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FUNDAMENTOS E MÉTODOS DO ENSINO

DA LÍNGUA PORTUGUESA

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA


Ementa –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prática pedagógica. Leitura e escrita. Gêneros textuais. Aspectos gramaticais: o
trabalho com a ortografia. Revisão de textos.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO

Com certeza, quando você era estudante do Ensino Funda-


mental ou Médio, já se perguntou por que deveria aprender Língua
Portuguesa na escola, visto que já se comunicava muito bem na sua
Língua Materna e até escrevia com certa competência.
Hoje, ao se preparar para ser um educador, pode estar se
perguntando: "Por que ‘ensinar’ Língua Portuguesa na escola? Para
que ensinar Língua Portuguesa na escola? Como ensinar Língua
Portuguesa na escola? É possível ensinar a Língua Materna deforma
prazerosa?".
Pode parecer óbvio responder que as crianças estão na escola
para aprenderem a ler, compreender e produzir sentidos parasuas
leituras. Mas isso parece não ser tão simples assim, dado queuma
grande maioria de jovens sai de nossas escolas sem adquirir
competências para fazer uso proficiente da leitura e da escrita dos
textos que circulam em nossa sociedade.
O grande desafio deste modulo será buscar embasamentos
teóricos e metodológicos para responder a essas questões e
apontar algumas possibilidades pedagógicas no tratamento da
leitura, da análise linguística e da produção de textos. Afinal, ler,
compreender e produzir bons textos deve ser oprincipal objetivo do
ensino de Língua Portuguesa na escola.
Você verá, no decorrer de nossos estudos, que um aspecto
muito importante a considerar é que as concepções que se tem do
que seja a linguagem alteram o que e como ensinar a língua.
Esquema dos Conceitos-chave

Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais
importantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um
Esquema dos Conceitos-chave. O mais aconselhável é que você
mesmo faça o seu esquema deconceitos-chave ou até mesmo o seu
mapa mental. Esse exercícioé uma forma de você construir o seu
conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas
próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações entre
os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais
complexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na
ordenação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de
ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se que,
por meio da organização das ideias e dos princípios em esquemas e
mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimento de
maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos
significativos no seu processo de ensino e aprendizagem.
Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem
escolar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas
em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, na
ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que
estabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos
conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim,
novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem
pontos de ancoragem.
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa,
apenas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é
preciso, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se
configure como uma aprendizagem significativa. Para isso, é
importante considerar as entradas de conhecimento e organizar
bem os materiais de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os
novos conceitos devem ser potencialmente significativos para o
aluno, uma vezque, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes
estruturas cognitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é vocêo
principal agente da construção do próprio conhecimento, por meio
de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas e
externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tornar
significativa a sua aprendizagem, transformando o seu
conhecimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja,
estabelecendo uma relação entre aquilo que você acabou de
conhecer como que já fazia parte do seu conhecimento de mundo
(adaptado do site disponível em:
<http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon-
ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2011).
Como poderá observar, esse Esquema oferecerá a você,como
dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais
importantes deste estudo. Ao segui-lo, será possível transitarentre
os principais conceitos e descobrir o caminho para construiro seu
processo de ensino-aprendizagem. Por exemplo, é importante
saber que a perspectiva sociointeracional de linguagem tem o
discurso e o texto como dois aspectos distintos. Nessa ótica, a
produção de sentidos do texto (discurso) é construída na interação
locutor/interlocutor; texto/sujeitos e não algo que preexista a essa
interação, portanto, depende dos aspectos sócio-históricos do mo-
mento da enunciação.
Dessa maneira, é possível depreender que a leitura é uma
atividade interativa complexa de produção de sentidos, que se
realiza com base nos elementos linguísticos presentes na superfície
textual e na sua forma de organização (tipologia textual), mas que
requer a mobilização de vasto conjunto de saberes do interlocutor
(leitor, ouvinte) no interior do evento comunicativo, que, por
natureza, é dialógico.
Figura 1 - Esquema dos Conceitos-chave do módulo de Fundamentose Métodos do Ensino
da Língua Portuguesa.
Capítulo I
Práticas de Leitura
e de Escrita
"O que queres que eu te leia, querido?
‘As fadas’?
Perguntei, incrédulo:‘As fadas estão aí dentro?"
(SARTRE, 2005, p. 33).

1. OBJETIVOS
• Compreender e identificar os fatores que interferem no ato
de ler.
• Discutir sobre a leitura como prática social e objeto de
aprendizagem.
• Empregar metodologia adequada para o ensino da leituraem
sala de aula.
• Identificar quais os pressupostos que estão por trás das
atividades e situações que o professor propõe aos alunos.
• Identificar a diversidade de gêneros discursivos que circulam
socialmente como objetos de análise, e o texto comounidade
de ensino da leitura e da escrita.
• Distinguir e compreender os suportes textuais, gêneros
textuais e textos.
2. CONTEÚDOS
• Ato de ler.
• Construindo a competência leitora por meio de estratégias.
• Texto como unidade de ensino.
• Suportes de textos e gêneros textuais.
• Construindo a competência escritora por meio da análisede
gêneros.

3. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Você saberia apontar tudo o que leu hoje desde que se
levantou até agora? Lembra-se da marca do café que coou logo de
manhã? E donome da margarina que passou no pão? Com certeza
ficou impressionado com a manchete do jornal de hoje! E aquelas
tantas propagandas das ofertas dos supermercados que lhe
chegaram debaixo da porta? Havia contas a pagar também? Luz,
água, telefone? IPVA? IPTU?
Realmente, não nos damos conta de todos os atos de leitura
de que participamos durante o dia. Se você já é professor, tomou
seu plano de aula e reviu rapidamente sua rotina de trabalho do dia
com as crianças na sala de aula; se ainda não é professor, com
certeza tomou um dos livros recomendados para o concurso de
ingresso ao magistério para preparar-se para ele.
Na rua, a caminho do trabalho, com certeza leu dois ou três
outdoors que argumentavam com palavras, formas e cores que de-
veria comprar todos aqueles produtos!
Talvez, na escola, tenha lido o manual de instrução sobre
como ligar o vídeo para projetar um filme para os alunos; na hora
do intervalo, deve ter lido a Revista Escola e, com certeza, leu um
conto de fadas ou uma notícia para seus alunos na Roda de leitura.
Agora, está lendo este material que trata justamente do ato de
ler e dos aspectos que envolvem a leitura.
Em todas as situações em que você leu durante o seu dia, foi
movido por um objetivo, mesmo que tenha sido por mera
curiosidade.
Convidamos você, agora, a ler para discutir conosco sobre os
fatores que interferem na leitura, tanto na vida, como na sala de aula.
Antes disso, vamos ler um trecho do poema de Carlos
Drummond de Andrade (1988) Poesia e prosa, no qual ele diz o que
pensa sobre as palavras:

As palavras não nascem amarradas,


Elas saltam, se beijam, se dissolvem,
No céu livres por vezes um desenho,
São puras, largas, autênticas, indevassáveis.

Como diz Drummond, as palavras não nascem amarradas e não


seremos nós que as amarraremos. O que desejamos é conhecê-las
para saber usá-las a nosso favor, sempre. Por isso, vamos refletir
sobre o ato de ler.

4. ATO DE LER
Neste tópico, pensaremos no ato de ler como uma prática
social a que estamos acostumados e, ao mesmo tempo, como um
processo de construção de significados.

O ato de ler como prática social


Quando estamos em casa e tomamos um romance para ler por
entretenimento, nossa leitura será sempre extensiva, ou seja, lemos
a obra toda, linearmente, embora possamos fazê-lo por par- tes.
Lemos, de preferência, sozinhos, em voz baixa, nos momentosem que
desejarmos.
Ao contrário, se estivermos na igreja, para acompanhar a
missa, tomaremos o folheto em que encontraremos textos religiosos
como trechos da Bíblia e cantos. Leremos, às vezes, em voz alta,
respondendo ao celebrante, às vezes em coro, às vezes can- tando.
Nesse caso, lemos para retirar do texto algum ensinamentoou para
acompanhar o ritual e saber quais falas deverão ser realizadas. A
leitura que fazemos nessa ocasião é de pequenos trechos,
entrecortada, e não uma leitura exaustiva.
Ao assistirmos a uma peça de teatro, sabemos que os atores
estarão fazendo uma leitura dramática de um texto escrito por um
autor. Nessa situação, a finalidade da leitura, para os atores, é serlida
em voz alta e interpretada. Para nós, que assistimos, é apreciar a
leitura que está sendo realizada por eles.
Se estivermos no consultório médico, onde costumam estar
disponíveis vários tipos de revistas, para que os pacientes "passemo
tempo" enquanto esperam seu horário, faremos uma leitura de
entretenimento, interrompendo-a quando nossa presença for
solicitada. Nessa situação, a leitura costuma ser feita em voz baixa,
com o foco de nossa atenção em alguns assuntos, descartando outros.
Essas situações demonstram que o nosso ato de ler, enquanto
prática social, se realiza nos diferentes espaços em que circulamos e
adquirem características bem específicas: os tipos de conteúdos
que veiculam os textos; as finalidades da leitura; os procedimentos
comuns que adotamos conforme a finalidade com que lemos e os
gêneros dos textos.

O ato de ler como processo de construção de significados


Ler é o processo de construir um significado a partir do texto.
Os conhecimentos de mundo do leitor, seus conhecimentos
enciclopédicos e linguísticos estabelecem interação com os
elementos textuais no momento da leitura e propiciam a construção
de certos significados. Assim, quanto maior for a concordância entre
esses aspectos, maior será a probabilidade de êxito na leitura, ou
seja, uma melhor compreensão.
A interação estabelecida entre o texto escrito e o leitor é di-
ferente daquela que se estabelece entre duas pessoas enquanto
conversam. Na conversação, além das palavras, muitos outros
aspectos interferem, como a expressão facial, a gesticulação, a
entonação da voz, as perguntas, as repetições que vão dando
significa-do à fala.
No ato da leitura, o leitor encontra-se em contato com palavras
escritas por um autor que não está presente para completar certas
informações. É natural, nesse momento, que esse leitor forneça
informações ao texto enquanto lê, ou seja, ele complementa, com
seus conhecimentos, as lacunas deixadas implícitas pelo au- tor.
Assim, duas pessoas que estão lendo o mesmo texto podem
entender mensagens diferentes, ou seja, as capacidades
internalizadas e o conhecimento de mundo interferem na construção
dos sentidos do texto para cada leitor.
Por outro lado, o texto também atua sobre os esquemas
cognitivos do leitor. Quando alguém lê um texto, inicia aplicando um
determinado esquema, alterando-o ou confirmando-o,
acrescentando informações, discordando ou concordando, enfim,
respondendo a ele. Isso interfere nos esquemas cognitivos do leitor
modificando-o.
Na concepção de Bakhtin (1997, p. 290), "ler é tanto uma
experiência individual e única, quanto uma experiência interpessoal
e dialógica".
Essa afirmação nos remete diretamente à natureza do pro-
cesso de leitura. Toda leitura é individual porque estabelece uma
disposição pessoal e particular de processamento de sentidos do
texto. Ao mesmo tempo, toda leitura é interpessoal, porque os
sentidos não se encontram, exatamente, no texto ou no leitor; ao
contrário, os sentidos situam-se entre texto e leitor.
Quando um texto é produzido, são pretendidos pelo autor
alguns sentidos decorrentes da forma como ele compreende o
mundo naquele momento histórico específico dentro da cultura de
que ele faz parte. A compreensão dependerá, também, da medida
dos conhecimentos e informações compartilhados pelo autor e o
leitor, dentro dessa cultura.
Nesse sentido, o leitor dialoga com o texto e com o autor. De
acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Portuguesa – 1º e 2º ciclos (2001, p. 53):
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo
de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos,do
seu conhecimento sobre o assunto, de tudo o que sabe sobre a
língua: características do gênero, do portador, do sistema de escrita
etc.

Para Solé (2004, p. 24):

O leitor é um processador ativo do texto e a leitura é um processo


constante de emissão e verificação de hipóteses que levam à
construção da compreensão do texto e do controle desta
compreensão
– de comprovação de que a compreensão realmente ocorre.

Segundo Koch e Elias (2006, p. 11):

A leitura é [...] uma atividade interativa altamente complexa de


produção de sentidos, que se realiza evidentemente com base nos
ele- mentos linguísticos presentes na superfície textual e na sua
forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto
conjunto desaberes no interior do evento comunicativo.

Dessa forma, observamos que o leitor tem participação ativae


decisiva no ato de ler; não é o texto ou o autor que garantirá a
compreensão do leitor sobre os sentidos do texto, mas sua vivência
no mundo, suas experiências de leitura, seus conhecimentos
enciclopédicos sobre o assunto e seus conhecimentos sobre a língua
e o gênero de texto que está lendo é que farão toda a diferença, é
assim que se estabelecerá o "diálogo" do leitor com o texto.
De acordo com as mais recentes pesquisas, a leitura é vista
como:
[…] um ato de se colocar em relação um discurso (texto) com outros
discursos anteriores a ele, emaranhados nele e posteriores a ele,
como possibilidades infinitas de réplica, gerando novos discursos/
textos. O discurso/texto é visto como conjunto de sentidos e
apreciações de valor das pessoas e coisas do mundo, dependentes
dolugar social do autor e do leitor e da situação de interação entre
eles – finalidades da leitura e da produção do texto, esfera social de
comunicação em que o ato da leitura se dá (ROJO, 2004, p. 34-5).

Percebemos que a atividade linguística é um trabalho pelo qual


o homem dá forma aos seus pensamentos e às suas experiências e
interage com seus semelhantes buscando cooperação para a
construção dos sentidos do que se diz e se escreve. E assim ele vai
apreciando, replicando com o outro, dependentes do lugar que
ocupam socialmente e das características próprias de cada situação
de comunicação.
Podemos entender o que os autores chamam de réplica como
a resposta aos textos lidos e compreendidos. Está implícito que toda
compreensão implica uma responsividade, de forma que muitos
textos literários surgem como réplicas a outros textos. Temos
exemplos de releituras, reescrituras, intertextualidades, transleituras
etc.

5. ATO DE LER COMO PROCESSO DE APRENDIZAGEM


Veremos, agora, como a leitura se constitui em um desafio e
quais seriam os desafios da escola no processo de sua aprendizagem
pelas crianças.

Desafios da leitura

Para que nosso aluno perceba que a leitura é uma atividade


valorizada por nós, professores, temos que proporcionar situações
como:

1) a "leitura" de ilustrações de um livro;


2) uma roda de conversa em que seja dada a oportunidadede
contar sobre vivências, ouvir os colegas, descrever algo;
3) ouvir uma cantiga e sua letra;
4) o acesso constante aos livros da sala ou da biblioteca;
5) a leitura do professor para a classe etc.

No decorrer de nossos estudos, você verá que, desde


pequenas, as crianças podem "ler" textos, mesmo sem saberem ler
ainda, ou seja, mesmo sem saberem decodificar as palavras
literalmente. Para tanto, devemos criar certas condições que
possibilitem isso, como informar a elas, anteriormente, sobre o que
vai tratar o texto, permitir que usem todos os seus conhecimentos
sobre o valor sonoro das letras e incentivar as estratégias de leitura.
Na vida em sociedade, em todo momento, essas crianças serão
desafiadas a ler informações em outdoors espalhados pelas cidades,
em cartazes afixados nos muros das ruas, nos sinais de trânsito, nas
mais diferentes placas informativas, em impressos de propagandas,
em folders, na televisão, na internet e em outrastantas situações.
Esse processo de apropriação de como se escreve em cada
situação social, em sociedades letradas como a nossa, está
estreitamente ligado ao conhecimento da linguagem escrita. É a
leituraque nos fornece a matéria-prima para a escrita, ou seja, para
o que escrever, e contribui para a constituição dos modelos de como
escrever.
Para Brakling, (2004, p. 1 grifos nossos):

Esse conhecimento, tal como hoje compreendemos, refere-se a um


grau ou tipo de letramento que inclui tanto saber decifrar o escrito,
quanto ler/escrever com proficiência de leitor/escritor competente,
quer dizer, saber utilizar nas práticas sociais de leitura e de escrita
as estratégias e procedimentos que conferem maior fluência e
eficácia ao processo de produção e atribuição de sentidos aos
textos com os quais se interage.
Dessa forma, o desafio que se coloca para a escola é a formação
de leitores e escritores competentes que façam uso da linguagem oral
e escrita como forma de participação social e exercício efetivo da
cidadania.
É isso que veremos agora: como enfrentar o desafio proposto à
escola.

Desafio da escola

Você deve estar se perguntando: o desafio da escola é formar


um leitor competente, mas o que é ser um "leitor competente"?
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Portuguesa – 1° e 2º ciclos (2001, p. 54):

[…] um leitor competente é alguém que, por iniciativa própria, é


capaz de selecionar, dentre os textos que circulam socialmente,
aqueles que podem atender a uma necessidade sua. Que consegue
utilizar estratégias de leitura adequadas para abordá-los de formaa
atender a essa necessidade.

E para a escola, o que seria formar um leitor competente? Veja


como os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa
(2001, p. 54) posicionam-se a esse respeito:

Formar um leitor competente supõe formar alguém que


compreende o que lê; que possa aprender a ler também o que não
está escrito, identificando elementos implícitos; que estabeleça
relaçõesentre o texto que lê e outros textos já lidos; que saiba que
vários sentidos podem ser atribuídos a um texto; que consiga
justificar evalidar a sua leitura a partir da localização de elementos
discursivos.

Dessa forma, aprender a ler implica interagir com os textos


escritos que circulam na sociedade, testemunhar a utilização que os
leitores fazem deles e participar de atos de leitura de fato. É preciso
oferecer às crianças os textos do mundo, inseri-los num contexto no
qual ler é um ato de prazer, de necessidade ou de pesquisa.
A primeira e talvez a mais importante estratégia didática da
escola para fomentar a leitura é o trabalho com a diversidade de
textos. Muitas crianças, quando não participam de ambientes emque
ler é indispensável, em que não contam com bons materiais de
leitura e com bons leitores à sua volta, têm o direito de encontrar na
escola livros de boa qualidade, leitores proficientes na pessoa de seus
professores e situações de leitura eficazes.
Leia um trecho do que diz Jean Paul Sartre (2005), escritor
francês, em seu romance As palavras, no qual faz uma análise do
significado de sua infância, e relata fatos sobre o início do seu pro-
cesso de letramento:

Eu não sabia ainda ler, mas já era bastante esnobe para exigir os
meus livros...Peguei os dois volumezinhos, cheirei-os, apalpei-os,
abri-os negligentemente na "página certa", fazendo-os estalar. De-
balde: eu não tinha a sensação de possuí-los. Tentei sem maior êxito
tratá-los como bonecas, acalentá-los, beijá-los, surrá-los. Quaseem
lágrimas, acabei por depô-los sobre os joelhos de minha mãe.Ela
levantou os olhos de seu trabalho: "O que queres que eu te leia,
querido? ‘As fadas’?". Perguntei, incrédulo: "As fadas estão aí
dentro?" (SARTRE, 2005, p. 33)

Com certeza, Sartre estava seduzido pela leitura.


Provavelmente, participava de momentos de leitura em família,
como era costume entre as famílias letradas, antes do advento das
tecnologias de comunicação a distância, como a televisão e a
internet.
Dessa forma, o fato de presenciar a mãe lendo envolvia-o no
processo de leitura, despertando-lhe o gosto pela descoberta das
palavras e dos segredos que elas podem encerrar. Qual criança não
gosta de descobrir segredos?
As perguntas que Sartre fazia, incrédulo, eram estratégias de
leitura. Fazia antecipações ao acariciar os livros imaginando as
histórias que trariam dentro; levantava hipóteses quando aventoua
possibilidade de as fadas estarem, de alguma forma, dentro dos
livros. Provavelmente, logo inferiu que sua mãe falava de fadas
imaginárias e verificou que ela se referia a uma das histórias,
chamada As fadas.

No Tópico 7, veremos quais as estratégias que os leitores usam


para desenvolver sua competência leitora.
6. CONSTRUINDO COMPETÊNCIA LEITORA POR MEIO DE
ESTRATÉGIAS
Ao analisarmos quais são as estratégias que os leitores
proficientes usam para ler e compreender textos, visualizaremos
possibilidades de colaborar para o desenvolvimento da competência
leitora de nossos alunos.

As estratégias de compreensão leitora


Pelas considerações já apresentadas durante nossa conversa,
você deve concordar conosco que a leitura, como prática social, é
sempre um meio, nunca um fim. Lemos sempre com um objetivo,
respondendo a uma necessidade pessoal.
Todavia, a compreensão de um texto é um processo de
construção de significados. Depende do texto, mas também de
outrasquestões, próprias do leitor, além dos objetivos que ele tem
em mente, como os conhecimentos prévios sobre o assunto e a
motivação para aquela leitura.
Naturalmente, uma atividade de leitura será motivadorapara
alguém se essa tarefa corresponder a um objetivo seu e se o
conteúdo estiver ligado aos temas de seu interesse. Há textos que
lemos para nos informar, como jornais e revistas; outros que lemos
por deleite, como os romances e os poemas; outros para consulta,
como a lista telefônica; e outros, ainda, para realizar trabalhos
acadêmicos, como livros e revistas científicas; e muitos quelemos, a
todo o momento nas propagandas em outdoors, cartazes,etc. Esses
objetivos do leitor direcionarão o seu modo de ler: com maior ou
menor atenção; com mais rapidez ou mais de vagar; com maior ou
menor engajamento.
É evidente que, nesse processo, é preciso considerar a
materialidade linguística do texto, a partir da qual se iniciará a
interaçãodo leitor com o texto e com o autor. Os conhecimentos do
leitor contribuirão, nesse momento, para maior ou menor
intensidade e qualidade dessa interação. Por isso, é importante
salientar que o leitor construirá possíveis sentidos para o texto e não
o sentido do texto, já que contribuirão para isso outros saberes,
vivências, valores e conhecimentos.
O ato de ler ativa uma série de ações na nossa mente, por meio
das quais extraímos algumas informações, acrescentamos outras,
levantamos hipóteses e confirmamos ou não essas hipóteses até
chegarmos à compreensão possível do texto objeto de leitura. Essas
ações são denominadas estratégias de leitura.
Para Kleiman (1989, p. 50):

As estratégias de leitura regem os comportamentos automáticos,


inconscientes do leitor, e o seu conjunto serve essencialmente para
construir a coerência local do texto, isto é, aquelas relações coesivas
que se estabelecem entre elementos sucessivos, sequenciais no
texto.

Naspolini (1996, p. 27) considera que o ato de ler ativa uma


série de ações na mente do leitor e é por meio delas que ele extrai
informações. Essas ações são denominadas de estratégias de leitura
e, na sua maioria, passam despercebidas da consciência. Segundo a
autora, ocorrem simultaneamente, podendo ser mantidas,
modificadas ou desenvolvidas durante a apropriação do conteúdo.
São elas:

Seleção
Ao lermos um texto qualquer, nossa mente seleciona o que lhe interessa. Nem tudo
o que está escrito é igualmente útil. Escolhemos alguns aspectos relevantes e
ignoramos outros, os irrelevantes, para o entendimento do texto.
Assim, quando estamos lendo um livro e "pulamos" certos trechos que nos
desinteressam, estamos fazendo uma seleção. Prestamos atenção apenas aos
aspectos que nos interessam, ou seja, àquelessem os quais não seríamos capazes de
compreender o texto.
Predições
São hipóteses que o leitor faz, antecipando informações, com base
nas "pistas" que vai percebendo durante a leitura.
Um exemplo disso é quando na leitura de um romance policial, antecipamos quem
será o herói e quem será o vilão, fazemos uma predição. Durante a leitura, vamos
perceber se esta predição estava certa ou errada.
Inferências
Os complementos que o leitor fornece ao texto, a partir de seus conhecimentos
prévios. É tão frequente o uso dessa estratégia queé comum não nos lembrarmos se
um determinado aspecto estavaexplícito ou implícito no texto.
Autocontrole
É a atitude permanente do leitor, que consiste em fazer a ponte entre o que ele
supõe (seleção, predição, inferência) e as respostas que vai obtendo por meio do
texto. Trata-se de avaliar as prediçõese inferências, confirmando-as ou refutando-as,
com a finalidade de garantir a compreensão.
Autocorreção
Quando as expectativas levantadas pelas estratégias de predição não são
confirmadas, há um momento de dúvida. Então, o leitor repensa a hipótese
anteriormente levantada, constrói outras e retoma as partes anteriores do texto para
fazer as devidas correções.Exemplificando, é o caso do leitor que "volta" para corrigir
a palavraque leu errado.

