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Este relato curioso nos mostra a atmosfera na qual o Concílio se realizou. As paixões
surgidas eram por vezes tão violentas que as sessões não eram sempre contidas ou
elegantes. "Sínodos e Concílios eu os saúdo a distância”, notou secamente Gregório de
Nazianzo, "pois sei como eles são problemáticos.
Cirilo era temperamental nos seus métodos por causa de seu ardoroso desejo de ver o lado
certo triunfar; e se os cristãos foram as vezes amargos, foi porque estavam preocupados
com a fé cristã. Talvez a desordem seja melhor do que a apatia. A Ortodoxia reconhece que
os Concílios foram realizados por homens imperfeitos, mas ela acredita que estes homens
imperfeitos foram guiados pelo Espírito Santo.
O bispo bizantino não era apenas uma figura distante que participava dos Concílios; ele
agia também em muitos casos como um verdadeiro pai para seu povo, um amigo e protetor
em quem as pessoas confiavam quando tinham algum problema. A preocupação com os
pobres e oprimidos que João Crisóstomo demonstrava é encontrada também em muitos
outros. São João o "Doador de Esmolas”, Patriarca de Alexandria (morto em 619), por
exemplo, doou toda a riqueza de sua sé para ajudar aqueles a que ele chamava "meus
irmãos, os pobres”. Quando seus próprios recursos acabaram, ele pediu a outros: Ele
costumava dizer, um conceito contemporâneo, "que se, sem rancor, alguém tirar a camisa
do rico para dar aos pobres, não estaria errado. Aqueles que você chama pobres e
pedintes, estes eu declaro meus mestres e ajudantes, pois apenas eles, podem realmente
nos ajudar e nos conceder o reino do céu”. A Igreja no Império bizantino não deixava de
cuidar de suas obrigações sociais, e uma de suas funções principais era com obras de
caridade.
O monasticismo teve um papel decisivo na vida religiosa de Bizâncio, da mesma forma que
em todos os países ortodoxos. Tem-se dito corretamente que "o melhor modo de penetrar
na espiritualidade ortodoxa é fazê-lo por meio do monasticismo. Existe uma grande
variedade de formas de vida espiritual a serem encontradas nos limites da ortodoxia, mas o
monasticismo continua a ser a mais clássica de todas”. A vida monástica, como instituição
definitiva, surgiu primeiro no Egito, no inicio do século IV, e de lá espalhou-se rapidamente
pela cristandade. Não é coincidência que o monasticismo tenha se desenvolvido
imediatamente após a conversão de Constantino, no tempo que as perseguições cessaram
e o cristianismo tornou-se moda. Os monges, com sua austeridade, eram mártires numa
época em que o martírio de sangue já não existia mais; formavam o contra-peso do
cristianismo estabelecido. As pessoas na sociedade bizantina corriam o perigo de esquecer
que Bizâncio era um ícone e um símbolo, não a realidade; corriam o risco de identificar o
reino de Deus com um reino terrestre. Os monges com sua saída da sociedade para o
deserto preenchiam um ministério profético e escatológico na vida de Igreja. Eles
lembravam aos cristãos que o reino de Deus não é deste mundo.
O monasticismo tomou três formas principais, todas apareceram no Egito por volta de 350
DC, e todas subsistem até hoje na Igreja Ortodoxa. Existe primeiro os eremitas, homens
vivendo uma vida solitária em cabanas ou cavernas, e mesmo em tumbas, troncos de
árvores ou topo de colunas. O grande modelo de vida eremita é o próprio pai do
monasticismo. Santo Antônio do Egito (251 - 356). Em segundo existe a vida comunitária,
onde monges moram juntos sob um regulamento comum e num mosteiro constituído
regularmente. Aqui o grande pioneiro foi São Pacomio do Egito (286 - 346), autor de um
regra usado por São Bento no ocidente. Basílio o Grande, cujos escritos ascéticos
exerceram influência na formação do monasticismo ocidental, era um forte defensor da vida
comunitária. Dando ênfase social ao monasticismo, ele recomendava com insistência que
as casas religiosas deviam cuidar dos doentes e dos pobres, mantendo hospitais e
orfanatos, e trabalhando diretamente para o benefício da sociedade de um modo geral. Mas
em geral o monasticismo oriental tem sido muito menos voltado a um trabalho ativo do que
o ocidental. Na Ortodoxia a principal tarefa de um monge é orar e é através disso que ele
ajuda os outros. O importante não é tanto o que o monge faz, mas o que ele é. Finalmente
existe uma forma de vida monástica intermediária entre estas duas, a vida semi-eremita, um
"meio termo" onde ao invés de uma única comunidade altamente organizada existe um
grupo disperso em uma pequena colônia, cada colônia abriga de dois a seis irmãos
morando juntos e sob a orientação de um mais velho. Os grandes centros de vida
semi-eremita no Egito foram Nítria e Setis, que ao final do quarto século haviam produzido
muitos monges ilustres - Ammon fundador de Nítria, Macário do Egito e Macário de
Alexandria, Evagrio Pôntico e Arsênio o Grande. (Este sistema semi-eremita não é
encontrado apenas no oriente, mas também no extremo ocidente, no monasticismo celta).
