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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ

PROCESSUAL OBJETIVA

O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ PROCESSUAL OBJETIVA


Revista de Processo | vol. 126/2005 | p. 59 - 81 | Ago / 2005
DTR\2005\548

Antonio do Passo Cabral

Área do Direito: Processual


Sumário:

1. Introdução - 2. O contraditório como direito da parte de informação-reação no processo - 3. O


contraditório como dever: a colaboração e participação dos sujeitos do processo - 4. Se o
contraditório é uma garantia, como pode impor deveres? A dimensão objetiva dos direitos
fundamentais. O imperativo constitucional da boa-fé no Brasil e no direito comparado - 5. As normas
jurídicas acerca da ética processual no CPC - 6. O carnaval procedimental. Boa-fé x ampla defesa -
7. O conceito de boa-fé processual objetiva - 8. Conclusão - 9. Bibliografia -

1. Introdução

Consagrado no art. 5.º, LV, da CF/1988 (LGL\1988\3), o princípio do contraditório ilumina toda a
sistemática processual, sendo freqüente a afirmação de que inexiste processo sem contraditório. O
princípio encontra guarida em normas internacionais referentes a direitos fundamentais e muitos
autores consideram-no decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, já que, no
processo, não pode o homem ser transformado em mero objeto, mas antes exercer papel ativo de
sujeito processual.1

O princípio do contraditório possui paralelos em inúmeros ordenamentos jurídicos ao redor do mundo


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e no Brasil não foi contemplado nas Constituições de 1824, 1891 e 1934. Curiosamente, apenas
ganhou assento constitucional com a Carta outorgada de 1937, em seu art. 122, §11. Todavia, a
fórmula então adotada pelo legislador constitucional limitava o espectro de aplicação do princípio ao
processo penal, o que se manteve nas constituições de 1946 e 1967. Somente a Constituição
Federal de 1988 ampliou o contraditório aos processos civil e administrativo, vestindo a cláusula da
sua indumentária atual: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral, são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

Contradizer significa manifestar-se contrariamente, em sentido oposto. O significado literal do


princípio nos idiomas de origem latina fornece-lhe conotação que por vezes ofusca a real
compreensão de seu alcance. Sem embargo, nos ordenamentos de origem germânica, evita-se a
idéia de contrariedade de interesses e se utiliza a cláusula "direito de uma oitiva jurídica" (Anspruch
auf rechtliches Gehör), previsto, por exemplo, no art.103 da Grundgesetz alemã, em consonância
com o artigo X da Declaração Universal dos Direitos do Homem e art.8.º da Convenção Americana
de Direitos do Homem (Pacto de São José da Costa Rica). Trata-se de a fórmula de grande
simplicidade e notável densidade normativa: direito a uma justa audiência, o direito de ser ouvido.

Embora classicamente definido no Brasil como direito da parte e vinculado à contraposição de


argumentos antagônicos, o contraditório assume atualmente outras feições, vendo ampliada sua
concepção, como se verá, no sentido de importar em deveres de colaboração dos litigantes e de
participação do juiz em verdadeiro debate judicial.

2. O contraditório como direito da parte de informação-reação no processo

Desde o direito romano, o brocardo audiatur et altera pars estampava a dialeticidade ínsita ao
processo. Aos argumentos de uma parte contrapõem-se as alegações da outra, extraindo o juiz,
deste embate, a síntese que corresponde à decisão.

O ambiente dialético em que se desenvolve o processo impõe que se permita a manifestação das
partes em momento precedente ao ato decisório. A audiência prévia legitima o decisum. Assim,
muitos identificam o contraditório como decorrência do postulado do Estado de Direito, pois se trata
de uma exigência quase intuitiva e que povoa o sentimento social: só pode haver imposição de uma
decisão a determinada pessoa se lhe são asseguradas possibilidades de defesa.

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No campo do direito processual, o exercício de poder estatal, que se manifesta dentro de um


procedimento pré-estabelecido, demanda a existência de garantias constitucionais para as partes,
que sob a batuta regente do devido processo legal, asseguram a higidez da decisão final.3O
resultado do ato de poder jurisdicional legitima-se se exercido dentro dos ditames da legalidade do
procedimento e com a participação dos sujeitos envolvidos no conflito. O exercício do poder não
pode ser arbitrário e sua legitimação decorre do procedimento participativo. Proíbe-se o arbítrio,
somente sendo legítima uma decisão coercitiva caso haja participação daqueles que podem sofrer
suas conseqüências.

Comumente definido como o direito de desempenhar um papel ativo no processo, o contraditório


abarca não só o conhecimento dos atos processuais praticados ou pendentes de realização, como
também a possibilidade de pronunciamento a respeito. Compreende o direito de presença e de ser
comunicado dos fatos processuais; abrange as faculdades de contra-argumentar, examinar os autos
do processo, dirigir requerimentos ao Estado-juiz, formular perguntas a testemunhas e quesitos
periciais, sustentar oralmente em audiência, em grau de recurso ou no plenário do Tribunal do Júri,
dentre outras. A ratio do contraditório é permitir oportunidades de reagir ou evitar posições jurídicas
processuais desfavoráveis. Identifica-se, portanto, um binômio essencial em torno do qual gravita o
princípio: informação-reação - o contraditório significa audiência bilateral.

O primeiro braço deste binômio é o direito de informação (Recht auf Benachrichtigung).Com efeito, o
contra-ataque de um dos sujeitos do processo depende da ciência necessária do gravame sofrido ou
potencial, sendo absolutamente imperativo o conhecimento acerca da realização e conseqüência dos
atos processuais, materializado pelos mecanismos de comunicação previstos no processo,
notadamente a citação, as intimações e as cartas (rogatória, precatória e de ordem).

Ligado à ciência dos atos está o segundo pólo que compõe o núcleo essencial do princípio, a
garantia de expressão (ou de reação) no processo (Recht auf Äusserung). As partes têm direito de
manifestar-se sobre os elementos fáticos e jurídicos contidos nos autos, sendo-lhes facultadas as
vias oral e escrita através de seus advogados ou mesmo pessoalmente quando dispensada a
capacidade postulatória. E, se por um lado, a informação aos interessados é imperativa, cabe frisar
que sua reação é apenas possível, visto que, em homenagem à liberdade das partes, não se pode
impor o exercício de um direito como o contraditório. Pense-se no exemplo da revelia, em que o réu,
apesar de citado (e, portanto, informado do ajuizamento da demanda), não oferece contestação. O
direito de expressão é uma porta aberta franqueada à passagem: entra quem quiser.4

Muito embora o acerto conceitual das idéias até aqui expostas, a abrangência do princípio limitada
às partes interessadas e confinada aos domínios da garantia de ciência-reação denota uma visão
individualista do processo. A doutrina italiana, por exemplo, a reboque da definição do art. 101 do
Codice di Procedura Civile, adota majoritariamente concepção do contraditório ligada aos efeitos que
a decisão venha a produzir, vinculando seu exercício a um potencial prejuízo que a parte possa
sofrer com ela. Carnelutti afirma que a direção oposta dos interesses dos litigantes justifica o
contraditório5e Calamandrei propagou o formato bilateral e egoísta do "processo como jogo".

