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J ULIANNA COS TA

4 Semanas de
P RAZER
© 2014 by Universo dos Livros
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19/02/1998.

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outros.

1a edição - 2014
Diretor editorial
Luis Matos

Editora-chefe
Marcia Batista

Assistentes editoriais
Aline Graça
Nathália Fernandes
Raíça Augusto
Rafael Duarte

Preparação
Marina Constantino

Revisão
Carolina Zuppo Abbed
Yasmin Albuquerque
Âmala Barbosa

Arte
Francine C. Silva
Valdinei Gomes

Capa
Zuleika Iamashita

Dados Internacionais de Catalogação na


Publicação (CIP)
Angélica Ilacqua CRB-8/7057

C87c

Chantagem / Julianna Costa. – –


São Paulo : Universo dos Livros, 2014.
496 p.
ISBN: 978-85-7930-726-3
1. Literatura brasileira 2. Ficção
erótica brasileira 3. Sexo I. Título

14-0367 CDD B869.93

Universo dos Livros Editora Ltda.


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603/606
CEP 01136-001 – Barra Funda – São
Paulo/SP
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Prólogo
Eu já me masturbei pensando em
Gregory Holt.
Acho melhor falar isso de uma vez.
Tenho certeza de que é o tipo de coisa
que todo mundo imagina e, embora eu
negue até o dia do Juízo Final, é
verdade.
Se alguém pudesse ler meus
pensamentos me consideraria o ser mais
arrogante do universo. Ah, inferno… As
pessoas já acham isso de qualquer
modo. Mas eu não sou arrogante. Sou
apenas uma mulher segura. Eu sei o que
eu quero e nunca, nunca, minto para
mim mesma sobre coisas desse tipo.
Não importa quão impossível ou
absurda seja a ambição: eu sempre
admito para mim mesma onde quero
chegar e tento chegar lá o mais rápido
que conseguir. Muita gente vê isso como
arrogância. E o que eu acho? Que o
problema é delas.
Mas eu estava falando sobre o infame
senhor Holt e meus desejos íntimos e
não revelados.
Permita que eu me explique melhor.
Muitas mulheres se masturbam. Não
vou dizer todas porque não sei se isso é
verdade. Isso varia de uma mulher para
outra: depende da ocasião, do tempo ou
das ferramentas que ela tenha à sua
disposição. Mas, e isso é um fato, para
muitas mulheres a masturbação precisa
de encenação. O homem pega a revista
masculina mais próxima e começa a se
tocar de qualquer jeito, enquanto encara
fotos de mulheres despidas e baba sobre
elas. Pouco tempo depois ele está
ejaculando sobre meias, paredes ou
algum outro lugar que ele nunca vai
limpar do jeito certo. A masturbação
feminina é diferente. É delicada, sutil. É
quase como uma dança. Você tem que
descobrir os passos que funcionam para
você, decorá-los e repeti-los como uma
coreografia.
Geralmente começa com uma imagem.
Mulheres não se masturbam diante de
revistas ou sites pornográficos. Elas
fazem sexo sozinhas dentro do infinito
mundo de sua rica imaginação. Penso em
um cenário que me seduz: talvez eu deva
dinheiro ao entregador de pizza como
em um filme pornô, ou o ator mais
gostoso do meu seriado favorito me
deseje loucamente como em um conto na
internet, talvez um homem dominante
queira me foder sem nenhuma emoção
como em um romance de banca de
jornal. Pense em uma possibilidade,
ligue seu vibrador, enfie-o entre as
pernas e se prepare.
É assim com a maioria das mulheres.
Nunca foi assim comigo.
Eu me lembro da primeira vez que me
masturbei de verdade. Nunca tinha visto
muita graça nessa coisa toda… Não no
sexo! Sexo sempre foi razoável, bom ou
muito bom. Nunca sem graça. Mas a
masturbação nunca me encantou e,
confesso, não era um hábito que eu
sentia necessidade de fazer com
frequência. Eu era muito jovem, e o meu
namorado tinha me traído. Cheguei em
casa com muita raiva e me masturbei
pensando nele. Foi uma das minhas
experiências íntimas mais prazerosas. É
contraditório, eu sei. Muitas mulheres
iriam gritar aos quatro pontos cardeais
que nunca mais pensariam no filho da
puta enquanto vivessem – mas o que
fariam seria só pensar no filho da puta.
Mas eu… Bem, eu já mencionei que não
minto para mim mesma, não é?
Pensei nele com todas as minhas
forças. Eu montava sobre seu corpo
suado e fazia ele me desejar como nunca
tinha desejado nada na vida. Fazia ele
pedir e implorar. Eu ia rebolar e fazê-lo
gritar alto e rouco. E depois o
abandonaria. Depois de experimentar a
melhor transa de sua vida, ele pediria
mais e eu diria “não”. Eu diria “nunca
mais”.
Só isso já é capaz de me fazer gozar
até hoje.
Não… Eu não penso em cenários
eróticos com uma sensual figura
masculina sem rosto enquanto estou me
masturbando: o que me faz atingir o
clímax é pensar em homens de verdade.
Não aquele ator pornô famoso, nem o
novo queridinho de Hollywood ou
algum personagem de um best-seller: eu
penso em homens que eu conheço.
Nunca procurei sentido nesse prazer
específico. Mas aprendi os passos da
minha dança e, sempre que tinha
vontade, eu dançava.
Até que, um dia, estava lendo algo do
Oscar Wilde – ou algo sobre o Oscar
Wilde – e, de forma simples, ele
conseguiu traduzir meu sentimento
perfeitamente: “Tudo no mundo tem a
ver com sexo. Menos sexo. Sexo tem a
ver com poder.”
Era isso que me encantava. Era isso
que me seduzia.
Sexo era mais uma forma de poder. A
mais basal, instintiva e, talvez, a mais
absoluta. Era o poder que me deliciava
em meus momentos íntimos.
Um juiz que deu ganho de causa para
a outra parte, um advogado irritante, um
cliente boçal, meu chefe em um dia
ruim… Qualquer um desses homens
poderia cair sob meus encantos quando
eu estava sozinha com meu vibrador à
noite.
A sociedade pode torcer o nariz e
dizer que é errado se sentir sexualmente
atraída por alguém em um ambiente de
trabalho. Mas eu não estava fazendo
nada de verdade, estava? Não. Eu estava
apenas cedendo aos meus desejos mais
íntimos. Aqueles desejos, sabe? Que a
maior parte da população prefere mentir
e dizer que não sente.
E é por isso que eu penso em Gregory
Holt.
Não, eu não sinto nenhuma paixão
adolescente por ele.
Não, não é uma relação de amor e
ódio.
Ele é irritante e muito inteligente. Me
desafia de todos os jeitos errados, e é
justamente por isso que eu penso nele
com frequência, quando minhas mãos
encontram algum lugar deliciosamente
sensível para acariciar. Se não posso me
impor a ele em nenhuma situação real,
eu pelo menos extravaso em uma
situação imaginária. Não é uma questão
de sexo. É uma questão de poder.
E, no fim das contas, eu não tenho
nenhum poder sobre ele. Nenhum.
Mas isso não vai mais ser um
problema: ele está indo embora. E
tomara que nunca mais volte.
Capítulo 1
“Talvez eu tenha uma fraqueza por
causas realmente perdidas.”

Rhett – E o vento levou

– Um dia vão te achar soterrada sob


uma pilha de papéis, Dominique.
Levantei os olhos para a porta do meu
escritório. Ao meu redor, a típica
montanha de processos descansava: um
eterno lembrete de que eu sempre tinha
trabalho a fazer. Ele estava parado na
porta, com alguma coisa escondida atrás
do corpo. Seu paletó era bem cortado,
delineando seu corpo atlético. Seus
cabelos cor de mel eram curtos e
arrepiados, de modo que ele sempre
tinha que usar uma quantidade exagerada
de gel para mantê-los comportados. Ele
me encarou com seus olhos verdes e
inquisitivos. Tinha ido até ali me
provocar uma última vez. Isso era
óbvio.
– Eu sempre mantenho meus prazos
em dia, Gregory. Não sou preguiçosa
como você – disse sorrindo, e baixei os
olhos de volta para os meus documentos.
– Os papéis nunca se acumulariam o
suficiente para me soterrar.
Percebi que ele tinha dado alguns
passos para dentro do escritório e
estava prestes a informá-lo de que eu,
obviamente, estava ocupada demais para
o que quer que fosse e o mandaria dar o
fora.
– Ouvi que você não vai poder ir hoje
à noite.
– Para onde? – perguntei, sem
levantar os olhos.
– Minha despedida. Hoje é o meu
último dia, lembra?
Eu lembrava.
– Aleluia! – murmurei sorrindo. –
Não, não me lembrava, Gregory. Sua
agenda não é o tipo de coisa que ocupa
espaço em minha memória.
– Por que não vem, Dominique? Não
seria uma despedida apropriada sem
você – ele respondeu. – Eu podia sentir
o seu sorriso e o seu sarcasmo. – Não
acho que consigo ir embora sem ouvir
seu último comentário azedo e invejoso
sobre como eu não sou uma escolha
adequada para o meu novo emprego.
– Eles são uns idiotas sem colhões
que fingem ter princípios para ganhar
dinheiro – disse encarando-o. – Você
vai se encaixar perfeitamente bem.
Ele riu alto, estourando uma garrafa
de champanhe e servindo duas taças.
– O que está fazendo? – quis saber. –
Você queria um último comentário
azedo. Já teve. Sai.
– Se você não vem até mim hoje à
noite, eu venho até você.
Irritante do jeito errado. Ele não ia
perder a última oportunidade de
regurgitar toda a sua recém-encontrada
alegria na minha cara antes de ir
embora.
– Não vou hoje à noite porque tenho
trabalho a fazer. A audiência do caso
Monroe é amanhã.
– Amanhã? Achei que essa audiência
só seria daqui a dois meses… Depois
que você voltasse de férias.
Engoli a seco. A palavra férias me
incomodava de um jeito estranho e
inesperado.
– E desde quando você sabe o
agendamento das audiências do meu
cliente?
– Um caso de danos morais pela
quebra de segredo de justiça é o tipo de
coisa de que não se esquece tão
facilmente.
– É por isso que você perde tantas
causas, Gregory. É despreparado.
– Perco tantas causas? – disse rindo.
– E por que sou despreparado?
– Quebra de segredo de justiça é mais
comum nessa cidade do que você
imagina –– torci o nariz para sua risada.
–– Saberia disso se dedicasse mais
tempo aos próprios casos em vez de
vigiar os dos colegas.
– O caso Monroe era meu caso. Antes
de você roubá-lo, lembra?
– Somos uma equipe, Greg – sorri. –
Não há isso de meu cliente ou seu
cliente.
– Éramos uma equipe, Dom – ele
corrigiu. – A partir de amanhã, eu vou
embora para bem longe de você e de seu
veneno – ele me ofereceu uma taça.
– Aqui – anunciei com um falso tom
de diplomacia, levantando minha taça. –
Um brinde a você.
– Não esperava isso de você – sorriu,
levantando sua própria taça. – Vai ser
clichê como os outros e dizer que não se
importa que eu vá para longe desde que
seja feliz?
– Vou dizer que não me importo se
você será feliz desde que vá para longe
– confessei e bati meu copo contra o
dele. – Isso não está envenenado, está? –
brinquei.
– Infelizmente, não – ele respondeu,
bebendo.
– Tem um gosto horrível de
champanhe barato – eu disse com uma
careta.
– Você acha que eu ia gastar dinheiro
com você? – riu. – É mais do que você
merece – Ele bebeu mais um pouco
antes de ficar em um profundo silêncio.
– Não quero sair daqui com inimizades,
Dom – disse finalmente. – Não acho que
você seja tão ruim quanto demonstrou
ser… A vida inteira – disse sorrindo.
– Os que me conhecem há mais tempo
que você dizem que eu sou ainda pior.
– Meu avô dizia que as pessoas
amargas geralmente têm motivos para
serem assim. Então, seja lá qual for o
seu motivo…
– Qual o seu problema? – interrompi.
– Só quero dizer que, no que
depender de mim, não há mais qualquer
clima ruim entre nós. Está desculpada.
– Por que eu tenho motivos para ter
sido amarga, Gregory? A sua
incompetência e irritação. Esses eram
meus motivos.
– Não quis te ofender, Dominique.
– Mas ainda assim conseguiu. Meus
parabéns. Ou você acha o quê? Que eu
fui assediada quando criança ou que tive
um casamento que não deu certo e por
isso sou desse jeito hoje? Não e não,
Holt. Fique avisado.
– Não precisa fazer um alarde tão
grande. Só vim até aqui fazer as pazes.
– Pois vá embora e leve suas pazes
com você. Quando um homem é
ambicioso, ele é uma grande
personalidade que conquistou seus mais
majestosos sonhos. Quando uma mulher
é ambiciosa, ela deve ser uma vadia
amarga que merece ser desculpada pelo
seu comportamento?
– Não foi isso o que eu disse e você
sabe.
– Começamos a trabalhar aqui quase
ao mesmo tempo, Holt, e qual de nós
dois foi mais longe?
– Você não está sugerindo que minhas
promoções não foram merecidas, está?
– Ah, por favor. Eu cubro os seus
erros desde o seu primeiro ano aqui.
– Isso é absurdo e injusto… Mas pelo
menos também consegui seu comentário
invejoso.
– Ah, cai morto, Gregory.
– Sabe, eu realmente, realmente,
pensei que você não era uma pessoa
horrível. Mal tive contato com você em
meu primeiro ano aqui e todo mundo já
falava que você era A megera
indomada, se me permite a paráfrase,
mas eu nunca acreditei. Não de verdade.
Aí você entra na justiça contra mim.
– As raízes da sua maldita árvore
estavam quebrando o muro da minha
propriedade! E eu não sabia que você
era o meu vizinho com o cachorro
maníaco que parece não conseguir parar
de latir. Como eu podia ter adivinhado?
– Adivinhado? Sua maluca arrogante
e egocêntrica. Qual o problema de
levantar os olhos da sua vidinha
medíocre para desejar bom dia a um
vizinho. Moro naquela vizinhança a
menos tempo que você e te garanto que
conheço mais pessoas.
– Ah, parabéns. O que você quer?
Uma estrela dourada?
– Você só precisava ter falado
comigo e poderíamos ter resolvido toda
a situação da árvore sem um juiz. Será
que você consegue entender isso,
Dominique? Que é possível resolver
problemas conversando com as pessoas
fora de uma sala de audiência?
– E por que eu faria isso se na sala de
audiência eu consigo um documento
assinado por um juiz dizendo que eu
estou certa e que posso chamar a polícia
para fazer valer o meu direito?
– Você é impossível – ele disse. Eu ia
dar mais um gole no champanhe mas
Gregory se adiantou e tomou a taça das
minhas mãos. – E eu não acredito que
cheguei a pensar que poderia sair daqui
em bons termos com você.
– O que você quer ouvir? Que eu
sinto muito? Porque eu não sinto.
– Trabalhamos juntos por anos. Você
foi uma péssima colega de trabalho.
Arrogante e insensível. Sou
provavelmente a única pessoa desse
escritório inteiro que não te acha um
caso perdido. Você poderia ter sido
boazinha uma única vez na sua vida –
ele se levantou, levando o champanhe
barato consigo.
– Me processe – disse sorrindo
quando ele alcançou a porta.
– Vai pro inferno, Dominique.
Saí do banho enrolada em meu robe
azul-claro. Meu corpo ainda estava
úmido e a seda grudava em minhas
curvas de uma forma quase carinhosa.
Soltei o coque folgado que prendia meu
cabelo e o atei mais uma vez,
firmemente. O vento sacudiu algumas
árvores do lado de fora e me peguei
observando a casa vizinha através da
janela do meu quarto.
Holt parecia um homem limpo e
organizado. Ou, pelo menos, essa era a
ideia que eu tinha da sua garagem e do
pedaço do seu quintal que eu conseguia
ver pela minha janela. Em algumas
ocasiões cheguei a vê-lo na cozinha da
sua casa, ou no andar de cima, mas não
conseguia enxengar quaisquer detalhes
de sua vida, não importava o quanto
minha curiosidade e minha visão
aguçada tentassem.
Os fundos do meu quintal davam para
a lateral da casa dele. Ainda bem que eu
não era usuária assídua da minha
piscina, ou teria tido sérios problemas
de voyeurismo da parte dele. Meus
olhos visualizaram o espaço vazio que
antes abrigava a maldita árvore que
tinha sido origem de tantos problemas.
Um sorriso se grudou ao meu rosto e
uma ideia proibida começou a se
espalhar em minha mente.
Me aproximei do vidro da janela e
olhei com cuidado ao redor. Sua casa
estava completamente apagada.
Ele iria embora no dia seguinte, não
era? E a essa hora, ainda devia estar
enfiado na festa de despedida do
escritório. Todo mundo amava Gregory
Holt. Ele era o garoto maravilha. Gentil
e agradável e sensível e nhé, nhé, nhé.
Deviam ter feito uma festa memorável.
Mordi os lábios e corri para o
banheiro. Voltei ao quarto com meu
vibrador rosa de 16 cm nas mãos. Sim,
eu tenho mais de um vibrador. Desci as
escadas ainda decidindo se ia ou não
fazer aquilo. Abri as portas de vidro que
davam para o pátio de trás e senti a
brisa da noite balançar a seda do meu
robe. O clima estava fresco e agradável.
Olhei ao redor: a casa de Holt estava
envolta na mais absoluta escuridão, mas
andei até o muro baixo que dividia
nossas propriedades e fiquei em silêncio
tentando ouvir alguma coisa. Qualquer
coisa.
Nenhum som. Tudo estava no mais
absoluto silêncio.
Estiquei o pescoço e observei sua
casa mais uma vez. Sua garagem
entreaberta estava entupida de caixas.
As coisas da mudança, provavelmente.
Deviam estar ali para facilitar o
trabalho do caminhão que certamente
chegaria pela manhã.
Parte de mim quis pular o muro e
roubar suas coisas. A ideia me divertiu
e por um tempo fiquei sorrindo como
uma criança contra o muro. Ainda
sorrindo, esfreguei minha testa, dei as
costas para a casa de Holt e fui para as
espreguiçadeiras na borda da minha
piscina. Massageei o pescoço e repassei
o que eu sabia. A casa está vazia. Está
tudo apagado. Nenhum som. Não tem
ninguém. Ele está em uma festa. Não tem
hora pra voltar. Deve voltar tarde. Eu
serei rápida.
Enfiei um dedo no nó do robe e
desatei o cordão. Eu estava nua por
baixo e tinha plena consciência disso. O
ar levemente frio fez meus mamilos
enrijecerem quase que imediatamente.
Ah, merda, Dom… Vamos fazer isso
de uma vez.
Joguei o robe no chão e senti meus
pelos se arrepiarem. Sentei na
espreguiçadeira de frente para a casa de
Holt. Meu polegar encontrou a base do
vibrador e o girou. O zumbido discreto
me informou que ele estava devidamente
ligado em uma velocidade baixa. Deitei
e observei as estrelas.
Havia algo embriagante na
sensualidade de estar nua do lado de
fora. Deixei que minhas coxas se
afastassem e enfiei o vibrador entre
elas.
Fechei os olhos e conseguia vê-lo na
minha frente. Ele estava parado na porta
do meu escritório. Ele diria que aquele
champanhe barato era tudo que eu
merecia. Aproximei o vibrador do meu
clitóris. Eu o ofenderia até que ele não
conseguisse mais suportar, seria incisiva
e feroz com as palavras. Consegui ouvir
sua voz, apenas um sussurro contra o
meu rosto: “Vadia”. Desci o vibrador
um pouco mais e ele deslizou gostoso.
Eu já estava molhada. Levantaria a mão
e daria um tapa em seu rosto que
estalaria alto. Aqueles olhos verdes iam
me observar com ódio e ele rosnaria que
eu não tenho solução, me mandaria pro
inferno. Ah… Aumentei a velocidade e
encontrei meu ponto favorito, logo
acima do clitóris, e segurei o vibrador
com força. “Vai pro inferno,
Dominique.” Eu colocaria a mão contra
a porta e diria que não tinha autorizado
ele a sair. Eu o conhecia bem demais:
com certeza seu sorriso apareceria com
uma pergunta: “Como é que é?” Para
cima e para baixo. Só com a ponta do
meu aparelho, sentindo as vibrações em
poucos lugares de cada vez. Eu tiraria a
roupa e ficaria seminua na sua frente.
“Você quer uma última chance de fazer
as pazes? Pois, então, implore.”
Não importa que ele seja gentil,
agradável ou sensível. Ele é um homem.
E eu veria seu pau endurecer através do
paletó bem cortado. Se havia uma
mulher no mundo que ele nunca
imaginou que veria nua, essa mulher era
eu. E lá eu estaria: com uma lingerie
rendada, e tudo o que ele precisava
fazer era implorar.
Aumentei a velocidade na minha
massagem íntima, nunca chegando perto
de penetrar. Penetração com o vibrador
nunca me fazia gozar. A ilusão era
minha, e na minha ilusão, Gregory Holt
iria fazer exatamente o que eu queria.
Ele ia implorar.
Ia me despir e passar as mãos pelo
meu corpo nu. Ia me jogar em cima da
mesa e me foder com força. Ele ia me
chamar de puta, eu tenho certeza. Ia me
chamar de vadia arrogante e impossível.
E eu ia ouvir sua voz rouca de desejo
contra o meu ouvido e ia empurrá-lo
antes que ele gozasse. Ia me cobrir e
mandar que ele saísse. Ah, eu conseguia
ver a incompreensão em seu semblante,
e o sorriso voltou ao meu rosto. Apertei
o vibrador com força e me ouvi gemer.
Eu diria que se ele quisesse gozar dentro
de mim teria que se desculpar pela
árvore. Pela árvore, pelo cachorro, pelo
champanhe barato, pelas ofensas… Se
quisesse jorrar seu líquido dentro de
mim ia ter que merecer. Ia ter que
implorar.
E ele imploraria. E eu deixaria que
ele me possuísse mais uma vez.
Afundei o vibrador com tanta força
que teria doído se não estivesse sendo
tão gostoso. Gemi alto e acho que disse
seu nome. O alívio veio rápido e fez
minhas pernas tremerem
involuntariamente.
Desliguei o vibrador e o soltei em
cima da espreguiçadeira. Eu estava
encharcada. Abri os olhos, ainda
passando a língua pelos lábios, e
estiquei a mão para pegar o meu robe.
Foi aí que algo me chamou a atenção.
Aconteceu tão rápido e ao mesmo
tempo tão devagar.
Uma minúscula luz vermelha nas
sombras, do outro lado do muro.
Um sorriso abafado.
Um clique baixo da máquina
fotográfica de um celular.
Eu tinha perdido a noção do tempo.
Ele tinha voltado para casa.
Vesti o robe novamente e, quando dei
por mim, estava correndo como uma
leoa para cima de Holt.

– Eu vou te matar, Holt.


Entrei na casa dele sem pedir
autorização. Ele estava rindo satisfeito.
– Me devolve isso agora, seu tarado!
– Tarado? Eu? – ele ria como se
nunca tivesse passado por uma situação
tão engraçada na vida. – Que eu saiba,
não era eu quem estava se masturbando
em público.
– Estava me masturbando no quintal
da minha casa e você estava tirando
fotos! Pervertido!
– Tirando fotos? – ele riu alto. Eu me
lancei em sua direção enquanto ele
mantinha o celular fora do meu alcance
com o braço esticado. – Certo… Calma,
calma – disse passando o braço pela
minha cintura, me deixando presa contra
ele. Holt estava tentando me manter
quieta e longe do celular. Eu estava com
os mamilos rígidos e a vagina molhada,
coberta por uma fina camada de seda,
logo depois de ter me masturbado
pensando exatamente nele: a coisa toda
tinha uma sensação errada e deliciosa, e
eu não estava conseguindo me
concentrar. O empurrei para longe em
uma tentativa de recobrar a plenitude
dos sentidos. O ar descia ardendo pelos
meus pulmões.
– Certo – comecei diplomática. Eu
precisava reassumir o controle. – A
brincadeira foi engraçada. Dominique
estava se masturbando e eu tirei algumas
fotos, hilário. Tudo bem, eu sou uma
vadia arrogante que merece que você se
vingue. Você já me deu um susto
horrível. Vingança completa. Agora, me
dê isso.
– Por-que-diabos-eu-faria-isso? – ele
disse sorrindo, ainda segurando o
celular nas alturas.
– Porque você é uma pessoa decente.
– E você é uma pessoa horrível.
– Certo, tudo bem. – Não era hora de
brigar, era hora de negociar – E o que
você pretende fazer com isso, então?
– Eu poderia te ensinar uma lição.
Poderia te ensinar a ser mais humilde.
– Se você acha que vai conseguir me
chantagear, você está louco.
– E se você acha que amarrou esse
robe direito, é você quem está louca –
ele continuou rindo.
Olhei para baixo e vi um de meus
seios expostos. Ah, merda de situação
que fica cada vez pior. Puxei as laterais
do robe e amarrei o cordão com tanta
força que estava quase prendendo a
circulação. Que se dane. Não preciso de
pernas. Preciso daquele celular.
Ele estava se divertindo
absurdamente. Eu também estaria, no
lugar dele. Estaria sendo agradável, o
contrário da dose concentrada de horror
que eu estava experimentando.
– Se você fizer algo com essas fotos,
vai estar sendo uma pessoa tão horrível
quanto eu, Greg. – tentei convencê-lo.
– Você fica repetindo a palavra
“fotos”… – levei três segundos inteiros
para entender.
Puta merda.
Ele tinha me filmado.
– Seu nojento pervertido! Você me
filmou? – Dei um murro contra o peito
dele e vi, pela primeira vez, seu sorriso
sumir. Ele chiou de dor enquanto eu
continuava a socá-lo.
– Estava filmando minha casa,
Dominique! – Greg berrou quando
conseguiu me segurar por um pulso –
Estava filmando os arredores para ter
uma lembrança caso me sentisse
nostálgico durante a mudança – ele
explicou, e logo tinha meus dois pulsos
presos em uma de suas mãos fortes –
Não imaginei que você quisesse me dar
um suvenir de despedida – brincou. Eu
me sacudi até que ele me soltasse.
– Mas você podia ter parado de
filmar quando…
– Ah! Você pararia?
– Eu…
– Para de me tratar como um monstro.
Estava filmando minha casa, ouvi um
barulho, girei a câmera, você estava
com um vibrador enfiado no meio das
pernas, e eu fiquei sem reação – ele
explicou. Gelei diante das palavras
descontraídas de Gregory – Nada que
não seja perfeitamente compreensível –
concluiu, me encarando – Agora, a
pergunta é: o quanto você merece uma
lição?
Tudo bem. Ele estava com o poder.
Eu precisava acabar com aquela
situação. Eu ia me odiar pelo resto da
vida, mas era a única saída.
– Gregory, por favor. Se você colocar
isso na internet, minha vida acabou. Eu
perco minha credibilidade, meu
emprego… perco tudo. Por favor. Você
sabe como o mundo jurídico é
conservador. Uma única foto dessas
seria suficiente para… – eu já estava
implorando, mas por Deus, eu não ia
chorar. Respirei fundo. – Tudo pelo que
trabalhei a vida inteira. Destruído. Com
uma só foto. Imagine um vídeo. Por
favor. – Juntei as mãos em súplica.
Ele respirou fundo e pareceu
considerar.
– Não quero mostrar isso para
ninguém – ele falou finalmente. Eu
suspirei aliviada. – Mas… – Prendi a
respiração de novo. – Você merece uma
lição. E eu não posso perder essa
oportunidade.
– Que lição, Holt? – perguntei
irritada.
– Você faz uma coisa, e apago o
vídeo – ele disse sorrindo, como se
tivesse amado a própria ideia.
– Ou eu te processo, tomo todos os
seus bens e coloco você na cadeia! –
respondi, cruzando os braços sobre os
seios.
– Processa? – Ele estava rindo como
se tivesse acabado de ouvir a piada
mais engraçada do mundo. – Não sei,
Dom… mas acho perigoso. Ouvi dizer
que quebra de segredo de justiça é muito
mais comum nessa cidade do que se
imagina.
Ouvi-lo repetir minhas palavras fez
com que um arrepio de pavor descesse
pela minha espinha. Poderia correr tudo
bem. Eu iria deixá-lo pobre e furioso
quando tudo acabasse. Mas… e se
alguém ficasse sabendo? Um único
comentário bastaria para acabar com
minha reputação. E seria pelo menos um
juiz que eu nunca mais poderia encontrar
na vida. Sem contar as fofocas e teorias
que, certamente, correriam pelo
escritório. Seria um risco, quanto a isso
não havia dúvida. A questão que
permanecia era: seria um risco que eu
estava disposta a correr?
– Pode arriscar um processo e acabar
perdendo sua preciosa reputação, Thoen
– ele avisou como se estivesse lendo
minha mente. – Ou pode aceitar um
simples acordo e ninguém nunca vai
precisar saber disso.
Suspirei controlando a raiva. Em
todas as situações sexuais que eu já
tinha imaginado, nunca era assim. Nunca
era ele quem tinha o poder. Inferno. O
filho da puta ia querer transar. O lado
bom é que transar com ele, para mim,
não era uma má ideia. Mas desse jeito…
desse jeito não.
– Tudo bem, Holt. Você quer me
chantagear, então? – decidi enfrentar o
menor dos males e, pelo menos, ia poder
experimentá-lo uma vez na vida. – Vai
ser assim? Tudo bem – disse. Ele
poderia me ter, mas eu não ia deixá-lo
perceber que estava interessada.
Arranquei o robe com fúria, e Holt
levantou as mãos em uma assustada
rendição. – Pode ter o que você quer,
mas saiba que essa decisão vai te
assombrar pelo resto da vida – dei dois
passos em sua direção e ele deu dois
passos para trás. Ele estava rindo, e eu
estava vagamente consciente de que ele
estava observando de perto o que tinha
visto de longe mais cedo. – Toda vez, na
sua existência miúda e patética, que
você se considerar uma pessoa decente,
vai se lembrar do dia de hoje e do
monstro que você verdadeiramente é.
Ele baixou os braços ao lado do
corpo.
– Dominique, será que você pode
parar de ficar nua? Está ficando difícil
de manter a concentração.
– Parar de… Mas o que diabos você
quer, Holt?
– Não quero transar com você em
troca da gravação. Garanto – ele
explicou pausadamente e, de repente, eu
senti uma vergonha impossível de medir.
Ele apanhou meu robe e eu me vesti
novamente em uma fração de segundo.
– O que você quer?
– Bem, eu poderia só ficar com esse
vídeo pra mim – disse rindo. – É um
produto de qualidade – afirmou
levantando o polegar, e eu dei um tapa
em seu braço com toda a minha força.
– Diga de uma vez.
– Primeiro – ele reclamou, apontando
o indicador para o meu nariz –, pare de
me bater.
– Diga logo – rosnei.
– Eu odeio mudança – deu de ombros.
– Sou muito desorganizado. Levo uma
eternidade para arrumar tudo.
– Não estou acompanhando, Holt.
– Você entra de férias amanhã.
– E o que tem isso?
– Você viaja para me encontrar
depois de amanhã e passa suas férias
comigo. Arruma minha casa nova.
Organiza meus documentos.
Desempacota minhas coisas – concluiu
com um sorriso nos lábios. – Quando
tudo isso estiver feito, apagamos o
vídeo.
Mordi o lábio com raiva.
– Você quer que eu seja sua assistente
pessoal de luxo?
– Precisamente – afirmou sorrindo, o
maldito.
– E quer que eu fique as minhas férias
inteiras? Arrumo sua casa em uma
semana. Não há necessidade alguma
de…
– Eu sou bem bagunceiro.
– Duas semanas, então – reclamei. –
Um mês é muito…
– Um mês – ele repetiu. – Não é
negociável.
– Eu trabalhei duro. Mereço esse
descanso! Pedir minhas férias inteiras é
crueldade.
– Não. Crueldade foi o que você fez
com a garota do financeiro, seja lá o que
tenha sido.
– Ela é uma incompetente que não
sabe contar e a culpa é minha?
– Ela chorou o dia inteiro!
– Se ela é emocionalmente
desestabilizada, deveria procurar ajuda
profissional. Não entendo por que eu
seria responsável por…
– Você é um ser humano terrível – ele
concluiu com um ar de exaustão. – E, se
eu fosse você, aceitaria antes que eu
mude de ideia.
Ele não ia ceder. Processá-lo seria
um risco grande. Talvez grande demais.
E ir com ele…
Uma pequena parte de mim estava
achando interessante a ideia de ter
companhia durante as férias. Mas era
uma parte ridícula e minúscula que eu
preferia não ouvir. A vadia dentro de
mim tinha planos mais interessantes.
Ele queria me humilhar? Tudo bem…
Eu jogo seu jogo, Holt. Vou para sua
casa, garanto que ninguém nunca vai
ouvir qualquer notícia sobre essa merda
de vídeo, mas não se engane, meu
bem… A arte da guerra me ensinou a
manter meus inimigos por perto. E eu
vou me vingar.
– Quatro semanas?
– Quatro semanas.
– E como isso vai me ensinar algum
tipo de lição?
– Isso te ensina um pouco de
humildade, Dominique. Algo que você
precisa com urgência.
– E quem é você pra me dar alguma
lição de vida, Gregory? Meu pai? Minha
mãe? Deus?
– Melhor! – ele riu. – Eu sou o cara
que tem um vídeo de você se
masturbando.
– Você também é um ser humano
horrível, sabia? Uma pessoa baixa.
– Vou deixar passar desta vez –
brincou. – Nunca fui baixo durante toda
a minha vida, acho que se for fraco só
dessa vez não vou morrer por isso.
– Eu desempacoto algumas coisas,
compro uns lençóis novos e pronto?
– Você é uma assistente pessoal de
luxo, como você bem descreveu. Vai
precisar fazer o que eu pedir. Pense
nisso como um emprego. Eu sou o patrão
– ele apontou para si mesmo com um
sorriso irritante no rosto. – Você
trabalha pra mim. Se fizer um bom
trabalho, recebe um vídeo como
pagamento.
– E como eu vou saber que você não
fez cópias?
– Eu tenho uma pasta de
compartilhamento integrada no celular.
Todas as fotos ou vídeos que eu faço
vão direto para essa pasta na internet,
que eu posso acessar de qualquer
computador.
– Ótimo – senti meu sangue subir. –
Então a gravação já está na internet?
– Não. Está em uma pasta pessoal,
com senha, que fica na internet. Mas que
ninguém pode acessar.
– Só você.
– Exatamente.
– E de que me serve isso? – reclamei
ferozmente. Estava perdendo a
paciência, e ele estava se deliciando
com isso.
– A gente vai até o meu computador
agora, e muda a senha da pasta. Eu
escrevo a primeira metade e você a
segunda. Assim ninguém sabe a senha
inteira. Nenhum de nós pode acessar
sem o outro. Depois nós acessamos a
pasta juntos e apagamos o arquivo.
– E como eu tenho certeza de que é a
única cópia?
– Dominique. Você acabou de correr
atrás de mim como um animal. Eu tive
tempo para fazer alguma cópia?
– Não que eu tenha visto, mas você é
um demônio ardiloso – lembrei.
– Então você vai ter que confiar em
mim. Não é como se tivesse uma
escolha.
– Mas, se você não tiver a senha
completa, o arquivo vai estar protegido.
O que te garante que eu vou fazer o que
você quer? Eu posso simplesmente
deixar o vídeo lá pelo resto da
eternidade.
– Pode – ele deu de ombros. – Mas
bem guardado não é o mesmo que
inexistente. Se você não for comigo, o
vídeo vai ficar lá até você morrer ou
alguém conseguir acessá-lo. Se você for,
ele deixa de existir. Você escolhe – Ele
sorriu. Estava odiando que ele estivesse
se divertindo tanto as minhas custas. –
Negócio fechado? – perguntou esticando
a mão para que eu apertasse.
– Eu quero o celular. Mesmo indo
para a sua pasta, o arquivo também fica
gravado no aparelho.
– Te dou o celular assim que
mudarmos a senha. Ou você poderia
acessar a pasta direto pelo telefone e
apagar o vídeo.
– Fechado – apertei com nojo a mão
que ele oferecia.
– Você quer ir se trocar?
– Não saio de perto de você até a
senha dessa pasta ter sido modificada –
expliquei.
– Como quiser – ele riu. – Viu que é
possível resolver as coisas com um
diálogo agradável? – Sarcástico.
– Pense o que quiser. Eu só estou
satisfeita que você não quis sexo. Acho
que nunca mais ia me sentir limpa na
vida se você me tocasse – reclamei.
– Você fala com muito pudor para
quem estava completamente nua se
masturbando bem embaixo da janela do
meu quarto.
– Será que podemos mudar de assunto
e não falar sobre isso nunca mais?
Ele me observou com uma cara de
exagerada incompreensão.
– Dom, meu bem… Eu nunca vou
parar de falar disso com você – disse
rindo – E olha, talvez eu ainda mude de
ideia e aceite o que você estava
oferecendo antes. Então, é melhor
manter a mente aberta – ele terminou
com uma gargalhada. E eu não entendi se
ele estava brincando ou falando sério.
Um ponto entre minhas coxas tremeu
deliciosamente, e eu desejei que fosse
sério.
Capítulo 2
“– Você, senhor, não é nenhum
cavalheiro.
– E você, senhorita, não é nenhuma
dama.”

Scarlett e Rhett – E o vento levou

Dei o nó na gravata e encarei meu


reflexo no espelho. Passei um pouco de
gel nos cabelos arrepiados em uma
tentativa de mantê-los sob controle.
Segunda-feira.
Será que ela viria?
Era um pensamento delicado e
arriscado. Eu estava brincado com fogo.
E Dominique era fogo do pior tipo.
A mulher merecia uma lição: isso era
inquestionável. Ela era uma pessoa
horrível na maior parte do tempo. E
quando não era horrível, era…
Quase sorri sozinho. Se mais alguém
teria tido a oportunidade de ver o lado
gentil de Thoen era uma dúvida que eu
sempre tive. Eu mesmo, nunca o teria
visto se não fosse por acidente. Ela
parecia ser boa sem querer, e ruim de
propósito. De qualquer maneira, boa ou
ruim, ela era teimosa e inteligente, meu
pequeno plano sem dúvida jogaria toda
sua fúria na minha direção.
Mas eu precisava tentar.
– Se ela vier, vai fazer você se
arrepender de sua brincadeira – avisei
ao meu reflexo antes de enxugar as mãos
e sair do banheiro.
Eu não podia pensar muito tempo
naquele assunto. Só de lembrar da
cena… Aquele corpo escultural despido
e contorcido, gemendo…
Ai, merda… Eu tinha que ir trabalhar.
Ela tirou o robe na minha casa e se
ofereceu. Esfreguei as têmporas. E eu
tive que me controlar para não puxá-la
pela cintura e dizer “Sim, por favor”.
Tive que me controlar durante muitos
anos.
Sempre tive tesão por aquela maldita
mulher. Isso era um fato.
E parte de mim sempre achou que
todas as nossas intermináveis discussões
tinham um bocado de tensão sexual
sufocada. Mas Dominique brigava e
rosnava com qualquer um que se
aproximasse e, ao perceber que seu
estado constante de birra não era
reservado exclusivamente a mim, deixei
essa ideia da atração velada de lado.
Era mais fácil só odiá-la, falar mal dela
pelas costas e reprimir o pensamento de
como ela ficava linda sempre que
espremia os lábios quando estava me
xingando de uma coisa ou outra.
Ela não vai vir.
Thoen me conhece… Ela sabe que eu
não vou colocar o vídeo na internet.
Merda… eu não tive nem coragem de
assistir àquela porcaria. Passei os dedos
pelo meu celular, no bolso. O backup do
vídeo estava em outra pasta. Uma que
Thoen sequer imaginava existir. Podia
sentar na minha sala de estar e assistir à
mulher que mais me torturou na vida
enfiar um vibrador no meio das pernas.
Senti meu sangue fluindo para o lugar
errado e soltei o celular. Não era uma
boa ideia pensar em Thoen se
masturbando. Mas era impossível não
pensar. Parte de mim queria muito que
ela viesse. Queria conviver com ela e
tentar descobrir por que escondia o seu
lado gentil e só mostrava aquela casca,
teimosa e revoltante. Talvez eu
conseguisse fazê-la mudar. Faria dela
minha pequena missão de redenção
pelos meus erros do passado. Não
importaria quanta merda eu tivesse feito
na vida, não é? Quero dizer… Se eu
conseguisse fazer o demônio Thoen ser
uma pessoa melhor, meu karma teria que
se equilibrar mais uma vez.
Tranquei a porta de casa e brinquei
com a chave em meus dedos. Eu havia
dito a Dominique que deixaria a chave
embaixo do capacho.
Seria divertido se ela viesse.
Ela não vem, Greg. Você tem sorte se
ela não te processar.
Era ruim manter expectativas.
Thoen era passado. E, se algum dia eu
tive uma chance de me aproximar
daquela mulher confusa e misteriosa…
A chance estava perdida.
Nova vida agora, Greg.
Entrei no carro e resolvi deixar o
passado para trás. Já ia ser difícil o
suficiente não passar o dia fantasiando
cenas com meu celular me provocando
no bolso. Se eu tivesse expectativas de
vê-la quando chegasse em casa à noite,
seria bem pior.
Girei a chave na ignição e tentei
afastar a imagem do corpo nu de
Dominique da minha mente, mesmo
sabendo que era pouco provável que eu
tivesse mais sucesso hoje do que tinha
tido nos últimos dias.

Larguei minhas duas malas no chão e


levantei o capacho. Antes de viajar,
Holt disse que a chave estaria ali
embaixo esperando por mim.
– Filho da puta – reclamei para o
nada.
Não havia chave alguma.
– Ótimo – ri de raiva. O idiota ia usar
cada minúscula oportunidade para me
humilhar. Tudo bem. Eu ia aceitar:
precisava do vídeo. Mas que ele não se
enganasse! Minha vingança viria, e ela
seria pior do que as sete pragas do
Egito.
Meu relógio de pulso me informou
que ainda estávamos na metade da
manhã. O meu patrão imbecil só
chegaria à noite. O que diabos eu ia
fazer até lá?
“Dominique Thoen não espera por
ninguém”, ouvi minha mente resmungar.
Apanhei minhas malas e voltei para a
cerca de entrada, puxando o celular do
bolso.
– Bom dia – ouvi de uma voz era
estridente e irritante.
– Hmm – cumprimentei de volta com
um sorriso. Ah, mentira… Não sorri.
Nem sequer tentei. Devo ter feito alguma
careta genérica enquanto procurava na
internet o número de alguma companhia
de táxi local.
– Você deve ser Dominique.
Levantei os olhos. Ela era baixa e
rechonchuda, devia ter pouco mais de
trinta anos. Os olhos eram de um azul
muito forte, e a boca fina parecia uma
linha no meio do rosto.
– Perdão?
– Dominique Thoen, não é isso? Ah,
porcaria – tapou a própria boca com um
susto. – Eu devia ter perguntado o seu
nome primeiro. Agora, se você não for
Dominique, pode dizer que é e me
enganar.
– Sou Dominique Thoen – respondi,
encarando-a. – Posso te mostrar um
documento se quiser. Mas quem é você?
E, afinal, como sabe quem eu sou? –
minha voz sempre ficava firme em
situações assim. Sempre que eu
precisava de uma resposta, minha voz
atingia automaticamente um tom que
deixava claro que eu não estava
brincando. Era intimidante e, às vezes,
grosseiro. Eu adorava.
– Sou Shelbi Classen! Sou sua vizinha
– ela riu e apontou para alguma casa
atrás de onde ela estava. – Você é a
amiga do Greg. A que ele não tinha
certeza se viria.
“Greg?”
– Você conhece o Gregory?
– Ah! Nós nos conhecemos ontem. Ele
é uma pessoa ótima! – ela expirou
exageradamente. E eu ainda estava
tentando decidir se ela tinha se sentido
atraída por ele ou se estava tentando me
agradar.
– Você não devia achar “ótima” uma
pessoa que mal conhece – sorri,
tentando parecer desagradável de
propósito e voltei os olhos para o
celular – Pode ser perigoso.
– É verdade – sua voz era de genuína
concordância. – Acho que sou um pouco
inocente – ela disse rindo.
De repente, algo que tinha dito me
incomodou.
– Ele não tinha certeza de que eu
vinha?
– Não – ela exibiu um largo sorriso
ao ver que a conversa não tinha
acabado. – Ele mencionou que não gosta
de mudança e que uma amiga dele talvez
viesse até aqui para ajudá-lo. E aí eu
disse… – riu –, eu disse “Greg” –
forçou um tom astuto que ela certamente
não conseguiria manter naturalmente –
“Se uma garota vem até aqui só para te
ajudar a se mudar, ela deve ser uma
garota muito especial” – sorriu,
espremendo as mãos como se estivesse
esperando que eu agradecesse o elogio.
É… “especial” ou “sendo
chantageada”.
Fiquei em silêncio por dois segundos
enquanto a observava. Finalmente,
decidi que não havia nada ali que
valesse a pena observar e liguei para a
companhia de táxi.
– Você precisa de ajuda com suas
malas? Você tem a chave?
Ah, como eu queria que ela ficasse
quieta.
Levantei o indicador com um sorriso
pernóstico, indicando que estava no
telefone. Ela emitiu um “oh” discreto e
se calou.
Do outro lado da linha, a atendente
me perguntou o que poderia fazer por
mim. “Matar um ex-colega de trabalho”
não me pareceu um pedido que ela
pudesse atender.
– Gostaria de um táxi para… – olhei
para Shelbi. O endereço estava em um
papel amassado em algum lugar da
minha bolsa.
Ela sussurrou o nome da rua e o
número.
Não precisa sussurrar, Shelbi. Não é
a senha do seu cartão de crédito.
Eu repeti o endereço para a atendente,
e ela disse que o táxi chegaria em até
vinte minutos. Eu tive vontade de
reclamar, mas, em vez disso, respirei
fundo e desliguei.
– Você já vai sair?
– Não que seja da sua conta, querida
– respondi com o tom mais educado que
eu consegui simular. – Mas Gregory se
esqueceu de deixar a chave. Ele faz
besteiras como essa com frequência.
Agora, preciso ir até o trabalhinho dele
pegar a chave.
– Ah! Eu posso te levar. Não estou
fazendo nada. – ela respondeu. Olhei
para ela. Não parecia o tipo de ser
humano que eu queria ver no comando
de um veículo em que eu estivesse. Mas
se ela me levasse, eu não precisaria
esperar vinte minutos. – Eu sei onde é o
escritório! Estávamos conversando
ontem e ele explicou que…
– Shelbi, Shelbi – falei
apressadamente, interrompendo-a. –
Tem certeza de que pode me levar?
– Claro! – ela respondeu, satisfeita
demais. – Será uma aventura de garotas!
– riu e eu tive vontade de esfaqueá-la.
– Ótimo – sorri ridiculamente. –
Podemos ir agora, então?
– Hmm! Por aqui! – ela balançou de
um lado para o outro como se fosse um
mordomo me mostrando o caminho, e eu
soube naquele segundo que ia odiá-la.

Perguntei na recepção pelo senhor


Gregory Holt. Uma secretária com um
vestido preto, uma cara rosada e com
cheiro de hortelã me levou até uma
pequena sala de espera redonda.
Algumas poltronas beges e pretas
estavam espalhadas de forma simétrica
ao redor de pequenas mesinhas de
mogno. Dois rapazes e uma garota já
estavam lá, sentados com alguns papéis
espalhados nos colos, mesa e tapete.
Sentei a alguma distância, de frente
para o grupo. Eles pareciam perdidos, e
eu ia passar o meu tempo de espera os
observando.
– Não adianta… A gente tinha que
pedir a citação de qualquer jeito –
começou um dos rapazes. Ele tinha um
porte mais robusto e uma barba mal feita
que lhe dava uma aparência pouco
asseada.
– Vocês estão olhando isso do jeito
errado! A juíza já pediu para
solicitarmos as informações do cliente
na companhia elétrica, não pediu?
Então, a gente passa o pedido para eles
e depois disso não é mais problema
nosso.
A garota que disse isso vestia um
conjunto de saia e paletó cinza com uma
camisa de seda branca. Eu conseguia
sentir o cheiro de estagiário a dois
metros de distância. Sorri e peguei um
jornal de uma das mesinhas à minha
frente.
– Juízes não pedem, Soraia, eles
mandam – completou o terceiro jovem.
Ele tinha o cabelo cortado bem curto e
usava uma gravata com um nó estranho.
Não consegui deixar de imaginar que
aquela poderia ser a primeira gravata
que ele tinha usado na vida.
– Que seja, Edgar! Ela mandou que a
gente solicitasse os dados do cliente. A
gente faz o que ela mandou.
– Mas e a urgência do…
– Eu sei, eu sei! Mas quais opções
nós temos?
– Como funciona isso? – perguntou o
robusto com a barba mal feita – Alguém
sabe como é feita essa solicitação?
– Acho que a gente pode ligar para a
companhia elétrica e pedir… – Edgar
coçou a cabeça e eu ri discretamente da
sua inexperiência.
– Não deve ser assim tão simples –
Soraia torceu o nariz. – Deve ter algum
tipo de protocolo.
– É isso que eu estou falando –
explicou Edgar. – Se isso demorar pode
ficar mal para a gente. Acho que
devíamos falar com um dos advogados
responsáveis.
– Se corrermos para falar com
advogados toda vez que tivermos um
problema, perdemos a credibilidade –
lembrou a moça. – E eu não sei vocês,
mas eu quero garantir um lugar aqui
depois que me formar.
Respirei fundo. Ah… não custava
nada.
– Peçam para a juíza realizar a
citação por edital – falei. Três pares de
olhos se viraram para mim como se não
tivessem certeza de que eu estava
falando com eles. – A companhia
elétrica não vai divulgar os dados de um
cliente. Eles nunca fazem isso –
continuei, observando-os. Eles
continuaram me encarando sem saber se
diziam algo ou se me esperavam
terminar. – Vocês vão fazer a
solicitação para a companhia, vão
esperar dois meses para receber uma
resposta e ela vai ser “Devido ao sigilo
contratual, não podemos liberar dados
dos clientes sem mandado judicial”.
– Então a gente tem que pedir um
mandado? – arriscou Edgar, e eu
consegui perceber em sua voz que ele
imaginava que aquilo deveria ser muito
difícil. Eu sorri. Não conseguia me
lembrar de uma época em que eu achava
aquilo difícil.
– Não. Você explica para a juíza que
é isso que vai acontecer e pede para que
ela autorize a citação por edital.
– A gente liga pra ela ou…
Eu ri.
– Claro que não, imbecil! – Soraia
respondeu por mim.
– Faça uma petição para juntar aos
autos – expliquei. – Pesquise nos
regulamentos internos de companhias
elétricas, telefônicas e do que mais você
conseguir achar… Copie todas as
menções feitas ao sigilo. Explique como
o procedimento funciona e como é
pouco eficiente. Alegue celeridade
processual. Juízes adoram ser céleres –
brinquei, voltando para o meu jornal.
– Quem é você? – Soraia quis saber.
Foi um pouco menos educada do que
deveria ter sido e eu vi algo de mim
naquela garota.
– Alguém que sabe mais do que vocês
– respondi descansadamente.
– Dominique?
Virei o rosto e vi Holt me esperando
na porta.
– Gregory – levantei. – Você se
esqueceu de deixar a chave.
– Não imaginei que você viria – ele
respondeu. Tinha uma agradável
expressão de surpresa em seu rosto.
– Não imaginou que… Você esqueceu
por que estou aqui?
– Não. Mas imaginei que você fosse
pagar o meu blefe.
– Quer dizer que você estava
blefando?
– Agora que está aqui, acho que não
vai descobrir – sorriu.
– Conheci sua vizinha.
– Qual delas?
– Por Deus, homem… Você se mudou
há menos de 48 horas e já conhece mais
de uma vizinha?
– Não há nada de errado em desejar
bom dia para os vizinhos, Dominique.
Acho que essa vai ser uma boa maneira
de começar a semana, por sinal.
– Vai fazer uma festa de inauguração
da sua casa, é? – provoquei.
– É uma boa ideia. Mas não era a isso
que eu estava me referindo.
Continuei fitando-o nos olhos e pude
ver que ele estava elaborando algum
tipo de tortura para me submeter.
– Vamos, Holt. Diga de uma vez.
– Seu primeiro trabalho: recebi
algumas cestas e cartões de boas-vindas
de alguns vizinhos. Por que você não
compra algo legal para agradecê-los?
Vá até a casa deles, converse um pouco.
Vai te fazer bem.
– Certo. Seu cartão de crédito e sua
senha? Ou você vai querer que eu
compre presentinhos para a sua
vizinhança inteira com o meu dinheiro?
– Não acho que você vá à falência
por isso. Eu te pago de volta hoje à
noite.
– Posso precisar comprar alguma
coisa para sua casa também…
– Não vou te dar meu cartão nem
minha senha, Dominique. De jeito
nenhum! – ele disse rindo.
– Tudo bem – sorri, fingindo
rendição. Ia ter que arranjar outro jeito
de me vingar. Tudo bem. Oportunidades
iriam aparecer.
– Você precisa de um táxi?
Estiquei o pescoço tentando olhar por
cima de seu ombro.
– O seu chefe está aí?
– Por quê? Quer deixar seu currículo?
– Nunca! – ri. – Mas imaginei que ele
gostaria de ouvir que o novo empregado
dele está chantageando uma donzela
indefesa.
– Donzela indefesa? Você é muitas
coisas, Dominique, mas…
– Ou talvez sobre o tipo de vídeos
caseiros que você gosta de fazer. Será
que ele gostaria de ouvir uma história
sobre isso? – ameacei. Estava só
provocando, obviamente. Aquilo nunca
daria certo, até porque…
– Acho que ele vai gostar sim – ele
sussurrou. – Mas acho que ele vai gostar
mais ainda de ver o vídeo. Você vai
precisar provar suas alegações, não vai?
Exatamente por isso nunca daria
certo.
Abanei a mão de qualquer jeito na
direção dele.
– Você precisa de um táxi? – ele
repetiu.
– Não. Shelbi está me esperando lá
em baixo.
Ele arregalou os olhos para mim.
– Thoen, me diga que você não está
explorando os meus vizinhos.
– Não, Holt, só estou fazendo
amizades – repliquei sonsamente. –
Achei que esse era o objetivo.
Peguei a chave em suas mãos e dei um
“adeus” brincalhão para os estagiários
que, agora, pareciam bem mais
organizados.
De nada.

– Você disse que não estava ocupada!


– Ah, não se preocupe, querida! Não
foi incômodo algum. Eu deixo você em
casa e vou terminar de resolver umas
coisas que preciso fazer hoje. Vai dar
tempo!
Suspirei.
Não estava preocupada em
incomodar. Nem um pouco. Mas iria
usá-la mais um pouco de motorista
assim que descobrisse quantos
presentinhos eu ia ter que comprar para
os vizinhos. Não importava mais: tinha
perdido minha carona.
Girei a chave e empurrei minhas
malas para dentro.
O lugar estava uma zona.
Ninguém, ninguém, deixa as coisas
assim tão largadas quando está de
mudança. Gregory tinha dito que achava
que eu não viria, mas, observando sua
sala, era difícil de acreditar. Parecia
que ele tinha deixado as coisas
propositalmente da maneira mais caótica
possível só para me irritar. Qual é o
problema em deixar caixas empilhadas?
Mas não, Gregory Holt! Ele deixou suas
caixas espalhadas formando um
verdadeiro labirinto que impedia um
deslocamento em linha reta do ponto A
ao ponto B sem ser necessário escalar
alguma coisa.
O pior eram as descrições das
caixas… “Livros”, “Cozinha” e
“Quarto” são marcações aceitáveis.
““Presentes de Natal”, “Coisas para
olhar e jogar fora” e “Lembranças A.H.”
não são.
Eu estava enganada: ia levar uma
eternidade para conseguir arrumar
aquilo tudo. Seja lá qual fosse a
vingança que eu ia planejar para
Gregory, ela ia ter que ser umas oito
vezes pior.
Respirei fundo com as mãos na
cintura, visualizando o inferno que me
aguardava. Por quê? Por quê? Por que
eu fui me masturbar no quintal?
Esfreguei a testa e afastei o
pensamento da minha cabeça. Eu não
tinha o hábito de me arrepender e não ia
começar agora. Fiz o que eu queria fazer
e ia arcar com as consequências.
Escolhi um dos quartos no andar de
cima que não parecia ser o que Gregory
tinha se acomodado e dispus minhas
coisas o mais ordenadamente possível.
O Caos Holt poderia reinar do lado de
fora, mas se eu ia morar ali pelas
próximas semanas, aquele lugar ia ser
um santuário perfeito e intocável.
Coloquei uma roupa confortável,
amarrei meu cabelo para tirá-lo do
caminho e deixei meus sapatos em um
canto. Nem chinelos… Ia ficar descalça
mesmo. Usaria apenas o indispensável
naquela batalha, qualquer item
sobressalente só iria me atrasar. E,
olhando pelo lado bom, se eu cortasse
meus pés em algum lugar daquela casa,
processaria Holt por cada centavo que
ele possuía.
Demorei uma boa meia hora para
encontrar os produtos de limpeza, tanto
que estava começando a achar que ia ter
que sair para comprá-los. Só um homem
para guardar produtos de limpeza dentro
do quarto… Nunca vou entender. Sério.
Nunca.
Primeiro, limpei e arrumei o meu
quarto e o banheiro. Obviamente. A
tarde já estava bem avançada quando
fiquei satisfeita com a higiene da minha
morada temporária e segui para outra
parte da casa. Resolvi começar pela
sala. Era o lugar que mais me
incomodava.
A porta de entrada dava para um
pequeno hall que se abria em uma
antessala redonda onde ficava a escada
para o primeiro andar. À esquerda
ficava a sala de jantar, um espaço
retangular e estreito já ocupado por uma
mesa com seis cadeiras; no fundo, uma
porta vaivém levava para a cozinha. À
direita do hall de entrada ficava a sala
de estar, onde já estavam dispostos
alguns sofás, uma mesa de centro, uma
televisão e um videogame. A televisão e
o videogame eram as únicas coisas da
casa que estavam perfeitamente
asseadas e em pleno funcionamento. Não
precisa nem explicar, não é?
Encontrei um som com entrada para
iPod e resolvi trabalhar ouvindo Art
Blakey, nunca me sentia sozinha com um
bom jazz. A bateria delicada e constante
de Blakey se fez ouvir pelos alto-
falantes, e eu esfreguei as mãos tentando
me estimular a continuar. “Vamos lá,
Dom. Vamos acabar com isso.”
Separei as caixas insanas de Holt em
três grupos: no hall, as que tinham
marcações compreensíveis e que eu
começaria a abrir imediatamente. Na
sala de estar, empilhadas próximas ao
sofá, as com marcações
semicompreensíveis, aquelas que eu
imaginava que compreenderia assim que
as abrisse e observasse seu conteúdo.
Na sala de jantar, as com marcações
ininteligíveis e que Holt precisaria
traduzir quando chegasse.
Algumas das caixas estavam
identificadas como “Ferramentas” ou
“Coisas de jardim”, e eu achei melhor
levá-las para a garagem e me livrar de
parte do volume de uma vez.
Estava voltando para pegar mais um
lote de caixas quando ouvi uma voz
masculina perto demais.
– Boa tarde, vizinha.
Virei e dei de cara com um homem
asseado e elegante. Cabelo escuro bem
curto, barba bem feita, olhos
amendoados e nariz longo. Ele tinha um
sorriso de vendedor e eu imaginei que
ele fosse exatamente isso.
– Boa tarde – respondi, discretamente
passando as mãos ao redor do corpo.
Estava vagamente consciente do meu
short muito curto e da minha blusa longa,
folgada e levemente transparente. Roupa
vagabunda para fazer faxina. Não para
conversar com desconhecidos. Mas se
era aquilo que eu estava vestindo, era
aquilo que ia ter que servir.
– Você deve ser a senhora Holt – ele
esticou a mão para que eu apertasse.
Pensei em corrigi-lo. Mas o mal-
entendido gerava tantas possibilidades
agradáveis de vingança: talvez Gregory
fosse um marido abusivo e violento e
dali a um mês eu o abandonasse para
voltar para a casa dos meus pais. Eu iria
rir daquilo por anos. Apertei a mão que
ele me oferecia e resolvi não negar nem
confirmar.
– Dominique, por favor.
– Dominique, é um prazer. Sou Eric,
seu vizinho, e é uma honra tê-la na
vizinhança.
Hmm… “Uma honra”. Ele estava
fazendo uma reverência boba e cortês.
Só existem dois motivos para um
homem fazer isso. Ou ele está querendo
te agradar ou te seduzir. Algo no jeito
que ele olhava para minha boca e para a
minha bunda me fez imaginar que fosse a
segunda opção. Certo… Eu posso usar
isso também.
Ele não era feio. Mas também não era
um deus grego. Nem perto disso. Até
Holt era mais atraente do que ele. Certo,
tudo bem, Holt é bastante atraente, na
verdade. O tipo que deve fazer as
mulheres na academia se derreterem em
sorrisos imbecis ao vê-lo com uma
regata colada. A imagem surgiu em
minha mente por um segundo e ficou ali,
dançando diante de mim, até eu sacudi-
la para longe. Não faça isso,
Dominique!
– É uma honra estar aqui – respondi,
exalando uma simpatia que eu guardava
para momentos em que estivesse
excitada e precisando extravasar.
E se Holt fosse transformado em
corno? E se sua doce e dedicada esposa
Dominique o traísse com frequência e
empolgação? Isso seria divertido
também, não seria?
– Precisa de ajuda? Sempre há caixas
pesadas para um homem carregar –
falou, inflando o peito. Eu ri, apesar de
não ter achado graça nenhuma.
– Na verdade, há algumas. Se não se
incomodar…
– Claro que não! Mostre o caminho –
pediu.
Eu obedeci com ares de gratidão.
Ele andava na minha frente falando
sobre trivialidades, eu respondia
qualquer coisa e ria em intervalos
esporádicos. Um pensamento firme em
minha mente: ele não liga que eu seja
casada. Olha para minha bunda e para
meus seios quando acha que eu não vou
notar e eu, propositalmente, crio
variadas situações para que ele observe
meu corpo sem preocupações.
Esse é o tipo de coisa que meus
conhecidos consideram arrogância.
Claro… Até parece que mulher nenhuma
faz isso: valorizar partes do corpo
quando acha que um homem que lhe
interessa está observando. A grande
maioria das mulheres faz isso, mas não
fala sobre isso. Eu? Eu gosto de sexo,
sabe? Não gosto de relacionamentos. É
muito complicado, exige muito tempo.
Mas sexo não. Sexo é rápido e
maravilhosamente delicioso. É relaxante
e serve para me distrair quando estou
muito tensa com alguma situação do
trabalho. Manipular homens para levá-
los para cama é algo em que eu tenho,
digamos, alguma experiência.
Isso é outra coisa que as pessoas
consideram arrogância. Certo, mas o que
eu posso fazer se realmente tenho
experiência nisso? Fingir que não tenho
porque é mais delicado? Ah, danem-se
todos. Quando um homem tem tesão e
vai atrás de uma mulher ele é um
garanhão, um espécime exemplar do
gênero masculino. Quando a mulher faz
a mesma coisa é uma vadia arrogante.
Sabe o que eu odeio? Odeio ser
chamada de vadia arrogante por admitir
fazer coisas que todo mundo faz sem
admitir.
Eric estava me observando.
Acabaram as caixas que deveriam ficar
na garagem e ele estava esperando que
eu o convidasse para entrar.
– Não fiz compras ainda – confessei.
– Não sei o que posso te oferecer, mas
acho que pelo menos um copo d’água –
sorri.
– Água está ótimo, e tenho certeza de
que podemos ser criativos com o que
encontrarmos.
As pessoas dizem que cenas de filmes
pornôs são ridículas. Mas a vida real é
igualzinha. A mesma coisa. As mesmas
situações, os mesmos diálogos, as
mesmas intenções. A única diferença é a
sutileza. O vendedor de pizza diria que
eu tenho uma bunda linda e que a
aceitaria como pagamento pelos seus
serviços. O cavalheiro do meu vizinho
encara meu corpo inteiro e diz que
podemos ser “criativos”. Falta só a
trilha sonora ruim e voilà, pornô
instantâneo.
Sugeri que ele se sentasse enquanto eu
ia buscar a água. Voltei e ele estava
sentado exatamente onde o deixei. Olhei
para o sofá… Parecia novo. Parecia que
Holt tinha comprado o sofá para a casa
nova. Sorri.
Poderiam acabar descobrindo que eu
não era mulher dele, e que ele não era
um homem traído. Mas ter transado com
um de seus vizinhos no seu sofá novo
era algo que Holt nunca poderia tirar de
mim. Pelas próximas semanas, sempre
que ele sentasse ali para comer, jogar
videogame, ver tevê… Eu pensaria
nisso. Pensaria que estive suada com um
desconhecido naquele sofá, naquele
pequeno e confortável refúgio do
inocente Greg.
Uma boa vingança.
Excelente.
Toquei no joelho de Eric quando lhe
passei o copo d’água. Ele olhou para
mim e eu o encarei por um tempo mais
longo do que seria adequado. Ele estava
sorrindo e eu também. Ríamos sem
palavras. Eric derrubou um pouco de
água, meio por acidente, meio de
propósito. E aí estávamos, rindo e
tentando secar a água de sua roupa,
alisando tecidos e pele, olhares e
sorrisos. Toques simples se tornaram
toques perigosos e então inapropriados.
Eu chamo de “hora do tapa”. É aquele
momento em que o homem já está te
tocando de um jeito que, ou você o
beija, ou lhe dá um tapa.
Eu o beijei.
Ele sorriu para mim.
– Você é das minhas, Dominique.
Estive esperando por uma vizinha como
você há muito tempo.
– Eu estou aqui e você vai ficar
falando?
Ele me beijou e passou as mãos por
toda a extensão do meu corpo. Puxou
minha camiseta para longe, pela minha
cabeça, e de repente eu estava só de
sutiã no sofá de Greg. Senti sua boca em
meu pescoço e em meus seios.
Desabotoei sua camisa e sua calça.
Passei as pontas dos dedos sobre seu
peito nu, descendo até sua virilha. Ele
estava duro, mas o material não era
muito grande. Fazer o quê…
Eric tirou meu short e minha calcinha
antes de começar a me provocar com
dois dedos. Seu toque era leve e
desajeitado, enquanto procurava minha
boca com voracidade. Puxei sua cueca
para baixo e apoiei um joelho em cada
lado do seu quadril. Quando o pênis é
pequeno demais para causar impacto, o
truque é se concentrar na fricção.
– Camisinha?
Ele empurrou o quadril para cima, me
levantando enquanto buscava algo no
bolso traseiro. Da sua carteira ele tirou
dois pacotes. Abri um e desenrolei o
preservativo cuidadosamente pelo seu
membro ereto. Ele gemeu com o carinho
e eu tapei sua boca com a minha. Um
movimento rápido e eu estava montada
nele. Senti suas mãos em meus seios,
puxando o bojo do meu sutiã para baixo
para conseguir morder meus mamilos.
Odeio quando o homem faz isso. Não
morder meus mamilos, isso eu até gosto.
Mas puxar para baixo… Ou você tira o
sutiã ou acaricia por cima, meu amigo.
Essa porcaria normalmente custa três
dígitos, aí vem qualquer um e estraga o
suporte. Valeu… Mas o bojo estava
embolando de qualquer jeito e meu peito
estava na sua boca. Resolvi focar nisso
e me inclinei mais para baixo. Eu
rebolava, fazendo com que o ritmo da
penetração fosse gostoso para ele, mas
sempre fazendo o possível e o
impossível para roçar meu clitóris
contra sua virilha. Esfregava cada vez
mais forte e mais rápido até que parei
completamente de ligar para a
penetração e passei a me concentrar só
na deliciosa fricção entre nossas partes
íntimas.
– Ai, delícia… Isso… Linda, vai.
Ele parecia indeciso se colocava as
mãos nos meus quadris e me observava
rebolar ou se abraçava minha cintura e
enfiava meus peitos na boca. Decidi por
ele e segurei um de seus pulsos contra
minha coxa e coloquei o antebraço em
seu peito, mantendo-o afastado. Eric
tinha os olhos semicerrados e emitia um
gemido baixo e contínuo. Seu quadril se
elevava em batidas leves, tentando
acompanhar o meu ritmo. Eu preferia
que ele parasse e me deixasse fazer
aquilo sozinha. Mas ele continuou e eu
acabei me adequando.
Um incômodo delicioso perto do
umbigo deixou claro que eu estava bem
perto. Pelos gemidos de Eric, imaginei
que ele estivesse mais perto ainda e
resolvi acelerar. Abandonei sua mão e
peito e acariciei meus seios, apertando
meus mamilos do jeito que eu gosto.
Apliquei mais força no meu movimento
e senti meu corpo explodir, começando
pelo meu clitóris.
Ele gozou poucos segundos antes de
mim. Senti seus braços ao redor da
minha cintura tentando me puxar para
perto, mas me desvencilhei a tempo e
logo estava completamente vestida e me
livrando dele.
Tranquei a porta atrás de mim e fui
me livrar da camisinha usada. A dúvida
sobre contar ou não contar a Holt que
tinha transado no sofá novo dele estava
me consumindo e me fazendo sorrir
como uma babaca. Nunca mais ia
conseguir olhar para aquele sofá sem
dar risada. Principalmente depois que
visse Gregory sentado nele.
Capítulo 3
“Você é como o ladrão que não se
sente nem um pouco mal por ter
roubado, mas se sente horrivelmente
mal por estar sendo preso.”

Rhett – E o vento levou

– Como foi o seu dia, querida?


Ele tinha um sorriso impossível,
estampado no meio do resto. Olhei pra
ele sem emoção, deixando claro que não
tinha achado graça nenhuma na
brincadeira estúpida.
– Qual o seu problema?
– Problema? Nenhum. Tenho um
emprego maravilhoso, ganho muito bem,
tenho bons amigos e uma secretária
pessoal espetacular.
Ele se aproximou e me deu um beijo
estalado na bochecha. Eu virei com a
mão aberta para lhe dar um tapa com
toda a minha força, mas ele já estava
preparado para essa possibilidade e se
afastou ainda mais rápido.
O hall estava quase sem caixas. As
com rótulos compreensíveis já tinham
sido desempacotadas e seus objetos
tinham ido para seus devidos lugares. A
sala de estar e de jantar ainda estavam
abarrotadas.
– Sabe, Dom – ele começou, jogando
três pastas de processo no meu sofá. –
Para quem disse que só precisava de
uma semana para arrumar tudo, você
parece bem atrasada.
– Tive que desinfetar e esterilizar o
lugar onde eu vou dormir. Gastei a
maior parte do tempo com isso, não que
seja da sua conta.
– “Não que seja da minha conta?” –
ele se sentou no sofá e se serviu de um
pedaço da pizza que eu tinha pedido
quando a fome foi maior que meu desejo
de acabar tudo o mais rápido possível. –
Pelo que eu me lembro dos termos do
nosso acordo, tudo que você faz é da
minha conta – ele riu, mordendo uma
fatia fria.
– O acordo é: eu arrumo sua casa e
você me deixa em paz – lembrei, tirando
a fatia da boca dele.
– E isso – disse apontando para a
pizza – é meu. – joguei a fatia de volta
na caixa.
– Ah… Vai ser assim, é? Então, já
que a casa é minha, eu posso
simplesmente entrar no banheiro quando
você estiver tomando banho, não é? A
porta é minha, quero dizer. Eu posso
abri-la quando quiser.
– É esse o tipo de argumento que você
usa no tribunal? É por isso que sua taxa
de ganhos de causas é tão baixo.
– Minha porcentagem é 93%! – ele
respondeu, rindo. Ok. Era uma
porcentagem impressionante. A minha
era um pouco melhor, obviamente. Mas
muito pouco. – E não sei por que você
se incomodaria – continuou, soltando o
nó da gravata e pegando a fatia de volta.
– Não é como se eu nunca a tivesse visto
nua.
Sabe quando você está quase no seu
limite? Sabe aquele momento em que o
copo está quase cheio e só uma gota
pode destruir tudo? O momento em que
você quase não aguenta mais, mas por
pouco ainda se segura? Esse meu
momento quase foi há várias caixas
atrás. E, de repente, com aquelas poucas
palavras, Gregory Holt fez meu
resignado copo d’água transbordar.
Fechei meus punhos e me joguei
contra ele com força. Ele tinha um vídeo
perigoso, poder sobre meu futuro e
sobre minha reputação e uma taxa de
sucesso invejável, mas, por Deus, ele
não teria a minha pizza.
– Isso é meu!
Puxei Holt pela gravata frouxa e ele
me segurou pelo braço com a mão livre.
Ele era claramente mais forte do que eu,
e conseguiria me afastar com facilidade.
Sem pensar, montei em cima dele,
mantendo-o preso no sofá.
– Devolva minha pizza – ordenei.
– Você não vai mais comer isso.
Deixa de ser egoísta.
Tentei alcançar a mão que mantinha a
pizza longe de mim, mas ora ele
segurava um de meus braços, ora o
outro, e sempre conseguia me impedir
de atingir meu objetivo. Eu queria
esmurrá-lo e mordê-lo.
Mesmo com toda minha raiva, a
proximidade com Holt era sedutora,
quase proibida. Se ele ficasse excitado
eu iria apontar e rir. Seria uma vitória
extra. Eu estava de joelhos quando
consegui segurar com as duas mãos o
braço em que ele segurava a pizza, e
senti seu outro braço me envolvendo,
tentando fazer com que eu me abaixasse.
Tinha plena consciência de que meus
seios estavam na altura do seu rosto,
mas não abandonei minha presa e
esperei que toda a situação seio/rosto
fosse distraí-lo por tempo suficiente.
Mas ele me soltou, passou a fatia de
uma mão para a outra e a enfiou inteira
na boca.
– Eu vou te matar – sussurrei.
Coloquei minhas mãos no rosto dele e
comecei a abrir sua boca. Gregory
segurou minhas mãos e mastigou
vorazmente.
Bati as mãos espalmadas contra seu
peito e me levantei em fúria.
Minha fúria pode parecer ridícula
diante desse episódio irrelevante, mas
eu estava entrando em desespero.
Nunca, nunca, nunca tinha estado tanto
sob o jugo de alguém como nessa
situação. Se apenas eu tivesse
conseguido aquela estúpida fatia de
volta… Não era a pizza, ou o valor, ou o
que quer que fosse… Era uma questão
de orgulho, e o meu estava
irreparavelmente ferido.
Andei em direção à porta da sala com
o rosto entre as mãos e senti que ia
chorar. Conte até dez, Dom. Calma.
Respira. Ele se moveu
desconfortavelmente no sofá, sem
levantar. Algo na minha expressão
corporal deve ter denunciado que eu não
estava apenas brincando inocentemente.
Um. Dois. Três.
– Dom, desculpa. Não sabia que você
e a pizza tinham ficado tão íntimas,
assim, tão rápido – ele tentou brincar.
Eu o olhei e deixei que o rancor
tomasse conta do meu semblante.
Quatro. Cinco.
– Brincadeira. Desculpa – ele repetiu.
– Não sabia que significava tanto para
você que eu não comesse sua pizza.
Sinto muito, mesmo. Não como mais
suas coisas.
Continuei olhando para ele sem dizer
uma palavra. Temi que, caso abrisse a
boca, começasse a chorar. Odeio chorar.
E na frente dos outros, então… Na frente
de Holt! Nunca iria me perdoar.
Seis. Sete.
– Achei que estávamos só brincando.
Não achei que fosse sério – ele apontou
para a pizza descontraidamente. – Sabe
como é, não? – sorriu, um pouco mais
relaxado. – Eu te chantageio, você cede,
a gente faz um acordo bobo, você passa
algumas semanas comigo e, algumas
brincadeiras e conversas íntimas depois,
você se apaixona loucamente pela minha
personalidade irresistível – ele abriu um
sorriso largo, tentando fazer com que eu
sorrisse. Teria sorrido se não estivesse
tão magoada. Mantive minha expressão
irascível.
Oito.
– Certo. Muito cedo para brincar.
Olha, desculpa. Eu devolveria a pizza,
se pudesse. Eu… Te levo pra jantar,
amanhã. O que acha? Por minha conta?
Por favor.
Coloquei a mão na nuca e massageei
meu pescoço.
Respirei fundo.
Nove.
– Vem, senta aqui – ele se moveu no
sofá para me dar mais espaço e bateu a
mão na almofada ao seu lado como um
convite. Eu ia dar um passo a frente
quando notei seu olhar fixo em um ponto
do sofá. Ele tinha uma expressão curiosa
nos olhos quando puxou um pequeno
pedaço de plástico escuro no espaço
entre duas almofadas do assento.
– Mas que diabos é isso? – ele
analisou a tira cuidadosamente e eu
prendi a respiração. A tira de cima do
pacote do preservativo. Eu tinha jogado
todo o resto fora cuidadosamente, mas
aquele pequeno pedaço, com a
logomarca perfeitamente legível, me
escapou completamente.
– Isso é o que eu acho que é? – seu
olhar ficou frio e seco.
Merda.
Eu podia tentar mentir. Ou podia dizer
a verdade e ele que se foda. Mas havia
algo de dor em seus olhos verdes, e eu
não consegui me forçar faz dizer nem
mais uma palavra.
– Não acredito nisso, Dominique! –
ele se levantou. – Você está aqui a UM
MALDITO DIA e fez o quê? Trouxe um
estranho para dentro da minha casa e
transou com ele? Onde? Na minha
cama?
– O que eu faço não é da sua conta
e…
– Cala a boca – ele falou encarando o
chão, com um asco em sua voz que fez
com que eu me sentisse imunda. Por que
aquilo estava me incomodando tanto? –
Você é a pessoa mais egocêntrica que eu
já conheci – suspirou. – E pervertida,
diga-se de passagem.
Meu peito inflou. Ah, isso não…
– Sou pervertida porque gosto de
sexo?
– Você parece nem se lembrar do que
te colocou nessa situação em primeiro
lugar…
– Estava na minha casa…
– Embaixo da minha janela! – ele
berrou.
Ah, então íamos começar a gritar?
Tudo bem. Eu sabia gritar também.
– Vivo minha vida do jeito que eu
quiser e não lhe devo satisfações,
Gregory!
– Na minha casa você deve! Não
acabei de comprar móveis novos para
você batizá-los com o pau de algum
amiguinho seu.
– Me respeite!
– Como? Se nem você se respeita?
– Seu ridículo hipócrita! Você não
transa, então?
– Não na casa dos outros – rosnou. –
Não é hipocrisia, sua vadia maluca. É
educação.
– Típico! Uma mulher atende aos
próprios desejos sexuais e é…
– Cala. Essa. Boca. – sibilou. – Para
de advogar! Para! Para de fingir que
isso tem algo a ver com preconceito de
gênero. Se um homem tivesse vindo
como convidado para minha casa e
tivesse feito o que você fez…
– Você gritaria com ele?
– Daria um murro na cara dele. Como
isso funciona na sua cartilha de
igualdade entre os sexos? Dou um murro
em você também?
Abri a boca para continuar a falar,
mas ele pegou a caixa de pizza e virou
as costas. Ouvi a porta do seu quarto se
fechar e senti meu coração batendo na
garganta.

A vagabunda tinha transado com um


cara na minha casa.
Joguei a caixa de pizza em cima da
cama e comecei a tirar a roupa. Mal-
educada, arrogante, impossível! Queria
descer as escadas e continuar a brigar
com ela. Queria gritar e xingá-la e…
Arrancar suas roupas naquele sofá.
Qual era o meu problema? Eu estava
enfurecido, mas não parecia ser por ela
ter transado com um cara na minha
casa. Mas apenas pelo fato de ela ter
transado com um cara.
Tinha um nó na minha garganta e algo
pesado incomodando minha respiração.
Estava atraído por Thoen, mas não
mandava nela. O que ela fez foi uma
grosseria sem tamanho, e era esse o
argumento que eu tinha que repetir. Se
desviasse desse caminho e deixasse que
ela percebesse que tinha outra nota
nessa melodia, uma nota de ciúmes, ela
iria me engolir e eu perderia a razão.
Liguei o chuveiro e me joguei
embaixo do jato de água quente.
Podia mandar ela embora e acabar
com esse problema de uma vez.
Mas eu não queria.
Não queria nem um pouco.
Eu devo ser mesmo um masoquista
imbecil para querê-la por perto.
E agora, mais do que tudo, eu queria
devolver a gentileza. Uma parte insana,
perversa e irracional de mim queria
fazer Dominique ficar com ciúmes.
Idiota… Não se pode ter ciúmes do
que não se gosta.
Fechei os olhos e minha memória
começou a me oferecer um festival de
imagens intrusas. Eu conseguia me
lembrar do dia em que conheci
Dominique como se isso tivesse
acontecido há poucos segundos atrás.
Lembrava de estar sentado no meu
carro, na garagem da casa do meu antigo
chefe, Hyde. Assim como agora, tinha
acabado de me mudar para uma cidade
nova. Naquela noite de Natal, meu
ânimo estava pesado. Estava sempre
pesado, era um ardor difícil de afastar…
Comi algumas fatias frias com muito
orgulho. Era a pizza que ela não queria
que eu comesse. Escovei os dentes e
deitei. Minha mente sonolenta oscilava
entre Dominique montada em cima de
mim tentando roubar a fatia de volta e
aquela noite de Natal em que nos
conhecemos.
Eu estava dentro do carro…
Puxei o cobertor e fechei os olhos.
Dentro do carro…
Conseguia me lembrar de cada
detalhe como se estivesse acontecendo
naquele exato momento. Não sei dizer
em que ponto dormi e as lembranças
viraram sonhos, mas eu estava lá. Estava
dentro do meu carro, naquela garagem,
mais uma vez.
Passei as mãos pelas mangas do
paletó e ajustei a gravata borboleta.
Queria causar uma boa impressão.
Aquele seria meu novo lar e eu esperava
que fosse por muito tempo. Queria me
distanciar o máximo possível da minha
vida anterior, e talvez uma posição em
um grande escritório de advocacia não
fosse o extremo oposto do meu ponto de
partida, mas era de longe o suficiente.
Ou, pelo menos, teria que ser.
Fora aquilo, não havia muitas coisas
que eu sabia fazer. E havia ainda menos
coisas que eu queria realmente fazer.
Respirei fundo e desci do carro. As
únicas coisas que eu tinha trazido
comigo da minha antiga vida eram
minhas roupas, algumas coisas da
Amanda e meu Porsche Boxster. Apertei
o botão do alarme. Aquele carro tinha
sido a primeira coisa que eu tinha
comprado com o meu dinheiro. Dinheiro
do meu trabalho. Nada de dinheiro da
família, fundos de investimento ou
poupança. Eu tinha trabalhado por cada
centavo.
Por um lado, aquilo era ridículo.
Afinal, o único motivo pelo qual eu
tinha conseguido economizar dinheiro
para comprar o bendito carro era a
existência do dinheiro da família, dos
fundos de investimentos e das minhas
poupanças, que arcavam com todos os
custos da minha vida superficial,
insignificante e luxuosa.
Era verdade.
Mas juntar dinheiro e comprar aquele
carro tinha sido um divisor de águas.
Tinha sido a prova de que eu podia.
Eu podia fazer o que quisesse.
E o que eu queria depois do acidente
era me mudar para bem longe.
Demorei tempo demais para tomar
coragem, mas naquele momento… Ali
estava eu. Com meu Boxster, meu
dinheiro e minha vida. Não devia
satisfações a ninguém. Exceto aos meus
novos chefes.
A música de Natal tocava alta e
alegre e fui recebido com sorrisos,
cumprimentos e uma taça de champanhe
assim que entrei na gigantesca mansão
de Anthony Hyde. Ele era um dos sócios
majoritários do escritório e, todos os
anos, dava uma inesquecível festa de
Natal para família, amigos e colegas. Ou
pelo menos era isso que eu tinha ouvido
falar.
Havia comida suficiente para
alimentar uma pequena cidade, e eu me
servi de um pouco de tudo, mais porque
não sabia o que fazer do que por fome.
Olhei ao redor enquanto mordia um
pedaço de torrada com caviar. Senti as
bolinhas do caviar contra minha língua e
me odiei por saber identificar a marca.
Estava considerando me aproximar de
um dos poucos grupos de pessoas que eu
já tinha conhecido em minha primeira
semana de trabalho, mas não sabia o que
dizer e preferi ficar ali, em pé ao lado
da mesa por mais alguns minutos até me
familiarizar melhor com o ambiente.
Foi aí que eu a vi.
Estava do outro lado do salão.
Segurava em sua mão de unhas bem
feitas uma taça de champanhe com
morangos e, pelo jeito como falava e
sorria, se tornou claro porque era o
centro das atenções do pequeno grupo
em que se encontrava. Seu vestido
amarelo tomara que caia sustentava seus
seios em um decote espetacular. Um
pequeno detalhe ornamentado com
brilhantes começava bem abaixo dos
seus seios e seguia pelas laterais do
corpo, delineando sua cintura como um
delicado cinto justo. A partir daí a saia
do vestido caia longa e suave, em um
tecido pesado o suficiente para se
agarrar a cada uma de suas curvas. E,
por Deus, que curvas!
Seu cabelo escuro caía em cachos
largos e imponentes quase até sua
cintura. Ela usava poucas joias e uma
maquiagem discreta. Era tão linda que
qualquer acessório seria um exagero e
uma distração. Eu a media dos pés à
cabeça, e tive certeza de que se ela
tivesse aparecido para a festa vestida
com um saco de batatas ainda seria a
convidada mais bonita do sr. Hyde. Era
o seu porte: a maneira como andava,
falava ou gesticulava. Tinha algo nobre
em seus trejeitos. Algo que parecia
natural e ao mesmo tempo
cuidadosamente aprendido.
Analisei o grupo de seis homens ao
seu redor. Um deles, com certeza, o
marido rico. Uma mulher como aquelas
não fica solteira por muito tempo. Não
com aqueles olhos, com aquela postura,
com aquelas curvas. Não em uma sala
como aquela. Algum babaca
hediondamente rico já deveria ter se
aproximado e colocado um diamante de
vinte quilates em seu dedo. Isso depois
de ter concorrido arduamente com
outros babacas um pouco menos
hediondamente ricos.
Alguns colegas acenaram e eu me
aproximei sorrindo e desejando feliz
Natal. Os votos de felicitações foram
devolvidos para todos os lados e a
conversa seguiu para trabalho,
investimentos e possíveis locais para
passar boas férias. Eu sorria,
concordava, acrescentava comentários
que eu acreditava serem pertinentes,
sempre tomando cuidado para não soar
prepotente ou boçal: todos os lugares
que meus colegas desejavam conhecer,
eu já tinha visitado. Mais de uma vez.
Logo não estávamos mais falando de
férias e sim de esportes. Mas não
importava o quanto o assunto variasse,
de um jeito ou de outro, eu sempre me
pegava observando a mulher de
amarelo. Parecia uma hipnose ou magia
negra. Tinha algo naquela mulher que
estava me enfeitiçando.
Algumas colegas foram ao banheiro,
outros se afastaram para pegar mais uma
bebida e eu pedi licença sob a desculpa
de repetir o caviar, ou alguma outra
bobagem, na mesa de frios.
Ela estava lá. Colocava poucas
porções em um prato enquanto tentava
equilibrar a taça.
– Aqui, por favor – eu me adiantei. –
Posso ajudar? – levantei a mão para
pegar sua taça.
– Ah, obrigada. Mas estou bem.
Parecendo um pouco atrapalhada,
ofereci meu sorriso mais simpático: –
Imaginei que pudesse precisar de ajuda.
– Atrapalhada? – seu sorriso se
transformou em algo diferente. Ela
colocou a taça em um espaço livre sobre
a mesa e fez um gesto de modelo
apresentando uma nova motocicleta
antes de voltar a se servir. – Tudo certo.
Acho que consigo me virar sozinha.
– É. Parece que sim. Perdoe-me –
levantei as mãos, rendido, e continuei a
sorrir. Vamos lá, Greg, pergunte seu
nome.
– Gregory Holt.
– Prazer, sr. Holt. – ela pescou um
morango na sua taça de champanhe e o
colocou na boca. Seu polegar encostou
demoradamente em seu lábio inferior
enquanto ela mordia um pedaço da fruta
sem nunca tirar os olhos dos meus. É
horrível como nós, homens, parecemos
nascer com um gene que nos impede de
ver uma mulher colocando algo na boca
assim, desse jeito vagaroso, sem
imaginar como seria a sensação de ter
nossa ereção ali, naquele mesmo lugar,
servindo de aperitivo para aquela
mesma boca.
Ela mastigou como se estivesse
brincando com o morango. Ou, mais
provavelmente, brincando comigo. Tive
que me forçar a parar de observar sua
boca e, quando encarei seus olhos
novamente, vi a diversão estampada em
seu rosto. Então, ela era uma dessas
mulheres. Dessas que sabem exatamente
o efeito que causam nos homens e que
não se envergonham de fazer isso.
Definitivamente, a esposa troféu de
algum ricaço. Definitivamente.
Eu tive pena do coitado
imediatamente. Com certeza, devia estar
preso em seus encantos e não importava
o quanto ele achasse que era ou tentasse
ser o chefe do lar: quem mandava era
ela. Sem dúvidas.
– Trabalho para Hyde – coloquei a
mão no peito me apresentando. – Quem
é seu marido? Talvez eu já o conheça.
– Meu marido? – ela riu.
Seria possível que eu estivesse
enganado? Se ela fosse solteira, aquela
seria a melhor noite da minha vida. Não
que eu imaginasse que ela iria para a
cama comigo no mesmo dia em que nos
conhecemos ou algo assim. Mas era
interessante brincar com a ideia. E se
ela fosse, de fato, solteira, eu
simplesmente precisava conhecê-la
melhor.
– Sim – eu queria perguntar, mas não
sabia como. Precisava ter certeza.
Ela inclinou a cabeça próxima ao
ombro e sorriu. Estava me medindo da
cabeça aos pés, como se estivesse
tentando decidir o que fazer comigo. Se
ela resolvesse me levar para sua cama,
acho que eu não sairia de lá nunca mais.
Vamos, Greg… Pergunte.
Seja educado. Elogie. Use um tom de
brincadeira. É. É isso.
– Quero dizer, uma mulher linda como
você não pode estar solteira.
– É mesmo? – ela sorriu.
– E com todos esses homens ricos ao
redor te cobiçando, seria difícil para
uma mulher como você recusar.
– Uma mulher como eu? – sua
postura mudou e eu notei que estava
indo pelo caminho errado.
– Não quis ofendê-la. Só quis dizer
que… uma mulher tão linda, em uma
festa como essa…
– … deve estar acompanhando o
marido? – ela arregalou os olhos para
mim e eu senti que tinha cometido algum
erro irreparável. Repassei minhas
palavras para entender exatamente qual
tinha sido a besteira que eu, certamente,
falara – Por que uma mulher não pode
ter sido convidada para uma festa de
homens importantes porque ela é
importante?
Ah. Então, foi essa a besteira.
– Olhe. Sinto muito. Acho que
comecei do jeito errado. – Eu tinha um
sorriso que gostava de usar em situações
como essa. É o sorriso lindo e fofo que
diz “me desculpe se eu fiz besteira, mas
eu juro que sou gostoso e que posso te
recompensar” – Vamos começar de
novo.
Sou Gregory Holt. Trabalho para
Anthony Hyde. Comecei essa semana. E
você é…
– A mulher que está indo embora –
ela virou o pouco que sobrava de seu
champanhe e largou a taça em minhas
mãos antes de se virar e partir.
Passei as próximas horas da festa
decidindo se ia falar com ela de novo ou
não.
Conversei com várias outras pessoas,
comi, bebi, ouvi música natalina… Mas
sempre que ela entrava no meu campo
de visão eu repassava o diálogo inteiro
que havíamos tido em minha mente, me
arrependia profundamente e tentava
decidir se ia atrás dela ou não.
Ela sempre se afastava ou começava a
conversar com alguém antes que eu
pudesse me decidir.
Olhando em retrospecto, talvez
tivesse sido melhor simplesmente ter
deixado para lá e esquecer que essa
mulher existia.
Mas ela podia ser uma colega de
trabalho. E entre não querer começar um
trabalho novo já com uma inimizade e
meu pênis que não parava de implorar
por uma segunda chance, acabei
decidindo me aproximar mais uma vez.
Ela estava encostada na lateral de um
dos grandes portais de madeira escura
que levavam de um ambiente ao outro.
Tinha a mão na nuca e massageava o
pescoço como se estivesse exausta. Eu
me aproximei por trás e já estava quase
invadindo seu espaço pessoal quando
percebi que não sabia o que dizer.
Rápido, Greg. Pense em alguma coisa
ou vire as costas e vá embora.
Ela se virou, senti seus olhos nos
meus e o tempo para pensar em algo
interessante para dizer tinha acabado.
– Quer ajuda com a massagem? –
apontei para o seu pescoço.
Que droga foi essa, Greg? “Quer
ajuda com a massagem?” De todas,
todas, as coisas que você poderia ter
dito…
Ela me olhou com fúria e eu achei que
não tinha salvação para algo tão
inapropriado a não ser tentar levar na
brincadeira.
Sorri, tentando deixar minhas
intenções óbvias.
– Espero que você não seja o novo
porta-voz do escritório – ela disse,
simplesmente. – Porque você parece
odiar as palavras, sr. Holt, e é
recíproco.
– Foi só uma brincadeira. Me perdoe,
foi inapropriado.
– Eu conheço o senhor há
pouquíssimas horas e já teve que se
desculpar duas vezes. Acho que isso diz
algo sobre seu comportamento.
– Com certeza, é só que… – depois
de duas mancadas seguidas, julguei que
era melhor simplesmente ser sincero.
Ela parecia uma mulher inteligente, com
certeza não se ofenderia com
sinceridade – Você é espetacularmente
linda e eu fiquei um pouco confuso.
Peço desculpas – coloquei a mão sobre
o peito. – Realmente, não vai acontecer
de novo.
Alguns segundos de um silêncio
constrangedor se seguiram.
De minha parte, pelo menos.
– Tudo bem? – perguntei, e ela me
observou como se não entendesse o que
eu ainda estava fazendo ali.
Sorri e olhei ao redor. Algo chamou a
minha atenção. Bem em cima do portal
onde estávamos, alguém tinha colocado
um visgo. Uma pequena plantinha verde,
enrolada em um laço vermelho e
natalino. Eu conhecia a tradição: ela
dizia que quando duas pessoas se
encontravam ali embaixo, deviam se
beijar. Eu não consegui não dar risada.
De todas as pessoas que eu poderia
encontrar embaixo de um visgo, a
mulher do vestido amarelo era a pior
opção. Pelo menos, no momento.
– Posso perguntar qual é a graça?
– O destino – respondi irritado,
apontando para cima.
Ela deve ter entendido minha
brincadeira como mais um comentário
inapropriado e, sinceramente, quem
poderia condená-la?
Escutei o estalo do tapa assim que sua
mão encontrou minha bochecha. Quando
finalmente entendi o que tinha
acontecido ela já tinha ido embora e eu
estava esfregando meu rosto ardente.
Minha mente passeou entre memórias
e sonhos loucos e agitadores antes de me
levar de volta para aquela noite. Para
minha cama. Sozinho, na noite de
Natal… Debaixo dos cobertores, como
naquele momento. Com raiva de
Dominique, como agora.
Queria tirar a maldita mulher de
amarelo da cabeça e dormir. Mas, assim
como naquele momento, ela era a única
coisa em que eu conseguia pensar.
Eu ficava revivendo o tapa, os
comentários esnobes e irritados, as
curvas e o decote.
Mas acima de tudo, eu ficava
revivendo o morango.
Aquela boca molhada mordendo o
morando. Mastigando com uma calma
infinita. Me encarando como se dissesse
que sabia exatamente em que eu estava
pensando.
Mantive os olhos fechados e me cocei
em um lugar gostoso.
Logo, o coçar se transformou em um
carinho e o carinho em um toque ainda
mais urgente.
Meu pau estava duro e eu passei a
mão fechada em toda a sua extensão. Da
base até a ponta.
Aquela boca naquele morango.
Aquela boca no meu pau.
E de volta, da ponta até a base.
Aquelas curvas naquele vestido.
Aquelas curvas nas minhas mãos.
Subi mais uma vez.
Aqueles olhos safados. Aquela atitude
de mulher que sabe o que faz.
Desci mais uma vez.
Aquele decote exposto. A minha boca
enfiada naquele decote.
Aumentei a velocidade. Aumentei a
pressão.
O vestido amarelo no chão do meu
quarto. A morena deliciosa nua na minha
cama.
Minhas entranhas estavam gemendo
junto comigo.
Um tapa na minha cara. Meu pau
fodendo ela com força.
Um gemido longo. Um grito rouco.
Meu corpo inteiro tremia e suava.
Um beijo naquele pescoço lindo. Um
puxão naqueles cabelos imensos.
Senti o recuo na minha virilha e eu
sabia que estava bem perto.
Lembrei do morango. A boca. A
língua no lábio.
Aquela boca gritando e mordendo os
dedos para parar de gritar meu nome.
Enfiando meu pau nela.
Mais rápido.
Mais fundo.
Coloquei a mão sobre minha ereção
satisfeita para evitar que a ejaculação
sujasse tudo.
Acordei com o alívio percorrendo o
meu corpo como eletricidade. O
resquício da minha ereção molhado de
esperma.
Levantei da cama e fui me lavar.
Tinha que trocar os lençóis e lavar o
lugar que eu tinha sujado. Não ia deixar
aquilo para Thoen… Mesmo que ela
merecesse uma vingança…
Tirei o pijama com aquela noite de
Natal de tantos anos atrás ainda girando
em minha mente. Aquela noite, sozinho
em casa, na minha cama. Pensando nela
enquanto eu me acariciava.
Aquela tinha sido a primeira vez em
que me masturbei pensando em
Dominique.
Mas não foi, nem de perto, a última.

Passei boa parte da noite acordada.


Se Gregory achava que eu ia me
esconder como uma criança pequena, ele
não me conhecia bem o suficiente.
Fiquei na sala lendo os processos que
ele deixou no sofá. O novo escritório de
Holt era quase o oposto do seu antigo
emprego.
Lá, trabalhamos com empresas
grandes, corporações monstruosas,
tubarões-baleia em um oceano imenso.
Agora Holt trabalhava com pessoas. Os
ofendidos pelas grandes empresas e
corporações monstruosas. Era a outra
face da moeda, e eu entendi
perfeitamente bem por que uma pessoa
com uma índole gentil e fraca como a
dele iria preferir o novo emprego ao
anterior.
Aquelas causas eram ridículas, eu
devo dizer. Ganharia qualquer uma
delas sem mais que duas horas de
trabalho em cada. Trabalho bom, fácil e
bem pago. Era óbvio o motivo pelo qual
ele tinha ficado tão satisfeito com a
mudança.
Meu pai dizia que trabalho bom é
trabalho duro. Sempre concordei com
ele: ganhar dinheiro por um trabalho
bobo que mal merecia ser pago nunca
me satisfez. Eu gostava do difícil. Dos
problemas de que a maioria das pessoas
fugia, correndo para longe.
Já tinha passado da meia-noite
quando subi para o quarto, Gregory não
tinha aparecido. Que seja. Se era para
um de nós dois se esconder, melhor que
fosse ele.
Deitei a cabeça no travesseiro e
comecei a ser consumida por uma
irritante sequência de pensamentos. O
que eu fiz foi errado? Foi rude e mal-
educado? Vamos lá, Dom, não minta.
Foi?
Sim, foi. Mas foi de propósito. Ele
me filmou enquanto eu me masturbava e
está usando isso para me humilhar.
Queria me vingar e me vinguei. Pronto.
Certo, não vamos mais pensar nisso.
Virei de lado e observei a luz da lua
entrando delicadamente pela janela.
Mas eu não precisava ter feito aquilo.
Foi excessivo. Quero dizer… Até agora,
ele não me humilhou de verdade, não é?
Ah, inferno. Levantei a cabeça, sacudi
os cabelos e deitei novamente. Por que
eu ligava? Por que tinha começado a
ligar? Eu não estava desenvolvendo uma
consciência, estava? Isso que eu estava
sentindo… Seria remorso?
Expirei longamente deitada no escuro.
Considerei as minhas possibilidades por
alguns minutos: estava argumentando
contra mim mesma e esperando para ver
o resultado.
Aparentemente, eu estava me sentindo
mal pela minha conduta.
Aparentemente, eu continuaria me
sentindo mal até fazer algo para
recompensá-lo.
Droga.

Meu relógio biológico me acordou


cedo demais, e resolvi descobrir o que
eu podia fazer para o café com o pouco
que Holt tinha em sua cozinha. Eu não
sabia como essa coisa de se redimir
funcionava, mas imaginei que um café da
manhã bem preparado fosse um bom
começo.
Ele desceu uns vinte minutos depois.
Eu tinha feito ovos e sanduíches de
queijo e posto a mesa na sala de jantar.
– Fiz comida demais – avisei. – Pode
comer, se quiser.
– Não, obrigado. Pego alguma coisa
no caminho – ele respondeu, indo direto
para os seus processos no sofá.
– Ahmm… Tudo bem. Mas já está
pronto e vai pro lixo, se você não
quiser.
– Você fez café da manhã para me
pedir desculpas? – ele me observou
subitamente. Seus olhos traziam alguma
emoção indecifrável.
– Claro que não – menti. – Fiz comida
demais. Só isso.
– Se você quiser que eu te desculpe,
Dominique, vai ter que dizer as
palavras. – Ele tinha os processos na
mão e já estava na porta. – Vai ter que
dizer “me desculpe”. – Ele saiu sem se
despedir e eu tive vontade de jogar uma
xícara no lugar onde a cabeça dele havia
estado segundos atrás.
Ia ter que pedir desculpas?
É… Aquilo não ia acontecer. Não sei
se minha boca sequer conseguia dizer a
palavra “desculpe”. Nunca tinha
experimentado antes.
Terminei meu café, lavei a louça e fui
tirar o lixo. Joguei tudo em uma lata
apropriada na lateral da casa.
– Você não recicla?
Ah, meu deus… Chega de vizinhos,
por favor. É por isso que eu não desejo
“bom dia” aos meus. Você os
cumprimenta uma única vez e pronto:
tem que fingir simpatia pelo resto da
eternidade.
– Não, não reciclo – respondi. Curta e
grossa. Não estava no clima para fazer
amizades.
– Não demora muito e é uma grande
contribuição para o planeta. Sabe?
Aquela coisa imensa, redonda e azul
graças à qual a vida pode existir.
Virei pronta para soltar fumaça.
Ela era alta e magra. Seus cabelos
longos tinham as pontas tingidas de azul
e rosa. Seus olhos eram escuros, sua
pele pálida, e ela usava roupas demais
para um clima quente de verão.
– Há alguma lei nesta cidade em que é
obrigatório reciclar? – perguntei seca.
– É uma questão de princípio, não
uma…
– Há uma lei? – repeti e meu tom
firme surgiu imediatamente.
– Não – seus lábios se moveram em
uma careta e eu tive certeza de que havia
ganhado uma inimiga. – Mas quando nós
todos morrermos soterrados pelo lixo,
quero ver como você vai se sentir.
– Você está assistindo muito Wall-E,
querida – respondi, dando as costas e
voltando para a casa.
– Vadia… – ela não tentou falar baixo
e eu a admirei muito por isso.
Duas coisas precisavam ser feitas
urgentemente: uma feira e uma limpeza
no sofá de Holt. Não queria que ele
usasse isso contra mim, nunca mais.
Encontrei uma lavanderia e marquei
para que eles buscassem o sofá durante
a tarde.
A feira ia ser um pouco mais difícil.
Eu estava sem carro e algo me dizia que
Holt não estaria disposto a me emprestar
o dele em um futuro próximo. Olhei o
mapa no celular e xinguei aquele
maldito bairro periférico por não ter
nenhum supermercado próximo. Já
estava sentindo saudades da minha
metrópole com toda a poluição e
engarrafamento.
Talvez a vizinha de ontem pudesse me
ajudar. Se eu apenas me lembrasse do
nome dela.
O mapa digital me informou que havia
uma pequena mercearia a uma distância
próxima o suficiente para ser feita a pé.
Certo, novo plano: comprar
suprimentos básicos, limpar o máximo
da zona Holtiana e tentar convencê-lo a
me emprestar o carro no dia seguinte.
Ou descobrir o nome da vizinha
simpática que não se incomoda em dar
carona para estranhos.
Olhei pela janela da sala e vi a garota
alta e esquisita me olhando do seu
jardim. Ela morava exatamente na casa
ao lado da de Holt. Ótimo. Arranjei uma
vigia. Senti vontade de ter alguma
camiseta que dissesse “derretam as
calotas polares” ou algo igualmente
ultrajante, só para irritá-la. Mas,
infelizmente, esse não era o tipo de peça
que encontraria no meu guarda roupa.
Irritá-la ia exigir um pouco mais de
criatividade.
Amarrei um lenço em meu cabelo
para manter os fios longe dos olhos e
comecei a enfrentar as caixas
semicompreensíveis. Já era quase meio-
dia quando consegui organizar uma
quantidade suficiente delas de modo
satisfatório. Quem coloca CDs em uma
caixa classificada como “Coisas que
estavam na estante de baixo”? Ou
melhor… Quem ainda tem CDs?
Seja como for, só precisei abrir três
para perceber que estavam todos nas
caixinhas erradas. Organizar aquilo ia
levar um tempo infernal.
Talvez fosse hora de parar e fazer
uma visita à mercearia.
Alguém bateu na minha porta. Ou
melhor, na porta de Holt.
Ela devia ter pouco mais de cinquenta
anos. Seu cabelo era tingido de preto tão
uniformemente que parecia uma peruca.
Seu rosto esticado gritava “botox” e
seus lábios tinham sido exageradamente
pintados com um batom vermelho.
– Boa tarde, queridinha – pronto, eu
já a odiava.
– Posso ajudar?
– Vim até aqui ver se o belo Gregory
apreciou meus bolinhos.
Ela alternava entre palavras audíveis
e sussurros, e balançava o corpo como
se tentasse valorizar as curvas que não
tinha.
– Não sei dizer. Mas posso perguntar
e te digo depois – sorri falsamente,
pronta para fechar a porta na cara dela.
– Você é a esposa? – ela segurou a
porta com o indicador. Meu bem, isso
não vai me impedir de fechar a porta.
Quebrar seu dedinho de unha postiça vai
ser um bônus. – Não achei que ele fosse
casado – A vadia estava torcendo o
nariz para mim?
– Sou uma amiga. Gregory não fica
com mulheres acima dos 22 – sorri
maliciosamente. – Ele gosta de
garotinhas que mal saíram da puberdade
– chiei. Merda… eu deveria parar de
inventar essas histórias sobre ele para
os vizinhos. A última vez que fiz isso
não deu certo, não foi?
– Ah – achei que ela ia avançar suas
garras artificias na minha garganta. Mas,
em vez disso, ela engoliu a seco e se
afastou. – Volto depois para falar
diretamente com ele, então. Você vai
embora logo, eu suponho? – sua voz
estava cheia de uma mal disfarçada
esperança, e eu sorri.
– Não, não. Acabei de chegar.
Fechei a porta, rindo.
Eu sei que eu não me dou bem com
muitas pessoas. Mas, tenho que
confessar, odiar algumas pessoas é bem
agradável.

Eu estava arrumando as cuecas do


Holt.
A porcaria das cuecas dele.
Quando eu poderia ter imaginado
isso?
Limpar o quarto dele se tornou uma
necessidade naquele dia. Queria agradá-
lo de algum jeito para ver se conseguia
superar nosso pequeno desentendimento
sem ter que, efetivamente, pedir
desculpas.
Poucas horas de trabalho e o lugar
estava limpo. Mas a maior parte das
coisas dele ainda estava dentro de malas
ou jogadas de qualquer jeito no armário.
O engraçado é que tinha uma tábua de
passar roupa no quarto dele. A cada
noite, o meu desorganizado ex-colega de
trabalho deveria estar passando as
roupas que iria usar no dia seguinte. Era
cômico, e parte de mim teve vontade de
deixá-lo continuar seu labor noturno.
Mas a outra parte suspirou e admitiu
que eu estava tentando me redimir.
Foram mais algumas horas entre tirar as
coisas do armário, separar o que devia
estar sujo, o que devia estar limpo e o
que parecia suspeito e seria lavado na
dúvida. Estava descendo com as roupas
sujas para colocar na máquina de lavar
quando ouvi as vozes exaltadas do lado
de fora.
Não estavam na minha porta.
Não estavam nem no meu quintal.
Deviam estar a algumas casas mais
adiante, mas ainda assim eu conseguia
ouvi-las claramente.
Abri a porta abraçada a um punhado
de roupas masculinas e coloquei a
cabeça para fora. Havia uma pequena
concentração de vizinhos no meio da
rua. Eles estavam gritando uns com os
outros. Merda de vida suburbana. Era só
o que me faltava: barraco no meio da
rua. Parabéns pela casa nova, hein,
Holt?
– Sua bruxa preconceituosa! – ouvi a
voz masculina que gritava. Levantei os
olhos e vi um homem tentando segurar
outro, que avançava para cima de uma
senhora. Ela usava uma saia comprida,
um coque apertado e tinha a mão sobre o
peito como se estivesse completamente
ofendida com o que estava ouvindo.
– Isso não é de Deus! – ela gritou. – E
eu não vou ver criança alguma sendo
criada nesse tipo de ambiente.
Dois mais dois: casal gay, vizinha
preconceituosa. Entendi tudo e voltei
aos meus afazeres.
Os gritos continuaram. Claro. A
vizinhança preferia ver a confusão do
que tentar apartar. Eu, particularmente,
nunca me encontrei em nenhum dos dois
grupos: nem dos que assistem à briga,
nem dos que tentam apartá-la. Sempre
me localizei muito confortavelmente em
um terceiro grupo: o das pessoas que
não podiam se importar menos com a
vida alheia. A mulher acha que um casal
gay não é de Deus e que é pecado e
crime. Ótimo, problema dela. O casal
gay está incomodado em ter que
conviver com uma conservadora
retrógrada. Ótimo, problema deles. Se
não estão satisfeitos que se mudem,
chamem a polícia, processem uns aos
outros, se explodam, mas, por favor,
parem de gritar. Estão incomodando a
vizinhança inteira.
Foi só meia hora depois, enquanto
enfiava mais uma remessa de roupas na
máquina, quando ouvi a voz de Holt do
lado de fora, que parei o que fazia e fui
realmente observar a discussão.
O meu gentil captor tinha chegado de
um cansativo dia de trabalho para uma
discussão pública da vizinhança e tinha
resolvido, pasmem, se meter.
Tive vontade de enfiar a cabeça nas
mãos.
Homem imbecil.
E lá estava ele. Argumentando contra
uma senhora que ameaçava chamar a
polícia ou, pior, a congregação. Guiados
por Holt, três ou quatro outros
observadores começaram a interferir e
em alguns minutos a coisa toda tinha
terminado.
Fiquei lá de braços cruzados no
jardim esperando que ele chegasse.
Ele caminhou vagarosamente até o
carro para pegar o resto de seus
pertences.
– Você não consegue mesmo deixar
que as pessoas resolvam os próprios
problemas, não é?
– E você não consegue mesmo sair do
seu caminho para interagir com a
vizinhança, não é? A não ser – virou-se,
já na porta – quando é para transar com
alguém.
Maravilha. Ele não tinha deixado pra
lá.
– Rá, rá, rá – ri com falsidade. – Não
tenho o costume de me meter nos
problemas dos outros a não ser que me
paguem por isso. E que me paguem bem.
Ele subiu as escadas, dois degraus de
cada vez. Parecia querer se afastar de
mim o mais rápido possível. Parte de
mim ressentiu a atitude.
Fui até a cozinha e coloquei em cima
da mesa o que eu encontrei que ainda
fosse comestível.
Precisava fazer feira urgentemente. Eu
não aguentaria nem mais um dia daquele
cardápio chez Holt.
– Dominique, que diabos é aquilo?
Ele estava na porta da cozinha e eu
me virei sobressaltada. Juro que dessa
vez eu não fiz nada.
– O quê?
– Você ficou entediada durante o dia
e resolveu jogar todas as minhas roupas
para cima? Você ficou louca?
– Ei! Calma! Estava arrumando seu
guarda-roupa.
– Como? Sorteando qual roupa ficaria
em qual lugar?
– Mesmo que tivesse sido assim,
seria uma técnica melhor do que a sua
que é… – coloquei o indicador no
queixo fingindo pensar. – Aliás… Qual
é mesmo sua técnica de organização?
– Você vai arrumar aquilo.
– Me trate com respeito. Você não
manda em mim.
– Vamos ter essa conversa de novo?
– Quer botar a porcaria do vídeo na
internet? Pois coloque, Holt! Aliás, você
não pode porque não tem a senha. Então
pare de me ameaçar a cada quatro
segundos. Está perdendo o charme.
– Vamos, Dom – ele sorriu de um
jeito que me preocupou. – Você é
advogada. Sabe como é importante ter
um plano b, ter uma segurança, ter
provas, ter… um backup.
Seus olhos verdes olhavam firmes na
minha direção, e eu os senti queimando.
– Você está querendo sugerir que tem
uma cópia do vídeo em outro lugar?
– É importante estar sempre
preparado.
– Você não fez nenhuma cópia. Não
deu tempo.
– Eu não precisei fazer nenhuma
cópia – ele riu. – Eu menti. Ou melhor…
quase.
Ele estava voltando para o andar de
cima e eu o puxei pela camisa.
– Termine a frase, Gregory.
– Meu celular não manda minhas
fotos, vídeos e arquivos para uma pasta
compartilhada – explicou, levantando o
indicador. – Ele manda para duas pastas
– completou, levantando mais um dedo.
– É mentira.
Ele puxou o celular do bolso e eu
senti minhas entranhas tremendo. Vi seu
dedão apertando um botão e ouvi um
barulho de uma gravação feita por um
microfone ruim. O som de vento e
gemidos era claro.
Holt olhou para o visor e sorriu.
– Pode ser qualquer outra gravação.
Você está blefando e… – ele virou o
celular na minha direção e eu vi o
vibrador massageando minha vagina.
– Me dê isso – eu não ia conseguir ter
aquela discussão de novo.
Ele guardou o celular no bolso e eu vi
algo nos seus olhos. Não era mais o Holt
bobo e gentil. Era o Holt que estava puto
por eu ter transado com um vizinho no
seu sofá.
– Arrume meu quarto – ele sibilou. –
Compre um vinho de agradecimento
para cada um dos meus vizinhos, em
retribuição aos presentes de boas-vindas
que recebi. Use seu dinheiro. Trate as
pessoas com educação. Lave seja lá
qual for o lugar da minha casa em que
você tiver se esfregado nua com um
desconhecido e nunca, nunca mais faça
isso de novo.
O gosto de bile fez minha garganta
arder e eu senti vontade de vomitar.
Ele estava indo embora. Não podia
deixar aquilo terminar assim. Não podia
deixá-lo ter a última palavra.
– Você não manda em mim, Holt – foi
a única coisa que consegui pensar.
– Não se engane, Dominique. Você é
mais inteligente do que isso.
Capítulo 4
“Por pior que seja a noite, amanhã é
outro dia.”

