômica, social e política.
Imaginam novas cidades organizadas em grandes cooperativas geridas pelos
trabalhadores e nas quais haja escola para todos, liberdade de pensamento e de
expressão, igualdade de direitos sociais (moradia, alimentação, transporte, saúde),
abundância e felicidade.
As cidades são comunidades de pessoas livres e iguais que se autogovernam.
Por serem cidades perfeitas, que não existem em parte alguma, mas que serão criadas
pela vontade livre dos despossuídos, diz-se que são cidades utópicas e as teorias que
as criaram são chamadas de utopias.
A palavra “utopia” foi empregada pela primeira vez pelo filósofo inglês Thomas
More (1478-1535), no livro Utopia, descrevendo o que seria uma cidade ideal. O
vocábulo deriva de uma composição de dois outros: U-, prefixo de negação, e topos,
“lugar”. Nesse sentido, etimologicamente, quer dizer “não lugar”. Por essa razão, uma
associação comum à palavra é algo que seja “impossível”, “imaginário”, “subjetivo”.
Os principais socialistas utópicos sãos os franceses Saint-Simon (1760-1825),
Fourier (1768-1830), Proudhon (1809-1865), Louis Blanc (1811-1882), bem como o
inglês Robert Owen (1771-1858).
Anarquismo

O principal teórico dessa corrente socialista foi o russo Bakunin (1814-1876),


inspirado nas ideias socialistas de Proudhon. Seu ponto de partida é a crítica do
individualismo e do Estado liberal, considerado autoritário e antinatural. Veremos mais
sore o anarquismo no capítulo oportuno.

Socialismo científico ou comunismo

Crítica não só do Estado liberal, mas também do socialismo utópico e do


anarquismo, está localizada a obra de Karl Marx, em conjunto com Engels. É o que se
conhece hoje como marxismo (que veremos no capítulo oportuno).

Socialismo e Comunismo

Socialismo e comunismo, na doutrina de Marx, são formas de pós-capitalismo.


Entre as similaridades, podem ser apontados dois fatores:
• advogam que a propriedade dos meios de produção deve ser social, não
individual;
• rejeitam a orientação do mercado ao lucro, em vez do uso.

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Quanto às diferenças, pode ser citado a Crítica para o programa de Gotha, de


Marx, obra em que discute o pós-capitalismo, dividindo-o em duas partes: uma fase
menor, outra fase maior.
A fase menor foi chamada de socialismo pelos seguidores posteriores de Marx.
A fase maior foi chamada de comunismo pelo próprio Marx.
Para Marx, o socialismo ainda guarda características importantes do sistema
capitalista anterior, entre elas:
• Escassez material
• Estado
• Divisão do trabalho
• Atitude capitalista quanto à produção econômica
Por todas essas características, ainda que seja pós-capitalista, trata-se de uma
fase menor. A tendência, defende Marx, é que paulatinamente essas características
caiam em desuso para dar lugar à fase maior: o comunismo.
Mas o que seria o comunismo?
Marx não responde a essa questão em detalhes, mas estabelece alguns
princípios:
• Abundância material
• Abolição do Estado
• Ausência de divisão do trabalho
• Mudança em relação ao trabalho, encarado como um fim em si mesmo, não
mais como um meio a um fim.
Da perspectiva marxista, assim, embora ambos erradiquem propriedade privada e
lucro, apenas o comunismo elimina a divisão do trabalho, o Estado, escassez material
e, idealmente, o próprio conflito de classes. Seria o estágio final em que a sociedade
se libertaria do reino da necessidade para o reino da liberdade.

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11. Fascismo

Fascismo é, historicamente, um movimento autoritário e ultranacionalista


caracterizado por um poder ditatorial, supressão da oposição, forte controle da
sociedade e da economia, que ganhou proeminência no início do séc. XX na Europa.
Opõe-se ao anarquismo, à democracia, ao liberalismo e ao marxismo.
O primeiro movimento fascista surgiu na Itália, durante a Primeira Grande Guerra
(1914-1918), espalhando-se para outros países europeus. Acreditado que a democracia
liberal era obsoleta, o movimento organizou-se em ampla mobilização social, sob a
direção de um partido único, com base na justificativa de preparar a nação para
confrontos militares e dificuldades econômicas. Considerava a violência e a expansão
militar como meios legítimos de ação política. Sob o comando de um grande líder
carismático, agia mediante a demonização dos inimigos e o massacre contra os
opositores do regime.

Contexto histórico

Foram difíceis aquelas primeiras décadas de século 20. Por um lado, para quem
as viveu, era patente que o mundo havia dado uma guinada, que mudava a olhos vistos.
Havia automóveis nas ruas onde, anos antes, ainda se andava a cavalo. O telégrafo,
depois o rádio e o telefone, passaram a permitir um nível de instantaneidade de
comunicações jamais imaginado. Neste sentido, no de que a tecnologia parecia
caminhar mais rápido do que nunca e de que o mundo todo ficava cada vez mais
próximo, este início de século 21 é muito parecido com aquele início de século 20.
Mas havia complicadores fundamentais: a economia ainda era essencialmente
agrária. A ideia de Estados nacionais era muito recente. O prussiano Otto von Bismarck
assumiu o governo de uma Alemanha unificada em 1871. O Reino da Itália nascia dez
anos antes. Para um alemão de 1920, o conceito de uma só Alemanha era mais recente
do que o Golpe de 1964 é para um brasileiro de 2021. Havia inúmeras pessoas vivas
com memória do tempo em que não existia país e, assim como na Itália, havia a
convicção de que a nação não estava ainda de todo formada. Outros povos por essência
alemães — os austríacos, muitos suíços, para dar exemplos — viviam fora da fronteira.
(Hitler era austríaco.)
E há um último ponto fundamental: a tragédia única que foi a Primeira Guerra. A
tecnologia bélica já avançara para novos padrões, mas o pensamento militar não a
acompanhou. Lutou-se a Grande Guerra (1914-18), como se lutou todas as guerras
anteriores: no corpo a corpo. Mas os canhões e as granadas eram outros. As armas de
mão tampouco precisavam mais ser carregadas bala a bala — havia metralhadoras. E,
num tempo em que a química ainda começava a ser dominada de fato, exércitos
regulares usaram Gás cloro, Cianureto de hidrogênio e Gás mostarda com um nível de
impunidade que, hoje, seria considerado bárbaro. Foi uma carnificina que deixou
aleijados traumatizados e gente incapaz de trabalhar com não havia acontecido antes.
Ao fim da Guerra e com o Tratado de Versailles, que selou sua paz, a Europa era outra.
Versailles impôs dívidas duras a todos os derrotados e dificultou a vida de um dos
vitoriosos — a Itália.