Por causa de seus mosteiros, o Egito no século IV era considerado a Segunda Terra Santa,
e viajantes para Jerusalém achavam sua peregrinação incompleta se não incluíam as casas
ascéticas do Nilo. Nos séculos V e VI a liderança dos movimentos monásticos transferiu-se
para a Palestina, com São Eutímio o Grande (morto em 473) e seu discípulo São Sabbas
(morto em 532). O mosteiro fundado por São Sabbas no vale do Jordão representa uma
história ininterrupta até os dias de hoje; era a esta comunidade que João Damasceno
pertencia. Quase tão antiga é uma outra casa importante com uma história ininterrupta até o
presente, o mosteiro de Santa Catarina no Monte Sinai, fundado pelo Imperador Justiniano
(reinou de 527-565). Com a Palestina e o Sinai nas mãos dos árabes, a proeminência
monástica no Império bizantino passou para o imenso mosteiro de Studium em
Constantinopla, originalmente fundado em 463; São Teodoro foi abade lá e fez uma revisão
do regulamento da comunidade.
Escritores ocidentais, às vezes, referem-se aos monges ortodoxos como "monges Basílios"
ou "monges da Ordem Basília”, mas isto não é correto. São Basílio é uma figura importante
no monasticismo ortodoxo, mas não fundou Ordem alguma, e embora duas de suas obras
sejam conhecidas como Regras Maiores e Regras Menores, não são de forma alguma
comparáveis às Regras de São Bento.
No centro da política cristã de Bizâncio existia a figura do Imperador, que não era um
regente comum, mas o representante de Deus na terra. Se Bizâncio era um ícone da
Jerusalém celeste, então a monarquia terrestre do imperador era uma imagem ou ícone da
monarquia de Deus no céu; na igreja os homens prostravam-se diante do ícone de Cristo, e
no palácio diante do ícone vivo de Deus - o Imperador. O palácio labiríntico, o elaborado
cerimonial da corte, a sala do trono onde leões mecânicos rugiam e pássaros cantavam:
tais coisas foram elaboradas para deixar claro o status de vice-regente de Deus do
Imperador. Por tais meios, escreveu o Imperador Constantino VII, o Porfirogênito, "nós
representamos o movimento harmonioso de Deus Criador em seu universo, enquanto o
poder imperial é preservado em harmonia e ordem”. O Imperador tinha um lugar especial no
rito da Igreja: não podia é claro celebrar a eucaristia, mas recebia comunhão como os
padres, pregava sermões, em certas festas incensava o altar. As vestimentas que os bispos
ortodoxos usam hoje em dia são as vestes usadas outrora pelo Imperador na igreja.
A vida em Bizâncio formava um todo uniforme, e não havia uma linha rígida de separação
entre religiosos e seculares, entre Igreja e Estado: ambos eram vistos como partes de um
mesmo organismo. Mesmo que fosse inevitável o Imperador ter uma participação ativa nos
assuntos da Igreja. Ao mesmo tempo não é justo acusar Bizâncio de cesaropapismo, de
subordinar a Igreja ao Estado. Embora Igreja e Estado formassem um mesmo organismo,
dentro deste organismo único havia dois elementos distintos, o presbiterado (sacerdotium) e
o poder imperial (imperium); e mesmo trabalhando em total cooperação, cada um desses
elementos tinha sua esfera própria na qual atuava com autonomia. Entre os dois havia
"sinfonia" ou "harmonia”, mas nenhum elemento exercia controle absoluto sobre o outro.
Esta é a doutrina explicada no grande código da lei bizantina redigida sob Justiniano (veja o
sexto apêndice) e repetida em vários outros textos bizantinos. Tome por exemplo as
palavras do Imperador João Tzimices: "Reconheço duas autoridades, clero e império; o
Criador do mundo confiou ao primeiro a guarda das almas e ao segundo o controle dos
corpos dos homens.
