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CENTRO PRESBITERIANO DE PÓS-GRADUAÇÃO

ANDREW JUMPER

Ronaldo Lourenço Machado

O REINO MILENAR E O CUMPRIMENTO DAS PROFECIAS DO ANTIGO


TESTAMENTO

São Paulo

2022
CENTRO PRESBITERIANO DE PÓS-GRADUAÇÃO

ANDREW JUMPER

Ronaldo Lourenço Machado

O REINO MILENAR E O CUMPRIMENTO DAS PROFECIAS DO ANTIGO


TESTAMENTO

Monografia apresentada ao Centro


Presbiteriano de Pós-graduação Andrew
Jumper – CPAJ, como requisito parcial para
obtenção do título de Magister Divinitatis,
MDiv, na área de Estudos Históricos-
Teológicos. Orientador Professor Dr.
Leandro Antônio de Lima.

São Paulo

2022
Elaborado pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da Mackenzie com
os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
M149r Machado, Ronaldo Lourenço.
O Reino Milenar e o cumprimento das profecias do Antigo
Testamento : [recurso eletrônico] / Ronaldo Lourenço Machado.
109 KB ;

Monografia (Magister Divinitatis) - Universidade Presbiteriana


Mackenzie, São Paulo, 2023.
Orientador(a): Prof(a). Dr(a). Leandro Antônio de Lima. Referências
Bibliográficas: f. 48-50.

1. "Reino Milenar". 2. "Amilenismo". 3. "Profecias do Antigo


Testamento". 4. "Ressurreição".. I. Lima, Leandro Antônio de,
orientador(a). II. Título.

Bibliotecário(a) Responsável: Eliezer Lírio Dos Santos - CRB 8/6779


Ronaldo Lourenço Machado

O REINO MILENAR E O CUMPRIMENTO DAS PROFECIAS DO ANTIGO


TESTAMENTO

Monografia apresentada ao Centro


Presbiteriano de Pós-graduação Andrew
Jumper – CPAJ, como requisito parcial para
obtenção do título de Magister Divinitatis,
MDiv, na área de Estudos Históricos-
Teológicos. Orientador Professor Dr.
Leandro Antônio de Lima.

Aprovação: 22/12/2022

Orientador: Prof. Dr. Leandro Antônio de Lima


Folha de Identificação da Agência de Financiamento

Autor: Ronaldo Lourenço Machado

Programa: MDIV - EHT

Título do Trabalho: O Reino Milenar e as profecias do Antigo Testamento

O presente trabalho foi realizado com o apoio de:

☐ Instituto Presbiteriano Mackenzie / Isenção Integral das Mensalidades

☒ Instituto Presbiteriano Mackenzie / Isenção Parcial das Mensalidades


RESUMO

O presente tema envolve grande discussão no meio evangélico. O problema gira em torno da
interpretação do Reino Milenar descrito em Ap. 20.1-6 e seus desdobramentos, especialmente
quanto ao cumprimento de profecias do Antigo Testamento. Entre as diversas respostas que são
oferecidas à questão, serão abordadas neste trabalho mais diretamente o pré-milenismo
dispensacionalista e o amilenismo. Após análise das duas posições, o autor propõe como correta
a visão amilenista, demonstrando a inexistência de evidências bíblicas para considerar o
Milênio como um período de literalmente mil anos, muito de menos de considerar o reino
milenar um período reservado ao cumprimento de profecias do Antigo Testamento relacionadas
exclusivamente à restauração de Israel. Entre as profecias do Antigo Testamento cumpridas
durante o Milênio estão as vinculadas à ressurreição de Cristo.

PALAVRAS-CHAVE: Reino Milenar; Amilenismo; Profecias do Antigo Testamento;


Ressurreição.

ABSTRACT

The presente theme involves great discussion in the evangelical environment. The problem
revolves around the interpretation of the Millennial Kingdom described in Rev. 20:1-6 and its
ramifications, especially regarding the fulfillment of Old Testament prophecies. Among the
various answers that are offered to the question, dispensational premillennialism and
amillennialism will be addressed in this work more directly. After analyzing both positions, the
author proposes the amillennial view as correct, demonstrating the lack of biblical evidence to
consider the Millennium as a period of literally a thousand years, much less considering the
millennial kingdom a period reserved for the fulfillment of Old Testament prophecies relating
exclusively to the restoration of Israel. Among the Old Testament prophecies fulfilled during
the Millennium are those relating to the resurrection of Christ.

KEYWORDS: Millennial Kingdom; Amillennialism; Old Testament Prophecies;


Resurrection.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................................... 09

CAPÍTULO 1 – APOCALIPSE 20 A 22: ERA PRESENTE E ERA VINDOURA............... 12

1.1 – APOCALIPSE 20: O MILÊNIO JÁ INICIADO................................................. 12


1.1.1 – SATANÁS AMARRADO (AP. 20.1-3)......................................................... 13
1.1.2 – OS SANTOS COM CRISTO (AP. 20.4-6)..................................................... 16
1.1.3 – DERROTA E BANIMENTO DE SATANÁS (AP. 20.7-10)......................... 17
1.1.4 – O JULGAMENTO FINAL (AP. 20.11-15).................................................... 19
1.1.5 – CONCLUSÕES SOBRE APOCALIPSE 20................................................... 20

1.2 – APOCALIPSE 21 E 22: NOVO CÉU A NOVA TERRA.................................... 21


1.2.1 – A NOVA JERUSALÉM SERÁ HABITAÇÃO DE DEUS E SEU POVO.... 21
1.2.2 – NÃO HAVERÁ SOFRIMENTO NA NOVA JERUSALÉM......................... 22
1.2.3 – A BELEZA DA NOVA JERUSALÉM.......................................................... 22
1.2.4 – A PUREZA DA NOVA JERUSALÉM.......................................................... 23
1.2.5 – O REINO ETERNO........................................................................................ 23

CAPÍTULO 2 – O MILÊNIO E AS PROFECIAS DO ANTIGO TESTAMENTO............... 24

2.1 – ASPECTOS GERAIS SOBRE O DISPENSACIONALISMO............................. 24

2.2 – PROFECIAS QUE NÃO SERÃO CUMPRIDAS DURANTE O MILÊNIO...... 26


2.2.1 – ISAÍAS 65.17-25............................................................................................. 26
2.2.2 – EZEQUIEL 40 A 48........................................................................................ 28
2.2.3 – ISAÍAS 2.1-4................................................................................................... 31
2.2.4 – AMÓS 9.14-15................................................................................................ 32
2.2.5 – ZACARIAS 8.7-8............................................................................................ 33
2.2.6 – JEREMIAS 23.3, 7-8....................................................................................... 34

2.3 – PROFECIAS EFETIVAMENTE CUMPRIDAS DURANTE O MILÊNIO........ 35


2.3.1 – O CUMPRIMENTO DE SALMOS 16.8-11 EM ATOS 2.22-36................... 36
2.3.2 – O CUMPRIMENTO DE IS. 53.10 EM ATOS 2.23-24 E LUCAS 24.46.......37
2.3.3 – O CUMPRIMENTO DE SALMOS 110.1 EM EF. 1.20.21 E AT. 2.32-35... 38
2.3.4 – O CUMPRIMENTO DE OSÉIAS 6.1-2 EM 1 CORÍNTIOS 15.1-4............. 39
CAPÍTULO 3 – CONSIDERAÇÕES DOUTRINÁRIAS E PRÁTICAS............................... 41

3.1 – A TEOLOGIA DA ALIANÇA............................................................................. 41

3.2 – A RELAÇÃO ENTRE ISRAEL E A IGREJA..................................................... 42

3.3 – O AMILENISMO.................................................................................................. 43

3.4 – APLICAÇÕES....................................................................................................... 44

CONCLUSÃO......................................................................................................................... 46

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA......................................................................................... 48
9

INTRODUÇÃO

Nos estudos da escatologia bíblica, o Reino Milenar é um tema que se destaca.


Diferentes interpretações sobre o assunto, de maneira especial sobre o conteúdo e significado
do texto de Apocalipse 20.1-6, têm sido formuladas ao longo das gerações, desde o início da
Igreja. Entre as principais linhas de pensamento sobre o Milênio está o pré-milenismo, que
aponta para um reinado de exatamente mil anos e situa a vinda de Cristo antes deste reinado 1;
e o amilenismo, que considera simbólico o Milênio, um longo e indefinido período de tempo,
iniciado na primeira vinda de Cristo e que se encerrará na segunda vinda2.
De peculiar interesse a visão pré-milenista dispensacionalista, que não só advoga
um milênio literal, mas o considera como uma de sete dispensações, um período de tempo
posterior à era atual e anterior à era vindoura, que Deus reservou especialmente para o
cumprimento de algumas profecias do Antigo Testamento, notadamente aplicáveis ao povo de
Israel3.
Diante deste cenário, o presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a estrutura
do Reino Milenar e estabelecer critérios adequados para indicação de quais profecias do Antigo
Testamento tem seu cumprimento durante o Milênio, além de apresentar as razões pelas quais
não podem ser adotadas as conclusões a que chegaram os defensores do pré-milenismo
dispensacionalista, além de indicar em qual momento serão cumpridas as profecias que por eles
são consideradas como referindo-se ao Milênio.
Desde já é importante reconhecer que a aqui adotada interpretação do Livro de
Apocalipse – também objeto de controvérsia ao longo do tempo – parte do paralelismo

1
Erickson lista alguns defensores deste posicionamento no período inicial da Igreja, como Justino Mártir e Ireneu,
além de teólogos dos dias atuais, como George Beasley-Murray e George Ladd. O próprio Erickson é adepto desta
linha de pensamento. ERICKSON, Millard J. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2015, p. 1153-1154 e
1160.
2
Entre os amilenistas estão Agostinho, Anthony Hoekema, William Hendriksen, Louis Berkhof, William E. Cox,
Floyd Hamilton, Theodore Graebner, William Grier, Oswald Allis, Abraham Kuyper, Leon Morris, George L.
Murray, Geerhardus Vos. CLOUSE, Robert G. (org.). Milênio: significado e interpretações. Campinas: Luz para
o Caminho, 1990, p. 9 e 198-199.
3
Os comentários inseridos na The New Scofield Reference Bible, relativos a diversas profecias do Antigo
Testamento, apontam neste sentido e integram a escatologia dispensacionalista. Hoekema anota que a versão desta
Bíblia comentada, na edição de 1967, foi elaborada por nove teólogos dispensacionalistas, a saber: E. Schuyler
English, Frank E. Gaebelein, William Culbertson, Charles L. Feinberg, Allan A. McRae, Clarence E. Mason, Alva
J. McClain, Wilbur M. Smith e John F. Walvoord. Outros autores citados por Hoekema são Charles C. Ryrie e J.
Dwight Pentecost. HOEKEMA, Anthony A. A Bíblia e o Futuro. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 207.
10

progressivo4, da visão escatológica amilenista e trabalha com profecias do Antigo Testamento


que são cumpridas durante o Reino Milenar relacionadas à ressurreição de Cristo.
Com base em pesquisa bibliográfica, serão colacionados pensamentos de expoentes
das doutrinas já mencionadas, sobre a melhor interpretação de Apocalipse 20, além de
fundamentos do paralelismo progressivo e noções acerca dos princípios do dispensacionalismo;
serão refutadas as interpretações voltadas para um Milênio literal, enquanto dispensação
específica, e apresentadas respostas sobre o que se considera como correto, em termos de
cumprimento das profecias do Antigo Testamento.
O primeiro capítulo se dedica a expor a última seção do Livro do Apocalipse, do
capítulo 20 ao capítulo 22, explicando, inicialmente, em que consiste o paralelismo progressivo
e como esta seção do Livro deve ser vista a partir deste ponto de vista. Com tais alicerces será
possível entender porque o Reino Milenar já se iniciou e a exposição do capítulo 20 em sua
integralidade situará corretamente o Milênio na ordem de eventos previstos nesta última seção
do Livro de Apocalipse, além de oferecer explicações, ainda que breves, sobre a situação dos
crentes, dos incrédulos e de Satanás no fim dos tempos. Por fim, o capítulo ainda tecerá
considerações sobre a era vindoura, listando algumas características da Nova Jerusalém, a partir
do texto do capítulo 21 de Apocalipse e parte do capítulo 22.
O capítulo 2 trata do cumprimento das profecias do Antigo Testamento durante o
Reino Milenar. De início são mencionados os princípios norteadores do dispensacionalismo e
quais são as principais profecias que seus defensores consideram que serão cumpridas na era
milenar. A vinculação destas profecias ao Milênio literal, nos termos da interpretação pré-
milenista dispensacionalista, é seguida de refutações. É apresentado, em cada caso, o momento
ou o período em que tais profecias de fato se cumprem. Depois das descrições e das respectivas
críticas, o texto segue listando algumas das principais profecias do Antigo Testamento, estas
sim cumpridas no Reino Milenar, ligadas à ressurreição de Cristo.
O terceiro e último capítulo cuida de sistematizar conceitos e propor aplicações.
Nele serão abordados o aliancismo, a substituição de Israel pela Igreja e o amilenismo. A
aplicação do estudo, também objeto do capítulo final, diz respeito, entre outros pontos, ao
reinado atual de Cristo, ao otimismo do crente quanto aos rumos da História em razão do

