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LIBERDADE – IGUALDADE - FRATERNIDADE

UM SIMPLES LEMA POLÍTICO OU O FUNDAMENTO PARA A CONSTRUÇÃO DE


UM NOVO HOMEM?
ANTONIO CARLOS MAIA PINTO GOUVEIA

RESUMO:

Nesta pesquisa procuramos verificar o sentido dos conceitos de Liberdade e Igual-


dade desde a Antiguidade Clássica até a contemporaneidade, entender estes con-
ceitos para saber se eles têm realmente uma participação efetiva nas transforma-
ções políticas que o homem vem desenvolvendo desde a antiguidade ou se não
passam de lemas políticos usados de acordo com as conveniências e interesses da-
queles que comandam as transformações políticas para em seguida deixarem estes
conceitos de lado e retornarem ao domínio e até à escravização de seus comanda-
dos. Para tanto, percorremos autores como Platão, Aristóteles, passamos por Sto
Agostinho e São Tomás de Aquino, entramos na modernidade com a perspectiva
destes conceitos de Hobbes, Locke, Rousseau e Kant, para chegarmos à contempo-
raneidade de Hannah Arendt e Einstein. A proposta de Fraternidade, inserida no
conjunto de Liberdade e Igualdade, torna-se realmente verdadeira se um dia passar
de mero símbolo de ideal a ser conquistado pela realidade política, a uma realidade
interna do ser humano e for, por consequência, inserida na praxis social, resultado
de uma nova e mais profunda conceituação de Liberdade e Igualdade a ser alcan-
çada neste terceiro milênio, onde o novo Homem possa conviver equilibrada e cons-
cientemente com suas duas realidades, tanto interna como externa.

Palavras-chave: Liberdade. Igualdade. Autodomínio. Vontade. Fraternidade.


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“Liberdade é uma palavra


. que o sonho humano alimenta.
Não há ninguém que explique
E ninguém que não entenda”

Cecília Meireles

INTRODUÇÃO

O tema visa o desenvolvimento de pesquisa dos conceitos de Liberdade e


Igualdade, procurando seus significados desde a antiguidade clássica até nossos
dias, com vistas a entender a evolução destes significados ao longo da história do
pensamento humano. Entendemos ser o significado destes dois conceitos de grande
importância posto que serviram de princípios fundamentais e de bandeira para al-
guns movimentos políticos que muito marcaram a História, como seja a Revolução
Francesa e a própria independência dos Estados Unidos da América. Representam
uma emancipação do ser humano dele próprio o que os torna de difícil entendimento
e compreensão para o próprio ser humano. Para atingirmos nosso objetivo, nossas
pesquisas passam por obras como “A República” de Platão, “Ética a Nicômaco” de
Aristóteles, “Paidéia: a formação do homem grego”, de Wilhelm Jaeger, “O Livre-
Arbítrio” de Santo Agostinho e a “Suma Teológica” de Tomás de Aquino; o “Leviatã”,
de Thomas Hobbes, passando pelo “Contrato Social” de Rousseau, bem como a
“Fundamentação da Metafísica dos Costumes” de Kant. Obras como “História da Fi-
losofia” de Reale e Antiseri também foram utilizadas, além de “Entre o Passado e o
Futuro” de Hannah Arendt e “O Poder Nú” de Einstein, além de muitos outros pes-
quisadores de que nos servimos para realizar nossas pesquisas.
A motivação para esta pesquisa nasceu do progressivo entendimento da
importância que estes conceitos tiveram em toda a vida humana e principalmente no
séc. XVIII quando o iluminismo devolveu ao homem novamente a capacidade de se
organizar com Liberdade, de construir uma sociedade mais igualitária e de criar as-
sim um ambiente onde se pudesse reviver no futuro a prática da verdadeira Frater-
nidade.
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PARTE I

Estamos no início do terceiro milênio. O homem atual imagina-se muito


velho e experiente ao saber que está ingressando num calendário pomposamente já
multimilenar. Realmente, nossa realidade atual é ímpar na História Humana. O co-
nhecimento filosófico e científico vem atingindo níveis talvez nunca alcançados pelo
ser humano e a tecnologia, por sua vez, está transformando a vida, nas suas formas
de estar, de agir e de pensar. À disposição deste ser humano do séc. XXI encontra-
se todo o tipo de informação de forma quase instantânea, fácil e cada vez mais se-
gura.
Porém, contrastando com esta novíssima e estrutural cultura, nos depa-
ramos com um niilismo crescente e profundo que atinge e contamina a maioria dos
indivíduos, como doença provocada por tanta informação que acaba por desinformá-
los. O choque informativo e cultural torna muitos incapazes de se posicionarem de
forma fundamentada e consciente sobre assuntos relativos à sua vida diária. Princí-
pios e conceitos fundamentais como a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade são
exemplos de processos de esvaziamento e desinteresse que atingem o ser humano
dos dias atuais. Da mesma maneira que vivemos numa época de intensa e quase
massacrante informação, o homem estagna numa terrível alienação interior e se en-
volve numa imensa teia de pequenos interesses e de inócuos, mesquinhos e pesso-
ais objetivos, que o mantêm servilmente e sem resistência sob as ordens das ideias
e valores impostos pelas instituições que o rodeiam e o destituem de sua já débil
vontade própria, tornando-o alvo fácil e preferido das ordens morais e culturais da
sociedade. É este o homem que se julga livre, mas na verdade, fica aniquilado e to-
talmente escravizado pelas limitações dos valores e crenças que impensadamente
adota. Vamos assim ao encontro dos filósofos da Antiguidade Clássica para deles
podermos sorver o seu conhecimento sobre estes conceitos.

