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A GEOPOLÍTICA BRASILEIRA – PREDECESSORES E

GEOPOLÍTICOS
Carlos de Meira Mattos (*)

Os Predecessores
Antes mesmo que o pensamento geopolítico adquirisse foros de conhecimento científico,
através da teorização das observações relativas à interação homem-meio físico, isto no final do
Século XIX, já havia, a respeito do Brasil, prognósticos prospectivos de pensadores esclarecidos,
dotados de visão política, que premonizaram para o nosso país um destino de grandeza.
Nascidas da observação, as ciências sociais, entre as quais se inclui a Política e seu ramo a
Geopolítica, caracterizam-se por comportarem projeções prospectivas. Não se trata de futurologia,
visão advinhatória, mas de aproximação porvindoura baseada em elementos racionais de estatísti-
ca, de história e de psicologia.
Observa o Embaixador José Oswaldo Meira Penna, no seu livro “Política Externa”, que os
autores do Tratado de Tordesilhas (1494) já haviam traçado as grandes servidões da geopolítica
brasileira. Passamos a palavra ao Embaixador Meira Penna:
“A linha de Tordesilhas, marco inicial, imposição geopolítica sobre a qual se arcará a
história colonial do Brasil, determinando a configuração de nossa política externa. Tordesilhas é
este o primeiro, em ordem cronológica e em importância histórica, dos alicerces sobre os quais se
assentará nossa vida internacional. Representa as relações com a Espanha, isto é os domínios a
oeste da linha, os quais irão, mais tarde, constituir as repúblicas nossas vizinhas. Tordesilhas é o
problema de fronteiras – problema sempre prioritário em toda ação diplomática e tacitamente colo-
cado ao realizar-se o descobrimento. Logo em seguida quase que imediatamente após a colocação
do marco cabralino, anuncia-se o segundo elemento fundamental dessa política: o problema da
segurança da orla marítima.”
Destacou o Embaixador Meira Penna, a presença já nos primórdios de Século XVI, dos dois
desafios vitais de nossa segurança externa, - a proteção das fronteiras terrestres a oeste e a proteção
da fronteira marítima a leste. Dois problemas geopolíticos que exigiram da diplomacia colonial
portuguesa e da diplomacia imperial e republicana, preocupação constante, negociação permanente
e, algumas vezes, luta armada.
A mais antiga visão prospectiva sobre o futuro do Brasil data de 1587, do historiador portu-
guês Gabriel Soares de Sousa, que no seu livro “In Tratado Descritivo do Brasil – Proemio”, rela-
tando a visita que fez a nossa terra, assim sintetiza as suas impressões:
“Está capaz para se edificar nele um grande império, o qual com pouca despesa destes
reinos se fará tão soberano que será um dos Estados do Mundo.”
Antes de nossa Independência, em 1821, José Bonifácio produziu um documento precioso
em termos de visão do Estado Brasileiro do futuro. Tal documento, denominado “Lembranças e
Apontamentos”, era destinado a orientar os deputados da Província de São Paulo, eleitos para
representar o Brasil na Corte de Lisboa, encarregada de elaborar a nova Constituição para o Império
Português.
“Lembranças e Apontamentos” revela como preocupação principal a preservação da unidade
nacional, quando viesse a se dar a Independência , cuja proximidade era evidente. Mas, ao lado de
um programa completo de necessidades administrativas, versando sobre estrutura territorial, edu-
cação, saúde, questão indígena, política exterior, defesa do território, antevendo, já, o futuro Estado
brasileiro, os “Apontamentos” revelam uma extraordinária visão geopolítica de nossa territoriedade.
Propõe José Bonifácio que os nossos representantes na Corte de Lisboa defendam a tese da neces-
sidade de interiorização da capital do país, pois possuidores de enorme massa continental, não
poderemos, no futuro, viver somente nos alimentando nas praias e sugere o local para o novo centro
de poder político, assim se expressando, “que poderia, no futuro, ser em latitude pouco mais ou
menos de 15o, em sítio sadio, ameno e fértil, e regado por algum rio navegável.” Este local estaria
nas proximidades de Paracatu, cerca de 200 quilômetros ao sul da atual Brasília.
As razões que José Bonifácio vê para a mudança da capital para o interior, revelam sua notá-
vel visão geopolítica: – invoca a imensidão geográfica e a característica continental-marítima, in-
voca motivo de defesa, (numa época em que o poder marítimo das potenciais imperialistas consti-
tuíam constante perigo às nações fracas), invoca a necessidade de uma administração central que se
transforme em pólo de atração das áreas periféricas. Diz textualmente: – “com a mudança da capi-
tal para o interior fica a Corte ou assento da Regência livre de qualquer assalto de surpresa externa,
e se chama para as províncias centrais o excesso de população vadia das cidades marítimas e mer-
cantis”, e mais adiante, “desta Corte central dever-se-ão logo abrir estradas para as diversas pro-
víncias e portos de mar, para que se comuniquem e circulem com toda a prontidão as ordens do
governo, e se favoreça por elas o comércio interno do vasto Império do Brasil”.
Outra figura de visão geopolítica foi, sem dúvida, o brasileiro, santista, diplomata da corte
portuguesa de D. José I, Alexandre de Gusmão, considerado o inspirador do Tratado de Madrid de
1750. Segundo o historiador português Jaime Cortezão, “Alexandre de Gusmão dava-nos “de jure”
aquilo que bandeirantes já nos haviam dado de fato”. O Tratado de Madrid legitimou as conquistas
dos bandeirantes paulistas e nortistas até então contestadas pelos espanhóis. Ali, ficaram já esboçadas
as nossas atuais fronteiras políticas.