4
Hendriksen, um dos adeptos do paralelismo progressivo, anota que compartilha desta visão com R.C.H. Lenski,
S.L. Morris, M.F. Sadler e B.B. Warfield. HENDRIKSEN, William A. Mais que Vencedores: uma interpretação
do livro do Apocalipse. 1ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 31. Hoekema também defende este
posicionamento. HOEKEMA, 2012, p. 238. E Bavinck: BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada. Vol. 4. 1ª
ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 690.
11

governo vigente de Cristo, mas sem esperar que o mundo melhore pelas forças humanas, e à
esperança da redenção absoluta e vida eterna na presença do Salvador.
A relevância do estudo está na mais adequada interpretação do Livro do Apocalipse,
na que aqui se considera a mais adequada, que lê o Livro em suas seções paralelas e melhor
responde à pergunta relativa à sua mensagem. Talvez também sirva ao propósito de situar a
Igreja quanto ao seu propósito e sua missão, ajudando os crentes a confiarem plenamente no
poder do Redentor, além de trazer a segurança e paz ao coração do que crê, pois pode com
convicção afirmar que Jesus Cristo reina na atualidade, apesar da lamentável situação em que
se encontra a humanidade caída.
12

CAPÍTULO 1
APOCALIPSE 20 A 22: ERA PRESENTE E ERA VINDOURA

O estudo adequado dos capítulos finais do Apocalipse não prescinde de


considerações acerca da estrutura do livro. Sobre o tema disserta William Hendriksen, que
divide o livro em sete seções paralelas 1. Fundamental para a compreensão do paralelismo
progressivo, da unidade do livro do Apocalipse e da divisão do livro em seções, é a afirmação
de HENDRIKSEN (2001, p. 31):
Uma leitura cuidadosa do livro do Apocalipse mostra claramente que o
livro consiste de sete seções, e que estas sete seções correm paralelas
umas às outras. Cada uma delas abarca toda a dispensação, da primeira
à segunda vinda de Cristo. Este período é visto ora de uma perspectiva,
ora de outra.
Todas as sete seções do livro do Apocalipse tratam do mesmo período e,
progressivamente, acrescentam elementos relativos ao juízo final. Nas palavras de
HENDRIKSEN (2001, p. 55), “quanto mais nos aproximamos do fim do livro, mais nossa
atenção é dirigida para o juízo final e para o que está além dele. As sete seções são arranjadas
em ordem crescente e climática. O livro revela um progresso gradual na ênfase escatológica”.
HENDRIKSEN2 assim divide as seções do livro: a primeira seção diz respeito aos
capítulos 1 a 3 do livro e a segunda abrange os capítulos 4 a 7. A terceira seção compreende os
capítulos 8 a 11. A quarta, os capítulos 12 e 14. A quinta seção é composta pelos capítulos 15
e 16 e a sexta seção inclui os capítulos 17 a 19. A sétima seção abrange os capítulos 20 a 22,
que serão mais detidamente analisados a seguir, sendo importante anotar neste momento que o
assunto desta seção, como afirma HOEKEMA3, vai além da dispensação e do juízo para incluir
o futuro, a criação renovada, os novos céus e nova terra.

1.1 – APOCALIPSE 20: O MILÊNIO JÁ INICIADO

1
Antes de Hendriksen, outros teólogos interpretaram o Apocalipse não de maneira linear, mas de forma cíclica,
como é o caso de Vitorino de Petóvio (morto entre 304 e 305), e do Venerável Beda, no século oitavo, este que
dividiu o livro do Apocalipse em sete seções. FROOM, Le Roy Edwin. The Prophetic Faith of our fathers. Vol.
1. Washington: Review and Herald Publishing Association, 1950, p. 338 e 611-612.
2
HENDRIKSEN, William A. Mais que Vencedores: uma interpretação do livro do Apocalipse. 1ª ed. São Paulo:
Cultura Cristã, 2001, p. 27-31.
3
HOEKEMA, Anthony A. A Bíblia e o Futuro. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 241.
13

É importante lembrar, na esteira do quanto já afirmado acerca do paralelismo


progressivo, que o capítulo 20 de Apocalipse não expressa a sequência temporal em relação ao
capítulo 194.
Anote-se, ainda, que a divisão do capítulo 20 de Apocalipse aqui adotada é a
proposta por KISTEMAKER 5, com alguma variação.

1.1.1 – SATANÁS AMARRADO (Ap. 20.1-3)


Para melhor compreensão do texto, convém iniciar com a transcrição da passagem:
1. Então, vi descer do céu um anjo; tinha na mão a chave do abismo e
uma grande corrente. 2. Ele segurou o dragão, a antiga serpente, que é
o diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos; 3. lançou-o no abismo,
fechou-o e pôs selo sobre ele, para que não mais enganasse às nações
até se completarem os mil anos. Depois disto, é necessário que ele seja
solto pouco tempo. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e
Atualizada, Ap. 20.1-3).
A visão de João começa com um anjo descendo do céu, com a chave do abismo na
mão e uma grande corrente. O anjo desce para limitar a atuação de Satanás e prendê-lo no poço
do abismo, um lugar onde demônios são mantidos 6.
BEALE traça um interessante paralelo entre a chave do abismo mencionada em Ap.
20.1 e as chaves da morte e do inferno, citada em Ap. 1.18. Diz o texto de Ap. 1.17-18: “(...)
Não temas, eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo
pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno” (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Ap. 1.17-18). Eis a conexão entre a chave do abismo e as chaves
da morte e do inferno:
“A chave do abismo” é provavelmente a mesma que a “chave da morte
e do inferno” que Cristo detém no cap. 1 porque venceu a morte pela
sua ressurreição (1.18). Ali as chaves denotam figurativamente a
soberania de Cristo sobre o reino dos mortos. As mesmas “chaves” são
referidas no cap. 3 para mostrar que Cristo tem autoridade não apenas
para ressuscitar os mortos no fim dos tempos, mas também para
conceder vida espiritual no presente século (BEALE, 1999, p. 984).
A conclusão que se segue, de vital importância para compreender melhor o reino
milenar, é a de que o primeiro versículo do capítulo 20 de Apocalipse trata da ressurreição de
Cristo e de realidades atinentes ao período da Igreja7.

4
BEALE lista diversas razões que recomendam não interpretar o capítulo 20 como sequência cronológica do
capítulo 19. BEALE, G.K. The Book of Revelation: a commentary on the greek text. Grand Rapids: W.B Edermans,
1999, p. 975-982.
5
KISTEMAKER, Simon J. Apocalipse. São Paulo: Cultura Cristã, 2014, p. 693.
6
Ibid, p. 694.
7
Neste sentido o entendimento de BEALE, apontando para o paralelismo progressivo. BEALE, 1999, p. 984.
14

No versículo 2 de Ap. 20 é descrita a prisão de Satanás pelo período de mil anos.


Importa primeiro analisar em que consistiu a prisão de Satanás e depois ponderar sobre o
período de mil anos.
A prisão de Satanás não se trata de prisão literal, mas de restrições que lhe foram
impostas por Deus8. Neste sentido comenta KISTEMAKER (2014, p. 695-696):
O anjo dominou Satanás e o amarrou. Mas essa amarração refere-se às
restrições que Deus colocou sobre o diabo, retirando o poder e a
autoridade dele. Satanás e os seus anjos caídos são “amarrados a uma
corda, a qual pode ser mais ou menos alongada”. Eles podem tentar se
libertar, mas é impossível se livrarem. A intenção de João não é uma
amarração literal, mas uma restrição figurativa, de modo que Satanás é
incapaz de executar suas perversidades como fazia antes de ser
restringido.
Nota-se que a prisão de Satanás foi levada a efeito quando da primeira vinda de
Cristo, o que corrobora a compreensão de que a primeira vinda deu início ao Reino Milenar,
entendimento ensinado com precisão e profundidade por HENDRIKSEN, que lança mão de
diversas passagens do Novo Testamento, suficientes para dirimir as dúvidas sobre a questão:
(...) Jesus nasce. Ele inicia seu ministério. Os fariseus o acusam de
expulsar demônios pelo poder do próprio Satanás. Ele responde: “Ou,
como alguém entrar na casa do valente (a saber, Satanás) e roubar-lhe
os bens sem primeiro amarrá-lo? E então lhe saqueará a casa” (Mt.
12.29). Observe que exatamente a mesma palavra, “amarrar”, é usada
em Apocalipse 20. A obra de amarrar o diabo foi iniciada quando o
Senhor triunfou sobre ele nas tentações do deserto (Mt. 4.1-11). Como
resultado, Cristo começou a “expulsar” demônios. O poder e a
influência de Satanás sobre as massas iludidas começavam a ser
refreadas.
Novamente, quando os setenta missionários retornaram, eles disseram:
“...Senhor, os próprios demônios se nos submetem pelo teu nome”!
Note o que segue: “Mas ele lhes disse: Eu via Satanás caindo do céu
como um relâmpago” (Lc 10.17,18). Aqui o diabo “caindo do céu” está
associado com a atividade missionária dos setenta. É uma passagem
muito significativa para explicar Apocalipse 20.
Noutra ocasião, certos gregos vieram para ver Jesus. Jesus declara:
“Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe
será expulso. E eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim
mesmo” (Jo 12.31-32). Observe que a palavra usada tem a mesma raiz,
no original, do termo traduzido por “expulsar” ou “lançar” no abismo
(Ap. 20). Ainda mais importante é o fato de que aqui, em Jo 12.20-32,
a expulsão de Satanás é associada ao fato de que não somente os judeus,
como era a lei no passado, mas “todos” os homens – tanto judeus quanto
gentios – seriam atraídos a Cristo. Tudo isso ocorre como resultado do
sofrimento de Cristo na cruz e o envio do Espírito Santo. Colossenses
2.15 associa, de modo muito definitivo, o despojamento de Satanás e

8
HOEKEMA defende que há menção ao aprisionamento de Satanás em Mt 12.29 e sustenta que Jesus amarrou o
diabo quando triunfou contra ele no deserto. O fato de Jesus expulsar demônios e “amarrar o valente”, conforme
consta de Mt. 12.29, evidencia este triunfo. HOEKEMA, 2012, p. 244.
15

de seus exércitos com o triunfo de Cristo na cruz. Apocalipse 12.5s


mostra, claramente, que a “expulsão” de Satanás foi um resultado da
coroação de Cristo.
Entenda, portanto, que em todas essas passagens, a prisão e a expulsão,
ou queda, de Satanás está, de alguma forma, relacionada com a primeira
vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Quando dizemos “a primeira
vinda”, nos referimos a todos os eventos a ela associados, desde a
encarnação até a coroação. (HENDRIKSEN, 2001, p. 249-250).
Assim, a prisão de Satanás deve ser entendida simbolicamente e significa a
imposição de restrições à sua atuação. Se antes Satanás agia livremente, naturalmente com os
limites já colocados por Deus, agora, na era da Igreja, está aprisionado e não pode mais enganar
as nações9, não pode mais impedir o avanço da Igreja.
Quanto aos “mil anos”, melhor se afigura entender a expressão como simbólica,
não literal, especialmente diante do fato de que o capítulo 20 de Apocalipse é repleto de
simbologia10. Conforme ensina KISTEMAKER, há diversos motivos para afastar a
interpretação literal deste período e considerá-lo simbólico:
Diversos teólogos sustentam uma explicação literal de exatamente mil
anos como o intervalo entre o retorno de Jesus à terra e o final dos
tempos. Porém, há objeções a essa visão. Primeiro, a palavra milênio,
derivada das palavras do latim mille (mil) e annus (ano), ocorre seis
vezes nesse capítulo e em nenhum outro lugar e em nenhum outro
ensino escatológico do Novo Testamento (v. 2, 7). No seu sermão
escatológico (Mt 24), Jesus não diz nada sobre o reino de mil anos com
os santos na terra. Nas suas respectivas epístolas, Paulo e Pedro não
mencionam um reino ínterim milenar de Cristo na terra. E, também, o
Novo Testamento ensina apenas uma vinda de Cristo e não duas.
Terceiro, a primeira menção de um período de mil anos (v. 2) é “o
milênio do diabo” que vai do tempo de Satanás no abismo até que ele
seja lançado no lago de fogo para sempre. Quarto, uma interpretação
literal desse número num livro de simbolismo e, especialmente nesse
capítulo repleto de símbolos, é de fato, um obstáculo considerável. E
por último, mil é dez para o terceiro poder e indica totalidade. Está,
portanto, mais de acordo com o estilo do Apocalipse interpretar o termo
metaforicamente. (KISTEMAKER, 2014, p. 695-696).
O versículo 3 do capítulo 20 segue com a informação de que Satanás foi lançado
no abismo para não mais enganar as nações, este um dos principais aspectos da limitação
imposta por Deus, até se completarem os mil anos, e que depois ele será soltou por pouco tempo.
É possível conectar este versículo, como faz KISTEMAKER 11, a Mt. 24.22, no qual o Senhor
Jesus, tratando da grande tribulação que marcará o fim dos tempos, afirma que “por causa dos

9
Ver: HOEKEMA, 2012, p. 244-245.
10
William Cox é um dos adeptos da interpretação não literal de Ap. 20. COX, William E. Biblical Studies in final
things. Phillisburg, New Jersey: Presbyterian and Reformed Publishing CO, 1966, p. 182.
11
KISTEMAKER, 2014, p. 698.
16

escolhidos, tais dias serão abreviados” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada,
Mt. 24.22).
Até aqui o que se percebe, a partir do estudo dos versículos 1 a 3 de Apocalipse 20,
é que um anjo desceu do céu para aprisionar Satanás e que os eventos mencionados neste texto
têm relação com a primeira vinda de Jesus Cristo. Além disto, a prisão de Satanás deve ser vista
como a restrição de sua atuação, com limitação quanto ao ato de enganar as nações, e a
expressão “mil anos” foi tomada em seu sentido simbólico, abrangendo longo período de
tempo, entre a primeira e a segunda vindas de Cristo. Por fim, a soltura de Satanás ao final do
milênio será por curto período de tempo.