CAPÍTULO I – O CONCEITO DE LIBERDADE E IGUALDADE NA ANTIGUIDADE


CLÁSSICA.

Platão classificou as diversas formas de governo atribuindo característi-


cas humanas a seus governantes. A um Estado democrático, ele atribuiu a Liberda-
de como sendo “a coisa mais bela que possui” (PLATÃO, 2005, 563, b, c). E, aos
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homens democráticos, ele classifica como sendo “pessoas livres”, cuja cidade por
estes governada estará “cheia de liberdades e do direito de falar e de se fazer o que
se quiser” (PLATÃO, 2005, 557, b).
Com estas citações de “A República” iniciamos a caminhada que nos le-
vará a desvendar a origem e o significado da palavra “Liberdade”, incrustrada que
está no centro da nossa cultura ética.
Partindo de uma concepção de vida coletiva e do conceito político de do-
mínio e pela comparação entre uma polis bem governada e a alma do Homem, Só-
crates criou o conceito de desenvolvimento interior, interno ou autodomínio e que fez
surgir no idioma grego de Atenas a nova palavra enkrateia com o sentido de domínio
de si próprio, firmeza e moderação: “A enkrateia não constitui uma virtude especial,
mas [...] a base de todas as virtudes”. (JAEGER,1994 p. 549).
E é justamente a partir deste novo conceito de domínio não externo, mas
interno do Homem, de domínio não sobre os outros, mas sobre si próprio, de domí-
nio do eu interior do Homem, que se manifesta pela supremacia da Razão sobre
seus instintos e emoções, que reside e se desenvolve o socrático conceito de Liber-
dade. Deste novo conceito de “domínio de si próprio”, com o sentido de autodomínio
da razão sobre os instintos e emoções, forma-se um conceito também inovador de
Liberdade interior. E, se até então, livre era o homem que não era escravo, agora
“livre” passa a ser o Homem que deixou de ser escravo de seus próprios apetites e
de suas paixões. Para Sócrates, a verdadeira Liberdade não consiste somente na
mera independência em relação às normas existentes fora do indivíduo, mas funda-
mentalmente esta Liberdade reside na independência ou autonomia em relação à
sua parte animal, instintiva, emocional, passional, própria de sua natureza.
Para esta época clássica grega, o conceito de Liberdade tem como refe-
rência a escravatura em seus diversos aspectos ou níveis. O cidadão liberal é o ci-
dadão livre em todas as suas atitudes, sua maneira de viver, em suas diversas for-
mas de expressão que se diferenciam das de um escravo. As Artes liberais são as
que perfazem a cultura liberal, a Paidéia do cidadão livre, oposta à ignorância e
mesquinhez do homem não livre, do escravo (JAEGER, 1994). Esta autonomia mo-
ral socrática equivale assim à emancipação da razão sobre a tirania da natureza
animal do homem e à estabilização legal do espírito sobre os instintos e emoções
humanas.
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O conceito de autarquia, ou ausência de necessidades, relacionado ao


conceito de Liberdade, relembra o Herói do Mito Helênico representado por Héra-
cles, sempre vencedor de suas lutas contra os monstros e espíritos malignos, em
razão de uma força interior como condição do homem para se ajudar a si próprio,
limitando os seus desejos e aspirações ao que está ao seu alcance. Aprender a do-
minar seus próprios monstros e espíritos malignos que residem dentro de si próprio
é o que o torna livre e o aproxima da divindade. Aquele que não tem necessidades.
Este Homem livre é o autárquico, o novo Herói, não mais aquele que consegue ven-
cer apenas os seus inimigos externos, as adversidades exteriores, mas como nos
sugere G.Reale (2007, p.97): “o novo herói é aquele que sabe vencer seus inimigos
interiores, que se lhe aninham na alma”.
O conceito de Igualdade podemos encontrar numa referência à palavra
grega Dike e que tem o sentido de compensação. Assim, na execução da lei, o cul-
pado e o lesado trocam entre si compensações como consequência dos atos por
ambos praticados. É uma tentativa de reequilibrarem suas ações, tornando-as mais
próximas, mais iguais. Cada um dá e recebe do outro o que lhe é devido. Cada ci-
dadão retribui ou compensa o outro cidadão com uma ação equivalente ao prejuízo
causado (JAEGER, 1994). Esta foi a base do conceito de Igualdade que teve seu
desenvolvimento em graus intermediários até chegar a um patamar da vida pública
em que todos são considerados iguais, tanto os grandes como os pequenos. Assim,
Dike constitui a base da vida pública e Aristóteles define o homem autárquico ape-
nas em suas atividades contemplativas, pois todos têm necessidade das coisas bá-
sicas e imprescindíveis para viver, tanto o sapiente como o justo e todos os outros
(REALE, 2007). Com esta visão, Aristóteles insere o homem na vida em sociedade,
numa ação de interação harmoniosa e equilibrada dos indivíduos entre si. Para o Es-
tagirita, a Liberdade era facultada pelo pensamento que dava ao homem a condição
para realizar suas escolhas e opções num ambiente social que lhe propiciava alhear-
se de qualquer condicionalismo. Escolhas e opções estas que são livres porque de-
pendem exclusivamente do homem, definido por ele como ser livre por ter em si
mesmo o princípio de seus atos.
Para Aristóteles (2013, p.56), “o homem é verdadeiramente livre enquanto
é o princípio motor e o pai de suas ações, como se fosse de seus filhos”. Desta for-
ma, tanto a virtude como o vício são manifestações desta liberdade. Para o filósofo
de Estagira, existem duas virtudes fundamentais, sendo uma o próprio exercício da
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razão, ou virtude dianoética e a outra que é exercida pela razão sobre os impulsos
sensíveis, determinante dos bons costumes ou ethos-mos e por isto se chama Ética.
Esta ação moral tem como causa a liberdade da vontade, ou por outras palavras, a
ação moral é uma ação voluntária que implica a existência da liberdade de escolha,
sem o quê a vontade não seria livre, nem a escolha seria possível se a vontade não
fosse livre. Aristóteles condicionava ainda a responsabilidade dos atos do indivíduo
ou a sua ação voluntária ao fato desta ação ser interna ou racional, ter também co-
mo causa a sua vontade própria e esta ação não ser consequência de sua ignorân-
cia. Para o filósofo, segundo Chauí (2009, p.334):

