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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ – UNESA

CURSO SUPERIOR TECNOLÓGICO EM SEGURANÇA PÚBLICA – CSTSP

ALESSANDRO LUIZ DA CUNHA PEDRO

AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS E SUA EFICÁCIA

Artigo a ser apresentado à Banca do Exame do Curso


Superior de Tecnólogo em Segurança Pública da
Universidade Estácio de Sá – CSTSP/UNESA, como
requisito para aprovação na disciplina de TCC em
Segurança Pública.

ORIENTADOR

Professor George Wilton Toledo

Rio de Janeiro- RJ

Abril de 2020
AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS E SUA EFICÁCIA

SOCIO-EDUCATIONAL MEASURES AND THEIR EFFECTIVENESS

Alessandro Luiz da Cunha Pedro1


GeorgeWilton Toledo2

RESUMO

O presente trabalho aborda o estudo do instituto medidas socioeducativas e a sua eficácia.


Analisando se a reeducação e ressocialização, que são os objetivos principais da aplicação
dessas medidas, ocorrem de fato. A pesquisa apresenta uma evolução histórica do direito
menorista na legislação brasileira, os princípios aplicados aos adolescentes em conflito com a
lei, os atos infracionais que podem gerar a aplicação de tais medidas, o conceito e o
procedimento de cada medida, bem como as garantias e os direitos fundamentais dos menores.
E por fim, a analisa a eficácia das medidas socioeducativas, observando como o Estado, a
sociedade e a própria família contribuem para ineficácia do presente instituto. Apresentadas
todos os aspectos analisados pode se concluir que em uma análise relativa, as medidas
socioeducativas não alcançam sua finalidade. O método de pesquisa utilizado foi o de
pesquisa bibliográfica, por meio de consultas a livros, revistas científicas e a internet, referente
ao assunto em pauta.

Palavras-chave: Medida Socioeducativa; Eficácia; Segurança Pública.

ABSTRACT

The present work deals with the study of the institute of socio-educational measures and its
effectiveness. Analyzing whether re-education and resocialization, which are the main
objective of the application of these measures, the occurrence of facts. The research presents a
historical evolution of the minor law in Brazilian legislation, the principles applicable to
minors in conflict with the law, the infractions that can generate the application of such
measures, the concept and the procedure of each measure, as well as the practices and the
fundamental rights of minors. And also, a conclusion about the measure of the measures. The
research method used was bibliographic research, through consultations with books, scientific
journals and the internet, regarding subjects on the agenda.

Keywords: Socio-educational Measure; Efficiecy; Public security.


1 Graduando em Tecnólogo em Segurança Pública pela Universidade Estácio de Sá. E-mail:
alcpedro1960@gmail.com
2 Graduado em Ciências Jurídicas Sociais. E-mail: george.wilton@estacio.com.br
1
1 INTRODUÇÃO

O presente artigo estuda com afinco a Lei. nº 8.069/90, chamado de Estatuto da Criança e do
Adolescente, analisando a eficácia das medidas socioeducativas. Assim, o presente artigo tem por
escopo, analisar a conveniência e aplicabilidade das medidas socioeducativas, frente a complexidade de
reeducação e ressocialização do adolescente em conflito com a lei. Analisando se as medidas aplicadas
são eficientes e aplicadas corretamente, a fim de atender ao seu objetivo.
Por muito tempo, os menores viviam a margem da sociedade, sem direitos regulamentados. O
Estatuto da Criança e do Adolescente passou a ser idealizado após a promulgação da Constituição
Federal, no ano de 1988, momento em que foi determinado que crianças e adolescentes devem ser
tratadas como pessoas de direito e assim ter seus direitos e garantias positivadas.
A Constituição Federal previu que:
Art. 227.É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
Assegurar tais direitos e evitar possíveis negligências, exploração, discriminação ou qualquer
tipo de violência devem ser tratados como absoluta prioridade. Desta forma o texto constitucional
reconhece o estado de vulnerabilidade em que crianças e adolescentes se encontram e propõe meios
para que possam ser protegidos de forma que sua integridade física e moral possam ser preservada.
Para responder a tais questionamentos abordaremos a Lei que garante os direitos menoristas,
analisaremos as medidas socioeducativas, a forma de sua execução e exploraremos o seu préstimo.
Insta salientar que, a Lei nº8.069/90 revogou o Código de Menores, vez que, este só previa
sanções, não assegurando as garantias constitucionais aos adolescentes em conflito com lei.
A justificativa para a escolha de tal tema se deve as inúmeras críticas que tal sistema recebe
atualmente.
A metodologia utilizada na realização do presente trabalho foi a de pesquisa bibliográfica, com
consultas a sites, renomados doutrinadores e sítios eletrônicos confiáveis.
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2. DESENVOLVIMENTO

2.1. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

Com o advento da Constituição Federal de 1988, o mencionado Código de Menores já não se


enquadrava nos padrões e preceitos de uma Constituição política cidadã, a qual implantou a doutrina da
proteção integral à criança e ao adolescente, diferenciando-a da doutrina da situação irregular durante a
vigência do Código de Menores.

A partir da nova ordem constitucional, o legislador infraconstitucional criou no ano de 1990 o


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que passou a considerar o menor de idade como pessoa
com direitos e deveres garantindo aos mesmos os direitos inseridos na Constituição Federal de 1988.
Assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente veio atender às determinações contidas no artigo 5º,
LIV, LV e LVI c/c o artigo 227, § 3º, incisos IV e V, todos da Constituição Federal.

