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Para
que possamos compreender o porquê de ela ser caracterizada como uma ciência, tomemos como
exemplo o caso da gramática normativa, uma vez que ela não descreve a língua como realmente se
evidencia, mas sim como deve ser materializada pelos falantes, constituída por um conjunto de
sinais (as palavras) e por um conjunto de regras, de modo a realizar a combinação desses.
Assim, a título de reforçarmos ainda mais a ideia abordada, consideremos as palavras de André
Martinet, acerca do conceito de Linguística:
“A linguística é o estudo científico da linguagem humana. Diz-se que um estudo é científico quando
se baseia na observação dos factos e se abstém de propor qualquer escolha entre tais fatos, em
nome de certos princípios estéticos ou morais. ‘Científico’ opõe-se a ‘prescritivo’. No caso da
linguística, importa especialmente insistir no carácter científico e não prescritivo do estudo: como o
objecto desta ciência constitui uma actividade humana, é grande a tentação de abandonar o
domínio da observação imparcial para recomendar determinado comportamento, de deixar de notar
o que realmente se diz para passar a recomendar o que deve dizer-se”.
O fundador desta ciência foi Ferdinand de Saussure, um linguista suíço cujas contribuições em
muito auxiliaram para o carácter autónomo adquirido por essa ciência de estudo. Assim, antes de
retratá-las, constatemos um pouco mais acerca de seus dados biográficos:
Na Universidade de Genebra, entre os anos de 1907 e 1910, Saussure ministrou três cursos sobre
linguística, e em 1916, três anos após sua morte, Charles Bally e Albert Sechehaye, alunos dele,
compilaram todas as informações que tinham aprendido e editaram o chamado Curso de Linguística
Geral – livro no qual ele apresenta distintos conceitos que serviram de sustentáculo para o
desenvolvimento da linguística moderna.
Entre tais conceitos, tornam-se passíveis de menção alguns deles, tais como as dicotomias:
Língua X Fala
Esse grande mestre suíço aponta que entre dois elementos há uma diferença que os demarca:
enquanto a língua é concebida como um conjunto de valores que se opõem uns aos outros e que
está inserida na mente humana como um produto social, razão pela qual é homogénea, a fala é
considerada como um ato individual, pertencendo a cada indivíduo que a utiliza. Sendo, portanto,
sujeita a factores externos.
Significante X Significado
Para Saussure, o signo linguístico se compõe de duas faces básicas: a do significado – relativo ao
conceito, isto é, à imagem acústica, e a do significante – caracterizado pela realização material de
tal conceito, por meio dos fonemas e letras. Falando em signo, torna-se relevante dizer acerca do
carácter arbitrário que o nutre, pois, sob a visão saussuriana, nada existe no conceito que o leve a
ser denominado pela sequência de fonemas, como é o caso da palavra casa, por exemplo, e de
tantas outras. Factos esses que bem se comprova pelas diferenças existentes entre as línguas,
visto que um mesmo significado é representado por significantes distintos, como é ocaso da palavra
cachorro (em português); dog (inglês); perro (espanhol); chien (francês) e cane (italiano).
Sintagma X Paradigma
Sincronia X Diacronia
Saussure, por meio dessa relação dicotómica retratou a existência de uma visão sincrónica – o
estudo descritivo da linguística em contraste à visão diacrónica - estudo da linguística histórica,
materializado pela mudança dos signos ao longo do tempo. Tal afirmação, dita em outras palavras,
trata-se de um estudo da linguagem a partir de um dado ponto do tempo (visão sincrónica),
levando-se em consideração as transformações decorridas mediante as sucessões históricas (visão
diacrónica), como é o caso da palavra vosmecê, você, ocê, cê, vc...
Mediante os postulados aqui expostos, cabe ainda ressaltar que a linguística não se afirma como
uma ciência isolada, haja vista que se relaciona com outras áreas do conhecimento humano, tendo
por base os conceitos dessas. Por essa razão, pode-se dizer que ela assim subdivide:
* Psicolinguística – trata-se da parte da linguística que compreende as relações entre linguagem e
pensamentos humanos.
* Linguística aplicada – revela-se como a parte dessa ciência que aplica os conceitos linguísticos
no aperfeiçoamento da comunicação humana, como é o caso do ensino das diferentes línguas.
* Sociolinguística – considerada a parte da linguística que trata das relações existentes entre fatos
linguísticos e fatos sociais.
