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Revisão da Literatura
2.1 Scenario planning
Scenario planning trata-se, portanto, de uma ferramenta prospetiva versátil que pode ser
utilizada para planeamento estratégico e desenvolvimento de prospetiva estratégica em
contextos empresariais (Bradfield et al., 2005; Hodgkinson et al., 2006), devido a três
vantagens identificadas na literatura. Em primeiro lugar, pode ajudar as organizações a
melhorar a sua compreensão dos processos causais, ligações e sequências lógicas
subjacentes a eventos que possam moldar o futuro. Em segundo lugar, permite desafiar o
pensamento convencional e as mentalidades estabelecidas. Por último, é capaz de
contribuir para melhorar o processo de tomada de decisão, a fim de informar o
desenvolvimento de estratégias (Wright et al., 2013). Ademais pode ter contributos
indiretos, na forma de aprendizagem organizacional e servir como ferramenta de
comunicação (Mietzner & Reger, 2005). Em virtude destes benefícios, scenario planning
também é frequentemente empregue no contexto da literatura científica (Van der Heijden
et al., 2002; Wright et al., 2013), onde surge como um conceito umbrella, abrangendo uma
vasta gama de métodos, definições e abordagens (Amer et al., 2013).
Convém ressalvar que o uso de scenario planing não é direcionado para prever o futuro
mais provável, mas sim explorar múltiplas situações futuras possíveis com o intuito de
expandir a esfera de pensamento dos participantes, aquando no processo de
desenvolvimento de um dado cenário (Godet, 2000). Como tal, cenários diferem das
previsões. Enquanto nos primeiros são exploradas uma série de resultados possíveis,
resultantes de um entendimento das incertezas, nas segundas o objetivo passa por
identificar o caminho mais provável e estimar as incertezas associadas (Pillkahn, 2008).
O número de métodos e técnicas na literatura chega a ser tão elevado, que alguns autores
descrevem o seu estado atual como sendo um “caos metodológico” (Martelli, 2001;
Spaniol and Rowland, 2018), faltando ainda uma base conceptual sólida (Bradfield et al.,
2016). Tal dificulta o trabalho dos académicos em desenvolver uma compreensão
abrangente das ligações entre prospetiva estratégica e scenario planning (Spaniol &
Rowland, 2018).
Uma possível tipologia apresentada por Börjeson et al. (2006) divide os estudos de
cenários em três tipos, dependendo da sua natureza, bem como o grau de complexidade e
incerteza envolvida. Estes são cenários preditivos (“O que vai acontecer?”), cenários
exploratórios (“O que pode acontecer?”) e cenários normativos (“Como é que um objetivo
específico pode ser alcançado?”) (Börjeson et al., 2006). Os mesmos autores também
apontam três tipos de técnicas principais para a formulação de cenários. Primeiramente,
temos as técnicas de geração, que resultam da geração e coleção de ideias e conhecimento
relativas ao futuro, obtidas de entrevistas, workshops, inquéritos, entre outros.
Segundamente, surgem as técnicas de integração, que envolve o uso de modelos
quantitativos e qualitativo para desenvolvimento dos diferentes cenários. Por último,
técnicas de consistência que procuram assegurar a consistência entre os diferentes cenários
formulados (Börjeson et al., 2006).
Com maior relevância na literatura científica, surge as três escolas de scenario planning,
propostas por Bradfield et al. (2005), cada uma com as suas técnicas e abordagens para a
formulação de cenários. São elas a escola de lógica intuitiva, a escola de tendências
probabilísticas modificadas e a escola francesa la prospective.
Por outro lado, a escola de tendências probabilísticas modificadas segue uma abordagem
quantitativa, assente num raciocínio probabilístico, incorporando duas metodologias
distintas baseadas em matrizes, análise de impacto de tendências e análise de impacto
cruzado (Bradfield et al., 2005). Tais técnicas envolvem a modificação probabilística de
tendências extrapoladas (Amer et al., 2013).
Por último, a escola la prospective, de origem francesa, caracteriza-se por uma abordagem
formalizada que utiliza uma combinação ferramentas qualitativas e quantitativas, sendo
descrita pelos acadêmicos, portanto, como sendo uma mistura da escola de lógica intuitiva
e a escola de tendências probabilísticas (Bradfield et al., 2005). Tipicamente, é bastante
usada para auxiliar decisores no desenvolvimento de políticas (Arboleda et al., 2021),
como é o caso do planeamento do setor público francês (Bradfield et al., 2005).
Na tabela XX encontra-se uma breve sistematização das três escolas descritas, com base
nos trabalhos de Amer et al. (2013) e Bradfield et al. (2005). De ressalvar, que mesmo com
a proposta das três escolas de scenario planning, numa revisão feita por Hussain et al.
(2017), os autores concluem que os requisitos e circunstâncias de cada intervenção leva à
criação de variações nos métodos usados por cada autor. No entanto, genericamente
podemos identificar três fases chave no processo, nomeadamente a preparação, a
construção e a elaboração de estratégias (Amer et al., 2013).