Por conta da ideia de se criar o ECA, foi surgindo uma nova perspectiva cujo pilar já estava
assentado na Constituição Federal de 1988. Ou seja, realçou-se o pensamento de que o processo de
construção dos direitos faz parte da luta de todos os seres humanos. A criança e o adolescente, em
função da sua imaturidade física, psicológica, social e pela sua condição de vulnerabilidade, revelam e
apresentam necessidades específicas que acarretam direitos igualmente específicos.

Conforme Bulgarelli (2013) Neste contexto de muitas lutas e movimentos, no dia 13 de julho
de 1990, foi aprovada a Lei Federal nº. 8.069/90, denominado de Estatuto da Criança e do Adolescen-
te, substituindo integralmente o já citado Código de Menores de 10 de novembro de 1979 (Lei 6.697).
Porém, a luta pelos direitos da criança e do adolescente não começou e nem se concluiu com a procla-
mação do ECA, ou seja, este é resultado de uma conjunção de movimentos da sociedade, que vinham
debatendo e manifestando a necessidade de alteração no tratamento às crianças e aos adolescentes.

O ECA surge, então, com a intenção de defender os direitos infantojuvenis, tendo como alicer-
ce a cidadania das crianças e dos adolescentes, aflorando um resgate ético na defesa e na luta por uma
sociedade mais justa, humana e igualitária. Mas, conforme Dallari (2011), para que se possa entender
a sua criação e aplicação, faz-se necessário compreendê-lo inserido em uma conjuntura social, econô-
mica e política marcada pelo neoliberalismo e, em decorrência da pobreza, desigualdade e exclusão
3

social, acirradas no decorrer dos últimos trinta anos, principalmente nos países de economia periféri-
ca, como o Brasil.

Internacionalmente a conjuntura que antecedeu a proclamação do ECA, nas décadas de 1970 e


1980, passava por mudanças substanciais na conformação de uma fase mais evoluída do capitalismo
conhecida como globalização.

Conforme Silva (2015) na conjuntura nacional da década de 1980, o Brasil vivia um processo
de transição político-democrática, como o (novo) sindicalismo, o movimento das ―Diretas-Já (1984),
a manifestação pela anistia dos presos exilados políticos durante a ditadura militar e as lutas por direi-
tos trabalhistas, sociais, políticos e civis.

Assim, o ECA teve a sua institucionalização no movimento entre a conjuntura nacional e a in-
ternacional, em que o Brasil encontrava-se em plena mudança de cunho político, atrelado ao novo sin-
dicalismo.

Conforme Silva (2015, p. 30):

“Ainda deve se analisar que, por ocasião da sua aprovação, o Brasil já conhecia a prática do ne-
oliberalismo promovido pelo governo Collor de Mello, que firmou essa lei não apenas por con-
vicção política, mas também por questões internacionais e nacionais, já que seu governo estava
desabonado”.

Contudo, o ECA representava e ainda representa um importante momento de consolidação de


uma nova interpretação sobre as questões ligadas à infância e à juventude, fundamentado na garantia
e viabilização dos direitos, no estímulo a participação e principalmente no desenvolvimento de políti-
cas sociais de caráter universal e não mais destinado a um pequeno grupo privilegiado.

Para a aprovação do ECA foi necessário contar com a participação e mobilização de diferentes
atores sociais para que, juntos, somassem seus esforços com a intenção de levar o país a uma mudan-
ça estrutural capaz de romper com as velhas práticas consideradas até então educativas. Aprovação
está consagrada em um sistema capitalista marcado pela injustiça, pobreza, exclusão e desigualdade.

Conforme Silva (2015, p. 36):

“O ECA não foi um presente do Estado, mas uma conquista da sociedade civil, das lutas sociais
e reflete ganhos fundamentais que os movimentos sociais têm sabido edificar. Ocorre que foi
uma conquista adquirida tardiamente nos limites do neoliberalismo, nos quais os direitos estão
ameaçados, precarizados e reduzidos, criando um empecilho na cidadania de crianças‘ no senti-
do de tê-la conquistada formalmente, sem, contudo, existir condições autênticas de ser concre-
tizada e usufruída”.
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Para essa autora, representa um referencial e marco jurídico-legal, determinando que os direi-
tos, devem ser promovidos e garantidos a todos, com a articulação das políticas sociais em prol das
necessidades de crianças e adolescentes. São direitos considerados universais, indivisíveis, interde-
pendentes e complementares. Está composto por 267 artigos, que direcionam todas as práticas neces-
sárias para a construção de um novo tempo, relacionado à tentativa de dar respaldo às ações de todos

os cidadãos em busca da garantia, da efetivação e do respeito aos direitos daqueles que se encontram
na faixa etária da infância e da adolescência.

Conforme Dallari (2012), o ECA apresenta inovações na política de promoção e defesa dos di-
reitos, ou seja, proporciona mudanças de conteúdos, de método e de gestão, consubstanciando uma
política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente. Divide as políticas sociais em bási-
cas, assistenciais, programas de proteção especial para as crianças e jovens em situação de extremo
risco e políticas de garantias, sendo essas um direito da criança e do adolescente e, simultaneamente,
um dever do Estado, mas também da família e da sociedade.