O mito quer mostrar o poder criador da linguagem, que dá ao homem a capacidade de ordenar o mundo,
de categorizá-lo. Com os signos, o homem cria universos de sentido. As línguas não são nomenclaturas
que se aplicam a uma realidade pré-ordenada, mas são modos de interpretar o mundo. Por isso, estudar
a linguagem é a forma de entender a cultura, de compreender o homem em sua marcha sobre a Terra.
(Fiorin, 2002, p.73).
Introdução
Este estudo propõe unir estudos da área da Lingüística, com enfoque
em Saussure, já que se afirma que:
Ainda segundo Saussure, a língua pode ser definida como um “ sistema cujos
termos são todos solidários e em que o valor de um não resulta senão da
presença simultânea dos outros.” (Saussure, 1971 apud Textos Seleccionados,
1985, p.VIII), ou seja, a língua é a relação entre o indivíduo e o meio social,
entendido como sistema de signos: língua (elementos abstractos) e fala
(concretização de elementos abstratos).
Sob este foco, o autor sugere que as interpretações de algo que se ouve pode ser
multiforme, porém se esta mesma palavra for contextualizada pouco de dúvida
haverá, pois dar-se-á sentido ao que se pretende transmitir. Quando se observa
uma colecção, pode-se interpretar os objectos de várias formas, porém quando
se analisam os objectos sob o foco do coleccionador, pode-se compreender qual
o sentido que ele deu para cada objecto componente da colecção. De acordo
com Fiorin, os signos nos permitem ver que a: “ realidade só tem existência para
os homens quando é nomeada. Só percebemos no mundo o que nossa língua
nomeia.” (Fiorin, 2002, p.55).
Seguindo a teoria de Saussure que diz “ o signo lingüístico não une um nome a
uma coisa, mas um conceito a uma imagem acústica” (Fiorin, 2002, p.58), pode-
se compreender que o signo é a impressão psíquica dos sons. Fiorin traz de
forma clara a relação de signo, significado e significante:
Saussure diz que o signo lingüístico não une um nome a uma coisa, mas
um conceito a uma imagem acústica. O que o mestre genebrino quer
mostrar-nos é que o signo não é um conjunto de sons, cujo significado
são as coisas do mundo. O signo é a união de um conceito com uma
imagem acústica, que não é o som material, físico, mas a impressão
psíquica dos sons, perceptível quando pensamos numa palavra, mas não
a falamos. O signo é uma entidade de duas faces, uma reclama a outra,
à maneira do verso e do anverso de uma folha de papel. Percebem-se as
duas faces, mas elas são inseparáveis.
sistema não pode funcionar, porque o objecto não designa tudo o que
uma língua pode expressar. Ele não exprime as propriedades de uma
coisa. Daí a impossibilidade de construir metáforas e metonímias.
Quando se usa a metonímia “as velas singram os mares”, velas têm o
sentido de navio, porque, na fala, usa-se a parte para denominar o todo.
Mostrar um objecto não exprime a pertença do objecto a uma
determinada classe. No léxico de uma língua, agrupamos nomes em
classes. Violeta, rosa, margarida pertencem à classe das flores. Mostrar
uma margarida não exprimiria a classe flor. Exibir um objecto não
exprime as categorias gramaticais, como a do singular ou do plural. A
língua não é um sistema de demonstração dos objectos, pois a
linguagem humana pode falar de objectos presentes ou ausentes da
situação de comunicação. Aliás, o objecto nem precisa existir, para que
falemos dele, pois a língua pode criar universos de coisas inexistentes.
(Fiorin, 2002, p.56).
O valor de um signo é dado por outro signo. Além disso, um signo é sempre
interpretável por outro signo: no interior do mesmo sistema pelos sinónimos,
pelas paráfrases, pelas definições; em outro sistema, em outra língua, por
exemplo, pela tradução. A dificuldade de traduzir indica que não há
univocidade na relação entre os nomes e as coisas. (Fiorin, 2002, p.56).
O sentido pode ser entendido como algo até certo ponto individual, pois como
no sistema dos signos a univocidade de relação entre nomes e coisas, não é
característica principal, uma vez que a diversidade é cultural. No fenómeno
do coleccionismo se observa a mesma característica, pois um objecto idêntico,
tem valor e significado distintos em colecções distintas.