Apresentados os três premonizadores intuitivos da geopolítica brasileira: – o historiador
seiscentista Gabriel Soares de Sousa, o diplomata oitocentista Alexandre de Gusmão e o estadista
novecentista José Bonifácio de Andrada e Silva, vamos enfocar, agora, o pensamento geopolítico já
fundamentado na metodologia científica das escolas alemã e francesa, lideradas respectivamente
pelo talento acadêmico de Rudolf Ratzel e Vidal de La Blache.
Os Geopolíticos
Os primeiros livros de Geopolítica Ciência, Geopolítica Teoria, surgiram no Brasil na Déca-
da dre 30. Os autores, o Capitão do Exército Mario Travassos e o Professor Acadêmico Everardo
Backeuser. Foram saudados pela intelectualidade brasileira nas figuras de Ronald de Carvalho,
Alberto Torres, Oliveira Vianna, Roquete Pinto, Gilberto Freyre, Pandiá Calogeras.
O jovem Capitão Mario Travassos na década de 30 escreveu dois livros: “Projeção Continen-
tal do Brasil” (edição de 1931) e “Introdução à Política de Comunicações Brasileiras”, Prefacia-
ram, o primeiro Pandiá Calogeras e o segundo Gilberto Freyre. O primeiro destes livros, o “Proje-
ção Continental”, saurgiu em 1930 sob o título de: “Aspectos Geográficos Sul-americanos”. O
segundo livro, “Introdução à Política de Comunicações Brasileiras”, 1941, atualizou e complementou
as idéias e sugestões contidas no “Projeção”, conforme declarou na sua apresentação o próprio
autor.
O “Projeção Continental”, escreveu Ronald de Carvalho, foi a primeira obra de Geopolítica
publicada no Brasil. Este livro lançou os fundamentos da Geopolítica brasileira para a primeira
metade do Século XX. Com clarividência e nitidez invejável, Mario Travassos traçou os grandes
rumos de uma política nacional destinada a nos levar à posição de maior potencial sul americana.
Não se sabe o que mais admirar nessa obra, se clareza das análises ou a objetividade das soluções
propostas.
Na sua análise geopolítica, Mario Travassos destaca os dois grandes antagonismos geográfi-
cos de nosso subcontinente – do Atlântico e do Pacífico. Mostra a importância da cordilheira andina
como divisor, que se extende da Venezuela à Patagônia, os pontos de rebaixamento, os chamados
“nudos”, onde a cordilheira oferece passagem mais fácil de uma vertente para a outra. Pesquisa
nossa posição atlântica, por sua vez submetida a dois outros antagonismos geográficos – do Prata e
do Amazonas, Salienta a força convergente do Prata carreando para Buenos Aires a influência
sobre as bacias de seus formadores – o Uruguai, Paraná e o Paraguai – todos os três mergulhando
fundo no território brasileiro.
Realça, em termos de uma política continental, a importância do triângulo geopolítico bolivi-
ano – Santa Cruz de la Sierra – Cochabamba – Sucre, como pólo de converg6encia das influências
Atlântico – Pacífico. Santa Cruz na bacia amazônica mas bem articulada com a região andina de
Cochabamba e Sucre. Cochabamba andina mas também próxima à calha amazônica e, finalmente,
Sucre andina, próxima a um dos “nudos”, passagens na cordilheira e ligada à Cochabamba e à
influência amazônica de Santa Cruz de la Sierra, que recebe a atração platina de Corumbá. Segundo
Mario Travassos, o poder sul-americano que conseguir controlar esse triângulo-chave, região de
convergência das três forças geográficas que o operam no subcontinente, dominará a política
continentalista regional. Nessa região encontram-se e poder-se-ão dar-se as mãos ou partir para a
disputa.
As soluções sugeridas por Travassos visando à superação dos óbices oferecidos pela geogra-
fia sul-americana, situam-se na realização de uma política de transportes que neutralize, a nosso
favor, os desequilíbrios potenciais oferecidos pelos antagonismos fisiográficos existentes. Propõe
que se implante ou se complete (quando for o caso), uma rede ferroviária carreadora para os portos
brasileiros do Atlântico – Santos, Paranaguá, São Francisco, Porto Alegre e Rio Grande – as influ-
ências platinas sobre as regiões interiores brasileiras das bacias dos rios Paraná, Paraguai e Uru-
guai. Propões a chegada de nossos trilhos a Santa Cruz de la Sierra e daí, a África, articulando as
grandes regiões platina (Atlântico) e andina (Pacífico). Sugere a construção de ramais da Estrada
de Ferro Noroeste do Brasil para a República do Paraguai. Em termos de vertebração da massa
continental sul-americana sugere ampla conjugação das redes ferroviária, hidroviária e aérea, além
de propor a criação de um sistema aéreo interligando todas as capitais dos países de nosso
subcontinente austral, superando assim, temporariamente, as dificuldades de tráfego terrestre ofe-
recidas pelos obstáculos geográficos. Antever o desenvolvimento do transporte rodoviário para
longa distâncias e sua futura inserção no sistema múltiplo de articulação vial.
Mario Travassos chegou a General de Divisão no Exército ativo, como Coronel participou da
Força Expedicionária Brasileira, FEB, e foi reformado como Marechal. Teve imensa influência no
pensamento de sua geração. Suas análises e formulações geopolíticas dominaram a mente de inte-
lectuais patriotas e dos oficiais formados pelas Escolas de Estado-Maior do Exército, Marinha e
Aeronáutica até a década de 50. Suas idéias coincidiram com os propósitos políticos de fortaleci-
mento do Estado Brasileiro oriundas dos revolucionários de 1930. Seu livro “Projeção Continen-
tal” foi amplamente discutido, aceito ou negado, mas sempre discutido, em quase todos os países
sul-americanos, particularmente na Argentina . Foi traduzido para o idioma espanhol.