Ainda segundo Naspolini (1996, p. 28):

Há uma relação recíproca entre usar estratégias de leitura e


interpretar o texto. Emprega-se uma estratégia porque se está
entendendo o texto; entende-se o texto porque se está aplicando
estratégias.

Pelo que vimos, trata-se de uma situação na qual é necessário


que o aluno ponha em jogo tudo o que sabe para descobrir o que não
sabe.

7. A CONSTRUÇÃO DA COMPETÊNCIA LEITORA POR MEIO


DAS ESTRATÉGIAS

Em sua opinião, é possível ensinar as estratégias de leitura?


Compare sua resposta com os conteúdos a seguir.
Para Solé (2004), além da habilidade de decodificação das
palavras, a compreensão de um texto depende da clareza e da
coerência do conteúdo do texto, da familiaridade do leitor com a sua
estrutura e com as palavras, do grau de conhecimentos prévios do
leitor sobre o assunto que lhe permita contextualizar o texto, e das
estratégias que usa para intensificar a compreensão e a lembrançado
que lê bem como para detectar e compensar as possíveis falhas de
compreensão.
Mas o que seriam essas estratégias?
As estratégias de compreensão leitora, de acordo com Solé
(2004, p. 69-70),
[…] são procedimentos que envolvem a presença de objetivos a
serem realizados para a leitura, o planejamento das ações que se
desencadeiam para atingi-los, bem como sua avaliação e possível
mudança.

Você, futuro professor, deve estar se perguntando: como


ensiná-las?
Não se trata de ensinar os nomes das estratégias de leitura aos
alunos, uma vez que elas são um meio para interpretar um texto, e não
um fim em si mesmas; mas, sim, de ensinar-lhes o procedimento
leitor, que usa de estratégias para chegar à compreensão.
Não podemos deixar de considerar a ideia de um leitor ativo,que
constrói seus próprios significados e que é capaz de utilizá-los de
forma competente e autônoma. Solé (2004, p.89-128) propõe
ensinar estratégias que podem ser trabalhadas "antes da leitura",
"durante a leitura" e "depois da leitura".
No transcorrer de sua explanação, a mesma autora propõe que
as situações em que se trabalha a leitura sejam diferentes das
situações em que simplesmente se lê. Na escola, ambas deveriam
estar presentes.
Para sintetizar didaticamente a proposta de Solé (2004) sobre
o ensino do processo de leitura, você verá, ilustradas pela Figura 1, as
Orientações Didáticas que a professora Maria José Nóbrega, membro
da equipe de elaboração do PCN Língua Portuguesa, apresentou em
palestra proferida no Programa Nacional do Livro Didático, da
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo.
Estas Orientações Didáticas de Nóbrega (2005) para o ensino
de leitura fazem parte do Projeto Tecendo leituras, versão de 2005.
Acompanhe suas recomendações ao professor:
Orientações didáticas para o ensino de leitura ––––––––––––
Autoria: Profª. Maria José Nóbrega Projeto: Tecendo leituras
Ano: 2005
Instituição: Secretaria Estadual de Educação de São Paulo

O ENSINO DA LEITURA

Leitor

ANTES DURANTE

Texto
Contexto

DEPOIS

Figura 1 O processo da leitura.

O Ensino da leitura
Antes da leitura
Ao ler literatura, mobilizamos nossas experiências para desfrutarmos o texto e
apreciarmos os recursos estilísticos selecionados pelo autor.
Observando um livro, em uma rápida leitura "inspecional", podemos antecipar
algumas das informações que iremos encontrar nele.

Antes da leitura: passo a passo


• Observar indicadores como título, capa, ilustração, sumário, autor, gê-nero etc.
• Apresentar informações que o autor do texto pressupõe que os leitores virtuais
tenham, mas que supomos que nossos alunos ignorem.
• Estimular os alunos a explicitarem os conteúdos que esperam encontrar no
texto com base nos índices levantados

Durante a leitura
• Os objetivos que o leitor tem com a leitura mobilizam diferentes estratégias de
abordagem do texto.
• Algumas "dicas" de um leitor mais experiente podem ser valiosas paraajudar um
leitor iniciante a construir os sentidos do texto.
Durante a leitura: passo a passo
• Estimular a compreensão global do texto em contextos de leitura autônoma ou
compartilhada, com base na observação de indicadores como o léxico, a
situação enunciativa, as conexões entre os enuncia- dos, as relações
intertextuais etc.
• Identificar a organização composicional do gênero a que pertence o texto.

Depois da leitura
• Pode-se ou não se emocionar com um texto; gostar dele; concordar ou não com
o quadro de valores sustentados ou sugeridos pelo texto ou por suas leituras.

Depois da leitura: passo a passo


• Estimular paráfrases do texto lido.
• Apreciar os recursos expressivos selecionados pelo autor.
• Identificar os valores e as crenças veiculados no texto e refletir a respeito
deles.
• Identificar a posição do autor e refletir a respeito dela.
• Promover o debate democrático em torno de questões polêmicas.
• Estabelecer relações com outros textos, filmes etc.
• Ampliar as referências dos leitores, estimulando a pesquisa de in- formações
complementares, a produção de outros textos ou, ainda, outras produções
criativas que contemplem as múltiplas linguagens artísticas (NÓBREGA, 2005).
–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Por essas orientações didáticas, fica claro que é preciso
oferecer aos alunos inúmeras oportunidades de aprenderem a ler
usando os procedimentos que os leitores proficientes já utilizam,
como:
1) antecipar fatos (antecipação);
2) formular perguntas enquanto leem e se manterem atentos
(autocontrole);
3) selecionar índices relevantes para a compreensão (seleção);
4) suprir os elementos ausentes, complementando informações
(inferência);
5) criticar o conteúdo;
6) reformular hipóteses;
7) estabelecer relações com outros aspectos do conheci-mento;
8) transformar ou reconstruir o texto lido;
9) atribuir intenções ao escritor e replicar com ele.

Ainda é possível registrar que há textos que podem ser li- dos
apenas por partes, buscando a informação necessária; outros
precisam ser lidos exaustivamente e várias vezes. Há textos que se
pode ler rapidamente e outros que devem ser lidos devagar. Há
leituras em que é necessário controlar atentamente a compreensão,
voltando para certificar-se do entendimento; e há outras em que se
segue adiante sem dificuldade, entregue apenas ao prazerde ler. Há,
ainda, leituras que requerem um enorme esforço intelectual e, a
despeito disso, deseja-se ler sem parar; já em outras, o esforço é
mínimo e, mesmo assim, o desejo é deixá-las para depois (SOLÉ, 2004).
Para que nossos alunos sejam leitores competentes e amantes
da leitura, são necessárias propostas didáticas orientadas
especificamente no sentido de formar leitores: leitura diária; leitura
colaborativa (o professor lê um texto e, durante a leitura, questiona
os alunos sobre as pistas linguísticas que possibilitam a atribuição de
determinados sentidos); projetos de leitura; atividades sequenciadas
de leitura (planejadas em uma sequência encadeada: o que vem a
seguir depende do que já foi realizado anterior- mente); atividades
permanentes de leitura (acontecem ao longo de um determinado
período de tempo, com certa regularidade e voltadas para a
formação de atitudes ou hábitos); leitura feita pelo professor.
Após a leitura, a conversa sobre o que se leu, o
compartilhamento das impressões sobre a leitura com os colegas e o
professor, a apreciação dos recursos expressivos mobilizados pelo
autor, o debate sobre os temas mais polêmicos permitem uma
melhor compreensão da obra por todos.
Diferentemente dos projetos, que convergem para um pro-
duto, as sequências didáticas, por exemplo, permitem que os alunos
leiam textos relacionados a um mesmo tema, ou textos de ummesmo
autor, ou textos que pertençam a um mesmo gênero (PRO- POSTA
CURRICULAR PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: 1ºgrau. 4.
ed. São Paulo: SE/CENP, 1991).
A seguir, apresentamos uma sequência didática de atividades
para a leitura de dois contos que estabelecem intertextualidade.
Trata-se do conto A verdadeira história dos Três Porquinhos! do
autor Jon Scieszka, traduzido por Pedro Maia, da editora Companhia
das Letrinhas, que estabelece uma "conversa" com a tradicional
história de "Os três porquinhos", um clássico da literatura universal.
Na Figura 2, apresentamos a você a capa do referido livro.
Observe bem os detalhes da imagem e tudo o que pode ser lido:
Figura 2 Capa do livro A verdadeira história dos três porquinhos.

Assim como na resenha do livro no site da editora, após essa


primeira exploração da capa, você deve estar se perguntando:

Será que a história dos três porquinhos ocorreu daquele jeito


mesmo? Dando a palavra ao lobo, que naturalmente narra os
aconteci- mentos do seu ponto de vista, Jon Scieszka consegue
reforçar a "veracidade" da história original, contar uma história nova
e engraçada e dar às crianças a chance de demonstrar que
compreendem muito bem as coisas (COMPANHIA DAS LETRAS,
2011).

Seria interessante que você providenciasse o livro do conto A


verdadeira história dos Três Porquinhos! e fizesse uma primeira
leitura para compreender bem a sequência didática proposta a seguir.

A verdadeira história dos três porquinhos! –––––––––––––––


Sequência didática

Nesta sequência didática, as crianças lerão o conto A verdadeira história dos três
porquinhos! que tem a mesma temática de outro (Os três porquinhos), mas que
apresenta um ponto de vista muito diferente, o ponto de vista do lobo. A
intertextualidade permite a discussão sobre os valores sob cada ponto de vista.

Antes da leitura
Quanto ao portador de texto

1. Analise a capa do livro: título e ilustração, atentando-se para as cores quentes –


"masculinas". Pergunte aos alunos se a ilustração da capa remete-os a um conto
já conhecido e se o título põe em questionamento a veracidade da primeira
história (Os três porquinhos). Por exemplo, se essa história é "a verdadeira"
história dos três porquinhos, então, será que a outra que conhecemos é falsa?
2. Pergunte às crianças: por que, na ilustração da capa, o Lobo apareceria vestido,
de gravata e com óculos? Por que ele aparece em uma foto ao lado de uma
notícia de jornal? Quem teria escrito a matéria noticiado jornal? Seria o próprio
Lobo?
3. Peça para atentarem para uma "mão", do lado direito inferior da capa, queparece
a pata de um animal. Qual seria esse animal? Ele estaria lendo o jornal?
4. Por que será que lá no alto da capa está escrito "O diário do lobo"?
5. Lá embaixo há uma nota dizendo: "Tal como foi contada a Jon Scieszka".O autor
teria ouvido a história do próprio Lobo?
6. Leia para os alunos a resenha do livro como forma de introduzi-los na temática.

Quanto ao autor
Jon Scieszka tem também outros livros com nomes estranhos, como:
Monstromática, O patinho realmente feio e outras histórias malucas, O sapo que
virou príncipe, Sapos não andam de skate entre outros.
Verifique se há no acervo da biblioteca da escola esses outros livros do autor.

Quanto ao gênero
Faça um levantamento do conhecimento prévio dos alunos a respeito do gê- nero
"conto" − narrativa curta, com poucos episódios. Discuta a especificidade do "conto
maravilhoso", enfatizando seu papel nas diferentes culturas de várias épocas e
lugares.
Saiba que, no conto maravilhoso, as temáticas evidenciam os questionamentos
econômicos e sociais, isto é, os problemas da sobrevivência em nível
socioeconômico ou ligados à vida prática, concreta, cotidiana. Essas narrativas
sema presença de fadas – ainda que delas não se excluam elementos mágicos,
maravilhosos – enfatizam aspectos materiais, sensoriais, éticos do ser humano: suas
necessidades básicas (estômago, sexo e vontade de poder), suas paixões eróticas
(COELHO, 1991).

1. Pergunte aos alunos quais contos a família de cada um já contou a eles; de quais
ainda se lembram para recontar aos colegas.
2. Os avós sabem de muitas coisas; eles guardam a infância na memória. Comente
que quando um avô morre, esse mundo antigo morre com ele, por isso é bom
pedir para que contem histórias.

Quanto ao plano do conteúdo


Discuta a escolha temática do autor: animais em papéis contraditórios.Objetivo de
leitura
Coloque um objetivo de leitura para a turma, por exemplo: leia a história
procurando saber se o lobo fala a verdade.

Durante a leitura
A partir da leitura da primeira página:
Em todo o mundo, as pessoas conhecem a história dos Três Porquinhos. Ou, Pelo
menos, acham que conhecem. Mas eu vou contar um segredo. Ninguém conhece a
história verdadeira, porque ninguém jamais escutou o meu lado da história
(SCIESZKA, 2005, p. 3):
1. Pergunte de que ponto de vista será contada a história.
2. Por que será que ele põe em dúvida a veracidade da outra história, a de Os três
porquinhos? O lobo começa se apresentando com nome degente e sobrenome
de Lobo e diz não saber como começar... Diz nãoser sua culpa, compara sua
alimentação com os cheeseburgers que os humanos comem e usa um
argumento para dizer que tem razão. Qual é?
3. Por que será que ele escreve Mau com maiúsculas no trecho "todos iam achar
que você é Mau". Quem seria esse "você"?
4. Do ponto de vista do lobo, qual é a verdadeira história?
5. O que ele quis dizer com "No tempo do Era uma vez..."?
6. O Lobo se refere a sua avó dizendo "querida e amada vovozinha...".Você já
viu vovozinha do lobo em alguma história?
7. Será que lobo gosta de bolo?
8. Repare na ilustração. O que há na tigela em que o Lobo faz o bolo?
9. Será que o Lobo é educado assim: bate na porta da casinha de palha e chama o
porquinho: "Porquinho, Porquinho, você está aí?". Por que será que a porta
"caiu"?
10. Como é que percebemos que o Lobo mente? (Já estava "a ponto de voltar para
casa" sem o açúcar; bolo de aniversário da vovozinha; o nariz começou a coçar).
11. Por que ele sempre faz comparações do porquinho, que chama de"presunto"
com o cheeseburger que as pessoas comem?
12. Você acha que o Lobo é irônico?
13. Que expressões o Lobo usa para ironizar? ("mortinho da silva", "você não vai
acreditar", "seria desperdício deixar um presunto em excelente estado" etc.).
14. O Lobo sempre faz um juízo de valor quando vê a construção das casinhas dos
porquinhos. O que ele diz do primeiro, do segundo e do terceiro?
15. Por que o Lobo diz "E venham me acusar de grosseria!"?
16. Quando o Terceiro Porquinho disse que a vovozinha do Lobo podia "iràs favas"
ele se irritou, mas disse que era "um cara geralmente calmo. Mas quando
alguém fala desse jeito da minha vovozinha, eu perco acabeça". Você já ouviu
alguém falando assim?
17. Na penúltima ilustração, vemos o Lobo soprando a casa do porquinhoe outros
animais chegando. Quem eram eles? O que faziam?
18. A última ilustração é uma página de jornal. Qual é o nome do Jornal? Qual a
manchete? De que ponto de vista fala?
19. Na última página, onde o Lobo está? Como sabemos? Como o Lobo
justifica seu nome de Lobo Mau?

Depois da leitura
1. Você conhece pessoas parecidas com esse Lobo Mau? Por quê?
2. Você acha que sempre há pontos de vista diferentes sobre algum fato?
3. De qual história você gostou mais? Conhece outras histórias com oponto de
vista diferente da história que todos conhecem?
Na última página, o Lobo coloca sua avaliação sobre a imprensa. O que pensa
dela? Você concorda ou discorda? Por quê?

Produções a partir do texto


Quanto à linguagem oral
Proponha aos estudantes que escolham contos para contá-los aos demais.
Lembre-se de que, para que as outras crianças escutem de forma atenta e
interessada, é preciso que o contador cuide do tom da voz, do ritmo, dos gestos e
das expressões fisionômicas.
Quanto à linguagem escrita
Peça aos alunos que selecionem um conto maravilhoso conhecido e reescrevam-
no, podendo mudar o foco narrativo e colocar o personagem antagonista contando
a história.

Esperamos que você tenha percebido o encadeamento das


estratégias de leitura, ora de predições, ora de levantamento de
hipóteses, ora confirmando ou não essas hipóteses e elaborando
outras, ora fazendo inferências. Tudo para ensinar um procedi-
mento leitor.
E quando esse "leitor" é desafiado a também ser um "escritor"?
O que acontece? Como nos sentimos diante de uma página em
branco? E nossos alunos, como se sentem?
O que sabemos é que é preciso enfrentar o desafio. Para isso,
passaremos a olhar por um outro lado o texto escrito, o lado da
produção.

9. TEXTO COMO UNIDADE DE ENSINO

Os textos constituem-se em unidades básicas de ensino e


organizam-se sempre dentro de certas restrições de natureza
temática, composicional e estilística, o que os caracteriza como
pertencentes a um determinado gênero textual (BRASIL, 2001).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) chamam a atenção
para que o texto e a noção de gênero textual, constitutiva do texto,
sejam tomados como objeto de ensino em nossas escolas porque
cada gênero se organiza de uma forma diferente e todos têm uma
função social.
Segundo Bronckart (1999, p. 75), "texto designa toda unidade
de produção verbal que veicula uma mensagem linguisticamente
organizada e que tende a produzir um efeito de coerência em seu
destinatário".
Koch (2006), ao adotar a concepção sociointeracional de
linguagem, declara que suas convicções a levam a subscrever a
definição de texto proposta por Beaugrande (1997 apud KOCH 2006,
p. 20) como: "evento comunicativo no qual convergem ações
linguísticas, cognitivas e sociais". Acrescenta que "trata-se de um
evento dialógico", referindo-se a Bakhtin, "de interação entre
sujeitos sociais – contemporâneos ou não, copresentes ou não, do
mesmo grupo social ou não, mas em diálogo constante" (KOCH,
2006, p. 20).
Nas duas perspectivas, que em nenhum aspecto se
contradizem, na compreensão dos textos que caracterizam os usos
públicos da linguagem, entram em jogo tanto o texto como o autor e
oleitor. Este tem uma participação ativa na construção dos sentidos.
Os textos, como manifestações verbais – orais ou escritas
organizam-se em gêneros que, por sua vez, podem ser
compreendidos como famílias de textos que possuem características
comuns.
Em outras palavras, qualquer coisa que dissermos a alguém
será organizada de uma forma tal que o outro nos compreenda, seja
em uma situação familiar, entre amigos, ou em uma situação mais
formal, como em uma palestra, por exemplo, ou em uma carta de
solicitação de emprego. Isso porque escolhemos uma forma comum
a todos os falantes da língua de organizar nossa fala ou nossa escrita,
já solidificada pelo uso.
Mas não será qualquer gênero que servirá para se dizer qual-
quer coisa, em qualquer situação comunicativa. Por exemplo, se
alguém quiser discutir sobre uma questão complexa como pena de
morte como uma possibilidade de combater a criminalidade, será
necessário que essa pessoa organize o seu discurso em um gênero
como o artigo de opinião. Esse é um gênero que pressupõe a
argumentação em favor de questões polêmicas, mediante a
apresentação de argumentos que possam sustentar a posição quese
defende e refutar aquelas que forem contrárias a ela.
Por outro lado, se uma pessoa quiser orientar outra para fazer
determinada tarefa, a distância, terá de relacionar instruções ou
escrever um manual. Se o desafio é colocar outras pessoas a par de
um acontecimento, o melhor caminho é escrever uma notícia. Ainda,
se quiser apresentar um ensinamento usando personagens animais,
que representem certas ações humanas, o gênero adequado será a
fábula.
Assim, podemos dizer que há formas de enunciados produzidas
historicamente pelos usuários de uma língua, que vão ficando
disponíveis na cultura, ao que chamamos de gêneros textuais. Por
exemplo, um curriculum vitae é uma forma de enunciado que se
solidificou pelo uso dos tempos e poucas variações apresenta desde
então. Uma receita médica também tem uma certa regularidade em
seus dizeres que são características facilmente reconhecíveis. Uma
notícia é reconhecida como notícia pelos elementos quea constituem.
Um poema, uma parlenda, uma receita culinária é facilmente
reconhecível pelos temas, pela forma composicional, pelo estilo.
Podemos reconhecer que os gêneros podem ser identifica- dos
por três características fundamentais: o tipo de tema que podem
veicular; a sua forma composicional; as marcas linguísticas que
definem seu estilo (BRASIL, 2001).
Do exposto, já podemos perceber que saber selecionar o gê-
nero para organizar o próprio discurso implica conhecer
características para avaliar sua adequação: às finalidades colocadas
para a situação comunicativa; ao lugar de circulação; a um contexto
deprodução determinado.
O conhecimento que se tem sobre um gênero, portanto, parece
determinar as possibilidades de eficácia do discurso do falante. Sendo
assim, nós, professores, podemos concluir que as competências
leitora e escritora do aluno em língua portuguesa vão depender do
conhecimento que ele tiver sobre os gêneros e sua adequação às
diferentes situações comunicativas.
As características dos gêneros, portanto, devem ser estudadas
na escola, precisam ser discutidas em atividades de ensino eo que
materializa essas características do gênero são os textos. Deacordo
com o que os PCNs dizem, os textos são as unidades de ensino.
A sociedade em que vivemos, na atualidade, necessita de
cidadãos ativos que não se limitem a observar a realidade, mas que
saibam examinar os fatos, articular acontecimentos, prever suas
possíveis consequências para a qualidade de vida das pessoas, da
cidade, do país, e que nela saibam agir (BRASIL, 2001). Isso significa
saber analisar criticamente a realidade social e pensar ações para
nela intervir. De certa forma, isso é saber lidar com a informação, no
mundo da informação.