De acordo com, o ECA, as políticas sociais básicas são: a saúde, a educação e a profissionali-
zação, entendidas como direito de todos e dever do Estado de provê-las. As políticas e programas de
assistência social são disponibilizados àqueles que dela necessitarem, como a alimentação e o vestuá-
rio. As políticas de proteção especial são direcionadas à prevenção e ao atendimento das situações de
risco pessoal e social como a negligência, os maus tratos, a exploração, o abuso, a crueldade e a
opressão. Já as políticas de garantias, voltada para a promoção da garantia e proteção jurídico social
dos direitos das crianças e adolescentes.

Os autores chamam atenção para o pressuposto de que, o uso de drogas lícitas e ilícitas como
uma situação importante de vulnerabilidade. Os viciados em drogas são considerados infratores, uma
vez que o uso de tais substâncias caracteriza crime e tratamento para isso pode ser prescrito a partir de
uma visão patológica e / ou psicopatologia. Há grande preconceito e intolerância sociedade que avalia
com rejeição, a terapêutica redução de danos (um programa do Ministério da Saúde no Brasil), até
mesmo socialmente tolerada e não criminalizada. O uso de álcool e abuso também são vistos como
problemas patológicos e psicológicos que requerem tratamento. Socialmente focado no julgamento
moral, a desqualificação dos gatilhos do usuário de álcool e drogas todas as reações de indignação às
atitudes e consequências desses indivíduos, dificultando o acesso para esses assuntos.
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A política de atendimento à criança e ao adolescente é complexa, pois para alcançar seu êxito
depende da interação dos poderes da União (judiciário, executivo e legislativo), dos níveis de governo
(federal, estadual e municipal) e das diversas instituições (Vara da Infância e da Juventude, o Ministé-
rio Público, a Prefeitura Municipal, as Organizações sem fins econômicos, as Polícias, os Conselhos).

2.2. Princípios aplicáveis à Criança e ao Adolescente

Princípio da Prioridade Absoluta

Este princípio está previsto na Constituição Federal, estabelecido pelo artigo 227, já estudado
anteriormente e retomado pelo artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente. Sendo assim, o artigo
dispõe que:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar,


com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Nesse sentido, todas as crianças e adolescentes deverão ser tratadas com absoluta prioridade,
tendo em vista a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Determina que a família, o Estado e
a sociedade têm o dever de assegurar, por todos os meios, todos os direitos das crianças e adolescentes.

Ainda é possível extrair do Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 4º que, garantia
de prioridade compreende:

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:


a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à


infância e à juventude
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Assim, o princípio da prioridade absoluta determina que crianças e adolescentes sejam tratados
pela sociedade e em especial, pelo Poder Público, com total primazia pelas políticas públicas e ações do
governo.

Princípio da Proteção Integral

A proteção integral tem como propósito a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos
de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. O princípio da proteção integral, em síntese,
norteia a construção de todo o ordenamento jurídico voltado à proteção dos direitos da criança e do
adolescente

Sobre este princípio, Cury, Garrido & Marçura ensinam que:

A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e ado lescentes são
sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a ideia de que sejam
simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos
comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição pe
culiar de pessoas em processo de desenvolvimento (2002, p. 21).

No apoio do significado de proteção integral está o conceito de concretização de todos os


direitos fundamentais de crianças e adolescentes, localizada na compreensão de que estes fundamentais
direitos estabelecem um todo unitário e interdependente, que deve ser ao mesmo tempo garantido, para
que se tenha a proteção material plena dos cidadãos, crianças e dos cidadãos adolescentes
(MACHADO, 2013).

Segundo Amato (2018), para conseguir a proteção integral, é necessário um tratamento distinto
da maneira como são tratados os direitos fundamentais dos adultos. Para alcançá-la, é fundamental a
atuação harmônica e interdependente do Estado, da família e da sociedade.

Antes de estudarmos os próximos princípios devemos fazer menção do art.121 da Lei estudada,
que trata a respeito da medida socioeducativa de internação, que será tratada de forma melhor adiante,
que diz:

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios
de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento.
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Princípio da Excepcionalidade

A Lei nº 8.069/90 determina que a medida de internação somente será aplicada em sendo a
última alternativa possível. Assim, sempre que possível, o adolescente em conflito com a lei deve ser
mantido no seu seio familiar. Sendo a internação a medida mais gravosa a ser aplicada.

A medida de internação só será aplicada caso o ato infracional tenha sido cometido mediante
grave ameaça ou violência, ou no caso de reiteração em outras infrações graves, bem como, por
descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta (MACHADO, 2013).

Deve-se frisar que é um engano da população pensar que a solução do problema do adolescente
infrator é a internação. Na verdade, por melhor que seja a entidade de atendimento, a internação deve
ser aplicada de forma excepcional, pois provoca no adolescente os sentimentos de insegurança,
agressividade e frustração, acarreta exacerbado ônus financeiro para o estabelecimento e não responde
as dimensões do problema (MACHADO, 2013).

Princípio da Brevidade

Como vimos, a medida socioeducativa de internação é a mais grave aplicada pelo Estatuto. O
educando submetido a esta modalidade de ação socioeducativa está privado do direito de ir e vir. Por
ser a referida medida a mais severa deve ser considerado que se trata de pessoa em desenvolvimento,
portanto deve ser a internação a última “ratio”. (MACHADO, 2013).

