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A (in)constitucionalidade da criminalização das drogas


A (in)constitucionalidade da criminalização das drogas

Andressa Barboza Félix

Publicado em 03/2013. Elaborado em 06/2012.

A política proibicionista da maioria das drogas no Brasil impõe


tratamento injustificavelmente diferenciado, pois permite o
consumo de bebidas alcoólicas e cigarros de tabaco, causadores
de problemas na saúde do ser humano tão ou mais graves do
que as drogas hoje consideradas ilícitas.

INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos, observa-se que a “guerra às drogas” não traz nenhuma
mudança significativa à realidade dos dependentes químicos e eventuais usuários,
que continuam a movimentar o mercado ilegal. Enquanto determinada quadrilha
de traficantes é desmantelada por forças policiais – combinadas à violência e ao
medo que afligem os moradores – em alguma periferia ou favela do país, esses
consumidores simplesmente buscavam outros fornecedores para suprir suas
necessidades.

Afinal, qual seria o objetivo final dessa verdadeira “guerra às drogas” empenhada
pelo Estado brasileiro? O fim das drogas? Ora, aquele que crê em tal possibilidade
está, certamente, fora do pleno exercício da razão. Essas substâncias não deixarão
de existir na natureza ou de serem criadas pelo homem; elas sempre existiram e
sempre foram consumidas, inclusive sem serem internacionalmente classificadas
como ilícitas até o recente século XX – inclusive no Brasil.

Mas o pior é que ignora-se que este é um Estado Democrático de Direito, baseado
em uma Constituição que prevê em seu artigo 5º certos direitos fundamentais
indispensáveis à vida digna em sociedade, como a liberdade individual, a
intimidade, a vida privada, a igualdade e a apreciação jurisdicional da lesividade,
os quais se vêem mortalmente feridos pela criminalização das condutas tipificadas
na Lei n. 11.343/2006 – norma esta infraconstitucional. Afinal, combinados esses

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direitos, garante-se, em suma, que todos os indivíduos possam gerir a própria vida
como desejar, desde que não prejudiquem o outro, cabendo à lei proibir tão
somente as ações lesivas à sociedade.

Esta pesquisa objetiva verificar se legalizar as drogas é admissível no Brasil, tendo


em vista fundamentos constitucionais e penais. Para tanto, será analisada a
(in)constitucionalidade da criminalização existente no país, frente aos princípios
constitucionais da liberdade individual, da intimidade, da vida privada, da
igualdade e da lesividade.

1 CRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS, LIBERDADE INDIVIDUAL,


INTIMIDADE E VIDA PRIVADA

Pioneira na questão dos direitos humanos fundamentais, a Declaração de Direitos


do Homem e do Cidadão, publicada em 1789 na França, já definia que

Artigo I. Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos.

[...]

Artigo IV. A liberdade consiste em poder fazer qualquer coisa que não
prejudique aos outros. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada
homem não tem limites senão aqueles que asseguram aos outros
membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites só
podem ser determinados pela lei.

Artigo V. A lei tem o direito de proibir as ações prejudiciais à sociedade.


[1]

Nesse mesmo sentido se apresenta o direito à liberdade no constitucionalismo


brasileiro, que visa assegurar a cada pessoa a possibilidade de autodeterminação,
o poder de autonomia, pelo qual ela escolhe por si mesmo o seu comportamento
pessoal, de acordo com a sua consciência, os seus valores e os seus interesses,
desde que não atinja a esfera pessoal de terceiro.[2] Dessa forma, o exercício dos
direitos naturais do ser humano encontra limites apenas para garantir aos outros
membros da comunidade o gozo dos mesmos direitos.

O princípio da liberdade individual, consagrado como direito fundamental do


homem no caput do artigo 5º da CRFB, traz a idéia de liberdade de fazer,
liberdade de atuar ou liberdade de agir como bem se entender, desde que isso não
prejudique a pessoa de outrem. Logo, no Estado Democrático de Direito
brasileiro, amparado em uma Constituição, a liberdade individual é regra e
qualquer tipo de proibição ou coação estatal é exceção.

Posto isso, é interessante destacar a conceituação do constitucionalista José


Afonso da Silva, que, ao tratar do direito à liberdade do ser humano, explica que
esta pode ser dividida em liberdade interna e liberdade externa:

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Liberdade interna (chamada também de liberdade subjetiva, liberdade


psicológica ou moral e especialmente liberdade de indiferença) é o livre-
arbítrio, como simples manifestação da vontade no mundo interior do
homem. Por isso, é chamada igualmente liberdade do querer. Significa
que a decisão entre duas possibilidades opostas pertence, exclusivamente,
à vontade do indivíduo; vale dizer, é poder de escolha, de opção, entre
fins contrários. [...] feita a escolha, é possível determinar-se em função
dela. Isto é, se têm condições objetivas para atuar no sentido da escolha
feita, e, aí, se põe a questão da liberdade externa. Esta, que também é
denominada de liberdade objetiva, consiste na expressão externa do
querer individual, e implica o afastamento de obstáculo ou de coações, de
modo que o homem possa agir livremente. Por isso é que também se fala
em liberdade de fazer, poder fazer tudo o que se quer.[3]

Ao adequar-se a questão das drogas à definição de liberdade acima apresentada,


conclui-se que a pessoa deve ter a liberdade interna de querer e tomar a decisão de
adquirir, produzir ou fazer uso ou não de algum tipo de droga, bem como ter a
liberdade externa de agir conforme essa decisão livremente.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, a CRFB contemplou no inciso X de seu art.


5º o princípio da inviolabilidade da intimidade e da vida privada das pessoas. O
direito à intimidade consiste no poder legal que o indivíduo tem para afastar os
demais da esfera secreta da sua vida. Por sua vez, o direito à vida privada consiste
no poder legal que o indivíduo tem de viver sua própria vida; diz respeito ao
conjunto de modo de ser e de viver.[4]

Para Silva, os valores humanos da intimidade e da vida privada são direitos


individuais conexos ao próprio direito à vida (também assegurado pelo art. 5º da
CRFB, em seu caput).[5] Conjuntamente, esses direitos integram o chamado
direito à privacidade, que compreende “o direito de toda pessoa tomar sozinha as
decisões na esfera da sua vida privada”.[6]

Assim, é indubitável a necessidade de constatar-se a (in)constitucionalidade da


criminalização do consumo de drogas no Brasil frente ao princípio constitucional
da liberdade individual, que é – e deve ser (no plano normativo) – a primeira e
mais importante garantia do ser humano, bem como frente ao princípio da
inviolabilidade da intimidade e da vida privada do indivíduo.

Conforme explicitado anteriormente, o direito à liberdade, em linhas gerais,


consiste na possibilidade que cada indivíduo tem de fazer tudo que não prejudique
o seu próximo. Nota-se, então, que, como qualquer outro direito fundamental, não
é absoluto. Há um limite, podendo este ser determinado somente por lei. Acontece
que a lei não pode proibir senão as ações nocivas à sociedade.