1.1.2 – OS SANTOS COM CRISTO (Ap. 20.4-6)


Assim diz o texto:
4. Vi também tronos, e nestes sentaram-se aqueles aos quais foi dada
autoridade de julgar. Vi ainda as almas dos decapitados por causa do
testemunho de Jesus, bem como por causa da palavra de Deus, tantos
quantos não adoraram a besta, nem tampouco a sua imagem, e não
receberam a marca na fronte e na mão; e viveram e reinaram com Cristo
durante mil anos. 5. Os restantes dos mortos não reviveram até que se
completassem os mil anos. Esta é a primeira ressurreição. 6. Bem-
aventurado e santo é aquele que tem parte na primeira ressurreição;
sobre esses a segunda morte não tem autoridade; pelo contrário, serão
sacerdotes de Deus e de Cristo e reinarão com ele os mil anos. (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 20.4-6).
A visão do Apóstolo João refere-se ao mesmo período de mil anos, mas agora tem
foco diverso. Se nos versículos 1 a 3 é descrito o milênio na terra, os versículos 4 a 6 nos
informam acerca do reino milenar no céu, do qual participam aqueles que sofreram e morreram
por Cristo. Desta forma, fica claro que Jesus Cristo reina durante o milênio, tanto na terra quanto
no céu.
MORRIS (1989, p. 230) introduz adequadamente este segundo quadro da visão de
João: “A atenção está concentrada agora naqueles que sofreram por amor a Cristo. Eles
reinam com ele através dos mil anos. Esta seção é, portanto, contemporânea com a anterior”.
17

Entre os assuntos abordados no versículo 4 aborda, estão: os tronos e a autoridade


para julgar, concedida aos que nele se sentaram12; as almas dos mártires, mortos por causa de
seu testemunho cristão; e o reinado destes mártires, junto com Cristo, durante o milênio 13.
Os mártires foram mortos por causa do seu testemunho. A menção a “almas” não é
fora de propósito e não é correta sua substituição indiscriminada por “corpos” ou “pessoas”,
sob pena de impor certo prejuízo à compreensão da intenção de João com a palavra específica,
em seu contexto, que é retratar exatamente a decapitação de mártires por autoridades romanas.
Neste sentido o comentário de KISTEMAKER (2014, p. 699/700):
João é descritivo e preciso nas suas palavras, pois ele não está usando a
palavra almas como um sinônimo de pessoas; ele se refere a almas sem
corpos. Ele descreve mártires decapitados pelos executores romanos.
Os seus corpos voltam ao pó da terra e as suas almas a Deus no céu; e
esses santos estão para sempre com Cristo.
Anote-se, ainda, que no grupo dos mártires devem ser incluídos todos os crentes
obedientes ao Senhor que, de alguma forma, sofreram por causa do seu testemunho e da
fidelidade a Jesus Cristo, não portaram a marca da besta, nem a adoraram14.
Sobre a ressurreição dos santos e a dos incrédulos cumpre apenas citar a síntese
didática e precisa de KISTEMAKER (2014, p. 703/704): “Aqueles que pertencem a Cristo
morrem uma vez, mas ressuscitam duas vezes (espiritualmente e fisicamente), aqueles que
rejeitaram, ressuscitam uma vez, mas morrem duas vezes (física e espiritual)”.
Os temas da passagem, portanto, são a participação dos santos, mortos em razão de
seu testemunho, no governo de Cristo durante o Reino Milenar; e a morte e ressurreição
experimentadas pelos crentes e pelos incrédulos.

1.1.3 – DERROTA E BANIMENTO DE SATANÁS (Ap. 20.7-10)


Eis a passagem:
7. Quando, porém, se completarem os mil anos, Satanás será solto da
sua prisão. 8. e sairá a seduzir as nações que há nos quatro cantos da
terra, Gogue e Magogue, a fim de reuni-las para a peleja. O número
dessas é como a areia do mar. 9. Marcharam, então, pela superfície da
terra e sitiaram o acampamento dos santos e a cidade querida; desceu,
porém, fogo do céu os consumiu. 10. O diabo, o sedutor deles, foi
lançado para dentro do lado de fogo e enxofre, onde já se encontram

12
A conexão entre “trono” e “julgamento” é encontrada em outros lugares. No Antigo Testamento, está em Dn.
7.9, e no Novo Testamento aparece em Mt. 19.28 e 1Co 6.2. BEALE anota que o mesmo padrão de Dn. 7 é visto
em Ap. 20, e apontam para a participação dos santos no reinado e no julgamento. BEALE, 1999, p. 985.
13
Ver: MORRIS, Leon. The book of Revelation: an introduction and commentary. Grand Rapids, Michigan:
William B. Eedermans Publishing Company, 1989, p. 231. Na mesma linha: KISTEMAKER, 2014, p. 701.
14
KISTEMAKER, 2014, p. 700/701.
18

não só a besta como também o falso profeta; e serão atormentados de


dia e de noite, pelos séculos dos séculos. (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Ap. 20.7-10).
A passagem retrata um breve período de tempo ao final do Milênio. Satanás, que
estava aprisionado e tolhido nas suas atividades voltadas a enganar as nações, atividades que
exercia com mais liberdade na época do Antigo Testamento, será solto desta prisão exatamente
para sair e seduzir as nações (v. 8 do capítulo 20), e iniciar um embate contra Deus, que
evidentemente não terá sucesso. Em seguida, o diabo será lançado no lago de fogo e enxofre,
onde já se encontram a besta e o falso profeta (v. 8 do capítulo 20).
O versículo 8 menciona Gogue e Magogue, que serão reunidas por Satanás para a
peleja, e seu contingente é bastante numeroso. BEALE (1999, p. 1.022) afirma que “a reunião
destas forças contra o povo de Deus é vista como o cumprimento da profecia em Ezequiel 38-
39 de “Gogue” e Magogue” e as nações “reunindo-se para a guerra” contra Israel”. No
mesmo sentido entende HUGHES15.
Sobre o versículo 9 cabe analisar a expressão “acampamento dos santos”, que será
sitiado por Satanás, sua horda e suas legiões. A expressão pode ser associada à ideia de
enfrentamento de inimigos, mas não necessariamente a um lugar específico, como defende
KISTEMAKER (2014, p. 707/708) ao comentar este versículo: “o acampamento dos santos
inclui cristãos verdadeiros de todos os povos, nações, línguas e raças. A referência é à Igreja
que enfrenta o inimigo espiritual dos exércitos de Satanás”.
A “cidade querida”, também presente em Ap. 20.9 e que também será cercada
pelos inimigos de Deus, tampouco é uma cidade específica, antes representa o povo de Deus,
o ajuntamento dos santos, conforme argumenta HUGHES 16. Não por outro motivo, Jesus
chama os vitoriosos, os que perseveram na fé, de habitantes da “cidade do meu Deus”
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 3.12), vista em clara oposição à
“grande cidade que, espiritualmente, se chama Sodoma e Egito, onde também o Senhor foi
crucificado” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 11.8).
BEALE (1999, p. 1.027) faz interessante conexão entre a “cidade querida” de Ap.
20.9 e a “cidade santa” de Ap. 21.2: “a cidade dos santos perseguidos em 20.9 é a
inauguração da nova criação que é composta pela comunidade de fé e que encontra sua
consumação em 21.2”.

15
HUGHES, Philip Edgcumbe. The Book of the Revelation: a commentary. Grand Rapids, Michigan: William B.
Eedermans Publishing Company, 1990, p. 217.
16
Loc. cit.
19

Neste contexto de inter-relações entre a profecia de Ezequiel e o texto de


Apocalipse, não é exagero afirmar que o cerco descrito em Ap. 20.9 representa o cumprimento
de Ez. 38.11, conforme afirma BEALE 17.
Finalmente, o versículo 10 trata do banimento de Satanás, que é lançado no lago
de fogo e enxofre, onde será atormentado de dia e de noite, pelos séculos dos séculos. Ao ser
lançado no lago de fogo e enxofre Satanás se juntará à besta e ao falso profeta.
Assim, ao final do Milênio não literal, Satanás será solto por breve período de
tempo para enganar as nações. Há aqui conexão e o cumprimento da profecia de Ezequiel 38-
39, ao referir-se o texto a Gogue e Magogue, e ao mencionar a marcha e o sitiamento do povo
de Deus. O acampamento dos santos e a cidade querida serão sitiados e haverá a batalha final.
Após a derrota de Satanás, ele será enviado ao lago de fogo e enxofre, onde se encontrará
com a besta do mar e com o falso profeta, e lá experimentarão o sofrimento eterno.

1.1.4 – O JULGAMENTO FINAL (Ap. 20.11-15)


O capítulo 20 de Apocalipse tem o seguinte fechamento:
11. Vi um grande trono branco e aquele que nele se assenta, de cuja
presença fugiram a terra e o céu, e não se achou lugar para eles. 12. Vi
também os mortos, os grandes e os pequenos, postos em pé diante do
trono. Então, se abriram livros. Ainda outro livro, o Livro da Vida, foi
aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o
que se achava escrito nos livros. 13. Deu o mar os mortos que nele
estavam. A morte e o além entregaram os mortos que neles havia. E
foram julgados, um por um, segundo as suas obras. 14. Então, a morte
e o inferno foram lançados para dentro do lago de fogo. Esta é a segunda
morte, o lago de fogo. 15. E, se alguém não foi achado inscrito no Livro
da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo. (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 20.11-15).
A passagem retrata o julgamento definitivo, ao final da história do mundo, depois
do cumprimento de todos os planos de Deus, quando serão separados os santos, que têm seus
nomes escritos no Livro da Vida, e os ímpios, que não têm.
O versículo 11 do capítulo 20 evidencia o aspecto celestial do julgamento final, eis
que João descreve a visão de um trono branco e daquele que nele se assenta, dotado de
majestade indiscutível, que certamente é uma referência ao próprio Deus 18.
Sobre a segunda parte do versículo 11, pela qual o céu e a terra fugiram da presença
de Deus e não se achou lugar para eles, é possível afirmar que se refere à profunda mudança

17
BEALE, 1999, p. 1.026.
18
KISTEMAKER, 2014, p. 710. MORRIS anota que o Senhor Jesus Cristo, o Deus-Filho, também participa deste
julgamento. MORRIS, 1989, p. 233-234.
20

pela qual passará a criação de Deus quando do julgamento final19 e MORRIS20 afirma que a
constatação de que não se achou lugar para eles significa que foram totalmente destruídos.
O texto segue nos versículos 12 e 13 mencionando o julgamento dos que estavam
mortos. De fato, conforme sinalizado quando da análise dos versículos 4 a 6, os ímpios
experimentarão duas mortes e uma ressurreição. Ao que tudo indica, a ressurreição física dos
descrentes é o tema destes versos e será seguida do julgamento, da condenação, e da segunda
morte.
BEALE (1999, p. 1.037) acrescenta importante informação sobre a situação dos que
tem o seu nome escrito no Livro da Vida e conecta o texto de Ap. 20.15 com o de Dn. 12.1:
“Todos os que estão listados no livro da vida são poupados do julgamento, como 3.5 e 21.27
explicitam. Esta implicação é garantida pela forma positiva da declaração em Dn. 1.2: ‘todo
povo será salvo, todo aquele que for achado escrito no livro.”.
Ainda sobre os versículos 12 e 13, eles aludem ao ajuntamento dos mortos, os
pequenos e os grandes, entregues pelo mar, pela morte e pelo além, para serem julgados pelas
suas obras. Embora os crentes também tenham registradas suas obras boas e más, é certo que
serão absolvidos pela graça de Deus, porque creram em Jesus, e terão seu nome inscrito no
Livro da Vida, como afirma KISTEMAKER 21.
A expressão “lago de fogo”, presente nos dois versículos finais do capítulo 20 de
Apocalipse, representa a segunda morte, como o próprio texto explica, no v. 14. MORRIS
(1989, p. 235), ao comentar este texto, lembra que a morte e o inferno têm o mesmo destino
que a besta e o falso profeta, e anota que “João parece querer dizer que a morte e o Hades são,
em última análise, tão impotentes quanto as outras forças do mal”.
Assim, o desfecho da História do mundo envolve o julgamento dos incrédulos e sua
condenação definitiva, porque seus nomes não foram encontrados no Livro da Vida. Serão
lançados para o lago de fogo, onde os esperam Satanás, o falso profeta, a besta e os anjos caídos.
Os eleitos, por outro lado, são absolvidos de suas obras más, apenas pela graça de Deus.

1.1.5 – CONCLUSÕES SOBRE APOCALIPSE 20


A exposição do capítulo 20 de Apocalipse revela, em apertada síntese, que: i) o
Reino Milenar não pode ser considerado como literalmente de mil anos, antes como um longo

19
KISTEMAKER, 2014, p. 710.
20
MORRIS, 1989, p. 234.
21
KISTEMAKER, 2014, p. 711.
21

período de tempo, iniciado com a primeira vinda de Jesus Cristo e que será encerrado com a
segunda vinda; ii) os crentes perseguidos e mortos por causa de sua fidelidade a Cristo reinarão
durante o Milênio; iii) ao que tudo indica, a profecia que consta dos capítulos 38 e 39 de
Ezequiel, relacionada ao avanço de Gogue e Magogue e sitiamento do acampamento dos santos
e da cidade querida, tem seu cumprimento em Ap. 20.8-9; iv) os incrédulos serão ressuscitados
ao final do Reino Milenar e experimentarão a segunda morte e a condenação eterna.