As propostas geopolíticas sugeridas por Travassos, visando a articulação vial do território
foram, quase todas, incorporadas aos projetos dosa sucessivos governos. Graças à realização do
sistema de transportes carreadores para os nosso portos os interesses da imensa área interiorana
brasileira, antes submetida à atração hidroviária da bacia platina, consolidamos a nossa integração
territorial e construímos nas nossas regiões Leste, Sudeste e Sul, a mais importante base cultural e
econômica da América Latina.
Começando a produzir nos últimos anos da década de 20. O Professor Everardo Backheuser,
autor de vários livros, colunista dos principais jornais, articulista de revistas especializadas em
geografia e história, é considerado o precursor dos estudos de geopolítica no nosso país. Backheuser
foi o teórico da geopolítica brasileira, deu-lhe um método, sistematizou-a. Travassos aplicou-a com
mestria no diagnóstico de nossas potencialidades. Ambos dominaram o campo durante 30 anos
com valiosa e intensa produção intelectual. Backheuser pregou suas idéias geopolíticas durante
vários anos, principalmente pelas colunas do Jornal do Brasil e nas aulas da cadeira de geografia do
Colégio Pedro II. Foi organizador (1948) e Professor do Curso de Geopolítica na Pontifícia Univer-
sidade do Rio de Janeiro.
O pensamento de Backheuser expresso no seu excelente estudo sobre Política de Fronteiras,
largamente difundido em artigos de jornais e revistas desde os anos 30 e condensado no seu livro
“Geopolítica Geral do Brasil”, teve grande influência no estabelecimento pelo governo de uma
nova política de fronteiras e na criação dos territórios nas regiões lindeiras mais críticas.
Realmente, nos primeiros anos que se seguiram à Revolução de 30, o espírito renovador,
[preponderante no governo, aproveitou-se das idéias difundidas por Backheuser e promoveu uma
política de fortalecimento de nossas regiões limítrofes, sob a inspiração de que, “a fronteira é a
epiderme do organismo estatal, captadora das influências e pressões foraneas e, como tal, região
que deve ficar diretamente subordinada ao poder central, e não a autoridades regionais que mani-
festam menor sensibilidade para os seus problemas”, enfim, a política de fronteira não deve ser
atribuição regional, mas federal.
Estas idéias difundidas por Backheuser foram decisivas para a criação dos nossos territórios
federais do Amapá, Roraima, Rondônia, Fernando de Noronha , Ponta Porã e Foz do Iguaçu. Cum-
prida a finalidade de povoamento e fortalecimento destes territórios, foram os três primeiros trans-
formados em Estados e os três últimos extintos e reincorporados aos Estado contíguos.
No período dos anos 40 e 50 tivemos o aporte valioso dos estudos geopolíticos do brigadeiro
Lysias Rodrigues, condensados no livro “Geopolítica do Brasil” (1947), prefaciado pelo Professor
Backheuser. O autror destaca a importante do papel presente e futuro da aviação para o desenvolvi-
mento das áreas longínquas e despovoados de nosso território, em particular das fronteiras terres-
tres. Preocupa-se com as nossas fronteiras norte, analisa-as e aponta seus pontos críticos (punctum
dolentis). Defende com entusiasmo uma política de interiorização, de mudança da capital e de
redivisão territorial. Preocupa-se particularmente com o futuro de nossas fronteiras com os Estados
europeusa ocupantes das Guianas. Pregando a interiorização escreve:
“O deslocamento do homem brasileiro para o sertão é um problema de economia dirigida,
dando-se a ele e sua família o transporte até o local, fixando-se a gleba que lhe toca, fornecendo-lhe
as ferramentas, as sementes e o financiamento para sua alimentação e instalação, até que possa dar-
lhe compensações. É o que se faz com o imigrante. E o imigrante não é em nada superior ao
homem brasileiro, balanceados qualidades e qualidades, defeitos e defeitos. Agir de outra forma é
condenar à inutilidade qualquer esforço”.
Conclui o Brigadeiro Lysias Rodrigues: “o Brasil tem potencialidade e ambições para se
engrandecer, deverá: dirigir seus passos de acordo com as linhas que forem fixadas pela geopolítica,
porque, só ela é capaz de apontar o caminho certo, só ela é que pode evitar ao Brasil surpresas
dolorosas”.
O Brigadeiro encontrou um seguidor entusiasta de suas idéias no Professor paulista Paulo
Henrique da Rocha Correia, ainda hoje militante nas hostes dos geopolíticos.
Sem ser um geopolítico teórico, mas um intelectual possuidor de pensamento intuído para a
conjugação das realidades políticas e geográficas do território, Cassiano Ricardo, na década de 40
trouxe a sua contribuição através da portentosa obra “Marcha para o Oeste”. Grande pensador que
foi, além de poetas dos melhores, seu livro extraordinário avivou a face continentalista de nosso
destino aspecto tão descurado por aqueles que no dizer de Frei Vicente do Salvador, “contentaram-
se em andar arranhando as terras ao longo do mar, como caranguejos”.