Posto isso, passa-se a analisar se a restrição à liberdade do indivíduo para usar a


droga, mas também para produzi-la ou adquiri-la – desde que junto a
comerciantes devidamente regulamentados e fiscalizados pelo Poder Público, uma

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vez legalizada a conduta – é cabível nesta sociedade democrática. Tratam-se


realmente de condutas que afetam de forma direta e concreta quaisquer direitos
de terceiros?

Não. Adquirir, produzir, possuir e, por conseguinte, usar algum tipo de droga não
diz respeito à esfera de terceiros, mas tão somente ao indivíduo, que faz uso de sua
liberdade para conduzir a própria vida como bem entender. Além disso, fazer uso
de drogas é uma decisão e uma conduta particular, que não concerne a mais
ninguém, ainda que entendam que o indivíduo esteja prejudicando a si mesmo.
Afinal, faz parte da idéia de liberdade individual, intimidade e vida privada deixar
causar dano a si próprio, seja como for.

O único propósito com o qual se legitima o exercício do poder


sobre algum membro de uma comunidade civilizada contra a
sua vontade é impedir dano a outrem. O próprio bem do
indivíduo, seja material seja moral, não constitui justificação
suficiente. O indivíduo não pode legitimamente ser compelido a fazer
ou deixar de fazer alguma coisa, porque na opinião dos outros tal seja
sábio ou reto. Essas são boas razões para o admoestar, para com ele
discutir, para o persuadir, para o aconselhar, mas não para o coagir, ou
para lhe infligir um mal caso aja de outra forma. Para justificar a coação
ou a penalidade, faz-se mister que a conduta de que se quer desviá-lo
tenha em mira causar dano a outrem. [...] Na parte que diz respeito
unicamente a ele próprio, a sua independência é, de direito,
absoluta. Sobre si mesmo, sobre o seu próprio corpo e espírito,
o indivíduo é soberano.[7] (grifo nosso)

Assim sendo, mesmo que a sociedade em geral entenda que a livre produção,
aquisição, porte e uso de drogas sejam condutas inadequadas, práticas
condenáveis dentro de todo o âmbito social, um modo de viver que não é sábio e
reto, reprovável pela moral e pelos bons costumes, não cabe a ninguém tentar
impor conduta contrária, muito menos por meio da criminalização, que não deve
ser voltada à tutela da liberdade individual – quando seu exercício não aflige
terceiros –, da intimidade e da vida privada. Nesse sentido, são as palavras de
Rogério Greco:

Concluindo, todas as vertentes acima traduzem, na verdade, a


impossibilidade de atuação do Direito Penal caso um bem jurídico
relevante de terceira pessoa não esteja sendo efetivamente atacado.
Aquilo que for da esfera própria do agente deverá ser
respeitado pela sociedade e, principalmente, pelo Estado, em
face da arguição da necessária tolerância que deve existir no
meio social, indispensável ao convívio entre pessoas que, naturalmente,
são diferentes.[8] (grifo nosso)

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Destarte, ignorar determinado modo de ser e de viver por ser “diferente” é


inadmissível neste Estado Democrático de Direito, o que fere mortalmente, em
última instância, a própria dignidade da pessoa humana[9], princípio fundamental
tão aclamado contemporaneamente e assegurado no inciso III do art. 1º da CRFB.
Como “a liberdade representa o anseio primeiro de todos os homens, sem a qual,
nenhum outro direito seria de muita valia, [entende-se que] sem liberdade não se
concebe a mínima dignidade humana”[10].

Corroborando esse entendimento, Silva dispõe que, por ser essência da


natureza humana e por conferir autonomia (liberdade) ao ser humano, a
dignidade não admite discriminação alguma e não está assegurada se o
indivíduo for discriminado ou depreciado.[11] No mesmo sentido, Alexy
aduz que “[...] a norma da dignidade da humana está baseada na
compreensão do ser humano como um ser intelectual e moral, capaz de
se determinar e se desenvolver em liberdade”.[12] (grifo nosso)

Inclusive, é hoje dever do Estado promover esse processo de “liberação” do


homem de todos os obstáculos que se antepõem à realização de sua personalidade
– no qual consiste a liberdade, em suma[13] – e não o contrário, de modo a
“aprisionar” o indivíduo, principalmente, em si mesmo. Até porque, lembre-se, é
objetivo fundamental desta República Federativa a construção de uma sociedade
livre e a promoção do bem de todos (incisos I e IV do art. 3º da CRFB).

Admitir situação contrária, como se tem visto em especial com a instaurada


política criminal de drogas no Brasil importa na inversão dos valores positivados
na ilustre Carta Constitucional e na configuração de um Estado de exceção,
conforme completa Canotilho:

É fácil de ver que a desestabilização do sistema penal, nos seus princípios


e na sua dogmática, equivale também a uma radical alteração dos
princípios fundantes e dos princípios estruturantes do direito
constitucional. [...] A pressão recai sobre as Constituições, obrigando-as a
rever os respectivos textos, sobretudo no âmbito das liberdades e das
garantias, transformando as regras em excepções e as excepções
em regras.[14]

Posto isso, é imperioso enfatizar a notável decisão do Tribunal de Justiça de São


Paulo, cujo relator sabiamente priorizou a harmonia do ordenamento jurídico com
os ditames emanados da CRFB. Seguindo o voto do relator, a Câmara absolveu um
réu que havia sido preso em flagrante portando 7,7 gramas de cocaína, nos termos
do inciso III do art. 386 do Código de Processo Penal, isto é, reconhecendo que o
fato não constituiu infração penal:

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EMENTA: 1 – A traficância exige prova concreta, não sendo suficientes,


para a comprovação da mercancia, denúncias anônimas de que o acusado
seria um traficante. 2 – O artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é
inconstitucional. A criminalização primária do porte de entorpecentes
para uso próprio é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal,
porque não há tipificação de conduta hábil a produzir lesão que invada os
limites da alteridade, afronta os princípios da igualdade, da
inviolabilidade da intimidade e da vida privada e do respeito à diferença,
colorálio do princípio da dignidade, albergados pela Constituição Federal
e por tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil.
[15]

Para melhor inteligência, destacam-se aqui os seguintes trechos do incólume voto


do relator, ao qual foi dado provimento para absolver o recorrente, por enquanto
apenas no que tange à liberdade individual, intimidade e vida privada do homem:

[...] os elementos de prova produzidos nesta ação penal são suficientes,


apenas e tão somente, para afirmar que o recorrente estava portando 7,7g
de cocaína para consumo próprio e que, em conseqüência, a sua conduta
seria subsumível ao tipo do artigo 28 da Lei n. 11.343/2006.

Todavia, a criminalização primária do porte de entorpecentes para uso


próprio é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal, porque [...]
viola frontalmente os princípios da igualdade e da
inviolabilidade da intimidade e da vida privada, albergados
pelo artigo 5º da Constituição Federal como dogmas de
garantia individual.

Como observa Salo de Carvalho, “a permanência da lógica bélica e


sanitarista nas políticas de drogas no Brasil é fruto da opção por modelos
punitivos moralizadores e que sobrepõem a razão de Estado à razão de
direito, pois desde a estrutura do direito penal constitucional, o
tratamento punitivo ao uso de entorpecentes é injustificável”.
[CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo
criminológico e dogmático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 253].