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Àquela altura, a liberal-democracia ainda era jovem. Com momentos


conturbados — a Guerra Civil americana (1861-1865), o Período Napoleônico (1799-
1815), a decadência do Império Britânico —, ela ainda existia com alguma saúde nos
três países em que nascera. Em outros lugares, porém, o experimento não parecia
cumprir sua promessa. Economias devastadas, migração da produção agrícola para a
industrial, maus tratos de trabalhadores fabris, voto exclusivo da elite e pobreza – muita
pobreza. Até ali, a democracia liberal não entregara uma vida melhor, parecia só um
regime como todos os outros. Nos períodos de crise profunda do capitalismo, quando a
maneira de fazer dinheiro antiga se desmonta e a maneira nova ainda não se consolida,
o nível de insegurança na sociedade se multiplica. Nesse cenário, muita gente não está
capacitada para os novos trabalhos que existem, o trabalho de outros tantos deixa de
existir. De certo modo se parece ao cenário em que vivemos hoje, no início do séc. XXI.
Nesse contexto, o movimento fascista liderado por Benito Mussolini (1883-
1945), na Itália, caminhava numa direção similar. Formado comunista, Mussolini havia
rompido com seus pares na explosão da Guerra. Os socialistas acreditavam que a
população pobre da Europa deveria se unir perante o conflito que só interessava aos
patrões. O futuro premiê italiano, porém, não abraçou o internacionalismo socialista e
manteve-se um firme nacionalista.
Nos anos seguintes, imaginou uma alternativa ao comunismo de Karl Marx. Ao
invés do fim da luta de classes que levaria à Ditadura do Proletariado, Mussolini
imaginou um governo forte que orientaria todas as classes sobre como agir —
industriais, pequenos burgueses, proletários, todos trabalhariam juntos, cada qual em
sua função, pelos objetivos comuns da Nação tais quais orientados pelo Estado, pelo
governo.
Para garantir a uniformidade das diretrizes, ideias liberais como a divisão de três
poderes ou diversidade de partidos políticos não seriam possíveis. O Estado precisava
falar com uma só voz, através de um só líder. Estado e partido passavam a ser uma só
coisa, uma estrutura que coordenaria todas as entidades patronais e todos os
sindicatos. E sua credibilidade nascia da Nação, do ser italiano, um conceito que
Mussolini insuflava baseando-se nos símbolos de um passado heroico que enxergava
na Roma imperial.

Muitas definições

O primeiro teórico do fascismo foi o jurista alemão Carl Schmitt (1888-1985),


que ainda nos anos 1920 começou a criticar a incapacidade de democracias para lidar
com momentos de crise institucional. Naquela época, Schmitt defendia que ditaduras
poderiam ser necessárias e legais. Afinal, constituições recebem emendas e, se o
Parlamento decide conceder plenos poderes ao chefe do Executivo, a lei foi cumprida.
Ele não via este processo como necessariamente um redutor de liberdades. Bastava
que fossem criadas instituições através das quais os desejos do povo pudessem chegar
ao comando: uma estrutura organizada de imprensa, assembleias populares,
sindicatos, com pleno acesso ao partido do governo. O nazismo nasce das teorias de
Schmitt, mas o professor já observava o que ocorria na Itália com Mussolini.
O fascismo, por esta definição, é um sistema no qual Estado e Partido trocam
de lugar. Não há um partido que está no comando do Estado. O Partido é o Estado, e

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todas as instituições sociais se integram ao partido. Schmitt criou uma proposta de


sistema que compatibilizava o liberalismo econômico com o antiliberalismo político. E
esta é a primeira definição de fascismo.
Hanna Arendt (1906-1975), por sua vez, sugeriu que havia mais semelhanças
entre o nazismo e o stalinismo do que de ambos com o fascismo italiano. E aí é
importante esquecer a dicotomia direita-esquerda, que perde importância. Um de
extrema-direita, o outro de extrema-esquerda, Hitler e Stalin conduziam regimes
totalitários: a população é transformada numa grande massa, pesadamente
manipulada por propaganda que molda a realidade, com respeito ao regime imposto por
terror. O sistema totalitário, que se impõem em todos os aspectos de vida do cidadão,
é diferente do autocrático, é muito mais do que uma ditadura. O autocrata, como
Mussolini era aos olhos de Arendt, quer apenas poder.
Outros filósofos, nas décadas seguintes, ampliaram a ideia de totalitarismo para
incluir Mussolini e Mao Tsé-Tung (1893-1976), na China. Talvez o mais importante
deles, o filósofo polonês Zbigniew Brzezinski (1977-1981), considerava o quarteto
Hitler, Mussolini, Stalin, Mao equivalentes no totalitarismo, mas observava a diferença
entre esquerda e direita: o totalitarismo de direita busca subjugar o mundo perante
o domínio imperialista de uma nação ou raça; o de esquerda quer estender o comando
aos ‘proletários de todo o mundo’. São mais parecidos entre si do que com quaisquer
outros regimes, mas há diferenças fundamentais entre ambos.
O estudo do fascismo, como todo estudo histórico, é influenciado pela época.
Antes da Segunda Guerra (1940-1945), Schmitt o viu como uma solução para
a crise que as democracias viviam: a fusão entre um autocrata, as instituições da
sociedade, o partido único e o Estado. Tudo a mesma coisa.
No pós-guerra e na Guerra Fria (1947-1991), a distinção entre fascismo e
comunismo nublou-se, e a característica totalitária dos dois regimes foi mais
atentamente observada.
Na segunda metade do séc. XXI, uma série de autores, neste momento em que
uma onda de direita com tons radicais começa a alcançar democraticamente o poder
em vários países, propõe nova leitura.
Porque cada tempo apresenta seus próprios dilemas. O problema deste
momento, em que nos aproximamos dos novos anos 20, não é definir o que foi o
fascismo em seu ápice. Mas descobrir como identificar seus sinais quando aparece.
Dois livros tentam encarar este problema: um, ainda não publicado no Brasil, é Como
funciona o fascismo, do filósofo Jason Stanley (1969-). O outro é Fascismo: Um
Alerta, da ex-secretária de Estado americana e cientista política Madeleine Albright
(1937-). Ambos chegam a conclusões parecidas.
“O fascismo é um método de fazer política, uma técnica para chegar ao
poder”, diz Stanley. Nesse sentido, fascismo não é uma ideologia. É um jeito de
conduzir candidaturas que se torna viável em momentos de grande ansiedade. Tem um
pacote de características. Primeiro, constrói uma narrativa através da qual um pedaço
da sociedade pode se enxergar como vítima. “Grande a um tempo, aquela sociedade
foi destruída pelo liberalismo, pelo feminismo, pelo marxismo cultural, não importa.”

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O fascismo de Stanley é baseado na mentira, numa tentativa de obscurecer a


verdade. Líderes fascistas mentem e espalham mentiras, porque é fundamental deixar
a fronteira entre verdade e mentira a mais nublada possível. E um acordo de todos a
respeito de fatos — ou verdades — é essencial para que democracias funcionem. Um
passado melhor e perdido faz parte da história contada.
E há um último elemento: movimentos fascistas são extremamente
masculinizados, carregados de símbolos ligados a hombridade, e muito mobilizados
com uma decadência sexual, na qual enxergam a cultura se perdendo.
“O fascismo não é uma ideologia. É um método”, diz Albright. Oferece
soluções simples em tempos de crise. “Fascistas subvertem, desacreditam e eliminam
as instituições liberais da sociedade.”