Com efeito, a decisão não vincula senão aqueles que atuaram como parte no processo, podendo
dele participar e tentar evitar posições desfavoráveis, o que se estampa nos limites subjetivos da
coisa julgada (art. 472 do CPC (LGL\1973\5)). Todavia, a conexão necessária entre o contraditório e
o interesse ou prejuízo individual das partes ou terceiros importa em severas limitações aos
contornos que o princípio assume atualmente. A própria sistemática das ações coletivas aponta
neste sentido, consagrando a técnica da legitimidade extraordinária com a correspondente
vinculação coletiva à decisão proferida apenas com a participação do substituto processual (art. 103
do CDC (LGL\1990\40)). Ademais, em inúmeros casos em que inexiste conflito de interesses
(veja-se, por exemplo, alguns procedimentos de jurisdição voluntária), todos os sujeitos são
igualmente chamados a exercer o contraditório. Como justificar o debate judicial na oposição de
interesses?

Decerto que o contraditório representa potente garantia de manifestação das partes e jamais
pretenderíamos negar esta relevante função. Porém, como se verá a seguir, o contraditório encontra
outras aplicações que o afastam das noções patrimonialistas e individualistas, notadamente sua
configuração como dever (em sua dimensão colaborativa para as partes e participativa para o
magistrado).6

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3. O contraditório como dever: a colaboração e participação dos sujeitos do processo

As plurais funções do princípio do contraditório não se esgotam na sua compreensão como direito de
informação-reação. Além de representar uma garantia de manifestação no processo, o contraditório
impõe deveres.

Nota-se, no cotidiano forense, que a participação das partes presta relevante contributo para o labor
jurisdicional. Sem embargo, a participação não só tem o escopo de garantir que cada um possa
influenciar na decisão, mas também tem uma finalidade de colaboração com o exercício da
jurisdição. Dinamarco afirma que "o juiz exerce a jurisdição com a colaboração das partes" e essa
dialética processual acaba revertendo em prol da "boa qualidade da prestação jurisdicional".7

Todos os sujeitos processuais devem ser co-responsáveis pela condução do processo e pela
manutenção da higidez da relação processual.8Como já ressaltamos em outra oportunidade, a lide
terá a solução mais justa e o direito objetivo será tão mais resguardado quanto maior for a
participação dos atores do processo:

"O contraditório assume função ainda mais nobilitante: a participação deixa de ser apenas indicativo
de justa possibilidade de manifestação para configurar colaboração para uma solução justa. O
processo é uma atividade de sujeitos em cooperação e a 'co-participação' das partes na formação do
decisum é uma 'exigência' decorrente do princípio constitucional do contraditório."9

Certamente que, até quando exercitado, vale dizer, até o momento em que a parte se pronuncia no
processo, o contraditório representa o direito (ou garantia) de ter ciência dos atos processuais e ver
suas considerações apreciadas pelo órgão judicial. No entanto, uma vez provocada a jurisdição, a
garantia ultrapassa tais fronteiras e cede espaço para um objetivo maior, que é a participação
colaborativa nas decisões estatais, fato que justifica a repressão às condutas de litigância de má-fé e
aos atos atentatórios à dignidade de justiça (arts. 14 a 18, e 600 do CPC (LGL\1973\5)). Se participar
é garantido, a atuação deve ser ética, consentânea com os objetivos estatais da jurisdição.10

O contraditório não pode ser exercido ilimitadamente. O Estado tem, portanto, o direito de exigir das
partes retidão no manuseio do processo - instrumento público -, ao qual está relacionado o dever de
atuação ética, de colaboração para a decisão final.11

Além da obrigação das partes em contribuir eticamente para a resolução do conflito, o contraditório
impõe ainda um dever ao juiz, no sentido de instalar verdadeiro debate judicial sobre as questões
discutidas no processo.12 Desde há muito foi superada a visão de que o magistrado não deveria
empreender esforços no campo probatório para não ferir sua imparcialidade, concepção dominante
há algumas décadas13 e que ainda prevalece nos ordenamentos do common law, onde vigora o
adversarial system com uma maior passividade do julgador. Ao contrário, perceberam os
processualistas a necessidade de postura ativa do juiz para a busca da verdade real, afastando a
aplicação irrestrita do princípio dispositivo, e não apenas na atividade probatória.

Atualmente, ganha vigor a tese de que é dever do magistrado a condução do processo para um
palco de discussão e interação constantes. O contraditório é o elemento que fornece ao processo
este aspecto discursivo, por força de um mandamento constitucional do diálogo judicial (
Verfassungsgebot zum Rechtsgespräch) entre partes e órgão julgador para a formação do juízo do
magistrado.14

4. Se o contraditório é uma garantia, como pode impor deveres? A dimensão objetiva dos
direitos fundamentais. O imperativo constitucional da boa-fé no Brasil e no direito comparado

A Constituição da República (LGL\1988\3) de 1988 não traz expressamente uma obrigação das
partes à ética processual. A constituição espanhola de 1978, ao revés, prevê a colaboração
processual como um dever em seu art. 118.15 Cabe, portanto, a seguinte indagação: existe realmente
um mandamento constitucional do diálogo judicial que decorra do contraditório?

Com efeito, apresentam-se-nos fortes opositores na doutrina à tese aqui defendida, tendo em vista
ser o contraditório um direito ou garantia protetiva das partes - dos "litigantes e acusados" como
afirma o art. 5.º, LV, da CF/1988 (LGL\1988\3) - e seria, portanto, inconcebível imaginá-lo como
gerador de obrigações processuais quando seu formato de direito subjetivo lhes confere uma
pretensão a uma situação jurídica de vantagem. Alguns autores afirmam que até se pode dizer que a
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colaboração e argumentação contribuem para a obtenção de uma decisão mais aprimorada. Mas
isso seria um efeito ou conseqüência da aplicação constante do contraditório, inexistindo porém um
dever de cooperação que decorra diretamente do princípio, podendo ser atingido este resultado
apenas por via reflexa.16

Não obstante, cabe destacar que, ante a consagração do contraditório como direito fundamental na
atual Constituição da República (LGL\1988\3), pensamos equivocada esta construção doutrinária.
Sem embargo, os direitos fundamentais não equivalem ao direito subjetivo como classicamente
definido no direito privado: ao direito do credor conecta-se indissociavelmente um dever correlato do
devedor. No campo dos direitos fundamentais, apresenta-se tal formato privatista manifestamente
insuficiente.17

Os direitos do homem possuem, ao lado de sua face subjetiva, aproximada dos contornos civilistas
descritos, uma dimensão objetiva, que significa a consagração dos valores nucleares do sistema
normativo, a essência axiológica do Estado de Direito. Segundo Hesse, os direitos fundamentais
encampam os bens mais sensíveis à vida em comunidade (Grundelemente objektiver Ordnung des
Gemeinwesens), positivando o complexo de valores constitucionais básicos. Isso implica que o bem
tutelado pela normativa de direitos do homem seja enxergado como diretriz valorativa, como valor
em si, que deve ser incentivado e protegido pelo Estado e todos os segmentos sociais. Esta eficácia
objetiva dos direitos fundamentais importa em dispersão de seus preceitos por todo o ordenamento,
sendo válidos para todas as relações jurídicas e desvinculada sua aplicação de qualquer limitação
subjetiva de quem os poderia invocar. A dimensão objetiva dos direitos humanos reforça a própria
validade destes direitos, já que reafirma sua teleologia e conteúdo.18