1.2 – APOCALIPSE 21 E 22: NOVO CÉU E NOVA TERRA

Feitas as considerações sobre o Reino Milenar e tendo como premissa os


fundamentos do paralelismo progressivo, importa tecer breves comentários sobre os dois
últimos capítulos do Livro do Apocalipse. De fato, esta última das sete seções paralelas inicia-
se com a primeira vinda de Cristo, conforme visto quando da análise do capítulo 20. Seguindo
a lógica do paralelismo, necessário se faz encontrar o que esta seção paralela acrescenta às
anteriores e, com efeito, o ponto adicional na revelação do desfecho do plano redentor de Deus
está exatamente nos capítulos 21 e 22 de Apocalipse.
Os capítulos 21 e 22 de Apocalipse anunciam a restauração do paraíso, através da
criação do novo céu e da nova terra, e descrevem a nova Jerusalém, onde habitarão Deus e seu
povo. Para o nosso propósito é importante analisar as características deste paraíso restaurado.

1.2.1 – A NOVA JERUSALÉM SERÁ HABITAÇÃO DE DEUS E SEU POVO


Esta verdade se extrai de Ap. 21.3: “Então, ouvi grande voz vinda do trono,
dizendo: Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos
de Deus, e Deus mesmo estará com eles” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada,
Ap. 21.3).
Diferentemente do tabernáculo do deserto, que tinha o Santo dos Santos, onde Deus
habitava, e do Templo em Jerusalém, no qual havia o lugar Santo, atrás da cortina, como
habitação de Deus, na Nova Jerusalém Deus e o povo moram sob o mesmo teto, moram juntos
em perfeita paz e harmonia 22. O santuário é o Deus Todo-Poderoso e o Cordeiro (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.22).

22
KISTEMAKER, 2014, p. 724.
22

Naturalmente, disto não resulta que Deus habita apenas no meio do seu povo, pois
Deus é onipresente, antes que, como afirma CAMPOS (2014, p. 150) “quando a Escritura fala
da habitação de Deus, ela se refere mais especificamente à sua habitação com o seu povo”.

1.2.2 – NÃO HAVERÁ SOFRIMENTO NA NOVA JERUSALÉM


Há inequívoca indicação sobre a ausência de sofrimento na Nova Jerusalém em Ap.
21.4: “E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto,
nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram.” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ap. 21.4).
Trata-se de uma estrutura de vida transformada por completo, sem as limitações e
consequências da queda, impostas aos seres humanos e a toda a criação. O tempo se
transformou em eternidade e a anterior separação de Deus agora é comunhão com Ele 23.

1.2.3 – A BELEZA DA NOVA JERUSALÉM


A visão do Apóstolo João indica que a Nova Jerusalém será repleta da glória de
Deus (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.11), e do Cordeiro também
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 22.1), que ilumina toda a cidade, a
ponto de tornar desnecessários o sol e a lua (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e
Atualizada, Ap. 21.23). É um lugar seguro, com grande e alta muralha (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.12). No texto há diversas referências ao número 12, nos
versículos 12, 14, 16 e 21 do capítulo 21, e no versículo 2 do capítulo 22. Segundo
KISTEMAKER (2014, p. 735) “esse número sempre ilustra Deus, o seu povo e a residência
deles”.
Há referência à vara de ouro para medir a cidade (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ap. 21.15); a cidade é de ouro puro, semelhante a vidro límpido (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.18); seus fundamentos são adornados de
pedras preciosas (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.19-20); as doze
portas são doze pérolas (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.21); e a
praça da cidade é de ouro puro, como vidro transparente (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ap. 21.21). Tais menções sugerem a beleza superior da cidade e o brilho
deslumbrante compatíveis com a glória e a majestade de Deus.

23
KISTEMAKER, 2014, p. 719.
23

1.2.4 – A PUREZA NA NOVA JERUSALÉM


O texto de Ap. 21.27 aponta nesta direção: “Nela, nunca jamais penetrará coisa
alguma contaminada, nem o que pratica abominação e mentira, mas somente os inscritos no
Livro da Vida do Cordeiro” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 21.27).
Ao lado da perfeição estética da cidade está a pureza moral de seus habitantes.
BEALE (1999, p. 1101) destaca a consistência da Escritura neste especial, ao anotar que “assim
como os fisicamente impuros não podiam entrar no templo do AT, os espiritualmente impuros
não poderão entrar no templo eterno”.
Percebe-se, portanto, que a nova Jerusalém será habitada por pessoas redimidas e
purificadas por Deus e sempre é oportuno lembrar que os crentes estão em processo de
santificação e é seu dever buscar o crescimento constante neste processo.

1.2.5 – O REINO ETERNO


Na Nova Jerusalém haverá o trono de Deus e do Cordeiro (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Ap. 22.3) e os crentes reinarão eternamente com Deus, conforme
Ap. 22.5: “Então, já não haverá noite, nem precisam eles de luz de candeia, nem da luz do sol,
porque o Senhor Deus brilhará sobre eles, e reinarão pelos séculos dos séculos” (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ap. 22.3).
Acresce que, como anota BEALE 24, referido reinado foi profetizado em Dn 7.18:
“Mas os santos do Altíssimo receberão o reino e o possuirão para todo o sempre, de eternidade
em eternidade” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Dn. 7.18) e prometido
por Jesus Cristo em Ap. 3.21: “Ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim
como também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ap. 3.21).
Concluída está a análise da última das sete seções paralelas do Livro do Apocalipse,
dentro dos limites e do propósito deste trabalho. Como visto, a seção inicia-se com o Reino
Milenar, passa pelo julgamento e condenação de Satanás e dos incrédulos, e culmina na
descrição dos novos céus e nova terra, que desperta a esperança e o encantamento nos cristãos.

24
BEALE, 1999, p. 1.116.
24

CAPÍTULO 2
O MILÊNIO E AS PROFECIAS DO ANTIGO TESTAMENTO

Este capítulo tem por objetivo estudar o cumprimento das profecias do Antigo
Testamento durante o Reino Milenar, que é substancialmente impactado a partir da forma de
interpretar o milênio. O ponto de partida da análise será a descrição do tema conforme
interpretação defendida por linha doutrinária diversa do amilenismo, a saber, o pré-milenismo
dispensacionalista, que entende não só que o milênio terá duração de exatos mil anos, mas
também que será a dispensação reservada ao cumprimento de algumas profecias do Antigo
Testamento, período no qual Deus cumpre as promessas feitas exclusivamente para os judeus 1.
A exposição partirá da menção aos aspectos gerais do dispensacionalismo para
depois examinar a interpretação pré-milenista dispensacionalista sobre algumas profecias do
Antigo Testamento e apresentar uma crítica a esta interpretação.
Para tornar completo o contraponto, também se faz necessário listar e explicar
algumas profecias do Antigo Testamento que verdadeiramente tem seu cumprimento durante o
Reino Milenar.

2.1 – ASPECTOS GERAIS SOBRE O DISPENSACIONALISMO

São suficientes para o propósito aqui delineado uma breve notícia histórica sobre a
origem do dispensacionalismo, alguns dos principais aspectos desta linha de entendimento, a
conceituação de dispensação, a listagem das dispensações e a descrição da dispensação
denominada “reino”, referente ao Reino Milenar.
Segundo SANTOS2, John Nelson Darby (1800-1882) foi precursor de um novo
modo de interpretação bíblica, especialmente das profecias, denominado dispensacionalismo.
Este movimento difundiu-se a partir da publicação de vários periódicos e adesão de escolas
teológicas, entre elas o atual Seminário Teológico de Dallas. Destaca-se, como publicação com
ideias dispensacionalistas de 1909, a Bíblia de Referência de Scofield (The Scofield Reference
Bible), que se trata da Bíblia King James comentada por Cyrus Ingerson Scofield (1843-1921).

1
FRAME, John. Teologia Sistemática. Vol. 2. São Paulo: Cultura Cristã, 2019, p. 449.
2
SANTOS, João Alves dos. O Dispensacionalismo e suas implicações doutrinárias (artigo). Disponível em:
https://www.seminariojmc.br/index.php/2018/01/15/o-dispensacionalismo-e-suas-implicacoes-doutrinarias/.
Acesso em 15/09/2022.
25

Esta bíblia de estudo recebeu nova edição em 1967, elaborado por nove teólogos
dispensacionalistas: a Nova Bíblia de Referência de Scofield (THE NEW SCOFIELD
REFERENCE BIBLE).
Entre os postulados do dispensacionalismo, destaca-se a distinção entre Israel e a
Igreja. LEWIS SPERRY CHAFER aponta 24 contrastes, dos quais se destacam o propósito
divino e o reino terreno de Cristo.
O propósito divino é analisado por CHAFER (2008, p. 413) que assim o explica:
“pacto, promessa e provisão para Israel são terrestres, e Israel será uma nação importante na
terra, quando ela for recriada. Todo pacto ou promessa para a Igreja é para uma realidade
celestial, e ela continuará na cidadania celestial quando os céus forem recriados”.
Quanto ao contraste relativo ao reino terreno de Cristo, o teólogo ressalta que
“aqueles da nação eleita são designados para serem súditos do Rei em seu reino terrestre (Ez.
37.21-28), enquanto que aqueles que compõem a Igreja devem reinar com o Rei, como seu
Consorte naquele reino (Ap. 20.6)” (CHAFER, 2008, p. 418).
Também é um princípio desta linha de pensamento a interpretação literal da
Escritura, incluindo-se as profecias, conforme afirma o teólogo dispensacionalista RYRIE
(1968, p. 96):
O dispensacionalismo é o resultado da aplicação consistente do
princípio hermenêutico básico da interpretação literal, normal ou
simples.
(...)
O não literalista é o não dispensacionalista, e o literalista consistente é
um dispensacionalista.
Dispensação pode ser entendida como um período no qual são revelados aspectos
específicos da vontade de Deus e o homem é testado quanto à sua obediência 3. São sete as
dispensações: inocência, consciência de responsabilidade moral, governo humano, promessa,
lei, a igreja e o reino4. Em cada uma das dispensações a reconciliação entre o homem e Deus se
dá pela mesma forma, a saber, pela graça de Deus em razão da obra de Cristo realizada na cruz5.
Nos termos da visão dispensacionalista, como anota HOEKEMA6, a volta de Cristo
acontecerá em duas etapas, a primeira etapa é a do arrebatamento dos crentes, que é seguida de
tribulação; e a segunda etapa é posterior à tribulação e nela ocorre o julgamento e a destruição
dos inimigos de Cristo. Depois da segunda etapa, Cristo estabelecerá seu trono em Jerusalém e

3
SCOFIELD, C.I. (ed). The New Scofield Reference Bible. New York: Oxford University Press, 1967, p. 3.
4
Loc. cit.
5
Loc. cit.
6
HOEKEMA, Anthony A. A Bíblia e o Futuro. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 178-179.
26

dará início ao Reino Milenar, de exatamente mil anos. A dispensação do reino diz respeito ao
Reino Milenar.
Sobre o conceito da dispensação do Reino Milenar disserta RYRIE (1968, p. 63):
Após o segundo advento de Cristo o reino milenar será estabelecido em
cumprimento de todas as promessas dadas em ambos os Testamentos e
particularmente aquelas contidas nas alianças Abraâmica e Davídica. O
Senhor Jesus, que se encarregará pessoalmente da administração dos
assuntos do mundo durante essa época, será o personagem principal da
dispensação. Ele continuará por mil anos, e o homem será responsável
pela obediência ao Rei e suas leis. Satanás será preso, Cristo governará,
a justiça prevalecerá, a desobediência aberta será rapidamente punida.
No entanto, no final do período, serão encontrados rebeldes suficientes
para formar um exército formidável que ousará atacar a sede do governo
(Ap. 20.7-9). A revolta não terá sucesso e os rebeldes serão lançados no
castigo do inferno.
Feitas estas considerações, cumpre analisar quais profecias não serão cumpridas
durante o Reino Milenar, e quais tem seu cumprimento neste período.

2.2 – PROFECIAS QUE NÃO SERÃO CUMPRIDAS DURANTE O MILÊNIO

Passemos à análise de algumas das principais profecias do Antigo Testamento que,


segundo entendimento de dispensacionalistas, dizem respeito exclusivamente ao futuro de
Israel e serão cumpridas no Reino Milenar. Em cada tópico será estabelecido o contraponto a
este posicionamento, com o propósito de mostrar que o conteúdo destas profecias não leva à
conclusão de que haverá um Milênio literal, antes o cumprimento delas pode ser situado no
retorno de Israel do cativeiro babilônio, durante o Reino Milenar não literal ou nos novos céus
e nova terra.

2.2.1 – ISAÍAS 65.17-25


Assim diz o texto:
17. Pois eis que eu crio novos céus e nova terra; e não haverá
lembrança das coisas passadas, jamais haverá memória delas. 18. Mas
vós folgareis e exultareis perpetuamente no que eu crio; porque eis
que crio para Jerusalém alegria e para o seu povo, regozijo. 19. E
exultarei por causa de Jerusalém e me alegrarei no meu povo, e nunca
mais se ouvirá nela nem voz de choro nem de clamor. 20. Não haverá
mais nela criança para viver poucos dias, nem velho que não cumpra
os seus; porque morrer aos cem anos é morrer ainda jovem, e quem
pecar só aos cem anos será amaldiçoado. 21. Eles edificarão casas e
nelas habitarão; plantarão vinhas e comerão o seu fruto. 22. Não
edificarão para que outros habitem; não plantarão para que outros
comam; porque a longevidade do meu povo será como a da árvore, e
27

os meus eleitos desfrutarão de todo as obras das suas próprias mãos.