É livre aquele que tem em si mesmo o princípio para agir ou não agir, isto
é, aquele que é causa interna de sua ação ou da sua decisão de não agir.
A liberdade é concebida como o poder pleno e incondicional da vontade
para se determinar a si mesma, isto é, para autodeterminar-se.

Necessário se torna que o indivíduo tenha possibilidade de agir com total


liberdade, sem constrangimentos externos ou internos, bem como é essencial que
exista plena espontaneidade do indivíduo, único que pode fornecer a si mesmo os
motivos e as finalidades de suas ações, sem nada que o force a decidir agir ou não
agir. Esta concepção da liberdade aponta para o domínio da Razão na condução da
vontade livre e pela primazia da inteligência no direcionamento das ações dos indi-
víduos.
O tema da Igualdade é abordado por Aristóteles em sua obra “A Política”
definindo-a como o que existe de justo entre os homens na igualdade de tratamento
entre pessoas iguais. A Igualdade, como base do direito, serve unicamente para os
iguais e não para todos, assim como a desigualdade, também como base do direito,
serve apenas para os desiguais. A igualdade das coisas é de fácil consenso, mas
sobre a igualdade das pessoas não existe acordo possível porque estas tendem
sempre a dar uma extensão ilimitada a seus direitos. Assim, a verdade exata, em
matéria de igualdade e de justiça não será fácil de encontrar. Para Aristóteles
(2011, p. 112): “Os fracos não pedem mais do que igualdade e justiça, mas os mais
fortes pouco se importam com isso”. Para este filósofo, é necessário que o Estado
seja composto pelas desigualdades de funções. No entanto, o Estado deve abrigar
homens livres que tenham posses materiais para sustentar seus cargos, pois não é
possível um Estado manter-se apenas com pessoas pobres ou formado somente por
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escravos. Da mesma maneira que é impensável passar sem escravos e trabalhado-


res manuais, é ainda mais difícil viver sem os que fazem, pela força, reinar a justiça,
ou seja, o estado fica irrealizável sem a presença da igualdade na justiça e da desi-
gualdade nas funções sociais. (ARISTÓTELES, 2011).

CAPÍTULO II – OS CONCEITOS DE LIBERDADE E IGUALDADE NA IDADE MÉ-


DIA.

Caracterizado pela universalização da língua e culturas gregas e sua fu-


são com novas ideias e culturas de outros povos, o helenismo foi fruto das transfor-
mações do mundo antigo. O ser humano, que até então tinha sua vida centralizada e
realizada na polis, transferiu-a para um plano interior que atribuía à Virtude o cami-
nho para estabelecer a harmonia da alma e à Razão a ferramenta para anular suas
paixões e vícios.
O Império Romano trouxe uma nova religião e com esta, surge uma Ética
que estabeleceu uma nova visão sobre a divindade e sua relação com o ser huma-
no. A busca pelo equilíbrio entre a Razão e a Fé cristã passa a ser uma constante
no pensamento medieval. Santo Agostinho inaugura o que se poderia chamar de um
“círculo hermenêutico” pelo qual o conhecimento é precedido por um pré-
conhecimento apreendido através de outros meios, como a Fé, para depois ser con-
firmado, desmentido ou modificado pela Razão. Como nos relata Reale (2003, p.88):
“A Fé é, portanto, um pré-conhecimento em relação à Razão (credo ut intelligam);
mas a Razão depois pode e deve transpor criticamente as verdades de Fé (intelligo
ut credam)”. A nova relação Homem-Deus conduz Agostinho para a busca do senti-
do do homem e sua alma interna, em substituição ao cosmo, ao mundo. Alma e
Deus passam a ser o alicerce da filosofia cristã de Agostinho. Para ele, não é procu-
rando fora, no mundo, que se encontra a divindade, mas escavando a alma, pois a
Verdade encontra-se no interior do homem. Deus não se encontra fora, mas no inte-
rior do Ser Humano. Agostinho responde assim à questão do Bem e do Mal, definin-
do o Mal como sendo a ausência de Deus (AGOSTINHO, 1995). Para ele, Deus era
apenas o Bem. A partir desta definição de Bem e Mal, Agostinho formula os dois
conceitos que estruturam a noção de Liberdade, atribuindo ao homem a possibilida-
de de escolher entre a retidão e o pecado.
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A vontade livre ou livre arbítrio é o que permite ao homem decidir seguir