Assim, a duração de tal medida não deve exceder o prazo necessário para o fim a qual se
destina, que o de reeducar e conscientizar o adolescente em conflito com a lei, da conduta praticada.
Não devendo jamais ultrapassar o limite legal, que estudaremos adiante e, sempre que possível, ser
reavaliada, analisando a conduta do educando e observando a razoabilidade da medida.

2.3. Do ato infracional


Considera-se ato infracional a prática de conduta descrita com crime ou contravenção penal,
segundo o art. 103 da Lei nº 8.069/90.
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Do sujeito do ato infracional

Considera-se sujeito do ato infracional a criança ou adolescente que, pratica conduta análoga a
crime ou contravenção penal. O Estatuto da Criança e do Adolescente compreende que:

Art.2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade
incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Assim, conforme ensina Liberatti, ato infracional sob a ótica do Estatuto o definiu como: “a
prática de crime e contravenção penal por criança ou adolescente (2001, p.90).”
Insta salientar que, o presente artigo não tem como finalidade discutir as questões relativas a
maioridade penal, mas somente analisar a força das medidas socioeducativas.
A lei em estudo prevê que os menores de 18 anos são inimputáveis, assim, não é possível a
aplicação de penas, daí surge o instituto das medidas socioeducativas. Assim, todos os adolescentes que
praticam infrações devem ser orientados segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, e não, pelo
Código Penal.

Conforme ensina Tourinho Filho:


[...] uma presunção jure et de jure de que, em face do seu desenvolvimento mental
incompleto, não tem o discernimento ético para entender o caráter ilícito do fato ou de
se conduzir de acordo com essa compreensão, de acordo com o Art. 27 do CP. Pouco importa
seja ele estabelecido comercialmente ou casado. Interessa saber se à época da ação ou omissão
era menor de 18 anos de idade. Sendo-o, não se lhe instaura processo. Ficará apenas sujeito às
sanções previstas no Código da Criança e do Adolescente.

Marcos Bandeira também entende que:

No momento em que ao adolescente é atribuída uma conduta humana que esteja tipificada no
Código Penal Brasileiro, Lei de Contravenções Penais ou em qualquer lei extravagante, como
crime ou contravenção, pode-se afirmar que a ele está sendo imputada a prática de um ato
infracional, como, v.g., o adolescente que rouba, furta, porta arma de fogo, dirige veículo sem
habilitação e ameaça, concretamente, a integridade física de alguém, trafi ca drogas etc. É curial
que o fato, além de ser, ofensividade e da imputação objetiva. Com efeito, o adolescente
responderá pelo ato que lhe é imputado nos termos estabelecidos pelo ECA, pois o legislador,
ao eleger o critério biológico ou etiológico para aferir a inimputabilidade do menor de 18 anos
(2006).
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2.4. As medidas socioeducativas em espécie:

Sempre que um adolescente for apreendido na prática de um ato infracional este poderá ser sub-
metido a uma medida socioeducativa, que será imposta pelo Juiz, diante de um devido processo legal.
Insta salientar que, as medidas socioeducativas são aplicáveis aos adolescentes, que segundo o próprio
Estatuto da Criança e do Adolescente, são os maiores de 12 e menores de 18 anos.

Assim, o adolescente autor de ato infracional é obrigado, por determinação judicial, a cumprir
medidas socioeducativas, que contribuem, de maneira pedagógica, para o acesso a direitos e para a mu-
dança de valores pessoais e sociais dos adolescentes.

A Lei nº 8.069/90 prevê que são medidas socioeducativas:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar
ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Para cada ato infracional praticado por um adolescente, haverá uma medida socioeducativa
correspondente, e, se esse cometer mais de um ato, responderá cumulativamente, atendendo aos
princípios da proporcionalidade, necessidade e individualização. A respeito da individualização: “está
relacionada ao próprio adolescente, ou seja, qual a medida socioeducativa mais adequada ao infrator,
conforme sua personalidade, sua conduta social, o grau de reprovabilidade que ele atribui a sua conduta
(RESMINI, 2008).”

Passaremos agora ao estudo de cada uma das medidas que podem ser aplicadas aos adolescentes
em conflito com a lei:
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2.4.1 Advertência

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que advertência consistirá na admoestação verbal,


que será reduzida a termo e assinada.

Esta medida será aplicada ao adolescente que cometer ato infracional de menor potencial
ofensivo. É uma das medidas mais tradicionais, uma vez que, já era prevista desde o Código Melo
Matos.
Conforme ensina Marco Bandeira, o ato de “advertir”, “admoestar” está inserido numa relação
de poder, objetivando, em última análise, orientar ou conduzir o adolescente em conflito com a lei a
redirecionar o seu comportamento para o modelo exigido pelo sistema social dominante (BANDEIRA,
2006).
Comenta sobre essa medida o autor Konzen:

A medida de advertência, muitas vezes banalizada por sua aparente simplicidade e singeleza,
certamente porque confundida com as práticas disciplinares no âmbito familiar ou escolar,
produz efeitos jurídicos na vida do infrator, porque passará a constar do registro dos
antecedentes e poderá significar fator decisivo para a eleição da medida na hipótese da prática
de nova infração. Não está, no entanto, nos efeitos objetivos a compreensão da natureza dessa
medida, mas no seu real sentido valorativo para o destinatário, sujeito passivo da palavra
determinada autoridade pública. A sensação do sujeito certamente não será outra do que a de se
recolher à meditação, e, constrangido, aceitar a palavra da autoridade como promessa de não
reiterar na conduta. Será provavelmente um instante de intensa aflição (2007).