Para Saussure:
cada elemento linguístico deve ser diferente dos outros elementos com
os quais contrai relação. Por isso, é preciso considerar o signo não mais
em sua composição, mas em seus contornos, dados por suas relações
com os outros signos. Por isso, Saussure cria a noção de valor . Com
ela, dá-se uma definição negativa do signo: um signo é o que os outros
não são. O valor provém da situação recíproca das peças na língua,
pois importa menos o que existe de conceito e de matéria fónica num
signo do que o que há ao seu redor. A significação é, então uma
diferença entre um signo e outro signo, pois o que existe na língua são a
produção e a interpretação de diferenças. Com o conceito de
valor, Saussure mostra que o que importa na língua são as diferenças
existentes entre conceitos e sons. (Fiorin, 2002, p.58-59).
Utilizando este conceito de Saussure que “um signo é o que os outros não são”,
ou seja, o valor está nos contornos das relações, nas diferenças existentes,
pode-se compará-la com o desenvolvimento das colecções. Para o
coleccionador, quando busca uma nova peça para compor a colecção, procura
por indícios não encontrados nas peças que possui. O valor das peças que estão
por vir trazem a diferença, porém nunca perdendo de vista a relação que elas
mantêm com as outras peças da colecção.
" une uma forma da expressão a uma forma de conteúdo. Essas duas
formas geram duas substâncias, uma da expressão e uma do conteúdo. A
forma da expressão são diferenças fônicas e suas regras combinatórias;
a forma do conteúdo são diferenças semânticas e suas regras
combinatórias; a substância da expressão são os sons; a substância do
conteúdo, os conceitos." (Fiorin, 2002, p.59).
Fig. 1
Fig 2
Para se criar um signo conotado “ é preciso que haja uma relação entre o
significado que se acrescenta e o significado já presente no signo denotado.
Entre os dois significados, há então um traço comum.” (Fiorin, 2002, p.66). Em
sentido conotado, por exemplo, “olho-de-gato” passa a ser entendido como
“chapinha colocada em pequenos postes, instalados ao longo das estradas de
rodagem que reflete a luz dos faróis dos automóveis, para marcar os limites do
leito da estrada.” (Fiorin, 2002, p.66).
Fazendo uma distinção entre dois pontos de vista diferentes de olhar para o
mesmo fenómeno, Saussure define um novo objecto de estudos para a
Linguística. Contrariamente ao estudo da mudança linguística, o ponto de vista
sincrónico vê a língua como um sistema em que um elemento se define pelos
demais elementos. No estudo sincrónico, um determinado estado de uma língua
é isolado de suas mudanças através do tempo e passa a ser estudado como um
sistema de elementos linguísticos. Esses elementos são estudados não mais em
suas mudanças históricas, mas nas relações que eles contraem, ao mesmo
tempo, uns com os outros.” (Pietroforte, 2002, p.79).
Fig. 3
O mundo e suas coisas passam para um domínio que está fora dos
estudos linguísticos e a língua ganha uma especificidade própria. Um
significante e um significado (1969:81) formam um signo, que, por sua
vez, é definido dentro de um sistema (1969:23-24), ou seja, um signo
ganha valor na relação com outros signos. Esse conceito de signo traz a
significação para dentro da língua e de sua estrutura. O que significa
são os signos em suas relações uns com os outros e não a relação entre
as palavras e as coisas do mundo. (Pietroforte, 2002, p.85).
A relação entre signos é o marco de Saussure. Pode-se concluir parcialmente
que: um signo tem que se relacionar com outro para formar um texto. Um texto
para ter sentido tem que ser coerente, da mesma forma que um objecto se
relaciona com outro objecto para formar uma colecção. Em outras palavras,
para que uma colecção seja coerente é necessário o sentido do coleccionador.
Desse modo, pode-se afirmar que é a partir de uma língua que se vêem as
coisas do mundo e não o contrário. " Assim, o signo não une uma palavra a
uma coisa, mas um significante a um significado." (Saussure, 1969:80
apud Pietroforte, 2002, p.86).
O objecto tem uma vida própria, uma função específica para a qual foi criado,
mas apresentam duas vidas, ou mais vidas, pois quando é inserido numa
colecção toma o sentido que o coleccionador dá a mesma. Sob este enfoque de
relação do objecto com a colecção em que está inserido, pode-se retomar o
conceito de sistema linguístico de Saussure em que a relação do signo se dá
pela relação com outros signos.