Ademais, essa força objetiva justifica "restrições aos direitos subjetivos individuais, limitando o
conteúdo e o alcance dos direitos fundamentais"19 dos demais indivíduos em favor dos valores
constitucionais neles próprios consagrados. Assim, desnecessário afirmar que a formulação do
contraditório como "direito" ou "garantia" não impede que, deste princípio, derivem deveres
objetivamente considerados na tela publicista em que hoje é desenhado o processo.20

Neste sentido, o Code de Procédure Civile francês, em seu renovado art.16, estabelece um dever do
magistrado de fazer observar e observar ele mesmo o contraditório, permitindo um "debate" entre as
partes e órgão jurisdicional em torno dos argumentos constantes dos autos. E vai além, proibindo o
juiz de decidir com base em argumento ou questão de direito - ainda que suscitável de ofício - sem
que tenha previamente ouvido as partes a respeito.21

Em sentido semelhante, foi modificado recentemente o § 139 da Zivilprozessordnung alemã,


estabelecendo obrigação semelhante para o magistrado. A antiga redação do dispositivo já
consagrava o denominado Hinweispflicht, dever do julgador de provocar as partes a esclarecer todos
os fatos relevantes para a decisão, de externar a mudança de sua visão jurídica a respeito de uma
questão discutida, bem como se fosse julgar contrariamente ao entendimento jurisprudencial
dominante.22 Na sua nova redação, a norma reforça a idéia de debate,23 proibindo que o órgão
jurisdicional julgue certa matéria controvertida com fundamento em ponto de vista valorado e
argumentado de maneira diversa de ambas as partes (ou por elas reputado irrelevante), sem que
antes lhes permita manifestação a respeito, e mesmo aquelas questões que poderiam ser
conhecidas ex officio.24 Imagine-se a decadência do direito em discussão. Se não foi alegada pelas
partes, não poderia o juiz julgar o mérito no sentido do seu reconhecimento.

Do que até aqui foi exposto, podemos formular dois vetores de trabalho para as considerações
seguintes: a) no Brasil e no direito comparado vem sendo vencedora a tese de que deve existir um
debate judicial ético, com a correta utilização dos instrumentos do processo; b) a concepção do
contraditório como fonte de deveres processuais eleva ao patamar da Lei Maior a base normativa
para justificar a boa-fé processual objetiva no ordenamento brasileiro, um imperativo constitucional
da conduta ética dos sujeitos processuais.

5. As normas jurídicas acerca da ética processual no CPC

Direito e ética possuem inapartável núcleo comum em razão das condutas humanas a que visam e,
embora haja fronteiras delineáveis entre moral e direito, não se pode admitir a subsistência de um
direito imoral. Ao contrário, posto que sejam conceitos independentes, o direito deve abraçar a moral
e a garantir.25 Aristóteles, que muito se dedicou ao estudo da ética, afirma que "a justiça é
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freqüentemente considerada a mais elevada forma de excelência moral".26

De fato, as esferas do direito e da ética possuem interseção que será tão mais alargada quanto for a
observância espontânea das normas morais pelos membros de uma coletividade. No entanto, na
medida em que as normas morais são inobservadas, é necessária atuação estatal para
consolidá-las, transformando deveres éticos em normas jurídicas.27 O direito processual, instrumento
de atuação desses preceitos jurídicos, torna-se um moderador da moralidade social, uma espécie de
superego social, como já afirmamos em outra sede.28

Com efeito, a superação das concepções privatistas do processo e a ascensão de sua face publicista
sinalizaram no sentido de que o processo é um instrumento de que se utiliza o Estado
precipuamente para finalidades públicas,29 e não uma ferramenta sujeita ao alvedrio das partes
litigantes. Certamente que o interesse privado provoca a jurisdição, mas esta opera para manter ou
restabelecer a ordem jurídica. E então se justifica a busca por retidão no manuseio dos mecanismos
do processo.

Tal constatação é especialmente importante no Processo Civil, que, por características próprias,
sempre foi encarado sob uma ótica privatista diante da possibilidade dos particulares poderem, em
regra, dispor livremente dos seus interesses materiais.30

Trata-se do chamado "liberalismo processual",31 que se encontra em patente obsolescência. Tal


sistemática dispositivística32 reflete o caráter individualista do processo, que não mais se harmoniza
com a dimensão social que o instituto assumiu.33 O juiz não pode ser aquele do paradigma liberal,
concebido como mero espectador da luta entre as partes.34

Principalmente no campo processual, onde se está diante de um conflito de interesses, pode ocorrer
que "as partes sejam tentadas a usar de todos os meios, dignos ou não, para conseguirem seu
objetivo final".35 É certo que cabe ao Estado-juiz zelar pela ética no processo, mas embora todos os
sujeitos processuais sejam destinatários dos preceitos da moral processual, é em relação às partes e
seus procuradores que o âmbito de incidência das regras legais referentes à moralidade revela-se
mais amplo, visando a impedir a figura do improbus litigator.36

Notou-se, historicamente, esta necessidade no campo da ética do processo com a sedimentação de


diversas normas regentes do comportamento processual das partes, formando o que a doutrina
consignou como o princípio da probidade.37

Vimos que nossa Lei Maior não traz expressamente um dever de colaboração com o Judiciário, mas
defendemos aqui a possibilidade de sua compreensão a partir do exercício colaborativo do
contraditório. Vejamos agora quais as normas constantes do Código de Processo Civil (LGL\1973\5)
a respeito da matéria, que complementam, concretizam e especificam o princípio da probidade em
sede infra-constitucional.

O art. 14 do CPC (LGL\1973\5) versa acerca dos deveres das partes (e de seus procuradores) e, em
seu inc. II, encerra o núcleo axiológico do princípio da probidade: o dever de lealdade. Aponta a
doutrina que seriam desnecessárias quaisquer outras disposições a respeito, pois todas as demais
normas de conduta das partes no processo estariam insertas no art. 14 do CPC (LGL\1973\5), que
consubstancia cláusula genérica de conduta ética.38 O art. 17 do CPC (LGL\1973\5) complementa o
art. 14 do CPC (LGL\1973\5), especificando as condutas que configuram litigância de má-fé. E o art.
18 do CPC (LGL\1973\5) reitera o disposto no art. 16 do CPC (LGL\1973\5), impondo ao infrator
indenização à parte contrária dos prejuízos causados pela litigância de má-fé. Essas são as
disposições gerais acerca do princípio da probidade, mas se reconhecem, ao longo do estatuto
processual civil, outras regras esparsas no mesmo sentido. De fato, a doutrina tem reconhecido
existirem duas vertentes do princípio da probidade positivadas no CPC (LGL\1973\5): a disciplina da
litigância de má-fé, prevista nos arts. 14 a 18 do CPC (LGL\1973\5), e os atos atentatórios à
dignidade da Justiça, elencados nos arts.14, V, 599, 600 e 601.39

Recentemente, a Lei 10.358/2001 seguiu o escopo de proteção do processo contra condutas


ímprobas, dando nova redação ao art. 14 do CPC (LGL\1973\5). As mudanças legislativas, além de
exacerbarem as sanções ao litigante desleal, prevendo severas multas pecuniárias (art. 14,
parágrafo único, do CPC (LGL\1973\5)), explicitaram aquilo que a doutrina já advertia: todos os
participantes do processo (e não apenas as partes) são destinatários dos preceitos éticos contidos
na lei.40
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Mas se existe um instrumental tão detalhado para repressão da má-fé processual em sede
infra-constitucional, cabe a indagação acerca das razões de sua pouca aplicação na prática forense
nacional.

