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CDU 7
CONTINENTE MÃE 5
Continente Mãe
Continente Mãe é uma série que traz diferentes Atualmente, dezenas de congados/reinados,
expressões da cultura afro-brasileira. Conhecer, com suas guardas, mantêm a riqueza dessa
valorizar e divulgar a riqueza dessa cultura é tradição por meio de festejos. Uma das pinturas
importante para refazer a nossa relação com o homenageia Tizumba, músico mineiro e também
Continente Mãe. capitão da guarda da Irmandade Os Carolinos.
A diáspora fez com que o africano deixasse Outras formas de expressão cultural foram
para trás crenças religiosas, costumes, famílias originadas a partir da dança das tribos africanas.
e sua convivência por muitas gerações. Já na A dança afro-brasileira, por exemplo, apresentou
travessia, em meio ao sofrimento a bordo do crescimento durante o período colonial, quando
navio negreiro, tinha que escolher adaptar-se era praticada pelos escravizados. O bumba meu
para poder sobreviver. Para que isso ocorresse, boi, outra manifestação popular, teve origem
sua identidade tinha que ser refeita, mesmo na tradição ibérica trazida pelos colonizadores
em meio a tantas provações. Um sentimento portugueses, misturando-se à nossa cultura.
de profunda tristeza e saudades da terra natal,
chamado banzo, permeava a fase inicial da vida Esta exposição visa mostrar um pouco do Con-
do escravizado. gado, da dança afro e do bumba-meu-boi. São
pinturas em óleo sobre tela que partem de uma
O papel de acolhimento destes recém-chegados pesquisa realizada acerca do Congado, espe-
coube às irmandades religiosas, como é o caso cialmente o mineiro, entre 2016 e 2019. A série
da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, de pinturas teve como referencial um banco de
que esteve presente em todas as vilas, distritos fotos que produzi a partir da visitação a diversos
e paróquias onde houve escravidão no Brasil. cultos e festas ocorridos em Minas Gerais. Outro
Mesclando os cultos católicos, surge o Congado referencial foram as fotos produzidas pelo fotó-
ou Reinado, que, por meio da dança, música e grafo Tiago Aguiar sobre o Congado do Serro.
muitas cores, representa passagens históricas,
como a coroação de um rei do Congo, e também
presta homenagem a vários santos católicos,
especialmente a Nossa Senhora do Rosário. Lúcia Araujo
CONTINENTE MÃE 7
Retratos de
manifestações
afro-brasileiras
A mostra Continente Mãe, de Lúcia Araujo, é o sente no Congado enquanto um ritual coletivo afro no tecido amplamente composto da socie-
resultado plástico do interesse e fascinação da de resistência negra, numa segunda camada dade brasileira. Sob esse aspecto salienta-se
artista pela riqueza cultural e visual do Congado de percepção, algumas das obras apresentam ainda o resultado final da exposição como uma
e de outras manifestações afro-brasileiras. Uma uma rica pesquisa em retrato que revela os pesquisa de muito envolvimento da artista com
pesquisa em pintura que eclode do envolvimento personagens sob uma ótica de muita intros- os grupos aos quais passou a pertencer como
de Lúcia, a partir de sua atuação como psicó- pecção e verdade. A pintura de retrato como forma de desconstruir as distâncias e ideias
loga em estudos originalmente focados sobre um gênero estabelecido ao longo da história preconcebidas.
aspectos do racismo no Brasil, a levou a entrar da arte se fundamenta na arte contemporânea
em contato e se apaixonar por esta cultura, pas- não apenas como um registro da imagem do Num momento em que se discute intensamente
sando a participar de festas e cultos. retratado, mas como um gênero que se instala a presença do negro na arte, não como ele-
no campo lacunar do poético, que a impreci- mento da representação artística, mas no lugar
A exposição apresenta uma série de retratos em são do meio da pintura pode de forma potente do artista, num momento em que as narrativas
pintura de personagens registrados pela artista tornar visível. históricas são revisadas na contestação da
ao longo do tempo em que passou a frequentar, narrativa eurocêntrica como verdade, a mostra
ter aulas de tambor e a participar das apresenta- As obras são compostas com pinceladas de Lúcia Araujo, artista branca que sente a
ções do músico Maurício Tizumba, que também expressionistas e têm as composições defini- afro-brasilidade como um caráter indissociável
é Capitão da Guarda da Irmandade Os Caroli- das com dois tratamentos pictóricos sutilmente de sua brasilidade, pretende somar discursos
nos, em Minas Gerais. A mostra tem ainda como diferenciados. Um tratamento pesado, com e promover avanços na desconstrução de um
parte de sua apresentação uma instalação na uma paleta cromática fechada para retratar a racismo estrutural que não pode estabelecer
qual papéis coloridos, que remetem ao Con- diversidade tonal da pele preta numa dimensão novos muros.
gado, são dispostos no teto da sala expositiva, individual e afetiva, e uma outra paleta variada
criando uma experiência sensorial que leva o e cromaticamente aberta, com grandes con-
espectador a sentir-se parte do ritual festivo. trastes para representar as cores vivas dos
adereços e vestimentas utilizados nos festejos. Alan Fontes
As pinturas da exposição podem ser divididas Esse jogo de tratamentos reforça o caráter
em dois momentos: se sob o aspecto geral re- identitário da pesquisa da artista, que pretende Artista, pesquisador e professor de pintura
presentam e documentam a riqueza visual pre- evidenciar a riqueza e contribuição da cultura na Escola de Belas Artes da UFMG
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Tanga
Óleo sobre tela
80 x 120 cm
2017
Mandinga Batuque
Óleo sobre tela Óleo sobre tela
80 x 100 cm 60 x 90 cm
2017 2016
Estandarte
Técnica mista
53 x 115 cm
2018
Na página ao lado:
Marujo
Óleo sobre tela
60 x 80 cm
2017
Na página ao lado:
Tambor
Óleo sobre tela
70 x 100 cm
2018
LÚCIA ARAUJO 22
O que eu sei da verdade histórica deste país?
Lúcia Araujo
27
Na página anterior: Angola Na página ao lado:
Óleo sobre tela
Banzo 90 x 90 cm Bumba meu Boi
2016 Óleo sobre tela
Óleo sobre tela
70 x 90 cm
80 x 120 cm 2018
2016
LÚCIA ARAUJO 28
Na página ao lado: Abará
Óleo sobre tela
Guarda de Moçambique 60 x 80 cm
Óleo sobre tela 2016
100 x 100 cm
2017
Instrumentista, cantor, compositor, ator e em- Mas se com a pintura dela, se com a arte dela,
preendedor cultural brasileiro nascido em Mi- ela conseguir devolver alguma coisa para o nos-
nas Gerais, com carreira artística estabelecida so povo preto, tá valendo, Lúcia! Pinte! Borde!
desde 1973. Capitão da Guarda da Irmandade Pinte o sete e vai ser feliz! Devolva o que puder
de Nossa Senhora do Rosário Os Carolinos. para o nosso povo preto e vai ser feliz!!!!
Tizumba
Tizumba Capitão da Guarda
Óleo sobre tela
70 x 90 cm
2018
///////// EXPOSIÇÕES