Fig. 4
Museu de Armas e Veículos Eduardo André Matarazzo – Bebedouro/SP
Fonte: http://www.museueduardoamatarazzo.com.br/
A leitura de uma colecção pode ser feita de forma aleatória, o leitor / visitante
de uma colecção tem indícios da organização da colecção pelos próprios
objectos que a compõem, porém falta algo que dê sentido a esta. Falta algo que
preencha este sistema de objectos: a relação (do sistema de Saussure), o
sentido, a coerência (a “argamassa que liga o azulejo ao chão”).O que vem a
ser a coerência? Para a Linguística Textual:
Quando o objecto se une a outros objectos, ele toma sentido, porque segue as
regras aí instituídas. O objecto segue o contexto, a direcção da colecção, dado
pelo coleccionador, formado pelos factores psicológicos, sociais, culturais,
financeiros e intelectuais do mesmo. Mais a frente esta abordagem de contexto
será focada em situacionalidade.
Fig. 5
Fonte: colecção particular
Fig. 6
Fig. 7
Fonte: colecção particular
Como nos textos a coesão e coerência estão presentes, sempre juntas, as duas “
passam a constituir as duas faces de uma mesma moeda, ou então, para usar
de uma outra metáfora, o verso e o reverso desse complexo fenómeno que é o
texto.” (Koch, 2001, p.45).
Considerações Finais
Como afirma Baudrillard “o objecto puro, privado de função ou abstraído de
seu uso, toma um estatuto estritamente subjectivo: torna-se objecto de
colecção.” (Baudrillard, 2004, p.94). A proposta de um mapeamento de
coleccionador pode ser a reconstrução de sentidos, pois:
O profundo poder dos objectos coleccionados não lhes vem, com efeito,
nem de sua singularidade nem de sua historicidade diversa, não é por
este meio que o tempo da colecção deixa de ser o tempo real, é pelo fato
de a própria organização da colecção substituir o tempo. ...
Inventariando o tempo em termos fixos com os quais pode jogar
reversivelmente, a colecção representa o perpetuo reinicio de um ciclo
dirigido onde o homem se entrega a cada instante e com absoluta
segurança – partindo não importa de que termo e seguro de a ele voltar
– ao jogo do nascimento e da morte. (Baudrillard, 2004, p.103).
Notas
quipos -A palavra significa “nó” na língua dos ancestrais dos peruanos e era
justamente assim que as informações mais importantes eram registadas: a partir
de nós com grossuras e cores diferentes, formando mensagens que eram
interpretadas pelos quipucamayocs, os especialistas da sociedade incaica nessa
espécie de escrita.
Referências bibliográficas
KOCH, Ingedore Villaça. O texto e a construção dos sentidos. 5 ed. São Paulo:
Contexto, 2001. 124 p. (Caminhos da linguística).
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História da Linguística
O objecto de estudo da Linguística não é novidade, nem recente. Desde a Antiguidade, já se estudavam
as línguas, a linguagem, no entanto “o termo [Linguística] foi empregado pela primeira vez em meados
do século XIX, para distinguir as novas directrizes para o estudo da linguagem, em contraposição ao
enfoque filológico mais tradicional.”1 A ciência linguística se tornou especialmente conhecida e ensinada
na década de 60.
De qualquer maneira, é de utilidade apresentar um panorama sobre os estudos linguísticos nas diversas
épocas. Como referência, será utilizado o Um Traçado da História da Linguística2, do qual é feita uma
espécie de resenha a seguir.
1. Antiguidade
Tradição babilónico: os textos mais antigos datam de cerca de 4.000 anos atrás. Nos primeiros
séculos do segundo milénio a.C., no sul da Mesopotâmia, surgiu uma tradição gramatical –
nomes/substantivos em sumério (língua dos textos religiosos e sagrados) – que durou mais de 2.500
anos. O sumério foi sendo trocado no discurso do quotidiano por outra língua diferente (o acádio).
Continuou prestigioso e usado em contextos religiosos e legais; foi ensinado então como língua
estrangeira.
Tradição hindu: ela tem origem no primeiro milénio a.C. e foi estimulada por mudanças no
sânscrito (língua sagrada dos textos religiosos). O ritual exigia a exacta realização verbal dos textos
religiosos; então a tradição gramatical mais conhecida é a de Pānini, cuja gramática cobria a fonética e a
morfologia.