Analisando este período da geopolítica brasileira que engloba desde as obras de Alberto Tor-
res até as de Mario Travassos, aproximadamente meio século, começando na década de 10 termi-
nando na de 50, o historiador e “imortal” Luiz Vianna Filho, prefaciando o livro “A Geopolítica e
as Projeções do Poder” de nossa autoria, assim se expressou:
“Contudo, embora oriundos de origens que poderíamos ter como diversas, a verdade é
que Alberto Torres, Oliveira Vianna, Backheuser e Mario Travassos, parecem corresponder a um
reclamo, a um espírito da nacionalidade que dir-se-ía desejosa de se encontrar com seus problemas,
avaliá-los, conhecê-los e para eles procurar soluções que correspondessem efetivamente à decanta-
da realidade nacional. realidade muito mais real do que se imaginava , e cujo conhecimento era
intensamente almejado pelas gerações jovens. Gerações ávidas por encontrar novos caminhos para
o Brasil e que, a bem dizer, como que advinhavam a necessidade de adquirirmos uma outra dimen-
são interna e externa. Internamente não podíamos continuar a ser apenas a pátria do Jéca Tatu, e
externamente repugnava permanecermos como simples e explorados exportadores de produtos pri-
mários”.
Nos anos 50 desponta no horizonte geopolítico brasileiro a figura do então Tenente Coronel
Golbery do Couto e Silva. Golbery proferiu inúmeras confer6encias em nossas Escolas de Estado-
Maior e na Escola Superior de Guerra. Escreveu dezenas de artigos para revistas especializadas
como a defesa Nacional e a do Instituto Histórico e Geográfico. Em 1976 condensou todos os seus
escritos no livro que alcançou grande projeção “Geopolítica do Brasil”, lançado pela Editora José
Olympio.
Golbery projeta suas luzes sobre no projeto desenvolvi-mentista brasileiro, faz a radiografia
do Brasil contemporâneo e sugere ações políticas.

Vamos reproduzir trechos principais dessa radiografia:


· “Na verdade o Brasil é bem um “império”, vasto império compacto, de ampla frente marítima e
dilatada fronteira continental equidependentes quase em torno do eixo de simetria norte-sul, que
vai do cabo Orange à barra do Chuy;
· Ocupa sem dúvida, aquela frente marítima, uma posição um tanto original no caprichoso contor-
no do oceano mundial em que o Atlântico Sul não é mais que um golfão ainda excêntrico;
· Estende-se aquela fronteira terrestre, em grande parte, através do deserto que a Hileia domina
como vasto cinturão protetor;
· Essas condições favoráveis de início é que asseguram o indispensável grau de imunidade a
ações de conquista, mantidas em potência ou duração, provindas do exterior. É, de fato, a pró-
pria insularidade em proporções continentais.
A este resumo do enfoque global do território, em face, inclusive às pressões externas, segue-
se a radiografia interna traduzida no levantamento das regiões geopolíticas e sua dinâmica.
Destaca-se o autor:
- Uma área geopolítica de reserva geral ou de manobra, são Paulo, Rio de Janeiro e Guanabara,
Espírito Santo, Minas Gerais e o sul de Goiás com o Distrito Federal;
- Uma área geopolítica da ala Norte, abarcando os estados do Nordeste, desde a Bahia até o
Maranhão;
- Uma área geopolítica da ala sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul;
- Uma área geopolítica do oeste, reajustada aos contornos de Mato Grosso e mais o Território de
Rondônia;
- Finalmente, uma área geopolítica da Amazônia, compreendendo os estados do Amazonas, Pará,
Acre e os territórios do Amapá, Roraima e Rondônia.
Durante seus primeiros quinzes anos a ESG formulou sua doutrina de Segurança Nacional e
pesquisou profundamente no campo do desenvolvimento. Formou elites civis e militares aptas a
pensarem no Brasil com objetividade, como um todo, e se exercitarem na formulação de um méto-
do visando a aplicação do poder nacional para a segurança, a se aprofundarem nos estudos seletivos
para o nosso desenvolvimento. Quando veio a Revolução de 1964 a doutrina da Escola Superior de
Guerra já estava formulada e exercitada em termos laboratoriais ou escolares. No período revoluci-
onário, os Presidentes da República e seus principais assessores, militares e civis estimularam a
formulação dessa doutrina pois, na sua maioria, haviam pertencido aos quadros da ESG. Exercita-
ram, na prática governamental, a aplicação da doutrina já formulada no casarão do Forte de São
João.
De todos, indubitavelmente, o mais lúcido expositor desta doutrina foi o próprio Presidente
Castelo Branco. São essas as suas palavras pronunciadas na aula inaugural do ano letivo de 1967 na
Escola Superior de Guerra:
“A Escola que hoje está entregue a vossa inteligência e conhecimento não se imobilizou
sempre, se atualizou, e é, no meio cultura do Brasil um exemplo de antecipação de idéias. O
tema escolhido – Segurança e Desenvolvimento – é o assunto dominante no vosso programa
doutrinário, nos vossos estudos e hoje ‘já integrado, em essência, na nova Constituição Bra-
sileira e em leis modernas.
Procurarei desdobrá-lo segundo os seus elementos constitutivos.
A primeira parte a fixar é a dilatação do conceito de Segurança Nacional, bastante diferenci-
ado, hoje, do conceito mais restrito de defesa nacional. A diferença é dupla. Conceito tradici-
onal de defesa nacional coloca mais ênfase sobre os aspectos militares de segurança e
correlatamente aos problemas de agressão externa. A noção de Segurança nacional é mais
abrangente. Compreende, por assim dizer, a psicológicos, a preservação do desenvolvimento
e da estabilidade política interna, além disto o conceito de segurança, muita mais explicita-
mente do que o de defesa, toma em linha de conta a agressão interna, corporificada na infil-
tração e subversão ideológica, até mesmo nos movimentos de guerrilha, formas hoje mais
prováveis de conflito do que a agressão externa.
Desenvolvimento e segurança por sua vez são ligados por uma relação de mútua causalidade.