10. SUPORTES DE TEXTOS E GÊNEROS TEXTUAIS

A criança, ao chegar à escola, já tem um desempenho


eficiente em situações de linguagem oral, pois ela tem a seu dispor
a linguagem que foi adquirindo desde que nasceu por estar em
contato com seus familiares. Aos poucos, ela aprendeu que sua fala
tem de ser planejada para que o seu interlocutor a compreenda. Tal
vivência permite que ela proceda naturalmente usando a língua que
se fala para estabelecer a comunicação.
Mas, como sabemos, a comunicação escrita é diferente da
comunicação oral. Uma das principais diferenças é a necessidade,na
escrita, de maior explicitação daquilo que se quer dizer, mesmo
porque o produtor do texto, supõe-se, está longe de seu receptore
muitas particularidades da comunicação oral como olhares, gestos,
devem ser substituídas por marcas que produzem sentidos notexto
escrito.
Para que o produtor de textos escritos se sinta encorajadoa
produzi-los, é preciso que vivencie situações de leitura de bons textos
e observe as características que fazem deles bons textos. Por isso, é
importante trazer para a sala de aula uma diversidade de textos em
seus próprios suportes.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua
Portuguesa (BRASIL, 2001, p. 91) recomendam textos autênticos
como um dos recursos didáticos para o trabalho pedagógico na área:
Entre os principais recursos que precisam estar disponíveis na escola
para viabilizar a proposta didática da área, estão os textos autênticos.
A utilização de textos autênticos pressupõe cuidados como a
manutenção de suas características gráficas: formatação,
paginação, diferentes elementos utilizados para atribuição de
sentido – como fotografias, desenhos gráficos, ilustrações etc. Da
mesmaforma, é importante que esses textos, sempre que possível,
sejamtrazidos para a sala de aula nos seus portadores de origem
(aindaque em algumas situações possam ser agrupados segundo o
gênero ou tema, por exemplo, para atender a necessidades
específicasdos projetos de estudo).
O que seriam esses suportes ou portadores de textos?
Entendemos por suportes textuais, ou portadores textuais, os
espaços, sejam eles físicos ou materiais, em que estão escritos os
textos, como, por exemplo:
1) jornais;
2) livros;
3) revistas,
4) gibis,
5) enciclopédias
6) listas de compras;
7) outdoors;
8) convites;
9) talões de cheques;
10) folders;
11) manuais de instrução;
12) bulas de remédio;
13) monitores de computadores;
14) cds e tantos outros.
Portanto, é interessante observar que, na antiguidade, as
paredes interiores das cavernas já tinham a função de suportes
textuais para as inscrições dos homens primitivos, vindo, depois, as
tabuletas, os pergaminhos e, mais modernamente, o papel, o
outdoor e até o ambiente virtual da internet.
Nos dias de hoje, os suportes textuais contribuem para a
forma de apresentação dos vários gêneros. Por exemplo, uma
propaganda publicada em uma revista pode ter um efeito de sentido
diferente se estiver em um outdoor ou em um jornal; um conto pode
tomar conotações diferentes se estiver em um livro ilustrado para
crianças ou em um volume de uma coleção para adultos; uma
reportagem jornalística publicada em uma revista pode produzir um
efeito diferente se for publicada em um jornal de grande circulação;
um horóscopo em uma revista feminina pode ser mais detalhado do
que no jornal; uma receita culinária em um livrode receitas, em
uma revista ou na página online da internet pode exigir mais
detalhamento em um ou outro suporte; um cardápio de restaurante
no jornal pode produzir o efeito de propaganda, mas no próprio
restaurante pode ser mais informativo; um edital de concurso no
jornal ou afixado nas paredes da instituição tem objetivos um pouco
diferentes; uma conferência proferida em um evento usa uma
linguagem um pouco diferente do que se for publicada em uma
revista científica etc.
Essa observação nos permite dizer que, ao mesmo tempoem
que os suportes possibilitam que os gêneros circulem na socie-dade,
de alguma maneira, eles podem influenciar na natureza do gênero
que carregam. A esse respeito, Marcuschi (2003, p. 2-3)
[…] observa que não significa que o suporte determine o gênero e
sim que o gênero exige um suporte especial. Contudo, o autor
admite que essa posição é questionável, pois há casos complexos em
que o suporte determina a distinção que o gênero recebe.

Para ilustrar sua argumentação sobre a relação entre o suporte


de texto e o gênero textual, Marcuschi (2003, p. 2) coloca um
exemplo interessante e, logo em seguida, faz considerações a seu
respeito. Ele solicita que consideremos este breve texto:

"Paulo, te amo, me ligue o mais rápido que puder.


Te espero no fone 55 44 33 22. Verônica." (PORTAL DO PROFESSOR, 2011).

O que você acha: seria um bilhete? Um telegrama? Um recado


na secretária eletrônica?
Segundo Marcuschi (2003, p. 2):
Se isto estiver escrito num papel colocado sobre a mesa da pessoa
indicada (Paulo), argumenta o autor, pode ser um bilhete; se for
passado pela secretária eletrônica é um recado; remetido pelos
correios num formulário próprio, pode ser um telegrama; exposto
num outdoor pode ser uma declaração de amor. O certo é que o
conteúdo não muda, mas o gênero é sempre identificado na relação
com o suporte.

Marcuschi (2003) chama a atenção, ainda, para alguns suportes


que denomina "incidentais", como uma tatuagem afixada em uma
parte do corpo humano, uma inscrição produzida no céu -no ar - por
um avião da esquadrilha da fumaça, um para-choque de caminhão no
qual está escrita uma frase ou um provérbio, uma embalagem na qual
está o rótulo do produto e, às vezes, até receitas.
Além do portador de texto, outro aspecto que influencia no seu
sentido é o contexto de produção do texto, ou seja: de que lugar
social foi escrito, para que tipo de leitor foi escrito, qual sua
finalidade, em que gênero foi organizado, onde circulará.

11. CONSTRUINDO A COMPETÊNCIA ESCRITORA

Pelo que expusemos no Tópico 9, você há de convir que


produzir sentidos por meio de palavras organizadas em uma página
em branco realmente não acontece por acaso ou de qualquer
maneira. Produzir textos em algum gênero implica conhecer esses
gêneros e suas características.
Uma das razões que podem justificar as dificuldades de
produção ou de compreensão de textos que a maioria das pessoas
tem é a falta de domínio do gênero em que se pretende escrever ou
ler. O contexto de circulação desse texto em questão pode,também,
ser desconhecido para determinadas pessoas por não se ter tido
muito contato com ele. Os textos de gêneros que circulamna área do
Direito, por exemplo, podem ser estranhos às pessoasque lidam mais
com a área da Arte, da ou da Saúde. Textos de gêneros que circulam
na área médica poderão ser desconhecidos para a maioria das
pessoas. Gêneros que circulam na área administrativa, por exemplo,
como contratos de locação, podem ser in- compreensíveis para
muitas pessoas, pois usam termos técnicos, organizações próprias.

Esse fato não significa que deveríamos saber escrever todos


esses gêneros, mas que a familiaridade com a leitura e a reflexão
sobre eles permite nos apropriarmos da sua forma de organização,da
recorrência de suas temáticas, de seu estilo e possibilita-nos sua
compreensão. Conhecer um grande número de gêneros textuais,
entretanto, não significa ser capaz de escrevê-los.
Por exemplo, conhecer de perto a esfera jornalística não
significa que saibamos produzir uma reportagem ou um artigo de
opinião; podemos apreciar obras literárias e até conviver nesse meio
sem que nos tornemos escritores, poetas ou romancistas. Isso por-que
não circulamos por todas as esferas sociais. Muitas pessoas não
frequentam o meio acadêmico, ou o religioso, ou o musical.
Há uma grande maioria de gêneros textuais, no entanto, que
são fundamentais para a nossa formação como cidadãos e, por isso,
é preciso aprendê-los. E de quem seria essa tarefa? Essa é uma tarefa
que compete à escola: ensinar aos alunos as características dos
gêneros mais complexos, que não são aprendidos espontaneamente
nas situações do cotidiano. Quanto melhor conhecermos esses
gêneros, maior facilidade de compreensão e de produção de textos
teremos e maiores possibilidades de nos fazermos compreender,
tanto oralmente, como por escrito.
Mas essa não é uma tarefa fácil, convenhamos, pois para
muitos aprendizes, expressar suas ideias oralmente é um processo
natural, porém, o processo de registrar essas ideias em um texto
escrito representa um trabalho árduo e intenso.
Segundo Rojo e Cordeiro (in SCHENEUWLY; DOLZ , 2004, p. 10),

As práticas escolares brasileiras tendem a formar leitores apenas


com as capacidades mais básicas de leitura, ligadas à extração
simples de informação de textos relativamente simples.

Isso se deve a equivocadas maneiras de se tomar o texto como


objeto de estudo, que provocaram mudança no enfoque dado aos
textos e seus usos em sala de aula. De acordo com as autoras, passou
a existir uma necessidade de:

[…] enfocar, em sala de aula, o texto em seu funcionamento e em


seu contexto de produção/leitura, evidenciando as significações
geradas mais do que as propriedades formais que dão suporte a
funcionamentos cognitivos (ROJO; CORDEIRO, in SCHENEUWLY;
DOLZ , 2004, p. 10).

Sendo assim, é preciso que a escola organize situações de


aprendizagem que tragam para a discussão em sala de aula questões
relativas:
1) aos conhecimentos que o processo de produção de textos
exige;
2) à natureza dialógica da escrita e sua relação com outros
textos;
3) aos procedimentos que se usa para escrever.
É fundamental que a escola crie oportunidades em que os alunos
possam:
1) compreender para que serve a linguagem;
2) participar de situações públicas de práticas de linguagem como
pequenos discursos em situações formais ou festivas na escola,
comunicações aos pais, apresentações em público;
3) perceber que o texto construído produzido será mais
significativo se for mais adequado às características do gênero
do discurso que a situação exigir;
4) reconhecer as características dos gêneros do discurso que mais
aparecem em situações públicas de linguagem;
5) utilizar procedimentos adequados de escrita e o modo de
articulá-los que melhor expressem os possíveis sen- tidos do
texto;
6) recorrer aos conhecimentos linguísticos adquiridos em
sala de aula para produzir textos coerentes.
Da mesma forma que no momento da leitura é importante
observar todas as características do contexto de produção do textoa
ser lido, no momento da própria produção, é imprescindível que o
professor defina juntamente com o aluno para quem ele escreverá,
qual a finalidade de seu texto, de que lugar social ele fala, onde
circulará, em que portador de texto estará inserido e em qualgênero
será organizado.
Essas características impõem restrições aos textos,
determinando escolhas, as quais devem ser reconhecidas, sob pena
de o texto resultar incoerente.
Um dos aspectos mais importantes no ensino de Língua
Portuguesa é trazer para a sala de aula as práticas de escrita que
acontecem na sociedade, de maneira que os alunos possam
conhecer, analisar, discutir, experimentar, ler, escrever textos dos
gêneros que circulam em várias instâncias sociais e desenvolvam sua
competência escritora para operar também nessas situações.
Para ensinar os alunos a dominar, de forma gradual, passo a
passo, um gênero de texto que circula socialmente a melhor
metodologia é a de sequências didáticas.
Você saberia dizer o que são sequências didáticas?
De acordo com Dolz (in CENPEC, 2010, p. 14), "uma sequência
didática é um conjunto de oficinas e de atividades escolares sobre um
gênero textual, organizada de modo a facilitar a progressão na
aprendizagem da escrita".
Joaquim Dolz, linguista da Universidade de Genebra (Suíça),ao
fazer a apresentação da Coleção da Olimpíada de Língua Portuguesa
Escrevendo o futuro (CENPEC, 2010, p. 14-15) apresenta cin- co
conselhos aos professores que utilizam esse dispositivo como
estratégia para o ensino de produção de textos:

1) Fazer os alunos escreverem um primeiro texto e avaliar suas capacidades


iniciais. Observar o que eles já sabem e assinalaras lacunas e os erros me parece
fundamental para escolher as atividades e para orientar as intervenções do
professor. Uma discussão com os alunos com base na primeira versão do texto
é de grande eficácia: o aluno descobre as dimensões que vale apena melhorar, as
novas metas para superar, enquanto o professor compreende melhor as
necessidades dos alunos e a origemde alguns dos erros deles.
2) Escolher e adaptar as atividades de acordo com a situação escolar e com as
necessidades dos alunos, pois a sequência didática apresenta uma base de
materiais que podem ser completados etransformados em função dessa situação
e dessas necessidades.
3) Trabalhar com outros textos do mesmo gênero, produzidos poradultos ou por
outros alunos. Diversificar as referências e apre-sentar um conjunto variado de
textos pertencentes a um mesmo gênero, propondo sua leitura e comparação,
é sempre umabase importante para a realização de outras atividades.
4) Trabalhar sistematicamente as dimensões verbais e as formasde expressão em
língua portuguesa. Não se conformar apenas com o entusiasmo que a redação
de um texto para participar de uma competição provoca e sempre buscar
estratégias paradesenvolver a linguagem escrita.
5) Estimular progressivamente a autonomia e a escrita criativa dos alunos. Os
auxílios externos, os suportes para regular as primeiras etapas da escrita são
muito importantes, mas, pouco a pouco, os alunos devem aprender a reler, a
revisar e a melhorar os próprios textos, introduzindo, no que for possível, um
toquepessoal de criatividade.

O trabalho com os gêneros de imprensa são enriquecedores


porque o jornalismo é uma atividade que se movimenta no âmbitodo
interesse público e da construção da cidadania. Segundo Amaral,
Gagliardi e Rangel (2010), organizadores do Caderno Pontos devista
da referida publicação:

As matérias dos mais diferentes veículos ditos "de imprensa" –


jornais, revistas, sites, telejornais etc., têm o objetivo de nos contar
o que acontece à nossa volta. Analisar e comentar esses fatos faz
parte da função jornalística, que é oferecer ao público em geral um
retrato o mais fiel possível da realidade, colaborando para sua aná-
lise, discussão e transformação (PONTOS DE VISTA, 2011).

Por isso, trouxemos aqui exemplos de algumas sequências


didáticas para o trabalho com artigos de opinião, gênero da esfera
jornalística, organizadas por Amaral, Gagliardi e Rangel (CENPEC,
2010), no volume Pontos de vista, da Coleção Olimpíada de Língua
Portuguesa Escrevendo o futuro.
As atividades da sequência didática de leitura e de escrita
denominada de Pontos de vista são chamadas pelo referido pro-
grama de "oficinas", direcionadas ao professor; têm como objetivoa
análise e a produção de textos do gênero artigo de opinião.
As oficinas 1 e 2 do material Olimpíadas de Língua Portuguesa
Escrevendo o futuro têm como objetivo identificar questões
polêmicas, reconhecer bons argumentos e escolher ou formular uma
questão polêmica. Para isso os alunos lerão primeiramente uma
notícia que circulou na mídia e provocou questionamentos entre os
leitores, discutirão sobre o fato e formularão a questão polêmica que
está implícita no texto. Na oficina 2 os alunos lerão um artigo de
opinião publicado na mídia e, além reconhecera questão polêmica e
os argumentos do autor, observarão onde circulam esses artigos,
quem escreve, para quem ler, com que objetivo foram escritos.
A oficina 3 do material Escrevendo o futuro Olimpíadas de
Língua Portuguesa propõe ao professor que oriente os alunos a
escreverem seu primeiro artigo de opinião, sendo auxiliados a definir
questões polêmicas e a identificar o que é polêmico em sua
comunidade. Para isso, lerão, primeiramente, uma charge publicada
em jornal de grande circulação, depois uma notícia que trata do
assunto que deu mote à charge e, a seguir, lerão um artigo de
opinião que se refere ao assunto da notícia. Durante essas leituras,
serão questionados pelo professor sobre as diferenças de
posicionamento dos autores: no caso da notícia, o jornalista, e, no
caso do artigo, de um professor de direito. O professor orientará os
alunos a verificar que, na notícia, o jornalista procura não tomar
posição a respeito do que divulga, mas sim apresentar o fato em si,
assim como sua repercussão. Os alunos deverão perceber, também,
em que pontos o articulista deixa transparecer que leu a notícia
divulgada no dia anterior e em que pontos emite sua opinião.
Um dos aspectos importantes a observar, de acordo com o
documento Escrevendo o futuro Olimpíadas de Língua Portuguesa, é
que cada um dos textos – notícia ou artigo de opinião – tem uma
finalidade específica: na notícia, o jornalista veicula informações
sobre um fato; já no artigo é o articulista quem opina sobre as
questões polêmicas que a notícia pode despertar.
Na oficina 4 do documento, os alunos são incentivados a
identificar questões polêmicas em sua comunidade, pois o tema da
Olimpíada de Língua Portuguesa é "O lugar onde vivo". Eles
formularão uma questão polêmica e elaborarão argumentos que lhes
possibilite desenvolver seu próprio artigo de opinião.
Na oficina 5, os alunos se colocarão no lugar de um articulista e
o professor deverá ajudá-los a definir a questão polêmica sobre a
qual escreverão, quais os objetivos que os levaram a isso, emqual tipo
de publicação (jornal mural, blog, jornal do bairro etc.)o artigo será
publicado e qual será o público-alvo ou leitor visado.
Leia as orientações ao professor, na oficina 5, para a sequência
que propõe a escrita de um primeiro artigo de opinião aos alunos que
participarão das Olimpíadas de Língua Portuguesa, que tem sempre
como tema O lugar onde vivo.

Oficina 5 A polêmica no texto ––––––––––––––––––––––––––


1ª - etapa
Primeiro artigo
Uma vez realizado o debate sugerido na oficina anterior, proponha aos alunosa
escrita de um artigo de opinião com base em uma das questões polêmicas
escolhidas por eles.
Peça-lhes que se coloquem no lugar do articulista e ajude-os a definir a questão
polêmica a ser abordada; os objetivos que levam à escrita desse artigo; o tipo de
publicação (jornal mural, blog, jornal do bairro etc.); e o público-alvo ou leitor visado.
Depois disso, oriente a turma para planejar a escrita de acordo com os
questionamentos:

1. Que aspecto da polêmica será discutido?


2. Qual opinião ou tese será defendida a esse respeito?
3. Que argumentos principais serão utilizados para isso?
4. De quais fatos ou dados deve-se partir?
5. O que será escrito na "Introdução", de forma que possa indicar aoleitor
qual é o contexto da discussão?
6. Como serão desenvolvidos os argumentos de forma que fiquem bem
7. claros?
8. Como se pretende concluir?

Que título será mais adequado para já situar o leitor acerca da tese defendida e
despertar o interesse dele?
Por fim, peça a cada aluno que escreva um artigo, procurando seguir o planeja-
mento feito. Anuncie que o processo de escrita pode levá-los a repensar o
planejamento. Nesse caso, devem estar atentos para a repercussão que as
alterações terão sobre os outros elementos do texto, ou seja, se resolverem mudar a
tese no meio do caminho, será preciso verificar se a nova opinião também é
compatível com a polêmica. E muito provavelmente será preciso estabelecer outros
argumentos e partir de novos dados.
Terminada essa fase, peça aos alunos que releiam o que escreveram – agora como
possíveis leitores do artigo. Caso haja tempo, sugira que troquem os textosentre si,
fazendo comentários e sugestões. Só depois da releitura ou da leitura de um colega
é que o aluno deverá rever o texto para escrever a versão final. Explique-lhes que
esse texto permitirá a você fazer uma avaliação inicial do nívelde compreensão dos
alunos, bem como daquilo que ainda necessitam aprendersobre artigo de opinião.

Primeira escrita
A produção inicial indica o que os alunos já sabem sobre o gênero e dá pistas para
que o professor possa intervir adequadamente no processo de aprendizagem.
Esse primeiro texto também é importante para que os alunos avaliem a própria
escrita. Com sua ajuda, eles serão capazes de perceber o que é preciso melhorar e
poderão envolver-se mais nas atividades das oficinas. Além disso, será possível
comparar essa produção com o texto final e identificar os avanços, realizando-se um
processo de avaliação continuada.
Ao ler esses primeiros textos dos alunos, avalie se:
• há erros de ortografia, de gramática, ou outras dificuldades;
• tratam efetivamente de uma questão polêmica;
• localizam adequadamente o leitor em relação a essa questão;
• deixam clara a posição assumida;
• trazem argumentos coerentes e convincentes;
• apresentam e discutem ou rebatem o pensamento de opositores
• sobre o assunto (PONTOS DE VISTA, 2011).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Dessa maneira, a sequência de atividades propostas no
documento do Programa Escrevendo o futuro Olimpíadas de Língua
Portuguesa de 2010, em número de 13, vão orientando os
professores ora a analisarem textos com os alunos em busca de
elementos característicos de sua estrutura composicional, ora a
proporem a escrita de um artigo de opinião em que coloquem seus
argumentos e opinem sobre a comunidade onde vivem, já que a
temática do concurso é "O lugar onde vivo".
Após a primeira escrita do texto dos alunos, o professor já
poderá avaliar quais traços de um artigo de opinião eles já
demonstram conhecer ou dominar, para poder continuar
orientando-os quanto à sustentação da tese, quanto aos tipos de
argumentos, quanto às formas de articulação das orações, enfim,
quanto ao estilo.
O momento da revisão do texto também é uma etapa
importante na sequência de atividades de escrita de qualquer gênero
ao cuidar da coerência entre os argumentos e a tese, da pontuação,
da colocação de pronomes, da ortografia e outros aspectos
importantes para o sentido do texto.
Os aspectos da revisão de textos e dos critérios de avaliaçãodos
gêneros mais conhecidos serão retomados na última unidade deste
material.

12. CONSIDERAÇÕES

Encerrando nossas discussões sobre a leitura e a escrita, não


porque esteja esgotado o assunto, mas somente porque é
necessário, também, tocar em outras questões metodológicas,
passaremos a algumas considerações.
O aluno que faz da leitura uma prática constante terá mais
facilidade para associar ideias, estabelecer relações intertextuais se
comparado àquele que não lê ou que pouco recorre à leitura. Além
da informação, as dicas que o texto lhe oferece serão valiosas se
aliadas ao seu conhecimento de mundo, enciclopédico e linguístico,
pois dessa interação surgirão os sentidos do texto.
Podemos concluir, de acordo com Koch (2006, p. 22), que a
leitura é "uma atividade de produção de sentidos". Se quisermos
uma prática constante de leitura na escola, é necessário que
trabalhemos com a diversidade de objetivos, modalidades e textos
quecaracterizam as práticas de leitura de verdade. Isso significa dizer
que diferentes objetivos exigem diferentes textos em diferentes
gêneros e cada um, por sua vez, exige um modo de leitura ou um
modo de escrita.
Na produção de textos na escola, as propostas de escrita queo
professor elabora para que os alunos escrevam são os principais
elementos de condições de produção de textos. Dessa maneira, hoje
se propõe que as situações de produção de textos em sala de aula
sejam realizadas pensando, em primeiro lugar, nos objetivos de
leitura dos possíveis leitores, pois todas as outras decisões que o
escritor tomará dependem dessas condições.
Sendo assim, é importante que o professor defina, junta-
mente com seus alunos, para quem eles escreverão, em que gê- nero
será organizado, de que lugar social estarão falando, qual a finalidade
do texto, em que suporte veiculará e em que esfera social circulará.
Dessa forma, o professor estará desenvolvendo práticas de
leitura de textos que realmente circulam na sociedade e de escritade
textos que têm uma finalidade ou que se aproximam das práticas
reais de escrita em sociedade.
Esperamos que esta unidade tenha colocado conceitos
importantes para sua base teórica sobre leitura e produção de textos
e que a amostra de sugestões de trabalho com a leitura e a escrita
venham a colaborar para a compreensão de que esse tipo de
sequências didáticas atendem aos objetivos da leitura como
processo dialógico e da escrita com prática social efetiva.

13. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 O processo da leitura. Disponível em: <http://pnld.edunet.sp.gov.br/2005/
experiencia/videoconferencias.asp.>. Acesso em: 6 mar. 2010.
Figura 2 Capa do livro A verdadeira história dos três porquinhos. Disponível em: <http://
www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=40015>. Acesso em: 20 jun. 2010.

Sites pesquisados
COMPANHIA DAS LETRAS. A verdadeira história dos três porquinhos. Disponível em:
<http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=40015>. Acesso em: 02
jan. 2011.
NÓBREGA M. J. Orientações didáticas: 3ª Videoconferência Tecendo Leituras. Apresentação
da Palestra: Tecendo Leituras - 3 - Estrutura das Orientações Didáticas. Disponível em:
<http://pnld.edunet.sp.gov.br/2005/experiencia/videoconferencias. asp.>. Acesso em: 27
dez. 2010.
PONTOS DE VISTA. Caderno do professor: escrevendo o futuro. Coleção Olimpíadas de
Língua Portuguesa. São Paulo: Cenpec, 2010. Disponível em: <http://www.scribd.com/
doc/27525069/Pontos-de-Vista.>. Acesso em: 10 jan. 2011.
PORTAL DO PROFESSOR. A importância da noção de Suporte no trabalho com gêneros.
Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.
html?aula=10677>. Acesso em: 3 jul. 2011.
ROJO, R. Letramento e capacidades de leitura. Disponível em: <http://web.me.com/
rrojo/Roxane_Rojo/Espa%C3%A7o_Blog/Entr%C3%A9es/2009/2/24_Letramento_e_
capacidades_de_leitura_para_a_cidadania_files/Rojo_2004_CapacidLeitura_1.pdf>.
Acesso em: 10 jun. 2010.