O argumento de que o artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é de perigo abstrato, bem


como a alegação de que a saúde pública é o bem tutelado, não é sustentável
juridicamente, pois contraria inclusive a expressão típica desse dispositivo
criminalizador, lavrado pela própria ideologia proibicionista, o qual estabelece os
limites de sua incidência pelas elementares elegidas, que determinam
expressamente o âmbito individualista da lesividade e proíbem o expansionismo
desejado.

Basta ler o tipo penal em menção, que descreve, para a incidência da conduta que
pretende criminalizar, exclusivamente aquela de quem adquire, guarda, tem em
depósito, transporta ou porta, “para consumo pessoal”, drogas proibidas. O

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elemento subjetivo do tipo, evidenciado pela expressão “para consumo


próprio”, delimita com exatidão o âmbito da lesividade e impede
qualquer interpretação expansionista que extrapasse os lindes da
autolesão.

Com efeito, como assevera Maria Lúcia Karam, “é evidente que na conduta de uma
pessoa, que, destinando-a a seu próprio uso, adquire ou tem a posse de uma
substância, que causa ou pode causar mal à saúde, não há como identificar ofensa
à saúde pública, dada ausência daquela expansibilidade do perigo (...). Nesta linha
de raciocínio, não há como negar incompatibilidade entre a aquisição ou
posse de drogas para uso pessoal não importa em que quantidade – e a
ofensa à saúde pública, pois não há como negar que a expansibilidade
do perigo e a destinação individual são antagônicas. A destinação pessoal
não se compatibiliza com o perigo para interesses jurídicos alheios. São coisas
conceitualmente antagônicas; ter algo para difundir entre terceiros, sendo
totalmente fora de lógica sustentar que a proteção à saúde pública envolve a
punição da posse de drogas para uso pessoal”. [KARAM, Maria Lúcia. De crimes,
penas e fantasias. Rio de Janeiro: Luam, 1993. p. 126].

É por isso que Alexandre Morais da Rosa afirma que “no caso de porte de
substâncias tóxicas inexiste crime, porque, ao contrário do que se difunde, o bem
jurídico tutelado pelo artigo 16 da Lei n. 6368/76 é a integridade física e não a
incolumidade pública”. [ROSA, Alexandre Morais da. Direito infracional:
garantismo, psicanálise e movimento antiterror. Florianópolis: Habitus, 2005. p.
217].

[...]

Não se olvide da violação ao princípio constitucional garantidor da


intimidade e da vida privada, que estabelece intransponível separação
entre o direito e a moral.

Com efeito, não se pode admitir qualquer intervenção estatal,


principalmente de índole repressiva e de caráter penal, no âmbito das
opções pessoais, máxime quando se pretende impor pauta de
comportamento na esfera da moralidade.

Induvidosamente, “nenhuma norma penal criminalizadora será legítima se


intervier nas opções pessoais ou se impuser aos sujeitos determinados padrões de
comportamento que reforçam concepções morais. A secularização do direito e do
processo penal, fruto da recepção constitucional dos valores do pluralismo e da
tolerância à diversidade, blinda o indivíduo de intervenções indevidas na esfera da
interioridade”. [CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil:
estudo criminológico e dogmático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 256].

[...]

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Decididamente, “no direito penal de viés libertário, orientado pela


ideologia iluminista, ficam vedadas as punições dirigidas à autolesão
(...): o direito penal se presta, exclusivamente, à tutela de lesão a bens
jurídicos de terceiros. Prever como delitos fatos dirigidos contra a
própria pessoa é resquício de sistemas punitivos pré-modernos. O
sistema penal moderno, garantista e democrático não admite crime
sem vítima. A lei não pode punir aquele que contra a própria saúde ou contra a
própria vida – bem jurídico maior – atenta: fatos sem lesividade a outrem,
punição desproporcional e irracional” [Lições de Eugênio Raul Zafaroni, Nilo
Batista, Vera Malaguti Batista, Rosa Del Olmo, Maria Lúcia Karam e Salo de
Carvalho].

Como ensina Maria Lúcia Karam, “a simples posse de drogas para uso pessoal, ou
seu consumo em circunstâncias que não envolvam perigo concreto para terceiros,
são condutas que, situando-se na esfera individual, se inserem no campo da
intimidade e da vida privada, em cujo âmbito é vedado ao Estado – e, portanto, ao
Direito – penetrar. Assim, como não se pode criminalizar e punir, como,
de fato, não se pune a tentativa de suicídio e a autolesão; não se podem
criminalizar e punir condutas, que podem encerrar, no máximo, um
simples perigo de autolesão”. [KARAM, Maria Lúcia. Revisitando a sociologia
das drogas. In: ANDRADE, Vera Regina Pereira de (Org.). Verso e reverso do
controle penal. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2002. p. 136].

E não se olvide, ainda, que a criminalização do porte de drogas para uso pessoal
afronta o respeito à diferença, corolário do princípio da dignidade, albergado pela
Constituição Federal e por inúmeros tratados internacionais de Direitos Humanos
ratificados pelo Brasil.

Com efeito, “a criminalização do porte de substância entorpecente dá uma


bofetada no respeito ao ser diferente, invadindo a opção moral do
indivíduo. Há uma nítida reprovação a quem não segue o padrão imposto. Há
uma espécie de eliminação social dos que não são iguais. (...). Cabe ao ser humano,
desde que não interfira nos desígnios de terceiros e os lesione, de maneira
individual, escolher e traçar os caminhos que mais lhe convém. Ao se reprovar o
uso criminalizando o porte, a sociedade invade seara que não é
constitucionalmente sua. Assim fazendo, desrespeita as opções individuais e
estigmatiza o ser diferente pela simples razão de este não se revestir
da crença do que seria correto. (...) A Constituição exige tolerância com
quem seja assim, sem exigir padrões de moralidade aos diversos
grupos existentes, dentre eles os que usam drogas” [BIZZOTTO,
Alexandre; RODRIGUES, Andréia de Brito Rodrigues. Nova lei de drogas:
comentários à Lei n. 11.343/06. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 41].

Portanto, como a criminalização primária do porte de entorpecente para uso


próprio é inconstitucional, a conduta do recorrente, que portava cocaína para uso
próprio, é atípica.[16] (grifo nosso)

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Tendo isso em vista todos os pontos anteriormente explicitados, não restam


dúvidas de que a proibição do Estado imposta às condutas de adquirir ou
produzir, possuir e usar drogas, as quais não excedem o âmbito próprio, é
inconstitucional, uma vez que isso implica intervenção estatal na vida particular
do indivíduo, sem que realmente tenha potencial para causar dano a alguém que
não seja ele mesmo.