6. O carnaval procedimental. Boa-fé x ampla defesa

Ante a morosidade da máquina judiciária, a utilização de expedientes processuais escusos é uma


preocupação que assumiu, nos últimos tempos, o status de drama social: já faz parte da cultura
popular o mito de que aquele que tem o melhor advogado será vitorioso no processo, rito complexo e
incompreensível, comparado freqüentemente a um verdadeiro carnaval, onde os foliões, com
insaciável volúpia por vitória a qualquer custo, desfilam na avenida com fantasias e alegorias,
travestindo suas reais intenções em múltiplos recursos e requerimentos protelatórios, quando não
fraudando ou manipulando fatos e documentos.

Ora, se temos arsenal normativo para combater esse cenário, por que não o fazemos? A primeira
das razões apontadas em doutrina para a fraca incidência do princípio da probidade no cotidiano
empírico do processo brasileiro é a carga de subjetivismo de que impregnada a normativa acerca do
tema. Larga é a margem de apreciação subjetiva que exigem as disposições legais que versam
sobre a conduta ética processual. Desse modo, a aplicação de sanções dependerá da tolerância de
cada magistrado e de seus critérios na aferição do comportamento das partes.41 Expressões como
"resistência injustificada", "intuito protelatório", "proceder de modo temerário", "incidentes
manifestamente infundados", "cientes de que são destituídas de fundamento", importam em alto de
grau de abstração e subjetivismo dos ilícitos descritos nesses preceitos normativos éticos.

Essa é também a tônica da legislação em outros países. Na Alemanha, o § 138 da ZPO traz deveres
das partes no processo, consagrando, dentre eles, o dever de veracidade (Wahrheitspflicht),
segundo o qual a parte não pode alegar inverdades nem contestar afirmações verdadeiras do
adversário sobre as quais esteja ciente ou tenha conhecimento (Kenntnis). Assim, é freqüente a
referência na doutrina tedesca ao fato de que a verdade de que fala o legislador é uma verdade
subjetiva, colhida do psiquismo do sujeito processual, em contraposição à verdade objetiva, extraída
da comprovação dos fatos e circunstâncias, independentemente da ciência da parte. Ora, com efeito,
a exigência de que a parte tenha conhecimento da inverdade para que seja punida pelo regramento
da litigância de má-fé transforma, portanto, o dever de verdade em um dever de "sinceridade" (
Wahrhaftigkeit).42

Ao lado da carga subjetiva da legislação, o segundo ponto que merece consideração no que tange à
inoperância prática das normas éticas é a parcimônia com que os juízes tratam a matéria,
benevolência até festejada, em nosso sentir sem razão, por parte da doutrina. Leonardo Greco, por
exemplo, assevera que não pode haver aplicação constante das sanções à litigância de má-fé ou
aos atos atentatórios da dignidade de justiça, pois poderia haver violação à ampla defesa ou uma
ingerência indevida na estratégia processual traçada pela parte.43

Semelhantes posicionamentos doutrinários também puderam ser sentidos na experiência italiana no


que tange à punição da conduta abusiva dos advogados. Sem embargo, como narra Augusto
Morello, dentre as tentativas de reformar o antigo Código de 1865, o denominado Projeto Solmi, de
1937, julgava ser essencial estabelecer graves sanções civis (pecuniárias) e penais contra o litigante
que quebrasse os deveres de veracidade ou de atuar com lealdade. A previsão repercutiu
imediatamente e a doutrina, liderada por Carnelutti, Calamadrei, Liebman, dentre outros, respondeu
em massa com indignação e repúdio às disposições do projeto.44 O texto que originou o Codice
peninsular seguiu, portanto, outros rumos. O art. 88 do estatuto processual italiano assevera que,
diante de atos de má-fé processual, compete ao juiz apenas informar aos órgãos administrativos aos
quais subordinados os advogados para que a estas instâncias caiba aplicar eventuais sanções
disciplinares.45

E, em seguida, ao tratar da sucumbência, vale dizer, da imposição de condenação em custas e


despesas (spese) ao vencido, prevê o código italiano o instituto da "responsabilidade agravada" (art.
96). Trata-se da possibilidade de prolação de um outro decreto condenatório ao litigante que, além
de ter sido vencido na lide, tenha ainda transgredido as normas éticas processuais (e então se fala
em responsabilidade "agravada" porque já pesa sobre ele a condenação acerca da res in judicium
deducta). Contudo, como se vê, a legislação italiana é acanhada a respeito, já que esta punição
somente se impõe ao vencido, quando se sabe que, no processo, também o vencedor pode litigar
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contra a boa-fé. Ademais, a responsabilidade por dano processual somente pode ser pronunciada
pelo juiz se a parte contrária o requerer, o que denota ideologia privatista, como se a eficácia do
processo pudesse depender da vontade de qualquer das partes. Em sentido semelhante é a norma
análoga do Código de Processo Civil (LGL\1973\5) português (art. 456).46

Tais opções doutrinárias e legislativas, em nosso entender, não se deveriam observar, na medida em
que a sanção tem caráter educativo, pedagógico, no sentido de desestimular a repetição da conduta
que se tenta reprimir mediante sua imposição.47 Deve-se realizar o escopo sancionatório de tais
normas e, por conseguinte, "romper la timidez de los jueces para aplicarlas".48

Outro ponto assinalado por parte da doutrina é a peculiaridade do princípio dispositivo no Processo
Civil. Liebman afirma que o Processo Civil, em que às partes cabe argumentar em torno de suas
próprias razões "é refratário a uma rigorosa disciplina moralista do comportamento daquelas,"49
ressalvando, no entanto, que a habilidade das partes não pode ultrapassar limites impostos pela
ética profissional.

