Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
3
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
Resumo
Existe uma demanda por ferramentas computacionais que possam facilitar o processo de ensino-aprendizagem. As
tecnologias de Realidade Virtual e Aumentada são vistas como ferramentas promissoras para a melhora desse pro-
cesso, pois são capazes de simular diversos conteúdos de aprendizagem. Contudo, essas tecnologias também são
conhecidas como soluções que demandam recursos específicos, como hardware, software e treinamento próprio. Este
artigo apresenta essas tecnologias e as barreiras que devem ser ultrapassadas nas escola para a implantação delas
no contexto diário das escolas. Discute-se as dificuldades que os professores têm na geração de conteúdos; no de-
senvolvimento de aplicações e na construção de laboratórios. Por fim, são apresentados alguns exemplos de uso da
Realidade Virtual e Aumentada no contexto educacional.
Abstract
There is a demand for tools that facilitate the teaching-learning process. Virtual Reality and Augmented reality are
seen as promising tools for improving this process because they create environments and situations where students
can learn different subjects. However, these technologies are also known as solutions that require specific resources,
such as hardware, software and training. This paper aims to present the challenges in the use of Virtual Reality and
Augmented Reality by schools. It is presented these technologies and the main challenges to be overcome to become
part of the educational context daily. It discuss the difficulties faced by the teachers to generate content; in the software
development; and the lab cost. It also presented some educational examples of applications based on Virtual Reality
and Augmented Reality.
1
Universidade Federal de São Paulo/membro do Programa de mestrado da Faculdade Campo Limpo Paulista, São
Paulo, Brasil marcelodepaiva@gmail.com
2
Faculdade de Computação e Informática ---- Grupo de Processamento Gráfico ---- Universidade Presbiteriana Ma-
ckenzie, São Paulo, Brasil valfarinazzo@hotmail.com
15
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
1 Introdução
O potencial de uso de RV e RA em diversos contextos
Existe uma busca constante por tecnologias que possam educacionais é amplo, pois podem simular desde um pas-
auxiliar o processo de ensino-aprendizagem de tal manei- seio em um museu arqueológico até uma expedição pela
ra que acarretem avanços nos métodos de ensino, aprimo- galáxia. Além disso, podem ser aplicadas em qualquer
rando assim o modo com que os professores transmitem nível de instrução e faixas etárias. Assim como possibili-
o conhecimento e, consequentemente, o modo de apren- tam auxiliar a aprendizagem das operações matemáticas
dizagem dos alunos. Como resultado dessa procura, na fundamentais, também podem simular fenômenos físicos
última década ocorreu um significante aumento no uso de complexos. Em muitas situações, devidos aos requisitos
tecnologias computacionais nas salas de aula, principal- específicos, como, por exemplo, equipamentos, o desen-
mente devido à diminuição dos custos envolvidos, o sur- volvimento de tais simulações não é simples. A evolução
gimento de novas ferramentas de software e a evolução dos sistemas de RV e RA na última década foi significati-
das interfaces de interação com as aplicações. Apesar de vo – enquanto há dez anos havia pouquíssimas soluções,
muitas tecnologias, principalmente as emergentes, esta- sempre de alto custo, hoje há uma gama de soluções dis-
rem cada vez mais presentes no contexto educacional, poníveis sob licenças de custo baixo (MARANA; BREGA,
como é o caso, por exemplo, de aplicativos que auxiliam 2008). Porém, muitos desafios ainda estão em aberto.
a exercitar a tabuada ou o alfabeto para crianças, ainda
são inviáveis de serem utilizadas pela maioria dos pro- Para que as aplicações de RV e RA sejam utilizadas em
fessores. Em uma análise ampla, nota-se que isso ocor- larga escala nas salas de aula, devem atender tanto os
re porque existe uma disparidade entre o estado da arte aspectos pedagógicos quanto requisitos como a facilidade
delas e o tempo necessário de amadurecimento para ser de uso, custo acessível e a capacidade de proporcionar a
implantada de maneira efetiva, ou seja, disponibilizada de preparação rápida pelos próprios professores dos conte-
maneira fácil e com custo acessível para todos. údos que serão abordados. Além disso, para a tecnologia
agregue valores no processo de ensino, é necessária a
A Realidade Virtual (RV) e Realidade Aumentada (RA) criação e adoção de uma metodologia eficaz de inserção
são exemplos de tecnologias que estão maduras no meio delas no contexto educacional.