Scarlett – E o vento levou

– Você não está entendendo –


expliquei de maneira firme, me servindo
de mais uma xícara de café. – Você vai
vir até aqui buscar esse sofá hoje. Agora
pela manhã. Na verdade – continuei –,
se eu fosse você, estaria vindo agora.
Holt desceu apertando a gravata ao
redor do pescoço e sentou à mesa na
minha frente.
– Eu já percebi que você não me
entendeu. Então, eu vou ser mais clara:
você não pode pedir um depósito de
cartão de crédito por um serviço que
ainda não prestou, se comprometer a
prestá-lo em um determinado momento e
atrasar o procedimento.
O homem da lavanderia estava
tentando argumentar do outro lado da
linha. Em vão, obviamente. Ia ser do
meu jeito. Ele só estava demorando para
entender isso.
– Querido, querido! – repeti para que
ele se calasse. – Não me importa. Eu já
fiz um depósito inicial para uma
lavagem que deveria ter sido feita
ontem. Se o serviço que eu solicitei não
incluía vocês virem buscar meu sofá e
depois devolvê-lo, vocês deveriam ter
me avisado ontem, quando eu fiz a
solicitação, o agendamento e o
pagamento. E agora você quer que eu
agende de novo e pague para que vocês
venham buscar?
Ele estava dizendo que o
agendamento era para ontem e que eu
não levei o sofá então ele tinha suposto
que…
– Você supôs que eu ia te dar meu
dinheiro para lavar meu sofá e depois ia
desistir de lavar meu sofá e te deixar
com o dinheiro que eu paguei para que
você lavasse meu sofá? O senhor acha
que eu sou idiota? – Ele estava tentando
falar. – Então, não me trate como se eu
fosse idiota. Meu bem, você vai vir
buscar esse sofá agora. Vai lavar esse
sofá hoje. Vai me devolver esse sofá
hoje. Ou eu vou querer meu dinheiro de
volta.
Ele estava dizendo que não tinha
como fazer isso hoje de jeito nenhum.
– Querido, ou você me vê hoje pela
manhã quando vier buscar meu sofá, ou
me vê daqui algumas semanas em uma
sala de audiência depois que eu te
processar por propaganda enganosa.
Que propaganda? A que diz no seu site
que vocês pegam o material e devolvem
em casa.
Ele explicou que seria por um custo
adicional. Holt deu uma mordida na
torrada e me observou com admiração.
– Então, você deveria dizer isso na
propaganda.
“Não deveria”?
– Vamos ver o que um juiz vai dizer.
E alguns jornalistas locais que eu
conheço. Eles adoram esse tipo de
discussão judicial, envolvendo
empresas locais e direitos do
consumidor. Conheço pelo menos uns
dois que escreveriam um gordo artigo a
respeito.
Ele ainda queria argumentar. Ele tinha
colhões, isso era verdade.
– Querido, estarei te esperando em,
no máximo, duas horas. Se você chegar
depois disso, não vai me encontrar em
casa. Eu vou ter saído para visitar a
redação de um jornal local e um fórum.
Desliguei.
– O tubarão Dominique – Gregory
resmungou, servindo-se de café. – Se ele
soubesse com quem está lidando já
estaria aqui.
– Por que você está me elogiando?
– Não foi um elogio. É uma
constatação. Você não é horrível em
tudo – ele explicou.
– Ah, obrigada – reclamei.
– Como eu disse: não foi um elogio.
Quer dizer que foi no meu sofá que você
deixou um estranho te comer?
– Por que você precisa falar desse
jeito?
– Foi isso que aconteceu, não foi?
– Eu fiz amor com o cara, não precisa
ser grosseiro quando descreve.
– Fez amor? – ele riu. – Não se faz
amor com um desconhecido na casa dos
outros, Dominique. Na verdade, acho
que você seria incapaz de fazer amor
em qualquer situação que fosse –
acrescentou, e algo dentro de mim doeu.
– Você não precisa ser grosseiro.
– Não, não preciso. Mas você
merece.
– O sofá será devidamente lavado e
esterilizado, está bem? – perguntei
abrindo os braços, irritada. – Então, por
que você não cala a boca?
– Você é impossível.
– Você fala como se fosse novidade.
– Eu preciso ir – ele se levantou. –
Não posso ficar aqui perdendo tempo
com você, não enquanto tem uma mulher
que pode não receber uma indenização
depois de ter sofrido um acidente de
trabalho que a fez perder os movimentos
da cintura para baixo.
– Ah, deixe de drama. Você fala como
se houvesse alguma chance de ela
realmente não receber a indenização.
– Obrigado por acreditar nas minhas
habilidades como advogado,
Dominique. Mas o caso é sério.
– Não acredito nas suas habilidades
como advogado. Eu li o processo, antes
de ontem. Um adolescente sob efeito de
entorpecentes seria capaz de resolver
aquilo.
– E você acha que não merece a
minha grosseria. É fácil falar quando
não está encarregada do caso.
Eu sorri.
– Você não viu.
Ele se deteve na porta.
– Não vi o quê?
Meu sorriso se alargou.
– Você não viu – repeti batendo
palmas. – Eu sabia que você era
devagar, Holt. Mas é tão óbvio.
– O que é óbvio?
Ah, amado poder. Senti tanto a sua
falta.
– A testemunha-chave estava
mentindo.
– O técnico? O Harris?
Balancei a cabeça afirmativamente.
Eu estava mordendo o lábio de
empolgação. Estava com saudades
daquela sensação: ter o completo
controle da situação.
– Sabemos que ele está mentindo.
Mas não temos como provar. O que foi
que você viu?
Ele deu dois passos na minha direção
e eu tive vontade de fechar os olhos e
me deliciar com o momento.
– Troco o vídeo pela resposta –
expliquei.
Ele estreitou os olhos e pareceu
considerar.
– Vamos lá, Holt. Um mísero vídeo e
você ganha sua primeira causa no
trabalho novo. E eu nem preciso levar o
crédito – provoquei.
Ele sorriu e balançou o indicador
negativamente em minha direção.
– Se você conseguiu descobrir algo
ali, eu também consigo.
As roupas de Holt estavam limpas,
passadas, dobradas e guardadas. Os CDs
estavam dentro das caixinhas certas e eu
tinha passado um pano úmido em cada
uma delas antes de colocá-las em
algumas gavetas na sala.
Minha meta do dia era desaparecer
com todas as caixas. De hoje não
passava: tudo seria aberto e colocado no
seu devido lugar. A única coisa que me
atrasava, fora as designações
incompreensíveis, era o fato de que eu
fazia questão de limpar um local antes
de começar a preenchê-lo. Cada gaveta,
cada prateleira. Tudo deveria estar
devidamente limpo antes de ser ocupado
com os itens do morador.
Os produtos de limpeza estavam
acabando e logo eu não conseguiria
fazer coisa alguma sem, antes, ir fazer
compras.
Abri uma caixa e me deparei com
zilhares de fotos. Álbuns misturados
com fotos soltas e envelopes repletos de
fotos. Seria mais fácil digitalizar aquilo
tudo, ou seriam memórias perdidas.
Tudo bem… Eu ainda tinha um mês.
Poderia perder um dia digitalizando
fotos de Holt.
O escritório ficava no primeiro andar
e era um dos poucos cômodos que
Gregory tinha organizado antes da minha
chegada. Workaholic. Ali estava algo
com o que eu conseguia me identificar.
Seus papéis, documentos e cópias de
processos ainda estavam desarrumados.
Mas, pelo menos, as caixas estavam
todas ali, o lugar estava limpo e o
computador, instalado.
Foi uma manhã interessante. Era
estranho ver a vida de Holt. Eu não tive
uma vida fácil, mas nunca me lamentei
por isso. Achava que “vida fácil” era
coisa de romance de banca de jornal e
de propaganda de margarina. Não
achava que era uma coisa que as
pessoas realmente tinham. Os problemas
eram diferentes. O jeito como as
pessoas lidavam com seus problemas
era diferente. Mas cada um sentia o peso
da própria existência, e ninguém tinha
uma vida fácil.
Mas as fotos da infância de Gregory
Holt estavam colocando minha
convicção à prova.
Seus pais estavam sempre abraçados,
sorrindo e se beijando. Eles pareciam
realmente se curtir, se… amar até. Os
lugares que ele tinha visitado eram
espetaculares. Ele não devia ter mais
que seis anos quando foi à França pela
primeira vez. Digo primeira, porque
havia outras fotos ali que indicavam
pelo menos outras duas viagens a Paris
enquanto ele ainda era criança. O
pequeno Gregory Holt em cima de um
cavalo caro com uma bela paisagem de
fundo. O pequeno Gregory Holt
brincando em uma cama inflável em uma
longa piscina em um dia de verão. O
pequeno Gregory Holt assando
marshmallows em uma fogueira ao lado
do seu pai em frente a mais luxuosa casa
de verão que eu já tinha visto.
O filho da puta tinha tido uma vida
fácil. Se aquele mito existia, o pequeno
Gregory Holt certamente o tinha
experimentado.
Foi difícil não ressenti-lo. Não…
difícil não. Foi impossível. Não
conseguia parar de pensar na minha
própria vida. Em todas as dificuldades
que eu tive que superar para chegar
aonde tinha chegado enquanto ele tinha
tudo às suas mãos. E agora, o miserável
ainda tinha a mim. No seu bolso. Na
palma da sua mão. Para fazer comigo o
que quisesse.
As fotos foram passando e eu vi Greg
Holt crescer diante dos meus olhos. O
garoto mirrado e sorridente se
transformou em um adolescente altivo e
então em um homem elegante.
Algumas fotos mais recentes
mostravam Greg tal qual eu o conhecia,
na mesma luxuosa casa de verão. Em
duas delas, ele estava sem camisa, e as
fotos tiverem que ser observadas com
mais cuidado.
Tudo bem. Ele é gostoso. Eu já
imaginava.
Há alguns caras que você consegue
notar que eles têm um corpo de babar
mesmo observando eles vestidos. É o
jeito como o tecido prende em
determinadas linhas de músculo quando
ele se move. E o modo como uma
camisa, mesmo do tamanho adequado,
consegue se agarrar a algumas
curvaturas do braço. E daí você se pega
fantasiando como o cara deve ser por
baixo daquilo.
Sim, mulheres também fazem isso.
Eu não sou homem, então não sei
exatamente como acontece com eles.
Imagino que eles pensem em peitos,
vagina e bunda. Devem imaginar se a
gente é depilada ou não e mais todo o
tipo de absurdo.
Para mulheres, ou pelo menos para
mim, essa parte da imaginação tem mais
a ver com dedução. É observar essas
dobras da camisa, o volume alto na
virilha e… deduzir.
Mas estou divagando: as fotos de Holt
deixavam pouco para a imaginação.
Dava para estudar anatomia nas linhas
dos músculos dos seus braços. Ele tinha
o peitoral levemente elevado, a barriga
severamente dividida em seis blocos e
um caminho da felicidade que terminava
provocante em um short abaixo da linha
da cintura.
Ele tinha um caminho de pelos claros
que descia abaixo do umbigo, além de
um considerável volume em seu short de
banho; e eu me peguei deduzindo.
A campainha tocou e eu tive que
acordar do exercício para sair da casa e
observar três homens carregarem o sofá
para um caminhão.
Eu estava com tesão.
Merda.
Por que diabos eu fui olhar aquelas
fotos?

Dizer que eu passei o dia inteiro no


limite não faria jus à delicadeza da
minha situação.
Acontece com mulheres com uma
frequência maior do que elas gostariam
de admitir: o tesão é tanto que você se
pega procurando motivos para esfregar
uma perna na outra só para sentir o
contato com aquela ínfima região
deliciosa.
De repente, tudo que eu conseguia
pensar era que eu não tinha trazido meu
vibrador. Nenhum deles. Foi uma
decisão consciente e proposital. Foi um
vibrador que me meteu em toda essa
confusão para começo de conversa,
preferi não trazer nenhum comigo.
Agora, só me restava o arrependimento.
Já passava um pouco do meio-dia e
eu estava sentindo minhas entranhas
ardendo de desejo. Eu precisava de
alguns minutos para mim. Descarregar a
energia.
Foi só depois que enfiei um sapato na
máquina de lavar e esqueci uma tesoura
dentro da geladeira que percebi que era
melhor eu me masturbar logo e retomar a
concentração.
Subi até o quarto e encostei a porta.
Algo dentro de mim, mais ou menos
na região da virilha, queria que eu
fizesse isso na cama de Holt. Mas meu
cérebro ganhou a discussão e chegamos
todos – eu, cérebro e virilha – à
conclusão de que o risco não valeria a
pena.
Fechei as cortinas do quarto e me
despi. Deitei na minha cama apenas de
lingerie e escorreguei os dedos para
dentro da minha calcinha.
Encontrei minha umidez e massageei
com gosto. Em poucos segundos eu
estava arfando e mal notei que uma das
alças do meu sutiã tinha caído pelo
ombro. Estimulei meu clitóris e os
lábios. Apertei meus seios com força e
senti a sensação gostosa crescer e
crescer. Minhas pernas pareciam ter
criado vida própria e estavam se
esfregando uma contra a outra,
involuntariamente. Continuei a me
acariciar. O tesão era tanto que eu
poderia explodir. Precisava gozar. Todo
aquele estresse, humilhação e tensão dos
últimos dias. Até minha última transa
tinha sido mais para ferir Holt do que
para me agradar… Mas naquele
momento, eu precisava. Não era para
mais ninguém. Era para mim.
Holt abriu a porta do meu quarto e eu
demorei quase cinco segundos para
perceber e parar o que eu estava
fazendo.
– Puta merda, Dominique.
Me cobri, constrangida.
– Você não sabe bater?
– Sei, mas como eu podia imaginar
que você ia… – ele não tirava os olhos
de mim. Era desejo que eu estava vendo
nos olhos dele? – Se você for ficar
fazendo isso o tempo inteiro, eu… – ele
usava a mesma camisa de mangas
compridas com que tinha saído de
manhã. Estava sem a gravata, e os
primeiros dois botões estavam
desabotoados. – Eu sou homem… Sabe?
Não dá pra… – ele estava se
aproximando.
Baixei os olhos e vi o inconfundível
volume em suas calças.
– Te deixei excitado, foi? – ri
enquanto me levantava da cama para
pegar minhas roupas. Então senti um
puxão e suas mãos na minha bunda.
– Foi – ele respondeu, e eu senti seu
hálito em meu pescoço. – Era isso que
você queria? Me deixar excitado? Me
convencer a te devolver o vídeo se você
me deixasse te comer?
– Você está sendo grosseiro de novo,
Holt. Me solte – reclamei. Mas seu
abraço ainda era apertado e suas mãos
agora estavam enfiadas entre as minhas
pernas. Eu estava molhada e ele estava
sentindo.
– É assim que a chantagem funciona,
não é?
– Eu sabia que, no fundo, você era
uma pessoa horrível.
Ele enfiou um dedo em mim e eu senti
meu coração chegar até a Lua.
– Eu posso estar enganado –
sussurrou –, mas acho que você está com
mais tesão do que eu – enfiou mais um
dedo e eu não consegui disfarçar um
gemido. – Então, acho que não vou te
foder agora, Dominique. Porque, agora,
você quer. – Seus dedos estavam
entrando e saindo e eu quis fechar os
olhos e me entregar. – E eu me recuso a
fazer algo que você queira.
Ele puxou a mão e eu o segurei pela
camisa.
– Gregory… por favor… – Ah droga.
Droga, droga, droga. – Me desculpe. –
Eu estava tão excitada que minha cabeça
não parava de girar. Eu me arrependeria
daquilo amanhã. Me arrependeria
daquilo pelo resto da vida. Mas ali, com
minha vagina ardendo com um tesão
incontrolável, eu senti que podia
estourar. – Me desculpe pelo sofá e pelo
vizinho. Me desculpe por tudo.
Holt colocou a boca contra minha e
me envolveu em um abraço espremendo
meus seios seminus contra seu peitoral.
Ah, como eu queria arrancar aquela
camisa.
Ele segurou meu maxilar com força.
– Implore – ordenou.
– Por favor.
– Por favor o quê?
– Por favor me come.
Ele me jogou na cama e tirou minha
calcinha e meu sutiã.
– Me diga que você é uma vadia.
Peça desculpas e implore para eu te
chupar.
Eu queria que ele metesse o pau em
mim. Queria muito.
– Pede, Dominique.
– Eu sou uma vadia – ele me olhava
como se eu fosse um objeto. Como se eu
fosse um objeto dele. – Desculpe. – Ele
espremeu meus seios e brincou com
meus mamilos. Eu não conseguia parar
de esfregar uma coxa na outra. – Me
chupa.
Ele se abaixou e eu vi seu rosto entre
minhas pernas. Ele ia fazer isso? De
verdade? Não ia me foder? Ia realmente
me chupar?
– Peça de novo – senti seu hálito
contra meu clitóris e tive certeza de que
assim que ele colocasse a língua em
mim eu iria gozar.
– Vai, Greg, por favor! Vai.
Senti seu beijo molhado contra minha
vagina. Senti sua língua me lambendo.
Senti sua respiração contra minha pele.
Senti seus dentes em meu clitóris. Mais
rápido. Mais gostoso. Sempre em um
lugar diferente. O alívio chegou
arrebatador e eu gritei.
Abri os olhos para o quarto vazio.
Eu tinha três dedos enfiados em mim e
tinha certeza de que tinha encharcado o
lençol.
Respirei rapidamente, recuperando o
fôlego.
Isso era novidade: nunca tinha
conseguido gozar me masturbando
imaginando uma situação de submissão.
Era sempre o poder que me deliciava.
Ou pelo menos era assim que sempre
tinha sido.
O infernal Gregory Holt estava
mexendo comigo de um jeito cada vez
mais perigoso.
E eu não tinha certeza se estava
achando ruim.

A ideia de que eu poderia estar com


um verdadeiro tesão por Holt estava
começando a me assustar.
Sim, eu já tinha me masturbado
pensando nele outras vezes. Mas sempre
em cenários completamente irreais. Era
só um hobby, uma distração. Mas ter
ficado encantada com seu corpo
escultural e ter me masturbado pensando
nele em uma situação perfeitamente
possível era perigoso. Era desagradável
que o fato de ele me ter sob seu controle
estivesse me excitando.
Respirei fundo. Não vamos nos
descontrolar, Dom. Foi só uma vez, e eu
estou sob um estresse bem grande.
Precisei extravasar e extravasei. Pronto.
Passei o resto da tarde organizando as
fotos. Deu um trabalho absurdo, mas
consegui passar todas para o
computador e distribuí-las em pastas de
acordo com a idade aproximada ou
evento. Depois coloquei todas, em
ordem similar à das pastas no
computador, em álbuns. Os álbuns foram
para uma gaveta apropriada e eu segui
para a próxima missão.
Já que estava no escritório, resolvi
continuar por lá e organizar os
processos de Holt.
Como ele nunca perdeu nada
importante, nunca vou saber. Sabia que
ele tinha acabado de se mudar e, como
sabia que eu teria que ajudá-lo, fez
muito pouco para facilitar meu trabalho.
Mas a falta de ordem em suas coisas era
desesperadora.
Tinha avançado muito pouco quando
ouvi o barulho de carro do lado de fora
e imaginei que ele tivesse chegado. O
dia tinha sido tão longo que eu não
conseguia me lembrar se ainda devia
estar com raiva dele ou ele de mim.
Levei o tempo em que descia as
escadas para lembrar que estava com
raiva dele por ele ter mentido sobre a
existência de uma cópia do vídeo, e que
ele estava com raiva de mim pela minha
incapacidade de pedir desculpas.
Um latido me arrancou dos meus
pensamentos.
Holt abriu a porta e um labrador
imenso passou por ela junto com ele. Eu
estava aos pés da escada quando aquela
coisa monstruosa avançou para cima de
mim.
As pessoas gostam de dividir o
mundo entre pessoas que gostam de
gatos e pessoas que gostam de
cachorros. Eu não gosto de nenhum dos
dois.
– O que é isso?
– Dominique, Max. Max, Dominique.
Cuidado com ela, Max. Ela morde – ele
riu.
– O que é isso? – repeti.
– Meu cachorro, Dominique. Não se
lembra? O que você acionou na justiça
por latir demais.
– Eu não acionei o cachorro. Acionei
você. É diferente. E quanto tempo ele
vai ficar aqui?
– Quanto tempo? É o meu cachorro,
Dominique. Ele vai ficar aqui para
sempre.
– Onde ele estava esse tempo todo?
Por que não estava aqui?
– Eu mal tenho tempo de ficar em
casa e o lugar ainda estava uma zona.
Deixei ele em um hotel de animais por
um tempo. A ideia era pegá-lo algumas
noites e aos fins de semana até eu
conseguir me organizar. Mas já que você
está aqui, tenho certeza de que ele vai
ficar mais confortável em casa.
– Mais confortável? Não, não, ele não
vai. Holt, eu não me dou bem com
animais.
– Eu já tinha notado isso em sua
relação com outros Homo sapiens. Mas
quer dizer que você não se dá bem com
criatura viva nenhuma?
– Gosto de plantas. Por que você não
cria uma planta?
– Eu crio um labrador. E
Dominique… – ele se virou com
seriedade. – Sem gracinhas com o meu
cachorro. Eu estou falando sério. Eu
amo o Max. Muito. Se você machucar
meu cachorro ou fizer uma maldade de
qualquer tipo com ele, eu publico aquele
vídeo na internet e mando o link para
todas as pessoas que você conhece, me
ouviu?
Engoli a seco.
– Estou falando muito, muito sério.
Não mexa com o meu cachorro.
Perfeito.
Um cachorro foi adicionado à
equação.
Era só isso que me faltava.

Holt desceu ainda enxugando os


cabelos molhados com a toalha. A
comida chinesa tinha chegado e eu
estava colocando a mesa. Coloquei só o
meu jogo de prato e talher, de propósito.
Se ele quisesse comer, que pegasse suas
coisas.
Estava usando uma camisa branca
justa. Era quase como se ele tivesse
conseguido ler minha mente e soubesse
o que eu tinha feito durante a tarde. Seu
corpo ainda estava úmido e a maldita da
camisa grudava em todos os lugares
certos. Eu devo ter hesitado por alguns
segundos enquanto o observava porque,
quando dei por mim, ele já estava
sentado na mesa. No lugar que eu tinha
arrumado para mim.
– Você não vai comer? – perguntou,
olhando ao redor e, certamente, notando
a ausência de outro prato.
– Vou. E você está sentado no meu
lugar. – expliquei, tentando controlar o
tom de fúria em minha voz.
– Ah – ele disse, começando a se
servir. – É melhor você colocar mais um
lugar, então. Porque eu não vou sair
daqui.
Não o espanque. Não o espanque.
Não o espanque.
Fui até a cozinha e peguei tudo o que
precisava, mais uma vez.
– Max dorme do lado de fora. Já dei
comida para ele, mas amanhã você vai
precisar fazer isso.
Eu ia mandar que ele parasse de me
tratar como se estivesse me pagando
pelo trabalho. Mas eu sabia onde essa
conversa ia dar e achei melhor, pelo
menos dessa vez, ficar quieta.
– E o que ele come?
– Ração. Tem um medidor dentro do
saco, na despensa.
– Vou precisar do seu carro amanhã –
falei antes de começar a comer.
– Ah, é? – ele riu, enfiando mais uma
porção de frango xadrez na boca.
– Preciso comprar algumas coisas
para sua casa. Comida, produtos de
limpeza… Você já pelo menos ouviu
falar dessas coisas? Preciso do seu
carro pra fazer isso.
– Se vire – acrescentou, fazendo uma
careta divertida enquanto tentava falar
sem mostrar a comida semimastigada em
sua boca.
De repente, eu conseguia entender
perfeitamente o que levava uma pessoa a
cometer um homicídio.
– Por favor – rosnei, com os dentes
travados.
– Faço um acordo com você –
continuou, depois de engolir a comida.
– Não, obrigada. Estou cheia dos seus
acordos.
– Você me diz o que viu no processo
e eu te empresto o carro amanhã.
Estreitei os olhos, satisfeita. Ele não
conseguiu encontrar nada. Aquele ínfimo
detalhe era tão óbvio para mim e, ainda
assim, o iludia completamente.
– O seu processo vale bem mais do
que isso.
– Mas é só uma questão de tempo até
eu ver o que você viu. E aí sua vantagem
deixa de existir. Não vou trocar a
resposta pelo vídeo, Dom. Isso é um
fato. Então, é melhor você aproveitar
sua vantagem enquanto ela ainda existe.
– Diz pra mim… Você chegou ao
escritório hoje e disse para a equipe que
tinha algo no processo que provava que
a testemunha estava mentindo. E aí todos
eles começaram a ler e reler tudo. Me
conta, Greg. Quantas pessoas? Quantas
pessoas passaram o dia lendo o
processo inteiro e ainda assim não
conseguiram achar a coisa mais óbvia
do mundo?
Ele estava mordendo o lábio
descontraidamente enquanto pensava se
ia ou não massagear o meu ego.
– Oito.
– Oito? – ri. Ah, que delícia.
– Mas não foi o dia todo – ele
acrescentou, se servindo de mais arroz.
– Hmm – gemi, fingindo acreditar,
enquanto bebia mais um gole de
refrigerante.
– Você é inteligente, Dominique. E é
espetacularmente boa no que faz, nunca
neguei isso.
– Não vou te contar o que é.
– Mas também é uma megera louca
que ninguém suporta.
– Obrigada – sorri.
– Mas eu te prometo uma coisa – ele
levantou o indicador e se aproximou de
mim. – Eu vou descobrir o que é.
Fitei seus olhos mantendo uma
divertida expressão de incredulidade.
– Boa sorte.
– Sabe o que diverte o meu dia?
– Não. O quê?
– Pensar em você.
Eu quase engasguei com a comida.
Tinha certeza de que tinha entendido
errado.
– A poderosa Dominique Thoen. O
Terror das Cortes, aqui… lavando o
meu banheiro.
É, eu tinha entendido errado. Mas
algo que ele falou me irritou além de
suas intenções.
– O que tem de errado com lavar
banheiros?
– Nada, mas sabe… é você. Lavando
banheiros.
– O que tem de errado com lavar
banheiros? – minha voz ficou mais forte
e intensa. É claro que o pequeno
Gregory Holt, crescido no luxo e na
fartura, não sabia o valor de um trabalho
bem feito.
– Ah, vamos… Você quer me dizer
que é louvável lavar…
– Meu pai era zelador do fórum,
Gregory. Ele lavou banheiros a vida
inteira para sustentar a casa. E foi
lavando banheiros que ele me deu uma
infância digna e oportunidades para um
futuro promissor. Então, me diga, seu
prepotente imbecil, o que tem de errado
com lavar banheiros?
Seu rosto assumiu uma tonalidade
azulada e eu fiquei muito satisfeita. Isso
mesmo, Greg, fique sem graça.
– Desculpe, não foi minha intenção
ofender seu pai.
– É, sei… – resmunguei.
– De verdade, não foi. Peço
desculpas.
Olhei atravessado para ele. Sabia que
tinha sido sem querer, mas não mudava
nem um pouco a raiva que eu sentia da
sua vida de privilégios e alienação. E
pensar que há pouco tempo atrás eu não
acreditava que “vida fácil” era uma
coisa que podia existir.
Terminamos de comer e ele se
levantou para começar a tirar a louça.
Foi um gesto educado e involuntário.
Mas parou subitamente, como se tivesse
se lembrado de que deveria estar me
torturando. Largou tudo na mesa e virou
as costas.
– Onde está meu sofá? – perguntou
quando chegou na sala. Eu o ouvi
ligando a tevê.
– Lavando – gritei da cozinha.
– Achei que você tinha jurado
consumir a alma do funcionário se ele
não devolvesse hoje.
– Você disse que eu tinha que tratar as
pessoas com educação. Resolvi dar uma
chance ao incompetente.
Andei até a sala e vi o sofá menor
atravessado. Ele o tinha arrastado para
substituir o outro, que ficava de frente
para a televisão. Sentei ao seu lado.
O engraçado é que eu sempre preferi
ficar sozinha em casa. Mas depois da
solidão dos últimos dias de caixas e
organização, eu estava com saudade de
um pouco de calor humano.
– Alguma chance de você me deixar
escolher o canal? – perguntei.
Ele olhou para mim e sorriu.
– Porque você foi gentil com o
funcionário – ele disse, me entregando o
controle, e eu me senti uma cobaia em
um laboratório. Sabe? Aquelas de
experimentos comportamentais? Em que
se dá um choque quando a cobaia faz
algo errado e se dá um agrado quando
faz algo certo? Peguei o controle e me
senti mais rabugenta do que tinha estado
cinco minutos atrás.
Estava mudando de canal e em um
deles vi a Enterprise cruzando o espaço.
Senti minha espinha gelar. Eu queria
assistir, mas não queria ouvir as
piadinhas de Holt e mudei de canal.
– Você pode assistir ao capitão Kirk,
se quiser.
Olhei para ele confusa.
– Você tem uma miniatura da nave no
seu escritório – ele explicou. – Imaginei
que você fosse fã.
– Era do meu pai – expliquei.
– Ele parece ser um cara legal.
– Ah, por favor, Holt. Pare com o
falso moralismo. Era legal só porque era
um zelador? Pessoas pobres não podem
ser ruins?
– Quis dizer que ele parece ser um
cara legal porque conseguiu conviver
com você a vida inteira sem nunca te
largar em um lixão ou te vender – ele
devolveu. – Foi muito decente da parte
dele te tolerar.
– Rá, rá.
– Ele mora perto de você?
– Ele morreu.
Eu podia sentir a respiração de Holt
hesitando do outro lado do sofá.
– Perdão, eu…
– Ah, deixe de ser uma menininha,
Holt. As pessoas morrem, a vida é
assim. Faz muito tempo, de qualquer
jeito. Já superei.
– E ele gosta… gostava do capitão
Kirk?
– Aquilo era a Nova Geração. Não é
Kirk na Nova Geração, é Picard.
Ele ficou muito quieto e, quando olhei
na sua direção, ele estava segurando
uma gargalhada quase impossível de
conter.
– Você sabe os nomes!
– É claro que eu sei os nomes. Meu
pai assistia a isso!
– Você sabe qual capitão é de qual
temporada!
– Cala a boca – revirei os olhos.
– Você é viciada em Jornada nas
Estrelas!
– O nome é Trekker – brinquei, e ele
não conseguia parar de rir.
Sucesso.
Ele tinha esquecido toda a situação do
sexo com o vizinho no sofá. E eu nem
tinha precisado pedir desculpas.
Sinceramente, Holt… Não sei como
você sobrevive com toda sua gentileza
no mundo de gente grande.
– Pare de rir! – cutuquei ele com o
controle – Vai. Me conta como anda seu
emprego novo.
Gregory me observou com olhos
arregalados.
– Você está efetivamente interessada
na vida de outro ser humano? – ele
tentou colocar a mão sobre minha testa
para ver se eu estava com febre, mas eu
o empurrei para longe.
– Acho que se passar mais um dia
sem ler um despacho ou qualquer outra
decisão judicial eu vou ter um derrame –
sorri e ele me acompanhou.
– Pois é. Achei estranho quando você
resolveu tirar férias.
– Não resolvi. Resolveram por mim.
Eu tinha muito tempo acumulado e os
chefes resolveram que isso poderia ser
um problema em uma eventual causa
trabalhista.
– E quem é louco de querer ir contra
você em um processo? – completou com
uma breve reverência na minha direção.
– E você? Salvando uma pessoa
indefesa de cada vez?
– É agradável. E é interessante
conhecer pessoas com uma
personalidade mais parecida com a
minha. Já fiz várias boas amizades.
– Eu não duvido! Você é a pessoa
mais simpática que eu conheço.
– Obrigado, Dom – ele soou sincero.
Eu estava confusa.
– Não foi um elogio – expliquei,
incrédula.
Ele riu.
– Conheci uma garota legal.
– Garota legal? Quem diz “garota
legal”?
– Perdão – abanou as mãos em
rendição. – Conheci uma mulher
interessante. Melhorou?
Não. Na verdade, não tinha
melhorado. Nem um pouco.
– Se eu tomar coragem, vou chamá-la
para sair amanhã.
– Se tomar coragem? Mas você é
uma criança, mesmo… – reclamei.
– Agradeço o incentivo. Mas é
delicado. Ela é uma colega de trabalho.
– Não é contra a política da empresa?
– Na verdade, não.
Merda.
– Você acabou de chegar, talvez fosse
melhor…
– Mas eu não devia estar conversando
sobre isso com você – disse rindo. – Se
há uma pessoa nesse mundo que deseja
que coisas ruins aconteçam comigo essa
pessoa é você – completou. Sua voz
tinha um tom de brincadeira misturado
com um tom de verdade. – Acho melhor
pedir conselho para o Max.
Eu tinha parado de trocar de canal e
nós ficamos ali, sentados em pontas
opostas do sofá menor assistindo a um
jornal qualquer.
Eu tinha algo embrulhado no
estômago.
Ele estava interessado em uma mulher
e eu não estava gostando disso. Essa
parte tinha ficado bem clara para mim.
Mas por quê?
Capítulo 5
“Não me incomode mais. E não me
chame de docinho.”

Scarlett – E o vento levou

Eu estava lutando arduamente contra a


possibilidade de estar atraída por
Gregory Holt.
Ele era a concentração de tudo que
me irritava e, para piorar, estava me
chantageando com algo particularmente
constrangedor. Eu achava que as
mulheres deveriam se apaixonar pelo
cara que senta em uma mesa próxima a
ela todos os dias na mesma cafeteria, ou
pelo cara que a salva de morrer
atropelada, ou… sei lá. Qualquer coisa
que não envolva uma gravação de sexo
caseiro.
Mas eu estava me desesperando
rápido demais: eu não estava
apaixonada por Holt. “Paixão” é uma
palavra muito forte. Atraída, talvez. Mas
isso era tudo.
Acho que poucas vezes na minha vida
tinha trabalhado com tanto empenho.
Quando Greg saiu de manhã, eu já
estava acordada e ativa há duas horas
inteiras. Ele fez alguma piada sobre eu
estar desesperada para acabar com
aquilo e ir logo embora. E eu estava
tentando tirar a imagem dele nu da minha
cabeça.
Aquilo não era paixão, nem atração.
Era obsessão. É isso: eu já me masturbei
pensando nele em um cenário irreal, a
proximidade dos últimos dias foi
sedutora e minha vagina começou a
pensar que aquilo poderia acontecer de
verdade. Minha vagina merecia uma
surra para deixar de ter ideias ridículas.
O cachorro ficava me encarando o
tempo todo. Eu já te dei comida, não
dei? O que mais você quer? Nunca tive
animais de estimação, então não
conhecia muito bem seu comportamento.
Será que era isso que os animais
faziam? Te encaravam?
Talvez ele quisesse atenção. Carinho
ou brincar… É, sinto muito, meu bem,
mas isso não vai acontecer. Não é que
eu tenha medo de cachorros. Eu não
tenho medo de quase nada nessa vida.
Mas a ideia de abraçar uma coisa que
baba e solta pelos me parece
pouquíssimo higiênica. Mantive uma
distância saudável e o ignorei enquanto
seguia trabalhando.
Resolvi ficar trancada no escritório
de Holt organizando seus processos.
Aquilo era o tipo de coisa que ia manter
minha mente focada. Li algumas petições
que levavam a elegante assinatura de
Gregory procurando erros de qualquer
tipo: jurídicos, de ortografia, de bom
senso. Mas, por mais que aquilo me
irritasse, ele era um bom profissional.
Tinha trabalhado em uma série de
processos sigilosos e eu me diverti com
a ideia semiproibida de observá-los.
Além do mais, a atividade permitia que
eu me distraísse com meu passatempo
preferido. Inventei essa brincadeira na
época em que estagiava. Ficava horas a
mais que os outros, todos os dias.
Trabalhava como uma escrava, mas era
o que eu queria: aprender tudo que eu
pudesse e provar que eu conseguia.
Assim que me formei, os advogados
encarregados me disseram que, se eu
quisesse, teriam uma vaga para mim no
escritório. Eu recusei educadamente:
àquela altura, já tinha recebido umas
três propostas infinitamente melhores.
Mas o fato é que eu passava muito
tempo trancada. Minha vida se resumia
àquelas folhas de papel. Pedidos e
decisões. Um dia, eu simplesmente
comecei a pensar nas pessoas por trás
dos nomes estampados na minha frente:
qual era sua história de vida, que tipo de
roupas elas vestiam, quais eram suas
comidas favoritas, onde elas moravam,
quais eram seus sonhos… Eu me
divertia por horas com aquilo.
Transformei cada autor e cada réu em
meus amigos íntimos nos meus longos
dias fechada em uma sala sem janelas.
E agora, eu podia repetir a
brincadeira. Talvez aquele Richard da
petição de guarda fosse um espião que
queria manter seus filhos a todo custo,
talvez Amiant tivesse matado um de seus
filhos, naquela ação penal, e forjado o
suicídio, talvez Crispadin estivesse
casada com três homens ao mesmo
tempo e por isso não tinha explicação
para a quantidade de imóveis que
possuía.
O toque do telefone chamou a minha
atenção. Quem poderia estar ligando?
Holt estava no trabalho e deveria ter
dado o número do seu celular para quem
quer que fosse e eu… quem iria ligar
para mim?
Tirei o telefone do gancho.
– Dom?
– Holt?
– Olha, eu sei que você não daria a
mínima se eu morresse ou algo assim.
Mas eu vou chegar bem tarde hoje, e não
quero que você se preocupe.
– Você tem razão. Eu não iria me
preocupar – respondi secamente.
– Ótimo – riu. – Vou sair com uma
colega essa noite. Vamos beber alguma
coisa e pode ser que eu…
-– Eu não perguntei, Holt.
– Certo. Até mais então.
Desliguei sem me despedir.
Ele ia sair com a piranha.
Aquilo que eu estava sentindo… era
ciúme?

Se alguém perguntasse, eu poderia


dizer que não saí procurando por sexo
casual depois daquela ligação de Holt,
mas seria mentira.
Eu queria foder pesado. De
preferência com o vizinho que tinha
irritado tanto o Holt.
Ah, que se dane.
Que se dane essa coisa de remorso.
De ser educada com os outros. De
cuidar de cachorro e de organizar essa
vidinha suburbana. Eu sou uma vadia
infernal de primeira categoria. Era
assim que eu sempre tinha vivido e é
assim o único modo que eu sei viver.
Eu trabalho o dia inteiro, todos os
dias. Sou espetacularmente sensacional
no que eu faço. Quando volto para casa,
gosto de ficar sozinha. E quando estou
me sentindo solitária, eu saio com um
vestido colado e com um decote
generoso e alivio minha solidão no
corpo de um estranho.
Se Holt ia transar hoje, eu também ia.
De jeito nenhum eu ia recebê-lo vestida
em roupas vagabundas, limpando sua
bagunça, quando ele chegasse à noite
com um sorriso satisfeito de orelha a
orelha.
Transar na casa dele era falta de
educação. Certo. Essa parte eu entendi.
Mas fora da casa dele eu era dona do
meu corpo e ele que se fodesse.
Andei até a porta da casa que Eric
tinha indicado como sendo a dele. Não
parei para refletir, respirar ou
considerar minhas opções. Eu só queria
ficar suada com alguém e parar de
pensar. Parar de pensar em Holt suado
com uma mulher.
Ah. Inferno. Eu estava mesmo atraída
por ele, não estava?
Acho que bati umas cinco vezes na
porta.
– Dominique?
Ele estava com uma cara assustada.
Saiu de casa e fechou a porta atrás de si.
– Cheguei em um mau momento?
– Não exatamente. Posso ajudá-la?
– Na verdade, parte de mim até achou
que você não estaria em casa.
– Trabalho com ações. Faço boa parte
do trabalho em casa mas, no momento,
estou de saída.
Ele seguiu andando em direção ao
carro e indicou com a mão que eu o
acompanhasse.
A garagem dele estava fechada e ele
abriu uma pequena porta na lateral que
dava acesso ao interior. Assim que ele
fechou a porta e eu vi que estávamos
sozinhos na garagem…
– Você tem alguns minutos antes do
trabalho?
Ele olhou de um lado para o outro
com um sorriso no rosto. Tinha
entendido o que eu tinha dito, mas estava
decidindo se acreditava ou não.
– Você está sugerindo…
– Uma rapidinha antes de você ir
trabalhar. Exatamente, Eric – respondi.
Eu não tinha tempo, ou melhor, não tinha
vontade de dar espaço para sutilezas.
Queria transar e, de preferência, que
fosse rápido.
Ele andou na minha direção de um
jeito que deveria ter sido sedutor, mas
não foi.
– Mas você é mesmo uma dama
perigosa.
Colocou as mãos na minha cintura.
Levantei meus braços até seus ombros.
– Ah, meu bem. Você não faz a menor
ideia.
Ele enfiou a mão na minha bunda e
empurrou meu short de lycra para baixo
junto com a calcinha. Estava desatando
o próprio cinto quando eu tive uma ideia
e segurei suas mãos.
– Calma – pedi rapidamente.
– Achei que estávamos com pressa.
– E estamos, mas… Você gosta de
brincar?
Ele sorriu confuso.
– Brincar?
– É – expliquei com a língua nos
lábios. – Interpretar papéis…
– Ahmm – ele riu gostoso. – E o que
eu devo ser hoje?
– Seu vizinho está com raiva de mim
– brinquei com sua gravata. – E eu acho
isso… – balancei a cabeça procurando a
palavra certa – sedutor.
– Seu marido não te come quando está
com raiva, hein? – ele me abraçou mais
forte pela minha cintura e me prendeu
contra a lateral do carro.
– Você se incomoda? – perguntei, mas
pelo seu olhar tinha certeza de que ele
não se incomodava.
– O que foi que você fez? – Ele
estava sorrindo e tinha a boca contra a
minha. Passeava meus dedos pelo seu
corpo e notei algo que não tinha
percebido quando tínhamos transado
antes: ele tinha um corpo gostoso. Era
firme e rígido. Não era charmoso nem
tinha traços especialmente
maravilhosos, mas por baixo daquela
roupa comportada seu corpo deveria ser
de babar. Como o de Holt. Merda, não
conseguia parar de pensar naquele
homem…
– Acho que tenho sido uma garota
muito má – eu disse, mas não de um jeito
provocante. Pelo menos não
intencionalmente. Mas as palavras
saíram safadas. Acho que “Tenho sido
uma garota má” é o tipo de frase que não
se pode dizer com naturalidade.
Eric me beijou e eu senti o gosto de
hortelã e antisséptico na sua boca.
Pensei em qual seria o gosto de Holt.
– Eu minto – sussurrei, e ele me
beijou de novo. – Não o ajudo com seu
trabalho, mesmo quando posso. – Outro
beijo – E eu odeio aquele cachorro. –
Ele riu contra a minha boca e me virou
de costas para ele.
– Eu odeio chegar em casa para uma
mulher que não cuida de mim, sabia,
vagabunda? – ele cantava as palavras no
meu ouvido, mas Greg não me chamaria
de vagabunda.
– Vadia – ri. – Ele não me chama de
vagabunda.
Seus dedos desceram entre minhas
pernas ainda fechadas e eu as abri,
obediente.
– Isso – murmurou beliscando meu
clitóris. – Abre essa porra dessas
pernas. Se você não serve para mais
nada, pelo menos para isso vai servir.
Ele me puxou para o capô do carro,
enquanto abria o pacote de camisinha, e
me forçou a ficar quase de quatro, com
os cotovelos apoiados contra a
mercedes vermelha. Fechei os olhos e
imaginei que fosse Holt. Era ele com sua
camisa branca colada em todos os
lugares certos. Ele ia enfiar a mão na
calça de moletom escura e abaixar a
parte da frente. Ia colocar seu pau duro
para fora e ia dar um passo pra trás.
Tinha certeza de que ele ia encarar
minha bunda com gosto antes de meter
alguma coisa em mim. Ia me olhar
daquele jeito, pensando na “poderosa
Dominique Thoen completamente
indefesa”.
Mantive os olhos fechados, conseguia
sentir seu toque me estimulando, me
deixando cada vez mais molhada, suas
mãos nos meus seios, sua boca no meu
ouvido.
– Vou te dar uma lição para você
aprender quem é que manda.
O impacto empurrou meu corpo todo
contra o carro e eu fiquei com as mãos
espalmadas procurando apoio, mantendo
a testa contra o metal frio e sentindo
meus seios espremidos contra o capô.
Ele meteu sem piedade. A cada nova
estocada meu corpo inteiro esfregava
contra o metal. A sensação era
deliciosa.
– Me diga quem é que manda, vadia.
Diz pra mim – ele disse, me segurando
pela bunda. Se me desse um tapinha,
tinha certeza de que o espancaria. Não
gosto disso.
– Eu – sorri. – Quem manda sou eu.
– Ah, é? Vamos ver se é. – Ele meteu
com ainda mais força e ainda mais
rápido. Puxei uma de suas mãos da
minha bunda para o meu ventre e ele
entendeu o que eu queria.
Seu pau entrava cada vez mais voraz
e ele puxava meu clitóris com força.
Gozei com minha respiração
embaçando o metal vermelho.
– Senta! Senta! Senta! – Porcaria de
cachorro.
Eu estava tentando recolocar os
móveis no lugar depois que o sofá
chegou da lavanderia. Mas com o
cachorro enviado por satanás pulando
para todos os lados e tentando me
lamber a cada três segundos, andar pela
sala estava ficando impossível.
– Você tem sorte de seu dono ter
aquele vídeo, ou já tinha feito
churrasquinho de você.
Ele finalmente se sentou e me encarou
com aqueles imensos olhos castanhos.
– Acha que eu não faria, é? Pois eles
fazem isso o tempo todo na China. Não
duvide, Cérbero.
Eu estava com fome, mas não
aguentava mais ficar naquela casa.
Precisava sair dali. Tomar um ar.
Respirar fundo.
O mapa no meu celular dizia que
havia uma lanchonete não muito longe
dali. Seria um sanduíche de almoço, mas
pelo menos não seria na sala de estar de
Holt.
Coloquei um punhado de ração para a
besta demoníaca antes de sair.
A vizinhança era… Estranhamente
agradável: gramados verdes e bem
cuidados, pessoas se cumprimentando,
um casal correndo com roupas de
ginástica.
Coloquei a mão na testa. Estou
começando a achar essa vida
agradável… Preciso sair daqui, e logo.
O casal passou por mim e eu pensei
em que tipo de espírito deveria possuir
uma pessoa para sair para correr em
pleno meio-dia. Acho que inteligência
não era um ponto forte naquele bairro.
– Dominique! – disse uma voz
irritante, e eu me lembrei dela
imediatamente. – Tudo bem? – Era a
vizinha do outro dia. A da carona.
Continuava sem lembrar o nome dela. –
Como está a mudança?
Horrível. Infernal. Amaldiçoada.
Saída de um pesadelo de Lovecraft.
“Seja educada com os vizinhos.”
– Bem, obrigada.
– Estou indo ao supermercado, hoje à
tarde. Se você ainda estiver sem carro e
quiser…
– Ah, seria ótimo!
Ela sorriu como se tivéssemos
acabado de virar melhores amigas.
– Saio daqui a uma hora.
– Estou indo almoçar, agora. Pode ser
que eu me atrase um pouco.
– Sem problemas! – respondeu
esganiçada e solícita. – Nós esperamos.
– Nós?
– Um ou outro vizinho sempre vem
comigo – sorriu. – Somos uma
comunidade bem unida – completou,
balançou para os lados, e ensaiou um
murro brincalhão contra o meu braço. Eu
geralmente emano uma áurea que diz
“Não me toque”, e que é intransponível
para a maior parte das pessoas com
algum nível de bom senso. Aquela
vizinha, no entanto, parecia não temer a
morte. Ousadia ou estupidez, eu não
soube definir.
Mentira. Soube sim: estupidez.
Definitivamente, estupidez.

A vizinha estava com o carro


estacionado em frente à minha porta
quando voltei do almoço.
Havia gente demais dentro do carro.
– Olá – cumprimentei.
– Shelbi – Esse é o nome dela. Não
podia mais esquecer. –, você não devia
se misturar com esse tipo de gente –
ouvi uma voz falar em alto e bom tom.
Era a garota-propaganda do
Greenpeace. Ótimo.
Abri a porta do carro e lá estava ela:
sentada no banco do passageiro com
uma camisa do System of a Down.
Adorei a camisa, detestei a menina.
– Crianças da sua idade não podem
andar no banco da frente – cuspi as
palavras em tom de brincadeira.
– Se você acha que eu vou passar
para trás para você ir na frente, ficou
louca.
– Andy! – pediu Shelbi. – Dominique
é nova na vizinhança, por favor, vá atrás
com o Rick.
Ela saiu do carro soltando fumaça e
foi para o banco de trás.
– Dominique, este é Rick.
Um braço fino surgiu entre os bancos
e eu apertei sua mão. Ele era muito
branco e tinha cabelos muito escuros.
Tinha um sorriso gentil e olhos claros
que ficavam por trás de óculos de lentes
grossas.
– Prazer – falou de qualquer jeito.
– O prazer é meu – apertei a mão que
ele oferecia.
– Próxima parada: supermercado! –
anunciou Shelbi com alegria antes de
fazer um barulho ridículo do que deveria
ser de um trem.
– Shelbi, você precisa parar de fazer
isso – constatou a garota irritante. – É
ridículo.
Nossa… concordamos em uma coisa.
– Não ligue pra ela, Shelbi. Poucas
pessoas apreciam uma brincadeira. – É,
eu odiava a onomatopeia e a atitude
excessivamente otimista da motorista.
Mas odiava a menina-reciclagem ainda
mais.
– Eu pedi sua opinião?
– Andy! Não precisa ser grossa –
Shelbi continuou. – Você precisa
desculpar a Andy, Dominique. Ela não
tem modos! – exclamou olhando pelo
retrovisor.
– Ah, eu estou acostumada. E pode me
chamar de Dom.
Ela olhou para mim e sorriu.
– Não a chame de Dom, Shelbi! – Ah,
garota, cala a boca. – Vocês não são
amigas.
– Com licença? – perguntei. – Qual o
seu problema?
– Não suporto gente que… não
recicla.
Ah, morre, perua.
A viagem seguiu com a voz irritante
de Andy proferindo ofensas veladas
contra mim e com o circo de
onomatopeias de Shelbi que eu,
infelizmente, tinha começado a defender.
Rick se manteve em silêncio e, apesar
das incontáveis tentativas de Andy de
trazê-lo para o seu lado da discussão e
colocá-lo contra mim, se absteve de
qualquer comentário para qualquer um
dos lados.
Considerando todos os elementos, até
agora ele era a pessoa do carro de quem
eu mais gostava.
Finalmente chegamos ao
supermercado e eu já estava pronta para
me jogar pela janela. Qualquer coisa
que me afastasse daquela gente.
– Vê se faz as compras rápido –
reclamou a Miss Puberdade. – Já
tivemos que esperar você por mais de
uma hora para vir para cá.
– Eu avisei a Shelbi que iria me
atrasar, não foi, querida?
– Foi sim, Andy.
– Querida? – Andy disse, mais uma
vez entre os bancos da frente, com o
indicador ossudo invadindo meu espaço
pessoal. – Não a chame de “querida”.
Ai, como eu queria mandar ela pro
inferno.
Se não matar e esquartejar o
funcionário da lavanderia tinha me
rendido o direito de escolher o canal na
noite passada, eu tinha certeza de que
não esbofetear a magricela ia me render
múltiplos benefícios.
Um deles deveria ser sexo oral. Mas
acho que Holt não ia concordar, mesmo
se eu pedisse. E, é claro, eu não faria
isso.

A verdade é que a casa de Holt


precisava de tudo. Eu ia gastar uma
fortuna…
Mas eu precisava fazer aquilo.
Rick estava um pouco atrapalhado
com suas compras e, como ele era o
único ser humano decente da vizinhança,
resolvi ajudá-lo. Ele não parava de
agradecer e aquilo começou a me
incomodar. Calma, Dom, o moleque só
está tentando ser educado.
Paramos no corredor de produtos
higiênicos. Duas garotas passaram por
Rick e ele derrubou metade dos oito
sabonetes que tentava equilibrar.
Virgem.
Coitado.
Abaixei para ajudá-lo a apanhar suas
coisas e notei que ele estava
estrategicamente parado na frente das
fraldas geriátricas.
– Sabe? Se você quiser ir puxar
conversa com uma delas, é melhor
escolher outro lugar para estacionar seu
carrinho – brinquei, indicando as
fraldas.
Ele sorriu constrangido, ajeitou os
óculos no rosto e começou a analisar as
fraldas.
Não entendi o que ele estava fazendo,
mas poucos segundos depois ele pareceu
se decidir por uma marca e colocou dois
pacotes no carrinho.
Hmm…
– Você sofre de incontinência? –
perguntei, séria.
– Não. Estou fazendo compras para
um amigo também – ele explicou, antes
de voltar a empurrar seu carrinho.
Um amigo… sei…
Achei melhor não perguntar mais
nada. Não o conhecia bem o suficiente,
era um assunto delicado e, por fim, eu
simplesmente não me importava.
Se eu fosse ele, daria em cima das
meninas no supermercado e compraria
minhas fraldas pela internet. Mas cada
um é cada um.
Alguns enlatados depois, chegamos a
um corredor com artigos de papelaria e
algumas araras com roupas genéricas. O
encarregado da organização daquele
supermercado deveria ser demitido.
Andy estava escolhendo alguns sutiãs
de péssima qualidade.
– Você compra sua roupa íntima em
supermercados? – não resisti e
perguntei.
– Onde eu compro minha roupa íntima
é da minha conta. Não se meta.
– Você é um amor, sabia?
– Pelo menos eu sou decente e não
poluo o planeta.
– Ah! Eu tenho certeza de que as
fábricas de Taiwan que produziram esse
material de qualidade que você está
comprando para tapar os seus
minúsculos seios compartilham da sua
consciência social.
– Vai pro inferno.
Puta merda. Ela tinha me mandado ir
pro inferno? E eu estava me policiando
esse tempo todo… Devia ter mandado
ela ir pro inferno primeiro.
Respirei fundo e empurrei meu
carrinho para o corredor de bebidas
alcoólicas. De todos os itens que eu
tinha ido comprar, as bebidas eram o
que eu mais estava precisando
ultimamente.
– Que coincidência, parece que a
vizinhança inteira está aqui – ouvi uma
voz masculina dizer em algum lugar
atrás de mim.
Virei-me para um jovem alto e forte.
Ele tinha os cabelos castanhos
arrepiados, um par de olhos azuis bem
escuros e um sorriso que dizia “Eu sou
gostoso”.
– Você é a vizinha nova, não é? Que
se mudou essa semana?
– Dominique Thoen – ofereci a mão
para que ele apertasse. Não me
lembrava dele.
– Calvin Harris – ele disse. Apertou
minha mão e não soltou. – Moro há umas
três casas da sua. Já te vi arrumando as
coisas quando passo na frente da sua
casa. É que eu corro todos os dias –
falou as últimas palavras com um ar de
arrogância que eu conhecia muito bem.
– Estou arrumando as coisas dentro
de casa, sr. Harris. Como pode ter me
visto? – sorri.
– Você tem uma janela bem grande na
sala. E já te vi do lado de fora algumas
vezes – explicou atrapalhado e soltou
minha mão subitamente.
Hm… sei…
– Não sou tarado, nem nada assim –
completou. – Prometo – acrescentou, e o
sorriso sedutor voltou ao seu rosto.
– Não pensei que fosse.
– Você tem uma camisa do Scorpions.
Você estava usando ela outro dia, com
um shortinho preto. Eu vi quando passei
correndo – ele estava ficando um pouco
vermelho e eu me deliciei com sua
vergonha. – Você gosta de rock?
Quando um homem elogia suas
roupas, ele geralmente está elogiando
suas curvas. Não é sempre, mas é quase.
– Bastante.
– Seu marido é um cara de sorte. Uma
mulher bonita que gosta de rock.
– Não é meu marido. É a casa de um
amigo. Estou passando uns dias.
– Ah – seu sorriso se alargou. – Então
talvez eu passe lá um dia. A gente escuta
umas músicas, toma esse vinho… –
brincou, apontando para a garrafa que eu
tinha nas mãos.
– Você tem idade suficiente para
beber? – perguntei.
– Tenho. Claro – ele respondeu, e
algo no seu tom de voz me afirmou que,
com certeza, ele não tinha.
– Acho que vou precisar ver um
documento antes de abrir um vinho com
você, Calvin – ele riu. Nunca, nunca,
nunca aconteceria. Ele era,
definitivamente, novo demais. Mas toda
mulher gosta de ver um cara interessado
nela, e eu não sou exceção. – Obrigada
pelo elogio, Calvin, mas não, obrigada.
– Bem, eu tenho que ir agora.
Continuar as compras – indiquei o
carrinho com a mão. Ele se afastou,
saindo do meu caminho e levantando a
mão mais uma vez. Eu a apertei, mas ele
a puxou até os lábios e beijou meus
dedos.
Eu sorri e me afastei.
É claro que dei de cara com Andy. E
é claro que ela estava me encarando
como se eu fosse o anticristo.
Peguei mais duas garrafas.
Voltei e peguei uma terceira. Só por
segurança.

Andy estava com uma cesta


aguardando na fila do caixa comum.
– Por que você não vai para o caixa
rápido? Tem menos de trinta itens na sua
cesta, com certeza – disse, observando o
conteúdo da cesta que ela segurava na
frente do corpo e tapava como se sua
vida dependesse disso.
– Estou bem aqui. Obrigada.
O seu tom de voz e o jeito como
tentava evitar que alguém olhasse para o
que ela ia comprar fez que eu tivesse
certeza de que tinha comprado a lingerie
colorida que estava olhando mais cedo.
– Pode passar na minha frente –
ofereceu Calvin, que era o último da
fila, logo atrás de Andy.
– Tem certeza? Você também tem
pouquíssimos itens aí. E eu… – indiquei
a imensa quantidade de coisas no
carrinho com o queixo.
– Sem problemas – sorriu.
Eu passei na frente com um
“obrigada” discreto e, para compensar,
fiquei inclinada sobre o carrinho,
empinando a bunda na sua direção. Não
era como se eu estivesse de minissaia ou
algo assim, mas tinha plena consciência
de que meu short era curto o suficiente.
Não, eu não sou vadia só por empinar
a bunda para um cara. Olhar não tira
pedaço. Muitas mulheres fazem isso.
Muitas mulheres se empinam, poucas
admitem.
– Sério. Você já ouviu falar em lojas
de lingerie, certo? – provoquei.
– Cala a boca – sussurrou.
– Tem lugares especializados em
roupas íntimas de qualidade. Você não
precisa comprar essa coisa estranha só
pela facilidade.
Ela ficou muito quieta, respirando
fundo. Vamos lá, magricela. Devolva
com uma resposta sagaz. É melhor se
defender, porque eu descobri um ponto
fraco e estou só aquecendo.
– E não é nem questão de preço. Tem
lugares bem baratos. Posso te levar em
um lugar um dia, a gente compra umas
calcinhas decentes pra você.
Calvin, a essa altura, já tinha
entendido a brincadeira e estava rindo
atrás de mim.
– Estou bem, obrigada.
Por que ela estava tão calma?
– Deixa eu dar uma olhada nisso –
puxei um dos sutiãs que ela tentava
esconder na cesta.
– Devolve isso – ela disse. Seu rosto
estava vermelho. Mas não era raiva, era
vergonha.
– Awn! Tem arco-íris! – sacudi o
item no ar, observando os múltiplos e
minúsculos arco-íris desenhados por
todo o pano.
Ela soltou a cesta no chão perto do
caixa e foi embora em silêncio.
Estranho.
Por que ela não…
Então, eu entendi.
Calvin morava na vizinhança. Ele era
um rapaz jovem, da sua faixa etária,
bonito e charmoso. Ela estava atraída
por ele. Talvez o sutiã fosse algo que
ela quisesse mostrar para ele no seu
próprio corpo. E não sacudido na fila de
um supermercado por uma estranha.
Bem feito.
Não se brinca com Dominique Thoen.
Não se manda Dominique Thoen para
o inferno.
Peguei as coisas da sua cesta e paguei
junto com as minhas. Entregaria para ela
quando chegasse em casa. Não porque
me importava. Sinceramente? Por mim
ela morria virgem vestida com sua roupa
íntima barata. Mas se não fosse gentil
com ela, e Holt descobrisse, eu podia
estar em apuros e…
Um das coisas nas compras de Andy
chamou a minha atenção. Era uma
revista em quadrinhos vagabunda que,
adivinhei pela capa, deveria mostrar um
grupo de aventureiros espaciais.
Senti um nó em algum lugar da minha
garganta.
“Você é melhor do que ela, Dommie.
É melhor do que ela porque não precisa
de nada disso.”
Eu podia ouvir a voz do meu pai.
Conseguia sentir sua mão segurando a
minha quando andávamos pela loja de
departamentos e observávamos todas as
coisas que minha mãe queria e não
podia ter. Todas as coisas pelas quais
ela tinha nos abandonado.
Em algum momento da minha vida, eu
fui como Andy. Uma garota que não
sabia o que queria. Ou melhor, que sabia
o que queria, mas que não sabia do que
precisava para conseguir o que queria.
Respirei fundo, paguei minhas
compras, me despedi de Calvin e fui
encontrar o resto do grupo.
Andy estava encostada no carro
enquanto Rick e Shelbi colocavam suas
compras no porta-malas. De repente, me
ocorreu que a boa vontade de Shelbi não
ia ser capaz de contrariar as leis da
física e que, todas as nossas coisas
juntas, não caberiam lá.
– Paguei suas coisas – disse para
Andy, de qualquer jeito. Não quis que
ela notasse que eu me importava porque
eu não queria me importar. Era um
caminho sem volta.
– Vagabunda.
– Andy! – Shelbi reclamou.
– É isso que ela é. Vagabunda.
– Olha, eu não sabia do seu
namoradinho. Da próxima vez, me avise.
– Que namoradinho? – Shelbi quis
saber.
– O garoto do…
– Não é meu namoradinho. Você é
uma vagabunda porque é uma
vagabunda. Pare de falar sobre a minha
vida! Pare agora!
– Certo. Parei. – respondi, irritada.
Toda a compaixão que eu tinha sentido
ao ver a revista tinha acabado de
desaparecer. – Shelbi, acho que nossas
coisas não vão caber todas aí.
– Por que você não volta andando,
então?
– Andrea, chega! – dessa vez foi Rick
quem se irritou. – Pare de ser mal-
educada.
– Tudo bem, Dom. Eu vou colocar
essas coisas aqui na frente.
Ela tirou um engradado bem grande
de cervejas e várias embalagens de
coisas para se comer enquanto se bebe
cerveja.
– Festa? – perguntei, sorrindo.
– Han? Ah! – olhou para as
embalagens e compreendeu – Uns
amigos do Eric vem esse fim de semana
para assistir ao jogo. Se eu não tenho
nada para servir ele fica irritado – ela
começou a sorrir de um jeito estranho.
Mas algo me incomodou um pouco mais.
– Eric?
– É – sorriu. – O meu marido. Você
não o conhece ainda, ele…
Ela estava falando. Estava dizendo
palavras e provavelmente frases
inteiras. Mas eu não estava ouvindo.
Minha capacidade de compreensão
parou na palavra “marido” e meus
ouvidos desaprenderam a ouvir.
Quais as chances de ter mais de um
Eric na vizinhança?
– O que… Com o que ele trabalha? –
perguntei. Minha garganta estava
completamente seca.
– Ah. Com ações – sorriu. – Ele é
daqueles homens superinteligentes que
trabalham com oscilações de mercado
e…
Eu queria que meu coração parasse de
bater. Qualquer coisa para parar de
ouvir aquelas batidas altas dentro do
meu corpo.
Eu sou uma vadia infernal que não
liga para os outros. Passo por cima do
que for preciso para ganhar uma causa.
Não tenho educação ou tato para falar
com os outros. Tenho uma coleção de
defeitos horríveis e indesculpáveis. Mas
nunca na minha vida… Nunca… Tinha
ficado com um homem casado.
Sequer tinha ficado com um homem
comprometido.
Minha respiração estava curta e
ofegante. Passei a mão pelos cabelos,
vagamente consciente de que Andy me
observava com olhos de falcão.
Puta merda.
Casado.
Eu estava tão preocupada com Holt.
Em agredir Holt. Em me vingar de Holt.
Em magoar Holt. Em causar ciúmes em
Holt. Em não ficar para trás com Holt.
Tão preocupada que sequer parei
para pensar.
“Você é uma das minhas,
Dominique.”
Ele tinha dito isso quando nos
conhecemos. Quando estávamos nos
agarrando no sofá. Ele acha que eu sou
casada.
“Você é uma das minhas,
Dominique.”
Ele achou que eu era casada, assim
como ele.
“Você é uma das minhas,
Dominique.”
Ele achou que eu traía meu cônjuge
assim como ele fazia.
Minha cabeça estava girando e eu
achei que ia vomitar.
– Dom, você não vai colocar suas
coisas no carro?
– Não, eu…
Puta merda.
Casado. CASADO.
Eu tinha transado com um homem
casado.
Duas vezes.
Tinha transado com um homem
casado na sala da casa de seu novo
vizinho.
Tinha transado com ele na garagem da
sua própria casa.
– Não precisa… Eu…
Lembrei do seu jeito assustado. De
como fechou a porta naquela manhã.
Shelbi estava em casa? Ele transou com
a vizinha na sua garagem com a mulher
em casa?
Eu estava tão focada em fingir que
estava com Holt. Será que ele estava
usando aliança?
Ele devia estar usando aliança. Eu
não vi.
Eu ia passar mal.
– Acho melhor pegar um táxi. Shelbi,
obrigada pela carona. Mas acho que tem
coisas demais e…
Meu olhar encontrou o carro.
Não tinha notado antes.
Senti meus olhos querendo lacrimejar.
A mercedes vermelha.
Eu ia chorar. Passar mal. Desmaiar.
E depois repetir tudo de novo.
Eu tinha transado com um homem
casado em cima do carro da sua esposa.
Capítulo 6
“– Você nunca pensou em casar só por
diversão?
– Casamento, diversão? Diversão para
os homens, você quer dizer.”

Rhett e Scarlett – E o vento levou

Fiz a viagem de táxi para casa no


piloto automático.
Casado…
Acho que dei uma gorjeta exagerada
ao taxista.
Espero ter guardado todas as coisas
frias na geladeira ou, no dia seguinte,
metade das compras estaria estragada. O
resto ficou no chão da cozinha nas
sacolas.
Casado…
Abri a porta do quintal e joguei
comida para o cachorro sem me
incomodar com o medidor.
Devo ter esquecido de fechar a porta,
porque ele me seguiu para dentro da
sala.
O filho da puta é casado…
Respirei fundo.
Pensei em começar a guardar o resto
das compras nos armários. Limpar mais
alguma coisa antes de Holt chegar.
Enfiei a mão em uma das sacolas e
tirei o sutiã vagabundo de Andy. Holt ia
chegar tarde, ele tinha me avisado que
tinha um encontro hoje.
Um encontro com uma mulher
interessante. Uma que devia tratar as
pessoas com educação e que não devia
transar com homens casados.
Olhei para o sutiã de arco-íris e me
senti imunda.
Andy era uma garota boba e jovem
que se preocupava com reciclagem e
que estava atraída pelo vizinho.
Rick era um jovem que tinha
incontinência e tentava esconder isso.
Ele tinha seus próprios problemas, mas
ainda me defendeu quando Andy foi
agressiva demais.
E Shelbi… Shelbi era um poço
infinito de simpatia e altruísmo e eu
tinha…
E eu…
Eu tinha…
Na minha memória, eu conseguia
ouvir a voz grave e tranquila do meu
pai, fazendo o impossível para esconder
a dor que sentia.
“Vamos ser só você e eu agora,
Dommie.”
Eu tinha virado a vagabunda da minha
mãe.
A mulher que traía e destruía famílias.
A mulher que não se importava com o
compromisso de fidelidade firmado
entre duas pessoas, e que se metia entre
elas para sua própria conveniência.
Levou outro homem para a cama do
meu pai.
Levou um homem casado para a cama
do meu pai.
Seduziu. Conquistou. Destruiu. E
depois juntou os cacos, pegou o que lhe
agradava e jogou o resto fora. Fez o
homem rico se divorciar da mulher e
abandonar os filhos pequenos para se
casar com ela. Deixou eu e meu pai para
trás como se não fôssemos mais do que
um incômodo constante em sua vida.
Larguei o sutiã no chão e subi para o
banheiro. Comecei a tirar as roupas no
meio do corredor e deixei tudo caído
perto da cama antes de me jogar debaixo
do chuveiro.
“Casamento são só umas palavras e
umas alianças, Dominique”, ela tinha
torcido o nariz para mim. “Fiquei com
um homem que eu quis quando não
queria mais seu pai. Só isso.”
Tive vontade de espancá-la. Cortar
sua cabeça fora e assistir o sangue
peçonhento escorrer de suas veias
podres.
Ela era a pessoa mais horrível que eu
já tive o desprazer de conhecer.
E eu tinha me transformado nela.
Exagerei no sabonete líquido e passei
os próximos vinte minutos a esfregar
metodicamente cada centímetro do meu
corpo.
Lembrava dos meus seios espremidos
contra o capô do carro. Eu tinha pensado
em Holt e tinha adorado. Esfreguei a
esponja contra os meus peitos com tanta
força que doeu, mas eu não me
incomodei. Continuei a exorcizar minha
pele com tanto empenho que tive certeza
de ter esfolado meu corpo em pelo
menos dois lugares.
Não estava adiantando.
Eu não estava me sentindo nem um
pouco mais limpa.
Podia escutar a risada maldita de
satisfação que minha mãe daria se algum
dia escutasse essa história.
E não conseguia parar de pensar em
Eric.
Eric em baixo de mim.
Eric por trás de mim.
Seu hálito no meu pescoço.
Na minha boca.
Um homem casado.
No sofá de Holt.
No carro de Shelbi.
Um homem casado.
Meu nariz começou a entupir e,
mesmo debaixo do forte jato de água
quente, eu conseguia sentir as lágrimas
salgadas descendo pelas minhas
bochechas.
Aquilo não ia adiantar.
Desliguei o jato. Escutei um latido
baixo e notei que tinha deixado as portas
todas abertas.
Abri a porta do box, me enrolei na
toalha e andei até o quarto para procurar
roupas limpas. E de repente, eu tinha
usado todas as forças que me restavam.
Apoiei a mão contra a quina da cama
e deixei meu corpo escorregar para o
chão.
As lágrimas desistiram da discrição e
começaram a cair torrencialmente.
Meu corpo estava fraco, minha
cabeça latejava e eu não conseguia parar
de fungar. Tapei o rosto com as mãos e
chorei.
Eu odiava chorar, fazia minha cabeça
doer e meu raciocínio falhar. Mas ali,
molhada e precariamente enrolada com
uma tolha no chão da casa de um cara
que estava me chantageando, depois de
ter feito uma das piores descobertas da
minha vida, eu cedi e me permiti chorar.
Não tinha ninguém ali para me ver.
Ninguém para me ouvir.
Ninguém para me consolar.
Nunca tive ninguém para me consolar.
A poderosa Dominique Thoen que
nunca precisou de ninguém.
É fácil aprender a não precisar de
ninguém quando você nunca teve
alguém.
Eu estava abraçada aos meus joelhos,
soluçando contra minhas mãos. No que
foi que eu me tornei?
A ideia do que meu pai diria se me
visse naquela situação, se visse o que eu
tinha feito, no que eu tinha me tornado…
Só a mera ideia fez com que eu chorasse
duas vezes mais intensamente.
Por quê? Por que eu precisei transar
com aquele cara? Por que sentia essa
necessidade de me vingar? De estar
sempre certa, sempre por cima, sempre
no controle? Do que tinha me servido?
Uma vida inteira não me importando
e… Parabéns, Dom: ninguém se importa
com você também. E enquanto Holt faz
amizades e Shelbi tem o apoio da
vizinhança inteira, você fica chorando
sozinha no banheiro porque o único cara
que te quer é o safado casado, que só
quer te comer e voltar para a mulher.
Senti um sopro quente contra o meu
rosto e levantei assustada. Por um
milésimo de segundo achei que fosse
Holt. Mas não era.
Era o cachorro. Ele estava me
encarando com aqueles imensos olhos
castanhos e fez um gemido estranho
como se estivesse com pena de mim
Eu o empurrei com o braço.
Não preciso de sua pena, criatura
demoníaca. Preciso da sua distância.
Ele pareceu não se importar com meu
empurrão e logo estava de volta ao meu
lado, coisa irritante.
– Sai – reclamei. Mas ele se
aproximou ainda mais, com o seu
gemido sofrido, e passou a língua
babona pelo meu rosto inteiro.
– Ai! Que nojo! Sua coisa maldita…
Ele me lambeu de novo e latiu.
– Sai – reclamei, mas senti minha voz
sair mais leve.
Max começou a pular ao meu redor.
Ele latia, tentava pular em cima de mim
e continuava a me lamber sempre que
tinha uma chance. Eu finalmente desisti
de tentar afastá-lo e percebi que estava
sorrindo. Ele ia e vinha tentando puxar
minha toalha com os dentes em uma
atitude brincalhona.
– Para, seu tarado! – brinquei,
sacudindo suas orelhas e ele se deitou
ao meu lado, estirado de barriga para
cima como se quisesse carinho. –
Aprendeu com o seu dono, foi? – ele
rosnou alegremente enquanto eu lhe fazia
cócegas.
– Minha vida é uma merda, Max –
confessei.
Ele se virou de volta e veio apoiar a
cabeça no meu joelho.
– Eu não queria ser uma pessoa ruim.
Nunca foi minha intenção. Mas acho
que… Acho que aconteceu, sabe?
O par de olhos castanhos se levantou
na minha direção como se ele realmente
compreendesse. Ele era um animal
irracional, era óbvio que não
compreendia. Mas falar em voz alta
estava ajudando.
– Eu fiquei tão preocupada em criar
uma casca que fosse grossa o suficiente
para me proteger da parte ruim do
mundo que acabei me distanciando da
parte boa também. – As lágrimas tinham
começado a secar salgadas no meu
rosto, e eu quase conseguia respirar pelo
nariz de novo.
– E agora… Eu consigo me defender
muito, muito bem. Mas precisei
desenvolver uma boa dose de
agressividade para aprender a fazer isso
e, quando não há nada me ameaçando, eu
uso essa agressividade acumulada
contra pessoas que não tem nada a ver.
Não sei como controlar. – Dei dois
tapinhas no seu pelo macio. – Tenho
medo de ser mais gentil e acabar
desaprendendo a me defender. E aí, o
que acontece? Eu sou gentil com todo
mundo, todo mundo para de me detestar.
Mas eu ainda vou estar sozinha. O que
acontece quando eu precisar? Quem vai
me defender, a não ser eu mesma?
Ele latiu e eu senti que era quase
como se ele quisesse falar.
– Eu queria ser uma pessoa boa, mas
tenho medo do que possa acontecer –
respirei fundo. – Mas não conte para o
seu dono! – ralhei, olhando feio para
ele.
A campainha tocou e eu puxei a toalha
para mais perto de mim.
O olho mágico mostrou que era Andy.
Merda. Tomara que eu não esteja com
os olhos vermelhos.
Abri uma faixa bem estreita da porta.
– Ainda não terminei de arrumar tudo.
Levo suas coisas para você quando
acabar – cuspi, mal-humorada.
– Não, não vim por causa disso.
– O que você quer?
– Posso entrar? – ela olhou ao redor.
– Não, não pode. Estou ocupada. O
que você quer? – Max estava latindo e
tentando me empurrar para ver quem
estava na porta. Ou talvez ele estivesse
me empurrando para Andy, em uma
tentativa de me forçar a ser mais
sociável. Calma, rapaz. Mesmo que eu
estivesse disposta a tentar fazer isso,
nunca seria assim tão rápido.
– Tudo bem – ela expirou insatisfeita,
dando mais uma rápida olhada ao redor
– Vim te pedir desculpas. – falou de uma
vez, como se tivesse medo de demorar e
se arrepender.
Ela queria entrar para pedir desculpas
de uma forma mais privada? Pois que
pedisse em público.
– E por qual ofensa específica você
está se desculpando? – provoquei.
– Você não sabia. – Tinha algo no seu
olhar que gelou meu coração.
– Como é? – minha voz não tinha
qualquer resquício de convicção.
– Você não sabia que ele era casado.
Eu queria dizer mais alguma coisa,
mas só consegui engolir a seco e
esperar.
– Sua janela é bem grande – disse,
levantando o indicador para a janela
grande na lateral da sala. A janela que
dava em parte para a rua e em parte para
a casa dela. – Eu vi quando você e
Eric… – ela arregalou olhos de um
modo sugestivo e deixou que seu tom
terminasse a frase por ela. – Mas você
não sabia. Achei que sabia. Desculpe.
Respirei fundo. Reassuma o controle,
Dom.
– Tudo bem. Está desculpada – dei
um passo para trás e fechei a porta, mas
sua mão impediu que ela se fechasse.
– Qual é o seu problema?
– Meu problema?
– É! – reclamou. – Eu vim até aqui
pedir desculpas e você age como se eu
viesse te devolver dinheiro que te devia.
– Ah, garota! O que é que você quer?
– Quero que você pareça pelo menos
incomodada de ter transado com um
homem casado no sofá do seu marido –
ela explicou com um misto de exaltação
e sussurro. – Vagabunda! – acrescentou,
ríspida.
– Pare de me chamar assim –
respondi, levantando o indicador,
ameaçadora, em direção ao rosto dela. –
E Holt não é meu marido. É só um…
amigo. Vim ajudá-lo com a mudança.
Ela parou por dois segundos, como se
estivesse considerando as informações
que tinha acabado de receber.
– Não sei se transar com um estranho
no sofá do seu amigo é muito melhor.
– Ah, que inferno! É o ano
internacional de explicar para
Dominique de quantos modos diferentes
ela pode ser mal-educada? Olha garota,
eu transei com o cara, certo? Eu não
sabia que ele era casado. ACREDITE: não
vai acontecer de novo. Você veio se
desculpar, desculpas aceitas. O que
mais você quer?
– Você vai falar com a Shelbi?
– Claro que não! Você perdeu o
juízo?
– O cara não presta! Ela merece
saber.
Algo em seu tom me deixou intrigada.
– Ele já fez isso outras vezes? Trair a
Shelbi?
Ela não precisou responder.
– Então, por que você já não foi falar
com ela antes?
– Porque eu nunca soube o que dizer!
E o cara realmente não presta. Quero
dizer, ele já deu até em cima de mim. E
eu não sou exatamente… Bem… – ela
me indicou com a mão. Ela queria dizer
que não era bonita, mas não estava
achando as palavras. – Eu não sou bem
o tipo de mulher que os caras dão em
cima – resolveu.
– E se você nunca contou para ela,
por que diabos acha que eu vou contar?
– Achei que podíamos contar juntas.
– Ah, ótima ideia! – bati palmas,
irônica. – E depois vamos fazer uma
festa do pijama na sua casa, assistir
Grease e fazer nossas unhas.
– Grease?
– Foco, garota! Eu não vou falar nada
e nem você.
– Você pode não falar se quiser, mas
não pode me impedir.
Alguém começou a gritar no meio da
rua e eu me lembrei que odiava aquele
lugar. Holt ia descobrir e eu ia ter que
esbofetear a garota moralista.
– Se você falar, eu nego. E aí?
– Ela vai acreditar em mim!
– Então, por que você já não foi até
lá?
Os gritos aumentaram e eu quis
cometer um homicídio. Max ficava
latindo atrás de mim e eu não entendia o
que os infernais vizinhos poderiam estar
discutindo a três casas de distância.
Quero dizer: eu estava discutindo
traições e confissões com minha arqui-
inimiga e nós estávamos conseguindo
manter nossas vozes baixas. Educação,
por favor, vizinhos. Resolvam seus
problemas em voz baixa.
– Tá, tá. – ela balançou as mãos. – Eu
não vou até lá. Não tenho coragem. Mas
você é toda segura, imaginei que você
poderia…
Entre Max latindo e os vizinhos
gritando, eu não conseguia ouvir o que
Andy estava dizendo. Merda, eu não
conseguia ouvir os meus pensamentos.
Uma voz feminina berrava que estaria
morta antes de ver uma criança ser
criada por um casal de pecadores bem
na sua frente.
– Toda segura? Garota, eu te garanto
que tenho milhares de problemas para
resolver. Problemas meus, que não
envolvem vizinhos e seus problemas
conjugais.
As vozes continuavam a chegar altas e
claras: um homem a chamava de
hipócrita preconceituosa e a mulher
estava clamando por uma intervenção de
Deus.
– Mas você pode ajudar…
– Eu ia era trazer problemas para
mim. Nunca faria isso
conscientemente…
– Então, você precisa parar de pensar
e simplesmente tentar ajudá-la.
– Você é muito nova para entender,
mas adultos não se metem em problemas
de outros adultos sem serem
convidados.
– Eu sou adulta, obrigada.
– Você é uma pirralha
inconsequente…
– Não sou!
– E eu tenho um sutiã de arco-íris
para provar.
– Você é a pior pessoa que eu
conheço.
A mulher, a distância, estava usando
toda variante vulgar da palavra
“homossexual” para descrever o casal
de vizinhos, e a raiva que estava
subindo pelo meu corpo pelas últimas
duas horas simplesmente explodiu.
– Pior pessoa que você conhece? Pois
o mundo ainda vai te assustar um bocado
– afirmei, passando por ela com raiva e
me dirigindo até o centro da discussão a
algumas casas de distância.
– Ei! – gritei, batendo palmas. – Seja
lá qual for o problema aqui, será que dá
para vocês resolverem como seres
humanos civilizados? Estão
incomodando a vizinhança inteira com o
seu barulho.
De um lado, um homem alto, com o
cabelo bem penteado com gel e que
usava um paletó cinza sobre uma camisa
de linho, segurava um homem vestido
com roupas esportivas confortáveis.
Provavelmente para evitar que ele
avançasse para cima da mulher de calça
comprida e terninho comportado, com
um precioso colar de pérolas, do outro
lado da rua.
– Se a palavra de Deus te incomoda,
você deve ficar bem com esses daí –
disse a mulher, indicando o casal gay.
– As palavras que estavam me
incomodando eram os gritos da senhora
– expliquei rude.
– Essa vizinhança fica cada vez pior –
exclamou ofendida, com as mãos na
cintura. – Como se esses daí querendo
ensinar sodomia para uma criança
inocente já não fossem ruins o
suficiente, agora temos uma prostituta
também.
Eu fiquei na dúvida se a prostituta
seria eu. Mas, pelo bem da integridade
física da velha das pérolas, achei
melhor nem perguntar.
– Vagabunda! – o grito me pegou de
surpresa e, considerando as últimas
horas, achei que o xingamento estava
sendo dirigido a mim. Mas, olhando ao
redor, vi o homem de roupas esportivas
cuspindo a palavra na direção da velha.
Aleluia! Mais alguém além de mim está
sendo chamada de vagabunda.
Ela fez o sinal da cruz e, entre o
“vagabunda” e o “prostituta”, percebi
que o clima era de gritaria e falta de
respeito. Se era assim, era melhor eu
entrar na onda.
– Minha senhora, eu não te conheço,
está bem? E garanto que a senhora
também não me conhece. Então…
– Ah, eu conheço o seu tipo, muito
bem. É o tipo que está infestando essa
vizinhança.
Infestando? Agora, eu sou uma
doença. Oito anos em salas de audiência
defendendo causas milionárias, e eu
nunca tinha recebido metade das ofensas
que tinha ouvido nos últimos dias na
casa de Holt. Isso é o que ele chama de
“lugar tranquilo para morar”?
– Se nós queremos adotar uma
criança, é problema nosso, sua bruxa! –
gritou o homem.
– É! Sua bruxa! – repeti. Eu queria
começar a ofendê-la, e logo. Mas não
sabia quais ofensas eram apropriadas,
então resolvi seguir a liderança de
alguém. Pela expressão corporal
agressiva do cara de roupas esportivas,
imaginei que, dos presentes, ele era
quem tinha o perfil mais similar ao meu.
– É da minha conta o que eu tenho que
tolerar na minha vizinhança.
Ouvi um latido familiar e notei que
Max estava ao meu lado. Puta merda, eu
precisava começar a fechar as portas.
Baixei a mão para a coleira e o
mantive próximo. A última coisa que eu
precisava era que o cachorro de Holt
fugisse ou fosse atropelado.
– Se está incomodada que se mude! –
exclamei.
– Eu cheguei aqui primeiro!
– Na Terra? Pela sua idade, minha
senhora, nenhum de nós está discutindo
isso.
O casal gay foi o primeiro a rir e
alguns espectadores próximos o
acompanharam. Alguns moleques que
estavam jogando bola na rua pararam e
começaram a prestar atenção na
discussão.
– Eu não perguntei sua opinião, sua
vadiazinha.
– Mas eu vim aqui dar ela mesmo
assim. Estava conseguindo ouvir a sua lá
da minha casa. Então, imaginei que fosse
justo vir aqui gritar com a senhora
também.
– Não fui eu quem começou a gritar –
indicou o casal com um dedo.
– A hora deles vai chegar, também –
afirmei. – Ou vocês se calam todos ou
eu chamo a polícia.
– Pois chame!
Ela pareceu animada demais e o
casal, animado de menos.
Droga, uma ligação para a polícia ia
direto para o relatório de adoção da
assistente-social e eles nunca
conseguiriam uma criança.
– Por que a senhora quer tanto
prejudicá-los? – perguntei indignada.
– Eu não estou vendo casal em lugar
nenhum.
– Ignorem. Por favor, ignorem ela – o
homem de paletó disse, querendo que
aquilo acabasse. Eu conseguia ver o
nervosismo em seus olhos. Ele não
estava acostumado a comprar uma briga.
Felizmente, eu estava.
– E eu não preciso ver esse tipo de
coisa – a mulher acrescentou.
– E quem foi que disse que a senhora
precisa ver? Eles estão dando a bunda
no sofá da sua casa?
O clima foi de comoção, risadas ou
ultraje. Eu não soube dizer e,
sinceramente, não liguei. Estava no meu
limite e se alguém não gostasse do que
eu tinha dito que me processasse. Sem
problema algum.
Ela colocou a mão no peito e fez o
sinal da cruz.
– É por isso que o Inferno existe. Para
gente como você.
– Minha senhora, se o Paraíso é para
pessoas como você, eu prefiro o Inferno
pela companhia. Obrigada.
– Você precisa voltar para o puteiro
de onde saiu!
– E a senhora precisa voltar para o
século XIV. Sabe? Quando a senhora
seria queimada na fogueira por usar
essas calças?
Ela se virou com fogo nos olhos,
puxando pelo braço um jovem que
chamou minha atenção enquanto voltava
para dentro de casa. Era Calvin. Ele
tinha um sorriso brincalhão no rosto, e
me ofereceu um adeus rápido quando
sua mãe não estava olhando.
– Olha, obrigado. Você não
precisava…
Eu levantei a mão para que ele se
calasse.
– Não estou te defendendo! – deixei
claro. – Só quero que o barulho pare –
levantei o indicador.
Ele sorriu e concordou com um gesto.
Puxei Max pela coleira para trazê-lo
de volta para casa.
Andy estava me olhando com as mãos
na cintura e um sorriso nos lábios. Acho
que ela estava satisfeita por eu ter
tomado as dores de alguém. Pobre
Andy: eu não estava tomando as dores
de ninguém. Só queria que a gritaria
parasse.
Mas os pensamentos sobre Andy
rapidamente fugiram de minha mente.
Poucos metros atrás dela, Gregory
estava parado no meio da rua. Ainda
segurando sua pasta de processos. Ele
tinha a boca aberta e o olhar fixo em
mim. Sua expressão era um misto de
impressionado e admirado que fez com
que eu tivesse muito orgulho de mim
mesma.
Andei até a frente da casa e anunciei
alto o suficiente para que Andy ouvisse
também.
– Não estou defendendo ninguém! –
exclamei. – Só não aguento mais essa
gente mal-educada reclamando.
– Caramba… Acho que no fundo você
é uma boa pessoa, Dom – Andy afirmou
antes de sair. Ela pareceu quase
chateada, como se quisesse que eu fosse,
na verdade, realmente uma pessoa ruim
que ela pudesse odiar.
Holt tinha um sorriso no rosto que ia
de uma orelha a outra.
– O encontro foi bom? – perguntei,
diante do seu olhar de satisfação.
– Não – ele pareceu ter sido
arrancado da sua linha de pensamento. –
Desmarquei. Podemos entrar?
– Desmarcou? – perguntei, segurando
a coleira de Max firme. Ele se
aproximou de mim, abaixou-se para
alisar o cachorro e quando se levantou
de volta estava tão próximo que eu
conseguia sentir seu perfume.
– Não achei legal te deixar aqui
sozinha. Vamos? – indicou a porta de
casa.
– Eu não ligo. Pode sair com quem
você quiser. – Dentro de mim, meu
estômago estava fazendo uma espécie de
dancinha da vitória. Cara… eu
realmente estava atraída por Holt.
Merda. – Eu me mantenho ocupada.
– Percebi – riu. – Vamos continuar a
conversar lá dentro e…
– Senhora Holt? – um dos moleques
que estava jogando bola se aproximou.
Greg deu um passo protetor na minha
direção e segurou minha cintura.
Não entendi.
– É senhorita Thoen, moleque. Não
sou casada com esse daqui – expliquei.
– Senhorita Thoen – ele estava
sorrindo –, a nossa bola caiu no telhado
da sua casa, podemos…
– … ficar sem jogar bola até amanhã
para aprender a ter cuidado perto da
casa dos outros? – rosnei. – Pode.
Holt ficou em silêncio, o que eu achei
bastante peculiar. Não era do feitio dele
me deixar ser grossa sem nenhuma
intervenção.
– Podemos entrar agora? – ele se
virou para mim quando o moleque se
afastou.
– Que fixação é essa com entrar em
casa? Você não manda em mim, Holt. Se
eu quiser ficar na rua, eu fico na… – Um
pensamento me arrebatou da minha
argumentação.
Merda.
Merda, merda, merda.
Eu ainda estava de toalha, não estava?

– Ouvi a gritaria e acho que saí sem


pensar.
Não fique vermelha, Dom. Não fique
vermelha. Por favor, não fique
vermelha.
– É. Parece que você tem feito muitas
coisas sem pensar ultimamente – riu,
colocando as coisas em cima da mesa.
– Isso foi algum tipo de indireta,
Holt? – Passei as mãos pelo corpo me
certificando de que a toalha ainda estava
devidamente presa.
– Não, Dominique. Na verdade foi
uma direta em relação ao vídeo que eu
tenho graças a sua masturbação ao ar
livre.
Eu odiava o jeito como ele falava
sobre aquilo tão casualmente. Mas, ao
mesmo tempo, algo nas minhas entranhas
sempre se aquecia quando eu o
imaginava me imaginando nua.
– Não foi intencional – expliquei
comedida. – Eu ter saído de toalha na
rua, quero dizer. Não estava tentando te
humilhar ou causar nenhum
constrangimento com os vizinhos ou…
– Eu sei. Tudo bem – ele se
aproximou mais uma vez. – Mas sabe?
Se você continuar fazendo isso – ele
colocou as mãos na minha cintura –,
logo, logo mais alguém também vai ter
um vídeo seu e aí o meu vai perder o
valor. Vamos evitar que isso aconteça,
sim? – ele riu e eu não consegui não
sorrir.
– Você está tentando ser fofo ao me
chantagear? – Tentei disfarçar meu
sorriso em descrença.
– Não estou tentando.
Ele ainda estava muito perto. Havia
algo em sua voz e em seu olhar que eu
não conseguia definir muito bem. Não
era como se ele quisesse me seduzir. Na
verdade era como se…
Bem, se fosse qualquer outro homem,
eu leria aquela expressão corporal como
se ele não quisesse se afastar. Como se
quisesse ficar ali, me observando, com
as mãos na minha cintura, pelo máximo
de tempo que pudesse até que tudo
começasse a ficar estranho.
Mas era Holt. E eu nunca consegui ler
Holt muito bem.
Sacudi as ideias loucas para longe.
– E Max ainda está vivo! – ele
exclamou me soltando. Acho que o
momento começou a ficar estranho –
Ponto para você.
– Você vai apagar meu vídeo agora?
– perguntei, puxando o cachorro
demoníaco e coçando suas orelhas.
Parte de mim queria voltar a falar de
sexo com Holt. Era uma parte bem
grande de mim, e ela ganhou sem
qualquer contestação.
– Ainda não. Mas está fazendo um
bom trabalho – ele disse olhando para
mim, e seu sorriso se transformou em
uma expressão estranha e assustada.
Um puxão na minha toalha e eu
compreendi. Max estava brincando com
as pontas soltas mais uma vez e eu,
ainda precariamente embrulhada, tive
que começar a brincar de cabo de guerra
contra o labrador.
Greg correu em minha direção e
colocou os braços ao redor da toalha.
Eu ainda estava vencendo, o que
significava que eu ainda estava vestida.
Mas um puxão mais forte da parte de
Max e Holt estaria abraçando meu corpo
nu.
Aparentemente, ter duas pessoas
puxando a outra ponta da toalha
convenceu Max de que aquela era uma
brincadeira muito divertida da qual
todos queriam participar. E não importa
o quanto Holt o mandasse parar, a besta
continuava empenhada em puxar o
tecido.
Eu segurei a parte da toalha ao meu
alcance com todas as minhas forças. E
entre isso e sentir Holt ao meu redor,
minha cabeça não conseguia fazer mais
nada. Seus braços e seu peitoral estavam
em todos os lugares.
– Droga, Max! Pare!
Ele estava de frente para mim, com os
braços ao redor do meu corpo, puxando
a barra da toalha da boca de Max. Seus
dedos tocavam minha coxa nua e uma
parte de mim queria que Max arrancasse
aquela toalha de uma vez para eu
descobrir o que aconteceria. Mas essa
parte foi bem menor dessa vez,
perdendo louvavelmente.
Gregory puxou a mandíbula de Max e
o forçou a largar a toalha. O cachorro,
finalmente, pareceu entender que a
brincadeira tinha acabado e foi procurar
um lugar para se deitar. Holt ainda tinha
os braços ao meu redor. Ele estava
olhando para minha boca como se
estivesse lutando contra um pensamento.
Aquela era uma emoção com a qual eu
conseguia me identificar. Afinal, estava
fazendo a mesma coisa.
Coloquei minhas mãos contra seus
ombros e senti seu abraço ficar mais
firme. Ah, por que ele tinha que ter um
cheiro tão bom? Senti um inconfundível
volume contra o meu quadril. Não tinha
por que me ofender. Mas também não
podia considerar aquilo nenhum tipo de
elogio. Ele estava excitado: óbvio.
Abraçado com uma mulher nua e ainda
úmida do banho. Se ele não tivesse
ficado excitado é que seria estranho.
Ele se afastou educadamente, tentando
disfarçar. Fingi que não tinha percebido
nada.
– Acho melhor eu ir tomar um banho –
disse. – E você devia…
– É. Eu vou…

Quase toda mulher no meu lugar faria


o que eu fiz: coloquei o vestido mais
sensual que tinha. Nada exageradamente
elegante ou vulgar, é claro. Mas
daqueles soltos, decotados e curtos que
valorizam os seios e mostram a
quantidade certa de coxa.
Olhei pela janela e vi que os
moleques ainda estavam na rua,
brincando de alguma outra coisa.
Eu podia pegar a bola deles e fazer a
última gentileza do dia. Seria algo para
conversar com Holt no jantar. Algo para
ele me elogiar.
Eu estava mesmo me transformando
em um rato de laboratório, querendo
repetir comportamentos que geravam
benefícios. Mas que se dane.
– Onde ela está? – perguntei para os
meninos na rua.
– Chutamos a bola ali – o meninos
indicou o ponto aproximado, ainda
receoso. Acho que eu o tinha assustado.
Bom, eu gostava de assustar as pessoas.
– Certo. Vou pegar para vocês. –
Apoiei a escada contra a lateral da casa
em um ponto onde o telhado era mais
baixo.
Nada a não ser telhas.
– Vocês têm certeza de que foi aqui?
– gritei para a rua.
– Temos. Foi um chute forte, talvez…
Mas eu a encontrei. Estava só um
pouco mais adiante, na curva onde o
telhado de Holt se dobrava sobre si
mesmo.
Andei entre as telhas com uma
cuidadosa destreza e lancei a bola de
volta para a rua. Acenei para os gritos
de obrigado e estava me preparando
para fazer o caminho de volta quando
um movimento em uma das janelas do
primeiro andar chamou a minha atenção.
O banheiro de Holt tinha uma janela
comprida seguindo a linha do teto, e eu
conseguia vê-lo lá dentro. Ele estava de
pé contra a parede do banheiro de frente
para mim. Tinha o rosto no teto e os
olhos fechados. Com uma das mãos ele
estava se apoiando no mármore da pia e
com a outra…
Mesmo a distância e através do vidro
da janela, ainda dava para ver aquele
corpo delicioso.
Minha nossa. Cada músculo do seu
braço era perfeito. Seu tórax e seu
abdômen eram ainda mais definidos que
os da foto que eu tinha visto.
Eu senti uma vontade louca de lamber
cada centímetro dele. Sentir o gosto de
sua boca, de sua pele.
Ele estava inclinado sobre o próprio
corpo de um jeito típico, e o movimento
rítmico da sua mão direita e do seu
quadril deixou bem claro o que ele
estava fazendo.
Em qualquer outro dia, eu
simplesmente assistiria àquele homem
maravilhoso massageando o próprio pau
e me deliciaria com a visão e com a
ideia proibida de observá-lo.
Mas hoje, depois do nosso pequeno
encontro cabo de guerra com a toalha, eu
não tive como não imaginar que era em
mim que ele estava pensando. Talvez
fosse completa ilusão e loucura. Talvez
ele estivesse pensando em seja lá qual
fosse a piranha que ele ia se encontrar
hoje. Podia ser.
Mas podia não ser.
Podia ser em mim que ele estava
pensando.
Não podia?
Me abaixei contra o telhado e me
aproximei da beirada, exatamente onde a
casa fazia a curva, para melhorar o meu
ângulo de visão.
Ele tinha o lábio inferior entre os
dentes, e eu podia imaginar o gemido
excitante de prazer que ele deveria estar
emitindo naquele exato segundo. Ah,
como eu queria que aquele gemido
estivesse sendo contra o meu ouvido. Eu
não me incomodaria de passar os dedos
por cada linha de músculo naquela
barriga perfeita e estimular sua ereção
por ele.
Não conseguia ver a linha abaixo da
sua cintura muito bem, mas, pelo pouco
que eu via e pelo movimento longo do
seu braço, eu conseguia deduzir o
tamanho. Por Deus, Holt. Será que você
podia, por favor, ter algum defeito?
Seu braço se movia cada vez mais
rápido e uma dor me avisou que eu
estava mordendo meu lábio com força
demais. Seu estômago estava contraído e
eu conseguia ver os primeiros indícios
de recuo no seu corpo. Queria vê-lo
gozar. Me aproximei um pouco mais da
borda. Eu queria ouvi-lo gozar. Mas
aquilo era pedir demais. Ia ter que me
contentar só com a vista.
Ele seguiu com seu movimento
maravilhoso.
No que você está pensando, Greg?
Está pensando nas suas mãos no meu
corpo?
Na toalha quase caindo?
No abraço apertado? Nas mãos na
cintura? Na toalha caindo? Em você ao
meu redor? O mesmo corpo nu que você
viu a distância, agora de perto? Um
toque ínfimo e proibido? Um desejo
latente e incontrolável? Um único beijo
e tudo acabaria.
Você tentaria me levar pra cama, mas
eu já estaria nua e iria te despir antes de
chegarmos às escadas. É nisso em que
você está pensando? Em meter esse pau
em mim nas escadas? Com as cortinas
abertas e que, se os vizinhos assistirem,
o problema é deles?
Você ia gemer no meu ouvido e ia
gozar dentro de mim e eu te
acompanharia.
É nisso que você está pensando?
Tomara que seja.
Ah, por favor, que seja.
Ele parou, estava recuperando o
fôlego. Concentrada em pensamentos eu
tinha perdido o momento do ápice, mas
ainda assim tinha sido uma experiência
maravilhosa.
Greg abriu os olhos e esticou um
braço para pegar uma toalha. Seu olhar
seguiu através da janela e se cruzou com
o meu.
Ah, não! De novo, não.
Chega de me pegar em situações
constrangedoras, Holt.
Nossos olhares se cruzaram durante
um segundo inteiro, e acho que o vi
sorrir quando me virei para descer a
escada.
Ótimo.
Perfeito.
Excelente.
Como eu consigo me meter nessas
situações de merda?
Virei de costas e comecei a descer os
degraus. Pela janela da sala, vi Holt
descendo, os olhos ávidos me
procurando do lado de fora. Ele estava
usando apenas calças de moletom. O
abdômen exposto exibindo aquele lindo
caminho da felicidade. Meu coração
latejou no fundo do peito e meu pé
encontrou apenas o vazio onde deveria
haver um degrau.
Acho que ouvi Holt gritando meu
nome enquanto eu caía.
Capítulo 7
“Se eu dissesse que estou loucamente
apaixonada por você, você saberia que
eu estou mentindo.”

Scarlett – E o vento levou

Não cheguei a bater a cabeça. Mas


meu tornozelo não tinha ficado a salvo;
o braço sobre qual eu tinha caído
também já tinha visto dias melhores.
Holt demorou menos de dois minutos
para chegar até o quintal dos fundos.
Com calças de moletom cinza e o peito
nu eu o vi pular os degraus que
separavam o pórtico do gramado. Max
chegou primeiro e, por incrível que
pareça, não pulou em cima de mim, nem
tentou me lamber. Era estranho, mas ele
parecia saber que eu estava machucada
e que não seria apropriado se jogar em
cima de mim. Valeu, Max.
– Dom! Dominique! Ai, meu Deus.
Você está bem?
Ele estava ofegante quando se
ajoelhou ao meu lado e me tocou com
cuidado, indeciso se deveria ou não
tentar me levantar.
– Você machucou a cabeça? Ou o
pescoço?
Mas eu estava bem. A queda tinha
sido alta, mas não tão alta.
– Estou bem – tentei me levantar, mas
Greg queria que eu ficasse quieta.
– Acho que você não devia se mover.
– Ele tinha a mão sobre o meu estômago,
me mantendo deitada. Meu vestido tinha
subido um bocado e eu tinha certeza de
que minha calcinha devia estar quase à
mostra. Mas Holt já tinha me visto nua
me masturbando, quase perdendo a
toalha para um cachorro e em cima de
um telhado assistindo ele se acariciar.
Olhando em retrospectiva, deixar minha
calcinha a mostra para Gregory era
quase irrelevante.
– Estou bem, é sério.
Tirei sua mão da minha barriga e me
levantei. Eu ia dizer que tinha uma
resistência bem alta para dor e que só
precisava de um analgésico, mas
levantar exigiu mais forças do que eu
tinha imaginado que ia precisar e, de
repente, meu tornozelo e meu pulso
estavam latejando horrendamente com
uma dor insuportável e eu gemi
involuntariamente.
– Você não está bem. Precisa ir pro
hospital.
O fato de eu ter conseguido me sentar
convenceu Holt de que minha cabeça,
pescoço e coluna vertebral estavam
bem, e ele enfiou os braços por baixo
das minhas costas e coxas e me levantou
no ar.
– Eu acho que consigo andar –
reclamei chorosa. – Não gosto que me
carreguem. Coloque-me no chão.
– Cala a boca, Dom.
Ele tinha um tom evidente de
preocupação em sua voz, e meu corpo
foi preenchido por uma sensação quente
e agradável. Havia alguém cuidando de
mim para variar. Era interessante.
Ele me colocou no banco da frente do
carro e correu de volta para dentro de
casa para buscar um casaco e prender o
cachorro. Só então percebi que poderia
ter aproveitado para espalhar meus
dedos pelos seus músculos, sentir o
calor da sua pele e experimentar mais
toda a arte de toques proibidos que a
situação permitia. Mas eu estava com
muita dor e meu cérebro priorizou as
coisas erradas.
Ele acelerou pela rua e os moleques
abriram passagem para o carro antes de
voltar a jogar bola. Segurei meu pulso e
percebi que a possibilidade de ele estar
quebrado era considerável.
– O que está sentindo? – Gregory
repetia a cada quatro segundos.
– Pode ser que eu tenha quebrado o
braço. Mas estou bem, é sério. Já
quebrei o braço antes. Não é nada
demais.
– Tem certeza?
Eu não sei bem como funciona essa
coisa de se machucar e ter alguém para
cuidar de você, mas estava começando a
parecer que dava mais trabalho do que
se machucar sozinha. Eu tinha que
respirar fundo, controlando a dor e ao
mesmo tempo dar um discurso de
incentivo atrás do outro para um
Gregory que parecia mais assustado do
que eu. Se eu estivesse sozinha ia poder
gritar de raiva até chegar ao hospital.
– Tenho. Tenho certeza.
– Estamos quase chegando.
– Calma! Não precisa nos matar em
um acidente de trânsito só porque eu me
machuquei.
– Só porque você se machucou. Você
está falando como se tivesse se espetado
com uma agulha. Dominique, você caiu
de uma escada.
– Estou perfeitamente ciente disso,
Holt. Mas estou bem.
– Você tem certeza?
A dor era grande, mas eu comecei a
rir.
– Tenho. Pela centésima vez.
– Está rindo? – Ele pareceu chocado.
– Você não está sentindo dor? Está rindo
do quê?
– Estou rindo de você.
– Desculpe se estou preocupado com
você – disse. Seu tom era sarcástico e
parecia ofendido, mas um pouco mais
tranquilo.
– Está desculpado – ri de novo, e
dessa vez ele me acompanhou.
– Não sei por que me preocupo. Você
é o indivíduo mais duro na queda que
eu conheço.
– Obrigada, querido.
Ele se acalmou, e eu tive tempo para
me concentrar na minha dor, o que
acabou sendo uma coisa ruim. Eu devo
ter gemido, porque Holt voltou a me
perguntar se eu estava bem.
Dizer que ele “estacionou o carro”
seria gentileza. Ele largou seu Porsche
Boxster em uma vaga de qualquer jeito e
pulou para fora do carro.
Abriu minha porta e já ia enfiar os
braços por baixo do meu corpo para me
levantar mais uma vez quando eu o
impedi com meu braço bom.
– Eu vou andando.
– Você machucou o pé.
– Pela última vez, Gregory, eu estou
bem. Foi só uma queda sem jeito. –
Coloquei as pernas para fora do carro e
me pus de pé. A dor foi tão grande que
meu mundo inteiro girou. Ainda bem que
meu orgulho é irascível, ou eu teria
desmaiado ali mesmo.
– Você é teimosa ao cubo, mulher.
Deixe pelo menos eu trazer uma cadeira
de rodas.
– Bobagem – sussurrei para que ele
não ouvisse a dor em minha voz. – Estou
perfeitamente bem.
Coloquei um pé atrás do outro como
se fosse um bebê que acabou de
aprender a andar e ainda não está
completamente seguro de que sabe fazer
aquilo sem cair.
– Dominique, pare de ser tão teimosa,
por favor – Holt resmungou atrás de
mim enquanto eu continuava com meus
passos tímidos e audaciosos em direção
à porta de entrada do hospital. – Você
vai acabar prejudicando seu pé ainda
mais.
Resistir à dor exigia toda a minha
força, e os discursos irritantes de Holt
começaram a pinicar minha alma. Eu
queria que ele calasse a boca.
Passamos pelo gramado e chegamos
ao asfalto da entrada de ambulâncias.
Ele tentava me apoiar pelo braço e
me ajudar a caminhar, mas agora que eu
já tinha me comprometido a agir como
se estivesse bem, iria até o fim. Recusei
sua ajuda e o senti suspirar atrás de
mim.
– Pare de agir como uma criança!
Deixe, pelo menos, que eu peça ajuda
para você.
– Ah, cale-se, Holt! – minha voz saiu
mais doída que indignada, e eu me odiei
por isso. – Já estou quase lá. Já teria
chegado se você não ficasse me
interrompendo o tempo inteiro pra dizer
que eu preciso…
Senti seu braço nas minhas pernas e
ele me levantou contra minha vontade.
Acho que deve ter, finalmente,
percebido que é mais fácil simplesmente
fazer algo do que tentar argumentar
contra mim. Não há vitória em uma
discussão comigo.
Cruzei a porta de entrada do hospital
gritando e mandando que ele me
largasse. Acho que o escândalo pode ter
sido um pouco desnecessário, porque
dois policiais se aproximaram
imediatamente.
Eu ainda estava me debatendo contra
Holt quando me colocaram em uma
cadeira de rodas.
– O que houve aqui?
– Nada. Ela se machucou – Greg
explicou, segurando a cadeira de rodas
para me empurrar.
– O senhor poderia, por favor, se
afastar da senhorita?
– Com licença? – Holt soou
indignado.
– Poderia, por favor, se afastar? – o
policial respondeu. Seu parceiro se
aproximou de mim.
– A senhorita está bem? O que houve?
– Eu caí – expliquei. Entre o susto de
ser carregada contra a minha vontade, o
orgulho ferido e a aproximação súbita
dos policiais, minha convicção falhou
momentaneamente e o policial Danver –
era isso que dizia sua placa de
identificação – deve ter ouvido isso no
meu tom.
– Esse senhor machucou a senhorita
ou tocou em você contra sua vontade?
Bem… aquela era uma pergunta sem
uma resposta satisfatória.
– Dominique… – Holt parecia
ofendido, surpreso e incrédulo.
– Não – afirmei categoricamente.
Minha convicção começando a retornar.
– Você está louco?
Uma enfermeira se aproximou e
começou a me perguntar o que tinha
acontecido.
– Eu caí – expliquei mais uma vez. –
Acho que machuquei meu pulso e meu
tornozelo.
Ela queria as informações do meu
plano de saúde, disse que o médico já
iria me atender e olhou ao redor
perguntando por acompanhantes.
– Estou com ela – Holt disse. Mas o
policial ainda não estava deixando que
ele se aproximasse de mim. Ele olhou
para o homem fardado com fúria nos
olhos. Eu queria avisá-lo de que era
melhor ele deixar Holt passar de uma
vez. Não é saudável irritar um advogado
desse jeito, colega. Confie em mim.
Principalmente um que tenha uma taxa
de vitórias de 93%.
– Ele está comigo. – A enfermeira
desviou o olhar de mim para Holt.
– O senhor é da família?
Ele manteve a boca aberta por uma
fração de segundo enquanto pensava no
que responder.
– Não – disse finalmente. – Sou um
colega de trabalho. Estava só trazendo
ela até aqui – virou-se para o policial.
– Então, não pode entrar, ainda. – Ela
me rolou para longe de Holt e eu fiquei
sem ação.
– Preferia que ele pudesse me
acompanhar. – Olhei para ela. – Ele
achou que meu pé estava pior do que de
fato está, me carregou de surpresa e eu
me assustei. Por isso estava gritando.
– Vamos deixar que os policiais
resolvam isso, sim? Agora, temos que
cuidar de você.
Tentei me esticar para ver Holt atrás
dela, mas já estávamos longe e eu não
conseguia mais ver o hall de entrada.
Eu não devia me preocupar com ele.
Gregory é um rapaz bem crescido, ele
consegue se virar sozinho. E como ele,
obviamente, não tinha me machucado, a
única pessoa digna de pena era o
policial e seu parceiro, caso
resolvessem insistir naquilo. Holt os
arrastaria em uma ação de danos morais
e arrancaria até seus órgãos como
pagamento.
Mas ainda assim… Eu estava
preocupada. Não me agradava ter
causado um inconveniente daqueles para
ele. Principalmente quando Greg só
estava tentando me ajudar.
Ótimo.
Eu não estava só atraída por ele.
Estava começando a me importar
também.
Maravilha.