Ousamos discordar, pensando, ao contrário, que o princípio dispositivo não impede que o juiz
conduza a marcha processual dentro dos trilhos procedimentais forjados pelo legislador. Trata-se
das faculdades processuais do magistrado, ou seja, aquelas referentes à direção do processo, seu
impulso e desenvolvimento regular, poderes jurisdicionais desvinculados da pretensão ou da
atividade probatória - onde têm lugar as denominadas as faculdades materiais.50 E entre as
faculdades processuais inserem-se as chamadas faculdades coercitivas, que permitem ao Judiciário
exigir colaboração dos particulares com os juízes e tribunais e que sejam punidos comportamentos
processuais antiéticos.51

Percebemos, portanto, que os argumentos contrários à punição da litigância de má-fé são calcados
na proteção quase egoísta da atuação privada no processo, onde qualquer interferência estatal seria
autoritária e descabida. A punição é necessária, mas decerto que o repúdio a atos contrários à
boa-fé processual não pode resultar em uma incursão deletéria na estratégia processual dos sujeitos
processuais, devendo haver um equilíbrio entre o princípio dispositivo e a repressão das condutas
das partes, de modo a preservar os instrumentos processuais e não ingressar indevidamente na
ampla defesa e na iniciativa da parte no processo civil.52 Pensamos, todavia, que inexiste qualquer
contradição entre a punição do abuso do direito de manifestação processual e o princípio dispositivo:
na verdade, o princípio existe para imprimir a neutralidade no labor do magistrado, para que haja o
distanciamento necessário dos interesses em conflito visando à prolação de uma decisão mais
precisa e afastada das paixões,53 o que não impede a correção sancionatória da infringência das
regras do jogo.54

Contra o carnaval processual, será que é certo que a justiça e retidão tenham suas silhuetas
encobertas pelos holofotes do princípio dispositivo, que deixam o juiz à margem da atuação dos
participantes?

Também a doutrina alemã aponta neste sentido do equilíbrio entre os interesses públicos no
processo e a estratégia e iniciativa das partes ao examinar o dever de integridade ou de completude
(Vollständigkeitspflicht), também estampado no §138 da ZPO, e que proíbe a sonegação de fatos e
circunstâncias relevantes para a discussão.55 Afirma-se que o dever de integridade, apesar de
representar um postulado de colaboração, impondo às partes que tragam ao processo fatos
relevantes para a descoberta da verdade real, deve ser circunscrito por certos limites. Assim, não
significa a obrigação da parte de expressar todos os fatos que conheça de uma só vez e tampouco
impõe o dever de trazer aos autos fatos desfavoráveis à própria parte, o que, obviamente, nenhum
dos litigantes faz espontaneamente. Também não pode representar uma imposição de carrear ao
processo fatos desonrosos, que possam gerar auto-incriminação ou proporcionar ao adversário a
vitória na lide ou oportunidade de reconvir. Não obstante, o dever legal proíbe a alteração fraudulenta
das circunstâncias efetivamente alegadas.56 Em suma: há respeito à ampla defesa e ao princípio
dispositivo sem descuidar da sanção ao abuso e às ilegalidades.

Então, seja pelo apego ao egoísmo privatista57 no Processo Civil, seja pela complacência pretoriana
ou o subjetivismo da legislação, muitas são as dificuldades em punir as condutas processuais
abusivas. Acreditamos que uma aferição objetiva da litigância de má-fé já seria um significativo
avanço para a efetividade das sanções que visam a punir as condutas lesivas ao bom andamento
processual. Portanto, a determinação de standards objetivos para aferir as condutas de má-fé
processual faz-se notadamente necessária atualmente.
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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

Na análise de certos preceitos definidores das condutas de má-fé no Brasil e no estrangeiro,


inúmeras dificuldades surgem da utopia legislativa de tentar extremar, enumerando condutas, os
limites entre o abuso e a regular manifestação processual, sendo comum ainda a concentração na lei
- não na Constituição, como pregamos - a sede para estas disposições. Decerto que dispositivos
como do art. 14, IV do CPC (LGL\1973\5), que proíbe que a parte pratique atos inúteis ou
desnecessários à declaração ou defesa do direito, são de pouca aplicação, vez que é tênue a linha
que separa os atos desnecessários dos que são imprescindíveis à argumentação das partes.
Note-se que, ao fundamentar neste dispositivo da legislação processual uma eventual sanção ao
comportamento de uma das partes, o magistrado poderia lesionar o direito, igualmente fundamental,
da ampla defesa, vez que o conceito de abuso de direito processual é fluido e qualquer tentativa de
definí-lo na lei de improvável acerto científico.58 Todavia, os preceitos do art. 17, I do CPC
(LGL\1973\5), fornecem ao julgador parâmetros um pouco mais objetivos para mensurar a malícia
empregada na conduta das partes. Ressalte-se que os conceitos de "texto expresso de lei" ou "fato
incontroverso" são facilmente verificáveis.59 Também o art. 600, IV, do CPC (LGL\1973\5) contém
notável solução para combater a indeterminação dos parâmetros legais, insatisfatória para efetivar a
repressão a comportamentos indesejáveis das partes, o que não é privilégio brasileiro, mas
fenômeno identificado, com freqüência, no direito comparado, como visto.60

Dessa forma, a prática legislativa de descrever comportamentos casuisticamente não se nos afigura
adequada nesta seara onde a conceituação é difícil e a tentativa de detalhar normativamente
condutas das partes permite um apego à literalidade e a inoperância dos preceitos punitivos.

Em sentido oposto, na Itália, o Codice apresenta o dever de lealdade e probidade em seu art. 88,
sem enumerar quaisquer condutas específicas. Também na Argentina, o art.45 do Código de la
Nación, embora tenha elencado alguns parâmetros para a configuração dos comportamentos
antiéticos,traz o dever de lealdade como uma cláusula geral, o que autoriza uma sanção pecuniária
genérica para qualquer conduta abusiva. Fala a lei em hipóteses em que, em se observando uma
"conduta maliciosa ou temerária", poderá o juiz impor multas ao litigante desleal.61 E o próprio Código
processual brasileiro contém cláusula genérica da ética processual no art. 14, II, do CPC
(LGL\1973\5), como visto, o que torna as enumerações apenas exemplificativas.

Releva destacar que em todo ordenamento que possua preceitos abertos como estes, assume cabal
importância a atuação diretora do juiz, comparado freqüentemente a um "maestro de uma orquestra",
que deve zelar pelo bom resultado do processo, identificando as condutas que sejam contrárias à
boa-fé ainda que não estejam expressamente previstas ou enumeradas no texto legal.62

Além disso, cabe ressaltar que devemos pensar este dever, no Brasil, como cláusula geral
constitucional, diretamente decorrente do contraditório. Dessa forma, torna-se prejudicada a
alegação de inconstitucionalidade da sanção por ofensa à ampla defesa e à estratégia das partes, já
que estão ambos - contraditório e ampla defesa - contidos no texto constitucional. A questão passa a
envolver colisão de preceitos igualmente constitucionais, abandonando-se o critério hierárquico para
solucionar esta antinomia normativa.

7. O conceito de boa-fé processual objetiva

Contra essa indeterminação conceitual e na esteira de considerar a boa-fé uma cláusula geral,
pode-se sustentar, como o faz parte da doutrina latino-americana, a existência de uma verdadeira
boa-fé processual objetiva,63 para utilizar o termo consagrado pelos civilistas.64

O fortalecimento da boa-fé processual objetiva significa o abandono da concepção subjetivista do


comportamento das partes e seus procuradores. Com efeito, o conceito de boa-fé não é novo no
nosso ordenamento jurídico nem no direito comparado, mas seu desenvolvimento sempre dependeu
da iniciativa dos magistrados e juristas.