14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRADE, C. D. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998.


BAKHTIN, M. M. A Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BRAKLING,
K. L. Sobre a leitura e a formação de leitores. São Paulo: Fundação Vanzolini, 2004.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. v. 2. Ministério da Educação e
do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. 3 ed. Brasília: A Secretaria, 2001.
BRONCKART, J. P. Atividades de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo
sócio-discursivo. São Paulo: EDUC, 1999.
CENPEC. Pontos de vista. Caderno do professor: escrevendo o futuro. Coleção Olimpíadas de
Língua Portuguesa. São Paulo: Cenpec, 2010.
KLEIMAN, Â. Oficina de leitura. Campinas: Pontes, 1983.
. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas: Pontes, 1989.
KOCK, I. G. V . Desvendando os segredos do texto. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
. ELIAS, V. M. Ler e compreender os sentidos dos textos. São Paulo: Contexto,
2006.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, Â. P.;
MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. Gêneros textuais & Ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2003.
NASPOLINI, A.T. Didática de português: tijolo por tijolo: leitura e produção escrita. São
Paulo: FTD, 1996.
PONTOS DE VISTA. Caderno do professor: escrevendo o futuro. Coleção Olimpíadas de
Língua Portuguesa. São Paulo: Cenpec, 2010.
PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: 1º grau. 4.ed. São Paulo:
SE/CENP, 1991.
ROJO, R. H. R. A concepção de leitor e produtor de textos nos PCNs: ler é melhor doque
estudar. In: FREITAS, M. T. A.; COSTA, S. R. (Org.). Leitura e escrita na formação de
professores. São Paulo: Musa/UFJF/INEP-COMPED, 2004.
SARTRE, J. P. As palavras . Tradução J. Guinsburg. - 2. ed. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2005.
SCHENEUWLY, B; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução de Roxane Rojo e
Gláis Sales Cordeiro. Campinas: Mercado das Letras, 2004.
SOLÉ, I. Estratégias de Leitura. Tradução de Cláudia Schilling. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,
2004.
Capítulo II
Gêneros Discursivos
"[...] O leitor maduro é aquele para quem cada nova lei-
tura desloca e altera o significado de tudo o que já leu,
tornando mais profunda sua compreensão dos livros,
das gentes e da vida" (MARISA LAJOLO, 2005, p. 13).

1. OBJETIVOS
• Ampliar conhecimentos a respeito de gêneros do discurso.
• Estabelecer discussões e comparações sobre os aspectos
tipológicos do discurso escrito.
• Salientar o condicionamento da leitura e da escrita dos
diferentes gêneros discursivos à sua função social.
• Proceder a atividades de análise de alguns gêneros dis-cursivos.
• Reconhecer e compreender os aspectos que caracterizam
o gênero: tema, estilo e forma composicional.

2. CONTEÚDOS
• Gêneros do discurso.
• Aspectos tipológicos do discurso escrito.
• Gêneros textuais: contexto de produção, tema, estilo.
• Gêneros da ordem do narrar, do relatar, do argumentar,do
expor, do descrever.
3. INTRODUÇÃO À UNIDADE

Você seria capaz de observar e de registrar tudo o que


conversou, leu, escreveu durante o seu dia? E pensar, ainda, em que
forma de linguagem usou para cada situação: no café da manhã, na
escola, no banco, ao telefone, na internet, no jantar?
Muitas práticas discursivas orais, como a conversação, nós
usamos na relação imediata com nossos interlocutores ao
dialogarmos com pessoas ao nosso redor, contando casos, piadas,
respondendo a perguntas, opinando, dando ordens. Essas práticas
discursivas estão disponíveis em nossa cultura desde há muito
tempo, por isso as aprendemos sem perceber.
Bakhtin (1997) estudou essas e outras formas de interação que
os falantes de uma língua mantêm com seus interlocutores e
observou que o ato de conversar (ou seja, a conversação) é um dos
gêneros primários da oralidade humana. Gênero primário porque
apareceu primeiro, é primitivo, original; não porque é elementar,
superficial ou limitado, e, por ser oral, poderia ser interpretado como
mal construído ou inferior a outro, escrito.
Agora, recorde-se de diálogos entre personagens de uma no-
vela, de um romance, de um conto ou de uma peça de teatro, ou,
ainda, de uma entrevista publicada em uma revista ou realizada ao
vivo no rádio ou na televisão. Os diálogos parecem naturais, não?
Nessas situações, os diálogos foram como que tomados em-
prestados da vida cotidiana por uma instância mais complexa,
pública, em que a conversação não é mais imediata. Observamos que
nesses casos, as condições de produção do discurso mudam, tornam-
se secundárias, complexas. Resumindo, a conversação, que seria do
gênero primário, passa a ser um diálogo do gênero secundário se for
reproduzida por personagens de um romance, novela ou conto,
porque são introduzidas no discurso literário. O mesmo acontece
com uma entrevista no rádio ou na televisão, emque o contexto de
produção muda, passando da esfera cotidiana para uma esfera mais
formal, preparada, pública. Os diálogos produzidos passarão de
gênero primário a gênero secundário.
É sobre esses gêneros do discurso que falaremos nesta uni-
dade, com mais profundidade, lembrando que a concepção de
linguagem em que nos fundamentamos é a concepção interacional
(dialógica), para a qual a leitura é uma atividade interativa do leitor
com o texto e cuja produção de sentidos vai depender de um
conjunto de saberes desse leitor a respeito não só da língua, mas do
mundo e dos conhecimentos já acumulados pela sociedade.
Nessa perspectiva, vimos que o texto, tanto oral como escrito,
é considerado um "evento comunicativo" ou um "evento dialógico"
em que o leitor estabelece um diálogo constante com o autore com o
próprio texto, que se apresenta sempre em um gênero.
Acreditamos que este material contribuirá de forma
significativa para desencadear reflexões didático-pedagógicas sobre
o trabalho com a língua oral e a língua escrita na escola. Com certeza,
isso nos conduzirá a bons resultados na nossa tarefa educativa.
Vejamos o que são os gêneros do discurso.

4. GÊNEROS DO DISCURSO

Os estudos contemporâneos sobre gêneros discursivos hoje,


em sua maioria, decorrem da proposta de Bakhtin (1997), que
considera gênero do discurso enunciados que atendam a um
propósito comunicativo. Não só os textos literários, portanto, podem
ser agrupados em gêneros discursivos, mas qualquer texto que
apresente uma função sóciocomunicativa. O autor fala, em sua
definição de gêneros, do uso variado da língua de acordo comesferas
da atividade humana. Bakhtin (1997) considera que, em todas as
esferas da vida, as atividades humanas se realizam pela linguagem e
na linguagem.

A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, poisa


variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera
dessa atividade comporta um repertório de gêneros do discursoque
vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera
se desenvolve e fica mais complexa (BAKHTIN, 1997, p. 281).
Podemos compreender que, como cada atividade humana se
caracteriza por determinadas especificidades, possui seus tipos
relativamente estáveis de enunciados, ou seja, compreende um
determinado repertório de gêneros discursivos. Além disso, à medida
que essa atividade se amplia e se complexifica, também seus
discursos tendem a ficar mais complexos.
Entendemos por discurso uma prática social de produçãode
textos (orais ou escritos) que é o resultado de uma atividade
discursiva construída socialmente e não individualmente. Mesmo
quando produzido, ele traz em si uma visão de mundo que está
determinada pelo meio social do autor. Dizemos que o texto porta
outras vozes (sociais) expressas pela voz narrativa. Podemos falar em
discurso religioso (como a prece, o sermão, a parábola etc.), discurso
jornalístico (como o que transparece em notícias, reportagens,
editoriais etc), discurso literário (que permeia a tragédia, o romance,
o conto etc.) e discurso do cotidiano (que caracteriza aconversação e
seus tipos etc.).
Bakhtin (1997) explica que os enunciados são as unidades
concretas que usamos da língua, as expressões que construímos
socialmente e que compreendemos ao conversar com outros
falantes da língua. A esse respeito, o autor afirma que:

A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e


escritos), concretos e únicos que circulam entre as pessoas de uma
ou outra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as
condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas,
não só por seu conteúdo temático e por seu estilo verbal, ou seja,
pela seleção operada nos recursos da língua (recursos lexicais,
fraseológicos e gramaticais), mas também, e sobretudo, por sua
construção composicional. Esses três elementos - (conteúdo
temático, estilo e construção composicional) - fundem-se
indissoluvelmente no tododo enunciado, e todos eles são marcados
pela especificidade de uma esfera de comunicação (BAKHTIN, 1997,
p. 279).

Veja quais são esses três elementos que constituem os enunciados:

Conteúdo temático: o que é ou pode tornar-se dizível por meio do gênero.


Construção composicional: estrutura particular dos textos (narrativo,
argumentativo, descritivo, explicativo ou conversacional) pertencentes ao gênero.
Estilo: configurações específicas das unidades de linguagem deriva- das, sobretudo,
da posição enunciativa do locutor; conjuntos particulares de sequências que
compõem o texto etc. (BRASIL, 1998,p. 21).
Um enunciado considerado isoladamente é individual, mas
cada esfera de utilização da língua, ou seja, cada esfera de atividade
das pessoas, elabora seus tipos relativamente estáveis de
enunciados, sendo isso que Bakhtin (1997, p. 279) denomina de
"gêneros do discurso".
Por exemplo, a esfera de atuação jurídica tem suas formas
estáveis de comunicação: processos, demandas, atas, petições etc. Já
a esfera da medicina utiliza prontuários, receitas, relatórios,análises,
laudos etc. No âmbito da educação, por sua vez, circulamrelatórios,
planos de aula, planos de ensino, pesquisas, atas, anotações de aulas,
redações, resumos etc.
Podemos concluir, portanto, com base em Bakhtin (1997), que
os gêneros são formas de enunciados produzidas historicamente,
que se encontram disponíveis na nossa cultura. Entre uma grande
variedade deles, podemos encontrar a notícia, a reportagem, o artigo
de opinião, o artigo científico, o romance, o conto (literário, popular,
maravilhoso, de fadas, de aventuras), a fábula,a crônica, o anúncio, a
receita culinária, a receita médica, a tese, amonografia, o cordel, o
poema, o repente, o relatório, o seminário, assim como a palestra, a
conferência, o verbete, a parlenda, aadivinha, a cantiga, o panfleto,
o sermão e outros.
Se tivéssemos de criar pela primeira vez uma forma de dizer
algo a alguém toda as vezes que nos comunicássemos, seria quase
impossível a comunicação. Por isso os falantes da língua buscam
formas já existentes na cultura, como, por exemplo, o modo de se
cumprimentar, de fazer e de atender uma ligação, de iniciar uma
carta, uma aula ou uma história. É, portanto, por meio da
estabilidade relativa dos gêneros do discurso que fazemos economia
aoestruturar nossas formas de comunicação.
Essa estabilidade relativa a que Bakhtin (1997) se refere
significa que os gêneros do discurso se modificam para atender às
necessidades da sociedade, por isso sofrem constantes atualizações
ou transformações. Um exemplo disso é a carta, meio de
comunicação bastante usado em épocas anteriores, que hoje perde
espaço para o e-mail, já que a sociedade atual necessita de maior
agilidade e rapidez na transmissão das informações, características
estas não oferecidas pela carta. No entanto, a carta não deixou de
existir, o que houve foi uma atualização do gênero carta, para melhor
atender à sociedade.
Segundo Bakhtin (1997, p. 301):

Aprender a falar é aprender a estruturar enunciados, e os gêneros


do discurso, por sua vez, organizam nossa fala, assim como
organizam as formas gramaticais (sintáticas). Isso significa dizer que,
para falar, utilizamo-nos dos gêneros do discurso, ou seja, de
enunciados que dispõem de uma forma padronizada e relativamente
estável de estruturação.

Gêneros primários e gêneros secundários


Para Bakhtin (1997), é importante levar em consideração a
diferença essencial existente entre o gênero do discurso primário
(simples) e o gênero do discurso secundário (complexo – o romance,o
teatro, o discurso científico, o discurso ideológico etc.), este último,que
aparece em circunstância de uma comunicação cultural mais
complexa e relativamente mais evoluída, especialmente escrita
(artística, científica, sociopolítica.
A esse respeito, Bakhtin (1997, p. 282) considera que, para
qualquer estudo, é importante, em primeiro lugar, compreender
qual a natureza dos enunciados:
Uma concepção clara da natureza do enunciado em geral e dos vá-
rios tipos de enunciados em particular (primários e secundários), ou
seja, dos diversos gêneros do discurso, é indispensável para qualquer
estudo, seja qual for a sua orientação específica. Ignorar a natureza
do enunciado e as particularidades de gênero que assinalam a
variedade do discurso em qualquer área do estudo linguístico leva
aoformalismo e à abstração, desvirtua a historicidade do estudo e
enfraquece o vínculo existente entre a língua e a vida. A língua
penetrana vida através dos enunciados concretos que a realizam,
e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na
língua.

Vamos entender isso melhor a seguir.


Gêneros primários
Gêneros primários são aqueles que surgem nas situações de
comunicação verbal espontânea e menos elaborada (oral ou escrita).
Podemos chamá-los de gêneros que são empregados nos nossos
enunciados da vida cotidiana, como na linguagem oral, nos diálogosem
família, nas reuniões de amigos, nos pequenos registros etc.
Assim, eles podem se configurar em:

1) pequeno diálogo;
2) carta;
3) bilhete;
4) relato familiar;
5) ordem;
6) declarações públicas;
7) conversa telefônica.

Gêneros secundários
Os gêneros secundários são os gêneros mais complexos que
aparecem em situações de comunicação culturalmente mais
complexas e mais evoluídas, especialmente escritas (artística,
científica, sociopolítica).
Entretanto, isso não significa que os gêneros primários sejam
somente orais e os secundários sejam estritamente escritos. Eles
podem absorver e modificar os gêneros primários. Um romance
pode absorver em seu discurso tanto uma carta como um bilhete ou
qualquer outro gênero simples, quando uma personagem escreve
uma carta, dentro da narrativa, por exemplo.
Quando inserimos qualquer um dos gêneros simples em um
romance, esses se desvinculam da realidade comunicativa imediata e
podem ser interpretados somente diante do conteúdo total do
romance. Podemos citar como gêneros complexos:
1) romance;
2) peça teatral;
3) discurso científico;
4) discurso ideológico.
É importante observarmos que há uma inter-relação entre os
gêneros primários e os secundários, além de haver todo um histórico
na formação dos gêneros secundários. Isso porque os gêneros
arranjam os conhecimentos dos falantes da língua de um
determinado modo, conforme os interesses e os propósitos das
pessoas em uma certa esfera de atuação.
É sabido que grupos sociais diferentes têm interesses e valores
diferentes e vivenciam situações sociais de modos diversos. Um
esportista, com certeza, lançará mão de temáticas e de formas de
dizer diferentes das de um jurista ou das de um professor, poistodos
eles, embora convivam socialmente, cultivam os interesses de sua
esfera profissional e necessitam interagir por meio de gê- neros
diferentes.
Vimos que é função da escola apresentar e trabalhar com o
maior número de gêneros possível que circula na sociedade para que
os alunos desenvolvam as competências leitora e escritora. Mas é
importante saber que não encontraremos no cotidiano, circulando,
as formas tradicionais que se aprende na escola (ou seja, narração,
descrição, dissertação), e sim notícias, artigos de opinião, receitas,
currículo, entrevistas, artigos científicos, letras de músicas entre
outros gêneros. Por isso, o Tópico 6 tratará das diferenças entre
gêneros e tipos textuais.

5. ASPECTOS TIPOLÓGICOS DO DISCURSO ESCRITO

Muitas vezes, tanto alunos como professores referem-se,


indiscriminadamente, a textos que denominam ora de narração, ora
de conto, ora de descrição, ora de manual de instrução, ou se referem
a uma dissertação quando se deparam com um artigo de opinião no
jornal. Esse é um aspecto terminológico que implica certas
considerações teóricas, as quais faremos a seguir.
Algumas considerações sobre gêneros e tipos textuais
A distinção entre gêneros textuais e tipos textuais é significativa
para quem trabalha com a compreensão e a produção textual. Por
isso, recorremos a Marcuschi (2003, p. 22), que tece claras
considerações acerca desse assunto:

a. Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de construção teórica
definida pela natureza linguística de suacomposição {aspectos lexicais, sintáticos,
tempos verbais, relações lógicas}. Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de
meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição,
descrição, injunção.
b. Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para
referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que
apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição característica. Se os tipos textuais são
apenas meia dúzia, os gêneros são inúmeros. Algunsexemplos de gêneros textuais
seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete,
reportagem jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística,
horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de
restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de
concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo
porcomputador, aulas virtuais e assim por diante.

É importante dizer que Marcuschi (2003, p. 22) se baseou em


Swales (1990), em Adam (1990) e em Bronckart (1999) para afirmar
que "em geral, os tipos textuais abrangem as categorias narração,
argumentação, exposição, descrição e injunção"

Pelo que vimos, quando se nomeia certo texto como


narrativo, descritivo ou argumentativo, segundo Marcuschi
(2003, p. 27), "não se está nomeando o gênero e sim o
predomínio de um tipo de sequência de base".

Muitas vezes, a expressão "tipo de texto" é usada


erroneamente para designar o que é um gênero textual. Marcuschi
(2003, p. 25) observa que "Quando alguém diz, por exemplo, a carta
pessoal é um tipo de texto informal, ele não está empregando o ter-
mo ‘tipo de texto’ de maneira correta [...]", pois a carta pessoal se
trata, na verdade, de um gênero textual.
Por outro lado, esse mesmo autor destaca que
em todos os gêneros também se está realizando tipos textuais,
podendo ocorrer que o mesmo gênero realize dois ou mais tipos.
Assim, um texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo)
(MARCUSCHI, 2003, p. 25).

O autor ilustra essa afirmação com um exemplo bem elucidativo


ao referir-se à carta pessoal, "que pode conter uma sequência
narrativa (conta uma historinha), uma argumentação (argumenta em
função de algo), uma descrição (descreve uma situação) e as- sim por
diante" (MARCUSCHI, 2003, p. 25).
Vejamos, agora, como poderia ser organizado o ensino por
meio de gêneros e de tipologias, porque a abordagem dos dois
aspectos deve ser motivo de reflexão na sala de aula.

O ensino por meio de gêneros e tipologias

Para pensarmos como inserir a prática de estudo da


diversidade de gêneros discursivos na escola, Schneuwly e Dolz
(2004) consideram que esses gêneros, ao serem inseridos na tradição
didática, devem corresponder às grandes finalidades sociais
atribuídas ao ensino, cobrindo os domínios essenciais da
comunicação escrita e oral em nossa sociedade; devem retomar, de
maneira flexível, as distinções tipológicas e, ainda, serem
relativamente homogêneos quanto às capacidades de linguagem.
Vamos apresentar a você um agrupamento de gêneros, pro-
posto por Schneuwly e Dolz (2004, p. 121), no livro Gêneros orais e
escritos na escola, que consiste em organizar os gêneros textuaisde
acordo com as semelhanças que as situações de produção que os
gêneros possuem. Os agrupamentos de gêneros dividem-se emcinco:
gêneros da ordem do Narrar, do Expor, do Argumentar, do Instruir e
do Relatar. Veja a Tabela 1.

Tabela 1 Agrupamento de gêneros.


DOMÍNIOS SOCIAISDE CAPACIDADES
EXEMPLOS
DE DE GÊNEROS ORAIS EESCRITOS
COMUNICAÇÃO LINGUAGEM DOMINANTES
Conto maravilhoso
FábulaNovela
Narrativa de aventura Narrativa de
Cultura literáriaficcional
ficção científicaNarrativa de
Narrar enigma
Mimesis (cópia) da ação
através da intriga (enredo) Novela fantástica
Conto parodiado

Relato de experiência vividaRelato


de viagem Testemunho
Curriculum vitae Notícia
Documentação e Reportagem Crônica Esportiva
memorização de ações Relatar Ensaio biográfico
humanas Representação pelo discurso
de experiências vividas,
situadas no tempo

Texto de opinião Diálogo


argumentativoCarta do leitor
Carta de reclamação Deliberação
Discussão de problemas informalDebate regrado
sociaiscontroversos Argumentar Discurso de defesa (adv.)
Sustentação, refutação e Discurso de acusação (adv.)
negociação de tomada de
posição

Seminário Conferência
Artigo ou verbete deenciclopédia
Entrevista de especialistaTomada
de notas
Transmissão e Resumo de textos "expositivos"ou
construção desaberes explicativos
Expor Relatório científico
Apresentação textual de Relato de experiência científica
diferentes formas desaberes
DOMÍNIOS SOCIAISDE CAPACIDADES
EXEMPLOS
DE DE GÊNEROS ORAIS EESCRITOS
COMUNICAÇÃO LINGUAGEM DOMINANTES
Instruções de montagemReceita
Regulamento Regras de jogo
Instruções eprescrições Descrever ações Instruções de uso
Regulação mútua de Instruções
comportamentos

Fonte: Schneuwly; Dolz (2004, p. 121).

Os agrupamentos não são estanques uns em relação aos


outros, alertam os autores; não é possível classificar um gênero de
maneira absoluta num dos agrupamentos propostos. A organização
didática tem em vista a progressão ideal para o início dos trabalhos
em sala de aula no Ensino Fundamental.
Passemos a observar mais de perto o que caracterizam esses
agrupamentos, com base em Rojo (2000, p. 120-121), que especifica
em quais domínios sociais circulam os gêneros em cada agrupamento
proposto por Schneuwly e Dolz (2004, p. 121):

Agrupamento da ordem do narrar – ligado ao domínio social da cultura literária


ficcional, caracteriza-se pela mimesis da ação através da criação da intriga no domínio
do verossímil (contos de fadas, fábulas, lendas, ficção científica, narrativa de enigma,
romance, novela, bio- grafia romanceada etc.). Os textos pertencentes a esse
agrupamentosão herança da escola para a formação do leitor literário.
Agrupamento da ordem do relatar – ligado ao domínio social da comunicação,
voltado à documentação e memorização das ações humanas, exigindo uma
representação pelo discurso de experiências vividas situadas no tempo (relatos de
experiência vivida, diários íntimos, diários de viagem, notícias, reportagem,
biografias, relato histórico, testemunho, curriculum etc.). Os textos aqui e
quadrados são aqueles que documentam fatos e memorizam açõeshumanas.
Agrupamento da ordem do argumentar – ligado ao domínio socialda comunicação,
voltado à discussão de problemas sociais contro-versos, visando a um entendimento
e um posicionamento perante eles (diálogo argumentativo, carta de reclamação,
debate regrado,editorial, ensaio argumentativo etc.). Os textos desse agrupamentose
realizam a partir da sustentação, refutação e negociação de to-madas de posição.
Agrupamento da ordem do expor – ligado ao domínio social da comunicação,
voltado à transmissão e construção de saberes, veiculam o conhecimento mais
sistematizado, transmitido cultural- mente (texto expositivo, conferências,
seminários, resenhas, artigoenciclopédico, relatório científico etc.). Os textos desse
agrupa- mento apresentam diferentes formas de saberes.
Agrupamento da ordem do descrever ações – ligado ao domínio social da
comunicação, voltado às instruções e prescrições, exige a regulação mútua de
comportamentos (instruções de uso, instruções de montagem, receitas,
regulamentos, regras de jogo etc.).
Tipologicamente falando, os agrupamentos da ordem do relatar e do narrar são
narrativos; os da ordem do argumentar, argumentativos; os do expor, expositivos e
os do descrever ações, injuntivos.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1998,


p. 24) propõem que os textos selecionados para o trabalho em sala
de aula no terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental sejam:

[…] aqueles que, por suas características e usos, podem favorecer a


reflexão crítica, o exercício de formas de pensamento mais
elaboradas e abstratas, bem como a fruição estética de usos artísticos
dalinguagem, ou seja, os mais vitais para a plena participação numa
sociedade letrada.