científico, mas ainda estão pouco presentes no meio edu-
cacional, de maneira efetiva. As peculiaridades dessas Diversas aplicações de RV e RA já foram desenvolvidas
tecnologias, como a dificuldade para a geração de con- em diversas áreas educacionais, como na medicina, en-
teúdo, dificulta até o momento a sua adoção ampla pe- genharia, química e física (CARDOSO et al., 2013)[5]. Po-
los professores (MARTINS, GUIMARÃES, 2012). RV e rém, devido à complexidade envolvida, essas aplicações
RA são capazes de auxiliar o processo de transmissão são construídas por especialistas de Computação. Além
de conhecimento, pois podem simular situações reais ou disso, geralmente são apenas protótipos desenvolvidos e,
não, em ambientes controlados, sem a necessidades do assim, não são implantados em escola. Dessa maneira,
usuário estar fisicamente no local ou de possuir equipa- elas não passam por uma avaliação formal e pela valida-
mentos, como, por exemplo, uma nave espacial (AZUMA ção dos usuários finais – professores e alunos, tampouco
et al, 2001; KIRNER; SICOUTO, 2007). essas aplicações são focadas nos requisitos funcionais
apropriados, exatamente por não envolverem esses usu-
RV e RA são tecnologias multissensoriais que utilizam ários finais.
recursos multimídia, de computação gráfica, processa-
mento de imagens e outros, para a criação de ambien- Este artigo trata dos desafios a serem superados para que
tes total ou parcialmente artificiais [2,3]. Elas ampliam as ocorra o desenvolvimento rápido e eficaz de sistemas e
limitações físicas naturais dos seres humanos, enrique- conteúdo educacionais de alta qualidade com base no uso
cendo a manipulação dos objetos visualizados durante as de RV e RA. Assim, tem-se como objetivo, principalmente,
simulações. Para isso, os ambientes de RV e RA utilizam discutir as questões ligadas ao uso efetivo dessas tecno-
variados dispositivos convencionais e não-convencionais logias, visto que, atualmente, a maioria dos professores
de entrada/saída (trackers, capacetes de visualização, lu- desconhece as suas potencialidades; as ferramentas não
vas, spaceball e joystick) para tornar a interação o mais atendem o requisito de facilidade de desenvolvimento de
real e natural possível. Esses dispositivos proporcionam novas aplicações; e o custo de laboratórios específicos
aos usuários a impressão de que a aplicação está fun- ainda é alto para a maioria das instituições de ensino.
cionando no ambiente real, permitindo a exploração e a
manipulação natural dos objetos com o uso das mãos, por Este artigo mostra na seção 2 as características, poten-
exemplo, para apontar, pegar, e realizar outras ações. Du- cialidades e restrições de RV e RA. A seção 3 analisa o
rante as simulações, os usuários entram em um espaço desenvolvimento rápido e eficaz de conteúdo educacional
virtual para visualizar, manipular e explorar os objetos das com base no uso de RV e RA. Para isso, trata de assuntos
aplicações em tempo real. Para isso, os usuários usam como a falta de conhecimento tecnológico dos envolvidos;
os seus sentidos, particularmente os movimentos naturais a falta de um processo de desenvolvimento de software
tridimensionais do corpo. adequado e de ferramentas eficazes; e a restrições orça-
16
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
modificar instantaneamente o mundo virtual e as Advinda da RV, tem-se a RA, que trata da sobreposição
ações sobre ele; de objetos virtuais no mundo real, enriquecendo então o
ambiente real com objetos virtuais, em tempo real (AZU-
· Realístico: refere-se à precisão com que o ambiente MA et al., 2001). Essa tecnologia é apontada pelo Horizon
virtual reproduz os objetos reais, as interações com os Report (2013) como uma das que irão gerar impactos sig-
usuários e o próprio modelo do ambiente; nificativos na área educacional nos próximos anos. Se-
17
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
gundo Azuma (2001), existem três características princi- como, por exemplo, uma exploração da Lua em se-
pais nos sistemas de RA: gundos;
· Combinação do mundo real com os objetos virtuais · Possibilita a simulação e prática de conteúdos de
dentro do ambiente real; modo similar ao modo real, como, por exemplo, as leis
de trânsito;
· Interatividade em tempo real ; e
· Permitem a simulação de ambiente reais ou virtuais;
· Alinhamento exato dos objetos virtuais no ambiente
real. · O custo atual permite que muitas das simulações,
mesmo as imersivas (Figura 1), sejam suportadas por
Um ambiente de RA é composto por um cenário predo- equipamentos comuns.
minante real com alguns objetos virtuais inseridos. Para
interagir com o ambiente de RA, o usuário pode utilizar A evolução das ferramentas de desenvolvimento de am-
desde marcadores até as próprias mãos para manipular bientes de RV e RA na última década é considerável; hoje
os objetos virtuais no mundo real. A interação é sempre há uma gama de soluções disponíveis. Porém, ainda exi-
em tempo real, não importa o meio utilizado para interagir. gem um elevado conhecimento técnico e/ou requerem
A Figura 2 mostra um exemplo de aplicação de RA. Ela bastante tempo para geração de conteúdos, o que torna
tem como objetivo mostrar uma caravela quando um de- a criação de ambientes educacionais e a geração de con-
terminado marcador é apresentado. Como as aplicações teúdos de RV e RA de maneira fácil e eficaz um desafio.