A enfermeira estava me tirando da


sala de raio X e me explicando que os
policiais iam querer falar comigo assim
que o dr. Henris acabasse de me
examinar. Eu disse que tudo bem e
percebei que estava mais ansiosa para
resolver o problema de Holt do que o
meu. Isso era, no mínimo, estranho.
O corredor era limpo, branco e
elegante, com grandes vasos
ornamentais a cada esquina. Viramos à
direita e meu olhar seguiu para além de
uma das portas de vidro.
– Ah, só um momento! – pedi para a
enfermeira.
O cômodo era longo e bem iluminado.
Tinha bonitos quadros nas paredes e
vasos de flores aqui e ali. Duas longas
mesas de madeira no centro do ambiente
serviam de apoio para revistas, livros e
copos. Ao redor das mesas havia
diversas poltronas cinza de aparência
confortável. Rick estava sentado em uma
cadeira simples de frente para um
senhor de idade bem avançada. O senhor
estava sentado em uma das poltronas,
seu braço estirado tinha tubos entrando e
saindo.
Olhei para o adesivo fosco na porta
de vidro, que dizia “Unidade de
Quimioterapia”.
– Poderia só falar com um amigo? –
pedi educadamente.
Ela me olhou como se eu tivesse
pedido para grudar um chiclete no seu
cabelo. Olhou para o relógio como quem
diz “Minha senhora, você está,
provavelmente, com dois membros
quebrados. Não é hora de falar com
amigos”.
– Vai ser só um segundo. – Dessa vez
meu tom foi mais rígido. Foi o tom
Thoen que diz “Meu bem, não estou
pedindo. Estou só avisando”.
– Rick? – chamei. – Tudo bem?
– Olá, Dominique – ele acenou sem se
levantar, e a preocupação ficou evidente
em seus olhos. – Você está bem?
– Estou – sorri, abanando a mão boa.
– Só levei uma queda e acho que torci o
tornozelo.
– Ah. – Ele não fez mais nenhuma
pergunta e eu tive certeza de que ele era
o tipo de pessoa de que eu gostava. O
tipo que não se mete a não ser quando é
convidado.
Entre descobrir que Eric era casado,
a discussão moral com Andy, tentar
resolver o problema da vizinhança e ver
Holt se masturbando, eu sentia como se
semanas tivessem se passado. Ou pelo
menos alguns dias em vez das poucas
horas entre termos ido todos juntos fazer
compras e aquele momento.
– Dominique, este é o sr. Thierry.
Thierry, Dominique é nova na
vizinhança. Acabou de se mudar para a
antiga casa dos Parker.
– Ah, olá. Como vai?
Ele levantou uma mão tímida e
trêmula na minha direção. Sua pele era
enrugada e envelhecida. Seus olhos
eram escuros e opacos, a não ser por um
único ponto que tremeluzia como se
alguém tivesse molhado aquele ponto:
cirurgia de catarata, certamente. Ele não
tinha um único fio de cabelo na cabeça,
e eu imaginei que ele já devia estar
lutando contra o câncer há um bom
tempo.
Eu apenas sorri como resposta. Não
queria ter que perguntar “E o senhor?”.
Ele estava fazendo um tratamento de
quimioterapia, era óbvio que não estava
bem.
– O senhor também mora na
vizinhança? – perguntei, e a enfermeira
chamou minha atenção.
– Sim, sim. – Tinha algo no seu jeito
que eu achava familiar. Talvez fosse o
jeito de se sentar ou o modo como
apertou minha mão. Não soube
confirmar.
– Vocês são…
– Parentes? – Rick sorriu. – Não.
Muita gente pergunta isso. Acho que nos
parecemos, Thierry – brincou, apertando
os joelhos do velho.
Thierry olhou para mim com uma
certeza nos olhos. Ele não era o tipo de
homem que se engana com facilidade.
Sabia exatamente por que as pessoas
achavam que eles eram parentes: não é
qualquer pessoa que acompanha um
desconhecido para um tratamento como
esse.
– Acho que é o cabelo – brinquei.
A enfermeira prendeu a respiração
atrás de mim, mas, ao contrário dela,
tanto Rick quanto Thierry tinham senso
de humor. O velho riu tanto que
começou a tossir. Era agradável ver uma
pessoa tão debilitada rindo com gosto.
– Gostei de você, jovem – disse
quando recuperou o ar. – As pessoas
geralmente me tratam como se eu fosse
quebrar.
– Odeio quando fazem isso comigo –
respondi, mas, na verdade, não
conseguia me lembrar da última vez que
alguém tinha me tratado com tanto zelo.
Fora Holt, depois da minha queda,
obviamente.
– Senhorita Thoen, precisamos…
– Está bem, está bem. Acho que
preciso ir. Nos vemos depois, então.
– Sim! Venha comer uns biscoitos um
dia. Rick lhe mostra onde moro? –
completou olhando para o rapaz.
– Claro. Os biscoitos dele são muito
bons – sorriu para mim.
A enfermeira me levou embora e eu
me peguei lembrando das fraldas
geriátricas.
Ele não tinha mentido.
Eram para um amigo.
Existiam pessoas boas no mundo.
Pessoas que simplesmente faziam
algo por outras.
Esse era um conceito que eu ainda
tinha dificuldade de compreender.

O dr. Henris tinha um porte


imponente, um cabelo loiro muito liso e
um par de olhos castanhos extremamente
penetrantes.
Eu tinha recebido um bom analgésico
e, mais uma vez na plenitude de minhas
capacidades cognitivas, estava
conseguindo admirar toda a beleza do
meu modesto médico.
– Foram apenas torções, tanto no
tornozelo quanto no pulso – explicou. –
Vamos imobilizar por uns dias por
segurança. Alguns analgésicos e anti-
inflamatórios e você está liberada –
sorriu, observando meu raio X.
– Ótimo – sorri de volta. – Disse para
meu amigo que me trouxe até aqui que
estava tudo bem, mas ele não acreditava
em mim.
– Mas você precisa de repouso,
ouviu? Nada de ficar de pé ou fazendo
trabalhos manuais. Tente se comportar
por uns dias.
– Por uns dias? Quantos dias? – eu
precisava terminar de arrumar a casa de
Holt ou ficaria presa ali para sempre.
– Uma semana, no máximo.
Ele puxou a cortina para sair.
– Belo vestido – elogiou antes de se
retirar.
Não lembrava mais que roupa estava
usando e baixei os olhos diretamente
para o meu decote.
Quando um homem elogia suas
roupas…
O policial Danver entrou assim que o
médico saiu e eu me percebi,
subitamente sem nenhuma paciência.
– Senhorita Thoen?
– Ah, por favor! – resmunguei. –
Gregory Holt é um colega de trabalho e
um amigo. Ele acabou de se mudar para
cá eu estou ficando na casa dele para
ajudá-lo por uns dias. Uns moleques da
rua chutaram a bola para cima do
telhado. Eu subi no telhado para pegar,
tropecei na escada e caí. Holt me trouxe
até aqui. Eu disse a ele que conseguia
andar do carro até a porta do hospital.
Ele não acreditou e me carregou. Eu me
assustei e gritei. Agora, se você não
tiver mais nenhuma pergunta, eu
aconselho que vá ocupar seu tempo com
algo mais importante, pare com todo
esse drama de agente secreto e deixe-o
entrar.
– A senhora caiu do telhado e teve
apenas algumas torções? E, mais
importante… Subiu no telhado de
vestido?
– Não foi do telhado, foi da escada. E
se comentários sobre a minha sorte ou às
minhas escolhas de vestuário são as
únicas dúvidas que o senhor tem, oficial
Danver, eu recomendo que pare de
insinuar que meu amigo me machucou.
Isso é o tipo de coisa que pode gerar um
problema bem longo.
– Quando um homem machuca uma
mulher é uma coisa séria. O problema
deve ser longo mesmo!
– Ah, o senhor me entendeu errado: o
problema bem longo vai ser para você.
Não tenho qualquer dúvida de que um
homem machucar uma mulher é uma
coisa séria. Já mandei alguns desses
para a cadeia. Mas Holt não me
machucou e se você continuar
insinuando que ele fez isso, como sua
advogada, vou aconselhá-lo a processar
o senhor, seu parceiro, toda a sua
unidade e este hospital. Estamos
entendidos?
– Ele não machucou a senhora, então?
– De modo algum.
– Tudo bem. Tenha uma boa noite.
– O senhor também.
Holt chegou alguns segundos depois.
– O que foi que você disse?
– Como assim?
– Em um minuto estão me tratando
como um criminoso. Aí falam com você
e começam a me pedir desculpas e me
tratar como se eu fosse o embaixador de
algum sultão árabe.
– É sério, Holt, você precisa aprender
a argumentar. Não sei como você
consegue ganhar alguma causa desse
jeito.
Ele riu e me ajudou a sentar de volta
na cadeira de rodas.
– Então, quer dizer que você é minha
advogada? – brincou, enquanto
empurrava a cadeira pelos corredores
de volta para o hall principal.
– Então quer dizer que você sabe o
que eu disse? – devolvi.
– Eles só mencionaram que eu
explicasse para minha advogada lá
dentro que tinha sido apenas um mal-
entendido. Eu demorei para entender o
que eles queriam dizer.
– Demorou foi? Raciocínio lento o
seu, hein?
Holt continuou a rir.
– Espera aqui? Vou buscar o carro.
Fiz que sim com a cabeça e baixei os
olhos para minhas mãos enquanto
esperava.
Eric era casado.
No meio de toda essa confusão, tinha
esquecido do meu maior problema.
E se Andy sabia, mais alguém da
vizinhança logo saberia também. Era só
uma questão de tempo até Holt
descobrir.
Ele não se surpreenderia. É claro que
aquele era o tipo de coisa que uma bruxa
como Dominique Thoen era
completamente capaz de fazer. Ele me
chamaria de vadia e eu me sentiria
imunda.
Era uma injustiça tão grande… eu me
sentia como em O estrangeiro, de
Camus. Eu não era culpada. Não por
aquilo. Não daquela vez. Mas mesmo
assim ia ser condenada. Condenada por
causa de uma vida inteira de uma
personalidade horrível e ultrajante.
Paciência.
– Já está indo?
Era o doutor Henris.
– Já. Liberada – sorri.
Ele trocou o peso de pé como se
estivesse considerando se ia embora ou
se ficava. Finalmente, resolveu ficar e
se abaixou ao lado da minha cadeira.
– Ahn… Eu não costumo fazer isso,
mas… – ele tirou um cartão do jaleco. –
Se precisar de alguma coisa. Ataduras
novas, algum remédio ou companhia
para o jantar. – Levantou o cartão no ar
e esperou que eu o pegasse. – Fique à
vontade para me ligar.
– Obrigada – peguei o cartão e sorri
discretamente. Olhei cuidadosamente
para sua mão esquerda antes de aceitar.
Não era o tipo de coisa que eu
pretendia fazer em um futuro próximo.
Mas, se eu ainda estivesse na cidade
quando Holt descobrisse sobre Eric, eu
poderia precisar de uma distração.

– Tudo bem. – Holt estava dirigindo


bem mais calmamente agora. – Você já
foi devidamente medicada, não está
mais sentindo dor ou correndo o risco
de perder um braço. Então, me diga,
Dominique, o que diabos você estava
fazendo no telhado?
Prendi a respiração e me odiei por
não ter me preparado para aquele
momento. Eu tinha assistido a ele se
masturbar: é claro que aquela pergunta
seria feita. Mas eu estava tão ocupada
com outros pensamentos que ignorei
completamente esse fato e agora estava
terrivelmente despreparada para o
inevitável rumo que essa conversa
tomaria.
– Uns meninos da rua chutaram a bola
para o telhado.
– E você disse que eles só poderiam
pegá-la no dia seguinte. Eu estava do
seu lado na hora.
– É, mas eu mudei de ideia. Pensei
que podia ser educada com os vizinhos,
como você mesmo sugeriu – me defendi
rapidamente.
– Certo, mas por que não pediu que eu
fizesse isso?
Olhei para ele com uma expressão
incrédula. Ele esperava mesmo que eu
pedisse ajuda a alguém para fazer algo
que eu era totalmente capaz de fazer
sozinha?
Greg parece ter lido a explicação nos
meus olhos.
– Tudo bem. Não é do seu feitio.
Mas… Aí você pegou a bola e devolveu
para os meninos?
– Não, eu roubei a bola! – disse,
sarcástica. – É claro que eu devolvi,
Holt. Que tipo de monstro sem coração
você acha que eu sou?
Ele me olhou com um sorriso nos
olhos e eu mostrei a língua pra ele.
– Certo. Mas e aí?
– E aí o quê?
– Você subiu para pegar a bola.
Pegou a bola e devolveu a bola. Por que
não desceu do telhado?
Ai, merda. Ele ia até o fim.
– Eu ia…
– Mas aí preferiu me ver nu.
Ele tinha um sorriso delicioso nos
lábios que deixava claro que ele não se
envergonhava nem um pouco do próprio
corpo nem da própria sexualidade. A
questão é que eu também não me
envergonhava nem do meu corpo nem da
minha sexualidade. Então, como ele
conseguia fazer isso? Como ele
conseguia me deixar com vergonha o
tempo todo?
– Você já me viu em uma situação
parecida, Holt. Então, nem tente me
constranger. Não vai conseguir. – Ah,
quem eu estava enganando? Ele já
estava conseguindo.
– É, mas eu não escalei um telhado
para te ver nua. Quero dizer, não me
leve a mal: não é que você não mereça –
ele riu. – Acredite, merece –
acrescentou baixinho, mais para si
mesmo do que para mim. – Mas eu não
fui pervertido a esse ponto.
– Não escalei o telhado para ver
você nu – chiei com os dentes cerrados.
– Subi com uma escada – expliquei para
diminuir o tamanho do esforço. Pode
parecer besteira, mas soou importante na
hora – Para pegar a bola das crianças.
Se você estava se masturbando de frente
para a janela, não sou eu quem tem que
ficar constrangida.
– Ah, então você me viu enquanto eu
me masturbava?
Só então me ocorreu que ele não
sabia quanto tempo eu tinha ficado em
cima do telhado. Até onde Holt sabia,
tinha sido apenas um momento fugaz em
que nossos olhares se cruzaram. Mas
agora, eu tinha deixado claro que não
havia sido só isso.
Parabéns, Dominique. Show.
– Vamos! Conte a história toda. Não
adianta ficar com vergonha agora – Holt
estava se divertindo.
– Não estou com vergonha. – Eu
estava com vergonha. Estava morrendo
de vergonha. Mas por quê?
– Você subiu no telhado, me viu
enquanto eu me masturbava e…
– E parei para olhar! – reclamei
dentro do carro. Gregory começou a rir.
– Não é como se você nunca tivesse
feito o mesmo. Parei e olhei. E pronto.
Ele não ia parar de rir tão cedo.
– Certo, Holt. Chega desse assunto.
Eu podia ter te filmado, sabia? –
lembrei de repente. E parte de mim
odiou não ter tido essa ideia antes.
– E fazer o quê? Colocar uma
filmagem de mim me masturbando que
você conseguiu graças a sua perícia em
escalada? – riu. – Ia ser mais prejudicial
para você do que para mim, Dom.
É. Ele estava certo.
Maldita sociedade machista.
– Certo. Podemos parar de falar sobre
isso?
– Acho que a gente devia transar de
uma vez.
Meu coração parou de bater. Meu
pulmão interrompeu as trocas gasosas.
Minha boca ressecou. Minhas unhas se
enfiaram na carne. Minha vagina gritou
“Sim, por favor”.
– Quero dizer, a gente não para de
passar por situações constrangedoras –
riu, e dessa vez seu tom deixou claro
que ele estava brincando. – É como se o
universo estivesse mandando um sinal –
brincou.
É claro que ele estava brincando. Ou
você achou o que, Dom? Que ele estava
falando sério?
Ele estacionou dentro da garagem.
Virou-se para mim e colocou o
indicador quase no meu nariz.
– Eu vou te carregar e você não vai
gritar – ordenou. – Já vimos que os
vizinhos são do tipo que fazem
escândalo e chamam a polícia. Então,
nada de gritos, Thoen. Me ouviu?
Concordei em silêncio e deixei que
ele me carregasse para o andar de cima.
Ele ainda usava o casaco mole e fino
por cima do peitoral nu, mas mesmo
assim eu aproveitei o máximo que pude
da experiência. Abracei seu pescoço e
deixei que a ponta dos meus dedos se
enfiasse em seus cabelos arrepiados.
Mantive meu rosto desnecessariamente
próximo ao dele e respirei fundo aquele
perfume cítrico delicioso. Aqui e ali,
fingia me desequilibrar, e usava isso
como desculpa para mudar minhas mãos
de lugar e tocar seus ombros largos e
seu tórax nos mais variados pontos.
Eu queria esfregar minha mão em toda
a extensão do seu corpo, mas precisava
ser discreta. Só toquei onde fazia o
mínimo de sentido. Não estava
satisfeita, mas pelo menos não tinha sido
pega.
Holt, por sua vez, também parecia
estar curtindo a proximidade. Apoiava
minhas costas com seu braço, mas sua
mão sempre dava um jeito de descer até
a minha cintura ou subir até quase o meu
seio. A mão que segurava minha coxa
era ainda mais indiscreta, e Holt
apertava minha carne com gosto. Em
mais de uma ocasião, acho que o senti
acariciando a parte interna da minha
perna com o polegar. Podia ser que só
estivesse recolocando a mão. Ou podia
ser que ele, assim como eu, estivesse
usando a situação como desculpa para
me tocar em lugares que não seriam
facilmente atingidos em outra situação.
Eu não sabia qual dos dois toques
preferia: sua mão em minha cintura e
seio ou o toque forte em minha coxa.
Acho que se tivesse que escolher só um,
escolheria a coxa. Meu vestido caía, e
onde seus dedos passavam em minha
pele nua eu sentia uma rajada de fogo.
Queria que ele me acariciasse mais um
pouco. Que passasse seu polegar pela
parte interna das minhas coxas e me
fizesse tremer por baixo da calcinha.
Mas chegamos rápido demais ao
primeiro andar. Ele fez uma curva
errada e eu não entendi.
– Holt? Está me levando para o seu
quarto?
– Não tem televisão no seu quarto –
explicou. – E você vai ter que passar um
bocado de tempo deitada. É melhor ficar
no meu.
– Eu não ligo. Não preciso de tevê.
– Dominique, por favor. Não vamos
mais discutir, está bem? Só faça como
estou te pedindo.
Ele tinha um tom tão doce em sua voz
que eu não consegui recusar.
Greg me colocou sobre sua cama, e eu
senti como se estivesse profanando um
lugar sagrado.
– Vou dar comida ao Max e pedir
algo para a gente jantar.
– Tem comida aí, eu fiz compras.
– Tem algo que fique pronto só com o
micro-ondas?
– Hmm… não sei.
– Então é melhor a gente pedir. Eu
não sei cozinhar nada.
– Mas não precisa nem cozinhar, é
só…
– Nada! – Ele arregalou os olhos em
um claro sinal de pânico e eu ri.
– Tudo bem.
– Uma pizza? Ainda estou te devendo
– brincou.
– Você pode ficar com o último
pedaço.
– É claro que posso – fingi um tom
rabugento. – Você comeu minha última
pizza.
– Você não sabe só agradecer, não é?
– ele riu. Estávamos estirados em cima
da sua cama assistindo a Jornada nas
Estrelas. Acho que estava sendo uma
das melhores noites da minha vida. Me
senti uma solitária patética por causa
disso.
– E por que eu faria isso?
– Para ser agradável, educada… – ele
me provocou.
– Não… Não sei o que são essas
coisas – brinquei, cerrando os olhos,
fingindo pensar. Holt riu alto.
O episódio acabou e eu não consegui
terminar a fatia inteira. Holt roubou o
que tinha sobrado e enfiou na boca
rapidamente.
– Você podia fazer especialização
nisso: ladrão de pizza.
– Você acha que paga bem?
– A gente dá um jeito.
Ele se moveu na cama para se deitar
perto de mim e Max, deitado aos nossos
pés, levantou a cabeça para observar a
movimentação.
Os créditos terminaram, e a tevê
voltou para a tela inicial do Netflix.
Peguei o controle da tevê e passei pra
ele.
– Você escolhe agora.
– Não. Você escolhe.
– A gente já assistiu a dois episódios
de Jornada, Greg. Acho que está na sua
vez.
– Você quase morreu. Você escolhe.
– Quase morri? Exagerado!
– Thoen! Você caiu do telhado! Do
telhado do primeiro andar! É uma queda
de cinco metros de altura e você só teve
duas torções. Mesmo que as partes mais
baixas do telhado tenham ajudado a
aparar sua queda… O pessoal do
escritório já achava que você tinha
vendido a alma pro diabo. Depois disso
eles vão ter certeza.
– Não caí do telhado! Já disse! Caí da
escada quando estava descendo. Foi
uma queda baixa – mostrei a língua pra
ele. – Mas olha isso – levantei o braço
que tinha ficado embaixo do corpo
quando caí para que ele observasse. A
pele já estava roxa e inchada. E era só o
começo. Muito em breve ia piorar.
– Acho que alguns torções e uns
hematomas não são tão ruins assim,
considerando…
– Uns hematomas? Você fala como se
não fosse nada.
– Tem gente que morre em quedas
assim, Dom! E você teve o quê? Um
braço roxo?
– Um braço… – levantei a barra do
vestido do lado que eu tinha caído e
mostrei minha perna roxa – Metade do
meu corpo vai ficar assim, Holt. Já está
doendo!
Ele levou a mão até minha coxa e
tocou o hematoma com a ponta dos
dedos. Se ele estava desenhando as
bordas do machucado ou se estava
simplesmente acariciando minha coxa,
eu não saberia dizer. Sinceramente? Não
fazia diferença. Ele me tocou
suavemente e eu senti eletricidade
correndo pelo corpo.
– Sinto muito – murmurou.
– Pelo quê?
– Você não teria caído do telhado se
eu não tivesse te obrigado a vir até aqui.
– Sua voz, seu toque… Era tudo tão
gentil que eu me senti constrangida.
Rápido, Dom! Diga algo cruel.
– Também não teria caído se meus
pais tivessem usado camisinha na noite
em que fui concebida. Vai culpar meu
pai morto e enterrado, também?
– Dominique, você não precisa ser
horrível – apesar das palavras rudes,
seu tom era delicado. Sua mão ainda
estava na minha perna e ele tinha se
girado de lado, estando de frente para
mim. Perto demais.
– Não estou sendo horrível. Estou só
dizendo que não é culpa sua.
– Tudo bem. Mas me desculpe,
mesmo assim.
– Certo, está desculpado – falei
rapidamente. A proximidade com Holt
estava dificultando minha respiração.
Era como se ele estivesse sugando todo
o oxigênio do cômodo. – Mas não devia
se desculpar por qualquer coisa.
Principalmente por coisas que não são
culpa sua.
– Posso me desculpar por ter te
olhado de volta. Você só caiu porque se
assustou. Isso foi culpa minha, não foi?
– Seu toque na minha perna tinha ficado
mais intenso. Desistiu de me tocar
apenas com as pontas dos dedos e agora
tinha a mão espalmada na minha perna.
– Eu subi no telhado, Greg. Eu assisti
a você se masturbar. Eu me assustei. Eu
caí. Que parte disso é culpa sua?
– Você sabe não argumentar? Sabe?
– ele estava rindo. Descobri que
adorava o som da sua risada. –
Simplesmente ouvir algo sem
transformar isso em uma discussão?
– Acho que não – segurei o sorriso,
mas ele levantou meu queixo para me
observar melhor e eu ri. Teve que tirar a
mão da minha coxa para isso. Uma pena.
– O que vamos ver agora? – ele
passou o braço pelas minhas costas e
agora estávamos quase abraçados.
– Já disse, pode escolher.
– Tá – ele pegou o controle. – Quero
ver mais um episódio de Jornada nas
Estrelas. Qual você prefere? A nova
geração ou a série clássica?
Eu mal me mexia e quase não
respirava. Tinha medo que se me
movesse muito subitamente ele fosse
imaginar que estava me machucando e
retirasse o braço. Queria ficar ali.
Protegida. Recebendo carinho e atenção.
Inferno… Eu parecia um filhotinho
desesperado por carinho. Acho que
minha individualidade e independência
sempre conseguiram disfarçar minha
solidão muito bem. Mas ali, machucada
tanto física quando emocionalmente, eu
estava precisando de um abraço.
– Tanto faz – minha voz saiu doída.
Ele ia descobrir que eu fiquei com um
homem casado. Ele ia achar que eu sou
o tipo de mulher que faz isso com
frequência.
– Está tudo bem? – a dor na minha
voz deve ter sido identificada. Ele me
soltou por um segundo e eu me arrependi
de ter deixado minhas emoções tomarem
o controle.
– Está – tentei sorrir. – É só… Sei
lá…
Então, Holt fez algo que eu não
esperava: colocou o braço ao meu redor
mais uma vez e me abraçou com ainda
mais força. Me puxou para ele e me
manteve ali, contra o seu peito,
envolvida pelos seus braços.
– Quer analgésicos mais fortes? A
gente pode dirigir por um bairro
perigoso e tentar achar um traficante… –
brincou, enfiando a mão nos meus
cabelos e eu comecei a rir contra a sua
camisa.
– Não. Acho que preciso de um
banho.
– Hmm… – Ele tirou os dedos dos
meus cabelos e continuou o carinho pela
minha coluna – Vai querer ajuda? Não é
como se eu nunca tivesse te visto nua.
O descarado estava rindo e eu dei um
tapa em seu braço. Normalmente, eu o
afastaria para longe. Mas hoje não.
– Voyager – mudei de assunto. – Essa
é a minha saga favorita de Jornada nas
Estrelas.
– Nunca ouvi falar nessa. É Kirk ou
Picard?
– Nenhum dos dois. Voyager é a única
saga de Jornada em que a nave é
comandada por uma mulher.
– Uma capitã? – ele pareceu
impressionado.
– Capitã Janeway.
– Legal. Acho que essa vai ser a
minha favorita também. – ele retomou o
cafuné e eu queria que ele não parasse
nunca mais.
– Você é a pessoa mais influenciável
do mundo? Você nunca nem viu o
seriado.
– Estava brincando. Além do mais,
por que você gosta mais desse? Só
porque a capitã é mulher?
– Não é só por causa disso. Mas isso
é uma grande parte.
– Posso te perguntar uma coisa?
– Ih… – Apoiei o queixo contra o seu
tórax para observá-lo. – Lá vem… O
que foi?
– Por que você é tão… defensiva
quanto ao seu gênero?
– A palavra é feminista, Holt.
– Não, não é. Você é excessivamente
defensiva sempre que há algo que
envolve gênero.
Eu me levantei e o empurrei
discretamente. Aquilo era o meu
calcanhar de Aquiles.
– Eu sou defensiva em relação a tudo
que eu sou. Defendo mulheres,
advogadas, morenas… Desde muito
cedo precisei me defender sozinha.
Aprendi a ser boa nisso e aprendi bem
rápido.
– Justo. Acho que explica muita coisa.
– Você não vai dizer de novo que eu
sou agressiva porque sou amarga, vai?
– Não – ele riu e tentou me puxar para
perto dele de novo, mas dessa vez eu
resisti – Mas todo mundo tem um motivo
para ser como é, Thoen, e você não é
exceção.
– É? E você? Quais são seus
motivos?
– Venho de uma família…
afortunada.
– Rica. Essa parte eu entendi
arrumando suas fotos.
– Minha avó é uma pessoa
complicada. É a matriarca de uma
família importante e acha que os tempos
medievais ainda estão em vigor. Minha
mãe, a filha dela, se casou com um
homem que minha avó não aprovava.
– O seu pai?
– É. Foi complicado.
– Mas eles pareciam felizes. Pelas
fotos – acrescentei.
– Eles eram.
– Eles faleceram?
– Meu pai, sim. Minha mãe… bem,
minha mãe ainda está viva. Ou quase.
Eu queria perguntar mais, mas achei
que, talvez, naquele momento, fosse
indelicado.
– De qualquer modo – ele continuou
–, quando as pessoas têm dinheiro
acham que isso basta. Meu pai me
ensinou que a gente tem que tratar as
pessoas com decência. Por isso, desde
que eu… Abandonei essa vida, tento ser
gentil com as pessoas.
Greg tinha algo triste em seus olhos e
eu senti uma dor no coração que
eclipsou qualquer machucado de uma
queda de cinco metros. Eu estava muito
atraída por esse homem. Senti uma
vontade louca de abraçá-lo e dizer que
ia ficar tudo bem. Tive que lutar
enlouquecidamente contra esse instinto.
Precisava tentar mudar de assunto.
– Minha mãe se envolveu com um
cara rico e casado. Ele largou a família
para ficar com ela. E ela nos largou, eu
e meu pai, para ficar com ele. A
vagabunda queria vida fácil.
– Riqueza não traz vida fácil,
acredite.
– Eu acredito – dessa vez fui eu quem
me aproximei dele. Estava começando a
ceder à vontade louca de abraçá-lo. –
Ele a largou alguns anos depois por uma
mulher mais nova. Deu em cima de mim,
algumas vezes, o nojento.
– E ela levou metade de tudo que ele
tinha? – riu.
– Não. Ela não levou quase nada, na
verdade.
– Foi uma das suas primeiras causas?
– ele parecia confuso.
– Eu não representei ela. Nunca!
– Ah, está explicado!
– É, Holt – cutuquei, tentando
amenizar o clima. – Está me
confundindo com outra pessoa? Se eu a
tivesse representado…
– Ela teria levado até as cuecas dele.
– Por aí – ri.
– Você vai me contar o que viu no
meu processo?
– Não sei. Se você se comportar –
provoquei.
– Me comportar? Eu salvei sua vida,
deixei você escolher o que a gente ia
assistir, te dei a última fatia de pizza…
Por Deus, mulher! – brincou,
exageradamente. – O que mais você
quer?
Seu corpo nu. Ri sozinha.
– Quero que você apague meu vídeo.
– Jamais! – ele riu e me espremeu em
um abraço forte demais.
Deixei minhas mãos repousarem em
seus ombros e enfiei meu nariz em seu
pescoço. Holt alisava minha coluna com
gentileza e eu sentia sua respiração
contra meus cabelos. Era uma
brincadeira de tocar. Eu queria tocá-lo.
Ele queria me tocar. Mas nenhum dos
dois tinha coragem de fazer isso
explicitamente. Ficávamos fingindo um
movimento ou outro para ficar cada vez
mais próximos, toques cada vez mais
íntimos.
Eu já tinha dançado aquela dança
centenas de vezes. Mas ela nunca tinha
sido tão delicada como aquela. Ou tão
gostosa.
Eu estava envergonhada e não sabia
muito bem como lidar com isso. Era a
primeira vez que eu tinha vergonha de
tocar um homem. Já levei foras antes:
acontece. Mas lidei com isso do mesmo
jeito com que lido com tudo na minha
vida. Uma boa dose de “dane-se” e
partia para outra. Mas Holt… Se ele me
recusasse, as consequências seriam
completamente desconhecidas. E o
desconhecido me trazia uma boa dose
de pavor.
Eu ainda estava presa entre seus
braços e suas mãos estavam em quase
todos os lugares. Puxei minha perna
contra ele e, com meu joelho, encostado
em sua virilha, já podia sentir o
princípio de uma ereção. Ele empurrou
o corpo um pouco para trás, tentando
evitar que eu percebesse. Tarde demais.
Escorreguei minha mão por seu peito
rígido e o arranhei de leve por cima da
camisa. Sua mão estava de volta à minha
coxa e dessa vez ela estava subindo e
subindo. Cada um se movia a uma
velocidade glacial para ficar mais de
frente um para o outro. Se fosse
qualquer outro homem eu já teria
enfiado os dedos em seus cabelos e
minha boca na dele. Teria envolvido seu
quadril com minhas pernas e dito algo
safado. Mas havia algo em Gregory Holt
que me deixava congelada. Congelada
pelo fogo, se é que isso faz algum
sentido: eu o queria tanto que não
conseguia fazer nada. Era tortura do pior
tipo.
Eu queria falar de sexo. Queria que
ele pensasse em sexo e que fizesse o
primeiro movimento já que eu,
claramente, não iria conseguir fazer.
– Quero esse vídeo, Holt.
– E vai ter. E nem vai precisar
trabalhar tanto por isso – Ele puxou a
mão das minhas costas e agora era o
meu rosto que ele acariciava com uma
gentileza infinita.
– O que quer dizer?
– Vai passar boa parte do seu tempo
restante aqui nessa cama.
Eu queria que ele completasse com
um “porque eu não vou sair de cima de
você”. Mas eu sabia que ele estava se
referindo ao fato de eu estar machucada.
– Faço questão de acabar o que
comecei – falei. Ele estava passando o
polegar sobre o meu lábio e parecia
vagamente consciente do que eu estava
falando. Estava tão perto que o único
cheiro que eu conseguia sentir era o
dele. – Não vou embora enquanto não
acabar. Questão de honra.
As palavras saíam da minha boca mas
eu dava pouca importância a cada uma
delas. Eu só conseguia pensar em abrir a
boca e chupar aquele polegar. Chupar
com vontade, depois lambê-lo e dizer
que era isso que eu queria fazer com seu
pau.
Mas era Holt. Maldito Holt. E eu não
conseguiria fazer nada disso.
– Vai ser difícil me separar desse
vídeo – havia um toque de brincadeira
no que dizia, mas sua voz não passou de
um sussurro delicioso.
– Está levando meu vídeo para o
banheiro com você, é? – me forcei a
dizer.
– Ainda não – susurrou contra os
meus lábios e eu me peguei lutando
contra a vontade de fechar os olhos. –
Mas é uma boa ideia.
– Está querendo me deixar com
vergonha, Holt?
– Vergonha de que, Thoen? Você tem
um corpo perfeito – ele piscou e
manteve os olhos fechados por uma
fração de segundo a mais do que deveria
e eu não pude deixar de pensar que ele
estava imaginando. Imaginando aquela
noite. Me imaginando nua. Seu toque na
minha coxa ficou mais urgente, seus
olhos verdes estavam cravados nos
meus e algo dentro de mim começou a
tremer incontrolavelmente. – Você não
tem nada de que se envergonhar.
Vai, Dom! Diz “Você também não”.
Segure ele pela virilha e diga “Você
também não”.
Mas nada. Eu ainda estava congelada.
O polegar de Holt já tinha explorado
cada centímetro dos meus lábios antes
de sua mão descer para o meu queixo.
Manteve meu rosto preso em sua mão.
Seu olhar não hesitava. Holt se sentou e
se inclinou por cima de mim. Senti seu
rosto se aproximar. Sua boca. Sua boca.
Sua boca.
Era só nisso que eu conseguia pensar.
Era só isso que eu conseguia ver.
Estava acostumada a seduzir.
Mas eu estava sendo seduzida.
Senti o calor dos seus lábios contra
os meus e tive certeza de que meu
sangue tinha descido da cabeça e que
minha boca estava gelada. Holt largou
meu queixo e me segurou pelos cabelos.
Ele me queria e me queria agora.
Entreabri os lábios e senti sua língua
entrando na minha boca. Calma e
delicada primeiro. Paciente.
Massageando minha língua, me
explorando com cuidado. Senti força na
mão que ele mantinha contra minha nuca
até me colocar sentada. Seus dois
braços me envolveram com força e eu
me senti sua. Eu não tinha nenhum poder
ali, nenhum controle. Estava
completamente entregue.
Sua boca se abriu forçando a minha.
Enfiei minha língua em sua boca e o
senti sugando. Segurei seu rosto entre
minhas mãos e me deliciei em seu gosto.
Uma mordida no lábio, um chupão na
língua, suas mãos em locais cada vez
mais proibidos.
Eu queria descer minhas mãos, queria
explorar seu corpo também. Mas era
como se minha mente só conseguisse
fazer uma coisa de cada vez. E, no
momento, eu só conseguia me concentrar
no beijo ou iria explodir.
Ele me beijou e me beijou. Eu estava
perdendo o ar, mas não me importei e
ele também não. Ele ofegava contra
minha pele sem nunca largar o beijo.
Eu queria mais. Queria sugar sua
saliva inteira. Queria secá-lo em minha
boca.
Holt tinha as mãos no meu pescoço,
no meu cabelo, nas minhas coxas, na
minha cintura. Seus dedos subiam pela
minha cintura e estavam quase em meus
seios. Era só isso que eu precisava.
Precisava que ele ultrapassasse a
barreira, deixando claro que era isso
que ele queria.
E aí algo horrível aconteceu: eu
comecei a pensar.
Comecei a pensar em tudo.
Em Eric e Shelbi. Nos vizinhos. No
meu pai. Na minha mãe. Na família dele.
Mas principalmente em Eric.
Greg estava me dando o que
provavelmente era o melhor beijo da
minha vida e tudo que eu queria era me
entregar ao momento. Mas a imagem do
seu rosto ficava voltando a minha mente.
Sua expressão de nojo quando descobriu
que eu tinha transado com um
desconhecido no seu sofá. O que ele
diria quando descobrisse que era com
um homem casado? Ele acreditaria em
mim quando eu dissesse que não sabia?
Ou diria que eu era uma vadia
incorrigível? Que ele deveria ter
imaginado? Me olharia com asco e
mandaria eu pegar minhas coisas e dar o
fora da sua casa e da sua vida?
Eu estava passando mal. Não era um
mal estar físico, mas completamente
emocional, e era horrível. Empurrei seu
tórax com o braço.
– Holt, não. Não quero fazer isso.
Ele passou a língua nos lábios e vi
seu rosto ficar vermelho de vergonha.
– Ah, tudo bem… Thoen, me
desculpe. Eu não… – ele se levantou
rapidamente e eu quis dizer alguma
coisa.
Quis dizer que não estava dizendo
nunca, mas que… Eu precisava resolver
outras coisas antes.
Lembrava de todos os filmes de
romance que eu já tinha assistido. Era
sempre assim: uma das partes tinha um
segredo bobo e simples que poderia ser
explicado e compreendido sem maiores
problemas. Mas eles sempre esperavam
e esperavam até que o segredo era
revelado do pior jeito possível.
Era isso que estava acontecendo.
Talvez se eu simplesmente abrisse a
porcaria da minha boca e explicasse,
Holt entenderia e eu poderia parar de
me preocupar. Ou, na pior das hipóteses,
ele não entenderia. Mas pelo menos…
Era melhor ouvir de mim do que de
outra pessoa, não?
Mas ele estava na porta, tirando Max
do quarto, pedindo desculpas e dizendo
que dormiria no meu quarto. Ele parecia
desconcertado e eu quis corrigir meu
erro desesperadamente. Mas não havia
palavras. Eu não conseguia pensar em
nenhuma. Eu queria que ele se sentasse,
queria colocar mais um episódio e
brincar sobre pizzas e vídeos. Mas Holt
tinha me desejado boa noite e tinha ido
embora. E eu fiquei ali. Sozinha em sua
cama. Pensando em por que diabos eu
tinha feito aquilo.
Capítulo 8
“Não se superestime, Scarlett.”

Rhett — E o vento levou

Girei a maçaneta bem devagar e


coloquei metade do corpo para dentro
do quarto. Dominique ainda estava
dormindo na minha cama. Ela estava
deitada de lado, com as costas viradas
para a porta. A camiseta justa do seu
pijama estava enrolada em baixo da sua
cintura e boa parte de sua barriga estava
a mostra. De onde eu observava, as
curvas do seu corpo poderiam se alinhar
perfeitamente com a linha de um violão.
Dominique e suas malditas curvas
latinas que fazem o pênis criar vida
própria e querer sair para um passeio.
Ela estava descoberta com as pernas
entrelaçadas no edredom. Eu conseguia
ver o desenho de sua calcinha por baixo
do pano do short curto e fino.
Pare, Gregory. Isso não vai acabar
bem.
Dei um passo para trás e saí do
quarto.
Só queria ver se ela estava acordada.
Não queria que ela precisasse levantar,
ia acabar piorando o tornozelo, que,
apesar de sua teimosia, com certeza não
devia estar muito bem.
Precisava me ocupar aquela manhã.
Ou melhor, precisaria me ocupar o dia
inteiro. O fim de semana inteiro. O mês
inteiro. Até ela ir embora. Aquilo tinha
sido uma ideia sensacional e ao mesmo
tempo ridícula. A oportunidade de
provocar um pouco de humildade em
Thoen foi irresistível, mas pensar que eu
poderia domá-la? Não, isso nunca. No
máximo seria agradável vê-la ser gentil
e humana por alguns dias. Mas ia
acabar. Mesmo que ela ainda passasse
alguns meses com a intenção de ser um
indivíduo melhor, as pessoas não
mudam. Isso eu já tinha aprendido muito
bem.
O problema agora ia ser resistir à
vontade de me envolver com ela.
Desci as escadas sem pressa.
Era incrível como ela conseguia ser
uma mulher que gerava opiniões
unânimes. No escritório onde
trabalhávamos, quando o assunto era
Dominique Thoen, todo mundo
concordava:
Ela era uma megera insuportável.
Ela era a melhor e mais temível
advogada do escritório.
E ela era gostosa.
Por Deus, como era gostosa.
Claro que homens e mulheres se
dividiam nessa última opinião. Homens
não negavam. Nós todos tínhamos plena
consciência de que ela era o tipo de
mulher que qualquer um de nós adoraria
espremer contra a parede. Mas as
mulheres usavam outros tipos de
elogios. Uns que facilmente são
confundidos com ofensas. Bastava
Dominique se aproximar e começava a
interminável sequência de “Vadia”,
“Como ela tem coragem de usar um
vestido tão colado em uma audiência”,
“Ela engordou” ou “Ela emagreceu
demais”.
Não, senhoritas, sinto muito.
Ela não está acima ou abaixo do peso.
A roupa é sensual e não vulgar. E quanto
ao “Vadia”… Bem… Isso era verdade.
Mas o fato inegável é que todas as suas
colegas de trabalho apenas a ofendiam
porque a admiravam. É o jeito feminino
de elogiar através de camadas e
camadas de inveja.
E Dominique dava muitos motivos
para ser invejada.
Abri a porta e deixei Max entrar
enquanto colocava sua ração.
Conseguia me lembrar de quando a vi
pela primeira vez. Tinha acabado de
entrar para o escritório, era a festa de
Natal na casa de um dos sócios
majoritários. Estávamos no salão
principal e eu a vi. Ela usava um vestido
amarelo que… Minha nossa… Era a
mulher mais bonita do salão. Talvez
fosse até a mulher mais linda que eu já
tinha visto na vida. Boa parte das
mulheres tenta ser exagerada para
chamar atenção. Um vestido muito
chamativo, uma maquiagem muito
trabalhada, fala mais alto ou mais
sugestivamente… Todas essas são
ferramentas à sua disposição. Mas Dom
era diferente. Ela era sensual de um jeito
quieto. E quando me olhou, seu olhar foi
tão penetrante que eu me senti
derretendo. À primeira vista, pensei que
ela fosse até a esposa troféu de algum
ricaço da festa. Foi com essa atitude que
me aproximei dela. E foi provavelmente
por causa dessa atitude que ela passou a
me odiar com todas as suas forças. E
quando Dominique odeia alguém, ela
realmente odeia. Acho que é isso que a
faz ser tão boa advogada: ela é intensa
com tudo.
Fiquei deslumbrado como uma
criança diante de uma loja de
brinquedos na primeira vez que a vi em
uma audiência. Ela dominava o ambiente
com tanta segurança que até o juiz
parecia precisar pedir licença para
interrompê-la. Era tão inteligente, culta
e sagaz que eu… Fiquei curioso.
E foi aí que comecei a conhecê-la
melhor. No escritório, não faltavam
apelidos para a poderosa Thoen. E
nenhum deles era carinhoso. Ela tratava
todo e qualquer colega com desprezo e
superioridade. Acionava na justiça
qualquer um com quem tivesse o mínimo
problema. Eu, inclusive. Em mais de
uma ocasião. Era rude e mal-educada.
Ambiciosa do pior jeito. Era fácil odiá-
la. Fácil até demais. Era quase como se
ela quisesse que todos fizessem isso.
Logo toda sua beleza, sagacidade e
competência perderam o brilho perante
meus olhos. E eu passei a trocar ofensas
veladas quando estava na sua frente e
xingá-la dos mais baixos nomes assim
que se virava de costas.
Havia algo escuro e podre em sua
alma. E eu não queria nada daquilo
perto de mim. Já tinha experimentado
podridão suficiente em minha vida.
E então aquele dia no fórum
aconteceu… E eu… Eu fiquei curioso
de novo.
Comi algo que podia ser preparado
rapidamente e olhei para Max. Passei os
dedos em seu pelo.
– Um banho, amigão?
Ele me encarou com seus olhos
castanhos e tristes. Ele não gostava de
banho. Mas que cachorro gosta?
Peguei os produtos dele de um
armário na garagem. Dominique
realmente estava levando a missão
mudança a sério. A casa estava ficando
impecável.
Sem querer, me peguei levantando a
cabeça para observar a janela do meu
quarto.
Tinha ido longe demais.
Droga.
Eu a beijei quando ela não queria ser
beijada. Sacudi os cabelos com força.
Tinha entendido tudo errado. Os toques,
os olhares, os sussurros. Achei que ela
queria também. Achei que era ciúmes o
que eu tinha percebido quando liguei
para dizer que tinha um encontro. Achei
que ela queria me ver nu do telhado por
desejo.
Belo dom de interpretação o meu.
Entendi tudo errado.
Ou talvez tenha entendido exatamente
o que ela queria que eu entendesse. Não
seria tão estranho assim se ela estivesse
só brincando comigo, seria? Quero
dizer, seria uma vingança bem típica
dela, na verdade.
Eu podia ter imaginado isso antes.
Mas ver aquele corpo escultural
rebolando de um lado para o outro
naquelas roupas curtas e leves estava
prejudicando meu raciocínio. E quando
ela montou em mim para tirar aquele
pedaço de pizza da minha boca eu
pensei que fosse ter um orgasmo.
Droga… Eu sou um homem decente.
Mas sou só um homem ainda assim, não
sou?
E mesmo antes do dia do fórum,
mesmo quando eu sentia nada além de
ódio por Dominique, mesmo assim,
aquele desejo latente sempre esteve ali.
Várias vezes eu menti para mim
mesmo. Eu ignorei e disfarcei. Mas se
em qualquer um desses dias ela tivesse
tirado minha roupa e dito “agora”, eu
teria ido. Era além da razão: eu queria
experimentá-la. Deve ser assim que uma
atração física absurda funciona.
Nesse ponto eu já estava sorrindo
sozinho, me lembrando de quando ela
ficou nua na minha sala. Ela achou que
eu queria transar com ela em troca de
não espalhar o vídeo. Se eu tivesse um
pouco menos de moral, só um pouco
menos, teria caído de boca naqueles
seios perfeitos. Teria puxado aquela
cintura linda para mim e a teria possuído
vorazmente. Experimentado sua umidez,
seu calor, sua saliva.
Meus olhos estavam fechando e eu
senti meus dedos tocando minha boca.
Arranhei meu rosto afastando o
pensamento e liguei a torneira. Ia jogar o
jato de água da mangueira em cima de
mim quando lembrei do celular no meu
bolso.
Tirei a camisa e a enrolei no celular
em um canto do jardim. Nem pensar em
deixá-lo na mesa da cozinha. Dominique
acordaria e iria direto destruir o
aparelho inteiro. Segurei o celular
sentindo a indecisão.
Eu ainda não conseguia acreditar que
a tinha visto se masturbando. Era tão
completamente surreal. Chegar em casa
e dar de cara com essa mulher
maravilhosa, nua e molhada, gemendo
de prazer. Se eu não fosse atraído por
ela antes, essa cena, definitivamente,
mudaria tudo.
Queria tanto ter coragem para ver o
vídeo. Queria muito. Mas a verdade é
que eu tinha ficado mais envergonhado
de vê-la se masturbar do que do fato de
ela ter me visto na mesma situação.
Joguei água gelada no meu corpo e
esperei a ereção, que começava a surgir
timidamente, desaparecer por completo.
Eu só queria me deitar em algum
lugar, fechar os olhos e relembrar
aquele beijo. Aquela boca macia, a pele
suave e o calor… Um fogo que só ela
podia apagar e que agora estava
desconfortavelmente preso nas minhas
entranhas.
Eu a queria mais naquele momento
do que antes do beijo.
Isso não era bom.
Precisava me concentrar.
Precisava me distrair.
Precisava aceitar que tinha entendido
errado e que não era isso que ela queria.
Eu sempre podia devolver o vídeo de
uma vez e mandá-la embora. Pelo menos
eu não teria que ver aquela bunda e
aquelas coxas naquele short minúsculo
por nem mais um insuportável dia.
Mas ela não me quer.
Eu teria que apagar o fogo de outro
jeito.

Fui dormir me sentindo uma


adolescente de dezesseis anos, insegura
e excitada, e acordei me sentindo uma
menina de doze, sem a menor ideia do
que deveria fazer a seguir.
Era sábado, o que significava que era
melhor resolver logo o que iria fazer
porque seria um dia inteiro de Holt.
Max estava latindo do lado de fora.
Levantei com dificuldade e fui trocar de
roupas, escovar os dentes, pentear os
cabelos… Meu tornozelo parecia um
pouco melhor. Era meu braço que ainda
me preocupava. Com os latidos de Max
como trilha sonora, eu fui até a janela e
puxei a cortina.
Ele estava no quintal de trás, com o
pelo coberto de espuma. Gregory o
segurava, tentando mantê-lo quieto. Sua
bermuda estava encharcada e ele estava
sem camisa. Exatamente o que eu
precisava…
– Quieto, Max. Comporte-se – puxou
a mangueira para enxaguá-lo, mas a cria
de Belzebu, como sempre, estava se
recusando a cooperar e logo Holt tinha
mais água sobre si mesmo do que sobre
o cachorro.
Soltei a cortina e dei um passo para
trás. Se a história me ensinava alguma
coisa era que se eu continuasse a
observar seu peito nu e molhado, Greg,
inevitavelmente, me pegaria no ato e aí
se seguiria um sequência interminável
de aleatoriedades incompreensíveis: ou
eu me jogaria para trás, com vergonha e
quebraria a outra metade do meu corpo,
ou abriria a janela para tentar explicar o
que estava fazendo e iria fazer algum
comentário completamente inapropriado
ou simplesmente ia sorrir e ir embora e
passar o resto do dia com Holt rindo da
minha tara semidisfarçada e odiando a
mim mesma por ter lidado tão mal com a
situação.
Não, obrigada. Hoje, eu poderia
passar sem nenhum incidente.
Depois que coloquei tudo de que
precisava em cima do balcão da
cozinha, pude preparar o café
devidamente sentada em um banquinho
alto. Pelo prato sujo de bolacha e a
xícara de café, pude perceber que Holt
não tinha se alimentado tão bem assim.
Vamos lá, Dom. Vamos mimá-lo um
pouco e ver se há como voltar atrás.
Derreti algumas fatias grossas de
queijo e fiz ovos mexidos. Até enfeitei
os pratos com frutas. Minha nossa… Eu
devia estar realmente gostando daquele
homem.
Empurrei a porta que dava para o
quintal traseiro:
– O café está pronto. – Ele levantou o
rosto surpreso, o que fez com que fosse
pego desprevenido por um Max molhado
e brincalhão. – Bom dia – acrescentei.
Ele segurou o cachorro, que pulava,
pelas patas da frente e o colocou de
volta no chão.
– Você não devia ter levantado! –
Desligou a mangueira e jogou uma
toalha em cima de Max, depois que o
cão tinha se sacudido espalhando mais
água. – Eu ia levar para você. Só não
sabia se estava acordada.
– Estou bem – sorri. – Venha de uma
vez – ordenei com um gesto.
– Nossa! – exclamou assim que
entrou.
– Para agradecer por ter salvado
minha vida – brinquei. – Mas é melhor
você se secar. E vestir uma camisa. E
nem pense em colocar esse cachorro
para dentro.
Eu mandei ele vestir uma camisa?
Por que diabos eu tinha feito isso?
Perdi o juízo?
Ele disse um “Sim, senhora” e saiu do
meu campo de visão por alguns
segundos. Voltou se secando com uma
toalha e com uma camisa nas mãos.
– Acho que quero salvar sua vida
mais vezes – comentou, servindo-se de
um pouco de tudo. – Você não quer subir
no telhado de novo?
– Depende. Você vai se masturbar no
banheiro?
Dominique! Não. Isso não foi legal.
Ele estava tossindo, engasgado com o
suco de laranja, e eu devia estar ficando
vermelha.
Certo. Vamos respirar fundo e
reassumir o controle. Primeiro, você não
fez nenhum comentário safado que nunca
tenha feito antes. Foi só uma piada sobre
a sexualidade dele e a sua. Por que está
com vergonha disso? E segundo, não era
esse o plano? Deixar claro que você
ainda está a fim dele?
– Você não devia começar a me
provocar tão cedo – riu. – É maldade.
Ele levou na brincadeira. Ótimo.
Aliás… será?
– Não posso evitar, Holt. Você me dá
muitas oportunidades – disse. Minhas
palavras saíam casuais e descontraídas,
mas por dentro eu era um poço de lava
venenosa e explosiva girando em um
turbulento redemoinho. O que Gregory
Holt estava fazendo com minha
autoconfiança? – O que vai fazer hoje? –
perguntei, e talvez minhas segundas
intenções tenham ficado estupidamente
claras.
– Não sei. Acho que preciso adiantar
um pouco do trabalho.
Ou talvez não.
– Quer ajuda?
Holt arregalou os olhos para mim.
– Com certeza! – exclamou
impressionado. – Mas… Você não vai
me cobrar ou algo assim, vai?
– Não em dinheiro, Holt. Mas você
vai ter que pagar pelos meus serviços.
– E não é sempre assim com você?
Havia algo estranho no seu tom de
voz e eu não consegui definir exatamente
o que seria. Ele estava dizendo que, de
um jeito ou de outro, as pessoas sempre
têm que me pagar. Se estivéssemos no
escritório eu diria que ele estava me
ofendendo indiretamente, como era o
padrão da nossa relação. Mas ele tinha
acabado de me beijar na noite anterior.
E foi um beijo de verdade. Ele não
podia simplesmente desligar um botão e
voltar a simplesmente acreditar que eu
sou uma vadia egocêntrica, podia?
Bebi um gole do meu suco e notei que
ele me observava por cima. Desviou o
olhar assim que o encarei de volta.
Na verdade, ele podia sim. Eu sempre
fui uma vadia egocêntrica e se ele tinha
encontrado o botão para desativar o
carinho que sentia por mim – ou pelo
menos, que eu achava que ele sentia –, a
atitude mais racional seria, de fato,
desativá-lo.
Terminamos o café em silêncio.
Certo, então nós não íamos conversar
sobre o beijo. Acho que, às vezes,
ignorar é uma atitude adulta também. Foi
um longo caminho do champanhe barato
na minha sala antes de sua mudança até
o beijo da noite anterior. Mas hoje ele
parecia diferente. Como se eu já não o
afetasse mais. Comecei a me perguntar
se algum dia eu o teria afetado. Talvez
ele só estivesse com tesão. Eu podia ter
imaginado o carinho. Só o que havia era
tesão.
É, Dom. Ele queria te comer. Viu que
não podia e desistiu. É só mais um
homem.
– Vou trocar de roupa. Obrigado pelo
café. Deixe tudo aí que eu limpo, sim?
Eu devo ter balbuciado um “tudo
bem”.
Holt era só mais um homem. Uma
criatura com um cromossomo Y e um
pênis que definia 70% das suas ações.
Nunca me incomodei com a ideia de
que um homem quisesse me comer. E a
palavra é essa mesmo: “comer”. Fazer
amor, sexo e até transar é o que você faz
com o seu namorado, noivo, marido.
Quem te come é aquele desconhecido na
balada, é aquele cara que tem uma
ereção só de pensar em você e que não
quer mais nada a não ser que ele meta
com força e depois te deixe suada,
exausta e muito, muito, satisfeita.
De um modo geral, as mulheres
consideram isso um elogio. Um que elas
sempre recebem de um jeito esnobe e
que, muito frequentemente, acabam
recusando. Eu não ligo pra essas
pequenas hipocrisias do cotidiano. Se
um cara quer me comer é porque ele me
acha gostosa e isso é um elogio. Se eu
achar ele gostoso, quero comer ele
também e tudo dá certo.
Mas por algum motivo, a ideia de que
Holt só quisesse me comer estava me
incomodando. Eu queria que ele
voltasse a me tratar com carinho. Queria
que ele sentisse vontade de me beijar só
por me beijar. Mesmo que aquilo não
levasse a mais nada. O que, obviamente,
não era o que estava acontecendo, dada
a sua óbvia desistência.

– Ahmm… Dom?
– Chamou?
Voltei para a cozinha e quase esbarrei
de frente com Greg. Ele me segurou
pelos braços e me apoiou para que eu
pudesse liberar o peso do meu pé.
Segurei seus braços sem nenhuma
intenção de largá-lo. Ele tinha terminado
de lavar a louça e a cozinha estava um
brilho. O que lhe faltava de habilidades
culinárias lhe sobrava de habilidades
com limpeza. E eu me peguei me
perguntando como sua casa tinha
conseguido ficar tão infernalmente
bagunçada. Talvez a sujeira tivesse
sido, de fato, especialmente para me
irritar.
– Será que você podia me explicar
uma coisa – ele tinha “diversão”
estampada no sorriso, e eu soube
imediatamente que havia algo errado.
– O que foi?
– Não sei. É só que… Não me parece
seu estilo.
Ele levantou o conjunto de roupa
íntima de arco-íris e eu revirei os olhos
para ele.
– É da vizinha – tomei o conjunto das
suas mãos.
– Ahmm… – seu queixo caiu e ele
ficou assim por uma fração de segundo –
Por que temos roupa íntima da vizinha
em casa? A pessoa… Que você ficou no
sofá… Foi…
Não consegui não rir.
– Não, Holt. Foi com um homem que
eu fiquei naquele dia. Não que seja da
sua conta, mas já fiquei com mulheres,
se você precisa saber. Em mais de uma
ocasião.
Seu queixo continuou caído. Ele
estava imaginando. Isso mesmo, meu
bem. Me imagine nua com uma mulher.
– Fui fazer compras com o pessoal da
vizinhança. A sua vizinha aí do lado
comprou isso e veio junto com as
minhas coisas. – Achei melhor resumir a
história. Ele não precisava saber que eu
tinha humilhado a menina na frente do
seu namoradinho.
– Tudo bem. Você já ficou com
mulheres – ele tinha esquecido
completamente do sutiã da vizinha –
Será que eu posso conseguir um vídeo
disso, também?
– Rá-rá – mostrei a língua pra ele.
– Você faz isso um bocado – apontou.
– Mostrar a língua pros outros.
– Não é pros outros – reclamei. – É
só pra você.
Acho que eu o ouvi murmurar um
“Ah, bom” antes de sair.
O trabalho que Holt precisava fazer
exigia quase nenhuma ajuda. Ele
conseguiria terminar tudo sozinho e bem
rápido. Parte de mim achou que ele tinha
usado o trabalho como uma desculpa
para não ter que me encarar durante o
fim de semana e, depois de quase uma
hora trancada no escritório com ele,
percebi que estar tão perto dele e, ao
mesmo tempo, tão longe, não estava
fazendo bem para minha saúde.
Andei até o quintal da frente e cruzei
os braços. As latas de lixo estavam
vazias. Tanto a comuns quanto as de
reciclagem.
Meu olhar seguiu sozinho para a casa
de Andy.
Eu posso fazer isso – disse Andy.
Voltei para casa e comecei a separar
o lixo: metal, papel, vidro e plástico.
Proteção ao planeta à parte, era até uma
tarefa divertida. E mantinha a mente
ocupada.
– Criou uma consciência foi?
– Porra! Você precisa parar de fazer
isso.
– Fazer o quê?
– Se aproximar dos outros de fininho
e gritar algo em seus ouvidos.
– Não me aproximei de fininho e
não…
– Sua lingerie ainda está comigo –
mudei de assunto. Acho que Andy
poderia se considerar a primeira pessoa
do universo com a qual eu odiava
discutir. – Na verdade, todas as suas
compras do outro dia. Quando eu
terminar isso aqui, vou pegar para você.
– Não tem pressa. – Tinha algo de
envergonhado em sua voz.
– Olha, se você achou aquela porcaria
de sutiã bonito não tem porque se
envergonhar.
– Será que você pode parar de ser
grossa?
– Não estou sendo grossa, garota.
Estou sendo objetiva. É diferente.
– É grosseria para mim – reclamou.
– Porque você é virgem. Eu entendo,
mas olhe…
Ela emitiu um rosnado
incompreensível e foi embora. E eu era
a grossa?
Andy entrou batendo a porta e eu
fiquei parada encarando sua casa. Se a
teoria de Holt fosse verdade, ela
também teria um motivo para ser tão
impossível daquele jeito.
Talvez fosse um motivo parecido com
o meu. Odiava isso, mas desde a revista
em quadrinho, eu não conseguia mais
olhar para aquela garota sem pensar em
mim mesma.
Eu podia tentar fazer algo por ela.
Teria que sair da minha zona de
conforto, mas poderia ajudá-la. A
pergunta era: será que valia a pena
insistir? Mesmo que à primeira vista ela
fosse insuportável?
Respirei fundo e voltei para dentro de
casa.
Aquilo não ia acabar com Holt me
amando ou com Andy virando minha
melhor amiga.
Estava ali só para arrumar a bagunça
de Holt e ir embora. Voltar para a minha
vida. Já tinha me metido em confusões
demais. Era melhor eu me lembrar dos
meus objetivos e voltar a me concentrar
neles. Ou então ia só gastar energia.

O trabalho era pouco mas eu não


estava conseguindo me concentrar em
nada. Não conseguia decidir se
Dominique estava interessada ou se
estava apenas brincando comigo. Aquele
beijo ficava girando na minha cabeça e
eu não conseguia adiar nem mais um
segundo.
Ela disse que ia se deitar, mas não
estava no quarto. Ao invés disso, a
encontrei sentada no sofá da sala de
estar, lendo.
– Você sumiu.
– Estava separando o lixo para
reciclagem e parei para conversar com
Andy.
– Reciclagem e contato social com
uma vizinha… Você é um extraterrestre
que substituiu Dominique, não é?
– Você está pedindo para eu te
mostrar minha língua mais uma vez. –
Uma única menção à sua língua e eu
tremi. Eu queria aquela língua de novo.
Muito.
Ela estava estirada no sofá com o pé
machucado esticado nas almofadas. Me
sentei ao seu lado, empurrando-a
gentilmente para que ela apoiasse as
costas nos meus braços. Tomei cuidado
para não abraçá-la do jeito que eu
queria, mas, naquela posição, estava
sendo um verdadeiro desafio.
– Como está o pé?
– A mesma coisa. O braço está
doendo mais.
Toquei seu braço com cuidado. Os
hematomas ainda estavam lá.
– Precisa de alguma coisa? Mais
analgésicos? Se quiser, posso te levar
ao hospital de novo.
Ela baixou o livro e se virou para me
observar. Agora ela estava praticamente
no meu colo, e eu passei um dos braços
ao seu redor.
– Estou bem. É sério.
– O que está lendo? – Eu sabia que
ela estava lendo e que eu estava sendo
irritante. Mas precisava puxar assunto.
Precisava conversar. Precisava…
saber.
– Um livro – riu.
Puxei o livro de suas mãos.
– Hey!
– “Um homem acusado injustamente
de estupro passa a viver à margem da
sociedade e a perder progressivamente
sua humanidade, acabando por se tornar
um serial killer”. Então… Nada de
revista de moda pra você, hein?
– Sou eclética – ela chiou, pegando o
livro de volta.
– É tipo Dexter?
– O seriado?
– É.
– Dexter é bonzinho, um anti-herói.
Ballard é um necrófilo, sociopata,
doente.
– Nossa. Literatura leve, hein?
– Como disse, sou eclética – ela disse
virando-se de volta para o livro e me
empurrando de leve com o cotovelo. Eu
estava ficando louco por aquele jeito
dela. Louco.
– Está bom?
– Até a metade estava achando um
dos piores livros que já li. Considerei
desistir, mas…
– Mas?
– Ficou estupidamente bom de
repente. Talvez um dos melhores livros
que eu já tenha lido. – Encarei aquele
comentário como uma oportunidade.
– Hmm… Acho que vale a pena a
gente insistir em certas coisas, então,
não é? A gente pode se enganar de
primeira.
Ela estava virando uma página e eu
deixei que meu tom sugerisse que eu
queria dizer mais do que minhas simples
palavras significam.
– Talvez – ela se moveu contra meu
tórax procurando uma posição mais
confortável e pelo jeito como se aninhou
contra mim, imagino que tenha
encontrado. – Mas, às vezes, algumas
coisas simplesmente não têm solução e é
melhor a gente continuar do jeito que
está.
– Mas, se você tentar, pode se
surpreender, não? Pode descobrir que a
segunda metade da história fez tudo
valer a pena.
– Mas também pode acabar gastando
todas as suas energias com uma coisa
sem solução. Gastar tempo que seria
melhor empregado em seus verdadeiros
objetivos do que com uma coisa que…
Só vai te tirar da sua zona de conforto
e… Para quê?
– Porque o risco pode valer a pena.
Pode ter algo incrível te esperando no
final. – Ela não tirava os olhos do livro
e eu aproveitava a oportunidade para
observar seu rosto. Cada linha. Ela era
uma mulher linda. Uma mulher linda que
não me queria.
– Eu acho que se você está bem como
está, tentar inovar é perda de tempo.
Senti alguma coisa dentro de mim
murchar. Precisava ter certeza. Puxei
Dominique para mim. Meu nariz estava
quase tocando no dela.
– É isso que você acha?
Eu a encarei e vi seus olhos escuros
se arregalarem.
– Holt… Eu…
– Você também me beijou, Dom.
– Holt…
– Você me beijou e foi só… Perda de
tempo para você?
– Não foi isso que eu quis dizer. Eu
estava pensando em… – De repente, eu
percebi que o problema estava
resolvido. Minha dúvida estava
esclarecida e eu não queria ouvir nem
mais uma palavra. Aquele era o tipo de
discussão que só ia insuflar ainda mais o
seu monstruoso ego. Sim, eu estou louco
por você. Quero te abraçar, te beijar e
fazer amor com você.
E você… Você não dá a mínima.
– Me desculpe por ter me esquecido –
disse levantando, e deixei que ela
voltasse ao seu livro. – Você só está
aqui por causa do vídeo. É tudo com o
que você é capaz de se importar: você
mesma.
Assim que cheguei às escadas já
estava sentindo um gosto amargo de
arrependimento na boca. Fui cruel. Eu a
tinha chantageado para que viesse até
aqui, não foi? E agora estava exigindo
que ela sentisse por mim o mesmo que
eu sentia? Era injusto.
Mas eu já tinha massageado o seu ego
o suficiente por uma noite sem ter que
voltar para assumir que estava
arrependido. Hoje, eu ia ser infantil.
Precisava extravasar. Tinha
Dominique atravessada na minha
garganta.
E aquele maldito fogo que ardia por
dentro, consumindo tudo que eu tinha
para dar. Estava morrendo de raiva.
Sabia que era irracional, mas não se
discute com raiva. Só se age. E eu tinha
um fogo que precisava ser apagado. Se
não por Dominique, por outra pessoa.
Do jeito que eu estava, qualquer
mulher teria que servir.
Capítulo 9
“Eu nunca vou querer ser nada além de
completamente feliz.”

Ashley – E o vento levou

O que é que eu faço agora?


Toda essa conversa sobre insistir em
algo e sobre segundas chances de Holt
só me fez pensar em Andy. Não pensei
que ele estivesse falando sobre… Ah,
merda. E agora?
Eu não conseguia mais olhar para ele.
A única coisa que me restava era correr
atrás de Gregory, dizer para ele como eu
me sentia e esperar que ele sentisse o
mesmo. Ele podia ter acabado de
insinuar que queria algo mais comigo ou
podia simplesmente estar preparando o
terreno para sexo. Homens fazem isso,
não fazem?
Como eu queria estar prestando
atenção quando ele começou a usar o
livro como analogia para a nossa
situação. Mas eu estava pensando em
Ballard e McCarthy e Andy. Não estava
pensando nele. E agora, não importava o
quanto eu me esforçasse, simplesmente
não conseguia lembrar quais foram suas
palavras exatas.
Subi as escadas e encontrei a porta do
seu quarto fechada. Levantei a mão em
punho para bater na porta.
Chega disso.
Diga que ficou com um homem
casado. Diga que não sabia. Diga que
está com tesão por ele. Aceite o que ele
disser de volta e pronto.
Respirei fundo e ia bater na porta.
Mas lembrei de algo que fez meu
coração se fechar em sua conhecida e
confortável casca impenetrável.
E daí?
E daí que eu fiquei com um homem
casado? E daí se eu sabia ou não? E daí
se Holt fosse ficar enojado?
Aquela semana inteira trancada
naquele lugar infernal me fez baixar a
guarda. Fez com que eu me importasse
com um bocado de coisa e um bocado
de gente. Mas uma verdade era
inquestionável: quando o mês acabasse
eu voltaria para a minha casa, para o
meu trabalho, para a minha vida. Bem
longe de Holt e Eric e Andy e toda a
sorte de loucuras que aquela vizinhança
escondia.
De que adiantaria aquele trabalho
todo? Só pra transar com Holt? Eu ainda
ficaria ali por mais algum tempo. Se a
oportunidade se apresentasse eu
transaria com ele. Se não se
apresentasse, meus vibradores ficariam
bem ocupados quando eu voltasse para
casa. E pronto.
Já basta de congelar, de ficar sem
saber o que dizer, ficar envergonhada e
constrangida diante dele.
Joguei a mão com força em três
batidas seguras contra sua porta.
– O que você quer?
– Sou uma convidada na sua casa e
você está sendo grosso.
– Eu não sei o que fazer com você,
Thoen.
– E nem precisa. Eu sei o que fazer
comigo mesma bem o suficiente.
Obrigada.
– Queria que você falasse comigo.
Mas não desse jeito – disse, apontando
para mim. – Queria que falasse como um
ser humano.
– Não te devo satisfações, Holt. –
Não fui grosseira, apenas objetiva –
Você me beijou. Eu te beijei de volta.
Não estava no clima para transar e te
interrompi. Não quis ofender seus
sentimentos. – Ele olhava para mim com
um sorriso ultrajado e descrente nos
lábios. – Não me entenda mal. Você é
muito bonito e sedutor. Mas eu não
estava com vontade.
Ele mordeu o lábio com raiva
enquanto balançava a cabeça
afirmativamente.
– Mais alguma coisa?
– Vou até a casa da vizinha devolver
as coisas dela.
– Se demorar, pode ser que quando
voltar eu tenha saído. Não me espere
para jantar.
– Eu não ia mesmo.
Ele fechou a porta contra o meu rosto.
Respirei aliviada. A vadia que não se
importava com ninguém estava de volta
e eu tinha sentido muito a falta dela.
Ele disse que ia sair e que não tinha
hora para voltar… Provavelmente ia
atrás da piranha do outro dia. Mas…
Holt que se dane.
Eu não ligo mais.

– Suas coisas.
– Eu disse que não tinha pressa. –
Andy pegou os pacotes das minhas mãos
e os colocou no chão ao lado da porta. –
E você… Você pode ficar andando por
aí? Seu pé não parece legal. Nem seu
braço… O seu amigo te espancou foi?
– Não – estreitei os olhos para ela.
– Ah… Porque eu super entenderia se
ele tivesse feito isso.
– Obrigada – resmunguei, virando de
costas.
– Por que você faz questão de ser tão
desagradável?
– Porque as pessoas me julgaram
inferior a minha vida inteira por ser
filha de um zelador. Porque minha mãe
riu quando eu disse que ia entrar no
curso de direito e disse que com a minha
bunda eu tinha melhores chances na vida
conseguindo um marido rico. Porque
meus colegas de faculdade eram elitistas
filhinhos de papai que não suportavam
o fato de que minhas notas eram
melhores do que as deles. Porque eu
sempre tive que, na minha vida inteira,
trabalhar quatro vezes mais pesado do
que qualquer outra pessoa para atingir
metade do sucesso. Porque todas as
vezes que eu me importei com outras
pessoas elas me abandonaram, me
traíram, me usaram ou me
decepcionaram. Porque eu estou muito
bem sozinha e, quando eu sou gentil, as
pessoas acham que podem se aproximar.
E quando elas se aproximam quem se
fode sou eu. Então, não, eu não faço
nenhuma questão de ser agradável e de
ficar cercada de pessoas que só vão me
trazer problemas.
Eu estava naquela situação mais uma
vez: última gota d’água. Não aguentava
mais todos me questionando por que eu
era como eu era.
– Calma. Foi só uma pergunta.
– Não, não foi só uma pergunta,
Greenpeace. Foi uma tentativa de me
ofender. De novo. Parabéns, dessa vez
você conseguiu.
– É muito ceticismo da sua parte.
Nem todo mundo vai te magoar.
– Mas o risco é bem grande. E eu
optei por não me arriscar mais. A
decisão é minha, será que dá pra todo
mundo começar a respeitar isso?
– Você parece ter se aproximado do
seu amigo. O Holt.
– É. E que bem isso me fez?
Fiquei encarando a menina com fúria
nos olhos.
– Parece que você está descarregando
seus problemas em mim. Nunca te
abandonei, nem te traí, nem nada do
tipo. Então, por favor, pare de me olhar
como se eu fosse o resumo de todos os
problemas da sua vida. – Ela não soava
exatamente constrangida. Era mais…
indignação.
– Só vim entregar suas coisas –
concluí, tentando recuperar o fôlego e a
calma. Entre perder minha autoconfiança
na frente de Holt e o meu autocontrole
na frente de Andy, aquele lugar estava
me transformando em outra pessoa.
– Se ficar aqui é tão ruim, por que
você não vai embora? – ela exclamou
quando eu já estava a alguns passos de
distância.
– Porque Holt está me chantageando
com uma gravação de sexo!
Foda-se.
Foda-se tudo nessa merda.
Cansei.
– É o quê? – seu queixo caiu
descomunalmente, e ela olhou chocada
na direção da casa do vizinho.
Eu ia virar de costas e deixar que ela
pensasse o que quisesse, mas Andy
correu atrás de mim e me segurou pelo
braço.
– Você precisa denunciá-lo para a
polícia!
Suspirei, pedindo encarecidamente ao
meu autocontrole que voltasse logo.
– Não é o que você está pensando.
Ele é um cara decente e eu sou uma
pessoa horrível. – repeti roboticamente,
acenando como quem conduz uma
sinfonia – Foi uma brincadeira.
As palavras saíram doces da minha
boca.
Holt nunca colocaria aquele vídeo na
internet. Ele simplesmente não faria
isso. Independente de eu cumprir o
acordo ou não. Mas eu já estava ali e
podia ter perdido minha confiança e meu
controle, mas, por Deus, eu não perderia
o meu orgulho. Ia até o fim com essa
história toda.
– Ele está querendo te dar uma lição,
é? – ela riu, e eu percebi que ela tinha
mudado de lado.
– Pode fingir que não está achando
tão bom?
– É difícil – riu. – Você é muito chata.
Observando de fora pode parecer
louco. Mas, de repente, eu não
conseguia parar de achar graça na
situação e fiquei rindo com uma maluca
no seu gramado.
– Olha… – ela começou. – Você
parece meio mal e eu… eu não estou
fazendo nada. Você quer… – ela indicou
a porta da própria casa.
Eu não morria de amores pela garota,
mas me esconder de Holt pareceu uma
boa ideia.

– Não acredito que você se masturbou


do lado de fora!
– Ah, pare de ser tão virgem, Andy.
Ela abriu a boca com indignação.
– Ah, você pode me chamar de chata,
insuportável e vadia, mas eu não posso
te chamar de virgem?
– Não sou virgem – afirmou,
encarando os próprios pés.
Mentira.
Olhei para ela com ares de quem
reconhece uma mentira.
– Tá, talvez eu seja um pouquinho –
confessou.
– Como alguém pode ser um
pouquinho virgem? – bati as mãos nos
joelhos e senti meu pulso doer.
– Eu já transei com um cara. Uma vez.
Só foi… estranho.
– Pare. Pare – balancei as mãos para
ela. – Está me dando pena – ri, e ela me
acompanhou.
– Não sou uma mulher bonita – deu de
ombros. – Tive poucos pretendentes. E
quando finalmente aconteceu, acho que
ele não era o cara certo. E aí foi… ruim.
– O “cara certo” é uma ilusão da sua
virgindade – disse, fazendo as aspas
com os dedos.
– Você tem que ficar repetindo a
palavra com “v”?
– Virgem, virgem, virgem. Cresça,
Andy.
– Ah, claro. Você fica repetindo como
uma criança e a infantil sou eu?
Virgindade é uma coisa importante na
vida de uma mulher.
– Concordo. Não foi isso que eu
disse?
– Não. Você disse que o “cara certo”
era uma ilusão – ela disse, exagerando
nas aspas com os dedos, me imitando.
– Eu não disse isso. Disse que era
uma ilusão da sua virgindade.
– E o que diabos isso quer dizer?
– Quer dizer que essa coisa de cara
certo só existe enquanto você é virgem.
Aí você perde o hímen e vira sexo. Vira
orgasmo. De preferência gostoso e com
frequência.
Ela riu com o rosto enfiado nas mãos.
Pelo seu jeito eu tinha certeza de que ela
não tinha ninguém com quem conversar
sobre aqueles assuntos.
– Com quem você perdeu a sua…
sabe?
– Virgindade? Ah, com um cara.
– Um cara?
– É. Um cara. A gente namorou por
um tempo, mas acabou.
– Você se arrepende?
– Nem um pouquinho – sorri. – Mas
acho que varia de mulher para mulher.
Me conta, você queria experimentar o
Calvin, é isso? Não fica vermelha!
Responde!
– Eu acho ele bonito. Mas, sei lá…
Acho que não sou o tipo dele.
– Toda mulher é o tipo de qualquer
homem. Basta você saber se vender.
– Não vou me prostituir! Você ficou
louca?
– Ah, garota! Me acompanha! É só
uma expressão. Eu sou advogada, você
acha que eu ia sugerir a alguém que
fizesse algo ilegal?
– Não sei. Tem advogado de todo o
tipo.
– Não sou desse tipo.
– Você ficou com um homem
casado…
– E o que isso tem a ver? Você quer
ajuda com o Calvin ou não?
– Quero. Desculpe.
– A primeira coisa que você precisa
fazer é perder a vergonha.
– Dominique, a não ser que tenha
algum remédio que resolva, não me vejo
perdendo a vergonha assim tão fácil.
– É porque você é inexperiente! Fica
mais fácil com a prática. Mais…
natural.
– Então eu perco a vergonha e pratico
com ele?
– A gente pode fazer isso também.
Mas não acho que é uma boa ideia.
– Por quê?
– Porque você está nervosa,
envergonhada e a fim dele. Já teve uma
experiência ruim com sexo e a
combinação desses elementos não vai te
ajudar. Além disso, ele tem cara de
homem que não presta, fique avisada! –
apontei um dedo pra ela. – Do tipo que
usa e vai embora. Se acontecer, vai estar
pronta pra isso?
– Ou ele pode se apaixonar por mim.
– É. Em um filme da Disney.
– Não vou fazer sexo com qualquer
um.
– Você tem alguma inclinação
religiosa?
– Não.
– Quer transar de novo só depois do
casamento?
– Não.
– Esses são dois motivos válidos e
bem grandes para esperar. Fora isso, é
só se sentir pronta. Diz pra mim: você
está com vontade de experimentar de
novo? – Ela me observou, hesitante. –
Fala garota! Para de ficar com vergonha!
– Não sei! É fácil pra você! Eu não
tenho experiência, está bem? Foi ruim
e… E se for ruim de novo? E se for ruim
sempre?
Revirei os olhos para ela.
– Não vai ser ruim sempre, Andy!
Acredite. É complicado quando você
está nervosa. Para gozar tem que
relaxar! – disse, e ela riu. – Estou
falando sério! É por isso que ir direto ao
Calvin é uma má ideia. – murmurei mais
para mim do que para ela. – Você
precisa aprender a relaxar. E não tem
jeito de fazer isso a não ser praticando,
entendeu? – perguntei. Ela fez que sim. –
Você é uma mulher feita. Paga suas
contas. Vive sua vida. Não é? – Mais
uma concordância. – Sexo é natural,
Andy. É como comer ou ir ao banheiro.
É algo do corpo. O único mistério que o
sexo tem é o mistério que você dá a ele.
Está na sua cabeça. Se você não
estivesse pronta, eu te diria para esperar
que o cara certo aparecesse na sua frente
com um alto-falante e um show de
pirotecnia. Mas garota, se você está
pronta pra transar, vai lá e transa. Não
deixe uma única experiência ruim te
enganar. Sexo é muito bom.
Ela sorriu envergonhada.
– Só tome cuidado para não
engravidar ou pegar alguma doença.
Conheça o cara minimamente para não
correr o risco de ser alguém que vai te
forçar a fazer algo que você não quer. E
evite lugares públicos onde você possa
ser pega. Pelo menos nas primeiras
vezes – pisquei para ela.
– Você acha que é mesmo assim tão
simples?
– Para mim, pelo menos, sempre foi.
A impressão que eu tenho é que as
mulheres tendem a esperar pelo cara
certo porque transam sem estarem
prontas. Então, elas usam a desculpa
“mas foi com o cara que eu conhecia
desde a infância e com quem eu
namorava há três anos”. Tem tanta
magia envolvendo a perda da
virgindade feminina que nós todas,
enquanto gênero, achamos que temos que
ter uma boa história sobre a primeira
vez para contar ou será arrependimento
eterno. É bobagem. Não é que transar
com o amigo de infância com quem você
namora não seja o ideal. Provavelmente
seja. Mas não vale a pena permanecer
virgem quando você está louca por sexo
só porque nenhum amigo de infância se
apaixonou por você, sabe? Quando você
está pronta e se sente pronta, pode ser
com qualquer cara. Porque o que
importa não é ele, entende? É você. O
sexo não é pra ele. É pra você.
– Dominique, você me ouviu dizer
que não sou mais virgem, não é?
Mordi o lábio e sorri. Acho que parte
de mim estava achando difícil acreditar.
– Foi só uma tangente do assunto
principal – lembrei. – Estou só dando
minha opinião.
– Acho que eu concordo com você –
balançou a cabeça, educadamente.
– Concorda comigo? – arregalei os
olhos, descrente, e puxei as cortinas
olhando para o céu – Vai chover
canivete.
– Pare – ela riu. – Mas e o Holt?
– O que tem o Holt? – Ah merda.
Queria me distrair e não falar dele.
– Ele é o cara certo pra você?
– Menina, você precisa parar com
essa obsessão com o “cara certo”.
– Sei lá, é só que… Ele te conhece e
ainda assim te quer por perto – riu. – O
que há de errado com ele?
Aquela era uma boa pergunta.
– Vai ter que perguntar a ele.
– Você já transou com ele?
– Não. E isso não é uma pergunta
muito apropriada.
– Você acabou de sugerir que eu
transasse com qualquer um. Acho que já
ultrapassamos a barreira do
“apropriado” há umas oito menções de
virgindade.
– Verdade. Não, não transei com
Holt.
– Mas queria?
– Que diabos de pergunta é essa?
– Você engole a seco toda vez que
menciona o nome dele. É estranho.
– Você não me conhece. Eu posso
engolir a seco um bocado.
– Achei que você era tipo Deusa de
todos os homens.
– Por que acharia isso?
– Por que você é bonita e…Tem um
corpo bonito. E é segura e confiante.
Não sei – deu de ombros.
– É. Mas essas coisas todas somem
quando fico perto de Holt. Ele tem uma
espécie de aspirador que suga toda essa
segurança e confiança – resmunguei.
– Então você gosta dele?
– Gosta dele? Você tem doze anos?
Eu estou atraída por ele, sim. Queria
transar com ele, sim. Mas não acho que
isso vai acontecer.
– Por que não?
– Ótimo. Arranjei um guru do sexo.
– Responde, Dominique!
– Um guru do sexo virgem.
Ela me encarou com uma careta e ia
dizer, mais uma vez, que não era mais
virgem. Mas eu continuei:
– Ele é muito… decente. E eu transei
com um homem casado. Não sei como
falar sobre isso com ele.
– Você sabe como me dizer que eu
sou uma imbecil por não ter muita
experiência na cama, mesmo eu sendo
uma completa desconhecida, mas não
consegue explicar um erro honesto para
um cara que você conhece há anos?
– Pois é. Vai entender. Tenho travado
perto dele por algum motivo.
– O nome desse motivo é “amor”.
Expirei fundo resgatando minha
paciência.
– Não seja tão apocalíptica, virgem.
Às vezes, tesão tem os mesmos
sintomas.
– Mas pode ser que…
– Não quero falar sobre Holt.
– Mas…
– Não quero, Andy! Ele saiu hoje.
Tem um encontro. Eu e ele… Não é uma
coisa que pode dar certo. Deixe pra lá.
– Mas ainda estamos no meio da tarde
– olhou para o relógio.
– Então, talvez ele não tenha saído
ainda – disse e me estiquei para olhar
pela janela. Podia ver o caminho da
entrada até a garagem, mas não podia
ver a garagem em si. Não havia como
saber se seu carro ainda estava lá. –
Além do mais, não vou me preocupar
com isso. Hoje nós vamos sair, eu e
você. Vamos arranjar um homem que te
interesse.
Ela começou a rir.
– Desde que seja depois dos
biscoitos, eu deixo você bancar a
cafetina.
– Vou ignorar o comentário da
cafetina. E o que você quer dizer com
“biscoitos”.
– Quero dizer aquelas massas doces
de comer.
Olhei feio para ela.
– É um senhor que mora aqui perto.
Ele tem câncer. Eu e Rick…
– O Thierry?
Ela piscou.
– Como você o conhece?
– No hospital, ontem. Depois que eu
caí. Cruzei com o Rick.
– Ah! Ele é um doce. Cuida do
Thierry como se fosse seu pai.
– Notei.
– Mas, de qualquer modo, aos fins de
semana nós sempre passamos por lá
para ficar um pouco com ele.
Conversar… Ele gosta de jogar baralho.
Pobre Thierry. É tão sozinho.
– Ele me convidou para ir até lá um
dia. Eu vou com você, então. E, depois
dos biscoitos, você não escapa.
Passava das sete horas da noite
quando saí do cinema. Em sua
mensagem, Dominique dizia que ia
passar a noite fora. Aparentemente, nós
dois estávamos competindo para ver
quem conseguia ser mais imaturo.
E eu estava cansado de perder.
Lynn já estava no bar quando eu
cheguei.
– Greg! Foi um prazer receber sua
ligação.
Seus cabelos loiros eram curtos e
lisos. O corpo esbelto estava coberto
por um vestido preto de uma
sensualidade discreta.
– Sinto muito ter desmarcado nossos
planos ontem, Lynn. E também por ter
ligado hoje tão em cima da hora.
– Ah, não é problema – ela disse,
tocando meu braço assim que me sentei
ao seu lado. – Ia passar o fim de semana
trabalhando. Esse caso Merkin está me
dando dores de cabeça. Precisava
mesmo de uma bebida.
– Vamos dar um jeito – sorri. – Tenho
certeza de que vamos dar um jeito de
provar que o Harris está mentindo.
– Você parece bem confiante disso,
Greg. Queria ter metade do seu
otimismo.
– Sei que tem algo ali que não
estamos vendo. – Se Dominique tinha
encontrado, eu iria encontrar também. A
não ser que aquela criatura demoníaca
no corpo de uma deusa estivesse
mentindo só para me irritar. O que,
considerando seu histórico, era bem
possível.
– Pois então vamos nos dedicar para
encontrar – ela completou e levantou sua
taça de vinho em um brinde assim que
minha dose de uísque chegou.
Brindamos e eu virei metade da dose.
Olhei fundo nos seus olhos. Azuis. A
cor errada.
– Diga-me, Greg. Por que eu estou
aqui? – Lynn tinha uma voz suave e
derretida quando se dirigiu a mim.
– Eu não sei. Eu… – Passei os dedos
nos cabelos. Eu não queria aquela
mulher. Era Thoen quem eu queria nua
na minha cama.
– Teve uma semana longa? –
perguntou, apertando meu ombro.
– Mais ou menos. – “Longa” nem
começava a descrever minha semana.
Ela se virou no banco alto na beira do
balcão e ficou de frente para mim. Senti
uma de suas mãos na minha coxa, quase
na minha virilha.
– Greg, você quer sair daqui?
Lembrei da sua silhueta enrolada no
edredom. O gosto delicioso da sua boca.
O toque de sua pele quente. Se eu
fechasse os olhos bem apertados
poderia fingir que Lynn era ela.
– Quero.
Os biscoitos de Thierry eram
realmente bons. Não eram nada de
espetacular. Mas eram gostosos.
– E agora?
Rick estava mostrando algo em um
tablet para o debilitado homem sentado
no sofá.
– Agora nós vamos nos arrumar para
sair. Você já me enrolou a tarde inteira,
Andy. Biscoitos, baralho, conversas. Já
é quase oito horas e nós vamos sair!
– Tudo bem, tudo bem! – levantou as
mãos, rendida.
– Vou trocar de roupa e te encontro na
sua casa daqui a uma hora, está bem?
– Dominique, não tenho certeza se…
– Ela olhou ao redor. – Tá. Está bem.
Vamos.
– Thierry, obrigada por tudo! – Rick
fechou a porta e eu já tinha cruzado a rua
quando vi o Porsche Boxster
estacionado na garagem.
– Uma hora? – Andy perguntou já do
seu lado da cerca. Eu confirmei e entrei
em casa. Holt já tinha voltado e uma
série de pensamentos inundou minha
cabeça. Eu podia parar de ser uma
megera e ir conversar com ele.
Conversar como um ser humano, como
ele tinha pedido. Se eu fizesse isso, ao
invés de sair com Andy, minha noite
poderia terminar de um jeito bem
diferente.
Estava sentindo falta de alguém.
Onde estava Max? Holt não entraria
em casa e deixaria seu babão favorito
ainda preso no quintal. Abri a porta dos
fundos e o cachorro quase me derrubou.
– Você está aqui fora sozinho há um
tempão, não é, rapaz? – alisei seu pelo.
Estava macio e cheiroso depois do
banho. Quase dava vontade de abraçá-
lo. – Vem, menino. Vem pra dentro.
Ouvi um barulho no andar de cima e
Max me seguiu quando subi as escadas.
Meu coração estava batendo
desconfortavelmente. Algo estava
errado.
O barulho estava vindo do quarto
dele. Eu queria chamar seu nome e
perguntar se estava tudo bem, mas algo
em minha mente estava gritando para
que eu ficasse quieta e, mesmo sem
saber por que, obedeci.
Virei o corredor e o barulho ficou
mais alto. Minha garganta secou e ardeu.
Eu reconhecia aqueles sons bem demais.
Era como se um piloto automático
tivesse assumido minhas funções e ele
estava mandando meu corpo colocar um
pé atrás do outro e continuar em frente.
A porta do seu quarto estava aberta e
a luz do criado mudo estava acesa.
Holt estava só de cueca com seus
braços envolvendo e apertando uma
piranha loira e esquálida.
Algo dentro de mim rachou e doeu
como nada nunca tinha doído na vida.
Meus pulmões congelaram e eu não
conseguia respirar. Um ardor
insuportável subiu pelo meu nariz até
chegar aos meus olhos e o mundo ficou
embaçado.
Eu tentei engolir, mas não havia uma
gota de saliva na minha boca.
Tente respirar, Dom. Você precisa
sair daqui.
Eu estava parada como uma estátua no
meio do corredor, bem em frente à
porta. Uma virada de cabeça e Gregory
veria minha figura patética hipnotizada
por um sofrimento difícil de descrever.
Ele gemeu e a beijou e eu quis
morrer.
Dei um passo para trás e desejei
sumir dali sem deixar rastros.
Mas Max tinha outros planos.
Ele latiu e pulou para frente. Sua
coleira tinha escapado por milímetros
da minha mão frouxa e frágil. Em dois
segundos, o labrador estava em cima da
cama.
Greg se virou para tentar segurá-lo,
mas ele já tinha as patas nos
travesseiros e o focinho no cabelo loiro
de uma mulher histérica.
Se ele queria lambê-la ou mordê-la,
eu não soube dizer. Mas estava
esperando que fosse a segunda opção.
Morde ela, Max. Morde ela.
Holt puxou seu cachorro pela coleira
e se virou para colocá-lo no chão. Sua
expressão era um misto de pânico,
confusão e incômodo.
Levantou o rosto e nós nos
encaramos. Na cama, a loira estava se
tapando com o lençol.
– Não sabia que você tinha voltado. –
Meu orgulho era tudo que me mantinha
em pé, e eu queria agradecê-lo por ter
forçado minha boca a usar palavras
compreensíveis em vez de deixar meus
pés ganharem a briga e saírem correndo.
– Vou levar Max lá para baixo.
– Dom…
Não sei de onde tirei forças para
andar até o meio do quarto e pegar o
cachorro pela coleira. Ele resmungou
com um latido baixo, mas me seguiu
obediente. Ainda consegui cumprimentar
a vagabunda com um rápido olhar e um
gesto com a cabeça.
Finja indiferença, Dom. A palavra de
ordem é indiferença.
Assim que puxei Max, Holt tentou
colocar a mão na minha cintura.
– Dominique.
Desviei do seu toque e assim que fiz a
curva no corredor e estava certa de que
eles não podiam mais me ver, corri
pelas escadas abaixo. Meu pé doeu
como se alguém estivesse enfiando
navalhas em chama ao longo das minhas
articulações, mas eu mandei tudo ir se
foder e continuei a correr.
Fechei a porta de casa atrás de mim
para que Max não me seguisse.
Atravessei o gramado da casa de
Andy, sentindo minha respiração curta e
ofegante. Eu tinha lágrimas amargas,
azedas e mais de toda a sorte de gostos
horríveis descendo pelas minhas
bochechas.
Esmurrei a porta de Andy com força e
ouvi Holt chamando meu nome. Ele deve
ter demorado a colocar algumas roupas
antes de me seguir. Ou talvez estivesse
explicando para a vagabunda aonde
estava indo…
A porta se abriu.
– Dominique? Mas ainda não…
Eu me enfiei dentro de sua sala e me
abaixei no sofá. Tinha plena convicção
de que, assim que ele colocasse o pé do
lado de fora, me veria pelas janelas de
Andy.
Ela ainda estava com a porta aberta,
me encarando em uma tentativa
desesperada de encontrar um sentido
naquela cena absurda.
Meu coração batia na minha garganta,
e eu sentia as lágrimas caindo
ininterruptas de meus olhos inundados.
Escutei Holt chamando meu nome,
dessa vez mais alto e mais perto. Andy
olhou pela janela e eu soube que ele já
estava fora de casa.
– Por favor, me esconde.
O que era aquilo?
O que era aquela dor?
Aquela falta de controle?
A falta de discernimento?
Fazia anos que eu não chorava
daquele jeito. Anos que eu não sentia
vontade de derrubar uma lágrima sequer.
E agora…
Eu não conseguiria olhar para ele.
Não sem perder dois terços da minha
dignidade.
– Por favor, Andy – juntei as mãos e
implorei. Ela ainda mantinha a porta
aberta, confusa. Se Holt começasse a
andar pela rua me procurando, iria me
encontrar encolhida e encharcada de
lágrimas na casa de uma desconhecida.
Aquilo ia ser muito mais do que eu
podia suportar.
– Me esconde, por favor.
Ela fechou a porta com cuidado e
apagou a luz da sala, antes de se
ajoelhar ao meu lado.
Eu enfiei minha mão boa na boca e
mordi. Tinha um choro incontrolável
chegando e eu não sabia o que poderia
fazer quando ele chegasse.
Abracei meus joelhos e senti Andy
esfregando minhas costas. Apoiei a testa
nas mãos e chorei em silêncio.
Era hora de admitir.
Eu estava irreparavelmente
apaixonada por Holt.
Capítulo 10
“Sonhos, sonhos. Sempre sonhos com
você. Nunca senso comum.”

Scarlett – E o vento levou

– Você quer me contar o que


aconteceu?
Eu tinha secado minhas lágrimas, mas
o gosto salgado ainda estava grudado na
minha pele.
– Dom, por favor, me diga que ele
não te bateu.
Ela tinha os olhos semicerrados e
preocupados cravados em mim. E eu
comecei a rir. Era um riso louco.
– Eu caí do telhado. Fui buscar a bola
que os moleques chutaram lá e me
distraí.
– Se distraiu?
– Vendo Holt se masturbar. – Ela
abriu a boca e manteve a boca aberta.
Sem querer, aquela garota esquisita
tinha se tornado minha confidente. Não
sabia como tinha acontecido ou se
aquele era o jeito certo. Nunca tive uma
confidente antes. – Mas não, Andy, ele
não me bateu.
– Tudo bem. Mas o que houve?
Apoiei minha cabeça contra a parede
e fechei os olhos.
Vamos, Dom. Diga as palavras em
voz alta.
– Estou apaixonada por ele.
– E isso é ruim porque…
– Porque ele estava na cama com
outra mulher.
– Agora? Cachorro traidor!
– Não exatamente. Nós não estamos
juntos, então… – dei de ombros.
– Ah. – Ela olhou ao redor, confusa. –
Mas ele correu atrás de você. Ele largou
a outra na cama?
Era verdade. Ele podia simplesmente
ter fechado a porta e voltado a montar na
lambisgoia. Mas não. Ele tinha largado
tudo e corrido atrás de mim. Mordi o
lábio. Não queria depender de
suposições. Tudo que eu sabia era que
ele tinha desistido de mim e tinha saído
com outra mulher. Isso era o que eu
sabia com certeza.
Algumas batidas incisivas na porta e
eu me sobressaltei.
Andy passou o polegar nas minhas
bochechas, limpando minhas lágrimas, e
depois colocou o indicador sobre a
própria boca indicando que eu ficasse
em silêncio.
Ela girou a maçaneta e eu me encolhi
no escuro.
– Olá, sou Gregory Holt. Seu vizinho.
– Eu conseguia ouvir sua voz. Ela
entrava em mim atravessando pele e
carne. É, eu estava apaixonada por ele,
mesmo. Certeza. – Você conhece minha
amiga, Dominique Thoen?
– Sim. Estávamos juntas hoje à tarde.
Ótima pessoa. É linda, não é?
Enfiei a cara nas mãos. Não, Andy,
fique quieta.
– Ah, sim. Você a viu? Agora há
pouco?
– Não. Acabamos de nos despedir.
Ela foi para casa. O que houve?
– É que… Tivemos um problema e…
Ela está machucada. Estou preocupado.
Se a vir, por favor, diga a ela que ligue
para mim ou que volte pra casa.
– Ah, sim. Com certeza. Mas ela está
bem?
– Espero que sim. Ela não devia estar
andando por aí, está com o pé
machucado.
– Se a vir, passarei o recado.
– Obrigado.
Andy fechou a porta e voltou para o
meu canto no escuro.
– Você ouviu? Ele está preocupado.
Não era melhor…
– Voltar para dizer que entrei em
desespero ao vê-lo com uma mulher?
Não. Má ideia.
– Olha, eu não entendendo desses
jogos de sedução ou seja lá o que for
que você esteja fazendo, mas ele
pareceu honestamente preocupado.
– Não é “jogo de sedução”, Andy. É
jogo de orgulho. E se Holt me vir
assim, eu perco para sempre.
– E seria tão ruim assim? Perder?
Alguém estava batendo na porta mais
uma vez.
Andy gesticulou para que eu fizesse
silêncio mais uma vez.
– Você está bem?
Era Rick. A anfitriã botou a cara para
fora da porta e hesitou enquanto pensava
no que fazer. Logo depois, puxou Rick
pela gola e o colocou dentro de casa.
– O que está acontecendo? Estava
saindo da casa do Thierry e vi a
Dominique correndo para cá. E depois o
Gregory a seguiu e…
– Shhh! – ordenou Andy. – A gente
está escondendo Dominique.
– Andy! – reclamei.
– Escondendo? Ele… – Rick tinha os
olhos cravados em mim – Ele te
machucou?
Ai meu deus… Isso de novo.
– Não seja ridículo, Rick. – Andy
interveio como se ela mesma nunca
tivesse pensado algo parecido – Ela está
apaixonada por ele. Mas ele estava na
cama com outra mulher.
– Nossa! Essa vizinhança atrai
traidores?
– Ele não é meu marido – eu disse
enquanto me apoiei no sofá e comecei a
me levantar. Os dois se aproximaram
para me ajudar – E não estamos juntos.
– Ah, então você só está se
escondendo de vergonha?
– Não estou com vergonha – chiei. –
Mas também não quero falar com ele
agora. É um direito meu, tudo bem?
– É, ela só quer ficar aqui por um
tempo para deixá-lo preocupado. Rick,
sinceramente, você é homem e não
entende nada de jogo de sedução.
– De orgulho – eu corrigi.
– De orgulho – ela repetiu.
– Certo – ele se rendeu. – Só fiquei
preocupado com vocês duas. Mas se
vocês estão bem, o resto,
definitivamente, não é da minha conta.
Ele se despediu e saiu. Andy manteve
a porta entreaberta e sussurrou para
fora:
– Não diga a ele que ela está aqui.
Puta merda, Andy. Cala essa boca. Se
Holt estiver a menos de um quilômetro
ele vai te ouvir, sua maluca.
Ela voltou para onde eu estava,
sentada no sofá, levantando os
polegares. Estava animada com a
conspiração.
Apoiei a testa contra a mão.
– Rick não vai falar nada.
Encarei ela com descrença no olhar.
Meu problema não era Rick, ele era o
ser humano mais discreto das
redondezas. Tinha certeza de que ele
não ia falar nada. Meu problema era ela.
– O que a gente faz agora? Seu pé está
bem? Holt disse que você estava mal.
Tem que tomar algum remédio? Posso
ligar para a farmácia.
– Não. Vou ficar bem.
Mais batidas na porta.
Que inferno.
Estava começando a me sentir em um
programa de tevê no qual não parava de
aparecer convidados.
Andy fez uma careta para mim e eu
me recostei contra o sofá. Estava
exausta. Se fosse Holt, que me visse ali
de uma vez e pronto.
Ela entreabriu a porta e eu ouvi sua
voz irritada.
– O que você quer?
– Vi Dominique vindo até aqui. Ela
parece ter brigado com o marido. Se ela
precisar de um lugar para ficar….
Eric.
Eric, Eric, Eric.
Maldito Eric.
Levantei do sofá com uma força de
vontade sobrenatural. Não liguei para o
meu pé, para minha mão ou para o fato
de que Holt poderia me ver. Puxei o
resto da porta e encarei seus olhos
maliciosos.
– Dom! Vim até aqui ver se…
– Não me chame de Dom – disse
levantando o indicador.
– Dom – ele sorriu, como se estivesse
levando na brincadeira.
– Não me ouviu? Eu disse para não
me chamar de Dom.
– Mas…
– Mas nada. Não me chame de Dom.
Você não me conhece. Não é meu amigo.
– Tudo bem – ele deu um passo para
trás e sorriu. – Posso falar com você em
particular? – Olhou para Andy quando
pronunciou as últimas palavras.
Ela cruzou os braços e ficou firme ao
meu lado, como quem diz “Me faça sair
daqui, imbecil”.
– O que você tiver que dizer para
mim, pode dizer na frente dela.
Eu sempre quis dizer isso.
Mas nunca tive ninguém em que eu
confiasse o suficiente.
Não que eu confiasse na maluca do
sutiã de arco-íris. O objetivo era só
irritá-lo. E estava tendo sucesso.
– Seu marido está chateado porque…
– Meu marido não está chateado com
nada.
– Mas porque…
– Não é da sua conta.
– Certo. Você quer vir ficar comigo e
com a Shelbi esta noite?
– Não.
– Ela não se incomoda. Acho que ela
adora você – ele tinha um sorriso
descarado.
Senti a dor dentro de mim aumentar.
– Não quero mais nada com você,
Eric.
Ia fechar a porta na cara dele, mas ele
colocou o antebraço no meio do
caminho e me impediu.
– Por quê?
Pronto! Agora eu precisava de motivo
para não querer mais um homem!
Eu podia ter dito que ele tinha
entendido errado: que eu não era casada
e não sabia que ele era. Mas o que ia
conseguir com isso?
– Por quê? – perguntei de volta.
– É. Por quê? – ele repetiu.
– Porque você tem um pau minúsculo
e eu sou uma mulher que exige potência.
Enfiei o punho com força contra o seu
ombro e ele foi empurrado para trás.
Fechei a porta na cara dele e girei a
chave.
Pela expressão no rosto de Andy eu
imaginei que ela bateria palmas para
mim assim que saísse de seu estado de
torpor. Fazia tempo que eu não sentia
tanto orgulho de algo que eu tinha feito.

Andy nem cogitou me levar para o


quarto de hóspedes. Aparentemente, a
preocupação de Holt a comoveu e,
agora, ela tinha tomado para si a missão
de ser minha guardiã.
Eu estava debilitada demais, triste
demais, cansada demais…
Simplesmente deixei que ela me guiasse.
Tomei banho com dificuldade e vesti
umas roupas emprestadas antes de me
deitar na cama de Andy.
– Vou ficar aqui com você. Não quero
que você passe mal e morra de
madrugada.
– Não vou passar mal e morrer.
– Não vai mesmo, porque eu vou estar
aqui.
Sorri.
Tive pouquíssimos amigos na minha
vida, mas Andy conseguia ser a mais
inesperada. Ela me odiava, ou pelo
menos tinha me odiado. E foi bastante
recíproco. Mas agora, estava usando sua
casa como refúgio e estava sendo bem-
vinda.
Mesmo depois de ter sido horrível
com ela.
Coloquei a cabeça contra o
travesseiro enquanto ela colocava uma
almofada embaixo do meu tornozelo
machucado.
A palavra estava vindo à minha boca.
Tinha um gosto estranho. Um gosto que
eu nunca tinha experimentado antes.
– Desculpe.
Ela me observou intrigada. Para ela
era só uma palavra. Para mim era uma
barreira que eu nunca havia rompido.
Sempre assumi as consequências de
todas as minhas ações de queixo
levantado e nunca me desculpei por
nada.
Mesmo quando era pequena e o meu
pai me obrigava a aceitar que tinha
cometido um erro, ainda era difícil me
convencer a cuspir aquela palavra.
Mesmo que a contragosto.
– Não devia ter te provocado na fila
do supermercado ou ter sido grossa com
você – expliquei. – Desculpe.
Ela abanou a mão para mim.
– Eu não sou exatamente inocente.
Também fui bem perversa com você.
Eu abri um sorriso inexpressivo e
fechei os olhos.
– Boa noite, Andy.
– Boa noite, Dom.

Fiquei parado no meio da rua.


Ainda não tinha conseguido processar
completamente os eventos dos últimos
minutos.
Parte de mim sabia que Dominique
podia me pegar na cama com uma
mulher. E parte de mim queria isso com
vontade. Deixá-la ultrajada e
enciumada. Mas… Mas ela saiu
correndo.
O que diabos tinha acontecido?
Nunca vi Thoen fugir de lugar nenhum
e, em todos os cenários criados pela
minha imaginação, aquela cena nunca
acabava desse jeito.
Pelo que eu conhecia dela, até se
convidar para se juntar a nós seria uma
reação mais esperada do que aquela
fuga.
Ela está machucada.
Ai, que merda! Ela estava machucada
e correndo por aí. Para onde ela tinha
ido? Imaginei que pudesse ter ido para a
casa da vizinha, mas para Dominique
pedir ajuda a um vizinho… Não, ela não
estava escondida em algum lugar.
Talvez um táxi tenha passado…
Olhei ao redor para a rua deserta.
Quais eram as chances?
Droga, Dom, aonde você foi?
Ela não podia ter ido muito longe.
Não com aquele pé machucado. Correu
para algum lugar. Vai se acalmar e logo
estará de volta. Passei a mão pelos
cabelos e desejei que não demorasse
muito. Queria conversar com ela. Queria
explicar e ter certeza de que ela estava
bem.
Por que diabos se importar, Greg? A
mulher é horrível!
Não… Esfreguei a testa com
violência.
Não, ela não é.
Ela só precisa de um pouco de tempo.
Voltei para casa e a voz feminina no
topo da escada chamou minha atenção.
Meus olhos ávidos se levantaram
procurando Dom.
– Greg? O que houve?
– Ah, Lynn. – Não consegui esconder
a decepção em minha voz. Como eu
tinha conseguido esquecer tão
rapidamente da mulher que tinha
acabado de estar comigo na cama?
Não é você que eu quero. Meu
coração estava comprimido dentro do
peito, batendo acelerado e triste. Eu
quero ela.
– Visita inesperada? – Lynn brincou.
– Não exatamente – disse, coçando a
testa.
– E eu? – sorriu, um pouco sem jeito.
– Fico ou vou?
Hesitei durante alguns segundos
enquanto decidia o jeito certo de mandá-
la embora, apenas para descobrir que
não havia jeito certo.
– Sinto muito – foi tudo que consegui
dizer.
– Tudo bem. – Ela desceu as escadas
e me deu um beijo na bochecha. – Nos
falamos depois. Vai ficar me devendo,
Holt.
Sorri sem achar nenhuma graça e a
acompanhei até seu carro. Me despedi,
desculpei e agradeci várias vezes.
Mas, no final, tinha sido melhor
assim. Eu ia fingir que estava com Dom
o tempo inteiro e acabar magoando os
sentimentos da pobre mulher em minha
jornada egoísta.
Sentei no sofá e ter magoado Lynn
sumiu completamente da minha lista de
prioridades. Respirei fundo, tentando me
acalmar, mas sabia que seria
impossível. Seria impossível fazer
qualquer coisa que não fosse me
preocupar com Dominique.

Acordei cedo demais. Como sempre.