um caminho que o afaste de Deus, criando assim o Mal. O Ser Humano passa a ser
a fonte de todo o Mal, pela Liberdade que tem de tomar decisões, de fazer escolhas.
Pela retidão, o homem submete suas paixões à Razão. O pecado é o contrário,
submete a Razão às paixões. A livre vontade ou arbítrio é a única condição do pe-
cado, pois somente o livre arbítrio pode forçá-la a se submeter às paixões, o que
demonstra que o pecado tem como origem a vontade livre. E, partindo da causa do
pecado, tornava-se necessário definir o que era ou não o pecado. Santo Agostinho
cria então outra dicotomia: a Lei Eterna e a Lei Temporal. A primeira é a razão su-
prema de tudo (nous), uma lei divina em obediência à qual os homens se tornam
merecedores da felicidade, assim como os maus ou os que a ela não obedecem,
merecem uma vida de infortúnio. Agostinho (1995, p. 64), assim se referia a estas
duas leis:

Os que se submetem à lei temporal não podem se isentar da lei eterna, da


qual deriva, como dissemos, tudo o que é justo e tudo o que pode ser mu-
dado com justiça. Quanto àqueles cuja boa vontade se submete à lei eterna,
eles não têm necessidade da lei temporal.

Por constituir a razão suprema, a Lei Eterna é a Verdade e a verdadeira


Liberdade consiste em a ela estar submetido. A Lei temporal é a que rege o ser hu-
mano em relação às coisas temporais (AGOSTINHO,1995). Encontramos desta for-
ma em Santo Agostinho uma diferença entre o conceito de Liberdade que propicia
ao ser humano a vida na graça divina, liberto da escravidão das paixões e afastado
do pecado e o livre arbítrio como condição humana para seguir uma vida virtuosa ou
pecaminosa (TOMASEVICIUS FILHO, 2006).
O conceito agostiniano de livre arbítrio inova o conceito de Liberdade da
Antiguidade Clássica. Enquanto, entre os gregos, Liberdade tem uma conotação
muito política e jurídica, em Agostinho ela se liga com noções subjetivas da prática
de atos voluntários. Liberdade deixa de ser um status social grego para se transfor-
mar numa ideia universalizada, pois no Reino de Deus todos eram livres. Para Agos-
tinho a Liberdade ligava-se à vontade interior dos seres humanos que agora se colo-
cam todos em igualdade de condições para decidir que caminho seguir em todos os
momentos de suas vidas, podendo escolher entre uma vida de retidão, aproximan-
do-se de Deus ou uma vida pecaminosa, dele se afastando. A ideia de universaliza-
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ção da Liberdade, estendendo a todos os indivíduos a capacidade de usar o livre ar-


bítrio com fundamento na sua própria vontade, transformou profundamente a com-
preensão da Liberdade por ter atribuído a qualquer ser humano a sua condição de
ser livre e não a restringindo a determinado grupo social (TOMASEVICIUS FILHO,
2006). O Ser Humano tornava-se assim responsável por seus atos, por ser ele
mesmo a sua causa.
Em São Tomás de Aquino vamos encontrar a noção de Liberdade sob di-
versos aspectos. Para ele, a liberdade de escolha, ou o livre arbítrio, a liberdade mo-
ral ou Libertas Major e a liberdade fundamental detinham características próprias e
constituem três formas de abordar planos da Liberdade. A Liberdade de escolha as-
sume, para São Tomás, dois aspectos, o que ele identificou como negativo pela au-
sência ou não coação externa nos atos humanos e que ele denominou de “liberdade
de”. O aspecto positivo refere-se à liberdade ou livre arbítrio que o homem tem para
fazer qualquer coisa ou deixar de fazer e consiste na capacidade de auto realização
que o indivíduo tem nos seus atos, a “Liberdade para” (ALVES, 2011). Esta liberda-
de de escolha ou livre arbítrio tem como fator principal o que São Tomás denomina
de “juízo de eleição”, determinante na escolha e compreendendo o juízo e a execu-
ção da ação. O homem age livremente, não determinado ad unum como nos ani-
mais, mas sempre com a possibilidade de um modo ou outro de ação ou mesmo de
agir ou não agir. O homem é livre em seus atos podendo ou não agir segundo seus
instintos. Para Tomás de Aquino (2017, p. 694):

A eleição é propriedade do livre arbítrio. Pois, se temos livre arbítrio é que


podemos tomar uma coisa e recusar outra; e isso é eleger. Por onde é mis-
ter considerar a natureza do livre arbítrio partindo da eleição[...]. A eleição
pertence, principalmente, ao livre arbítrio. Ora, esta, incluindo a comparação
de um juízo com outro, o que é próprio da virtude cognitiva, é uma proprie-
dade do conhecimento. Logo, o livre arbítrio é uma potência cognitiva.