De um lado, a verdadeira segurança pressupõe um processo de desenvolvimento quer econô-
mico, quer social. Econômico porque o poder militar está também essencialmente condicio-
nado à base industrial e tecnológica do país. Social, porque mesmo um desenvolvimento
econômico satisfatório, se acompanhado de excessiva concentração de renda e crescente des-
nível social, gera tensões e lutas que impedem a boa prática das instituições e acabam com-
prometendo o próprio desenvol-vimento econômico e a segurança do país.
De outro lado, o desenvolvimento econômico e social pressupõe um mínimo de segurança e
estabilidade das instituições. E não só das instituições políticas, que condicionam o nível e a
eficiência dos investimentos do Estado, mais também das instituições econômicas e jurídi-
cas, que garantindo a estabilidade dos contratos e o direito de propriedade, condicionam, de
seu lado, o nível de eficácia dos investimentos privados.
A doutrina de segurança nacional, assim como o conceito de estratégia, não constitui um
corpo rígido de princípios, visto comportar influências geográficas, ideológicas, tecnológicas
e econômicas.
A influência doutrinária pode ser exemplificada pela expansão territorial, que elevou a cons-
trução dos grandes impérios que se julgaram possuídos de missão civilizadora; pelo
expansionismo ideológico característicos dos sistemas marxistas; ou pelo isolacionismo, con-
forme ocorreu em certas fases da história americana.
No caso brasileiro, a nossa longa tradição pacifista leva-nos a uma doutrina essencial-
mente defensiva. A opção que realmente se nos apresenta é entre um conceito de segurança emi-
nentemente nacional, o que seria algo irreal no mundo moderno e esquemas de defesa associativa
em que passamos a pensar em termos de segurança continental”.
Nos anos 70 aparece nos estudos da geopolítica brasileira Therezinha de Castro, professora
de História e Geografia do Colégio D. Pedro II.
Logo nos seus primeiros escritos na área da Geopolítica revela-se uma incansável pesquisa-
dora e uma inteligência criativa. Deixou inúmeros livros, entre os quais, na área específica da
geopolítica se destacam: “O Brasil da Amazônia ao Prata, África – Geohistória, Nossa América –
Geopolítica Comparada, Geopolítica – Princípios, Meio e Fins” sua presença foi contínua., nestes
últimos 30 anos, com artigos sobre temas geopolíticos em nossos jornais e revistas. Conferencista
entusiasta e dotada de grande poder de comunicação, ocupou com freqüência o “pódium” dos
institutos de ensino superior das Forças Armadas, tais como da Escola Superior de Guerra – ESG,
a cujo quadro de professores pertenceu e das Escolas de Estado-Maior e de altos estudos políticos
e estratégicos do Exército, Marinha e Aeronáutica. Era, habitualmente, convidada a pronunciar
confer6encias sobre temas geopolíticos na Argentina, Uruguai, Chile e Portugal. Teve vários de
seus livros traduzidos para o idioma espanhol. De todos os temas geopolíticos que Therezinha de
Castro tratava freqüentemente destacam-se” – geoestratégia do Atlântico Sul, importância estraté-
gica da ocupação da Antártica, integração do Cone Sul, Bacia do Caribe, problemas amazônicos.
Foi uma das poucas vozes pioneiras e entre elas a mais insistente, sobre a necessidade do Brasil
instalar uma base na Antártica, tendo em vista a prospectiva de sua importância estratégica num
futuro próximo, em função de sua posição de defrontação com todo o Hemisfério Sul do planeta e
por suas imensa reservas minerais e de água. Therezinha de Castro reivindicava que o Brasil parti-
cipasse territorialmente da comunidade antártica defendendo o seu direito pelo princípio de
defrontação, princípio que já fora aplicado no caso dos direitos territoriais no Ártico. Viu a sua
pregação realizar-se, quando em 1983, o Brasil instalou a Estação Comandante Ferraz, comandada
pela Marinha, na ilha Rei George, do arquipélago Shetlands.
MAPA DAS PRETENSÕES BRASILEIRAS NA ANTÁRTICA BASEADAS
NO DIREITO DE DEFRONTAÇÃO, EXTRAÍDO DA REVISTA ARGENTI-
NA ESTRATEGIA

O autor deste livro, quando ainda Tenente Meira Mattos, no final dos anos 30, teve oportuni-
dade de ler os livros de Mario Travassos. Empolgou-se por sua visão geopolítica do Brasil. Tive-
mos o nosso patriotismo eletrizado pela leitura de Travassos sobre a geografia sul-americana, os
antagonismos em confronto, a posição do Brasil nesse contexto geográfico, as sugestões sobre uma
política de comunicações e de transportes que nos trouxesse para a situação inequívoca de principal
poder continental. Passamos a estudar a geopolítica. Lemos um livro muito falado na época, “El
Factor Geográfico en la Politiva Sul Americana” de autoria do Professor espanhol Carlos Badia
Malagrida. Este livro era muito apreciado pelos argentinos porque, entre outras conclusões, consi-
derava a bacia platina (cuja maior extensão territorial encontra-se no interior do nosso país), tirani-
camente subordinada, política e economicamente, à atração hidroviária de Buenos Aires, por sua
posição privilegiada na Foz do Prata. Travassos nos seus livros “Projeção Continental do Brasil” e
“Introdução à Política de Comunicações do Brasil” propõe um sistema vial terrestre que atraísse
para os nosso portos atlânticos do Sul, o interesse das regiões platinas brasileiras, propondo, assim,
uma correção geopolítica que neutralizasse a força carreadora sobre o nosso território da rede fluvi-
al platina. Os hoje chamados “carreadores de exportação” outra coisa não são senão parte do proje-
to geopolítico de Travassos, apresentado em 1931. Nossa leituras do tenente, capitão e major de
então, não ficaram em Malagrida. Lemos os autores Backheuser e Lysias Rodrigues entre os brasi-
leiros e Ratzel, Kjéllen, Vidal de La Blache, Hausshofer e vários outros mais modernos, entre os
estrangeiros. Em 1959 publicamos o nosso primeiro trabalho sobre geopolítica, um fascículos de
72 páginas de que o Brasil já podia almejar uma escalada de poder, 30 anos depois do “Projeção
Continental” de Travassos, na apresentação deste livro escrevemos:
- “O Capitão de 1931 sonhou com um Brasil potência continental, nós lhe pedimos licença para
sonhar agora com um Brasil potência mundial”.