A primeira coisa que pensei assim que
abri os olhos foi em Holt. Será que ele
ainda estava preocupado ou já tinha me
mandando para o inferno? E a piranha?
Será que ela tinha dormido lá com ele?
Ainda deviam ser as primeiras horas
da manhã.
Andy estava roncando ao meu lado.
Cocei os olhos.
Era melhor eu voltar para a casa de
Holt. Na verdade, não era melhor. Mas
era o que eu queria. Precisava saber se
ela estava lá, se ela tinha dormido lá.
Levantei vagarosamente e coloquei
minhas roupas de volta. Lavei o rosto e
joguei um antisséptico na boca, antes de
deixar um bilhete para Andy. Era
impressionante como você podia
escrever bilhetes curtos quando
aprendia a usar todas as palavras.
Escrevi “Obrigada” e “Desculpe”
antes de assinar e deixei o papel do
pequeno bloco de notas em cima do
travesseiro que eu tinha usado. Pousei as
roupas emprestadas dobradas em cima
de uma das cadeiras no canto e desci as
escadas segurando no corrimão.
Atravessei os gramados devagar,
destranquei a porta de Holt tentando
fazer o mínimo de barulho possível. Eu
podia ouvir a tevê ligada na sala. Tentei
pisar na ponta dos pés, mas aquilo doeu
mais que a morte e eu logo desisti.
Greg estava deitado no sofá ainda
com as roupas da noite anterior. Tinha
dormido quase sentado e a tevê ainda
estava ligada em um canal qualquer.
Ia deixá-lo ali e subir para me deitar.
Fingir que nada tinha acontecido seria
interessante. Iria dizer que passei a noite
fora, como já tinha dito a ele que
pretendia fazer, e que ele estava
dormindo no sofá quando eu cheguei.
Já tinha colocado o pé no primeiro
degrau da escada quando escutei sua voz
em minha mente. “Ela está machucada.
Estou preocupado.” Ele tinha ido até a
casa da vizinha e exposto sua
privacidade porque estava preocupado
comigo. Ele provavelmente tinha
passado a noite em claro esperando que
eu voltasse. Não podia simplesmente
deixá-lo ali, deitado de qualquer jeito,
para acordar cansado e com uma dor
horrível na coluna.
Me aproximei e me dobrei sobre ele.
Toquei seu ombro com cuidado.
– Greg? – chamei baixinho – Greg,
você dormiu no sofá.
Ele abriu os olhos e se levantou
assustado.
– Dominique! Droga! – Ele esfregou
os olhos com os dedos – Onde você se
enfiou?
– Eu saí – as palavras saíram secas.
Eu não conseguia mentir para ele. Eu
não queria mentir para ele. Talvez se a
piranha ainda estivesse ali, eu dissesse
que tinha passado a noite com um
homem entre minhas pernas. Mas se ele
estivesse sozinho, se tivesse passado a
noite me esperando… Eu não poderia
mentir.
– Saiu para onde? Droga! – ele
repetiu e se levantou. – Você está bem?
– começou a me tocar nos braços e
pernas inspecionando meus machucados
– Você perdeu o juízo?
– Sou uma mulher adulta.
– Você! – gritou apontando o
indicador contra o meu nariz. – É uma
criança! – Eu conseguia sentir a ira em
sua voz. Ele estava com muita, muita
raiva. E isso não é fácil de conseguir
assim que se acorda.
Quando ele finalmente decidiu que eu
não estava machucada, virou de costas e
foi ao banheiro. Eu estava colocando
ração para Max quando ele voltou.
– Será que você pode, por favor, se
sentar ou se deitar antes que perca o pé?
– Eu estou bem.
– Pois então perca o pé. Não me
importo mais com você. Que se dane.
Ele se virou e foi embora mais uma
vez. Eu fiquei congelada no meio da
cozinha segurando o medidor de ração.
Parecia que ele tinha passado a noite
inteira cozinhando um ódio absoluto
contra mim e agora ele estava
simplesmente incontrolável.
Comecei a colocar água para o
cachorro quando ele voltou.
– Não vai perder o pé – ele gritou.
Por que ele estava gritando? – Não na
minha casa. Porque aí você vai me
processar e a gente já sabe como isso
termina. Com você ganhando e eu sendo
deixado para trás para ferver em fúria
eterna – ele jogou os braços do lado do
corpo em um claro sinal de exaustão.
– Você está falando como uma pessoa
louca.
– Sabe quem faz isso comigo? VOCÊ!
Para onde DIABOS você foi? Você está
com o pé machucado. E o braço. E
metade do corpo! E saiu correndo como
uma criança pequena pela rua no meio
da noite. Nem uma ligação, nem uma
mensagem. E se você tivesse caído em
algum lugar? E se estivesse ferida? E se
precisasse de ajuda?
– Eu estava bem. – Minha respiração
estava começando a falhar. Estava
embriagada pela ideia de que ele se
importava tanto.
– Mas eu não sabia disso, sabia? E
você não se importou, não é?
Ah, não! Ele não ia se fazer de vítima!
De jeito nenhum!
– Não imaginei que você fosse se
preocupar! Por que iria? Você parecia
bem distraído se divertindo em cima da
sua amiga.
– Era uma mulher que eu conheço e
que trouxe para dentro da minha casa
para transar comigo na minha cama.
Você tem algum problema com isso?
– Você podia, pelo menos, ter
fechado a porta.
– Não achei que você estivesse em
casa.
– Pois eu estava. E fui obrigada a ver
aquela cena pífia.
– Pífia?
– É, Holt.
– Ah, cala a boca, Dominique.
– Cale a boca, você, Gregory. Estava
bastante ávido para me julgar quando
era eu quem estava transando com
alguém e quando eu faço o mesmo você
age como se eu estivesse em uma
discussão sem propósito.
– É a minha casa! E eu não sabia que
você estava aqui! Será que você não vê
a diferença?
– E o que foi que eu fiz? Eu te xinguei
ou te humilhei? Eu gritei com a sua
amiga?
– Não. Você soltou um cachorro em
cima da gente.
– Isso foi tudo o Max. Não pode me
responsabilizar pelo seu cachorro.
Ele tinha as duas mãos enfiadas no
cabelo como se não soubesse mais o que
dizer.
– Vai embora.
– Como é?
– Vou colocar você no próximo avião
de volta pra casa.
– Não vou embora até…
– Você pode levar a merda do vídeo
com você. Aqui. – Ele jogou o celular
na minha direção. – Leve tudo. Eu não
ligo. Você… Eu não aguento mais.
Senti o ardor subir pelos meus olhos
mais uma vez. Mas dessa vez a raiva era
maior que a dor e eu tive certeza de que
não ia chorar.
– E você não entende por que eu me
fecho para as pessoas. É exatamente por
causa disso, Gregory! Por causa de
escrotos egocêntricos como você – disse
enfiando meu indicador no seu peito
com força e ele hesitou. – Que me usam
do jeito que lhes convém e depois me
descartam como se eu não fosse nada.
– E desde quando você liga para
como as pessoas te tratam?
– Vai se foder.
– Vai você.
– O moralista supremo. Passou dias
querendo me convencer de que eu era
uma pessoa ruim e que deveria ser mais
como você. E o que é que você faz, seu
cretino? Você usou um vídeo contra mim
e quando desistiu da brincadeira me
joga fora?
– Te jogo fora? EU TE BEIJEI! Eu
queria continuar te beijando e o que
você fez? Você…
– Eu me apaixonei por você! E não
sabia como lidar com isso. Aí você traz
uma vagabunda e coloca ela nua na sua
cama e quer que eu faça o quê? Fique
assistindo como se eu fosse oca por
dentro? É, eu fui embora, Holt. Dormi na
casa de uma amiga e se você se
preocupa tanto com o meu bem-estar
como gosta de demonstrar talvez
devesse ter pensado antes de trazer uma
mulher aqui.
– Você me mandou embora.
– Quando? Quando eu te mandei
embora?
– Você disse que não queria. E disse
que era perda de tempo – Ele apontava o
dedo para mim como se estivesse se
agarrando em suas memórias para não
afundar.
– Você está tirando tudo que eu disse
de contexto.
– Dominique! – Ele bateu a mão
contra a mesa – Pare de advogar!
– Eu fiz uma merda, Holt. Bem grande
e…
As palavras grudaram na minha
garganta e ficaram ali.
– O quê? O que foi que você fez?
Tudo bem. Acho que vai ser agora,
então.
– O cara que eu fiquei. No primeiro
dia quando cheguei aqui.
Travei o queixo e respirei fundo.
Aconteça o que acontecer, eu não vou
chorar.
– O que tem ele?
– Eu estava com raiva de você.
Queria te magoar e fiquei com ele por
vingança.
– Me diz algo que eu ainda não sei.
– Eu não sabia nada sobre ele. E,
antes de ontem, eu descobri algo e… Eu
tive certeza de que você ia me odiar.
– Você não me conhece tão bem
assim, Thoen. Por que não experimenta
me contar?
Olhei para ele em silêncio.
Eu queria que ele não me odiasse.
Queria que ele me beijasse e me
abraçasse. Mas aquilo não ia acontecer.
Ele tinha me mandado embora e depois
que eu falasse sobre Eric… O que ele
poderia fazer?
– O que tem ele, Dominique? – ele
perguntou olhando para mim – É algum
pedófilo? Um ex-torturador nazista? –
Eu passei os dedos pelos cabelos –
Testemunha de Jeová? – Eu sorri –
Casado?
Levantei meu rosto em sua direção
inconscientemente.
– Casado – ele repetiu se apoiando
contra o balcão da cozinha. – Era isso
que você estava pensando enquanto me
beijava? Que tinha transado com um
homem casado no meu sofá?
– Não faz isso ser pior do que já é,
Holt. Por favor.
– Acho que era de se esperar. Quero
dizer, você deve ter uma cartela de
bingo em algum lugar, não é? Com
coisas horríveis que tem que fazer para
vencer na vida. Essa é uma delas?
– Para.
– Se você queria arranjar problemas
para mim na minha vizinhança nova,
Dom. Parabéns. Conseguiu um bem
grande.
– Cala a boca. – Dessa vez fui eu
quem bati a mão contra a mesa. A mão
machucada. A dor destruiu meu orgulho,
minha teimosia e minha força de
vontade. As lágrimas vieram inundando
tudo.
– Nunca na minha vida. NUNCA! – eu
cuspia as palavras com fúria – Eu nunca
nem fiquei com um homem
comprometido. E eu não vou ficar aqui
ouvindo você me julgar e me condenar
sem nem me conhecer. Eu não sabia que
ele era casado. – As palavras estavam
jorrando pela minha boca como se
estivessem esperando em fila para
serem ditas – Ele deu em cima de mim e
eu queria te magoar e fiquei com ele. E
aí você começou… Você começou a ser
maravilhoso e eu comecei a sentir algo
por você. Não sabia o que você ia
pensar. Imaginava que seria algo assim.
– Apontei para ele com nojo, indicando
a situação – Por isso não quis deixar
você me comer, Holt. Já que era só isso
que você queria. Porque estava sentindo
algo por você e não queria que você se
arrependesse de ter ficado comigo sem
saber o que aconteceu. Não queria que
isso aparecesse para você como uma
surpresa. Então, me desculpe se eu fui
imbecil o suficiente para me preocupar
com o que você ia pensar.
Eu estava chorando. Mas não era um
choro descompensado de dor. Era um
choro contido de ódio.
Ele abaixou os olhos para o balcão.
– Me desculpe. Eu não devia…
– Devia. Eu sou a megera
insuportável, não é? Eu posso ser
ambiciosa e lutar com afinco pelo que
eu quero, Gregory. Mas eu nunca roubei,
matei ou traí ninguém. Não
conscientemente.
– Eu estava com raiva, porque você
foi embora sem falar nada e…
– Eu não sabia – sussurrei. Ele se
aproximou e pegou a mão machucada
que eu abraçava contra o corpo.
– Aqui. Deixa eu ver.
– Você não é médico.
– Ainda assim, deixa eu ver.
Segurou meu pulso com cuidado
enquanto o verificava.
– Está doendo?
– Muito pouco.
Ele se virou para os frascos de
remédios em um pote em cima do
balcão.
– Aqui – disse, me entregando uma
pílula.
– Não precisa, eu…
– Dominique, por favor… – Sua voz
estava tão cansada que eu aceitei sem
nenhuma reclamação adicional. – Vai
melhorar – ele acrescentou.
Greg continuou a segurar minha mão
machucada e com a outra mão envolveu
minha cintura tentando aliviar o peso do
meu pé. Não estava adiantando muito,
mas era bom ser abraçada ainda assim.
– Você disse que estava apaixonada
por mim – ele estava sério.
– Acho que disse – resmunguei.
Ele sorriu encarando o chão. Foi um
gesto simples, mas tão recheado de dor
e ressentimento que apertou meu
coração.
– Eu não sabia, Holt. Se você quiser
nunca mais na sua vida acreditar em
nada que eu digo, faça isso. Mas
acredite só dessa vez. – Eu precisava
daquilo. Mesmo que ele não me
quisesse. Precisava que ele soubesse e
que realmente acreditasse que eu era
inocente. Pelo menos dessa vez. – Eu
juro que não sabia. Por favor, acredite.
– Tinha uma vaga noção de que minha
voz firme estava se tornando um
choramingo sussurrado cada vez mais
cheio de dor – Se não acreditar em mais
nada, acredite nisso. – Ele levantou os
olhos para mim – Por favor, acredite.
Pode acreditar em mim?
Ele sorriu e segurou meu queixo entre
o indicador e o polegar. Um leve toque
pra alinhar meu rosto ao seu. E ele me
beijou.
Como eu podia sentir tanta saudade
de uma coisa que só tinha experimentado
uma única vez?
Segurei seu rosto antes que ele
pensasse em desistir. Mas desistir não
tinha passado pela sua cabeça. Ele
manteve seus lábios nos meus, sua
língua na minha e por um bom tempo sua
boca era a única coisa em que eu
conseguia pensar.
Depois de vários segundos ele me
soltou do beijo, mas me manteve envolta
no abraço.
– Você pode se deitar, por favor? –
ele acariciava seu nariz contra o meu e
eu percebi que não seria capaz de lhe
recusar nada. – Ou se sentar… qualquer
coisa assim.
– Posso.
Greg segurou meu rosto entre suas
mãos e enfiou os dedos em meus
cabelos. Vi um princípio de um sorriso
se formando e meu coração se iluminou.
– O que foi?
– Eu estou morrendo de sono – ele
confessou e apoiou a testa contra a
minha. Eu ri com ele.
– Vem, Holt. Vamos te botar na cama.
Capítulo 11
“– Diga-me, Scarlett. Você nunca se
cansa de casar com homens que não
ama?
– Ah, como foi que você saiu da
cadeia? Por que não te enforcaram?”

Rhett e Scarlett – E o vento levou

– Aqui – ele me deu o controle da


tevê assim que decidiu que eu estava
deitada e confortável o suficiente.
– Acho que prefiro ler.
– Aquela coisa horrível com
estupradores e assassinos? Não. – Eu
sei que eu devia ter defendido a minha
vontade, mas ele estava tirando a roupa
e eu hesitei.
– O que… O que você está…
– Não vou dormir de calça jeans. –
Eu pude vê-lo usando nada a não ser sua
cueca boxer preta por uma fração de
segundo antes de ele se enfiar debaixo
do edredom ao meu lado. – E não faça
essa cara. Nós já vimos um ao outro em
situações bem piores. – Ele me apertou
em um abraço rápido enquanto me
beijava na bochecha e depois em um
breve selinho. Eu ri. Era verdade…
– Você tem certeza de que não quer
que eu fique em outro quarto? Se você
passou a noite em claro, devia dormir, e
eu não quero incomodar. – Por nada no
mundo eu iria querer sair dali e,
sinceramente, não fazia a menor ideia de
onde estava vindo tanta educação da
minha parte. Mas Holt tinha colocado o
seu travesseiro no meu colo e se deitou
de bruços com os braços ao redor do
meu quadril e eu percebi que ele
também não queria que eu saísse.
– Quando a gente te deixa sem
supervisão você sai correndo por aí com
esse pé machucado. Acho que vou ficar
aqui para ter certeza de que você vai
ficar quieta.
Coloquei as mãos em seus cabelos e
comecei a fazer um cafuné lento e
carinhoso. Ele gemeu baixinho. Em
poucos minutos senti sua respiração
ficar mais pesada e tive certeza de que
ele tinha dormido. Agora eu podia
admirar cada linha, cada músculo
torneado, cada centímetro de pele e cada
fio de cabelo pelo tempo que eu
quisesse e sem qualquer
constrangimento. Ficava indo e vindo no
cafuné, alternando com carinhos em seus
braços e suas costas. Vez ou outra eu
sentia seu abraço no meu quadril apertar
involuntariamente e fiquei encantada por
alguns minutos, vendo ele dormir e me
aproveitando da liberdade absoluta para
tocá-lo.
Nunca me considerei uma pessoa
muito romântica e, apesar de nos últimos
dias ter começado a perceber que
poderia conseguir ser romântica, ainda
assim eu precisava confessar: ver uma
pessoa dormir é chato.
Não tem nada de muito maravilhoso
ou encantador. Eu preferia Holt
acordado e me beijando
enlouquecidamente. E depois que eu já
tinha apertado cada pedacinho de
músculo que tive vontade, comecei a
ficar entediada e acabei ligando a
televisão.
Apertei o botão do mudo e escolhi um
documentário legendado sobre o vale do
Loire. Mantive minhas mãos em Holt em
uma mistura incessante de cafunés e
carinhos enquanto alternava minha
atenção da região francesa de castelos
para sua respiração densa.
Max apareceu na porta do quarto e
ficou lá parado por alguns segundos
enquanto me observava. Imaginei que se
ele falasse diria “Vocês já se
entenderam ou vão continuar gritando?
Porque se forem gritar eu vou dormir lá
embaixo”.
Dei alguns tapinhas na cama e ele
abanou o rabo e aceitou o convite. Mas
assim que ele colocou as duas patas
dianteiras na lateral da cama eu me
arrependi, empurrei suas patas com
cuidado e indiquei que ele ficasse no
chão.
Ele não era treinado o suficiente para
entender de primeira. Mas entendeu
ainda assim.
Recostei nos travesseiros e voltei a
me concentrar no documentário. A
legenda falava sobre arquitetura, arte e
fatos históricos enquanto as imagens
mostravam castelos, florestas,
tapeçarias e pinturas. Em algum lugar
entre Chambord e Chenonceau, acho que
adormeci.

Era um pouco depois de meio-dia


quando acordei. A impressão que tinha
era que tinha caído contra o colo de
Dominique e apagado em poucos
segundos. A tevê estava ligada no mudo
e Dom estava quieta embaixo de mim.
Virei o rosto apoiando o queixo
contra o seu estômago e vi seus olhos
fechados e os braços caídos
relaxadamente. Ela deve ter pegado no
sono logo depois de mim. Voltei a enfiar
a cabeça no travesseiro e puxei minhas
mãos contra seu quadril. Estava
resistindo ao impulso de movimentar
meus dedos com leveza ao longo do seu
corpo e senti-la todinha. Falhei
grosseiramente e logo estava buscando
sua cintura ou o alto de suas coxas.
Notei um movimento no chão e vi Max
se sentar ao nosso lado. Ele estava me
olhando de um jeito estranho, como se
quisesse chamar minha atenção e, de
repente, eu tive certeza de que ele ia
latir. Estiquei o braço e o segurei pelo
focinho bem a tempo. Seus grandes
olhos castanhos estavam firmes em mim.
Comecei a me levantar com cuidado e
senti Dominique se mexendo. Congelei
em uma posição pouco confortável ainda
em cima da cama, tentando evitar que
ela acordasse.
Peguei algumas roupas antes de entrar
no banheiro e fechar a porta atrás de
mim. Meus cabelos estavam espalhados
para todos os lados. Passei a mão por
eles com força, tentando deixá-los de um
jeito arrepiado mais natural e
comportado. Eles ficaram ainda mais
bagunçados e eu desisti.
Comecei a me vestir… Quando tirei a
roupa para dormir há algumas horas
atrás, parte de mim esperava que a
ousada Dominique me seguisse.
Esperava que ela dissesse que também
estava pouco confortável com aquela
roupa e que preferia dormir nua. Queria
que ela me pedisse ajuda para fazer
isso.
Mas acho que no fim foi melhor que
ela não tenha feito isso ou eu,
definitivamente, não teria conseguido
dormir.
Atravessei o quarto na ponta dos pés
e desci até a cozinha.
Dei comida a Max antes que ele
começasse a latir desesperadamente e
estressasse Thoen. Porque isso era de
uma probabilidade monstruosa.
Apoiei meus punhos fechados contra a
cintura e olhei ao redor. Eu podia fazer
algo como um café da manhã para ela,
não podia?
Expirei cansadamente. Não, eu não
podia. Ia ficar horrível. Mas eu podia
tentar.
Apertei um botão e o tablet pediu a
minha senha. Entrei no navegador e
comecei a buscar o passo a passo de
coisas que algumas pessoas parecem
nascer sabendo, como fritar ovos, fazer
panquecas ou um café que não seja
venenoso.
Meia hora e uma cozinha
descomunalmente suja depois, consegui
fazer algo razoável. Olhei pela porta da
cozinha e vi algumas flores crescendo
no jardim de trás. Escolhi uma pequena
e delicada. Não queria nada óbvio
demais ou Dominique iria rir e me
chamar de menininha. Estava
começando a ficar sem opções do que
fazer para agradar uma mulher que não
tinha um osso de romantismo no corpo.
Entrei no quarto e encontrei a cama
vazia.
– O que é isso? – ela estava
mancando atrás de mim. Devia ter
acordado já fazia algum tempo, porque
estava com os cabelos molhados saídos
do banho.
– Vou trazer a coleira do Max para
prender você. Parece incapaz de
repousar.
– Só levantei para tomar banho.
Segurei seus braços para lhe dar
apoio e a ajudei a deitar-se mais uma
vez.
– Trouxe comida.
– Estou vendo – ela riu. – E estou
impressionada. É comestível? – Ela
tinha um sorriso safado e aquele lábio
delicioso preso entre os dentes. Eu me
aproximei do seu rosto e a beijei
passando a língua no lábio que ela
mordia e depois o suguei. Nossa… Era
bom demais poder beijá-la quando me
dava vontade.
– É – respondi, com os olhos ainda
fechados.
– Vamos experimentar, então.
A comida estava horrível.
Bem, talvez não horrível. Mas não
estava deliciosa.
Seria bom viver em um mundo em que
eu poderia dizer que Dominique comeu
sem reclamar. Mas nesse universo em
que vivemos, isso não seria verdade: ela
criticou a cada mordida. O interessante
é que aquilo não me irritou. Pelo
contrário, eu ria como um imbecil a
cada novo comentário, novo sorriso,
novo toque. Só ouvir sua voz me
aquecia.
– E então? O que vamos fazer hoje? –
ela quis saber. Tinha uma sobrancelha
levantada para mim e eu imaginei que
tinha um duplo sentido em suas palavras.
Mas preferi ter cuidado. Eu poderia ter
apenas imaginado o duplo sentido.
– Tentar dominar o mundo? –
brinquei, e ela me empurrou. – Não sei.
Mas tem que ser alguma coisa que não
envolva levantar dessa cama –
acrescentei, tentando dar obviedade ao
meu duplo sentindo.
– Acho que consigo pensar em uma
coisa ou duas – ela sorriu e, dessa vez,
eu tive certeza de que vi safadeza em
seu sorriso.

– Não acredito que você fez isso! – eu


não conseguia parar de rir.
– O que você queria que eu fizesse?
Eles prepararam o bolo com tanto
cuidado.
– Você é a pessoa mais gentil do
universo! Como alguém come algo de
que tem alergia e corre o risco de ter um
choque anafilático e morrer, só para não
deixar alguém triste?
– É, eu sei. Pensando bem, eu acho
que foi imbecil da minha parte fazer
isso.
– Só um pouquinho – provoquei.
– E você? Qual foi a coisa mais
estúpida que já fez?
– Fora me masturbar do lado de fora e
subir no telhado para pegar uma bola,
você quer dizer?
– Obviamente – riu.
– Não sei. – Eu queria pensar em algo
interessante. – Quando era menor eu
aprontava algumas brincadeiras bobas
com a minha mãe. Eram bobagens de
criança, mas eu sempre me sentia
melhor. Era como se eu estivesse me
vingando dela aos pouquinhos pelo o
que ela tinha feito comigo e com o meu
pai.
– Isso não é estúpido. É brincadeira
de criança.
– Uma vez eu coloquei pimenta na
pasta de dentes dela. Enfiei um canudo
dentro do tubo e sai jogando molho de
pimenta e misturando com a pasta. Ela
me pegou no ato e eu fingi que era outra
coisa. Ela então pediu que eu escovasse
os dentes com aquela pasta.
– Aí você teve que admitir?
– Admitir? Holt… Parece que não me
conhece. Eu passei o mês inteiro usando
a pasta.
Agora era ele quem ria
compulsivamente.
– Certo. Isso foi bem estúpido
também. E isso tudo só para não admitir
que estava fazendo coisa errada.
– Admitir jamais!
Ele riu.
– O que houve com sua mãe? Quero
dizer, onde ela está?
– Não sei. Ela se mudou depois que
se divorciou do seu segundo marido.
Soube que ela tinha encontrado outro
homem rico que a queria. Deve ter se
casado de novo.
– Vocês não têm nenhum contato?
– Eu ainda tentei acreditar que
poderíamos superar o que ela fez. Mas
depois que seu segundo marido deu em
cima de mim pela terceira vez e, pela
terceira vez, ela não acreditou em mim,
eu resolvi que já bastava.
– Ele chegou a te… sabe?
– A se aproveitar de mim? Não. Eram
só palavras e insinuações. Uma vez ele
chegou bem perto de me tocar. Só uma
vez.
– E o que houve?
– Eu dei uma joelhada na virilha dele
com tanta força que tivemos que chamar
uma ambulância. Nunca mais ele se
meteu comigo.
Ele riu colocando a mão sobre a parte
interna das coxas.
– Eu sabia que você era perigosa, mas
não tanto.
– E olha que eu nem fazia muay thai
na época. Imagina se tivesse sido agora.
– Calma. Calma. Calma. Você faz
muay thai? – ele parecia impressionado.
– Gosto de poder me defender
sozinha.
Ele mordeu os lábios em admiração.
– E você? – perguntei – Algum
esporte?
– Comecei a fazer kickboxing faz um
tempo. Mas cresci fazendo esgrima e
equitação.
– Minha nossa… Você é tão… rico –
dei risada.
– Hey! Eu não tinha escolha naquela
época. Vai! Você embaralha. – Jogou as
cartas na minha direção. – Mas mesmo
que tivesse, acho que ainda faria
equitação. Adoro cavalos.
Comecei a dar as cartas.
– E a sua mãe? Onde ela está? Vocês
ainda tem contato?
– Não muito. Ela está em uma
instituição. Ficava muito longe de onde
eu morava, não tinha condições de ir até
lá com frequência.
– Que instituição?
– É um lugar onde pessoas ricas
colocam os parentes com os quais não
querem lidar. Minha avó enfiou ela lá
depois… Depois de uns problemas.
– Hmm. Entendo. E onde fica?
– Fica… Fica aqui perto, na verdade.
A uma hora, uma hora e meia de
distância.
– E por que você não vai visitá-la?
– Talvez eu faça isso – ele sorriu,
pegando as cartas que eu lhe entreguei e
soube que ele estava mentindo.
– Hey! E o meu vídeo! Você me disse
mais cedo que eu poderia pegá-lo. Eu
quero.
– Isso foi mais cedo, Dom. Você é
advogada, sabe como funciona: se você
não aceita a proposta de conciliação na
hora, não vale de nada depois. – Piscou
um olho para mim. – E, além disso, isso
foi antes de você dizer que estava
apaixonada por mim. Isso muda tudo.
– Por quê?
– Porque agora eu vou, finalmente,
poder ver aquele vídeo sem me sentir
um tarado pervertido.
– Quem disse?
– O senso comum – brincou.
– Mas você é um frouxo mesmo – ri.
Ele se virou para mim, incomodado.
– Posso saber por quê?
– Porque você pode ter ao vivo e fica
pensando em um vídeo.
Ele hesitou por três segundos antes de
tomar as cartas da minha mão e se
aproximar.
– Não me provoque, Thoen.
Eu venci a distância que faltava entre
nós e deixei minha boca a alguns
centímetros da dele. Eu ainda não estava
completamente excitada: estava só
brincando de provocar. Inspirei
profundamente e vi seu olhar
acompanhar minha boca.
– Frouxo – sussurrei.
– Você está brincando com fogo.
– Frouxo – repeti.
– Frouxo? Você sabe a quantidade de
coragem que um homem tem que ter pra
resistir a essa tua bunda linda?
– Linda? Mas você ainda nem viu
nada! E sabe por quê?
– Por quê? – ele tinha um sorriso
sacana estampado no meio da cara.
– Porque você é frouxo.
Ele enfiou uma das mãos no meio das
minhas pernas, tão alto na minha coxa
que as pontas de seus dedos estavam
quase tocando minha calcinha. Eu queria
que ele subisse a mão. Nem que fosse só
mais um pouquinho.
– O que é que eu tenho que fazer pra
você calar a boca? – ele estava
sussurrando contra a minha pele.
– Acho que vai ter que me foder.
– Você diz que está apaixonada por
mim e poucas horas depois já está
falando em foder. É impressionante
como você é romântica.
– Melhor ser pouco romântica do que
ser frouxo.
Sua mão avançou violenta e arrancou
minha calcinha. Senti seus dedos
roçarem meu clitóris e a umidez tomou
conta de minhas partes íntimas. Ele
enfiou minha boca na sua e a sugou com
força.
– Cala a boca – ele disse quando
finalmente me soltou do beijo. Seus
dedos estavam ali, timidamente me
bolinando.
– Diz pra mim, Holt, quantas vezes
ainda vou ter que te chamar de frouxo
antes de…
Ele levantou meu vestido. Minha
calcinha, que já estava nos meus
joelhos, sumiu de vez.
Puxei sua camisa e espalhei minhas
mãos no seu tórax. Agora sim. Holt
arrancou toda minha roupa pela cabeça
antes de colocar seus dedos no meu
clitóris mais uma vez.
Fechei os olhos e meu corpo arqueou
ao seu toque.
Senti seu hálito quente contra o meu
ouvido.
– A única coisa que eu quero ouvir
saindo dessa tua boca é aquele gemido
delicioso.
Não foi intencional. Não foi para
provocá-lo ou excitá-lo. Mas foi só
ouvir esse sussurro quente e delicioso e
eu já estava gemendo.
Seus braços me envolveram e ele
começou a abrir meu sutiã. Se eu não
estivesse tão colossalmente excitada,
teria pensando em agradecer por ele não
estar destruindo o bojo da minha
lingerie cara. Mas eu estava encharcada
e insanamente desabotoando suas calças.
Seu pau latejava de desejo contra o
tecido. Mas eu não queria ele ali, queria
ele nas minhas mãos.
Ele estava com uma boxer cinza
agora. A cintura estava baixa e eu podia
passar meus dedos por aquele caminho
da felicidade enlouquecedor.
Ele me beijava com paixão e luxúria
e eu devolvia na mesma intensidade.
Senti suas mãos em meus joelhos
forçando minhas pernas a se abrirem.
Um de meus pés bateu contra a ponta da
cama. Greg hesitou e só voltou depois
que viu que o pé que tinha batido não
era o machucado.
Enfiei as mãos por dentro de sua
cueca e apertei sua bunda com gosto.
Depois me ocupei em tirar do caminho o
resto de tecido que ainda o cobria e
segurei sua ereção com força,
massageando da base até a ponta e de
volta. Ele fechou os olhos e agora era
ele quem gemia.
– Acho que eu quero você na minha
boca – confessei.
– Depois – ele disse, e havia urgência
na sua voz. – Eu não aguento mais
esperar por esse teu corpo. Você queria
que eu te fodesse, não era? Acho que é
isso que eu vou fazer.
Seus lábios estavam no meu queixo e
no meu pescoço. As mãos de Holt me
apertavam com força e desespero. Era
como se ele não aguentasse esperar mais
nem um segundo, como se precisasse do
meu corpo inteiro de uma só vez.
Seu pau estava na entrada da minha
vagina, me acariciando de leve,
raspando no meu clitóris, me deixando
louca de desejo.
– Para, Holt. Enfia esse pau em mim
de uma vez. – Agora era eu quem não
estava aguentando.
Ele ainda estava me beijando no rosto
e no pescoço enquanto eu rebolava,
tentando forçar seu pênis contra minha
vagina. Mas Holt estava no controle e ia
ser quando ele quisesse, na velocidade
em que ele quisesse.
– Ah, você não faz a menor ideia de
há quanto tempo eu estou cheio de tesão
por essa tua bocetinha. Vou comer ela
bem devagarzinho.
Eu estava pronta para gozar ali
mesmo. Sem penetração nem nada. Só
com aquele roçado delicioso e aquela
voz contra o meu pescoço.
Minhas mãos se perderam em seu
cabelo e ele fazendo uma trilha de
beijos até meus seios. Eu continuava
rebolando, e ele desceu uma das mãos
até o próprio pau e o segurou a uma
distância segura de mim, raspando o
membro contra meus pelos ralos e
experimentando minha umidez, um
pouquinho de cada vez.
Eu gemi alto enquanto Holt segurava
um dos meus peitos com a boca.
Beijava, lambia e mordia um mamilo. E
depois o outro.
Eu tentava me empurrar para baixo e
me contorcia sob o seu corpo apenas
para encontrar seu pau ainda longe
demais.
– Quero ver se você vai ter coragem
de continuar usando aqueles shortinhos
minúsculos agora. – Ele voltou para a
minha boca. – Depois de experimentar
isso aqui eu não quero mais saber.
Rebola essa tua bunda na minha frente
de novo e eu como ela todinha.
– Quem sabe? Talvez se você se
comportar eu deixe você meter onde
você quiser.
Parece que aquela última frase foi
demais pra Holt e eu senti seu pau me
rasgar.
Ele tinha dito que ia me comer
devagar, mas acho que aquilo ia exigir
um autocontrole que ele não tinha mais.
Socava com força e eu queria que fosse
mais rápido, mais forte. Queria ele em
mim até o talo. Queria que socasse até
doer.
Acho que Holt estava perto de gozar,
porque ele parou ofegante e espremeu os
lábios contra os meus.
– Fica de quatro?
Lambi sua boca e o beijei antes de ele
sair de dentro de mim para que eu me
virasse.
Suas mãos seguraram minha bunda,
me mantendo firme, e ele meteu na
minha boceta mais uma vez.
Seu toque ia do meu quadril para
minha cintura e de volta para a minha
bunda. Me empinei para que ele pudesse
ver meu corpo do jeito que eu sabia que
ele queria. Comer Dominique Thoen de
quatro. É, aquele soava como um desejo
que ele poderia ter. E eu ia realizar cada
centímetro dele. Rebolei e o senti se
dobrar contra mim com suas mãos em
meus seios. O suor grudava meus
cabelos nas minhas bochechas e no meu
pescoço.
Holt estocava rápido e com força.
Senti uma de suas mãos esfregando
minha coluna, enquanto a outra passeou
pelo meu estômago e atingiu meu
clitóris. Ele ainda estava socando
quando seus dedos beliscaram meu
clitóris e o seguraram em um aperto
indescritivelmente delicioso. Eu
comecei a gozar e ele meteu ainda mais
forte e ainda mais rápido.
Acho que passei uns quinze segundos
gozando.
Capítulo 12
“Abra os olhos e olhe pra mim. Não, eu
não vou te beijar. Apesar de que você
precisa ser beijada. Muito.”

Rhett – E o vento levou

Gregory se mexeu rápido demais e eu


acordei.
– Porcaria. – Ele levantou da cama
em um pulo, e eu tive uma visão
privilegiada daquela bunda gostosa
enquanto ele corria para o banheiro. –
São nove horas!
Virei de lado na cama e vi Max
levantar a cabeça apenas para deitá-la
de novo no chão, ignorando o desespero
do seu dono.
– Achei que você era super
responsável, Holt – provoquei. – Não
sabe usar um despertador?
Ele entreabriu a porta do banheiro e
eu o vi enfiando suas calças sociais. A
braguilha ainda aberta exibia a cintura
da sua cueca e aquela torneirinha
abençoada. Tirou a escova de dentes da
boca:
– Não faz isso, Dom. – Ele tinha
nervosismo nos olhos, e eu achei que era
melhor colaborar.
– Relaxe! Ninguém vai nem notar.
– Fora o juiz – disse, cuspindo a
pasta.
– Você tem uma audiência? –
arregalei os olhos para ele e me senti
subitamente desperta.
Holt estava fazendo que sim com a
cabeça e terminando de abotoar a
camisa.
Sacudi o edredom para longe e fui
abrir a gaveta das gravatas. Escolhi uma
verde sóbria e me aproximei. Greg
ainda estava vencendo os botões da
camisa e seu nervosismo se transformou
em um sorriso sapeca assim que
coloquei meus braços ao seu redor para
dar o nó na sua gravata.
– Acho que você ficar nua assim tão
perto de mim não vai ser bom para a
minha pontualidade.
Puxei o nó com força e ele engasgou.
– Concentre-se – aconselhei enquanto
ele ajustava o nó e acariciava o próprio
pescoço fazendo uma careta para mim.
Deixei-o calçando as meias e virei
para o guarda-roupa, plenamente
consciente de que seus olhos estavam
cravados na minha bunda. Abri uma das
portas e me abaixei para pegar um par
de sapatos. Seria mentira se eu dissesse
que não me empinei exageradamente só
pra ele. Seria mentira também se eu
dissesse que não tinha achado os sapatos
imediatamente e fingi que ainda estava
procurando alguma coisa só para lhe dar
mais tempo de me observar.
Uma mão escorregou pela minha
bunda e se enfiou entre as minhas coxas.
Ia me levantar quando senti a força de
uma de suas mãos contra minhas costas e
a outra procurando meu clitóris. Dois
toques rápidos e eu estava úmida. Não
muito. Mas mesmo assim, úmida.
Ele meteu dois dedos em mim e eu
levantei. Dessa vez ele tinha deixado.
Empurrei seu braço rindo e Holt me
prendeu entre o guarda-roupa e seu
corpo. Moveu os dedos dentro da minha
vagina e eu suspirei. Sua mão estava na
minha cintura, subindo para o meu seio.
Seu desejo estava no meu corpo, mas
seus olhos estavam nos meus. Seu olhar
calmo e profundo me consumia e
congelava quando tirou os dedos de mim
e os levou vagarosamente até a própria
boca. Fechou os olhos e chupou como se
tivesse chocolate derretido nas mãos.
Gemeu, passou a língua nos lábios e
me observou por segundos inteiros antes
que eu finalmente o lembrasse:
– O juiz está esperando.
– Merda! – Levantou as mãos para a
cabeça e me largou. Me apoiei nos
joelhos rindo de seu jeito moleque
desesperado.
Holt correu pelo quarto pegando
paletó, carteira e chaves, e eu ia buscar
minhas roupas quando ele voltou
completamente vestido e segurou minha
cintura nua mais uma vez. Me beijou
longamente. Me soltou, beijou a base do
meu seio, então o mamilo. Eu ri e ele
beijou minha boca mais uma vez.
– Tente não correr uma maratona
hoje, por favor.
Levantei a mão em juramento.
Ele me beijou mais uma vez e saiu.

Eu não ia passar o dia inteiro na


cama.
De jeito nenhum.
Os hematomas no meu corpo já
começavam a mudar de cor e o meu
reduzido conhecimento em medicina me
dizia que isso era um bom sinal. Meu
braço e meu pé estavam
consideravelmente melhores e, de um
modo geral, eu me sentia muito bem.
Mas talvez isso fosse só a dose
concentrada de endorfinas da noite
anterior ainda gritando pelo meu corpo.
Meu trabalho árduo durante a semana
garantiu que eu não tivesse muito o que
arrumar na casa de Holt nessa segunda-
feira. Eu escolhi algumas caixas
incompreensíveis e comecei a organizá-
las.
A caixa classificada como “Presentes
de Natal” era composta pela mais
variada coleção de tralhas que Gregory
deveria ter ganhado de presente de natal
ao longo dos anos. Boa parte delas de
colegas de trabalho, eu supus.
Reconheci uma caneca aqui e uma
caneta ali que eu também tinha ganhado
em determinado momento, e que
pareciam ter sido compradas no mesmo
lugar. Pontos para os nossos colegas de
trabalho pela praticidade…
Eu, particularmente, nunca me
preocupei em dar presentes de fim de
ano para ninguém. Nem para mim
mesma. Eu geralmente passava a
véspera de Natal na festa que um dos
sócios majoritários organizava todos os
anos, e o dia de Natal na Sopa da
Lauren. De noite, eu ouvia Art Blakey e
comia panetone. Era a isso que se
resumia minhas comemorações
natalinas.
Uma corrente de ar frio passou me
arrepiando e eu coloquei os braços ao
meu redor para me aquecer. Os
moleques da rua estavam andando de
skate e acenaram para mim quando eu
fui fechar a janela. Acenei de volta antes
de voltar aos meus afazeres.
Misturei a caixa de presentes de Natal
com a das coisas que Holt queria olhar e
jogar fora. Achei que as duas
combinavam. Agora, só me restava tirá-
las do meio do caminho.
Na garagem elas ficariam bem até
Holt decidir verificá-las, provavelmente
no dia de São Nunca. A ideia foi boa e
simples. A execução estava se
mostrando um pouco mais complicada.
As caixas eram pesadas demais para
o meu braço e pé. Precisei de alguns
minutos e de uns goles de suco para ter
uma ideia.
– Hey! – chamei. – Vocês querem
ganhar uns trocados?
Os moleques pararam e se
aproximaram.
– Com o quê?
– Preciso levar umas caixas para a
garagem, mas estou com o braço
machucado. E… – lembrei de mais uma
coisa. – A grama precisa ser cortada. O
que acham?
Eu estava marchando meus pequenos
duendes de casa para a garagem e de
volta para a casa, quando Andy
apareceu.
– Você sumiu. – ela tinha um ar
crítico. Como sempre. – Mas como não
ouvi notícias suas pelo resto do dia,
achei que era uma coisa boa – riu. –
Você e Holt…?
– Andy! Crianças! – reclamei.
– O que é isso, por sinal? Está
explorando trabalho infantil, agora?
– Elas estão sendo pagas pelos seus
serviços.
– É assim que trabalho infantil
funciona, Dom – torceu o nariz.
Nosso breve momento de amizade e
confissões estava ficando cada vez mais
distante na minha memória e eu voltava
a achá-la insuportável com uma
velocidade impressionante.
– Se quiser ajuda, pode me chamar –
disse. – Eu e Rick carregaríamos essas
coisas para você, se você ainda está
doente.
– Não estou doente. Só machucada. E
consigo me virar muito bem, obrigada.
E… – percebi algo que não tinha notado
antes. – Vocês não tem o que fazer, não?
– Como assim? – Ela quis saber
enquanto eu abria a carteira para pagar
os meninos.
– Precisamos de um cortador de
grama, sra. Holt.
– Eu já disse que não sou casada com
ele, não disse? – reclamei.
– Esqueci o outro nome – admitiu, e
parecia ter medo de mim.
– É Thoen. Senhorita Thoen.
– Certo. Precisamos de um cortador
de grama, senhorita Thoen.
Eu estava me lembrando de todos os
meus dias de arrumação na casa de
Holt…
– Não tenho um cortador de grama.
– Ahmm… – os três garotos se
entreolharam – Podemos pegar um lá em
casa. Mas vai custar mais caro.
Eu estreitei os olhos para ele.
– Pois vá buscar, seu pequeno
capitalista – eles correram rindo. – Mas
eu quero essa grama perfeita, ouviram?
– acrescentei alto. – Você não trabalha?
– perguntei a Andy, explicando minha
pergunta anterior.
– Ah. Trabalho.
– Mas está de férias?
– Não.
– Então o que diabos você faz em
casa o dia todo? E o Rick? E a Shelbi? –
de repente, notei que ninguém naquele
lugar parecia trabalhar.
– Eu trabalho com tradução.
– Tradução?
– É. De livros, sabe? E de
documentos. Faço a maior parte do
trabalho em casa.
– E isso paga bem? Quero dizer, deve
pagar, já que você tem uma casa aqui.
– Isso não é pergunta que se faça,
Dominique – rosnou.
– Ah, sim! E perguntar se eu transei
com Holt é – devolvi.
– E transou?
– Ahh… – Joguei a cabeça para trás e
esfreguei as têmporas – Vem. Entra. Não
vou falar sobre isso do lado de fora.

– Não acredito que você fala russo.


Ela respondeu com algum barulho
incompreensível.
– E o que isso significa?
– Significa “Eu falo russo”, em russo.
– Ah. Se algum dia eu precisar de
uma tradutora…
– É só me chamar – sorriu. – E paga
melhor do que você imagina. Mas eu
venho de uma família com algumas
condições. Não somos ricos, nem nada
assim. Eu queria ser artista, logo quando
saí de casa, aí recebi um bom dinheiro
para começar a vida e o apliquei bem.
– Interessante. – Eu estava
impressionada. Havia mais na Capitã
Planeta do que eu tinha imaginado
originalmente – Que tipo de arte você
faz?
– Escultura, principalmente. Nada
muito grandioso. Eu arrisco pintar, de
vez em quando. Você gosta de arte?
– Gosto daquelas que são exibidas em
algum museu na França – brinquei. –
Mas feitas pelas minhas mãos? Não.
Nunca. Não tenho esse dom.
Andy estava me observando de um
jeito curioso. Como se eu fosse parte de
algum experimento que está dando
resultados quase satisfatórios.
– O que foi?
– Você está agradável.
– Não, não estou. Você é que
aprendeu como eu sou e parou de me
chamar de vagabunda a cada três
segundos e meio.
Ela riu e engasgou com um gole de
água.
– Calma. – Dei dois tapinhas em suas
costas.
– Adorei o jeito como você falou com
o Eric.
– É. Mas acho que o filho da puta
ainda merece um pouco mais de estrago,
sabe? – Eu estava gesticulando em uma
tentativa de dar forma a minha angústia
– Foi bom dizer que ele tem um pinto
pequeno, mas eu queria… Eu queria…
Colocá-lo nu! – decidi – E apontar. E
rir.
Ela estava rindo compulsivamente.
– E ele tem? O…
– … pinto pequeno? Sinceramente,
Andy, você precisa começar a conseguir
dizer as palavras. Conversar assim é
difícil.
– É. Pinto pequeno – ela riu. – Tem?
– Tem. – afirmei categoricamente – É
do tipo que se você não se esfregar,
você não goza.
Nós começamos a rir e minha mente
foi para Shelbi. Acho que a de Andy
também, porque ela voltou ao seu copo
de água e a brincadeira simplesmente
perdeu a graça.
– A gente precisa contar para Shelbi.
Eu respirei fundo.
– Tudo bem.
Ela arregalou os olhos para mim.
– Você está falando sério?
Agora que Holt já sabia, eu podia
contar até para o papa.
– Estou. Mas por que você ficou tão
nervosa?
– Porque… Porque… Eu achava que
você ia dizer que não. Achava que você
ia me convencer a ficar quieta.
Eu abri a boca completamente
estupefata.
– Se você não quer contar para ela,
por que sugeriu?
– Porque achei que seria o certo a
fazer?
– Então, por que queria que eu te
convencesse a não fazer?
– Porque… sei lá. É o casamento
dela. E se a gente estragar tudo? E se
eles se divorciarem e for horrível? E se
ela sofrer? E se ela… se matar?
– Você acha que ela faria isso?
Andy levantou os ombros.
– Shelbi é uma pessoa muito doce.
Não sei o que algo assim faria com ela.
Eric é… Ele é sua vida inteira, sabe?
Ela não trabalha, quase não tem amigos.
Ela vive para ele. Não sei o que
acontece quando você tira a razão de
uma pessoa assim.
– Aí você vem e joga essa bomba em
cima de mim?
– Eu só queria saber sua opinião!
– Você é que é amiga dela! – Nós
duas estávamos muito perto de começar
a gritar. – Como eu vou saber o que
fazer?
– Você é mais velha. Tem mais
experiência!
– Mais velha? Quantos anos você
acha que eu tenho?
– Não sei… uns vinte e seis?
– Vinte e sete! – exclamei. – E você
tem… o quê? Vinte e quatro? Vinte e
cinco?
– Quase vinte e quatro – murmurou.
– E você acha que três anos de
diferença me dão mais experiência do
que você no quesito a vizinha vai se
matar de que maneira, exatamente?
– Eu não sei o que fazer!
– Nem eu!
– Diz o que você acha!
– Eu não acho nada! Essa coisa toda
de tentar fazer o que é certo é novidade
para mim! Volte a falar comigo quando
tiver um plano. E um bom plano.
– Certo. Tudo bem. – Andy
gesticulava e eu não sabia se ela estava
tentando se acalmar ou me acalmar. –
Vamos deixar o assunto de Shelbi de
molho por um tempo.
Tudo que Andy fez foi dizer as
palavras “por um tempo”.
Para ela era só um comentário. Para
mim tinha uma dimensão muito maior.
Meu tempo ali era limitado.
Engoli a seco.
Logo, logo eu teria que voltar para
casa e deixar tudo aquilo para trás. Eu
tinha um emprego, uma casa e uma vida.
Não podia abandonar tudo.
Lembrei de Holt.
Lembrei do seu beijo corrido de
manhã. Na minha boca. No meu seio.
Eu nunca quis aquilo: ter um homem
na minha vida. Sempre me pareceu
muito mais trabalhoso do que benéfico.
E todas as poucas vezes em que decidi
experimentar, percebi que eu estava
certa.
Mas com Holt… Com Holt era
diferente. Ou, pelo menos, eu queria que
fosse diferente.
Tinha algo me incomodando. Algo
bem fundo em mim, e eu não sabia
expressar em palavras o que era.
– O que foi?
Meu silêncio repentino deve ter
entregado minhas emoções para Andy.
– Eu estou apaixonada pelo Holt.
– Ahmm… Já conversamos sobre
isso.
– Eu contei para ele.
– Sério? – Ela deu um pulo. Mas não
foi um pulo daqueles que amigas frescas
dão quando querem te parabenizar por
algo. Não que eu tenha tido muitas
amigas frescas. Não que eu tenha tido
muitas amigas. Mas o pulo de Andy foi
humano e genuíno. Ela estava animada e
queria saber o resto da história. – Eu
estava certa, não estava? Vocês
transaram. – Ela sussurrou a última
palavra e eu ri da sua contínua
inocência.
– Foi, Andy… Se você precisa saber.
– E? Foi… romântico?
– Rá! – Ela podia ser impossível, mas
eu me divertia com ela como jamais
tinha me divertido com alguém. – Foi
gostoso. – Fechei os olhos. – Muito
gostoso.
– E qual o problema?
– O problema é que eu tenho que ir
embora.
– O quê? Mas você mora aqui.
– Não, não moro. – Olhei pra ela,
descrente – Só vim ajudar Holt com a
mudança. Eu moro do outro lado do
país. Tenho minha vida inteira lá. Estou
de férias, e quando elas acabarem, vou
ter que voltar.
– Não. – Ela se sentou. – Não faz
isso.
Seu tom me envolveu como um
delicado veludo. Acho que iria sentir
minha falta.
– Não tenho opção – disse levantando
um ombro.
– Tem sim. A gente te arranja um
emprego aqui. – Ela levantou e estava
andando pela cozinha como se o
movimento pudesse gerar mais ideias. –
Eu… Eu te ensino russo! – apontou a
mão para mim como se todos os
problemas estivessem resolvidos e eu ri.
– Não é assim que funciona, Andy. E
você sabe. O problema é exatamente
esse. Acho que eu gostaria de ficar. Mas
não posso. E tenho medo de… de querer
mais do que eu já quero.
– Não! – Ela me segurou pelos
ombros – Não faz isso!
– Fazer o quê? Me solta, sua
perturbada!
– Você vai fazer isso, de novo. –
Apontou o indicador para o meio do
meu rosto e eu segurei sua mão. – Vai
ficar com medo porque vai doer muito
na hora de ir embora e aí vai se
esconder e não vai viver o que pode
viver por medo de uma dor futura.
– Certo, obrigada pela dica, Oprah.
Vou escutar a garota semivirgem com
nenhuma experiência de vida falar sobre
os meus assuntos afetivos.
– Eu tenho o Rick! E o Thierry, e até a
Shelbi. Tenho uns amigos da escola de
arte. Tenho um monte de gente legal na
minha vida, Dom. E você…
– Eu não tenho ninguém – completei
as palavras que ela teve a delicadeza de
não dizer.
– E não é porque você é uma pessoa
ruim. Quer dizer – sorriu –, você é bem
ruim. – mordeu os lábios como se fosse
uma criança que acabou de aprontar. –
Mas é esse seu medo horrível de se
machucar. Você finalmente admitiu que
está apaixonada pelo cara. Transou com
ele e tudo. Disse que foi ótimo. Aí se
lembra de que vai acabar e desiste de
tudo. Se você tem só mais uma semana,
vive essa uma semana, ou esse um mês,
ou seja lá quanto tempo você ainda tem.
E quando doer… quando doer, doeu.
– Tenho que admitir que seu discurso
faz algum sentido.
– Ainda bem. – Ela se jogou sentada
na cadeira e abriu um pacote de
biscoitos. – Porque se você voltasse
para aquela ladainha de “Não estou nem
aí pra ele” quando, claramente, está, eu
não ia aguentar.
– Você fala como se tivesse passado
anos me ouvindo falar sobre Holt –
disse, e mostrei a língua pra ela.
– Ah, mas quando você começa a
falar – Moveu a mão como se tivesse
controlando um fantoche –, parece que
anos se passaram.
Dei uma tapa na sua mão e roubei seu
biscoito.
Eu não diria que não estava nem aí.
Eu não diria isso sobre Holt nunca mais.
Seria mentira. Seria uma mentira bem
grande.
Eu realmente achei que não estava
apaixonada por ele. Realmente… Ou
será que não? Será que eu estava só me
enganando?
Não seria minha primeira regra
quebrada por causa do Holt, e eu tentei
não me deter muito nisso.
Não era importante. Não agora.
– E o que ele disse? Quero saber
todos os detalhes! – Seu sorriso parecia
o de uma menininha falando sobre
garotos pela primeira vez. – Os detalhes
românticos, não os pervertidos –
acrescentou com um gesto de desprezo e
eu roubei outro biscoito. – E pare de
fazer isso, por favor – riu.
– Como assim, o que ele disse? –
separei as camadas e comi o recheio de
chocolate primeiro.
Andy fez uma careta impaciente, mas
eu realmente não tinha entendido.
– Quando você disse que estava
apaixonada. O que ele disse?
Simples assim, eu tinha colocado
nome e sobrenome no meu incômodo.
– Ele… Ele não disse nada.
– Nada? – tapou a boca, mastigando.
– Não, quero dizer… Ele disse muitas
coisas, mas…
Mas ele não tinha dito como se sentia
por mim. Não tinha dito nada. Tinha me
chamado de linda, gostosa e impossível.
Ele se preocupava, essa parte estava
bem clara, mas… Tinha mais alguma
coisa?
Respirei fundo e encarei Andy.
Quando doer, doeu.
Talvez aquela dor fosse chegar antes
do que eu imaginava.

Algumas batidas na porta do meu


escritório chamaram a minha atenção.
– Lynn! Entre.
Eu sabia que ia me encontrar com ela
mais cedo ou mais tarde. Mas depois de
todo o episódio no sábado à noite,
esperava que fosse mais tarde.
– Você está me devendo um jantar.
– Com certeza, te devo um pedido de
desculpas.
Ela fechou a porta atrás de si e se
sentou em uma das cadeiras. Sentei na
mesa, de frente pra ela.
– Espero que tudo tenha se resolvido.
– Ela deu um leve aperto no meu joelho
e logo me soltou.
– Sim, tudo resolvido. – Eu estava
irremediavelmente constrangido. Eu a
tinha colocado em uma situação de
extrema intimidade e agora precisava
me desfazer dela e, de preferência, sem
muitas perguntas.
Lynn ficou sentada de pernas cruzadas
me observando como se esperasse que
eu dissesse alguma coisa.
Eu enchi o pulmão e fiquei ali,
resolvendo se abria ou não a boca.
Droga.
Eu não fazia a menor ideia do que
dizer.
– Sua amiga – ela começou. – A do
cachorro – sorriu. – Tem uma história
ali, não tem?
– Uma bem longa – expirei. Eu
conseguia sentia a tensão no ar e ela
estava impedindo que eu respirasse do
jeito que precisava. – Escute, Lynn,
eu… Não foi minha intenção te enganar
ou algo do gênero. Quando te chamei
para sair foi verdadeiro, foi…
espontâneo, mas…
– Mas tem uma longa história com a
moça do cachorro.
– Uma bem longa – repeti.
– É como assistir a Senhor dos Anéis
– murmurou, me oferecendo uma
piscadela.
– Perdão?
– É um filme bem longo.
– Verdade… – Eu não estava
entendendo.
– Chega um ponto em que… Não
importa se você está gostando da
história ou não. Você simplesmente
precisa saber como ela termina. Quero
dizer… Você já veio até aqui, não é?
Não pode ser trabalho desperdiçado.
– Ah – suspirei compreendendo.
– Então, termine seu filme, Gregory. –
Ela se levantou e apertou meu ombro –
E, se ele acabar sendo tão horrível
quanto O Senhor dos Anéis – sorriu
sugestivamente – Talvez tenha um filme
melhor te esperando depois.
Ela saiu pensando que tinha deixado
um clima de mistério no ar. E só o que
eu conseguia pensar era que tinha
adorado O Senhor dos Anéis. Os livros
e os filmes.
Tinha conseguido me concentrar no
trabalho perfeitamente bem até agora.
Bastou ter conversado com Lynn e eu
estava pensando em Dominique mais
uma vez.
E, por mais incrível que possa
parecer diante da situação, não era em
seu corpo que eu estava pensando.
Aquele corpo que me encheu de desejo e
fome por tanto tempo. Mas não… Eu
estava pensando em seus olhos. Em sua
voz. No jeito como ela tinha amarrado
minha gravata.
“Eu estou apaixonada por você.”
Ela deve ter ido ao inferno, lutado
muay thai contra o demônio e voltado
antes de ter tomado coragem para se
abrir desse jeito. Era impressionante
que ela tivesse se permitido chegar a tal
nível de vulnerabilidade.
Acho que era exatamente por isso que
eu não acreditava em uma palavra.
Ela não estava apaixonada por mim.
Era tesão. E, no momento, ela me quis e
fez o que precisava para me ter. Assim
como ela fazia em todos os outros
aspectos de sua vida.
Eu não queria ser só um peão no seu
tabuleiro. Não podia me permitir baixar
a guarda agora. Eu tinha arrancado uma
página do Manual Dominique Thoen de
Sobrevivência e o estava seguindo à
risca.
Ironia do destino, eu acho. Mas agora
era eu quem precisava tomar cuidado.
Não podia me abrir e correr o risco de
ser alguma brincadeira sádica do seu
repertório. Se fosse verdade, o tempo
diria. Mas se não fosse e eu admitisse
como me sentia…
Eu não aguentava aquele sorriso. Meu
toque nos seus cabelos macios. Ainda
me lembrava de sentir seu coração
batendo contra minha pele quando ela se
deitou sobre mim. Nua. A sensação de
acariciar sua espinha e poder beijá-la
quando eu quisesse.
Cocei os cabelos gastando energia.
Nunca tinha me sentido assim na vida.
O jeito como eu me sentia próximo a
ela não podia ser explicado em
palavras, era… Magnético. Superava
qualquer razão e qualquer sentido.
Acho que tanto tempo de ódio tinha se
transformado em algo absolutamente
poderoso e que estava pronto para me
consumir. Se eu dissesse as palavras e
me permitisse sentir algo por ela, eu
sabia que não teria mais volta.
Eu não queria dizer as palavras em
voz alta.
Eu não iria dizer as palavras em voz
alta.
Mas lá no fundo, em algum lugar
dentro de mim, meu coração parecia
saber que ela, com todas as suas
loucuras e imperfeições, era a mulher da
minha vida.

– Dom?
– Na cozinha, alimentando o seu
cachorro infernal – ela gritou. – Max!
Quieto! – ela misturava gritos com risos
e eu imaginei que ela e Max estavam
começando a se entender.
Enfiei a cabeça pela porta.
– Tudo certo com vocês dois?
– Não exatamente. – Max tinha
colocado as patas da frente no balcão e
estava disputando uma tigela de cereais
que, eu imaginei, Dominique tivesse
colocado para ela. – Isso aí se recusa a
comer o que a gente serve.
Ela estava coçando suas orelhas e
empurrando sua tigela para longe.
Dominique estava com uma regata que
marcava seus seios fartos, a alça escura
do sutiã caindo pelo braço. Tinha uma
colher enfiada na boca e um sorriso no
rosto enquanto brincava e reclamava
com meu cachorro.
Fiquei parado na porta sorrindo.
Eu poderia voltar para casa todos os
dias para aquela cena e seria feliz.
Ou melhor: Dominique poderia voltar
comigo.
Ela acabaria de ter destruído alguém
em uma audiência com toda a sua
inteligência e sagacidade. Eu assistiria
fazendo nada além de sussurrar as
informações que ela solicitasse, para
que a outra parte não fosse ouvida.
Voltaríamos para casa, transaríamos no
chuveiro e depois ela ia colocar aquela
regata. Faria uma tigela de cereal e
brincaria com Max enquanto a alça do
seu sutiã cairia pelo seu ombro. E eu
ficaria sentado em um canto sendo feliz
só por fazer parte daquilo.
A felicidade pode ser tão simples.
– Preciso tomar um banho – falei.
Precisava sair dali antes que a pedisse
em casamento ou algo igualmente
absurdo. – Desço em quinze minutos.
– Tá. – Talvez ela fosse dizer mais
alguma, mas Max estava pulando mais
uma vez. – Para! Cachorro enviado por
Satanás! Chega! – Ela levantou com a
sua tigela e estava tentando sair do
alcance das patas do labrador.
Subi as escadas ainda rindo. Coloquei
a roupa suja no cesto e liguei a ducha.
A água quente lavou meu corpo e eu
inspirei o vapor.
De um modo geral, estava muito
satisfeito com a minha vida.
Nunca tive problemas em manter
relacionamentos sérios. Mas nunca
estive particularmente apaixonado por
nenhuma de minhas namoradas também.
E essa experiência de viver com uma
mulher era interessante. Apesar de que,
se eu me casasse com Dominique, nunca
iria querer ela em casa o dia inteiro. Ela
ia enlouquecer, ia me enlouquecer e
nunca daria certo. E, além do mais,
nunca seria uma situação aceitável para
ela.
Esfreguei o xampu no cabelo com
força para trazer minha mente de volta à
realidade.
Casar com Dominique. Gregory…
Escute o que você está falando.
Tudo bem que eu já estava batendo na
porta dos trinta e que a vontade de me
acomodar começava a crescer dentro do
peito sem ser convidada. Mas a gente
tinha transado uma vez e eu estava
pensando em casamento.
Gregory Holt, você virou uma mulher
do século passado.
Com todo o respeito às mulheres e ao
século passado.
Deixei o rosto contra a água. Um
toque delicado no meu quadril me
assustou e eu respirei fundo dentro do
jato de água. Virei tossindo.
Dominique estava nua. Nua e
molhada. Nua e molhada, junto comigo,
nu e molhado.
Isso não ajudou a minha tosse.
Nem um pouco.
– Calma – ela riu, colocando a mão
no meu peito.
Meu pênis ainda estava flácido, mas
não ia ficar assim por muito tempo.
– Vai me matar afogado? Eu sabia que
você devia ter um plano – sorri,
puxando-a para um abraço.
– Droga. Fui desmascarada. – Ela deu
um murro leve no meu braço. – Mas o
plano era te afogar só depois.
– Depois?
– Depois – repetiu, sugestiva.
– Ah… Então acho que eu vou morrer
feliz.
Beijei sua boca e desci a mão pela
sua bunda. Minha nossa… aquela bunda.
A apertei com gosto, forçando-a a
mover a pélvis na minha direção. Dom
ia reclamar de alguma coisa, mas eu
mordi sua boca e não deixei ela se soltar
do beijo. Suas mãos estavam no meu
pescoço e eu a tinha molhada em meus
braços. Espremi seu corpo contra o meu
e senti meu pau latejando contra seu
quadril.
Dom dobrou os braços e empurrou
meu tórax para longe. Eu não sabia o
que ela estava fazendo, mas eu sabia que
ela era uma mulher que não aceita ser
contrariada quando decide algo. Apertei
meus lábios de desejo e a observei.
Gotas de água se acumulavam e
escorriam em cada nuance do seu corpo
e eu desejei segurá-la e mantê-la parada
por alguns minutos para que eu pudesse
só memorizar cada detalhe.
Ela segurou minhas mãos ao lado do
meu corpo para que eu não a tocasse e
me beijou. Primeiro na boca, depois no
pescoço. Dom me soltou e sorriu pra
mim de um jeito tão safado que eu tive
vontade de jogá-la contra a parede e
fodê-la até ela gritar “Chega”. Mas ela
se ajoelhou no box e eu achei que
estivesse sonhando. E quando ela passou
a língua pela cabeça do meu pau, tive
certeza.
– Eu disse que queria você na minha
boca, não disse? sussurrou contra minha
ereção e enfiou minhas bolas na boca.
Aninhei meus dedos em seus cabelos e
segurei sua cabeça contra mim enquanto
aquela boquinha de veludo me lambia e
me chupava.
Dominique puxou o ar, prendeu a
respiração, e eu a assisti enfiar meu pau
inteiro na boca. Uma vez e outra. E mais
uma. Eu estava gemendo sem controle.
Sentia sua boca ao meu redor, seus
lábios protegendo os dentes, meu pau
chegando na sua garganta.
Fez um movimento involuntário para
frente, e percebi que devia estar quase
gozando. Tentei diminuir a velocidade,
mas ela não parou. Não estava mais
enfiando meu pau até sua garganta, mas
estava deixando que eu fodesse sua
boquinha, o que era praticamente tão
paradisíaco quanto.
Alisei seus cabelos e mantive meus
olhos em sua boca, assistindo ao
movimento de sua bochecha no ritmo
das minhas estocadas. Ela se empinou e
arranhou meus testículos com suavidade.
Eu não ia aguentar.
Nem mais um segundo.
A empurrei para longe um pouco
bruscamente demais e ela olhou pra mim
confusa.
– Vem – chamei.
Ela ia falar alguma coisa.
Claro que ia. Dominique Thoen
sempre precisava questionar uma ordem.
Mas meu pau estava furiosamente
duro, eu estava pronto para ejacular
para todos os lados e não queria que ela
não gozasse.
A segurei com força e a joguei contra
a parede. Pensei em pedir desculpas
pela violência, mas ela estava rindo
excitada, então simplesmente continuei.
Levantei uma de suas pernas pelo joelho
e meti com força sem diminuir a
brutalidade. Ela começou a gemer meu
nome e eu queria que ela parasse, ou eu
ia gozar imediatamente.
Afastei meu tórax do seu e diminuí a
velocidade em uma tentativa de
reassumir o controle. Mas aquilo foi
pior ainda. Ela rebolava devagar e
enfiava os dedos na boca, para depois
levá-los aos mamilos em uma dança
erótica que fazia minhas entranhas
ferverem.
Aqueles seios perfeitos se
movimentando no nosso ritmo, o quadril
grudado no meu…
Puta merda.
Por que ela tinha que ser tão gostosa?
– Dom, eu não aguento mais.
– Aguenta sim. – Ela arranhou meu
peito. – Não goza ainda, Holt. Me fode
mais um pouquinho.
Eu a beijei e fiz exatamente o que ela
mandou. Estava ficando quase
impossível me conter, mas eu me
segurei. Mais e mais. Não sei de onde
eu estava tirando forças para resistir ao
gozo com meu pau enfiado até o talo
naquela morena perfeita.
E quando ela começou a gemer mais
alto, eu aumentei a velocidade. Quanto
mais alto ela gemia, mais fundo eu
enfiava e com mais força. Até ela gritar.
E ela gritou.
Gritou meu nome.
Bem alto.
E ouvir seu grito rouco e louco de
desejo chamando meu nome foi mais
excitante do que todo o resto.
Eu gozei dentro dela com a boca
contra o seu pescoço.
Capítulo 13
“Não entenda isso como uma ofensa.
Damas nunca me encantaram.”

Rhett — E o vento levou

Desenhei sua boca com meu indicador


e ela me mordeu.
– Ai.
– Foi só uma mordida de leve.
– Doeu.
– Frouxo. – Ela tinha uma risadinha
safada e sedutora.
– A gente vai começar isso de novo?
– Se você quiser. – Ela estava
passando os dedos pelos músculos no
meu estômago e eu quis querer. Mas eu
estava fraco, cansado e sonolento.
Dom beijou meu queixo e meu
pescoço. Eu a abracei com força e a
espremi contra os travesseiros.
Você quer ser um homem forte,
resistente e potente. Mas tem hora que a
natureza diz não, agora não dá. E aí
você faz o quê?
– E então? O que você aprontou,
hoje? – Eu precisava mudar de assunto.
Fazê-la pensar em algo que não fosse
sexo e dar ao soldado pelo menos
alguns minutos para se recuperar e ver
se ele conseguiria enfrentar mais uma
batalha.
– Arrumei mais da sua zona. Estou
bem perto de acabar, ouviu? Vou querer
meu vídeo.
Já tinha notado que ela fazia isso.
Falava do vídeo quando queria falar de
sexo. Isso ia ser difícil.
– Vai ter. A casa está incrível, Dom.
Eu juro que tenho aquelas fotografias
emolduradas da França há anos e nunca
as tinha pendurado.
– Você não sabe usar um martelo? –
ela riu.
– Eu acho que nem tenho um martelo.
– E não tem mesmo. Tive que pegar
um emprestado com o Rick. Que tipo de
homem não tem ferramentas?
– Ah! E quem está proferindo
preconceitos de gênero, agora? –
belisquei seu nariz e ela se contorceu
entre meu braço e os travesseiros
tentando fugir de mim.
Ela era linda daquele jeito. Sem
qualquer maquiagem. O cabelo
despenteado. Vestindo uma de minhas
camisas.
Obviamente, ela também era linda
quando se produzia. Mas era gostoso vê-
la assim: sem escudo ou armadura.
Vulnerável.
– E parece que você fez amizade com
os vizinhos.
– É. Mas ainda não comprei os
presentes de agradecimento que você
pediu.
– Já tinha me esquecido disso. –
Dominique revirou os olhos para mim. –
E se eu fizesse uma festa? Uma pequena
reunião com os vizinhos, sabe? O que
acha?
– Sei lá – deu de ombros. – A casa é
sua.
– É, mas é você quem já conheceu a
comunidade inteira. – Apertei meus
dedos em sua cintura e a reação foi um
pouco mais exagerada do que eu
antecipei – Você sente cosquinhas! –
Ah, eu estava maravilhado com a ideia
de torturá-la.
– Não, não sinto. – Ela estava com a
mandíbula travada e segurava minhas
mãos com uma força animalesca, mas eu
mexi os dedos de novo e ela deu um
pulo.
– Para, Holt! Para! – ela reclamava e
tentava se mexer enquanto eu a mantinha
esmagada embaixo de mim,
– Peça penico! – expliquei – Peça e
eu paro.
– Nunca! Pare ou eu jogo o cachorro
em cima de você!
Parei, rindo.
– É, você já mostrou que é
profissional em fazer isso.
– Rá-rá-rá. – seu sorriso com a
língua estirada me fez rir mais ainda.
– Acho que vou convidar os vizinhos,
então.
– Eu posso fazer isso. À medida que
sua zona vai ficando sob controle, eu
tenho cada vez menos pra fazer.
– Tudo bem. Obrigado. Sexta-feira,
pode ser?
– Não. Pode ser no sábado.
Eu ri e beijei sua bochecha. Ela não
conseguia parar de ser mandona.
– Tem planos para sexta?
– Na verdade, tenho.
Toda a brincadeira se diluiu e eu me
peguei engolindo a seco. Era o que eu
imaginava desde o começo: ela estava
só brincando comigo?
– Tem um encontro, é? – Tentei dar
um tom jocoso a minhas palavras, mas
senti o incômodo impresso em cada
sílaba. Ela me beijou devagar,
provocando com sua língua, e eu me
acalmei.
– Vou ajudar Andy com uma coisa.
– Sexta à noite?
– É.
– Ah. Tudo bem.
– O que foi?
– Nada, é só que… Acho que seria
interessante te levar para um encontro
decente algum dia, sabe? – Ajeitei seus
cabelos atrás da orelha.
– A gente dá um jeito.
– É – Beijei sua boca mais uma vez e
desejei boa noite antes de apagar a luz.
– Greg? – ela me chamou, no escuro,
depois de alguns segundos de silêncio.
– Sim?
– Posso te perguntar uma coisa? É…
sobre um assunto delicado.
– Pode. Claro.
Ela acendeu a luz e eu fiquei
preocupado.
Dom se sentou na cama e eu me
apoiei sobre um cotovelo. Ela tinha a
testa nas mãos e parecia seriamente
perturbada.
– Ei! O que foi? – Acariciei seu braço
e me levantei para abraçá-la, mas ela me
manteve a uma certa distância.
– Eu não sou uma pessoa decente. E
você é.
– Dom, está tarde para discussões
filosóficas – sorri, tentando incentivá-la.
– É que eu não sei o que fazer com
uma coisa e… E pensei que talvez você
pudesse me dar uma sugestão.
– Tudo bem. O que é?
– É sobre o cara com quem eu fiquei.
– Ela falou rápido, como quem arranca
um curativo, e depois ficou em silêncio
esperando minha reação.
Engoli a seco. Não era um assunto
que me agradava, mas ela parecia
realmente precisar falar sobre aquilo.
– O que tem ele?
– O que eu faço? Digo alguma coisa
para a mulher dele ou fico quieta e não
me meto no que não é da minha conta?
– Eu não sei, Dom. Eu não conheço…
Não sabia o que dizer.
Odiava o homem.
Muito.
E não era só porque ele era um
crápula casado que traía a mulher. Mas
porque ele tinha ficado com Dominique.
Com a minha Dominique. Tinha
colocado suas mãos nojentas nela e
beijado sua boca e… E mesmo que ele
fosse o solteiro mais solteiro da história
do Universo eu ainda o odiaria. Ele ser
casado só facilitava a questão.
– Acho que isso foi uma má ideia, não
é? – Ela se esticou para apagar a luz e
eu segurei sua mão. Um relacionamento
com Dominique era como uma pescaria:
você não pode afastar o peixe. Ela
estava se abrindo para mim. Estava
pedindo meu conselho e minha ajuda. Se
eu a afastasse agora, ela podia nunca
mais voltar.
– Você é uma pessoa decente. Mesmo
que duvide disso às vezes. E é a pessoa
mais inteligente que eu conheço.
– Está tentando me seduzir com
elogios, Holt?
– É verdade. Seja lá o que for melhor,
eu tenho certeza de que você vai
descobrir. E vai fazer a coisa certa.
– Você tem confiança demais em uma
pessoa que passou a vida inteira fazendo
a coisa errada.
– Você não fazia coisas erradas,
Dom. Você fazia o certo para o que você
queria. Você sempre quis se proteger e
sempre conseguiu. Se quiser proteger
outra pessoa, vai descobrir a coisa certa
também.
Ela segurou meu rosto entre as mãos e
pôs seus lábios nos meus de um jeito tão
espontâneo e gentil que eu senti meu
corpo inteiro se arrepiar.
Talvez aquilo fosse realmente
possível.
Talvez ela estivesse realmente
apaixonada por mim.
Sequei o cabelo, enrolei uma toalha
no corpo e abri a porta do box.
Gregory estava nu, escovando os
dentes.
– Você precisa ficar nessa
indecência?
Ele mordeu a escova, andou na minha
direção e arrancou minha toalha.
– Ei! – reclamei, me tapando,
enquanto ele enrolava minha toalha ao
redor do próprio quadril.
– Que foi? – Sua dicção estava
estranha por causa da pasta na boca –
Você não disse que eu devia vestir algo?
– Sim. Mas não o meu algo. – Tentei
puxar a toalha de volta e ele lutou por
alguns segundos antes de ceder. Estava
claramente só tentando me provocar. Se
realmente quisesse a toalha, era três
vezes mais forte do que eu e teria ficado
com ela. Por alguns segundos, é claro:
até eu enfiar o pé contra sua virilha e
pegar de volta o que me pertencia.
– Quando é a audiência da ação de
danos morais?
– A que você descobriu algo que não
quer me dizer? – ele estava vestindo as
calças por cima da cueca.
– É – sorri satisfeita. – Quero saber
quanto tempo você ainda vai fingir que
não precisa implorar.
– Depois de amanhã. E eu não vou
implorar porque eu descobri o que é.
Me aproximei dele e fechei um pouco
os olhos, analisando a veracidade de
suas palavras. Tenho certeza de que vi
um sorriso em seus lábios.
– Não, você não descobriu – decidi.
– Ainda não – completou, vestindo a
camisa. – Mas vou descobrir.
– Não vai, não – cantei. Eu ia sair do
quarto para buscar minhas roupas
quando Holt puxou minha toalha mais
uma vez. Ia me virar para gritar e lhe dar
um tapa, mas, quando dei por mim, ele
tinha as mãos na minha cintura e estava
me jogando na cama.
Vi quando ele abriu a braguilha e
colocou a ereção para fora. Mordi
minha língua.
– Você vai se atrasar.
Arreganhou minhas pernas com as
mãos fortes e cuspiu na minha vagina
para lubrificá-la.
– Não vou, não.
Eu ainda estava seca quando ele me
rasgou e ardeu como o inferno. Mas a
sensação da sua camisa de cetim por
cima do seu tórax perfeito contra os
meus seios logo estava me estimulando
loucamente.
Foi rápido e gostoso tê-lo me fodendo
duro e com força. Ele gozou primeiro,
mas não parou de estimular meu clitóris
com os dedos até que eu o
acompanhasse.
Depois se limpou na minha toalha e
fechou a braguilha.
– Tchau, querida.
Já estava na porta quando deu a volta.
– Esqueci de perguntar! – disse
tocando a testa. – Vamos ter uma
pequena comemoração no escritório.
Vai ser amanhã à noite. Vem comigo?
Mordi o lábio e fiz que sim.
Ele sorriu, piscou para mim e se foi.

– Tá. Então a gente fala com a Shelbi.


– Você parece mais confiante hoje. O
que aconteceu, Greenpeace?
A pergunta foi boba e retórica, mas o
jeito como ela prendeu a respiração me
assustou. – O que foi?
– Nada… Não foi nada.
– Andy! O que foi?
– É que eu conversei com os meninos.
Eles também acham que é melhor falar
com ela.
Meu coração foi até a garganta e disse
“Dom, eu acho que vou ficar aqui, hoje”.
Respirei fundo e deixei meu mais
temível sorriso de fúria transparecer.
– Quem são os meninos? O que você
disse? E o que eles disseram?
– Calma. Não é o que você está
pensando – ela disse, levantando as
mãos.
– Você não sabe no que eu estou
pensando. – Meu corpo inteiro estava
rígido e travado. E quando eu falei,
meus dentes se recusavam a se separar
mais do que poucos milímetros –
Responda às perguntas.
– Foi só com o Rick e o Thierry.
Acabei de passar por lá. E não falei
nada sobre você. É só que… Nós todos
sabemos que ele faz isso e aí… Achei
que era uma bom ideia perguntar o que
eles achavam.
– Andy, se você contou que…
– Não contei nada. Palavra.
Não que eu me incomodasse se eles
soubessem. Não devia nada a nenhum
dos dois. Mas agora que eu tinha que
fazer aquilo do jeito certo para Shelbi,
todas as decisões ficavam em um
território completamente novo e
inexplorado para mim. Eu não sabia o
que fazer e não queria que nada desse
errado.
– Tudo bem. Então, nós vamos até lá
falar com ela.
– É, os meninos acham que ela devia
ouvir isso de mulheres.
– Pare de chamá-los de meninos,
Andy. São dois homens adultos.
Ela deu de ombros e sorriu. Eu abri a
última caixa que faltava e era a mais
incompreensível de todas. A marcação
dizia “Lembranças de A.H”.
Só faltava aquela. Só aquela e eu
poderia dizer a Holt que tudo tinha
acabado, apagar o vídeo e ir embora.
Senti um aperto no coração, mas sacudi
ele para longe e abri a caixa.
– O que é isso? – Andy enfiou as
mãos no conteúdo da caixa e começo a
puxar itens aleatórios.
– Estamos arrumando e não
bagunçando ainda mais. Se não se
incomoda. – Puxei a caixa de música e
um pequeno porta-retrato de suas mãos e
a vi movendo os lábios rapidamente em
uma clara ridicularização do que eu
tinha dito.
Ia começar a tentar desvendar onde
colocar cada coisa quando uma foto
chamou a minha atenção.
Holt estava sem camisa em uma praia.
A data na foto dizia que tinha sido tirada
há alguns anos. Antes de nos
conhecermos. Havia uma mulher nos
seus braços, na foto. Tinha os longos
cabelos dourados e os olhos azuis.
Sorria como se não tivesse nenhuma
preocupação na vida, enquanto Holt lhe
fazia cosquinhas.
Meu estômago se apertou e se
comprimiu.
– Quem é? – Andy quis saber por
cima do meu ombro.
– Não sei – respondi baixinho.
– Tem alguma coisa aqui dentro. –
Ela estava sacudindo a caixa de música.
– Cuidado com isso! – A tomei de
suas mãos desajeitadas e abri o fecho
com um cuidado exagerado. Tinha uma
pequena caixa de veludo lá dentro, e
uma embalagem de anel sem nenhuma
marcação.
Andy arregalou um par de olhos
curiosos para mim, mas ela não sabia
que eu não precisava de qualquer
incentivo: ia abrir aquilo de um jeito ou
de outro.
O anel que estava lá dentro era
deslumbrante. Repleto de diamantes que
formavam algo entre uma espiral e uma
elaborada rosa sobre o aro de ouro.
– Olha! Tem uma inscrição aí.
Girei o anel contra a luz e vi a
inscrição, em uma caligrafia elegante,
que dizia “A. Holt”.
Ele não falava sobre sua família. Eu
sabia que algo horrível tinha acontecido,
ou, pelo menos, algo bem ruim. Mas não
sabia exatamente o quê. Agora o
passado de Holt começava a tomar
forma. Será que ele tinha sido casado?

– Não adianta se preocupar com isso


agora. – Andy me arrastava pelo meio
da rua até a casa de Shelbi.
Eu não estava exatamente preocupada.
Eu sabia que ele não era mais casado.
Sabia que não era casado há anos. Mas
ele não tinha me dado nenhum sinal
verbal sobre seus sentimentos e sempre
que conversávamos sobre seu passado
ele se fechava.
Não podia culpá-lo, afinal, eu não era
exatamente um livro aberto.
“E, além do mais”, minha mente
recitou, “daqui a alguns dias você vai
embora e nunca mais vai vê-lo de
novo”.
– Vamos terminar logo com isso.
– Qual é o plano?
– Plano?
– É. A gente não pode simplesmente
entrar lá e ir falando. Tem que ter um
plano.
– Não tem plano, menina. Isso aqui
não é um episódio de Scooby Doo. A
gente vai entrar lá e vai conversar com
ela. Só isso.
– Será que vocês podem sair do meu
gramado?
Virei para observar. Era a coroa
estranha do outro dia. A dos bolinhos.
Eu tinha perguntado o nome dela?
– Vai cuidar da sua vida, Madeleine!
– Ótimo. Andy também não gostava
dela.
– Mas você é grossa, hein, Andrea?
– Só com quem merece!
– Pois então você devia manter sua
boca suja longe de mim.
– Qual o seu problema? – perguntei. –
Você fica o dia todo na varanda
esperando alguma oportunidade para
gritar com as pessoas?
– Só quero que saiam do meu
gramado. – Ela nos enxotou com um
gesto.
– Se for me tratar como um bicho eu
vou acabar te mordendo – ameacei.
– Mas olha para isso. Você achou
uma amiga tão grossa quanto você,
Andrea. Já dizia o ditado que cobras só
andam em par.
– Como é? – Eu dei alguns passos
ameaçadores em sua direção e notei que
Andy, ao invés de me impedir, estava
me acompanhando. Se continuasse assim
a bruxa ia apanhar…
– Só quero que vocês saiam da minha
propriedade. – Ela estava dando alguns
passos para trás e eu não parei de
avançar.
– Já teríamos saído se a senhora não
tivesse nos chamado. – Exagerei na
entonação do “senhora” para que ela se
sentisse umas oitenta vezes mais velha.
Depois de tantos dias de meiguice, a
Dominique Vadia estava voltando com
força. Era bom saber que ela não tinha
me abandonado.
– Se continuarem aqui eu chamo a
polícia.
Andy hesitou ao meu lado e eu senti
que ela me observava.
– Por que não faz isso? Eu aproveito
e presto queixa de calúnia contra a
senhora.
– Calúnia? Mas que diabos você está
fazendo?
– Está me acusando de invadir
propriedade privada quando só viemos
até aqui porque a senhora nos chamou.
Isso é calúnia, querida.
– Vocês estavam aí antes… – Ela
tentava ser firme. Mas não há firmeza
diante da minha fúria.
– Não me lembro dos fatos assim. E
você Andy? – Ah, por favor, garota,
colabora!
– Eu me lembro das coisas do jeito
que Dominique falou. – Apontou para
mim. Isso! Essa é a minha menina!
– A casa de vocês duas é pro outro
lado. O que estão fazendo aqui?
– Estamos indo visitar a Shelbi, não
que seja da sua conta. – Ela tinha as
mãos na cintura.
– Vão tricotar com a esquisita, é?
– É o quê? – Andy voltou a avançar e
dessa vez fui eu quem a acompanhei.
– Não me teste, velha.
Ela colocou a mão contra o peito,
chocada.
– Saiam da minha propriedade! –
gritou antes de se enfiar na casa e bater
a porta.
– Mas será possível que ninguém
nessa vizinhança tem um emprego? E
qual é a da maluca? – perguntei,
apontando o polegar para a casa atrás de
nós enquanto continuávamos pela rua.
– Sei lá. Ela já foi casada com um
cara rico. Ou oito. E agora está acabada,
mal amada e…
– Mal comida. – completei.
Andy riu contra as mãos. Respirei
fundo e coloquei os ombros para trás.
– Pronta? – Já estava com a mão na
campainha.
– Pronta.

– Tem certeza de que não querem


mais alguma coisa?
Shelbi não parava de nos oferecer
comida, bebida e sabe-se Deus mais o
quê.
Andy sorria enquanto eu encarava
minhas unhas. Nós queríamos começar a
conversar sobre algo que envolvesse
nosso objetivo, mas nenhuma de nós
duas tinha coragem de quebrar o gelo.
A boa e velha Dominique Vadia
contaria tudo antes de dar dois passos
dentro da casa. Ou teria mandado uma
mensagem de texto dizendo “Seu marido
escroto deu em cima de mim e eu transei
com ele sem saber que ele era casado.
Descobri agora e estou te contando. Boa
sorte”. Mas dar a notícia de um modo
que não magoasse Shelbi além do
necessário ou que a fizesse ter vontade
de se matar exigia um tato que eu não
tinha.
Fiquei ali analisando minhas
francesinhas e pensando em por que
diabos eu tinha decidido que aquilo era
uma boa ideia.
Não havia nenhum cenário em que
aquela coisa toda fosse acabar bem.
Nenhum.
– Muitas coisas para fazer hoje? –
Andy tinha as mãos no joelho e eu me
perguntei se ela estava se preparando
para levantar e correr.
– Só o de sempre – sorriu, servindo-
se de algo da bandeja. – E vocês duas?
– Ah, só… – nos entreolhamos –, o de
sempre também. – Andy repetiu
constrangida. – E o Eric? Onde está?
– No escritório. Teve que encontrar
uns clientes. – Ela tinha um sorriso
orgulhoso na boca. Parecia que ter se
casado era a maior conquista da sua
vida. Senti uma pena imensurável. Mas
não era hora de me doer com os
pormenores. Eu estava ali para fazer
uma coisa e, pelo amor que eu sentia
pelo meu pai, eu iria fazê-la!
– Ele é um cara legal, não é? O Eric?
Andy… Que merda é essa, menina?
Você não começa a contar sobre a
traição de um cara dizendo que ele é
legal.
– Ah! Ele é ótimo! Vocês precisam
ver o que ele me deu de Natal no ano
passado. – Ela levantou correndo do seu
jeito urgente e eu enfiei minhas unhas no
joelho de Andy.
– “Ele é um cara legal?” Você perdeu
o juízo? – sussurrei.
– Não! Mas você não estava dizendo
nada. – Ela gesticulava enfurecida.
– Melhor do que elogiar o cara! Você
esqueceu o que a gente veio fazer aqui?
– Dominique, a gente precisa puxar o
assunto de algum jeito!
– E dizer “Poxa! Seu marido é bem
legal” – fingi uma voz sonsa – “Sim! E,
por sinal… Ele está te traindo” é uma
boa ideia? Esse é o seu plano?
– Eu não tenho um plano! – rosnou –
Porque isso não é “um episódio de
Scooby Doo”, lembra?
– Tá, tá, tá.
Shelbi estava voltando, mas Andy não
tinha calado a boca.
– Eu queria ter um plano! Mas você
tem que fingir que sabe de tudo. Mesmo
quando não sabe – chiou.
– Psss! – abanei a mão para que ela
se calasse e ela encarou Shelbi, que
retornava afobada, com um sorriso
vazio.
– Olhem que coisa linda!
Ela abriu uma caixa preta da Cartier
e, descansando sobre a almofada de
veludo, estava a bijuteria de vidro mais
falsa que eu já tinha visto na minha vida.
– Não é perfeito? E é Cartier – ela
sussurrou a palavra arregalando os
olhos com ares de mistério e sacudiu os
ombros empolgadamente.
Eu tentei dissimular o desconforto e
abrir um sorriso de falsa admiração.
Uma coisa que quem me conhece
percebe com facilidade é que eu tenho
vários sorrisos: O sedutor, o eu quero
alguma coisa, o saia do meu caminho e
até mesmo o que demonstra uma
gratidão que eu não sinto. Todos esses
eu sempre fui capaz de simular com uma
atuação digna de um Oscar.
Já o meu sorriso de falsa admiração
ou o de falsa alegria pela felicidade
alheia… Bem… Nunca tive muita
prática com nenhum dos dois.
Shelbi estava contando como não
sabia onde usar uma peça tão cara, Andy
estava impressionada que o crápula do
marido traidor fosse capaz de tamanha
gentileza e eu tinha enfiado minha testa
na mão e estava encarando o chão pela
simples falta de saber o que fazer
comigo mesma.
O cara tinha comprado uma coisa de
vidro colorido para enrolar no pescoço
em alguma zona de livre importação,
vulgo, mercadinho chinês da esquina.
Tinha colocado em uma caixa usada
para relógios e eu estava ali tendo que
engolir a vontade de gritar que aquilo
era mais falso que o meu sorriso.
Andy olhou para mim e abriu a boca
em admiração como quem diz “Não é
que ele não é de todo mal?”, e eu revirei
os olhos diante de sua inocência.
– Vocês terminaram? Eu vou tirar
logo a bandeja do caminho e deixar tudo
limpinho. Eric fica nervoso quando
chega cansado e a casa está suja.
Eu olhei para a sala que brilhava
impecável. Eu posso ter milhões de
defeitos. Bilhões até. Mas eu sempre fui
limpinha. Quase ao ponto de ser fresca.
E a sala de estar de Shelbi era
deslumbrante até para os meus padrões.
Onde estava a sujeira?
Ela tirou a bandeja e eu perguntei se
ela precisava de ajuda.
– Não querida, eu resolvo. Sente aí –
gesticulou, e eu parei o movimento a
meio caminho de me levantar.
Andy me deu quatro tapas na coxa.
Com força.
– Ai! – Ela estava me batendo? Ela
ficou louca?
– Você viu o tamanho daqueles
diamantes?
Ai, meu deus…
– Dominique! – continuou –, talvez a
gente esteja vendo isso do jeito errado.
E se eles se amam, mas… Sei lá… Ele
pula a cerca de vez em quando e ela não
liga. Por que a gente vai se meter?
– Garota! Presta atenção! – Tive
vontade de estalar os dedos no meio da
cara dela para ver se a trazia de volta a
realidade – Aquela porcaria é falsa.
– Você tem certeza? – Tinha mais do
que dúvida em seu rosto. Tinha
descrença. Ela não acreditava em mim.
– Eu posso não ter berço nobre, mas
se tem uma coisa de qualidade que eu
aprendi a reconhecer nessa vida é um
diamante. E, meu bem, naquela caixa
não tinha nenhum.
– Mas como você sabe que…
– Nenhum! – repeti para que ela se
calasse.
Shelbi estava de volta com um pano
nas mãos e Andy se sentou contra o
encosto do sofá encarando a mesinha de
centro e desejando que eu estivesse
errada.
– O que está fazendo? – A anfitriã
estava limpando o lugar onde a bandeja
havia estado há alguns segundos.
– Limpando – sorriu. – Só para o
ambiente ficar fresquinho e agradável
para as visitas! Hi-hi! – Seu risinho era
quase tão ridículo quanto toda aquela
situação, e eu tentei não perder a
paciência.
– É por causa do Eric, Shelbi? É por
causa dele que você é tão preocupada
com limpeza?
– Também. – Seu sorriso ficou mais
discreto, e ela levantou um ombro quase
como se estivesse se desculpando – Ele
é tão bom para mim que eu tento fazer o
que posso por ele. Para lembrá-lo por
que ele se casou comigo. – Seu riso
agora ficou estridente e eu me senti
profundamente triste por ela. – Juro por
Deus que não mereço aquele homem.
Basta.
Olhei pra Andy e senti que já bastava
para ela também.
– Querida, senta aqui. – Percebi que,
talvez pela primeira vez em minha vida,
a palavra “querida” tinha sido dita com
carinho. Não havia sarcasmo ou insulto.
Eu só queria que ela ficasse bem. Ela se
sentou em uma cadeira na minha frente e
eu tomei sua mão nas minhas. Não sabia
por que estava fazendo aquilo. Mas é
assim que as pessoas fazem nos filmes,
não é? Quando tem algo ruim para
contar? Elas te abraçam e seguram sua
mão como se o simples toque humano
fosse capaz de atenuar qualquer dor. –
Eu e Andy viemos até aqui porque
precisamos te contar uma coisa.
Ela me observou com olhos curiosos
e com seu eterno sorriso no rosto.
Parecia que sua expressão facial não
conhecia dia ruim.
Eu, por outro lado, me sentia como
uma cirurgiã que tinha acabado de sair
da sala de operações, sendo que seu
parente mais próximo tinha morrido nas
minhas mãos. E agora, eu precisava
dizer isso para ela.
Vamos lá, Dom, comece dizendo que
o sangramento foi muito grave e que
você fez o que pôde.
– Eu não te conheço muito bem,
Shelbi. Nem você, nem o Eric. Mas sei
que você é uma pessoa boa e, se a vida
fosse justa, só coisas boas aconteceriam
a pessoas boas. Mas a vida é uma vadia
miserável e ela não liga para ninguém. E
coisas ruins acontecem com pessoas
boas.
– Vocês estão me assustando! – ela
riu, como se fosse uma brincadeira e
apontou o indicador para mim e para
Andy como se estivesse esperando que,
a qualquer momento, eu anunciasse que
era uma pegadinha.
– A gente só quer que você saiba que
a gente está aqui. – Andy se aproximou e
estava alisando o braço de Shelbi.
Ótimo. Então, eu tinha acertado na coisa
do contato humano. – Você não está
sozinha.
– Eu sei. Vocês são ótimas! Mas qual
o problema? – Ela estava estranhamente
descontraída e eu percebi que ela era
como eu.
Ela era exatamente como eu. Como
Andy. Como qualquer mulher do mundo.
Ela não era imbecil. Não era alguma
ridícula superficial que adorava
onomatopeias. Ela só tinha uma história
de vida, uma que eu desconhecia, que a
tinha trazido até ali. E, assim como
qualquer uma de nós, Shelbi tinha
escolhido a maneira como ia lidar com
sua vida. E ela tinha escolhido ser
desatenta. Era tola por opção. Prestar
atenção poderia doer. Então, do mesmo
jeito que eu não me aproximava de
ninguém para evitar me machucar,
Shelbi não queria prestar atenção aos
arredores.
– Querida, nós achamos que Eric não
é um homem bom.
– Pff… Bobagem! – Ela soltou nossas
mãos e agora eu começava a ver sua
expressão mudando.
– É verdade, Shelbi.
– Você acabou de se mudar para cá,
como pode querer julgar meu marido? –
Ela estava olhando para mim e seu
eterno sorriso tinha sumido.
– Mas e eu? – Andy quis saber. – Eu
moro aqui há bem mais tempo e
concordo com ela.
– Achei que vocês duas se
detestavam. E aí vêm aqui com essa
conversa… Olha, se é algum tipo de
brincadeira, eu não estou achando graça.
– Eu sei que isso é horrível de ouvir,
Shelbi. – Toda sua postura corporal
indicava que ela queria se proteger. –
Mas Eric não é o bom marido que você
pensa. – Eu conseguia parar uma sala de
audiência inteira para indicar novas
provas, eu conseguia chocar e interessar
um júri, eu conseguia dizer para o meu
chefe que ele tinha que aumentar meus
honorários, em determinada situação eu
tinha até mandado um procurador
federal calar a boca. Mas eu estava ali,
sem saber o que dizer. Respirei fundo.
Diga de uma vez. – Ele te trai, Shelbi.
– Vocês são ridículas! Isso é absurdo
– disse se levantando.
– É verdade, Shelbi. Ele já deu até em
cima de mim. – Andy estava tentando
fazê-la acreditar.
– De você? – Havia algo depreciativo
no jeito como ela se referiu a Andy. Sua
expressão se aproximava de algo que eu
acho que era o mais perto que Shelbi já
tinha ido da fúria. – Você acha que eu
vou acreditar que o MEU Eric ia precisar
sair de casa para buscar uma que nem
você?
Andy mordeu o lábio e estava
tentando superar a ofensa.
– Shelbi. Nós só achamos que você
merecia saber. Não mate as
mensageiras.
– Ele deu em cima de Dominique,
também! Ele dá em cima de todo mundo!
– Andy devolveu e eu respirei fundo.
Aparentemente, sua tentativa de superar
a ofensa falhou grotescamente.
Por favor, menina, não piore tudo.
– Sabe qual é o problema de vocês?
Falta de amor e carinho na vida. –
Shelbi estava começando a flutuar entre
um grito e um choro, e eu me lembrei de
como detesto gente descompensada. – Já
cruzei com muitas mulheres como vocês
na vida! Mulheres que acham que, para
valorizar o que tem, precisam
desvalorizar o que a outra tem.
– Tudo bem, Shelbi. – Estava
tentando não odiá-la. Lembrava de
quando vi Holt na cama com outra
mulher. Eu também tinha me
descompensado, não tinha? Dor faz isso
com a gente. E Shelbi estava machucada.
– Você está magoada, mas nós estamos
aqui para te ajudar. – Era estranho como
eu realmente queria ajudar. Eu queria
que ela soubesse que eu entendia o que
ela estava fazendo. Eu entendi o escudo,
a armadura. Eu entendia o conceito de
“se proteger acima de todas as outras
coisas”. Mas eu também entendia como
ser forte, algo que ela desconhecia. Só
queria lhe emprestar minha força.
Queria lhe emprestar um pouco do meu
foda-se, para que ela pudesse aceitar a
situação e lutar de volta.
– Não quero ajuda. Não quero nada.
Não quero ouvir nem mais uma palavra.
O problema de mentir para si mesmo
é que você fica além da razão: não ia
adiantar continuar a conversa. Não
agora.
– Certo, então. Nós só viemos te dizer
isso. E foi dito: agora você já sabe. Lide
com isso como quiser.
– Vou lidar com isso como quiser,
sim! Fora da minha casa! As duas!
Andy estava cravada no sofá com uma
atitude de mulher ofendida que queria
continuar a briga.
Eu me levantei e forcei seu braço
para que ela me acompanhasse.
– Certo, Shelbi. Estamos indo.
– Não acredito que fui tão simpática
com vocês! – Ela estava emitindo sons
estranhos e eu achei melhor sair dali de
uma vez.
A porta estourou audivelmente atrás
de nós e eu puxei Andy para a calçada.
– É. – suspirei – Isso definitivamente
não saiu como a gente esperava.
– Estão arruinando a vida de mais
alguém? – A voz irritante da coroa saiu
da janela da sua casa e eu vi seu rosto
excessivamente maquiado rindo para
nós com desprezo.
– Ah, cala a boca! – exclamei e ouvi
Andy fazendo eco a minhas palavras.
Capítulo 14
“Francamente, minha querida, eu não
dou a mínima.”

Rhett – E o vento levou

Por que nós fomos parar na casa de


Thierry é uma pergunta que eu nunca vou
saber responder.
– Ela não acreditou.
– Você acha que ajuda se a gente
também for falar com ela? – Rick quis
saber.
– Não. – respondi junto com Thierry.
– Ela precisa de tempo. – Deixei que
ele continuasse – Vocês são muito novos
para entender o peso que um casamento
tem na vida de uma pessoa. Ela não vai
simplesmente desistir assim.
– Mas ele não vale de nada! – Andy
reclamou.
– Para você. E para nós, Andrea. Mas
ele ainda é o marido dela. E se ela
acredita mais em um vizinho que no
próprio marido…
– Bem, agora que vocês já foram até
lá falar, a gente precisa fazer mais
alguma coisa. Não podemos
simplesmente abandoná-la. Mais cedo
ou mais tarde ela vai perceber que
vocês falaram a verdade e vai precisar
de alguém.
– E se a gente a fizesse perceber?
Eric é a fim da Dominique! A gente
monta uma cena e a Shelbi pega os dois
nus!
– É o quê, garota? – Agora era eu
quem estava ultrajada – Nunca no
universo. Pode arranjar outro plano aí,
Pink, porque esse não vai rolar.
– Por que eu sou o Pink?
– A gente precisa esperar a Shelbi
perceber. Ela vai levar o tempo dela. E
o tempo é só dela – gesticulei, tentando
evitar pegar mais um biscoito, mas
aquela porcaria era uma delícia mesmo.
– Ninguém tem que se meter.
– Mas e se ela nunca admitir? – Era
incrível como Rick sempre conseguia
soar verdadeiramente preocupado com
os problemas alheios. Era como na noite
em que ele veio ver se eu e Andy
estávamos bem. – Se o que vocês
tentaram fazer com que ela se
distanciasse dos amigos, tudo que ela
vai ter é o marido horrível dela.
– Ô vagabunda, por que eu sou o
Pink?
– Fedelha! Pare de me chamar de
vagabunda!
– Ei! Ei! – Rick estava batendo
palmas. – Será que vocês duas podem se
concentrar? O que a gente faz agora?
– A gente não faz nada! – decidi. –
Entendo sua preocupação, Rick, de
verdade. Mas já fizemos o que podia ser
feito. Cabe a ela decidir o que vai fazer
da vida agora. Não podemos pegá-la
pela mão e cuidar para que ela nunca se
machuque com nenhum problema da
vida. E essa coisa de inventar planos é
muito infantil. Temos que pensar e agir
como adultos e, como adultos, se
nenhum de nós pretende colocar Shelbi
em uma instituição para que alguém
fique de olho nela vinte e quatro horas
por dia, sete dias por semana, vamos ter
que confiar na capacidade dela de tomar
suas próprias decisões. Inclusive sobre
continuar a amizade conosco ou não, e
se vai continuar casada ou não. Ninguém
se mete, ouviu Clube dos Biscoitos?
Eles riram e repetiram o nome como
se tivessem achado o máximo. Eu
revirei os olhos, peguei mais um
biscoito e fui embora.
– Vai fazer o que, agora?
Eu preferia Max. Se era para ter um
bichinho de estimação, ele exigia
consideravelmente menos atenção do
que Andy.
– Vou cuidar da minha vida –
expliquei com ar de obviedade.
– Vai voltar a arrumar as caixas da
ex-mulher do seu namorado?
Ah, garota impossível!
– Primeiro, ele não é meu namorado.
Segundo, não sabemos se ela é a ex-
mulher dele.
– Tinha um anel de noivado com…
– E terceiro! – a interrompi. – Acho
que vou deixar a caixa do jeito que está
para ele escolher onde vai colocar
aquelas coisas. Vou me concentrar nos
outros detalhes que faltam para acabar
com isso de uma vez e…
Ir embora.
Respirei fundo. Duas vezes. Três.
Conte até dez, Dom.
– Você devia perguntar para ele quem
ela é.
Eu concordei de qualquer jeito, mas,
no fundo do meu coração, discordava
completamente. Sabia que parecia
bobagem, mas ele não disse nada. Ele
não disse que estava apaixonado por
mim, não disse que me amava, não disse
que gostava de mim… Ele não disse
nada. Como eu podia mostrar um porta-
retrato e perguntar “E essa, quem é?”
sem soar possessiva?
E, mais importante: e se fosse uma ex-
mulher? Ou uma ex-namorada? E se
fosse a mulher da sua vida de quem ele
se arrependia de ter se separado? Como
eu ia ouvir isso? E do que iria me
servir?
Se Holt me achava gostosa e queria
me comer, o sentimento ia ter que ser
recíproco: eu ia ter que achá-lo gostoso
e comê-lo de volta até meu tempo ali
acabar. Não adiantava eu abrir espaço
para essa paixão e depois ter que
expurgá-lo como a um demônio.
– Eu posso perguntar para ele se você
quiser.
– Ah, ia ser lindo. Uma vizinha que
ele nem conhece fazendo perguntas
íntimas. Ele nem ia suspeitar que fui eu
quem te pediu pra perguntar – disse,
sarcástica.
– Esse é o problema? Você não quer
perguntar? A gente pode tentar descobrir
de outro jeito.
– “A gente” não vai fazer nada. Eu
vou cuidar da minha vida e você vai
voltar para o hospício de onde você
saiu.
Eu ia dar um passo e me afastar dela
quando uma palavra que eu havia dito
grudou na minha cabeça e me deu uma
ideia pouco convencional.
– Justo quando eu começava a te
achar legal.
Eu queria dizer um “Ah, vai trabalhar,
garota!”, mas, em vez disso disso,
traduzi meu pensamento em voz alta.
– Você sabe onde tem uma instituição
aqui perto? Para pessoas com
problemas? Tipo um asilo ou
hospício… Não sei…
– Tá, já entendi a piada. Você quer
me levar para lá porque acha que eu sou
doida. Rá-rá. Muito engraçado.
Eu a segurei pelos ombros.
– Estou falando sério.
Andy me observou como se estivesse
decidindo se eu estava brincando ou
não.
– A mãe de Holt – expliquei – Ela
está internada em uma instituição perto
daqui. Uma para pessoas ricas,
aparentemente.
– A Casa Morghan?
– O que é isso?
– Fica a pouco mais de uma hora
daqui. É um asilo para pessoas que não
podem se cuidar. É bem chique e bem
caro.
– É esse. – Apontei o indicador para
ela. – Diz pra mim, desocupada, você
tem carro?

Andy é daquelas pessoas que cantam


mais alto do que a música do rádio.
Se eu não estivesse aprendendo a
gostar dela, teria sentido uma vontade
louca de esfaqueá-la.
– Isso não é invasão de privacidade?
Você fazer uma viagem dessas só para
perguntar para a mãe do seu namorado
se ele já foi casado? – Diminuiu o
volume do som quando começaram os
comerciais.
Havia tantas coisas erradas com
aquela frase que eu não soube nem por
onde começar.
– Quero dizer, não seria mais simples
engolir sua vergonha e perguntar para
ele?
– Não estou com vergonha.
E não estava mesmo.
O problema não era ter coragem para
fazer a pergunta. O problema era ter
coragem para engolir o orgulho diante
dele. Havia tanta coisa sobre Holt que
eu queria saber, e não apenas sobre seu
passado: queria saber se ele sentia
alguma coisa mais forte por mim ou se
já tinha sentido algo parecido por
alguma mulher antes de mim.
Inclinei minha cabeça pela janela e
deixei o vento sacudir meus cabelos. Eu
tinha passado da inércia completa para a
velocidade máxima quando o assunto
era Gregory Holt. Fui de uma época em
que não ligava para nada nem para
ninguém para um momento em que não
conseguia me concentrar nem em um
copo d’água sem pensar nele pelo menos
três vezes.
Tinha uma angústia dentro de mim, e
eu precisava arrancá-la de lá.
– É infantil, eu sei. Não precisa ficar
me lembrando disso a cada três minutos,
Andy.
– Você é engraçada.
– Obrigada – rosnei.
– Sério. Você é toda segura e
confiante, mas quando o assunto é esse
cara, você não se controla, não é?
– Mais ou menos – confessei.
E ela tinha definido exatamente como
eu me sentia.
– O que você vai perguntar para ela
quando chegar?
Olhei para Andy. Ela dirigia com
calma e fazia cada pergunta com um
genuíno interesse. Quando você não se
preocupa com ninguém, ninguém se
preocupa com você.
Ninguém se preocupava comigo.
Ninguém se preocupou comigo por um
tempo bem longo. Desde que o meu pai
tinha morrido.
Aprendi a não mentir para mim
mesma porque eu era minha única amiga
e minha única confidente. Não havia
mais ninguém.
E agora, ali estava ela: com seus
cabelos meio pintados de azul, as roupas
folgadas, a expressão curiosa. Ela
realmente queria saber.
E eu realmente queria contar.
– Eu não o conheço muito bem. Quer
dizer… Até conheço. Acho que essa é a
palavra errada – parei por um breve
intervalo enquanto esperava a palavra
certa surgir. – Compreender! Acho que é
isso, eu não o compreendo muito bem. –
Ela estava ouvindo. – Eu sei quem ele é,
o que ele faz. Sei como bebe o café,
como prepara uma defesa… Conheço
pessoalmente quase cada um de seus
clientes. Já o vi trabalhar e se divertir.
Já o vi ser gentil e idiota. Sei como ele
beija e como briga. Mas eu não sei por
que… Por que ele abandonou a família?
Por que ele é gentil com o mundo
inteiro, mas não separa um tempo para
visitar a própria mãe? Por que ele é
lindo, talentoso e simpático e ainda está
solteiro? Por que ele acha que eu posso
ser uma pessoa boa mesmo depois de ter
sido horrível com ele tantas vezes?
– Não é isso que você quer –
suspirou.
– Agora você acha que me entende
melhor do que eu mesma?
– Não é isso. É só… As coisas que
você diz. Você não quer a compreensão
do passado. Você quer uma previsão
para o futuro. Você não se importa se
ele já foi casado ou se ele foi capaz de
te enxergar como uma pessoa além de
uma megera maldita. Você quer saber o
que o levou a sentir carinho por você
para prever se ele vai ser capaz de
continuar sentindo esse carinho. Se ele é
um cara que já foi casado e que já
transou com milhões de mulheres, ou se
você só acha que ele te deu uma
oportunidade, mas na verdade a intenção
dele era só te levar para cama, então
você vai saber que não há futuro para
vocês. Mas se ele nunca amou ninguém,
se ele realmente viu algo em você que
ninguém mais viu, se ele realmente
estiver se esforçando por você… Aí é
diferente, não é? – Continuei a observá-
la com o canto do olho. Não queria
admitir para ela que seu raciocínio fazia
sentido. – Mas é claro que você nunca
vai admitir isso. Porque para admitir,
você precisaria primeiro aceitar que
quer algo mais sério e duradouro com
Holt. E nós duas sabemos que você não
vai fazer isso.
Mordi o lábio.
Querer algo mais sério e duradouro
com Holt implicava tomar tantas
decisões diferentes que eu senti minha
cabeça começar a latejar.
– Chegamos!
Andy indicou o rebuscado portão
duplo de ferro e reduziu a velocidade.
Seja lá qual fosse o passado de Holt,
e seja lá quais fossem as previsões para
o futuro, eu ia conseguir descobrir. Tudo
estava além daqueles portões.