A Liberdade fundamental traz consigo a exigência da responsabilidade e


é tida como um dom. Para Tomás de Aquino, a alma humana diferencia-se da alma
dos animais por possuir o ser por si mesma e o seu actus essendi indica o modo de
agir próprio através da razão e da vontade. A Liberdade fundamental significa uma
autonomia operativa da alma humana que se manifesta no ato humano realizado
com inteligência e vontade. Para Aquino, (2017, p. 691):
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O homem tem livre arbítrio; do contrário, seriam inúteis os conselhos, as


exortações, os preceitos, as proibições, os prêmios e as penas. E isto se
evidencia considerando que certos seres agem sem discernimento, como a
pedra que cai e, semelhantemente, todos os seres sem conhecimento. Ou-
tros, porém, agem com discernimento, mas não livres, como os brutos. As-
sim, a ovelha que, vendo o lobo, discerne que deve fugir por discernimento
natural, mas não livre porque esse discernimento não provém da reflexão,
mas do instinto natural. [...] O homem, porém, age com discernimento, pois
pela virtude cognoscitiva, discerne que deve evitar ou buscar alguma coisa.
Mas esse discernimento, capaz de visar diversas possibilidades, não pro-
vém do instinto natural, relativo a um ato particular, mas na reflexão racio-
nal. Pois a razão, relativamente às coisas contingentes, pode decidir entre
dois termos opostos, como se vê nos silogismos dialéticos e nas persua-
sões retóricas.

A Liberdade moral é relativa a um ser humano criado e limitado, fruto da


liberalidade divina que, com amor de benevolência criou o homem livremente e o
criou para ser livre com amor. Esta liberdade moral pode aumentar ou diminuir de
acordo com os atos bons ou maus que o homem pratique. A essência da Liberdade
está no domínio que o homem tem sobre seus próprios atos e dirige-se a um fim que
é a auto doação de si mesmo imitando a amorosa liberdade divina (ALVES 2011).

CAPÍTULO III - ANÁLISE E CONHECIMENTO DOS CONCEITOS DE LIBERDADE


E IGUALDADE NA IDADE MODERNA.

3.1 – OS CONCEITOS DE LIBERDADE E IGUALDADE EM HOBBES,


LOCKE E ROUSSEAU.
Marcada pela dominação da Igreja de Roma nos campos cultural, eco-
nômico e político, a Idade Média tornou-se precursora de um renascimento cultural e
principalmente científico caracterizado pela substituição do paradigma baseado na
revelação divina, pelo uso da Razão. De uma visão teocêntrica, para uma nova po-
sição antropocêntrica marcada pela racionalidade. A um conceito de sociedade
submetida aos dogmas de uma religião em que a Liberdade e a Igualdade estavam
condicionadas às regras estabelecidas pela autoridade divina, surge uma nova regu-
lação da vida social mais própria da modernidade racional, baseada agora na figura
do contrato social.
O Contratualismo emerge como nova forma de teorizar o poder político e
reformular os conceitos de Liberdade e Igualdade dentro do novo contexto modernis-
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ta. A um estado original, natural, ou “Estado de Natureza” sucede um outro modelo


de Estado formado pela liberdade de união de seus componentes sociais (SHIMA-
MURA, 2008). Para Hobbes, este “Estado de Natureza” propiciava a que os homens
vivessem em constante estado de guerra (bellum omnium contra omnes). O temor
da morte induziu a que os indivíduos, de forma livre e espontânea, fizessem um pac-
to entre todos para formarem um Estado governado por um soberano depositário de
sua liberdade e direitos pessoais. Esta foi a figura criada do monarca absolutista, de-
tentor único do poder. A liberdade individual ficava à mercê e permanentemente re-
gulada pelo absolutismo soberano. O pacto ou contrato era a garantia da manuten-
ção das liberdades naturais, da vida, dos bens e da própria liberdade que, para
Hobbes, apresentava apenas a ausência de obstáculos ao movimento dos corpos,
portanto, uma conotação relativa apenas ao movimento do corpo físico. Hobbes
(2003, p.179) assim se referiu:

LIBERDADE, ou INDEPENDÊNCIA significa, em sentido próprio, a ausência


de oposição (entendendo por oposição os impedimentos externos do movi
mento) e não se aplica menos às criaturas irracionais e inanimadas do que
às racionais. Porque de tudo o que estiver amarrado ou envolvido de modo
que não se possa mover senão dentro de certo espaço, sendo esse espaço
determinado pela oposição de algum corpo externo. Dizemos que não tem
liberdade de ir mais além.

Esta é, portanto, uma definição de liberdade indicativa de uma nova e


moderna concepção de realidade física.
Locke assume uma posição diferente de Hobbes e considera a liberdade
como resultado da igualdade entre os homens. Não existe subordinação de uns em
relação aos outros, como em Hobbes, porque todos são dotados de racionalidade e
inteligência, o que lhes confere a igualdade necessária para usufruírem da Natureza.
Pela razão, os homens concebem a lei da preservação segundo a qual todos sabem
que não podem se destruir mutuamente. O Estado ficava com a missão de garantir
as liberdades individuais da própria natureza humana, das quais Locke destacava a
propriedade como fruto do trabalho produzido através de suas capacidades físicas e
intelectuais e que, por isso, passava a pertencer ao indivíduo. “A extensão de terra
que um homem lavra, planta, melhora, cultiva, cujos produtos usa, constitui sua pro-
priedade” (LOCKE,1988, p. 37). O contrato civil surge como necessário para garantir
o acúmulo de bens. O Estado, em Locke, baseia-se numa carta magna com divisão
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de poderes visando a limitação do poder estatal, a manutenção de uma ordem legal


