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É nesse movimento que situo esse ensaio fotográfico enquanto uma experiência
etnofotográfica. Uma experiência que não está relacionada a qualquer experimentação
ou experimentos como nos habituamos a ouvir. É uma experiência no sentido que
Larrosa (2002) nos provoca a pensar quando afirma que “experiência é o que nos passa,
o que nos acontece, o que nos toca” (2002, pg. 21). Para Larrosa (2002) o saber da
experiência não diz respeito à verdade das coisas, mas sobre o sentido que atribuímos ao
que nos acontece. Assim, as imagens ora apresentadas não são registros de coisas,
pessoas ou lugares, mas a minha experiência com as pessoas e com o lugar. É um
desvelar das vivências particulares e subjetivas com a feira do Juaba e tudo que nela há.
Como dizia o poeta, “para cantar é preciso perder o interesse de informar” (BARROS,
2010), uma vez que a melodia possibilita o voo, bem como as imagens corporificam
narrativas.
Considero, portanto, a fotografia não enquanto técnica, mas como linguagem e,
ao mesmo tempo, como arte que possibilita narrar a experiência. Os ângulos, as
composições, as cores ou a ausência delas, a nitidez ou a não nitidez não são escolhas
estéticas ou apenas um aplicar de técnicas, contudo se constituem como um esforço
poético de aproximar o visto do percebido/sentido. Se a fotografia é escrever com a luz,
considero a poesia como uma espécie de iluminar de sentimentos, pois sem sentimentos
não há poesia. Percebo, então, a fotografia e a poesia de maneira indissociáveis, haja
vista que a narrativa imagética é poética na medida em que expresso os meus
sentimentos, vivências e experiências naquilo que registro.
Nessa perspectiva, aproximo, situo, a narrativa tal qual Walter Benjamin nos
ensina a percebê-la:
a narrativa que durante tanto tempo floresceu no meio de Artesão- no campo
do mar e na cidade-, é ela própria, num certo sentido, uma forma artesanal de
transmissão. Ela não está interessada em transmitir o “puro em si” da coisa
narrada como uma informação de um relatório. Ela mergulha a coisa na vida
do narrador para em seguida retirá-la dele. Assim se imprime na narrativa a
marca do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso. (Benjamin, 1985,
p. 2005)
A intensa movimentação tem início por volta das 5h da manhã. Barcos chegam
no porto trazendo, principalmente, a produção extrativista das águas e florestas. Açaí,
castanha, camarão e peixes são os principais produtos do trabalho das comunidades
ribeirinhas e da região das ilhas do distrito. Os ramais ligam as comunidades de terra
firma à vila de Juaba. São dezenas de comunidades que trazem à feira hortaliças, frutos,
carne de caça e, principalmente, os derivados da mandioca, a exemplo dos diversos
tipos de farinha (farinha d’água, farinha seca, farinha mista, farinha branca, farinha de
tapioca, tapioca em ramos e muitos outros produtos. Cabe ressaltar, a importância das
comunidades dos Territórios Quilombolas do distrito, sobretudo comunidades como
Tomásia e Itapocú, na produção e comercialização da mandioca e seus derivados no
território.
A narrativa imagética foi construída nos meses de março e abril de 2022 durante
o desenvolvimento de pesquisa que buscava compreender a feira do Juaba enquanto
estratégia de reprodução social camponesa no território. Após concluída a pesquisa,
percebi que ainda restava algo a dizer, mas não com palavras, mas a partir de uma outra
forma de expressão. Uma escrita imagética pensada na transgressão emergencial da
sociedade moderna em dizer tudo em poucas linhas, na qual a imagem transborda de
palavras, sentimentos, sensações e impressões. É isso que busco.
A narrativa imagética
Fotografia(s)
Imagens para além do que os olhos podem ver,
O reconhecimento de que trabalhar com
a linguagem da arte
Significa trabalhar com outro mundo possível.
Encantemos!
Lori Figueiró
Agradecimentos
À todas as pessoas que fazem da Feira livre do Juaba um extraordinário e privilegiado
lugar da experiência. Durante esses dias pude vivenciar e perceber os olhos curiosos e
receosos para alguém “de fora” com uma câmera na mão e um caderno de anotações na
outra, se transformar em olhares de reconhecimento acompanhados por “olha o
professor das fotos voltou”/”Só quero ver essas fotos depois, hein!”. Meu muito
obrigado pela receptividade, pelas conversas, pelas explicações e, principalmente por
terem permitido escrever com as imagens essa experiência.