23. Não trabalharão debalde, nem terão filhos para a calamidade,
porque são a posteridade bendita do Senhor, e os seus filhos estarão
com eles. 24. E será que, antes que clamem, eu responderei; estando
eles ainda falando, eu os ouvirei. 25. O lobo e o cordeiro pastarão
juntos, e o leão comerá palha como o boi; pó será a comida da
serpente. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo
monte, diz o Senhor. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e
atualizada, Is. 65.17-25).
A THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE7, que bem representa o
pensamento dispensacionalista, aponta como subtítulo, antes do versículo 17, “Novos céus e
nova terra”, mas, para os versículos 18 a 25 o subtítulo é “Condições milenares na terra
renovada com maldição removida”. Consta dos comentários a esta passagem que o versículo
17 lança seu olhar para além da era do Reino, mas os versículos 18 a 25 descrevem a era do
Reino propriamente dito. Durante o Reio Milenar haverá longevidade, mas a morte será
destruída apenas depois da rebelião de Satanás e encerramento dos mil anos.
O texto, entretanto, não faz nenhuma menção a reino milenar, nem há razões para
entender que Isaías mudou de assunto entre o versículo 17 e os versículos 18 a 25. A relação
desta profecia com os novos céus e nova terra está expressamente estabelecida no versículo 17,
tudo a indicar seu cumprimento por oportunidade da nova criação, descrita a partir de Ap. 21.1.
Sobre o tema HOEKEMA (2012, p. 215) acrescenta que:
(...) só se pode encontrar uma descrição do milênio, nessa passagem, se
deliberadamente omitirmos o que dizem os versículos 17 a 19. O
versículo 17 fala, inequivocamente, acerca dos novos céus e nova terra
(que o livro de Apocalipse reconhece como marcando o estado final;
ver Ap 21.1). O versículo 18 convoca o leitor a “exultar perpetuamente”
– não somente por mil anos – nos novos céus e na nova terra recém-
mencionados. Isaías não fala aqui a respeito de uma existência que não
durará mais que mil anos, mas sim sobre uma felicidade eterna! O que
se segue, no versículo 19, acrescenta o que, em Apocalipse 21.4, é uma
marca do estado final: “Nunca mais se ouvirá nela (a nova Jerusalém)
nem voz de choro nem de clamor”.
Percebe-se, pois, que a profecia de Is. 65.17-25 refere-se aos novos céus e nova
terra e terá seu cumprimento na era vindoura, descrita em Ap. 21-1 a 22.58.
A menção à morte em Is. 65.20 não afasta a ideia de que o cumprimento da profecia
está reservado aos novos céus e nova terra. OSWALT anota que o significado deste versículo
é incerto e a apresenta a seguinte interpretação:

7
SCOFIELD, Reference Bible, p. 767-768.
8
BEALE é da mesma opinião. BEALE, G.K. The Book of Revelation: a commentary on the greek text. Grand
Rapids: W.B Edermans, 1999, p. 1.041.
28

Este versículo dá início à série de exemplos concretos que explicam por


que não haverá clamor nem pranto no reino de Deus (v. 19). A série
continua no versículo 25. São exemplos extraídos desta vida, mas que
não se limitam à referência ao reino milenial, nem significam que este
quadro é necessariamente contraditório ao apresentado em 25.6–9, o
qual declara que a morte será destruída. Tais exemplos simplesmente
ilustram todas as aquelas coisas que causam tristeza, e são usadas para
mostrar que tais condições não existirão nos novos céus e terra.
(OSWALT, 2011, p. 791).
Tampouco a referência ao pecado autoriza conclusão diversa. A menção ao pecado
assim constou de Is. 65.20: “quem pecar só aos cem anos será amaldiçoado”. OSWALT
explica esta passagem reiterando a ideia de que a intenção do texto é enfatizar a longevidade
nos novos céus e na nova terra: “Aqui, como ali, cem anos seria uma vida curta, e o pecador
seria maldito por viver apenas cem anos” (OSWALT, 2011, p. 792).
Em suma, a profecia de Is. 65.17-25 não faz qualquer referência ao Milênio, nem
deve ser entendida como evidência da existência de um reino milenar literal. O próprio texto
afirma que a profecia se refere aos novos céus e nova terra e a descrição que encontramos na
passagem é de uma nova terra, recriada, onde não há morte nem sofrimento.

2.2.2 – EZEQUIEL 40 a 48
Resumidamente, estes capítulos tratam da visão de Ezequiel que encerra seu livro,
pela qual o profeta é acompanhado por um ser angelical por toda a extensão do Templo e tudo
passa a ser medido com “um cordel de linho e uma cana de medir” (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Ez. 40.3). Há um detalhamento sobre as portas do Templo
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez. 40.6-37), das câmaras reservadas aos
sacerdotes que faziam holocaustos (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez.
40.38-47) e do Santo dos Santos (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez.
40.48-41.26). Depois a glória do Senhor enche o Templo (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ez. 43.1-5) e Ezequiel recebe instruções sobre como deveria proceder
perante o povo de Israel (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez. 43.6-12). A
visão segue com o Senhor instruindo e instituindo regulamentos sobre organização do Templo,
deveres dos sacerdotes, repartição das terras ao redor do Templo e sobre festas, ofertas e
sacrifícios (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez. 44.1-46.24). Por fim são
estabelecidas fronteiras da terra de Israel e definidos os limites das porções das tribos de Israel
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ez. 47.13-48.35).
29

A THE NEW SCOFIELD REFERENTE BIBLE atribui ao texto Ez. 40.1 a 47.12 o
título “O Templo do Milênio e seu Culto”9 e ao texto de Ez. 47.13 a 48.35 o título “A Divisão
da Terra na Era Milenar” 10. No comentário de Ez. 40.5, consta desta Bíblia de Referência que
os nove últimos capítulos de Ezequiel têm sido interpretados de diversas maneiras, mas a
interpretação preferível é de que nos é dada uma imagem do Templo Milenar e que,
A julgar pelo contexto amplo da profecia (o tempo posterior ao
reajuntamento e conversão de Israel) e o testemunho de outros textos
da Escritura (Is. 66, Ez. 6, 14), esta interpretação está de acordo com o
programa profético de Deus para o milênio11.
Todavia, não há qualquer indicação no sentido de que estes capítulos se referem ao
Reino Milenar e a interpretação literal deste texto, que é defendida pelos dispensacionalistas,
impõe dificuldades insuperáveis, entre outros pontos, quanto aos holocaustos e sacrifícios de
animais determinados em Ez. 44.10-11:
Os levitas, porém, que se apartaram para longe de mim, quando Israel
andava errado, que andavam transviados, desviados de mim, para irem
atrás dos seus ídolos, bem levarão sobre si a sua iniquidade. Contudo,
eles servirão no meu santuário como guardas nas portas do templo e
ministros dele; eles imolarão o holocausto e o sacrifício para o povo e
estarão perante este para lhe servir. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Ez. 44.10-11).
Com efeito, não há motivo para qualquer sacrifício ou holocausto de animal, sequer
como memorial, eis que Jesus Cristo nos deixou a Ceia do Senhor, como o memorial da sua
morte12.
A THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE13 sugere duas respostas aos
questionamentos sobre o sacrifício de animais durante o Reino Milenar: i) seria um sacrifício
com característica meramente memorial, mas sem valor expiatório; ii) a menção ao sacrifício
de animais não deve ser adotada literalmente, antes deve ser considerada como representando
a adoração de Israel, após sua redenção, no Templo, durante o reino milenar.
Como visto, a primeira resposta não é satisfatória, ante a absoluta desnecessidade
de outro memorial senão a Ceia, ordenada pelo próprio Senhor Jesus Cristo. A segunda resposta
contraria o princípio dispensacionalista da interpretação literal das profecias.

9
SCOFIELD, Reference Bible, p. 883.
10
Ibid., p. 893.
11
Ibid, p. 884.
12
HOEKEMA, 2012, p. 217.
13
SCOFIELD, Reference Bible, p. 888.
30

Floyd E. Hamilton critica a interpretação literal de Ez. 44.9, que impede o acesso
ao santuário de Deus dos incircuncisos “na carne” e aponta a impropriedade da interpretação
literal das profecias do Antigo Testamento:
Isso descartaria a Epístola de Paulo aos Gálatas, pois foi escrita
especificamente contra os judaizantes que insistiam que era necessário
ser circuncidado, bem como crer em Cristo, para a salvação. Do que
nossos amigos pré-milenistas sugeririam que a circuncisão seria um
memorial? Não está claro que o princípio da interpretação literal de
todas as profecias do Antigo Testamento é reduzido ao absurdo pela
mera contemplação de tal perspectiva durante o suposto milênio? O
próprio Cristo providenciou o verdadeiro memorial de sua morte, na
Ceia do Senhor, e isso deveria ser observado apenas “até que ele
venha”, quando a necessidade de um memorial seria eliminada, e ele,
juntamente com as “coisas anteriores que passaram” (Ap. 21.4).
(HAMILTON, 1942, p. 43).
O princípio geral da interpretação literal das profecias e, de maneira especial, a
conclusão de que o cumprimento literal destas profecias dar-se-ia durante suposto reino
milenar, foi corretamente refutado por George L. Murray:
A verdade clara é que não há um capítulo das Escrituras proféticas que
possa ser tomado com absoluta literalidade e mostrar a restauração do
Israel natural e o estabelecimento de um reino palestino no qual os
judeus predominarão, com Jerusalém como capital e Cristo como rei.
(MURRAY, 1948, p. 40).
Anote-se, ainda, a crítica de John B. Taylor à interpretação literal dos capítulos 40
a 48 de Ezequiel:
Se a partir daí conclui-se que as festas, os sacrifícios de sangue, o
sacerdócio e a adoração no templo, todos conforme o Antigo
Testamento, devem ser reintroduzidos, depois da revelação do Novo
Testamento de Cristo e Sua obra completa, mostra quão completamente
este ponto de vista traz uma interpretação errônea do significado da
salvação em Cristo e como lança dúvidas sobre a consistência da
maneira de Deus lidar com a humanidade. Sua falha, portanto, acha-se
basicamente em considerar Ezequiel 40-48 como profecia e em insistir
num cumprimento literal, se não no passado, então no futuro.
(TAYLOR, 1984, p. 226).
Portanto, não há nenhum indicativo de que Ezequiel 40 a 48 trata de realidades que
aconteceriam em suposto reino milenar literal, e nada autoriza a interpretação literal de todos
textos proféticos, especialmente destes capítulos de Ezequiel, pois implicaria no
restabelecimento de práticas litúrgicas que atualmente são desnecessárias, pois prenunciavam
realidades futuras e foram integralmente cumpridas por Jesus Cristo, sua obra e sua
ressurreição. Melhor se afigura situar o cumprimento destas profecias na nova terra14.

14
HOEKEMA, 2012, p. 218.
31

2.2.3 – ISAÍAS 2.1-4


Eis a passagem:
1. Palavra que, em visão, veio a Isaías, filho de Amoz, a respeito de
Judá e Jerusalém. 2. Nos últimos dias, acontecerá que o monte da Casa
do SENHOR será estabelecido no cimo dos montes e se elevará sobre
os outeiros, e para ele afluirão todos os povos. 3. Irão muitas nações e
dirão: Vinde, e subamos ao monte do SENHOR e à casa do Deus de
Jacó, para que nos ensine os seus caminhos, e andemos pelas suas
veredas; porque de Sião sairá a lei, e a palavra do SENHOR, de
Jerusalém. 4. Ele julgará entre os povos e corrigirá muitas nações; estas
converterão as suas espadas em relhas de arados e suas lanças, em
podadeiras; uma nação não levantará a espada contra outra nação, nem
aprenderão mais a guerra. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e
Atualizada, Is. 2.1-4).
A THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE15 atribui a Is. 2.1-5 o título “Uma
visão do reino vindouro”. Também anota que a mesma visão consta de Mq 4.1-3, 5, este com
um detalhe adicional na descrição. Sobre Mq 4.1-4 consta o seguinte comentário: “Nos v. 1-4
há algumas previsões gerais sobre o reino”16, e há referência a Is. 2.1-5 e 11.1-12. Não há
dúvida, pois, que estes textos são considerados como referindo-se ao milênio, na perspectiva
dispensacionalista.
Entretanto, o versículo 4 do capítulo 2 de Isaías aponta para a cessação de conflitos
entre as nações, ao passo em que, do ponto de vista dispensacionalista, a guerra não é
completamente eliminada na era milenar: “Na conclusão dos mil anos, Satanás é solto por um
pequeno período e instiga uma rebelião final que é sumariamente reprimida pelo Senhor” 17.
Afastado o cumprimento desta profecia no reino milenar, por aplicação de critérios
defendidos pelos próprios dispensacionalistas, melhor se afigura situar seu cumprimento na
nova terra descrita em Ap. 21 e 22, onde verdadeiramente as nações adorarão juntas ao Deus
verdadeiro18.
Sem destoar deste entendimento quanto ao cumprimento integral desta profecia na
nova terra, J. RIDDERBOS (1995, p. 78) anota que “o cumprimento desta profecia é executado
por Cristo (Lc 2.32) – inicialmente, por sua primeira vinda e depois, no fim desta dispensação,
de maneira perfeita (2 Pe 3.13)”. Para melhor compreensão do argumento, vale a pena
transcrever o texto de 2 Pe 3.13: “Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos novos céus

15
SCOFIELD, Reference Bible, p. 714.
16
Ibid., p. 946.
17
Ibid., p. 1.373, anotação a Ap. 20.4.
18
HOEKEMA, 2012, p. 218-219.
32

e nova terras, nos quais habita justiça” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada,
2Pe 3.13).
Portanto, nada vincula a profecia de Is. 2.1-4 ao reino milenar, interpretação
afastada quando se vale de parâmetros adotados pelos próprios dispensacionalistas, antes é mais
razoável considerar que seu cumprimento ocorrerá plenamente na nova terra.