Quem é fascista hoje

O estadunidense Donald Trump (1946-), o filipino Rodrigo Duterte (1945-), o


húngaro Viktor Orbán (1963-) ou o brasileiro Jair Bolsonaro (1955-), todos líderes de
direita de seus países, são associados ao fascismo por intelectuais atuais.
No entanto, não defendem uma proposta na qual o partido se torna o Estado e
a sociedade civil, simultaneamente. Não são fascistas perante a definição de Carl
Schmitt.
Quando Arendt e seus sucessores observaram que, mais do que o fascismo, era
o totalitarismo o marco da tragédia do século XX, descreveram um sistema ainda mais
longínquo daquele governado por todos esses líderes. Sob essa definição também não
são fascistas.
Porém, ao focalizar hoje nos métodos de chegar ao poder, Albright e Stanley
encontram várias características desses novos líderes com os fascistas iniciais. Nessa
análise, o fascismo se assemelha muito mais à demagogia e ao populismo que à
doutrina historicamente localizada, característica da Europa do início do séc. XX.
Essa ainda é uma questão para a qual ninguém deu uma resposta convincente.
Porque, se democracias são de fato mais resilientes do que eram há um século,
populistas de direita (ou de esquerda) podem até passar pelo governo, mas passam
sem ter modificado o Estado.

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12. Nazismo

Nazismo, oficialmente Nacional Socialismo, é uma prática ou ideologia


associada a Adolf Hitler (1889-1945) e Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores
Alemães. Durante a ascensão de Hitler na década de 1930, o movimento era
frequentemente referido como hitlerismo.
Nazismo é uma forma de fascismo, com desvalorização da democracia liberal.
Incorpora elementos de antissemitismo (preconceito e discriminação contra judeus),
anticomunismo e de racismo. É nacionalista extremista e se origina nos movimentos
de retomada do espírito alemão do séc. XIX.
Apoiava e desenvolvia teorias pseudocientíficas de hierarquia racial,
identificando os germânicos como parte da raça superior ariana. Seu objetivo, nesse
sentido, era o de criar homogeneidade cultural, baseado na pureza racial, que
representava a comunidade do homem comum.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1940-1945), milhões de pessoas, inclusive
cerca de dois terços da população de judeus da Europa, foram exterminados num
genocídio que ficou conhecido como Holocausto.

Contexto histórico

Foram difíceis aquelas primeiras décadas de século XX. Por um lado, para quem
as viveu, era patente que o mundo havia dado uma guinada. Havia automóveis nas ruas
onde, anos antes, ainda se andava a cavalo. O telégrafo, depois o rádio e o telefone,
passaram a permitir um nível de instantaneidade de comunicações jamais imaginado.
Neste sentido, no de que a tecnologia parecia caminhar mais rápido do que nunca e de
que o mundo todo ficava cada vez mais próximo, este início de século 21 é muito
parecido com aquele início de século 20.
Mas havia complicadores fundamentais: a economia ainda era essencialmente
agrária. A ideia de Estados nacionais era muito recente. O prussiano Otto von
Bismarck (1815-1898) assumiu o governo de uma Alemanha unificada em 1871. O
Reino da Itália nascia dez anos antes. Para um alemão de 1920, o conceito de uma só
Alemanha era mais recente do que o Golpe de 1964 é para um brasileiro de 2021. Havia
inúmeras pessoas vivas com memória do tempo em que não existia país e, assim como
na Itália, havia a convicção de que a nação não estava ainda de todo formada. Outros
povos por essência alemães — os austríacos, muitos suíços, para dar exemplos —
viviam fora da fronteira. (Hitler era austríaco.)
E há um último ponto fundamental: a tragédia única que foi a Primeira Guerra. A
tecnologia bélica já avançara para novos padrões, mas o pensamento militar não a
acompanhou. Lutou-se a Grande Guerra (1914-18), como se lutou todas as guerras
anteriores: no corpo a corpo. Mas os canhões e as granadas eram outros. As armas de
mão tampouco precisavam mais ser carregadas bala a bala — havia metralhadoras. E,
num tempo em que a química ainda começava a ser dominada de fato, exércitos
regulares usaram Gás cloro, Cianureto de hidrogênio e Gás mostarda com um nível de
impunidade que, hoje, seria considerado bárbaro. Foi uma carnificina que deixou
aleijados traumatizados e gente incapaz de trabalhar com não havia acontecido antes.

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Ao fim da Guerra e com o Tratado de Versailles, que selou sua paz, a Europa era outra.
Versailles impôs dívidas duras a todos os derrotados e dificultou a vida de um dos
vitoriosos — a Itália.
Àquela altura, a liberal-democracia ainda era jovem. Com momentos
conturbados — a Guerra Civil americana (1861-1865), o Período Napoleônico (1799-
1815), a decadência do Império Britânico —, ela ainda existia com alguma saúde nos
três países em que nascera. Em outros lugares, porém, o experimento não parecia
cumprir sua promessa. Economias devastadas, migração da produção agrícola para a
industrial, maus tratos de trabalhadores fabris, voto exclusivo da elite e pobreza – muita
pobreza. Até ali, a democracia liberal não entregara uma vida melhor, parecia só um
regime como todos os outros. Nos períodos de crise profunda do capitalismo, quando a
maneira de fazer dinheiro antiga se desmonta e a maneira nova ainda não se consolida,
o nível de insegurança na sociedade se multiplica. Nesse cenário, muita gente não está
capacitada para os novos trabalhos que existem, o trabalho de outros tantos deixa de
existir. De certo modo se parece ao cenário em que vivemos hoje, no início do séc. XXI.

Nazismo e socialismo (o nazismo é de esquerda?)

O Partido Nazista, ou Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães,


por carregar o termo “socialista” no nome, seria de esquerda. Não é uma leitura que
encontre endosso entre os principais especialistas a respeito da Alemanha de Hitler,
tampouco na história ensinada nas escolas de Alemanha ou Israel. Mas seria incorreto
sugerir que a questão é simplória. O termo socialista no nome do partido não é trivial:
está cheio de significados, profundamente ancorado no que era se compreender como
alemão nos anos 1920 e 30.
No país onde imperou o regime, não se usa um substantivo próprio mas as
palavras diretamente descritivas da ideologia. Quando o alemão
ouve Nationalsozialistische, nacional-socialismo, ele não pensa em marxismo ou
esquerda. Este conceito o remete à Volksgemeinshachaft — a “comunidade do homem
comum”, do alemão puro padrão, para um tempo antes de pessoas que não eram
alemães de verdade aparecerem.
Para compreender o que era nacional socialismo para os nazistas, é preciso
compreender o dilema entre Gemeinschaft e Gesellschaft. Em um artigo denominado
“Volksgeminschaft: A Modern Perspective on National Socialist Society” o
historiador e professor de ciência política Michael Wildt (1954-), do Instituto de
Pesquisa Social de Hamburgo, explora com profundidade a briga de palavras e a
construção dos conceitos.
Parte da confusão nasce doutro uso de palavras. O que nós chamamos de
nazistas os alemães sempre chamaram de nacional-socialistas, sem contração, sem
criar um nome próprio. Historiador da Universidade de Memphis, Andrei Znamenski
(1960-) reflete sobre o quanto os termos ‘nazi’ e ‘nazismo’ dificultam a compreensão de
como pensavam política Hitler e seus seguidores, no artigo “From ‘National Socialists’
to ‘Nazi’: History, Politics, and the English Language”.
Nos basearemos nos artigos de Wildt e Znamenski para responder à questão.

