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Esse trabalho, escrito a pedido do professor diácono Júlio, está dividido em duas partes. Na
primeira procurei discorrer sobre a emergência e o desenvolvimento do monaquismo, assim como
apontar para sua atividade missionária, que muito contribuiu para a evangelização da Europa e
conversão dos “bárbaros”. Na segunda parte, mais breve por ser mais carente de fontes de pesquisa,
apresento como que o desenvolvimento da caridade, pelos monges, contribuiu para o esvaziamento
do diaconado. Certamente, não foi a única razão para seu posterior desaparecimento, mas, segundo
estudos atuais como de José Durán2 e Alphonse Borras3, foi um fator, dentre outros,4 que contribuiu
para a perca de sentido do diaconado depois do século IV.
Em meados do século IV, no Egito, uma rede de comunidades emergiu com objetivo de
uma vida santa, renunciando à mundanização que tomava a vida cristã. A solidão do deserto atraiu
monges e monges que buscavam intimidade com Cristo por meio da disciplina e da ascese. Esses
homens e mulheres atraíam muitas pessoas devido seu estilo de vida. A gênese deste movimento
situa-se no século III com os anacoretas. O termo provém de anachorein, retirar-se. Tal como o
nome eremita que deriva do grego éremos, deserto, solidão.5 Nome importante foi Antão, que
1
SCHINDLER, Alfred. “Os princípios do monarquismo”. In: KAUFMANN, Thomas (et alii). História Ecumênica
da Igreja (1): dos primórdios até a Idade Média. São Paulo: Edições Loyola: Paulus; São Leopoldo, RS: Editora
Sinodal, 2012, p. 154-155.
2
DURÁN, José Durán Y. Diaconato Permanente e Ministério da Caridade: elementos teológico-pastorais. São
Paulo: Edições Loyola, 2003.
3
BORRAS, Alphonse; POTTIER, Bernard. A graça do diaconato: questões atuais relativas ao diaconato latino.
São Paulo: Edições Loyola, 2010.
4
PINTO, Luciano Rocha. “Diaconado Latino: uma reflexão sobre seu desaparecimento a partir das relações de
poder pastoral”. In Atualidade Teológica. Ano XX, fascículo 52, 2016, p. 106-128.
5
SCHINDLER, Alfred. Op. Cit., p. 162.
procurou viver plenamente aquele ideal e tornou-se um abba, um pai do manaquismo. Termo esse
que designará os superiores dos futuros mosteiros: o abade (Pai). Atanásio escreveu sobre ele, em
sua Vida de Antão, chegando a ser lido até na Germânia. Graças à Antão, esta forma de Monaquismo
espalhou-se pelo alto Egito, Palestina, indo até à Síria e à Mesopotâmia. Experiências comunitárias
foram feitas, mas foi Pacômio (292-346) que forjou os princípios da vida cenobítica (comunitária).6
6
IRVIN, Dale T.; SUNQUIST, Scott W. História do movimento cristão mundial: do cristianismo primitivo a 1453
(Vol. I). São Paulo: Paulus, 2004, p. 267.
7
Ibidem, p. 268-269.
8
Ibidem, p. 355.
9
COMBY, Jean. Para ler a História da Igreja: das origens ao século XV (Vol. 1). São Paulo: edições Loyola,
1984, p. 86.
monasticismo agostiniano não sobreviveu às conquistas do islamismo.10 Outro nome será
importante, no ocidente, para o crescimento do monaquismo e a evangelização: Patrício.
Na Irlanda, terra povoada pelos celtas, nasce um novo método de expansão missionária.
Patrício, bispo e líder monástico (+ 460) animava os irlandeses convertidos a aprender o latim. Para
este fim, procurou estabelecer mosteiros. No seguimento de Patrício destaca-se Brígida de Kildare
(c. 450-523). Com outras sete mulheres organizou a primeira comunidade monástica feminina na
Irlanda. Os mosteiros cresceram e cresceram em importância. Além da educação por método
missionário, ensinando ofícios diversos além da alfabetização, destacavam-se pela hospitalidade
aos viajantes. Muito cedo, tornaram-se centros de aprendizado e de acolhida.11 “Sem choques, sem
mártires, graças ao zelo e à sabedoria de Patrício, seu herói nacional, a Irlanda passara do druismo
ao cristianismo mais ardente. Desde o final do século V, o país estava coberto de mosteiros-
bispados.” 12
Nenhum outro nome foi mais fundamental para o monacato no ocidente que Bento. Nasceu
na Úmbria, Itália, no ano de 480. Era de família nobre romana. Desde pequeno manifestou um gosto
especial pela oração. Realizou os primeiros estudos na região de Murcia, próximo à cidade de
Spoleto. Depois foi morar em Roma para estudar filosofia. Um eremita chamado Romano encontrou
Bento e lhe deu um hábito de monge. Romano ensinou a São Bento tudo sobre a vida de eremita e
levando-o para uma gruta escondida, (gruta santa), no monte de Subiáco. Lá, o jovem Bento
aprofundava-se na vida de eremita e Romano o ajudava regularmente com alimentos. São Bento
ficou ali por três anos só em orações e estudos, sem receber visitas. Um dia, porém, um sacerdote
da região, fazendo seu jantar, ouviu uma voz dizendo: estás fazendo seu jantar enquanto meu servo
Bento morre de fome no deserto. O sacerdote, com muito esforço, partiu para o deserto, encontrou
a gruta em que Bento estava escondido e após uma oração, disse que era o dia da Páscoa do Senhor e
serviu-lhe a comida. Tempos depois o jovem bento foi descoberto por pastores e assim passou a
receber muitas visitas para conselhos e orações. Logo sua fama começou a crescer e ele passou a
ser visitado por mais e mais pessoas em busca de aconselhamentos e orações. Bento fundou em
poucos anos doze mosteiros e organizou a vida monástica comunitária.13 A força de Bento estava
na regulamentação dos detalhes da vida monástica bem pensada e apoiada na experiência,
relacionando teologia monástica e indicações práticas de maneira eficiente.
