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ARTIGO ARTICLE
para reorientação do serviço na promoção
da saúde: um estudo de caso no Centro de Saúde
Escola Germano Sinval Faria
Abstract The Training Health Center belongs to Resumo O Centro de Saúde Escola pertence a
an institution which performs in different areas uma instituição de pesquisa, ensino, desenvolvi-
such as research, teaching, technology develop- mento tecnológico e prestação de serviços em saú-
ment and a service on public health. This article de pública. O artigo apresenta marcos conceituais
presents conceptual issues on health promotion, sobre promoção da saúde, um dos objetivos deste
one important step of this Health Center, and centro de saúde, e lista indicadores para serem
evaluation points to the staff and patients chek- avaliados por seus trabalhadores e usuários. Uti-
ing if this Health Center is a health promotion or lizaram-se questionários aplicados em entrevis-
not. To perform this evaluation, questionnaires in tas. Conclui que o Centro tem muitas ações de
interviews are used. There are many actions to- promoção da saúde, ainda não auto-sustentáveis,
wards the health promotion, but many of them e mostra que está caminhando para ser um cen-
are still not sustainable. The discussion and eval- tro de referência em promoção da saúde. Os indi-
uation of this comparison will point to reach the cadores propostos foram aprovados para avaliar a
Health Center goal which is to be a reference on reorientação do serviço e, ao final, sugeridos mais
health promotion. Some questions are based on dois: análise da multidisciplinaridade e do ambi-
approved indicators by the team to evaluate the ente construído.
health services “re-orientation” focusing in more Palavras-chave Promoção da saúde, Reorien-
two main ones: multi-disciplinarity and changed tação de serviço, Proposta de indicadores
environment.
Key words Health promotion, Orientation ser-
vice, Proposal of indicators
tão e um dos caminhos está em dois de seus ei- quisadores e dos sujeitos que participam da ex-
xos temáticos intitulados a intersetorialidade periência bem como suas relações recíprocas”
das ações de saúde e a organização da atenção à (Bruyne et al., 1982).
saúde, que têm o apoio do governo. Este reco- Os autores estabeleceram alguns indicado-
nhece que o primeiro é fundamental para a ob- res para avaliar a afirmativa de que o CSE é um
tenção da promoção da saúde, e o segundo de- centro promotor de saúde, com base nos mar-
ve também incorporar tecnologias e a metodolo- cos conceituais apresentados anteriormente,
gia de educação e promoção de hábitos saudá- conforme listado a seguir. Entretanto, ressal-
veis, entre outros para garantir os novos rumos tam que este é um primeiro ensaio em um es-
da reforma sanitária brasileira. tudo de caso, reconhecendo a importância de
Parte-se da premissa que, para o sucesso do ser um debate necessário por abranger a quali-
trabalho a partir da promoção da saúde, o pro- dade de vida do cidadão, entendida como de-
fissional de saúde deve estar aberto ao diálogo, senvolvimento integral do ser humano, sendo
como definido por Paulo Freire (2000), um dos um desafio que precisa ser enfrentado pelos
norteadores das instituições de promoção da serviços de saúde, além da necessidade de in-
saúde no Canadá. Para estimular o empower- corporação da vida cotidiana nas ciências soci-
ment, o profissional de saúde deve ser um me- ais (Minayo et al., 2000; Fleck, 2000; Canesqui,
diador dos recursos existentes, através de um 1995).