A recepção era maior e mais bonita


que a minha casa. O balcão era longo e
arredondado e, atrás dele, dois homens e
uma mulher aguardavam sentados com
uniformes da instituição. A mulher
conversava com um dos homens
alegremente enquanto o outro falava ao
telefone com um tom bastante formal.
– Boa tarde.
– Boa tarde. Posso ajudar? – A moça
olhou para mim e sorriu, simpática.
Tentei devolver um sorriso com a
mesma intensidade. Não sabia se não
familiares podiam visitar pessoas
internadas, e era possível que eu tivesse
que pedir aos recepcionistas que
ignorassem algumas regras da instituição
para permitir o encontro. Então, era
melhor ser agradável desde já.
– Espero que sim. Vim visitar uma
pessoa.
– Claro. Levo as senhoritas até lá.
Quem é a pessoa?
Ótimo, então qualquer um poderia
visitar quem quer que fosse. Mas eu
ainda tinha um problema…
– A sra. Holt.
Disse o nome com o máximo de
casualidade que consegui, como se
aquele sobrenome bastasse. Não sabia o
primeiro nome dela e não tinha qualquer
meio de descobrir.
– A sra. Holt? – Ela me observou
intrigada. – Ah, ela vai ficar muito feliz.
Quase não recebe visitas. E quem eu
devo anunciar?
– Dominique Thoen. Sou… amiga do
filho dela. Gregory.
– Ah, certo! – Ela pegou um telefone e
começou a falar com alguém. Atrás dela,
notei o homem que não estava ao
telefone me observando de um jeito
esquisito.
Andy estava ao meu lado,
distraidamente olhando os panfletos de
divulgação do asilo.
– Pronto, srta. Thoen. Se puder subir
por aquela escada. – Ela indicou uma
bela escada de mármore em uma das
extremidades do hall. – Um funcionário
está esperando pela senhorita no
primeiro andar e vai levá-la até a sra.
Holt. Só preciso de um documento com
foto e da sua assinatura bem… aqui. –
Ela indicou um livro de registro que eu
assinei prontamente, logo depois que ela
verificou meu documento. – A sua amiga
também.
Andy explicou que ia esperar no hall
e a funcionária indicou um lugar
confortável, bem iluminado, com uma
tevê e muitas revistas, onde ela poderia
esperar.
Subi os degraus considerando se
aquilo era realmente uma boa ideia e
acabei decidindo não me preocupar
mais com aquilo naquele momento, que
já estava ali.
– Srta. Thoen? – O funcionário estava
fardado, assim como os da recepção, e
me recebeu com um sorriso alegre e com
uma mão estendida.
– Sou eu. – Apertei a mão que ele
oferecia.
– A sra. Holt está no jardim leste. Por
aqui, por favor.
Ele me guiou por alguns corredores
esnobemente luxuosos e, por fim, a uma
varanda larga de pedra branca com uma
escada simples que descia até o belo
gramado de um rebuscado e colorido
jardim.
– Ela está bem ali.
Ela estava sentada em uma cadeira de
rodas e usava roupas leves e
monocromáticas. Haviam colocado um
cobertor sobre suas pernas, como fazem
com pessoas muito idosas e muito
doentes.
O estranho é que ela não parecia ser
muito idosa ou estar muito doente. Tinha
a pele muito branca e enrugada, seu
cabelo longo e escuro estava recheado
de fios brancos e fortemente preso em
um rabo de cavalo. Era magra e possuía
algo incrivelmente familiar em seus
olhos verdes.
Tinha um bordado nas mãos e, assim
que me aproximei, percebi que sua
habilidade manual era horrível.
– Audrey! – O funcionário chamou –
Temos uma visita para você.
Ela se virou confusa. Olhou do
funcionário para mim e de volta para
ele, claramente sem compreender.
– Sra Holt?
– Eu não falo com repórteres! –
exclamou, arrumando o cobertor verde
que tinha nas pernas – Já disse isso!
– Ela não é… – O funcionário queria
ajudar, mas eu não gosto que falem por
mim, e levantei a mão pedindo licença.
– Não sou jornalista, sra. Holt. Meu
nome é Dominique Thoen, não nos
conhecemos. Sou amiga do seu filho,
Gregory.
Sua boca se entreabriu como se ela
buscasse oxigênio e, embora seu rosto
não demonstrasse qualquer expressão
que não fosse surpresa, tenho certeza de
que vi uma sombra de alegria em seus
olhos.
– Ora, sente-se, então! – pediu,
indicando um banco de pedra branca ao
seu lado. – Sente-se! Sente-se!
O funcionário ao meu lado sorriu
antes de nos deixar e algo me fez sentir
como se aquele fosse o máximo de
empolgação dela que ele já tinha
presenciado.
– Dominique, você disse, não é isso?
– Exatamente. Dominique, sra. Holt.
– Ah, por favor, pode me chamar de
Audrey.
Sorri e me sentei ao seu lado.
– A que devo o prazer dessa visita? –
Agora ela estava sorrindo.
Eu já estava me arrependendo de não
ter ouvido Andy. Acho que seria
inteligente começar a planejar antes de
me enfiar de cabeça nessas situações.
Passei as últimas horas inteiras
pensando em todas as perguntas que eu
queria fazer e como aquilo poderia
mudar meu jeito de ver Holt e o nosso
relacionamento. Se é que teríamos um.
Mas eu não tinha pensado nessa parte.
Não podia simplesmente aparecer
fazendo perguntas. Tinha que lhe dar
algum motivo para que ela me
respondesse.
– Ainda não estou vendo um anel,
então, imagino que ainda não tenham
noivado?
– Perdão?
– Ah! – Ela tapou a boca com as
mãos. – Eu estou me adiantando.
Desculpe! Não recebo muitas visitas,
acho que fiquei nervosa.
– Não, não tem problema – sorri.
Precisava mantê-la falando.
– É que eu deduzi que você é a
namorada do meu Greg. Quer dizer…
Não do meu Greg – ela se corrigiu como
se temesse me ofender. – Afinal, por que
outro motivo uma amiga de Greg me
visitaria?
Apertei sua mão com carinho.
– Não sou namorada dele, sra. Holt.
Não exatamente.
– Não precisa medir as palavras para
mim, jovem. – Ela segurou minha mão
nas suas e por algum motivo eu comecei
imediatamente a gostar dela. – Eu sei
que os relacionamentos no mundo de
hoje são diferentes! – brincou, piscando
um olho para mim. – Vocês não gostam
de rótulos, eu sei. Eu assisto a novelas
aqui dentro, sabia? – riu, e eu a
acompanhei.
– Para todos os efeitos, sou amiga
dele. – Enfatizei na palavra “amiga”
sorrindo e ela fez uma careta de quem
fingia que acreditava. – E… – Vamos
Dom, diga o que veio dizer. – Me
preocupo com ele. Greg não fala muito
sobre seu passado e… – Ela tinha
aqueles olhos verdes firmes em mim.
Cheios de carinho, curiosidade e
interesse. Cada menção ao nome do
filho parecia fazer seu coração bater
mais rápido, e eu imaginei que ela não
tivesse notícias dele há muito tempo. Eu
estava ali para lhe fazer um punhado de
perguntas e dar o fora. Mas para ela, eu
talvez fosse o primeiro contato com o
mundo em sabe-se lá quanto tempo. – A
senhora… tem notícias dele?
Ele me ofereceu um sorriso
constrangido e começou a encarar as
próprias mãos e o horroroso bordado.
– Ele é um bom menino – começou. –
Eu sei que ele é muito ocupado e não me
incomodo. – Levantou os olhos para
mim e apertou minha mão – Não me
incomodo, de verdade! Acho que eu até
prefiro – riu e eu percebi a mentira em
suas palavras.
– Bem, então eu vim aqui para lhe dar
notícias – sorri. Eu, definitivamente, não
tinha ido até lá para isso, mas, de
repente, responder as suas perguntas me
pareceu infinitamente mais importante
do que fazer as minhas. – O que quer
saber? – levantei um ombro, tímida. Não
tinha costume algum de sentir timidez.
Na verdade, acho que a última vez em
que senti algum resquício de timidez foi
quando fiquei menstruada pela primeira
vez e, sem uma mãe presente, não soube
muito bem o que dizer e nem a quem.
Ali, na frente dela, eu senti como se
estivesse entrando na puberdade mais
uma vez. Não queria ser agressiva, não
queria ser confiante. Não queria ser
nada que ela não fosse.
– Ele trabalha com advocacia ainda,
não é? Ainda está morando naquela
cidade horrível do outro lado do país?
– Sim, ele é advogado. E acabou de
se mudar para bem mais perto daqui.
Acho que vai poder vir visitá-la com
mais frequência.
Sua primeira reação foi sorrir. Mas o
sorriso sumiu com uma timidez delicada.
– Não, ele não precisa. Não quero
incomodá-lo. – Eu ouvia a emoção em
suas palavras. Ela queria incomodá-lo,
sim. Ela queria ligar para ele e dizer que
se sentia sozinha e que queria que ele
viesse sempre. Ou que a tirasse daquele
lugar e a levasse para casa. Mas havia
algo nela que me dava a certeza de que
ela pensava não merecer a atenção e o
cuidado. – Vocês estão pensando em se
casar? Eu queria netos – riu, tapando a
boca como se fosse uma menina de onze
anos que tivesse acabado de confessar
por qual garoto era apaixonada.
– Não, não vamos nos casar. – Dei-
lhe um tapa bem leve e brincalhão na
perna. – Estamos juntos há pouco tempo.
Se é que se pode dizer que estamos
juntos.
– Greg pode ser uma pessoa difícil,
mas ele é um garoto bom. É um garoto
muito bom.
Ela parecia temer que eu o
abandonasse. Ou pior, que eu o
abandonasse e dissesse que foi por
causa de alguma coisa que ela tivesse
tido.
– Eu sei.
– Ele está feliz?
Essa era uma pergunta que eu não
sabia responder.
– Acho que sim. Quero dizer, ele
parece feliz.
– E tem alguém na vida dele que o
incomoda? – Achei a pergunta estranha e
tive que pensar por alguns segundos.
– Agora que a senhora perguntou, eu
sei que tem uma loira horrível no lugar
onde ele trabalha. Detesto ela. –
exagerei na careta e ela riu com gosto.
– Ah, então eu detesto ela também.
Seu desespero por ser agradável e
querida era tangível. Senti uma mistura
enorme de pena e carinho.
– Sra. Holt…
-– Audrey! – pediu
– Audrey – aceitei. – Eu vim até aqui
por um motivo. – Eu ainda precisava das
minhas respostas. Mas não tinha
qualquer intenção de mentir para aquela
mulher. – E se a senhora achar errado e
preferir não responder às minhas
perguntas, quero que saiba que vou
entender. Mas eu tinha que vir até aqui
lhe perguntar.
Ela ficou em silêncio e eu continuei.
– Gregory consegue ser um livro
fechado, lacrado e inviolável sobre
alguns assuntos e, embora eu saiba que
deveria estar tendo essa conversa com
ele, tem… Tem algumas coisas sobre
ele que eu preciso entender. Antes de
sequer imaginar que alguma coisa pode
acontecer entre nós.
Ela segurou minha mão.
– Meu Gregory é um homem muito
bonito.
– Sim, ele é. – Esperei que ela
terminasse o raciocínio, porque, no
contexto, sua observação não fazia
nenhum sentido.
– Estou aqui há muitos anos,
Dominique. E um homem muito bonito
não fica sozinho durante muitos anos.
Você é a primeira moça que vem até
aqui me ver. Imagino que esteja aqui
sem o seu conhecimento e sem sua
autorização. – A palavra me incomodou.
Eu não precisava da autorização de
ninguém. – Não me importo se você é só
uma amiga ou algo mais. Você parece se
preocupar com o meu menino, então,
gosto de você. Faça suas perguntas.
Abri meus olhos e meus lábios
travaram. Eu não sabia o que perguntar
primeiro.
– O que aconteceu? – perguntei
finalmente. Foi interessante como os
olhos dela brilharam, e ela pareceu
entender exatamente a que eu me referia.
– Você já ouviu falar na família
Baxter?
– Claro, é uma das oito famílias mais
ricas do mundo. Um império composto
pelos três jornais de maior circulação
nacional, uma rede de dezenas de
hospitais e uma das maiores
farmacêuticas do continente.
– Era o meu sobrenome – ela sorriu, e
eu senti um nó na garganta. Eu sabia que
ele era de uma família rica, mas
imaginei que fosse riqueza na casa das
centenas de milhares. Não de centenas
de milhões. – E quando você é um
Baxter, há coisas que são esperadas de
você. – O volume de sua voz diminuiu
como se ela estivesse se lembrando de
algo muito distante e doloroso. – Mas
não vou incomodar você com os
detalhes da minha longa e tediosa vida.
O que precisa saber é que me apaixonei
por um rapaz que minha mãe não
aprovava e que casei com ele apesar de
todas as suas restrições.
– Era um rapaz de origem humilde?
– Humilde é relativo – riu. – Os Holt
eram uma família de novos ricos.
“Novos” quando comparados aos
Baxter, que têm uma árvore genealógica
que se estende por séculos. O pai de
Greg era da terceira geração de uma
família que tinha adquirido fortuna com
hotéis, clubes, discotecas, restaurantes e
jogos de azar. Nada ilegal – levantou a
mão. – Jogos de azar em locais onde a
atividade é permitida e regulamentada –
acrescentou – Mas para uma família
nobre como os Baxter… Minha mãe
teve muitos problemas com o meu
relacionamento com o jovem herdeiro
Mathias Holt. – Ela fechou os olhos por
alguns segundos, mas continuou
narrando a história de sua vida como se
estivesse revivendo cada detalhe. –
Fomos tão felizes. Apesar de minha mãe
e de todo o seu ódio incontrolável. Eu
amava meu Mathias e ele me amava.
Tivemos nossos filhos, nossa vida…
Mas eu sempre fui fraca, ao contrário de
minha mãe, e sempre deixei que seus
comentários invadissem minha vida.
Eram coisas pequenas no começo: o
nome de um filho, a escola em que
deveria colocá-lo. Mas acho que acabei
sendo daquelas pessoas que finge odiar
a mãe e tudo o que ela representa
quando, na verdade, tudo o que faz é
tentar agradá-la.
– Entendo.
– Um dia foi demais. Foi há alguns
anos. Meus filhos estavam se
distanciando dos ideais dos Baxter.
Muito. Isso preocupou minha mãe, e ela
conseguiu passar cada gota do seu
desespero para mim. Eu e Mathias
começamos a ter muitos problemas e,
um dia, resolvi que queria me separar,
que queria trazer meus filhos de volta
para a tradição. Como se ela servisse
de alguma coisa… Se apenas eu pudesse
voltar no tempo. – Ela abaixou os olhos
para a mão e eu apertei seu braço em
uma tentativa de lhe dar forças para
continuar.– Ele estava em uma
negociação em uma cidade vizinha. Eu
liguei para ele e disse que estava indo
embora de casa. Mathias pediu que eu
esperasse, que deveríamos conversar,
que não podíamos destruir quase trinta
anos de casamento assim, pelo telefone.
Mas eu tinha minha mãe na cabeça e no
coração, e não queria ouvir nem mais
uma palavra. Ele saiu de lá desesperado
para tentar chegar em casa antes que eu
saísse. Seu nervosismo era tamanho que
minha filha, que estava na mesma cidade
em que ele, resolveu acompanhá-lo na
viagem para acalmá-lo.
Ela estava hesitando cada vez mais, e
eu tive medo que ela começasse a
chorar. Eu não ia saber o que fazer.
– Audrey, não precisamos mais falar
sobre isso. – Eu queria ouvir o resto da
história. Mas fazer aquela mulher sofrer
era algo que estava além dos meus
limites. – Podemos falar de outra coisa.
– Não, querida. Eu quero falar. – Seu
sorriso foi mais dolorido que qualquer
lágrima. – Estava chovendo muito. O
carro derrapou. Eles morreram. Os dois.
Ela engolia o choro e eu tive vontade
de abraçá-la. Eram muitas emoções
novas para mim, e eu não sabia quantas
mais ia conseguir aguentar.
– Gregory não conseguiu me perdoar.
– Seus lábios estavam travados. – E
quem pode culpá-lo? No dia em que me
colocaram de preto, de pé no meio de
um cemitério, e enfiaram a minha menina
em uma caixa no chão… Eu soube que
nunca mais ia ser a mesma pessoa. Não
tem volta. A dor que você sente quando
perde um filho… A saudade… É a única
coisa na vida que é verdadeiramente
insuportável. Todo o resto, qualquer
problema, qualquer dor, acredite! É
bobagem perto disso. Todas as opiniões
de minha mãe, toda a tradição da
família, todo o orgulho perante a
sociedade. Minha menina estava morta,
de que me servia toda aquela porcaria?
Ver o meu Mathias enfiado em um terno
caro com algodão enfiado em sua boca e
em seu nariz… Foi uma das piores
sensações da minha vida, mas eu ainda
conseguia aguentar. Mas minha
Amanda… A minha Amanda, não.
Ela estava chorando e eu não resisti.
Estava abraçada com uma estranha.
Aquele estava sendo o mês mais
transformador da minha vida.
– Um filho é como uma parte do seu
corpo. Você sente o mesmo amor, o
mesmo cuidado, a mesma sensação de
autopreservação. Mas é um pedaço do
seu corpo que sai por aí sozinho. E você
fica desesperado porque… como pode
protegê-lo? Como pode mantê-lo a
salvo? Cada festa, cada saída, cada
viagem… Você passa a vida inteira se
preocupando. E aí te dizem que aquele
pedaço do seu corpo acabou e você
sente tanta dor. E você quer gritar e
negociar para conseguir aquele pedaço
de volta. Mas não tem como. Você sente
dor no corpo inteiro.
Eu acho que estava chorando junto
com ela. Não tinha certeza, mas sentia
uma dor na garganta, como se o
sofrimento quisesse sair por ali.
– Gregory abandonou completamente
a família depois disso. – Ela começou a
limpar as lágrimas e tentou sorrir. Acho
que imaginou que eu estivesse
constrangida e estava querendo me
acalmar. – Foi embora para bem longe,
o meu menino. Ele estava certo. Foi
viver onde nada dessa podridão pudesse
tocá-lo. Mas para mim… Para mim era
tarde demais. Perdi minha família inteira
naquela estrada, naquela chuva. E me
perdi também. Entrei em depressão e
nunca mais consegui sair. Tentei me
matar algumas vezes. Enlouqueci – deu
de ombros – Foi então que me tornei
uma verdadeira vergonha para a família.
Um membro da família Baxter louco?
Suicida? Nunca! Jamais! Me
esconderam aqui e dizem para os outros
que eu estou meditando em um templo
budista, fazendo topless em algum spa
ou algo igualmente ridículo e fútil.
– Mas Greg, ele… É uma pessoa tão
boa e gentil. Não acredito que ele possa
simplesmente tê-la deixado aqui…
– Eu sou o motivo pelo qual ele é tão
gentil – sorriu.
– O que quer dizer?
– Eu sou a última crueldade que ele
fez na vida. A última que ele se permitiu
fazer. Me abandonar aqui e me esquecer.
E, para compensar, ele nunca mais foi
cruel. Ele sempre foi assim, desde
menino. Acha que uma coisa muito boa
pode compensar uma muito ruim. Não
acho que ele esteja errado. E mesmo que
achasse, quem sou eu para julgar? Mas
eu não o culpo. Eu cometi meu crime e
estou cumprindo minha pena.
Sinceramente? Prefiro que ele esteja
bem longe daqui. Bem longe disso tudo.
– Por quê?
– Ele é o último – expirou
longamente. – O último Baxter. Minha
mãe vai querê-lo de volta. Ele sempre
foi o favorito dela, sempre se deram
muito bem. Acho que, no fundo, ela
acredita que tudo isso, ele ter se
mudado, ter se distanciado de tudo…
Ela deve achar que tudo isso é só uma
fase que ele vai superar e vai voltar. Ela
está só esperando. E, não se engane,
Dominique, aquela mulher é o demônio.
E eu quero ela bem longe do meu filho.
Não consegui contar a história toda
para Andy. Passei a maior parte da
viagem de volta encarando a paisagem
escura e pensando.
Não existe vida fácil. Minha verdade
continuava firme e forte. Todas aquelas
fotos, toda aquela alegria… Não era
fácil.
A. Holt. Lembrei da inscrição no anel.
Amanda… O nome dela era Amanda.
Era a isso que Gregory estava se
prendendo? A irmã que ele tinha
perdido? Ao pai que tinha perdido? A
uma vida inteira que ele acreditou ser
verdadeira e que foi destruída na sua
frente?
Lembrei da moça na foto. Os cabelos
cor de mel assim como os dele. Os
olhos azuis tinham um toque esverdeado,
não tinham? Eu precisaria olhar com
mais cuidado em vez de com a repulsa
ciumenta com que observei da primeira
vez.
Era a irmã dele.
Lembrei das cosquinhas. Não era um
amor sensual naquela foto. Era um amor
fraterno. Era o irmão mais velho
querendo forçar a irmã mais nova a
fazer uma careta para a câmera.
Eu precisava respirar fundo e colocar
toda aquela conversa para trás. Tinha
que seguir o último conselho que Audrey
tinha me dado: não podia dizer a Holt
que tinha ido visitá-la.
– Estava começando a ficar
preocupada.
Holt estava no seu escritório. Parecia
ter chegado já a algum tempo e ter se
enfiado direto no trabalho.
Tinha dobrado as mangas da camisa
social até quase o cotovelo e sua gravata
já descansava sobre o encosto da
cadeira.
– Estava com Andy. – Eu tinha
preparado algo mais elaborado, mas
seja lá qual fosse a verdade que eu tinha
formulado para lhe contar, ela ficou
esquecida no fundo da minha mente.
Ele estava sentado na poltrona com o
laptop, e alguns processos estavam
abertos à sua frente. Seu sorriso era
cansado, mas verdadeiro.
– Está vendo que não é impossível
fazer amizade com os vizinhos?
Ele tinha os mesmos olhos verdes da
sua mãe. Minha mente viajava até o
asilo e de volta para a casa. Todas as
coisas sobre ele que eu tinha aprendido
hoje fizeram com que o carinho que eu
já sentia crescesse de um jeito
exponencial, e agora eu precisava usar
todas as minhas forças para não correr
até aquela poltrona e abraçá-lo, segurá-
lo em meus braços e dizer que ia ficar
tudo bem.
É claro que essa emoção fez com que
eu me sentisse ridícula. Ele era um
homem adulto, perfeitamente capaz de
cuidar de si mesmo, assim como tinha
feito todos esses anos. Mas meu coração
não ligava mais de ser ridículo e queria
confortá-lo mesmo assim.
Andei até Greg tentando manter um
sorriso descontraído nos lábios. Era eu
quem estava deprimida, não ele.
Gregory, provavelmente, não tinha
sequer pensado em nada disso ao longo
do dia. Era eu quem estava com o seu
passado na cabeça e não podia misturar
as coisas.
Curvei o corpo e segurei seu rosto.
Ele estava esperando que eu dissesse
algo. Mas eu não tinha palavras. Eu só
conseguia pensar no jovem e iludido
Greg recebendo a notícia de que seu pai
e sua irmã estavam mortos. A dura
notícia de que a realidade chega para
todo mundo.
Beijei sua boca.
Não foi com desejo ou provocação.
Eu só queria beijá-lo. Só queria que
aquele gesto gritasse como eu me sentia.
Fiz carinho em seu lábio inferior com o
polegar e o beijei mais uma vez.
– Dom? Está tudo bem?
Ele se jogou para trás e as rodinhas
da cadeira giraram. Aproveitei o
movimento e me sentei em seu colo.
– Está. Está tudo bem. Muito
trabalho? – Levantei alguns papéis
fingindo lê-los, mas não conseguia me
concentrar em nada.
– Sabe como é… – deu de ombros,
colocando a mão em meu quadril. Ele
ainda me observava de um jeito
cuidadoso. Minha atitude estava
deixando Holt preocupado. – Estou um
caco – riu.
– Está – respondi exageradamente
séria e ele continuou sorrindo. – Já
comeu alguma coisa? Precisa tomar um
banho.
– Ah! Eu estava esperando você. –
Ele me deu um beliscão bem baixo no
quadril. – Vem comigo?
Passei os dedos em seu cabelo, sorri
e o beijei mais uma vez antes de me
levantar de seu colo. Segui até o
banheiro puxando-o pela mão, e ele me
acompanhou obediente.
Desabotoei cada um dos botões de
sua camisa com calma enquanto suas
mãos se mantinham na minha cintura.
Notei que até então sempre tínhamos
sido urgentes. Sempre tinha sido duro,
forte, intenso e louco. Não que eu
achasse ruim, pelo contrário. Eu
adorava. Mas algo estranho estava
acontecendo comigo naquele momento.
Eu não queria que ele me fodesse. Eu
queria tirar sua roupa. Queria colocá-lo
embaixo da água. Queria acariciar sua
pele e sentir seu calor. Perto ou dentro
de mim, não me importava.
Algo na delicadeza e paciência do
meu toque fez com que Holt não
avançasse e, em vez disso, ele apenas
ficou ali, de pé, esperando.
Colocou os braços para trás e eu o
ajudei a tirar a camisa. Depois foi o
cinto e a calça. Levantei minhas mãos e
senti o toque leve de seus dedos
enquanto ele tirava minha blusa.
Ele me beijou. Devagar. Deixei
nossas línguas se tocarem e se
conhecerem. Greg tirou o resto de minha
roupa com cuidado enquanto me
mantinha firme contra o seu corpo nu. Eu
o coloquei debaixo do jato de água e
coloquei o sabonete líquido na esponja.
Joguei água no seu corpo e passei a
esponja pelos seus ombros e descendo
pelo seu tórax.
Gregory me observou com um sorriso
de diversão nos lábios, como se não
estivesse entendendo exatamente o que
eu estava fazendo. Não entendi sua
confusão com algo que para mim era tão
óbvio. Eu estava cuidando dele. Do meu
jeito.
Passei os dedos ensaboados pelo seu
pescoço e suas mãos. Ele deu um passo
à frente e colocou o nariz contra minha
bochecha. Eu estava evitando me mover
demais enquanto continuava a ensaboá-
lo. Ele seguia o movimento do meu
rosto, nunca deixando seu nariz muito
distante da minha bochecha, a não ser
quando ele me beijava de leve na linha
do maxilar ou na base do pescoço.
Greg tomou a esponja das minhas
mãos. Agora era ele quem me banhava.
Depois, me puxou devagar e senti a água
e o sabão deixando nossos corpos.
Nossas bocas se encontraram, e eu
coloquei meus braços ao redor do seu
pescoço.
Me soltei para observá-lo. Observei
seus olhos, sua boca, seu corpo.
Não era só luxúria. Não era só
paixão.
Eu amava a sensação de sua pele
contra a minha, amava sua boca e seu
sorriso, amava o seu cabelo grudado no
rosto pela água, amava a curiosidade em
seus olhos verdes.
– O que foi que aconteceu?
– Nada – sorri. Eu o beijei mais uma
vez e ele me abraçou com tanto
carinho… Como se quisesse me
proteger do que quer que fosse. Caímos
na cama ainda molhados e abraçados.
Não havia sorrisos brincalhões,
gemidos provocantes ou palavras
safadas ao pé do ouvido dessa vez.
Havia só ele e eu.
E eu o amava. O amava muito.
Senti o seu corpo sobre o meu e
depois dentro de mim.
Não queria fechar os olhos. Seu olhar
firme deixou claro que ele deveria estar
pensando a mesma coisa.
O orgasmo foi algo que eu nunca tinha
experimentado antes. Nunca tive um
homem tão dentro de mim. Tinha seus
cabelos nos meus dedos, sua língua na
minha boca, seu gemido contra a minha
pele.
Acho que era essa a diferença. Em
minha vida inteira, eu estava acostumada
a transar, a foder pesado ou a deixar que
um cara me comesse. Acho que aquela
foi a primeira vez que eu fiz amor.
Estava deitada sobre seu peito,
sentindo as pontas dos seus dedos
acariciando meu braço.
– Acho que vou ter que arrumar mais
coisas para você fazer aqui. Não sei o
que vai ser de mim quando você
precisar ir embora.
Sorri e dei um beijo estalado em seu
tórax. Ia deitar o rosto mais uma vez,
mas ele me segurou pelo queixo.
– Você é muito linda.
– Eu sei – mordi sua mão e voltei a
me deitar, abraçando-o apertado
enquanto ele ria alto.
Mas brincadeiras não iam esconder a
preocupação em minha mente.
– Só falta mais uma caixa – confessei.
– E eu acabo de arrumar sua casa.
– Então vou precisar esconder essa
caixa para você não terminar nunca. –
Enfiou a mão nos meus cabelos naquele
cafuné delicioso. – Aliás… É a caixa
que estava na mesa da cozinha, hoje?
A caixa “Lembranças de A.H.” Meu
coração queria parar de bater.
– Essa mesmo. – Fiquei esperando
que minha voz tivesse soado casual o
suficiente. Por Deus… Eu não ia
conseguir mentir pra ele.
– Ah, eu já resolvi aquela. – Levantei
o rosto e apoiei o queixo em seu peito. –
Coloquei na garagem. Tem umas coisas
ali que eu mesmo arrumo depois.
Ele não ia arrumar.
Não ia arrumar nunca.
Ia deixá-la escondida na garagem em
algum lugar onde não precisasse ver ou
lembrar.
Não faz isso, Holt…
– Tem certeza? Eu já tinha até
começado. Não é trabalho algum.
Não se esconda. Por favor, não faça
isso.
– Obrigado. Mas pode deixar aquela
comigo.
– Tem poucas coisas, não vou
demorar para arrumar.
– Eu sei. Mas é que tem algumas
coisas ali que talvez precisem ser
jogadas fora. Tenho que olhar com
calma.
– Mas eu posso já tirar algumas
coisas que você vai querer, com certeza.
Pelo menos a foto da sua irmã, posso
colocar no quarto ou no escritório.
Me arrependi no momento que as
palavras saíram dos meus lábios e
prendi a respiração, esperando o
veredicto.
Ele não demorou mais do que dois
segundos.
– Como sabe que é minha irmã? – Sua
testa se enrugou em uma dúvida clara e
séria.
Diga que imaginou por causa da
semelhança física, Dom. Diga que
pesquisou e descobriu a história da
família, diga qualquer coisa menos…
– Sua mãe me disse. – Não era que eu
não conseguia mentir para ele. Eu
conseguia. Mas não queria. Não queria
nem um pouco.
Era a primeira vez em muito tempo
que eu tinha alguém na minha vida em
quem eu queria confiar. E queria que
fosse recíproco. Se ele não descobrisse
por mim, poderia descobrir por outra
pessoa, e aí não seria bem pior?
– Minha mãe? – ele riu. Achou que eu
estava brincado. Fiquei séria. – Como
assim “minha mãe te disse”?
– Você disse que ela ficava em um
asilo perto daqui, e eu achei que seria
gentil visitá-la e…
Ele se levantou da cama e começou a
se vestir.
– Você fez O QUÊ?
– Greg, não fiz por mal, só…
– Só se meteu na minha vida! De um
jeito que você… Que você…
Dominique, você não tinha o direito de
fazer isso!
– Achei que seria…
– Achou que seria o quê? Um bom
jeito de investigar minha vida?
– Quando você fala assim parece
horrível.
– Porque é! Qual é o seu problema?
– Não fale assim comigo! – Se ele ia
gritar, a Dominique gentil e carinhosa ia
ter que dar licença para a vadia passar –
Estou falando com educação, Gregory!
Retribua a gentileza.
– Que gentileza? Dominique, você
quer saber alguma coisa sobre a vida de
uma pessoa é só perguntar para ela.
– Mas você nunca fala…
– Porque eu não quero! É um direito
meu! Você pergunta algo para uma
pessoa, se ela não quer responder, ela
não responde e você fica sem saber! É
assim que o convívio social funciona e,
sinceramente, estou cansado de ser seu
professor no assunto. Você já é bem
grandinha, está na hora de começar a
descobrir como adultos normais se
comportam.
– Eles deixam a mãe trancada,
deprimida e isolada em um lugar sem
nunca visitá-la? É isso que os adultos
normais fazem?
– Não me julgue sem saber da minha
vida.
– Talvez eu saiba mais do que você
imagina.
– O que foi que ela te disse? Aliás! –
Levantou a mão. – Não fale. Não quero
saber.
– Ela não disse nada de mais.
– Não fale! – repetiu rudemente. –
Não quero saber! Foi por isso que
você… – Ele estreitou os olhos para
mim. – Esse carinho todo na cama? Foi
culpa? – Ele parecia magoado. – Estava
me recompensando por ter feito algo
pelas minhas costas?
– Eu pareço ser o tipo de mulher que
faz algo por culpa? – Mas ele não estava
ouvindo. Tinha as mãos enfiadas nos
cabelos.
– Droga! – sussurrou para si mesmo –
E eu pensei que isso tudo era porque…
Mas eu sou um imbecil mesmo.
– Olha, se você vai ficar assim, eu
vou dormir no outro quarto. Não preciso
desse tipo de…
– Não. Fica aí. Eu tenho que
trabalhar.
Ele vestiu a roupa e saiu.
Eu demorei uma eternidade para
conseguir dormir e acordei no meio da
madrugada em uma cama sem Gregory.
Ele tinha ido dormir no quarto de
hóspedes.
Capítulo 15
“Por Deus, mulher. Isso é guerra, não
uma festa.”

Rhett – E o vento levou

Eu tinha aprendido a pedir desculpas.


Essa parte eu sabia.
Mas o problema é que eu não achava
que tinha feito nada errado. Ou pelo
menos não tão errado para receber toda
aquela fúria.
Tomei café no balcão da cozinha.
Holt comeu praticamente em pé. Ele não
disse uma única palavra e, se aquilo era
uma competição para ver quem falava
por último, eu não queria perder.
– A caixa com as coisas da minha
irmã está na garagem – ele disse, quando
já estava pronto para sair. – Deixe onde
está, tudo bem? Acha que consegue não
se meter pelo menos nisso?
O encarei com raiva e não disse uma
palavra.
Vi seu pomo de adão se mover para
cima e para baixo.
É isso mesmo, Holt. Eu estou puta.
– Passo para te pegar às oito, está
bem? – acrescentou com uma voz um
pouco mais suave, mas ainda firme.
– E para onde é que eu vou? –
perguntei irritada.
– A comemoração. Eu te convidei
ontem. Você disse que iria.
– Eu posso mudar de ideia?
Ele abriu um sorriso irritado e
exausto.
– Você pode fazer o que você quiser.
Não é sempre assim?
Eu bebi meu café e ignorei sua
presença.
– Tudo bem – sacudiu a cabeça
devagar. – Eu chego às oito. Se você
quiser ir comigo, você vai. Se não… Se
não você faz o que você quiser.
Max colocou as patas dianteiras no
balcão e eu cocei suas orelhas enquanto
terminava minha xícara. Se Holt esperou
minha resposta antes de sair, não me dei
ao trabalho de reparar.
Metade de uma manhã sem ter o que
fazer e com meu cérebro cozinhando em
possibilidades fez com que meu orgulho
sumisse. Eu já estava começando a me
arrepender do jeito como tinha tratado
Gregory.
Mas o que me fez decidir parar com a
criancice foi a lembrança da loira
aguada. Ele disse que tinha conhecido
uma mulher no trabalho. Isso significava
que ela certamente estaria nessa
comemoração.
Foi um pensamento que durou apenas
uma fração de segundo, mas foi
completamente capaz de me fazer tomar
uma decisão: eu iria a essa festa e não
havia nada na Terra, acima ou abaixo
dela, que me impedisse.
Restava apenas o eterno dilema
feminino: o que vestir? Algo que eu já
tenho ou algo que precisa ser comprado?
Eu tinha preparado a mala de uma
mulher que iria fazer uma faxina rápida
e eficiente e depois iria voltar para casa
o mais rápido possível. Esse já não era
mais o cenário em que eu me encontrava
há algum tempo, vide o fato de a faxina
já ter sido concluída e eu não estar
exatamente comprando meu bilhete de
volta para casa pela internet. Olhei
todas as roupas que eu tinha trazido
organizadamente dispostas em cima da
cama. Eu tinha um único vestido que
poderia servir. Poderia.
Sentei na cadeira e observei a
bagunça que eu tinha feito.
Max ficou de pé na minha frente.
– O que você quer? – cocei sua orelha
e ele se sentou. Eu odiava admitir, mas
cachorros eram uma companhia
interessante. Estava começando a
considerar arranjar um para mim quando
voltasse para casa. Principalmente
depois do Experimento Holt, ia ser
difícil sobreviver na solidão.
Enchi os pulmões e tentei me acalmar.
Eu não estava só cheia de tesão e
loucamente apaixonada pelo homem.
Aparentemente, meus sentimentos
eram ainda mais fortes.
Eu estava fodida. Total e
completamente.
Que diabos eu ia fazer? Voltar para
casa e fingir que nada daquilo tinha
acontecido?
Ou me mudar para perto de Holt
correndo o risco de que ele não sentisse
nada por mim e de acabar fazendo o
papel de uma mulher louca e
perseguidora?
Não havia alternativa ideal e eu ia ter
que descobrir uma saída menos pior.
Eu ia ter que comprar sorvete. Era
isso o que as mulheres faziam nos
filmes, não era? Quando tinham uma
desilusão amorosa? E eu odeio sorvete.
“Acho que vou ter que aprender a
gostar.” Max inclinou a cabeça e emitiu
um latido baixo. Afinal, o clichê da
mulher abandonada não está completo
sem sorvete.
Apoiei meus cotovelos nos joelhos e
coloquei o queixo nas mãos.
Aquela seria, provavelmente, minha
última noite ali. Principalmente se Holt
continuasse tão irritado. À noite eu diria
que tinha acabado de arrumar sua casa.
A mudança estava concluída e ele,
oficialmente, morava em outra cidade.
Eu ia ligar o computador e ele ia acessar
sua pasta on-line. Eu o deixaria digitar
sua metade da senha e eu completaria
com “imbecil”.
Estava olhando para ele naquela
fatídica noite em que ele,
acidentalmente, me filmou. Olhando
para ele e tentando decidir o que
colocar na minha metade da senha. Holt
me ofereceu um sorriso pernóstico e eu
digitei a palavra “imbecil” sem pensar
duas vezes.
Max estava me observando divagar
sobre todas as nuances do meu passado
e todas as possibilidades para o meu
futuro.
– Mas de todos esses cenários, Max,
sabe qual é o único que nós não vamos
suportar? Deixar seu dono sozinho com
a loira esquálida. Isso, de jeito nenhum.
Depois que eu fosse embora, quando
estivesse longe dali aprendendo a me
afogar em sorvete, ele traria ela para
casa. Seria ela quem dormiria na sua
cama e coçaria as orelhas de Max. Mas
enquanto eu estivesse ali, ela não ia
encostar nele. Não ia, não ia e não ia de
novo.
Passei os dedos pelos cabelos.
Eu precisava de um vestido novo.
Precisava de um vestido que fizesse
cada mulher daquela festa me odiar e
cada homem querer cair de boca em
mim.
Precisava sair dali deixando uma
coisa bem clara para aquela lambisgoia.
Ele pode até ficar com você, mas
preferia estar comigo.

– Eu tenho que trabalhar.


– Mentira.
– É verdade!
– Não acredito. Você é a maior
desocupada que eu conheço.
– Isso, Dominique. É desse jeito que
você vai me convencer a te fazer um
favor.
– Olha, desculpa, Andy! Mas me
escuta! Nós vamos sair na sexta, não
vamos? Tenho certeza de que você
também aproveitaria um dia de compras.
A gente vai até o salão e dá um jeito no
seu cabelo.
– O que há de errado com o meu
cabelo?
– Ah, meu bem… O que não há de
errado com o seu cabelo?
– Você não pode pegar um táxi?
– Posso. – Eu não queria pegar um
táxi. Ai meu Deus… Eu estava
apreciando companhia. O que diabos
estava acontecendo comigo? – Mas
achei que você poderia querer vir.
Ela me observou por alguns segundos
mordendo o próprio lábio. Estava
considerando.
– Você não faz nada com o meu
cabelo sem a minha expressa
autorização?
– Com certeza – prometi resignada. –
Mas acho que você devia me ouvir.
– Vou pensar no seu caso.

Estava no quintal esperando Andy


sair quando vi Shelbi regando as plantas
do lado de fora. Ela se moveu, esticando
a coluna, e nossos olhares se cruzaram.
Levantei a mão em um cumprimento
tímido. Não sabia qual a regra de
etiqueta para esse tipo de situação, mas
não queria que tudo acabasse com a
criação de uma inimizade.
– Estou pronta. – Andy estacou ao
meu lado, e percebi que ela deveria
estar olhando para o mesmo lugar que
eu. – Você acha que a gente devia
chamá-la?
– Eu não sou muito boa com essas
decisões sociais.
– O que a gente faz, então?
Coloquei a cabeça para traz e inspirei
profundamente. Estava sentindo minha
sanidade começando a querer me
abandonar.
A verdade?
Eu estava de saco cheio.
Estava de saco cheio dessa coisa de
timidez, meiguice e preocupação.
Às vezes, ser uma vadia é a melhor
coisa que você pode fazer. E essa
vizinhança era dócil demais, precisava
de uma sacudida.
Marchei pela rua e ouvi Andy me
questionando às minhas costas.
– Shelbi! – gritei, antes que ela
pudesse fugir para dentro de casa e
fingir que não tinha me ouvido.
– O que é que vocês querem? –
resmungou baixinho quando nos
aproximamos.
– Estamos indo fazer compras, passar
no salão de beleza, essas coisas… E
você vem com a gente.
– Não vou, não. Eu tenho coisas
para…
– Vem com a gente, sim! E eu não
estou pedindo.
Andy estava segurando meu braço e
parecia ainda mais nervosa que Shelbi.
– Dom, o que você está fazendo?
– Estou dando um basta nessa
frescura. Shelbi, eu e Andy viemos te
dizer uma coisa. Você decidiu não
acreditar. A escolha é sua. Não vamos
mais falar sobre isso nem nos meter na
sua vida. Mas você me ajudou no meu
primeiro dia aqui e, por algum motivo
que eu não compreendo, parece tratar
bem todo mundo ao ser redor, inclusive
o traste do seu marido. – Ela fez uma
careta e ameaçou se virar – E pronto!
Esse foi o último comentário que eu fiz a
respeito dele. Não falo mais nada! Mas,
como eu dizia, você me ajudou, estou em
débito com você e eu odeio ficar em
débito com quem quer que seja. Você
vem com a gente. Vamos comprar um
vestido bonito para você, arranjar um
corte de cabelo novo para levar o seu
marido à loucura, se é que… – engoli a
ofensa. – Nada. Não vou dizer mais
nada.
– Vocês acham mesmo que eu iria
com vocês depois de tudo o que
disseram sobre o meu Eric?
Sua voz estava diferente. Não estava
cheia de fúria e indignação como no
outro dia. Estava mais sóbria, mais
composta. Era um leve tom de mágoa.
Mas uma mágoa que ela queria superar.
Um pedido de desculpas resolveria
tudo para a pobre Shelbi, e ela poderia
enfim voltar a ignorar o fato de que seu
marido era, de fato, horrível.
Mas desculpas eu não ia pedir.
– Não vou pedir desculpas, Shelbi.
Não acho que tenho nada para me
desculpar e não me arrependo de nada
que disse. Se você quiser ficar
emburrada regando as plantas, o
problema é seu. Nós estamos indo.
Agora! Você vem?
– Mas o que é esse inferno?
Ela chegou com seus sapatos de
plataforma e com um drinque cheio de
gelo na mão.
– Será que vocês podem parar de
gritar? Estão interrompendo minha
meditação.
– Você medita com álcool,
Madeleine? – Andy torceu o nariz.
– Não é da sua conta.
– Pois o que estamos dizendo também
não é da sua – retrucou.
– Não briguem, por favor. Vamos
falar mais baixo, Madeleine. – A Shelbi
que odiava conflitos estava de volta.
– Não estou brigando. Só não aguento
mais essas duas baderneiras. – Quem é
a baderneira, sua velha gagá?
– CALADAS! AS TRÊS! – Minha voz
firme foi ouvida acima de todas as
outras. – Mas será que ninguém trabalha
nessa vizinhança? Andy, vamos para o
carro.
– Você não manda em mim.
– Menina, não me teste! E vocês duas
vêm também.
– Dominique, eu…
– Shelbi! Entra na porcaria do carro e
cala a boca.
– E eu? – Madeleine perguntou.
– Você vem também.
– Mas olhem só pra isso… A
esquisita é nova na vizinhança e já acha
que pode me dar ordens.
Andy se aproximou com o carro. Eu
olhei para Madeleine com fúria nos
olhos.
– Entra. No. Carro.
Andy começou a dirigir a caminho do
shopping e o silêncio não durou mais
que poucos segundos.
– Vai fazer o quê, agora que nos
sequestrou?
– Madeleine, a Dominique foi gentil
demais convidando você. Então, cala
essa tua boca imensa.
– Convidando? Ah, e foi isso que a
grossa fez?
– Por que vocês são assim? –
perguntei.
– Assim como? – quis saber.
– Por que vocês brigam e xingam e
agem como inimigas mortais o tempo
inteiro?
– Eu não gosto dela – Andy explicou.
– É recíproco – Madeleine completou
com sua voz rouca no banco de trás.
– Eu não tinha qualquer problema
com nenhuma de vocês até inventarem
coisas sobre o meu Eric.
– O que foi que vocês inventaram? –
Senti o tom de quem ama um fuxico na
voz de Madeleine.
– Elas disseram que meu Eric fez
coisas que ele não fez.
– Tipo agarrar outras mulheres?
Porque isso, querida, é verdade.
– Pare o carro, Andy! Eu quero
descer! – Shelbi gritou.
– Ninguém vai parar o carro – decidi,
me perguntando que tipo de doença
mental tinha me acometido para ter essa
ideia genial de trazer o circo inteiro.
– Vocês disseram que iam parar com
essas loucuras.
– Mas a única loucura aqui é você
ainda ser casada com aquele traste e se
recusar a admitir que estamos certas.
– Andy! – reclamei. – Nós
prometemos.
– Eu não prometi nada. E você não
tem autorização para prometer por mim.
– Dominique, faça ela parar o carro!
Eu quero descer! – Shelbi repetiu.
– Não tem nem calçada aqui, Shelbi,
se controle.
Madeleine continuou a narrar como
Eric não prestava. Andy alternava entre
mandá-la calar a boca e dizer a Shelbi
que parasse de ser idiota. Shelbi pedia
para descer e sua voz começou a ficar
cada vez mais fina, como se ela fosse
chorar a qualquer segundo.
Eu estava com uma enxaqueca louca e
com um arrependimento eterno. Mas
consegui usar algumas palavras mágicas.
E eu digo mágicas porque não sei como
conseguimos chegar ao shopping sem
que acabássemos nos matando.

Andy tinha um sorriso deslumbrado.


Quando tinha dito ao cabeleireiro que
sumisse com aquelas mechas horrorosas
ela teve vontade de me matar, mas assim
que seus fios ficaram uniformes mais
uma vez, eu disse a ele que fizesse as
suas amadas mechas de volta. Mas agora
eram dois tons de violeta e um de azul
que preenchiam seus cabelos. Algumas
mechas tinham sido puxadas desde a
raiz, outras do meio dos fios e a grande
maioria apenas das pontas. A coloração
de antes parecia ter sido feita com água
e papel crepom. Agora, uma linda
mistura de cores se mesclava em um
furta-cor sempre que a luz batia em seus
fios.
– É assim que se pinta o cabelo –
expliquei e ela riu.
– Ficou perfeito! – Ela não conseguia
tirar os dedos dos cabelos e os olhos do
espelho.
– Eu sei. E na sexta você usa a roupa
nova que a gente comprou. Juro por
Deus, Andrea, se você usar uma
camiseta de banda na sexta-feira eu mato
você e enterro seu corpo no quintal da
Madeleine.
– Está muito lindo. – Ela não estava
me ouvindo. Ficava encarando cada
detalhe do próprio cabelo, e eu ri de seu
deslumbramento.
Shelbi tinha pintado o cabelo com
dois tons de loiro e cortado os fios na
altura do queixo. Meia hora na cadeira
do cabeleireiro e ela tinha
rejuvenescido uns oito anos. Brincava
com as pontas dos cabelos de frente
para o espelho. Eu entendia exatamente
o que aquele sorriso queria dizer: ela ia
voltar para casa e fazer um jantar
delicioso, ia vestir a roupa nova, se
entupir de perfume e de maquiagem e ia
mostrar o corte de cabelo novo para
Eric. Eu esperava que ele conseguisse
ser, pelo menos, delicado. Notasse o
corte e o elogiasse. Levasse sua mulher
para cama e a fizesse se sentir especial.
Ela queria tanto aquilo que, mesmo a
alguns metros de distância e em
completo silêncio, era possível ouvir
seu pensamento com clareza.
– E você? Não vai fazer nada com o
cabelo?
Balancei minha cabeça negativamente
para Madeleine. Meu corte era recente e
impecável. O estilo franjão estava na
medida certa e eu gostava dos meus
cabelos bem longos. E algo no jeito
como ele os agarrava, indicava que
Gregory também gostava deles assim.
Eu ainda não tinha fios brancos e
adorava ser morena. E não podia
reclamar da minha genética nesse
quesito. Meu cabelo colaborava muito e
quase nunca acordava indomável.
– Uma hidratação era tudo que eu
precisava – respondi. Convencer
Madeleine a fazer luzes no cabelo tinha
sido uma verdadeira saga. Ela, ao
contrário de Andy e de Shelbi, se
recusava a aceitar que eu tinha uma
noção de estética melhor do que a dela.
Foi quase tão difícil quanto arrancar a
blusa com estampa de onça de suas
garras na loja de roupas, mas eu
consegui convencê-la e, assim como as
outras duas, depois de tudo ela parecia
bastante satisfeita.
A manicure estava tendo trabalho com
Andy. Ela não conseguia parar de mexer
no cabelo e o esmalte borrou pela
terceira vez.
Escolhi uma cor escura para minhas
unhas. Um preto com um leve toque
avermelhado para combinar com o
vestido vermelho que tinha comprado.
Eu geralmente preferia amarelo para
ocasiões assim, a cor contrastava mais
com o meu tom de pele, mas o maldito
vestido vermelho serviu no meu corpo
de um jeito tão sensual que eu
simplesmente soube que tinha que ser
ele.
– E agora? Vamos para onde? – Andy
perguntou quando a manicure finalmente
a liberou. A pobre funcionária tinha uma
expressão exausta.
– Depilação.
– Eu espero vocês lá fora.
Eu a segurei pelo braço.
– Não preciso disso, é sério.
– Ela vai fazer o quê? – a depiladora
me perguntou. Claramente, ela não tinha
paciência para Andy. Eu te entendo,
colega.
– Você tem pelos na coxa também?
Ou só nas canelas? – perguntei.
– Só nas canelas – ela respondeu
assustada. – E bem pouco.
Estreitei os olhos e analisei sua
expressão.
Decidi que ela estava mentindo.
– Ela vai fazer perna inteira,
sobrancelhas, buço e virilha.
– O que ela prefere?
A depiladora nem olhava para Andy e
isso começou a incomodá-la.
– Egípcia nas sobrancelhas e buço.
Cera quente nas pernas e virilha.
– Tudo bem. E qual o tipo de
depilação na virilha?
– Eu estou bem aqui – reclamou. – Eu
posso decidir por mim, tudo bem?
A depiladora levantou uma
sobrancelha impaciente para ela, mas
esperou que eu falasse.
– O que você quer, então?
Ela olhou de mim para a depiladora, e
então de volta para mim.
– Quais são minhas opções?
– Lisa, cavada, asa delta… A gente
pode fazer um desenho em você também.
Um coração ou um coelhinho da
Playboy. O que acha? – ri.
– Não! Nada disso! Dominique, é
sério!
A depiladora não resistiu e também
começou a rir.
– Acho que a gente pode fazer uma
asa delta nela. Pouco cavada. Já que ela
não tem costume.
– Acho que é a melhor ideia.
– O que é isso?
– Significa que só vai depilar o
excesso. As bordas. Vai deixar os pelos
em toda a região triangular do púbis. Eu
uso assim.
– Tá. Se serve para você, serve para
mim também. Você também vai fazer?
– Eu me depilo a laser. Estou em dia
com os retoques. Apesar de que… Acho
que vou dar uma variada. Vou fazer
virilha, também – disse para a
depiladora. – Lisa.
Andy gritou tanto que não havia uma
pessoa nas proximidades que não
estivesse constrangida.
– Você não disse que ela ia… Que ela
ia…
– Menina, desembucha.
– Fazer atrás também.
– E você queria que ela deixasse
como estava?
– Foi horrível. – Ela não estava me
ouvindo e parecia estar controlando o
choro. – Não faço isso de novo nunca
mais.
– Faz sim. Deixe de bobagem.
A depiladora saiu e me chamou.
– O que você faz. – Andy olhou para
ela. – Tenho certeza de que há algum
artigo na Convenção das Nações Unidas
contra Tortura que diz que é ilegal.
Certeza.
– Obrigada – a moça agradeceu,
indicando que eu passasse.

– A sua amiga vem hoje à noite?


Eu não sei por que Devon Hill falava
comigo como se fôssemos grandes
amigos. Ele era um sacana pernóstico e
eu o odiava desde que tinha feito uma
piada inapropriada sobre minha vida
pessoal.
Não tinha o costume de odiar pessoas,
então respirei fundo e lhe dei uma
segunda chance.
Chance que ele jogou pela janela.
Cruzou conosco no elevador no primeiro
dia de Dominique na cidade, quando ela
veio até o escritório pegar as chaves de
casa. Ela sorriu e piscou seus longos
cílios para ele. Tinha sido uma
brincadeira boba e tenho certeza de que
assim que saiu do elevador, ela nunca
mais pensou nele. Ela sequer tinha feito
qualquer menção à ocasião: tinha sido
sedutora porque sabia que isso ia me
irritar. Me irritou e pronto, missão
cumprida. Mas desde então, Devon era
só perguntas sobre ela e sobre quando
poderia conhecê-la.
Ela é areia demais para o seu
caminhão minúsculo, Hill, e não, você
não vai conhecê-la.
– Ainda não sei. – Era verdade. Sorri,
tentando ser simpático. – E você? Quem
vai ser a companhia da noite?
– Sua amiga, eu espero. – riu,
sentando na cadeira à minha frente –
Desculpe a brincadeira, Greg. – passou
a mão na gravata. – Mas você disse que
era só uma amiga e, minha nossa… Com
todo o respeito, é o pedaço de carne
mais bonito que eu já vi na vida.
– Sei que você não faz por mal,
Devon. Mas a situação mudou. Estamos
juntos agora. – Meu tom tinha saído um
pouco mais rude e possessivo do que eu
tinha planejado. Mas foi bom, recado
dado. Fique longe da minha mulher,
idiota!
– Ah, poxa. Desculpe, cara. – Ele
pareceu levemente constrangido. – Mas
é só que… Achei que você e a Lynn…
– Não. Isso foi antes. E não deu certo.
– Entendo. É só que… Quando você
falou da sua amiga… Realmente soou
como se não houvesse nada. Achei até
que tinha sentido um pouco de irritação.
Pensei que poderia ser uma ex-
namorada inconveniente ou algo assim –
sorriu.
Suas perguntas eram o motivo da
minha irritação, Hill, não Dominique.
– Não havia nada quando você
perguntou. Mas agora há.
– E é sério? Ou é do tipo que dá para
compartilhar com os amigos?
Ele riu como se fosse uma piada, mas
eu sabia que havia um fundo de verdade
no comentário e não achei graça
nenhuma.
– Estamos namorando. – Droga. Não
sabia se estávamos de fato. Não fazia a
menor ideia de qual era definição do
nosso relacionamento.
Independentemente de nossa discussão,
eu sabia o que eu queria. Mas não sabia
o que ela queria. Além do mais, e se ela
fosse embora? E agora, se Hill fizesse
qualquer menção a esse meu comentário
Dominique ia me fritar e comer com
geleia.
– Ah. Bem, felicidades, então.
– Obrigado.
– E se não der certo. Por qualquer
motivo – brincou gesticulando, e eu
sorri, usando até a minha última gota de
força de vontade para continuar sendo
simpático e educado – vou querer o
telefone dela, hein? – ele riu mais uma
vez da sua brincadeira estúpida e eu ri
de volta.
Ele saiu e eu amassei um papel e o
joguei contra a porta.
Imbecil.
“Sua mãe me disse.”
Ela tinha ido ver minha mãe.
Eu queria gritar, brigar e dizer a ela
que não queria que ela fizesse isso
nunca mais. Mas não se diz a Dominique
o que fazer, e esse era um dos motivos
pelos quais eu tinha me encantado por
ela.
Dominique Thoen era o oposto de
tudo que minha mãe era, de tudo o que
tinha destruído nossa família. Ninguém
puxava ou empurrava Dominique.
Ninguém lhe dizia o que fazer ou como
fazer. Ela era sua própria mulher, dona
da sua vida e do seu destino. Era isso o
que eu adorava. E era isso o que me
deixava louco.
Assim que saí do quarto me arrependi
do jeito como tinha falado com ela.
Tudo bem, ela não precisava ter ido ver
minha mãe pelas minhas costas. Mas eu
tinha lhe dado todas as informações que
precisava para fazer isso. Tinho contado
pequenos pedaços do meu passado,
apenas o suficiente para deixá-la
curiosa. Será que eu podia mesmo
culpá-la? Eu também tinha feito algo
parecido, tinha olhado sua lista pro
bono, tinha seguido seus passos no dia
do fórum. Eu também tinha investigado
sua vida quando ela achou que ninguém
estava olhando. E nós nem estávamos
dormindo juntos naquela época. O que
ela diria se descobrisse? Ficaria
indignada como eu tinha ficado?
Dominique estava virando minha vida
de cabeça para baixo de um jeito que ela
não fazia a menor ideia. Tinha mudado
toda a minha vida para conseguir me
afastar da minha família, e mal ela se
aproxima e já começa a trazer minha
família de volta. Eu não queria aquilo.
Odiava brigar com ela. Odiava. Mais
que tudo. Acho que nunca odiei tanto
uma coisa na minha vida. Nem o Hill,
nem a minha mãe, nem a minha avó.
Brigar com Dominique me fazia perder
meu norte.
Demorei o dobro do tempo na noite
anterior para conseguir acabar meu
trabalho… Só conseguia pensar em
voltar para o quarto e fazer as pazes.
Voltar e dizer “Olha, eu te amo, está
bem? Chega dessa frescura. Vem aqui
fazer amor comigo e amanhã vamos
arranjar um emprego nessa cidade para
você não precisar ir embora nunca
mais”.
E aí o quê?
Ela ia olhar para mim e rir? Sua
vingança estava completa e ela podia
voltar para casa.
Eu tinha tanto medo.
Já tinha perdido alguém que eu amava
antes.
E aquela perda tinha destruído minha
vida inteira, não tinha?
Parte de mim queria experimentar a
sensação, independentemente do risco.
Queria ser vulnerável e me permitir algo
maravilhoso.
Mas a outra parte era uma covardia
condensada, e eu tremia só de pensar em
como seria horrível me abrir desse jeito
e depois ter uma porta fechada na minha
cara.
Amar Dominique poderia ser incrível.
Mas perdê-la seria insuportável.

– Dominique? – bati na porta


entreaberta do quarto de hóspedes e
enfiei o rosto no cômodo. Mantive os
olhos no chão, pois não sabia se ela
estava trocando de roupa e não queria
ser grosseiro. Principalmente com
Dominique. E principalmente depois de
uma discussão.
– Estou quase pronta.
– Você vai, então?
– Você me convidou, não foi? Já
mudou de ideia? – Ela estava sendo
grossa. Isso era bom. Ela ser grossa
significava que estava bem.
– Claro que não. Mas você disse hoje
de manhã que não tinha certeza.
– Eu sei o que eu disse e… Por que
você está olhando para o chão? Não tem
nada aqui que você já não tenha visto.
Levantei os olhos.
Ela estava usando uma lingerie de
renda vermelha. Salto alto daqueles bem
finos. E mais nada.
Vermelha.
De todas as cores que ele poderia
estar usando… Logo vermelha…
Puta merda.
Eu sabia que não estava respirando.
Eu estava encarando aquela porra
daquele corpo escultural enfiado
naquela porcaria vermelha e minúscula.
Ela tinha celulite. Tinha estria. Tinha
marcas no corpo como qualquer mulher.
E isso não diminuía em nada aquela
delícia de bunda. Não era um corpo
perfeito e imaculado. Mas aquelas
imperfeições eram a parte mais
sedutora. Deixavam claro que ela não
era parte de alguma fantasia inatingível.
Ela era real e estava bem ali, a poucos
passos de mim. Tudo o que eu precisava
fazer era andar até lá, pedir desculpas
pela minha grosseria, beijá-la e jogá-la
na cama. Eu afastaria a parte de baixo
da calcinha, só um pouquinho, só para
me dar passagem, e a comeria sem tirar
nada daquela lingerie vermelha. Suas
pernas abraçadas na minha cintura, seus
saltos contra minhas pernas, seu mamilo
na minha boca…
Eu devia estar sem dizer nenhuma
palavra há alguns segundos.
– Você disse que ia chegar às oito
horas. Está atrasado.
Mandei meu cérebro fechar minha
boca, mesmo sem ter plena certeza de
que ela estava realmente aberta. Tinha
perdido o controle do meu corpo
enquanto meus músculos se contraíam e
minha garganta secava de desejo.
Vamos lá, Greg. Tenha calma. Diga
palavras. Devagar. Uma frase de cada
vez. Concentre-se.
– Desculpe. – Pausa. – Tive que
resolver umas coisas no escritório. –
Pausa. – Fico pronto em quinze minutos.
Eu estava passando a língua nos
lábios e escondendo minha ereção atrás
da porta.
Ela se virou de frente e eu desejei
morrer.
Conseguia sentir seu perfume e meu
pênis estava gritando para que eu
pedisse desculpas de joelhos e acabasse
com aquilo de uma vez. Afinal, se aquilo
era uma competição de orgulho e
teimosia, nós todos sabíamos quem ia
ganhar…
Mas meu coração me lembrou que, se
eu cedesse a essas emoções por
qualquer coisa, era ele quem podia
acabar quebrado e arruinado.
Ela levantou os braços como se
estivesse esperando que eu terminasse
de dizer o que eu tinha ido dizer.
Eu não tinha mais nada para falar.
Mas não queria fechar a porta. Abri a
boca. Não saiu nem uma palavra. Nem
uma. Valeu pela ajuda, cérebro.
Apontei para o lado de fora indicando
que eu ia sair e passei os olhos pelo seu
corpo mais uma vez.
Puta merda.

– Dom? Já está pronta? – chamei, já


descendo as escadas.
– Aqui embaixo.
Ela estava me esperando na sala.
– Uau. – Minha boca se mexeu
sozinha.
O vestido vermelho tinha alças finas e
um bojo rígido que empinava e
delineava seus seios. A roupa colava
agarrada até sua cintura, e depois se
abria em uma saia leve com uma fenda
na lateral que deixava uma de suas
coxas quase completamente de fora.
Estava me lembrando do dia em que a
conheci. Não foi o acaso de apenas uma
noite. Ela tinha a capacidade de ser
estonteante quando queria.
Seu perfume parecia uma dose
concentrada de afrodisíaco, e era
suficiente para deixar qualquer homem
com as pernas bambas.
– Você está… linda. Como sempre. –
Tentei fazer o elogio soar casual e não
apaixonadamente deslumbrado. Acho
que consegui.
– Obrigada. Vamos?
Se ela estava tentando fingir descaso,
estava atuando milhares de vezes melhor
do que eu.
Abri a porta de casa e ela foi para o
carro sem me dirigir uma única palavra.
Lembrei de Hill e seus comentários
imbecis. Ele ia estar esperando na festa
e se Dominique flertasse com ele para
me irritar eu não tinha certeza se ia
conseguir me segurar. Ele era um
advogado antigo da firma. Não podia
dar um murro nele.
Queria explicar a situação para ela e
pedir que compreendesse e não fosse
infantil. Mas, ao mesmo tempo, não
queria lhe dar munição.
Liguei o carro e seguimos em silêncio
por alguns instantes.
– Onde vai ser essa festa?
– Em uma galeria no sul da cidade.
– É uma comemoração de que,
exatamente?
– O escritório trabalha com algumas
fundações de cunho social. Uma delas
acabou de conseguir resgatar uma
coleção de arte bem importante. A
abertura da exibição vai ser hoje.
– No meio da semana? Não era mais
inteligente fazer isso no fim de semana?
– Amanhã é feriado, Dom.
– Ah!
As férias deviam ter bagunçado seu
calendário.
Meus olhos desceram para sua perna
exposta pela fenda do vestido. Queria
poder tirá-la daquela roupa quando
voltássemos para casa. E não
precisávamos nem transar. Quer dizer,
se não fosse por aquela droga de
lingerie vermelha me deixando louco de
tesão… Mas o fato é que eu queria o que
tivemos ontem. Foi bom de um jeito que
eu nunca tinha experimentado antes.
Sentir seus dedos ensaboados na minha
pele, apenas me alisando. Era
contraditório imaginar isso. Estávamos
nus, mas tinha sido inocente. Tinha sido
um carinho verdadeiro.
Droga, será que foi só culpa?
Ou será que ela me ama?
Ah, por favor, por favor, que ela me
ame.
Não precisava nem ser amor ainda.
Acho que já ficaria feliz o bastante se
ela estivesse apaixonada. Apaixonada
de verdade e disposta a tentar.

– Dominique Thoen, este é meu chefe,


Andrew Conaughy. Andrew, minha
amiga Dominique.
– Um prazer. – Ele pegou minha mão
e a beijou. Sorri de volta.
– O prazer é meu.
Tinha decidido que ia ser
espetacularmente simpática aquela noite.
Ia deixar todos os seus colegas de
trabalho vastamente impressionados
com minha personalidade embriagante.
Ou, em outras palavras, tinha deixado a
vadia em casa.
Logo eu estava sendo apresentada a
todos do novo escritório de Holt.
– Gregory! – exclamou um dos sócios.
– Você tem que nos dizer onde
encontrou uma dama tão linda.
– Sim! E se tinha mais delas nesse
lugar.
Todos riram e eu acompanhei.
Detestava essas hipocrisias. Eles
estavam me achando gostosa, medindo
minha bunda e decorando minhas curvas
para pensar em mim quando estivessem
comendo suas mulheres mais tarde. Mas
iam passar a noite me fazendo elogios
que eles acreditavam serem sutis. Eu
sorri, aceitei, e deixei que a brincadeira
continuasse.
– Ela era minha colega de trabalho no
meu emprego anterior – explicou,
virando-se para me observar. Eu não
estava exatamente próxima a seus
braços, mas também não estava
exatamente separada. Holt sempre
encontrava um jeito de colocar uma mão
na minha cintura, no meu braço, nas
minhas costas… Era uma dança, e ele
sempre estava me tocando. Um gene de
DNA canino e ele estaria urinando ao
meu redor. Está bem, Greg, acho que
todo mundo já entendeu que eu estou
com você.
– Hyde, Willows & Benson, hein?
Conte para nós, Dominique: com quem
você teve que dormir para conseguir um
emprego lá?
Todos riram. A mulher que precisa
dormir com alguém para conseguir um
emprego. Realmente pessoal, hilário…
– Na verdade, eu achei um precedente
na jurisdição e encontrei uma falha
contratual que evitou que um dos sócios
majoritários perdesse 60% de seus bens
para a ex-mulher, de quem estava se
separando depois de ter sido pego na
cama com a amante. Ele praticamente
deixou que eu escolhesse meu salário
depois disso.
– Impressionante! – Andrew fez uma
breve reverência. – E quanto ela levou
no divórcio?
– 20%.
– É, ele realmente tinha que deixar
você escolher quantos zeros ia ter no
contracheque! – riu.
– E isso foi porque ele preferiu que
outro advogado conduzisse a audiência
– expliquei.
– Ah! Claro! Se fosse você teria
conseguido o quê? 15%?
– Cinco. – Levantei o copo em um
brinde elegante e ele me acompanhou.
– Impressionante – murmurou mais
para si mesmo do que para os outros –
Deveras impressionante.
– Espero que não tenham começado a
festa sem mim! – Ele tinha o cabelo
escuro e um par de olhos castanhos
perigosamente sensuais. – Boa noite –
acrescentou, dirigindo-se diretamente a
mim. Gregory apertou o braço que tinha
na minha cintura. Hmm… Ciúmes…
Certo, eu posso trabalhar com isso.
– Dominique Thoen – disse
oferecendo a mão para que ele
apertasse. Em vez disso, ele a levou até
a própria boca.
– Devon Hill.
– Prazer, sr. Hill.
– Não, não. O prazer é todo meu.
Ele estava sorrindo daquele jeito
óbvio. Estava dando em cima de mim.
Holt estava congelado ao meu lado.
Se não tivesse gritado comigo no dia
anterior, poderíamos agir de modo mais
descontraído, ele iria me beijar e eu não
piscaria os olhos para o sr. Hill. Mas
ele preferiu gritar comigo e ser
intransigente, não foi? Pois agora que
aguente.
A conversa seguiu entre um tópico e
outro. Eu tinha conseguido me livrar do
abraço de Holt e sentia Hill se
aproximar sorrateiro. Gregory estava
virando uma taça de champanhe depois
da outra.
– Onde Greg estava te escondendo? –
Hill quis saber finalmente.
– Ninguém me esconde, sr. Hill. Eu
vou para onde quero. – Tinha um leve
tom provocativo em minhas palavras.
Discreto, mas evidente.
– Perdoe-me – riu. – E é Devon, por
favor.
– Devon – completei.
Holt estava em silêncio já há alguns
minutos. E depois que seu chefe se
afastou, ele passou a não participar da
conversa nem com interjeições.
A mulher loira se aproximou tocando
Holt e Devon nos braços.
– Boa noite! É realmente uma
belíssima exibição, não é?
Na última e única vez em que eu já
tinha visto a recém-chegada, ela estava
de roupa íntima na cama de Holt. Minha
garganta deu um nó. Ele ia se vingar
agora, não ia? Ia retribuir meu
comportamento infantil com Hill sendo
infantil com a loira aguada.
– Linda! – Hill concordou, sem tirar
os olhos de mim.
Holt só balançou a cabeça
concordando.
Prendi a respiração. Ele ia dar em
cima dela e eu ia querer morrer.
– Não fomos propriamente
apresentadas. – Ela tinha um sorriso
idiota estampado na cara e eu quis lhe
bater. Apertou o braço de Holt como se
estivesse pedindo que ele fizesse as
apresentações e eu tive certeza de que
eu ia lhe bater. Tira as mãos dele,
vagabunda.
– Dominique, Lynn. Lynn, Dominique.
– Curto e grosso. Por que ele não estava
flertando com ela?
Ela me ofereceu uma mão. Tinha uma
postura altiva e dominante. Em sua
minúscula cabecinha, devia se lembrar
de que estava nua na cama com o meu
homem e que tinha sido eu quem saiu
correndo. A vagabunda devia achar que
ela era a gostosa e eu a mal-amada.
Precisava lhe explicar bem direitinho
que eu não estava nem um pouco
constrangida com a situação e que,
quando eu apareci, foi ela quem acabou
sendo chutada para fora da cama.
– Quase não te reconheci sem o
cachorro – riu, esnobe. Ela queria curtir
com a minha cara?
– Quase não te reconheci vestida. –
Eu também sei brincar, viu, meu bem?
Lynn me ofereceu um sorriso amarelo
e Hill ficou olhando de uma para a outra
tentando compreender as informações
recém-adquiridas.
– Ainda bem que não tenho vergonha
do meu corpo – riu, passando a mão de
unhas longas e bem feitas pela gravata
de Gregory. – Ou teria sido
constrangedor. – Ele tocou sua mão com
educação e a guiou para longe. Isso aí.
Entendeu, magricela? Ele não quer suas
mãos nele.
– Ah, mas não deve se envergonhar. –
Peguei o morango preso na borda da
taça de champanhe de Holt e o coloquei
na boca permitindo que meus dedos se
demorassem em minha língua. Os dois
homens me observavam hipnotizados. –
Quero dizer, não com esse seu
vestidinho fofo. Ele esconde muito bem
todas as imperfeições do seu corpo, não
precisa se preocupar.
Ela queria me matar.
Ótimo.
– Imperfeições? – ela sorria como se
eu estivesse brincando. Mordi o
morango bem devagar. Greg estava me
vigiando e eu firmei meus olhos nos
deles enquanto mastigava e chupava a
fruta na minha boca com uma delicadeza
imensa e uma discrição infinita. Era
sensual de um jeito que só um homem
olhando nos meus olhos poderia ver.
Acho que senti seu pau ficando duro
contra meu quadril. Só por causa de uma
fruta, Greg? Sério?
Ele tocou minha cintura e me
reposicionou à sua frente.
Duro. Definitivamente duro.
Eu ia precisar comprar morangos.
– É. Mas não se preocupe. – Engoli a
fruta e voltei minha atenção para ela –
Ouvi dizer que é supercomum uma
mulher ter a quantidade de celulites e de
gordura localizada que você tem.
É um idioma.
Um que eu apelidei de vadiês. Não é
exatamente o que você fala, mas como
você fala. É só colocar uma boa dose de
condescendência misturada com ofensas
e dizer tudo que você quer com a voz
mais sonsa da história do universo e
sorrir como se estivesse elogiando a
pessoa.
Lynn queria dialogar comigo. Ela só
não sabia que minha sagacidade não
conhecia limites e que, quando o assunto
era vadiês, eu era fluente.
Podia continuar nessa brincadeira a
noite inteira.
– Como está se adaptando à nova
cidade, Greg? – Virou-se para ele,
desistindo de continuar a conversa
comigo. Pelo menos ela aprende rápido,
isso ninguém podia negar. – Já virou um
cidadão local? – Ela não tirava os olhos
de sua boca e as patas de seu braço.
Queria que ela voltasse a conversar
comigo. Preferia ela me ofendendo do
que o elogiando. Se ele precisasse lhe
dar atenção, eu estaria navegando em
águas perigosas.
– Ainda não. Mas está tudo tranquilo,
por enquanto.
Tentei suprimir a vontade de enrugar
a testa. Por que ele estava tão normal?
Eu estava ali me derretendo para cima
do seu colega de trabalho apenas para
lhe causar ciúmes e, aparentemente, não
estava causando nada.
– Bem, se precisar de qualquer ajuda,
por favor… – Ela colocou a mão sobre
o peito e fez a expressão de humildade
mais risível que eu já vi na vida. – Não
hesite em pedir.
– Obrigado, Lynn.
Será que ele não se importava? Eu
podia estar interpretando aquilo tudo
errado… Se ele não ligasse, todas as
toneladas de flerte que eu despejei sobre
Hill tinham sido inúteis.
– Preciso… – Ela apontou para algum
lugar atrás de nós como se precisasse
fazer alguma outra coisa. – Mande
lembranças para o cachorro, sim?
Eu poderia ter respondido milhares
de coisas a essa altura, mas estava
preocupada demais decidindo se Holt
realmente não se importava nem um
pouco que eu estivesse flertando com
outro cara.
– Dom? – Hill estava indo longe
demais. Não tinha lhe dado intimidade
para me chamar de Dom… – Você
dança? Seu acompanhante parece um
pouco baixo-astral hoje – riu e eu olhei
para Holt. Ele me observou e travou o
braço em minha cintura mais uma vez.
Ele estava com ciúmes.
Ele não queria que eu fosse com Hill.
E ele não tinha nem se incomodado
em infantilmente devolver a
provocação.
De repente, me senti miúda e ridícula.
Eu e meus jogos imbecis. Ele só tinha
me convidado para uma comemoração e
eu tinha transformado o evento em mais
um jogo de poder. Sinceramente, como
ele conseguia me aguentar?
– Não, Hill. Estou bem – respondi,
encarando os olhos verdes de Holt.
– Ora, vamos! Gregory não se
incomoda.
– Não é por isso – sorri. – Eu
realmente não quero.
– Greg – pediu –, você esteve
desanimado a noite inteira. Vamos!
Deixe a garota se divertir.
Holt trocou o apoio do corpo e
respirou fundo como se quisesse dizer
alguma coisa, mas todas as frases que
lhe vinham à mente começavam com um
palavrão.
– Sr. Hill, o senhor está sendo
inapropriado.
– Inapropriado? Dominique, somos
todos adultos aqui. Podemos deixar de
bobagens?
Ele estava claramente se referindo ao
meu comportamento até então. Eu tinha,
de fato, sido um pouco amigável
demais. Holt soltou minha cintura,
vencido. Eu quis abraçá-lo de volta e
sussurrar “Não me solta”. Meu pobre
Greg… Ele tinha todas as armas para
lutar, mas parecia ter desistido da
guerra. E por que deveria persistir se
tudo que eu fazia era provocá-lo? Ele
estava exausto e o arrependimento
começou a explodir por baixo da minha
pele.
– Deixar de bobagens? Tudo bem, sr.
Hill. – Encarei o colega de Holt com
minha irritação típica. Não ia deixar
meu homem ficar por baixo de ninguém
que não fosse eu. – Gosto de causar
ciúmes em Greg de vez em quando. O
sexo fica mais gostoso quando a gente
volta pra casa. – Holt tinha prendido a
respiração e estava esperando, sem
qualquer reação, enquanto eu terminava
de falar. – Ele me chama de safada e me
bate de um jeito que eu gosto. Mas só
faz isso quando eu o provoco o
suficiente. – Se Holt queria rir ou
chorar, eu não soube dizer, mas estava
respirando de um jeito estranho. –
Então, não tenho qualquer intenção de
dançar com o senhor. Nem agora, nem
nunca – ri como se apenas a ideia fosse
motivo de piada. Virei para Holt com o
lábio entre os dentes. – Estou com sede,
vou pegar algo para beber. – Então
enfiei a boca dele na minha. Chupei sua
língua com calma e prazer. Mordi e
lambi. Deixei minha língua à sua
disposição por longos segundos. Eu
podia senti-lo, ávido, buscando meu
corpo. Sentia a confusão em seu gosto.
Ele não estava entendendo nada. – Você
quer alguma coisa? – Passei o polegar
pelos seus lábios tentando em vão tirar
as marcas do batom vermelho.
– Han? – Ele engoliu a seco,
recuperando o fôlego. – Não, estou bem.
Obrigado.
Sorri para um cavalheiro. Depois
para o outro, e me retirei.
Capítulo 16
“Aconteça o que acontecer, vou te
amar como te amo hoje até o dia que eu
morrer.”

Melanie – E o vento levou

– Admiro mulheres como você.


Devon Hill estava de volta e eu já
tinha me arrependido de ter flertado com
ele.
– Obrigada? – perguntei sarcástica.
– Sem julgamentos. Quero dizer, eu
trabalho com o cara.
Ele estava querendo sugerir alguma
coisa. Essa parte estava bem clara. Mas
o quê?
– Perdão?
– Eu ganho mais de trezentos mil por
ano, sabia? – Ele piscou um olho para
mim e beliscou minha cintura. Não
enfiei o punho no meio das suas fuças
porque imaginei que ele estivesse
temporariamente maluco para me tocar
com esse nível de liberdade.
– Não sei do que o senhor está
falando e, Hill… Não me toque sem
minha permissão. – Eu não ia falar de
novo. Na próxima vez ia receber meu
punho nas fuças, e deixei meu tom
afirmar isso bem claramente.
– É claro que não sabe – riu. – Você,
uma advogada ambiciosa que mora do
outro lado do país veio até aqui só para
ajudar o herdeiro Baxter com sua
mudança. É claro. Vocês devem ser
muito amigos. – Virou o que sobrava da
sua dose de uísque – Ou você está
apaixonada. É claro – riu. – Muito
conveniente.
Senti o gosto da bile na minha
garganta e queria que ele dissesse mais
alguma coisa inapropriada. Qualquer
coisa que justificasse o tapa que eu ia
dar em sua cara em um futuro muito
próximo.
– Você não me conhece, Hill. – Para
o inferno com a educação. Eu ia ser
grossa e ele ia ouvir. – Não defina uma
pessoa que você não conhece por
clichês. Pode ser perigoso.
– Você é uma mulher muito bonita. E,
não me leve a mal, eu entendo a
ambição. Aqui. – Ele me deu um cartão
e pegou mais um copo de uísque da
bandeja de um garçom. – Quando ele te
largar, e ele vai te largar, liga pra mim.
Podemos compartilhar ambições –
sorriu, colocando o copo na boca. –
Posso te ajudar com algumas coisas e
você, pode… me ajudar com outras.
Coloquei o cartão dentro do seu copo
e vi o papel se dissolver no líquido.
– Não recuse um homem só porque
ele não é o homem mais rico do mundo,
srta. Thoen. Amanhã, ele pode ser o
melhor que a senhorita pode conseguir.
– Ele soou irritado.
– Se você acha que eu preciso de um
homem para o que quer que seja,
claramente, não me conhece.
Ele me observou como se decidisse
se fazia mais algum comentário
agressivo ou se me beijava. Para mim
não importava, de um jeito ou de outro
ele ia levar um murro. Era só uma
questão de tempo.
– Não te dói? – perguntou. – Pessoas
como ele, que podem ter tudo
simplesmente pelo fato de terem
nascido?
– Você também não conhece Gregory,
Hill. Parece que tem o péssimo costume
de julgar as pessoas sem qualquer
conhecimento.
– O quê? Ele teve uma vida difícil?
Fala sério, Dominique? O que é o pior
que pode lhe ter acontecido? Sua Ferrari
nova veio na cor errada? E o que é o
pior que já aconteceu na minha vida? Na
sua? E na de milhões de pessoas como
eu e você? E ele… Ele só precisou
nascer. Não digo que odeio o homem,
quero dizer, não é culpa dele. Mas é
difícil não invejá-lo ou não ressentir a
injustiça da vida.
– Não existe vida fácil.
– Não… Mas existe vida mais difícil.
Sabe o quanto eu tive que batalhar pela
posição que tenho hoje nesse escritório?
Quanto tempo de trabalho escravo, horas
e horas de sono e de descanso perdidas.
Tanta coisa de que eu tive que abrir mão
só para conseguir galgar esse lugar, um
milímetro de cada vez. E ele? Ele já
tinha o emprego mesmo antes de vir
fazer a entrevista.
– Então você supõe me conhecer,
conhecer Holt e conhecer todos os
motivos dos seus chefes por trás da
contratação de um dos advogados. Você
é bem presunçoso, hein?
– Não, imagina. Você tem razão. É
super comum todo o conglomerado de
empresas Baxter mudar de escritório
jurídico do nada. E um mês depois, o
único herdeiro da família ser contratado
para uma posição que o resto de nós
teve que conquistar a ferro e fogo. Mas
você deve ter razão… – A ironia
despejava torrencialmente de sua boca.
– Foi só coincidência. Não foi indicação
de ninguém…
– Se os fatos aconteceram assim como
você está narrando, e eu não estou
dizendo que aconteceram, afinal não te
conheço, não tenho motivo algum para
acreditar que diria a verdade… Mas se
aconteceram desse jeito, sua lógica é
inegável. Só tem dois elementos que
escaparam da sua análise.
– Ah, é? Por favor, esclareça-me.
– Pessoas competentes e
incompetentes nascem em qualquer
lugar. Independentemente de classe,
condição socioeconômica, clima,
vegetação ou alinhamento das
constelações. Uma pessoa ser rica não
significa que ela obrigatoriamente não
mereça ter sucesso e, sinceramente, é
estúpido pensar assim. Não conheço
você, mas conheço Holt. Conheço seu
trabalho, sua evolução, seus métodos,
sua inteligência. E posso te garantir,
mesmo sem te conhecer, que ele vale
dez vezes mais do que você.
– Vale mesmo. Ele é um Baxter. Vale
umas mil vezes mais.
– Não seja engraçadinho, Hill. Não
lhe cai bem. Aliás, quase nada lhe cai
bem. – Apontei para gravata dourada,
que tinha sido uma péssima escolha. –
Mas isso é outro assunto. Estou falando
de sua integridade como homem e de sua
capacidade como advogado. Ele é, pelo
menos, dez vezes o homem que você é.
– Quem está sendo presunçoso,
agora? Você também não me conhece.
– Não. Mas eu sei que Holt não
flertaria com a sua acompanhante. Sei
que ele não busca desculpas para suas
conquistas e fracassos na sua origem ou
na dos outros. Sei que nesse momento,
ele está apreciando a exibição e
comemorando em vez de se dedicar a
joguetes. Podem ser poucas
informações, mas uma olhada no senhor
e eu tenho certeza de que, se me desse
tempo, descobriria muito mais defeitos
do que qualidades.
– Ele não precisa de ninguém para
enaltecer o ego, Dominique. Garanto que
o jovem Baxter já tem um ego bem
inflado por si só.
– Odeio pessoas com sua definição de
vida fácil ou vida difícil, sabia? Gente
como você usa isso como desculpa para
não trabalhar. “Ah, eu não posso
conseguir o que ele tem porque ele
nasceu com tudo, ele teve tudo entregue
de bandeja”. Se eu tivesse pensado
assim, nem sei onde estaria… Pessoas
com esse tipo de pensamento me dão
nojo. Então, se me dá licença. Não
quero mais desfrutar do desprazer de
sua companhia. Passar bem.
– Você disse que eram duas coisas. –
Sorri. – Você disse que dois elementos
tinham escapado da minha análise. Esse
foi um. Qual o outro?
– O outro é sobre a vida pessoal de
Holt e tem a ver com decisões que ele
tomou em relação à própria família.
Decisões que o senhor desconhece e,
portanto, não deveria julgar.
– Por favor, continue – sugeriu com
um gesto. – Adoraria ser educado nos
assuntos da família Baxter. Quais foram
essas decisões?
– Não é da sua conta – respondi como
se a mera pergunta fosse insana. – Esse
é o meu ponto, ou será que o senhor não
entendeu?
– Entendi. Entendi muito bem. É
melhor ser a puta de um homem rico do
que a companheira de um homem
mediano.
Fechei o punho e joguei o peso do
corpo inteiro contra seu rosto. Seis anos
de Muay Thai nas fuças do imbecil.
Ele caiu no chão e algumas pessoas se
aproximaram entre a curiosidade e a
preocupação. Deixei a cena para trás.
Não tinha dado três passos quando
esbarrei em Holt.
Ele me segurou pelos braços. Seus
olhos diziam milhares de coisas. Diziam
que ele tinha ouvido nossa conversa.
Diziam que ele estava preocupado com
o envolvimento de sua família em seu
novo emprego. Diziam que ele estava
grato por eu o ter defendido. E diziam
que ele queria me abraçar.
– Já podemos ir? – perguntei.
– Quando você quiser.

A viagem de volta para casa foi


silenciosa. Tenho certeza de que Holt
estava considerando zilhares de
possibilidades e achei melhor me
concentrar na direção e deixá-lo pensar
em silêncio. Eu, por outro lado, ainda
estava irritada com o seu
comportamento da noite anterior. Não
suportava quando uma pessoa
simplesmente me abandonava e, apesar
da minha pequena traição por ter ido
ver sua mãe sem comunicá-lo… Ah, por
favor… Eu só queria saber um pouco
mais sobre ele. Era realmente um crime
tão imperdoável?
Aquilo só podia terminar de uma ou
de outra maneira: ele ia ter que pedir
desculpas de um jeito que eu
acreditasse, eu ia persistir na teimosia
só por mais um pouco e depois iria
perdoá-lo, ou eu iria esquecer o que
tinha acontecido entre a gente, dizer que
tinha acabado de arrumar sua casa,
pegaria sua metade da senha e iria
embora.
Comecei a tirar os brincos já na sala
de estar. Estavam pesados e fazendo
minhas orelhas doerem.
– Obrigado – sussurrou. – Você não
precisava ter me defendido.
– Só quem pode te chamar de esnobe
filhinho de papai sou eu.
Ele sorriu discretamente. Eu falei
brincando, mas meu tom ainda era sério.
– Bem, eu agradeço. – ficou de pé no
meio da sala me observando com
firmeza.
Esperei por alguns segundos. Ele não
disse uma palavra.
– Boa noite, então – falei antes de
virar para subir a escadas.
– Desculpe.
– Han?
– Por ontem à noite. E por hoje de
manhã. Fui grosseiro, desculpe. É só
que… Não gosto de contato com a minha
família, e você ter ido até lá pelas
minhas costas, eu… Perdi o controle.
Desculpe. Você só queria algumas
respostas. Eu já tinha te dado algumas
informações soltas e devia ter lembrado
de que você não é o tipo de mulher que
fica parada, esperando alguma coisa
acontecer. Na verdade, quando paro
para pensar, não sei como não imaginei
que você acabaria fazendo exatamente
isso.
Coloquei a mão na testa.
– Já fui abandonada muitas vezes na
minha vida, Gregory – interrompi. Ele
ficou em silêncio, me observando como
se esperasse um veredicto. – Não gosto
da sensação, mas aprendi a me
acostumar. Mas quando eu vim até aqui
e tentei mudar algumas coisas na minha
vida por você. – Apontei em sua direção
irritada – E aí você cansa no primeiro
problema, vira as costas e vai embora…
Isso me irrita. Profundamente. Não é
atitude de um homem. Se você tem um
problema, você o resolve. Simples
assim.
– Eu sei. Me desculpe. Você está
completamente certa. Eu… Só fui pego
de surpresa e exagerei.
– Tudo bem. – Abanei uma mão
gentilmente na sua direção e suspirei
cansada. Já estava subindo as escadas
mais uma vez.
– Eu… – Sua voz grave chamou
minha atenção.
– Que foi?
– Posso dormir no quarto?
Tive vontade de rir. A casa era dele!
Como alguém podia imaginar que o
poço de gentileza que era aquele homem
poderia algum dia se aproveitar de
privilégios familiares para conseguir o
que quer que fosse?
– É a sua casa, Holt. Você dorme
onde quiser.
– Quero dormir com você, então. –
Sua voz era cuidadosa. Era quase como
se ele estivesse com medo de mim. Eu
ainda estava irritada e sabia que rir
naquele momento destruiria o controle
que eu tinha da situação.
– Isso não depende só de você – o
lembrei – A casa é sua e você escolhe
onde quer dormir. Mas eu decido o que
faço comigo. E eu vou dormir no quarto
de hóspedes hoje.

Fiquei andando de um lado para o


outro no meu quarto. Dominique estava
com raiva. Essa parte eu tinha
entendido.
Era engraçado porque eu não
conseguia parar de rir.
Estava louco por essa mulher. Louco
de tesão, de paixão, de amor. Cada dia
eu descobria uma loucura nova. Tinha
um medo insano do que ia acontecer, um
medo inexplicável de perder uma coisa
da qual eu mal tinha certeza se tinha. E
apesar de ela estar com raiva e de isso
ser um problema, eu não conseguia parar
de sorrir.
Deitei na cama.
Ela estava me defendendo.
Verdade seja dita, no começo ela
estava se defendendo. Hill achou que ela
precisava de um homem rico e eu me
lembrei da noite em que a conheci. Eu
também tinha cometido aquele erro uma
vez. Só uma. Dominique não precisa de
homem. Ela não precisa de ninguém. Era
a mulher mais forte, confiante e
autossuficiente que eu já tinha
conhecido.
E ela estava me defendendo.
Pensar nela era tão embriagante que
eu mal consegui me lembrar do fato de
que meu emprego poderia ter sido
conquistado por causa da minha família.
Mas me preocuparia com isso depois.
No momento, eu só conseguia pensar
em Dominique e no murro que ela tinha
dado em Hill.
Eu queria muito ceder e acreditar que
ela realmente gostava de mim. Só
brincar de imaginar já era tão gostoso.
Fechar os olhos e pensar que ela estava
no quarto do outro lado do corredor
pensando em mim.
Era possível.
Levantei da cama.
Certo.
Chega.

Ouvi algumas batidas na porta do


quarto. Achei que, a essa altura, Gregory
já estaria dormindo.
Abri a porta e dei de cara com seu
tórax nu. Ele podia ter vestido uma
camisa. Mas ainda bem que não tinha
feito isso.
– Desculpe – repetiu.
– Já entendi, Holt. E está desculpado.
– Não, não estou. Ou você estaria na
cama comigo.
– Não seja presunçoso, Holt!
– Não! Não! Não quis dizer nesse
sentido. – Levantou as mãos. – Quis
dizer fisicamente, deitada ao meu lado.
Dormindo, apenas. Se você quiser. Só
isso, prometo!
Ele era muito fofo quando ficava
constrangido.
Merda, Dom. Presta atenção! Ou ele
vai te dobrar só com esse jeito
irresistível.
– Não acho que consigo dormir sem
você hoje.
Consegue, sim. Claro que consegue.
Mas eu entendi o que ele estava dizendo.
Ele não queria dormir sem mim.
– Holt, olha… Acho que talvez seja
melhor… – Minha teimosia tinha
encontrado uma voz e estava recusando
seu convite sem minha autorização.
– Não, não é melhor. Dom, por favor,
me desculpa. Não quis ser grosseiro.
Eu queria resistir. Queria manter meu
orgulho intacto. Queria ter poder sobre a
situação.
Mas eu queria ele mais.
Seus olhos mornos imploravam mais
que suas palavras, e cada segundo era
uma luta para manter meus braços
abaixados e longe do seu pescoço.
Queria perdoá-lo, beijar sua boca e
lambê-lo inteiro.
Meu orgulho estava pequeno e
esquecido no fundo da minha mente e
percebi o quanto ele era insignificante
ali.
– Vamos acabar com isso? Não quero
brigar. Vem pra cama comigo? Por
favor? – Ele estendeu uma mão e eu
comecei a travar uma batalha épica
comigo mesma.
Expirei longamente, desistindo da
birra, e ele riu.
Coloquei minha mão na sua e deixei
ele me guiar.

– Acho que eu devia pedir desculpas


também – confessei.
Ele estava deitado com a cabeça na
minha barriga, sua testa tocava meus
seios e ele tinha a mão nas minhas
coxas.
– Acha é? – Ele levantou os olhos e
esperou que eu, de fato, pedisse
desculpas. Hmm… Não. Não ia
acontecer. Fiquei em silêncio e ele riu.
– Você não tem jeito!
Eu tinha os dedos em seus cabelos.
Sua respiração era profunda e tranquila,
e eu me senti em paz.
– O que você quer saber? – sussurrou
contra a minha pele.
– Como assim?
– Você foi até lá fazer perguntas à
minha mãe, não foi? Pergunte, Dom. O
que você queria saber.
– Não acho que precisamos falar
sobre isso agora.
– Quero te contar.
– Sua mãe me disse várias coisas já.
É verdade, não precisa.
– Ela te disse que só queria o melhor
para a família? Quando resolveu se
separar do meu pai?
– Não. Foi o oposto, na verdade. Ela
se sente muito culpada.
– Culpada? – Ele se levantou e deitou
ao meu lado. Me puxou para um abraço
e grudou o nariz no meu. – Acho que o
tempo naquele lugar fez bem para ela.
– Não fale assim. É estranho te ver
ser cruel.
– Você não entende…
– Então me explica. – Abracei Greg
pelos ombros e dei um beijo rápido em
seus lábios em súplica. – Me explica.
Eu vi o brilho dos seus olhos sumir.
Ia doer falar sobre isso, eu sabia. Mas
queria que ele conseguisse falar. E
queria que fosse comigo.
Alisei sua bochecha e ele sorriu como
se estivesse se decidindo.
– Amanda… Minha irmã era incrível
– riu. – Não é só uma daquelas coisas
que a gente fala sobre pessoas que já
morreram, sabe? – Ele conseguia falar
sobre sua morte com uma calma quase
resignada. Aceitava sua morte. Era todo
o resto que ele parecia não aceitar. –
Ela era realmente incrível.
Sorri perto de seus lábios e deixei
que ele continuasse.
– Dizem que irmãos gêmeos têm uma
ligação especial. Não sei se é verdade.
Eu e Amanda não podíamos ser mais
diferentes.
– Vocês eram gêmeos?
– Éramos. Mas Amanda era livre. Eu
sempre fui medroso. Vivia bem perto da
família, debaixo das asas da minha avó.
Queria fazer tudo certo e do jeito da
família. Já Amanda… Ela não estava
nem aí. Minha avó dizia que ela teve
uma adolescência rebelde, mas quando
eu paro para pensar… Foi uma
adolescência completamente normal,
sabe? Mas minha mãe tratava Mandy
como se ela fosse uma viciada em
drogas. Quando ela entrou na faculdade
de medicina, minha avó quase morreu de
alegria. Na sua cabeça, Mandy estava
crescendo e se preparando para assumir
parte dos negócios da família. Aí ela se
formou e entrou para os Médicos sem
Fronteiras e a minha avó quase teve um
infarto. Ela acabou se conformando e
pensou que era só mais uma fase de
Mandy. E era bom para a imagem da
família ter um membro fazendo
trabalhos sociais tão intensos. Ela não
pensou se era bom para as crianças
famintas e para as vítimas de cólera no
interior da África, sabe? Era bom para a
família e isso era tudo o que importava.
Bastava minha avó se reunir para
discutir esses assuntos e eu me sentia em
O poderoso chefão.
Ri com ele.
– E eu era grudado nela. Espero que
você nunca a conheça… – murmurou. –
Mas, se um dia acontecer, você vai
entender. Ela tem uma personalidade
dominante.
– Acho que posso me identificar com
isso – brinquei.
– Não sei, não. Acho que minha avó
consegue dominar até você.
Levantei uma sobrancelha para Greg e
ele me apertou.
– Vou voltar para o meu quarto, hein?
– ri.
– Não! Eu retiro o que disse! – Era
bom poder ouvi-lo rir enquanto
conversava sobre esses assuntos. Se ele
chorasse, como Audrey, eu tinha certeza
de que não ia suportar.
– Mandy voltou noiva da sua segunda
viagem para África. Minha avó não se
importava com quem ela casasse. Para
mim, ela estava pronta para fazer um
baile de pretendentes como em
Cinderela. Mas para Mandy… Acho
que desde que o rapaz tivesse todos os
dentes, minha avó não ia reclamar.
– Então foi tudo certo?
– Teria sido. Se Amanda não tivesse
ficado noiva de uma mulher.
Cobri a boca com a mão e comecei a
rir.
– Desculpa! Mas a história da sua
família parece uma novela mexicana.
– Nem me fale! Minha avó queria
mandar a Amanda para a reabilitação e
esquecer que ela existia. Mas Mandy…
Ela não era como eu. Ela não dava a
mínima para nada da família e só queria
ser feliz. Ela só tinha usado o dinheiro
dos Baxter para montar uma fundação
para crianças carentes. Mas assim que
ela se assumiu lésbica, minha avó tirou
todos os fundos e fechou as portas.
– Não acredito.
– Pois acredite. Começou a
barganhar. Mas Mandy não barganhava.
Ela estava acostumada a se cuidar e foi
exatamente isso que fez. Eu lembro que
fui até o seu apartamento algumas vezes.
Era um lugar minúsculo e sem nenhum
luxo, mas era tão… confortável. Era um
lar, sabe? Eu lembro que nos dias ruins,
quando eu tinha certeza de que eu não
era nada a não ser uma engrenagem na
máquina da família, quando eu perdia
completamente minha individualidade e
não podia fazer o que eu queria… Eu
pensava nela. Pensava que se algum dia
tudo ficasse ruim demais eu podia ir
viver como ela. Se ela conseguia ser tão
feliz, eu conseguiria também. Não é
drama. Minha irmã era minha heroína.
Meu pai tentou lhe dar dinheiro para a
Fundação, mas Amanda tinha resolvido
que ia fazer aquilo sozinha e, quando ela
resolvia uma coisa, ninguém conseguia
fazê-la mudar de ideia. O máximo que
ela permitiu que meu pai fizesse foi lhe
apresentar alguns investidores que
poderiam se interessar. Era isso que ela
estava fazendo… Eles tinham viajado
para uma cidade vizinha. Ele tinha
reuniões com alguns investidores em
potencial, e Amanda foi com ele para
conhecê-los. Eles deveriam dormir lá e
voltar no dia seguinte. Mas aí minha
mãe… – Ele estava tentando juntar
oxigênio suficiente para falar e eu
interrompê-lo.
– Sua mãe já me contou essa parte.
Ele moveu a cabeça, concordando.
– E foi isso. Meu pai e minha irmã
estavam mortos. Minha mãe dizia que
não era culpa dela e minha avó dizia que
tinha sido melhor assim. Você acredita?
“Foi melhor assim”. Tive vontade de
vomitar. Nunca mais olhei na cara dela
depois daquilo e… Saí de lá o mais
rápido que pude e nunca mais voltei.
– Você visitou sua mãe alguma vez?
– Algumas. Logo depois que ela
tentou se matar. Mas ela parecia alternar
entre perder a razão e se recusar a
admitir sua parcela de culpa.
– Você não pode culpá-la, Holt. Ela
também perdeu muita coisa. Também
estava sofrendo muito.
– Eu posso culpá-la, sim, Dom. E é
exatamente isso que eu faço. Não tire
isso de mim.
Às vezes, a gente precisa de alguém a
quem culpar. Independentemente de essa
pessoa ter culpa ou não.
– Eu sempre fui horrível e você deu
um jeito de me perdoar. Ou, pelo menos,
eu acho – sorri com delicadeza – Não
pode achar um jeito de fazer o mesmo
pela sua mãe?
– É diferente.
– Por quê?
– Porque você é uma pessoa boa que
vestiu uma casca bem grossa para evitar
que outras pessoas te machuquem.
Minha mãe machucou outras para se
proteger.
– Como você tem tanta certeza de que
eu sou uma pessoa boa?
Ele sorriu de um jeito suspeito.
– Eu já vi sua lista pro bono.
– Investigou minha vida, foi?
Engraçado, podia jurar que tinha te
ouvido dizer que isso era horrível e
imperdoável… – Ele enfiou os dedos na
minha cintura e estava fazendo
cosquinhas – e coisa que adultos não
fazem! – gritei, me contorcendo para
fugir dos seus dedos.
– Justo! – respondeu. – Mas foi
porque…
– Porque o quê?
Ele estava decidindo se me contava
ou não.
– Eu tinha audiência no Fórum um dia
e te vi chegando. Acenei para te
cumprimentar, mas você não me viu.
Desceu do carro da empresa e estava
subindo as escadarias. Aí você parou
e… Eu notei que você estava dando algo
para um rapaz. Percebi que minha visão
seletiva tinha feito com que eu ignorasse
os sem-teto que ficavam por ali às
vezes. Mas você não só não os tinha
ignorado como tinha levado uma
refeição para eles. Falou com um deles
como se o conhecesse há algum tempo.
O cumprimentou sem nenhuma frescura e
eu fiquei pensando que você não podia
ser uma pessoa horrível. Não de
verdade. Pessoas horríveis deixam de
apoiar uma fundação em prol de
crianças carentes para conseguir o que
querem. É isso o que pessoas horríveis
fazem. E você… sua lista pro bono era a
maior do escritório inteiro. Dom, de
todos os advogados de um dos maiores
escritórios de advocacia do país, você é
a que mais atende pessoas sem
condições financeiras voluntariamente…
A maior parte do pessoal do escritório
fazia aquilo só para cumprir meta.
Ignorava completamente os clientes
necessitados, fazia só porque tinha que
fazer. Quando eu vi sua lista pro bono…
Sua taxa de sucesso era igual à dos seus
casos normais. Você se empenhava da
mesma maneira tanto nos trabalhos
pagos como nos voluntários.
Fiquei em silêncio. Eu não era do tipo
que posta fotos em redes sociais e diz
“Estou me sentindo feia” só para
receber elogios. Não ligo se as pessoas
acham que algo que eu faço é certo ou
errado. Tomo minhas decisões e estou
sempre satisfeita com elas. Ouvir
alguém me elogiar por algo que eu tinha
feito sem qualquer intenção de ser
descoberta, me deixou embaraçada e
sem palavras.
– Você é incrível – sussurrou.
– Obrigada – agradeci porque não
sabia o que mais dizer.
– Thoen? – Holt se apoiou nos
cotovelos. – Você está com vergonha?
– Não!
– Está! Você está com vergonha!
– Cala a boca, Holt.
– Não achei que fosse viver para ver
isso acontecer! – Ele tinha os olhos
arregalados e um sorriso divertido –
Dominique Thoen está com vergonha!
Puxei-o para perto de minha boca e o
beijei. Ele parou e me apertou com mais
força.
– Cala a boca – mandei.
– Sim, senhora – riu, buscando minha
boca mais uma vez.
Colocou o corpo sobre o meu, ainda
apoiado em um dos cotovelos, sempre
me olhando, seu olhar silencioso e
urgente.
– Você deu um murro em Hill. –
Nossos narizes se encostaram em uma
posição que era cada vez mais familiar e
confortável.
– Ele me chamou de puta.
– Rá! Pobre coitado. – Curvou a boca
no sorriso mais delicioso que eu já tinha
visto – Se ele apenas soubesse…
– Ele mereceu.
– Sem dúvidas. Mas olha… Acho que
ele vai te processar. – o misto de
diversão e seriedade em seu rosto não
deixou claro se ele estava brincando.
– Pois que processe. O último cara
que me processou depois de levar um
murro acabou tendo que me pagar quinze
mil de danos morais.
Ele se afastou de mim com a boca
exageradamente aberta.
– Você não existe!
– As pessoas não deviam me
processar. Não é bom pra elas. – Fiz
beicinho.
– Eu bem sei! – Prendeu meu lábio
inferior nos dentes e o chupou. Arqueei
meu corpo só um pouco, mas foi
suficiente para seu pau começar a se
manifestar. Olhei para baixo,
provocando.
– Dom, não quero que você pense que
só quero sexo com você. Não é isso.
– Mas está com tesão? – ri.
– Estou com saudade – Confessou
com um olhar brincalhão. – Faz algum
sentido?
Fazia. Fazia perfeito sentido. Eu
também estava com saudade.
– É, mas você não está merecendo
nada – disse, fazendo birra.
– Verdade. Mas você merece.
Eu não tive certeza de que tinha
entendido o que ele quis dizer até ele
descer a mão pelo meu corpo, abrindo
minhas coxas. Escorregou para baixo e
puxou o curto short do pijama e a
calcinha para o lado.
– O que é essa novidade?
Senti seu polegar esfregando a região
do púbis onde antes estavam meus
pelos.
– Eu gosto de inovar. Acostume-se.
– Já me acostumei. – Ele se afastou
para observar minha nova nudez. Seu
toque passeava por cada centímetro das
minhas partes íntimas. Coloquei a
cabeça para trás e fechei os olhos. Podia
sentir seu olhar, seu desejo, sua carícia
proibida e deliciosa. Desceu um dedo
para o meu clitóris e mordeu meu
mamilo rígido. Minha umidez estava
preparando meu corpo para recebê-lo.
Seus lábios quentes trilharam
vagarosamente um caminho de beijos
desde a base do meu seio, passando
pelas minhas costelas, por cima da
barriga até o umbigo, e continuamente
descendo.
Gregory me lambeu, bem devagar.
Não estava tentando me excitar –
embora estivesse conseguindo sem
problemas. – Era como se ele quisesse
me saborear.
Lambeu meu líquido mais algumas
vezes antes de começar a chupar. Gemi
seu nome e senti ele encaixando a boca
inteira na minha vagina. Vai, lindo, me
chupa, vai. Tinha minhas coxas apoiadas
sobre seus ombros, e ele esfregava os
polegares contra a curva da minha bunda
sem nunca tirar a boca de mim.
Pressionou os lábios gentilmente
contra meu púbis recém-depilado.
– Dom, eu sei que você sabe que é
gostosa. Mas puta merda… – Ele me
lambeu de novo – Você é muito gostosa.
Usou os dentes para brincar com meu
clitóris, e eu ouvi meus gemidos ficando
mais intensos.
Abriu espaço para sua língua com os
dedos e começou a comer minha boceta
e chupar minha umidez como se fosse o
único alimento que o satisfazia na Terra.
Meu corpo queria alívio, mas o prazer
estava só começando e crescia de um
jeito arrebatador. Movi o quadril contra
sua boca querendo aumentar o estímulo.
Coloquei minhas mãos sobre os seios
e prendi cada mamilo com um beliscão.
Holt soltou a boca de mim e puxou
minhas mãos para os lados.
– Deixa que eu faço isso.
Sua língua voltou para o meio das
minhas pernas e suas mãos estavam
apertando, espremendo, alisando e
beliscando cada nuance dos meus seios.
– Holt… – Eu não conseguia parar de
gemer. Coloquei minhas mãos sobre as
suas enquanto ele continuava a
massagear meus seios com um apetite
voraz.
Gregory enfiou a língua em mim e
tirou uma de suas mãos dos meus seios
para dar atenção ao meu clitóris. Sentia
sua língua fazendo movimentos
acrobáticos; era como se ele estivesse
procurando alguma coisa…
Meu corpo inteiro arqueou e eu
percebi que ele tinha encontrado. O
famoso ponto G é uma área pequena,
delicada e extremamente sensível no
osso púbico, na parte superior interna da
parede vaginal. É, provavelmente, a
zona erógena mais poderosa do corpo
feminino. E Holt estava fazendo a festa
bem em cima dele. Com a língua.
– Caralho, Holt! – Se antes eu estava
gemendo o nome dele, agora eu estava
gritando. Urrava de desejo e de tesão
com as unhas enfiadas no colchão. Um
calor tomou conta do meu corpo,
começando pela virilha, e eu estava
ofegando desesperadamente. O suor
escorria pelos meus peitos enquanto
Holt estimulava meu clitóris e um de
meus mamilos. Sua língua continuava
enfiada em mim, e ele não parecia ter
qualquer intenção de sair dali tão cedo.
Rebolava contra sua boca e deixava
ele me foder com a língua. Sentia sua
respiração quente contra minha pele
sensível e depilada.
E o lugar dentro de mim que sua
língua atingia e acariciava lançava
espasmos de arrepio, fazendo meus
músculos do corpo inteiro contraírem.
Eu queria gritar obscenidades
enquanto meu corpo acumulava mais e
mais tensão. Mas a única palavra que
ainda parecia existir no meu vocabulário
era o nome dele. E, na falta do que
gritar, continuei gritando isso.
Ele tirou a língua e me chupou uma
última vez. Com tanta força que parecia
querer me sugar inteira pela boceta.
Gritei sem controle enquanto meu
corpo inteiro tremia e caía sobre o
colchão sem qualquer reação. Holt
beijou meu clitóris e voltou pela mesma
trilha de beijos pela minha barriga.
– Estou perdoado?
– Hmm…
Eu queria dizer alguma coisa, mas não
tinha forças. Meus dedos dos pés e das
mãos formigavam, e eu precisei de
alguns segundos para recuperar a
sensibilidade deles.
Holt ficou deitado ao meu lado
fazendo carícias no meu corpo nu,
exposto e completamente vulnerável. Eu
respirava profundamente, cansada, e me
concentrava em cada centímetro de pele
sob seu toque. Desenhou padrões em
meus seios, na linha das minhas costelas
e até ao redor do meu umbigo. Acariciou
meu queixo e toda a linha da minha
mandíbula. Aqui e ali, me dava beijos.
Eu podia sentir seu pau latejando
contra mim. Notei que tinha recuperado
o controle dos meus movimentos e
escorreguei uma mão por dentro da sua
bermuda. Sua rigidez inteira pulsou na
minha mão. Assim que o toquei, ele
endureceu ainda mais.
– Minha vez – sorri e desci gulosa
para enfiá-lo todinho na minha boca.

O suor tinha grudado nas nossas peles


e secado. Eu queria levantar para tomar
um banho, mas não tinha forças ou
coragem. Gozar era, obviamente,
delicioso. Mas gozar na boca de
Dominique… Puta que pariu…
– Aonde você vai? – perguntei, ainda
deitado de bruços, quando ela se
levantou.
– Banho – explicou – Odeio dormir
suada.
– Eu queria ter coragem para levantar.
– Se você não tomar banho nem pense
em tocar em mim com essas mãos
suadas quando eu voltar limpa. – Ela
deu um tapa estalado na minha bunda e
eu me levantei.
Não tocar em Dominique não era uma
opção. Não mais.