2.2.4 – AMÓS 9.14-15


Assim diz a profecia:
14. Mudarei a sorte do meu povo de Israel; reedificarão as cidades
assoladas e nelas habitarão, plantarão vinhas e beberão o seu vinho,
farão pomares e lhes comerão o fruto. 15. Plantá-los-ei na sua terra, e,
dessa terra que lhes dei, já não serão arrancados, diz o SENHOR, teu
Deus. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Am. 9.14-
15).
A THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE19 atribui a Am. 9.13-15 o título
“Restauração de Israel no Reino”, o que significa situar o cumprimento desta profecia na era
milenar.
Não há, todavia, nenhuma evidência de que este texto se refere ao Milênio,
especialmente um período de literalmente mil anos, eis que o versículo 15, ao afirmar que o
povo de Israel jamais será arrancado da terra recebida de Deus, afasta a ideia de limitação do
período.
SMITH (2008, p. 410) comenta o versículo 15, anotando, sobre o cumprimento da
promessa a Israel, que: “Eles irão possuir a terra e suas raízes não serão mais arrancadas do
lugar (...) que Deus lhes deu; esta expressão promete paz sem inimigos e uma habitação
eterna”. Nota-se, pois, que o cumprimento desta profecia implica na ausência de inimigos de
Israel e nos remete à ideia de habitação eterna, o que se mostra incompatível com as
características do Reino Milenar advogado pelos dispensacionalistas.
No ensejo do estudo desta profecia, cumpre anotar que consta de At. 15.13-18 a
interpretação de Am. 9.11-12, e dela se extrai que a interpretação literal das profecias relativas
à restauração de Israel não é recomendada.
Diz em Am. 9.11-12:
11. Naquele dia, levantarei o tabernáculo caído de Davi, repararei as
suas brechas; e, levantando-a das suas ruínas, restaurá-lo-ei como fora
nos dias da antiguidade 12. para que possuam o restante de Edom e
todas as nações que são chamadas pelo meu nome, diz o SENHOR, que

19
SCOFIELD, Reference Bible, p. 938.
33

faz estas coisas. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada,


Am. 9.11-12).
Em At. 15.13-18 encontramos o discurso de Tiago argumentando que os gentios
devem ser admitidos na comunidade cristã. Tiago cita a profecia de Am. 9.11-12 e a considera
cumprida exatamente porque os gentios foram incluídos no povo de Deus, o que indica a
interpretação não literal de uma profecia que trata da restauração de Israel20.
Transcreve-se o texto de Atos:
13. Depois que eles terminaram, falou Tiago, dizendo: Irmãos, atentai
nas minhas palavras: 14. expôs Simão como Deus, primeiramente,
visitou os gentios, a fim de constituir dentre eles um povo para o seu
nome. 15. Conferem com isto as palavras dos profetas, como está
escrito: 16. Cumpridas estas coisas, voltarei e reedificarei o
tabernáculo caído de Davi; e, levantando-o de suas ruínas, restaurá-
lo-ei. 17. Para que os demais homens busquem o Senhor, e também
todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, 18.
diz o Senhor, que faz estas coisas conhecidas desde séculos. (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, At. 15.13-18).
Desta forma, tratando a profecia da habitação eterna do povo de Israel, sem ataques
e ameaças de inimigos, a referência diz respeito à era vindoura e seu cumprimento será na nova
terra. Além disto, o texto de Am. 9.11-12, que antecede esta profecia de habitação eterna, recebe
interpretação figurada em At. 15.13-18, tudo a indicar que a interpretação literal deste texto e
de outras profecias não é correta.

2.2.5 – ZACARIAS 8.7-8


A profecia foi assim lançada: “Assim diz o SENHOR dos Exércitos: Eis que salvarei
o meu povo, tirando-o da terra do Oriente e da terra do Ocidente; eu os trarei, e habitarão em
Jerusalém; eles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus, em verdade e em justiça” (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Zc. 8.7-8).
A THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE21 atribui a Zc. 8.1-8 o título “O
Senhor restaurará Israel no reino”, e indica que esta passagem deve ser comparada a Is. 2.1-422,
texto que, como visto no item 2.2.3, também é uma profecia tida pelos dispensacionalistas como
evidência da participação de Israel no reino milenar. Por isto é possível afirmar que, segundo o
pensamento dispensacionalista, o texto de Zc. 8.7-8 trata da restauração milenar de Israel.

20
HOEKEMA, 2012, p. 223.
21
SCOFIELD, Reference Bible, p. 969.
22
Loc. cit.
34

Ao que tudo indica, entretanto, esta profecia se cumpriu literalmente nos dias de
Esdras, com o retorno de muitos judeus, da Babilônia para Jerusalém, conforme anota
HOEKEMA23.

2.2.6 – JEREMIAS 23.3, 7-8


Assim diz o texto:
v. 3: Eu mesmo recolherei o restante das minhas ovelhas, de todas as
terras para onde as tiver afugentado, e as farei voltar aos seus apriscos;
serão fecundas e se multiplicarão.
v. 7-8: Portanto, eis que vêm dias, diz o Senhor, em que nunca mais
dirão: Tão certo como vive o Senhor, que fez subir os filhos de Israel
da terra do Egito; mas: Tão certo como vive o Senhor, que fez subir,
que trouxe a descendência da casa de Israel da terra do Norte e de
todas as terras para onde os tinha arrojado; e habitarão na sua terra.
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Jr. 23.3 e 7-8).
Consta da THE NEW SCOFIELD REFERENCE BIBLE24 o seguinte comentário
ao v. 3 do capítulo 23 de Jeremias:
Esta restauração final será realizada após um período de incomparável
tribulação (Jr. 30.3-10), e em conexão com a manifestação do renovo
justo de Davi (v. 5).
(...)
Não se deve confundir essa restauração com o retorno de um
remanescente de Judá sob Esdras, Neemias e Zorobabel, ao final do
cativeiro de setenta anos (Jr. 29.10).
Nada impede, entretanto, que se considere a profecia de Jeremias cumprida com o
retorno dos israelitas do cativeiro na Babilônia, de resto anunciada em Jr. 29.10: “Assim diz o
Senhor: Logo que se cumprirem para a Babilônia setenta anos, atentarei para vós outros e
cumprirei para convosco a minha boa palavra, tornando a trazer-vos para este lugar”
(BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Jr. 29.10).
Neste sentido o comentário de HOEKEMA (2012, p. 220): “O fato de o próprio
Jeremias mencionar especificamente o retorno do cativeiro babilônico, num capítulo posterior,
reafirma o argumento de que é esse o retorno que ele prediz no capítulo 23”.
Assim, também é o caso de afastar a vinculação entre o cumprimento desta profecia
e o suposto milênio literal, antes, a exemplo da profecia de Zc 8.7-8, seu cumprimento fica
melhor situado quando do retorno dos israelitas do cativeiro.
Outras profecias podem ser mencionadas, pois reputadas como evidência da
existência de um reino milenar pelos dispensacionalistas. É o caso de Is. 11.6-10, Ez. 34.12-13

23
HOEKEMA, 2012, p. 221.
24
SCOFIELD, Reference Bible, p. 794.
35

e Ez. 36.1-2525. Os motivos para afastar o cumprimento destas profecias durante o Reino
Milenar foram abordados ao longo da exposição e aplicados a outras profecias, razão pela qual
aqui serão apenas citadas. Com efeito, o cumprimento da profecia de Is. 11.6-10, a exemplo de
Is. 2.1-4 e pelas mesmas razões, pode tranquilamente ser situado na nova terra. Na mesma linha
de entendimento, as de Ez. 34.12-13 e Ez. 36.24, assim como a de Zc. 8.7-8, são melhor
acomodadas quando entendido seu cumprimento no retorno de Israel do cativeiro 26.
Do quanto exposto se extrai que as principais profecias do Antigo Testamento que
tem seu cumprimento remetido pelos dispensacionalistas para o Reino Milenar, na verdade ou
se referem à nova terra na era vindoura, ou foram cumpridas com o retorno de Israel do
cativeiro. Esta constatação decorre da análise acurada destas profecias e da ideia já
desenvolvida de que o Reino Milenar não equivale ao período de exatamente mil anos.

2.3 – PROFECIAS EFETIVAMENTE CUMPRIDAS DURANTE O MILÊNIO

Serão analisadas algumas profecias do Antigo Testamento que dizem respeito à


ressurreição de Jesus Cristo e foram cumpridas durante o Milênio. É importante perceber que,
considerando-se o Milênio como um período não literal iniciado com a primeira vinda de Cristo,
todas as profecias do Antigo Testamento relacionadas à primeira vinda, ou seja, ao nascimento,
vida, obra, morte e ressurreição de Cristo foram cumpridas durante o Reino Milenar, além das
profecias sobre libertação da escravidão do pecado, também vinculada à ressurreição de Cristo.
Impõe-se, entretanto, focalizar o estudo nas profecias relacionadas à ressurreição de Cristo,
dado o profundo sentido escatológico deste evento.
Esta é a linha de raciocínio de BEALE (2018, p. 205):
A esperança judaica e do AT afirmava que a ressurreição ocorreria no
fim da história; portanto, a ressurreição de Cristo foi o começo do fim
dos tempos (...) essa ideia de ressurreição em todo o NT é equivalente
à nova criação e ao reinado de Cristo escatológicos, envolvendo todos
aqueles que se identificam com Jesus.
Neste contexto, o objeto da reflexão sobre este ponto fica delimitado à análise de
algumas das principais profecias do Antigo Testamento que anunciam a ressurreição 27 e a

25
SCOFIELD, Reference Bible, p. 723, 876-877 e 878-879.
26
HOEKEMA, 2012, p. 216-217 e 220-221.
27
BEALE lista as seguintes passagens do Antigo Testamento em que a ideia de esperança da ressurreição e o
conceito de últimos tempos estão presentes, ainda que não expressamente: Dt. 32.39, 1Sm 2.6, Sl. 16.9-10, Sl.
22.28-29, Sl. 49.14-16, Sl. 73.24, Is. 25.7-9, Is. 26.19, Is. 53.10-11, Ez. 37.1-14, Dn. 12.1-2, Os. 6.1-3 e Os.
6.13-14. BEALE, G.K. Teologia Bíblica do Novo Testamento – A continuidade teológica do Antigo Testamento
no Novo. São Paulo: Vida Nova, 2018, p. 206-207.
36

análise de alguns textos do Novo Testamento que afirmam o efetivo cumprimento destas
profecias, especialmente a partir da ressurreição de Cristo, portanto que tem relação direta com
o Reino Milenar.