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O principal movimento artístico do final do século XIX é o romantismo. Uma de


suas características é a celebração da cultura local: o que é ser brasileiro, italiano,
alemão. Entre o teatro de Johann von Goethe (1832-1749) e a música de Richard
Wagner (1813-1883) havia no ar uma tentativa de definir o que é ser nacional num país
que jamais fora uma nação. Nessa época, na Alemanha, duas palavras entraram em
choque: comunidade (Gemeinschaft) e sociedade (Gesellschaft).
Ferdinand Tönnies (1855-1936), um filósofo formado pela Universidade de
Tübingen, publicou em 1877 um livro chamado Comunidade e
Sociedade (Gemeishchaft und Gesellschaft). A sociedade, presente num país que
deixa de ser baseado em pequenas aldeias do mundo agrícola e migra para as grandes
cidades industriais, é impessoal. O filósofo e sociólogo percebia uma qualidade perdida
naquela comunidade de conhecidos e define, ali, uma oposição que se consolidará no
imaginário alemão nas décadas seguintes: comunidade não é sociedade.
Nos primeiros momentos do século XX, a palavra se estende para a
comunidade do povo, do homem comum (Volksgemeinshachaft). Volks é povo, no
sentido de gente comum e normal da palavra. Na cabeça do alemão, está presente a
oposição entre a comunidade que houve e a sociedade que se formou. Lentamente,
consolida-se um conjunto de ideias que remete a uma visão de que, no passado, era
melhor; de que não se pode, como povo, perder a essência do que se foi.
A Volksgemeinshachaft — a comunidade do povo — é superior à Gesellschaft, a
sociedade – impessoal e sem espírito.
Ao movimento político responsável pelo Holocausto, em português, chamamos
nazismo. Quem fala espanhol faz o mesmo. Em inglês o chamam de nazi. Em alemão
alternam entre Nationalsozialistische e NSDP — sigla para Nationalsozialistische
Deutsche Arbeiterpartei, Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães.
Por que, então, os alemães escolheram o termo “socialista”?
Na Alemanha, para remeter à ideia da comunidade do homem comum, os
nazistas escolheram usar o termo socialista (Sozialistische). Naquele ambiente no qual
imperava a dúvida sobre a eficácia da liberal-democracia, os dois extremos cresciam
em todo o continente. Buscava-se uma alternativa à democracia, que inspirava a ideia
de um regime corrupto e confuso.
O modelo comunista de Lênin (1870-1924) na Rússia, que propunha um país
sem classes sociais, no qual todos seriam iguais, era uma referência. O nome era
socialismo. Entre operários principalmente, era um termo de grande apelo. Houve um
componente de estratégia retórica na escolha da palavra “socialista” (Sozialistische). O
conceito comunista era declaradamente internacional. Ao enxergar a sociedade dividida
em classes, não em culturas, os comunistas imaginavam um levante internacional dos
trabalhadores que compreendiam explorados pelos patrões. Os países, as nações, não
eram relevantes. Relevantes eram a maioria de operários que, se levantassem juntos,
simultaneamente, inviabilizariam a produção do capitalismo e teriam número para
formar um novo poder global.
Porém, o “nacional” de “nacional socialista” (Nationalsozialistische) não é
gratuito. O que os nazistas propunham era diferente. Não um “socialismo” ancorado na
ideia de classes, mas numa ideia étnica e cultural: um retorno à comunidade de
alemães, antes da sociedade alemã.

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Não ancoravam sua ideia de ditadura nos símbolos de um passado glorioso


romano, como os fascistas italianos. Tampouco o faziam em classes sociais opostas,
como os comunistas russos. O que unia alemães era a ideia de etnia e cultura comuns
— Volksgemeinshachaft. E este, fazia já décadas, não era um debate de identidade
alheio ao povo alemão. Na ocasião, misturou-se à crise da República de Weimar
(1919-1933), à quebra econômica decorrida da Crise de 1929.
Se a diferença entre esquerda e direita é que a primeira procura uniformizar a
sociedade e, a segunda, considera que diferenças são naturais, não há como ver o
Nacional Socialismo alemão como de esquerda. Ele se ancorava na convicção de que
os alemães eram diferentes, e superiores, a todos os outros humanos.

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13. Social-democracia
Conceito

A social-democracia é uma doutrina social e econômica dentro do espectro do


socialismo, que apoia a democracia política e econômica, segundo Andrew Heywood17.
Como um regime político, é descrita por acadêmicos como defensora de intervenções
econômicas e sociais para promover a justiça social dentro da estrutura de uma política
liberal-democrática e uma economia mista de orientação capitalista. É conhecida como
a forma mais comum de socialismo ocidental ou moderno, bem como a ala reformista
do socialismo democrático.
Apresenta um compromisso com a democracia representativa e participativa,
medidas de redistribuição de renda, regulação da economia de interesse geral e
disposições de bem-estar social.
No pós-guerra, passou a ter influência na política socioeconômica na Europa do
Norte e Ocidental. Passou a ser associada ao keynesianismo em economia, ao modelo
nórdico e aos estados de bem-estar dentro de círculos políticos em o final do século XX.

História

A história da social-democracia remonta ao movimento socialista do século XIX.


Veio para defender uma transição evolutiva e pacífica do capitalismo para o socialismo,
usando processos políticos estabelecidos, em contraste com a abordagem socialista
revolucionária para a transição associada ao marxismo ortodoxo.
No início do pós-guerra na Europa Ocidental, os partidos social-democratas
rejeitaram o modelo político e econômico stalinista então vigente na União Soviética,
comprometendo-se com um caminho alternativo para o socialismo ou com um
compromisso entre capitalismo e socialismo.
Nesse período, os social-democratas abraçaram uma economia mista baseada
no predomínio da propriedade privada, com apenas uma minoria de utilidades
essenciais e serviços públicos sob propriedade pública.
Os social-democratas promoveram a economia keynesiana, o intervencionismo
estatal e o estado de bem-estar, enquanto colocavam menos ênfase no objetivo de
substituir o sistema capitalista (mercados de fatores, propriedade privada e trabalho
assalariado) por um sistema econômico socialista qualitativamente diferente.
Embora retendo o socialismo como uma meta de longo prazo, a social-
democracia se distingue de algumas formas modernas de socialismo democrático por
buscar humanizar o capitalismo e criar as condições para que ele leve a resultados mais
democráticos, igualitários e solidários.
É caracterizada por um compromisso com políticas voltadas para a redução da
desigualdade, eliminação da opressão de grupos desfavorecidos e erradicação da

17
HEYWOOD, 2007.

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pobreza, bem como apoio a serviços públicos universalmente acessíveis, como


creches, educação, idosos, saúde e trabalhadores. compensação.
A Terceira Via, que ostensivamente visa a fundir a economia liberal com as
políticas de bem-estar social-democrata, é uma ideologia que se desenvolveu na
década de 1990 e às vezes é associada a partidos social-democratas. No entanto,
alguns analistas caracterizaram a Terceira Via como parte do movimento neoliberal.