Linguística grega: como em outras áreas de esforço intelectual, os gregos fizeram investigação
filosófica sobre a linguagem: a origem da linguagem; sistemas de partes do discurso; relação entre
linguagem e pensamento; iconicidade e arbitrariedade das palavras-signos. No Crátilo de Platão,
Sócrates aparece defendendo a conexão natural; Aristóteles, por outro lado, favorecia a convenção em
vez da natureza. É de Dionísio Thrax, Technē Grammatikē, uma breve descrição do grego tratando de
fonética e fonologia (inclusive partes do discurso). Apolônio Díscolo, séculos depois, descreverá a
sintaxe grega.
Tradição romana: continuou com o mesmo interesse da linguística grega. O interesse primário
era em morfologia, particularmente nas partes do discurso e as formas de nomes/substantivos e verbos.
A sintaxe foi largamente ignorada. Varrão produziu uma gramática do latim. As gramáticas tardias de
Donato e de Prisciano foram muito influentes na Idade Média.
Tradições arábica e hebraica: a tradição gramatical grega teve forte influência sobre a tradição
arábica, que também se focava na morfologia e tinha descrições fonéticas precisas. Influenciou a
tradição hebraica. Ben Josef al Fayyum produziu a primeira gramática e o dicionário de hebraico. A
tradição gramatical hebraica atingiu seu pico com David Kimhi e em subsequência teve forte impacto na
linguística europeia.
2. Medievo
Na Idade Média, o latim era tido em grande estima como língua franca e como a primeira língua escrita.
Gradualmente cresceu nos estudiosos o interesse pelas línguas vernaculares. Gramáticas pedagógicas
do latim para nativos de outras línguas começaram a aparecer. Um abade na Bretanha, mais ou menos
no ano 1.000, escreveu uma gramática do latim para crianças falantes do anglo-saxão. Escreveram-se
também gramáticas descritivas dos vernáculos, que geralmente apresentavam as línguas aos moldes do
latim.
No séc. XII, apareceu a noção da natureza universal da gramática. Bacon sustentava que a gramática
fosse fundamentalmente a mesma em todas as línguas, com diferenças incidentais e superficiais. No
mesmo século ainda, houve O Primeiro Tratado Gramatical de um desconhecido autor da Islândia que
apresentava uma breve descrição fonológica do islandês e que se preocupava em corrigir desta língua
imperfeições do sistema de escrita baseado sobre o latim.
Pelo colonialismo europeu, tomou-se ciência de diversas línguas. Os estudiosos compilavam listas de
palavras e comparavam as línguas, o que viria a gerar o método comparativo.
Ao final do séc. XVI, surgiu a noção de que as línguas europeias formam uma família e que a partir das
línguas filhas se voltaria a uma única língua antiga. Andreas Jäger propôs isso em 1686 definindo a terra
natal desta língua antiga como as montanhas caucasianas, de onde as línguas se espalharam para a
Europa e Ásia. Por equívoco de história, é a William Jones dado o crédito da descoberta da relação das
línguas indo-europeias e a fundação da linguística comparativa. Outras famílias foram reconhecidas
depois. Rasmus Rask apontou a importância da evidência gramatical para o estabelecimento das
relações entre as línguas.
A linguística no período colonial tinha outras preocupações que não a comparação e classificação de
línguas. Escreveram-se gramáticas das línguas europeias e das línguas das colônias. Os missionários
tiveram um papel importante e suas gramáticas de línguas não europeias dominaram do séc. XVI ao
XVIII. O padre jesuíta José de Anchieta é uma figura de destaque: conhecia o português, o castelhano, o
latim, e aprendeu o tupi, compondo a primeira gramática deste. O latim era a base das gramáticas
missionárias, ainda que os melhores gramáticos missionários tivessem consciência dos problemas de
aplicar as classes e estruturas latinas às outras línguas.
3. Modernidade
A linguística moderna surgiu no final do séc. XIX e começo do séc. XX trocando o foco da mudança da
língua ao longo do tempo para aquele de um sistema estruturado e autónomo em determinado ponto no
tempo, formando, então, a base da linguística estruturalista no período pós-Primeira Guerra.
O linguista suíço Ferdinand de Saussure, conhecido como o pai da linguística moderna, é amplamente
reconhecido por essa mudança de foco. Ele mesmo escreveu pouco, mas seus alunos, por notas de
aulas, reconstruíram suas ideias, publicando-as postumamente em 1916 no Curso de Linguística Geral.