10
IRVIN, Dale T.; SUNQUIST, Scott W. Op. Cit., p. 175-176.
11
Ibidem, p. 297-298.
12
PIERRARD, Pierre. História da Igreja. São Paulo: Paulus, 1982, p. 57.
13
HISTÓRIA DE SÃO BENTO. In: www.cruzterrasanta.com.br/historia-de-sao-bento (Acesso em 24/5/2016).
14
IRVIN, Dale T.; SUNQUIST, Scott W. Op. Cit., p. 428-430.
A caridade monástica e o esvaziamento do ministério diaconal da caridade
A atuação dos monges teve por efeito externo a evangelização da Europa. Atuavam por
meio da educação informal, do ensino do latim e dos mais diversos ofícios, da prática da
hospitalidade, mas, principalmente da caridade. A disseminação dos mosteiros promoveu o
desenvolvimento das localidades e produziu outro efeito, agora não mais externo, mas interno:
contribuiu para o esvaziamento do diaconado, enquanto ministério voltado à prática da caridade.
Entre os séculos I e II não se pode falar que houve uma prática caritativa, por parte dos diáconos,
que fosse mais relevante que sua atuação na liturgia e no ministério da Palavra. Contudo, a atividade
do diácono no campo da beneficência adquire maior relevo no século III. A Didascalia dos
Apóstolos coloca o diácono como responsável direto, em nome do bispo, pelos doentes e
necessitados. A organização caritativa de coleta e doações passava, então, pelas mãos dos diáconos.
As tentações dos cargos e do acesso aos bens eclesiásticos, certamente corromperam alguns
diáconos. Escrito no século II, em Roma, o Pastor de Hermas, aponta a corrupção como um
problema, já naqueles tempos iniciais, entre alguns diáconos, que administravam mal, “roubando a
subsistência de viúvas e órfãos, enriqueceram-se com os recursos que receberam para socorrer”.18
É o caso do diácono Nicóstrato que foi descrito por Cipriano de Cartago, em meados do século III,
como criminoso e depravado por usurpar os bens da Igreja de Roma fugindo, depois, para a África.19
A partir do século V, principalmente depois das “Diaconias de beneficência”, que nasceram no
século anterior com a atuação dos monges diaconitas, verifica-se que o diácono não é mais o homem
da caridade e nem mesmo, progressivamente, o responsável pelo patrimônio eclesial. O serviço da
caridade não é mais diaconal, mas monacal. A partir do século VII as obras de caridade escapam
por completo das mãos dos diáconos.20
15
DURÁN, José Durán Y. Op. Cit., p. 88-89.
16
Comm. in Mat., 16,22; 40,552. In: COMUSSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. Diaconado: evolução e
perspectivas, 2002.
17
Idem, 16,22; 40,553. In: Ibidem.
18
Pastor de Hermas, 103.
19
CARTAGO, Cipriano de. Epístola 50, 1-2. In: Cartas. Madri: Ed. Credos, 1998.
Cf.: TEJA, Jamón. Cristianismo Marginado: rebeldes, excluídos, perseguidos. I – De los Orígenes al año 1000.
Madrid: Fundatión Santa Marí ala Real, 1998.
20
BORRAS, Alphonse; POTTIER, Bernard. Op. Cit., p. 61-62.
Considerações finais
O monarquismo, desde suas origens no Egito do século III com os anacoretas até a
organização sistemática de São Bento, demonstrou contínuo vigor e força renovadora. Graças à
Antão o Monaquismo espalhou-se pelo alto Egito, mas foi com Pacômio que vemos surgir a
primeira comunidade organizada com regra própria de vida. Rapidamente, os mosteiros tornaram-
se centros de vida, de culto, de ensino, de caridade e de evangelização. Basílio, bispo de Cesareia,
escreve algumas “Regras” em renovado esforço de renovação e adaptação às múltiplas realidades.
Foi da Irlanda, contudo, que nasce um novo método de expansão a partir de São Patrício, onde o
ardor missionário espalha mosteiros pela Irlanda e, mais tarde, por toda a Europa. Nenhum outro
nome, contudo, foi mais fundamental no ocidente que São Bento. Sua regra, sistemática e minuciosa
rapidamente renovou o monacato. Graças aos peregrine as cidades e vilarejos da Europa
conheceram mais que conversão. Onde quer que se fundasse um mosteiro, logo aquela terra
prosperaria graças à atuação dos monges.
21
ANDRIEU, Michel. “La carrière ecclésiastique des papes et les documents liturgiques du moyen age”. In:
Revue des Sciences Religieuses, tome 21, fascicule 3-4, 1947, p. 91-93.