2.4.2 Reparação de Danos

Toda vez que o ato infracional praticado pelo adolescente acarretar prejuízos, ou seja, ocasionar
reflexos patrimoniais, o juiz poderá aplicar a medida socioeducativa de obrigação de reparação do dano
Tem-se que o propósito da medida é fazer com que o adolescente infrator se sinta responsável
pelo ato que cometeu e intensifique os cuidados necessários, para não causar prejuízo a outrem. Por
isto, há entendimento de que essa medida tem caráter personalíssimo e intransferível, devendo o
adolescente ser o responsável exclusivo pela reparação do dano. (LIBERATI 2002).
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Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a
autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a
coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da
vítima.

Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída


por outra adequada.

2.4.3. Prestação de Serviços à Comunidade

Consiste na prestação de serviços a entidades hospitalares, assistenciais, educacionais e


congêneres, por período não superior a seis meses, e visa, fundamentalmente, aferir o senso de
responsabilidade do jovem e sua aptidão para cumprir a medida em meio aberto, ou seja, o adolescente
continuará estudando ou trabalhando, normalmente, convivendo na sua comunidade junto com seus
familiares e amigos (BANDEIRA, 2006).
O parágrafo único do art. 117, do ECA, enfatiza que as tarefas a serem cominadas aos
adolescentes o serão de concordância com as suas capacidades, não podendo a jornada exceder oito
horas semanais, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.

Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de


tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses,
junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos
congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.

Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do


adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas
semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não
prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.

2.4.4. Liberdade Assistida

A liberdade assistida consiste no acompanhamento do adolescente por pessoa capacitada para


tanto. Esta medida possui o prazo mínimo de 6 meses e visa impedir que o adolescente pratique novos
atos infracionais a partir da orientação exercida por um agente com esta função.

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais
adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.
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§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá


ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.

§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a
qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o
orientador, o Ministério Público e o defensor.

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente,


a realização dos seguintes encargos, entre outros:

I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e


inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e
assistência social;

II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente,


promovendo, inclusive, sua matrícula;

III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no


mercado de trabalho;

IV - apresentar relatório do caso.

Como enfatizado no início, o sucesso da medida depende da existência de uma entidade


de execução de medidas socioeducativas em meio aberto que, com sua equipe interdisciplinar e toda a
sua estrutura, possa estudar cada caso, conhecer a história do adolescente em conflito com a lei, e a de
sua família, distribuir adequadamente as tarefas em conformidade com suas aptidões, acompanhá-las,
fiscalizá-las e tudo comunicar ao Poder Judiciário, através de relatórios circunstanciados remetidos
periodicamente.

Nessa perspectiva, atuando diretamente na raiz do problema, estimulando a autoestima


do jovem ainda em desenvolvimento, introjetando regras mínimas de convívio social e fortalecendo os
vínculos familiares, é de se esperar que o adolescente que eventualmente cometeu algum ato
infracional possa redirecionar seus passos para o exercício da cidadania.

2.4.5. Semiliberdade

Com o fito de conservar os ligamentos familiares e sociais, o Estatuto da Criança e do


Adolescente inovou ao consentir a sua atenção desde o início do atendimento, permitindo a realização
de atividades externas, independentemente de autorização judicial.
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Art. 120. O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o início, ou como
forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades
externas, independentemente de autorização judicial.
§ 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que
possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.

§ 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as


disposições relativas à internação.

É cogente a escolarização e a profissionalização, não comportando prazo determinado,


aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.

A interação do adolescente com o meio social na sua condição de normalidade do


relacionamento humano (o que não se dá no cárcere) também potencializa a possibilidade de o
adolescente modificar seu comportamento anterior, para ajustá-lo às regras do convívio social
(MACHADO, 2003).

2.4.6. Internação

A medida socioeducativa da internação é a mais austera de todas as medidas antecipadas no


Estatuto da Criança e do Adolescente, por privar o adolescente de sua liberdade. Deve ser sobreposta
somente aos casos mais graves, em caráter excepcional, conforme prescreve o ditame constitucional e o
próprio Estatuto em estudo.

Art. 122 § 2º. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra
medida adequada.

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de
brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento.

Tal medida não tem prazo determinado, devendo ser reavaliada a cada seis meses e não devendo
exceder o prazo de três anos. Além disso, ao completar vinte e um anos de idade o adolescente deve ser
liberado.
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Conforme visto anteriormente a medida de internação só será aplicada em casos excepcionais,


em que as circunstâncias indicarem a necessidade de tal medida. O Estatuto da Criança e do Adolescen-
te explícita que:

Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:


I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

Tão importante quanto tratar das medidas é tratar dos direitos que os internos têm enquanto
durar a sua apreensão.

Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes,
em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de ida
de, compleição física e gravidade da infração.

Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:
I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público;

II - peticionar diretamente a qualquer autoridade;

III - avistar-se reservadamente com seu defensor;

IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada;

V - ser tratado com respeito e dignidade;

VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio


de seus pais ou responsável;

VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;

VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;

IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal;

X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade;

XI - receber escolarização e profissionalização;

XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer:

XIII - ter acesso aos meios de comunicação social;

XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje;
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XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para


guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da
entidade;

XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à


vida em sociedade.

§ 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade.