Passei uma toalha nos meus cabelos


molhados e vi ela se enfiar em uma de
minhas camisas e deitar na cama.
– Limpo! – Larguei a toalha em cima
de uma cadeira.
Essa coisa de tomar banho com Dom
estava me deixando mal-acostumado.
Acho que não saberia mais me ensaboar
direito sem ela.
Deitei ao seu lado e a puxei para os
meus braços.
– Não. Você tem o lado de lá inteiro
para você – reclamou.
– Você é tão romântica, Dom.
– Não cutuque uma mulher cansada,
Greg.
Eu ri e apaguei as luzes.
Podia ouvi-la respirando no escuro.
Queria me aproximar o suficiente para
sentir seu hálito contra minha pele.
Queria passar a noite inteira beijando
aquela boca.
– Dom? Ainda está acordada?
– Estou. O que foi? – Ela se virou de
lado.
– Acho que estou apaixonado por
você.
– Acha é?
A envolvi com meus braços e ri
quando ela reclamou.
– Acho que tenho certeza,
resmungona.
– Ou você acha ou tem certeza,
Gregory. Não pode ser os dois.
Beijei sua boca bem devagar. Era tão
gostoso dizer aquilo. Colocar as
palavras para fora e o resto que se dane.
– Tenho certeza – sussurrei – Estou
bem apaixonado por você, Dom.
Vai… diz o que você acha.
– Isso pode ser um problema. – Ela
estava séria e eu senti meu coração
doer. – Eu moro do outro lado do país e
só vim até aqui porque você me
chantageou. – Ela tinha as mãos no meu
peito e espremia suas unhas contra
minha pele, como se sentisse o mesmo
aperto no coração que eu.
Chega disso.
– Linda.
– Han? – Ela me olhou sem
compreender.
– É a minha metade da senha. Linda.
Não conseguia pensar em nada, aí olhei
para você e digitei a primeira coisa que
me veio à cabeça – sorri. Ela mordeu o
lábio e colocou a testa contra a minha.
– Está me dando a senha para que eu
vá embora?
– Estou te dando a senha para que
você fique porque quer. Não porque
precisa. – Enfiei a mão nos seus cabelos
e a beijei mais uma vez – Eu nunca ia
sair por aí espalhando aquele vídeo,
Dom.
– Eu sei. Quer dizer… A não ser que
eu matasse Max – riu.
– É! – Arregalei os olhos – Nesse
caso, era Youtube para você.
– Você assistiu?
– Não – confessei – Mas eu quis.
Muito.
– Pode ver se quiser. – Ela tinha um
sorriso safado e eu quis meter meu pau
naquela boca de novo.
– Assiste comigo?
– Uma única vez e depois a gente
apaga.
– Combinado. – Beijei sua boca outra
vez. Eu não cansava de fazer aquilo.
Ela manteve as mãos no meu tórax e
ficou encarando as próprias unhas. Ela
estava pensando no mesmo que eu.
Estava pensando no que fazer depois
que o vídeo fosse apagado. Quando ela
não tivesse mais motivo para ficar ali.
– Não vai embora.
– Holt, não é assim que a vida
funciona, e você sabe.
– Você pode conseguir um emprego
aqui se quiser, e você sabe.
– Está pedindo a uma mulher com
quem você está dormindo há pouco
tempo para mudar a vida inteira por
você? Isso não se faz, Gregory.
– Eu posso voltar.
Era verdade.
– Não estou te pedindo para fazer
isso. – Ela pareceu assustada.
– Mas eu voltaria mesmo assim. Dom,
se foi por causa da minha avó que eu
consegui esse emprego… Eu não quero.
Não quero de jeito nenhum.
– Você queria tanto trabalhar para
esse escritório…
– Se foi por causa dela, vou sempre
depender da sua vontade. Se eu fizer
qualquer coisa que ela não queira, serei
demitido. Não quero isso. Não quero
isso para minha vida nunca mais. Mas,
de qualquer forma, se eu voltasse, Dom,
seria por você.
– Não posso te pedir para fazer isso.
– Ouvia o nervosismo em seu tom.
– Você está com medo de se
comprometer, de se abrir para alguém e
de ficar vulnerável. Eu também estou.
Eu sei faz pouco tempo.
– Eu sei!
– Mas todo relacionamento começa
em algum lugar. Não estou te pedindo
em casamento. Ainda não – sorri. – Mas
eu queria… queria tentar.
– Greg…
– Diz para mim que você também
quer tentar. E a gente tenta.
– Não quero que você mude sua vida
por mim. E não sei se tenho coragem de
mudar minha vida por você, Holt. Não é
que eu não goste de você, eu gosto. De
verdade! Muito! Mas não sei se tenho
coragem.
– Eu tenho coragem por nós dois. Mas
você só precisa deixar que eu te ajude.
Dom, não precisa decidir nada agora.
Você ainda tem o resto do mês de férias,
não tem? Só o que eu estou te pedindo é
para ficar. Não apague o vídeo e vá
embora. Fica aqui comigo. Teremos um
encontro decente. Jantar, cinema. – Ela
estava rindo – É sério! – Belisquei sua
cintura – E aí a gente vê. Hein? O que
me diz?
Ela estava me olhando e mordendo os
lábios. Estava com medo. Ela tinha
lutado muito mais do que eu para chegar
onde estava. E arriscar mudar de vida
por algo que poderia não durar dois
meses… Era um risco enorme e eu
entendia. Mas eu queria que ela
entendesse que eu nunca a abandonaria.
Inferno… Se ela se mudasse para cá e
não desse certo, se ela não conseguisse
um emprego… Eu vendia minha alma de
volta para a minha avó e conseguia uma
posição espetacular pelo resto de sua
vida para ela.
Não tinha como ter certeza se aquilo
ia durar para sempre. Mas eu queria
muito que durasse e estava disposto a
fazer de tudo para isso. Se ela apenas
estivesse disposta a fazer o mesmo…
– Fico até o fim das minhas férias –
sussurrou. – E aí gente vê.
Ela tinha um sorriso contido que eu
achei deslumbrante.
Dom também queria tentar.
Coloquei minha boca sorridente
contra a sua e a beijei.
Eu tinha mentido. Não estava
apaixonado por ela.
Eu a amava.
E eu podia estar errado, mas algo me
dizia que ela me amava também.
Capítulo 17
“Não sou gentil. Estou só te
provocando.”

Rhett – E o vento levou

Espremi meu nariz contra o dele e


desci os nós dos dedos pelo seu
pescoço. Sua respiração era quente e
tranquila. Eu não conseguia tirar o
sorriso do meu rosto, a compreensão do
que ele tinha dito na noite anterior
estava me atingindo em ondas e, naquele
momento, quando eu finalmente tinha
entendido e aceitado que aquilo não era
um sonho, tinha uma quantidade enorme
de felicidade transbordando do meu
corpo.
Por que eu nunca tinha tentado fazer
aquilo antes? Se apaixonar era
indescritivelmente bom.
Holt abriu os olhos e meu sorriso se
alargou contra sua boca, que
rapidamente se abriu em um sorriso
igualável ao meu, tanto em tamanho
quanto em intensidade.
– Isso é bom – sussurrou e me
apertou. – Acho que não me lembro de
ter acordado sorrindo alguma outra vez
na vida.
Meus lábios se abriram e eu os fechei
forçadamente assim que percebi quais
eram as palavras que iam escapar.
Eu te amo.
Era isso o que eu queria dizer.
Merda.
Acordar com toda aquela alegria,
todo aquele carinho… Eu amava a
porcaria daquele homem e meus lábios
mal-educados iam informá-lo disso sem
consultar meu cérebro primeiro.
Duas semanas, Dom.
Você não pode amar alguém em duas
semanas.
Verdade. Não podia.
Estava loucamente apaixonada e
querendo amá-lo desesperadamente.
Talvez um dia… Se aquilo desse certo.
Mas não vai dar e você sabe.
Sabe do que mais? Estava começando
a ficar com raiva do meu cérebro.
É… Provavelmente nada daquilo
daria certo. Mas aquele dia era um
feriado. Eu tinha Greg só pra mim. Ele
tinha pedido para que eu ficasse. Disse
que estava apaixonado e que queria que
eu ficasse.
Ia ser um dia bom.
Joguei o cobertor para longe e tentei
levantar para ir ao banheiro apenas para
sentir os braços fortes de Greg me
jogando na cama de novo.
– Você não vai levantar.
– E quem disse que você manda em
mim?
– Mulher! – Ele inflou o peito e fingiu
uma voz autoritária. Eu comecei a rir. –
Não me faça ter que repetir.
Enfiou a cabeça entre os meus seios,
fechou os olhos e me prendeu na cama
com seu corpo.
– Acho que vou passar a dormir aqui.
– Você é muito pesado! – reclamei. –
Eu ia acordar toda dolorida.
– Você não reclama do meu peso
quando eu estou te fodendo. – Sua mão
escorregou pelo meu abdômen e
começou a brincar com meu clitóris. –
Ou de ficar toda dolorida.
– Prioridades, meu bem!
– Rá! – Seu hálito risonho atingiu
meus seios e meus mamilos se
endureceram em antecipação ao toque.
Sua mão continuou brincando com
meu clitóris. Estava ficando molhada
enquanto Holt continuava com sua lenta
e preguiçosa provocação. Puxei sua mão
livre e a coloquei sobre meu seio.
– Está com fogo, é?
– Não gosto de ficar com os mamilos
duros para nada.
– Ah, não seja por isso. – Ele se
moveu e enfiou um deles na boca – Eu
resolvo – sussurrou, entre beijos. – Sabe
o que eu adoro? – Continuou
provocando meu mamilo com os dentes
– Como você fica molhada rápido.
– Está me chamando de fácil, Holt?
– Fácil? você? – Ele estava
sufocando o riso com o meu peito
enfiado na boca.
– Tá, tá. – Dei um tapa no topo da sua
cabeça.
– Estou dizendo que você é
determinada. Tão determinada que até
seu corpo é decidido. – Trouxe o rosto
até o meu – Ele decide “quero transar
agora” e aí fica molhado de uma vez.
Sem perder tempo.
– Odeio perder tempo.
Ele sorriu e desceu até meus seios
mais uma vez.
– Levanta! – Empurrei ele para longe.
– Ahh… – Ele rolou para o lado,
contrariado.
– Preciso ir ao banheiro. – Andei
apressada e fechei a porta.
– Se você for se masturbar aí dentro
sem mim, vou ficar chateado. – Sua voz
grave ecoou através da porta e um calor
se espalhou pelas minhas entranhas.
Escovei os dentes com uma velocidade
furiosa, louca para voltar para aquela
cama.
Abri a porta e ele já estava
esperando. Deu um tapa na minha bunda
quando eu passei e também foi usar o
banheiro. Sentei na cama e esperei,
penteando meus cabelos.
O celular dele estava sobre a cômoda.
Olhei com o canto do olho para a porta
do banheiro fechada, ouvi o barulho da
torneira e espremi os lábios, sapeca.
Puxei o celular e estava tentando uma
sexta combinação de senha.
– 3, 9, 7, 2.
Levantei o rosto, sobressaltada.
– Minha senha, sua curiosa.
– Ah!
Sorri, culpada, e ele repetiu, sentando
ao meu lado.
– A gente vai fazer o que eu acho que
a gente vai fazer?
Estalei um beijo na sua boca.
Greg ficou em silêncio absoluto
enquanto eu mexia no celular
procurando o vídeo. Acho que ele teve
medo que, se dissesse algo errado, eu
desistiria e apagaria tudo sem mostrar
para ele.
Ainda não conseguia acreditar que ele
não tinha visto. Mas pelo jeito como
suspirou excitado quando eu encontrei o
que procurava, acho que poderia muito
bem ser a primeira vez em que ele iria
ver a coisa toda do início ao fim.
Girei o celular na mão.
– Não tenho certeza se vou querer
assistir a isso – exclamei no meu tom
sonso mais falso.
Gregory me puxou para o meio de
suas pernas e eu me sentei com as costas
apoiadas em seu tórax.
– Thoen, de um jeito ou de outro, eu
vou te ver nua e se masturbando nos
próximos segundos.
– Prefere ao vivo ou no vídeo?
O silêncio que ele fez, gritou mais
alto do que seus pulmões teriam
conseguido. Ele preferia ver ao vivo,
mas aquele vídeo o estava atormentando
há algum tempo. Já devia ser questão de
honra.
– Alguma chance de eu ter os dois?
Coloquei minha mão entre nós e
apalpei seu pau. Eu o senti crescendo
em minha mão. Deitei a cabeça em meu
ombro e Holt aproveitou o caminho
livre para beijar meu pescoço. Movi a
mão da base do seu pau até a cabecinha
e depois o caminho de volta. Bem
devagar.
Ele gemeu com o nariz enfiado na
curva do meu ombro e agarrou meus
seios. Eu apertei o play.
A imagem tremida mostrava os
arredores de sua casa. E não é que ele
estava falando a verdade? Realmente,
estava só filmando a própria casa. O
microfone do celular era um espetáculo,
e eu ouvi meu gemido no mesmo
momento em que a câmera fez uma
curva.
Dentes agarraram o lóbulo da minha
orelha com força e eu percebi que
estava masturbando Holt com muita
intensidade. Diminui a velocidade, ou
ele gozaria no meio da apresentação.
E lá estava eu.
As pernas abertas à luz da lua, o
corpo arqueado contra a
espreguiçadeira, arfando de desejo e
movendo o vibrador ao redor do meu
clitóris com uma velocidade que
aumentava progressivamente. Meus
gemidos saíram pelo som do celular,
cada vez mais intensos.
– Eu adoro essa porra desse teu
gemido – Holt sussurrava ao meu
ouvido, e eu podia ouvir a luxúria
incontrolável em cada sílaba. – Dá
vontade de colocar como toque no meu
celular. Ou meu despertador. Eu só ia
acordar duro.
Passei as unhas no seu pau com força
e ele reclamou, excitado, antes de enfiar
minha orelha na boca de novo.
Mantive meus olhos na tela. Havia
algo estranhamente gostoso em me
assistir naquela situação. Algo novo e
inesperadamente sensual. Modéstia à
parte, eu estava muito gostosa. E o pau
de Holt furando minhas costas com gosto
deixava claro que ele concordava.
– O que você pensou quando viu isso?
– perguntei, fogosa.
– Na hora? Que eu queria arrombar
sua casa depois que você dormisse para
achar esse vibrador molhado e enfiá-lo
na boca. – Holt largou meus peitos e
desceu com as mãos sincronizadas
apertando meu abdômen até chegar a
minha vagina. Repousou as duas mãos
ali, entre as minhas coxas, e ficou
sentindo meu calor e umidez. – Queria
lamber aquela porcaria todinha só pra
sentir esse teu gostinho doce.
Joguei um braço para trás, ao redor
do seu pescoço, e enfiei a mão no seu
cabelo.
– Puta merda – gemeu no meu ouvido
– Olha isso.
Na tela do celular, eu tinha enfiado o
vibrador até o talo e conseguia ouvir o
familiar som da sua vibração na
intensidade máxima.
Tirei o vibrador e o enfiei de novo
em uma dança rítmica e contínua. Na
imagem, eu tinha os dedos enfiados na
boca e não parava de gemer.
– Por que você faz isso? Por que enfia
esses dedos na boca? – Ele parecia
querer chorar – Fica impossível segurar
o gozo. Toda vez que você faz essa
merda dá vontade de te foder até morrer.
Tirei a mão dos seus cabelos e levei
até os seus lábios. Holt entendeu
exatamente o que eu queria e começou a
enfiar meus dedos na boca. Continuei a
masturbá-lo suavemente.
O áudio da gravação saiu claro e forte
quando o meu eu da filmagem gemeu.
– Holt… Vai…
Gregory parou o que estava fazendo e
se lançou em direção ao celular. Eu
tentei tirá-lo do seu alcance, mas não fui
rápida o suficiente. Ele pausou o vídeo e
me encarou com o queixo no chão e o
pau mais duro que aço.
– Você… Estava pensando em mim?
Não havia como negar.
Não quando havia uma gravação de
mim com um vibrador enfiado na boceta
e gemendo a porra do nome dele.
O único jeito de sair por cima era
deixar ele ainda mais duro:
– E não foi a primeira vez – gemi,
plantando mais um beijo em seus lábios
entreabertos. – Tenho um vibrador lá em
casa que praticamente tem o seu nome
escrito.
Sua expressão fazia parecer que ele
estava lutando para não fechar os olhos
e gozar ali mesmo.
– Eu preciso ouvir isso de novo. –
Sua voz saiu fraca enquanto ele
retrocedia o vídeo em alguns segundos.
E lá estava eu, gemendo o nome dele.
Ele voltou mais uma vez e mordeu o
lábio. Toquei seu pau com a mão e ele
me segurou.
– Agora não, Dom. Não me toca
agora, se não eu gozo.
Finalmente, Gregory decidiu que já
tinha ouvido meu gemido secreto o
máximo de vezes que conseguia sem
gozar nos lençóis e deixou o vídeo
continuar.
Eu tinha aumentado a velocidade dos
movimentos do meu punho, enfiando o
vibrador em mim, esfregando no meu
clitóris. Meus gemidos cada vez mais
altos e cada vez mais desesperados.
– Sua vez de me dizer no que estava
pensando. – A voz de Holt no meu
ouvido não era um pedido gentil, mas
um comando rosnado. – Diz para mim no
que você estava pensando enquanto se
fodia com aquele vibrador.
– Não é óbvio?
– Fala!
– Estava pensando em você no meio
das minhas pernas. – Virei o rosto para
sussurrar contra sua boca – Tinha
jogado aquele champanhe barato na sua
cara e mandado você tirar a roupa. Eu
montava em você, selvagem, e te ouvia
urrando enquanto me fodia.
Um grito alto e notei que meu eu
digital tinha gozado. O vídeo acabava
quando eu levantava correndo. Holt
tinha jogado o celular no chão.
– Abre as pernas.
Levantei uma sobrancelha pra ele.
– Peça com educação.
– Puta merda, Dominique. Abre essa
porra dessas pernas que eu não aguento
mais. – Tinha uma urgência insana na
voz quando puxou um dos meus
calcanhares e me deixou arreganhada e
atravessada na cama. Sua fome me fez
ficar umas oito vezes mais molhada.
Holt meteu fundo em mim com uma
violência deliciosa. Não começou
devagar ou gentil. Ele já estava pronto
para gozar há um bom tempo e quando
me penetrou, foi com um desespero
incontrolável.
Eu estava excitada, mas daquele jeito
eu tinha certeza de que ele ia gozar
primeiro. Lambi dois dedos antes de
enfiar a mão entre nós e comecei a
esfregar meu clitóris. Esse simples gesto
fez Holt começar a urrar obscenidades,
e só se calou quando enfiou meu peito na
boca e o sugou enfurecido.
Minhas pernas estavam tremendo em
contrações involuntárias e eu comecei a
sentir espasmos se espalhando pelo meu
corpo a partir da virilha. Holt soltou
meu seio, deu um tapa na minha mão e
começou ele mesmo a me estimular.
Arqueei o corpo me esfregando nele,
joguei a cabeça para trás e senti meu
corpo se contorcer como se estivesse
convulsionando.
O orgasmo começou poderoso,
mandando destruidores rastros de
eletricidade a partir da minha virilha
para o meu umbigo e dali para todo o
corpo. Puxei o ar com força tentando
recuperar o fôlego e sequer prestei
atenção no ápice de Holt. Mas pelo jeito
como ele caiu pesado em cima de mim,
imagino que também tenha terminado
bem satisfeito.

– Acho melhor a gente ver um filme –


reclamou.
– Frouxo! – ri.
– Você podia ser ruim em alguma
coisa, sabia?
– Vai! Vamos de novo!
– Não quero.
– Vai!
– Não quero e não vou.
– Deixa de ser frouxo, Holt.
– Chega dessa humilhação.
– Vai! Se você ganhar de mim na
próxima eu te chupo como você nunca
foi chupado na vida – prometi
sorridente.
Greg estreitou os olhos analisando
minha proposta.
– Mas e se eu perder? O que
provavelmente vai acontecer…
– Se você perder… – Estava
pensando em algo que fosse realmente
horrível. Eu podia pedir pra ele me
chupar, mas pelo tesão que eu o sentia
exalando de todos os seus poros, ele já
ia fazer isso de todo jeito. – Se você
perder, você atravessa a rua, bate na
porta da terceira casa e quando a dona te
receber você diz: “Madeleine, você é a
mulher mais linda que eu já vi na vida.”
– Estou imaginando que isso seja uma
coisa muito ruim para se fazer, por
algum motivo.
– É uma coisa horrível – ri contra seu
ombro.
Ele estava sentado no sofá com as
pernas abertas e eu tinha me encaixado
no espaço entre elas. Para segurar o
controle do videogame, seus braços
tinham que ficar ao meu redor. Eu podia
ficar ali jogando sentada naquele colo
quente e macio pelo resto da minha vida.
Acho que nem sentiria falta do trabalho.
Holt beijou minha bochecha e depois
meu queixo. Aproveitei sua distração
para roubar seu controle e começar mais
uma partida.
Eu não tinha muito costume de jogar
videogame. Na verdade, não tinha
costume nenhum. Mas uma vez que você
aprendia qual botão fazia o quê, o resto
era só uma questão de bom senso. E
para ganhar de Holt, o truque era
esfregar minha bunda contra sua virilha
sempre que eu precisava que ele se
distraísse. Aprendi isso bem rápido e
tenho certeza de que ele notou o que eu
estava fazendo na mesma velocidade.
Mas que homem iria reclamar de uma
coisa dessas? Então, ele ficou quieto, eu
continuei ganhando, e nós dois ficamos
felizes.
– Eu estou te deixando ganhar, sabia?
– Sabia. – Dei um beijo na mão que
segurava o controle.
Escolhi Blanka mais uma vez. De
todas as lutas até agora, percebi que
aquele adorável monstro verde era a
melhor opção para a minha recém-
adquirida habilidade de apertar só dois
botões bem rapidamente.
Minha barra de energia estava quase
cheia e a de Holt pela metade quando
ele largou uma das mãos do controle e a
enfiou por dentro do meu vestido, puxou
minha calcinha para o lado e meteu dois
dedos dentro de mim.
– Ahh… – arfei, surpresa. Ele apertou
os botões com muito mais familiaridade
do que eu e destruiu meu pobre e
indefeso Blanka.
– Eu também sei brincar, meu bem. –
Ele mordeu a lateral do meu maxilar e
depois me jogou deitada no sofá.
Levantou meu vestido até a cintura e me
beijou por cima da calcinha. Senti o
calor do seu corpo entre minhas pernas.
Eu já estava molhada de novo.
“Um corpo decidido”, como ele tinha
dito.
Senti seus dedos curiosos na borda da
minha calcinha. Dois segundos de
hesitação e ele empurrou o tecido para o
lado e me lambeu, antes de voltar a se
sentar.
– Não me canso desse teu gosto.
– Ótimo! Então, volte e termine.
– Não, não, não. Eu ganhei e você
prometeu.
– Tudo bem. Você ganhou. Estou te
devendo.
Ele bateu uma mão na outra e as
esfregou, debochando.
– Mas e então? Fora me chupar, o que
mais quer fazer hoje?
– Não sei. Eu me lembro vagamente
de uma promessa sobre um filme e um
jantar.
– Justo! O que você quer assistir?
– Não sei. Que tipo de filme você
gosta?
– Ahm… – coçou a cabeça. – Você
pode achar estranho…
– Você já se divertiu bastante às
minhas custas por eu gostar de Jornada
nas Estrelas. Vai, Holt. Desembucha!
– Eu gosto de filmes de horror, mas
daqueles antigões, sabe? Preto e branco
até.
Fiquei o encarando e forçando meus
olhos a piscarem.
– Eu adoro esse tipo de filme
também. – recitei, descrente.
– Mentira!
– Não, não vale! Você tem que me
contar alguma coisa bizarra que você
goste e eu não. Filme de horror antigo
não vale.
– Dom, acho que você não me
entendeu… – Ele parecia levemente
constrangido. – Eu gosto dos antigos
mesmo. Dos esquisitos que não fazem
sentido nenhum. Eu me divirto, sabe?
Acho eles hilários.
Mas eu tinha entendido perfeitamente.
– Você já assistiu ao filme Veio do
inferno? – perguntei, e vi seu queixo
cair exageradamente.
– Eu nunca conheci, na minha vida
toda, alguém que também tivesse visto
esse filme! – Ele se virou para o lado
para tentar ficar de frente para mim.
– Imaginei que tivesse assistido a
esse… Quero dizer, nada é mais antigo
e sem sentido do que um homem que
morre e volta do mundo dos mortos
como uma árvore assassina.
– Por causa dos espíritos dos povos
da tribo! – adicionou, completando o
roteiro do filme.
– E porque a ilha era radioativa! –
lembrei.
– E ele veio do inferno!
Eu estava rindo animada e ele sorria
de volta em uma empolgação única.
– E o jeito como ele mata as vítimas!
– Holt continuou, rindo – As joga em
uma poça de areia movediça…
– E as atuações daquele filme são um
circo dos horrores. Quero dizer, a
árvore assassina joga as pessoas na
borda da poça e, em vez de elas se
agarrarem em qualquer coisa para se
salvar…
– Elas nadam para mais para longe! –
ele concluiu minha frase. – É absurdo.
Ri aquele filme inteiro.
– É um dos melhores. Sem dúvidas.
– Certo! – Ele respirou fundo e me
observou com cuidado – Do que mais
você gosta?
– Achei que já tínhamos escolhido a
categoria do filme – brinquei.
– Eu sei, eu sei… É só que… Queria
saber do que mais você gosta. – Virei de
lado, ainda sentada no seu colo, e apoiei
meu braço em seu ombro. – Vai! Me
conta. – Ele sorriu convidativo e eu
percebi que, depois que meu pai tinha
falecido, não havia qualquer pessoa no
mundo que me conhecesse. Alisei seu
cabelo e sorri. Eu queria contar tudo.
– Gosto de comida italiana. Lírios.
Não sou muito fã de chocolate. Detesto
sorvete. Sou louca por romances
distópicos. Tanto esses juvenis atuais
como os clássicos: Ardil 22, 1984, A
Revolta de Atlas… Amélie Nothomb é
minha autora favorita, mas também gosto
muito de Dostoiévski. Sei que soa
pseudocult dizer que gosto de literatura
russa, mas depois que li O diabo e
outras histórias, do Tolstói, alguma
coisa mudou dentro de mim e eu nunca
mais consegui parar de ler os
camaradas. Meu diretor favorito é o
Woody Allen, tem algo real nas histórias
dele que sempre me toca profundamente.
E seu filme Match Point faz referências
óbvias a Dostoéivski e tem cenas
completamente inspiradas em Crime e
castigo, que é o meu livro favorito.
Todo mundo diz que o melhor livro dele
é Irmãos Karamázov… Eu mostro a
língua para essas pessoas. Crime e
castigo é sublime.
– Filmes favoritos? – ele perguntou
com um sorriso imenso no seu rosto. Ele
estava se divertindo com a minha
disposição.
– Gosto de qualquer coisa do Woody
Allen. Gosto dos filmes do Jornada nas
estrelas. Da trilogia Senhor dos anéis.
Tinha um brilho engraçado nos seus
olhos.
– Mas qual é o favorito? Se só
pudesse escolher um?
Eu não precisava nem pensar:
– E o vento levou.
– CLARO! – colocou a testa contra o
meu rosto.
– Por que “Claro”?
– Se você não for fã da Scarlett
O’Hara eu engulo minha mão – sorriu.
– A mulher é uma batalhadora! –
Levantei as mãos e ele começou a rir. –
E em uma época em que mulheres eram
submissas irrelevantes. Scarlett é um
exemplo. Ela é uma pessoa horrível.
Mas é um exemplo.
– Tem muito dela em você.
– É o maior elogio que você poderia
me fazer – mostrei a língua pra ele.
– “Nunca mais passarei fome” –
entoou, recitando a famosa frase do
livro e do filme.
– As pessoas esquecem do resto da
frase. – falei mais para mim mesma do
que para ele.
– Como assim?
– Todo mundo só se lembra do
“Nunca mais passarei fome”, mas a cena
é muito mais do que isso.
– Me conta – ele sussurrou. Era uma
conversa boba e cheia de trivialidades,
mas estava sendo importante para Greg.
E estava sendo importante para mim.
Havia tantas coisas que a gente
desconhecia sobre o outro.
Baguncei seus cabelos.
– Ela chega em casa e sua vida
acabou. Ela acabou de passar pelo
inferno da guerra civil. Quando ela acha
que finalmente chegou em casa, quando
ela acha que finalmente está a salvo… o
lugar que ela chamou de lar está em
completo caos. – Se eu fechasse os
olhos, conseguiria ver a tela em tons de
preto e vermelho na minha frente, e
Vivien Leigh subindo o morro
desgastado. Deus, eu amava esse filme.
– Ela sobe o morro da horta e cava o
chão com as mãos nuas para comer
raízes e o que mais ela conseguir
encontrar.
– E então ela diz: “Nunca mais
passarei fome” – Holt concluiu
suavemente.
– Não. – Beijei sua bochecha. – Ela
diz: “Nem que eu tenha que matar,
roubar ou mentir… Nunca mais passarei
fome”. Ela está disposta a fazer o que
precisa ser feito para proteger a si
mesma e as pessoas que ama.
– Uma mulher determinada. Confiante.
Autossuficiente. – Tinha algo diferente
no seu sorriso dessa vez.
– Um exemplo.
– Sem dúvidas. – Ele colocou uma
mecha do meu cabelo atrás da orelha.
Havia algo nos seus olhos verdes que
estava me incomodando.
– Já sei o que quero fazer hoje. –
Descobri de repente.
Gregory olhou para mim e deixou que
sua expressão de dúvida fizesse a
pergunta por ele.
– Acho que a gente devia ir ver a sua
mãe.
– Dom… – Sua expressão mudou
imediatamente. – Não faz isso. A gente
está tão bem.
– Você precisa superar isso um dia,
Greg.
– Eu sei. Tudo bem. Mas hoje não.
– Então, quando?
Ele abriu a boca procurando as
palavras e a fechou de novo. Abriu mais
uma vez e tornou a fechá-la.
– Não sei se isso entre a gente vai dar
certo, Gregory. Mas eu mudei um
bocado nessas míseras duas semanas
aqui. E acho que mudei para melhor.
Descobri coisas sobre mim que eu nem
sabia que existiam e isso foi graças a
você, sua chantagem e sua persistência.
– Dom, essa história com a minha mãe
é…
– Eu sei. Juro que sei. – Coloquei as
mãos em seu rosto e tentei fazer com que
o meu toque deixasse claro para ele o
quanto eu me importava.– Mas, se as
coisas entre nós não derem certo, daqui
a duas semanas eu vou embora e você
vai se esconder. Você nunca vai olhar a
caixa da sua irmã. Vai se esconder da
sua mãe e ignorar o passado. Não se
vive assim, Greg.
– Você odeia a sua mãe! Como pode
me dizer para dar mais uma chance para
a minha?
– Você deu uma segunda chance para
sua mãe? – Ele ficou em silêncio. Sabia
que a resposta era não. – Eu dei umas
doze segundas chances para a minha. E
ela me decepcionou em cada uma.
Demorei muito tempo para descobrir
que tudo que ela fazia era me machucar.
– Encostei meu nariz no dele. Eu não
queria me afastar. Ou pior, não queria
que ele me afastasse. Sabia que seu
primeiro instinto seria fugir e queria
segurá-lo ali. Fazer o que fosse possível
para que ele se sentisse seguro. – Com a
sua mãe é diferente. Ela está magoada.
– Dom…
– Eu posso não saber muitas coisas,
Greg, mas eu sou muito boa para julgar
caráter. E acredite quando eu digo que
sua mãe não é uma pessoa ruim. Ela só é
uma pessoa que sofreu um bocado. E
que ainda está sofrendo.
– Ela merece – respondeu ríspido.
– Eu entendo que você ache isso. E
até concordo que o que ela fez foi
horrível. Mas ela também perdeu muita
coisa, Holt. Você não perdeu sozinho.
– Outro dia, está bem? Outro dia nós
vamos.
– Você não vai. Sabe que não vai.
Precisa quebrar a inércia, Greg.
– Eu não quero proximidade com a
minha família, Dom. Eles são tóxicos.
São perigosos e letais – rosnou com os
dentes semicerrados.
– Se você for até lá e der uma boa
olhada na sua mãe, vai ver que está
errado em relação a ela. Há no mundo
poucas criaturas tão indefesas.
Acariciei seu rosto e beijei sua boca.
– Deixa eu te ajudar. Você me ajudou
e eu sou impossível, eu sei. Se você não
tivesse um vídeo meu eu nunca teria
deixado você fazer isso. Se eu tivesse
um vídeo seu, você seria obrigado a ir.
Então, finja que está sendo obrigado.
Não precisa ir por ela. Vai por você,
Holt. Vai até lá para largar essa dor e
esse arrependimento. Vai até lá por
mim.

E eu estava dentro de um carro sendo


levado até a Casa Morghan.
Se ela tivesse dito qualquer outra
coisa eu seria capaz de recusar ou
enrolar. Mas ela pediu que eu fosse por
ela. Merda… Eu faria qualquer coisa
por ela.
Assinei meu nome em um livro de
visitas e fui conduzido por um
funcionário por um lance de escadas.
– O que está fazendo? – Dominique
tinha se separado de mim e ido se sentar
em um sofá na recepção.
– Vou esperar aqui. Vocês precisam
de privacidade.
Eu desci os quatro degraus que já
tinha subido. Ah, mas de jeito nenhum!
– Você vem.
– Greg…
– Eu não vou falar com ela sozinho!
Não sei nem o que diria! Isso foi ideia
sua… Ou você vem comigo ou eu não
vou.
Ela se rendeu e me seguiu.
– Senhora Holt! – o funcionário
chamou. – Tem alguém aqui para vê-la.
Sentada em uma cadeira de rodas de
frente para um grande tabuleiro de
damas, estava a minha mãe. A senhora
sentada do outro lado sorriu, despediu-
se e levantou quando viu que a colega
tinha visitas.
Ela virou o rosto e sorriu primeiro
para Dominique. Levou dois segundos
para me reconhecer. Suas mãos trêmulas
foram para a boca e eu a observei. Ela
parecia tão… velha.
Não tinha qualquer resquício da
mulher intolerante que regurgitava todos
os discursos da minha avó. Aquela
senhora sentada na cadeira de rodas era
alguém que tinha lutado contra a vida e
perdido grotescamente.
– Greg! – ela falou meu nome com um
soluço.
– Olá, mãe – falei inexpressivo.
Dominique se sentou no sofá ao seu lado
e eu me mantive de pé. Estava só
esperando um sinal de que ela estava
satisfeita para dar o fora daquele lugar.
– Oh!! Oh-ohh! – Ela apertou a mão
de Dominique como se sentisse gratidão.
Obviamente, sabia que, se eu estava ali,
não tinha sido por decisão minha. – Por
favor, venha até aqui! Deixa eu te ver!
Me aproximei e sentei no sofá perto
de Dominique.
– Como você está? Você está bem? –
Ela se aproximou o máximo que pôde
sem me tocar. Pelo movimento de suas
mãos, notei que era isso que ela queria.
Mas estava se controlando.
– Estou. Tudo certo.
Não ia perguntar como ela estava.
Isso não podia acabar bem.
Ela ficou parada me observando,
dividida entre um soluço e um sorriso, e
eu comecei a ficar constrangido.
– Bem, só viemos dar uma olhada na
senhora. Estamos um pouco atrasados –
disse, levantando.
– Ah, tudo bem. – Ela pareceu um
pouco decepcionada. Mas logo sorriu de
novo. Aquele sorriso louco e
desesperado que me incomodava mais
do que tudo.
– Atrasados para quê?
Thoen… Cala a boca.
– Thoen. Nós precisamos…
– Holt! Sente e converse com a sua
mãe – ela rosnou na minha direção de
um jeito que me deu medo. Ela
conseguia ser extremamente impositiva
quando queria. – Eu vou ao banheiro. Se
me dão licença.
Ela levantou e se foi.
Na minha cabeça, comecei a xingá-la.
Sabia que a amava e era, sem dúvidas, a
mulher mais gostosa que eu já tive na
cama, mas, por Deus, ela conseguia me
enlouquecer.
– Ela é uma boa menina – sorriu
tímida e eu tive que rir. Dominique?
Uma boa menina? – O que há entre
vocês?
– Ainda não sei bem.
– Ah! – Ela olhava para os lados
como se procurasse assunto. Estava
mais nervosa do que eu. – Obrigada por
ter vindo. Significa muito para mim,
filho.
Expirei profundamente. Aquilo,
definitivamente, não ia dar certo.
– Não vim até aqui por sua causa.
Vim para que Dominique me deixasse
em paz. Por você, eu não viria nunca.
Meu pai e minha irmã estão mortos, e a
culpa é sua. Você é uma egocêntrica
venenosa que só se importa com duas
pessoas no mundo: com você e com a
sua mãe. Pois se quer a visita de alguém,
ligue para ela.
– Você está certo.
Tudo bem.
Eu não estava esperando aquilo.
Todas as conversas que já tinha tido
com minha mãe sobre esse assunto
sempre terminavam em gritos que me
levavam à rouquidão. Ela se agarrava
com todas as forças ao fato de que não
tinha como saber o que iria acontecer e
que só queria o melhor para a família e
mais toda essa merda que minha avó
tinha colocado na cabeça dela.
– Estou certo?
– Está. Você sempre esteve, na
verdade.
Acabaram minhas palavras.
Merda.
Eu estava me sentindo mal.
Dali a alguns minutos, quando Dom
voltasse, eu iria embora e ia deixá-la
sozinha naquele lugar com nada para lhe
fazer companhia a não ser as palavras
horríveis que eu tinha acabado de dizer.
– Desculpe se fui grosseiro.
– Não precisa se desculpar. Tive
muito tempo aqui, Gregory. Com nada
para fazer a não ser me afogar em
arrependimentos. Sei que pareço bem
mais frágil, mas a verdade é que aqui
fiquei mais forte. E agora eu consigo
encarar o que eu fiz.
Seus olhos estavam marejados.
– Não vou pedir seu perdão porque eu
sei que não mereço. Mas o problema é
que eu não sei mais o que fazer comigo.
Não tenho mais vida, não tenho mais
nada. Só restou você. Acho que a
esperança de ter notícias suas é a única
coisa que ainda faz com eu me mantenha
viva – sorriu. – E, mesmo que você não
volte para me visitar nunca mais, estou
feliz que esteja com essa moça. Ela
parece cuidar bem de você.
– Não foi minha intenção ser
grosseiro – repeti, por falta do que
dizer.
– Foi sim – ela riu, e finalmente
tomou coragem para tocar o meu queixo.
Balançou meu rosto do jeito que adultos
fazem com crianças muito pequenas e eu
senti uma saudade imensa dela. Uma
saudade insuportável de uma época em
que as coisas eram simples e boas.
– Tá – admiti com um meio sorriso –
Talvez tenha sido.
Seu sorriso aumentou e eu a
acompanhei discretamente.
– E esse lugar? É bom? Se quiser
posso procurar outro lugar para você.
– Ah, eu gosto daqui. Os funcionários
são muito gentis e o pudim de chocolate
das sextas-feiras é divino! – exagerou.
– Tudo bem. Tudo bem – ri do seu
otimismo. Ela parecia diferente. Talvez
Dom estivesse certa. Inferno… Era de
Dominique que eu estava falando. Era
óbvio que ela estava certa. – Quem é a
sua amiga? Que estava aqui antes de a
gente chegar?
– Paula Trimm! Ela é um doce! Os
filhos largaram ela aqui. Mas isso não é
novidade – riu. – É difícil achar alguém
aqui dentro que não tenha a mesma
história.
– Mãe, eu não…
– Eu sei, garoto. Não se preocupe.
Não é culpa sua. Nada disso é. É culpa
minha. Eu podia ter feito tanta coisa
diferente.
– Acho que não adianta mais pensar
nisso agora. Todo mundo errou em
algum momento. Acho que a gente tem
que admitir isso, aceitar e seguir em
frente. – E, simples assim, meu ódio
tinha ido embora. Era estranho e até
ridículo. Tanto tempo de raiva. E depois
de algumas poucas frases ditas e
ouvidas… Acabou.
– É. Acho que você está certo.
– Tudo bem com vocês? – Dominique
estava de volta.
Nós sorrimos e ela se sentou do outro
lado do tabuleiro.
– Esse banheiro que você foi, era lá
em casa?
Ela me mostrou a língua.
– Uma partida, Audrey?
– Ah! Eu não sou muito boa nesse
jogo – ela riu, colocando o rosto nas
mãos.
– Sem problemas, Greg joga com
você.
– Jogo, é?
– Joga! Minha desforra por aquela
última partida de Street Fighter.

Estacionei o carro e Dom me olhou


sem compreender.
– O que estamos fazendo aqui?
– Tem uma cantina italiana incrível
ali na esquina – expliquei – Te devo um
jantar.
– Hmm! Verdade! – Bateu com as
mãos nos joelhos.
Abri a porta e a tomei no meu braço.
Ela usava um vestido de verão justo na
cintura, com alças curtas, decote
moderado e saia rodada. Não tinha um
homem que passasse por nós que não se
virasse para observá-la mais uma vez.
Dom ignorava completamente todos eles
e eu percebi que era bem provável que
ela estivesse acostumada a esse tipo de
coisa.
– Sua vez! – sorriu. – Filmes e livros
favoritos! – pediu enquanto o garçom
perguntava se queríamos vinho.
– Estou dirigindo, mas se você
quiser…
O restaurante era cheio de pequenas
passagens e as mesas eram dispostas de
um jeito que quase todos os clientes
tinham uma boa dose de privacidade.
– Não. Eu não faço questão. Se você
quiser beber, eu dirijo.
– Você já fez isso por mim na
comemoração do escritório. – O garçom
se foi para buscar refrigerantes.
– Verdade! Você estava bebendo uma
taça de champanhe atrás da outra, Holt.
– E ia continuar até desmaiar e não
ser mais obrigado a ver a senhorita
flertando com o idiota do Hill.
– Estava tentando te provocar.
– Mas é claro… E conseguiu.
– Ah, nem reclame! Eu acabei dando
um murro nele.
– Verdade! Um dos melhores
momentos da minha vida. – Fechei os
olhos para reviver a lembrança e ouvi
sua risada. Eu amava aquele som.
Amava seu gemido também, mas acho
que amava sua risada ainda mais.
Não… Provavelmente amava mais o
gemido. Aquilo me deixava doido de
tesão.
– Obrigado por ter me feito ir hoje.
Acabou sendo uma boa ideia.
– Todas as minhas ideias são boas –
ela riu daquele jeito safado que me dá
vontade de foder aquela boquinha linda.
Sacudi os cabelos afastando os
pensamentos.
– Gosto dos filmes do Tarantino –
mudei de assunto antes que ficasse duro
no meio do restaurante.
– Sério? Você não faz o tipo.
– Tem um tipo? – ri.
– Sei lá, você é calmo. E os filmes de
Tarantino me parecem exagerados.
– E são. Acho que é exatamente por
isso que eu gosto. Ele não liga:
simplesmente vai lá e faz. Acho isso
libertador.
– Tarantino, hein? – ela perguntou,
com um sorriso curioso.
– Tarantino.
– Ouviu falar de um cara que salvou
uma lanchonete de um assalto recitando
uma passagem de Pulp fiction?
– A cena do final ou Ezequiel 25:17?
– A cena do final. – Eu comecei a rir.
– O que foi?
– Você sabe qual é a cena. E entendeu
a referência a Ezequiel 25:17.
– “Inglês, filho da puta, você fala?” –
rosnou baixinho, em uma péssima
imitação de Samuel L. Jackson que fez
refrigerante sair pelo meu nariz.
É sério, Dominique era incrível.
Quando eu repassava tudo que eu
sabia sobre ela na minha mente, parecia
só invenção de um homem apaixonado.
Mas se eu fizesse uma lista objetiva ela
diria:
Gostosa. Inteligente. Sagaz.
Competente. Gosta dos mesmos filmes
que eu. Gostosa. Entende o que se passa
na minha família. Boa de cama. Muito
boa de cama. Muito, muito boa de cama.
Determinada, Corajosa. Gostosa.
Surpreendentemente carinhosa.
Estava aprendendo muitas coisas
sobre ela nos últimos dias. Sobre seu
jeito, sua personalidade, seus gostos. E
não tinha absolutamente nada que não
me fizesse ficar ainda mais louco por
ela.
Quando Dom disse que gostava de
Senhor dos anéis, senti vontade de rir.
Chegava a ser cômico como ela
combinava comigo. Ela encaixava de
todos os jeitos certos. Eu não podia
deixá-la ir embora de jeito nenhum. Se
ela fosse, eu ia com ela.
Coloquei as mãos em cima da mesa,
como um convite. Ela pegou uma de
minhas mãos e a beijou de um jeito
suspeito. Toquei sua coxa por baixo da
mesa e sua mão segurou meu braço, me
guiando mais para cima. Gostei da
brincadeira. Subi minha mão por aquela
carne gostosa e apertei as pontas dos
dedos contra sua pele.
Em um movimento suave e discreto.
Dom derrubou o guardanapo de pano no
chão e se inclinou para buscá-lo. Minha
mão escapou de sua pele e a frustração
invadiu meu corpo por alguns segundos.
Até eu senti-la embaixo da mesa. Aquela
mulher infernal enfiou a mão na minha
virilha, destravou a fivela do meu cinto
e desceu o zíper.
Olhei ao redor.
A toalha da mesa se arrastava pelo
chão, e para o espectador desavisado eu
parecia apenas um cavalheiro esperando
sua companhia voltar do banheiro. Mas
ela estava ali embaixo.
Seu toque no meu pau foi breve e eu
estava duro como concreto em suas
mãos. E aí eu senti aquele calor
molhado me envolver.
Puta merda.
Puta merda.
Puta merda.
Apoiei os cotovelos e a testa na mesa
e escondi meus olhos com a mão. Seja
lá o que você fizer, Holt, não deixe
escapar nenhum gemido.
Poucas coisas na vida eram melhores
do que aquela boca no meu pau. Muito
poucas. Na verdade, no momento, eu não
conseguia pensar em nenhuma.
Senti uma camada fina de suor cobrir
meu corpo e minha respiração falhou.
O garçom se aproximou.
Por favor, vá embora.
– O senhor precisa de mais alguma
coisa?
– Não. Estou bem. – Meu sussurro era
pouco audível e eu congelei na cadeira.
Diga alguma coisa, Holt. – Só esperando
os pratos, obrigado.
– Tudo bem – ele sorriu educado e se
afastou. Acho que Dominique o ouviu se
afastar porque sugou meu pau como um
aspirador, tirou ele da boca e engoliu
meus testículos.
Eu não ia conseguir ficar em silêncio.
Simplesmente não ia. Puxei seus
cabelos, forçando-a a parar.
– Garçom! – chamei um pouco alto
demais.
– Sim, senhor?
– Na verdade… Vou precisar dos
pratos para viagem.

A masturbei o caminho inteiro.


– Já estou arrependido.
– De quê?
– De ter apagado o vídeo, de que
mais?
– Está querendo ouvir meu gemido é?
– Sempre e quando eu quiser. – Enfiei
mais um dedo nela na hora em que entrei
na garagem de casa.
– Hooolt! – ela gemeu alto. – Vem
aqui que eu quero gemer no teu ouvido.
Te fazer gozar só me ouvindo ficar louca
por causa desses teus dedos.
Me joguei em cima dela, guloso, e a
beijei, chupando seus lábios e língua.
Nos soltamos com desespero e saímos
do carro correndo para a porta. Ela
tropeçou no degrau e eu a segurei nos
meus braços. A espremi contra a porta e
enfiei minha língua na sua boca.
– Dom, nossa… Dom…
Eu não tinha palavras.
Quer dizer, palavras eu tinha. Mas as
que não deveriam ser ditas.
Suas mãos puxaram meu cabelo.
Eu queria dizer “Eu te amo”. Queria
dizer “Eu te amo. Faz amor comigo e
não vai embora nunca mais. Por favor”.
Acho que fechei a porta atrás de nós,
espero que sim, porque não aguentei
chegar ao quarto e eu e Dominique
ficamos nus na escada. Se a porta
estivesse aberta, qualquer vizinho na
calçada poderia ver suas costas nuas
rebolando no meu pau.
Segurei sua bunda com força e guiei
seu movimento sobre mim. Assisti seus
seios seguindo o ritmo das cavalgadas e
gozei longamente com espasmos fazendo
minhas pernas tremerem.
Dom estava suada sobre o meu corpo
e eu me estiquei: porta fechada. Ainda
bem.
Adorava o toque da sua pele suada
contra a minha. Dava uma sensação de
lar, de estar em casa.
Não importava se era aqui ou do
outro lado do país.
Se ela estava suada sobre mim e
sorrindo ao meu ouvido, eu estava em
casa.
Droga… Eu estava muito apaixonado.

Ela saiu do banho vestindo um de


seus pijamas curtos.
– Não vai querer uma camisa minha
hoje?
– Não, estou bem, obrigada. –
Prendeu o longo cabelo escuro em um
farto rabo de cavalo.
Recostei nos travesseiros e esperei
ela vir para os meus braços.
Preferia quando ela usava uma de
minhas camisas para dormir. Era
estúpido, mas só vê-la usando algo meu
me fazia sentir como se ela fosse minha.
Não de um jeito esnobe e possessivo.
Mas de um jeito carinhoso e duradouro.
Era o tipo de coisa que namoradas
faziam. Dom me beijou devagar e se
afastou para deitar no seu lado da cama.
– Nada de dormir agarradinho para
você, hein?
– Nós já conversamos sobre você
cutucar uma mulher cansada, não foi?
Dominique deitou de barriga para
baixo e virou a cabeça no travesseiro.
Fui para o lado dela da cama e grudei
meu nariz em seu ombro passeando as
pontas dos dedos pela sua coluna.
Suas costas subiam e desciam com
sua respiração.
Ela entendia os problemas com a
minha família. Dom tinha uma gentileza
e uma bondade em seu coração que até
ela desconhecia. Naquela tarde, eu tinha
dado o primeiro passo para me livrar de
anos de um ódio inexplicável, e tudo por
causa dela.
– Dom? Você acredita em alma
gêmea?
– Ai meu Deus, Holt, deixe de ser tão
mulherzinha.
Eu tive que rir.
– Quer dizer que se uma pessoa é
sensível ela é mulherzinha? Onde está
sua defesa pela igualdade de gêneros,
Thoen?
– Estudos comprovam que mulheres
são mais sensíveis que homens! – Ela se
virou para mim e agora era eu quem
recebia suas desajeitadas cosquinhas –
E eu não defendo a igualdade de
gêneros. Defendo a equidade de
gêneros, senhor Holt.
– Advogada Dominique Thoen se
apresentando! – debochei.
– E equidade significa tratar coisas
iguais como iguais e diferentes como
diferentes.
– Eu também fiz faculdade de Direito,
sabia? – Ela estava mais me beliscando
do que fazendo cosquinhas. Mas o
contato com ela, qualquer contato, era
sempre tão bom que eu recebi seus
beliscões rindo. – Nossa! Foi só uma
pergunta! – Segurei suas mãos e joguei
uma perna por cima do seu corpo para
dificultar seus movimentos.
– Não. – Seus lábios tocaram os meus
rapidamente e se foram deixando um
sorriso no meu rosto. – Não acredito em
alma gêmea ou em amor à primeira vista
ou nenhuma dessas bobagens.
– Por quê?
– Porque eu não acho que existe
amor. Acho que é uma coisa que o
desejo humano inventou. Quer dizer…
Pelo menos era isso que eu achava até
você apar… – Ela interrompeu a fala
como se as palavras tivessem um gosto
ruim.
Ela tinha dito que me amava?
Tinha, não tinha?
Ela tinha dito que me amava.
Quis que ela concluísse. Dissesse as
palavras de uma vez para que eu
pudesse dizer “Eu te amo também” e
pronto. Aí eu poderia fodê-la nas
escadas e dizer como eu me sentia
quando eu quisesse, sem nenhum tipo de
freio.
Mas ela engoliu as palavras, respirou
fundo e concluiu com um pensamento
que, definitivamente, não era o mesmo
que tinha começado.
– Até você aparecer e querer me
convencer de que a humanidade é boa. –
Foi uma boa saída. Quase fazia sentido
– Agora, estou começando a me
questionar. – Ela sorriu, mas havia algo
trêmulo no canto da sua boca.
Ela estava com medo. É claro que
estava. Dom tinha o costume de ser só.
Se ela achava que me amava, aquilo
deveria estar matando ela de medo. Ela
deveria estar apavorada. Se eu, que era
bem mais aberto a esse tipo de emoção,
estava tremendo por dentro, eu apenas
podia imaginar o que se passava na sua
cabeça.
Ela não estava pronta para dizer.
Tudo bem.
Eu também não estava.
Mas isso não significava que eu não
estava pronto para escutar, e aquelas
palavras espontâneas e inocentes
aqueceram meu coração. A puxei para
perto de mim e a beijei. Coloquei o
máximo de carinho que consegui naquele
beijo. Era o meu jeito espontâneo e
inocente de dizer “Eu também”. Seus
olhos me observaram tranquilos.
Dom estava nos meus braços e não
importava onde eu estivesse no mundo.
Se ela estivesse comigo, eu estaria em
casa.
Apertei meus braços ao seu redor e a
beijei mais uma vez. E de novo e de
novo.
– Vai dormir agarradinha hoje –
decidi. Ela riu tentando me empurrar
sem muito empenho, e logo desistiu.
Dormiu em meus braços, com a boca
grudada na minha.
Capítulo 18
“– Se você acha que vou casar com
você só para retribuir o favor, eu não
vou.
– Não se superestime. Eu não sou o
tipo que casa.”

Scarlett e Rhett – E o vento levou

– Acho que a gente precisa conversar


sobre algumas coisas. – Holt encheu
meu copo de suco e segurou a gravata
mantendo-a no lugar enquanto se
sentava.
– O que foi? – Coloquei o copo na
boca. A brisa fresca da manhã entrava
pela janela e depois de um feriado
maravilhoso, eu estava bastante
disposta. O problema agora seria me
manter ocupada, já que a casa estava
arrumada e eu não consigo ficar muito
tempo sem fazer nada.
– Não sei se você notou – seu sorriso
era um misto de constrangimento e graça
–, mas a gente não tem sido muito
cuidadoso.
Eu sabia exatamente o que ele queria
dizer, mas o fato de ele ter demorado
tanto tempo para perceber me fez querer
provocá-lo.
– Como assim?
– Quis dizer… em relação à
proteção.
– Quer que eu ligue para alguma
empresa de segurança colocar um
alarme na casa?
Esse comentário foi um pouco demais
e Holt abriu a boca desconfiado de que
eu já tinha entendido a sua intenção.
– Dominique. Você sabe do que eu
estou falando.
– A gente já transou zilhares de vezes
e só agora você lembra que não ter
usado camisinha pode ter sido um
problema?
– Eu culpo você – sorriu, safado, se
escondendo atrás da xícara de café. – O
corpo, os gemidos, a provocação… Eu
esqueço de tudo.
– Esquece com frequência? – Isso era
um pouco preocupante.
Greg largou a xícara e aproximou seu
rosto do meu.
– Nunca transei com ninguém sem
camisinha. Nunca. Mas com você, eu
só… Me distraí. – Fechou os olhos
como se estivesse revivendo uma
memória deliciosa, e eu dei um tapa em
seu braço.
– Vai se atrasar.
– E você também esqueceu! Se
tivesse dito qualquer coisa, eu teria
colocado.
– Eu sei. Acho que me distraí também
– sussurrei. Holt passou a língua nos
lábios como se quisesse desistir da
audiência e me foder ali, em cima da
mesa. – Mas não se preocupe, eu tomo
anticoncepcional. Então, pode ficar
tranquilo. Sou eu quem tenho que me
preocupar com suas doenças – ri.
– Eu sou limpinho. Você que é
safada. – Deu um beijo no topo da minha
cabeça quando se levantou.
– Isso é meio delicado.
Principalmente porque a gente pulou de
cabeça nisso, mas é uma coisa séria,
Holt. – Mudei o tom – Tem algo com
que eu precise me preocupar?
– Não. Nenhuma doença. – Piscou um
olho pra mim. – Tomo muito cuidado
com minha saúde.
– Ótimo. Eu também não tenho nada. –
falei antes que ele perguntasse. – Tenho
um cuidado obsessivo com essas coisas.
Faço exames anuais. De tudo.
– Tudo bem – ele sorriu, pegando
meus braços quando eu levantei com
meu prato. – A gente pode continuar,
então? Sem camisinha? Sem
preocupações?
– Acho que é meio tarde para dizer
não. – O beijo que eu dei em seus lábios
era para ter sido rápido, mas ele me
segurou pelos cabelos e não me soltou.
– Adoro ter você aqui – confessou
com um sussurro quando nossas línguas
se soltaram.
– Na sua casa? – Nossos narizes se
tocavam e a proximidade com Holt
estava tirando o oxigênio do ambiente
inteiro mais uma vez. Agora era eu quem
queria que ele desistisse da audiência e
me fodesse em cima daquela mesa.
– Não – riu. – Aqui – explicou,
sugestivo, apertando os braços ao meu
redor.
– Bem… Eu não vou a lugar algum.
Pelo menos, não pelas próximas
semanas.
Seu sorriso largo ficou tímido e
retraído.
– Você disse “Conversar sobre
algumas coisas” – lembrei.
– Sim! – Bateu a mão na testa. –
Como você está?
– Muito bem, obrigada. – Não
entendi.
– Dominique – revirou os olhos –, seu
pé e seu braço? Não temos sido
exatamente cuidadosos com eles e você
foi para a festa de salto…
– Não se preocupe – ri. – Eu sou tipo
o Wolverine. Preciso de pouco tempo
para me recuperar.
Ele riu da minha referência e
perguntou se eu tinha certeza. Tive que
levantar a camisa para mostrar que os
hematomas tinham sumido. Ele tocou
minha pele, ganancioso, e me beijou
mais três vezes antes de sair.

Estava regando as plantas enquanto


Max dormia na sombra quando vi
Thierry e Rick caminhando pela
calçada.
– Bom dia, vizinha – Rick
cumprimentou.
– Oi, Rick. Bom dia, Thierry.
– Olá, olá – respondeu sorridente.
Andava se apoiando no braço de Rick.
– Exercício matinal? – perguntei.
– Estou me preparando para uma meia
maratona. Uns seis meses disso e eu
conseguirei correr.
Tive que rir. Seu bom humor diante
de sua situação era invejável. Queria
saber como sua saúde andava, mas eu
me recusava terminantemente a trazer a
conversa para assuntos tristes.
– Parece que ele está se apoiando em
mim. – Rick mostrou o braço. – Mas é o
contrário.
Eu conseguia ver algo de Holt
naquele garoto. Era sua gentileza
inesgotável.
– Vocês dois não trabalham, não? –
Eu estava me repetindo nesse assunto,
apenas porque aquilo me incomodava
profundamente. Todas as pessoas
daquela vizinhança pareciam viver de
luz.
– Aposentado – Thierry afirmou
apontando para si mesmo. – Não sirvo
mais para nada a não ser fazer biscoitos.
– Mas são biscoitos muito bons –
elogiei.
– Eu trabalho em casa. – Rick ainda
estava rindo do comentário dos
biscoitos. – Trabalho com
desenvolvimento de softwares.
– Isso parece muito complicado.
– Escuto isso com frequência. Mas
não é… Sabe aqueles programas que
você tem no celular ou no tablet? Jogos
e aplicativos? – perguntou. Confirmei
com um gesto – Pronto. Eu desenvolvo
aquelas coisas e coloco para vender on-
line. Tenho uma pequena empresa, mas
como tudo é feito pela internet, todo
mundo trabalha em casa e a gente se
reúne de vez em quando se tiver alguma
decisão mais específica que não possa
ser tomada por conferência virtual.
– Algum aplicativo que eu conheça?
– Não sei – riu. – A gente trabalha
com alguns aplicativos para
profissionais. Temos um compêndio
com todas as leis de vários países,
talvez esse você conheça. Tem
ferramentas de busca, de marcação,
permite que você faça anotações.
– Eu tenho um desses no meu celular!
E foi bem barato.
– Olha aí. Talvez seja o meu.
– Que incrível, Rick! Nunca conheci
alguém que fizesse isso. Achei que esses
aplicativos eram feitos por… Duendes
escravizados, por meio de magia ou
algo assim.
Ele riu.
– Eu tenho outros mais bobos. Mas
esses profissionais são o carro-chefe da
empresa. É o que dá dinheiro. Mas faço
algumas outras coisas para brincar.
– Tipo o quê? – Desliguei a
mangueira quando notei que já estava
afogando as plantas.
– Uns jogos, um sensor de movimento
que pode ser vinculado a outros
aplicativos e um gravador com comando
de voz. São meus atuais projetos à parte
da empresa. O gravador é o único que
realmente está dando dor de cabeça.
– Por quê?
– Fazer a gravação ser ativada por um
comando de voz é fácil. É só dizer a
palavra e ele começa a gravar. O
problema é parar. Porque quando você
quer fazer gravações longas e com
muitas interrupções, como em uma
entrevista, por exemplo, a gravação
sempre fica cheia de comandos para
parar, sabe? Queria conseguir fazer com
que ele ignorasse a palavra de comando.
Não gravasse a palavra final. Mas se
você escolhe uma palavra, ela seria
ignorada sempre. Isso seria um
problema se ela fosse dita no meio do
diálogo. E ainda tem o problema do
aprimoramento do reconhecimento de
voz… Enfim…
Não tinha entendido completamente,
mas algo me dizia que quanto mais ele
tentasse me explicar, menos eu iria
entender. Achei melhor deixar para lá.
– Se precisar de alguém para ajudar
quando tiver uma versão experimental, é
só avisar.
– Ah, obrigado.
– E você, Dominique? – Thierry quis
saber. – Nenhum trabalho hoje?
– Não. Estou de férias. Mas estou
seriamente considerando voltar ao
trabalho mais cedo. Essa coisa de
descanso não funciona muito bem
comigo.
– Seu namorado é advogado também?
Não corrigi. Nós estávamos
transando. Eu estava apaixonada por ele
e tinha dito isso. Ele estava apaixonado
por mim e tinha dito isso. Não
importava se a palavra ainda me
incomodasse: para todos os efeitos, eu e
Holt estávamos namorando.
– É.
– Tem que se controlar para não
avançar no trabalho dele, então, hein? –
Rick brincou.
– Nem me fale. Metade do tempo eu
acho que ele não está fazendo as coisas
do jeito que…
A audiência!
A audiência de hoje era a do caso que
a testemunha estava mentindo!
Eu sabia que ela estava mentindo e
podia provar. Mas será que Holt tinha
descoberto o que era?
– Dominique? Está tudo bem?
– Está. Quer dizer, não! Acabei de
lembrar de uma coisa e preciso ir.
Dei um tchau apressado para os dois
e puxei Max para dentro de casa.

– Sinto muito, senhora. Mas não


posso dar esse tipo de informação.
Eu queria matar aquela secretária a
machadadas.
– É um caso de vida ou morte –
exclamei para o celular.
– Não tenho autorização para isso,
senhora – continuou, do outro lado da
linha. – Se preferir falar com…
– Você pode garantir que não vai me
deixar esperando na linha por quinze
minutos como da última vez?
– Os advogados podem estar
ocupados, senhora. Não posso prometer
que eles vão atender imediatamente. A
não ser que seja urgente.
– Mas é urgente, minha filha! Que
parte de é urgente você está tendo
dificuldades para entender?
– Se a senhora não mantiver a
educação, eu não sou obrigada a escutar.
Malditas secretárias de escritório
jurídico que sentem cheiro de processo
plausível. Não podia gritar com ela.
– Tudo bem. Mas é urgente.
– Certo. Se a senhora me disser qual é
a urgência eu repasso a informação
para…
– Devon Hill! Transfira a ligação
para Devon Hill, ou para Lynn… – Eu
tinha ouvido o sobrenome dela? –
Lynn… Lynn Alguma Coisa.
– Eles não estão no escritório no
momento. Mas a senhora pode deixar um
recado, se quiser.
Esfreguei os dedos nos olhos. Se Holt
perdesse essa causa imperdível por
minha culpa, eu nunca iria me perdoar.
Quem mais eu conhecia naquele
inferno de escritório?
– Soraia! – Lembrei com um estalo –
Você tem uma estagiária chamada
Soraia trabalhando aí, não tem?
– Temos…
– Pronto! Quero falar com ela.
Alguns segundos depois, uma voz
feminina e cansada atendeu ao telefone
com um alô murcho e irritado. Ela devia
estar soterrada por milhões de afazeres,
e atender uma ligação devia estar lá
embaixo na sua lista de prioridades.
– Soraia! Você não se lembra de mim.
Meu nome é Dominique Thoen e eu
salvei sua vida e a dos outros dois
estagiários no assunto da companhia
elétrica.
Ouvi sua respiração do outro lado da
linha.
– A amiga do dr. Holt?
– Exatamente! Liguei porque preciso
que você retribua o favor. Holt esqueceu
uma coisa muito importante que pode
fazer com que ele perca uma causa.
Preciso que você verifique para mim. O
cliente se chama Amberg, a audiência é
hoje. Preciso que você me diga qual é a
vara e qual o horário. E rápido!

Abri a porta de casa e Shelbi quase


caiu por cima de mim.
– Shelbi! Oi! Olha, eu estou muito
atrasada.
A empurrei com o corpo e tranquei a
porta da frente. Tinha exatamente meia
hora para chegar ao centro da cidade. Só
o trajeto, sem trânsito, ia levar mais
tempo do que isso.
– Você estava certa. – Tinha algo na
sua voz que me fez virar e observá-la
com mais atenção. Seus olhos estavam
vermelhos e inchados, algumas lágrimas
ainda escapavam pelo canto dos olhos
enquanto ela falava.
– Shelbi! O que houve?
– Eric… Eric, Dominique… Vocês
estavam certas.
Ai, não. Agora não.
– Olha, eu preciso sair agora. Mas eu
volto mais tarde e a gente conversa, está
bem?
– Eu vou jogar as coisas dele fora! –
disse chorando. – Vou jogar tudo pela
janela e mudar a fechadura! Quero ele
longe de mim! – Faltava convicção em
sua voz, e eu podia sentir que ela estava
louca para perdoá-lo. Mas, se ela tinha
vindo até mim para que eu a
convencesse a fazer as pazes com ele,
tinha escolhido a confidente errada. Mas
tinha que ser feito direito.
– Não! Você não vai fazer isso agora.
– Vou sim! – Ela inflou o peito.
Aparentemente, ter alguém para impedi-
la lhe deu mais convicção. Achou que
poderia xingá-lo até tirar tudo de seu
peito magoado e que eu a convenceria a
perdoá-lo e a ficar casada. E quando
finalmente terminasse de gritar, estaria
pronta para morrer ao lado de seu
marido traidor. Só que não era isso que
eu pretendia dizer.
– Vai fazer mesmo. Só não vai fazer
agora. Não antes de eu dar uma boa
olhada no contrato de casamento de
vocês, me ouviu?
Seus olhos se arregalaram brilhando.
Ela queria jogar as coisas dele pela
janela e humilhá-lo. Mas ele pediria
desculpas e ela o perdoaria. Seu plano
ia até aí. A mera indicação de que um
divórcio se seguiria fez suas pernas
tremerem perceptivelmente.
Ela ia fazer besteira.
Se eu a deixasse ali, sozinha, ia fazer
alguma besteira enorme e irreparável.
– Vem cá. – Puxei-a pelo braço
através do gramado de Andy e toquei a
campainha compulsivamente.
– Dominique! – Ela usava um avental
todo sujo de tinta por cima das
conhecidas roupas escuras. O cabelo
estava amarrado em um cuidadoso nó e
eu percebi imediatamente que ela
deveria estar dedicando um tratamento
de verdade ao cabelo novo.
– Preciso que você olhe a Shelbi e
preciso pegar seu carro emprestado.
– Você precisa de muitas coisas. –
reclamou – E eu estou ocupada.
– Ah, é? – puxei Shelbi chorosa para
o seu campo de visão.
– O que foi que houve?
– Alguma epifania maluca. Ela quer
se livrar do Eric.
– Oh, Shelbi! – Andy a abraçou.
– Não é hora de abraços. – Eu as
separei e depois segurei Andy pelos
ombros. – Ela não pode fazer nenhuma
besteira antes de eu dar uma olhada no
contrato de casamento, você entende?
– Entendo.
– Precisa ficar de olho nela até eu
voltar.
– Tudo bem, sem problemas.
– E preciso do seu carro. É urgente. É
sobre uma causa de Holt. A audiência é
agora e eu preciso chegar lá.
– Você é nova na cidade. Vai ser mais
rápido se eu te levar.
Estava certa.
Shelbi estava fungando ao meu lado
como se fizesse parte de uma realidade
alternativa e eu suspirei.
– Posso levá-la para o Clube dos
Biscoitos! – Andy sugeriu animada. Ah
merda, aquilo tinha virado um nome? –
Rick e Thierry ficam de olho nela até eu
voltar. Ou você precisa que eu fique te
esperando lá?
– Não! Eu volto de táxi, de ônibus, de
mula, qualquer coisa… Só preciso
chegar lá!
– Então, vamos!

Desejei bom dia para as pessoas na


sala e sentei na cadeira ao lado de Lynn.
– Bom dia, Greg.
– Bom dia – sorri educado. – Sra.
Amberg – cumprimentei. Ela estava
sentada em uma cadeira de rodas. Ia
ficar ali pelo resto da vida. Seu filho
mais velho estava sentado em um banco
logo atrás, esperando. A expressão dos
dois era de uma derrota ainda não
completamente assumida. – Primeiro, o
juiz vai ouvir as testemunhas – expliquei
ao seu ouvido. – Ele vai fazer algumas
perguntas. Depois será a vez dos
advogados dele e depois somos nós.
– Ele está mentindo, dr. Holt. Não
aconteceu daquele jeito.
– Vamos tentar deixar isso claro, está
bem?
Ela concordou com um gesto exausto.
Eu devia ter perguntado a Dominique.
Mas eu sabia a resposta: ela tinha
inventado aquilo para me provocar.
Toda aquela história de ter visto algo no
processo que provava a mentira de
Harris… Não havia nada ali. O
processo foi esmiuçado por uma equipe
inteira. E depois de novo. Nem eu, nem
ninguém mais tinha conseguido encontrar
nada ali. A história do homem fazia
perfeito sentido e eu não precisava ouvir
Dominique dizer que tinha mentido para
mim. Não quando estávamos indo tão
bem.
– Senhores? Vamos começar, então? –
O juiz folheou o processo.
Sybill Amberg era uma funcionária da
construtora Hammil. Seu cargo era
secretária. Ela deveria passar o dia em
uma pequena sala cuidando de papéis.
Mas, por algum motivo, tinha sofrido um
acidente em campo, regulando um
aparelho sem as instruções necessárias.
A construtora alegava que o técnico
estava com ela, a defesa, que o técnico
estava operando a máquina e que Sybill
se machucou por culpa própria.
O que Sybill alegava, e nós sabíamos
ser verdade, era que, após uma longa
onda de demissões, a Hammil estava
usando os funcionários de todos os
modos errados, e Sybill tinha sido
instruída a regular equipamentos, mesmo
sem conhecimento, e obedeceu por medo
de ser demitida.
Foi a imprudência da construtora que
fez com que a jovem sra. Amberg se
envolvesse no terrível acidente. Ela
ficou caída por horas, sozinha, até o
técnico finalmente chegar e ouvir seus
gritos fracos e roucos.
Mas não era isso que a testemunha
dizia.
– O Sr. estava presente no momento
do acidente? – o juiz quis saber.
– Estava.
– Mas se ausentou. Por quê?
– Precisei ir buscar ajuda. Mas era no
meio da semana e não há nada perto da
construção a não ser uma livraria. Corri
até lá. Precisava de uma toalha ou de um
pano para ajudar a estancar o
sangramento. E de um telefone.
– Estava sem celular?
– Não tinha sinal.
– Não havia telefone no local da
construção?
– Não. As obras ainda não
começaram. Eram só testes
preliminares. Coisa que qualquer
pessoa pode fazer. A senhora Amberg
me acompanhou para anotar os
resultados, ela estava tirando algumas
fotos quando se distraiu e andou para o
lugar errado.
– Mentiroso! – Amberg falou
sofrivelmente.
– Sra. Amberg, por favor – instruí. –
Não vai acontecer de novo, excelência.
A nossa argumentação girava em
torno da negligência da empresa.
Estávamos alegando que eles poderiam
tomar medidas de segurança maiores,
que deveriam ter mais pessoas presentes
no local se os testes tinham algum risco
em potencial. Mas a diferença entre a
falta de cuidado para proteger a sra.
Amberg e eles terem de fato colocado a
funcionária sem as qualificações
necessárias em um ambiente perigoso
era de alguns milhões na indenização.
Em vez dos poucos milhares que ela
acabaria recebendo.
Os advogados da construtora
solidificaram ainda mais o fato de que a
empresa tinha feito o possível para
proteger os funcionários e que a culpa
tinha sido exclusiva da vítima.
– Vamos passar a palavra agora para
os advogados da sra. Amberg – o juiz
indicou.
Lynn organizou a listagem de
perguntas e me passou.
– Bom dia, sr. Harris.
– Bom dia.
– Primeiro, queremos tirar algumas
duvidas sobre o padrão de segurança
da… A porta se abriu atrás de nós e
todos os olhos da sala se levantaram
para Dominique.
Dominique?
Mas o que diabos…
– Peço desculpas pelo atraso.
Ela usava uma saia cinza justa que ia
até os joelhos e uma blusa branca de
seda com mangas compridas. Os
primeiros três botões estavam abertos e
o decote exibia o alto dos seus seios. O
cabelo estava preso em um elegante
rabo de cavalo. A maquiagem era
discreta e usava um delicado par de
brilhantes nas orelhas. O conjunto como
um todo era o que fazia as mulheres do
escritório chamá-la de vadia e se
morderem de inveja.
Tê-la de short curto na minha casa era
espetacular o suficiente. Mas essa
imagem da Dominique no auge do poder,
a advogada cruel que tinha me irritado
todos os dias pelos últimos anos da
minha vida, me deu vontade de pedir
que ela me esperasse em casa vestida
exatamente daquele jeito. Para eu
arrancar aquela saia com os dentes.
– E quem é você? – o juiz perguntou
com pouca severidade na voz. Não pude
deixar de imaginar que uma parte dele
também estava babando por aquela
deliciosa mulher que tinha acabado de
entrar. Lynn tinha o queixo no chão e
encarava Dominique como se quisesse
matá-la com o olhar.
– Sou uma das advogadas da Sra.
Amberg. Sou a encarregada da sua
causa. Pedi para que uns colegas a
acompanhassem porque poderia me
atrasar.
Eu foquei meus olhos nos seus, em
desespero. Dom, o que você está
fazendo?
Mas havia uma segurança no seu
andar que empurrava minhas dúvidas
para bem longe. Deixe ela fazer o que
sabe, Greg.
– Obrigada, meu bem, mas já cheguei.
– Ela puxou a cadeira de Lynn e indicou
que ela se levantasse. Lynn olhou para
mim como se esperasse que eu fizesse
alguma coisa. Mas fazer o quê?
– Não gosto que as pessoas se
atrasem para minhas audiências,
doutora…
– Thoen. – Ela observou o juiz com
um sorriso. – E eu me atrasei porque
estava preparando algumas provas que o
senhor vai achar muito interessantes.
Quando eu terminar de falar, garanto que
vai ter valido a pena esperar.
– Ainda assim. Vou deixar os outros
advogados…
– E você não precisa me agradecer
agora. – Ela estava mandando o juiz
calar a boca? Ai meu deus… Enfiei a
testa na mão e rezei para acordar e
descobrir que aquilo era algum tipo de
pesadelo insano. – Pode me agradecer
depois.
Acho que ela deu um beliscão no
ombro de Lynn, porque minha nova
colega se levantou e foi se sentar ao
lado do filho de Sybill.
Por favor, Dom, me diz que você
sabe o que está fazendo.
– Sr. Harris. – Ela empurrou os
papéis de Lynn para longe – Esse é o
seu nome?
– Ahmm… Sim, sou.
O babaca estava encarando o decote
de Dom. Eu fiquei me perguntando se
seria uma de suas estratégias para
distrair as testemunhas.
– Sou Dominique Thoen. A
construtora já encerrou suas perguntas?
– Já. – O juiz suspirou e jogou as
costas contra a larga cadeira. Tinha
desistido de discutir com ela. É… Eu
conhecia bem aquela sensação.
– Ótimo. Tenho algumas perguntas,
então, sr. Harris. Se não se incomoda.
– Claro – ele sorriu um pouco demais.
Calma aí, idiota.
– O senhor trabalha para a construtora
Hammil como técnico de testes, estou
certa?
– Sim.
– E foi conduzir os testes que levaram
ao acidente de Sybill Amberg no dia 25
de maio deste ano?
– Fui.
– Pessoalmente?
– Pessoalmente.
– O senhor estava lá, fisicamente
presente, no momento em que o teste foi
realizado. Viu a senhora Amberg sofrer
o acidente no exato segundo em que ele
aconteceu e depois saiu para buscar
ajuda?
– Exatamente.
– E demorou algumas horas para
voltar?
– Já expliquei antes de a senhora
chegar – começou, sorrindo.
– Explique de novo. – Tinha algo
feroz em sua voz que fez a testemunha
engolir a seco. Nem mesmo o juiz ousou
questioná-la.
– O local da construção ainda não
estava preparado. A estrutura não estava
pronta. O celular não tinha sinal. E a
única coisa que havia por perto era uma
livraria. Tive que correr pelo
estacionamento e procurar um telefone.
– E isso levou duas horas?
– Tentei procurar um pano ou uma
toalha antes. Sei que foi estúpido, mas
ela estava sangrando e eu nunca tinha
presenciado algo daquele jeito. Não
conseguia parar de pensar em estancar o
sangramento e não notei o tempo
passando.
– E por que não pedir ajuda?
– A livraria estava vazia como se
fosse o dia depois do apocalipse. Fica
longe da cidade e era um dia de
semana… Não havia muitos
funcionários ou clientes.
– E a toalha? O senhor achou?
– Não. Liguei para a emergência e
voltei. Foi só aí que me ocorreu tirar
minha camisa. Como eu disse: estava
muito nervoso. Não consegui pensar
rápido o suficiente.
Dominique estava sorrindo. Algo no
seu sorriso me tranquilizou. Era lindo
vê-la em ação. Ela dominava o ambiente
inteiro como se pudesse prever o futuro
e soubesse que era só uma questão de
tempo até tudo se concretizar exatamente
do jeito que tinha previsto.
– A livraria que fica ao lado da
construção é uma Hillbrooke, não é?
– Sim.
– E não é uma Hillbrooke qualquer. É
uma das maiores da cidade. Estou certa?
– Acho que sim.
– Excelência, pela ordem – pediu
Marden, o advogado da construtora –,
qual a relevância disso?
– Vou dizer agora mesmo – Dom
respondeu pelo juiz e eu imaginei que,
se fosse biologicamente possível,
Marden estaria soltando fumaça pelo
nariz. – Os eventos se passaram no dia
25 de maio.
Ela respondeu com simplicidade e eu
vi o seu lindo corpo se recostar
elegantemente contra a cadeira como se
tudo estivesse resolvido.
– Desculpe, mas… – O advogado
estava rindo – O que tem isso?
– Ah, o senhor não sabe? – Ela
passou a língua nos lábios, já estava
saboreando uma vitória que só ela sabia
ter conquistado. – O dia 25 de maio é o
Dia do Orgulho Nerd. Há eventos em
vários lugares, principalmente em
livrarias, para comemorar o dia do
lançamento de um dos filmes de Guerra
nas estrelas e para homenagear o
escritor Douglas Adams no aniversário
da sua morte. A livraria Hillbrooke teve
um evento nesse dia. No horário do
acidente, do outro lado do
estacionamento, havia uma livraria
apinhada de gente. Então, o senhor vê,
não haveria como não encontrar alguém
para ajudar.
Minha nossa…
– Mas eu demorei para chegar lá.
Estava procurando uma toalha…
Levantando-se, Dominique passou
algumas fotos impressas para o juiz e
para a outra parte.
– São fotos do evento. Havia pessoas
por todo o estacionamento. E vê o que
quase todas as pessoas têm nas mãos?
– São toalhas? – o juiz perguntou.
Dominique estava rindo.
– Douglas Adams escreveu uma série
de livros chamada O guia do mochileiro
das galáxias. É uma comédia com uma
suave crítica social. Mas o fato é que
ele narra o que uma pessoa precisa para
viajar pelas galáxias, e a toalha é o item
mais importante. Em uma referência ao
livro, algumas pessoas saem de casa
com toalhas nesse dia, em homenagem
ao escritor. Por isso 25 de Maio, o Dia
do Orgulho Nerd, também é conhecido
como O Dia da Toalha. Agora, sr.
Harris, sei que o senhor já explicou isso
antes da minha chegada e mais uma vez
logo depois, mas será que o senhor
poderia explicar mais uma vez como
estava presente no momento do acidente,
se ausentou para procurar uma tolha e
uma pessoa para ajudar e voltou,
algumas horas depois, sem nenhum dos
dois, mesmo estando do lado de um
evento cheio de pessoas e toalhas?
O homem ia precisar ser entubado
para voltar a respirar.
– Isso é algum tipo de piada? – O juiz
se virou para o advogado da construtora
com fúria nos olhos – Você acha que
meu tribunal é um circo e que você pode
trazer macacos treinados para mentir na
minha frente?
– Excelência, claramente há alguma
engano… Não é uma piada, eu…
– Não, não é piada. – A diversão
sumiu da voz de Dominique e agora ela
estava séria como o diabo. – É perjúrio.
E nós vamos passar a acusação pelos
meios devidos. A lei não é uma
brincadeira que você pode manipular,
caro advogado. Deveria ter pensado
melhor antes de tentar nos fazer de
palhaços.
– Essa audiência está encerrada – o
juiz decidiu. – Vocês serão todos
comunicados da minha sentença.
Ele se levantou para sair.
– Excelência, por favor…
Marden se levantou com ele e eu notei
que Harris estava branco como uma
folha de papel.
– O que isso significa? – Amberg se
virou para Dominique. Não para mim ou
para Lynn… Para Dominique.
– Vamos ter que esperar a sentença,
mas acho que vai ser uma vitória de
alguns milhões.
Sybill a puxou em um abraço estranho
e eu a vi sorrir. Aquele sorriso lindo
que fazia meu mundo inteiro derreter.
– Holt. Acho que podemos renegociar
os termos do acordo como vocês
sugeriram inicialmente. Exatamente nos
termos de vocês e resolvemos isso de
uma vez – Marden agora dizia para mim.
– Meu bem – Dominique se enfiou
entre nós e, com seus saltos altos, ficava
maior do que o miúdo Marden –, acho
que você não está entendendo a
gravidade da situação. – Cruzou os
braços na frente do corpo de um jeito
que fez seus seios saltarem. – Vamos
fazer uma denúncia sobre o seu
comportamento para o Conselho da
Ordem. Eu vou querer os milhões da sua
empresa, cada centavo, conforme o
pedido da sra. Amberg e vou querer sua
licença profissional. Enquanto eu viver,
vai ser minha missão de vida fazer com
que um traste mentiroso como você
nunca mais exerça advocacia na vida.
Não haverá qualquer acordo. Não para
esse processo. Se fosse você, começaria
a pensar em qual acordo o seu cliente
vai querer fazer quando abrirmos mais
um processo contra ele. Dessa vez por
danos morais.
Eu queria jogar ela em cima da mesa
da sala de audiência, rasgar a blusa e
chupar aqueles peitos perfeitos.
Estava sentindo um tesão louco vendo
ela ali, a centímetros de distância do
meu corpo, sendo a Dominique megera.
Era muito delicioso de assistir.
Principalmente quando ela estava no
meu time e quando eu sabia que podia
levantar aquela saia cinza e fodê-la
quando chegasse em casa.
Marden engoliu a seco e saiu. Lynn
estava atrás de nós, escolhendo as
próximas palavras com cuidado. Sybill
e seu filho se abraçavam em
comemoração e tive certeza de que
Thoen era a pessoa mais incrível do
universo.
Andrew Conaughy ofereceu umas
doze propostas de emprego diferentes
para Dominique. Ela recusou cada uma
com educada discrição, mas sem deixar
clara uma certeza absoluta. Isso me fez
sorrir como um bobo. Ela não queria
fechar aquela porta definitivamente
porque estava pensando em se mudar
para lá. Tinha que ser. Era o único
motivo.
Depois que champanhes foram
estourados e Sybill abraçou Dominique
pela milésima vez, ela me acompanhou
até meu escritório e ficamos sozinhos.
– Dia do Orgulho Nerd, hein? –
provoquei.
– Vai se foder, Holt.
– Vou. Mas antes você me conta como
sabia disso.
– Conhecimentos gerais são
importantes, sabia?
– Se não soubesse, teria aprendido
agora.
– Assim que eu vi que o caso ocorreu
no dia 25 de maio e que o cara se
defendeu dizendo que tinha saído para
buscar uma toalha e não a encontrou,
soube que tinha alguma coisa estranha.
– Você foi espetacular.
– Eu geralmente sou – sorriu
debochada, e eu quis vê-la de joelhos
com a cabeça na minha virilha.
– Estava com saudade de te ver
assim.
– Com saudade, é?
– Estava quase esquecendo desse seu
jeito autoritário.
– Acho que vou ter que te lembrar
dele com mais frequência então. – Ela
deu dois passos e trancou a porta da
minha sala. Precisei apenas ouvir o
clique da trava para sentir minha ereção
dentro da calça.
– O que você está aprontando?
– Cala a boca. Eu disse que você
podia falar?
Ah, sim. Por favor. Faz isso. Meu pau
gostou da brincadeira mais do que eu e
já estava todo espremido contra o
tecido.
Sua boca tomou conta da minha em
um beijo louco, apenas para me soltar
muito rápido. Eu queria mais. Queria
aquela saliva deliciosa na minha língua.
Dom me puxou pela gravata e me
jogou contra a cadeira. Caí sentado e a
assisti passar as mãos pelas próprias
coxas. Inclinei meu corpo para frente
para tocá-la.
– Também não disse que podia me
tocar. – Ela se afastou e eu me recostei
na poltrona, vendo suas mãos passeando
delicadas e fogosas pelo meio de suas
pernas. Ela encontrou algum ponto
sensível e estava se acariciando. Enfiou
os dedos lá dentro e eu quis que ela
parasse com a brincadeira para poder
colocar os meus próprios lá dentro
também. Tirou os dois dedos úmidos e
os colocou sobre os meus lábios. Abri a
boca e suguei sentindo seu gosto. Ela
tirou os dedos da minha boca e levou
para sua. Lambeu com um cuidado
sensual e meu pau latejou como um
tambor.
Suas mãos abriram os botões e
baixaram o zíper da minha calça e minha
ereção saiu da cueca gritando por ela.
Dom engoliu até o talo e me deixou
foder sua boquinha por alguns segundos.
Eu ia começar a gemer quando ela se
levantou, tirando a calcinha. Era a porra
de uma calcinha de renda preta que eu
peguei e esfreguei contra o nariz,
sentindo seu cheiro. Tudo daquela
mulher me excitava. Tudo.
Dominique levantou a saia cinza e
abriu as pernas em cima de mim.
Coloquei uma mão na sua cintura e a
outra na base da minha ereção enquanto
ela descia seu corpo no meu pênis duro
e desesperado. Ela se moveu de maneira
devagar e suculenta, mordendo os dedos
enfiados na boca para sufocar um
gemido. Minha carne dura escorregava
dentro dela sentindo sua maciez e seu
calor. Apoiou as mãos nos meus ombros
e aumentou a velocidade.
– Merda, Greg… – ela sussurrava
com tesão. – Eu não aguento mais passar
um dia sem esse teu pau.
O desejo que saía da sua boca
conseguia me deixar ainda mais rígido
dentro dela. Se é que isso era possível.
– E eu não consigo mais olhar para
você sem pensar em sexo. – Minhas
palavras saíam ofegantes e mornas de
desejo. – Na hora em que você entrou
naquela sala de audiência eu só pensava
em arrancar tua roupa e te comer ali
mesmo, na frente do juiz.
Ela começou a rebolar e eu fui ao
paraíso. Mantive as mãos no seu
quadril, sentindo seu movimento fluído,
e joguei a cabeça para trás na poltrona.
Meus pés estavam grudados no chão e
eu me impulsionava devagar seguindo o
ritmo dela, me enfiando mais e mais
fundo.
– Quase… Quase… – ela começou a
ofegar. Seus mamilos endurecidos
estavam marcando a camisa de seda e eu
notei que ela não estava usando sutiã.
Coloquei a boca por cima da sua blusa e
mordi o discreto ponto rígido. Seu
movimento ficou mais intenso e eu podia
ouvir os pés da cadeira se arrastando
pelo chão da sala. Um transeunte atento
ouviria os barulhos óbvios e eu seria
demitido. Mas não importava. Não tinha
nada no mundo que me fizesse sair de
Dominique naquele instante.
Segurei seu pescoço na minha mão e
toquei seus cabelos. As mãos
espalmadas de Dom estavam contra o
meu tórax.
– Me morde – ela mandou e eu
obedeci. Mordi seu queixo, seu pescoço,
sua boca. – Isso… Isso… Gree-eg…
Sua blusa de seda começava a sair de
dentro da saia e minha mão encontrou
um espaço livre para se enfiar lá.
Encontrei seu seio nu e o mamilo
excitado. Ela continuou com aquele
rebolado impossível de resistir ao meu
redor e eu não aguentava mais esperar.
Precisava dela nua, agora.
Arranquei sua blusa e acho que vi
alguns botões voando. Passei a mão
entre seus seios e joguei meu quadril
contra ela com violência.
– Não para! Holt! Não para! – Não
precisa nem pedir, meu bem, não
pretendia parar. Não pretendia parar
nunca.
O orgasmo iminente fez com que ela
mordesse o lábio com tanta força que o
fez ficar branco ao redor dos dentes. Só
mais um pouco e eu poderia gozar junto
com ela. Mas tinha mais uma coisa que
eu queria fazer.
Dom estava com o corpo todo
apoiado sobre meus ombros quando eu a
segurei e olhei em seus olhos.
– Dom, eu quero foder essa tua
bocetinha em cima da minha mesa.
– Vai. Faz o que você quiser. Eu sou
toda tua.
Eu ainda estava dentro dela quando
enfiei minhas mãos por baixo dos seus
joelhos e a levantei no ar. Três passos e
a coloquei em cima da minha mesa por
cima dos papéis e do teclado. Nem me
incomodei em jogar nada no chão.
Apoiei sua bunda na borda e fiquei de
pé estocando com vontade.
Ela ainda estava mole, se
recuperando do orgasmo, mas logo
voltou a gemer e a se contorcer. A visão
de Dominique arrombada em cima da
minha mesa era uma que eu nunca mais
ia conseguir esquecer. Droga…
Trabalhar ali ia ser difícil.
– Eu queria ter te comido todos os
dias, assim. Pelos últimos anos. Toda
vez que você fizesse um comentário
safado. Te jogava na minha mesa e te
rasgava com meu pau até você aprender.
– Acho que se fizesse isso eu não ia
calar a boca nunca – ela respondeu.
Meti com mais força. Mais uma vez.
Outra. Ouvir que ela me desejava, sobre
o tesão que sentia por mim, me deixava
ainda mais louco. – Ia te provocar de
propósito só para você ter que me dar
uma lição. – Seu sorriso era sacana com
uma boa dose de deboche.
– Cala a boca ou eu enfio meu pau aí
para você manter essa boca ocupada.
– Achei que quem estava mandando
fosse eu – riu.
– Achou errado.
Metia meu pau com força e violência
e, quanto mais ela indicava que estava
gostando, mais fundo eu me enfiava.
Segurei sua cintura com força e a
virei de barriga para baixo na quina da
mesa.
– Vem cá que eu quero te comer de
quatro. – Ela chiou alguma coisa
incompreensível, mas eu estoquei de
novo e ela calou a boca, a não ser pelos
familiares rosnados de tesão. –
Dominique, se você não empinar essa
porra dessa bunda, vai apanhar.
Vi sua bunda descendo
propositalmente e entendi o recado. O
tapa estalou alto e ela gemeu gostoso.
– Vai, minha linda, levanta essa bunda
para mim.
Ela se empurrou contra o meu pau
com força, mas não se empinou, e eu
joguei minha mão aberta contra sua
bunda mais uma vez.
– Fala comigo, Holt – pediu se
esfregando. – Me diga o que você quer.
– Quero que você empine essa porra e
implore.
Dom levantou a bunda e eu a segurei,
apertando em êxtase. Seus cotovelos
estavam apoiados na ponta da mesa e
suas mãos deixavam marcas de suor na
madeira escura. Me curvei sobre ela,
beijando sua coluna, e me afastei de
novo para admirar seu corpo suado, de
quatro, empinado só pra mim.
Coloquei minha mão sobre sua boca
para abafar seu grito quando ela gozou
pela segunda vez e mordi seu ombro
para que meus gemidos também não
fossem tão evidentes.

Greg jogou minha blusa de volta


depois de fechar o zíper da calça. Eu
abaixei minha saia e resgatei minha
calcinha.
– Estragou alguns botões… – notei
assim que vesti a camisa.
– Vou estragar mais alguns quando
chegar em casa – ele sussurrou com o
nariz enfiado no meu cabelo.
Puxei a seda para frente tentando
evitar que os buracos causados pela
ausência de botões ficassem muito
evidentes.
– Vou precisar de um táxi.
– Não… Eu te deixo em casa.
– Tem certeza?
– Tenho. Ia sair para almoçar de todo
jeito. Quer vir comigo?
– Restaurante italiano? – ri.
– Com certeza! – ele exclamou
exagerado e meu sorriso aumentou.
Era tão confortável ficar com Holt.
Parecia que estávamos fazendo aquilo
há anos e eu me sentia absolutamente à
vontade ao seu lado.
– Obrigado pela ajuda hoje. – Sua
boca tocou a minha com carinho.
Gostava de como o toque de seus lábios
quentes faziam meu coração derreter
dentro do peito. Era… felicidade.
– Disponha.
– Tenho que confessar, achei que
você estava inventando.
– Rá! Inventando? Toma vergonha,
Holt.
Ele me abraçou pela cintura. Nossa…
Eu amava quando ele fazia isso. Eu me
sentia dele. E era uma sensação
indescritivelmente boa: ficar ali, com
minhas mãos apoiadas em seus ombros,
seu sorriso a centímetros do meu.
– Verdade. Não devia ter duvidado.
– Não devia. – Dei um peteleco em
seu nariz e recebi um beijo na bochecha.
– Mas você chegou bem a tempo de
me salvar.
– Graças ao Rick!
– E quem é Rick? – Me espremeu de
um jeito ciumento.
– O vizinho. Ele mora na esquina.
– O vizinho? – Sua boca tremeu de um
jeito peculiar e eu entendi qual era seu
problema.
– Não, Holt! O Rick não tem nada a
ver com… nada. Não foi ele.
– Ah – ele sorriu e me apertou ainda
mais forte – Então eu gosto do Rick.
– Estava regando as plantas quando
ele passou caminhando e começou a
falar sobre seu trabalho… – sorri,
arrumando sua gravata. – Ele
desenvolve aplicativos e entende dessas
coisas de computador. Aí uma coisa
levou a outra e ele começou a me
chamar de workaholic e a dizer que eu
iria avançar no seu trabalho depois de
tanto tempo de férias. Só então que eu
me lembrei que você tinha mencionado
que a audiência era hoje.
– Bem, então devo um “obrigado” ao
Rick também.
– Vou dizer a ele que você agradeceu.
– Dei um selinho nele. Não havia nada
no mundo mais gostoso que sua boca.

– Tchau, querido.
Respondi com um sorriso e tentei
esconder o excesso de alegria que eu
sentia. Já estava com um pé fora do
Porsche quando ele me puxou pelo
braço para mais um beijo.
– Juro que não canso disso –
murmurou nos meus lábios. – Quero te
beijar para sempre.
Passei os nós dos dedos pelo seu
rosto apreciando o contato de cada
centímetro de sua pele.
– Não faça promessas que não pode
cumprir, Holt – sussurrei de volta, beijei
seu rosto e desci.
– Ei! – ele baixou o vidro da janela
quando passou por mim. – Pretendo
cumprir. – Piscou um olho para mim
antes de acelerar pela rua de volta ao
trabalho.
Andei até a casa de Thierry. Queria
resolver essa coisa toda com Shelbi de
uma vez, voltar para casa, tomar um
banho e colocar a lingerie mais sensual
que eu tivesse.
Voltar para casa.
Eu estava realmente ficando cada vez
mais à vontade.
A sala de Thierry estava cheia: ele,
Rick, Andy, Shelbi e Madeleine. Até
Madeleine… Toda a vizinhança
desocupada reunida. Legal.
– A gente foi com ela até lá buscar o
contrato de casamento que você disse
que queria ver. Ela demorou um bocado
para achar – Andy reclamou, cruzando
os braços na frente do corpo.
– Certo. Deixa eu dar uma olhada. –
Cumprimentei o grupo rapidamente e me
afastei com Andy. – Você conseguiu
conversar com ela e descobrir o que
aconteceu?
– Ela só chora – deu de ombros. – Só
se acalmou agora há pouco. Mas pelo
que eu entendi, ela voltou do dia do
salão toda pronta para seduzi-lo e ele
nem notou a diferença. A Shelbi passou
a noite triste e, ontem, no feriado, ele
disse que tinha que trabalhar. Ela o
seguiu. E aí viu… Bem… Acho que
você pode imaginar.
Baixei os olhos para o contrato e o li
rapidamente.
– Ela tirou fotos dele traindo ela?
– Até onde eu sei, não. Acho que a
gente vai precisar perguntar.
– Shelbi? – Me aproximei com
cuidado e sentei ao seu lado. Madeleine
pulou para a ponta do sofá deixando que
eu passasse. – Andy me contou sobre o
que você viu ontem.
Percebi que todo o Clube dos
Biscoitos deveria estar tentando animá-
la pelas últimas horas e provavelmente
estavam conseguindo, porque quando
mencionei o nome dele, seu olhar
congelou e lágrimas começaram a se
formar. Todos ao meu redor me
encararam com ares de reprovação.
– Só preciso saber se você tem
alguma prova do que viu. Tirou alguma
foto?
– Não – comentou chorosa. – Só
consegui correr de lá.
– A gente vai precisar de provas de
que ele te traiu. Assim, quando você se
divorciar, ele não terá direito a nada
seu.
– Dominique… Não sei se é isso que
eu quero. E se tiver sido só uma vez?
– Não foi, Shelbi! Eu e Dominique já
falamos com você sobre isso – Andy
respondeu por mim.
– Mas o que foi que vocês viram?
Ela precisava saber de uma vez. Se
fosse me dar um tapa na cara, que desse
logo e acabasse com isso.
– Eu conheci o Eric sem saber que ele
era seu marido, Shelbi. Ele não
mencionou nenhuma vez. Eu ainda não
estava com o Holt. Eric deu em cima de
mim e nós transamos.
Ela abriu a boca na minha direção e
não foi a única.
– Sabia que essa daí não valia nada –
Madeleine achou importante mencionar.
– Cala a boca, velha chata! – Andy
correu a minha defesa, mas eu conseguia
me defender sozinha.
– Não sabia que ele era casado. Mas
ele não presta, Shelbi. É um fato
comprovado. Se você quiser gritar
comigo ou me dar um tapa… Tudo bem.
Mas eu realmente não sabia.
– E chamou ele de pau pequeno
quando descobriu. Bateu a porta na cara
dele e disse para que sumisse. Eu estava
lá e vi com meus próprios olhos! – Andy
levantou o dedo do meio para uma
Madeleine que pareceu ultrajada.
Shelbi engoliu a seco e se abraçou.
Estava chorando quando disse:
– Vocês têm certeza de que era ele?
– Shelbi! Pare de se enganar. Por
favor – respondi.
– Dominique… Não sei se quero me
divorciar dele. – Ela não parecia estar
com raiva de mim quando disse isso. Só
havia uma emoção reconhecível em sua
voz.
– Sabe, sim. Você só está com medo.
– Não precisa ficar com medo,
Shel… – Andy segurou seu braço e
tentou reconfortá-la.
– É, a gente vai te dar todo o apoio.
Você não vai ficar sozinha hora nenhuma
– Rick acrescentou.
– Estamos todos com você, garota. –
Thierry deu um beijo gentil em sua testa.
– É, todos nós. – Madeleine se
aproximou e eu tive que ficar
impressionada.
– O que me diz, Shelbi?
– Eu não saberia nem por onde
começar… – Havia um brilho diferente
nos seus olhos. Ela devia ter passado o
dia ouvindo discursos de incentivo dos
vizinhos e agora se sentia protegida o
suficiente para tentar fazer aquilo.
– Primeiro a gente precisa se
certificar de que ele não vai levar nada
que seja seu no divórcio.
– Como assim não levar nada dela? –
Andy quis saber.
– Acho que ela quer dizer que a
Shelbi deve garantir que, quando o
divórcio acabar, vai levar pelo menos
metade de tudo que o Eric tem –
Madeleine, a especialista em
casamentos, acrescentou.
– Não, não é isso. O dinheiro da
família é todo da Shelbi. Eric usa o seu
dinheiro, não é?
Todos os olhos da sala se voltaram
para ela, impressionados.
– Quer dizer que você nem precisa
dele para sobreviver? – Andy parecia
indignada. – Então, por que diabos se
submeteu a ele por tanto tempo?
– Andy. Não seja assim – Thierry
aconselhou.
– Estou só dizendo que…
– Não é importante, Andy! – Agora
era Rick quem se manifestava.
Ele tinha o dom de saber quando um
assunto não precisava ser discutido.
– Calem-se todos! – ordenei. – Temos
que conseguir provas de que Eric
quebrou uma das cláusulas contratuais e
traiu Shelbi.
– Dei dinheiro para ele começar os
investimentos… – Precisava de sua
atenção, mas ela estava bem longe,
relembrando o começo de sua vida. –
Foi por causa dos meus investimentos
que ele conseguiu o trabalho que tem
hoje…
– Safado – resmunguei, e Shelbi me
observou com olhos de reprovação. –
Diga você também, chame ele de safado!
Ela abriu um sorriso discreto.
– Crápula arrogante – Madeleine
sugeriu.
– Descarado desonesto – Thierry e
Rick entraram no clima e logo a sala
inteira estava proferindo ofensas contra
Eric.
– Safado – Shelbi conseguiu sussurrar
finalmente. – Descarado, traidor, sem
vergonha. – A cada palavra ela tomava
mais força e era bonito de assistir.
Logo ela estava chorando e xingando
ele de todos os nomes horríveis que
conseguia pensar em alto e bom som.
– O que eu faço, Dominique? – Ela se
virou para mim, com o coração
satisfeito e aliviado.
– A gente pega ele te traindo.
– Então, você vai ficar com ele de
novo? – Andy quis saber.
– Garota, desencana dessa ideia. Não
vai acontecer.
– Mas como a gente vai pegar ele
então?
– Poderíamos nos revezar – Rick
sugeriu. – Cada um segue ele por um
tempo. O cara não consegue se
controlar, não é? Quando ele fizer de
novo… Será flagrado.
– Não gosto de depender do acaso. –
Toquei minha boca com o indicador e
formulei um plano rápido. – Shelbi,
você teria algum problema se
armássemos para cima dele?
– Não. – Senti convicção em sua voz.
– Madeleine. Você ficaria com um
homem casado com a benção da esposa?
– Ela me olhou descrente – Estou
falando sério.
– Eric não vai dar em cima da velha.
– Greenpeace, silêncio. Sou eu quem
está dando as ordens. Ficaria,
Madeleine?
Ela olhou de um lado para o outro e
encontrou apenas olhares de apoio e
aprovação.
– Ficaria, mas como…
– Eu me preocupo com essa parte.
Eric vai aparecer te procurando em
breve. Rick!
– Sim?
– Vamos precisar preparar a casa de
Madeleine. Câmeras por todos os lados.
Pode organizar isso?
– Com certeza.
– Teste tudo pra ter certeza de que vai
funcionar e mostre a Madeleine onde
precisamos que ela fique. Não precisa ir
até o fim com ele, ouviu? Só algumas
fotos e vídeos de beijos e ou dele dando
em cima de você e pronto. Rick! Outra
coisa…
– O quê?
– Shelbi! – Virei para ela – Acha que
consegue pegar o celular dele sem que
ele perceba?
– Acho… Acho que sim…
– Pronto. Faça isso. Rick, você
consegue burlar a senha e acessar
mensagens de texto, e-mails e tudo o
mais?
– Sem problemas – sorriu.
– Vamos precisar disso tudo.
– E eu? Faço o quê? – Andy
perguntou.
– Shelbi vai dizer para Eric que vai
passar um tempo aqui te ajudando com
um projeto de arte. Para que ela não
precise voltar para casa se não quiser.
Você cuida dela.
– Quando a gente começa?
– Acho que consigo fazer Eric te
procurar esse fim de semana,
Madeleine.
– O que você vai dizer para ele?
– Não se preocupem. Eu sou criativa.

Atravessei a rua de volta para casa


me sentindo dez anos mais jovem e doze
vezes mais cansada. Era uma exaustão
boa: tinha sido um dia feliz e produtivo.
Essa coisa de ajudar os outros acabava
sendo bem recompensadora.
A tarde já estava chegando ao fim, e a
luz quebrada do crepúsculo entrava
discreta pela janela. Ouvi um barulho na
sala e meu coração pulou duas batidas.
Não podia ser Holt. Max estava preso
no quintal de trás. Tirei meus saltos com
cuidado e os soltei no canto do chão sem
fazer barulho.
Coloquei um pé atrás do outro até
cruzar o portal do hall para a sala. Vi a
sombra de um homem alto cruzar meu
caminho e joguei minhas mãos no seu
braço e pescoço. Um toque contra sua
jugular e ele perdeu o ar. Usei meu
ombro para jogá-lo no chão e acendi a
luz.
– Ai! Calma! – ele exclamou do chão,
com a mão para cima.
Tinha uns quarenta anos, era negro,
forte e muito alto. Senti a adrenalina
latejando em minhas veias.
– Quem é você? O que diabos está
fazendo aqui? – Já tinha colocado a mão
no telefone da sala e meus dedos
estavam prontos para ligar para a
polícia quando ouvi a voz feminina:
– Ele é meu motorista.
Virei assustada.
Tinha os cabelos grisalhos presos em
um coque perfeito. A saia preta escura e
a alinhada blusa branca gritavam
“Carolina Herrera”. Usava um colar de
pérolas que deveria estar na casa das
centenas de milhares. Seu perfume era
discreto e seu olhar, duro.
– Sou Eleanor Baxter. E nós duas
precisamos conversar.
Capítulo 19
“Sua pequena hipócrita. Não se
incomoda que eu saiba. Só se incomoda
que eu fale.”

Rhett – E o vento levou

Engoli a seco e fiquei congelada no


meio da sala com o telefone nas mãos.
Diz alguma coisa, Dominique.
Ajudei o motorista a se levantar.
– Ahm… Peço desculpas, senhora
Baxter. E senhor…
– Pode me chamar de Boe. – Ele
bateu as mãos na calça, arrumando o
tecido abarrotado, e moveu o braço que
deveria estar dolorido.
– Boe, Perdão. Não sabia que a
senhora viria hoje. Holt não disse nada.
– Gregory não sabe que estou aqui. –
Ela pronunciou o nome dele de um jeito
estranho.
– Não sabe? Mas como a senhora
conseguiu a chave?
– Eu tenho a chave de todas as casas
de Gregory.
– Tudo bem. – Tentei não deixar a
confusão transparecer no meu semblante.
Aquilo era muito estranho. – Eu não
sabia disso.
– Claramente. Há muitas coisas sobre
a nossa dinâmica familiar que a
senhorita desconhece.
– Tudo que Holt mencionou é que não
era muito próximo da senhora. – Eu
estava tentando manter minha recém-
descoberta educação, mas ela estava
começando a me irritar. – Não tinha
como imaginar que a senhora teria a
chave de sua casa nessas circunstâncias
e…
– Não vim até aqui falar de mim,
senhorita Thoen. Se precisasse falar
sobre mim, procuraria um profissional
caro e especializado, não a senhorita.
Vim até aqui para falarmos sobre você.
Eu não ia gostar dessa velha.
Não ia mesmo.
– Sobre mim? – meu tom autoritário
veio ao meu resgate e estava firme como
sempre.
– Observo com cuidado todas as
garotas com quem Gregory se envolve.
Na maior parte das vezes não passa de
algum relacionamento bobo. Tenho que
confessar que nunca precisei intervir
antes. Até agora.
– Intervir?
Odiar…
Eu ia odiar a velha.
– Não é bom para Gregory ir até
aquele lugar horrível e ver Audrey
naquela situação. – Ah, então era isso? –
Quando a senhorita voltar… – Ela
gesticulou com superioridade na minha
direção como se estivesse buscando
palavras que não fossem muito
ofensivas – … de onde quer que tenha
saído, sou eu quem vai ter que resolver
os problemas de Gregory. Então, peço
educadamente que evite criar situações
que possam ser constrangedoras no
futuro.
Educadamente?
– Só achei que ele deveria ver a mãe.
– Achou, não foi? Tenho certeza de
que tudo é muito simples de onde você
vem. – Por que eu sentia tanto nojo na
sua voz sempre que ela falava da minha
origem? – Mas uma família no padrão
da nossa precisa agir de acordo com
certos códigos de conduta que são além
da sua compreensão. Gostaria que
acreditasse na minha palavra quando
digo que é ruim para Gregory ter contato
com aquela mulher.
– Aquela mulher? – Eu estava ficando
indignada – Ela é sua filha.
– Sei muito bem o que ela é, senhorita
Thoen. – Levantou-se do sofá e eu notei
que mesmo sendo bons centímetros mais
baixa do que eu, ela parecia imensa.
Parecia colossal. Era quase como se sua
presença ocupasse a sala inteira e não
deixasse espaço nem para o ar. – E sei
muito bem o que a senhorita é, também.
– Sabe o que eu sou? – Não
importava quão grande ela fosse, eu
estava com raiva.
– Não faça análises sobre minha
família que são obviamente aquém de
seus ínfimos conhecimentos. – Ela
estava me ignorando.
– A senhora pode, por favor, me dizer
o que sabe quem eu sou?
Ela estava séria, mas eu sentia a
alegria em seus olhos. Greg estava
certo: ela era uma vadia oitenta vezes
pior do que eu.
– Peço desculpas. Não quis ofendê-la.
– Havia algo de peçonhento em suas
palavras e eu senti que estava pisando
em vidro – Começamos do jeito errado.
Acabo sendo possessiva quando o
assunto é a minha família. Pode me
perdoar?
– Claro – respondi azeda e sem
nenhuma convicção.
– Ótimo. Dominique… Posso chamá-
la de Dominique? – Ela não me deixou
responder – Vamos começar de novo.
Por que não me diz o que quer?
– Perdão?
– O que você quer? Com Gregory?
Quais são suas intenções?
“Fodê-lo até não conseguir mais” não
me pareceu um comentário apropriado e
“Estou apaixonada” não me pareceu ser
da conta dela.
– Isso é bastante pessoal, sra. Baxter.
– Querida, quando se é uma das oito
famílias mais ricas do mundo, não existe
pessoal. Tudo que Gregory faz é, e tem
que ser, público.
– Acho que ele não vê as coisas
assim.
– Ele está tendo um período rebelde.
E queremos evitar que continue assim,
não é?
– A senhora vai precisar me
desculpar, sra. Baxter, mas não estou
entendendo o motivo da sua visita. Veio
ver seu neto?
– Não. Eu já disse, criança, será que
não tem boa memória? Vim falar com
você.
– Pois então fale – rosnei com os
dentes semicerrados. A vadia tinha me
chamado de criança?
– Vamos ser objetivas? Tudo bem. O
que você quer?
– COMO ASSIM? – Minha paciência
estava indo embora em uma velocidade
arrebatadora.
– Você está com Gregory.
Claramente, quer alguma coisa.
Trabalhou com ele por muitos anos e
não tiveram qualquer amizade. Assim
que ele se muda, você o segue e o
seduz… Descobriu recentemente que ele
era um Baxter? Foi isso?
– O que está querendo sugerir? E eu
teria cuidado com as palavras se fosse a
senhora.
– Eu sempre tenho cuidado com as
palavras. Ao contrário de você, não
posso me dar ao luxo de ser vista em
situações inapropriadas. – Engoli a seco
sem saber se haveria um duplo sentido
em suas palavras – Você seguiu Gregory
até aqui, quando ele finalmente estava
voltando para casa, e se tornou um
empecilho no seu desenvolvimento.
Prendendo-o ao passado e coisas do
gênero. Minha pergunta é: o que você
quer com ele? Você é uma mulher
ambiciosa e inteligente, Dominique. É
claro que quer alguma coisa. Só quero
que me diga o que, e eu garanto que será
dado. Se aceitar meus termos, é claro.
– A senhora está querendo me dar
dinheiro para que eu vá embora? É isso?
– Se dinheiro for o que você quer. –
Enfiei as mãos no cabelo. Aquela
mulher era louca e estava me ofendendo
com cada suspiro – Mas se for contatos,
poder ou alguma posição o que busca,
tenha certeza de que isso também pode
ser arranjado.
– E se eu gostar do seu neto? Já
pensou nessa possibilidade?
– Não me faça rir – expirou, em tom
de ultraje – Uma mulher como você?
Encontraria Gregory e se apaixonaria? É
essa a história que você quer vender,
mocinha? Porque eu aviso desde já que
não vou comprar.
– Acha que não há nada no seu neto
que valha a pena para uma mulher?
– Há muitas coisas nele que valem a
pena. Mas para a mulher certa.
Mulheres erradas sentem o cheiro do
dinheiro primeiro.
– Mulheres erradas? – ri, irritada.
Era na jugular dela que eu devia ter
enfiado a mão.
– Eu conheço sua história. – Ela se
aproximou e eu me odiei por ter dado
um passo para trás. Mas havia algo ao
seu redor que parecia queimar. – Seu
pai era um lavador de chão, sua mãe é
uma golpista que casou com quantos
conseguiu. Você subiu muito na vida. É
uma garota determinada e sem medo de
trabalho. Isso eu admiro. Mas só chegou
aonde chegou por saber reconhecer uma
oportunidade quando a encontrava. E um
herdeiro Baxter é uma oportunidade
incomparável. Ninguém a condenaria
por ter imaginado que talvez sua mãe
estivesse certa: um casamento podia
levar uma pessoa bem longe. E um
casamento com um Baxter! – Arregalou
os olhos e bateu uma mão na outra, antes
de ficar séria como a morte. – Mas uma
coisa eu te prometo, querida: você
nunca, nunca, vai entrar para essa
família. É uma possibilidade que não
existe. Eu lhe dou minha palavra, e eu
nunca a quebro. Então, seja lá o que
você quer com Gregory, sua única
chance de tê-la é sendo honesta comigo,
agora. Diga o que você quer e
poderemos chegar a um acordo. Você
passa mais uns dias aqui. Abre suas
pernas para ele, o mantém longe daquele
asilo e negócio fechado. – Abri minha
boca enojada e quis esbofeteá-la. Era
possível que ainda fizesse isso antes de
ela ir embora. – Não faça essa cara de
sonsa. Ultraje não é uma expressão que
combina com seu tipo de mulher.
– E que tipo de mulher eu sou?
– Do tipo baixa – explicou
pausadamente. – Do tipo que usa blusas
sem metade dos botões para chamar a
atenção dos membros sexuais
masculinos.
Olhei para baixo sem entender.
Merda.
Os botões que tinham caído quando
Holt arrancara minha blusa.
Acho que dizer que ele tinha me
fodido no escritório era a última coisa
que ela precisava saber naquele
segundo.
– A senhora não me conhece – decidi
falar, usando a última gota de calma que
ainda me restava.
– Devo entender que prefere não
aceitar minha proposta?
Eu queria dizer com todas as letras
onde ela devia enfiar a proposta.
– Pode levar sua proposta com você.
Eu estou bem, obrigada.
– A decisão é sua – sorriu maliciosa
– Mas devo dizer que foi uma péssima
decisão, da qual você vai se arrepender
bastante. Vou me certificar disso.
Ela foi embora sem dar tchau, adeus,
ou até logo.