O Código Comercial brasileiro já trazia a previsão da boa-fé contratual desde 1850 em seu art. 131, e
o BGB alemão, de 1900, também a contemplava no § 242. Contudo, no Brasil o dispositivo da
legislação comercial foi quase totalmente negligenciado, enquanto na Alemanha o conteúdo da
previsão normativa do BGB foi construído pela doutrina e pela jurisprudência.65 A produção tedesca
redundou por traçar uma nítida linha divisória entre a boa-fé subjetiva (ou boa-fé/crença) e a boa-fé
objetiva (Treu und Glauben, a denominada boa-fé/lealdade).

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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

A boa-fé subjetiva é fulcrada na intenção e na consciência de que o comportamento é contrário ao


direito. Trata-se de um estado psicológico do agente, do seu convencimento de agir sem prejuízo
dos demais. A boa-fé subjetiva está, portanto, ligada ao voluntarismo e ao individualismo e sempre
foi contraposta à má-fé, do que decorre a dificuldade dúplice de extirpar das normas éticas
processuais o elemento anímico (o dolo) e de punir as condutas lesivas sem considerações
psíquicas - sem indagar se a parte desejou prejudicar o curso do processo.66

Por outro lado, a chamada boa-fé objetiva é baseada em padrões de conduta social, voltada para a
proteção às expectativas de que os demais membros do conjunto social nutrem de todos nós. Vale
dizer, protegem-se os interesses do alter, a confiança de que todos pautem suas condutas de acordo
com as convenções sociais, aquilo que legitimamente é esperado de cada parte. É a idéia de um
"arquétipo moral", passando a proteção processual da boa-fé, nos dias de hoje, da tradicional e
insuficiente tutela subjetiva da vontade para a necessária tutela objetiva da confiança. Permite-se,
portanto, com a sedimentação do conceito de boa-fé processual objetiva, a responsabilização por
atos contrários à boa-fé processual sem qualquer consideração quanto à má-fé e ao dolo das partes
e seus procuradores.67

Vale dizer, desnecessária é a aferição subjetiva do conhecimento da parte acerca da ilicitude de sua
conduta, subjetivismo que, além de implicar em dificuldades no campo probatório, pode, ao mesmo
tempo, tornar iníquas as normas repressoras da má-fé processual e perpetuar a utilização do
processo para fins escusos. Dessa forma, permite-se a punição de quaisquer condutas contrárias à
boa-fé processual e não apenas os comportamentos dolosos. 68

Claro que estas idéias iniciais são insuficientes para delinear a boa-fé objetiva no âmbito processual
e extremar suas conseqüências no Processo Civil e no Processo Penal,69 especialmente em poucas
linhas. Trata-se apenas do começo do debate.

8. Conclusão

Sem embargo, tortuoso será o caminho a ser trilhado até que os comportamentos processuais ilícitos
e imorais sejam banidos do cenário forense brasileiro. Esta é apenas uma contribuição ao debate
jurídico acerca das normas processuais dispondo sobre ética, bem como os padrões para aferição
das condutas ímprobas no processo de forma objetiva, partindo da concepção do correto exercício
do contraditório como dever dos sujeitos processuais.

A compreensão de deveres de colaboração e participação como decorrentes do princípio


constitucional do contraditório permitem extrair a matriz constitucional da boa-fé processual objetiva,
completada e detalhada pelas disposições gerais do princípio da probidade na normativa do CPC
(LGL\1973\5), tomado como cláusula geral da ética no processo. A vitória da boa-fé objetiva evita o
subjetivismo das disposições legais específicas, reconduzindo o debate sobre a boa-fé para a
confiança e proteção de expectativas.

Decerto há dificuldades que, na prática, cercam o tema, pois que, como visto, a sanção do julgador à
conduta das partes pode representar afronta à estratégia adotada por seu procurador para obtenção
da vitória na lide.70 Nesta seara, a prudência do julgador é indispensável para inferir, caso a caso, se
a parte procedeu de forma imoral ou ilícita. Dessarte, deve-se observar que a correta averiguação
dos comportamentos processuais dependerão sempre da análise concreta do magistrado e a
reforma dos paradigmas tradicionais no que tange às sanções para os atos contrários à boa-fé
processual deve ser endógena, não podendo os juízes assistirem à deterioração da prestação
jurisdicional à espera de soluções mágicas da lei. Impende colher, uma vez mais, os ensinamentos
do Prof. Barbosa Moreira, ao afirmar que "a dimensão ética do Direito independe das motivações e
das intenções do legislador".71

Assim, talvez, carnaval seja só aquele de todo fevereiro.

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(*) Para meu avô, Antonio do Passo (in memoriam), fonte de inspiração diária e exemplo de ética na
advocacia, saudades de um grande amigo.

(68) BARBOSA MOREIRA, José Carlos. "A responsabilidade das partes por dano processual no
direito brasileiro", Op. cit., p. 26. Prega o autor a mesma objetividade que propomos. Assevera que,
nos casos em que a lei exigir "atitude psicológica" do litigante deverá fazê-lo expressamente,
cabendo, nos demais casos, mera aferição objetiva. Diverge a doutrina acerca do tema. Ao lado do
Prof. Barbosa Moreira, na doutrina alienígena, advogando que as condutas aéticas no processo
possam ser punidas a título de culpa, confira-se SOSA, Gualberto Lucas. "Abuso de derechos
procesales" in BARBOSA MOREIRA, José Carlos (Coord.). Abuso dos Direitos Processuais. Op. cit.,
pp. 51-54; Na mesma coletânea, Cf.OTEIZA, Eduardo. "Abuso de los derechos procesales en
América Latina", p. 21; GARCIA, José Augusto. Op.cit, loc.cit., onde afirma o autor: "Enorme é a
riqueza do princípio da boa-fé objetiva. Em sua materialização mais singela, ele obstrui a eficacia de
todo e qualquer comportamento contrário à boa-fé, objetivamente considerada.(...) Não há mais,
outrossim, que se falar em condutas desprovidas de boa-fé, mas supostamente irretocáveis sob o
prisma da legalidade (...); o que for contra a boa-fé objetiva estará igualmente contra a lei, para
desalento dos sofismas de plantão e malabarismos retóricos de praxe"

(1) ROSENBERG, Leo, SCHWAB, Karl-Heinz, GOTTWALD, Peter. Zivilprozeßrecht. München: CH


Beck Verlag, 15. Auflage, 1993, p.456.

(2) Cf. arts. 5.º e 6.º da Convenção Européia de Direitos do Homem e art.111 da Constituição
italiana.

(3) WAMBIER, Luiz Rodrigues. "Anotações sobre o princípio do devido processo legal", in Revista de
Processo, n. 63, julho-setembro, 1991, p.55. O autor afirma que o contraditório decorre do devido
processo legal.