Após um breve estudo, dos aspectos mais importantes a serem abordados no presente trabalho,
passaremos a discutir quanto à efetividade das medidas socioeducativas.

2.5. A Ineficácia da medida socioeducativa

Geralmente o perfil do adolescente em conflito com a lei é de um adolescente com conflitos


causados dentro de seu lar, que vive a desigualdade social tão aflorada no nosso País, que sofre com a
falta de políticas públicas e por outras vezes o envolvimento com o tráfico de drogas, ou somente a
convivência com esses ambientes.

Ao analisarmos esse problema do ponto de vista sociocultural, percebemos que esses


adolescentes são todas vítimas de um complexo sistema decorrente da desordem ora do estado, ora da
família.

Partindo dessas situações, vem à tona uma grande onda de influências determinantemente
desproporcionais às grandes vítimas dessa violência que são os jovens adolescentes, no que vemos o
reflexo demonstrativo de incapacidade do nosso estado em promover com a sociedade moderna um
patamar de vida adequado para crianças, adolescentes e jovens.

A prática de um ato infracional não significa se ter um caráter ou um desvio moral, mas pode
ser também uma forma de sobrevivência, onde se luta contra o abandono e violências sofridas.

Destarte, não podemos dizer que somente os adolescentes pobres, de um grupo marginalizado,
cometem atos infracionais, pois nem todos cometem tais atos, e existem aqueles adolescentes de classe
econômica média a alta que cometem atos infracionais.

Indubitavelmente, o Estado quando falta com ações positivas colabora em muito para que
inúmeros adolescentes enveredem pelo caminho do crime. A violência, a fome, a desigualdade social, a
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falta de escola, carência de educação, saneamento básico e saúde, sim, são fatores que faltam a muitos
jovens, assim, podemos apontar o Estado como um dos colaboradores de tal situação.

Mas também, não se pode desprezar o papel essencial da família, no momento de formação do
caráter do adolescente, segundo Dourado,

Quando se estabelece firme e duradouro laço entre pais, o desenvolvimento psicológico do filho
se efetuará bem, seu superego será normal e a criança tornar-se-á um indivíduo moral e
socialmente independente. Mas, se os pais, principalmente as mães se satisfazerem em
permanecer como personagens alheios e impessoais ou agem de forma que seja impossível uma
inclinação permanente filhos-pais, a educação dos filhos será um fracasso, o desenvolvimento
do caráter far-se-á mal, a adaptação social poderá ser superficial e o futuro da criança correrá o
risco de ficar exposto a todos os perigos possíveis de um desenvolvimento antissocial.

Isto posto, vemos que em inúmeros casos, a ausência familiar, a falta de equilíbrio nessa
relação, a carência de orientação e diálogo, a escassez de afeto e atenção, colaboram, de certa forma,
para o desencadeamento de determinadas atitudes.

Podemos assim verificar, que por inúmeros motivos podem influenciar o cometimento de
infrações por parte dos adolescentes, não cabendo a sociedade julgá-los, mas sim apoiá-los, já que a
juventude é o futuro da Nação.

Ademais, cabe ao Estado proporcionar-lhes a medida correicional mais cabível, não com o
intuito somente de punir, mas também, de conscientizá-los sobre suas condutas, visando amostrar-lhes
que, existem outros caminhos a serem seguidos, uma rota de dignidade, trabalho e estudo.

Além do caráter sancionador e pedagógico, a sanção aplicada aos adolescentes visa reprimir a
prática de novas delinquências, servindo também como resposta para toda a sociedade, segundo
Konzen:

Além do caráter pedagógico, que visa à reintegração do jovem em conflito com a lei na vida
social, as medidas socioeducativas possuem outro, o sancionatório, em resposta à sociedade
pela lesão decorrente da conduta típica praticada. Destarte, fica evidente a sua natureza híbrida.

Assim, as medidas socioeducativas têm em sua teoria um papel fundamental na vida de


adolescentes em conflito com a lei. Sem dúvidas o principal papel das tais medidas não são o de
castigar os adolescentes em conflito com a lei, mas sim, de conscientizá-los. Contudo, para que estas
cumpram seu papel de modo eficaz é necessário um conjunto de fatores.
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Inicialmente deve ser analisado se a medida é a mais adequada para o fato praticado pelo
adolescente em conflito com a lei, não devendo de forma alguma ser aplicada medida superior a
necessária, pois uma medida desproporcional pode marcar negativamente a vida do adolescente.

Torna-se primordial ter em mente que, a sanção além de proporcional, deve ser acompanhada de
um complexo de medidas, como atendimento interdisciplinar, auxílio e incentivo aos estudos,
acompanhamento psicológico, orientação profissional, cursos para que possam ingressar no mercado de
trabalho. Não somente para o adolescente, mas também para sua família, que deve receber
acompanhamento, orientação e ajuda, seja para encarar o momento tão difícil que é a imposição de
medidas a um filho, seja para analisar até que ponto a família influencia o adolescente nas suas
condutas delinquentes, e principalmente, ser preparada quanto à sua conduta dali a diante.

Outro ponto fundamental é que, a aplicação de qualquer medida deve ser feita por uma equipe
especializada, treinada e consciente do seu papel, que entenda a finalidade de qualquer das medidas.
Muito embora, tal ideia abarque qualquer tipo de medida socioeducativa, analisando a imposição da
medida de internação, medida mais grave a ser aplicada, verifica-se a necessidade de que os institutos
de cumprimento de tal medida sejam de excelência no acolhimento desses adolescentes em conflito
com a lei, que todos que ali atuemos sejam capacitados, treinados e principalmente conscientizados.