2 CRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS E LESIVIDADE

Seguindo a linha de raciocínio exposta no capítulo anterior, insta salientar que a


CRFB também contemplou o princípio da lesividade ou ofensividade, no inciso
XXXV de seu art. 5º, ao assegurar que “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Ou seja, a tutela jurisdicional somente pode
ser invocada quando um direito, individual ou coletivo, for lesado ou
concretamente ameaçado.[17] Dessa forma,

[...] juntamente com o princípio da inafastabilidade da apreciação


judicial, a Carta Maior dispõe que a exigência da submissão de fatos ao
exame judicial se faça relativamente a uma lesão efetiva a um bem, ou a
uma ameaça a direito. [...] o disposto no art. 5º, XXXV, da Constituição
Federal, indica como juridicamente relevante a causação de lesões
efetivas ou ameaças a direitos, só podendo ser entendidas, como
verdadeiras ameaças, as que sejam concretas, pois ameaças abstratas
simplesmente inexistem.[18]

Em âmbito penal, a máxima expressão garantista e material do princípio da


ofensividade traduz-se na definição de que “unicamente o fato ofensivo – lesivo ou
concretamente perigoso – a um bem jurídico importante pode ser objeto de
criminalização e de sanção penal”.[19] Inclusive, a teoria geral do Direito Penal
brasileiro tem o referido princípio como parâmetro para esclarecer quais as
condutas que devem ou não sofrer os rigores da lei penal.

Posto isso, é imprescindível analisar a criminalização das drogas também em


relação ao princípio da lesividade, pois “[...] nenhum sistema penal está
legitimado a ‘sacrificar’ a liberdade individual senão quando incrimina fatos
significativamente ofensivos a bens jurídicos de relevância (pessoal) indiscutível”.
[20] Por isso, se determinada conduta não lesionar, oferecer risco real ou perigo

concreto de dano a bem jurídico de terceiro tutelado pelo Direito Penal, não deve
ser criminalizada.

No entanto, não é isso que vem sendo observado pelo Estado ao determinar o seu
âmbito de atuação. Todas as características até agora evidenciadas da política
criminal de drogas no Brasil revelam não mais do que um verdadeiro “direito
penal contra o inimigo”, o qual se baseia em uma espécie de “criminalização
antecipada”, fundamentalmente reconduzível a:

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(1) tutela marcada, e intencionalmente antecipada, de bens


jurídicos [...]; (2) centralidade do paradigma do crime de perigo
indirecto, de forma a possibilitar a incriminação de condutas que,
em abstrato, se revelam inidôneas e desadequadas para criar
aquelas situações de perigosidade legitimadoras de
antecipação de intervenção penal; (3) formulação estrutural dos
pressupostos incriminadores com especial subvaloração dos
pressupostos objectivos essenciais do direito penal [...]; (4)
inversão do onus probandi, atenuando a presunção de inocência do
argüido; (5) radicalização da pena de prisão nos seus limites
máximos e mínimos, e intensificação do rigor repressivo nas várias
modalidades de execução de penas, acompanhada de bloqueio a
políticas criminais alternativas.[21] (grifo nosso)

Tão logo esclarecido que é imprescindível que a lesividade seja utilizada para
pautar uma ordem jurídica de cunho garantista, convém destacar que o referido
princípio, segundo esclarece Nilo Batista[22], possui determinadas funções perante
o Direito Penal brasileiro.

Em primeiro lugar, o princípio da lesividade visa proibir a incriminação de uma


atitude interna, pois somente pode ser punido um ato contra terceiro que foi
externalizado. Ou seja, “ninguém pode ser punido por aquilo que pensa ou mesmo
por seus sentimentos pessoais [...] se tais sentimentos não forem exteriorizados no
sentido de que produzam lesão a bens de terceiros”.[23]

Em segundo lugar, esse princípio visa proibir a incriminação de uma conduta que
não exceda o âmbito próprio do autor, como, por exemplo, a tentativa de suicídio e
a autolesão. Nota-se aqui o principal ponto de contato entre o princípio da
lesividade e o posicionamento deste estudo quanto à legalização das drogas. Já
desde uma das primeiras leis de combate às drogas no Brasil – Lei n. 6.368/1976
– debatia-se que a mencionada legislação incriminava o uso de drogas em clara
oposição ao princípio penal da lesividade e às mais recentes recomendações
político-criminais, conforme defendia Nilo Batista[24] em suas críticas.

Em terceiro lugar, o referido princípio objetiva proibir a incriminação de simples


estados ou condições existenciais, como ocorreu nos EUA quando mulçumanos
que estavam no território do país foram vistos, indiscriminadamente, como
inimigos terroristas. Logo, o agente não deve ser punido por aquilo que ele é, mas
sim pelo que ele fez, a fim de que não seja erigido um autêntico direito penal do
autor, já que cabe ao Direito regular condutas humanas.[25]

Acontece que, conforme já explanado no capítulo anterior, na “guerra às drogas”,


o aparato estatal não se volta propriamente contra a existência de tais substâncias,
mas sim contra as pessoas que usam, produzem ou comercializam esse tipo de
produto. Como acontece em qualquer manifestação do poder punitivo estatal, os
mais atingidos pela repressão são – e sempre serão – aqueles mais vulneráveis
econômica e socialmente. São pessoas pobres e/ou negras, indivíduos

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enquadrados pelo sistema penal como traficantes na quase totalidade dos casos, e
não como meros usuários. Sobre essa frágil questão, Maria Lúcia Karam lembra
muito bem que

No Brasil, os mais atingidos são os muitos meninos, que, sem


oportunidades e sem perspectivas de uma vida melhor, são identificados
como “traficantes”, morrendo e matando, envolvidos pela violência
causada pela ilegalidade imposta ao mercado onde trabalham. Enfrentam
a polícia nos confrontos regulares ou irregulares; enfrentam os delatores;
enfrentam os concorrentes de seu negócio. Devem se mostrar corajosos;
precisam assegurar seus lucros efêmeros, seus pequenos poderes, suas
vidas. Não vivem muito e, logo, são substituídos por outros meninos
igualmente sem esperanças. Os que sobrevivem, superlotam as prisões
brasileiras.[26]

Em quarto e último lugar, esse princípio visa proibir a incriminação de


condutas consideradas “desviadas” que não afetam qualquer bem jurídico
de terceiros, pois não se deve punir determinado indivíduo por uma
conduta considerada “imoral” que não lesione o direito de outrem, como,
por exemplo, a decisão de comprar determinada droga e fazer uso dela.
Tais condutas, ainda que a sociedade as trate com certo desprezo, ou
mesmo repulsa, e as veja com reprovação sob o aspecto moral, por
agredirem o seu senso comum, não repercutem diretamente sobre
qualquer bem de terceiro, não podendo ser proibidas pelo Direito Penal.
[27]
(grifo nosso)

Inclusive, tal função do princípio da lesividade baseia-se em outro princípio


inerente ao Direito e ao Processo Penal do Estado Democrático de Direito: a
secularização, que consiste na separação entre Direito e Moral, de modo que o
Estado "não deve se imiscuir coercitivamente na vida moral dos cidadãos e nem
tampouco promover coativamente sua moralidade, mas apenas tutelar sua
segurança, impedindo que se lesem uns aos outros”.[28]

Nesse diapasão, Carvalho e Bueno propõem que haja uma espécie de “retrocesso”
ao estado de natureza, em que cada indivíduo é juiz em causa própria[29], isto é,
decide pelo próprio modo de ser e de viver. Assim, veda-se que este Estado de
Direito constitucional[30] lance mão da tutela jurisdicional sobre qualidades do
ser, inclusive prevendo condutas criminosas considerando-se apenas o aspecto
moral.