Me arrumar para sair com Andy


estava se tornando uma tarefa
impossível. A visita da matriarca Baxter
ficava girando em minha mente. Ela
achava que eu estava com Holt por
causa de dinheiro. O pior é que, quando
se analisava a história da minha vida e
do meu relacionamento com Greg, sua
opinião fazia bastante sentido.
Talvez se eu conseguisse convencê-la
de que não era esse tipo de gente ela me
deixasse em paz.
Mas também, ela que se danasse. Não
lhe devia nada e era uma mulher adulta,
responsável pelas minhas próprias
decisões.
O problema era que algo na sua
promessa tinha feito os pelos do meu
corpo inteiro se eriçarem, e eu tinha
ficado as horas seguintes inteiras com
essa sensação.
– Shelbi tem que ir com a gente.
Merda. Tinha esquecido dessa parte.
– Ela não melhorou?
– Um pouco. Mas não é bom deixá-la
sozinha…
Coloquei minhas mãos na nuca e
joguei minha cabeça para trás. Fechei os
olhos. A familiar enxaqueca estava
surgindo mais uma vez.
– A gente pode deixar para ir outro
dia.
Se metade das ameaças de Eleanor se
concretizasse, talvez eu não durasse
muito tempo naquela vizinhança, e não
queria deixar Andy semivirgem.
– Não! A gente vai hoje. E a gente
leva a Shelbi.
– Mas o que a gente faz com ela?
Você fica de olho nela quando eu…
Sair?
– A gente arruma alguém pra ela.
– Como? Ela não está em um clima
bom.
Cocei a cabeça. Será que eu conhecia
alguém naquela cidade que pudesse
apresentar para Shelbi? Talvez
conseguisse arranjar alguém para ela no
bar. Ela não era uma mulher espetacular,
mas era bonita. E poderia ficar bem
charmosa quando se arrumasse. Só
precisava de um pouco de
autoconfiança, e reduzir o nível das
brincadeiras bobas.
– Ela não vai querer sair.
– A gente não vai dar opção para ela,
Andy. Onde ela está?
Ela fez um gesto com a mão me
convidando para entrar. Andy estava
incrivelmente bonita na roupa nova.
Andava nos saltos de um jeito meio
desajeitado, mas quando ela sentasse no
bar, ninguém ia notar.
– Shelbi?
– Não me incomodo! – respondeu,
nervosa, e eu percebi que ela e Andy já
deveriam estar discutindo aquele tema
há algum tempo – Vocês podem ir sem
mim. Eu fico aqui. Prometo que não faço
nenhuma besteira. Não vou ligar para
Eric ou falar com ele… Ele não vai
saber o que estamos fazendo. Eu juro.
– O problema não é esse, Shelbi.
Quanto antes você aceitar e continuar
com a sua vida, melhor. Você vai sair
com a gente para se divertir. Vai tomar
uns drinques, vai rir, conversar e se
algum gato der em cima de você, vai
ficar com ele.
– Mas eu não quero. Eu ainda sou
casada…
– Se não quiser, tudo bem. Mas não
por você ser casada. Você está
separada, mesmo que seu marido ainda
não saiba. E ele já te traiu centenas de
vezes, Shelbi. Trair ele, nem que fosse
uma vez só, ia te fazer se sentir melhor.
– Mas não vou, está bem? Eu até fico
lá sentada com vocês. Mas não quero
fazer nada além disso. Tudo bem?
– Tudo bem. Você só faz o que quiser.
Mas meu amigo vai ficar muito
decepcionado.
Shelbi olhou para mim com olhos
esperançosos. Era horrível para uma
mulher como ela não se sentir querida.
Ser paquerada era tudo o que ela
precisava.
– Que amigo? – Andy quis saber.
É, Dominique, que amigo?
– Um amigo. Vocês vão conhecê-lo
quando chegarmos ao bar.
Merda.
Eu não conhecia ninguém.
Só Devon Hill. Mas ele seria a pior
ideia possível. Nunca me faria esse
favor e, mesmo que fizesse, era o pior
homem na Terra para se ficar em débito.
Quais outros homens eu conhecia
naquela cidade? Só Rick, Thierry,
Calvin… O casal gay e os pirralhos da
rua não iam servir. Tinha Holt, mas esse
de jeito nenhum. Eric não servia,
obviamente.
Quem mais, Dom? Quem mais você
conhece?
Era minha primeira vez naquela
cidade e fora o pessoal da vizinhança,
eu não conhecia ninguém. A não ser o
funcionário da lavanderia e o médico.
O médico!
Puta que pariu! Como não pensei
nisso antes?
Eu tinha o cartão dele!
– Você está sendo muito misteriosa,
Dominique.
– Eu sei. Mas ele é um bom partido.
Vale a pena. Vou voltar em casa e pegar
uma roupa emprestada para a Shelbi.
Vamos deixá-la sensual. E bote
maquiagem nessa cara, garota. Você não
vai sair com esse rosto lavado!
Andy fez um muxoxo estranho e eu
entendi imediatamente.
– Você não tem maquiagem suficiente,
não é?
– Acho que um batom ou…
– Eu trago a maquiagem também.

Eu vestia calça jeans e regata preta.


Prendi o cabelo em um rabo de cavalo,
coloquei um par de sapatos de salto
médio, brincos discretos, pouco perfume
e quase nenhuma maquiagem.
Andy e Shelbi queriam me engolir
porque eu não as deixei se vestirem tão
casualmente. Eu sabia que era algo
horrível de dizer, e por isso não disse,
mas se eu me produzisse para valer, era
pouco provável que homens se
aproximassem querendo falar com elas.
O homem loiro acenou para nós assim
que entramos no bar.
– Dr. Henris – cumprimentei.
– Tristan! Por favor, só sou doutor no
hospital – brincou com um sorriso
sensual.
– Essas são minhas amigas, Andy e
Shelbi.
Elas sorriam um pouco demais, não
sabiam onde colocar as mãos,
prolongavam todo e qualquer silêncio
constrangedor e eu me peguei rindo.
Como algo podia ser tão natural para
mim e tão assustador para aquelas duas?
– Vão beber alguma coisa?
– Eu preciso ir ao banheiro. – Andy
se levantou e eu tive certeza de que ela
queria ver se a maquiagem tinha
borrado. Se tornou uma obsessão desde
que eu tinha terminado de passar a
máscara para cílios. Ela tinha certeza de
que estava com uma mancha negra no
rosto e não importava quantas vezes eu a
mandasse calar a boca, Andy
simplesmente não me obedecia.
Shelbi a seguiu com um leve toque de
paranoia e eu quase gritei para que ela
ficasse e conhecesse o homem a quem eu
queria lhe apresentar.
Mas elas se foram e eu fiquei sozinha
com Tristan. Acompanhei com o olhar
minhas duas amigas desajeitadas
andarem entre as mesas até o lado
oposto de onde o banheiro feminino
estava e fazendo o caminho de volta
assim que perceberam que estavam
erradas. Andy acenou quando passou
pela mesa mais uma vez e eu senti o
desconforto no seu sorriso. Ai meu
deus…
Ri e voltei a atenção para o médico.
Peguei seus olhos enfiados no meu
decote. Ele levantou a cabeça, tentando
disfarçar. Pena que eu não sou idiota.
– Obrigada por ter feito essa
gentileza, Tristan.
– Não foi nada. – Ele estava sorrindo
daquele jeito sedutor que os homens
sorriem quando flertam. Em qualquer
outra situação, eu estaria espremendo
meus seios com os braços para
aprimorar sua vista e arranjando uma
desculpa para tocá-lo. Mas naquele dia
eu só olhei ao redor e pedi ao garçom
que trouxesse um suco de laranja.
– Nada de álcool para você hoje?
Alguns homens fazem isso… Tentam
te embriagar para facilitar o trabalho. Eu
nunca fui uma dessas mulheres. Já fingi
que estava bêbada em uma situação ou
duas para transar com um homem
gostoso que eu não tinha nenhuma
intenção de ligar no dia seguinte. Mas
nunca tinha ido para a cama de ninguém
efetivamente bêbada. E, bêbada ou
sóbria, nunca tinha levado ninguém para
minha cama.
Aquele pensamento flutuou no ar. Era
verdade: Nenhum homem conhecia
minha casa. Talvez Holt pudesse ser o
primeiro. Ou talvez sua avó mandasse
me matar e me enterrasse no quintal de
sua mansão antes que eu pudesse
convidá-lo.
– Não. Hoje, eu vim de babá.
– Deve ser a mais bela babá que eu já
vi.
– Você é muito gentil. – Meu tom foi
quieto e polido. Do tipo que diz
“obrigada pelo elogio, mas, por favor,
não o repita”.
– Como estão os machucados?
– Muito bem. – Fiz uma breve
reverência – Meu médico é muito
competente.
– Agora é você quem está sendo
gentil. – Aquele diálogo estava se
aproximando demais de um flerte e eu
não queria lhe dar a ideia errada.
– Obrigada por ter aceitado conhecer
a Shelbi. – Eu sabia que não era isso
que ele tinha aceitado. Ele só tinha dito
sim porque queria me fazer um favor e
me ver nua até o fim da semana. Talvez
eu tenha deixado essa possibilidade no
ar quando liguei pra ele, ainda em casa,
mas era apenas porque eu realmente
precisava que ele viesse. A única coisa
que ele ia ganhar de mim era um “muito
obrigada”.
– Qual é a história, por sinal?
– Ela está se divorciando. Já está
separada. Aí resolvemos sair para um
pouco de diversão.
– E por que eu estou aqui? – O
garçom chegou com o meu suco e eu
coloquei o copo nos lábios – Quero
dizer… Por que convidar um garoto
para uma noite só de garotas?
– Achei que Shelbi precisava
conhecer alguém. Ela anda com a
autoestima muito baixa. Alguns elogios
não vão fazer mal.
– Justo. Bem, estou aqui para servi-
las.
– Obrigada.
– Mas depois você fica me devendo
um jantar.
– Ah… – engoli a seco. Seus olhos
castanhos me perfuraram.
– Eu estou aqui só para conhecer a
Shelbi, não é? – Espremeu os lábios,
resignado.
– Sinto muito se te dei outra
impressão, Tristan. Eu não… Não estou
disponível.
– Entendo. – Deu um gole na sua
bebida – É claro que não está – riu –
Não sei por que diabos imaginei que
estivesse. Para você ser solteira, todos
os homens do universo teriam que ser
imbecis.
– Você não me conhece – brinquei. –
Talvez eu seja uma pessoa horrível.
Ele encheu o peito como se fosse me
fazer mais algum elogio, mas nossas
acompanhantes chegaram e se sentaram.
Tristan desistiu do que quer que fosse
falar e realmente se concentrou em
Shelbi. Parecia ser um homem bom.
Elogiou sua roupa e seus olhos. Ela
sorriu envergonhada e coube a mim e a
Andy quebrar o gelo repetidas vezes.
Mas logo os dois acharam um ponto em
comum conversando sobre viagens pela
Europa e eu pude me virar para Andy e
sussurrar:
– Certo, virgem. Sua vez.

– Entre – convidei quando ouvi duas


batidas firmes na minha porta. Ainda
estava com os olhos no computador
quando ouvi uma voz conhecida.
Conhecida até demais.
– Gregory?
Levantei meu olhar em descrença.
– Eleanor? O que está fazendo aqui? –
Ela ia dizer alguma coisa, mas eu
levantei a mão. – Não. Não precisa nem
dizer. Acho que já estava esperando
que, mais cedo ou mais tarde, você fosse
aparecer.
– Não seja assim. – Ela tinha uma
doçura na sua voz que se misturava com
uma quantidade ideal de firmeza. – Você
é meu neto. Uma avó não pode sentir
saudades do neto?
– Pode. Mas você não é assim e nós
dois sabemos.
– Não ganho nem um abraço? – Ela
levantou uma sobrancelha para mim.
Inferno… Eu gostava dela. Gostava
um bocado. Se alguém nesse universo
tinha me mimado era aquela mulher bem
ali. Eu tinha ressentimentos acumulados
por milhares de coisas que ela tinha
feito. Mas ao mesmo tempo, ao longo de
toda a minha vida, era com quem eu
mais me identificava.
Atravessei a sala e lhe dei um abraço
educado e sem muitas emoções.
– O que quer, Eleanor? – belisquei
sua bochecha. – E eu sei que quer
alguma coisa, então não minta pra mim.
– Estou preocupada.
– E não é sempre assim?
– Estou falando sério, Gregory.
– Não voltei para cá porque quero
voltar para a empresa. Voltei por outros
motivos e não pode dizer nada para
mudar disso. Entende?
– Não entendo. Mas aceito. – Pousou
uma mão no peito, resignada. – Não vim
por isso. Passei na sua casa hoje.
Esperava encontrá-lo. Mas em vez disso
encontrei uma moça bastante desbocada.
– Ela pareceu ofendida e eu tive que
segurar o riso de desespero. Então, ela
tinha conhecido Dominique? Fantástico.
Estava aí um encontro fadado ao
desastre.
– Não seja cruel, Eleanor. Eu gosto
da moça.
– Ah, Gregory! Não diga isso! Você
não sabe o que é gostar. – Agora era ela
quem beliscava minha bochecha.
– Escute…
– Eu vi as curvas que a moça tem. –
Seu tom era sugestivo o suficiente, mas
ela acrescentou uma expressão de
obviedade que não deixava dúvida
sobre suas intenções – E você é um
homem. E mais que um homem: um
Baxter. Baxters são perigosos! – riu. –
Têm as mulheres que querem. E eu
entendo: você é jovem e ela é atraente.
Mas, por favor, não confunda as coisas.
– A senhora não pode tomar esse tipo
de decisão por mim.
– Eu sei. Mas posso vir aqui e tentar
lhe abrir os olhos. Veja a história de
vida dessa jovem! Ela parece o tipo que
recusaria uma oportunidade de se
aproximar de um Baxter? Ela parece o
tipo que não faria de tudo para crescer
na vida?
Dominique era como a Scarlett
O’Hara que ela tanto amava. Isso eu
sabia além de qualquer dúvida: era
inteligente e ambiciosa, fazia o que
precisava ser feito para atingir seus
objetivos. Sempre foi assim. Mas ela
nunca precisou de ninguém para isso.
Estava se saindo muito bem sozinha e
mantinha todos que conhecia a uma boa
distância. Me usar apenas para sexo e
dinheiro nunca me pareceu estar em sua
lista de afazeres. Para vingança,
talvez… Mas por sexo e dinheiro, não.
– Eu posso ter poucas certezas na
vida, Eleanor, mas uma certeza que eu
tenho é de que Dominique não precisa
de homens para o que quer que seja.
Seja qual for seu sobrenome. E… – uma
ideia tomou conta da minha mente e eu
estava lívido. – Você não sugeriu isso
pra ela, sugeriu? Que ela estava comigo
por dinheiro?
– Queria ter certeza de que ela sabia
que tem alguém olhando por você. Com
um olhar objetivo!
Ótimo.
Maravilhoso.
Tinha um animal feroz me esperando
em casa então.
– Não gosto que se meta na minha
vida, Eleanor! Quantas vezes vou
precisar lhe dizer isso?
– Pelo menos mais uma. Como
sempre. E você fala como se eu
mantivesse você na coleira, Gregory!
Faz alguns anos que não tenho uma
notícia sua. Uma notícia de verdade.
Meu olhar ordenou que ela dissesse a
verdade.
– Não tenho! – repetiu.
– Quer mesmo que eu acredite que
não tinha ninguém me observando para
você? Já trabalhei na Baxter, Eleanor.
Sei muito bem como as coisas
funcionam.
– Tudo bem. Tudo bem. – Ela
levantou as mãos como uma oferta de
paz. – Você é meu neto, Gregory. E o
último Baxter!
– Você fala isso como se eu fosse
uma espécie em extinção.
– E não é?
– Não seja ridícula.
– Essa moça não é coisa boa. Não
precisa acreditar em mim agora. Só
preciso que fique atento. Ah, Gregory!
Prometa que vai ficar atento!
– Vou ficar atento, está bem?
Ela respirou como se estivesse
profundamente aliviada.
– Fico mais tranquila assim.
– Você não conhece a Dom. Ela não é
nada como você imagina.
– Espero que você esteja certo.
– Estou. Vou dar uma festa na minha
casa amanhã. Só alguns vizinhos e
amigos. Por que a senhora não vem?
Assim a conhece melhor. – Não, não,
não, Greg. Péssima ideia.
Droga…
– Posso levar alguém? – sorriu.
Ah, porcaria. Mas agora era tarde
demais, não era?
– Pode. Mas tem que prometer que
vai se comportar.
– Qualquer coisa por você, querido.

– Tem camisinha na bolsa?


– Dominique! Eu não vou fazer isso…
Não posso. Mudei de ideia.
– Andy! Não pode ficar mudando de
ideia a cada três segundos. Ou você está
pronta para fazer isso de novo ou não
está.
– Não estou! – resmungou.
– Não estar pronta e estar com medo
são duas coisas diferentes.
– Eu estou com medo de não estar
pronta.
– Ah, garota! Você já não perdeu a
virgindade? Ainda tem tesão? Se
masturba? Pensa em um cara enquanto
faz isso?
– Sim… – respondeu tímida.
– É a mesma coisa. Só que com uma
pessoa viva. Não precisa ter medo. Se
está pronta, vai lá e faz! Não vou falar
mais nada, me ouviu? Você não pode
fazer isso forçada e eu não vou te forçar.
A decisão é sua.
A ideia de que ninguém mais iria
pressioná-la a fazer aquilo, parecia ter
dado uma dose intravenosa de coragem
a Andy. Parte dela parecia estar
esperando que eu a empurrasse em cima
de um homem. Mas quando eu disse que
não ia fazer aquilo, ela percebeu que a
vontade ainda estava lá. E, agora, só
dependia dela.
– Aquele cara ali é lindo.
– Aquele cara ali é areia demais para
você.
– Você é muito grossa.
– Eu sou muito realista. Agora, cala a
boca e presta atenção. Aquele outro cara
ali, no bar, está te encarando há algum
tempo.
– Está?
– Não se vira assim, sua retardada!
– Tá. O que eu faço?
– Você vai até lá e deseja boa noite.
– E depois?
É… E depois? Eu não sabia. Ou
melhor, não sabia como ensinar. É tão
simples e natural. Ele vai sorrir e
desejar boa noite ou vai cumprimentá-la
de um jeito apático. Dá para sentir no
sorriso. E aí ou você pergunta se pode
se sentar ou só finge que queria algo no
bar e vai embora. Mas como dar anos de
experiência para Andy?
– Você gosta de arte. Escultura, essas
coisas… não é?
– O que isso tem a ver?
– Responde, menina! Me obedece! Já
não notou que eu sei mais dessas coisas
do que você?
– Tá. É! Gosto!
– Você já fez alguma aula de teatro na
vida?
– Já! Algumas em um lugar chamado
Empório 3! Se você quiser, eu posso…
– Andrea. Cala a boca. Presta
atenção.
– Olha, dá pra você ser menos
grossa?
– Não, não dá. Foco, fedelha! Presta
atenção. Você sou eu.
– Hein?
– Você sou eu. Esse é o seu papel.
Vai até lá e finge ser eu. Aja como eu
agiria. Pense como eu pensaria. Quer
dizer… Não exatamente, obviamente.
Mas tente entrar no papel de uma mulher
segura, gostosa e poderosa.
– Você é bem humilde, hein?
– Estou tentando te ajudar, mas você
não está facilitando.
– Não sei se consigo.
– Não precisa conseguir. Se fizer
merda, é só virar as costas e a gente vai
para outro bar. Nunca mais precisa olhar
para esse cara na vida.
Seus olhos brilharam e a ideia de que
errar era aceitável deu uma nova rodada
de confiança para o meu pequeno
experimento científico.
– É só chegar lá e desejar boa noite?
– Sorria, pergunte se pode sentar na
cadeira perto dele. E tente não ficar
desesperada! Preste atenção no que ele
vai dizer e no que vai fazer. Se ele
disser que você pode sentar de qualquer
jeito pode ser que não esteja
interessado, então não force. Mas se ele
ficar te observando, se for convidativo,
aí é porque ele está a fim e você vai
com força.
– Vou com força de quê? Para onde?
– Ela estava triplamente nervosa.
– Vai para um motel. Não vai para a
casa dele. Você não o conhece. E não
vai para a sua casa porque você não
quer que um desconhecido saiba onde
você mora. E quando estiver no carro
dele ou no táxi, mande uma mensagem
de texto para mim dizendo onde você
está.
– Por quê?
– Porque se ele te matar eu tenho
alguma pista para dar pra polícia.
– Ah! Dominique! – Ela ia chorar.
– Eu estou brincando! Quer dizer,
mais ou menos, manda a mensagem de
texto. Agora, repete para mim.
– Desejar boa noite, pedir pra sentar,
prestar atenção, ir com força para um
motel e mandar uma mensagem para
você.
– Tem camisinha?
– Tenho.
– Toma mais umas. – Abri minha
bolsa e tirei mais três pacotes de dentro.
– Quantas vezes eu vou transar com
ele? – Ela me olhou assustada dada a
quantidade infinita de preservativos que
eu a estava fazendo levar.
– Provavelmente só uma. Mas você
vai rasgar umas oito camisinhas antes de
conseguir colocar uma direito.
– Eu vou ter que colocar? – Ela
parecia em choque. – Da última vez o
cara fez isso.
– Da última vez? – Levantei uma
sobrancelha para ela – Você quer dizer
da única vez. – Ela me ofereceu uma
careta como resposta – Pode ser que ele
faça. Pode ser que ele te peça. Nesse
caso, você coloca.
– Ai! Eu devia ter prestado atenção na
banana. – Ela colocou a mão na testa e
falou mais para si mesma do que pra
mim.
– Que banana? Ô garota, você não tá
alucinando, tá?
– A banana! Na aula! Uma enfermeira
foi na escola mostrar e eu achei ridículo
e não prestei atenção.
– Você não sabe como colocar uma
camisinha? É isso?
– Mais ou menos.
– Não tem mistério. Coloca na ponta
do pênis dele, espreme a pontinha com
seu polegar e o indicador assim –
gesticulei –, e vai desenrolando o resto
pra baixo.
– Por que tem que espremer a ponta?
– Porque se não pode juntar ar, aí
quando ele goza a borracha estoura e
não adianta nada.
– Mas pode entrar um pouquinho de
ar? Ou não pode entrar nenhum? – Ela
estava tão tensa que eu podia cortar seu
nervosismo no ar com uma faca.
– Não pode entrar nenhum ar. É por
isso que as camisinhas são vendidas
com aquele aparelho de sucção a vácuo
para você acoplar na borracha.
– Que aparelho? Da última vez não vi
isso! Ai meu deus, eu não comprei isso!
Revirei os olhos:
– Quando eu fui na farmácia não tinha
isso! O que eu faço?
– Garota, você está merecendo um
tapa. Foi uma piada, imbecil! É claro
que pode entrar um pouco de ar. Você
espreme a ponta só pra evitar que entre
muito.
– E eu fico por cima ou por baixo?
– Fica por baixo. Você não ia saber o
que fazer em cima.
– E as preliminares? O que eu faço?
– Você o beija, em vários lugares
diferentes. Passa a língua no peito dele.
Esfrega as unhas no pênis e passa a mão
nos testículos. E deixa ele pegar em
você onde ele quiser.
– Certo. E se ele fizer algo que eu não
quero?
– Você diz que não quer. Se ele não
parar, você finge que está gostando,
desce a mão até o saco dele e aperta
como se estivesse espremendo o suco da
laranja. Isso vai te dar uns dez minutos
de vantagem para pegar o dinheiro que
ele tiver na carteira, suas roupas e
correr.
– O dinheiro dele? Sério?
– O filho da puta tentou te estuprar?
Seríssimo.
– Tudo bem. – Ela encarou o vazio e
eu soube que ela estava tentando
processar a infinita quantidade de
informações.
– Você vai ficar bem. – Coloquei
minha mão em seu ombro, tentando
acalmá-la. – E se mudar de ideia,
espreme o saco dele e liga para mim que
eu vou te buscar.
– É bom mesmo. Você está com o meu
carro – sorriu.
– Tudo bem. Vai lá e arrasa.
– Boa noite – sorri constrangida. Não
acredito que Dominique tinha me
convencido a fazer isso. Olhei para trás.
Ela estava me olhando com um fogo nos
olhos e senti que, se voltasse para lá
sem ao menos tentar, ela ia me bater.
– Boa noite. – Ele tinha um sorriso
lindo. E estava sorrindo para mim.
Achei que fosse derreter. Minhas pernas
iam parar de funcionar, minha boca ia
parar de mexer. Aquilo tinha sido uma
péssima ideia! Eu não ia conseguir!
Segue o plano, Andy… Só segue o
plano.
– Posso me sentar aqui?
– Claro. – Ele puxou a cadeira para
mim.
Mas eu não prestei atenção. Quer
dizer, não sabia se tinha atenção. Ele
tinha sido convidativo? Ou só estava
sendo educado? Puxou a cadeira para
ser romântico ou achou que eu tinha
alguma deficiência? Olhei para
Dominique mais uma vez e ela levantou
um indicador raivoso para mim,
mandando que eu parasse de olhar para
trás e prestasse atenção no homem na
minha frente.
Eu queria fazer aquilo.
Queria muito.
Mas nunca soube como. E mesmo com
todo o mapa que Dominique tinha
desenhado, ainda era difícil. Eu estava
anos atrasadas em uma área de
conhecimento que todo o resto da
população na minha faixa etária parecia
ter nascido sabendo. Como
Dominique… Ela simplesmente entendia
e fazia funcionar.
Claro, era fácil para ela, com aquele
rosto e aquele corpo. A maldita tinha
vindo com calça jeans e uma camiseta
vagabunda e quando ela levantou da
mesa para ir ao banheiro, tenho certeza
de que dois terços da população
masculina do lugar tinha se virado para
ver sua bunda passeando.
Enquanto eu… Eu tinha que pintar o
cabelo de azul para conseguir chamar
alguma atenção. Percebi bem cedo que
as pessoas não me notavam. Nenhuma
delas. Eu era a garota que todo mundo
conhecia e esquecia dois segundos
depois de eu ter ido embora. Depois da
tintura, eu era, pelo menos, “aquela
menina do cabelo azul”. Isso era melhor
do que ser imediatamente esquecida.
– Sou Leo. – Ele me ofereceu uma
mão. Eu a apertei devagar e depois
comecei a arrumar meu cabelo atrás da
orelha. Pisquei o olho algumas vezes e
senti algo escorrendo no meu rosto. Ah,
droga! Se a maquiagem estivesse
escorrendo eu ia ficar ridícula e nojenta
em segundos.
Dominique já tinha me garantido
repetidas vezes que era só a minha
imaginação. Mas sempre que eu sentia
aquela coisa estranha no meu rosto a
dúvida voltava e, com ela, o desespero.
Eu queria ser segura como Dominique.
Respirei fundo e tentei pensar no que ela
pensaria. Tentei pensar no que ela diria.
– Tudo bem com você? – ele quis
saber. Pelo seu sorriso, tive certeza de
que ele estava achando minha timidez
engraçada. Balancei a cabeça
afirmativamente, incapaz de colocar
ordem nas palavras.
Pensar no que Dominique faria era
impossível. Ela só olharia para ele e
diria “estou com tesão. Vem comigo”. E
ele obedeceria sem questionar. Eu não
podia fazer a mesma coisa.
– Qual é o seu nome?
Vai, Andy. Diz alguma coisa.
– Dominique – respondi, antes que
pudesse me controlar. – Dominique
Thoen.
– Prazer.
– Não. O prazer é meu.
AAhhhhh!! Aquilo era ótimo.
Eu podia ser a Dominique, não podia?
Podia dizer o que eu quisesse e o mundo
que se fodesse. Eu era a mulher mais
gostosa do bar e ele tinha sorte por estar
falando comigo. É, ia ser assim.
– O que te traz aqui essa noite?
– Você – respondi e mordi o lábio.
Doeu e eu imaginei que tivesse mordido
forte demais. O jeito sensual não era
assim, era? Eu estava fazendo do jeito
errado.
– Que bom. Porque acho que eu vim
por sua causa também.
Comecei a sorrir e toquei seu braço.
Certo. Eu consigo fazer isso.
Com Shelbi e Andy encaminhadas, eu
terminei de beber meu terceiro copo de
suco de laranja no canto do balcão.
– O que há de errado com você?
– Como é? – Só não virei pronta para
mordê-lo porque ouvi o tom de paquera
em sua voz. Era alguma cantada pronta
que eu ainda não tinha ouvido.
– Não quis ofendê-la. Mas uma
mulher linda como você, sentada aqui,
sozinha, no canto do bar… Não me
parece certo. A não ser, é claro, que
haja algo muito errado com você.
– Trabalho com microbiologia.
Tivemos um acidente no laboratório
com uma lâmina contaminada e eu não
me sinto muito bem em ficar tão perto de
outras pessoas. Eu posso ser contagiosa.
Eu conseguia notar que ele estava na
dúvida se ria ou se me levava a sério,
então resolvi acabar com sua dor.
– Só vim acompanhando umas amigas.
– Ah. Não está interessada em
conhecer ninguém hoje?
– Não, obrigada.
– Pode acabar se surpreendendo.
– Querido – bebi o último gole de
suco e me levantei do banco –, quando o
assunto é meu relacionamento com
homens, geralmente são eles quem se
surpreendem.
O deixei para trás com o queixo caído
e peguei o carro de Andy para voltar
para casa.
A mensagem de texto de Holt dizia
que ele tinha tido um problema e que ia
voltar muito tarde do trabalho. Devia ser
só coincidência: eu não conseguia contar
quantas vezes tinha ficado no escritório
até de madrugada. E, tenho certeza, com
ele não devia ser diferente. Mas esse
atraso logo depois da aparição
inesperada de sua avó fez com que
minha cabeça começasse a divagar entre
vários cenários. Um pior do que o outro.
Abri a porta e coloquei mais água
para Max.
– E aí, garoto? Acho que somos só eu
e você hoje.
Ainda não passava das onze, o que
significava que eu não tinha ficado nem
duas horas no bar. Preparei um jantar
rápido e coloquei ração e uns biscoitos
para o labrador.
– Seu dono vai chegar atrasado. – O
cachorro levantou a cabeça do pote
vazio e me observou. – E nem me olhe
com essa cara, você já comeu tudo. –
Sua língua saiu rápida e lambeu o
focinho. – Você vai ficar imenso de
gordo se continuar comendo desse jeito.
Coloquei os pratos sujos na pia e Max
me seguiu. Enfiei os dedos atrás das
suas orelhas e baixei a boca para lhe dar
um beijo em cima da cabeça. Ele latiu,
satisfeito, e eu cheirei minhas mãos.
– Você está fedendo. Holt precisa te
dar um banho de novo!
Era engraçado o jeito que ele me
olhava. Parecia que queria falar. Se
aquilo com Holt não desse certo – e
considerando a adição da avó materna à
equação, provavelmente não daria – eu
ia ter que arranjar um cachorro. Com
certeza. Era uma ótima companhia.
Ele tentou me lamber e eu o empurrei.
– Tá. Não tão ótima assim – ri,
falando em voz alta, como se ele tivesse
conseguido ler meus pensamentos.
Eu podia dar um banho nele. Ia ser
bom por vários motivos diferentes: ele
ia ficar limpinho, Holt não ia ter que se
preocupar em fazer isso antes da festa
do dia seguinte e eu podia me manter
ocupada por mais algum tempo.
Não sabia se devia esperar Holt
chegar ou não. Não estava com tanto
tesão. Depois dos últimos dias, seria
bem difícil… Mas ainda assim queria
vê-lo esta noite. Dormir sem falar com
ele significaria esperar até o dia
seguinte para olhar em seu rosto e ver se
algo tinha mudado. E eu precisava
saber.
Coloquei um short curto e uma
camiseta branca ainda mais vagabunda
do que a que eu já vestia. Os produtos
de higiene animal estavam todos em um
armário na garagem e eu os encontrei
sem maiores problemas. Ligar a
mangueira e manter Max debaixo da
água e longe dos canteiros de flores foi
a parte difícil.
Puxei sua coleira pela décima vez.
Ele tinha espuma espalhada por quase
todo o pelo e ficava se virando, tentando
abocanhá-la. Segurava sua mandíbula
com a minha vida. Eu não fazia a menor
ideia se aquela porcaria era tóxica ou se
era comestível. Mas depois da oitava
vez em que ele mordeu a espuma, decidi
que, se fosse para ele morrer por causa
daquilo, já teria morrido, e segui com o
banho impossível.
Ele tinha tanto sabão quanto terra pelo
corpo, e eu percebi que aquilo não ia
adiantar de absolutamente nada. Holt
fazia parecer fácil.
– Max! Por favor! Estou te
implorando! Fica quieto!
Ele latiu e correu soltando espuma
pelo quintal. Eu corri atrás dele com a
mangueira ao redor da piscina. A
criatura infernal tinha transformado o
banho em uma brincadeira de molhar.
– Vem aqui! Você quer que eu
implore de joelhos? É isso? Por favor!
Fica parado, só um instante!
Segurei sua coleira mais uma vez e
joguei água no pelo. A água começou a
cair com bem menos intensidade e eu vi
o cachorro contorcido mordendo outra
parte da mangueira.
– Eu vou chorar! Para, por favor.
Eu já tinha me arrependido daquela
ideia. E me arrependido de novo.
– Acho que nunca te vi implorar
antes!
A risada de Holt me pegou
desprevenida, e eu me virei com a
mangueira em riste. Em dois segundos,
ele estava encharcado.
– Ai meu Deus, Holt! Você me
assustou!
Ele começou a tirar o paletó e a
gravata:
– E precisa me dar um banho por
causa disso? – Agora que ele já estava
molhado, pareceu não se importar e me
puxou para os seus braços.
Ah… A gente estava bem.
Nunca pensei que algo pudesse
acalmar tanto meu coração e minha
ansiedade como um simples abraço.
– Você não ia chegar tarde?
– Ia. Mas resolvi trazer o trabalho pra
casa. – Me deu um beijo.
– Qual é o botão que faz esse
cachorro ficar parado?
– Tem que segurar ele com força – riu
– Quer ajuda?
– Por favor!
– Max! Vem aqui, garoto. – Mal ouviu
a voz do dono e o cachorro pulou em
cima dele. A camisa social de Greg
ficou cheia de água, terra e sabão.
Holt segurou Max pela coleira e o
manteve parado enquanto eu molhava o
pelo e o ensaboava mais uma vez para
livrá-lo da sujeira recém-adquirida.
Estava passando as mãos pela coluna do
labrador e só notei que minha camisa
estava estupidamente encharcada quando
senti a mão grossa de Holt apertando
meu peito e beliscando meu mamilo por
cima da camisa.
Olhei pra baixo e vi a camisa branca
vagabunda quase completamente
transparente. E eu sequer tinha colocado
um sutiã.
– Você faz isso para me provocar,
não é?
– Nem tudo é sobre você, Holt – ri,
esfregando a toalha em um Max que
insistia em se sacudir.
– Ah, mas isso é. Eu venho dirigindo
do trabalho para cá pensando que talvez
eu finalmente consiga sentar e ter uma
refeição com você sem pensar em sexo.
A gente tem transado tanto que eu vim
pensando que talvez o tesão
incontrolável tivesse ido embora.
– E? – puxei Max para o alcance do
secador e liguei o ar quente contra seu
pelo. Ele latiu, mas Greg o manteve
seguro.
– E eu chego em casa e você está me
esperando com um short que deixa
metade da sua bunda do lado de fora e
com uma camisa branca transparente. E
molhada, para completar.
– Ah, você não fez ideia de quão
molhada eu estou. – Me aproximei do
seu rosto.
– Não me provoque. – Ele me
envolveu com um abraço, mas sua mão
foi direto para a minha bunda.
– Vai! Me solta. Deixa eu acabar de
secar o Max – ri.
– O cachorro está limpo, Dominique.
– Sua boca estava no meu pescoço e eu
parei de me importar com a limpeza do
animal.
– E você está imundo. – Sua roupa
estava toda manchada.
– É. Acho que essa daqui não tem
mais solução. – Ele estava todo sujo de
terra, sabão e baba. – Vem me dar um
banho?
– Eu não! Você está podre. Tome um
banho sozinho e me procure quando
estiver limpo.
– Você fala como se estivesse em uma
situação melhor do que a minha. Com
esse short enrolado e essa camisa suja
de terra. – Seus olhos estavam no meu
corpo, e eu percebi a fome que
continham.
– Não está gostando da minha camisa,
é?
– Estou adorando sua camisa.
Principalmente o jeito como ela está
molhada e me mostrando esses teus
peitinhos perfeitos. – Segurou um deles
na palma da mão e me deu um beijo por
cima da camisa.
– Peitinhos? – reclamei, rindo.
– Ah, perdoe-me. – Lambeu os lábios
de forma sacana – O diminutivo
realmente não se adequa à situação. A
genética foi muito boazinha com você.
– Como você sabe que eu não tenho
silicone?
Ele me olhou com um sorriso de
obviedade.
– Acho que já conheço os seus peitos
muito bem, Dom.
Sorri e virei para abrir a porta e
deixar Max entrar em casa. Mal ele tinha
passado, Holt me puxou pela cintura.
– Mas vamos verificar, só por
segurança. – Me segurou pela cintura e
arrancou a blusa pela minha cabeça.
Fiquei nua da cintura pra cima e o ar
frio da noite enrijeceu a ponta dos meus
seios.
Ele se afastou, com minha camisa nas
mãos e o lábio inferior entre os dentes, e
me observou por alguns segundos.
Não me tapei, nem me escondi. Pelo
contrário. Cruzei os braços logo abaixo
dos seios e eles se levantaram.
– Você é muito linda.
– Vai descobrir se eu tenho ou não
silicone só olhando, é?
– De jeito nenhum. – Ele cobriu cada
seio com uma mão e os apalpou
enquanto passeava com o nariz pela
base do meu pescoço até um de meus
mamilos. – Tudo natural – sussurrou, e
eu me arrepiei onde seu hálito tocava
minha pele.
– Sabe do que eu gosto?
– Do quê?
– Gosto quando você suga meus seios.
Quando você mama com violência e os
deixa doídos e sensíveis. Me excita.
Muito.
– Ah, a gente pode trabalhar nisso.
– É? – Dei dois passos para trás e ele
começou a me seguir. – Vem cá e mostra
para mim como é que se faz. Porque
mesmo adorando essa tua boca, eu ainda
acho que consigo sugar melhor do que
você.
Deixei a palavra sugar dançar na
minha língua. A ereção de Holt estava
facilmente identificável.
– É difícil competir com você. – Ele
colocou o polegar na minha boca – Essa
boquinha é uma coisa de louco.
– Eu sei. – Dei mais um passo para
trás, em direção à piscina.
– Você está fugindo para onde?
– Estou fugindo de você. Está imundo.
– Mais um passo. E mais outro. Ele
estava me seguindo. Isso, meu bem, vem.
– Você não vai escapar. Vou meter
meu pau sujo em você. Gozar nesses
teus peitinhos – riu.
Tirei uma de minhas sandálias e
joguei nele. Ele a pegou no ar e eu
joguei a outra. Holt se desviou e
avançou para me segurar.
– Você só me fode depois que tomar
um banho. – Estávamos na borda da
piscina. Eu dei um passo para o lado e o
empurrei. O problema é que ele segurou
meus braços com força e me puxou
junto.
A água morna nos envolveu. Achei o
chão com os pés e comecei a caminhar
para o raso.
– Se isso foi uma tentativa de
diminuir minha ereção, não funcionou. –
Reclamou, tirando os sapatos e as meias
e os colocando na borda da piscina.
Estava tudo encharcado. – Vou aí te
pegar e te foder do mesmo jeito.
– Pelo menos agora você está limpo –
ri e me abaixei na água. Tirei o short e,
quando submergi, estava completamente
nua. Joguei as roupas na borda junto
com os sapatos de Holt e depois me
aproximei e passei a língua nos seus
lábios.
– Nunca – sussurrou –, nunca vou
parar de sentir um tesão incontrolável
por você.
Ele me beijou, enfiando as mãos nos
meus cabelos molhados, e eu senti sua
roupa molhada grudando no meu corpo.
– Eu ia te levar para a cama, Dom.
Mas não posso desperdiçar você nua
aqui.
– Não, não pode. – Holt agarrou
minha bunda e eu o envolvi com minhas
pernas. Ele deu alguns passos para o
lado e nos levou para o fundo até minhas
costas baterem na lateral na piscina.
Ele me beijava com um incrível nível
de intimidade: ele conhecia minha boca.
E mais do que isso, ele gostava da
minha boca. Sabia exatamente o que
fazer com ela.
Eu estava entregue ao seu toque, ao
seu carinho, à sua língua. Sexo animal e
voraz é excelente. Mas tinha algo novo
no sexo com Holt. Era ternura. Transar
com alguém que você gosta. Não
passava minhas mãos no seu corpo para
excitá-lo ou para me excitar, as carícias
eram feitas porque eu gostava dele.
Gostava do seu corpo. Queria o seu
calor perto de mim. Me aquecendo até
que eu derretesse.
Fechei os olhos e, a cada novo beijo,
eu sentia um arrepio delicioso descendo
pela minha espinha. Os braços fortes e
musculosos me mantinham bem presa a
ele de modo que não houvesse qualquer
distância entre nossos corpos. Esfreguei
minha vagina contra sua camisa e passei
alguns segundos ali, só curtindo a
fricção.
– Vai, linda. Se esfrega aqui. Deixa
eu te sentir. – Ele chupou um dos dedos
e o desceu entre minhas coxas. Enfiou
fundo em mim e eu gritei. Não de prazer.
De dor. – O que foi? – Greg parou,
assustado e me segurou pelos braços.
– Ai! – choraminguei. – A porcaria da
água da piscina… Não consigo ficar
molhada.
Holt me observou. Ele era lindo!
Tinha uma expressão extremamente
preocupada por eu ter me machucado.
Era uma gentileza que não conhecia
limites, e era dedicada só a mim. Era
indescritível como eu estava amando ter
alguém que se preocupava comigo
daquele jeito. Com cada toque, com
cada palavra. Ele não me machucaria
nunca.
– Você não está molhada? Dentro da
água? Como isso é possível?
Eu ri.
– A água está me lavando. Aí eu fico
seca por dentro. Doeu. – Fiz um
beicinho e ele expirou aliviado por ter
compreendido e beijou meus lábios.
– Oh, meu amor… Vem, vamos te
tirar da piscina.
– Mas eu queria ficar aqui. – Fazer
aquele dengo era tão gostoso. Aquela
atenção que ele me dedicava era
embriagante. – Nunca transei em uma
piscina antes.
– Não vou te machucar, Dom. De jeito
nenhum. Vem… A gente faz amor na
beira da piscina. – Beijou minha boca –
Você deixa os pés dentro da água se
quiser – disse com um carinho
envolvente.
Holt me pegou no colo dentro da água
e me carregou com facilidade.
– Estou me sentindo muito forte hoje –
brincou, inflando o peito, e eu comecei a
rir das suas bobagens.
Já estávamos na escada quando eu me
virei e comecei a despi-lo. Ele ficou
parado me observando. Tocava minhas
mãos enquanto eu me dedicava aos
botões de sua camisa, acariciava meu
rosto com os nós dos dedos quando eu
me aproximava. Nunca tirava os olhos
da minha boca, me beijou mais algumas
vezes e me ajudou a sair da água.
Assim que eu estava do lado de fora
da piscina, Holt me carregou nos braços
mais uma vez.
– Viu? – riu. – Forte!
Eu estava rindo sem qualquer vontade
de parar. Até ele se ajoelhar e me deitar
na grama. Colocou meus cabelos atrás
da orelha e apoiou minha cabeça com a
mão para que ela não ficasse contra o
chão. Nossos narizes se tocavam e sua
boca estava tão próxima que eu sentia o
seu hálito fresco.
– Eu sou louco por você, sabia?
– E eu sou louca por você. – Passei o
dedo por sua orelha.
Tentei respirar fundo, mas meus
pulmões pareciam estar trabalhando com
metade da capacidade.
Ele tocou meus joelhos e abriu minhas
pernas. Escorregou pelo meu corpo e
beijou a parte interna das minhas coxas,
do meu joelho, até lá. Os beijos e
lambidas foram só para umedecer minha
entrada.
– Se você ainda estiver seca, promete
que me diz? Não quero te machucar,
Dom. – Holt estava beijando meu
pescoço, mas só aquela simples frase
conseguiu me deixar molhada.
Não era sacanagem, nem safadeza de
nenhum tipo. Era só doçura. E a doçura
dele me excitou mais do que eu
imaginava ser capaz.
– Digo – respondi, envergonhada.
Era incrível como eu não tinha
vergonha de nada. Nem do meu corpo,
nem da minha sexualidade… Mas
bastava ele me tratar daquele jeito gentil
e cada centímetro do meu corpo se
derretia.
Ele manteve a mão na minha nuca,
protegendo minha cabeça do chão. Não
que precisasse… a grama era fofa e
agradável o suficiente, mas,
independentemente disso, ele deixou a
mão ali.
Holt baixou os olhos e segurou a base
de sua ereção antes de me penetrar. Eu o
senti mexendo ali dentro. Devagar e
gostoso. Um gemido longo de satisfação
escapou da sua boca. Envolvi seu
quadril com as pernas e apoiei meus
calcanhares em sua bunda. Ele entrava e
saía de mim como uma onda. Uma
fluída, constante e deliciosa onda.
Eu tinha um desejo por ele que não se
traduzia em palavras. Um desejo pelo
seu corpo, pela sua alma, pelo seu
coração.
– Holt? – perguntei, e me surpreendi
como minha voz soou tímida e
vulnerável.
– Amor? – Ele se apoiou nos
cotovelos e manteve os olhos nos meus,
sem nunca parar de se mexer. Não
queria que ele acelerasse. Não queria
que fosse bruto ou violento. Não naquele
momento. Eu só queria carinho.
– Faz amor comigo? – sussurrei.
– Todos os dias – murmurou contra os
meus lábios.
Gregory me tomou como sua, e não
apenas o meu corpo. Cada milésimo da
minha alma era dele. Continuou devagar
até a fricção entre nossos corpos virar
eletricidade e fogo. Então ele ficou mais
e mais rápido, sempre com os olhos
cravados nos meus, os nós dos dedos
acariciando meu rosto, um beijo
delicado nos lábios.
Joguei a cabeça contra a grama e
gozei olhando para as estrelas.
– Tem certeza de que não quer que eu
leve ele lá pra baixo?
– Tenho.
Assim que saímos do banho, Dom se
enfiou em uma das minhas camisas e
deitou na cama, puxando Max com ela.
Sentei ao seu lado e beijei sua testa.
– Vou terminar o trabalho
Ela já tinha fechado os olhos e deu um
suspiro pesado. Dormiu agarrada ao
Max antes que eu chegasse à porta.
– Eu te amo – sussurrei muito, muito
baixo. Não queria que ela ouvisse. Mas
queria dizer.
Saí do quarto e desci as escadas para
apagar as luzes antes de ir para o
escritório. Tinha uma longa noite de
trabalho pela frente, mas não me
importava. Desde que aquela morena
linda estivesse me esperando na cama,
eu não ligava para muitas outras coisas.
Ela não tinha mencionado minha avó.
Mas isso poderia ficar para o dia
seguinte.
Era por isso que eu não tinha
conseguido esperar no escritório.
Precisava voltar para casa porque não
sabia o que tinha acontecido, e parte de
mim temia não encontrar Dominique me
esperando quando eu chegasse. Temia
que seja lá o que minha avó tivesse dito
tivesse assustado Dom. Mas eu voltei e
ela estava lá.
Estava dando banho no meu cachorro.
E eu nem precisei chantageá-la.
Passei pelo portal que separava o hall
de entrada da sala e sorri pensando em
quanto eu e Dom tínhamos mudado. Foi
aí que algo perto do telefone chamou a
minha atenção.
Era um cartão. Um cartão de visitas.
Apanhei de qualquer jeito e li o nome.
Dr. Tristan Henris.
Era o médico que tinha atendido
Dominique quando ela tinha machucado
o pé. O médico que estava dando em
cima dela quando eu voltei do
estacionamento.
O que diabos esse cartão estava
fazendo ali?
Ela não tinha saído com Andy esta
noite?
O pensamento me ocorreu quando
voltei os olhos para o telefone.
Ah, não… Não, Dom. Por favor, não.
Não faz isso comigo.
Apertei o botão para rediscar o
último número e encarei o visor digital.
Era o mesmo do cartão.
Dominique tinha ligado para o médico
no mesmo dia em que tinha ido a um bar
com a amiga.
Será que ela tinha realmente saído
com a vizinha?
Ou tinha saído com ele?
Capítulo 20
“Não posso pensar nisso agora. Se
pensar, eu enlouqueço. Amanhã eu me
preocupo.”

Scarlett – E o vento levou

– Que bicho te mordeu?


– Quê? Nada.
Ele estava estranho.
Tirei os ovos da geladeira e os
coloquei sobre o balcão.
– A gente precisa ir ao supermercado
comprar algumas coisas para hoje à
noite. Já falei com o pessoal da
vizinhança. E você precisa contar
quantas pessoas do escritório vêm.
– Acho que umas quatro ou cinco.
Fora a minha avó.
Eu nunca tinha imaginado como seria
a sensação de uma estaca de madeira
atravessando meu pescoço. Mas o que
senti naquele momento deve ter sido
muito próximo disso.
– Sua avó vem?
– Vem. E vai trazer alguém com ela.
Pode somar mais duas pessoas. – Sua
voz era fria e distante e eu me peguei
repassando os acontecimentos da noite
anterior. O que é que eu tinha feito para
merecer essa mudança de
comportamento?
– Achei que você não se dava bem
com ela.
– Também não entendi. Mas ela
apareceu no escritório ontem à tarde e
eu acabei convidando-a sem querer.
– Se você não quer que ela venha,
então desconvide.
– Só porque você não gosta de uma
pessoa, não significa que pode
desconvidá-la para uma festa na minha
casa, Dominique.
– Não estou desconvidando ninguém,
e sei muito bem que a casa é sua! Holt, o
que diabos você tem? E por que está
dizendo que eu não gosto da sua avó?
– Você não ia me contar que ela
esteve aqui ontem?
– Ia. Em algum momento. Mas se você
já sabe, por que a charada?
– Talvez ela tenha te dito algumas
verdades que você não tenha gostado de
ouvir, e aí resolveu não me dizer que ela
esteve aqui – chiou para si mesmo e a
minha visão ficou vermelha de raiva.
– É O QUÊ? – Levantei a faca para ele.
– Ei, ei! Calma!
– Calma é o caramba! A mulher veio
até aqui e me acusou de me aproximar
de você por dinheiro e você está
dizendo que foram verdades? Quer dizer
que você diz que não quer me machucar,
que vai fazer amor comigo todos os dias
e depois resolve que mudou de ideia e
que pode me tratar como lixo?
– O que o cartão do médico estava
fazendo em cima da mesa?
– Que cartão? Que médico?
– O Henris. Ou seja lá qual for o
nome dele.
Puta que pariu. Esse drama todo era
por isso?
– Eu estou com você, Holt. – Baixei a
faca e me surpreendi com o meu tom
estava calmo. Mais que calmo… Estava
sentido. – Eu disse que estava
apaixonada por você e que queria ver
onde isso ia dar. – Eu estava ressentida.
– Aí você escuta umas três palavras
azedas da sua avó, vê um cartão em
cima da mesa e resolve que eu sou uma
vadia que não merece consideração de
novo. É isso?
– Eu sei que você ligou para ele
ontem. Quando você disse para mim que
estaria com a Andy. Por que você não
me explica, Dom? – Ele parecia
irritado. – Eu quero entender. – Ele não
tinha o direito de ficar irritado.
– Você quer entender, imbecil? Pois
então vem escutar de outra pessoa, já
que a minha palavra não vale nada para
você.
Puxei ele pelo pulso com violência e
marchei através da sala e do jardim.
Meti a mão na porta de Andy como se o
modesto pedaço de madeira fosse o
responsável por todos os meus
problemas.
– Dom? – Agora ela tinha o rosto todo
borrado de maquiagem. Tinha um
sorriso feliz no rosto, mas eu não tinha
tempo para isso.
– Andy, será que você pode explicar
para esse animal o que nós fizemos,
ontem?
– A gente foi para um bar. – Ela
desviou o olhar de mim para Holt, sem
compreender, e parecia querer se
esconder atrás da porta.
– Pode dar mais detalhes para ele não
achar que você está mentindo? Porque,
aparentemente, está na moda achar que
as pessoas estão mentindo e nem lhes
dar a chance de se defender.
– Ahmm… Você me maquiou. E
maquiou a Shelbi! Emprestou roupas
para ela. Por sinal, ela… Ahmm… Não
dormiu em casa. – sibilou para mim
com uma cara impressionada. – Foi
embora com o médico. Acho que te
devolve as roupas depois.
– Ah! Tinha um médico na história? –
exagerei, parecendo sonsa. – Por favor,
Andy, será que você podia explicar para
o Gregory o que o médico estava
fazendo lá? – Ele trocou o pé de apoio
do corpo, estava cada vez mais
constrangido. Ótimo. – E use palavras
fáceis. Porque ele é um imbecil! –
rosnei na cara dele.
– Não precisa, Andy. Está tudo bem.
Dom, por favor…
– Não! Você vai ouvir. Vai ouvir
umas verdades. Diz para ele!
Andy me encarou assustada.
– Dom, eu não quero me meter…
– Greenpeace! Abre essa boca e conta
a história. Agora!
– Shelbi está se separando do marido.
Está ficando aqui em casa por uns dias.
Ela não queria ir para o bar com a gente,
aí Dom ligou para o amigo médico e
apresentou os dois. Foi um trabalho de
cupido – sorriu, levantando os
polegares. – Vide o fato de que ela
ainda está com ele.
Olhei para Gregory em silêncio.
– Dom, me desculpe. Eu não pensei
direito.
– É, não pensou. – concluí,
autoritária. – Eu vou ficar aqui com a
Andy e vou descobrir como foi a noite
dela depois que eu saí do bar e voltei
para casa para dar banho no seu
cachorro. Quando eu voltar para a sua
casa é bom ter um café da manhã
delicioso me esperando ou eu pego
aquele seu amado videogame e jogo ele
na sua cabeça.
Ele deu um sorriso torto e levantou as
mãos em sinal de paz. Hesitou,
esperando autorização para se
aproximar. Eu não me movi, então Holt
colocou as mãos na minha cintura com
cuidado, sussurrou um “me desculpe” e
beijou minha bochecha antes de se
afastar.
– O que foi que houve?
– Crise de ciúmes sem propósito. Não
é importante. Mas me conta: como foi a
noite?
– Ah! Dom! – Ela se derreteu na
porta.
– Tão boa assim, hein? – ri.
– Eu realmente não sabia o que estava
perdendo! Como eu pude esperar tanto
tempo para tentar de novo? Quero fazer
isso todo dia!
– Oh, oh, oh! Calma aí. Também não é
para sair desesperada.
– Calvin vai estar na festa de vocês
hoje à noite?
– Ele foi convidado. – Logo, logo eu
ia ter que me apoiar nos joelhos ou a
gargalhada ia me derrubar no chão. A
animação de Andy era o máximo.
– Posso dar em cima dele?
– Deve! Agora é melhor eu voltar
para casa. Se Holt fica muito tempo
sozinho em uma cozinha, coisas
explodem. Quando Shelbi chegar, você
me avisa?
– Também quer ouvir a história, hein?
– sorriu.
– Com certeza!

– Desculpa.
Ele vinha empurrando o carrinho de
compras atrás de mim e repetia isso a
cada noventa segundos. Alternava os
pedidos com uns beijos no meu pescoço,
e eu estava achando difícil resistir.
– Tá. Da próxima vez, tenta me
perguntar antes de deduzir o pior.
– Eu sei. Mas é porque…
– Porque o quê? – Virei para ele e
parei o carrinho quase cheio.
– É difícil acreditar que é verdade.
– Não é difícil só para você, Gregory.
Mas você prometeu que ia ser forte por
nós dois. Essa de coisa de
relacionamento? É horrível para mim!
Eu não tenho nenhuma experiência! Fico
perdida sem saber o que fazer. E só
aceitei tentar porque você disse que ia
ser forte por nós dois. Aí, no primeiro
sinal de problema, você abre as pernas e
joga a toalha.
– Nossa, você está com muita raiva.
– Muitos Baxters questionando minha
ética nos últimos dias.
– Não me chame assim, Dom. Por
favor.
– Você me chamou de piranha
aproveitadora! Eu chamo você do que eu
quiser.
Ele começou a rir. Por algum motivo,
Holt estava achando minha fúria hilária.
– Você fica muito linda com raiva.
– Fico perigosa também. Cuidado. Eu
mordo.
– Não te chamei de piranha
aproveitadora. Só fiquei com ciúmes e
parei de ver com clareza. – Me puxou
em um daqueles abraços maravilhosos e
eu tive que virar o rosto para longe dele
ou desistiria da minha teimosia. – Me
desculpa, por favor? – Ele moveu o
rosto, tentando alinhar sua boca com a
minha e eu me distanciei em uma
provocação infantil. – Hum? – pediu
mais uma vez, com o sorriso a
milímetros do meu.
– Vou pensar no seu caso.
Ele me beijou e eu o perdoei.
Porcaria…
– Agora… Posso te perguntar o que
são algumas dessas coisas que você
colocou no carrinho?
– Tipo o quê?
– Não entendo como vamos servir
esses morangos, o chantilly ou os
iogurtes de chocolate para os vizinhos. –
Pelo sorriso sacana na sua cara, ele
tinha certeza do que eu estava
planejando.
– Tem um experimento que eu quero
fazer e não é porque você foi um imbecil
que eu vou desistir.
– Hmmm… E me envolve? Seu
experimento? – Eu adorava aquele
sorriso safado. Queria aquela boca me
chupando todinha e depois dizendo que
era louco por mim.
– Se você se comportar, talvez.
– Eu juro que me comporto! –
Levantou uma mão, em uma promessa
exagerada e eu ri.

A casa estava começando a ficar


cheia. Andy chegou primeiro e disse que
Shelbi tinha ido trocar de roupa em sua
própria casa. Aparentemente, a aventura
da noite anterior tinha deixado, minha
adorável vizinha, convencida de que a
recém-separada tinha bebido uma boa
dose de autoconfiança e não ia fazer
nenhuma besteira. Eu confiei nela mais
porque não havia o que fazer do que por
qualquer outro motivo. Algumas pessoas
do escritório de Holt tinham vindo,
inclusive Lynn. Se a avó dele queria
achar uma golpista de olho no baú do
tesouro, só precisava olhar para a doce
loira aguada. Quero dizer, se você
continua insistindo depois que o homem
te larga sozinha na cama para ir atrás de
outra mulher ou você não tem uma gota
de respeito por si mesma ou está se
esforçando para um prêmio maior.
No sofá, Rick estava dando uma surra
em Hill no videogame. Isso! Meu
garoto!
– Deixa eu tentar – pedi. Hill me
passou o controle a contragosto e eu vi
meu Blanka ser humilhado mais uma
vez. – Será que eu posso te processar
por isso?
– Acho que não – Rick riu.
– Mas pode tentar abrir um
precedente – Hill acrescentou,
arrogante.
Deixei os dois para trás assim que vi
Shelbi cruzar a porta. Me aproximei e
ela correu para os meus braços.
– Dom! Foi incrível! Tristan é um
homem excelente e nós temos tanto em
comum!
– E ele é bom de cama? – Andy quis
saber.
– Olha só pra isso! – ri. – A menina
perdeu a virgindade a menos de doze
horas e agora só pensa nisso.
– Foi uma pergunta honesta – deu de
ombros.
– Ah, mas eu não fiquei com ele. Não
assim.
Eu e Andy nos entreolhamos.
– E vocês foram para onde?
– Começamos a conversar e como nós
dois gostamos de música country, ele me
levou para um lugar… Foi muito bom.
– Mas onde você dormiu?
– Eu não queria ter que acordar a
Andy tão tarde. Fiquei na casa dele, mas
não fizemos nada! – acrescentou
rapidamente. – Ele foi um cavalheiro. –
Ela estava suspirando. Eu tenho medo de
quando mulheres começam a suspirar
por causa de homens. Tinha
experimentado um pouco disso nos
últimos dias: a razão nos abandona. Não
é muito aconselhável. – Tristan é o
homem mais incrível do mundo! – Ela
tecia elogio após elogio e não viu Holt
se aproximar. Olhei fundo nos seus
olhos e notei que ele estava ouvindo.
Estava ouvindo a mulher elogiar o
homem que ele tinha me acusado de ter
seduzido. Ou seja lá o que for que ele
tenha me acusado…
– Bebidas, moças? – ofereceu.
Shelbi se calou, assustada. Ela sabia
que esse assunto ainda não podia chegar
em Eric.
Elas começaram a escolher o que iam
aceitar e Greg passou um braço em
minhas costas.
– Desculpa – disse no meu ouvido
antes de dar um beijo na minha testa.
Não era um tom alegre ou brincalhão.
Era um tom bem sério dessa vez. Eu
assenti e ele baixou o rosto para me dar
um selinho.
Uma movimentação na porta chamou a
nossa atenção. Ela usava o mesmo coque
grisalho no topo da cabeça. A blusa
preta de manga comprida tinha a gola
alta, a saia vinho ia até os pés. Seu
pescoço ostentava um discreto colar de
diamantes, que era quase tão frio e
elegante quanto seu olhar.
Só havia uma diferença: ela estava
sorrindo. Se não tivesse sido tão
verbalmente agredida por ela no dia
anterior, quase acreditaria na sua
simpatia.
Ela estava de braços dados com outra
pessoa.
Uma mulher. Alta, com cabelos loiros
cuidadosamente penteados para trás e
presos com uma fita. Usava uma roupa
que… Na falta de descrição melhor,
poderia se dizer simplesmente que ela
estava fantasiada de rica. Cada peça
que ela usava era algo que só alguém
exorbitantemente podre de rico teria no
guarda-roupa. Eu conhecia tudo porque
gostava de observar objetos
incompráveis quando me permitia
sonhar acordada com alguns supérfluos
femininos: Dos scarpins pretos de
Christian Louboutin à echarpe de seda
Hermès.
– Gregory!
– Eleanor. Merryl? – acrescentou,
surpreso.
– Olá, Greggy!
Greggy? Ai… Não…
– Nossa! Há quanto tempo! – Eles se
abraçaram um pouco amigavelmente
demais e eu quis roubar seus scarpins,
atravessar o salto na sua garganta e
depois limpar o sangue, colocar aqueles
sapatos no meu guarda-roupa e amá-los
pelo resto da vida.
– Faz alguns anos, não é? Você sumiu!
– Eles soltaram o abraço e ela deu um
soco gentil no seu braço.
– É verdade. Tive que fugir por um
tempo. Essa é Dominique. Dom, acho
que já conheceu minha avó.
– Boa noite – cumprimentei de forma
seca e ela apenas sorriu
inexpressivamente de volta. É, a gente
se odiava. Estava decidido.
– E esta é Merryl. É uma amiga da
família.
– Olá. – Eu estava apertando sua mão
quando sua avó se intrometeu.
– Ora, Gregory, não seja tão formal. –
Ela pegou a loira rica pelo braço mais
uma vez – Merryl é mais que uma amiga,
é quase parte da família. E teria feito
parte de verdade da família se o
pequeno Baxter não fosse um tonto. –
Ela sorria do neto para a convidada e eu
estava pronta para enfiar um anzol na
minha garganta e pescar meu coração.
Qualquer coisa para ele parar de bater
tão desesperadamente dentro do meu
peito. Esculpi um sorriso na cara e
deixei ele congelado ali. Sabia que se
abrisse a boca para falar qualquer coisa
ia acabar me arrependendo.
– Não me chame de Baxter, eu não
gosto – sorriu educado. – E às vezes as
coisas não dão certo, Eleanor. – Ele
manteve sua mão firme na minha cintura
e eu o amei por isso. Mas mesmo com o
apoio do seu braço e do seu corpo junto
ao meu, mesmo me mantendo firme e
segura em seu ombro, o sorriso azedo e
odioso de sua avó ainda me machucava
e eu não conseguia entender exatamente
por quê.
– É verdade! Dominique, nós mal
conversamos no outro dia. – Ela estava
sendo simpática demais, e eu suspeitei
de suas intenções imediatamente – Por
que não passamos alguns minutos juntas,
hein? Gostaria de ouvir um pouco mais
sobre você. Gregory fala maravilhas a
seu respeito.
Ah, então ela era desse tipo.
Ia me elogiar e ser simpática na frente
dele e deixar para mim a missão de falar
mal dela. Isso ia fazer com que Gregory
a venerasse e começasse a ficar irritado
comigo. Não, eu não ia jogar esse jogo.
Os problemas que ele tinha com a
família eram dele. Eu não ia me meter.
– Claro. Será um prazer – respondi,
devolvendo toda a hipocrisia.
– Me mostre a casa, sim? – Ela me
pegou pelo braço e me puxou.
Vagabunda filha de uma puta.
Ela estava me afastando de Greg e
deixando ele sozinho com Merryl. Eu
tinha que confessar que tinha sido uma
boa jogada.
– Você não quer um tour da casa,
quer? Não de verdade…
– Não – sorriu. – Você é mais esperta
do que parece.
– Você realmente acha que seu neto é
estúpido o suficiente para não perceber
o que você está fazendo?
– Ah, ele sempre percebe. É um
garoto inteligente. Mas sempre acaba
fazendo o que eu quero mesmo assim.
– Você o subestima.
– E você o superestima. Ele é só um
homem. Um homem que foi criado no
luxo e na opulência. Aquela moça? Ela é
uma Waelde. Eles dividem conosco a
lista das famílias mais ricas. Olhe para
os dois. – Senti vontade de vomitar –
Gregory e Merryl cresceram juntos. Nós
planejávamos sua união antes de eles
aprenderem a andar. E eles ficaram
juntos por algum tempo. Até toda aquela
coisa com o pai dele acontecer.
– Morrer. Até o pai dele morrer.
Ela se virou de frente para mim e
começou a ajeitar o cinto fino que
delineava minha cintura por cima do
vestido.
– Olhe só pra você, achando que é
moralmente superior a mim porque
consegue ter compaixão pelos
sentimentos de Gregory. Querida, você
não é superior a mim em nada. Nem se
compara. Nem a mim, nem ao meu neto.
– Ele sabe que você só está vendendo
ele como carne.
– Ah, pobrezinha. Você acha que tem
alguma chance? Aqueles dois nasceram
um para o outro. Foram criados e
adestrados um para o outro. Não existe
parceria mais ideal do que essa. Eles só
se separaram por um acaso do destino. E
eu? Eu não preciso fazer nada. É só
colocar os dois no mesmo ambiente por
tempo suficiente. É inevitável.
Eu engoli a seco. Do outro lado da
sala, Greg e Merryl sorriam um para o
outro como velhos amigos. Amigos de
infância. Se ela tivesse sido seu
primeiro amor, seu primeiro beijo, sua
primeira vez… Como eu poderia
competir? Além do mais, ela tinha todo
o apoio do furacão Eleanor Baxter
enquanto eu, a poderosa Dominique
Thoen, começava a me sentir cada vez
mais minúscula.

– Não acredito que você ainda não


contou para ninguém.
– Ainda não posso, Greggy. Não estou
preparada, por favor, não me julgue.
– Não! Nunca. Não foi essa minha
intenção e você sabe – sorri para ela.
De todas as pessoas que eu tinha
deixado para trás, Merryl era de quem
eu mais sentia falta. Por muitos anos, ela
tinha sido minha melhor amiga.
– Eu sei! Você não é o tipo. Mas você
sabe como é…
– Sei. Acredite! – Arregalei os olhos
exagerando e ela riu.
– Mas estou feliz em te ver. Você
parece bem.
– É muito bom te ver também! E,
obrigado. Acho que estou bem. Agora,
pelo menos…
– Já foi visitar os túmulos?
– Não, e não fale isso muito alto. –
Olhei ao redor preocupado – Se
Dominique escuta isso, ela me arrasta
até lá. – A preocupação era genuína –
Ela me fez ir até o asilo.
– Ver a Audrey? – ela sussurrou,
impressionada – Não acredito! – seu
queixo caiu – E você foi?
– Confie em mim: não é seguro dizer
“não” para a Dominique.
– Está explicado por que a Eleanor a
odeia. Você sabia que ninguém sabe
onde sua mãe está? Eu só sei porque
você me contou. Sua avó nunca disse
nada para ninguém. Há rumores, óbvio.
Mas nenhuma certeza.
– Imagino que se eu for visto entrando
e saindo daquele lugar não vai ser bom
para os negócios da família, não é?
– Que se danem os negócios da
família. – Seu sorriso amigável me
aqueceu por dentro. Tinha sentindo falta
da minha amiga. – E eu não acredito que
ela te convenceu a ir. – Ela estava
tapando a risada com as mãos em
concha.
– Não estimule esse tipo de
comportamento, Merryl – ri e apertei
seu braço.
– Você gosta dela?
– Nossa… – suspirei.
– Isso tudo, hein?
– Mais – confessei. – É estranho
porque… de todas as pessoas do
mundo… – Eu não tinha palavras para
explicar.
– Você sabe que Eleanor vai fazer da
vida dela um inferno, não sabe?
– E ela começou te trazendo aqui.
– É, eu sei, não foi um plano muito
bom. – Ela se apoiou no meu ombro
rindo e eu a acompanhei. – Mas ela não
sabe de tudo. Foi até a minha casa
querendo me arrastar até aqui, mas é
claro que não precisou pedir duas vezes.
– Obrigado por ter vindo. É bom te
ver.
– Digo o mesmo, Greggy. Mas se
você gosta da garota tome cuidado, tá?
Quando Eleanor começa com essas
coisas, quem sabe quando ela vai parar?
– Ela não é tão ruim assim. É só um
cachorro que late muito, mas a mordida
é fraca.
– Você quem sabe – deu de ombros. –
E ela? Gosta de você?
– Eu acho que sim.
– Acha?
– Com Dominique é difícil. Às vezes
eu tenho quase certeza. Ou até certeza
absoluta. Mas aí acontece alguma coisa
e eu acho…
– … que é bom demais para ser
verdade. Sei como é. Mas não afaste a
menina por medo de acreditar, Greggy.
– Tá, tá. Eu sei – sorri. – E você?
Alguém especial?
– Estão me fazendo sair com um
Allender.
– Uuhh! – provoquei. – Mais um top 8
– ela riu.
– Não tira onda, Baxter-Holt! Nem
todos podem viver uma vida livre.
– Pode sim, se quiser.
– Não tenho coragem, Greg. Ainda
não. Te admiro muito por isso, você
sabe. Mas assim é mais fácil. Não sou
forte como a Amanda.
– É sim. Só está com medo que seja
bom demais para ser verdade. Agora,
fala a verdade. Alguém especial?
Ela sorriu.
– Ela se chama Laurie. É da minha
turma de literatura espanhola.
– Hmm… E o que ela acha da
situação da família?
– De ter que sair escondida, você
quer dizer? Ela detesta. Se assumiu há
pouco tempo e acha que está dando um
passo para trás comigo – deu de ombros.
– Mas eu não posso… Não agora.
– Sabe… – sussurrei. – Quando
Amanda me contou que você era lésbica,
a primeira coisa que eu pensei foi “e
ninguém mais notou ainda?”
– É! Acho que eu sempre preferi
brincar com você e seus carrinhos – riu.
– Não que isso seja indicativo…
Amanda adorava barbies.
– Ela foi o meu primeiro beijo, sabia?
Mentira!
– Não acredito!
– É sério!
– Olha para isso! Quase que um
Baxter e um Waelde se unem em um
relacionamento de verdade!
– Rá! Só não ia ser o que nenhuma
das duas famílias queria, não é? – riu.
– Mas eu achei que Mandy só tinha
percebido que era gay depois que voltou
da África.
– Não. Ela já sabia há muito tempo.
Quando ela sugeriu que a gente
namorasse para disfarçar, estava
tentando me ajudar porque entendia. –
Ela respirou fundo – Sua irmã era uma
pessoa incrível.
– Ah, nem me fale. – Meu coração
estava doendo.
– E sabe do que mais? Acho que ela
ia gostar de Dominique. Ia brigar com
Eleanor para que te deixasse viver sua
vida.
– “Deixe a menina em paz, sua velha
birrenta” – rosnei, imitando minha irmã
e Merryl começou a rir.
– Mais ou menos isso.
– Se algum dia precisar de alguma
coisa, sabe que pode contar comigo, não
sabe?
– Sei, moleque! Talvez, quando eu
finalmente contar que sou gay e meus
pais me colocarem para fora de casa, eu
tenha que vir atrás de você procurando
um lugar para ficar.
– Minha porta está sempre aberta. –
Os olhos de Merryl andaram por cima
do meu ombro.
– Ela é muito bonita.
Dominique estava nos braços da
minha avó, do outro lado da sala.
Usava um vestido leve que caía até os
pés delineando cada uma de suas curvas.
O cinto fino acentuava a cintura e
quando ela se virava de perfil eu podia
ver cada nuance daquele corpo que eu
estava rapidamente aprendendo a amar.
– É. Eu sei – sorri, em paz. – Acho
melhor eu ir lá resgatá-la. E se eu
conheço aquela mulher, ela deve estar
morrendo de ciúmes.
– De mim? – ela riu.
– E de quem mais? – a ironia era
infinita. – E o pior é que ela não vai
assumir. Vai ser grossa e irritante até eu
dizer chega.
– Nós, mulheres, somos complicadas.
Holt, posso te pedir um favor?
– Dois até.
– Não conta para ela, por favor? Eu
tenho certeza de que ela é confiável,
mas…
– É uma coisa sua e é um assunto
sensível, Merryl. Não é meu segredo
para contar. Fique tranquila.

Eu não dei nem dois passos e


Dominique já tinha conseguido se livrar
da minha avó sem a minha ajuda.
Objetivamente falando, quando é que
Dominique precisava de ajuda para o
que quer que fosse?
A sala de jantar estava vazia quando
cruzei apressado atrás dela e empurrei a
porta da cozinha alguns segundos
depois. O tempo tinha sido suficiente
para que ela arranjasse uma faca e
começasse a dar uma de açougueira em
um pedaço de queijo.
– Minha nossa… – brinquei, passando
as mãos pela sua cintura – O que é que o
queijo te fez?
– Estou armada, Holt. Não me
perturbe.
Ela estava com ciúmes.
Ela era linda.
– Nunca. Principalmente depois de ter
testemunhado o assassinato do queijo.
– Estou dividindo ele em pedaços
pequenos para colocar na bandeja dos
salgados. Algo que, por sinal, você
deveria estar fazendo, já que a casa é
sua.
Ela não ia parar com as indiretas.
Tudo bem, eu merecia.
A casa era mesmo minha, mas eu tinha
falado aquilo para ofender. Estava
magoado porque, algumas horas antes,
tinha realmente acreditado que ela tinha
saído com o médico.
– Não fica com raiva. Eu já pedi
desculpas. – Tentei fazer cosquinhas na
sua cintura, mas ela me empurrou.
– Me solta ou eu castro você com
essa faca.
– Estamos violentos, hoje, hein?
– Por que você não vai ficar com sua
amiga, Merryl? Tenho certeza de que ela
é mais pacífica do que eu. – Ela estava
morrendo de ciúmes e eu tive que sorrir
– Mais educada, também. Refinada…
Não é? – voltou a enfiar a faca no
queijo.
– Dom, o queijo está morto, acho que
você já pode parar. – Ela o esfaqueou
mais algumas vezes e eu puxei sua
cintura – Está com ciúmes, é? –
sussurrei no seu ouvido.
– De você? Rá! Não me faça rir. –
Dessa vez ela aceitou o abraço e ficou
quieta recebendo os beijos leves que eu
dava no seu rosto e no seu pescoço.
– Está soando como uma namorada
ciumenta.
– E se for? – Me observou com seus
olhos escuros.
– Nesse caso, eu vou ter que dizer que
é extremamente desnecessário já que,
depois de ter experimentado esse teu
corpo, eu não consigo sentir atração por
mais ninguém.
– Ah é?
– Você me debilitou para a vida
inteira, Thoen. Não pode ir embora
nunca mais agora.
Passei meu polegar pelos seus lábios.
Ela se virou para continuar a
organizar as bandejas e esfregou a bunda
na minha virilha.
Joguei a cabeça para trás.
Porra de mulher maravilhosa.
– Você está brincando com fogo –
baixei o rosto e falei contra seus
cabelos.
– Posso te provocar à vontade, Holt.
– Ela estava rindo com gosto – Você vai
fazer o quê?
– Te jogar contra pia e comer essa tua
bunda, por exemplo?
– Com a sua avó na sala ao lado? –
riu. – Até parece.
– Só não faço porque não sei se você
gosta dessas coisas. – Meu pênis estava
ficando duro com aquela conversa, e eu
achei melhor me afastar daquela
tentação antes que a situação chegasse
longe demais para voltar.
– Ah, querido. Se você tivesse
coragem para me comer agora, eu
deixava você enfiar onde você quisesse.
Ela estava me provocando.
Não estava?
Me afastei alguns passos em direção à
porta mas não consegui tirar os olhos da
sua bunda.
O sorriso no seu rosto era
deslumbrante. Eu mataria e morreria por
aquele sorriso. E por aquela bunda
também, obviamente.
Estava com a mão na porta quando a
ouvi rindo:
– Frouxo.
Eu olhei pra baixo e vi meu pau
explodindo ereto nas minhas calças. Sair
da cozinha não era mais uma opção.
– Olha o que você fez. – Eu me virei e
ela passou a língua nos lábios. – Isso
mesmo, pode se lamber, deixa essa
boquinha bem molhada para me receber.
Agora que você começou, vai ter que
terminar.
– Vai querer minha boca, é? Mesmo
depois que eu disse que podia enfiar
onde quisesse? – Ela moveu os lábios
sem emitir nenhum som e eu li a palavra
“frouxo” se formar na sua boca.
Puxei ela para o canto da cozinha de
forma tão rápida que tenho certeza de
que a assustei. Apoiei sua bunda na
mesa que ficava na curva da parede.
Naquele lugar, se alguém entrasse na
cozinha, teríamos exatos três segundos
antes de sermos pegos.
– Você me provocou porque quis. –
Comecei a puxar a alça do seu vestido
com a boca, enquanto enfiava minha mão
por baixo da saia e subia o tecido até o
seu quadril. – E agora eu percebi que
ainda não experimentei você nessa
cozinha.
– Tem certeza de que quer tentar? –
Sua respiração começava a ficar rasa.
Meus dedos alcançaram sua calcinha. –
Nós dois sabemos que você não é muito
bom na cozinha.
Eu tive que rir.
– Então você manda. Me diz o que
fazer. – Puxei sua calcinha para fora e
passei os dedos pela sua pele lisa. Meu
pau latejou com violência. Eu não ligava
para pelos, mas sentir Dominique
lisinha daquele jeito fazia meu sangue
evaporar.
– Me conta como você se masturba. –
Ela tinha a boca tão perto da minha que
nossos lábios se raspavam sempre que
ela falava. – Quando você se toca… –
Segurou minha mão e a guiou para
dentro da minha cueca. – Naquela vez
do banheiro… Que eu te vi… Tremendo
de desejo, estimulando esse pau enorme.
Diz pra mim… – Me beijou.
Dom estava me masturbando junto
comigo. Eu ainda podia sentir sua boca
depois que fechei os olhos. Puta merda,
ela era muito sensual.
– Eu estava pensando naquela porra
daquela toalha. Em como eu queria que
ela caísse para eu poder te ver toda nua.
Inteira, como veio ao mundo. Na minha
frente. – O meu abdômen estremeceu.
– O que é que você ia fazer, Greg? Se
a toalha caísse no chão. – Sua voz era
um sussurro contra a minha língua, e
acho que meu pau nunca esteve tão duro
na vida. Sentia a tensão das veias
rasgando minha pele.
– Nossa… Eu queria te lamber. –
Mantive os olhos fechados. Minha mão
subia e descia no meu pau e a dela ainda
estava lá comigo. Sentindo meu
movimento. Arranhando aqui,
provocando meus testículos ali. –
Quando eu cheguei do trabalho e te vi de
toalha no meio da rua… Nunca fiquei
duro tão rápido. – Minha virilha estava
recuando sozinha e eu me deliciei. –
Tive que esperar uns três minutos pra
me recuperar e não sair armado pela
vizinhança.
– Sabia que eu fiquei muito molhada?
– A voz dela provocava cada centímetro
do meu corpo. – Com suas mãos me
envolvendo. O cachorro puxando a
toalha. – A cada frase que ela dizia, sua
mão se movia pela minha ereção. –
Queria que aquela merda caísse para a
sua boca ficar bem em cima do meu seio
nu. Para eu te mandar abrir a boca e me
chupar.
Coloquei a língua no lábio inferior e a
deixei lá. Não tinha forças para mais
nada. Só para ouvir a voz de Dominique
e foder sua mão. Seus lábios quentes e
molhados fugiram brevemente para o
meu pescoço, mas logo ela estava de
volta, murmurando suas incitações no
meu ouvido.
– Foi tão gostoso. Ficar nua no meio
da sua sala. Só aquele pedacinho de
toalha me separando das tuas mãos. E
nem pense que eu não vi seu pau
acordando quietinho.
– Quietinho? Ele estava desesperado
para te ver pelada.
– É? E eu estava tão molhada que
fiquei com medo que escorresse no
chão. Sua mão segurando a toalha tocou
na minha coxa e eu queria que você
subisse só mais um pouquinho para eu
me esfregar nela e deixar você me foder
com os dedos.
Ela passou as pernas pelo meu
quadril e rebolou.
Puta merda. Eu ia gozar nas calças.
– Nunca tive que segurar tanto o gozo
como nas vezes em que transo com você,
sabia?
– E eu estou começando a ficar com
inveja. – Ela enfiou três dedos na
própria boca e depois na minha. Lambi
cada um chupando sua saliva. Eu sabia o
que ela ia fazer. Tanto que me afastei um
pouco para apreciar a vista quando ela
escorregou a mão entre as coxas e
começou a se masturbar. – Eu disse que
você podia ter ao vivo, não disse?
Soltei meu pau e levantei a saia do
vestido. Ver sua mão estimulando seu
clitóris e os dedos entrando e saindo era
hipnótico. Meu quadril estava se
movendo sozinho em uma atração
magnética. Cada célula do meu corpo
queria penetrar aquela mulher.
– Acho que vou te filmar de novo.
– Hmmm… – ela gemeu e eu calei a
boca. Ai, aquele gemido…
Eu não ia conseguir resistir por muito
tempo. Se ia fazer aquilo, tinha que ser
logo.
– Eu ainda posso meter onde eu
quiser?
Dom sorriu e levantou. Deu uma volta
sensual bem devagar até ficar de costas
para mim. Eu empurrei sua coluna com
uma mão, enquanto subia o vestido com
a outra.
– Ai, minha nossa… Vai, linda.
Empina essa bunda para mim.
Enfiei a mão entre suas pernas e
trouxe sua umidez para trás. Eu amava
quando ela ficava encharcada daquele
jeito. Aquele grito de desejo que aquela
coisinha linda manifestava. Cuspi na sua
entrada uma vez, devagar e passei o
polegar lentamente. Ao redor e depois
dentro.
Ela colocou uma mão entre as pernas
e continuou a se masturbar.
Meu pau estava gritando que se eu
não comesse aquele cuzinho lindo logo,
ele ia assumir o controle por mim.
Forcei um pouco e ela resistiu. Investi
com um pouco mais de força e logo
estava abrindo caminho por aquela
entrada apertada e deliciosa.
Me curvei sobre seu corpo e beijei
suas costas por cima do vestido.
– Dói? Quer que eu pare?
– Nem pense nisso!
Aquela voz carregada de tesão era
tudo de que eu precisava. Logo eu tinha
alcançado um ritmo perfeito e quando eu
parava para prestar atenção no que
estava acontecendo, não conseguia
acreditar.
– Gostosa… – sussurrei mais pra mim
do que para ela.
Segurei sua cintura e ela rebolou.
– Muito gostosa…
Seus gemidos se alternavam com
gritinhos curtos e abafados, e a ideia
surreal de comer Dominique Thoen por
trás e ouvi-la gemer e gritar de prazer
enquanto rebolava no meu pau começou
a ser demais para mim.
– Dom, eu vou gozar. Não aguento
mais.
– Ahhnn… Eu tô quase, Holt. Só mais
um pouquinho. Por favor!
Coloquei a mão entre suas pernas e os
dedos em seu clitóris. Ficamos os dois
beliscando aquela região, bolinando e
masturbando o que nossos dedos
alcançassem.
Ela rebolou mais rápido e eu ouvi a
porta da cozinha se abrir. Se a pessoa,
seja lá quem fosse, desse dois passos, ia
nos ver ali. Mordi seu ombro e coloquei
minha mão sobre sua boca. Parei de
estocar, mas ela continuou com aquele
rebolado impossível. Puxei seu clitóris
com força e ela mordeu minha mão.
Não grita, Dom.
Apertei sua bunda e ela se empinou
ainda mais. Que se foda. Podia ser quem
fosse… Estoquei uma última vez e senti
o mundo girando ao meu redor. O recuo
maravilhoso mandou vibrações por cada
músculo do meu corpo e eu fiquei
dobrado sobre ela, masturbando-a
enquanto seus dentes prendiam minha
mão com cada vez mais força, até que
ela lacrimejou como louca e eu tive
certeza de que tinha gozado também.

– Alguém viu a gente?


– Acho que não. – Holt não parecia
muito seguro.
Olhando pelo lado bom, na pior das
hipóteses tinha sido a avó dele, e ela já
me odiava mesmo…
– Você vai voltar a ficar lá flertando
com sua ex? – chiei. – Se for, eu só
quero ser avisada antes.
– Não – sorriu e me beijou. –
Enquanto você me quiser, eu não quero
nada com mais ninguém. Pode acreditar
nisso?
Estreitei os olhos, analisando seu
discurso.
– Posso tentar – provoquei. – Mas
fique avisado que eu vou flertar com
alguém.
– Posso saber com quem? – riu.
Achou que eu estava brincado. Mas eu
não estava.
– Com o Eric.
– O marido da Shelbi? – seu sorriso
diminuiu.
– Ele mesmo.
Holt ficou sério, abrindo e fechando a
boca como um peixe enquanto escolhia
as palavras.
– E você pode, ou confiar em mim, ou
achar que eu sou uma vagabunda. Seja
como for, tem que decidir agora.
Ele respirou fundo.
– Tenho certeza de que você tem um
bom motivo. Mas eu poderia saber qual
é?
– A gente precisa tirar fotos dele
traindo a Shelbi para que o divórcio
dela saia tranquilamente.
– Não, Dominique. Não. Eu entendo
que você quer ajudar, mas…
– Você não tinha decidido que podia
confiar em mim?
– Olha, pode me chamar de ciumento
controlador, mas eu não quero minha
namorada se agarrando com um cara por
aí. – Deixei o sorriso tomar conta do
meu rosto e ele balançou a cabeça,
brincalhão. – É isso mesmo. Te chamei
de “minha namorada”.
– Não vou me agarrar com ninguém.
Confiar em mim significa confiar no meu
bom senso também.
– Certo. Então, por favor, me
explique como você dar em cima de um
homem casado ajuda a Shelbi… – Sua
boca continuou aberta quando ele
concluiu o raciocínio e eu soube que ele
tinha somado dois mais dois. – Esse
Eric… Foi ele? – As palavras saíram
ríspidas.
– Foi – respondi simplesmente. – Mas
eu não sabia que ele era casado. Só
queria te irritar. Eu já dei um fora nele e
a Shelbi já sabe de tudo. – Achei que
era importante repassar todas as etapas.
Holt sorriu para mim e eu notei que
manter a calma estava exigindo cada
gota de paciência que ele tinha.
– E ele está aqui, hoje?
– Acho que o vi chegando antes de a
gente entrar na cozinha.
– O filho da puta trai a mulher na
minha casa e ainda tem a cara de pau de
aparecer depois?
– Hmm! – Quase me esqueci de um
detalhe importante – E tem mais uma
coisa: ele acha que nós somos casados.
– COMO É?
– Ele ficou com essa impressão e, no
primeiro momento, eu não neguei.
– Olha, eu não vou nem me irritar com
isso. – Abanou as mãos, desistindo – Só
me diz como esse teu plano termina, por
favor.
– Bem, ele começa com você fingindo
que somos casados. Não precisa nem
fazer nada se não quiser. Só não
desminta.
– Tudo bem. O que mais?
Eu respirei fundo e comecei a
explicar para Holt o que eu tinha
planejado.

Filho da puta.
Filho da puta.
Eu não conseguia parar de encará-lo.
Ele tinha ficado com Dominique. Com a
minha Dominique. Eu queria engoli-lo.
Queria jogar uma lata de cerveja na sua
cabeça, qualquer coisa…
Imbecil, idiota, sacana, traidor,
cachorro, filho da puta, cara de pau,
descarado, sem noção, nojento, verme,
podre, canalha, bunda mole.
Ele se aproximou. Acho que eu estava
o encarando demais.
– É uma bela casa.
– Obrigado – respondi seco.
– Você devia vir nos visitar um dia.
Você e sua esposa.
– É? – Mordi a língua.
– Com certeza. Eu e a Shelbi íamos
adorar recebê-los.
– Talvez daqui a alguns dias. Tenho
que dar um trato na Dominique antes.
– Um trato?
– É. A Shelbi não mencionou? Dom é
ninfomaníaca. Tem dias que ela fica com
tanto tesão que eu mal posso sair de
casa. É de um jeito que eu mal considero
traição quando ela fica com outros
homens. – Ele estava tentando não sorrir
e não deixar o queixo cair. Estava
falhando grotescamente em ambos os
quesitos. – Então, tenho que dar um
trato nela antes. Para não passar
vergonha na sua casa.
– Ah, sem problemas. Eu e a Shelbi
somos… Muito compreensíveis.
– É, mas a Dominique ultrapassa os
limites às vezes. – Suspirei e fingi estar
muito preocupado. – Você parece uma
pessoa discreta, será que eu poderia… –
Fingi hesitar – Não. Acabamos de nos
conhecer. – Comecei a me afastar –
Seria bem inapropriado.
– Não, por favor, fique à vontade.
Também sou homem – riu. – Sei como
podem ser os problemas conjugais.
Encarei meu inimigo mortal por
alguns segundos enquanto interpretava
um homem que cogita compartilhar ou
não um segredo.
– Dominique está com uma coisa pela
vizinha. Essa tal de… Mad… alguma
coisa.
– Madeleine?
– Essa! – sorri. – Deu que quer um
ménage com a mulher. Ninguém tira
essa ideia da cabeça dela. Estou
começando a ficar constrangido. Mas
enfim… Já disse a ela que não tem
condição.
– Hmm… Entendo. É… fazer o quê?
Dom, você me deve uma.
Uma bem grande.

– Calvin! Que bom que você veio. –


Comecei imediatamente a olhar ao redor
procurando por Andy.
– Claro, Dominique. Não podia
perder.
– E a sua mãe? Ela vem?
– Não… – riu. – Minha mãe não gosta
de festas. Quer dizer… pelo menos não
das que ela não organiza. – Havia algo
sugestivo no seu tom.
– Festas da igreja?
– Festas com igreja.
– Hmm… – ri. – Você conhece o
pessoal? – Encontrei Andy e a chamei
com a mão. Ela caminhou até nós um
pouco insegura. Acho que falar sobre
sexo na minha frente era fácil. Queria
ver agora com o Calvin.
– Ah, acho que sim. Quase todo
mundo.
– Bem, fique à vontade. Tenho que
resolver umas coisas. Anfitriã, sabe
como é… – sorri. – Mas Andy está me
ajudando com umas coisas aqui e ela
cuida de você. Não é, Andy?
Fala alguma coisa, menina…
Revirei os olhos e a deixei decidindo
o que ia dizer.
Holt tinha se despedido de sua avó e
de Merryl. Já vão tarde…
Merryl ainda tinha dado um adeus
educado na minha direção. Eleanor só se
virou como se eu não existisse.
– Vem cá. – Greg passou o braço nos
meus ombros. – Queria pedir sua
opinião profissional.
– O que foi?
– Adam, Liam! Essa é a Dominique.
Dominique, esses são Adam e Liam.
Eu os conhecia. Eram o casal gay das
zilhares de discussões barulhentas.
– Olá! E obrigado pelo outro dia.
– Não estava defendendo…
– Só queria que o barulho parasse, eu
sei – sorriu. – Mas obrigada ainda
assim.
– Adam e Liam estão no meio de um
processo de adoção. Eu me ofereci para
dar uma olhada na documentação e ver
se eu poderia ajudar de alguma forma.
Queria saber se você pode dar uma
olhada também. Você é um pouco mais
perceptiva do que eu.
– Só um pouco? – brinquei,
empurrando ele com o ombro. – Eu olho
sim, com certeza.
Eles me agradeceram e eu desviei o
olhar para observar Eric no canto da
sala. Ele estava me seguindo com olhos
de gavião. Holt fez um gesto quase
imperceptível e eu percebi que ele já
tinha conversado com nossa vítima.
Sorri e meu namorado, notando que
outro homem estava de olho no que era
dele, apertou minha bunda sem qualquer
constrangimento. A única pessoa, fora
nós dois, que viu foi a única pessoa que
estava olhando para minha bunda. E
depois de receber a carícia de Holt,
segui direto para ele.
– Acho que eu te devo um pedido de
desculpas – comecei.
– Acho que deve. – Ele se aproximou
e tentou sussurrar sedutor. Mas depois
de conhecer o sussurro sedutor de Holt,
o dele era só um grasnido ridículo. –
Você foi um pouco rude demais da
última vez em que nos encontramos.
– TPM. – disse seca. – Fico subindo
pelas paredes de fúria. Aí ela passa e eu
continuo subindo pelas paredes. Só que
de tesão. – Eric deu mais um passo na
minha direção. – Você gostou da
brincadeira da última vez. Será que
topava mais uma?
– Pode ser que sim. Pode ser que não.
– E se eu te prometer que vai ser bem
gostoso – sussurrei, ensinando para ele
como é que se faz.
– Nesse caso, você tem minha
atenção.
Ótimo.
Capítulo 21
“Oh Rhett, me escute, eu devo ter te
amado por anos, mas fui uma tola
estúpida e não percebi.”