Esse mesmo documento sugere:

[…] gêneros privilegiados para a prática de escuta e leitura de


textos, entre eles, gêneros próprios da linguagem oral como
cordel, causos, textos dramáticos, canções e outros próprios da
linguagemescrita, entre eles contos, romances, novelas, crônicas,
notícias, editoriais, entrevistas e outros (BRASIL, 1998, p. 54).

Entre os gêneros sugeridos para a prática de produção de


textos orais e escritos no PCN (BRASIL, 1998, p. 57-58), estão as
canções, os textos dramáticos, as entrevistas, as exposições e os
seminários no âmbito oral, e as crônicas, os contos, os poemas, as
cartas, os relatórios de experiências, os resumos e os artigos no
âmbito escrito.
A melhor alternativa para trabalhar o ensino de gêneros
textuais é envolver os alunos em situações concretas de uso da
língua, de modo que consigam, de forma criativa e consciente,
escolher meios adequados aos fins que desejam alcançar. É
necessário ter a consciência de que a escola é um "autêntico lugar de
comunicação" e as situações escolares "são ocasiões de produção e
recepção de textos" (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 78).
No próximo tópico, você terá a oportunidade de observar os
elementos que constituem alguns gêneros textuais que circulam
socialmente.

6. GÊNEROS TEXTUAIS: CONTEXTO DE PRODUÇÃO,


TEMA, ESTILO

Ao iniciar as atividades com determinados gêneros do discurso,


é muito importante que o professor agrupe textos pertencentes ao
mesmo gênero para que possam ser observadas suas regularidades
quanto:
• Ao contexto de produção do texto: dados sobre o autor,o tipo
de leitor, o objetivo, os possíveis locais de circulação do texto.
• Ao conteúdo temático: os temas comumente tratados em
textos desse gênero.
• À forma composicional: a estrutura, a organização dos
elementos dos textos do gênero.
• Ao estilo: marcas linguísticas e enunciativas do autor;
conjuntos particulares de sequências de frases.
Baseando-se na descrição dos elementos que caracterizam
vários textos do mesmo gênero que se pode definir o que será
abordado no trabalho com ele.
Entre os gêneros sugeridos no grupo narrar por Schneuwlye
Dolz (2004) encontram-se a novela fantástica, ou o conto fantástico
gótico. Por isso, você estudará, agora, as regularidades que apare-
cem nos temas, na composição e no estilo dos contos fantásticos.
O conto fantástico gótico – gênero da ordem do narrar

Você sabe o que significa "gótico"?


Você já viu alguém que gosta de perambular pelos cemitérios
à noite, de roupas pretas, melancólico? Atualmente, essas são as
pessoas chamadas de góticas. Mas será que essas características
são suficientes para definir a palavra "gótico"?
Para muitos estudiosos, não há uma definição precisa para o
que é ser gótico, não se trata de um movimento genuíno e, dessa
forma, não possui características específicas a serem elencadas. No
entanto, podemos dizer que os chamados góticos, segundo Lilian
Akemy Yamada (2010):

Gostam da noite, da vida e também da morte, da literatura, da arte,


da solidão, do ocultismo, do amor. O mundo dos góticos não pode
ser muito caracterizado, cada um define-se de uma maneira. [...]
O motivo estaria na ligação que muitas pessoas acabam fazendo
erroneamente, quando veem os góticos como vampiros; pois há
uma grande confusão por ambos terem gosto pela vida noturna,
romantismo mórbido, a maneira de se vestir, caracterizadas por
trajes antigos usados nos filmes.

Originalmente, a palavra "gótico" era usada para referenciaras


pessoas que faziam parte da tribo dos Godos, antigo povo da
Germânia, pouco conhecido, que habitava as regiões leste e oeste
do baixo Danúbio.
No século 12, uma inovação arquitetônica permitiu que as
igrejas construídas, antes sombrias e colossais, a partir de então,
fossem mais claras. A primeira igreja construída substituindo a
utilização das paredes por vitrais coloridos, de arcobotantes, peças
maciças de alvenaria que reforçam as paredes como opções de
sustentação, foi Saint Denis, na França.
Vasari, crítico de arte, pintor de grande talento e especialista
em vitrais, nomeou esse novo estilo de "gótico" ou "estilo ogival"
por usar o cruzamento de dois arcos iguais que se cortam superior-
mente, formando um ângulo agudo, típico das abóbadas góticas. O
termo "gótico" era usado, também, na Inglaterra na épocaem que
vivia Shakespeare, geralmente empregado para se referir asituações
de conflitos na política, na história, nas incertezas sobre a vida.
Abordaremos não o contexto de um conto gótico específico,
mas o contexto em que surge esse gênero no tempo e no espaço.
O contexto de produção do gênero conto fantástico gótico
dados sobre sua origem, o autor, o tipo de leitor, o objetivo, os
locais de circulação possível do texto.
O primeiro registro de literatura gótica surgiu na Inglaterra e
data do século 18, com a publicação do primeiro romance gótico O
castelo de Otranto, escrito por Horace Walpole.
Trata-se de uma narrativa em que prevalecem as situações de
mistério, aflição e terror. Geralmente, a inspiração para esses
contos são as pesadas e colossais construções medievais e o
passado feudal, sempre relacionados ao terror, ao medo.
Podemos dizer que os romances góticos se apresentam como
uma mistura entre o mitológico e o mimético (as mutações entre o
imaginário e o real). A intenção subjacente era o clamor pela
retomada da época dos sonhos, na Inglaterra, contra o materialismo
burguês e os ideais iluministas.
Os temas no gênero conto fantástico gótico, o medo, a
angústia, a repulsa pela morte são os temas centrais das narrativas
dos contos fantásticos góticos, cujos enredos variam entre a
realidade e a aceitação da existência de algo desconhecido, de um
outro mundo, sobrenatural.
De acordo com Klee (2011):

Permeiam o romance gótico temas e símbolos recorrentes: segre-


dos do passado, manuscritos escondidos, profecias, maldições;
sanidade e castidade estão constantemente ameaçadas, e
sobretudo paira a sugestão, algumas vezes finalmente subvertida,
de que forças irracionais e malévolas ameaçam tanto a
integridadeindividual como a ordem material da sociedade.

Nos contos góticos, todo tipo de racionalidade é questionada.


Os escritores dão relevância especial ao sentimentalismo, em todasas
suas nuances, muitas vezes exacerbado; denunciam a origem
caótica do mundo e as incertezas da vida; manifestam-se
existencialmente fúnebres e abrem caminho para discussões no
sentido de questionar o ser enquanto ser: equilibrado, racional,
harmônico.
O estilo do gênero conto fantástico gótico: marcas
linguísticas e enunciativas do autor; conjuntos particulares de
sequências de frases. Os autores góticos, em seus contos,
preocupam-se com o emprego da língua, criando muitas metáforas
e representações simbólicas.
Romances góticos famosos perpetuaram imagens que foram
usadas nos romances do século 19. Entre elas, monastérios habita-
dos por espíritos maléficos; cômodos claustrofóbicos; castelos
horripilantes onde vivem isolados da sociedade aristocratas
tirânicos;ruínas; igrejas; labirintos. Nesses cenários sombrios, são
comuns portas que se fecham inexplicavelmente; velas que se
acendem ouse apagam subitamente; quadros de antepassados que
começam a falar; torturas; gritos horripilantes; alguns seres que
transpassam paredes e outros que se locomovem por meio de
passagens secretas ou que se ocultam em apavorantes recintos
subterrâneos.
Observe a imagem do castelo assombrado mais famoso da
Escócia, o Castelo Glamis (Figura 1), que, desde 1372, o casteloé
a residência da família Bowes-Lyon, os Condes de Strathmore e
Kinghorne.

Figura 1 Castelo assombrado.

Tal efeito na narrativa é conseguido pelo acesso à retórica,


pelo uso de expressões adjetivas exageradas que compõem um
contexto grandioso e ameaçador, como: longas tempestades,
abismos, mares revoltos, cachoeiras estrondosas, florestas frias e
escuras onde malfeitores se escondem, vulcões em erupção, ventos
cortantes etc.
A forma composicional do gênero conto fantástico gótico: a
estrutura, a organização dos elementos dos textos do gênero.
As cenas eram compostas pela presença de personagens
melodramáticas, como os cavaleiros, as donzelas, os vilões e os
criados.
A simbologia, os temas que fundamentavam os contos, eram
os segredos guardados, as profecias, as maldições, a incitação ao
medo, a deformação do corpo, a insanidade mental; o temor do
sobrenatural, dos demônios, dos espectros, dos fantasmas, dos
espíritos e dos monstros; as ponderações sobre o poder e o uso que
faz dele em relação à exploração da força de trabalho, dos gêneros
que compõem as minorias fragilizadas, como, por exemplo, a
mulher; a sexualidade; as questões religiosas, estéticas e filosóficas.
Uma das melhores formas de se interpretar a presença do
gótico na literatura talvez seja o entendendo como uma narrativa
contrária à razão que é, a todo momento, testada por aconteci-
mentos insólitos.
O conto gótico consta da criação de um meio narrativo que
envolve o leitor na história com o intuito de o assustar, mas de uma
forma que esse susto, esse medo, seja uma fonte de prazer. A
literatura gótica, com seus efeitos narrativos, tornou-se um dos
mais influentes moldes para os contos de horror, terror,
assombração, mistério, policiais e suspense da atualidade.
Analisaremos, agora, os elementos constituintes de um gê-
nero da ordem do relatar, conforme Schneuwly e Dolz (2004, p.
121), do âmbito da esfera jornalística: a notícia.
A notícia – gênero da ordem do relatar, o contexto de
produção do gênero notícia: dados sobre o jornal, o tipo de leitor,
o objetivo, os locais de circulação possível do texto.
Segundo Benassi (2009, p. 1793): A notícia é um formato de
divulgação de um acontecimento por meios jornalísticos. É a
matéria-prima do jornalismo, normalmente reconhecida como
algum dado ou evento socialmente relevante que merece
publicação numa mídia. O leitor geralmente é um cidadão que se
interessa por saber o que acontece na sua sociedade e no mundo.

O conteúdo temático do gênero notícia: os temas


comumente tratados em textos desse gênero.
O que interessa aos meios de comunicação são fatos políticos,
econômicos, sociais, culturais, ou mesmo naturais, como acidentes
ambientais etc. Podem virar notícias, também, fatos que afetem
grupos sociais significativos para a sociedade. Fatos excepcionais de
grande impacto social, como tragédias, acidentes, guerras, golpes
de estado são foco de atenção das mídias.
A forma composicional do gênero notícia: a estrutura, a
organização dos elementos dos textos do gênero.
Os textos do gênero notícia pertencem à ordem do relatar,
com seu modo próprio de organização. Nos jornais brasileiros de
grande circulação, o modelo de notícia mais usado é aquele
centrado no leitor, ou seja, que quer se mostrar o mais esclarecedor
possível a quem lê. Esse modelo foi difundido pelos americanos
desde o século passado (FARIA; ZANCHETTA, 2005 apud BENASSI,
2009).
Os elementos que constituem a construção composicional do
gênero notícia são os seguintes:

• Quem? O quê? Quando? Onde? (abertura ou lide).


• Como?
• Por quê?
• Qual é o contexto?
• Qual é a consequência? (corpo ou desenvolvimento).
O lide, que constitui os primeiros parágrafos da notícia, deve
responder às questões implícitas: o quê, com quem, onde e quando
aconteceu o fato, ou seja, o espaço do lide deve conter as
informações mais importantes, de imediato interesse do leitor.
No desenvolvimento do texto, vão surgindo informações que
respondem como aconteceu o fato e em qual contexto socialele se
deu, até chegar a possíveis detalhes que, algumas vezes,
respondem ao "por quê", ou seja, explica as possíveis causas do
acontecido. Essa estrutura composicional permite ao leitor uma
visualização rápida do assunto a ser informado, convidando-o a
saber mais.
O estilo do gênero notícia: marcas linguísticas e enunciativas
do autor; conjuntos particulares de sequências de frases.
O estilo, no texto jornalístico, é distinguido pela objetividade,
evitando-se o uso de muitos adjetivos, evidenciando-se os
substantivos e os verbos que, geralmente, exprimem ações
concretas. Esses verbos, em sua maioria, vêm no passado no corpo
da notícia e, no título, aparecem no presente para sugerir que o
acontecimento acabou de se efetivar.
Trataremos, agora, da crônica, outro gênero da ordem do
relatar, que, conforme Schneuwly e Dolz (2004), é muito do gosto
dos leitores brasileiros e é interessante para se trabalhar na escola.
A crônica – gênero da ordem do relatar o contexto de
produção do gênero crônica: dados sobre o autor, o tipo de leitor,
o objetivo, os locais de circulação possível do texto.
Crônica, na antiga Roma, era o gênero pelo qual se faziam os
registros dos acontecimentos históricos, reais, na ordem crono-
lógica em que aconteciam, sem interpretações. A palavra vem do
grego khrónos ou do latim chronos, que significa "tempo".
Na Europa, a crônica foi usada com esse objetivo durante
séculos, mas, no Brasil do século 19, o gênero começou a tomar
uma forma mais jornalística e mais literária para tratar, também, de
fatos corriqueiros do dia a dia.
De 150 anos para cá, a crônica está em toda a imprensa
brasileira. O professor Antonio Candido observa: "até se poderia
dizer que sob vários aspectos é um gênero brasileiro, pela
naturalidadecom que se aclimatou aqui e pela originalidade com
que aqui se desenvolveu" (CENPEC, 2010, p. 19).
As primeiras crônicas brasileiras eram publicadas como
folhetins, na parte inferior da página do jornal e, geralmente, eram
dirigidas às mulheres, por tratarem de temas mais amenos do
cotidiano.
O conteúdo temático do gênero crônica: os temas
comumente tratados em textos desse gênero. Os temas que
circulam nas crônicas costumam tratar de fatos ligados ao cotidiano,
envolvendo relacionamentos humanos, questões éticas ou de
relações entre grupos sociais.
Os organizadores do material didático das Olimpíadas de
Língua Portuguesa, Escrevendo o futuro, assim se posicionam a
respeito da temática das crônicas brasileiras:

A crônica é um gênero que retrata os acontecimentos da vida em


tom despretensioso, ora poético, ora filosófico, muitas vezes
divertido. Nossas crônicas são bastante diferentes daquelas que
circulam em jornais de outros países. Lá são relatos objetivos e
sintéticos, comentários sobre pequenos acontecimentos, e não
costumam expressar sentimentos pessoais do autor. Os cronistas
brasileirosexprimem vivências e sentimentos próprios do universo
cultural dopaís (CENPEC, 2010, p. 19).

A forma composicional do gênero crônica: a estrutura, a


organização dos elementos dos textos do gênero.
Na crônica, o foco da narrativa recai sobre um momento do
dia do cronista, real ou fictício, que pode soar familiar ao leitor,
como um flagrante do dia a dia.
O desfecho nem sempre apresenta solução para o conflito,
ficando por conta do leitor preencher essa lacuna. As personagens
descritas na crônica podem ser fictícias ou reais, mas não se
confundem com pessoas que participam de fatos relatados em
notícias ou reportagens.
O estilo: marcas linguísticas e enunciativas do autor;
conjuntos particulares de sequências de frases.
O tom da crônica brasileira, ao tratar os fatos da vida cotidiana,
é um tom despretensioso, muitas vezes poético, outras vezes
filosófico, mas sempre divertido.
Mais que o fato em si, os cronistas destacam a interpretação
que fazem dele, como se fossem retratos de ocasiões fora do
tempo. Ivan Ângelo, escritor e cronista brasileiro, analisa alguns
aspectos quanto ao estilo da crônica:

Elementos que não funcionam na crônica: grandiloquência,


sectarismo, enrolação, arrogância, prolixidade. Elementos que
funcionam: humor, intimidade, lirismo, surpresa, estilo, elegância,
solidariedade (CENPEC, 2010, p. 19).

Na crônica, o autor procura envolver o leitor, seduzindo-o


para, com ele, lançar sobre situações do cotidiano olhares irônicos,
sérios ou poéticos, mas, geralmente, agudos e atentos.
A seguir, você lerá apontamentos sobre um gênero da ordem
do expor, conforme a organização de Schneuwly e Dolz (2004, p.
121), trata-se da entrevista.

A entrevista – gênero da ordem do expor


Os elementos que caracterizam o gênero discursivo entrevista
estão relacionados a seguir.
O contexto de produção do texto: dados sobre o autor, o tipo
de leitor, o objetivo, os locais de circulação possível do texto.
O contexto em que se produz o gênero entrevista caracteriza-
se pela influência que as expectativas do público produzem no
processo de interação dos participantes.
O discurso produzido pela entrevista pode influenciar sobre-
maneira a formação crítica da plateia ou do público leitor, pois nela
sempre há uma discussão das ideias, dos valores e dos pontos de
vista dos participantes.
O conteúdo temático do gênero entrevista: os temas
comumente tratados em textos desse gênero.
O gênero entrevista é construído a partir da perspectiva dos
participantes, em relação ao tema sugerido pela grade de um pro-
grama de uma instituição, que pode ser um jornal, uma revista, uma
emissora de TV ou de rádio etc. Os temas variam entre política,
moda, arte, ciência, educação, entre outros.
A forma composicional do gênero entrevista: a estrutura, a
organização dos elementos dos textos do gênero.
A entrevista caracteriza-se pela atuação de dois ou mais
participantes que constroem seu discurso a partir de um tema, que
costuma ser de interesse da comunidade. Pelo formato de perguntas
e respostas, pode-se afirmar que há uma adequação do gêneroao
contexto da produção.
Os participantes classificam-se em participantes efetivos
(entrevistador/entrevistado) e participantes observadores
(plateia). Os papéis dos participantes podem se inverter, além de
haver a possibilidade da participação do público, em alguns casos.
Pode-se dizer que a entrevista apresenta uma pluralidade de vozes
ao constituir-se dos discursos dos participantes e, também, do
público.
O estilo do gênero entrevista: marcas linguísticas e
enunciativas do autor; conjuntos particulares de sequências de
frases.
Por ser uma prática discursiva pré-elaborada, em que, em
geral, o entrevistador tem um roteiro de questões a ser seguido, a
entrevista sofre influência direta ou indireta do contexto no qual
estão inseridos os participantes, por questão do tempo
cronometrado, das influências ideológicas do contexto social etc.
No momento da revisão do texto da entrevista, a linguagem
deve adequar-se ao tema e ao meio de comunicação em que será
publicada ou levada ao ar.
A seguir, você lerá uma entrevista com Ziraldo, cartunista,
autor do livro O Menino Maluquinho. Na entrevista, publicada em
maio de 2006, Ziraldo (Figura 2) responde às perguntas elaboradas
pelo site do programa na TVE Brasil, sobre o livro O Menino
Maluquinho (Figura 3).
Entrevista de Ziraldo ––––––––––––––––––––––––––––––––––

Figura 3 Menino Maluquinho


Figura 2 Ziraldo

Você disse: "Dá para chorar", quando ouviu a Música do Menino Maluquinho
na Central do Brasil, na inauguração do trem da Supervia, que serve aos
subúrbios do Rio de Janeiro, adesivado em homenagem à série Um Menino
Muito Maluquinho, da TVE Brasil. Fale sobre essa emoção…
Ziraldo - É claro que isso é emocionante, mas essa é a minha vida. Eu já estou
há tanto tempo nesse tipo de existência, desenhando, escrevendo, em contato
com o público... Chegar em um colégio e ter trezentos meninos gritando é a minha
vida. Eu gosto muito porque isso me desobrigou de fazer análise, porque eu tenho
uma carência afetiva danada que eu mesmo reconheço. Eu gosto muito de
carinho, eu sou o neto mais velho, dentre trinta e tantos netos, então eu fiqueimal
acostumado, isso me dá uma sensação de calor
Como foi a criação do personagem?
Ziraldo - Eu só faço coisas que eu acredito. Escrevo, desenho, produzo, e sem-
pre com muito zelo. Eu acho que o Menino Maluquinho foi uma dessas sortes que
você dá na vida. Você tem que se preparar para viver e poder viver do trabalho
que você gosta de fazer não é esforço nenhum para mim, não é batalha e sim um
privilégio.
O Menino Maluquinho fala ao coração das pessoas, pois elas se identificam como
personagem. Num paralelo com as histórias de quadrinhos americanas, tem uma
tirinha de um menino americano chamado "Calvin" que é muito diferente do
Menino Maluquinho brasileiro. 0s pais do "Calvin" o reprimem, não deixamo
menino ter sentimento. Aí, um desses meninos sobe em cima do terraço e
metralha duzentas pessoas no colégio. O Menino Maluquinho é um menino mais
afetuoso. Pai americano não chama o filho de "filhão", não conta vantagem do filho
no escritório, não interrompe uma reunião para atender telefonema de filho.
O que te seduz mais no Menino Maluquinho?
Ziraldo - Se a gente fosse um país justo, a gente não teria violência nenhuma,
pois o brasileiro é muito afetuoso. O Menino Maluquinho é um personagem que
trabalha muito com o afeto. Se você for analisar bem, é a única coisa importantena
vida. Quando você fica velho, você descobre que nada é mais importante que o
afeto, gostar e precisar do próximo e admitir que precisa do amor dele
O que representou o Trem da TVE Brasil, adesivado para a Série Um Menino
Muito Maluquinho, da TVE Brasil, exibida aos domingos, às 18:30?
Ziraldo - O trem foi uma das formas absolutamente fantásticas de o personagem
ser reconhecido como uma criação importante da literatura infantil brasileira, da
arte brasileira. Ele já virou filme, ópera, cantata, e agora virou um trem. Ele está
cumprindo o destino dele.
Como foi ser abordado, de repente, pelo pai de um menino que era seu fã, ao
sair da Central do Brasil, depois da volta no trem da TVE Brasil, com os
estudantes da escola Municipal General Mitre?
Ziraldo - O pai do menino que me abordou é um homem do povo, com aquela
cara simples, boa e até severa. Se todos os pais do Brasil fossem iguais a ele, a
gente estava salvo. Ele disse: "Rapaz, meu filho é seu fã, dá um autógrafo para o
meu filho!". Uma bela figura. Essa coisa é maior do que tudo. Ele pegando um trem
da central para ir para casa e levando um autógrafo para o filho. E depois vai levar
o filho dele no trem da TVE Brasil, como eu expliquei para ele, basta sóacertar a
hora.
Menino Maluquinho é um menino feliz, um menino que tem direito a
felicidade. Você se coloca ou não no personagem?
Ziraldo - Não há nada que você escreva que não tenha a ver com sua vida. Eu
tinha 48 anos quando escrevi o Menino Maluquinho, ou seja, já era um senhor, já
tinha visto causa e consequência. O que acontece é que eu já tinha perdido um
bocado de amigos, já tinha percebido o que ia acontecer com cada um dos me-
ninos da minha turma, como eles eram e que destino que eles tiveram. O Menino
Maluquinho diz o seguinte: Se você tem uma infância onde, principalmente, vocêé
amado, a chance de você ser uma pessoa melhor é infinita. Eu não conheço
nenhum canalha que tenha sido um menino feliz. Ele provavelmente está se
vingando dos azares que ele deu na infância. O menino Maluquinho quer disser
isso: Se você tiver um presente bom, você vai ter um futuro bom, pois o futuroé
feito de vários presentes. O que você pode fazer para o seu filho é prepará-lo para
o hoje. O futuro é inexorável.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

A entrevista reproduzida aqui foi publicada no site do canal


extinto TVE Brasil, em 2006, que exibia a série televisiva Um Me-
nino muito Maluquinho, baseada na obra O Menino Maluquinho do
cartunista Ziraldo. Essa série, que teve direção de César Rodrigues
e roteiro de Anna Muylaert, é reprisada, atualmente, pelo canal TV
Brasil e, também, pelo canal a cabo Disney Channel. Vocêencontrará
informações disponíveis em: <http://www.tvbrasil.org. br/mmm/>.
Acesso em: 10 jan. 2011.
A seguir, você observará um gênero da ordem do descrever,a
receita culinária. Da mesma maneira que outros da mesma ordem,
os textos desse gênero descrevem ações para que o interlocutor se
oriente a fim de proceder a um mesmo tipo de ação.
A receita culinária – gênero da ordem do descrever- a receitaé
um gênero que tem grande apelo da cultura oral e apresenta muitas
regularidades:
• No conteúdo temático: fala de doces, bolos, salgados etc.
• Na forma composicional: em primeiro lugar, apresenta o
título e, geralmente, uma imagem ilustrativa do prato; de-pois,
os ingredientes, o modo de fazer e, por último, o rendimento.
Há uma sequência ordenada de procedimentos que deverão
ser realizados.
• No estilo: há palavras e expressões que aparecem na maioria
das receitas, como "ingredientes" e "modo de fazer" ou os
verbos "adicionar", "acrescentar", "mexer", "assar" e os
advérbios "em seguida", "após", "devagar", "delicadamente"
etc. O texto é impessoal, usa a 3º pessoa (do ponto de vista
morfológico) com valor de 2º pessoa (do ponto de vis- ta
discursivo) e o imperativo.