Levando-se em consideração os aspectos acima apresentados, é válido aqui


salientar novamente a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo citada no
tópico anterior. O relator, no exercício de sua função jurisdicional, sabiamente
corrigiu o desvio legislativo e objetivou harmonizar o sistema jurídico com os
ditames emanados da CRFB, já que

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[...] quando o legislador, no exercício de sua função legislativa,


criminalizar condutas ignorando a necessidade de possuírem conteúdo
lesivo, como exige o princípio em exame, essa omissão deve,
necessariamente, ser suprida pelo juiz ou intérprete. Com efeito, como
essa atividade parlamentar pode apresentar-se de forma incompleta ou
imperfeita ou, por alguma razão, mostrar-se insatisfatória, vaga,
exageradamente extensa ou inadequada no âmbito de um Estado
Democrático de Direito, o juiz, no exercício de sua função jurisdicional,
deve corrigir eventual imperfeição da norma legislativa para adequá-la
aos princípios norteadores dessa modalidade de Estado de Direito.[31]

Passa-se, então, a destacar os seguintes trechos do voto do relator no que diz


respeito à violação ao princípio da lesividade no caso em questão:

[...] os elementos de prova produzidos nesta ação penal são suficientes,


apenas e tão somente, para afirmar que o recorrente estava portando 7,7g
de cocaína para consumo próprio e que, em conseqüência, a sua conduta
seria subsumível ao tipo do artigo 28 da Lei n. 11.343/2006.

Todavia, a criminalização primária do porte de entorpecentes para uso


próprio é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal, porque não
há tipificação de conduta hábil a produzir lesão que invada os
limites da alteridade [...].

Como observa Salo de Carvalho, “a permanência da lógica bélica e sanitarista nas


políticas de drogas no Brasil é fruto da opção por modelos punitivos moralizadores
e que sobrepõem a razão de Estado à razão de direito, pois desde a estrutura do
direito penal constitucional, o tratamento punitivo ao uso de entorpecentes é
injustificável”. [CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil:
estudo criminológico e dogmático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 253].

O argumento de que o artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é de perigo abstrato, bem


como a alegação de que a saúde pública é o bem tutelado, não é sustentável
juridicamente, pois contraria inclusive a expressão típica desse dispositivo
criminalizador, lavrado pela própria ideologia proibicionista, o qual estabelece os
limites de sua incidência pelas elementares elegidas, que determinam
expressamente o âmbito individualista da lesividade e proíbem o expansionismo
desejado.

Basta ler o tipo penal em menção, que descreve, para a incidência da conduta que
pretende criminalizar, exclusivamente aquela de quem adquire, guarda, tem em
depósito, transporta ou porta, “para consumo pessoal”, drogas proibidas. O
elemento subjetivo do tipo, evidenciado pela expressão “para consumo
próprio”, delimita com exatidão o âmbito da lesividade e impede
qualquer interpretação expansionista que extrapasse os lindes da
autolesão.

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Com efeito, como assevera Maria Lúcia Karam, “é evidente que na


conduta de uma pessoa, que, destinando-a a seu próprio uso, adquire ou
tem a posse de uma substância, que causa ou pode causar mal à saúde,
não há como identificar ofensa à saúde pública, dada ausência daquela
expansibilidade do perigo (...).

Nesta linha de raciocínio, não há como negar incompatibilidade


entre a aquisição ou posse de drogas para uso pessoal – não
importa em que quantidade – e a ofensa à saúde pública, pois
não há como negar que a expansibilidade do perigo e a
destinação individual são antagônicas. A destinação pessoal
não se compatibiliza com o perigo para interesses jurídicos
alheios.

São coisas conceitualmente antagônicas; ter algo para difundir entre


terceiros, sendo totalmente fora de lógica sustentar que a proteção à
saúde pública envolve a punição da posse de drogas para uso pessoal”.
[KARAM, Maria Lúcia. De crimes, penas e fantasias. Rio de Janeiro:
Luam, 1993. p. 126].

É por isso que Alexandre Morais da Rosa afirma que “no caso de porte de
substâncias tóxicas inexiste crime, porque, ao contrário do que se difunde, o bem
jurídico tutelado pelo artigo 16 da Lei n. 6368/76 é a integridade física e não a
incolumidade pública”. [ROSA, Alexandre Morais da. Direito infracional:
garantismo, psicanálise e movimento antiterror. Florianópolis: Habitus, 2005. p.
217].

Assim, transformar aquele que tem a droga apenas e tão-somente para uso
próprio em agente causador de perigo à incolumidade pública, como se fosse um
potencial traficante, implica frontal violação do princípio da ofensividade,
dogma garantista previsto no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição
Federal.

[...]

É por isso que somente é admissível a criminalização das


condutas individuais que causem dano ou perigo concreto a
bens jurídicos de terceiros, o que não acontece com a conduta
descrita no tipo do artigo 28 da Lei n. 11343/2006.

[...]

Portanto, como a criminalização primária do porte de entorpecente para


uso próprio é inconstitucional, a conduta do recorrente, que portava
cocaína para uso próprio, é atípica.[32] (grifo nosso)

3 CRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS E IGUALDADE

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Inicialmente, vale aqui recordar mais uma vez o pioneirismo da Declaração de


Direitos do Homem e do Cidadão, publicada em 1789 na França, que já definia que
“os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. As distinções sociais
só podem basear-se na utilidade comum”.[33] Mas o que quiseram dizer os
idealistas franceses ao elaborar o referido texto, que tanto inspirou a ordem
jurídica de outros países e as cartas constitucionais destes ao longo dos anos?

Ora, sem maiores dificuldades, entende-se que aqui se fala em tratar de forma
igual todas as pessoas iguais, pois os seres de uma mesma categoria essencial
(qual seja, humana) devem ser tratados da mesma forma. Isto é, “em essência,
como seres humanos, não se vê como deixar de reconhecer igualdade entre os
homens. Não fosse assim não seriam seres da mesma espécie. A igualdade aqui se
revela na própria identidade de essência dos membros da espécie”.[34]

Seguindo esse raciocínio, o legislador constituinte brasileiro positivou o princípio


da igualdade ao afirmar, nos termos do caput do art. 5º da CRFB, que “todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito [...] à
igualdade”. Nesse ínterim, ao interpretar o texto constitucional, Bonavides aduz
que o princípio da igualdade perante a lei traz o significado de que os fatos
assemelhados devem ser tratados igualmente pela lei, de modo que, se o
fossem de forma desigual, esse tratamento seria arbítrio por parte do legislador ou
do juiz.

Posto isso, ao correlacionar o conceito do princípio e direito fundamental da


igualdade com a política proibicionista brasileira, visualiza-se que a criminalização
de determinadas drogas pelo legislador implica violação da referida norma
constitucional, visto que configura relevante distinção de tratamento entre pessoas
que usam, adquirem, produzem ou comercializam substâncias ou produtos
análogos.