Apesar de existir uma ampla coleção de métodos para uso em scenario planning, como
discutido anteriormente, de todos a abordagem a mais empregue na literatura é a da escola
da lógica intuitiva, chegando mesmo a ser denominada como o método padrão de scenario
planning (Bradfield et al., 2005; Hodgkinson et al., 2006). Trata-se da técnica mais
amplamente aceite devido à utilização de narrativas ricas para delinear potenciais
caminhos evolutivos do futuro, sendo, por isso, adequada à discussão de casos de estudos
em gestão (Wright et al., 2013). Ou seja, é uma abordagem essencialmente qualitativa e
descritiva para a formulação de cenários flexíveis, combinando a imaginação e pensamento
crítico dos participantes (Wilkinson & Kupers, 2014). A sua utilização ajuda a determinar
as relações entre incertezas críticas, as principais forças motrizes de mudança, e novas
tendências (e.g. sociais, políticas ou tecnológicas), bem como o comportamento de
organizações ou setores individuais, que possam ter interesse no dado futuro em estudo
(Wright et al., 2013). Aliás, uma vantagem principal desta escola é o desenvolvimento de
uma narrativa que mostra claramente as interações entre eventos que conduzem a um
determinando cenário (Amer et al., 2013).
A escola de lógica intuitiva segue uma abordagem baseada na plausabilidade, que ajuda a
gestão de uma organização a focar na criação de narrativas que descrevam relações de
causa-efeito num processo de tomada decisão (Mackay & Tambeau, 2013). Ademais, os
cenários formulados, baseados nas forças motrizes mais relevantes e incertas da indústria,
podem ser desenvolvidos em histórias de causalidade consistentes, numa estrutura
cronológica, de onde podem derivar estratégias para a respetiva organização (Van der
Heijden et al., 2002; Wright et al., 2013). Aliás, esta promoção do pensamento estratégico
no processo estratégico é um dos grandes objetivos deste método, a fim de obter um plano
estratégico mais holístico e baseado em contingências (Schoemaker, 1995). Num estudo de
Meissner e Wulf (2013), os autores concluem, que das ferramentas de planeamento
estratégico investigadas, este método relevou-se o mais eficaz em garantir uma elevada
qualidade na tomada decisão no processo estratégico.
Relativamente ao processo usado na lógica intuitiva, este pode variar no seu número de
etapas, consoante diversas propostas presentes na literatura. De uma forma geral, Tapinos
(2012) sugere que que tal processo pode ser dividido duas grandes fases: i) a geração de
cenários, que termina no criação das narrativas, e ii) uso dos cenários como base para
desenvolvimento de estratégia. Para passos mais concretos, existem várias propostas, como
as expostas nos trabalhos de Wright et al. (2013) ou Shoemaker (1995). Também bastante
mencionada na literatura, temos a metodologia denominada GBN, formulada por Schwartz
(1996). Nela, o autor descreve 8 etapas para a elaboração dos cenários, nomeadamente:
Dentro da escola intuitiva, podemos, ainda, distinguir duas abordagens diferentes, apesar
de ambas partirem do foco nas incertezas de um dado ambiente empresarial, para a seleção
das incertezas mais críticas a serem usadas como premissa base para a formulação de
cenários (Wright et al., 2013). A primeira, chamada abordagem indutiva, é vagamente
estruturada e conta com a capacidade de se alcançar um consenso dentro de um grupo de
peritos e tomadores de decisão. A segunda, denominada abordagem dedutiva, utiliza
técnicas simples de prioritização para construir uma matriz de cenários 2x2, baseada nas
duas maiores fontes de incerteza (i.e., forças motrizes de mudança) do ambiente em
análise, resultando em quatro cenários distintos, localizados no quadrante de um extremo
de cada incerteza crítica selecionada (ver Figura XX). Tanto uma quanto a outra são
subjetivas e de natureza qualitativa (Bradfield et al., 2005), sendo que a metodologia GBN
adequa-se bem aos autores que pretendam seguir uma destas abordagens (Schwartz, 1996).
Com tal elevado investimento em I&D, esta indústria apresenta ciclos de novas tendências
a nível de práticas e tecnologias, imperando a atenção de todos os stakeholders de forma a
serem capazes de as implementar. Atualmente, na indústria automóvel, surgem duas
grandes tendências a ter em conta, nomeadamente a eletrificação e a digitalização deste
setor (Brown et al., 2021; Pelle & Tabajdi 2021).
2.2.1.1 Eletrificação
Assim, com a crescente pressão por parte das autoridade e reguladores, aliada à maior
procura por parte do consumidor, verifica-se uma tendência de eletrificação na indústria
automóvel, uma vez que os carros elétricos, ou híbridos, podem auxiliar a redução de gases
CO2 (De Rubens et al., 2018; Gnann et al., 2018), resultando no aumento constante da sua
cota de mercado (Casper & Sundin, 2021).
2.2.1.2 Digitalização
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