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14. Direita e Esquerda

Definição inicial

A primeira informação para esclarecer o que é direita e esquerda é esta: não é


possível compreender todas as posições políticas somente no eixo esquerda-direita. Há
posições políticas completamente diferentes que compartilham o mesmo eixo: é o caso
da social-democracia e do comunismo soviético, na esquerda; e do conservadorismo e
do libertarianismo, na direita. Como diz Norberto Bobbio, celebre cientista político
italiano:
“Direita e esquerda não são conceitos absolutos. São conceitos relativos. [...] não são
palavras que designam conteúdos fixados de uma vez para sempre. [...] O fato da direita
e esquerda representarem uma oposição [...] não diz nada sobre o conteúdo das duas
partes contrapostas. A oposição permanece, mesmo que o conteúdo dos dois opostos
possa mudar.”18

Se fosse possível definir esquerda e direita em uma frase: a esquerda prioriza


igualdade material e sociedade ao passo que a direita prioriza igualdade formal,
indivíduo e eficiência econômica19. Enquanto a esquerda defende que a desigualdade
é socialmente construída, a direita aceita a desigualdade como natural.20
A direita tende a falar que a atuação da esquerda, historicamente, suplanta a
liberdade do indivíduo, impondo-lhe a vontade da maioria.
A esquerda contesta que, se as pessoas nascem em contextos tão diferentes e
desiguais, como estar autorizado a falar que todos têm a mesma liberdade? A liberdade
de escolha pressupõe que todos têm o máximo de igualdade possível no ponto de
largada. O caminho de uma pessoa socialmente desfavorável é muito mais difícil, de
modo que dizer que ela não conseguiu ascender socialmente exclusivamente por conta
de sua vontade é um mecanismo ideológico para legitimar desigualdades estruturais.
Essas são maneiras extremas de abordar a questão. Na maior parte dos casos,
o que ocorre é que as pessoas transitam entre uma posição e outra. As pessoas
transitam pelo centro. Na prática, o que acontece é que, para pessoas que se identificam
fortemente à esquerda, o centro pertence à direita e, para pessoas que se identificam
fortemente à direita, o centro é de esquerda.

18
BOBBIO, 2001, p. 107-8.
19
Sobre associação de cargas semânticas positivas e negativas à direita e à esquerda, diz Bobbio “Saber
qual dos dois [direita e esquerda] é o axiologicamente positivo e qual o axiologicamente negativo não
depende do significado descritivo, mas dos opostos juízos de valor que são dados às coisas descritas.”
Idem, p. 86.
20
“Uma coisa é a doutrina igualitária, ou um movimento nela inspirado, que tendem a reduzir as
desigualdades sociais e tornar menos penosas as desigualdades sociais e a tornar menos penosas as
desigualdades naturais; outra coisa é o igualitarismo, quando entendido como ‘igualdade de todos em
tudo’”. Idem, p. 116.

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2. Dimensão histórica

Historicamente, a definição aparece na Revolução Francesa, no contexto da


Assembleia dos Estados Gerais, instituída com o objetivo de decidir os rumos da França
após as revoltas de 1789. No salão em que a Assembleia se reuniu, dois grupos
principais debatiam.
Do lado esquerdo, ficavam os mais exaltados e radicais, alinhados à baixa
burguesia e aos trabalhadores. Os principais representantes desse grupo eram os
jacobinos.
Do lado direito, estavam aqueles mais moderados, com tendência à conciliação
e com boa articulação com a nobreza e a alta burguesia. Eram conhecidos como
girondinos.

3. Diferenças quanto a visões de mundo


3.1 Política

O debate político é constantemente remetido a duas figuras históricas do


pensamento político moderno: Edmund Burke (1729-1797) e Thomas Paine (1737-
1809).
Edmund Burke se coloca contra a Revolução Francesa e discursa contra a
situação que poderia advir daquele fato político. Burke tem medo de que a Revolução
descambe para o simples terror. Defende que não se podem simplesmente destruir as
tradições. Deve-se cuidar para fazer reformas cuidadosas, em vez de querer começar
do zero a experiência política e social. Burke é considerado o pai do conservadorismo
político moderno.
Thomas Paine, que combateu ao lado dos americanos em sua Revolução,
olhava para a Revolução Francesa com esperança. Acreditava que era possível
começar o mundo do zero – crença compartilhada por muitos iluministas do século XVIII.
A razão humana seria capaz de permitir que os homens reformulassem a sua vida social
a partir de um planejamento teórico, ideológico e político. Paine é considerado o pai do
progressismo político moderno.
A esquerda prima pela igualdade social. A crença básica é que a sociedade
deve agir em prol daqueles que estão em desvantagem relativa. O Estado, portanto,
deve intervir na economia se for preciso promover inclusão social via transferência de
renda e promulgação de leis aumentando os direitos de cidadania – trabalhistas,
previdenciários, educacionais etc.
A direita promove a igualdade jurídica, assegurada em lei, cabendo ao
indivíduo exercê-la sem os entraves estatais. A crença básica é que a desigualdade é
natural, cabendo aos indivíduos, por livre escolha, mais que ao estado, combater as
desigualdades.

3.2 Economia

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A esquerda é essencialmente voltada à sociedade e não ao indivíduo. Os meios


de produção estão progressivamente voltados à gestão coletiva. Deve haver acordos
coletivos entre empresários e sindicatos e impostos mais altos para financiar serviços
públicos e distribuição de renda.
Algumas pautas associadas à esquerda derivam de uma noção de que o
Estado precisa ser o gerenciador da economia a fim de promover o bem-estar social:

• Defesa de impostos para financiar o combate à desigualdade material.


• Geração progressiva de empregos públicos.
• Proteção contra abusos do mercado sem regulação e concentração de renda.
A direita é essencialmente voltada ao indivíduo e não à sociedade. Os meios de
produção estão progressivamente sob o comando privado. Deve haver acordos
individuais entre empregadores e empregados, sem intermédio de sindicados, bem
como impostos mais baixos, deixando mais dinheiro nas mãos dos indivíduos para que
eles decidam sobre seu uso.
A direita liberal, por isso, defende:

• Corte e progressiva extinção de gastos sociais.


• Diminuição do serviço público por julgá-lo ineficiente e caro.
• Facilitação da privatização.
• Desconsideração da concentração de renda como problema social.

3.3 Sociedade

Movimentos típicos de esquerda, como os diferentes vertentes do feminismo,


algumas moderadas e algumas radicais, apresentam conflitos internos. Trata-se, é
claro, de uma generalização que serve para ilustrar um exemplo.
A esquerda utiliza o viés econômico para criticar a mídia. A direita utiliza o viés
social para o mesmo propósito. Por isso, no Brasil, ambas criticam a Rede Globo – a
emissora levanta pautas economicamente liberais, ao passo que levanta também
pautas de minorias dos movimentos feminista, negro e LGBTQIA+.
Há cisões fortes em ambos os espectros por conta dessas interpretações. Na
esquerda, por exemplo, há um forte conflito entre setores de inspiração marxista que
entendem a economia e a questão de classe como mais importantes, enquanto outros
priorizam reformas focadas em identidades (gênero, raça etc.) e não necessariamente
se opõem às vertentes do capitalismo.