Veja como é simples reconhecer os elementos que


caracterizam o gênero receita culinária em um texto de receita de
bolo. Observe a Figura 4:

Açúcar
Fermento
Farinha de
Trigo em pó

Chocolate
em pó
Margarina
Leite

Figura 4 Ingredientes da receita do bolo rápido de chocolate.


Vamos ver a receita de um bolo de chocolate (Figura 5).

Bolo rápido de chocolate ––––––––––––––––––––––––––––––


Figura 5 Bolo de chocolate

Ingredientes Modo de Fazer


6 ovos Bata, primeiramente, o açúcar com a mar-
2 xícaras de açúcar garina até obter uma massa homogênea.
1 copo de leite (200 ml) Em seguida, acrescente as gemas, o óleo
¼ de copo de óleo e o leite. Mexa bem. Coloque a farinha e
2 colheres (cheias) de margarina o chocolate em pó, mexendo sempre. Fi-
3 copos de farinha de trigo nalmente, adicione o fermento. Unte uma
forma média com margarina e polvilhe
1 copo de chocolate em pó
1 colher de fermento em pó com farinha de trigo, despeje a massa e
leve-a para assar em forno pré-
aquecido.

O tema do texto do gênero receita, ilustrado pela Figura 4, é


"bolo de chocolate". A forma composicional é configurada pela
foto de um bolo de chocolate, seguida dos ingredientes e ao lado do
modo de fazer.
O estilo apresenta as regularidades do uso do imperativo
("bata", "mexa", "adicione", "acrescente", "unte", "polvilhe",
"leve") e advérbios de tempo ("primeiramente", "em seguida",
"finalmente").
Outros gêneros do mesmo domínio de comunicação apre-
sentam alguns atributos das receitas, como é o caso das instruções
de jogos ou de montagens, das bulas ou dos regulamentos.
Esperamos que você tenha compreendido quais os
elementos que caracterizam os gêneros e que tenha percebido
porque foram relacionados por Schneuwly e Dolz (2004) em ordens
e agrupados pelo domínio de circulação para que fossem estudados
emsala de aula, tudo isso tendo em vista que, quanto mais acesso,
leitura e escrita dos gêneros que circulam socialmente, mais os
nossos alunos desenvolverão sua competência leitora e escritora.
7. CONSIDERAÇÕES

Com base nas observações feitas no decorrer dos nossos


estudos sobre o tema gêneros discursivos e textuais, pudemos
concluir que estes se caracterizam por constituírem tipos
relativamente estáveis de enunciados construídos historicamente
na sociedade e vão ficando disponíveis em nossa cultura. O gênero
curriculum vitae, por exemplo, permanece com poucas variações
durante anos de utilização pelas pessoas de várias esferas sociais.
Nem por isso eles deixam de se transformar, adaptando-se às
necessidades comunicativas da sociedade conforme evoluem os
costumes e as tecnologias de comunicação. Vimos, nesse aspecto,
que a carta evoluiu para o gênero e-mail, embora os dois convivame
desempenhem suas funções sociais ao mesmo tempo.
Os gêneros discursivos, ou textuais, caracterizam-se numa
infinidade de variações, tanto que podemos citar cartas, receitas,
notícias, contos, poemas, relatórios etc., mas se apresentam em
tipologias definidas como narração, descrição, argumentação,
exposição e injunção. Schneuwly e Dolz (2004) agruparam, para
efeito de estudo e ensino, vários gêneros que apresentam
predominância de um desses tipos em gêneros da ordem do narrar,
do relatar,do argumentar, do expor e do descrever.
Dessa maneira, o espaço da sala de aula pode ser
transformado numa oficina de análise das regularidades entre
textos que caracterizam um mesmo gênero. Conhecendo-lhes as
características, sua construção composicional, a recorrência de suas
temáticas e os estilos que lhes são comuns ou que lhes
individualizam, os alunos estarão mais aptos a produzirem seus
próprios textos adequados às várias situações comunicacionais que
sua função social exige.
O papel do professor de Língua Portuguesa, na escola, exige
dele uma nova postura no tratamento da leitura, da compreensãoe
da produção de textos, sob a perspectiva da linguagem
sociointeracional dialógica, ao tomar como conteúdo de ensino os
gêneros discursivos. O professor passa a trabalhar não só com os
textos literários e científicos, mas com as diferentes modalidades
textuais, tanto orais como escritas, mais próximas do uso social que
osalunos fazem deles.
Professor e alunos passarão a usar o espaço da sala de aula
como uma oficina de análise das regularidades que caracterizam
textos de um mesmo gênero. Ao perceber as suas características, a
recorrência de suas temáticas, sua construção composicional e os
estilos que lhe são próprios, estarão mais preparados para
produzirem seus próprios textos condizentes com o contexto de
produção e de recepção que a sociedade exige.

8. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Castelo Assombrado. Disponível em: <http://www.sobrenatural.org/materia/
detalhar/8850/doze_castelos_assombrados_da_escocia/>. Acesso em: 10 jan. 2011.
Figura 2 Ziraldo. Disponível em:
<www.radio.usp.br/programa.
php?id=2&edicao=060320>. Acesso em: 24 fev. 2009.
Figura 3 Menino Maluquinho. Disponível em: <http://www.planetaeducacao.com.br/
portal/artigo.asp?artigo=4>. Acesso em: 24 fev. 2009.
Figura 5 Bolo de chocolate. Disponível em: <http://allannacarvalho.wordpress.com/
category/bolo/page/3/>. Acesso em: 10 jan. 2011.

Sites pesquisados
CENPEC. A ocasião faz o escritor. Disponível em: <http://escrevendo.cenpec.org.br/ecf/
index.php?option=com_content&task=view&id=18008>. Acesso em: 17 jun. 2010.
NOTÍCIAS DO PORTAL TVE BRASIL. Entrevista com Ziraldo para o site do programa
Um menino muito maluquinho. Disponível em: <http://www.tvebrasil.com.br/
noticias/060504_mmm_entrevziraldo.asp>. Acesso em: 2 mar. 2009.
YAMADA, L. A. Spectrum. Disponível em: <http://www.spectrumgothic.com.br/gothic/
materias/maneira_diferente.htm>. Acesso em: 5 jun. 2010.
KLEE, M. M. Fantasmas da paisagem gótica feminina: a tradição dialoga em Changing
Heaven, de Jane Urquhart. Disponível em: <http://www.ppgletras.furg.br/disserta/
marciaklee.pdf>. Acesso em: 5 jan. 2011.
SPECTRUM. Literatura gótica e sobrenatural. Disponível em: <http://spectrumgothic.
com.br/literatura/literatura_gotica.htm>. Acesso em: 1 jan. 2011.
TVCLIP.BIZ. Entrevista, em vídeo, com o cartunista Ziraldo. Disponível em: <http://www.
tvclip.biz/video/dPOwdsu4K_o/entrevista-com-ziraldo.html>. Acesso em: 10 jan. 2011.
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAKHTIN, M. M. Os gêneros do discurso. In. Estética da criação verbal. Tradução de Maria
Ermantina Galvão Gomes Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros curriculares nacionais de
Língua Portuguesa – 1º e 2º ciclos. 3. ed. Brasília: A Secretaria, 2001.
. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros
curriculares nacionais deLíngua Portuguesa – 3º e 4º ciclos. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BENASSI, M. V. B. O gênero notícia: uma proposta de análise e intervenção. In: CELLI –
Colóquio de estudos linguísticos e literários 3, 2007, Maringá. Anais. Maringá, 2009.
CENPEC. A ocasião faz o escritor. Caderno do professor: escrevendo o futuro. Coleção
Olimpíadas de Língua Portuguesa. São Paulo: Cenpec, 2010.
LAJOLO, M. Literatura: leitores e leitura. São Paulo: Moderna, 2005.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A. P.;
MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros textuais e ensino. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2003.
ROJO, R. H. Modos de transposição dos PCNs às práticas de sala de aula: progressão
curricular e projetos. In: (Org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os
PCNs. São Paulo: EDUC, 2000.
SCHENEUWLY, B; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução de Roxane
Rojo e de Gláis Sales Cordeiro. Campinas: Mercado das Letras, 2004.
Capítulo III
Que gramática é essa?
"Abuso das palavras. Só uso as que conheço,as desconhecidas são
perigosas e potencialmente traiçoeiras.
Exijo submissão.
Maltrato-as, sem dúvida.
E jamais me deixo dominar por elas" (VERÍSSIMO, 1994, p. 32).

1. OBJETIVOS
• Possibilitar a relação do aluno com o texto escrito, ajudando o a
investigar e a descobrir algumas propriedades do texto.
• Compreender e descobrir que para escrever um texto o
autor faz escolhas sobre o que e como escrever.
• Desenvolver nos alunos a capacidade de elaborar textos bem
escritos.
• Demonstrar como intervir gradativamente nos textos dos
alunos para aproximá-los da escrita convencional.

2. CONTEÚDOS
• As questões ortográficas: deve-se ou não as corrigir?
• Gramática: sim ou não?
• Reescrevendo textos.
3. INTRODUÇÃO À UNIDADE

De acordo com Falcão (2001, p. 23)

As gramáticas classificam as palavras em substantivo, adjetivo,


verbo, advérbio, conjunção, pronome, numeral, artigoe preposição.
Os poetas classificam as palavras pela alma, porque gostam de
brincar com elas, e pra brincar com elas é preciso ter intimidade
primeiro (FALCÃO, 2001, p. 23).

E você, classifica as palavras pela alma ou pela gramática?


Difícil dilema, você concorda?
Sabemos que escrever não é um ato banal e que qualquer
pessoa é capaz de o fazer, bastando, para isso, estar inspirado. Temos
consciência do que a escrita representa e que, como professores,
precisamos desenvolver no aluno a capacidade de criar textos.
Para isso, você também sabe que é preciso estimulá-lo,
proporciona-lhe condições de se tornar um usuário competente da
língua escrita.
Isso exige certas habilidades, como proceder a uma escrita
inicial, reescrever passando por várias etapas com o estabeleci-
mento de metas (o que escrever, para quem escrever, como escrever,
qual o gênero escolhido) e a organização de ideias, produzidas e
devidamente elaboradas com base nos conhecimentos do escritor.
Em um discurso escrito, é necessário muito mais que um
amontoado de palavras. É importante que o aluno tenha conheci-
mento de todos os fatores de textualidade que, no interior do seu
texto, permitirão que ele seja reconhecido como uma totalidade
semântica e não só como um conjunto aleatório de trechos isola-
dos.
Aprender a escrever significa pesquisar e descobrir de que
maneira se articula a língua para produzir e interpretar textos.
Quando falamos, você sabe que a emoção e a argumentação são
representadas também pelo olhar e pelo tom de voz, por exemplo.Já
na escrita, esses elementos não estão presentes, por isso é
necessário encontrar outras formas de articular a língua escrita, a fim
de que esses elementos apareçam e tornem o texto significativo para
o leitor.
Na escrita, trabalhamos com um interlocutor ausente, virtual,
e tudo o que queremos dizer deve estar inscrito no texto. Para que o
texto produza determinados efeitos capazes de criar um universo de
textualidade que permita seduzir o leitor é necessárioque se façam
escolhas nos níveis semântico, morfológico, discursivo e sintático.
Dessa forma, a gramática e a ortografia não podem ser vistas
como a memorização de regras, mas como a ação sobre a língua, o
pensar e o analisar sobre suas propriedades para construir a tessitura
do texto.
Diante disso, pretendemos trabalhar com você, nesta uni-
dade, de forma a proporcionar uma discussão sobre o papel da
gramática e da ortografia na sala de aula, apresentando algumas
estratégias que poderão ser desenvolvidas propiciando muitas
reflexões e descobertas.

4. QUESTÕES ORTOGRÁFICAS: DEVE-SE OU NÃO AS


CORRIGIR?

Quando falamos em ortografia, é importante compreender


que esse é um aspecto da língua que é fruto de uma convenção, ou
seja, de uma combinação entre falantes de um mesmo idioma.
Como fazemos parte de uma grande comunidade de falantesde
uma mesma língua, a forma de grafar as palavras é produto de
acordos ortográficos que envolvem os diversos países que falam a
Língua Portuguesa como idioma oficial.
Isso quer dizer que grafar convencionalmente as palavras
significa adequar-se a um padrão estabelecido por um acordo legal
entre os povos falantes daquela língua.
Ortografia é uma palavra de origem grega formada por orto,que
significa "correto", "exato" e por grafia que significa "escrita","ação
de escrever". Assim, essa é a parte da Gramática que se pre-ocupa
com a correta representação escrita das palavras.
De acordo com Cipro Neto (1999, p. 33):
É a ortografia, portanto, que fixa padrões de correção para a grafia
das palavras. Atualmente, a ortografia em nossa língua obedece a
uma combinação de critérios etimológicos (ligados à origem da
palavra) e fonológicos (ligados aos fonemas representados).

Durante muito tempo, acreditou-se que só havia um caminho


a ser seguido para se dominar as convenções ortográficas. Esse longo
e árduo caminho deveria ser conquistado por meio da
memorização das palavras. Entretanto, muitos estudiosos
demonstram que as crianças, quando chegam à escola, já levantam
hipóteses sobre como se escrevem as palavras, ou já têm
experiências com a escrita.
Sabemos que a comunicação escrita não é a mesma que a
comunicação oral. Uma das diferenças é que, no texto escrito, há
maior necessidade de explicitação daquilo que será comunicado. O
que o escritor deseja enfatizar deverá ser explicado detalhada-
mente ao leitor.
Desde o momento em que a criança constrói a base alfabética,
quer dizer, após o estabelecimento da correspondência letra/som, e
da compreensão de que grafamos duas ou mais letras para cada
sílaba, vem a parte complicada que é, exatamente, dominar as
convenções ortográficas.

Ortographia ou ortografia? Eis a questão!

Um dilema que os professores vivem gira em torno das questões


que eles se colocam: devo corrigir os erros de ortografia de meus
alunos? Devo considerar esses erros na hora de avaliar? Como
ensinar ortografia?
Essas dúvidas têm fundamento porque são reflexos das
discussões sobre o que priorizar no ensino de Língua Materna. Feliz-
mente, hoje, já sabemos que é papel da escola formar alunos que
leiam e produzam textos significativos.
Para isso, a leitura e a produção de textos tornaram-se os eixos
orientadores do trabalho com a língua, e para que os alunos
produzam textos significativos e aceitos socialmente é preciso queo
professor ensine, também, a ortografia.
Dessa forma, a ortografia é, geralmente, um aspecto muito
cobrado, mas pouco ensinado. A escola cria poucas oportunidadesde
refletir com as crianças a respeito das peculiaridades ortográficas na
nossa língua.
É provável que você se lembre de ter lido em algum documento
antigo algumas palavras escritas como: "pharmácia", "encyclopédia",
"commércio", "architetura", "biographia", "grammatica
descriptiva","syntaxe", "indifferença", "sciencia".
A própria palavra "ortographia" era escrita assim! Essas for-mas
foram sendo substituídas por várias reformas ortográficas que
definiram, também, o uso dos acentos e dos dígrafos etc.
Na linguagem oral, a pronúncia das pessoas varia não somente
de acordo com a região e com o grupo social, como também deépoca
para época. Se todos, então, escrevessem como falam, não
decifraríamos a intenção do autor nos textos escritos. A ortografia
existe como um recurso para cristalizar na escrita os modos desiguais
de falar das pessoas que usam uma mesma língua.
Nesse contexto, torna-se um imperativo trabalho pedagógico
do professor propor situações interessantes e desafiadoraspara que
as crianças descubram quais são as regras do jogo da convenção
ortográfica. Assim, descobrir o que sabem sobre a língua, que
hipóteses fazem sobre a escrita das palavras, como percebem as
razões e as não razões das formas estabelecidas para a grafia das
palavras são desafios centrais para o professor, não só o de Língua
Materna.
Em nossa língua, há muitos casos em que um mesmo som pode
ser grafado por mais de uma letra, por exemplo, "cigarro", "seguro",
"auxílio"; por outro lado, uma mesma letra serve para representar
mais de um som, como em "gato" e em "gelo", não é mesmo?
Pois bem, se uma criança escreve "sidade" (cidade), "oje"
(hoje), "cachoro" (cachorro) e "honrrado" (honrado), sabemos que
todas essas grafias contêm erros, mas eles são de naturezas dife-
rentes.
Na primeira situação (em "cidade" e "hoje"), não existem regras
ou princípios que esclareçam por que essas palavras devem ser
escritas assim, com "c" e com "h". Na segunda situação (em
"cachorro" e "honrado"), existem regras que explicam por que a
primeira grafia correta é com "rr" e a segunda com "r"; neste caso,é
possível compreender.
De acordo com Morais (2001, p. 3),
A norma ortográfica de nossa língua apresenta regularidades e ir-
regularidades e estamos, nesses casos, diante de dois tipos de
dificuldade ortográfica: uma irregular e outra regular.

Nas dificuldades irregulares, a grafia se justifica pela tradição


de uso, ou pela origem (etimologia) da palavra, assim, não existe uma
regra; o aprendiz precisará, neste caso, memorizar a forma correta
em "cidade" e "hoje".
Nas dificuldades regulares, existe um princípio gerador, uma
regra que se aplica a várias (ou a todas) as palavras da língua em que
aparece esse fenômeno, como no caso do emprego de "r" ou"rr" nas
palavras "honra" e "cachorro". Neste caso, podemos prever a grafia
correta sem nunca ter visto a palavra antes.
Sendo assim, o professor precisará se organizar e materializar
sua prática pedagógica de modo que os alunos sejam desafidos a
descobrir as regularidades e as irregularidades das palavrasda língua
escrita, ou seja, do nosso sistema ortográfico. Vamos pensar melhor
nesse assunto no decorrer desta unidade!
Como ensinar ortografia?
Certamente, você já deve estar se fazendo essa pergunta. Para
respondê-la, Morais (2001, p. 3) continua ensinando que estamos
diante de dois tipos de dificuldades ortográficas – irregulares e
regulares:
No caso das dificuldades irregulares, o uso de uma letra (ou dígrafo)
é justificado apenas pela tradição de uso ou pela origem (etimologia)
da palavra. Como não existe uma regra, o aprendiz vai ter que
memorizar a forma correta, como acontece com o C e com o H nas
palavras "cidade" e "hoje".

No caso das dificuldades regulares podemos prever a forma cor-


reta sem nunca ter visto a palavra antes. Inferimos a forma correta
porque existe um "princípio gerativo", uma regra que se aplica a vá-
rias (ou todas) as palavras da língua nas quais aparece a dificuldade
em questão. É, por exemplo, o que ocorre com o emprego de R ou
RR em palavras como "honra" e "cachorro".
Vejamos alguns casos de regularidades nas normas ortográficas.
Um tipo de regularidade entre letra e som, entre outros, é o que
depende do contexto, dentro da palavra, em que a letra (ou o
dígrafo) vai ser usada. Um exemplo disso é a diferença entre o "r"e
o "rr". Observando o contexto, sempre é possível escrever
corretamente, sem precisar memorizar.
Para o som de "r" forte, usamos "r" tanto no início da palavra (como
em "risada") quanto no começo de sílabas precedidas de
consoantes (como em "genro") ou no final de sílabas (como em
"porta"). Quando o mesmo som de "r" forte aparece entre vogais,
sabemos que temos de usar "rr", como em "carro" e "serrote" ;
quando que-remos registrar o outro som do "r", que chamamos
de "brando" ou "tremido", usamos só "r", em palavras como
"careca" e "braço"(MORAIS, 2001, p. 4).

Outro tipo de regularidade em que a compreensão nos


permite escrever com segurança é o caso de "portuguesa",
"inglesa", que sabemos que devemos grafar com "s", enquanto
"beleza", "pobreza" devem ser grafadas com "z".
Nesse caso, não é difícil compreender que adjetivos que in-
dicam o lugar onde as pessoas nascem são escritos com "esa", en-
quanto em substantivos derivados se emprega "eza".
O que queremos salientar, com base nas orientações do
professor Artur Gomes de Moraes, é que, nos casos que envolvem
regularidades, é preciso ajudar os alunos a compreenderem as re-
gras, lembrando que compreender não é decorar. Quando o aluno
decora certas regras, sem compreendê-las, nem sempre consegue
as aplicar. Portanto, a compreensão delas é que dará segurança ao
aprendiz.
Agora, vejamos alguns casos de irregularidades nas normas
ortográficas:
Há irregularidades que se concentram na escrita de determi-
nados sons, tais como:

1) "som de S": "seguro", "cidade", "auxílio", "cassino", "pis-cina"


etc.;
2) "som de G": "girafa", "jiló";
3) "som de Z": "zebu", "casa" e "exame";
4) disputa entre X e CH: "enxada", "enchente";
5) outras letras, como o H inicial.

Nesses casos, em que não há regras claras, Morais (2001,


p. 8) assegura que:

Considerando que a ortografia é uma "norma" que se arbitrou


socialmente como correta e por ser um conhecimento
convencional, normativo, não devemos apostar na Ideia de que o
aluno vá descobri-lo sozinho. Ele precisará de situações que
estimulem a reflexãosistemática sobre as características de nossa
norma ortográfica.