Neste nosso primeiro livro de geopolítica analisamos os conceitos de poder mundial expres-
sos por três respeitados pensadores da ciência política – o sueco Rudolf Kjéllen, o inglês Arnold
Toynbee e o francês Tibor Mende. Analisando o espaço e posição geográfica do Brasil, suas rique-
zas potenciais, a coesão de seu povo e sua história, além da opinião de vários autores estrangeiros,
concluímos que tínhamos condições de, no futuro, virmos nos alinhar entre as grandes pot6encias
do mundo.
Nosso segundo livro de geopolítica só veio 15 anos depois “Brasil Geopolítica e Destino”,
1975, prefaciado pelo historiador e cientista Arthur Cezar Ferreira Reis e, dois anos depois, em
1977, lançamos o “A Geopolítica e as Projeções do Poder”, que teve o prefácio do historiador e
“imortal” Luiz Vianna Filho.
Estes dois livros foram concebidos e publicados sob a influência do espírito de otimismo, de
fé nos destinos do Brasil, que dominaram o nosso povo na década de 70. Viajava-se pelo país, de
Norte a Sul, de Leste a oeste, e só se ouvia as expressões “Brasil Grande” e “Prá Frente Brasil”. O
nosso crescimento econômico beirava os 10% ao ano. Analistas e imprensa estrangeiros nos apon-
tavam como uma das próximas potências o Professor Ray Cline, Presidente do Centro de Estudos
Estratégicos na Universidade Georgetown, Washington, nas suas avaliações sobre potências mun-
diais, estimou que poderíamos vir a ocupar o 6o lugar, depois dos Estados Unidos, União Soviética,
Alemanha, França e China. O Secretário de Estado da maior potência do mundo, Henry Kissinger,
elegeu-nos como aliado preferencial dos Estados Unidos.
Nós, que em 1959, no nosso primeiro livro, havíamos viabilizado o nosso destino de potên-
cia, vimos reforçada a nossa avaliação prospectiva. Com este espírito escrevemos “Brasil Geopolítica
e Destino” e “A Geopolítica e as Projeções do Poder”.
No primeiro, examinamos os desafios do espaço brasileiro ao nosso desenvolvimento, enri-
quecimento e progresso social. Analisamos as características do nosso povo. Balanceamos as nos-
sas estratégias de segurança e defesa. Tivemos sempre presentes, como instrumentos de avaliação
estratégica, a teoria do historiador Tonybee sobre “Desafio e Resposta” e os fatores de poder polí-
tico da fórmula de Ray Cline. Eis esta fórmula:
· Pp = (C + E + M) X (S + W)
· Pp = poder perceptível
· C = massa crítica (população + território)
· E = capacidade econômica e tecnológica
· M = capacidade militar
· S = estratégia (projeto nacional)
· W = vontade nacional

Projeção Geoestratégica do Brasil


Estes instrumentos de análise e prospecção, aplicados à realidade nacional, permitiram-nos
julgar que havíamos já chegado a uma “plataforma de lançamento para alcançar o nível de potência
política. Impunha-se aos governos futuros assegurar o andamento rápido do Projeto de Desenvolvi-
mento Nacional, iniciado pelo Presidente Castelo Branco, seguido pelo Presidente Costa e Silva e
acelerado e fortalecido pelo Presidente Emílio Médici. O Desenvolvimento Nacional exigia, essen-
cialmente, uma política de interiorização, de valorização da enorme massa continental, particular-
mente a Amazônia e o Centro-Oeste carentes de uma infra-estrutura de transportes, comunicações
e povoamento. A necessidade de garantir a segurança interna e defesa externa deviam ser conside-
radas nos projetos de desenvolvimento. Consideramos que, prosseguindo no Projeto de Desenvol-
vimento, poderíamos transpor os humbrais do Ano 2000 alinhados entre as maiores potências do
planeta.
Não chegamos lá. A crise mundial provocada pela criação da OPEP, iniciada em 1973, au-
mentando substancialmente o preço do petróleo, nosso principal produto de exportação, desequili-
brou nossa economia e desritmou o Plano de Desenvolvimento. Mas, não devemos Ter errado
muito nos alvos que previmos para entra do século, erramos no tempo. Pelo menos é esta a opinião
do pesquisador e analista Roberto Pereira da Silva, em artigo publicado na revista especializada
“Parcerias Estratégicas”, dezembro de 1996., editada pelo Centro de Estudos Estratégicos, da Se-
cretaria de Assuntos Estratégicos. Conclui o articulista, depois de rever os estudos e propostas
contidas no livro “Brasil Geopolítica e Destino”, passados mais de 20 anos:
· “O General Meira Mattos como estudioso do Brasil à luz da Geopolítica e da Estratégia, foi
capaz de elaborar, na década de 70, um cenário para o ano 2000, muito próximo do que hoje se
vislumbra para 2020 e, praticamente, para uma extensão de tempo”.
No livro “A Geopolítica e as Projeções do Poder”, pensado e editado nessa mesma época de
entusiasmo desenvolvimentista da Nação, complementa e fortalece a tese de nossas possibilidades
políticas e econômicas de alcançar o nível de potência mundial.
Particularmente o estudo do poder, suas origens históricas, natureza e manifestações, caracte-
rísticas de Poder Nacional. Em seguida, reavaliamos a realidade política brasileira, os estímulos
marítimos e continentais de nosso espaço geográfico, os estímulos recebidos de fora, tentamos uma
análise norte-americana e, finalmente, imaginamos uma perspectiva da ação governamental para o
último quartel do século. Nessa perspectiva visualizamos a aceleração do Projeto de Desenvolvi-
mento Econômico e Social dentro dos padrões de um estado democrático moderno, destacando
neste Plano a necessidade de maior de progresso nos setores de transportes, educação, ciência e
tecnologia, energia inclusive a nuclear e cibernetização. Quanto à Segurança, opinamos que, asse-
gurada a paz interna, devemos dar mais atenção aos problemas de segurança externa, uma vez que,
a projeção de nosso poder resultará, fatalmente, no aumento de nossas responsabilidades e encar-
gos de defesa.
Em 1980 lançamos o livro “Uma Geopolítica Pan Amazônica”, prefaciado pelo conceituado
escritor Leandro Tocantins, autor entre outras obras de “O Rio Comanda a Vida” e “Formação
Histórica do Acre”. Animou-nos, na época, a assinatura em Manaus (1978), do Tratado Pan Ama-
zônico, firmado pelos oito países condôminos da grande bacia de 7 milhões de km2 (a bacia do
Mississipi banha 3,2 milhões de km2 e do Rio Nilo 2,8 milhões km2).
O que nos entusiasmou com a assinatura do Tratado Pan Amazônico, foi verificar que, pela
primeira vez os países amazônicos abandonavam suas prevenções e pequenas rivalidades e se uni-
am num projeto regional comum, indispensável para assegurar a elevação do padrão de vida dos
povos ribeirinhos e o progresso econômico da área banhada pela imensa calha hidrográfica. Propu-
semos-nos a fazer a avaliação geopolítica dessa região coberta por uma floresta tropical úmida (que
Humbolt chamou de Hiléia), regada por vasta trama hidrográfica, detentora da maior reserva de
água doce do planeta e, ao mesmo tempo, uma das mais despovoadas e atrasadas. Estávamos
convencidos de que somente uma estratégia comum, sustentada pela vontade firme dos condôminos
poderia levar ao êxito a iniciativa de desenvolver a região.
Uma estratégia regional visando a proteger a soberania dos países amazônicos sobre esta área
tão ambicionada internacionalmente, assegurar a preservação equilibrada de sua natureza e promo-
ver o seu progresso social e econômico, exigiria a conjunção das vontades e das ações dos países
signatários obedientes a um bem concebido plano estratégico.
Propusemos alguns elementos para este amplíssimo plano estratégico multinacional, visando
a acelerar o desenvolvimento sócio-econômico da região. Eis um resumo de nossa proposta:
- selecionar a área mais crítica da região, por que mais isolada a Amazônia Ocidental, como alvo
prioritário do plano de desenvolvimento;
- realizar a abordagem desta área, Amazônia Ocidental, partindo de três frentes – a tradicional,
saindo da foz e subindo o rio, a do planalto central brasileiro e, finalmente, descendo dos Andes
e do sistema guiano; cada país participante de cada frente se empenharia em realizar programas
de desenvolvimento nacionais que o arrastassem a fronteira econômica em direção à Amazônia
Ocidental;
- estimular nas áreas de conexão fronteirica, – Clevelândia (Guiana Francesa), Tiriós (Suriname),
Normandia (República da Guiana), BV8 (Venezuela), Auarís, Cucui e Letícia (Colômbia),
Tabatinga e Assis Brasil (Peru), Brasiléia, Porto Velho e Guarajá-Mirim (Bolívia) – no sentido
de, em torno delas, criar-se um pólo binacional de desenvolvimento social e prosperidade eco-
nômica, tomando como modelo os exemplos de convivência internacional profícua alcançados
na fronteira sul (Livramento / Rivera e Uruguaiana / Los Libres);
- estimular em toda a Amazônia Brasileira a execução de projetos e programas de transportes, de
navegação, de construção de aeroportos, de educação, saúde, saneamento básico, telecomunica-
ções, agricultura, pecuária e indústria.
AMÉRICA DO SUL
POLÍTICO
Apesar da extensão, complexidade e do vulto de investimento que exigiram os projetos ama-
zônicos dos governos Castelo Branco, Costa e Silva e Médici, a administração pública destes três
Presidentes da República conseguiu dar um grande impulso à tarefa de desenvolver a imensa bacia
do nosso “rio mar”. Nesse período nossos vizinhos muito pouco fizeram para desenvolverem a sua
região amazônica, exceptuando-se a Venezuela que construiu a Rodovia Caracas – Santa Helena na
fronteira, em frente a BV8, ligado a Boa Vista (Roraima) e impulsionou o desenvolvimento do Vale
do Rio Orinoco, que pela proximidade trouxe influência indireta à melhoria de sua linde amazôni-
ca.
Em nosso livro “Geopolítica e Trópicos” (1984) prefaciado pelo eminente sociólogo Gilberto
Freyre, focalizamos, na primeira Parte, as teorias de geógrafos, sociólogos, cientistas políticos que
proclamam a impropriedade das regiões tropicais para abrigarem uma sociedade adiantada. Em
geral, alegam duas razões: serem habitadas por raças inferiores e possuírem condições climáticas
desfavoráveis que desestimulam a criação da cultura e da tecnologia. Enfim, razões etnocentristas
e deterministas, que o historiador Arnold Tonybee, no seu estado das 21 civilizações que povoaram
a terra nestes últimos seis milênios, contesta veementemente. Para Tonybee não há raça superior,
não há clima completamente hostil, o que há é a dialética milenar entre o homem e o meio físico, –
o desafio e a resposta. Assim Tonybee sintetiza sua teoria do desafio e da resposta:
“A geografia condiciona, dificulta, sugere, inspira, estimula, enfim, apresenta o seu
desafio, cabe ao homem responder a esses desafios. Ou os responde e os supera, ou não os responde
e é derrotado.”
Terra e Homem conjugados numa equação de vontade e competência, de educação,
ambientação e de uma tecnologia adequada ao meio, são os instrumentos de uma síntese que a
história consagra como crisálida de sociedades adiantadas e de civilizações.
Na Segunda parte da obra, analisamos o desafio do trópico brasileiro, Amazônia e região do
Cerrado. Destacamos os feitos do homem brasílico no decorres de quase dois séculos e seus esfor-
ços inauditos para preservar o nosso patrimônio amazônico, criando dois grandes centros irradiadores
de progresso e mantendo incólumes suas fronteiras. Exaltamos a atuação sacrificada, competente e
operosa das Forças Armadas; presentes na região desde sua incorporação territorial ao Brasil.
Mostramos que este homem brasílico já estava prestes a vencer o desafio do cerrado tropical,
transformando-o em terra produtiva. Terminamos manifestando a nossa fé de que o homem brasílico
melhor aparelhado em educação, saúde e tecnologia estará apto a vencer o gigantesco desafio dos
trópicos.
No livro “A Geopolítica e a Teoria de Fronteiras” (1990), prefaciado pelo ilustre General
Lyra Tavares, voltamos à propostas que havíamos lançado em 1975 no livro “Brasil Geopolítica e
Destino”, alusiva à importância em fortalecer nossas fronteiras, principalmente as vazias lindes
amazônicas, já agora num contexto visando o interesse regional comum aos países vizinhos. Volta-
mos à tese da e necessidade de estimular o desenvolvimento das “as áreas interiores de intercâmbio
fronteiriço”. Animava-nos a criação, pelo governo, do Projeto Calha Norte (1985), cuja implanta-
ção vinha a corresponder às idéias que vínhamos defendendo há dez anos.
Destacamentos militares do Exército existentes na área de 1.200.000km2, que abrange os Estados
do Amazonas, Pará, Amapá e Territórios de Roraima. Asseguram a vigilância de 6.500km de fron-
teiras terrestres, com a Colômbia, Venezuela, Guiana Suriname e Guiana Francesa, estendendo-se
de Tabatinga sobre o Rio Solimões até a localidade de Oiapoque na foz oceânica do Rio Oiapoque.
Com estes seis livros, cujas idéias espraiamos, também, através de inúmeras conferências,
palestras, artigos em revistas especializadas e jornais, marcamos nosso pensamento geopolítico
durante os últimos 25 anos.
Seríamos injustos se recordando os 70 anos do pensamento geopolítico brasileiro, olvidásse-
mos do nome de autores de reconhecido valor cultural que, sem serem especializados em estudos
geopolíticos, revelaram em suas produções intelectuais admirável visão dos problemas políticos
brasileiros relacionados com a nossa geografia. Citaríamos aqui, entre os principais, os nomes de
Delgado de Carvalho, Arthur Cezar Ferreira Reism, Leandro Tocantrins, Samuel Benchimol, Jarbas
Passarinho, Gilberto Freyre, Lavanére Wanderley, Álvaro Alberto, Amerino Raposo, Mario Cesar
Flores, José Osvaldo de Meira Penna, Octávio Tosta e Shiguenoli Miyamoto.
Síntese
Reunindo e integrando o pensamento geopolítico de nossos autores manifestado nestes últi-
mos 70 anos, encontramos os seguintes rumos, muitos deles coincidentes entre as proposições de
vários pensadores:
- a idéia de Império, inspirada na grandeza territorial e na missão de desbravá-la, dominou o
espírito de vário pensadores;
- a necessidade de uma política de interiorização, visando a incorporar a imensa massa continen-
tal inexplorada ao processo de enriquecimento e de fortalecimento do Poder Nacional;
- nesta política, acentuada prioridade vem adquirindo a consciência da importância do desenvol-
vimento e da defesa da região amazônica;
- a vantagem de nossa maritimidade estará sempre assentada numa respeitada presença estratégi-
ca no Atlântico Sul;
- o desenvolvimento aeronáutico, (transporte, vigilância e defesa) face à extensão geográfica do
país, constitui-se em fator indispensável à integração territorial;
- em termos gerais, impõe-se uma política de desenvolvi-mento econômico, social, científico e
tecnológico em benefício de todo o território;
- prevalece o reconhecimento de que o Brasil possui condições para vir a ser uma das grandes
potências de nível mundial para chegar a isto precisará melhorar o seu desempenho administra-
tivo e acelerar o seu desenvolvimento econômico e social;
- em face das ambições internacionais suscitadas pelo seu imenso patrimônio geográfico e suas
riquezas inexploradas, o Brasil precisa manter uma força militar de dissuasão estratégica, capaz
de desencorajar possíveis tentativas de aventura sobre o seu território.
-
- (*) General do Exército Reformado e Conselheiro da Escola Superior de Guerra

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