A conscientização deve partir da premissa de que ali estão pessoas em desenvolvimento e que a
sua estada naquele local deve colaborar para a compreensão das ilicitudes praticadas nos seus atos, para
que o adolescente ao deixar o instituto socioeducativo esteja apto para viver um recomeço, sem
ingressar na vida do crime.

Insta salientar que, de forma alguma a conduta dos agentes deve ser no sentido de punir agredir,
amedrontar, assustar ou até mesmo torturar, como vemos relatos de jovens que deixam os institutos.
Além disso, os locais de cumprimento da medida devem ser locais limpos, salubres, com o mínimo de
condição para a permanência dos adolescentes em conflito com a lei, com atividades religiosas,
profissionais, e principalmente pedagógicas, conforme preleciona o artigo 123 da referida Lei. O
funcionamento de qualquer entidade de medida socioeducativa deve sempre prezar pelo princípio da
dignidade humana, jamais podendo os adolescentes serem submetidos a situações desumanas ou
degradantes, como preleciona a Constituição Federal.

Fazendo uma breve análise, sobre notícias do sistema de sócio educação no estado do Rio de
Janeiro, podemos constatar inúmeras irregularidades. No ano de 2017, um agente socioeducativo
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denunciou que umas das unidades de ressocialização estava em condições desumanas, com ratos
convivendo com os adolescente em conflito com a lei, além da superlotação3.

Outro ponto muito relatado por menores, são as agressões sofridas pelos agentes dentro das
unidades de ressocialização. No ano de 2015, em uma reportagem, inúmeros adolescentes relataram ser
espancados, humilhados e vexados, sem nenhum motivo aparente, por parte dos agentes, ou seja, as
agressões se sustentam na ocasião que levaram os adolescentes a receber tais medidas, ou seja, nas
delinquências cometidas.4

Ao efetuar a contenção e a segurança dos infratores internos, as autoridades encarregadas não


poderão, de forma alguma, praticar abusos ou submeter a vexame ou a constrangimento não autorizado
por lei. Vale dizer que devem observar os direitos do adolescente privado de liberdade, alinhados no art.
124 do ECA (LIBERATI, 2003)

Os jovens já provocaram inúmeras rebeliões contra as más condições, a fim de chamar a


atenção do poder público, mas nada é feito. Esses jovens continuam sofrendo massacres diários,
enquanto aguardam sua liberdade.

Sem dúvidas, a aplicação das medidas nessas condições, não somam para a ressocialização ou
reeducação, mas sim despertam o ódio, em pessoas que ainda estão em desenvolvimento, colaborando
ainda mais para a formação de um caráter violento, que muito possivelmente, não acreditará em um
recomeço com uma vida digna, mas enxergará somente raiva e violência.

Segundo ensina Liberati:

A internação tem finalidade educativa e curativa. É educativa, quando o estabelecimento


escolhido reúne condições de conferir ao infrator escolaridade, profissionalização e cultura,
visando a dotá-lo de instrumentos adequados, para enfrentar os desafios do convívio social.
Tem finalidade curativa, quando a internação se dá em estabelecimento ocupacional,
psicopedagógico, hospitalar ou psiquiátrico, ante a ideia de que o desvio de conduta seja
oriundo da presença de alguma patologia, cujo tratamento, em nível terapêutico, possa reverter
o potencial criminógeno do qual o menor infrator seja portador (2003).

A falta de qualquer dos fatores relatados, pode sim resultar em ineficácia das medidas
socioeducativas, em alguns casos, tais medidas marcam negativamente o menor para sempre. O erro na
execução das medidas socioeducativas pode ser entendida como um dos motivos que contribui para que
os jovens estejam adentrando no mundo do crime. É desastroso o resultado dessas medidas quando mal
3Disponível em <https://oglobo.globo.com/rio/unidades-de-ressocializacao-de-menores-infratores-sao-precarias-
superlotadas-no-rio-21430866> Acesso em 20/04/2020.
4Disponível em <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/03/rjtv-mostra-mas-condicoes-em-unidade-do-degase-em-
bangu-rio.html>. Acesso em 20/04/2020.
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aplicadas, considerando que o infrator, ao ser colocado em liberdade, volta a delinquir e, na maioria das
vezes, participa até mesmo de delitos mais graves.

O episódio atinente as medidas socioeducativas mostram inexistir a correta aplicação da


medida em referência, não havendo preservação do seu caráter pedagógico, reeducacional e de inserção
social, encontrando-se os adolescentes internados, desprovidos de merecedora atenção estatal, ferindo
assim norma constitucional que estabelece que as crianças e os adolescentes são prioridades e, entre
outros, o princípio da dignidade humana.

Ainda é necessário observar que, o adolescente ao cometer um ato infracional, inicialmente,


entra em conflito com a lei e passa a sofrer um processo de exclusão ainda maior, quando não é
contemplado com um atendimento adequado à sua problemática, não receber a medida adequada ao seu
caso, não é submetido a um estudo social, não receber do Estado orientação suficiente para sua família,
ser subjugado a situações insalubres e desumanas. Todas esses fatores relativizados, comprometem a
eficácia proposta às medidas socioeducativas, não atendendo a previsões do Estatuto da Criança e do
Adolescente, e principalmente, Constitucionais.