Para ajudar o aprendiz nessas situações, é preciso incentivá-


lo consultar o dicionário e a memorizar a grafia das palavras.
É importante, porém, que o professor priorize as palavras
que as crianças usam com frequência, como "homem", "hora", no
caso do "h" inicial, em vez de "holofote", "harpa", que, certamente,
quase não utilizam, por enquanto.
A leitura também é uma estratégia agradável de se visualizar
a grafia correta das palavras, sem preocupação específica comisso.

Como ensinar, então? Corrigir ou não corrigir?


Quanto às estratégias de ensino, é preciso estar claro que
corrigir e ensinar não significam a mesma coisa. O ensino
sistemático implica o uso de atividades que instiguem a
compreensão de dificuldades ortográficas específicas.
Para as dificuldades regulares Morais (2001, p. 9-10) orienta
que é conveniente usar estratégias que estimulem a compreensão
das dificuldades específicas, sugerindo:
Ditados interativos: faça o ditado de um texto que os alunos conhecem,
com pausas específicas, convidando as crianças a focalizar e discutir
questões ortográficas previamente selecionadas. Por exemplo, se você
quer focalizar o emprego do "o" ou do "u" no final das palavras, pode ditar
uma frase com a palavra "cavalo" elevantar questões do tipo: uma pessoa
que não sabe escrever a palavra "cavalo" poderia se enganar? Por quê? E
uma pessoa que sabe escrever, como colocaria? Continue, assim,
interrompendo oditado de vez em quando para focalizar outras palavras
com essadificuldade.
Leitura com focalização: durante a releitura coletiva de um texto
conhecido, faça interrupções para debater a grafia de certas palavras,
levantando questões do tipo das usadas no ditado interativo.
Jogos de reflexão ortográfica: dedicados ao estudo de uma dificuldade
específica. Se a meta for, por exemplo, discutir o emprego do"r" e do "rr",
peça para as crianças classificarem, em uma lista de palavras contendo "r"
e "rr", quais, entre elas, são parecidas. Feitoisso, discuta o motivo de cada
palavra estar em um grupo ou no outro. Em outra atividade, peça para
formarem, ou pesquisarem, outras palavras parecidas, discutindo as
soluções encontradas.
O importante nessas três estratégias é as crianças observa-
rem sempre o contraste entre as formas certas e erradas, e serem
estimuladas a compreender e a verbalizar as descobertas.
Para as dificuldades irregulares, algumas medidas são
importantes para Morais (2001, p. 11):
Selecionar palavras de uso frequente. Você pode combinar com
a turma, definindo as palavras, por exemplo, as que contêm "ch",
que precisarão memorizar, porque estão errando muito em seus
textos.
Uma segunda estratégia de trabalho com irregularidades
ortográficas requer o aprendizado do uso do dicionário, ou do
"pai dos sabidos", desmistificando uma outra metáfora, mais
conhecida, queusamos para chamar o dicionário.

Você se lembra qual é a metáfora desmistificada para o


dicionário quando se usa para ele "pai dos sabidos"?
No trabalho com a língua, que é tão específico, é importante
que o professor jogue às claras e explicite aos alunos suas táticas,
que divida com eles as dúvidas, incertezas, e ensine-os a procurar,
investigar, para que, realmente, tomem consciência dos fatos da
língua.
Acreditamos que garantir que essas aprendizagens
adquiram função social, ou seja, que sejam aprendizagens para a
vida de cidadãos letrados, consiste em criar oportunidades de
reflexão acerca das dificuldades ortográficas para ensinar de fato,
em lugarde somente cobrar uma escrita correta.
O trabalho com a leitura e a produção de textos é o foco
central do ensino da língua. O trabalho com as regularidades e ir-
regularidades está a serviço da revisão e editoração dos textos. E,
sabemos, a ortografia é um aspecto que aprendemos a vida inteira.
Vamos a um desafio: responda ao jogo dos 16 erros.
A seguir, temos um texto, no qual você encontrará 16 erros de
grafia. Descubra as palavras que estão erradas e circule-as comlápis
de cor – aproveitando, assim, para aprender um truque bemlegal!

Jogo dos 16 erros ––––––––––––––––––––––––––––––––––––


Que tal disafiar um amigo a resolver um inigma? Dê a ele um balão de gás, um
pedaço de barbante, uma folha de papel e uma tisoura. Disafie ele a deixar o balão
istacionado sozinho no ar bem na frente do seu rosto.
Si o seu amigo soltar o balão, ele irá parar no teto. Si ele amarrar a folha nele, o
balão não sairá do chão. Quando ele disistir, você mostra como se faz:
Amarri a folha no balão. Dipois, vá cortando pedacinhos dela. À medida que vocêfor
cortando, o balão vai ficar mais levi e começará a subir. Aí é só parar de cortar
quando ele istiver na altura do seu rosto.
Sabi por que isso acontece? Por causa de uma força chamada impuxo. Foi um
cientista chamado Arquimedes que discobriu essa força. Ele percebeu que todo
objeto mergulhado num líquido ou gás é impurrado para cima por essa força. Você
sabia que é por isso que seu corpo sobe sozinho quando você mergulha em uma
piscina? (CARVALHO, 2003).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Você pode ter percebido que essa experiência não é um


truque: é um princípio científico! E os 16 erros? Descobriu todos?
Então escreva as palavras circuladas, corrigindo os erros:
Essa é uma atividade diagnóstica para saber se usam i no lugar
de e.
Você deve ter observado as seguintes palavras que deveriam
ser grafadas com e e foram grafadas com i, como reflexo da forma
com que se fala:

1) disafiar
2) inigma
3) tisoura
4) Disafie
5) Istacionado
6) Si
7) Si
8) Disistir
9) Amarri
10) Dipois
11) levi
12) istiver
13) Sabi
14) Impuxo
15) Discobriu
16) Empurrado

No momento da correção, esteja atento aos erros não


percebidos pelos alunos. É desse diagnóstico e da observação dos
erroscometidos espontaneamente por eles que você poderá decidir
seainda é necessário realizar mais atividades de sistematização com
essas duas letras.

5. GRAMÁTICA: SIM OU NÃO?

Segundo Falcão (2010, p. 23):


A palavra nuvem chove. A palavra triste chora. A palavra sono
dorme. A palavra tempo passa. A palavra fogo queima.A palavra
faca corta. A palavra carro corre. A palavra diz. O que quer. E nunca
desdiz depois.
Desde pequena, muito antes de entrar na escola, a criança
emprega na oralidade a gramática da Língua Materna, isto é, ela
sabe usar as estruturas básicas da sua língua para se comunicar; ela
não diz "levar mamãe eu vai você na escola", mas, naturalmente,
ela aprende a perguntar: "Mamãe, você vai me levar na escola?".
Porém, ao entrar na escola, ela vai descobrir que a gramática
que usa de forma espontânea não é adequada, e que, por isso, deve
aprender regras pala falar e escrever bem.
Com essa boa intenção, a escola faz uso de exercícios e mais
exercícios isolados, descontextualizados, sobre diferentes aspectos
gramaticais e que ocupam lugar de destaque no processo de ensino
e aprendizagem da língua desde as primeiras séries.
Nesse sentido, a escola acredita que a repetição poderá
oferecer ao aluno os recursos necessários, as condições ideais para
falar "corretamente" e produzir textos bem escritos.
No entanto, a criança faz os exaustivos exercícios, acerta a
maioria deles, mas não consegue aplicar tais conhecimentos em
situações formais de escrita. Um exemplo característico é aquele
em que o Joãozinho, o aluno, escreve a palavra cabeu em vez de
coube na sua redação. A professora pede-lhe, então, para escrever
100 vezes a palavra coube. Ao final da folha de papel, o garoto,
preocupado, diz à professora:
— Fessora, só cabeu 90 vezes!
Outro exemplo típico é a separação de sílabas. A criança faz
inúmeros exercícios de: "Separe as sílabas das palavras". Depois de
tanto pelejar para "juntar" as sílabas, por que treinar a separação?
Dessa forma, muito tempo da aula é gasto com exercíciose
mais exercícios. Mas, em uma situação de produção de texto o
aluno, muitas vezes, demonstra não saber separar a palavra quando
a linha termina. Na maioria das vezes, como aprendeu fora de
contexto, erra a separação da sílaba na troca de linha.
Não estamos dizendo que é necessário abolir a gramática das
aulas de Língua Portuguesa, uma vez que ela faz parte da necessária
postura de reflexão do falante sobre sua própria língua. O que
estamos dizendo é que a gramática existe em função do texto,e não
o texto em função da gramática.
Isso implica dizer que, depois de usar, já competentemente, a
língua escrita em suas estruturas básicas, ou seja, depois de já saber
escrever textos que se possa ler e compreender, é possível e
desejável que a criança comece a refletir sobre os aspectos que
podem deixar um texto mais bem escrito. Nesse momento,
poderão iniciar as situações problemas de reflexão sobre os
aspectos gramaticais que fazem sentido serem discutidos para
melhorar ospróprios textos dos alunos.
As reflexões sobre os aspectos gramaticais da língua na escola
são importantes oportunidades para desenvolver o raciocíniológico,
além de esclarecer dúvidas sobre a melhor forma de escrever o que
se quer dizer.
De nada adiantam, porém, os exercícios repetitivos sem que
os alunos saibam por que o estão fazendo, pois eles só constroem
seus conhecimentos sobre a gramática da língua e fazem uso desses
conhecimentos de forma adequada quando compreendem o seu
uso.
Vejamos uma situação-problema que a professora Ana Tereza
Naspolini (1996) colocou a um grupo de professores que insistiam
em priorizar o estudo da gramática normativa em suas aulas de
Língua Portuguesa em detrimento da leitura e da produção de
textos.
Durante nossa vida como alunos, temos estudado gramáticae
feito muitos e muitos exercícios. Eis aqui alguns para você testar
seus conhecimentos gramaticais:

1. Classifique quanto ao tipo, as consoantes P, da palavra pátio, e


V, da palavra favor.
2. Qual é a regra que explica o uso do hífen na palavra antissemitismo?
3. Qual o significado do coletivo sínodo?
4. Qual o plural de cavalo-vapor? Dê a regra correspondente.
5. Qual o feminino de frei?
6. Qual é a locução adjetiva correspondente à palavra esplênico?
7. Dê a segunda pessoa do plural do pretérito mais-que-perfeito
do verbo pagar.
8. Qual a função sintática da palavra lhes, na frase: "Aos companheiros ofereci-
lhes ajuda"? (NASPOLINI, 1996, p. 166).

A intenção da professora, formadora de professores, era


provocar a reflexão sobre a função do estudo dos aspectos grama-
ticais na escola, principalmente no Ensino Fundamental de 1ª a 4ª
séries.
Conforme o Novo Acordo Ortográfico, a palavra grafada na
tes como antissemitismo perdeu o hífen, sendo o correto, agora,
antissemitismo.
Observe que seria preciso uma pesquisa nas gramáticas e nos
dicionários para responder a essas questões que cobram aspectos
fonológicos, morfológicos e sintáticos ao mesmo tempo, mas não
saber as responder não impede ninguém de saber falar ou escrever
um texto coeso e coerente.
É importante que você saiba que um trabalho de linguagem
na escola não pretende formar gramáticos, mas usuários
competentes da comunicação falada e escrita.
Falar bem e escrever bem dependem, sim, de vários aspectos
relacionados, por exemplo, à leitura, para ter o que dizer; ao
conhecimento dos gêneros discursivos e textuais, para saber como
dizer; a aspectos estilísticos, para saber como melhor dizer; a
aspectos ortográficos, para saber como escrever segundo as
convenções ortográficas da língua; a aspectos semânticos para dar
conta dos possíveis significados das palavras e expressões; às
relações sintáticas básicas entre os termos da oração. Saber
classificar essestermos implica abstrair as funções desses elementos
nos períodos,o que não garante que o falante organize bem suas
frases tanto falando como escrevendo. Por outro lado, à medida
que o escrevente vai aprofundando no ofício de escrever, por vezes
ele terá necessidade de buscar a função dos termos para melhor
organizá-los no período para assumirem o sentido pretendido.
Gramática é uma palavra de origem grega formada a partir de
grámma, que significa "letra". Segundo Cipro Neto (1998, p. 16),
Originalmente, Gramática era o nome das técnicas de escrita e lei-
tura. Posteriormente, passou a designar o conjunto de regras que
garantem o uso modelar da língua – a chamada Gramática
normativa, que estabelece padrões de certo e errado para as
formasdo idioma. Gramática é, atualmente, a descrição científica
do funcionamento de uma língua. Nesse caso, é chamada de
Gramática descritiva.

Podemos depreender que, conforme a finalidade da


gramática, há uma denominação e um conceito específicos.
A metodologia de ensino pautada pela gramática normativa,
aquela que apresenta as normas e as regras consideradas corretas
para o uso da língua escrita, centra-se nas propostas de exercícios
isolados e repetitivos, com base em palavras ou frases sobre um
determinado assunto gramatical que está sendo ensinado.
A prática do professor centrada somente nesta forma de
enxergar os aspectos gramaticais da língua tem o objetivo de separar
o certo do errado. Nessa postura, ele pode posicionar-se diante da
resolução dos exercícios e na correção dos textos de seus alunos
como se existisse uma única "forma correta" de realização dalíngua.
Isso porque ela estaria inspirada nas normas socialmente aceitas
pelos dialetos de prestígio da comunidade linguística que
condenariam as formas adotadas por grupos socioeconômicos
menos favorecidos.
Sob esse ponto de vista, seria considerado incorreto o uso de"a
gente" em lugar de "nós", tanto na posição de sujeito como na de
complemento (a gente foi, ela viu a gente).
Na gramática descritiva, que se ocupa de descrever o
conjunto de regras que realmente os falantes usam, os linguistas
têmo objetivo de registrar e de descrever esses usos no momento
atual, isto é, registrar a língua tal como é falada neste momento
histórico.
Esses linguistas têm a preocupação de tornar conhecidas, de
forma explícita, as regras de fato utilizadas pelos falantes. Por isso
não estão preocupados em determinar o certo e o errado, mas em
compreender como os falantes lidam com as estruturas da língua.
Exemplificando: eles já observaram, e registraram que, há
muito tempo, nós, falantes da Língua Portuguesa, não usamos mais
certas colocações do pronome, como em "Far-me-íes o favor de
entregar essa missiva a meus pais?" ou "Vós faríeis a mim o favor
de entregar esta missiva a meus pais?". Certamente, diríamos
"Você poderia me fazer o favor de entregar esta carta a meus pais?".
A gramática pedagógica ou aplicada é aquela ensinada por
meio de atividades com elementos, conceitos ou marcas
linguísticas retirados de um texto. São as atividades do tipo "Retire
do texto duas frases em que apareçam substantivos próprios; dois
verbos que se referem a Narizinho" ou "Releia o terceiro parágrafo,
grife os verbos e reescreva o trecho colocando os verbos no
pretérito perfeito" etc.
Uma outra possibilidade de trabalho com a gramática é o que
se chama de gramática textual, em que, geralmente, se confrontam
dois textos e se propõe que o aluno observe, localize e investigue
os aspectos gramaticais desses dois textos. Por exemplo, o uso de
tempos verbais, a presença de figuras de linguagem, a organização
dos componentes de uma oração, o uso de substantivos e de
adjetivos e as suas funções dentro dos textos, tanto semânticas,
como sintáticas ou morfológicas.
O importante nessa proposta é que se compreenda em que
medida o uso de uma forma ou outra faz diferença para os sentidos
que o autor quer dar aos textos. Por isso o trabalho comparativo de
dois textos é mais rico e dinâmico do que o estudo com um só.
Assim, a professora Ana Tereza Naspolini propôs ao mesmos
professores uma atividade com base na gramática textual
preparada por Cócco e Hailer (1995) (apud NASPOLINI, 1996, p.
171), que comparava a crônica No botequim, de Jô Soares, e a letra
de música Conversa de botequim, de Noel Rosa. Algumas questões
daatividades eram:

Observe, em No botequim, as palavras rosquinha e cafezinho. Quais


delas estão no diminutivo? Com que intenção elas foram usadas no
texto (carinho, tamanho, gozação etc.)? Em Conversa de botequim
não aparecem palavras no diminutivo. Qual é a relação desse fato
com o comportamento do freguês? (in: NASPOLINI, 1996, p. 171).

Podemos observar que há sentido na abordagem dos


aspectos gramaticais nessa proposta, pois a análise está a serviço da
melhor compreensão dos textos. Por isso, acreditamos que refletir
com os alunos sobre como os textos bem escritos usam as várias
possibilidades de estruturação das orações da língua para dizeremo
que querem dizer é um bom caminho para que eles também
encontrem as melhores formas de escreverem o que querem dizer.
Certamente, aprende-se a ler lendo, aprende-se a escrever
lendo e escrevendo. Dessa forma, o conhecimento dos elementos
gramaticais que estruturam as formas de dizer em nosso idioma ea
reflexão sobre sua função dentro dos textos só tem a contribuirpara
o melhor manejo da língua tanto oral como escrita. Contudo,só têm
sentido quando o professor sabe por que e para que está se
referindo a este ou a aquele aspecto gramatical.
Diante disso, Bagno (1999, p. 37-38) diz que:
Se durante todos esses anos os professores tivessem chamado a
atenção dos alunos para o que é realmente interessante e
importante, se tivessem desenvolvido as habilidades de
expressão dos alunos, em vez de entupir suas aulas com regras
ilógicas e nomenclaturas incoerentes, as pessoas sentiriam muito
mais confiança e prazer no momento de usar os recursos de seu
idioma, que afinal é um instrumento maravilhoso e que pertence
a todos!
Realmente, será necessário o professor saber selecionar o
que é relevante os alunos saberem sobre os aspectos gramaticais,
priorizando os que fazem diferença para a compreensão dos sen-
tidos dos textos, ou para a melhor expressão quando produzirem
textos.
Apresentaremos, agora, algumas possibilidades de trabalho
de análise de alguns aspectos gramaticais relevantes em textos.

Atividade de exploração dos aspectos gramaticais dos textos

Leia os dois textos a seguir procurando observar as diferenças


entre eles.

Esopo ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A gansa dos ovos de ouro
Certa manhã, um ambicioso fazendeiro descobriu que sua gansa tinha posto um
ovo de ouro. Apanhou o ovo, correu para casa, mostrou-o à mulher, dizendo:
— Veja! Estamos ricos!
Levou o ovo ao mercado e vendeu-o por um bom preço.
Na manhã seguinte, a gansa tinha posto outro ovo de ouro, que o fazendeiro
vendeu ao melhor preço.
E assim aconteceu durante muitos dias.
Mas, quanto mais rico ficava o fazendeiro, mais dinheiro queria.
E pensou:
"Se esta gansa põe ovos de ouro, dentro dela deve haver um tesouro!" Matou a
gansa e, por dentro, a gansa era igual a qualquer outra.
Quem tudo quer tudo perde.
A gansa dos ovos de ouro
Tinha certo casal
A sorte de ter uma gansa que botava ovos de ouro.Ainda com toda sorte
Achavam que enriqueciam pouco.
— Essa gansa deve ser por dentro de ouro! dizia a mulher.
O marido, não menos ganancioso,Matou a dourada gansa.
Tarde demais...
descobriram que era uma gansa comum.Gastaram o pouco que tinham
E hoje não têm nenhum.
Não tente forçar demais a sorte (in NASPOLINI, 1996, p. 57)
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Você saberia dizer do que falam os textos? O que você notou


de diferente na forma de se organizarem?
Comparando os dois textos, podemos perceber que o tema das
histórias contadas é o mesmo. No entanto, a forma de organizá-los
difere de um para o outro. Tais diferenças são basicamente quanto
à extensão do texto e quanto à escolha das palavras.
As duas versões da fábula têm a mesma temática: falam da
ganância das pessoas que querem sempre mais. A primeira, em
prosa, é organizada em períodos de orações, há diálogos. A segunda,
em forma de poema, é organizada em estrofes e versos.
Em qual texto percebemos que há mais detalhes sobre quando se
passou a história, o que a personagem fez, o que disse, o que
pensou?
Você pode observar com as crianças que, na primeira, a
linguagem é articulada, com mais detalhes, com organizadores
textuais como expressões que indicam tempo, lugar, referências, e
asegunda é mais sintética, mais densa, econômica.
Em qual texto podemos saber, mesmo que vagamente,
quando se passou a história? Por que será que não ficamos sabendo
emque dia, em que ano aconteceu?
Na primeira versão da fábula, as expressões "certa manhã" e
"na manhã seguinte" indicam-nos que o fato aconteceu no período
da manhã, em dois dias, mas não nos dá a certeza de "quando"
realmente aconteceu; isso é proposital, porque a fábula pretende
dar ensinamentos para todas as pessoas, em todos os tempos. Ela
pretende ser eterna.
Observe e localize nos dois textos expressões que deixam
também incertos quem são as personagens das histórias.
Você pode observar que "um fazendeiro", "à mulher", "a
gansa", no primeiro texto, e "certo casal", "uma gansa", "o mari-
do", no segundo texto são expressões genéricas que se referema
um elemento de uma espécie, mas não o denomina individual-
mente com nomes próprios, mesmo para não serem identificados;
este é outro objetivo do autor ao criar uma fábula.
Há algumas palavras destacadas nos dois textos. Procure
saber a quem elas se referem e para que servem.
As palavras destacadas são os adjetivos que atribuem
qualidades às personagens para anunciar como elas são.
O que há de diferente e especial na segunda versão da fábula
de A gansa dos ovos de ouro?
A segunda versão apresenta ritmo, sonoridade nas palavras,
às vezes rima.
Releia o primeiro texto procurando em que frase sabemos
que o fazendeiro está falando e em qual sabemos que ele está
pensando. Como sabemos isso?
Aqui é importante ajudar as crianças a observarem que há
os verbos de dizer que anunciam a fala ou o pensamento da
personagem ("dizendo", "pensou"), mas há, também, os sinais de
pontuação diferenciando cada uma (travessão na primeira e aspas
nasegunda situação).
Se a pontuação do trecho "O marido não menos ganancioso
matou a dourada gansa" fosse modificada para "O marido não me-
nos ganancioso matou a dourada gansa?", mudaria alguma coisa no
sentido da oração? Por quê?
A moral das duas versões foi escrita de modos diferentes.
Elas dizem a mesma coisa? Qual você achou melhor? Você concorda
com a moral da história?
Essa é uma discussão que somente estando com as crianças
poderá ser levada a cabo, uma vez que todos farão suas apreciações
estéticas, éticas, e darão suas opiniões pessoais.
A partir das duas versões da fábula A gansa dos ovos de ouro,
sugerimos algumas propostas de produção de textos, variando os
gêneros.

Produção de texto 1

Transforme essas duas fábulas em uma notícia. Lembre-se de que,


para isso, você deverá dizer o nome do homem e da mulher que
mataram a gansa para procurar um tesouro e, também, onde
aconteceu o fato, quando aconteceu e por quê. Não se esqueça de
criar um título bem interessante para chamar a atenção do leitor!

Produção de texto 2
A moral dessa história e de muitas outras, geralmente, são
provérbios ou ditados populares que todos conhecem. Procure
outro ditado interessante para criar a sua fábula. Escolha o modo
como você quer construir seu texto: em prosa ou em versos.
Veja alguns ditados que você poderá utilizar:
1) "Quem ri por último ri melhor".
2) "Quem ri por último não entendeu a piada".
3) "Casa de ferreiro espeto de pau".
4) "Quem desdenha quer comprar".

Produção de texto 3
Faça uma paráfrase da fábula A gansa dos ovos de ouro.
Paráfrase é uma palavra difícil que indica uma coisa fácil de entender
e de fazer... Às vezes. É um texto que repete outro texto de modo
parecido. Você pode fazer a paráfrase de um desenho que o imita,
parecido. Pode fazer uma outra fábula parecida com essa. A
paráfrase diz quase a mesma coisa dita pelo texto com algumas
modificações, com outras palavras. É como quando contamos uma
piada:repetimos, mas muda um pouco, por isso dizemos que "quem
conta um conto, aumenta um ponto".