de RA fornecem um grau de imersão inferior às de RV,
então, geralmente, os custos são inferiores. Por exemplo, 3 Desenvolvimento rápido e eficaz de conte-
a aplicação dessa figura não requer nenhum equipamento údo educacional com base em Realidade Vir-
específico. No caso somente um computador com uma tual e Aumentada
câmera, um marcador e o software de RA.
A implantação efetiva da RV e RA no ensino ainda é um
desafio, pois exige transpor diversas barreiras. A primeira
delas é a identificação dos conteúdos que podem usufruir
dessas tecnologias. Isso acontece porque a potenciali-
dade delas é ainda não é conhecida o suficiente pelos
envolvidos, no caso, os professores. A segunda barreira
é tecnológica, que trata do descompasso entre o proces-
so de desenvolvimento proposto na Engenharia de Sof-
tware para aplicações interativas (SOMMERVILLE, 2010;
PRESSMAN, 2009) e como esses projetos estão sendo
desenvolvidos. Por fim, a última barreira, refere-se à via-
bilidade financeira para a incorporação delas no contexto
educacional. Embora uma das áreas mais citadas para o
uso de RV/RA seja a educacional, muito poucos projetos
são, de fato, implantados em escolas, públicas ou priva-
das, para apoio ao aprendizado, de maneira efetiva.
Tanto a RV quanto a RA possuem características que tor- A criação de conteúdos para aplicações de RV e RA de-
nam o seu uso favorável no contexto educacional, como, manda grande tempo e esforço. Para desenvolver tais
por exemplo: conteúdos são necessários não apenas conhecimento
técnico computacional, mas, também, conhecimento do
· O aluno tem liberdade para executar a mesma simu- tema, além de possuir habilidades pedagógicas. Devido
lação várias vezes; às ferramentas de desenvolvimento de conteúdos não se-
rem de alto nível, ou seja, fáceis de serem utilizadas, os
· Podem ser utilizadas de maneira colaborativa ou in- professores sentem-se incapazes de gerar esses conte-
dividual; údos. A solução encontrada por alguns professores é a
busca por equipes de apoio, o que restringe a tecnologia
· Possibilitam a visualização e manipulação de objetos a apenas algumas instituições.
diversos, como uma caravela (Figura 2);
Geralmente os conteúdos são compostos por desenhos
· Podem simular situações impossíveis no mundo real, em 3D (três dimensões), como um carro ou um avião. A
18
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
3.2.3. Implementação
Exemplos de ferramentas de modelagens são: Blen- destinados à inserção do aluno no mundo tecnológico são
der, 3D Studio e o Maya. compostos por computadores geralmente com hardware
e software defasados. É válido ressaltar que essas esco-
· Engines gráficos: a síntese (geração) de imagens de las, em sua quase totalidade, não dispõem de recursos
um software de RV e RA é coordenada pela engine financeiros para a compra de softwares e dispositivos de
(motor) gráfico, como, por exemplo: Ogre, Panda3D, entrada e saída não-convencionais, tais como luvas, joys-
OpenSceneGraph, OpenSG, Crystal Space e Irrlicht. ticks, capacetes – que permitiriam que as aulas se tornas-
sem mais dinâmicas e motivadoras, aliado ao despreparo
· Frameworks para RV/RA: eles apresentam funciona- das pessoas que gerenciam esses laboratórios. Assim, é
lidades específicas para cada tipo de aplicativo, como: possível notar que laboratórios ideais para o uso de RV e
suporte a dispositivos de entrada não-convencionais RA são complexos e caros ainda, e exigem um elevado
de forma abstrata, permitindo que novos dispositivos conhecimento técnico da Instituição envolvida. A realida-
sejam usados sem modificação (ou com poucas mo- de é que os laboratórios de Informática dessas escolas
dificações) do software; suporte a dispositivos com- limitam-se, ainda, na sua grande maioria, a recursos para
plexos de saída, por exemplo com múltiplas saídas de acesso à internet para pesquisas bibliográficas.