e como garantia da liberdade dos direitos individuais, fundamento principal do libera-
lismo lockeano. A liberdade individual atingia assim um grau elevado de autonomia e
a igualdade apresenta-se explicitada em sua Liberdade, já que somente é possível
admiti-la concebendo os homens como iguais. A desigualdade surge naturalmente
pela apropriação legal de partes da Natureza além do estritamente necessário à so-
brevivência e a partir da diferenciação do poder criada pela estrutura do Estado
(VAZ, 2010).
Na obra “Do Contrato Social”, Rousseau (2002, p. 05) começa afirmando
que: “o homem nasce livre, mas em todo o lugar encontra-se sob ferros”. O objetivo
de Rousseau é o de libertar o ser humano das cadeias e restituí-lo à Liberdade. Ao
contrário de Hobbes e Locke, a soberania encontra-se no povo que se manifesta
através da vontade geral amante do bem comum. Esta vontade geral legitima o po-
der soberano do povo, mantenedora de sua liberdade civil e dos direitos dos cida-
dãos. O governante deixa de ser o soberano, para ser apenas um representante da
soberania popular, a quem cabe manter o interesse geral acima do interesse particu-
lar e privado, manter a vontade geral formada pela renúncia de cada um aos pró-
prios interesses em favor da coletividade (REALE, 2005). Assim, o novo contrato so-
cial somente será efetivo quando houver uma condição de igualdade para todos, pe-
la alienação de todos os direitos de cada associado a toda a comunidade, consistin-
do a igualdade nesta doação integral de todos, como condição igual para todos, em-
bora todos mantenham a desigualdade de suas características pessoais. (ROUS-
SEAU, 2002). A Liberdade em Rousseau consiste na possibilidade de todos delibe-
rarem e participarem das decisões políticas, formando a vontade geral que se impõe
sempre sobre as vontades particulares dos membros da comunidade. Para tanto, ele
defende a democracia participativa ou direta, pois a representatividade em si já insti-
tui a desigualdade.

3.2 – OS CONCEITOS DE LIBERDADE E IGUALDADE EM KANT


A maioria dos filósofos ao longo dos tempos tratou o tema da Liberdade
como um dos problemas principais da reflexão filosófica. Mas foi Kant que lhe con-
cedeu importância fundamental ao atribui-lhe a classificação de peça chave dentro
de sua reflexão crítica. No pensamento Kantiano, Liberdade e Razão complemen-
tam-se uma à outra, pois tanto a liberdade age segundo a razão como a razão se
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realiza através da liberdade. Sem esta, tanto o uso teorético quanto o uso prático da
razão permanecem incompreensíveis. A razão sem liberdade não poderia realizar a
obrigação da lei moral. Somente sendo livre, o homem pode resistir a seus estímulos
sensíveis tanto internos quanto externos. Somente com liberdade o ser humano rea-
liza e define sua responsabilidade de ser homem, como ser racional, o que, para
Kant, equivale a ser essencialmente livre e poder agir exclusivamente com liberdade
(PEORARI, 2010). Em sua obra “Fundamentos da Metafísica dos Costumes”, Kant
(2007, p. 93) afirma: “A Vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos en-
quanto racionais e liberdade seria a propriedade desta causalidade, pela qual ela
pode ser eficiente, independentemente das causas estranhas que a determinam”. O
filósofo classifica ainda a liberdade como negativa e positiva, sendo que seu sentido
negativo consiste em agir independentemente das causas externas. Seu sentido po-
sitivo refere-se a uma liberdade da vontade de constituir lei para si próprio, tornando-
a uma propriedade da vontade dos seres racionais, pois ela passa a ser sinônimo de
moralidade ao atribuir ao ser livre uma ação de acordo com a lei emanada da razão.
Por isso, Kant atribui à liberdade a causa da autonomia, isto é, a liberdade da vonta-
de não pode ser senão autonomia: Kant (2007, p.102)

Como ser racional e, portanto, pertencente ao mundo inteligível, o homem


não pode pensar nunca na causalidade da sua própria vontade senão sob a
ideia da liberdade, pois que a independência das causas determinantes do
mundo sensível (independência que a razão tem sempre de atribuir-se) é li-
berdade. Ora, à ideia da liberdade está inseparavelmente ligado o conceito
de autonomia e a este o princípio universal da moralidade, que serve de
fundamento e se encontra na base de todas as ações dos seres racionais,
como a lei natural está na base de todos os fenômenos.

A Liberdade é assim, para Kant, a condição que pode fundamentar a exis-


tência do dever, da lei moral. O Dever, como fato da Razão, conduz a uma condição
de liberdade, a uma condição de ser livre, pois de outro modo o dever não teria sen-
tido. A autonomia é algo que o ser humano aprende ao passar a ser guiado pela lei
moral, pelo dever. Alcançar a maioridade requer capacidade e vontade do próprio
indivíduo que vai saindo aos poucos da menoridade ao longo de sua vida, através
de um processo longo e gradual. Para Kant, o homem, por natureza, não é bom nem
mau, não é moral por natureza. Ele somente se torna moral quando se torna capaz
de elevar sua racionalidade aos conceitos de dever e de lei. Aprender a ser homem
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tem o sentido de ser guiado livremente pela lei moral, saindo de sua sujeição de
menoridade para se tornar um ser livre e autônomo.