2.3.1 – O CUMPRIMENTO DE SALMOS 16.8-11 EM ATOS 2.22-36


Diz o texto de Sl. 16.8-11:
8. O SENHOR, tenho-o sempre à minha presença; estando ele à minha
direita, não serei abalado. 9. Alegra-se, pois, o meu coração, e o meu
espírito exulta; até o meu corpo repousará seguro. 10. Pois não deixarás
a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção.
11. Tu me farás ver os caminhos da vida; na tua presença há plenitude
de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente. (BÍBLIA SAGRADA,
Almeida Revista e Atualizada, Sl. 16.8-11).
Segundo João Calvino, neste Salmo Davi pede a proteção de Deus e a Ele dá graças,
por reconhecer que “a plena e substancial felicidade consiste em repousar exclusivamente em
Deus” (CALVINO, vol. 1, 2009, p. 271). Ao comentar o v. 10, CALVINO ressalta a confiança
manifestada pelo salmista acerca da salvação eterna, que o liberta da ansiedade e do temor, e
providencia uma via de escape do túmulo, para que não permaneça na corrupção 28.
Em At. 2.22-36 está escrito:
22. Varões israelitas, atendei a estas palavras: Jesus, o Nazareno, varão
aprovado por Deus diante de vós com milagres, prodígios e sinais, os
quais o próprio Deus realizou por intermédio dele entre vós, como vós
mesmos sabeis; 23. sendo este entregue pelo determinado desígnio e
presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de
iníquos; 24. ao qual, porém, Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da
morte; porquanto não era possível fosse ele retido por ela. 25. Porque a
respeito dele diz Davi: “Diante de mim via sempre o Senhor, porque
está à minha direita, para que eu não seja abalado. 26. Por isso, se
alegrou o meu coração, e a minha língua exultou; além disto, também a
minha própria carne repousará em esperança, 27. porque não deixarás
a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção.
28. Fizeste-me conhecer os caminhos da vida, encher-me-ás de alegria
na tua presença.”. 29. Irmãos, seja-me permitido dizer-vos claramente
a respeito do patriarca Davi que ele morreu e foi sepultado, e o seu
túmulo permanece entre nós até hoje. 30. Sendo, pois, profeta e sabendo
que Deus lhe havia jurado que um dos seus descendentes se assentaria
no seu trono, 31. prevendo isto, referiu-se à ressurreição de Cristo, que
nem foi deixado na morte, nem o seu corpo experimentou corrupção.
32. A este Jesus Deus ressuscitou, do que todos nós somos testemunhas.
33. Exaltado, pois, à destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa
do Espírito Santo, derramou isto que vedes e ouvis. 34. Porque Davi
não subiu aos céus, mas ele mesmo declara: “Disse o Senhor ao meu
Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos
por estrado dos teus pés”. 36. Esteja absolutamente certa, pois, toda a

28
CALVINO, João. Salmos. Vol. 1. São José dos Campos: Editora Fiel, 2009, p. 287.
37

casa de Israel de que a este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez
Senhor e Cristo. (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada,
At. 2.22-36).
O cumprimento de Sl. 16.8-11 em At. 2.22-36 é evidenciada pela simples leitura do
texto do Novo Testamento, que cita expressamente o do Antigo Testamento. De fato, At. 2.25-
28 é a transcrição de Sl. 16.8-11.
A relação entre o texto do livro dos Salmos e a ressurreição de Jesus Cristo se infere
de At. 2.24 e sobre o tema vale a pena transcrever o comentário de HARMAN (2011, p. 110)
ao texto de Sl. 16.10:
O versículo 10 ocupa um lugar especial no pensamento bíblico, visto
ser citado em referência à ressurreição de Jesus. Assegura-se a Davi que
o Senhor não abandonará sua vida no Sheol, não permitirá que seu fiel
(i.e., Davi) veja corrupção. Ele sabe que sua oração do versículo 1
(“socorre-me”) é respondida, e que ele não morrerá; ou, como
alternativa, que ele será preservado de morte prematura. Davi, porém,
fala ainda em termos proféticos por meio do Espírito Santo e contempla
a ressurreição do Messias. Seus olhos visualizam um de seus
descendentes (ver At 2.27) e suas palavras têm um significado muito
mais profundo do que sugeriria uma leitura superficial delas.
Portanto, é possível identificar no Sl. 16.8-11 um caráter profético apontando para
a ressurreição de Cristo, evento que, como visto, ocorreu durante o Reino Milenar descrito em
Ap. 20.1-6.

2.3.2 – O CUMPRIMENTO DE ISAÍAS 53.10 EM ATOS 2.23-24 E LUCAS 24.46


O texto de Is. 53.10, inserido na profecia que trata do sofrimento vicário do Servo
do Senhor, descrita em Is. 52.13-53.12, diz: “Todavia, ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-
o enfermar, quando der ele a sua alma como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade e
prolongará os seus dias; e a vontade do SENHOR prosperará nas suas mãos” (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Is. 53.10).
O versículo em questão trata do injusto sofrimento suportado pelo Senhor Jesus,
por determinação do próprio Senhor Deus Pai, do sacrifício do Senhor Jesus pelos pecados dos
eleitos e de seu triunfo, na ressurreição29, que lhe conferiu longa descendência espiritual.
Neste sentido o comentário de RIDDERBOS (1995, p. 437) a Is. 53.10:
A vontade do Senhor é ligar com esta oferta pela culpa a perspectiva de
um futuro melhor reservado para o grande Sofredor. Estas bênçãos são
mencionadas muitas vezes no Antigo Testamento. Aqui, porém, elas
evidentemente subentendem um sentido mais elevado. O significado de

29
Morris afirma que em Is. 53.10-12 é profetizada a ressurreição de Cristo. MORRIS, Leon. 1 Coríntios –
Introdução e Comentário. São Paulo: Vida Nova, 1981, p. 165.
38

“posteridade” é os Seus descendentes espirituais, a congregação


nascida dEle, o verdadeiro Israel (cf. Hb 2.13); eles são os mesmos a
quem é dito no versículo 11 que Ele os “justificará”. A vida com “dias
prolongados” assume um significado peculiar, porque é uma vida
posterior à Sua morte, a vida de uma pessoa ressurreta (cf. Ap. 1.8).
Neste versículo apresenta-se claramente a evidência da maravilhosa
obra de Deus, que cabe apenas ao Servo do Senhor, e que pode ser crida
apenas por aqueles a quem foi revelado o braço do Senhor (v. 1). Não
apenas a cruz, mas também o túmulo vazio são mostrados claramente
nesta maravilhosa profecia.
Sobre esta profecia cuida o texto de At. 2.23-24 ao afirmar que o Senhor Jesus foi
entregue aos israelitas pelo “determinado desígnio e presciência de Deus” (v. 23) e por eles foi
morto, crucificado por mãos de iníquos, mas Deus o “ressuscitou, rompendo os grilhões da
morte” (v. 24).
BEALE (2018, p. 208) também entende que Is. 53.10 prenuncia a ressurreição do
Servo Sofredor: “A melhor interpretação deste trecho entende que ele se refere à ressurreição
do Servo, e que a ressurreição deste envolverá a produção de uma “descendência”, que
segundo Isaías 66.22 é o novo povo de Deus, que viverá para sempre na nova criação”.
Como visto, Is. 53.10 faz parte do texto que descreve o padecimento de Cristo, e
neste ponto também há menção ao cumprimento desta profecia em Lc. 24.46: “(...) Assim está
escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia” (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Lc. 24.46). HENDRIKSEN vincula Lc. 24.46 a Is.
53, quanto ao sofrimento de Cristo e sua ressurreição30.
Assim, o cumprimento da profecia de Is. 53.10 se deu com o sofrimento, a morte e
a ressurreição do Senhor Jesus, conforme a vontade do Senhor Deus Pai, e sua vitória na cruz
resultou na ressurreição, todos estes eventos ocorridos durante o Reino Milenar.

2.3.3 – O CUMPRIMENTO DE SALMOS 110.1 EM EFÉSIOS 1.20-21 E ATOS


2.32-35
Diz em Sl. 110.1: “Disse o SENHOR ao meu senhor: Assenta-te à minha direita,
até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida
Revista e Atualizada, Sl. 110.1).
Eis o comentário de abertura a este Salmo, feito por CALVINO (vol. 4, 2009, p.
63): “Neste Salmo, Davi apresenta a perpetuidade do reinado de Cristo e a eternidade de seu

30
HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento – Exposição do Evangelho de Lucas. Vol. 2. 2ªed.
São Paulo: Cultura Cristã, 2014, p. 666.
39

sacerdócio (...) ele afirma que Deus conferiu a Cristo domínio supremo, combinado com poder
invencível, com o qual ou Ele vence todos seus inimigos ou os compele a se Lhe submeterem”.
Portanto, o texto de Sl. 110.1 está tratando do reinado de Cristo e de sua vitória
sobre seus inimigos.
Em Ef. 1.15-23 há uma oração de Paulo pelos crentes. Após o anúncio da força do
poder de Deus (v. 19), estão os versículos 20 e 21:
o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos e
fazendo-o sentar à sua direita nos lugares celestiais, acima de todo
principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa
referir não só no presente século, mas também no vindouro (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, Ef. 1.20-21).
FOULKES identifica neste texto de Efésios uma referência ao Sl 110.1, anotando
que a exaltação do ungido de Deus encontrou expressão máxima em Jesus Cristo 31. Efésios, ao
afirmar que Cristo foi ressuscitado dentre os mortos e sentou-se à direita de Deus nos lugares
celestiais, indica a relação com o Sl. 110.132.
Em At. 2.32-35, texto já transcrito, mais uma vez é retomado o tema da ressurreição
de Cristo e os versículos 34 e 35 transcrevem o Sl. 110.133. Por isto é possível afirmar que o Sl.
110.1 também tem conteúdo profético apontando para a ressurreição de Cristo, como se extrai
de Ef. 1.20-21 e At. 2. 32-35, evento que ocorreu durante o Milênio.

2.3.4 – O CUMPRIMENTO DE OSÉIAS 6.1-2 EM 1 CORÍNTIOS 15.1-4


Eis o texto de Os. 6.1-2: “Vinde, e tornemos para o SENHOR, porque ele nos
despedaçou e nos sarará; fez a ferida e a ligará. Depois de dois dias, nos revigorará; ao
terceiro dia, nos levantará, e viveremos diante dele” (BÍBLIA SAGRADA, Almeida Revista e
Atualizada, Os. 6.1-2).
Diz em 1Co 15.1-4:
1. Irmãos, venho lembrar-vos o evangelho que vos anunciei, o qual
recebestes e no qual ainda perseverais; 2. por ele também sois salvos,
se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido
em vão. 3. Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo
morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, 4. e que foi
sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. (BÍBLIA
SAGRADA, Almeida Revista e Atualizada, 1Co 15.1-4).

31
FOULKES, Francis. Efésios – Introdução e comentário. 2ª ed. São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 54.
32
Hendriksen também viu esta relação. HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento – Exposição
dos Livros de Efésios e Filipenses. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2013, p. 121.
33
Kistemaker, ao comentar esta passagem, observa que o Sl. 110.1 não se aplica a Davi, mas ao Senhor Jesus
Cristo, este que, inclusive, explicou o texto do Salmo aos fariseus, conforme Mt. 22.41-46. KISTEMAKER, Simon
J. Comentário do Novo Testamento – Atos. Vol. 1. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2016, p. 136.
40

É possível afirmar que há relação entre “ao terceiro dia, nos levantará” de Os. 6.2
e a “ressurreição no terceiro dia” de 1Co 15.4, ainda que Paulo não tenha transcrito este texto,
nem citado expressamente a esta passagem.
Nesta linha o comentário de BEALE (2018, p. 232):
Alguns comentaristas reconhecem que por trás da declaração “...e
ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” está a passagem de
Oseias 6.2: “Depois de dois dias, ele nos revivificará; no terceiro dia
nos levantará, e viveremos diante dele”. Se for esse o caso, e creio que
é provável, Paulo entende que a profecia da ressurreição aplicada a
Israel tem seu início em Jesus, o que pode ser uma antecipação de seu
comentário posterior, no versículo 23: “Cristo, que é as primícias, e
depois os que lhe pertencem na sua vinda”.
Portanto, a preferível interpretação de Os. 6.1-2 o considera como uma profecia
relativa à ressurreição de Cristo34, mencionada no texto e At. 15.1-4 e cumprida durante o Reino
Milenar.
De tudo resulta que as profecias cujo cumprimento é reservado pelos
dispensacionalistas à dispensação do reino milenar, na verdade, não serão cumpridas durante o
Milênio, tampouco exigem uma dispensação específica de literalmente mil anos, antes ou foram
cumpridas com a libertação de Israel do cativeiro, ou serão cumpridas na era vindoura. Por
outro lado, há profecias do Antigo Testamento que se cumprem durante o Milênio e aqui foram
estudadas aquelas conectadas à ressurreição de Cristo, dado o especial significado escatológico
deste evento.

34
Kistemaker argumenta que o Antigo Testamento não tem referência específica sobre a ressurreição ao terceiro
dia, mas Os. 6.2, Jn. 1.17 e Is. 53.10-12 evidenciam o conceito de ressurreição. KISTEMAKER, Simon J.
Comentário do Novo Testamento – 1 Coríntios. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2014, p. 652.
41

CAPÍTULO 3
CONSIDERAÇÕES DOUTRINÁRIAS E PRÁTICAS

Para consolidar o estudo são pertinentes e necessárias breves considerações


doutrinárias sobre as alianças feitas por Deus com os seres humanos, sobre a relação entre Israel
e a Igreja, e sobre o milênio. Também convém propor aplicações práticas ao nosso estudo.