Saussure defendeu a conceituação e a arbitrariedade do signo linguístico, sendo de grande influência.
A Fonética e a Fonologia foram dominantes na linguística moderna inicial. O IPA (International Phonetic
Association) foi estabelecido em 1886 por um grupo de foneticistas europeus.
A Escola de Praga
Estruturalismo Britânico
Firth, que estabeleceu a chamada London School (Escola de Londres), trouxe perspectivas originais e
provocativas à linguística. Questionou a admissão de que o discurso pode ser dividido em segmentos de
som um após o outro. Firth estava profundamente preocupado com o significado, desenvolvendo uma
teoria contextual do significado, de onde o aforismo “o significado é o uso em contexto”. Ele não
desenvolveu completamente uma teoria de gramática; deixou uma estrutura sobre a qual se poderia
desenvolver uma teoria.
Estruturalismo Dinamarquês
A escola de Copenhague era chefiada por Louis Hjelmslev, que desenvolveu uma teoria algébrica da
linguagem chamada Glossemática, que se focava nas relações entre unidades no sistema da língua. A
teoria antecipou a orientação algébrica dos linguistas americanos do pós-1940. Uma geração de
linguistas dinamarqueses foram influenciados por esta teoria no período de 1930-1960.
Estruturalismo Americano
Franz Boas, Edward Sapir e Leonard Bloomfield foram os responsáveis pela vertente do estruturalismo
americano. A preocupação maior de Boas era reunir informações sobre as línguas e culturas dos
americanos nativos antes que desaparecessem, e os métodos que ele e seus alunos desenvolveram
para a descrição dessas línguas deram a base para o estruturalismo americano. Boas, com seu aluno
Sapir, defendia que as línguas deviam ser descritas em seus próprios termos, em vez de aos moldes das
línguas europeias.
A preocupação primária de Bloomfield era estabelecer a linguística como ciência. Sua abordagem,
focada na metodologia, era força dominante na linguística americana dos anos 30 até meados dos anos
50. Os métodos analíticos tentavam excluir o significado o tanto quanto fosse possível.
4. Contemporaneidade
Costuma-se dividir a vasta gama de enfoques linguísticos em dois tipos primários, formal e funcional,
conforme o foco seja respectivamente a forma ou a função, apesar de que esta divisão é mal arranjada,
porque as teorias não se encaixam perfeitamente nesta divisão.
Linguística Formal
A principal corrente do estruturalismo neobloomfieldiano se tornou cada vez mais de orientação algébrica
desde o fim da Segunda Guerra, e se focava cada vez mais na sintaxe. Em 1957, isso sofreu um desafio
maior com a publicação de Noam Chomsky de Estruturas Sintácticas. Influenciado pelos recentes
desenvolvimentos da lógica matemática, ele rejeitava explicitamente os procedimentos de descoberta, a
posição sem teoria, o sustento da psicologia behaviorista e a orientação empírica da tradição
neobloomfieldiana.
Linguística Funcional
No final dos anos 50, houve novos desenvolvimentos em linguística na Europa. Eles, sob liderança de
André Martinet e Michael Halliday, decolaram em direções funcionalistas, salientando tanto o lado do
significado do signo de Saussure quanto a ideia de que a língua se desenvolve por causa dos seus usos.
Mais tarde, em oposição à linguística chomskiana, a partir do final dos anos 60, desenvolveu-se a
gramática funcional pelo linguista holandês Simon Dik. Rejeitando as noções principais da gramática
gerativa, ele exigia seriamente explicitação analítica e teorética.
Uma escola de pensamento sem líder reconhecido, a Gramática Funcional da Costa Oeste, surgiu nos
EUA, com seus praticantes localizados na costa oeste da América, pelo mesmo tempo. A ideia
proeminente desta corrente era a de que as categorias gramaticais são funcionais – serviam a algum
propósito, não eram arbitrárias. As linhas da gramática cognitiva (associada a Ronald Langacker) e da
gramática construtiva (Charles Fillmore e associados), em contraste com a Gramática Funcional da
Costa Oeste, interpretam o signo saussureano como peça central da gramática.