(4) Sobre o tema e as restrições ao binômio, de que são exemplo as medidas inaudita altera parte,
Cf.CHIOVENDA, Giuseppe. Principii di diritto processuale civile. Napoli: Casa Editrice Dott. Eugenio
Jovene, Ristampa inalterata, 1965, pp. 625-626.

(5) Cf. CARNELUTTI, Francesco. Istituizioni del nuovo processo civile italiano. Roma: Soc. Ed. Del
Foro Italiano, 2.ª ed., 1941, pp. 96-98.

(6) Pregamos ainda a concepção do contraditório como direito de influência, ou seja, o direito de
condicionar a formação da vontade estatal. Tendo como pano de fundo a idéia habermasiana de
democracia deliberativa, pensamos ser possível imaginar o contraditório como expressão processual
da influência, forma mais ampla e moderada de poder. Se as manifestações das partes não
representam signo de poder estatal, podem-se incluir no espectro da influência, com objetivo de
condicionar a decisão do Estado-juiz. O contraditório como direito de influência, além de inserir os
sujeitos processuais no contexto de um debate judicial pluralista contribuinte para a decisão final,
admite a possibilidade de procedimentos não judiciais observarem o contraditório. No exemplo do
inquérito policial, vemos que o argumento mais freqüente para que se defenda sua inquisitoriedade é
o fato de que, até o oferecimento da denúncia, o investigado não sofre qualquer prejuízo. Trata-se de
justificação privatista, dissonante da publicização do direito processual e que não enxerga o fato de
que a decisão do Ministério Público de oferecer ou não a denúncia é também uma expressão da
vontade estatal que pode ser condicionada pelo debate. Sobre o tema, onde são reproduzidas ainda
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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

algumas das idéias aqui expostas do contraditório como dever, Cf. o nosso CABRAL, Antonio do
Passo. "Il principio del contraddittorio come diritto d'influenza e come dovere di dibattito", 2005, no
prelo.

(7) DINAMARCO, Cândido. Fundamentos do Processo Civil Moderno. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2.ª ed., 1987, p.90.

(8) REISCHL, Klaus. "Der Umfang der richterlichen Instruktionstätigkeit - ein Beitrag zu §139 Abs.1
ZPO", in Zeitschrift für Zivilprozeß, 116. Band, Heft 1, 2003, pp. 81-85. Na página 85, expõe o autor a
visão cooperativa do processo, advertindo que não pode haver excessos por parte do juiz no sentido
de tolher das partes a iniciativa do procedimento e a delimitação de seu objeto.

(9) CABRAL, Antonio do Passo. "Pelas asas de Hermes: a intervenção do amicus curiae, um terceiro
especial. Uma análise dos institutos interventivos similares - o amicus e o Vertreter des öffentlichen
Interesses", in Revista de Processo, vol.117, setembro-outubro de 2004, p. 27. Cf. sobre o tema,
LERCHE, Peter."Zum Anspruch auf rechtliches Gehör", in Zeitschrift für Zivilprozeß, 78. Band, Heft 1,
1965, pp. 9-10.

(10) OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. "A garantia do contraditório", in Revista Forense, vol. 346,
abril-junho, 1999, p.16.

(11) CHIOVENDA, Giuseppe. Op.cit., p. 742, já assim advertia, no sentido de que "lo Stato ha diritto
di pretendere dai cittadini la loro cooperazione alla lite". Ademais, neste ponto o dever decorrente do
contraditório parece rumar para a condição de regra universal, consagrado nos denominados
Principles of Transnational Civil Procedure, editados em iniciativa do American Law Institute e da
Unidroit, sob a supervisão dos Profs. Michele Taruffo, Geoffrey Hazard Jr., Rolf Stürner e Antonio
Gidi, e que contaram com a participação de centenas de juristas dos cinco continentes. Há menção
expressa ao dever de colaboração das partes (principle 7.2), e repartição de responsabilidades sobre
a condução do processo entre partes e juiz (principles 11.2 e 14.2). Dizem os textos: "11. Obligations
of the Parties and Advocates. 11.1 The parties and their counsel should conduct themselves in good
faith in dealing with the court and other parties. 11.2 The parties share with the court the responsibility
to promote a fair, efficient, and reasonably speedy resolution of the proceeding. (...). 14. Court
Responsibility for Direction of the Proceeding. (...) 14.2 To the extent reasonably practicable, the
court should manage the proceeding in consultation with the parties".

(12) Note-se que em doutrina ainda se controverte acerca da matéria. Há autores que negam a
obrigatoriedade da existência de um diálogo judicial entre os sujeitos do processo, admitindo
somente que o contraditório importa em direito das partes de ver seus argumentos levados em
consideração para a decisão. No sentido do texto, TROCKER, Nicolò. "Il nuovo articolo 111 della
costituizione e il 'giusto processo' in materia civile: profili generali", in Rivista trimestrale di Diritto e
Procedura Civile, Anno LV, n.2, junho, 2001, p.394, afirmando que as manifestações do contraditório
"oltre ad operare nei confronti delle parti, si convertono pure in un dovere-onere del giudice, cui
spetta non soltanto di far osservare, ma di osservare egli stesso il fondamentale principio, sì da
provocare anche d'ufficio il preventivo dibattito delle parti su ogni questione di fatto o di diritto, la cui
risoluzione sia determinante nella decisione della controversia". Contra, por todos, BAUR, Fritz e
GRUNSKY, Wolfgang. Zivilprozebrecht. Kriftel: Luchterhand, 10. Auflage, 2000, p. 28: "Zu einem
Rechtsgespräch ist der Richter aber nicht verpflichtet". Na página 44, asseveram que "Das Gericht ist
verpflichtet, die Ausführungen der Prozeßbeteiligten zur Kenntnis zu nehmen und in Erwägung zu
ziehen".

(13) CHIOVENDA, Giuseppe. Op.cit., pp. 727-734.

(14) Cf. LERCHE, Peter. Op.cit., p. 9; OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. "A garantia do contraditório",
Op.cit., p.12.

(15) Diz o dispositivo da Lei Maior espanhola: "Artículo 118. Es obligado cumplir las sentencias y
demás resoluciones firmes de los Jueces y Tribunales, así como prestar la colaboración requerida
por éstos en el curso del proceso y en la ejecución de lo resuelto".

(16) Cf. LERCHE, Peter. Op.cit., pp. 10-12. Na página 12, afirma: "(...) daher erzwingt art.103 I GG
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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

ein 'Rechtsgespräch' nicht schon im Interesse objektiv richtiger Rechtsfindung und - bildung. Die
Anhörung der Parteien mag stets auch diesem Effekte 'dienen'; aber nicht um dieses Effekt 'willen'
besteht die Verfassungsnorm vom rechtlichen Gehör."

(17) GALDINO, Flávio. "O Custo dos Direitos", in TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Legitimação dos
direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pp. 141-150.

(18) HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland.


Heidelberg: Müller Verlag, Neudruck der 20. Auflage, 1999, pp.133-134; ALEXY, Robert. Teoría de
los derechos fundamentales. Trad. Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Políticos y
Constitucionales, 2.ª reimpresión, 2001, pp. 507-509.