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4. Diagramas políticos

A classificação em direita e esquerda, herdeira da Assembleia dos Estados


Gerais da Revolução Francesa, não funciona mais. Ela localiza as posições políticas
apenas em uma reta, em que nos extremos estão os dois polos. Isso apresenta
problemas como colocar do mesmo lado pessoas que defendem ditaduras e pessoas
que defendem democracias – como é o caso de liberais e de nazistas à direita, e de
nacionais-desenvolvimentistas e comunistas stalinistas à esquerda.
Para evitar esse problema, passou-se a pensar não mais em uma reta, mas em
um plano cartesiano com duas retas (X e Y), de modo a pensar tanto gradações na
horizontal e na vertical, quanto nas horizontais.

4.1 Plano de Pournelle (1963)

No primeiro eixo, há a
categoria do estatismo, postura
perante o Estado – uma
extremidade representando o
estatismo total; outra, o mínimo.
No segundo eixo, há a
categoria do racionalismo,
postura perante o uso da razão
como ferramenta de solução de
problemas sociais – uma
extremidade representando o
racionalismo total; outra, o
antirracionalismo, que ou
abandona a ideia do racionalismo como organizador social, ou prioriza outros
elementos, tais quais tradição, questões étnicas, questões folclóricas etc.
As diagonais definem os aliados, elementos que, embora em extremidades
diferentes, contêm elementos parecidos ou estão dentro de uma argumentação
semelhante.
As diagonais definem os aliados naturais, ou seja, elementos políticos que, ainda
que em extremidades opostas, possuem uma retórica ou uma base semelhante. Por
exemplo, os anarquistas clássicos, como é o caso de Bakunin (1814-1876), apresentam
semelhanças retóricas com os comunistas stalinistas. Não obstante discordarem quanto
ao papel do Estado, apresentam bases ideológicas semelhantes. Outro exemplo, o
libertarianismo, como é o caso de Ayn Rand (1905-1982), apresentam semelhanças
retóricas com os nazistas.
Nesse esquema, os adversários políticos são os que estão em quadrantes
próximos, não em quadrantes da diagonal.
A maior crítica a esse modelo veio dos libertários, em decorrência da associação
ideológica entre libertarianismo e nazismo.

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4.2 Plano de Nolan (1969)

O gráfico foi criado por David Nolan, um


dos fundadores do Partido Libertário dos EUA.
Não à toa esse modelo tende a ser adotado por
libertários. Há dois eixos com cinco blocos, com
um centro, de modo a formar uma gradação.
O eixo X é o da liberdade econômica.
O eixo Y é o da liberdade individual.
No ponto de encontro dos eixos, ou seja,
na situação em que a liberdade individual e a
liberdade econômica é zero, localiza-se o
populismo totalitário.
No ponto em que só há contato com o
eixo Y em seu grau máximo, ou seja, na
situação em que só há liberdade individual, mas não econômica, localiza-se a
esquerda.
No ponto em que só há contato com o eixo X em seu grau máximo, ou seja, na
situação em que só há liberdade econômica, mas não individual, localiza-se a
direita.
No ponto em que acontece contato com o eixo X em seu grau máximo e com o
eixo Y em seu grau máximo, ou seja, na situação em que liberdade individual e
liberdade econômica é total, localiza-se o libertário.
Há algumas críticas a esse modelo.
A primeira é que não há diferenciação nítida entre liberdade econômica e
individual. Por exemplo, o direito de fumar pode tanto ser liberdade individual de um
consumidor comprar, quanto pode ser liberdade econômica de um produtor fabricar,
distribuir e vender para o cliente final.
A segunda é que há um claro enviesamento libertário, localizando o
libertarianismo como o melhor modelo possível.

4.3 Compasso político

O compasso político é feito por uma


Fundação do Reino Unido. Há dois eixos. O eixo X
divide-se entre direita e esquerda em relação à
economia política. O eixo Y divide-se em
autoritarismo e libertarianismo, quanto ao
controle das liberdades políticas.
No eixo X, há a liberdade econômica. A
esquerda defende que, progressivamente, a

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economia deve ser controlada por uma entidade coletiva, seja o Estado, seja uma
comunidade. A direita defende que, progressivamente, deve haver total liberdade de
mercado.
No eixo Y, há a liberdade política. O autoritário defende que, progressivamente,
a liberdade deve ser controlada por uma entidade coletiva, seja o Estado, seja uma
comunidade. O libertário defende que, progressivamente, deve haver total liberdade
individual.
Nesse modelo, é possível haver:
• Libertarianismo de esquerda: controle da liberdade de mercado com liberdade
individual.
• Libertarianismo de direita: liberdade de mercado com liberdade individual.
• Autoritarismo de esquerda: controle da liberdade de mercado e controle da liberdade
individual.
• Autoritarismo de direita: liberdade de mercado e controle da liberdade individual.

Cada um desses quatro blocos apresenta antagonismos com todos os outros


blocos.
Também há críticas a esse modelo.
A principal é uma falta de sustentação acadêmica – muitos o veem apenas
como uma curiosidade de internet que uma ferramenta científica válida.
Além disso, coloca-se o problema do anacronismo – aplicação de um conceito típico
de um contexto histórico a outro a ele completamente alheio. Por exemplo, é possível
analisar direita e esquerda, no período entre Guerras, de 1930 até a 2ª Grande
Guerra, sob o prisma do liberalismo, tendo como principal definidor a liberalização
econômica ou o libertarianismo, tendo em vista que se tratava de um período pós crise
de 1929, isto é, em que houve uma intervenção dos Estados em suas respectivas
economias?

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15. Conservadorismo e Progressismo

Conservadorismo e progressismo não são, de fato, de natureza especulativa,


mas podem ser usados como símbolos de complexas tendências da história do
Ocidente. É a tese de Tiziano Bonacci, que seguiremos aqui.
Em sua origem histórica, ambos os termos são inseparáveis do processo de
laicização do pensamento político europeu que, fazendo da sociedade o lugar da
completa autorrealização do homem, transformou a ação política em instrumento
libertador da humanidade.
Nesse sentido, são frutos da modernidade, conceito que vimos no Módulo 1
(História política e cultural). Para recapitular, a modernidade nasce com o

• desmoronamento da cosmologia antiga e com o


• nascimento de uma reavaliação das autoridades religiosas.
Nesse sentido, os modernos abandonam a noção de ordem cósmica (típica dos
antigos) e criticam a autoridade religiosa – com ela a salvação pela fé na figura de Jesus
(típica dos medievais). Trocaram-na pelo ideal humanista e pelas ideias de
racionalidade e liberdade humanas, típicas do Iluminismo. São estes os pilares que
informam o homem moderno:

• possui espírito crítico que opera via dúvida de tudo o que não passa pelo
crivo da razão, inclusive o conhecimento da tradição (Descartes),
• distingue-se por sua capacidade de se aperfeiçoar e não está limitado à sua
natureza (Rousseau),
• é livre para agir moralmente e negar o próprio egoísmo, rumo a princípios
universais (Kant).
Os grandes anseios humanos não mais se fundamentam na ordem cósmica,
nem na fé. Diferentemente, passam a querer se realizar no plano puramente humano.
Nesse panorama, acontecem por tripla via:

• Revolução (comunismo),
• Preservação e exaltação da nacionalidade (nacionalismo),
• Descoberta e inovação científicas (cientificismo).
O conservadorismo surge, então, como resposta às teorias que, a partir do séc.
XVIII, distanciaram-se da visão tradicional pré-moderna.
Ainda assim, o resultado que tendiam essas duas posturas – progressista e
conservadora – não se confundia com a postura anterior. Ambas viam a história humana
como um processo aberto e ascendente, baseado numa concepção de sociedade
dinâmica, não estática.