De acordo com Silva, Cananéia e Menezes, no Brasil, o fato de delinquência juvenil ser um
problema eminentemente estrutural e que vem crescendo substancialmente com o passar dos tempos,
não é novidade. Contudo, por que não se perguntar: o que passou na vida desses jovens? Que tragédias
familiares, escolares, sociais e jurídicas desabaram sobre eles? Não se trata de um caso, estamos diante
de um problema que com o avançar dos anos aumenta cada vez mais de tamanho e de onde se necessita
de soluções imediatas (2006, p. 132).

Através da análise da posição de Silva, Cananéia e Menezes (2006, p. 121), pode-se perceber
que o conflito da criança/adolescente não é apenas com a lei, mas sim, com a sociedade. A
desigualdade do sistema educacional, socioeconômico e cultural, a falta de organização e
direcionalidade das políticas públicas têm transformado indivíduos socialmente patológicos, tendo
como medida de fuga a criminalidade. Geralmente, a situação que é encontrada é de mães trabalhando
fora de casa, com uma intensa jornada de trabalho; pais que se desdobram em vários empregos para
conseguir uma renda mensal digna e acabam por dispensar menos tempo para os filhos, e, assim, em
face às dificuldades vividas no cotidiano, os pais abrem mão da palavra e do diálogo, desconsiderando-
os como um instrumento privilegiado na construção da relação pai-filho (CAMPISTA, 2004, p. 126).
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Assim, é possível depreender que, diante da falta de pontos basilares, muitos adolescentes têm
praticado atos infracionais, o que demonstra a falta de força estatal, o desiquilíbrio de muitas famílias,
o desafastamento escolar, e que em grande parte dos casos, estes jovens são submetidos à medidas
socioeducativas desproporcionais, ou ainda e pior, executadas de forma incoerente com o que é
previsto em lei. E infelizmente, os resultados têm sido colhidos, na maioria das vezes, resultando em
prisões, aumento da marginalidade, e o mais grave, a morte de muitos jovens que não recebem uma
nova oportunidade.

Dessa forma, é indispensável que toda a sociedade, a família e o Poder Público revejam suas
políticas, debatam e clamem pelos diretos infantojuvenis. Com o fulcro de que todas as políticas
envolvidas se adéquem a realidade social que vivemos atualmente. Fomentando melhores práticas de
todos os envolvidos, para que em futuro não tão distante possamos gozar de uma sociedade mais justa e
menos violenta.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através do estudo foi possível constatar que o ECA foi criado para garantir e proteger os
direitos da criança e do adolescente, deixando de ser tratados como objeto, passando a ser sujeito de
direitos. Nesse sentido, com base na sua condição de pessoa em formação, o jovem carece de cuidados
especiais.

Como se pode notar, é necessário que o jovem mantenha o vínculo com a família, sendo este o
primeiro grupo social do qual o infante está inserido, servindo de base para a formação de sua
personalidade. A convivência familiar é um direito assegurado na Constituição Federal em seu artigo
227, portanto, é fundamental para o desenvolvimento da identidade da criança e do adolescente a
conservação dos laços familiares, como forma de afastar influências nocivas a sua formação, assim,
sempre que possível, as medidas a serem aplicadas devem respeitar tal condição..

Contudo, se o adolescente vir a cometer atos infracionais de natureza grave ou com violência, a
medida socioeducativa de internação deverá ser aplicada. Esta possui caráter excepcional e só poderá
ser aplicada de forma restrita, constituindo em privação de liberdade. Por esse motivo é considerada a
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mais grave, devendo ser substituída sempre que possível, respeitando o princípio da condição peculiar
de pessoa em desenvolvimento.

Convém destacar que sem o devido processo legal nenhum adolescente será privado de sua
liberdade, devendo o juiz da Vara da Infância e da Juventude respeitar o referido princípio. Há de se
garantir ao adolescente todas as possibilidades de defesa, protegendo-o de qualquer arbitrariedade.

Assegura-se também o contraditório e a ampla defesa ao adolescente, durante o procedimento


de apuração do ato infracional, bem como as seguintes garantias: citação, igualdade na relação
processual, defesa técnica entre outras.

Torna-se necessário compreender que, qualquer tipo de medida a ser aplicada, um conjunto de
fatores deve ser analisado e não somente analisar a conduta infracional. . Precisa-se mais do que isso, é
preciso um olhar atento e humano, com a ideia de que, embora naquele momento, o momento esteja na
condição de conflito com a lei, aquele jovem é uma pessoa sujeito de direitos, que deve ser tratado com
dignidade e respeito e que a imposição exacerbada de qualquer medida pode decidir a vida do jovem,
marcar uma família e destruir uma sociedade.

Conclui-se o presente artigo que a função ressocializadora da medida socioeducativa,


principalmente a de internação, decorre de sua natureza pedagógica, que busca devolver a autoestima
do jovem, promovendo o seu crescimento como cidadão, utilizando para isso métodos de caráter
psicológico e social permitindo o reingresso do adolescente na sociedade, para isso, faz-se necessário
que todas as vertentes de aplicação de medidas socioeducativas sejam observadas, respeitadas,
debatidas e aprimoradas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Menores. São Paulo: Cortez, 2015.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal comentado. Vol. I. 2ª Ed. São
Paulo: Saraiva, 1997.

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