Isto é, uma vez que a Lei n. 11.343/2006 determina que, para fins de
criminalização, drogas são substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e
outras sob controle especial, capazes de causar dependência física ou psíquica –
nos termos do parágrafo único do artigo 1º combinado com o artigo 66 da referida
lei[35] –, como pode a tutela penal incidir somente sobre parte dessas substâncias?

Não poderia. Pelo princípio da igualdade, ao elaborar a lei, o legislador deveria


reger, com iguais disposições – isto é, com os mesmos ônus e as mesmas
vantagens – situações idênticas. Ao criar normas distintivas de pessoas, coisas
ou fatos, que devem ser tratados com igualdade, o legislador torna inteiramente
inútil o mandamento constitucional supracitado.[36]

Afinal, não é crime adquirir, portar, guardar, manter em depósito, preparar,


produzir, vender, fornecer, oferecer, prescrever, ministrar, transportar, importar,
exportar, remeter – dentre outros verbos incriminadores da lei em comento –
substâncias ou produtos que contenham álcool, nicotina (presente no tabaco),

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cafeína, analgésicos, anorexígenos (presentes nos moderadores de apetite) e


esteróides anabolizantes, por exemplo, apesar de todos interferirem no
funcionamento do organismo humano e terem potencialidade de levar à
dependência física e psíquica.[37] Mesmo assim, sabe-se que a produção,
comercialização e consumo das substâncias acima exemplificadas são admitidos
legal e socialmente.

Dessa forma, os indivíduos iguais e as situações análogas nas quais estão inseridos
são arbitrariamente tratados de modo desigual pelo Estado, o que se materializada
no conteúdo da Lei n. 11.343/2006. É como se da ordem jurídica brasileira não
constasse do direito positivo o princípio da igualdade para limitar a atuação do
Estado, ficando “[...] o cidadão privado de proteção judiciária contra o arbítrio que
porventura se insinuasse na sociedade pelas dobras da própria lei, mediante uma
vontade formalmente intangível do legislador”.[38]

Em verdade, o arbítrio do Estado proibicionista é configurado a partir do


momento em que não há justificativas racionais e plausíveis, tampouco
fundamentos concretos e objetivos, para que haja um tratamento (penal)
diferenciado, uma desigualdade.[39]

Não há que se falar aqui de tratar de forma desigual indivíduos que “merecem” a
tutela penal, para fins de proteção da incolumidade da saúde pública contra a
conduta daqueles, como argumentam os defensores do proibicionismo. Afinal, se
o objetivo é proteger a saúde pública, talvez o legislador tenha olvidado analisar os
dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre as consequências sanitárias
e sociais da presença de certas substâncias na vida do ser humano.

Nesse ínterim, saliente-se que os relatórios da OMS revelam como o álcool e o


tabaco são importantes e crescentes causas de mortalidade e de doenças em todo o
mundo, sendo classificados como “fatores de risco” que poderiam ser prevenidos.
Para piorar a situação, o mercado dessas substâncias está aumentando –
principalmente nos países em desenvolvimento, como o Brasil – de modo que,
mais do que nunca, as pessoas estão sendo expostas a esses produtos, que trazem
graves riscos em longo prazo para a saúde.[40]

Segundo os dados da pesquisa, em âmbito mundial, o tabaco é responsável por


8.8% das mortes e por 4.1% das doenças, que poderiam ser evitadas. Inclusive,
entre os fumantes, as taxas de mortalidade são até três vezes mais elevadas do que
entre os não-fumantes. Estima-se que, entre os países industrializados, onde o
hábito de fumar tem se tornado comum, o fumo aumenta substancialmente o risco
de mortalidade por diversos tipos de câncer (é responsável por 66% dos casos de
câncer de traquéia, de brônquios e de pulmão, além de câncer aerodigestivo
superior), doença respiratória crônica (38%), doença cardiovascular (12%),
acidente vascular cerebral e uma série de outras doenças. Ademais, vale lembrar
que o hábito de fumar também prejudica terceiros, pois há definitivos riscos para
a saúde daqueles atingidos pelo fumo passivo.[41]

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Por sua vez, o álcool é responsável por 3.2% das mortes e por 4% das doenças.
Além dos efeitos diretos da intoxicação e dependência alcoólica, que resultam em
transtornos e distúrbios pelo consumo de álcool, estima-se que ele seja a causa de
até 30% de problemas de saúde crônica como câncer de esôfago, câncer de fígado,
cirrose e epilepsia. Em geral, existem relações causais entre volume médio de
consumo de álcool e mais de 60 tipos de doenças e ferimentos. Ainda, o álcool é
um mediador poderoso que leva a desfechos agudos, tais como homicídios,
acidentes automobilísticos, casos de violência doméstica, lesões intencionais ou
não, dentre outros problemas sociais.[42]

Por outro lado, o uso de drogas consideradas ilícitas está relacionado a apenas
0.4% das mortes e 0.8% das doenças, em nível global.[43] Sobre essa questão, a
pesquisadora do Programa de Ensino e Assistência ao Uso Indevido de Álcool e
Drogas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Magda Vaissman, comenta: “É
óbvio que a maconha faz mal, mas quantas pessoas você conheceu que morreram
por uso abusivo de maconha? Mas casos de pessoas que morreram por beber ou
fumar cigarro de forma abusiva existem aos montes”.[44]

Assim, é nítido e inegável o fato de que a maior parte dos problemas de saúde no
mundo são mais devidos ao uso de substâncias consideradas lícitas do que ilícitas.
Inclusive, segundo as previsões da OMS para o ano de 2020, as substâncias
psicotrópicas continuarão a manter a sua elevada posição na lista de “fatores de
risco” à saúde.[45]

Tendo em vista os fatos acima correlacionados, conclui-se que, ao impor a


criminalização apenas sobre algumas drogas, a intenção do legislador é dar uma
solução aparente e uma resposta à pressão da opinião pública ou de certos grupos
para agir contra um fenômeno socialmente indesejável, o que, geralmente, dá
resultado, pois a imagem que prevalece na sociedade sobre o funcionamento do
sistema penal é pouco realista. Logo, a variabilidade da natureza do ilícito
comprova como a opção criminalizadora é essencialmente moral[46], além de ser
historicamente variável e não estar conjugada à gravidade dos efeitos da droga na
sociedade.

Por isso, é questionável a opção do legislador em distinguir situações análogas, já


que não é dado o mesmo tratamento (penal) àqueles que se envolvem, de alguma
forma, com quaisquer substâncias psicotrópicas – isto é, que levam à dependência
– e nocivas à saúde. Conforme se observou, contemporaneamente, as drogas
lícitas são até mesmo mais prejudiciais que as drogas ilícitas, pois somente o
cigarro e o álcool, juntos, são responsáveis por 12% das mortes no mundo e 8.1%
das doenças causadas ao organismo.