atendimento humanizado, sendo a capacitação
fundamental (Vasconcelos, 1988; Stotz & Valla, Lista de indicadores utilizados
2001). Isto torna-se ainda mais importante para avaliar o Centro de Saúde Escola
quando se assume a abrangência do termo pro- Germano Sinval Faria como promotor
moção de saúde e a necessidade de definição de de saúde
indicadores de avaliação diferentes dos referen-
ciais tradicionalmente utilizados, devendo sus- • controle social
citar debates entre os profissionais envolvidos • articulação intersetorial
em mudança da qualidade de vida, com ações • preocupação com a justiça social
intersetoriais, com mobilização e participação e eqüidade
comunitária. A importância desta temática é • participação para o desenvolvimento social
amplamente apresentada em Zancan et al. e econômico saudável e auto-sustentável
(2002), pois acredita-se que este é o caminho • participação para o desenvolvimento
da promoção da saúde para o alcance do de- ambiental saudável e auto-sustentável
senvolvimento local integrado e sustentável • organização da demanda e protocolos
(DLIS). Estas questões estão latentes no CSE. A por ciclo de vida
seguir, destacam-se reflexões dos autores com • contribuição para o controle
profissionais/gestores e usuários do CSE, sobre de enfermidades transmissíveis
indicadores de reorientação do serviço para • contribuição para o controle
promoção da saúde. de enfermidades não transmissíveis
• redução ao tabagismo e outras
dependências químicas
Metodologia • contribuição para mudanças de estilo
de vida
A metodologia adotada é inspirada no que Mi- • respeito às necessidades individuais
nayo (1998) chama de ciclo de pesquisa, ou seja, e peculiaridades culturais
é um processo de trabalho que começa com a • desenvolvimento tecnológico
fase exploratória, na qual preliminarmente se • pesquisa
interroga sobre o objeto, os pressupostos, as te- • capacitação profissional para mudança
orias e metodologia pertinentes; o trabalho de de atitudes
campo que “consiste no recorte empírico da
construção teórica elaborada”; e o tratamento Para o levantamento dos dados foi elabora-
do material recolhido no campo, que produz um do um questionário semi-estruturado que ser-
confronto entre a abordagem teórica e o que a viu de base para entrevistar pelo menos um
investigação de campo traz de contribuição trabalhador de cada programa/ação de promo-
singular. A experimentação de campo também ção da saúde, profissionais que trabalham em
favorece a transformação dos “papéis dos pes- ações basicamente biomédicas, membros do
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Quadro 2
Agrupamento de definições dos entrevistados sobre promoção da saúde.
Grupo Definição No
Responsabilidade Favorecer práticas saudáveis, em um sentido amplo 6
institucional/profissional
Construir junto com o usuário/comunidade 5
entrevistados correlacionou promoção da saú- Vacinação na Fiocruz (Reis et al., 2003), apon-
de a responsabilidades institucionais/profissio- tando a consciência de um conceito mais volta-
nais (78%) e o restante a iniciativas individuais. do para a saúde do que para a doença.
Alerta-se para o fato de que quatro pessoas
aparecem em mais de um agrupamento, mas Opinião sobre o CSE ser
apresentando uma lógica complementar e não um centro promotor de saúde
contraditória.
O CSE era voltado à atenção primária, lo- O reconhecimento sobre a reorientação do
go, encontrar a definição de que devemos cami- centro de saúde para a promoção da saúde é
nhar com o outro, trabalhar junto com a comu- notória, seja no resultado concordante de 22%,
nidade, através da troca de experiência, não adi- seja no caso de 61% que afirmam que “está ca-
antando só informar, é construir juntos, a partir da vez mais caminhando nesta estrada” (sic). A
dos saberes de cada um (sic), demonstra a mu- justificativa está em achar que “todos os profis-
dança dos conceitos que ocorrem historica- sionais e estagiários estão trabalhando para is-
mente a partir das práticas estabelecidas. Co- to” (sic), conhecendo as necessidades de seus
mo apresentado no quadro 2, setenta e dois por pacientes, procurando fazer um atendimento
cento dos entrevistados deram definições pró- humanizado, evitando medicalizar a clientela e
ximas às expostas no marco conceitual. Entre- trabalhando mais com a população, sendo apre-
tanto, o destaque foram as relações institucio- sentada a opinião de que funciona melhor do
nais, mas em outra pesquisa em andamento no que outras instituições.
CSE, sob nossa assessoria, 79% dos trabalhado- Foi citado que a falta de investimento insti-
res apresentaram conceitos mais próximos ao tucional e de capacitação dos recursos huma-
autocuidado, ainda que dentro dos pressupos- nos tem sido um limitador para o CSE ser mais
tos da promoção da saúde (Penna, 2004). prontamente nomeado promotor de saúde
Foi de um usuário a única definição voltada (11%). Outro fato apontado por um entrevis-
para o atendimento à doença exclusivamente – tado foi a sobrecarga de consultas e atribuições
necessidade de ter mais especialidades médicas. assumidas por profissionais comprometidos
O outro usuário, pertencente à terceira idade, com o trabalho e a população.
participa ativamente do dia-a-dia do CSE, con-
tribuindo para que dissesse: “é viver de bem Controle social
com a vida”, o que foi encontrado em 27% das
análises. Percentual similar (29%) aconteceu Todos reconheceram que o CSE tem uma
quando, sob nossa orientação, Penna (2004) en- gestão participativa, sendo que 78% das pessoas
trevistou 190 usuários do CSE. Este conceito foi citaram como exemplo o Conselho Gestor.
destacado por 46% dos visitantes entrevistados Mas, 28% acham que a participação do usuário
no evento Fiocruz pra Você, que acontece precisa melhorar. O próprio usuário aponta
anualmente durante a Campanha Nacional de que nem sempre entende o que é dito e “quan-
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nal, associada ao Bazar da Solidariedade (44%), tinuidade do processo, não abrangendo uma
que promove capacitação de moradores de mudança cultural ou mesmo de aproximação
Manguinhos e geração de renda. A orientação das instâncias de decisão.