3.1 – A TEOLOGIA DA ALIANÇA

É correto afirmar que Deus se relaciona com os seres humanos através de alianças.
HORTON (2016, p. 49) anota que “uma aliança é “uma união baseada num juramento”
(McCarthy) ou, mais especificamente, “um relacionamento sob sanções” (Kline)”.
De modo, geral, duas são estas alianças: a aliança das obras e a aliança da graça 1.
A aliança das obras fora firmada por Deus com Adão, e através dela se exigia a obediência à
Lei de Deus, sob pena de morte. A aliança foi transgredida no momento da queda e este fato
gerou consequências para toda a humanidade. Sobre o tema, HORTON (2016, p. 440) explica
que:
A humanidade foi criada para o amor, o que significa que foi criada
para a lei, visto que a lei simplesmente estipula ações amorosas. Por
causa da queda, já não há mais qualquer possibilidade de ser justificado
pelas “obras da lei”. Toda a humanidade, incluindo Israel, está agora
“em Adão”, condenada como transgressora da lei. Assim, a aliança da
criação (também chamada de aliança das obras, da lei ou da natureza) é
o contexto legal para o julgamento de Deus.
Entre os elementos da aliança das obras, podem ser mencionados os seguintes: i)
As partes envolvidas: de um lado Deus, de outro, Adão; ii) A promessa: na aliança das obras
está contida a promessa de vida eterna; iii) A condição da aliança: era a obediência perfeita; iv)
O castigo da aliança: a morte física, espiritual e eterna 2.
A aliança da graça pode ser vista como “a promessa de salvação na forma de uma
aliança”3. Diante da desobediência de Adão, que implicou em descumprimento da aliança das

1
Berkhof e teólogos que ele menciona, entendem que a aliança da graça se subdivide em aliança da graça e aliança
da redenção, esta também chamada de pactum salutis. A aliança da redenção teria sido firmada entre o Deus-Pai
e o Deus-Filho e dela sobreveio a aliança da graça, firmada entre os Deus trino e os eleitos. BERKHOF, Louis.
Teologia Sistemática. 4ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 247.
2
Ibid., p. 200.
3
Ibid., p. 245.
42

obras, Deus prometeu a salvação nos termos da aliança da graça. Como ensina HORTON (2016,
p. 148):
A aliança da criação (também chamada de aliança das obras ou da lei)
estava baseada no cumprimento pessoal de toda a justiça por parte do
servo da aliança. A aliança da graça está baseada no cumprimento de
toda a justiça por aquele que é o nosso cabeça representante e é
dispensado ao povo da aliança por meio da fé nele. Há ainda lei na
aliança da graça. No entanto, ela não pode mais condenar os cristãos,
mas orientá-los para uma vida de gratidão por causa da misericórdia de
Deus em Cristo.
As alianças firmadas por iniciativa de Deus formam a estrutura da história da
redenção4. O dispensacionalismo representa uma visão alternativa sobre a estrutura da
revelação, e seus fundamentos foram examinados e submetidos a críticas no capítulo anterior.
É certo que a teologia da aliança lança mão do termo “dispensação” em sua análise e, de outro
lado, os dispensacionalistas não desconsideram que Deus faz alianças com o ser humano, mas
mesmo assim há importante diferença entre os sistemas quanto aos princípios e características.
ROBERTSON5 aponta algumas distinções entre os dois sistemas: i) o
dispensacionalismo propõe uma dicotomia de propósitos de Deus, sendo um dos propósitos
terreno e físico, e o outro celestial e espiritual; ao passo em que a teologia da aliança reconhece
o propósito único de Deus, a saber, a redenção física e espiritual daqueles que estão unidos a
Cristo; ii) o dispensacionalismo sugere uma estrutura dual da história, com algumas
dispensações desconectadas do plano redentivo de Deus; enquanto a teologia da aliança
encoraja a esperança do ser humano num redentor futuro; iii) a perspectiva dispensacionalista
exclui das promessas do Antigo Testamento o reino presente de Cristo; já a teologia da aliança
considera a ressurreição de Cristo e sua ascensão como base para compreensão da profecia do
Antigo Testamento.
Definidos os aspectos fundamentais da teologia da aliança, este é o sistema
interpretativo da Escritura aqui adotado.

3.2 – A RELAÇÃO ENTRE ISRAEL E A IGREJA

Um tema que também é objeto de divergência diz respeito à continuidade entre


Israel e a Igreja. Sobre o assunto cumpre mencionar que o entendimento dispensacionalista é

4
ROBERTSON, O. Palmer. Cristo dos Pactos. Campinas: Luz para o Caminho, 1997, p. 181.
5
Ibid., p. 204-205.
43

no sentido de que “existe uma distinção fundamental e permanente entre Israel e a igreja (...)
Israel e a igreja têm sempre de ser mantidos separados”6.
De outro lado, invocando o ensino dos padrões confessionais reformados,
BERKHOF (2012, p. 524) afirma que “a Igreja do Novo Testamento e a da antiga dispensação
são essencialmente uma só. No que se refere à sua natureza essencial, ambas consistem de
crentes verdadeiros, e tão somente de crentes verdadeiros”. No mesmo sentido entende Marten
H. Woudstra7.
O entendimento de que há uma relação de continuidade e unidade entre Israel e a
Igreja deve ser reputado como a melhor interpretação da Escritura como um todo e em tudo
está alinhado aos pontos centrais da teologia da aliança, razões pelas quais aqui é considerado
como o mais adequado.

3.3 – O AMILENISMO

A escatologia tradicional discute a interpretação do Milênio e, entre as linhas de


entendimento sobre o tema, está o amilenismo. Ao contrário do que sugere a denominação
“amilenismo”, é certo que esta visão não descarta a existência do Milênio ensinado em Ap.
20.1-68. Por isto alguns preferem a denominação “milenismo realizado” 9 ou “milenismo
bíblico”10.
Para os amilenistas, os mil anos de Ap. 20.1-6 são simbólicos11. É o período
compreendido entre a primeira e a segunda vindas de Jesus Cristo 12, e está inserido na última
das sete seções paralelas do Livro de Apocalipse 13. Sobre os mil anos, Floyd Hamilton ensina
que: “Mil, o número da perfeição ou completude, é considerado a referência simbólica ao
período perfeito, ou o período completo entre as duas vindas de Cristo” (HAMILTON, 1942, p.
35).

6
HOEKEMA, Anthony A. A Bíblia e o Futuro. 3ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 210.
7
FEINBERG, John S. (ed. e org.). Continuidade e Descontinuidade: Perspectivas sobre o relacionamento entre
o Antigo e o Novo Testamentos. São Paulo: Hagnos, 2013, p. 269-290.
8
COX, William E. Amilliennialism today. Phillipsburg, New Jersey: Prebyterian and Reformed Publishing CO,
1966, p. 1.
9
Esta é a posição de Jay E. Adans, segundo Hoekema. CLOUSE, Robert G. (org.). Milênio: significado e
interpretações. Campinas: Luz para o Caminho, 1990, p. 141.
10
William Cox adota esta nomenclatura. COX, Amilliennialism today, 1966, p. 1.
11
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada. Vol. 4. 1ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 692.
12
CLOUSE, 1990, p. 146.
13
HENDRIKSEN, William A. Mais que Vencedores: uma interpretação do livro do Apocalipse. 1ª ed. São
Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 30.
44

HOEKEMA divide a escatologia amilenista em escatologia inaugurada e


escatologia futura14, e lista as principais afirmações destes dois tópicos15, sendo interessante
apenas citá-las, oferecendo assim um esboço desta linha de entendimento. Quanto à escatologia
inaugurada, as principais afirmações são: i) Cristo conquistou a vitória decisiva sobre o pecado,
a morte e Satanás; ii) O Reino de Deus é ao mesmo tempo presente e futuro; iii) Apesar do
último dia ser ainda futuro, estamos hoje nos últimos dias; iv) No que concerne aos mil anos de
Apocalipse 20, estamos hoje no milênio. Quanto à escatologia futura, os fundamentos são: i)
Os “sinais dos tempos” se aplicam tanto ao presente quanto ao futuro; ii) A Segunda Vinda de
Cristo será um único evento; iii) Na volta de Cristo haverá uma ressurreição geral, tanto de
crentes quanto de não-crentes; iv) Após a ressurreição, os crentes ainda vivos serão
repentinamente transformados e glorificados; v) Acontecerá o arrebatamento de todos os
crentes; vi) Haverá juízo final; vii) Após o julgamento é introduzido o estado final.
Por considerar que o amilenismo melhor reflete o ensino bíblico, e vê-lo em estreita
conexão com a teologia da aliança 16, neste trabalho este é o entendimento adotado.

3.4 – APLICAÇÕES

Sem a pretensão de esgotar o alcance da interpretação do Apocalipse, do Reino


Milenar e das profecias do Antigo Testamento aqui propostas; tampouco de exaurir as
implicações da adesão aos postulados doutrinários da teologia da aliança e do amilenismo,
seguem algumas sugestões de aplicação das ideias desenvolvidas ao longo do estudo.
A primeira aplicação é perceber que Cristo já governa no presente 17. Cristo não
deixou nas mãos dos homens ou nas mãos de Satanás o destino da Humanidade. O controle que
Cristo exerce no mundo é absoluto e soberano. Por isto o crente pode ser otimista quanto aos
rumos da História e dos povos, porque sabe que tudo caminha na direção do cumprimento
completo dos propósitos de Deus.
Este otimismo, entretanto, não pode desconsiderar a realidade do pecado e a da
situação deplorável em que se encontra a Humanidade, sem qualquer expectativa de alcançar a

14
CLOUSE, 1990, p. 160.
15
Ibid., p. 161-169.
16
Hoekema sustenta que uma das implicações da escatologia amilenista é a de que o pacto da graça é o que une o
Antigo e o Novo Testamentos. CLOUSE, 1990, p. 169. William Cox, por outro lado, entende que a teologia da
aliança não é uma doutrina básica do amilenismo. Ele mesmo reconhece discordar de alguns pressupostos da
teologia da aliança. COX, Amillennialism Today, 1966, p. 2.
17
CLOUSE, 1990, p. 170.
45

perfeição e harmonia, senão a partir da redenção de todas as coisas pelo Senhor Jesus Cristo.
Disto se extrai a segunda aplicação à vida do crente, que deve desenvolver uma visão realista
do mundo e da vida18, sem alimentar ilusões quanto ao progresso dos seres humanos ou
depositar suas esperanças em sistemas econômicos ou lideranças políticas.
A terceira aplicação consiste num convite à fidelidade e à santificação. A fidelidade
a Deus é uma marca do crente e a ele confere o grande privilégio de reinar com Cristo durante
o Milênio mesmo que seu corpo físico morra, como vimos ao interpretar Ap. 20.4-6. A
santificação é necessária para viver em comunhão com Deus num mundo de crescente pecado
e para suportar as tribulações da vida.
A quarta aplicação é no sentido de que o crente pode ter segurança em Jesus Cristo.
Esta segurança está relacionada ao governo de Cristo no presente, que nos assegura o sustento
necessário para nossa vida. Como visto, se nosso corpo físico morrer, reinaremos com Cristo
no céu e se Cristo voltar antes da nossa morte física, ingressaremos com Ele na eternidade.
A quinta e última aplicação é que o estudo desperta em nós a esperança da redenção
absoluta. Todas as áreas da vida humana foram atingidas pela queda e a punição do pecado
atingiu toda a criação19. A segunda vinda de Cristo “será não só a conclusão da redenção para
o homem, mas também o tempo “da restauração de todas as coisas” (At. 3.21)”20. Por esta
razão o crente, consciente de que o Reino Milenar está instalado, espera em seu Salvador a
redenção de todas as coisas.
Consideram-se, assim, encerradas as considerações doutrinárias e práticas que se
destinaram a sedimentar o conhecimento do tema proposto e sistematizar conceitos, oferecendo
melhor compreensão para o ponto de vista defendido.

18
CLOUSE, 1990, p. 170.
19
FRAME John. Teologia Sistemática. Vol. 2. São Paulo: Cultura Cristã, 2019, p. 202.
20
Ibid., p. 206.
46

CONCLUSÃO

O disputado tema do Milênio é melhor explicado partindo da ideia de que o Livro


do Apocalipse é composto por sete seções paralelas, todas iniciando-se com a primeira vinda e
encerrando-se com a segunda vinda de Cristo, e que em Ap. 20.1-6 encontramos a abertura da
última seção, que trata de um Reino Milenar simbólico e já iniciado. Durante o Milênio, Satanás
está limitado em seu poder, especialmente o de enganar as nações e os crentes reinam com
Cristo. Ao final deste período, Satanás será solto por um curto intervalo de tempo, e depois
sobrevirão julgamento e condenação para os incrédulos e os crentes ingressarão na Nova
Jerusalém, para a eternidade gloriosa na presença de Deus, conforme Ap. 21 e 22, que encerram
a última seção paralela.
Não há razões para considerar o Milênio como um reino de exatamente mil anos,
tampouco reservar este período para o cumprimento de profecias do Antigo Testamento. Há
evidências suficientes de que as profecias do Antigo Testamento cujo cumprimento é relegado
para o reino milenar, especialmente pelos adeptos do pré-milenismo dispensacionalista, ou se
cumpriram por oportunidade da volta do povo de Israel do cativeiro babilônico ou serão
cumpridas na era vindoura.
De outro lado, seguramente foram cumpridas durante o Milênio as profecias do
Antigo Testamento relativas à vida, sofrimento, morte e ressurreição de Cristo. Esta conclusão
está livre de “imposições arbitrárias sobre a ordem bíblica”1, sendo suficiente a analogia da
Escritura2 para que se perceba esta verdade, já que muitos textos proféticos do Antigo
Testamento aqui mencionados foram citados pelos autores inspirados do Novo Testamento e
conectados à ressurreição de Cristo.
Da Escritura também fluem doutrinas em tudo vinculadas a esta interpretação do
texto de Apocalipse e das profecias do Antigo Testamento. A teologia da aliança é a estrutura
que perpassa todo o texto bíblico e confere a compreensão da redenção a partir das alianças
firmadas entre Deus e os seres humanos. A continuidade entre Israel e a Igreja é um caro
postulado que possibilita a visão integrada da forma escolhida por Deus para salvação dos seres
humanos de todas as épocas, a saber, exclusivamente a graça imerecida. Também o amilenismo
melhor acomoda todo o sistema da escatologia e está associado à teologia da aliança.

1
Assim Robertson considera as dispensações conforme propostas pelos dispensacionalistas. ROBERTSON, O.
Palmer. Cristo dos Pactos. Campinas: Luz para o Caminho, 1997, p. 205.
2
Também chamada de “analogia da fé”, é a regra segundo a qual a Escritura interpreta a si mesma. BAVINCK,
Herman. Dogmática Reformada. Vol. 1. 1ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 480.
47

O estudo aqui desenvolvido não só auxilia na interpretação da Escritura neste


importante tópico que o Reino Milenar, mas também sua parte prática se revela de extrema
importância para a vida do cristão. Não só traz segurança, mas também alegria e otimismo, que
são ponderados pela visão realista do mundo, através da qual o crente deposita sua esperança
apenas na redenção absoluta operada por Jesus Cristo.
48

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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