Produção de texto 4
Se você fosse contar a fábula A gansa dos ovos de ouro a um
amigo, como seria? Registre o relato da sua história em um
rascunho. Faça uma leitura cuidadosa de sua produção e veja se
colocouo que gostaria.
Peça ao professor para ler e apontar o que deve ser
modificado. Compare o que você fez com as modificações indicadas
peloprofessor.
Depois disso, reescreva seu texto fazendo as correções
necessárias. Lembre-se de usar o travessão para indicar as falas das
personagens.
Escolha um amigo e leia para ele a história que você criou.
Além das atividades propostas anteriormente, o jogo é outro
recurso didático muito apreciado pelas crianças; podemos dizer que
quase toda atividade para crianças representa um jogo. Quando
isso é caracterizado, a situação de ensino e aprendizagem fica
explícita pelo aspecto lúdico e prazeroso, sendo o erro aceito
naturalmente e a interação com o outro natural. Por meio dele, a
criança experimenta ultrapassar seus próprios limites, adquirindo
autonomia na aprendizagem.

Jogos divertidos
Os jogos propiciam o desenvolvimento social, intelectual e
emocional nas crianças. Juntamente com as brincadeiras de faz-de-conta
e os desenhos, são meios facilitadores na descoberta da leitura e da
escrita. Ao utilizar jogos para desenvolver habilidades de leitura e
de escrita, é indispensável que o professor considere as situações
em que o ler e o escrever tenham significado para o aluno.
Vamos conhecer alguns desses jogos.
Jogo 1
O texto a seguir é uma piada. Há diálogos nela. Pontue-a e
dê boas risadas:

Piada –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A bisavó chama atenção de
seu neto Pedrinho por que acertou a cabeça do seu primo com meu ovo de ouro
e ele responde irritado
sabia ele me beliscou e a bisavó indignada pergunta mas por que você não me
chamou até pareceque a senhora ia acertar ele
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Jogo 2
Responda ao desafio: sua avó chegou da fazenda e lhe deu de
presente um galo e uma galinha, no dia seguinte, qual não foi oseu
espanto, no lugar de um ovo a galinha havia botado um enorme
diamante. O que você faria?
Caça-palavras:
Neste caça-palavras, há 15 palavras terminadas por ANÇA
ou ANSA, emaranhadas.

a) Circule as palavras que localizar e coloque-as,


posteriormente, na coluna correspondente:
CAÇA-PALAVRAS ––––––––––––––––––––––––––––––––––––
J L M S C B D U J L D M
I A L C A N Ç A H G A P
J N P A A V A N Ç A N N
K Ç Q N V I N G A N Ç A
V A Z S J Z M A N S A G
Q H N A L I A N Ç A Q U
P O U P A N Ç A E R B C
G C D G L H U R S G U R
T R A N Ç A Q U P G S U
T I N S G N S T E S Q R
Q A Ç I V Ç H T R R I S
J N A J B A J Q A P M T
H Ç M N U I L U N U N G
V A H J L M U B Ç U H J
L U I P I J L V A H G M

Fonte: CARVALHO, 2003.

Palavras terminadas em ANSA Palavras terminadas em ANÇA

b) Comparando as duas colunas, o que você observa


sobrea quantidade de palavras com cada terminação? O que você
pode concluir sobre a ortografia das palavras que têm terminação
em ANSA ou ANÇA?
O professor deve escrever na lousa as duas listas de palavras.
Certamente, os alunos vão reparar que há mais palavras escritas
com ANÇA, como criança, esperança; enquanto com ANSA só
encontramos cansa, mansa, gansa. É interessante dirigir o olhar das
crianças para o fato de queessa sequência de letras aparece com
maior frequência no final das palavras.

Questão de vida ou morte


Outro jogo muito interessante é Questão de vida ou morte.
Você conhece? O jogo é dividido em duas partes.

Questão de vida ou morte –––––––––––––––––––––––––––––


Parte I
Apresentaremos, aqui, uma lista de palavras que usaremos em uma brincadeira
antiga: Morto ou Vivo. Em casa, ou na biblioteca, complete as lacunas das pala-
vras com Ç ou S. Procure no dicionário, pergunte ao professor, ao colega. Preste
bastante atenção. Vamos lá!

pan a festan a esperan a


compreen impren a en urdecedor
can ão dan a in atisfeito
sen acional con ante imen a
can ado respon avel con ultório
cobran a bagun a in olúvel
dimen ão crian a mudan a
diferen a gan o In aciável
pan udo inven ão sen ível
aten ão pen amento man a
alian a doen a pin a
men agem avan ou semelhan a
on a in uperável men al
em aboar em aio balan o
Fonte: CARVALHO, 2003.

Parte II
Depois de feita a revisão ortográfica da lista de palavras, leia-as com bastante
atenção.
Agora, vamos ao jogo! Conheça as regras a seguir:
1) Todos devem ficar de pé, espalhados por um espaço livre; de preferência, no
pátio da escola.
2) A professora vai falar em voz alta uma das palavras da lista.
3) Caso a palavra seja escrita com Ç todos devem morrer, ou seja, devemse
agachar.
4) Caso seja escrita com S, todos devem ficar vivos, isto é, em pé.
5) Quem errar a letra que deve completar a palavra é eliminado da brincadeira.
6) O jogo termina quando sobrar apenas um participante do jogo. Esse éo
sobrevivente.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Os textos que circulam na sala de aula, na escola ou na
comunidade devem ser objetos de revisão e de edição final; um
trabalho que cuide tanto do conteúdo, como da correção
ortográfica e também da apresentação: formato, limpeza,
distribuição do texto e de eventuais ilustrações etc.
Esse respeito com o leitor e a preocupação de contentá-lo ao
enviar uma mensagem clara, limpa, correta, desvia a atenção do
aluno do medo de errar.
Reescrever os textos produzidos em sala de aula é uma das
mais significativas atividades do trabalho com a língua. É por meio
dela que os alunos se colocarão no lugar de seu leitor e poderão ser
orientados a "enxergar" as expressões adequadas ou não ao
contexto do texto, e também os desvios ortográficos.
Por isso, no Tópico 7, trataremos desse tema.

7. REESCRITA COLETIVA DE TEXTOS

Reescrever textos com base em outros sempre pode


possibilitar atividades interessantes de uso da língua escrita. De um
poema, pode-se escrever um texto em prosa e vice-versa; de uma
fábula pode-se escrever uma notícia, ou uma crônica; de um conto
pode-se escrever um texto para teatro; uma narrativa em discurso
indireto pode ganhar nova roupagem se passar para o discurso di-
reto. O essencial é a conservação do conteúdo de algo lido, ouvido
ou visto em outra forma apresentada pela criança. Uma vez que
essa atividade não implica a criação de ideias originais, pode-se
concentrar na forma, ou seja, no modo de organizar a mensagem
por escrito.
A atividade pode ser tanto individual quanto coletiva,
envolvendo pelo menos duas etapas.
Inicialmente, o professor fornece um conteúdo por escrito,
oralmente ou apresentando um texto extraverbal, e, em seguida, a
criança escreve seu texto.
Já em um segundo momento, o professor, observando os
aspectos a serem melhorados no texto do aluno, fará intervenções
propondo a reconstrução, ou a reestruturação, ou a refacção, ou a
autocorreção de aspectos ortográficos.
Dessa forma, o professor pode ensinar aos alunos esses
procedimentos de abordagem dos próprios textos em atividades de
reescrita coletiva, em que o professor vai, oralmente, analisando
os aspectos a serem melhorados em um texto representativo da
classe, tendo como informante privilegiado o aluno autor do texto.

Orientações ao professor para a reescrita coletiva de textos


No momento da reescrita coletiva de textos, é importante
que o professor tenha em vista que ele é o mediador da correção e
não o único a fazer a correção. Entre as estratégias que o professor
pode usar antes e durante a reescrita estão:
marcar no texto do aluno pistas para a análise e (re) organização das
ideias, rever características do gênero trabalhado, sugerir o
emprego do dicionário, levar o aluno a refletir sobre a língua,
tornando-asignificativa (CENPEC, vol. Impulso Inicial, 1998, p. 15).

É evidente que as inadequações mais comuns entre os textos


dos alunos devem ser anotadas pelo professor e trabalhadas com a
turma em situação de atividade planejada.

Procedimentos para a reescrita coletiva de textos

1. Selecionar, dentre os textos produzidos pelos alunos, um que seja


representativo das dificuldades mais relevantes de escritada classe.
2. Convidar o autor do texto a ocupar lugar de destaque, para quepossa ser
consultado sempre que necessário.
3. Copiar na lousa o texto (ou trazer o texto já copiado em papel pardo)
corrigido em seus aspectos ortográficos e morfossintáticos (concordância
nominal e verbal, conjugação verbal, uso depronomes).
4. Propor questões à classe em função dos aspectos a serem reestruturados,
anotando as respostas na lousa; por exemplo, completar informações (O
quê? Onde? Como? Quando?); eliminar redundâncias; expandir ideias (Por
quê? Como?); utilizarrecursos de coesão (conjunções, pronomes, advérbios,
tempos verbais adequados); eliminar contradições; pontuar e paragrafar
adequadamente.
5. Discutir com os alunos a importância das informações obtidaspara a
clareza, a compreensão e o aperfeiçoamento do texto.
6. Reescrever o novo texto ou trecho na lousa com a classe, incorporando as
alterações discutidas.
7. Pedir aos alunos para compararem o texto reescrito com o original.
8. Solicitar que verifiquem em seus próprios textos se há problemas da
mesma natureza e que, nesse caso, os corrijam (CENPEC,1998, p. 15).

A oportunidade de reescrever um texto com a turma


proporciona ao aluno a chance de refletir sobre a língua, de analisar
se há coerência e coesão no encadeamento das ideias, de reveras
sequências textuais típicas do gênero de texto e de avaliar se o tema
foi abordado satisfatoriamente.
Vamos exemplificar o que estamos dizendo com o relato de
uma atividade de reescrita de texto, relembrando qual foi a pro-
posta de produção feita aos alunos da turma e como foi a condução
do professor. Reproduziremos as palavras de um texto original de
aluno. As Figuras 1 e 2 são apenas ilustrativas do clima de medoque
o aluno quis trazer para o texto.

Relatório sobre uma atividade de reescrita coletiva


Depois de ler e ouvir muitos "causos" de assombração, uma
turma de alunos do Ensino Fundamental foi motivada a escrever
uma história interessante que tivesse acontecido com eles.
O aluno Carlos Eduardo (nome fictício), produziu o seguinte texto:

Criação de história –––––––––––––––––––––––––––––––––––


Mangueiras, 20 de abril de 2007. Aluno: Carlos Eduardo
Escola: Maria da CantareiraProfessora: Marileia

Figura 1 Fantasma.

Certo dia numa fazenda tão distante da cidade. eu estava lá nessa maldita
fa- zenda. eu achava ela assonbrada ingraçado por que só eu via as coisas
assonbrosas.
Num dia eu fui jogar um lixo fora chegando perto do mato derrepente olho
pro chão uma cabeça de um bicho de chifre eu joguei a lata no chão – fui correndo
pra dentro de casa avisar meu padrinho e foi lá não viu nada no chão fiquei num
medo
Figura 2 Menino com medo.

Mas eu não voltei naquele lugar nunca mais era tarde eu fui rançar umas
minho-cas par nos irmos pesca derrepente aparece um tatu eu fui correr atráz dele
ele sumiu derrepente eu já estava comedo.
Nu outo dia dimanhã eu quis vir enbora por tudo mais eu vim com muito
medo. chegou na cidade eu não guiz voltar naquela fazenda mas nunca até hoje.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O professor, ao fazer sua análise do texto, observou que Car-
los Eduardo garantia a estrutura narrativa do "causo".
Portanto, os aspectos da pontuação e da ortografia devem
ser abordados um de cada vez. Neste texto, priorizaremos o
enfoque na pontuação. Para isso, o professor deve "limpar" o texto,
ouseja, corrigi-lo, antes de apresentá-lo à classe, para deixar saltar
aos olhos a falta da pontuação.
Vamos observar como podemos fazer para trabalhar os erros
com as crianças.
1) Objetivo: perceber se a estrutura narrativa foi construída.
a) Caracteriza as personagens? (João é medroso, responsável;
o padrinho é atencioso).
b) Constrói o enredo? Situação (Certo dia eu estava lá na
fazenda); conflito (Olho para o chão uma cabeça de um
bicho de chifre).
c) Resolve o conflito? (Fui para dentro de casa avisar meu
padrinho; no outro dia de manhã eu quis vir em- bora);
desfecho (Eu não quis voltar naquela fazenda nunca mais).
d) Faz marcação de tempo? (Certo dia, num dia, no outro dia).
e) Faz marcação de lugar? (Numa fazenda, perto do mato,
naquele lugar, na cidade).
f) Usa vocabulário adequado? (Fazenda distante e
assombrada; naquele lugar; coisas assombrosas, mato,
cabeça de chifre, medo, era tarde, sumiu, muito medo, com
medo, nunca mais).
g) Paragrafa adequadamente? Tem "noção" de parágrafo.
h) Pontua adequadamente? Não.
i) Ortografa? Nem sempre corretamente.
2) Ao interagir com a classe, o professor pode iniciar fazendo
perguntas que levem os alunos a perceber se Carlos
estruturou bem o texto, tais como:
a) Do que fala o texto?
b) O que vocês acham do texto do Carlos Eduardo?
c) Ele contou uma história interessante?
d) Ele conseguiu estabelecer um suspense na sua história de
assombração?
e) Qual foi o momento mais assustador?
f) Carlos conseguiu dar um final para a história?

3) Depois, o professor vai introduzir as perguntas que focarão


o que falta no texto:
a) Carlos, "quando" você foi para a fazenda? Você costuma ir
sempre ou aquela foi a primeira vez?
b) Por que foram à fazenda? O que foram fazer lá? Comoforam
até lá?
c) Você já sabia que a fazenda era assombrada? Qual o
nome da fazenda?
d) Como você dormiu? Ficou no mesmo quarto que seu
padrinho? Ouviu barulhos à noite? Você se levantou?
Vale ressaltar que, quando a classe pergunta, se estabelece
verdadeira interlocução. Os alunos percebem quando, ao produzi-
rem um texto, há informações que não podem faltar e outras que
esclarecem melhor ou embelezam mais, dão suspense ao texto.
O professor, como leitor do texto, já fez algumas
constatações:

1) Carlos construiu o seu texto e já no primeiro parágrafo


construiu seu próprio assombro.
2) Há um impacto: ele chama o padrinho, mas o padrinho
nada vê, isso, no entanto, não tranquiliza Carlos.
3) A intensidade do seu medo vai aumentando.
4) O aluno já construiu alguns caminhos para o suspense: "esta
fazenda maldita e assombrada"; "olho para o chão uma
cabeça de chifre"; "de repente aparece um tatu e ele
sumiu"; "eu já estava com medo".
São estabelecidos o conflito e a tentativa de solução: cha-
mar o padrinho, vir embora. Há um fechamento: não quis voltar
naquela fazenda nunca mais.

a) Mas o que falta na forma de escrever de Carlos Eduar- do?


Pontuação.
b) Então, vamos ajudá-lo a reescrever pontuando, por par-
tes?
c) Reescrita coletiva por parágrafos, na lousa, ao lado (o
professor, na lousa, vai questionando os alunos para que
participem da reescrita).
Veremos como exemplo, o 1º parágrafo: o que podemos
tirar ou colocar para que o texto fique mais claro? (tão / muito /
bem / eu estava).

Márcia sugere: Certo dia eu estava numa fazenda tão distante da


cidade. Eu achava esta maldita fazenda assombrada. Engraçado, só
eu via as coisas assombrosas.
Laura sugere: Certo dia, numa fazenda tão distante da cidade, lá
estava eu nesse maldito lugar que eu achava assombrado, porque
só eu via as coisas assombrosas.
Camila sugere: Certo dia, numa fazenda muito distante da cidade. Eu
estava lá nessa maldita fazenda, achava ela assombrada.Engraçado,
porque só eu achava as coisas assombrosas.

Qual das três reescritas ficou melhor (discutir com os alunos,


ler como estava e como ficou. Pode ainda ser melhorado?). O
professor pode intervir para melhorar ainda mais o parágrafo e a
pontuação.

Sistematizando: ao final do trabalho de reescrita, é importante que


o professor sistematize os conhecimentos adquiridos com o
trabalho de análise linguística durante a reescrita do texto. Se o
aspecto focalizado foi "pontuação", é preciso voltar e refletir sobre
quais os recursos utilizados para melhorar o texto. Neste caso, vale
buscar regras, se houver, pesquisar mais, fazer atividades que
mobilizem várias possibilidades de pontuação, observando a
mudança de sentidos etc.
Nesse caso, o professor pode fazer questionamentos aos
alunos do tipo: o que fizemos durante a reescrita do texto?

1) Revisamos a pontuação.
2) Invertemos a ordem de algumas palavras.
3) Indicamos o uso da letra maiúscula no início da oração.
4) Procedemos à organização do parágrafo.
5) Eliminamos palavras.
Para trabalhar pontuação, o texto de suspense é excelente,
pois exige do escritor que use quase todos os sinais.
Se o aspecto a ser trabalhado é a pontuação, não deixe de
sistematizar no final: buscar na gramática e comparar.
É preciso que fique bem claro para os alunos que nem sempre o
texto dá conta de responder a todas as questões, daí a necessidade
de reescrita.

A pontuação
Nem sempre a pontuação dos textos foi como é hoje.
Antigamente, lia-se em voz alta e o texto era pontuado pelo leitor,
que dava a ele a entonação desejada. Contemporaneamente, em
que lemos somente com os olhos, foi necessário incorporar formas
gráficas aos textos para indicarem as unidades de processamento
da leitura ao leitor.
Ao contrário do que há muito tempo se pensou, a função da
pontuação não é indicar pausas para respirar, embora o locutor
possa usar a pontuação para isso.
Por não ser uma somatória de frases, mas sim um fluxo
contínuo, o texto precisa ser dividido em partes (frases, parágrafos)
que se agrupam para dar sentido global ao texto. Fica claro que a
função da pontuação é atribuir sentido ao texto.
Dessa forma, a pontuação aparece para marcar fronteiras
sintático-semânticas e separar fluxos de informações. Pontuar é
uma atividade que o aluno pode aprender se ele tiver a
preocupação de partir e reagrupar o fluxo do texto para indicar ao
seu leitorquais os sentidos que ele gostaria de lhe propor. Assim, ele
estará,também, em busca de efeitos estilísticos.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRA-
SIL, 1997, p 90):
A única regra obrigatória da pontuação é a que diz onde não se
pode pontuar: entre o sujeito e o verbo e entre o verbo e seu
complemento. Tudo o mais são possibilidades. Por isso – ao
contrárioda ortografia – na pontuação a fronteira entre o certo e
o erradonem sempre é bem definida. Há, quase sempre, mais de
uma possibilidade de pontuar um texto [...].
Podemos concluir, com as orientações dos PCN, que aprender
a pontuar não significa decorar um conjunto de regras a seguir,mas
aprender um procedimento que influi diretamente na textualidade.
Esse procedimento, porém, é possível aprender somente fazendo
juntamente com quem sabe:

• conversando sobre as decisões que cada um tomou ao pontuar


e por quê;
• analisando alternativas tanto do ponto de vista do sentido desejado
quanto dos aspectos estilísticos e escolhendo a que parece melhor entre as
possíveis;
• observando os usos característicos da pontuação nos diferentes gêneros e
suas razões (a grande quantidade de vírgulas/aposições nas notícias
jornalísticas como instrumento para condensar o texto, por exemplo);
• analisando os efeitos estilísticos obtidos por meio da pontuaçãopelos bons
autores (BRASIL, 1997, p. 91).

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos ao final deste Modulo de Fundamentos e Métodos


do Ensino da Língua Portuguesa tão importante para a consolidação
de sua prática pedagógica. Procuramos empregar uma metodologia
de participação ativa, uma vez que nossa preocupação é com uma
aprendizagem significativa.
Durante este estudo, navegamos pelo mundo dos contos
maravilhosos e das fábulas e suas ilustrações. Procuramos
proporcionar situações de observação da intertextualidade entre
textos do mesmo gênero e possibilidades de trabalho em sala de
aula.
Além disso, abordamos as fábulas em sua gênese,
comparando várias versões de uma mesma narrativa e conduzindo-
o a um olhar analítico sobre as marcas discursivas deixadas pelo
tempo e pelos muitos fabulistas em cada versão.
Gostaríamos que você vivenciasse todas essas experiências,
pois queremos um retorno que demonstre um percurso percorri-
do de muita pesquisa e construção de aprendizagens.
Ao final de nosso percurso, fizemos um breve estudo sobre a
ortografia e algumas possíveis abordagens dos aspectos grama-
ticais nos textos bem escritos, e nos textos de alunos. Tentamos
passar um pouco da nossa experiência como professoras,
apresentando algumas formas de reescrita coletiva de textos de
alunos.
Destacamos, ainda, a importância de sistematizar, organizar,
planejar atividades que sejam suporte e orientação ao professor
nesse processo de elaboração do aprendizado da leitura, da escrita,
da revisão e da editoração dos textos na escola.
Acreditamos em sua criatividade, em sua perseverança,
disponibilidade e envolvimento com todo o processo de formação
profissional para com o ensino da Língua Materna, atributos
essenciais para que seu trabalho se concretize.

Bom trabalho e grandes descobertas!

9. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Fantasma. Disponível em: <http://www.possibilidades.com.br/intelig_emocional/
img/fantasma.gif>. Acesso em: 12 jul. 2007.
Figura 2 Menino com medo. Disponível em: <http://sitededicas.uol.com.br/ct05b.htm>.
Acesso em: 12 jul. 2007.

Sites pesquisados
FALCÃO, A. In: ALONSO, P. V. Sobre a fala do analista. Disponível em: <http://www.
symbolon.com.br/artigos/sobreafala.htm>. Acesso em: 20 jul. 2010.
MORAIS, A. G. Ortografia. Disponível em: <http://www.sme.pmmc.com.br/arquivos/
matrizes/matrizes_portugues/anexos/texto-14.pdf>. Acesso em: 17 jan. 2011.
NOVAESCOLA. Diagnóstico inicial. Língua Portuguesa. Disponível em: <http://
revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/diagnostico- inicial-
427729.shtml>. Acesso em: 10 dez. 2010.
10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNO, M. Preconceito linguístico. O que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Língua
Portuguesa/ Secretaria de Educação Fundamental. (1ª à 4ª). Brasília: Mistério daEducação,
1997.
CARVALHO, C. S. et al. Construindo a escrita: textos, gramática, ortografia: Livro do
professor. São Paulo: Ática, 2003.
CENPEC. Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Social. Ensinar e
Aprender: construindo uma proposta – Língua Portuguesa – Impulso Inicial. São Paulo:
CENPEC, 1998.
CIPRO NETO, P. Gramática da língua portuguesa. São Paulo: Scipione, 1999.
CÓCCO, M. F; HAILER, M. A. Didática da alfabetização: decifrar o mundo – Alfabetização e
socioconstrutivismo. São Paulo: FTD, 1995.
FALCÃO, A. Palavras. In: . O doido da garrafa. São Paulo:
Planeta, 2001.
NASPOLINI, A. T. Didática de português: tijolo por tijolo: leitura e produção escrita. São
Paulo: FTD, 1996.
MORAIS, A. G. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 2001.
VERÍSSIMO, L. F. Comédias da vida privada. Porto Alegre: L&PM, 1994.

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