PARTE II – O CONCEITO DE LIBERDADE EM HANNAH ARENDT E ALBERT


EINSTEIN

CAPÍTULO I – O CONCEITO DE LIBERDADE EM HANNAH ARENDT

A Liberdade é, na obra de Hannah Arendt, tema sempre presente em


seus pensamentos e reflexões, pois, segundo ela mesma afirma, seu conceito de
Liberdade não é de fácil definição nem se trata de uma questão muito simples:

Levantar a questão – o que é Liberdade? – parece ser uma empresa ir-


realizável. É como se as velhas contradições e antinomias estivessem à nos-
sa espreita para forçar o espírito a dilemas de impossibilidade lógica de tal
modo que, dependendo da solução escolhida, se torna tão impossível conce-
ber a liberdade ou o seu oposto, quanto entender a noção de um círculo qua-
drado. Arendt (2014,p.188).

E, no entanto, a liberdade torna-se evidente na vida prática do ser huma-


no, pois, para Arendt (2014, p.189):

Em todas as questões práticas e, em especial nas políticas, temos a liber-


dade humana como uma verdade evidente por si mesma e é sobre essa
suposição axiomática que as leis são estabelecidas nas comunidades hu-
manas.

A questão da Liberdade apresenta-se como tão fundamental nas ques-


tões políticas que, para Arendt, nenhuma teoria política pode a ela ficar alheia e a
coloca como a última questão metafísica tradicional a converter-se em investigação
filosófica (ARENDT, 2014). Porém, é no âmbito da política que a liberdade é conhe-
cida como fato da vida cotidiana, pois a ação humana e a política, entre todas as ca-
pacidades e potencialidades humanas, constituem as duas únicas coisas que se tor-
nam impossíveis de conceber sem se admitir a presença da Liberdade. Para Arendt
(2014, p. 192):

A liberdade, além disso, não é apenas um dos inúmeros problemas e fe-


nômenos da esfera política propriamente dita, tais como a justiça, o poder
15

ou a igualdade; é na verdade o motivo por que os homens convivem politi-


camente organizados.

Assim, para Arendt, a liberdade não surge na consciência ou na vida inte-


rior do homem, mas apresenta-se como atividade na vida política. Não é algo que
tenha origem no pensamento nem na vida interna do eu consigo mesmo. Não se tra-
ta de dom ou dádiva que nasce com o ser humano. Historicamente, ela nasce na an-
tiguidade quando da descoberta da política, na experiência da polis no sentido da
vida social, na esfera da vida pública (SILVA, 2015). A liberdade constitui o motivo
pelo qual os homens convivem politicamente organizados, a raison d’être da política
e seu domínio de experiência é a ação (ARENDT, 2014).
A Liberdade opõe-se ao conceito de liberdade interior por constituir este
um espaço reservado que serve de refúgio à coação externa. Espaço este que, por
não se manifestar externamente não detém nenhuma significação política. Para a
filósofa, os conceitos de liberdade interior foram formulados a partir de uma necessi-
dade de retirada do mundo, onde a liberdade foi negada, para se refugiar numa inte-
rioridade onde ninguém mais tem acesso. Esta interioridade, como região de absolu-
ta liberdade, foi descoberta na Antiguidade por aqueles que não tinham um lugar
próprio no mundo e precisavam de uma condição mundana, considerada até o séc.
XIX como sendo uma pré-condição para se alcançar a liberdade. No entanto, “o ho-
mem nada saberia de liberdade interior se não tivesse experimentado antes a condi-
ção de estar livre como uma realidade mundanamente tangível” (ARENDT, 2014,
p.194). E Arendt ilustra ainda seu conceito de liberdade com o conceito de “virtú”
maquiavélico pois, como ela própria afirma: “A melhor versão de seu significado é
virtuosidade, isto é, uma excelência que atribuímos às artes da realização, onde a
perfeição está no próprio desempenho” (ARENDT, 2014, p.199).
A noção de espaço público que se encontra presente em toda a obra de
Arendt, identifica-se com o da polis grega, baseando na tradição política pré-
filosófica o pensamento político da contemporaneidade. Na sequência da Antiguida-
de a liberdade seria transferida do ambiente inicial da polis, que a colocava no con-
vívio entre os homens livres, para um ambiente de interioridade comandado pela
vontade e pelo livre arbítrio, retirando-lhe assim sua exterioridade. Este afastamento
da política foi mantido pela tradição desde o cristianismo, passando pelo pensamen-
to político moderno, pelas ciências políticas e sociais dos séc. XIX e XX. Porém, pa-
16

ra a filósofa, a liberdade reside na ação política, constitui a atividade política por ex-
celência, a capacidade humana de produzir alguma coisa inteiramente nova, a ca-
pacidade criativa do ser humano no seio do convívio com os outros (SILVA, 2015).