Não permita que nenhuma autoridade seja atacada e o mundo gozará de prosperidade."
Assim era tarefa do Imperador convocar concílios e fazer suas decisões serem cumpridas,
mas estava além de seus poderes ditar o conteúdo de tais decretos; cabia aos bispos
reunidos nos concílios a decisão do que significava a verdadeira fé. Os bispos foram
indicados por Deus para ensinar a fé, enquanto o Imperador era o protetor da Ortodoxia,
não seu expoente.
Assim era a teoria, assim na maioria das vezes foi praticado. Devemos admitir que houve
ocasiões nas quais o Imperador interferia injustificadamente em assuntos eclesiásticos; mas
quando surgia uma questão de base, as autoridades da Igreja mostravam rapidamente que
tinham vontade própria. O iconoclasmo, por exemplo, foi vigorosamente defendido por toda
uma série de Imperadores, e, apesar disso, foi com sucesso rejeitado pela Igreja. Na
história bizantina a Igreja e o Estado eram bastante interdependentes, mas nenhum era
subordinado ao outro.
Existem muitos hoje em dia, não apenas fora, mas também dentro da Ortodoxia, que
criticam duramente o Império bizantino e o conceito de sociedade cristã que ele
representava. Mas estavam os bizantinos totalmente errados? Eles acreditavam que Cristo,
que havia vivido na terra como homem, havia redimido cada aspecto da existência humana,
e sustentavam que isto havia tornado possível batizar não apenas indivíduos, mas todo o
espírito e organização da sociedade. Assim esforçaram-se para criar uma política
inteiramente cristã em seus princípios de governo e em suas vidas diárias.
Bizâncio de fato não era nada além de uma tentativa de aceitar e de aplicar todas as
implicações da Encarnação. Certamente esta tentativa tinha seus perigos: em particular os
bizantinos sempre cairam no erro de identificar o reino terrestre de Bizâncio com o Reino de
Deus, o povo grego com o povo de Deus. Certamente Bizâncio estava bastante aquém dos
altos ideais em que se colocava, e suas falhas foram freqüentemente lamentáveis e
desastrosas. As histórias da crueldade, violência e duplicidade de Bizâncio são bastante
conhecidas para serem repetidas aqui. Elas são verdadeiras - mas tão somente parte da
verdade. Pois atrás de todas as falhas de Bizâncio pode-se sempre discernir a grande visão
na qual os bizantinos se inspiravam: fundar aqui na terra um ícone vivo do governo de Deus
no céu.
O século XI marca o apogeu da vida monástica no Império Bizantino (do nome da sua
capital, Bizâncio, a antiga Constantinopla, atualmente Istambul, na Turquia).
Cerca do ano 860, dois monges nascidos na cidade grega de Tessalónica, os irmãos Cirilo e
Metódio, iniciam a evangelização dos povos eslavos. Para melhor anunciarem a
mensagem, criam um novo alfabeto, mais tarde denominado de cirílico, ainda hoje utilizado
na Rússia e e em alguns países vizinhos.
Em 963, o eremita Atanásio funda um primeiro mosteiro na quase ilha do Monte Athos. A
Polónia, e depois a Rússia, à semelhança dos seus príncipes, convertem-se ao
cristianismo. No ano 1000 é a vez da Hungria abraçar a fé cristã.
Foto
A cisão marca o nascimento de uma nova Igreja cristã, dita ortodoxa (do grego orthos,
“direito”, “justo”), que se considera mais fiel à herança do cristianismo original do que a
Igreja católica.
A espiritualidade bizantina tem como modelo a vida dos Padres do Deserto, que
consagraram a sua vida à oração e contemplação. No século III, um deles, Atanásio de
Alexandria, dizia: “Deus fez-se homem para o que o homem se faça Deus”, teologia cuja
influência se vai estender a todo o Oriente.
O ressurgimento desta tradição foi assegurada nos países vizinhos (Roménia, Finlândia,
Polónia, Estónia...) e em territórios de acolhimento mais longínquos (França, América do
Norte e do Sul).
Na Grécia, o Monte Athos serve de barómetro dos efetivos monásticos: em 1903, havia
7432 monges, sendo quase metade proveniente da Rússia; hoje não serão mais do que
dois mil, na maior parte gregos, distribuídos por 20 mosteiros, além das grutas onde vivem
os eremitas.