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Deste modo, cremos que ou o legislador proíbe a utilização de


todos os tipos de estupefacientes que cientificamente comprovados
prejudicam de maneira mais ou menos uniforme a saúde, ou permite o
uso e o consumo de todos aqueles que, de uma maneira ou outra,
provocam em quem os utilizam situações de certo grau equivalentes. O
que não pode ocorrer, desde uma perspectiva penal, é uma diversidade de
tratamento que compromete seriamente esse princípio constitucional
[isto é, a igualdade].[47] (grifo nosso)

Sendo assim, cabe aqui mais uma vez – e pela última – citar a decisão do Tribunal
de Justiça de São Paulo, que entendeu ser inconstitucional a criminalização das
drogas. Para melhor compreensão, destacam-se aqui os seguintes trechos do
ilustre voto do relator, dessa vez no que tange à violação do princípio da
igualdade:

[...] a criminalização primária do porte de entorpecentes para uso próprio


é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal, porque [...] viola
frontalmente os princípios da igualdade [...], albergados pelo
artigo 5º da Constituição Federal como dogmas de garantia
individual.

[...] a criminalização do porte para uso próprio também viola o princípio


constitucional da igualdade, pois há flagrante “distinção de
tratamento pena (drogas ilícitas) e não-penal (drogas lícitas)
para usuários de diferentes substâncias, tendo ambas
potencialidade de determinar dependência física e psíquica”.
[CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo
criminológico e dogmático da Lei 11.343/06. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2007. p. 256].

[...]

Portanto, como a criminalização primária do porte de entorpecente para


uso próprio é inconstitucional, a conduta do recorrente, que portava
cocaína para uso próprio, é atípica.[48] (grifo nosso)

Sendo assim, urge assumir que a normatividade estatal deve adequar-se à


realidade social e ao que fundamentalmente é assegurado na Carta Constitucional,
no que tange ao direito de igualdade entre os indivíduos, pois só admissível
tratamento diferenciado em situações concretas heterogêneas, o que, como foi
suficientemente exposto e discutido, não é o caso.

CONCLUSÃO

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Diante do exposto, extrai-se pelo menos uma convicção: o proibicionismo não é


compatível com a forma deste Estado. A bilionária política de combate às drogas
que persegue, extermina e encarcera grupos sociais em massa – em flagrante
violação aos direitos humanos – ignora que o Brasil é constituído sob a forma de
um Estado Democrático de Direito, segundo o qual princípios constitucionais e
direitos fundamentais do ser humano devem ser respeitados.

Conforme amplamente explicitado ao longo deste trabalho, o exercício do poder


punitivo estatal sobre aquele que usa, porta, produz ou adquire drogas atinge o
direito à liberdade individual, à inviolabilidade da intimidade e da vida privada, à
igualdade e a garantia de que a tutela jurisdicional só será exercida quando da
lesão ou ameaça a direito.

A criminalização das drogas opõe-se ao fato de que “toda a idéia de Justiça está
fundada na idéia de que os homens nascem livres e são livres para agir conforme
suas vontades”[49]. Logo, manter o proibicionismo, que estabelece um o
tratamento injustificavelmente diferenciado entre as pessoas, impede que
determinados indivíduos sejam felizes em escolher o seu próprio destino, sem que
isso interfira na esfera de terceiros.

Além disso, em que pese o tratamento injustificavelmente diferenciado que a


política proibicionista estabelece, violam-se não só os direitos daqueles que
desejam consumir a droga – enquanto que a toda sociedade é permitida consumir
bebidas alcoólicas e cigarros de tabaco, que também são drogas –, mas também o
direito daquele que objetiva comercializar a droga. Ora, drogas como álcool e
tabaco também causam problemas na saúde do ser humano, tão ou mais graves do
que as drogas hoje consideradas ilícitas. Mesmo assim, são liberadas, de forma
que sua produção e comercialização são reguladas. Seus fabricantes proporcionam
uma altíssima arrecadação tributária ao governo, e lucram mais ainda.

Destarte, é inegável que a criminalização do uso, da produção e da comercialização


de drogas no Brasil é contrária aos princípios consagrados na CRFB. Sendo assim,
é imperioso admitir a necessidade de uma descriminalização e legalização das
drogas, o que deve ser estudado e acompanhado de uma ampla política de
informação e de prevenção e redução dos danos.

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Acesso em: 2 jun. 2012.

NOTAS
[1]Segue o texto original: “Article I. Les hommes naissent et demeurent libres et
égaux en droits. [...] Article IV. La liberté consiste à pouvoir faire tout ce qui ne
nuit pas à autrui. Ainsi l’exercice des droits naturels de chaque homme n’a de
bornes que celles qui assurent aux autres Membres de la Société, la jouissance de
ces mêmes droits. Ces bornes ne peuvent être déterminées que par la Loi. Article
V. La Loi n’a le droit de défendre que les actions nuisibles à la Société’’ . (In:
FRANCE. Déclaration des Droits de L’homme et du Citoyen. 1789.
Disponível em: <www.assemblee-nationale.fr>. Acesso em: 25 fev. 2012).
[2]SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 233.
[3]SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 231-232.
[4] Ibidem, p. 207-208.

[5] Ibidem, p. 206.


[6]
O referido conceito, apresentado por José Afonso da Silva, foi estabelecido em
decisão da Corte Suprema dos EUA, em 1965, no caso Griswold x Connecticut.
[7]
MILL, John Stuart. Sobre a liberdade. Trad. Alberto da Rocha Barros.
Petrópolis: Vozes, 1991. p. 53.
[8]
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2003. p. 59.
[9]
Sobre a proteção constitucional da dignidade da pessoa humana, vale dizer que
“[...] a Constituição, reconhecendo sua existência e sua eminência, transformou-a
num valor supremo da ordem jurídica, quando a declara como um dos
fundamentos da República Federativa do Brasil constituída em Estado
Democrático de Direito. [...] A dignidade da pessoa humana é um valor supremo

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que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem [...], concebida


como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais” (In:
SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 3. ed. São
Paulo: Malheiros, 2007. p. 38).

[10]
PEDROSO, Marcelo Batuíra Losso. O princípio fundamental da liberdade, sua
importância e hierarquia sobre os demais direitos humanos. Revista do
Advogado, São Paulo, ano XXIV, n. 78, p. 53-60, set. 2004. p. 59-60.
[11]
SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 3. ed. São
Paulo: Malheiros, 2007. p. 39.
[12]
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso
da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 356.
[13]
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 234.
[14]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos
Fundamentais. 2. ed. Portugal: Coimbra Editora, 2008. p. 237, grifo nosso.
[15]
TJ/SP, Apelação Criminal n. 993.07.126537-3, 6ª Câmara de Direito Criminal,
Rel. José Henrique Rodrigues Torres, j. 31.03.2008.

[16]
TJ/SP, Apelação Criminal n. 993.07.126537-3, 6ª Câmara de Direito Criminal,
Rel. José Henrique Rodrigues Torres, j. 31.03.2008.

[17]SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 432.

[18]
OLIVEIRA, Marco Aurélio Moreira de. Crimes de perigo abstrato. Revista de
Estudos Criminais, Sapucaia do Sul, ano IV, n. 15, p. 95-100, 2004. p. 99.