Scarlett – E o vento levou

Considerando tudo que poderia dar


errado, a festa da noite anterior tinha
acabado sendo bem interessante.
Minha avó não demorou mais que uma
hora e, aparentemente, não enfureceu
Dominique além do necessário. Ainda
me segurou na porta, antes de ir, para
dar mais um de seus discursos sobre os
cuidados. Ela estava terminantemente
convencida que Dominique estava se
aproveitando de mim.
– Preste atenção na história de vida
dessa moça, Gregory! Ela parece o tipo
que se apaixona?
Tinha alguma verdade em suas
palavras e, se não fosse Merryl,
revirando os olhos ao seu lado, eu
realmente teria deixado as palavras me
atingirem. E fora a situação com Eric,
tudo mais tinha corrido na mais perfeita
tranquilidade. Lynn tinha sido
inconveniente em um momento ou dois,
mas acho que ela finalmente estava
começando a desenvolver uma saudável
dose de medo de Dominique, o que
estava facilitando as coisas
consideravelmente.
Hill apareceu, mesmo depois do
murro… O que me surpreendeu. Quer
dizer, teria surpreendido se eu não o
tivesse visto conversando com minha
avó. O sacana era um belo alpinista
social e não ia dispensar uma festa na
minha casa de jeito nenhum. Que tenha
feito bom proveito, pois nunca mais
seria convidado de novo.
Dom ainda estava dormindo,
parcialmente coberta, com uma das
coxas para fora do edredom. Saí do
banheiro secando o cabelo e a ouvi
gemer baixinho quando beijei sua coxa
antes de sair do quarto.
Já tinha, seguramente, passado das
três horas da manhã quando fomos
dormir. A festa com a vizinhança acabou
pouco depois da meia-noite. Alguns
vizinhos tinham ficado para ajudar na
limpeza, o que eu achei muito gentil.
Não sei se Dominique compartilhava
meu sentimento, já que passou uma boa
meia hora gritando ordens para cada um
deles. O curioso é que eles sorriam e
obedeciam. Faziam caretas quando ela
não estava olhando, mas é claro que
Dom sempre percebia. Ela mostrava a
língua para eles e continuava como se
nada tivesse acontecido. Eles pareciam
gostar dela. De um jeito bem peculiar,
pareciam ter notado o que eu notei: que
debaixo da rígida casca grossa, se
escondia uma mulher incrível.
Era quase impossível de acreditar.
Bom demais para ser verdade…
Eu tinha um sorriso no rosto e um
calor no coração que não ia embora.
Algo em mim sempre soube que ela
era uma pessoa boa. Passou boa parte da
noite conversando com um senhor de
aparência debilitada. Ele não ficou por
muito tempo, mas ela fez questão de ir
buscá-lo em casa e depois deixá-lo de
volta. Fiquei sabendo depois que ele
tinha um câncer bem sério. Não teria
percebido sozinho que era algo grave:
embora ele tivesse uma aparência frágil,
estava sempre sorrindo e pareceu se
divertir.
Desci as escadas passando a mão nos
meus cabelos molhados. Depois que os
vizinhos foram embora, eu e Dom
começamos a nossa festa privada. Ela
não tinha trazido os morangos e outros
itens da sua experiência. Mas eu estava
tão envolvido de desejo pelo seu corpo
que só notei isso quando já estávamos
deitados para dormir. Mas tínhamos o
domingo todo pela frente e eu não ia
estragar aquelas compras especiais. De
jeito nenhum.
– Vem, garoto!
Estava levando Max para o quintal da
frente assim que terminei de tomar café
quando vi Dom descendo as escadas.
– Não me acordou?
– Não. – Fiquei um degrau abaixo
dela e nossas bocas ficaram na mesma
altura. Ela segurou meu rosto com as
mãos e eu a beijei. – Estava tão linda
dormindo. – Revirou os olhos para mim.
– Tão pacífica e pouco agressiva –
brinquei.
– Mas agora eu acordei e a paz
acabou – decidiu. – Para onde meus
meninos estão indo? – alisou Max com
carinho.
– Ia lá fora brincar um pouco com ele.
Mas se você quiser companhia para o
café, eu espero.
– Não. Vai! Me deixa em paz – riu,
dando um tapa na minha bunda.
Eu estava feliz.
Nossa, eu estava muito feliz.
Alguns anos atrás eu tinha fugido
daquela cidade tentando deixar tanta
coisa ruim para trás, apenas para
descobrir que elas tinham viajado junto
comigo. Não conseguia largar o
ressentimento, o ódio, o rancor… Como
a cura era impossível, eu simplesmente
olhei pra frente e tentei ignorar o
passado.
Tinha um novo emprego, uma nova
casa, novos amigos. Comprei um
cachorro e vesti a máscara do “está tudo
certo”. Mas no fundo, meu coração
machucado continuava a sangrar. Era
possível que eu estivesse vendo as
coisas de um jeito deturpado já que eu
estava insanamente apaixonado por ela
agora. Mas olhando para trás, acho que
Dominique foi a única pessoa que
realmente tinha me ajudado a esquecer.
Tudo ao meu redor eram novas
tentativas para resolver problemas do
passado.
Menos ela.
Ela era um problema novo.
Um que não tinha nada a ver com
Baxters, Holts, asilos, declarações de
homossexualidade, divórcios ou
acidentes. Ela me irritava tanto que, sem
querer, era a única coisa que realmente
me distraía de todo o resto.
Era a vadia insuportável da minha
nova vida. E uma vida não é completa
sem alguns problemas.
Joguei a bola para Max pela terceira
vez e ele afundou pelo gramado para
recuperá-la.
– Com licença? – Virei o rosto sobre
o ombro procurando a origem da voz.
Era um garoto do outro lado da cerca
baixa da minha casa. Um jovem adulto,
na verdade. Devia ter acabado de passar
dos vinte. Tinha os cabelos escuros e os
olhos claros. Estava arrumado e
perfumado demais para um domingo de
manhã.
– Sim. Posso ajudar?
– Eu estou procurando uma pessoa. –
Ele coçou a nuca constrangido.
– Tudo bem – sorri indicando que ele
continuasse.
– Nossa, cara. Desculpa. Isso vai
parecer coisa de gente doida, mas eu
juro que não sou um perseguidor nem
nada assim.
– Não achei que fosse.
– Meu nome é Leo. – Ele ofereceu
uma mão e eu a apertei – É que eu
conheci essa menina e… Nossa… Não
consigo parar de pensar nela.
– É? – Eu comecei a rir – Conheço a
sensação.
– Fiquei com ela e… Nossa… – Ele
estava sem graça. – Ela me disse que
morava nessa rua, mas não disse a casa.
E eu não… Não peguei seu telefone. É
meio absurdo eu ter vindo até aqui, eu
sei, mas…
– Cara… Eu não julgo. Quem é a
moça? Pode ser que eu conheça.
– O nome dela é Dominique.
Dominique Thoen.
Meu estômago inteiro se contraiu e eu
senti que ia vomitar.
Calma, Greg, vocês acabaram de
conversar sobre isso: vamos confiar em
Dominique. Provavelmente você
entendeu errado.
Engoli a seco. Não estava gostando
do rumo dessa conversa.
– Dominique Thoen? – Meu tom tinha
ficado consideravelmente menos
simpático. Será que era algum maluco
que tinha conversado com Dominique no
bar? Ele tinha feito o quê? Procurado
ela pela internet? Mas como teria
achado minha casa? – Tem certeza?
– Tenho. Nome diferente, não é?
– E vocês ficaram juntos? – Eu
precisa ter certeza de que não tinha
entendido essa parte errado.
– Foi. Nessa última sexta. Deve ter
sido uma das melhores noites da minha
vida, se é que me entende.
– Você não devia ficar falando assim
de mulheres, rapaz. Não é educado.
– Ah, claro. Eu sei. É só que… Bem,
você a conhece? Sabe se ela mora por
aqui? Quer dizer… Ela não mora
exatamente por aqui. Mora do outro
lado do país. Está ficando na casa de um
amigo que acabou de se mudar. Sei que
ele é advogado, como ela, mas não
consigo me lembrar do nome dele.
– Gregory Holt? – Minha garganta
estava seca. Tinha alguma coisa errada,
tinha que ter.
– Isso! Você o conhece?
Prometa que vai ficar atento. Minha
avó só tinha me feito um único pedido.
Só um. Eu queria confiar em Dominique
mais do que qualquer coisa na vida. Mas
e se ela estivesse me enganando? Eu
estava apaixonado… Será que eu seria
capaz de notar?
– Sou eu. Por que não vem comigo?
Dominique está tomando café. – Abri a
porta e ele pareceu envergonhado.
Minha boca estava rígida. Na frente
dele, ela não ia ter como mentir. E eu
precisava saber a verdade.
Não era desconfiança… Eu só estava
atento.
Ele parou assim que cruzou a porta e
eu fui até à cozinha.
– Será que você podia vir até aqui um
instante?
– Claro. O que foi? – Ela me
observou, nervosa. Era o meu tom de
voz. Tinha certeza de que não estava
sendo nem um pouco amigável. E não
queria ser: se aquilo fosse só um engano
eu pediria desculpas. Mas tinha um
homem na minha sala dizendo que tinha
ficado com ela há duas noites e que tinha
sido a melhor noite da vida dele. Eu
merecia uma explicação, não merecia?
– Tem um rapaz aqui dizendo que
ficou com você há dois dias.
– Ah, Holt… – Ela jogou a torrada no
prato – Isso de novo?
– É sério, Dominique. Tem um cara
aqui na minha sala dizendo que ficou
com uma advogada chamada Dominique
Thoen na última sexta. Disse que foi a
melhor noite da vida dele. – o ciúme
subia ácido pela minha garganta. Se ela
estivesse me enganando… Botava ela
para fora da minha casa agora mesmo, e
ia tentar juntar os pedaços do meu
coração. – Disse que ela mencionou o
nome da rua, mas não o endereço
completo. E que não deixou o telefone.
Ele parece um bom rapaz… – Minha
raiva estava começando a ficar
perceptível – Por que uma mulher
ficaria com ele e não deixaria o
telefone? A não ser que estivesse se
escondendo, é claro.
Ela me olhou de um jeito magoado e
eu precisei me manter firme. Firme e
atento. Se ela estivesse me enganando ia
fazer o show inteiro. Ia se fazer de
ofendida e fingir que nunca tinha visto o
cara antes na vida. Precisava colocar os
dois na sala juntos para ter certeza.
– Tome muito cuidado com suas
próximas palavras, Gregory. – Ela se
levantou – Não vou te perdoar pela
mesma ofensa duas vezes.
– Só venha resolver isso, está bem? –
gesticulei na direção da sala.
– Resolver o quê?
– RESOLVER O HOMEM QUE ESTÁ NA
MINHA CASA DIZENDO QUE FICOU COM
VOCÊ!
– Não grite comigo – ela sussurrou e
eu fiquei arrepiado. A mulher conseguia
me assustar. – Eu não fiquei com
ninguém desde que ficamos juntos, está
me ouvindo? Ninguém! Quantas vezes eu
vou ter que dizer isso antes de você
escutar?
– Está sendo difícil, Dominique.
– Acreditar em mim? Por quê?
– Porque… Olha para a sua história!
– Ela engoliu a seco e deu um passo
para trás – Você sempre foi cruel e
impiedosa. Sempre. Me torturar e me
enganar por vingança parece bem
plausível com as suas atitudes. – Eu
sentia uma queimação horrível no
coração. Eu tinha me permitido amá-la.
Se ela só estivesse me enganando ia
doer como nada nunca tinha doído na
vida. – Aí você liga para um médico que
viu uma vez e o convida para sair com
vocês!
– Você já sabe o que aconteceu
naquele dia!
– E se você tiver a vizinha como
desculpa? E tem toda essa história de
dar em cima do Eric que…
– Holt! Não ouse usar isso contra
mim!
– E agora esse cara! – Apontei o
polegar na direção da sala. – São muitas
coincidências, Dominique. Muitas.
– Eu não fiquei com ninguém, Holt. –
Tinha um toque de nojo na sua voz.
Como se a mera acusação a enojasse, e
eu me senti horrível. Mas precisava me
proteger. Meu coração estava nas mãos
dela. Precisava ter o mínimo de
cuidado.
– Tudo bem. Então, vem até aqui e diz
isso pra ele.
Ela passou a língua no lábio em fúria
e suspirou.
– Tudo bem.
Passou por mim me empurrando com
o ombro e cruzou a sala.
– Bom dia. – Arregalou os olhos para
Leo.
– Bom dia… – Ele olhava dela para
mim e de volta, como se esperasse que
um de nós dois explicasse bem
pausadamente o que estava acontecendo.
Ele nunca a tinha visto na vida.
Eu não sabia se ficava aliviado ou em
pânico.
Meu coração estava dando piruetas e
gritando que sabia que ela me amava,
mas meu cérebro estava me mantendo
plenamente ciente da mulher furiosa ao
meu lado.
– Você disse que me conhece?
– Ahh… – Ele abriu a boca e a
manteve assim, sem saber quais
palavras usar.
– FALA, criança! – rosnou. – Você
disse que me conhece?
– Não. Eu não disse. Olha… Deve ter
sido algum engano. Eu preciso achar a
Dom e…
– Precisa achar quem?
– Eu só vim até aqui procurando
Dominique Thoen. Você a conhece?
Olha, eu não quero causar problemas.
Ela deu dois passos em sua direção e
ele se encolheu com um óbvio medo de
apanhar. Era um medo compreensível
dada a real probabilidade de ele, de
fato, apanhar.
– Parece o tipo de homem que eu
levaria para cama? – Ela apontou para a
figura miúda e encolhida.
É… Era um bom ponto.
– Espere aqui. – Ela sussurrou e eu o
vi congelar onde estava. Ele não se
moveria nem se uma chuva de meteoros
atingisse a casa.
– Dom… – Chamei, tímido.
– VOCÊ FICA AQUI TAMBÉM!
Não me mexi.
O que eu estava fazendo?
Era possível que só uma porcaria de
frase da minha avó me fizesse questionar
tudo. Eu sabia como me sentia por Dom
e era um risco, claro… É sempre um
risco.
Mas Eleanor tinha colocado uma
dúvida na minha cabeça e, se juntasse
isso ao medo louco que tinha de perder
aquela mulher incrível que eu tinha
acabado de descobrir… Acho que
qualquer coisa bastava para disparar
uma incontrolável crise de ciúmes.
Ela ia gritar um bocado comigo. E
tinha o direito.
Mas, poxa… O que eu podia fazer? O
cara apareceu dizendo aquilo, não foi?
Eu queria, pelo menos, uma explicação.
Dominique voltou trazendo Andy
arrastada pelo braço mais uma vez.
– Dominique! – Leo respirou
aliviado.
– Leo! – ela sorriu. – O que… Ahm…
O que está fazendo aqui?
– Ele está procurando Dominique
Thoen. – Dominique estava soltando
rosnados para todos os lados e Andy
virou-se para ela com uma boca aberta
de desculpas. – A mulher com quem ele
ficou na sexta.
Andy olhou para mim, nervosa.
– Ai meu deus… – sussurrou. – Você
não devia ter vindo – falou para ele.
– Andrea! Você deu meu nome para
esse rapaz? – Ela estava de volta em
uma sala de audiência, inquirindo uma
testemunha. Se Andy queria elaborar
alguma verdade para contar na frente do
namorado, era bom ela pensar rápido.
Dom não ia lhe dar muito tempo. – DEU?
– Dei. Leo… A gente precisa
conversar. Eu acho que te disse umas
coisas que…
– Andrea? – Ele olhou ao redor
repetindo o nome que Dominique tinha
dito. – Você me deu uma nome falso? –
Sua boca se contorceu em uma careta
irritada.
– Foi ideia dela! – apontou para Dom.
– Foi o quê, menina?
– Foi! Você disse que eu devia fingir
ser você!
– Disse que você devia pensar no que
eu faria ou no que eu diria para ficar
mais à vontade com o cara! Não pra dar
meu CPF! Ficou louca?
– Eu sinto muito, Leo. Sr. Holt. – Ela
se virou para mim, seus olhos tinham um
misto de pânico e educação. – Sinto
muito, eu só… Eu era praticamente
virgem… Não tinha quase nenhuma
experiência e… – murmurou de um jeito
quase inaudível – A Dominique é minha
amiga e ela é sempre tão segura que
eu…
– Olha, chega, está bem? Você! –
Dominique apontou para Leo. – Vai com
ela ouvir toda a sua explicação. Ela é
uma boa menina e isso tudo foi um mal-
entendido.
Leo estava olhando ao redor
assustado. Achei que deveria ajudar
Andy também, afinal, eu também tinha
minha parcela de culpa.
– Pelo que você falou sobre a noite
que passaram juntos, acho que ela
merece pelo menos alguns minutos do
seu tempo.
Ele sorriu constrangido e pediu
desculpas antes de sair.
– Dom… – Andei até ela e tentei
puxá-la pelo braço.
– Não me toque.
Ela marchou de volta para a cozinha e
começou a jogar a louça suja na pia de
qualquer jeito.
– Dom, o que você queria que eu
fizesse? O cara sabia seu nome e
sobrenome. Sabia sua profissão e que
você estava ficando com um amigo. Ele
sabia informações demais… O que você
queria que eu pensasse?
– Queria que pensasse no que eu te
disse, Holt! Que pensasse em como eu
me sinto, no que sinto por você. Que
pensasse que eu tenho meus motivos
para ser ambiciosa, mas que isso não faz
de mim uma vagabunda inescrupulosa.
– Não achei isso.
– Não? Não achou? E por que mais
acharia que eu seria capaz de te trair
com aquele moleque? – Ela apoiou os
braços na pia e me ignorou com o olhar.
– Você está certa – gesticulei. – É so
que… Eu fico com medo de descobrir
que isso entre a gente não é verdade. É
quase bom demais, sabe? – eu sorri sem
querer, me aproximei e coloquei os
braços pela sua cintura daquele jeito que
eu já tinha notado que ela gostava. Mas
dessa vez algo diferente aconteceu.
Tinha uma sensação estranha no ar, e
eu não estava conseguindo determinar o
que era exatamente.
Ela se desvencilhou do meu abraço de
um jeito tímido que não combinava com
ela. Seus olhos estavam no chão e ela
evitava me encarar a qualquer custo.
O que estava acontecendo?
– Me solta, por favor. – Ela ainda
tinha os olhos no chão.
– Dom? – Minha voz mal saiu. Puxei
ela para mim e segurei seu rosto nas
mãos. – Você está chorando?
– Não. Eu não choro. – Ela estava se
contorcendo.
– Vem aqui. – Segurei seu corpo com
força em um abraço apertado e a forcei
a olhar para mim. Ela levantou o rosto
com sua típica irritação. Seus olhos
eram fortes e decididos. Mesmo através
das lágrimas que se acumulavam na
pálpebra inferior antes de cair rolando
pela face.
– Estava lacrimejando. Mas já parei.
Acabou? Pode me soltar? – Ela estava
se mexendo de novo. Meu corpo inteiro
doeu. Ver aquelas lágrimas era como se
alguém estivesse enfiando espinhos nos
meus olhos. Meu peito inteiro se
espremeu e tudo o que eu queria era
limpar seus olhos e seu rosto e abraçá-la
até espantar seja lá o que fosse que a
estava deixando triste. Mas ela não
parou de me empurrar e eu a deixei
livre.
– O que foi que houve?
– Nada. Não houve nada. Olha, dá pra
você ir esperar lá fora? Vou arrumar a
cozinha e aqui dentro você só vai me
atrapalhar. – Ela começou a andar de um
lado para o outro fingindo estar muito
mais ocupada do que realmente estava.
– Dom… Essa coisa com o
moleque… Eu não queria…
– É. Eu sei. Está perdoado. – Não
havia muita firmeza em suas palavras
– Então me diz o que houve. Por que
está chorando?
– Você está surdo? – rosnou. – Disse
que não foi nada. Sai daqui. Por favor.
Tinha algo estranho na sua voz. Algo
choroso, magoado…
– Por favor, me diz o que houve. – O
tom baixo e desesperado de súplica
escapou dos meus lábios.
– Nada… – Tinha bem menos
convicção dessa vez.
– Dom, por favor. – Eu me aproximei
mais uma vez e tirei o prato que ela
mantinha nas mãos como desculpa para
não prestar atenção em mim. – Fala
comigo.
– Ah, que inferno. – Colocou a mão
contra a testa e parecia mais cansada do
que irritada.
– Fala, Dom – sussurrei.
– Nada.
– O que foi? Dom?
– Ah, merda! Entre você não acreditar
no que eu digo e achar que eu sou algum
tipo de puta promíscua e a sua avó vir
me dizer com todas as palavras que eu
sou uma oportunista antiética porque
meu pai era um zelador e minha mãe
uma vagabunda, eu estou tendo um fim
de semana bem ruim. E você! Você! –
Ela me deu um tapa no tórax e eu senti
que ela estava magoada. Não era raiva,
sedução ou provocação. Ela estava
realmente triste. – Você tinha que ficar
lá rindo e se derretendo para a sua ex.
Sabe o que mais, Baxter? – Respirei
fundo. – Se eu quisesse ter ficado com
aquele médico, tinha ficado com aquele
médico. – Ela estava respirando de um
jeito estranho e eu imaginei que a
qualquer momento ela pudesse voltar a
chorar. – Tinha ficado com metade dos
homens daquele bar. E se eu quisesse,
ao mesmo tempo! Mas, ao contrário do
que você, sua família e todo mundo do
escritório pensa, eu sou uma pessoa
decente. Eu cuido de mim em primeiro
lugar? Sim, claro. Olhe ao meu redor,
Holt! Quem é que vai cuidar de mim se
eu não fizer isso? Mas transar com um
homem casado ou ficar com você por
dinheiro, eu…
Ela estava mordendo os lábios e as
lágrimas começaram a cair. Ela nem se
preocupou em escondê-las.
– Eu lutei a minha vida INTEIRA. Por
tudo. Absolutamente tudo. Cada centavo
que eu tenho, cada fio de roupa, cada
grama de conhecimento, cada linha em
cada processo. Tudo. Eu conquistei tudo
o que eu tenho sozinha. – Eu não sabia
se devia me aproximar ou não. Ela não
estava mais chorando de tristeza. Estava
chorando de fúria. Mas lágrimas eram
lágrimas, e eu nunca tive estômago para
ver uma mulher chorar. E quando a
mulher que chorava era Dominique, eu
estava descobrindo bem rápido que
preferia morrer a vê-la sofrer por mais
um segundo. – Mas as pessoas não se
importam com isso. Elas só querem
saber se você é simpática, se as convida
para sua casa. E aí elas gostam de você
e acham que você é o máximo. Eu não
tinha uma casa para convidar meus
amigos. Aliás! Fiz isso uma única vez.
Passei um tempo sem dormir direito na
semana da véspera da prova para a
bolsa. Passei em primeiro lugar e entrei
para aquela escola maldita como
bolsista. Eu era inocente e achava que
só aquilo bastava: que se eu mostrasse
que era boa o suficiente as pessoas iam
gostar de mim e me aceitar. Mas como
eu estava enganada! As três amigas que
eu convidei para conhecer a minha casa
em um fim de semana passaram o resto
da eternidade explicando em ricos
detalhes como tinham pegado micose na
minha casa imunda da filha de lavador
de banheiros. Sabe o que eu fiz?
Mandei todas elas se foderem. Me
formei naquela merda em primeiro
lugar. Todas as melhores notas. Eu
conquistava o que eu queria e não
precisava do aval de ninguém. Nunca. E
eu posso nunca ter sido admirada na
minha vida por mais nada, mas isso era
uma coisa que as pessoas sabiam que eu
era: uma mulher que consegue se virar
sozinha. Não tem nada a ver com ética.
Ou com moral. Eu fui ambiciosa a minha
vida inteira porque eu não conhecia
mais nada. Minha ambição era tudo que
eu tinha. Mas aí, de repente, eu vi isso
se transformar em uma coisa ruim.
Dominique, a vadia megera que só
pensa em si mesma. E aí sabe o que eu
fiz? Mandei todo mundo se foder de
novo. Fiquei incrivelmente boa nisso.
– Dom… Eu não estou dizendo que
você é assim. Me enganei sobre você
por muito tempo. Mas também, no fundo,
sempre soube que você era uma pessoa
boa ou não estaríamos aqui.
– Não, Holt. O que você acha é que
eu sou uma mulher que diria que gosta
de você e sairia na sexta-feira para
transar com outro cara. É isso que você
acha.
– Dom, não faz isso. Não foi assim.
– Então, me diz como foi? E sua avó!
– Ela espremeu a mão contra a testa. –
Ah! Aquele mulher me enlouquece. Ela
age como se tudo que eu conquistei na
minha vida não valesse nada. E por quê?
Porque eu tive que lutar. Porque não
recebi tudo de graça no dia em que eu
nasci. É sério isso? Se eu tivesse
nascido com tudo e não tivesse que ter
me esforçado eu valeria mais do que eu
valho?
– Eu não estou dizendo isso.
– Não disse que estava. É o que ela
diz. Que eu sou errada pra você porque
meus pais não tinham o que os seus
tinham. O que isso tem a ver?
– Não tem nada a ver.
– Não tem nada a ver! – repetiu. -– Eu
não aguento isso. Essa… essa provação.
A única pessoa para quem eu preciso
provar alguma coisa é para mim mesma!
E aí vem você e a sua avó maldita e
agem como se eu precisasse provar
minha índole a cada minuto. Se era isso
que você queria que eu fizesse quando
sugeriu que a gente tentasse, acho que é
um contrato que eu não quero assinar.
– Dom, eu sinto muito por hoje. Não
foi minha intenção. Mas você tem que
entender as circunstâncias. Não pode
analisar tudo fora de contexto.
– Fora de contexto? Ah, vai se foder
você também, Holt.
– Fora de contexto! – repeti. – Não é
simples, Dominique! A gente se conhece
há muito tempo, mas somos novos nisso.
– Indiquei nós dois. – Você não pode
analisar cada atitude minha como mais
uma ação isolada de desconfiança. Isso
tudo é novidade para nós dois. Não
pode esperar que eu não cometa nenhum
erro. Se formos ficar juntos, eu ainda
vou cometer vários. E você também vai.
É assim que a gente vai se conhecer e
criar confiança. Erros podem fortalecer
o relacionamento, se a gente lidar com
eles do jeito certo.
– É fácil falar quando não é você
quem está sendo copiosamente julgado.
– Quem é que está te julgando? Eu só
quis que você esclarecesse o mal-
entendido! Só isso. Fiquei preocupado e
com ciúmes? Óbvio! Se a situação
tivesse sido ao contrário você teria
arrancado minha espinha.
Ela puxou o ar em antecipação ao
monólogo monstruoso que se seguiria,
mas engasgou com as palavras. Soltou
os braços cruzados na frente do corpo e
colocou uma das mãos na testa,
escondendo os próprios olhos. O modo
como seu peito soluçou serviu como
uma clara indicação do que estava
acontecendo.
Ah, droga… Eu não ia conseguir vê-
la chorar e continuar argumentando.
Venci a distância que nos separava e
a coloquei nos meus braços. Dom estava
chorando escondida atrás da própria
mão e fazia o impossível para chorar em
silêncio.
– Amor, por favor, não chora.
Desculpa! É sério: por favor, me
desculpa. Eu só estava roxo de ciúmes e
fui um imbecil! – Seu corpo se movia
seguindo os soluços silenciosos e eu
conseguia sentir sua dor furando minha
carne. Eu daria um braço para que ela
parasse. Arrancaria ele fora no mesmo
instante se isso parasse sua dor. – Sei
que não é justificativa, mas foi isso o
que aconteceu. Me perdoa.
Suas fungadas ficaram irregulares
quando ela respirou fundo.
– Eu achei que era ela. – As palavras
saíram soluçadas e quase
incompreensíveis.
– O quê?
– Achei que era ela – repetiu,
tentando acalmar o choro.
– Linda, você não está fazendo
sentido. – Passei meu polegar na maçã
do seu rosto limpando as lágrimas. Não
resisti e lhe dei um beijo suave na
bochecha. Ela tinha passado uma vida
inteira sozinha e tinha se acostumado a
isso. E agora estava começando a se
acostumar a não ficar sozinha, apenas
para que eu ficasse brincando com seu
coração desse jeito. Estava me sentindo
um traste inútil.
– Você disse que tinha um homem aí
dizendo que tinha ficado comigo. Eu
sabia que isso era impossível. Então eu
pensei que tivesse sido ela. Pensei que
tivesse sido sua avó. – Falar estava
acalmando seu choro, mas eu ainda
conseguia senti-la transbordando de
nervosismo nos meus braços. – Pensei
que ela tivesse contratado um ator ou…
Sei lá… – Ela apoiou a testa no meu
ombro, mas ainda estava se abraçando
de um jeito que não permitia que eu a
confortasse completamente. – Ele ia
saber tudo a meu respeito e ia dizer que
tinha ficado comigo.
– Dom, mas não foi… – Eu tive que
sorrir. – Foi só um mal-entendido.
– Ainda bem… – choramingou. Havia
uma dor imensurável na sua voz que fez
meu coração implodir. – Porque se fosse
isso… Se tivesse sido um plano da sua
avó e não um mal-entendido com
Andy… Você teria acreditado.
Sua tristeza me atingiu como um arpão
e eu ouvi verdade nas suas palavras. Ela
estava certa: nosso relacionamento
ainda era incrivelmente jovem e eu
ainda não tinha aprendido a confiar nela.
Uma pequena provação dessas teria
destruído tudo.
– A gente só precisa de tempo, Dom.
Um tempo para aprender a confiar um no
outro.
– Não consigo, Holt. – Ela tinha
parado de chorar, mas ainda trazia um
sentimento horrível em cada respiração.
– Você não entende… Eu fico bem
sozinha. Aí você aparece e me entope de
gentileza e eu penso “Poxa… E se for
possível?”, e depois você mesmo vem e
destrói tudo. Não suporto essa sensação
de não saber. Foi tão ruim… – Ela
levantou o rosto e eu vi seus olhos
magoados e exaustos. Vê-la com aquela
expressão de derrota consumiu minha
alma, e eu quis me espancar pelo que eu
estava fazendo com ela. – Quando eu
percebi que não ia ter amigos, quando
minha mãe foi embora, quando meu pai
morreu… Sempre que eu me abria um
pouco, eu acabava sozinha e doía tanto
– disse a última palavra com uma
intensidade imensa. – E com você… Eu
não sei se consigo aguentar. Não sei se
quero. Não quero mais. Não quero. Não
aguento mais.
Segurei seu rosto em minhas mãos e
beijei sua boca. Senti o gosto salgado
das lágrimas nos seus lábios. Ela puxou
o queixo me interrompendo cedo
demais, mas eu mantive minha testa
colada na sua.
– Eu te amo – sussurrei.
– Pare, Holt. – Ela estava me
empurrando.
– Eu te amo – repeti mais alto,
tentando mantê-la nos meus braços.
– Como? Você ficou louco? Estamos
juntos nesse experimento insano há
poucos dias. Você sequer confia em mim
e está dizendo que me ama? Ou perdeu o
juízo ou acha que eu sou idiota.
– Não estou dizendo que sempre te
amei. Nem estou dizendo que vou te
amar para sempre. Disse que te amo
agora. – Ela respirou fundo e me
observou. Seus olhos começavam a
brilhar com vida mais uma vez, e eu
senti um alívio se espalhando pelo meu
peito. – Não me entenda mal: eu quero te
amar para sempre. Mas o que eu quero
dizer é que agora, nesse exato segundo,
eu sinto por você algo forte que eu nunca
senti na minha vida. Por nada, nem por
ninguém. Não é mais só paixão e eu
tenho certeza.
– Você não pode…
– Será que você pode calar a boca? –
Ela estava se contorcendo para escapar
do meu abraço e foi minha vez de
interrompê-la. – Já te ouvi um bocado. É
minha vez de falar. – Ouvi sua expiração
resignada. – Eu te amo – repeti e ela
levantou os olhos para os meus. – Ou,
pelo menos, eu acredito com algum nível
de certeza de que é amor. – Umedeci os
lábios procurando as palavras certas. As
palavras que fizessem ela entender e
acreditar. – É uma coisa que cresce. A
cada dia eu descubro algo novo sobre
você e eu sempre adoro cada nova
descoberta. Eu te amo mais agora do que
há alguns dias quando percebi que isso
era mais forte que uma paixão simples e
boba. Se isso – disse apontando com o
indicador para o meu peito, para o meu
coração –, se isso continuar crescendo
desse jeito… Acredite: daqui a pouco
tempo vou te amar de um jeito
inquestionável. Eu sei que faz pouco
tempo! Eu sei. Mas tem que ser
diferente, não é? Quero dizer, algumas
pessoas podem levar anos para
perceber, outras meses.
– E outras dias?
– Uma pessoa que ama a outra há anos
teve que começar em algum lugar, não
foi? Em algum momento a amou só há
alguns dias.
– Não é isso que eu estou dizendo.
– Mas é isso que eu estou dizendo.
Daqui a muitos e muitos anos, eu e você
vamos estar casados, com filho e netos.
Teremos envelhecido juntos e estaremos
morando em um asilo. Vamos ter tido
uma vida inteira de provações, brigas,
mal-entendidos e raivas. Mas também de
companheirismo, amizade, confiança e
respeito. E eu vou olhar para trás, para o
meu eu jovem de hoje e vou pensar “Ah,
aquele moleque estúpido não fazia a
menor ideia do que era amor. Não fazia
a menor ideia do quanto ele ainda ia
amar aquela mulher”. Você pode achar
que é loucura. Pode achar impossível e
ridículo. Pode questionar se quiser. Mas
essa é minha realidade, hoje. Eu te amo.
E pronto.
Meus dedos estavam entrelaçados em
suas costas quando ela apoiou as mãos
no meu peito. Encarou as próprias unhas
durante uma fração de segundo. Aquela
timidez curiosa tinha voltado e, mesmo
que não fosse um comportamento típico
de Dom, ela ficava linda com aquele
jeito discreto. Mas quando é que ela não
ficava linda?
– Por que a gente vai estar morando
em um asilo? – perguntou finalmente,
com o princípio de um sorriso no rosto.
– Porque nossos filhos não vão te
suportar, não é óbvio? – belisquei sua
cintura e ela riu. – Vão te despachar
para lá assim que puderem. E eu vou te
seguir porque não consigo viver sem
você.

Subi as escadas com os meus dedos


presos nos de Holt. Ele me guiou do seu
jeito carinhoso e tranquilo.
Ele me amava?
Então não era absurdo e desesperado
eu amá-lo de volta?
“Se a situação tivesse sido ao
contrário você teria arrancado minha
espinha.”
Ele estava certo. Só de vê-lo falando
com a ex eu já estava na iminência de
um frenesi furioso. Se uma mulher
tivesse aparecido dizendo que tinha
passado a noite com ele… No mínimo,
eu ia querer uma explicação. No
mínimo.
O meu verdadeiro problema tinha
nome e sobrenome: Eleanor Baxter.
Desde que ela tinha aparecido eu estava
insegura. E insegurança era uma coisa
incompatível com cada fibra do meu ser.
Meu corpo estava recusando esse
sentimento como se fosse um corpo
estranho e inimigo no meu coração, e o
resultado tinha sido uma quebra na
minha confiança e muitas lágrimas.
Aquela mulher desalmada mexia
comigo.
Todos que eu conhecia podiam me
achar uma antipática nojenta, mas
ninguém questionava o meu valor. Há
muitos e muitos anos eu não ouvia
qualquer questionamento a respeito das
minhas capacidades. Eu odiava a ideia
de que ela podia fazer Greg duvidar de
mim. Mas não podia odiá-lo por ceder
quando até eu estava começando a
duvidar de mim mesma. A velha tinha
uma lábia digna do diabo.
Eu só precisava separar as coisas e
deixá-la no seu lugar: bem longe do meu
relacionamento.
Foi só um engano. Andy ficou com
medo e fingiu que era eu. Era até fofo
quando eu parava para pensar. Fofo de
um jeito bem estranho, é claro. Mas na
sua busca por confiança, ela tinha
encontrado a minha imagem. De certo
modo, eu me sentia honrada.
Holt estava me guiando para o quarto.
Eu entendia o que ele queria porque era
o mesmo que eu precisava. A situação
inteira transpirava uma necessidade
infinita de nos enfiarmos no corpo um do
outro e ficarmos lá até a mágoa sumir. E
ela sumiria, com certeza.
Estanquei quando faltavam apenas
dois degraus.
– O que foi? – Greg me observou
nervoso. Acho que ele estava com medo
que eu voltasse a chorar ou dissesse que
não queria mais aquilo e fosse embora.
Mordi a ponta do meu polegar e lhe
ofereci um sorriso safado que
imediatamente o tranquilizou. – O que
foi? – repetiu, com um tom muito mais
descarado.
– Esqueci minhas compras lá
embaixo. Me espera no quarto enquanto
eu vou buscar?
Seu sorriso aumentou e eu podia
contar seus dentes brancos e perfeitos.
– Sem dúvida.

Melei a mão no iogurte e desenhei


ondas de chocolate pelo seu peito. Seus
olhos mal permaneciam abertos
enquanto longos e suaves suspiros de
desejos escapavam pelos seus lábios.
Greg enfiou as mãos nos meus
cabelos e eu desci a língua até seus
mamilos. Usei os dentes para provocá-
lo antes de levar a língua até o doce
sobre sua pele e limpá-lo com lambidas
curtas e demoradas. O gosto do
chocolate provado direto do seu corpo
despertou o meu paladar enquanto eu
descia as mãos pelo seu quadril
enfiando meus dedos no topo da sua
cueca para empurrá-la para fora do
caminho.
Era a primeira vez em que ele ficava
completamente nu enquanto eu ainda
estava completamente vestida. Ele
movia os dedos no meu cabelo em
padrões circulares, fazendo um cafuné
calmo.
– É melhor tirar a roupa ou vai sujá-
la.
– Já, já. – Derrubei mais iogurte
sobre seu peito, dessa vez direto do
pote, e vi seus músculos se contraírem
de frio. A camada grossa se espalhava
devagar pelo seu tórax. Então me
estiquei para a bandeja de morangos na
cabeceira.
Umedeci os lábios antes de morder só
a pontinha da fruta. Deixei que ele
apreciasse a vagareza do movimento e
senti uma típica rigidez contra minha
perna.
– Vira aqui pra mim – pediu,
baixinho. – Morde esse morango de
novo para eu ver.
Eu sorri com tesão nos olhos e repeti
a mordida, ainda mais provocante. Ele
se inclinou para sentar e o iogurte
escorreu, mas ele não pareceu se
importar. Me beijou por cima do
morango que eu tinha delicadamente
colocado na sua boca, antes de morder
um pedaço direto dos seus lábios. Ele
fechou os olhos e gemeu, mastigando.
Peguei mais um morango e o lambuzei
no chocolate do seu corpo. Greg se
deitou mais uma vez colocando as mãos
entrelaçadas atrás da cabeça, e eu pude
ver aqueles músculos deliciosos dos
seus braços se desenharem ao alcance
das minhas mãos… Ao alcance da minha
língua… Eu queria morder aqueles
bíceps.
E foi exatamente isso que fiz. Não
precisei de chocolate ou morango, ele
era delicioso assim também: puro. Só
Greg. Coloquei um pedaço do bíceps
rígido entre os meus dentes e apertei
sensualmente. Desci a língua pela
extensão do seu músculo e o beijei e
lambi.
– Não vai querer chocolate? – riu.
– E precisa? – Passei mais um
morango na sua barriga e limpei um
pedaço do iogurte revelando o
tanquinho que me esperava logo abaixo.
– Você é gostoso de todo jeito.
– Mesmo assim, sem nada? – brincou.
– Especialmente sem nada. – Passei
chocolate nos meus lábios e o trouxe em
minha direção. Ele chupou minha boca
com fome.
– Quero mais morango – pediu.
Peguei na bandeja e coloquei ao alcance
da sua mordida, mas ele se virou. – Não
quero na minha boca. Quero na sua. –
Coloquei a fruta presa entre os meus
dentes e me inclinei. Sua mão forte me
segurou pela nuca enquanto ele mordia a
fruta e o meu lábio indistintamente.
Terminei de lamber o chocolate do
seu corpo. Limpando cada gominho do
seu tanquinho com uma lambida
orgásmica. O limpei com saliva dos
mamilos até o umbigo, e Greg se
contorcia de prazer sob minha língua
enquanto gemia elogios.
– Ai… Linda…
Tirei os últimos resquícios de
chocolate do seu tórax com meus dedos
e os lambi. Seus olhos brilharam e eu
toquei seu pau apenas para senti-lo
latejar com aquele desespero
maravilhoso. Ele realmente amava
quando eu enfiava os dedos na boca.
Antes era sem querer… Agora, eu fazia
isso sempre, e de propósito.
– Essa tua barriguinha é gostosa
demais. Só percebi agora como comida
fora dela não tem gosto. – Fiz um
beicinho e ele levantou da cama com
voracidade.
– Estou com fome – sussurrou contra
minha boca. Eu achei que ele ia me
beijar. – Minha vez – decidiu, e eu o
senti se afastar, rápido demais, antes de
me segurar pela coxa e me jogar deitada
na cama. Tirou minha roupa sem
cerimônia e me deixou nua. – Assim… –
sorriu. – Do jeito que eu gosto. Nua, na
minha cama e… – ofegou enquanto
descia a mão entre as minhas coxas – …
molhada.
– Vai me comer, agora? – perguntei
sonsamente.
– Ah, querida… Você não faz nem
ideia.
O toque frio do iogurte fez com que eu
me arrepiasse. Esfreguei uma coxa na
outra, tentando causar fricção no meu
clitóris, mas Holt segurou um dos meus
joelhos e abriu minhas pernas.
– A minha putinha tá com tesão, é?
– Morrendo – choraminguei.
– Pois vai continuar morrendo. Nada
de desperdiçar essa vontade toda só
esfregando as pernas. Você vai esfregar
essa bocetinha, já, já. – Desceu a boca
para o meu corpo melado. – Mas vai ser
em outra coisa.
Holt tomou meus seios e eu coloquei
uma mão de cada lado da cabeça
empurrando o colchão e jogando meu
corpo contra ele. O desejo que eu sentia
por aquele homem era uma coisa
incontrolável.
– Não faz assim! Tá me deixando
louca aqui. – Tentei puxar minhas coxas
para voltar a espremê-las uma contra a
outra, mas ele ainda mantinha meu
joelho firme em sua mão. – Me come,
vai…
Greg lambeu longamente o chocolate
em um dos meus seios e depois no outro.
– Estou comendo – riu.
– Holt! – Eu não sabia se estava
falando ou gemendo o nome dele. – É
sério! – Minha voz saía encharcada de
luxúria – Ou mete agora ou, quando
você quiser enfiar, eu não vou deixar!
– Não vai, é?
Soltou meu joelho e se enfiou entre as
minhas pernas. Raspou a ponta da sua
ereção na entrada da minha boceta e
ficou subindo e descendo até o meu
clitóris em uma provocação
insuportável. Eu gritei com força.
Puta que pariu! Eu queria mais.
Queria aquele pau em mim, duro e feroz.
Mas ver o nível enlouquecedor do meu
tesão estava apenas divertindo um Holt,
que ainda tinha fôlego para mais
algumas horas de preliminares.
Movi meu quadril em sua direção e
ele escapou.
– Não quero – rosnou autoritário. –
Não quero te foder agora. Quero só isso
aqui. – Chupou mais um pouco de
chocolate antes de se inclinar e segurar
o pau pela base. Aproximou a ponta de
mim mais uma vez e se pôs a acariciar
meu clitóris com sua rigidez. Primeiro,
eram só cosquinhas deliciosas, mas a
intensidade foi aumentando e logo ele
estava se esfregando contra minha
virilha e eu estava gemendo como uma
vadia no cio.
– Ai… Dom… Se continuar gemendo
assim vou gozar na tua barriga.
– Greg! – gemi. – Não para. Vai,
lindo. Por favor. Come tua putinha,
come. Me come agora. – Apertei minhas
coxas ao seu redor, tentando trazê-lo
para mim. Mas ele ainda não ia fazer
aquilo.
– Pede mais um pouquinho, Dom,
implora pra mim. Me diz se esse iogurte
matou a sua fome.
Eu estava gritando que não e ele
colocou um morango na minha boca
apenas para tirá-lo da minha língua com
a sua.
Seu pau continuava escapando sem
nunca parar de estimular meu clitóris.
– Sabe o que eu queria? Um pouco do
seu líquido para lavar a refeição.
– Aaahh… – Eu não conseguia parar
de gemer e de me contorcer. – Puta que
pariu, Greg! Me fode.
– Se eu te botar na boca você jura que
não goza? Porque eu quero te ouvir
gozar no meu ouvido e com o meu pau
dentro de você.
Não gozar se ele me chupasse? Eu
não sei como ainda não tinha gozado só
com a surra que a ponta do seu pau
estava dando no meu clitóris.
Eu queria dizer que jurava só pra ele
me chupar e eu gozar de uma vez. Mas
eu não estava conseguindo mentir e do
jeito que meu corpo gritava desesperado
buscando o alívio, eu tive certeza de que
ele não acreditaria mesmo se eu
mentisse.
– Acho que não, não é? – ele sorriu e
me beijou. Seu corpo estava sobre o
meu, nós dois melecados de doce e
suados de desejo. Sua boca tinha um
gosto melhor do que qualquer coisa e eu
vi o suor escorrendo pelo seu corpo.
Aquela delícia de peitoral perfeito…
Era um suor que pedia língua e eu o
mordi e lambi. Suas mãos empurraram
minhas coxas com força e eu as abri.
Vi o morango na mão que Holt desceu
para a minha virilha antes que ele o
esfregasse em mim, molhada. Depois o
trouxe para a própria boca e o comeu.
Movi meu quadril em desespero. Eu
precisava de um orgasmo naquele exato
momento, ou ia começar a convulsionar.
Greg enfiou o nariz na curva do meu
pescoço e me lambeu do ombro até a
orelha.
– Esse teu suor de tesão é mais
gostoso do que chocolate.
Ele colocou força suficiente no
quadril para me rasgar com a ereção,
mas eu estava tão fodasticamente
molhada que o pau duro escorregou até
quase a parede do meu útero. Ou pelo
menos, era essa a sensação.
Enfiei minhas unhas na carne das suas
costas e tive certeza de que, quando o
sexo acabasse, aquilo ia doer como o
inferno. Mas ele nem sequer hesitou e
continuou a me foder. Minha boca se
abria sozinha e eu sentia o orgasmo se
formando entre minha virilha e meu
umbigo. Poderia ter ficado com
vergonha dos meus urros animalescos se
eles não se comparassem aos de Holt em
número e intensidade.
Ele me fodia forte e gostoso, e mesmo
estando seguramente dentro de casa, vi
estrelas. Gozei e gozei e gozei e gozei
antes de ouvi-lo gritar meu nome e com
uma última rasgada derramar seu líquido
quente dentro de mim.

Eu estava em uma missão de beijar


cada centímetro do seu corpo. Ela ficou
deitada, sorrindo com o polegar entre os
dentes.
– Te amo – disse depois de um dos
meus zilhões de beijos. – Te amo. –
Mais um beijo – Te amo. – Eu adorava
repetir aquilo. Era gostoso como ficava
formigando na minha boca, anestesiava
qualquer dor, qualquer preocupação.
Dom puxou o cabelo molhado para o
lado e eu beijei sua boca.
– Acabou? – sorriu.
– De te beijar todinha? Acabei. Mas
acho que vou começar de novo. – Puxei
sua mão e comecei a beijar cada um
seus dedos enquanto ela ria e me
empurrava. Abracei seu corpo ainda
úmido do banho, apoiei minha testa na
dela e fechei os olhos. Senti seu toque
delicado nos meus lábios e beijei seu
dedo sem abrir os olhos.
– Eu tenho que sair – sussurrou.
– Não – decidi.
– É sério. Tenho que ver se está tudo
certo para hoje à noite.
– O problema da Shelbi? – Abri os
olhos e ela me beijou.
– Isso.
– Ela precisa de mais alguma coisa?
Fora essas fotos dele com a Madeleine?
– Não. Só bons advogados – sorriu.
– Isso a gente providencia. – Apertei
o abraço – Precisa ir agora?
Dom alisou meu ombro e me
observou como se estivesse travando
uma épica batalha interna.
– Não. Na verdade, acho que posso
ligar e pedir para Andy resolver e
passar o dia aqui na cama com você. –
Aquele sorriso tímido deslumbrante
tinha voltado.
– ADOREI esse plano. – Ela riu alto. –
Vamos fazer isso.
– Será que a gente consegue adestrar
o Max para ele fazer o almoço?
– Acho que sim – respondi resoluto
só para continuar ouvindo aquele riso
que fazia qualquer estresse valer a pena.
Qualquer problema, qualquer
irritação… Era só ouvir aquela risada e
eu estava bem.
Eu amava Dominique e tinha cada vez
mais certeza disso.
– Você ficou bem íntima da
vizinhança, não foi?
– Culpa sua. – Eu comecei a rir –
Agora, tenho que me preocupar com
todo mundo.
– Foi legal o modo como você ajudou
a Andrea.
– É… E vê como ela me retribui –
sorriu.
– Mas acabou dando tudo certo. –
Beijei a ponta do seu nariz. – E ela
parece ter se dado bem com o filho da
outra vizinha.
– O Calvin?
– É. Notei que eles passaram a noite
toda juntos.
– Ela tem uma queda por ele. Mas não
vai dar certo.
– Ele tem cara de ser descarado.
– Pois é. E Andy vai acabar casando
com Rick – sorriu. – Nenhum dos dois
faz a menor ideia ainda. Mas eles
combinam demais. Se completam, sabe?
O que ela tem de nervosa, estressada e
briguenta ele tem de calmo e racional.
Daria certo.
– Tipo a gente? – brinquei.
Ela ficou estranhamente silenciosa
por alguns segundos antes de dizer:
– Greg?
– Hmm?
– Eu sei que eu não disse… nada.
Eu sabia o que ela queria dizer.
Queria dizer que não tinha dito que me
amava também.
– Não é que eu não sinta – continuou
–, mas é só… Acho que não estou
pronta, sabe? Para dizer.
– Tudo bem. – Apertei seu sorriso no
meu em um beijo gostoso – Não precisa
dizer nada. Eu só disse o que eu queria
dizer.
– Eu só não quero que você pense
que…
– Não estou pensando em nada.
Prometo.
Para ela era vulnerabilidade demais
em apenas uma semana, e eu entendia.
Preferia que ela dissesse quando
estivesse pronta. Que fosse natural e
espontâneo. E não forçado porque ela
achava que me devia algo.
– Tudo bem. Desde que você entenda
que eu… Eu também me sinto… assim.
Mas acho que ainda é cedo.
– Eu entendo. – Esfreguei minha testa
na sua em um movimento brincalhão –
Juro que entendo.
– Só preciso de um tempo.
– E você tem todo o tempo que quiser
– dei de ombros com ela nos meus
braços. – Eu não vou a lugar algum.
O meu celular tocou estridente em
cima do criado-mudo arrancando nós
dois de nosso paraíso particular.
– Holt. – Atendi.
– Gregory? É Devon. Olha, tivemos
um problema no caso da Borgouis. O
prazo é amanhã, Andrew está chamando
todo mundo de volta para o escritório.
Precisamos fazer um milagre.
– Ahmm… certo. Tudo bem. Estou
chegando.
Desliguei o telefone e olhei para
Dom. Ela me observava com um sorriso
curioso nos olhos.
– Não vai a lugar algum, hein? –
brincou.
– Culpado. Problema com um dos
clientes – expliquei. – O prazo é
amanhã.
– Tá. Vai lá salvar o mundo.
– Volto o mais rápido que for
humanamente possível.
– É bom mesmo. Porque eu vou até a
casa do Rick ver se ele preparou as
câmeras para Madeleine e depois vou
voltar para essa cama, tirar a roupa e
ficar te esperando.
Eu estava muito feliz.
A vida estava me tratando cada vez
melhor.
– Não me deixe esperando muito
tempo, ouviu, Holt?
– Sim, senhora.

Eu tinha acabado de me vestir e de


descer as escadas quando ouvi batidas
na porta.
Não podia ser Holt. Mesmo que
tivesse esquecido alguma coisa, ele
tinha as chaves.
Max chegou na porta antes de mim.
Puxei sua coleira, afastando-o da
entrada antes de girar a maçaneta.
– Eleanor – cumprimentei, sem
qualquer indício de ânimo na voz. Tinha
decidido que não ia nem me dar ao
trabalho de fingir simpatia.
– Dominique. Posso entrar?
– Achei que você tinha a chave.
– Eu tenho. Mas preferi tocar a
campainha e evitar que você agredisse
meu motorista.
– Olá, Boe. – Acenei para o homem
alto que tinha ficado na calçada, perto
do Rolls-Royce estacionado.
– Srta. Thoen. – gesticulou uma
reverência com a cabeça e Eleanor
olhou para trás com uma expressão
ácida. Boe ajeitou a postura e voltou a
me ignorar.
– Podemos conversar lá dentro? Ou
as pessoas têm o hábito de conversar na
porta no lugar de onde você veio?
– De onde eu venho as pessoas têm o
hábito de serem minimamente educadas
com quem elas mal conhecem. Mas acho
que isso é demais para a senhora.
– Ora, ora… Olhe quem não está mais
com medo.
– Está insinuando que em algum
momento tive medo da senhora?
– Não estou insinuando, querida. –
Ela me empurrou com o braço e entrou
na casa.
– Pode entrar – Completei sarcástica,
quando ela já estava a meio caminho do
sofá.
– Não preciso de convite para entrar
na casa do meu neto. Sente-se.
– A senhora quer beber alguma coisa?
– Abri um sorriso propositalmente falso.
– Arsênico? Cianeto?
– Se isso foi uma ameaça, vai receber
uma ligação dos meus advogados.
Eu tive que rir.
– Não se ameaça um rottweiler com
poodles, sra. Baxter. – Levantei uma
sobrancelha. – Mas foi apenas uma
piada. Diga-me: qual foi a ofensa que a
senhora veio me fazer dessa vez?
– Nenhuma ofensa. Só um pedido
educado: vá embora. Hoje.
– Não, obrigada – sorri. – Era só
isso? – Indiquei o caminho da porta com
um gesto.
– Vou ter que lembrá-la de que fui
educada primeiro.
– Educada? “Vá embora. Hoje.” Isso
é educação de onde você vem? Acho
que prefiro a minha etiqueta de filha de
lavador de chão – rosnei.
– Ah, estou farta do som da sua voz.
Talvez isso aqui cale a sua boca.
Ela levantou a tela de um tablet para
mim. Estava no mudo, mas a imagem foi
mais do que suficiente para fazer meu
coração parar de bater.
Era o quintal da minha casa. Meu
corpo nu se contorcia sobre a
espreguiçadeira na borda da piscina
enquanto um vibrador entrava e saía da
minha vagina.
Me senti fraca e trêmula. Minhas
pernas começaram a se curvar sem
minha autorização e quando dei por
mim, estava sentada no sofá.
– Eu mantenho Gregory sob constante
observação. E, em um mundo digital,
isso significa ter não apenas o acesso
irrestrito à sua casa, mas também acesso
irrestrito a determinados aparelhos.
Agora! – Ela desligou a imagem e deitou
o tablet no próprio colo. – Vou repetir:
vá embora. Será que está me ouvindo
dessa vez? Ou vai ter mais algum
comentariozinho sarcástico para
acrescentar à conversa?
Eu tentei engolir a seco, mas não
havia qualquer saliva na minha boca.
Minha garganta estava ardida e
ressecada. Puta que pariu.
Puta.
Que.
Pariu.
– Ah, nenhum comentário? Bem, já
que a senhorita está prestando atenção,
vou aproveitar para explicar o que vai
acontecer. Não sei que tipo de mel você
passou nessa falha funda que tem no
meio das pernas, mas meu Gregory
parece estar hipnotizado.
O jeito como ela falava “meu
Gregory” era duro e possessivo. Nada
como o jeito gentil, delicado e tímido
como Audrey tinha chamado logo antes
de se desculpar por fazê-lo.
“E não se engane, Dominique, aquela
mulher é o demônio.”
As palavras da mulher frágil e
abandonada inundaram minha mente. Ela
estava certa. Muito certa.
– Tanto que nem mesmo Merryl foi
capaz de persuadi-lo. Enfim… Se não
posso fazer do jeito suave e natural, vou
fazer do jeito Baxter. Eu te fiz uma
promessa, Dominique, e eu pretendo
cumpri-la.
Eu estava tentando respirar.
Meu corpo inteiro tremia. Minha vida
estava ali naquele tablet. Meu futuro
inteiro, nas mãos dela. E diferentemente
de Holt, ela não tinha qualquer motivo
para se conter. Diferentemente de Holt,
ela não queria só brincar e me dar uma
lição.
Ela queria me destruir.
E tinha munição suficiente para fazer
isso quantas vezes quisesse.
– Você tem vinte e quatro horas.
Ouviu, criança? A esta hora, amanhã, ou
você vai estar em um avião voltando
para qualquer que seja o buraco que
chama de lar ou esse vídeo vai estar na
internet. E no e-mail de cada um dos
seus empregadores e potenciais
empregadores. Uma vez por mês, pelo
resto da eternidade, para ter certeza de
que eles não vão esquecer a vagabunda
promíscua que você é.
Ela se levantou e eu fiquei muda,
encarando o espaço vazio no sofá que
ela tinha ocupado há poucos segundos.
Eu precisava dizer alguma coisa.
– Eu disse que você deveria ter
aceitado minha proposta. Poderia estar
saindo daqui com dinheiro, contatos e
infinitas oportunidades. O que está
acontecendo agora com você é culpa
exclusivamente sua.
Defenda-se, Dom. Reaja!
– Foi seu neto quem fez essa
gravação. Se você colocar isso na
internet, não se preocupa em prejudicá-
lo?
– É um dano que eu posso contornar –
sorriu. Maldita.
Eu não ia aguentar ser chantageada
mais uma vez. Aquela merda daquele
vídeo já tinha causado o máximo de
problemas na minha vida que iria
causar.
– Você está errada – mordi o lábio. –
Eu amo o seu neto.
– Ama, é?
– Amo – respondi ríspida, e me odiei
por ter me permitido confessar isso para
ela antes de conseguir dizer para Greg.
Aquele vídeo não ia me incomodar
mais. E nem aquela velha. Os dois
tinham me escravizado o suficiente para
uma vida inteira, e eu não ia mais
aceitar. – Quer espalhar esse vídeo?
Pois espalhe. Eu não ligo mais. Não
cometi nenhum crime. Não há vergonha
nenhuma em ser uma mulher e exercer
sua sexualidade.
– Acho que o mundo jurídico não vai
concordar com você.
– Vou sofrer preconceito e ser
hostilizada – dei de ombros com um
breve sorriso de desespero. – Já sofri
preconceito e fui hostilizada antes. Eu
sobrevivo.
– Se o ama é mais um motivo para ir
embora. – Eu odiava aquele sorriso
impiedoso. Queria avançar com uma
faca na cara dela e arrancar aquele
sorriso fora. – Você acha que pode
conquistar grandes coisas com ele. Que
adorável! Mas ele já nasceu sendo vinte
vezes superior a você. Imagine tudo que
ele pode ser? Ele pode ser um Baxter. –
Ela estava gesticulando pela sala como
se estivesse proferindo um discurso
presidencial. – Pode ser o guia de um
império internacional. Mas se ficar com
você, se optar por essa… Por essa… –
olhou ao redor com nojo –, essa
vidinha, ele nunca vai ser mais do que
um mero advogado subalterno. Se você
o ama, por que não deixá-lo atingir seu
potencial? Você pode discordar de mim
quanto ao valor de um berço de ouro,
mas não pode negar que dinheiro e
poder trazem privilégios. Privilégios
que o homem que você diz amar nunca
vai poder ter se ficar com você. É isso
que quer para ele? Mediocridade?
Eleanor baixou os braços e respirou
fundo analisando qual o efeito que seu
discurso tinha causado. Detesto admitir
que a simples ideia de prejudicar
Gregory me doía mais do que um vídeo
íntimo meu na internet.
– Você fica aqui como uma
demonstração do seu amor. Eu coloco
seu vídeo na internet. – cuspiu. – E aí o
quê? Vocês se casam e vivem uma linda
história de amor. Sobrevivem o
preconceito que você sofreu, juntos.
Sim, essa é uma possibilidade em um
milhão. Mas e se o que acontecer for o
mais comum? Você não vai conseguir
outro emprego. Gregory vai te sustentar
com o salário de advogado medíocre
dele. Ele nasceu em um luxo extremo e
já caiu bastante. Sustentando dois com o
salário de um… Ele vai cair mais ainda.
Acha que ele não vai olhar para trás?
Não vai pensar em como poderia ter
sido sua vida se não tivesse que arrastar
você como peso morto? Vai ficar
estigmatizado como o homem decente
namorando a vagabunda que apareceu
nua e se masturbando na internet. Isso
vai acompanhá-lo pelo resto da vida.
Talvez você leve a credibilidade dele
junto com a sua. Talvez ele perca o
emprego. Eu prometo que irei congelar
todos os fundos dele. Vocês vão estar
desempregados, sem dinheiro ou
perspectivas, passando necessidades…
E então? Vocês ainda vão continuar
juntos? Um exemplo de superação do
amor? – Ela ridicularizava cada palavra
dita – Ou será que a vida vai desgastar
esse sentimento bobo que vocês, jovens
estúpidos, chamam de amor? Eu tenho
mais experiência de vida que você,
Dominique, então permita-me prever o
que vai acontecer: vocês vão ressentir
um ao outro. Você por ter perdido o
emprego e a vida por um vídeo que ele
fez e que caiu nas mãos da avó dele. E
ele por ter se tornado um homem miúdo
quando, sem você, poderia ter sido
gigantesco. Vocês vão virar as costas
um para o outro e seguir seus próprios
caminhos, sozinhos. E você vai olhar
para trás, para o dia de hoje, e vai
pensar: se apenas eu tivesse tomado uma
decisão diferente.
Eu sentia mais raiva do que tristeza.
– O que você está fazendo é uma
crueldade desumana e desnecessária.
– Sabe o que é desnecessário? – Ela
aproximou o rosto do meu
ameaçadoramente. – Se masturbar em
público.
Capítulo 22
“– Eu só sei que eu te amo.
– É uma pena.”

Scarlett e Rhett – E o vento levou

– Dom, você tem certeza de que está


bem?
– Tenho.
Já era muito tarde e ele tinha uma
expressão exausta.
Expressão exausta de advogado
medíocre subalterno. Meu coração
estava apertado. A profissão que eu
tinha era o ápice do que eu jamais tinha
almejado alcançar. Talvez não o ápice
absoluto… Mas bem perto. Mas para
Greg… Para ele, aquilo era tão menor
do que o que ele podia ser.
Se fosse presidente da Baxter não
estaria trabalhando até tarde em um
domingo para acordar cedo na segunda e
ganhar dez vezes menos que seus chefes
por trabalhar três vezes mais.
Ele teria uma vida mais tranquila,
mais luxuosa, sem dúvidas… Talvez
mais feliz.
Pelo que tinha me contado, sempre se
deu bem com sua avó. E se aquele fosse
apenas um período de rebeldia?
– Ainda não usamos o chantilly –
sorriu no meu ouvido.
– Agora não, Holt. Estou cansada.
Ele hesitou, decidindo se eu estaria
realmente cansada ou se havia algo
errado.
Virei no travesseiro para impedi-lo
de continuar me encarando até perceber
que a minha falta de desejo tinha uma
explicação desagradável.
Faça uma lista, Dom. Prós e contras.
Se eu fosse embora teria meu
emprego seguro. Meu futuro. Tudo pelo
que tinha trabalhado a vida inteira.
Greg, aos poucos, voltaria para a sua
vida de antes. Ele se dava bem com a
avó, ia encontrar um meio-termo para
viver assim de novo. Moraria naquela
cidade, perto da mãe, e teria a chance de
decidir se queria se aproximar dela ou
não. Ia ser um homem de sucesso, nunca
ia precisar de nada.
O contra é que eu teria que viver sem
Greg.
Espremi o rosto contra o travesseiro.
Se alguém me dissesse há duas semanas
que “viver sem Greg” seria o maior
problema e a maior dor da minha vida,
eu gargalharia até passar mal.
Acho que, às vezes, quando você ama,
você tem que deixar a pessoa livre.
É o último nível de altruísmo… E eu
nunca fui muito altruísta.
O que Scarlett faria?
Scarlett seria capaz de ver o que era
melhor para ela e para o homem que ela
amava.
Scarlett seria capaz de deixá-lo ir.
Talvez eu tivesse que fazer a mesma
coisa. Talvez eu só tivesse que respirar
fundo e deixar Holt ir.
Se ele levasse uma vida medíocre por
minha culpa, eu… não… eu não podia.
Deixar Holt bem tinha que ser o Plano
A.
Eu teria que me conformar em ser o
Plano B.

– Dom? O que aconteceu? Você está


estranha desde ontem à noite.
Eu não podia deixá-lo decidir.
Simplesmente não podia. Era gentil
demais. Ia dizer que estava apaixonado
e ia me pedir para ficar. E, se ele
pedisse, eu não ia conseguir dizer não.
A decisão ia ter que ser minha, e eu
tinha resolvido priorizar o Plano A.
– Saudades do trabalho – menti.
– A gente vai ter que conversar sobre
isso – sorriu e apertou minha bochecha.
– Sobre para onde a gente vai. Se você
preferir ficar, temos que conseguir um
emprego para você. Isso se você não
quiser trabalhar para Andrew. Ele já
deixou claro que, se você quiser, tem
uma vaga lá.
Sorri, mas sabia que não tinha
nenhuma emoção na minha expressão.
– Mas se você preferir voltar, sem
problemas, também. Eu falo com Hyde.
Quando fui embora ele disse que sempre
teria espaço para mim, caso eu mudasse
de ideia. Vamos ver se ele estava
falando sério – sorriu, mas assim que
seu olhar alcançou o meu, sua expressão
mudou. – Dom? O que você tem?
– Não sei – suspirei com dificuldade.
Ia precisar dizer mais alguma coisa para
convencê-lo. – Não estou me sentindo
muito bem. Pode ser uma gripe…
Greg levantou e colocou as costas da
mão na minha testa.
– Se você não estiver se sentindo
bem, posso ligar para o escritório e
dizer que não vou. Fico aqui e cuido de
você.
– Não seja ridículo. Eu consigo me
virar. – Estava cortando sua gentileza
com severidade. Se ia ter que fazer
aquilo, melhor que começasse a me
acostumar de uma vez: eu estava sozinha
de novo.
– Tudo bem – disse baixinho. Tirou a
mão da minha testa e eu tive certeza de
que ele sabia que algo não estava certo.
Fosse por cansaço dos meus problemas,
porque estava atrasado ou por qualquer
outro motivo que fosse, ele não insistiu
na pergunta. Segui seus passos até a
porta, Greg tocou minha cintura e
aproximou a boca da minha. Não sei o
que me possuiu, mas virei meu rosto no
último segundo e ele acabou beijando
minha bochecha.
– Chego mais cedo, hoje – suspirou. –
Para ficarmos juntos, tá? – Tinha medo
em seus olhos. Uma dúvida imensa.
– Tá.
– Pode dar uma olhada nos arquivos
de Adam e Liam?
– Claro.
Ele me beijou no rosto mais uma vez.
Intencionalmente na bochecha.
Assim que vi seu carro se afastando
na rua, subi as escadas e comecei a
arrumar minhas malas.
Acabou a brincadeira.
Era hora de voltar para casa e encarar
a vida real.

Mal abri a porta, Andy, Shelbi e


Madeleine já estavam enfiadas na sala.
– Deu tudo certo! Exatamente,
EXATAMENTE como você disse – Andy
anunciou.
– O que preciso fazer agora, Dom?
– Precisa achar um bom advogado e
levar tudo para ele. Já pode colocar
Eric para fora de casa. Pode jogar as
roupas dele pela janela e tocar fogo, se
quiser.
– Precisa achar um advogado? –
Andy repetiu. – Por que você não a
representa? Ia ser lindo! – Entrelaçou os
dedos, animada.
– Não posso. Mas aqui. – Encontrei o
número do escritório de Holt e anotei
em um pedaço de papel. – Esse é o
escritório de Gregory. É um escritório
excelente. Eles vão te ajudar com o que
precisar.
– Muito obrigada, Dom. De verdade!
– De nada, querida. E você, Cabelo
Azul? Greg notou que você e Calvin
ficaram bem íntimos na festa de sábado.
– É, acho que a gente se deu bem. –
Ela tinha um sorriso empolgado. – Eu ia
vir te contar, mas imaginei que você e
Gregory estavam se resolvendo depois
do problema com Leo.
– E você me deve um pedido de
desculpas.
– Não, não devo. Por minha causa
vocês dois tiveram um sexo de
reconciliação muito bom. – Madeleine e
Shelbi estavam rindo.
– Menina, me respeite!
– Dava para ouvir os gritos e gemidos
de vocês da minha cozinha! – Arregalou
os olhos para mim. – Sou eu quem devia
pedir respeito. – Cruzou os braços e eu
fiz uma careta para ela.
– Ah… Vai ficar com o Calvin, vai. –
brinquei. Andy conseguia me distrair
dos meus problemas.
– Ele saiu com uns amigos. Ele disse
que vai fazer isso toda segunda e quarta
de manhã enquanto estiver de férias
aqui.
– Por quê? – Madeleine quis saber.
– Porque a mãe dele tem um grupo de
estudo de Bíblia que aparentemente
sempre acaba com ela e um congregado
na cama.
Algo dentro de mim acordou.
Era a parte de mim que desejava
controle e que estava total e
completamente esquecida,
principalmente nos últimos dias.
– Ela vai se encontrar com ele hoje?
– Vai. Ih… O que é esse olhar?
– Que horas?
– Acho que… – Ela olhou para o
relógio – Daqui a uma meia hora?
– Dominique, o que foi? – Madeleine
estava interessada em todo e qualquer
tipo de plano depois do sucesso da
empreitada da noite anterior.
– Vocês conhecem Adam e Liam?
– Ah, eles são uns amores! –
Madeleine se derreteu.
– São pessoas ótimas, realmente. Uma
pena que Violeta tenha resolvido
persegui-los daquele jeito. – Shelbi
parecia realmente incomodada. – É por
causa dela que o processo de adoção
não anda mais rápido.
– Bruxa. – Andy acrescentou.
– Pois é… Acho que a gente podia
dar uma lição nela e, de quebra, garantir
que ela não incomode mais o casal. O
que vocês acham?
– Convoco o Clube dos Biscoitos? –
Andy sorriu, esfregando uma mão na
outra.
Eu sorri e disse que sim, logo depois
de mandá-la parar de chamar todo
mundo por aquele nome ridículo.
O Clube dos Biscoitos… É, vamos
lá… Uma última reunião.

– Só preciso colocar um celular lá


dentro, Rick. Com uma câmera, para
filmar os dois no ato.
Ele coçou a cabeça.
– Certo. Mas como vamos levar o
celular lá pra dentro?
– Deixa que eu me preocupo com
isso.
– É, Dominique é criativa. – Andy
piscou o olho pra mim.
Thierry estava sentado e sorrindo em
um canto da sala. Acho que ele estava se
divertindo com toda a animação dos
últimos dias. Rick tentava explicar o que
a gente precisava fazer, mas Andy o
interrompia a cada dois segundos.
Shelbi parecia mais nervosa do que
animada e Madeleine mais animada do
que nervosa.
– Tudo bem, a gente só tem que se
preocupar com duas coisas então: a
memória disponível e a bateria.
– Como assim?
– Deixa que ele explica, Greenpeace.
– Tá, tá.
– Se a gente deixar a câmera lá
gravando, pode ser que a memória lote
antes de você conseguir o que quer. E se
você não souber quanto tempo uma coisa
vai levar para acontecer, a bateria pode
acabar.
– E como a gente resolve isso?
– É bem simples, na verdade. Eu vou
precisar preparar o telefone pra
transmitir o feed ao vivo. Aí a gente não
precisa se preocupar com a memória. E
quanto à bateria… Essa parte é
complicada…
– Mas a gente sabe que vai acontecer
agora. A bateria não é problema – Andy
respondeu.
– E se você estiver errada? – lembrei.
– A gente precisa colocar a câmera lá,
mas se ela não se encontrar com o cara
hoje a gente perde a chance. – Havia
algo que Rick tinha dito que estava me
incomodando e, como um clarão, a ideia
invadiu minha mente. – O sensor! Rick,
você não disse que estava
desenvolvendo um sensor para vincular
a outros aplicativos?
– Isso! – Bateu palmas. – A gente
vincula a câmera do feed ao sensor.
Assim que tiver movimento no quarto,
ela liga sozinha. Assim a gente
economiza bateria.
– Perfeito! Em quanto tempo você
consegue preparar tudo?
– Qual celular a gente vai usar?
Todos na sala se entreolharam.
– Meu plano envolve deixar o celular
lá dentro – confessei. – Mas não
envolve resgatá-lo. Quem ceder o
aparelho pode dar adeus a ele.
– Usa o do Eric – Shelbi decidiu, e eu
ouvi o rancor vingativo na sua voz. –
Rick ainda está com ele.
– Boa ideia, Shelbi! – Eu estava
impressionada. – Já tirou o que
precisava do telefone? Mensagens de
texto, e-mail…
– Já. Tinha um bocado de coisa… –
admitiu, constrangido.
– Isso é bom! – incentivei. – Então,
vamos lá. Prepara o telefone do Eric e
vamos resolver isso.

Fui para o lado de fora com o celular


na mão. As férias escolares garantiam
uma rua com crianças andando de
bicicleta para todos os lados.
– Ei! Moleque! – gritei assim que
identifiquei o grupo de pirralhos que
tinha cortado minha grama no outro dia.
Quer dizer, minha não. De Holt.
Não pense nisso agora, Dom. Um
problema de cada vez.
– Você quer ganhar mais algum
dinheiro?
– Quer que eu corte sua grama de
novo, srta. Thoen?
– Não.
– Porque se for, vamos cobrar o
dobro.
– Extorsão é crime, sabia?
Ele riu, ganancioso.
Mais alguns moleques se
aproximaram.
– A gente vai aprontar uma pegadinha
com a vizinha. E eu só preciso que você
entre na casa dela e coloque esse celular
aqui no quarto dela. Coloque escondido
em algum lugar, com a câmera virada
para a cama. Pode fazer isso?
Shelbi se remexeu do meu lado como
se estivesse detestando a ideia. É,
envolver crianças era horrível. Mas ele
era dez vezes mais ágil e mais rápido do
que qualquer um de nós.
– Que pegadinha é essa?
– Quando ela estiver dormindo de
noite, o celular vai começar a fazer
barulhos bem altos e o flash da câmera
vai acender. Ela vai levar um susto
horrível. Mas para isso você precisa
colocar o aparelho escondido e com o
lado da câmera e do flash virado pra
ela. Entendeu?
– Ah! Que massa! Como vocês
conseguiram fazer isso?
Alguns dos seus coleguinhas ao redor
começaram a planejar aprontar a mesma
coisa com alguém chamado Brian.
– Foi o Rick ali – apontei. – Ele
desenvolveu um aplicativo.
Rick olhou para mim com a boca
aberta e os olhos arregalados como
quem diz “obrigado pelo trabalho
extra”. Devolvi um sorriso de desculpas
e levantei os polegares.
– Passem lá em casa depois e eu
preparo um no celular de vocês.
– Massa! – Eles comemoraram entre
si.
– Ótimo, então não vai ter pagamento.
– Como é? – reclamou.
– O pagamento vai ser o aplicativo.
Tem que escolher, moleque. Ou o
dinheiro ou o aplicativo.
Eles se entreolharam considerando as
possibilidades.
– Ah, não precisa! – Shelbi desistiu –
Aqui. Eu pago e o Rick dá o aplicativo.
Só resolvam isso de uma vez.
Expirei irritada e dei o celular para o
menino.
– Agora eu vou criar uma distração
para tirar ela de casa. Aí, quando ela
sair, você vai lá correndo. Entendeu?
– Entendi.
Eles correram animados com a
brincadeira e ficaram na lateral da casa
que eu indiquei.
– Dominique, como você vai tirar ela
de casa?
– Ah, eu tenho um plano e vocês vão
me ajudar.
– Como?
Andei até a calçada do lado oposto da
casa da mulher e gritei a plenos
pulmões.
– Adoração a Satanás. Adorem
Satanás.
Andy começou a rir. Madeleine fez o
sinal da cruz e deu dois passos para trás.
Mas no fim, todos entenderam o que eu
estava fazendo e acompanharam.
Em menos de um minuto. Violeta tinha
saído de casa e estava na calçada
gritando com a gente.
O bom de lidar com criaturas de
hábitos é que sempre é fácil manipulá-
las.

Uma hora depois, bati na porta da


casa de Violeta com metade do Clube
dos Biscoitos atrás de mim.
Era minha vez de chantagear outra
pessoa, e eu ia aproveitar cada segundo.
– O que vocês estão fazendo aqui? Eu
vou chamar a polícia.
Levantei a tela do celular sem dizer
uma palavra. Ela abriu a boca
exageradamente, mas não emitiu
qualquer som.
– Você vai parar de incomodar Adam
e Liam. O casal homossexual que mora
aí na frente – adicionei, caso ela fosse
do tipo que grita com as pessoas sem
sequer saber seus nomes. – E você vai
escrever uma carta de recomendação
para adicionar ao processo de adoção
deles na vara da família. Andy vai
passar aqui para pegar amanhã. E é bom
que seja uma carta espetacular.
Entrei de volta na casa de Thierry
com Andy nos meus calcanhares.
– Foi ótimo! – gritou para Rick e
jogou os braços no seu pescoço. – Acho
que dessa vez ela vai parar.
– Tomara. – ele riu, ficando muito
vermelho, muito rapidamente.
Todos se sentaram na sala e Thierry
perguntou quem queria biscoitos. Todo
mundo queria, mas ninguém queria
ajudar a fazer.
Eu me levantei devagar.
– Pessoal, eu preciso ir.
– Não vai ficar para os biscoitos?
– Não. Obrigada. Tenho que terminar
de arrumar as malas.
– Arrumar as malas? – Andy parou de
rir e me observou sem compreender.
– Eu estou indo embora.
– Embora? Para onde?
– Eu não vim para ficar, Andy. Moro
do outro lado do país. Tenho minha
vida, meu emprego. Minhas férias
acabaram, tenho que voltar pra casa.
– Mas sua casa é aqui! – Ela não
estava sendo doce. Estava sendo
agressiva e eu quis gritar que ou ela
calava a boca ou me tratava com
respeito. Merda. Eu ia sentir falta dela.
– Você e Holt não estão juntos?
– Ficamos juntos por um tempo. Mas
agora eu tenho que ir.
– Não! Você não vai.
– Andy… – Shelbi pediu. – A vida
não é simples. Todos vamos sentir falta
de Dominique, mas se ela precisa ir…
– Ela não precisa fazer nada. Ela está
é fugindo e se escondendo. Qual é o seu
problema?
– Qual é o meu problema? Qual é o
seu problema!
– Você paga de pavão para todo lado.
Diz que é a mulher segura e confiante.
Mas sempre, SEMPRE que o assunto é
esse cara você parece uma adolescente.
Se você gosta dele, por que não fica?
– Não devo explicações da minha
vida para você.
– Ah, então é assim? Você se mete na
vida de todo mundo, mas assim que
alguém quer te dizer o que fazer você
diz que não deve explicações?
– É – rosnei. – É exatamente isso.
– Tudo bem, então. Faça uma boa
viagem. – Ela virou as costas e foi
embora.
Escutamos o barulho alto da porta que
ela fez questão de bater atrás de si.
– Isso tudo é porque ela vai sentir sua
falta. – Shelbi passou a mão no meu
braço.
– Acho que vou sentir falta dela
também. Mas preciso ir.
– Claro. Vai ficar silencioso aqui sem
você. – Shelbi abriu os braços com um
cuidado estranho, e eu a abracei antes
que ela fizesse alguma onomatopeia
irritante.
– Não deixe ele te enganar, me ouviu?
Ele não presta e você tem que largá-lo
imediatamente – eu a alertei.
– Vou fazer isso! Não se preocupe.
– A gente não vai deixar ela sozinha –
Madeleine prometeu quando trocamos
um abraço desajeitado.
Depois foi a vez de Rick. Eu o
espremi em meus braços e dei um beijo
estalado em cada uma de suas
bochechas.
– Cuide de todos, sim?
– Pode deixar. E você, se cuida!
– Tchau, Thierry – sorri. – Foi um
prazer.
– O prazer foi meu, querida.

Era estranho, mas eu queria chorar.


Sentia um ardor horrível nos meus olhos
e não conseguia deixar o ar entrar muito
fundo nos meus pulmões. Parecia que eu
estava sufocando bem devagar.
Eu não preciso de ninguém.
Essa experiência com os vizinhos foi
legal, mas eu não preciso de ninguém.
Eu fico bem sozinha.
Eu consigo me virar.
Holt vai ficar melhor sem mim.
Vai conseguir avançar na vida de um
jeito que nunca conseguiria comigo.
Se eu ficasse, não seria justo com ele.
Tinha que ficar repetindo tudo que eu
sabia como um mantra, ou desistiria de
tudo. Ou pior: ligaria para Holt e
pediria para ele voltar e me convencer a
desistir.
Minhas malas estavam prontas. A
casa de Holt estava arrumada. O vídeo
tinha sido apagado… ou quase.
Max veio correndo assim que eu
cruzei a porta. Deixei que ele pulasse
em mim e lambesse meu rosto.
– Acho que vou pegar um labrador
quando voltar pra casa – sorri. Eu
adorava coçar suas orelhas. Ele ficava
bem quieto recebendo o carinho, com
um palmo de língua de fora da boca e
um par de olhos amigáveis me
observando. – Acho que vou chamá-lo
de Max também. Você se incomoda?
Ele sacudiu a cabeça quase como se
estivesse dizendo que não. Mas pode ter
sido só impressão minha. Provavelmente
foi.
Cachorros não falam, Dom.
Eu queria gritar para o meu cérebro
que esse cachorro falava! Esse cachorro
sentia e me entendia e era meu amigo, e
eu não queria ir embora.
Não queria ficar sozinha.
Mas, ah… Inferno… Eu amava
Gregory. Amava muito. Amava ele mais
que tudo na vida. Amava ele mais do
que a mim mesma, aparentemente.
E era exatamente esse o problema:
podia ser agora, podia ser depois…
Mas não ia durar. Fui uma vadia egoísta
minha vida inteira e logo, logo estaria
de volta às minhas raízes. Ele ia
descobrir que não gostava tanto assim
de mim… Tinha sido só o calor do
momento.
E aí? Que diabos eu ia fazer então?
Levei anos para montar a armadura
intransponível que protegia meus
sentimentos de qualquer ameaça externa.
Essa situação toda com Holt era um
trinco nas minhas defesas. Um que
poderia virar um buraco colossal e me
deixar destruída.
Marilyn Monroe dizia que era melhor
abandonar antes de ser abandonada…
Ali, na casa de Holt, com as malas feitas
e o coração na mão, tenho que confessar
que entendia exatamente o que a
senhorita Monroe queria dizer. Ficar ali
significaria arriscar meu futuro inteiro
por um cara que poderia desistir de mim
em pouco tempo.
Sentei no sofá e respirei fundo.
Eu não minto para mim mesma.
Não vou começar agora.
Minhas malas estavam no chão aos
meus pés. O telefone estava logo ali. Já
tinha comprado minha passagem pela
internet. Tudo que eu precisava fazer era
ligar para um táxi ou ligar para Holt.
Se eu mal tinha conseguido me
despedir da vizinhança, me despedir
dele ia ser… insuportável.
Eu não podia fazer isso. Não podia
olhar pra ele e dizer “Estou indo, até
logo. Me liga quando estiver pela
cidade”. Não ia acontecer. Eu ia chorar,
ele ia me abraçar. Se ele me beijasse,
dissesse que me amava e me pedisse
para ficar eu não iria embora nunca.
Pense, Dom. Pense, de verdade.
Fechei os olhos e fingi que o vídeo
estava na internet. Eu tinha decidido
ficar e a velha maldita tinha espalhado
minha intimidade para o mundo inteiro
ver. O que aconteceria depois? Como eu
me sentiria?
Ia ser horrível. Eu ia me sentir um
lixo. Ia perder tudo. Ou quase tudo.
Mas ia ficar com ele.
Valia a pena?
Não seja apocalíptica, Dom.
Eu não ia perder tudo. Ia pintar o
cabelo e arranjar um corte diferente.
Podia mudar de nome e conseguir um
emprego em outro lugar. Holt poderia se
mudar para outra cidade comigo. Ele
mesmo já tinha feito essa proposta antes,
não tinha? E, se nada mais desse certo,
podia abrir um escritório meu. Ia
atender os vizinhos e cobrar pouco, mas
não ia passar fome. Qualquer trabalho
duro é um bom trabalho. Era isso que o
meu pai tinha me ensinado.
Não ia ser tão ruim.
Mas e para ele?
Ele ia ter que ouvir piadas e
comentários? Ia ter que ouvir gracinhas
de colegas de trabalho como Hill?
Qualquer um… Um juiz em uma
audiência, uma parte contrária em uma
ação, o cara atrás da gente na fila do
cinema… Qualquer um poderia ter me
visto nua em uma situação da mais
extrema intimidade. Como ele iria se
sentir?
E se essa vontade de Gregory de ser
independente fosse só um período de
rebeldia como sua avó tinha sugerido?
Ele, com sua gentileza infinita, nunca me
abandonaria. Não se eu tivesse
escolhido ficar com ele em detrimento
do meu próprio futuro. Mas não
abandonar não significa não se
arrepender.
E se ele se arrependesse?
E se ele olhasse ao redor depois de
um bom tempo e percebesse que
priorizou a coisa errada?
Eu podia conviver com o preconceito
e a humilhação. Eu já tinha sido provada
nesse quesito. Mas ele não. Eu não
podia decidir ficar e impor para ele a
desgraça do meu futuro. Era injusto. E se
ele estava apaixonado, não veria com
clareza. Ele iria querer se sacrificar.
Mas depois… o arrependimento…
Peguei o telefone.
Tomei uma decisão.
A única que me restava tomar.
Disquei o número.
– Dom? – Ouvir sua voz quente fez
minha força de vontade falhar. – Dom?
Está aí?
Fale.
– Greg. Eu estive pensando… Estive
pensando sobre um bocado de coisas.
– Eu imaginei. Era por isso que
estava estranha ontem à noite?
– Acho que sim.
– Eu vou chegar em casa mais cedo,
hoje, está bem? A gente conversa
quando eu chegar. Você me conta o que
houve. – Ele atropelava uma frase com a
outra. Era quase como se não quisesse
me dar tempo para falar. Quase como se
soubesse exatamente o que eu ia dizer e
não quisesse ouvir.
– Greg, eu preciso ir. – Eu não tinha
certeza se ele tinha ouvido. Minha voz
saiu tão baixa que eu mesma mal a
escutei.
– Dom, eu chego mais cedo, hoje, está
bem? Por favor, vamos conversar com
calma.
– Não posso. Greg, confia em mim.
Por favor! Não vai dar certo.
– Eu confio em você. Se está dizendo
isso, tenho certeza de que tem algo te
incomodando. Mas eu não mereço pelo
menos saber o que é?
– É uma coisa minha. Uma coisa que
você não ia concordar e ia querer me
impedir. E não ia ser justo. Pode confiar
em mim?
– Dom… – ele sussurrou e eu podia
sentir a tristeza na sua voz. Não, Greg,
não sofre, por favor. Tudo isso é só para
você não sofrer. – Linda, a gente
conversa. Com calma.
– Não há mais nada para conversar.
Eu já sei o que eu preciso fazer. A
decisão é minha e eu já tomei. Só estou
te avisando que eu já comprei a
passagem e já arrumei minhas coisas. O
táxi já está chegando.
– Dominique, não faz isso. – Tinha
uma urgência dolorida em sua voz.
– Foi muito bom enquanto durou,
Greg. Muito bom mesmo. Mas foi só
uma brincadeira. Foi só um sonho que
não tinha nenhuma chance na vida real.
– Você não sabe disso. Não sabe.
Você não quer morar aqui? Tudo bem.
Eu já disse que posso voltar com você.
Ou a gente tenta um relacionamento a
distância. Tem milhões de
possibilidades entre o ficar junto e o não
ficar, Dom. Não precisa ser assim.
– Precisa. Holt, não dificulta.
– Eu estou indo até aí, está bem?
Estou indo agora. Só me promete que
não vai embora assim. Por favor. Só
promete que espera até eu chegar.
Algo na sua voz triste me lembrou a
sua mãe.
Eu liguei para ele e disse que estava
indo embora.
– Holt, eu preciso ir. E não há nada
que você diga que possa mudar isso.
Eu podia ver as lágrimas nos olhos de
Audrey de novo.
Ele pediu que eu esperasse, que
deveríamos conversar, não podíamos
destruir quase trinta anos de
casamento assim, pelo telefone.
– Estou com as chaves do carro na
mão. Estou indo até aí. Dom, por
favor… você sabe. Você sabe… não faz
isso. Não vai embora assim. Não se
despede de mim pelo telefone. Não me
faz passar por isso de novo.
Mas eu tinha minha mãe na cabeça e
no coração e não queria ouvir nem
mais uma palavra.
Eu entendia como Audrey se sentia.
Eleanor tinha encontrado o ponto mais
fraco na minha coluna vertebral e tinha
espremido com força. Agora eu era só
uma sombra da mulher confiante. Eu era
só uma mulher apaixonada, tentando
protegê-lo.
Se ele viesse correndo e tivesse um
acidente…
Mas ao mesmo tempo eu não podia
vê-lo. Não podia mais fazer isso.
– Eu espero – menti. – Mas venha
devagar.

Abri a porta do escritório e Eleanor


estava parada com a mão em riste, como
se estivesse pronta para bater na
madeira escura.
– Gregory. Aonde vai?
– Estou saindo, Eleanor. O que você
quer?
Ela entrou na minha sala
descansadamente e se sentou.
– Deixe-a ir.
Meu coração subiu até a garganta.
– Você é filho do seu pai e eu sabia
que ia tentar impedi-la. Mas ela sabe o
que é melhor para ela e sabe o que é
melhor para você. Por Deus, Gregory,
não me faça dizer que aquela moça de
pouco pudor tem mais bom senso do que
você.
– Eleanor, você não pode tomar esse
tipo de decisão sobre a minha vida. Não
brinque de Deus.
– Eu pareço uma mulher que brinca?
Estou falando muito sério. Deixe-a ir e
vá viver sua vida.
Dominique estava me esperando, mas
ela não ia esperar por muito tempo.
Virei as costas.
– Se você quiser ficar aí, fique. Mas
eu tenho que ir.
– Ela ficou com um homem casado,
Gregory! Abra os olhos! Essa mulher
não presta.
Eu esfreguei minha mão na testa.
– Você está falando sobre coisas que
não sabe.
– Não sei? Não sei que ela propôs um
encontro sexual exótico com um homem
casado em uma festa na sua casa?
Como diabos ela sabia disso?
– Você está vendo informações fora
do contexto. E… Além do mais, por que
eu estou perdendo tempo aqui? Você não
gosta dela, eu já entendi.
– E você deveria ter imaginado que
ela não é confiável. Dada a situação em
que a conheceu.
Eu parei e girei nos calcanhares
voltando a olhar para ela.
– O que você está dizendo?
Ela me observou com cuidado.
Levantou uma sobrancelha e mordeu o
lábio em silêncio por uma fração de
segundo.
– Diga de uma vez, Eleanor!
– Ora, está bem. – Puxou o tablet e
iniciou um vídeo. – Isso parece uma
moça de respeito, Gregory? E você acha
que ela não poderia dar em cima de um
homem casado? – Era o vídeo que eu
tinha feito de Dominique. – Uma moça
que se predispõe a uma coisa dessas é
capaz de tudo.
– Que se predispõe a quê? A se
masturbar? – Avancei vagarosamente na
sua direção com dentes semicerrados. –
As pessoas fazem isso, Eleanor: elas se
masturbam. Agora a verdadeira pergunta
é: como você conseguiu isso.
– Você mesmo disse. – Piscou os
olhos, guardando seu tablet. – Já
trabalhou na Baxter e sabe como
fazemos as coisas.
– Você invadiu meu e-mail? Minhas
pastas compartilhadas? E o que mais?
Minhas redes sociais? Tem algum
acionista de Wall Street fazendo
comentários sobre a Bolsa de Valores
no meu perfil do Facebook? Para que as
pessoas olhem e digam “Oh, como o
jovem Baxter é inteligente!” Porque é só
com isso que você se importa, não é? As
aparências? – Respirei fundo e baguncei
meus cabelos. Voltar para essa cidade
tinha sido uma péssima ideia. – Você
vai parar de investigar minha vida.
Ouviu? Vai parar.
– Tudo bem. Tudo bem. Estava só
tentando te proteger.
– Inacreditável.
Já estava passando pela porta quando
finalmente entendi. Entendi tudo.
– Você! Você mostrou isso para
Dominique? – Ela travou o lábio com
aquele seu jeito arrogante de quem
nunca vai admitir que tinha errado, e eu
tive certeza do que aconteceu – Você a
chantageou, não foi? A mandou ir
embora ou você colocaria isso na
internet. Foi isso? RESPONDE!
– Foi. Claro! Eu tinha que fazer
alguma coisa.
– Me dá.
– O quê?
– O tablet. Me dá. Agora.
Tomei o tablet das suas mãos com
violência e saí. Atrás de mim, ela
mencionou que não era a única cópia.
Merda, Dom. Por que você não me
disse?
Mas uma coisa era verdade: Se
Eleanor tinha feito cópias – e eu tinha
certeza disso –, só esse tablet não
convenceria Dominique a ficar. Eu
precisava de alguém que entendesse
disso melhor do que eu. Mas quem?
A resposta me veio alta e clara na voz
segura de Dominique. Ela tinha
mencionado uma pessoa que poderia
resolver meu problema.

Saí da casa de Rick mais de uma hora


depois. Só acabamos quando ele me
garantiu além de qualquer dúvida que
aquele tablet era a fonte original da
invasão na minha pasta e que ele tinha
certeza de quantas cópias tinham sido
feitas, para onde elas tinham ido e de
que tinham sido apagadas. O seu medo
era que alguma das cópias tivesse sido
feita para um disco rígido removível que
não estivesse conectado, porque, nesse
caso, ele não poderia fazer nada.
Mas ele identificou que apenas três
cópias tinham sido feitas e conseguiu
achar a apagar cada uma delas. Eu o
agradeci pela milésima vez, mas algo
em seu sorriso dizia que eu não
precisava. Ele tinha se tornado amigo de
Dominique, aquela amizade de um jeito
estranho, típica de Dominique.
Deixei o meu carro estacionado na
esquina e corri pela rua até chegar à
minha casa.
– Onde diabos você estava?
Olhei para trás e vi Andrea cruzando
meu gramado.
– Andrea. Não posso conversar
agora.
– Ela já foi.
Tirei a mão da maçaneta e me virei de
volta para ela.
– Hein?
– Dominique. Ela foi embora.
Capítulo 23
“Eu queria você. Queria
desesperadamente. Mas achei que você
não me queria.”

Scarlett — E o vento levou

Minha casa estava vazia. Fria e


escura. Parecia uma casca que algum
animal tinha abandonado quando ficou
grande demais para usá-la e agora era só
um resto pequeno demais diante da
grandeza do mundo.
Me recusei a acreditar em Andy e
subi as escadas gritando seu nome.
Passei em cada cômodo duas vezes. Mas
ela não estava lá. Suas coisas tinham
sumido. E a merda é que eu ainda
conseguia sentir seu perfume. Aquele
cheiro cítrico delicioso que ela deixava
para trás quando passava. Estava
impregnado em cada ambiente e no meu
coração.
A vizinha era uma criatura irritante
que ficava me seguindo e me mandando
fazer alguma coisa. Me ameaçou de
formas insanas que eu sequer
compreendi e disse em tom de ordem
que eu devia ir atrás de Dom.
Mas como? Se pelo menos eu
soubesse para qual aeroporto ela tinha
ido. Ainda tentei ligar meu computador e
olhar o histórico de navegação. Mas se
Dominique não queria ser encontrada,
ela não seria encontrada. O histórico
tinha sido apagado. Eu podia atravessar
a rua e pedir a Rick que viesse ao meu
resgate mais uma vez. Mas a verdade é
que, quando ele conseguisse, Dom
provavelmente já estaria voando.
Puxei o celular e enviei uma
mensagem de texto para Dom. Avisei
que o vídeo tinha sido completamente
destruído. Agora precisava esperar.
Esperar ela pousar, ler a mensagem e,
tomara, me ligar de volta.
Ela não se despediu.
Liguei de volta para o escritório. Eu
estava planejando voltar para casa mais
cedo. Disse à secretária que não voltaria
aquela tarde. Disse que estava me
sentindo mal.
Não era mentira.
Sentei no sofá e esperei a tarde virar
noite. Fiquei sentado no escuro
encarando a televisão desligada.
Eu nem a tinha beijado.
Não de um jeito decente.
Se eu soubesse que aquele até logo
de manhã teria sido um adeus, eu… Eu
teria tomado sua boca na minha por
horas. Teria levado ela para cama uma
última vez. Teria feito amor com ela e
segurado ela nos meus braços.
Vai dormir agarradinha.
Max deitou nos meus pés e parecia
sentir minha tristeza.
– Ela foi embora, parceiro –
murmurei. – Ela abandonou a gente.
Eu me sentia uma criança.
Estava completamente perdido.
Eu tinha decidido o que eu queria: eu
queria ela.
E aí ela foi e decidiu o oposto e eu
fiquei ali sozinho. Sozinho e perdido.
As horas se passaram e eu tive
certeza de que ela já deveria ter
pousado. Matei o tempo acessando as
páginas de todas as companhias aéreas e
tentando deduzir qual voo ela teria
escolhido.
Olhava para a tela do meu celular
compulsivamente.
Vamos, Dom. Me responde. Diz que
viu a mensagem. Pede desculpas por ter
ido embora sem se despedir. Diz que
ficou com medo. Diz que me ama. E
pronto. Acabou. Volta para cá. Volta
para mim.
Levantei e tentei andar pela casa para
me distrair. Mas aquilo não ia funcionar.
O sofá me lembrava Dom. A cozinha me
lembrava Dom. A piscina me lembrava
Dom. A escada me lembrava Dom. Não
vou nem falar sobre os quartos. Até o
maldito telhado me lembrava Dom.
Tentei tomar um banho. Mas ficar no
chuveiro também não ajudou…
Não era impressão. Não era paixão
ou tesão. Eu amava aquela mulher.
Amava realmente do fundo do meu
coração. Tinha acontecido em uma
velocidade avassaladora e me pegou
desprevenido. Pegou nós dois
desprevenidos. Mas eu não queria
perdê-la. Queria que ela voltasse.
Queria ela ao meu lado, na cama,
quando eu acordasse todos os dias.
Puta merda… Ela não estaria lá de
manhã.
Eu não ia conseguir.
Não ia conseguir dormir.
Não ia conseguir acordar no dia
seguinte sem ela.
Quer dizer, eu conseguiria. É óbvio.
Mas não queria.
Não queria nem um pouco.

Na mensagem, Greg dizia que tinha


resolvido o problema do vídeo. Ele
pedia desculpas pelo comportamento da
avó e me pedia para voltar. Terminou
com um “beijo e eu te amo” que me fez
querer morrer.
Mas o vídeo não era o meu único
problema. E, de volta em minha casa,
depois de algumas horas para digerir o
fato de que tudo aquilo tinha sido muito
bom, mas que ia ser apenas uma
lembrança, eu estava bem.
Ou tão bem quanto seria possível
ficar naquela situação.
Joguei minhas malas no chão da sala.
Minha casa parecia vazia e oca.
– Melhor se acostumar, Dom – falei
para o nada. – É só você, de novo.
Tomar banho foi uma provação do
inferno. Eu estava começando a
esquecer as etapas do meu mantra de por
que abandonar Holt era uma boa ideia.
Eu precisava de um cachorro. E de
sorvete.
Tentei dormir, mas ia ser impossível.
Completamente impossível.
Liguei a tevê da sala e estava
passando Jornadas nas estrelas.
Voyager.
Merda.
Nunca mais conseguiria ver meu
seriado favorito.
Eu sabia do que precisava. Remexi os
DVDs no armário e peguei E o vento
levou. Era isso de que eu precisava:
uma boa dose de Scarlett e eu estaria
pronta para enfrentar o inferno que
fosse.
Já passava das três horas de filme
quando senti que era melhor desligar a
televisão, antes das cenas finais. Não ia
ser uma boa ideia ver aquela parte. Não
do jeito que eu estava.

A claridade incomodou meus olhos e


eu demorei alguns segundos para
lembrar que tinha dormido no sofá.
De novo.
Era a terceira noite seguida.
Eu queria que aquela porcaria de
férias acabasse de uma vez para que eu
pudesse voltar ao trabalho e tivesse algo
para me distrair.
Os últimos dias podiam ser
facilmente resumidos em uma lista de
ações compulsivamente repetidas.
Procurar anúncios virtuais de venda
de cachorros e identificar infinitas
falhas em cada um dos filhotes, que
nunca eram tão perfeitos quanto o meu
Max.
Digitar o sobrenome Baxter no google
e descobrir se Holt já estava noivo de
alguma mulher obscenamente rica ou se
sua avó tinha morrido em algum acidente
trágico e maravilhoso.
Assistir a filmes de terror que
absolutamente não tivessem qualquer
relação com romance.
Tentar começar a ler Crítica da razão
pura, de Kant, que deveria exigir foco e
manter todos os meus problemas bem
longe da minha mente. Mas eu tinha que
reler a mesma frase oito vezes antes de
conseguir considerá-la compreensível e
seguir para a próxima. Isso era feito por
algumas páginas até meu cérebro traidor
fazer espasmos correrem pela minha
pele provocados pela lembrança do
toque de Holt. Então, tudo que eu
precisava era lembrar que aquele livro –
ou qualquer outro – seria muito mais
interessante se pudesse ser lido
enquanto ele estava ao meu redor
jogando videogame, e aí minha
concentração sumia e a leitura se
tornava impossível.
Cogitei comprar um videogame em
mais de uma ocasião. E, em mais de uma
ocasião, desisti.
Não conseguia me masturbar e
precisava de uma boa dose de filmes
antes de finalmente conseguir dormir de
cansaço.
Tudo me lembrava Gregory e me fazia
sofrer.
Mas, no fim, eu estava satisfeita com
a minha decisão.
Pensava nisso para manter sob
controle os meus impulsos de ligar para
ele ou de responder suas mensagens: se
após duas semanas eu já estava sofrendo
assim, mal podia imaginar como seria se
nosso relacionamento acabasse depois
que tivéssemos ficado ainda mais tempo
juntos.
Tinha sido bem melhor acabar com
aquilo de uma vez.
Nós não combinávamos. Erámos
opostos que não se misturavam e, em
pouco tempo, isso ia ficar perfeitamente
claro para os dois.
E aí ia doer. Ia doer mais do que
estava doendo agora.
Parece que a velha Baxter tinha
acabado me fazendo um favor, na
verdade. Nunca confessaria isso na sua
frente, é claro. Mas se meu coração já
estava pegando fogo agora, ver Holt me
abandonar depois que tivesse mudado
minha vida inteira por ele, ia ser
insuportável.
Mas a minha sóbria racionalidade não
impedia que eu sentisse sua falta.
Sentia falta do seu sorriso lindo, do
seu toque gentil, do seu abraço quente,
da língua ávida. Às vezes, tinha certeza
de que tinha ouvido a sua voz. Corria
para a janela e por um momento
minúsculo me permitia pensar que ele
tinha vindo atrás de mim.
Mas não tinha… Óbvio que não tinha.
Eu era só a colega de trabalho com o
corpo bonito que ele tinha levado para a
cama algumas vezes. Quando
reencontrasse o pessoal do escritório ia
contar nossa breve história e todos iam
rir. As mulheres iam torcer o nariz e se
perguntar como ele teve estômago para
ficar com a “vadia da Dominique” e os
homens iam parabenizá-lo de um modo
um pouco exagerado demais pela sua
conquista masculina.
Eu seria um prêmio, uma lembrança
cada vez mais distante e uma história
divertida para contar para os amigos.
Só isso.
Era tudo que eu jamais seria para
alguém, não é? Vadias sem coração não
têm final feliz. Elas vivem sozinhas e
morrem sozinhas depois de uma longa
vida amarga.
Eu olhava através da janela para o
meu quintal vazio. E me odiava por
sequer ter imaginado que ele viria. Por
imaginar que ele se importaria.
Ele tinha dito que me amava.
É… Mas eu estava certa desde o
começo: era só atração. Uma atração
bem forte, sem dúvida, mas nada mais.
Já fazia mais de um dia que ele não
ligava ou mandava qualquer mensagem.
Eu não sabia se o amor que ele dizia
sentir tinha se transformado em ódio
devido às suas tentativas de contato
ignoradas, ou se tinha se transformado
em indiferença quando ele percebeu que
o que sentia por mim, na verdade, não
era tão forte assim. Seja como fosse, sua
insistência logo se transformou em
silêncio e, por um dia inteiro, uma parte
cruel do meu coração alimentou a
esperança de que, talvez, ele viesse
bater à minha porta. Gritar comigo por
eu não ter atendido o telefone e o ter
forçado a atravessar o país. Eu faria
birra e diria que não queria mais nada
com ele, mas tudo que Greg precisaria
fazer era dizer mais duas palavras doces
e eu estaria convencida. Tinha certeza
de que era tudo de que eu precisava.
Mas seu silêncio durou dias e dias.
E minha campainha não tocou.
E a cada vez que eu pensava ouvir sua
voz, eu corria para ver meu jardim vazio
pela janela.

Ela não tinha voltado ao trabalho.


Pensei que fosse mandar as férias
para o inferno e voltar à sua vida
normal. Teria sido melhor, mesmo que
essa notícia significasse que ela não
sentia nada por mim. Nem mesmo
saudades. Mas a imagem de Dom
escondida em algum lugar, sofrendo,
estava me corroendo inteiro.
Depois de mais de vinte e quatro
horas de ligações não atendidas e
mensagens não respondidas, eu aceitei
que a teimosia de Dominique não ia me
deixar vencer. Consegui esperar quase
uma manhã inteira antes de ceder à
curiosidade desesperadora e ligar para
o meu antigo escritório. Me garantiram
que ela não tinha voltado.
Essa ligação foi razoável e
completamente compreensível. As
outras doze que eu fiz, no mesmo dia,
não foram. Mas eu precisava ter certeza
de que ela não tinha obrigado as
secretárias a mentirem pra mim. Ou
talvez que tivesse entrado escondida na
sua sala e ninguém a tivesse visto.
Depois de reiteradas garantias de que
Dominique Thoen não estava no prédio,
eu desisti dessa estratégia de ataque
também.
Alguns ex-colegas ligaram
perguntando o que ela tinha feito… Se
teria me processado de novo por alguma
coisa absurda e se era por isso que eu
precisava falar com ela tão
enlouquecidamente.
Eu expliquei sem dar muitas
informações diretas.
Afinal, o que eu poderia dizer?
Chantageei a megera para que viesse
cuidar da minha mudança e, acredite se
quiser, me apaixonei por ela. Minha avó
decidiu que não era uma boa ideia e a
chantageou para que fosse embora. Ela
deve estar dizendo a si mesma que foi
embora para me proteger de ameaças da
minha avó, ou para evitar que a
chantagem se concretize, mas eu a
conheço bem melhor agora. Eu sei que
ela fugiu porque está com medo, e que
toda essa conversa de chantagem e de
me deixar ser o melhor que eu possa ser,
é só conversa sem fundamento.
Ela está com medo de me amar.
Dominique consegue ser a mulher
mais medrosa e mais corajosa que eu já
conheci.
Todas as noites eu chego em casa e
não me sinto à vontade.
Tem alguma coisa errada com a minha
casa. Algo errado com minha cama.
Com meu chuveiro. Com minhas
refeições.
Tudo parece frio, sem gosto e
incompleto. Aquela sensação pesada e
horrível de que há algo faltando me
acompanha o tempo inteiro. O pior é que
eu sei exatamente do que estou sentindo
falta. Mas como eu faço para o inferno
daquela mulher pelo menos me ouvir?
Como faço para sacudi-la e obrigá-la a
perder o medo?
Joguei a cabeça no travesseiro e
passei o braço pelo lado vazio da cama.
O lado onde ela deveria estar.
Reclamando e rosnando. Dizendo que a
deixasse em paz, que ela não gosta de
dormir abraçada com ninguém e que não
é seguro cutucar uma mulher cansada.
Ri sozinho no escuro.
Como uma pessoa podia sentir tanta
saudade de outra depois de um
relacionamento tão curto?
Não fazia qualquer sentido. Mas lá
estava eu, contra toda a lógica, sentindo
uma falta insana da minha Dom teimosa
e reclamona.
Enfiei as mãos nos cabelos. Eu não ia
conseguir continuar assim. Aquilo ia me
deixar muito machucado.
Só tinha uma coisa que eu podia fazer.

A noite de sábado devia estar quase


terminando e eu ainda não estava nem
perto de conseguir dormir. Agarrada ao
travesseiro e ao cobertor que tinham
sido transferidos para o sofá da sala.
Demorei para entender que não
conseguia dormir na cama porque a
sensação de estar sozinha me deprimia.
Na sala, a tevê ficava ligada e eu podia
me distrair com a ilusão de estar
acompanhada. A solidão tinha crescido
sombriamente ao meu redor nos últimos
dias, e a TPM certamente não estava
colaborando.
Coloquei dois biscoitos na boca de
uma vez e mastiguei com preguiça.
Tentar achar algum canal que não me
lembrasse Gregory era uma missão
difícil. Acho que era por isso que eu
acabava passando a maior parte do
tempo mudando de um canal para o
outro, sem parar em uma mesma imagem
por mais que alguns poucos segundos.
Apertei o botão do controle remoto e
a tela exibiu um documentário sobre
castelos. Eu achei que ia começar a
chorar, mas a campainha tocou me
fazendo pular no sofá sobressaltada.
Olhei para o relógio no meu pulso.
Àquela hora… Quem poderia ser?
Eu sabia quem eu queria que fosse.
Mesmo sabendo que deveria ouvir
Marilyn. Mesmo sabendo que tudo podia
dar errado e que eu acabaria sofrendo
muito mais do que tinha sofrido naquela
semana. Mesmo sabendo que megeras
como eu não deveriam ter um final feliz.
Mesmo com tudo isso: eu sabia quem
eu queria que fosse. Tinha certeza.
Encostei o rosto no olho mágico e
sorri. Ia ser horrível ouvir o que ele
tinha para dizer e seria impossível me
livrar dele se conversássemos cara a
cara.
Mas minha cama estava mais fria e
mais vazia do que eu podia concordar.
Meu coração não aguentava mais e meu
corpo agiu sem pedir minha autorização.
Abri a porta e Max pulou em cima de
mim.
– Oi, garoto! – cocei suas orelhas.
Estava com quase tantas saudades dele
do que estava de Holt. Quase.
– Você disse que ia esperar.
Levantei o rosto. Ele tinha ficado
mais bonito? Mais gostoso e irresistível
nos últimos dias? Era possível?
Dei um passo para o lado para lhe dar
passagem e ele entrou na minha sala.
– Você me fez ter que atravessar o
país inteiro, Dominique. E não vou nem
falar sobre como você me ignorou todos
esses dias. Nem mesmo uma ligação! –
Seus lábios estavam espremidos e
irritados.
– Eu não ia conseguir me despedir de
você – expliquei fechando a porta. Max
estava passeando pela minha casa e
explorando a mobília desconhecida. – Ia
acabar desistindo de ir embora.
– E por que isso seria uma coisa
ruim?
– Porque… Porque é. – Mordi o lábio
e tentei controlar minha respiração.
– Eu sei o que a minha avó fez. E eu
já resolvi. Você recebeu alguma das
minhas centenas de mensagens?
– Recebi.
– Eu liguei. Várias vezes. Por que não
me atendeu?
– Holt… Não é só o vídeo. Eu disse a
ela que podia colocar na internet. Disse
a ela que eu não ligava.
Seus olhos se abriram
exageradamente.
– Você disse o quê?
– Não aguentava mais essa coisa de
chantagem. Ela disse que ia colocar na
internet, pois que colocasse.
– Então… Então, por que você foi
embora? – Eu conseguia ouvir na sua
voz que ele sabia a resposta para aquela
pergunta.
– Porque sem mim você pode ser
grande. Eleanor foi bastante clara sobre
tudo o que você estaria perdendo se
ficasse comigo, e eu não achei justo te
fazer escolher isso.
– Ah, cala essa boca! – largou os
ombros, exausto.
– Como é?
– Você foi embora porque é uma
medrosa! Ficou com medo de se
envolver, de se abrir… Medo de se
permitir ser vulnerável e sofrer.
– E você me culpa? Essa semana foi
horrível!
– Horrível porque você me ama, sua
mulher impossível! – reclamou alto. – E
não precisa nem me dizer isso, porque
eu sei exatamente o quão horrível ela foi
e sabe por quê? Porque eu te amo e por
que foi horrível para mim também.
Engoli a seco e cruzei os braços.
Queria que ele me abraçasse mais do
que queria viver.
– Eu errei várias vezes nessas últimas
semanas. Fui injusto com você em mais
de uma ocasião. Mas, desta vez, você
fez besteira, Dom. Não devia ter ido
embora.
– Eu queria que você tivesse todas as
oportunidades que quisesse – repeti. Se
eu confirmasse em voz alta… Se
dissesse que ele estava certo e que eu
estava morrendo de medo ia começar a
chorar. – E você mesmo disse que não
era como sua irmã. Você disse que
gostava da sua família antes.
– É. E aí metade da minha família
morreu por causa do jeito como minha
família conduz os negócios e eu abri os
olhos. Você pediu para eu confiar em
você, que você não estava me traindo ou
só querendo vingança. Eu errei, mas
aprendi. Eu confio em você. Estou te
pedindo que confie em mim. Não me
mudei por rebeldia, Dom. Eu não quero
mais aquela vida. Nunca mais.
– E vai preferir viver como um
advogado subalterno medíocre? – Ouvi
as palavras de Eleanor saindo pela
minha boca. Meu deus… Aquela mulher
tinha algum tipo de magia negra…
– Advogado subalterno medíocre?
Eleanor fez algum tipo de lavagem
cerebral em você? – riu. – Tenho uma
posição excelente e ganho muito bem,
obrigado. Estou… Aliás… Nós dois
estamos muito acima da média da
população. Foi isso que ela quis te
convencer? Que eu seria infeliz com
você porque não seria rico?
– Você poderia ser mais, Holt. Bem
mais do que já é.
– Poderia. Mas para isso eu teria que
pagar. E o preço que a minha avó cobra,
geralmente, é bem alto.
– Ela disse que ia congelar seus
fundos. Eu não sei como isso funciona
para você. Não sei o quanto depende
disso. Eu não podia deixá-la…
– Dominique… Eu não sou um Baxter.
Eu sou um Holt.
Mantive os braços cruzados e os
olhos nele.
– Se Eleanor congelar meus fundos
Baxter, não faz qualquer diferença para
mim por dois motivos. Primeiro, eu já
não uso aquela porcaria de qualquer
modo. Segundo, eu tenho todas as ações
e fundos de investimento do meu lado
Holt. É uma família bem rica também,
sabe? Não uso o dinheiro de nenhum dos
dois lados porque gosto de viver com o
meu salário. É suficiente para mim e
para Max. E creio que seja suficiente
pra você também.
– Ninguém vai me sustentar, Holt –
rosnei.
– Eu sei. E é precisamente o que eu
estou dizendo – sorriu. – Mas se algum
dia eu estivesse passando fome… –
exagerou, gesticulando –, eu ainda seria
dono de um terço de Las Vegas. Acho
que eu ficaria bem.
– Eu estou com medo – murmurei. – É
verdade, você está certo. – Ele sorriu,
discreto e satisfeito, e eu quis parar de
falar e beijá-lo. – Mas esse outro
problema também é uma realidade! Se
você voltar para casa, agora, sem mim,
você tem todas as possibilidades do
mundo, Greg. Você pode ser o que você
quiser e depois pode mudar de ideia e
ser outra coisa. Mas se você voltar
comigo, um monte dessas oportunidades
vai desaparecer. Você acha que não se
importa agora, mas pode mudar de ideia.
Não quero que se ressinta por isso. E,
principalmente, não quero que seja
obrigado a fazer algo que não quer por
uma decisão tomada por paixão – dei de
ombros. – Você tem que entender suas
prioridades. Escolher o que você quer
fazer com a sua vida, ter as opções de
ser o que você quiser… Isso é o Plano
a. Eu sou o Plano b, Greg. E você não
pode botar o b na frente do a porque não
é assim que o alfabeto funciona.
– Só tem um problema com a sua
lógica. – Ele passou a mão na nuca com
aquele sorriso doce e lindo no rosto. –
Você não é o Plano b. Nem o Plano a. –
Colocou as mãos na minha cintura e me
puxou naquele abraço que eu adorava. –
Você é pré-requisito, Dom. Sem você
não tem plano.
Greg passou os nós dos dedos na
maçã do meu rosto e me beijou. Eu me
entreguei naquele beijo macio e deixei
ele me abraçar. Há poucos minutos eu
tinha achado que nunca mais ia sentir
aquela boca. Segurei seu rosto entre
minhas mãos e o beijei de volta com
carinho e saudade.
– Comprei duas passagens de volta –
ele sussurrou contra os meus lábios. –
Você volta comigo.
– Eu não tenho voto? – ri.
– Não. Porque você foge sem se
despedir por motivo nenhum, sem sequer
me explicar o que está acontecendo.
Esse é o tipo de coisa que gente doida
faz – riu. – E gente doida não tem voto.
Você volta comigo. Além do mais, a
vizinha me ameaçou.
– Andy? – Eu tive que rir.
– É. – Ele levantou as sobrancelhas,
fingindo medo. – Ela consegue ser bem
assustadora.
– Está sendo uma boa aluna!
– Percebi! – beijou meus lábios, que
se abriam em um sorriso. – Ela me
ameaçou com alguma coisa de biscoitos.
Disse que ia mandar os biscoitos atrás
de mim se eu não te trouxesse de volta.
Não sei o que ela quis dizer, mas soou
horrível. Eu não quero biscoitos atrás de
mim, Dom. – ele disse, fingindo uma voz
assustada. Eu estava rindo como uma
criança. – Por favor, você tem que
voltar.
Coloquei as mãos nos seus ombros.
– Nada mudou – continuou. – Você
ainda tem mais algum tempo de férias.
Vem ficar comigo. A gente para durante
a semana e pensa no que vai fazer. A
gente decide algo junto. Você não pode
decidir sozinha! Não sei de onde tira
esses seus planos absurdos…
Greg passou o polegar nos meu lábio
inferior. Eu fechei os olhos e sorri.
– Eu fiquei pensando no que Scarlett
faria. – Segurei seu pescoço e o puxei
para mais perto. Ele veio, obediente. –
Ela deixou o homem que amava ir
embora porque era melhor para ele.
– Aí você pensou em fazer o mesmo
comigo?
– Seguir Scarlett nunca falha – decidi,
birrenta.
– Você tem certeza de que já assistiu
a esse filme? – Ele me apertou ainda
mais. Até quase doer. Mas eu não me
incomodei. Queria que ele me apertasse
o mais forte que pudesse e que me
mantivesse o mais próximo possível. –
Porque eu acho que você confundiu as
histórias de amor, Dom. O amor da vida
de Scarlett não é o homem que ela deixa
ir. É o homem de quem ela não desiste.
Ele estava certo. Eu estava sorrindo.
– E quando você conhece a
determinação de Scarlett, você tem
certeza de que ela vai consegui-lo de
volta.
– Porque ela não desiste. – Mordi o
lábio.
– Viu? Não sei como você pode ter
achado que era uma boa ideia ficar
sozinha. Você precisa de mim até para
interpretar o seu filme favorito.
Dei um tapa no seu braço.
– Não se divirta às minhas custas ou
eu boto você pra fora.
– Não! Não faz isso. Essa vizinhança
é meio louca – constatou, brincando com
os cordões do meu roupão. – Tinha uma
moça se masturbando ali do lado de fora
quando eu passei… ai!
Espalhei tapas pelo seu corpo, mas os
tapas logo viraram carícias e as carícias
viraram beijos mais intensos.
– Diz pra mim, Thoen. Você está nua
debaixo desse roupão?
– Talvez – provoquei. – E, por sinal!
Você se lembra desse roupão?
– Como eu poderia me esquecer?
Você estava usando quando achou que
eu queria trocar o vídeo por sexo.
– Que foi o que você acabou fazendo.
– Fiz um beicinho debochado.
– Ei, Max! Vem aqui! Roupão é mais
legal de puxar do que toalha! Vem aqui,
garoto.
Atiçou o cachorro usando os cordões.
Max acreditou na brincadeira e puxou
um deles. Holt me segurou por um dos
braços e me desembrulhou como se eu
fosse um presente.
Eu estava completamente nua a não
ser por uma lingerie vermelha. Ele
umedeceu os lábios.
– Você já acabou com a bobagem? Ou
eu vou ter que continuar o discurso para
te convencer sobre como eu me sinto
antes de você finalmente aceitar que eu
não vou a lugar nenhum sem você?
– Eu te amo – suspirei.
– É. Eu já sabia. – sorriu e levou mais
um tapa no ombro. – E já que estamos
aqui… – disse olhando ao redor –,
alguma chance de eu ser apresentado
àquele vibrador?
– Sem dúvidas – sorri, safada. – Eu te
mostro como usar.
Ele espremeu os lábios em um sorriso
discreto.
– Eu também te amo.
– É. Eu sei – repeti.
Epílogo
Dois anos depois

Morávamos na mesma cidade. Na


mesma rua. Trabalhávamos no mesmo
escritório e passávamos a maior parte
do tempo juntos, ou na minha casa ou na
dela. Mas Dominique não queria morar
junto oficialmente. Demorou quase um
ano para que eu, finalmente, a
convencesse de que estava na hora de
evoluir no relacionamento.
Vivia levando Max para sua casa e
mesmo depois que eu apelei para uma
guarda compartilhada, eu via meu
cachorro cada vez menos. Dei para Dom
um White Highland Terrier de presente
de Natal, para ver se ela me devolvia o
meu labrador. Mas aí, em vez de morar
com um cachorro, ela passou a morar
com dois.
Eu podia olhar para trás e saber que
filmar a minha vizinha gostosa se
masturbando tinha sido a melhor decisão
da minha vida.
A vizinha gostosa tinha se tornado
minha melhor amiga, minha companheira
inseparável, minha confidente. Tinha se
tornado o amor da minha vida.
E não haveria outra como ela. Nunca.
Fizemos uma lista de prós e contras
para decidir em qual cidade íamos
morar. Acabamos nos decidindo pela
minha cidade de origem. A vizinhança
amigável e algo chamado de Clube dos
Biscoitos ficou do lado dos prós, bem
como a proximidade com a minha mãe, a
quem Dom faz questão de visitar a cada
quinze dias. No começo ela me forçava
a ir junto, mas depois de um tempo
passei a ir por livre e espontânea
vontade. Trouxemos ela pra casa para
passar o natal conosco e ela acabou
ficando o mês inteiro. Agora, as pessoas
sabem onde ela está e o que aconteceu, e
suas velhas amigas a visitam com
frequência.
No lado dos contras, o único
elemento era a proximidade com
Eleanor e Dominique decidiu que esse
contra valia por três.
Eu não discordei.
Estamos juntos há dois anos.
Dois maravilhosos anos.
Enquanto procuro a caixa na garagem,
tento me lembrar de como era minha
vida antes dela e simplesmente não
consigo. Ela tinha se tornado
indispensável de um jeito absoluto.
Encontrei a caixa marcada como
“Lembranças de A.H.” e a abri.
Dominique já tinha me obrigado a
olhar o que tinha ali algumas vezes. Mas
a verdade é que eu ainda não sabia o
que fazer com os pertences da minha
irmã. Jogar fora me parecia errado, e
colocar os objetos pela casa não me
parecia certo. Então, a caixa ficou ali.
Respeitosamente guardada na garagem.
Encontrei a caixa de música embaixo
de alguns porta-retratos. De dentro dela,
tirei a pequena caixa preta sem
marcação. O anel de diamantes da
família Holt. Tinha sido da minha
bisavó. Quando meu bisavô Holt fez o
seu primeiro milhão, sua esposa
perguntou o que ele iria fazer com
aquilo. Ele foi até o mais respeitado
joalheiro da época e encomendou um
anel de noivado de mais de meio
milhão.
Quando eles se casaram ele era um
homem pobre que sequer tinha
condições de lhe comprar um anel. Ao
ser surpreendida com a joia milionária
ela lhe disse:
“Nathan, eu não preciso disso e você
sabe. Então, por que gastar todo esse
dinheiro com um presente para mim?”
E ele respondeu:
“Eu sempre posso conseguir outros
milhões, Ann. Mas só tenho uma de
você.”
Eleanor achava essa história ridícula.
Eu discordava. Ele jogou todo aquele
dinheiro fora em uma coisa inútil e
simbólica. Foi o jeito dele de dizer
“Está vendo todas essas coisas? Elas
não valem nada sem você”.
Era exatamente assim que eu me
sentia por Dominique.
Peguei o anel na mão, observei seus
belos diamantes e sorri antes de enfiá-lo
no bolso.
Agradecimentos
Um “obrigada” em primeiro, segundo
e terceiro lugar ao meu pai, por sempre
ter sido a minha mais firme rocha e o
mais animado membro na minha torcida.
Para Peu, por ter aguentado toda a
minha ansiedade e neurose com uma
paciência infinita e um carinho
interminável.
Para Luis Matos, Marcia Batista,
Juliana Teixeira e todo o pessoal da
Universo dos Livros por essa
oportunidade e pelo excelente trabalho,
carinho e dedicação para transformar
isso tudo em realidade.
Para minha mãe, que está resistindo
muito bem ao impulso de mandar me
internar desde que eu resolvi que queria
escrever.
Para os meus amigos que sempre
entenderam e apoiaram esse sonho e
estiveram presentes em cada evento,
encontro, palestra, venda de livros e
leitura de prólogos e outros trechos.
Vocês são o máximo!
Para Belinha, que também
acompanhou todos os gritos, risos e
choros!
Para Dr. Laila, por me ajudar a fazer
minha ansiedade malcriada se
comportar.
Para todas as mulheres malucas e
incríveis no “Restritas de Ju”, por terem
sido meu maior incentivo ao longo de
toda essa jornada.
Para o pessoal do Clube do Livro –
PE, para Lucien, Serena, Dany Wanessa,
Anna Schermak e tantos outros
blogueiros dedicados e maravilhosos
pelo seu incondicional apoio à literatura
nacional.
Valeu, pessoal! Vocês todos foram
mais do que essenciais.

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