vídeo em disposição arbitrária, algo raramente supor-
tado por engines. Torna-se então um desafio computacional criar laborató-
rios commodities, que possibilitem a sua montagem por
· Software de administração de hardware: sistemas de usuários leigos, e com poucos recursos financeiros. Tanto
RV e RA podem se tornar consideravelmente comple- RA quanto RV podem ser utilizadas com soluções sim-
xos, e sua administração deve ser reduzida ao míni- ples, como visualização em monitores dos computadores
mo. Geralmente, utiliza-se o próprio software do fabri- pessoais, em vez de ambientes imersivos proporcionados
cante ou constrói-se um. por CAVEs. Apesar de soluções simples, como as que
utilizam monitores convencionais, não explorarem toda a
Enquanto não houver ferramentas que possam elimi- potencialidade da RV e RA, elas podem ser suficientes
nar ou facilitar esses quatro itens supracitados, so- para diversas situações de ensino.
mente especialistas estarão aptos a desenvolver tais
aplicações de RV e RA. 4. Exemplos de Projetos de RV e RA desenvolvidos
Obviamente, para avaliar de maneira eficiente as aplica- 4.1 RV para Ensino de Português
ções de RV e RA na área educacional, o usuário deve
estar envolvido desde muito cedo no processo de de- O propósito dos autores (ABREU et al., 2011;
senvolvimento. Isso significa que o desenvolvedor deve
conhecer seu público-alvo – professores e alunos – e MARTINS et al., 2012) é a apresentação de uma solu-
estabelecer uma relação próxima com eles, de modo a ção de software de RV de baixo custo voltada à área de
envolvê-los na avaliação. Vale a pena ressaltar que é de Língua Portuguesa, que tem como objetivo ensinar novas
suma importância que esses projetos sejam implantados normas técnicas da língua portuguesa.
nas escolas-alvo, a fim de que os testes finais sejam reali-
zados no ambiente em que deverão ser utilizados. Um ponto fundamental desse projeto é que ele foi real-
mente implantado em uma escola pública na cidade de
3.3. Desafio 3: Montagem de laboratórios de RV e RA São Paulo. Com os resultados alcançados por esse sis-
tema, abordando uma avaliação formal com alunos e
Se forem analisados os recursos computacionais disponí- professores da escola pública, foi demonstrada a viabili-
veis atualmente nas escolas públicas no Brasil, pode ser dade de utilização do sistema com usuários reais. Assim
percebido que, em um cenário otimista, os laboratórios o sistema foi desenvolvido levando em consideração as
21
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
Figura 8: Paraboloide.
22
Revista de Informática Aplicada , Volume 9, Número 1, 2013
Embora haja soluções de RV e RA com licenças de baixo KALAWSKY, R. S. The Science of Virtual Reality and Vir-
custo, as escolas públicas não estão preparadas para a tual Environments: A Technical, Scientific and Enginee-
conversão de seus laboratórios de informática em labora- ring Reference on Virtual Environments, Addison-Wesley,
tórios para o uso dessas duas tecnologias. Entre os pon- ISBN-10: 0201631717, ISBN-13: 978-0201631715, 1993.
tos de dificuldade estão: hardware e software – falta de
equipamentos não convencionais e despreparo de pes- VINCE,J. Virtual reality systems, ACM Press/
soas que gerenciam esses laboratórios. Atrelado a esses Addison-Wesley Publishing Co. New York, NY,
problemas supracitados, ainda é possível salientar que os USA,ISBN:0-201-87687-6, 1995.
professores atualmente não estão preparados (capacita-
dos) para o uso de recursos computacionais em suas au- STUART, R. ”The Design of Virtual Environmets”. Fairfield,
las, mesmo os mais simples, limitando, muitas vezes, ao Pennsylvania, McGraw-Hill, 1996.
uso de internet para produção de material de referência
bibliográfica. KIRNER, C., ; PINHO, M. “Introdução à Realidade Virtual”,
Minicurso Jornada de Atualização(JAI)/Sociedade Brasi-
Outro ponto bastante importante é notar que o desenvol- leira de Computação (SBC), Recife, PE, 1996.
vimento atual, por especialistas, de muitas aplicações de
RV e RA na área educacional, não envolve verdadeira- NMC Horizon Report: Edição Ensino Superior 2013.ISBN
mente os usuários finais – professores e alunos – e não 978-0-9889140-4-9. Disponível em: http://www.nmc.org/
abordam nem a implantação dessas aplicações em esco- pdf/2013-Horizon-Report-HE-PT.pdf
las, tampouco avaliações formais.
SOMMERVILLE, I. Software Engineering. Addison-
Dessa maneira, é possível notar que o desenvolvimento -Wesley.9th Edition. 792 p., 2010.
de conteúdo educacional, com base no uso de RV e RA, e
a implementação deles nas escolas, com alta qualidade e PRESSMAN, R. Software Engineering: A Practitioner’s
com rapidez, é um desafio a ser superado. Approach.McGraw-Hill,ISBN-10: