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Fichamento Antropologia e Cinema Marc Piault

Introdução:
“A antropologia visual não é apenas um lugar de produção com e por imagem e som,
ela leva em conta os processos dessa produção no interior de uma reflexão
epistemológica sobre o próprio desenvolvimento da disciplina. Enfim, ela se questiona
sobre as imagens produzidas, externamente a um projeto que participe
deliberadamente da sua área, em lugares e tempos específicos, imagens
eventualmente pertinentes como dados para análise de uma situação particular e/ou
significativos para uma interpretação de modos de abordagem de uma formação
social.” P.20

1. Nascimento do cinematógrafo, nascimento da antropologia.


“O fim do século XIX foi, com efeito, marcado pelo desenvolvimento simultâneo de
duas instrumentalizações de tempos culturais e espaços sociais: tanto o cinema como
a etnologia alcançam horizontes longínquos, onde são perceptíveis as maiores
distancias físicas, mentais e comportamentais em relação ao que parece então o lugar
central de referência e que se poderia, sem muito erro, identificar como ‘mundo
branco’. ” p23

“Para além de uma simples descrição instrumental, é a resposta do cinema à oposição


insuperável, e, portanto, necessariamente superada, entre o descontínuo e contínuo,
entre o imóvel e o movimento: A passagem da representação fotográfica à
transposição em imagem do movimento desvela a centralidade da relação espaço
tempo. Essa oposição, paradoxalmente irredutível e, no entanto, superada está no
cerne de um questionamento antropológico ainda recentre: insuperável, não
dialetizável, ele revela a necessária mediação, na vivência, do afeto e do sentimento,
da emoção e das formas de expressão e de comunicação não verbais.” P. 25

“Formulações filosóficas do séc. XIX, para além de contradições entre seus autores,
exprimem uma mesma preocupação de abarcar e de compreender o mundo como
totalidade”p.25

“Há , no decorrer do séc. XIX, uma tentativa de colecionar e apreender o mundo, para
reduzir sua aparente diversidade a uma ordem única de classificação mais ou menos
dominadas pela ideia-força do evolucionismo [...] de todo modo, e sem dúvida
desencandeada pelo expansionismo unificador de tempo, uma espécie de obsessão
inventarial anima os pioneiros do cinema e da etnografia: ela se articula no modelo das
ciências naturais e apoia seu projeto de apreensão totalitária do mundo na afinação de
técnicas instrumentais produzidas graças, sobretudo ao desenvolvimento da química,
da óptica e da mecânica.” P27

Ö progresso permite manter a ideia de uma unidade última da Civilização, ao


reconhecer que a diferença é apenas a distância, seja ela espacial ou temporal. P27

Acumulam-se curiosidades e exotismos do planeta para melhor mensurá-los segundo a


normalidade histórica ocidental. P29
As sociedades que a exploração descobre tornam-se imagens fotográficas e depois
cinematográficas suscetíveis de ser transportadas, editadas, montadas, referidas e,
sobretudo, comentadas em relação ã posição de um espectador cuja centralidade e
cujo caráter de referencialidade essencial não são questionados. p 29

A imagem animada (e quase simultaneamente a capacidade de registrar o som) capta


o transitório da duração, supera a subjetividade do testemunho duvidoso dos viajantes
de longa distancia, suprime os desvios especiosos da memória: os momentos fugidios
da vivência, as singularidades e as diferenças do Outro tronam-se transportáveis e,
portanto, observáveis a vontade, como o obelisco Luxor, as múmias do Egito ou os
afresco de Partenon”. p30

A apresentação de uma observação dinâmica e totalizante, a passagem ‘pelo campo’ e,


portanto, a experimentação faz do cinema e da etnografia irmãos gêmeos de um
empreendimentos comum de descoberta, identificação, apropriação e talvez absorção
e assimilação do mundo e de suas histórias. P30

A gravação por imagem e som, assim como o empreendimento de categorização


etnográfico, contribui para os mesmo efeitos: absorver a distância material do outro e
reduzi-lo a imagens e a conceitos de que se alimentam meu olhar e minha mente. 31

Desde o inicio o cinema busca abarcar o que é o objeto da etnologia: as práticas do ser
humano nas relações que ele estabelece e enuncia com seus semelhantes e com o
ambiente que o situa e do qual dispõe. P 31

Identificação e distinção são as operações são as operações constantemente em ação


e das quais o balanceamento equilibrado garante uma dinâmica de existência, de
descoberta, de invenção, realização, um espaço do exercício do que se pode chamar
liberdade. Por meio dessas operações se elabora um dos constituintes essenciais de
qualquer relato, seja ele cinematográfico ou narração de experiência etnológica: o
personagem filmado ou a pessoa em sua autoctonia antropológica: o personagem
filmado ou a pessoa em sua autoctonia antropológica são construídos, de um lado, no
decorrer de um processo atributico e qualificativo de caracterização e, de outro lado,
mediante uma operação distintiva e de identificação em relação às outras figuras de
compreensão e no âmbito de uma simulação relativa. P31

“Sugiro de boa vontade que ela tome como ponto de partida a pertinente e
aparentemente misteriosa observação de Pier Paolo Pasolini: ‘a vida inteira, no
conjunto de duas ações, é um cinema natural e vivo: nisso, ela é linguisticamente o
equivalente da língua oral em sue momento natural ou biológico’. A capacidade de a
ação cinematográfica (digamos antes, em sentido lato, audiovisual) produzir a
realidade e não apenas transcrever, traduzir ou reproduzir a realidade do real, é posta
como uma possibilidade de uma linguagem, no sentido da linguística, isto é, como
sistema geral, e não na banalidade instrumental de um meio de expressão. [...] essa
produção de realidade é ainda apenas uma aproximação: há com efeito em nossa
cultura marcada pelo racionalismo cientifico a tentação de definis os objetos em vez
de avançar na elucidação de uma intenção, no esclarecimento de uma conduta, na
identificação de orientações e na aplicação de processos relacionais e dialógicos. O
cinema eu nos concerne inventa, como dizia justamente Jean Epstein há já cinquenta
anos, uma imagem plausível do Universo.”p 33

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