CAPÍTULO II – A LIBERDADE EM ALBERT EISNTEIN

Albert Einstein foi indubitavelmente um dos pensadores mais brilhantes


do séc. XX. O filósofo Bertrand Russel o denominou a um só tempo cientista e “sá-
bio”, duas coisas que nem sempre andam juntas, mas antes de tudo, um pensador
que entendeu bem a relação muitas vezes contraditória entre sua racionalidade e
sua sensibilidade, entre a sua Razão e a sua Emoção.
Em relação ao conceito de Liberdade, Einstein (1981, p. 8) “se recusa a
crer na liberdade e neste conceito filosófico”. Porém, caracterizando seu pensamen-
to tão contraditório quanto abrangente, ele atribui ao ser humano, na sua qualidade
de “ser livre”, a capacidade de realização dos aspectos positivos da vida, priorizando
o desenvolvimento do indivíduo em relação ao seu grupo social. Para Einstein
(1981, p.8): “é a pessoa humana livre, criadora e sensível que modela o belo e exal-
ta o sublime, ao passo que as massas continuam arrastadas por uma dança infernal
de imbecilidade e embrutecimento”.
Vivendo em uma época de grandes ameaças às liberdades intelectuais e
individuais, coloca-se em oposição a todas as potências mundiais que ameaçavam a
“própria noção de Liberdade, pela qual nossos ancestrais já lutavam” (EINSTEIN,
1994, p. 95).
Para o sábio, sem a Liberdade o mundo jamais teria visto nascer a maio-
ria dos grandes pensadores, filósofos, cientistas e artistas, as pessoas não viveriam
em casas minimamente confortáveis, não teríamos trem, rádio, remédios, nem cultu-
ra, nem arte. Não haveria máquinas para ajudar e substituir o homem nos trabalhos
mais penosos de que sempre precisou para produzir seus alimentos. Para Einstein
(1994, p. 96) “Sem essa Liberdade, a maioria dentre nós levaria uma vida de oprimi-
dos e escravos. Só numa sociedade livre o homem é capaz de inventar e ter acesso
aos valores culturais que fazem de sua existência uma vida que vale a pena ser vivi-
da”.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta breve pesquisa podemos verificar que, ao longo da evolução do


pensamento humano, alternaram-se polos distintos no que diz respeito à ideia de
Liberdade-Igualdade. Por um lado, temos filósofos que defendem o conceito de li-
berdade através da formação harmônica, equilibrada e coletiva das instituições soci-
ais, onde os indivíduos vivenciam a alienação provocada pela dicotomia das vonta-
des individuais e coletivas. A racionalidade humana colocada numa situação emi-
nentemente coletiva atribui à Liberdade a capacidade de ação sem ultrapassar os
limites naturais das barreiras sociais, o que possibilita a convivência pacífica e har-
moniosa entre os indivíduos, ou seja, ser livre é conviver com as vontades de uma
racionalidade coletiva manifestada nas instituições sociais.
Por outro lado, em outros pensadores verificamos a ideia da liberdade
vinculada a uma vontade autorreferente de um ser humano que se determina por si
mesmo e que atinge sua própria autonomia.
Entendemos que o binômio Liberdade-Igualdade, em suas diferentes con-
cepções, deve ser ampliado e constituído por aspectos subjetivos que conduzem a
uma moral racional e por aspectos objetivos constituídos pelas ações humanas de-
senvolvidas no ambiente que reproduz a realidade social.
A Fraternidade ainda é um conceito pouco trabalhado e ainda pouco in-
cluído na práxis social, sobretudo nos dias atuais. É preciso, pois, parar para refletir
sobre o que significa ser livre, já que o conceito de Liberdade juntamente com os
conceitos de Igualdade e Fraternidade vão muito além dos conceitos de pequenas
liberdades e igualdades próprias das atividades diárias que conduzem a falsas no-
ções de liberdade e igualdade num quadro de crescente ausência de Fraternidade.
Desta forma e numa primeira investida em direção à ampliação do conceito de Li-
berdade, deve ser esta enriquecida e ampliada com o conceito de conhecimento,
para podermos facilmente entender que a verdadeira Liberdade somente é possível
atingir com Conhecimento, o que nos revela desde logo que este é um tipo de con-
ceito de Liberdade para a qual a atual humanidade ainda não está preparada. Te-
mos assim um milênio inteiro à nossa frente para incorporarmos ao interior do ser
humano e à práxis social estes conceitos de Liberdade-Igualdade-Fraternidade, sob
pena de a atual humanidade correr diversos riscos e perigos, não se podendo exclu-
ir, dentre estes, o da própria extinção.
18

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ABSTRACT: FREEDOM – EQUALITY - FRATERNITY

In this research we tried to verify the meaning of the concepts of Freedom and
Equality from Classical Antiquity to contemporaneity, to understand these concepts
to know if they really have an effective participation in the political transformations
that the Man has been developing since Antiquity or if they are no more than political
slogans used in accordance with the conveniences and interests of those who com-
mand the political transformations and then leave these concepts aside and return to
domination and even the enslavement of their subordinates. The proposal of fraterni-
ty, inserted in the set of Freedom and Equality, becomes really true if one day it goes
from being a mere symbol of an ideal to be conquered by political reality, to an inter-
nal reality of the human being and is consequently inserted in the Social praxis, the
result of a new and deeper conceptualization of Freedom and Equality to be
achieved in this third millennium, where the new Man can live in a balanced and con-
scious way with his two realities, both internal and external.

Key Words: Freedom. Equality. Self Will. Fraternity.

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