[19]GOMES, Luiz Flávio. Princípio da ofensividade no Direito Penal. São


Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. (Série As Ciências Criminais no Século XXI, v.
6). p. 14.
[20]
Ibidem, p. 14.
[21]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos
Fundamentais. 2. ed. Portugal: Coimbra Editora, 2008. p. 236.
[22]
BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao Direito Penal brasileiro. Rio de
Janeiro: Revan, 1996. p. 92-94.
[23]
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2003. p. 57.
[24] BATISTA, op. cit., p. 92-93, nota 210.

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[25] GRECO, op. cit., p. 57, nota 211.

[26]KARAM, Maria Lúcia. Guerra às drogas encarcera mais negros do que


apartheid. Brasil de Fato, São Paulo, 10 dez. 2010b. Disponível em:
<www.brasildefato.com.br>. Acesso em: 25 ago. 2011.
[27]
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2003. p. 58.
[28]CARVALHO, Salo de; BUENO, Amilton. Aplicação da pena e garantismo.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 9.
[29]
CARVALHO, Salo de; BUENO, Amilton. Aplicação da pena e garantismo.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 7.
[30]
Vale ressaltar que o princípio da secularização “está incorporado em nossa
realidade constitucional, não sendo deduzível dos demais valores e princípios, mas
sendo ‘o’ princípio do qual aqueles são deduzíveis (In: CARVALHO, Salo de;
BUENO, Amilton. Aplicação da pena e garantismo. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2001. p. 12). Por exemplo, além do princípio da ofensividade, do princípio
da secularização derivam também os princípios da liberdade individual e da
inviolabilidade da vida privada e da intimidade, todos previstos na CRFB.

[31]BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 16.


ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 53.

[32]TJ/SP, Apelação Criminal n. 993.07.126537-3, 6ª Câmara de Direito Criminal,


Rel. José Henrique Rodrigues Torres, j. 31.03.2008.

[33]
Segue o texto original: “Article I. Les hommes naissent et demeurent libres et
égaux en droits. Les distinctions sociales ne peuvent être fondées que sur l’utilité
commune’’. (In: FRANCE. Déclaration des Droits de L’homme et du
Citoyen. 1789. Disponível em: <www.assemblee-nationale.fr>. Acesso em: 25 fev.
2012).
[34]
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
São Paulo: Malheiros, 2011. p. 212-213.

[35]
Art. 1º. [...]. Parágrafo único. Para fins desta lei, consideram-se como drogas as
substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados
em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo
da União.

Art. 66. Para fins do disposto no parágrafo único do art. 1º desta Lei, até que seja
atualizada a terminologia da lista mencionada no preceito, denominam-se drogas
substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob controle
especial, da Portaria SVS/MS n. 344, de 12 de maio de 1998.

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[36]
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 34. ed.
São Paulo: Malheiros, 2011. p. 215-216.

[37]
SAIBA mais sobre drogas. Portal Drogas, Jundiaí, 17 nov. 2009. Disponível
em: <www.drogas.org.br>. Acesso em: 2 jun. 2012.
[38]
BONAVIDES, Paulo. O princípio da igualdade como limitação à atuação do
Estado. Revista Brasileira de Direito Constitucional, São Paulo, Método, n.
2, p. 209-224, jul./dez. 2003. p. 217.
[39]
Ibidem, p. 222.
[40]
WORLD HEALTH ORGANIZATION. The World Health Report: reducing
risks, promoting healthy life. Geneva, 2002. Disponível em: <www.who.int>.
Acesso em: 2 jun. 2012. p. 9-10.
[41]
Segue o texto original: “Smoking causes substantially increased risk of
mortality from lung cancer, upper aerodigestive cancer, several other cancers,
heart disease, stroke, chronic respiratory disease and a range of other medical
causes. As a result, in populations where smoking has been common for many
decades, tobacco use accounts for a considerable proportion of mortality, as
illustrated by estimates of smoking-attributable deaths in industrialized countries
[…] Worldwide, it is estimated that tobacco causes about 8.8% of deaths (4.9
million) and 4.1% of DALY’s (59.1 million). Worldwide, the attributable fractions
for tobacco were about 12% for vascular disease, 66% for trachea bronchus and
lung cancers and 38% for chronic respiratory disease, although the pattern varies
by subregion”. (In: WORLD HEALTH ORGANIZATION. The World
Health Report: reducing risks, promoting healthy life. Geneva, 2002. Disponível
em: <www.who.int>. Acesso em: 2 jun. 2012. p. 76-77).
[42]
Segue o texto original: “Alcohol consumption has health and social
consequences via intoxication (drunkenness), dependence (habitual, compulsive,
long-term heavy drinking) and other biochemical effects. Intoxication is a
powerful mediator for acute outcomes, such as car crashes or domestic violence,
and can also cause chronic health and social problems. Alcohol dependence is a
disorder in itself. Overall, there are causal relationships between average volume
of alcohol consumption and more than 60 types of disease and injury. […]
Worldwide, alcohol causes 3.2% of deaths (1.8 million) and 4.0% of DALY’s (58.3
million). [...] Besides the direct effects of intoxication and addiction resulting in
alcohol use disorders, alcohol is estimated to cause about 20–30% of each of the
following worldwide: oesophageal cancer, liver cancer, cirrhosis of the liver,
homicide, epilepsy, and motor vehicle accidents”. (In: WORLD HEALTH
ORGANIZATION. The World Health Report: reducing risks, promoting
healthy life. Geneva, 2002. Disponível em: <www.who.int>. Acesso em: 2 jun.
2012. p. 77-78).

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[43]Segue o texto original: “Globally, 0.4% of deaths (0.2 million) and 0.8% of
DALYs (11.2 million) are attributed to overall illicit drug use”. (In: WORLD
HEALTH ORGANIZATION. The World Health Report: reducing risks,
promoting healthy life. Geneva, 2002. Disponível em: <www.who.int>. Acesso
em: 2 jun. 2012. p. 79).
[44]
AQUINO, Ruth de. Hora de legalizar? Época, Rio de Janeiro, n. 561, p. 82-88,
16. fev. 2009. p. 87.
[45]
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Neurociências: consumo e
dependência de substâncias psicoativas. Genebra, 2004. Disponível em:
<www.who.int>. Acesso em: 2 jun. 2012. p. 11.
[46]
CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo
criminológico e dogmático da Lei 11.343/06. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2010. p. 270.
[47]
SANTOS, Lycurgo de Castro. Tóxicos: algumas considerações penais. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 2, n. 5, jan./mar. 1994. p. 123-
124.
[48]TJ/SP, Apelação Criminal n. 993.07.126537-3, 6ª Câmara de Direito Criminal,
Rel. José Henrique Rodrigues Torres, j. 31.03.2008.
[49]
PEDROSO, Marcelo Batuíra Losso. O princípio fundamental da liberdade, sua
importância e hierarquia sobre os demais direitos humanos. Revista do
Advogado, São Paulo, ano XXIV, n. 78, p. 53-60, set. 2004. p. 59-60.

Autor
Andressa Andressa Barboza Félix
Barboza Félix
Advogada e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de
Vitória - FDV

Informações sobre o texto


Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FÉLIX, Andressa Barboza. A (in)constitucionalidade da criminalização das drogas.


Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3547, 18 mar.
2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23980. Acesso em: 2 set. 2019.

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