Conservadorismo

Primeiro é preciso fazer um esclarecimento: a confusão entre conservadorismo


e as ideologias de extrema direita é mais retórica que teoria, isto é, é mais discurso
distorcido com fins políticos que descrição honesta da realidade. Geralmente

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conservadorismo é associado à autoritarismo, elitismo e fascismo. Mas isso é um erro


teórico, segundo Anthony Quinton (1925-2010), um filósofo político britânico, uma das
referências contemporâneas no assunto. É dele que partiremos para a definição de
conservadorismo.
Segundo o autor, há uma tríade antiga, moderna e contemporânea que forma o
conservadorismo (notadamente de cunho britânico, de onde é o próprio pensador):
Aristóteles (384-322 a.C.), Edmund Burke (1729-1797) e Michael Oakeshott (1901-
1990).
Doutrinas centrais

A primeira doutrina central para o conservadorismo é o tradicionalismo. Trata-


se da ideia de continuidade na política, que se traduz na manutenção das instituições e
práticas, ao passo que suspeita das mudanças, particularmente as repentinas e
profundas, como as feitas por revoluções.
É preciso observar que a não disposição para a mudança não implica a
rejeição completa da mudança. Do ponto de vista conservador, caso deva haver
mudança, então precisa ser gradual, considerada com prudência.
A raiz intelectual do tradicionalismo na política é o ceticismo, o segundo pilar
intelectual do conservadorismo.
Trata-se da visão filosófica em epistemologia, segundo a qual não se sabe qual
é a tese verdadeira sobre algo, cabendo então suspender o juízo, isto é, não se
pronunciar enquanto não houver suficiente investigação – “sképsis”, palavra grega que
origina “ceticismo”, nada mais é que “investigação”, sendo o cético aquele que continua
investigando e que não se pronuncia enquanto não chegar ao termo da investigação.
Se o cético suspende o juízo no âmbito teórico para continuar investigando, no
âmbito prático opta por confiar nas instituições consolidadas – costumes e leis,
principalmente. Por mais que, epistemologicamente, não saiba se são verdadeiras ou
falsas, justas ou injustas, no âmbito prático, opta pela prudência de continuar acatando
suas determinações. O critério, vale ressaltar, é prático, antes que teórico. Isso quer
dizer que é um critério para a ação, ao invés de um critério para avaliar o valor de
verdade de uma doutrina.
Valem mais as habilidades e práticas consolidadas que as abstrações, porque,
por mais que não sejam teoricamente rígidas sob os padrões de exatidão, justamente
por terem se
O terceiro pilar do conservadorismo é o organicismo, a ideia de que seres
humanos e sociedade são organicamente relacionados. Isso quer dizer que seres
humanos não são plenamente formados, exceto em seu aspecto biológico, de modo
independente das instituições sociais e práticas culturais nas quais estão inseridos.
Nesse sentido, não há natureza humana universal. Cada sociedade produzirá suas
individualizações e suas demandas, a ponto de não haver uma ideal que sirva de
modelo para o indivíduo universal nascer e crescer.
Por esse motivo, não o conservadorismo desconfia da teorização, típica das
ciências naturais, aplicadas para delimitar o que significa ser homem. Assim como não
há ciência natural possível para estabelecer como fazer um poema, como fazer uma
amizade e como fazer amor, não há também uma ciência natural de como descrever a
natureza humana.

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Conservadorismo e ideologia

Porque desconfia dessa teorização abrangente sobre a natureza humana, o


conservadorismo não se considera uma ideologia, segundo Quinton. Isso porque, uma
ideologia é uma teoria geral sobre a realidade, e o conservadorismo é justamente a
negação da possibilidade de uma teoria geral sobre a realidade.
Assim, quando um conservador se posiciona a favor, por exemplo, da
monarquia, da aristocracia hereditária, da Igreja, isso nada mais é que manifestação de
uma atitude historicamente localizada, não de uma orientação que vale para todo e
qualquer contexto temporal e local.
Enquanto teoria, o conservadorismo é formal, procedimental ou
metodológico, ao invés de material, substantivo ou propositivo. Isso implica dizer
que é antes um modo de agir formalmente delimitado pelo princípio da desconfiança
cética e não uma proposta de como entender a realidade e o ser humano.
O livro clássico geralmente atribuído ao conservadorismo é o de Edmund Burke,
Reflexões sobre a revolução na França. Enquanto tradicionalista, concebia a
constituição da realidade enquanto histórica e contínua, não enquanto fruto de
planejamento e artifício – por isso desconfiava da revolução, cujo objetivo era instaurar
uma realidade nova e profundamente diferente da anterior em pouco tempo. Também
defendia não haver ideal político universal, tampouco uma lista abstrata de direitos
humanos fundamentais.
Porém, é a Aristóteles que costuma remontar a tradição. O filósofo antigo
defendia o governo da lei impessoal, ao invés do governo de indivíduos. Via os estados
constitucionais como estados saldáveis, ao passo que os estados despóticos eram
vistos como corrompidos. Foi crítico da república platônica, porque abolia a instituição
da família e da propriedade privada. Concebeu uma teoria orgânica entre ser humano e
sociedade – resumida na célebre frase o homem é um animal político. Por fim, via a
política como atividade da prudência, ao invés de ofício de pensadores treinandos com
acesso direto à Verdade, como via seu mestre Platão.

Progressismo

No decorrer do séc. XIX, o progressismo se foi construindo baseado em três


hipóteses fundamentais: científica, democrática e histórico-materialista.
A científica faz das ciências naturais modelos a imitar no desenvolvimento das
ciências humanas e do próprio homem.
A democrática considera a extensão do poder de decisão política a todos os
indivíduos o melhor resultado a que se poderia chegar.
A histórico-materialista faz da luta de classes o pré-requisito do necessário
progresso humano.
Combinadas entre si, essas teses formam o modelo interpretativo que serviu de
base para inúmeras doutrinas do séc. XIX em diante até nossos dias.
Com base nesse conjunto de posições, o progressismo tende a inviabilizar e
estabilização de qualquer novo equilíbrio de poder, acusando-o de insuficientemente