sobre o aproveitamento integral dos alimentos
e sobre a compra mais barata conforme as sa- Organização da demanda
fras foram mencionados (Cecan e NuPNS), de- e protocolos por ciclo de vida
monstrando uma sensibilidade pela “economia
indireta”. Outros exemplos foram: o forneci- Grande parte dos entrevistados (72%) acha
mento de cesta básica de alimentação, inserida que o CSE organiza sua demanda por ciclo de
no Programa Fome Zero; iniciativas individua- vida. Metade apontou a triagem como exem-
is de auxílio à obtenção de emprego; e permis- plo, já que as pessoas não são atendidas indivi-
são, pela chefia, para que moradores vendam dualmente, salvo se assim desejarem, pois são
em feiras promovidas pelo CSE e parceiros. chamadas pelo nome para comparecerem em
Ninguém avaliou a inserção do CSE no desen- uma sala onde são orientadas em grupo con-
volvimento local integral e auto-sustentável, forme a faixa etária. Outro exemplo é que os
possivelmente por ainda ser mais um conceito atendimentos agendados são direcionados por
com ações pontuais sem ter difundido práticas módulos distribuídos conforme o ciclo de vi-
cristalizadas e de impacto, por ser o DLIS um da, o que facilita a organização.
processo e não um projeto, já que todas as A mesma proporção (72%) não conseguiu,
ações da área social identificadas fazem parte todavia, citar ações que apontassem que os
do processo de DLIS. atendimentos são organizados em protocolos
por ciclo de vida. Reconhece-se que o PASI fa-
Participação para o desenvolvimento vorece o atendimento à terceira idade, mas se
ambiental saudável e auto-sustentável destaca a inexistência de atendimento direcio-
nado ao adolescente. O CSE passa por um pro-
A questão do desenvolvimento ambiental cesso de acreditação que poderá estimular este
não é amplamente percebida pela maioria dos trabalho. Ressalta-se que não há procedimen-
entrevistados, considerando não terem identi- tos de acreditação específicos à atenção primá-
ficado ações que trabalhassem com a temática ria e menos ainda voltados à promoção da saú-
(61%). Do universo de entrevistados, 28% de, sendo o CSE o primeiro nessa ótica, pelo
apontaram o Projeto Terrapia como tendo pre- que foi apontado pela equipe do Consórcio
ocupação com o meio ambiente, correspon- Brasileiro de Acreditação (CBA), que tem pres-
dendo a 71% dos que responderam sim ao tado assessoria aos serviços da Fiocruz com a
cumprimento deste indicador. Cabe esclarecer Joint Commission International.
que este Projeto pertence ao NUPNS e estimu-
la a prática de cuidado consigo, com a alimen- Contribuição para o controle
tação e com o meio ambiente a partir da pro- de enfermidades transmissíveis
dução e consumo do alimento vivo em horta
experimental. Todos os entrevistados concordam que o
Foram citados, também, trabalhos ligados à CSE contribui para o controle de enfermidades
participação comunitária no CSE (ESF e DLIS); transmissíveis sendo citadas ações das equipes
e parceria deste com a Universidade Aberta e o do Núcleo de DST/AIDS, ESF e de Tuberculo-
Laboratório Territorial, também pertencentes a se: visita domiciliar de acompanhamento ao
ENSP, que tem várias ações relacionadas à edu- paciente e familiar, grupos específicos, distri-
cação ambiental. buição de cartilhas e medicamentos e realiza-
Entretanto, a auto-sustentabilidade ainda ção de palestras. Entre os entrevistados, 33%
não é conseguida nas práticas do CSE, o que é frisaram, também, que nas consultas são feitas
confirmado por 43% dos que apontaram estas orientações sobre o assunto e no caso da DST/
ações. Reconheceu-se que é uma caminhada AIDS há diferentes estratégias na distribuição
importante e em desenvolvimento, cabendo de preservativos (participação em diversos ti-
valorizar a intersetorialidade a partir do refor- pos de campanhas, não só relacionadas ao te-
ço de políticas e ações institucionais, disponi- ma, Camelô Educativo, e grupos com ativida-
bilizando recursos para isto. des na comunidade).
Nota-se que o enfoque dado ao termo sus- Um entrevistado acrescentou a seriedade e
tentável foi aplicado no sentido estrito de con- a criatividade na busca das soluções para apoi-
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Colaboradores
Referências bibliográficas