Ao final dos anos 50 na América, Joseph Greenberg começou a repensar questões de universais e
tipologia da linguagem. Ele procurava os universais empiricamente, investigando muitas línguas,
rejeitando o racionalismo de Chomsky e seu foco excessivo em uma única língua, o inglês. A corrente
greenbergiana é uma das menos funcionalistas das escolas funcionalistas.
Quase 7.000 línguas são faladas hoje. Um número de linguistas se ocupa com colher dados de línguas
pobremente documentadas. Linguistas missionários continuam com papel proeminente. Os avanços
tecnológicos desde o começo do séc. XX – incluindo gravadores de áudio e vídeo, e computadores – têm
facilitado imensamente a tarefa de documentação e descrição das línguas.
Os linguistas têm se aplicado a crescentes interesses além dos tradicionais como o aprendizado de
língua, o letramento e a tradução. Por exemplo, a linguística descritiva, a psicolinguística, a pragmática e
a análise de conversação, a sociolinguística, a linguística computacional.
Referências:
signo linguístico
Na conceção da linguística estruturalista, o signo linguístico é uma entidade psíquica indivisí
vel, composta por doiselementos: o significado ou conceito e o significante ou a forma linguí
stica na sua realização fonética ou gráfica. O signolinguístico é arbitrário porque não preten
de assemelhar-se ao seu referente. Diversas línguas atribuem diversos
significantes a um significado idêntico. As onomatopeias e as exclamações são consideradas
o único vestígio do signo
motivado. Atualmente nenhuma escola linguística contesta o princípio da arbitrariedade. O s
istema linguístico organiza ossignos em relações paradigmáticas e sintagmáticas. Em compa
ração com outros signos, o signo linguístico épraticamente imutável. A sua eventual modific
ação resulta dos mecanismos da evolução da língua e não da volição deum utente.
Signo linguistico
Na linguística saussuriana, diz-se que a relação que une o significado ao significante é marcada
pela arbitrariedade. De forma geral, pode-se dizer que o signo linguístico é arbitrário porque é sempre
uma convenção reconhecida pelos falantes de uma língua. Por exemplo, a ideia de garrafa e o seu
significante [g a R a f a ] mostra que existe arbitrariedade na relação significado/significante, porque
em outras línguas o registo fonético é diferente para o mesmo significado (bottle, em inglês,
ou bouteille, em francês). Quer dizer, não existe uma relação natural entre a realidade fonética de um
signo linguístico e o seu significado.
Ainda na teoria saussuriana, consideram-se dois tipos de arbitrariedade: a absoluta e a relativa,
para dizer, respectivamente, a imotivação total do signo (tomado isoladamente) e a motivação
relativa, de que são exemplo os derivados (pereira remete-nos para a palavra original pêra, mas o seu
sufixo -eira lembra-nos outros signos semelhantes como bananeira ou macieira).
A arbitrariedade do signo linguístico tem sido objecto, neste século XX, de grande discussão.
Em “La linguistique en France” (Journal de psychologie normale et pathologique, 33, 25, 1937), E.
Pinchon chama a atenção para que a realidade fonética do signo não é diferente nem existe
independentemente do significado, pelo que conclui que tal relação é necessária e não arbitrária.
Em Problèmes de linguistique générale (1966), Emile Benveniste argumenta que o vínculo entre
significado e significante não é arbitrário mas necessário, porque as duas realidades do signo são
indissociáveis. Jacques Derrida pronunciou-se também criticamente em relação ao modelo
saussuriano: “A tese do arbitrário do signo (….) deveria proibir a distinção radical entre signo
linguístico e signo gráfico. Sem dúvida, esta tese refere-se somente, no interior de uma relação
pretensamente natural entre a voz e o sentido em geral, entre a ordem dos significantes fónicos e o
conteúdo dos significados (…), à Necessidade das relações entre significantes e significados
determinados. Somente estas últimas relações seriam regidas pelo arbitrário. No interior da relação
‘natural’ entre os significantes fónicos e seus significados em geral, a relação entre cada significante
determinado e cada significado determinado seria ‘arbitrária’. Ora, a partir do momento em que se
considera a totalidade dos signos determinados, falados e a fortiori escritos, como instituições
imotivadas, dever-se-ia excluir toda a relação de subordinação natural, toda a hierarquia natural entre
significantes ou ordem de significantes.” (Gramatologia, trad. de Miriam Schnaiderman e Renato J.
Ribeiro, Ed. Perspectiva, São Paulo, 1973, pp.53-54).