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racional ou ligado a interesses de classe. Nesse sentido, tende a considerar o poder


político como um limite a superar, porque é essencialmente repressivo, baseado
fundamentalmente na repressão e interesses não declarados – de classe (Marx),
inconsciente (Freud), de poder (Foucault).
O progressismo, nesse sentido, tende a encarar o homem como
fundamentalmente livre e racional, virtualmente capaz de criar comunidades onde não
exista coação e prevaleça a cooperação.
Além disso, enxerga os avanços econômicos e sociais - impulsionados pela
ciência e tecnologia – como imprescindíveis para a melhoria da condição humana.
Tem caráter eminentemente reformista (mas não radical) e secular (não
religioso). Nesse sentido, um dos aspectos fundamentais é a defesa de que das
mudanças na sociedade deve ser baseada na razão - como defendido pelo iluminismo
–, em contraposição à tradição, como defendido pelo conservadorismo.
A principal discordância em relação ao conservadorismo é quanto à velocidade
com que as mudanças devem ocorrer na sociedade. Progressistas preferem
mudanças mais rápidas a que um conservador aceitaria.
Desde o seu surgimento o progressismo mudou de forma e adotou diversas
bandeiras, entre as quais o sufrágio universal, os direitos trabalhistas, programas
sociais, pautas de inclusão de minorias – mulheres, negros, população LGBTQIA+.
Nesse contexto, o progressismo se adaptou ao pensamento social democrata.
É problemático associar progressismo estritamente à esquerda, porque pode
ser adotada em muitos aspectos por pensamentos políticos de direita mais liberais e
contrários à imposição de uma ordem social e de tradições.

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16. Coletivismo e Individualismo

Individualismo e coletivismo é uma dicotomia alternativa, proposta para entender


as inúmeras doutrinas políticas de modo organizado em categorias abrangentes, tal
como direita e esquerda, conservadorismo e progressismo.
O precursor dessa análise é Ferdinand Tönnies (1855-1936), um filósofo
formado pela Universidade de Tübingen, que publicou em 1877 um livro chamado
Comunidade e Sociedade (Gemeishchaft und Gesellschaft)21. A sociedade, presente
num país que deixa de ser baseado em pequenas aldeias do mundo agrícola – as
comunidades – e migra para as grandes cidades industriais, é impessoal.
Max Weber (1864-1920), em A ética protestante e o espírito do capitalismo22,
contrastou coletivismo e individualismo através das lentes da religião, acreditando que
os protestantes eram mais individualistas e autossuficientes em comparação com os
católicos, que endossavam relações hierárquicas e interdependentes entre as pessoas.
Geert Hofstede (1928-2020) foi altamente influente no início de uma era de
pesquisa intercultural, fazendo comparações ao longo da dimensão do coletivismo
versus individualismo, principalmente em seu livro Culture’s Consequences23. Hofstede
conceituou coletivismo e individualismo como parte de uma linha contínua, com cada
conceito representando um polo oposto. O autor caracterizou os indivíduos que
endossavam alto grau de coletivismo como estando inseridos em seus contextos sociais
e priorizando objetivos comunais sobre objetivos individuais.

Coletivismo

O coletivismo foi uma parte importante da ideologia marxista-leninista na


União Soviética, onde desempenhou um papel fundamental na formação do Novo
Homem Soviético, sacrificando voluntariamente sua vida pelo bem do coletivo. Termos
como "coletivo" e "as massas" eram frequentemente usados na língua oficial e elogiados
na literatura da época.
O anarco-coletivismo lida com o coletivismo em um sistema anarquista
descentralizado, no qual as pessoas recebem seu trabalho excedente. O anarquismo
coletivista é contrastado com o anarco-comunismo, onde os salários seriam abolidos
e onde os indivíduos tomariam livremente de um depósito de mercadorias "para cada
um de acordo com sua necessidade". É mais comumente associado a Mikhail Bakunin,
as seções antiautoritárias da Associação Internacional de Trabalhadores e o movimento
anarquista espanhol inicial.
O corporativismo às vezes é visto como uma ideologia que depende da
cooperação coletivista como um de seus componentes centrais. O termo é derivado do
latim corpus, ou "corpo humano", que neste caso significa que a sociedade deve

21
TONNIES, 2001.
22
WEBBER, 2004.
23
HOFSTEDE, 2001.

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funcionar como um corpo, por meio da lealdade interna ao grupo. A negociação coletiva
entre trabalhadores e patrão é um exemplo de princípios econômicos corporativos.

Individualismo

Individualismo é, ao mesmo tempo, postura moral, filosofia política, ideologia e


perspectiva social que enfatiza o valor intrínseco do indivíduo, segundo Ellen Meiksins
Wood24.
Os individualistas promovem o exercício de seus objetivos e desejos e valorizam
a independência e autossuficiência e defendem que os interesses do indivíduo devem
ter precedência sobre o estado ou um grupo social, enquanto se opõem à
interferência externa sobre os próprios interesses da sociedade ou instituições como o
governo. O individualismo é frequentemente definido em contraste com o
totalitarismo, coletivismo e formas sociais mais corporativas.
Anarquismo, existencialismo, liberalismo e libertarianismo são exemplos de
movimentos que tomam o indivíduo humano como unidade central de análise.
Em suma, trata-se da ideia de que o indivíduo é um fim em si mesmo. O ideal
regulador é a não agressão a outros indivíduos. Antes de falar de família, sociedade,
nação, país, é preciso garantir a propriedade material e espiritual do indivíduo, entendido
enquanto pessoa física – um corpo e uma mente. A relação social fundamental é a de
troca livre entre indivíduos, baseada no princípio da não agressão e do interesse mútuo.
Uma autora constantemente considerada como a grande representante
contemporânea dessa análise é a filósofa e escritora Ayn Rand (1905-1982). Atribui-se
a ela a frase que resume o individualismo como categoria de análise aqui considerada:
“a menor minoria na Terra é o indivíduo. Aqueles que negam os direitos individuais não
podem clamar serem defensores das minorias.”
Rand descreveu sua abordagem da literatura como "realismo romântico". Queria
que sua ficção apresentasse o mundo "como ele poderia ser e deveria ser", ao invés de
como ele era. Essa abordagem a levou a criar situações e personagens altamente
estilizados. Sua ficção normalmente tem protagonistas que são individualistas heroicos,
descritos como saudáveis e atraentes. Os vilões de suas histórias apoiam o dever e os
ideais morais coletivistas. Talvez seu livro mais famoso seja A Revolta de Atlas.

Cautela no uso

A dicotomia individualismo-coletivismo é usada para localizar o individualismo


como favorável, em relação ao coletivismo, que seria uma tendência de pensamento
essencialmente opressora.
Quando utilizada nesse sentido, não se trata de uma categoria teórica, mas de
um discurso retórico utilizado por pessoas que se declaram de um lado do espectro para
enfatizar os defeitos do outro lado.

24
WOOD, 1972.

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Além disso, enquadra doutrinas diferentes histórica e teoricamente em rótulos


que, ao invés de esclarecer a realidade, tornam a interpretação mais obscura, apesar
de mais simples.

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Disponível em: < https://www.independent.org/pdf/tir/tir_19_04_06_znamenski.pdf>.
Acesso em 22/12/2019.
ZUCCHINI, Giampaolo, “Demagogia” (verbete) In: BOBBIO [et. al], 1987, p. 318-319.

Robson Ferreira Barbosa - aksakof@hotmail.com - IP: 177.100.80.134

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