(19) MENDES, Gilmar Ferreira et alii.Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais. Brasília:


Brasília Jurídica, 1.ª ed., 2.ª tiragem, 2002, p.153.

(20) DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 3.ª
ed., 2003, pp. 214-215, enxergando todavia um dever apenas para o magistrado.

(21) "Art.16. Le juge doit, en toutes circonstances, faire observer et observer lui-même le principe de
la contradiction. Il ne peut retenir, dans sa décision, les moyens, les explications et les documents
invoqués ou produits par les parties que si celles-ci ont été à même d'en débattre contradictoirement.
Il ne peut fonder sa décision sur les moyens de droit qu'il a relevés d'office sans avoir au préalable
invité les parties à présenter leurs observations".

(22) Como já então alertava a doutrina tedesca. Cf. ROSENBERG-SCHWAB-GOTTWALD. Op.cit., p.


458. Sobre o tema, tratando de outros tópicos da reforma processual alemã, BARBOSA MOREIRA,
José Carlos. "Breve notícia sobre a reforma do processo civil alemão", in Revista de Processo,
vol.111, julho-setembro de 2003, p. 105.

(23) REISCHL, Klaus. "Der Umfang der richterlichen Instruktionstätigkeit (...)", Op. cit., pp. 88-89.

(24) Previsão semelhante pode ser encontrada nos Principles of Transnational Civil Procedure,
especialmente no princípio n.22.

(25) BARBOSA MOREIRA, José Carlos. "Direito e ética no Brasil de hoje" in Temas de Direito
Processual - 6.ª Série. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 302. NALINI, José Renato. "A Ética nas
Profissões Jurídicas" in Revista dos Tribunais, vol. 731, setembro de 1996, p. 456.

(26) ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Trad. Mário da Gama Cury. Brasília: EdUnb, 2.ª ed., 1992,
p. 93.

(27) NALINI, José Renato. Op. cit., p. 457.

(28) CABRAL, Antonio do Passo. "O processo como superego social: um estudo sobre os fins sociais
da jurisdição", in Revista de Processo, n.115, maio-junho de 2004, pp. 364-368.

(29) BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil (LGL\1973\5). Rio de Janeiro:
Forense, 1975, Vol. I, Tomo II, p. 513

(30) ARAÚJO CINTRA, Antonio Carlos, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel.
Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 8.ª ed., 1991, p. 63.

(31) A expressão é de PEYRANO, Jorge W. "Abuso de los derechos procesales" in BARBOSA


MOREIRA, José Carlos (Coord). Abuso dos Direitos Processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2000,p.
77.

(32) O trocadilho entre o princípio dispositivo e a leitura positivista da lei processual é do Prof. José
Carlos Barbosa Moreira.

(33) BARBI, Celso Agrícola. Op.Cit., p. 531.


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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

(34) MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 3.ª ed., 2004, p. 59.

(35) LIMA, Alcides de Mendonça. "O princípio da probidade no Código de Processo Civil
(LGL\1973\5) brasileiro" in Revista de Processo, n.16, outubro-dezembro de 1979, pp. 16-17.

(36) Note-se que algumas das normas do CPC (LGL\1973\5) citadas no presente estudo somente
impõem sanções às partes, não a seus advogados. No entanto, isto não impede o direito de regresso
em relação a estes, pelo que não faremos diferenciação de tratamento, ao longo do texto, entre suas
funções, devendo ser entendidos os destinatários dessas normas, como quaisquer infratores das
disposições legais, ou seja, todos aqueles que praticam as condutas ilícitas descritas, sejam partes
ou advogados. Os arts. 16, 17 e 18 do CPC (LGL\1973\5) encontram-se em seção denominada "da
responsabilidade das partes por dano processual", não havendo referência aos advogados. No
entanto, também estão contidas no livro I, título II, intitulado "das partes e dos procuradores".
Ressalte-se, outrossim, que a referida seção do CPC (LGL\1973\5) está inserta no título II, capítulo
II, este denominado "dos deveres das partes e seus procuradores". Aponta, portanto, o fator
topográfico, na mesma direção da tese aqui exposta. No mesmo sentido, BARBOSA MOREIRA,
José Carlos. "A responsabilidade das partes por dano processual no direito brasileiro", in Temas de
Direito Processual 1.ª Série. São Paulo: Saraiva, 2.ª ed., 1988, p. 25. Outros ordenamentos
processuais expressamente prevêem sanções cumulativas para a parte e seus patronos. Assim, o
CPC (LGL\1973\5) português, como se verá adiante.

(37) Não significa o princípio da probidade que a parte esteja obrigada a presentear o adversário
com munição para que triunfe, mas importa em impedimento de condutas maliciosas que fraudem o
resultado que advirá da função jurisdicional. Cf. LIMA, Alcides de Mendonça. "O princípio da
probidade (...)", Op.cit., p.18. Mais adiante voltaremos ao tema.

(38) LIMA, Alcides de Mendonça. Op. cit., p. 28

(39) Sobre o tema, por todos, DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do Código de Processo
Civil (LGL\1973\5). São Paulo: Malheiros, 2.ª ed., 1995, p. 61.

(40) De acordo com a nova redação do caput do art.14. Cf.DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma
da reforma. São Paulo: Malheiros, 4.ª ed., 2.ª tiragem, 2002, pp. 57-59.

(41) LIMA, Alcides de Mendonça. Op. cit., p. 29

(42) JAUERNIG, Othmar. Zivilprozessrecht. München: C.H.Beck Verlag, 28.ª ed., 2003, p.101, "Die
Partei darf nicht zu Lasten des Gegners eine Tatsache behaupten, von deren Unwahrheit sie
Kenntnis hat oder überzeugt ist.(...) Die Pflicht zielt also auf die subjektive, nicht auf die objektive
Wahrheit. Sie ist eine Pflicht zur Wahrhaftigkeit".

(43) Afirma o autor que "isso comprometeria a aura de tolerância, que todos nós nos acostumamos a
exortar como uma das mais elevadas virtudes do magistrado". E continua, pregando que a "sanção
ao litigante de má-fé sempre soaria como uma descabida censura do juiz à conduta do advogado,
que definiu a estratégia defensiva do seu cliente". GRECO, Leonardo. O Processo de Execução. Rio
de Janeiro: Renovar, vol.I, 1999, p. 293.

(44) MORELLO, Augusto. La eficacia del proceso. Buenos Aires: Ed. Hammurabi, 2.ª ed., 2001,pp.
225-226.

(45) Diz o dispositivo: "Dovere di lealtà e di probità. - Le parti e i loro difensori hanno il dovere di
comportarsi in giudizio con lealtà e probità. In caso di mancanza dei difensori a tale dovere, il giudice
deve riferirne alle autorità che esercitano il potere disciplinare su di esse".

(46) Afirma a lei lusitana: "Art. 456. Responsabilidade em caso de má-fé. Noção de má-fé. 1.Tendo
litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta
a pedir. 2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido
pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos
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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
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factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do
dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente
reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer
a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão. 3.
Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau,
da decisão que condene por litigância de má-fé."

(47) CABRAL, Antonio do Passo. "O processo como superego social (...)", Op. cit., pp. 361-363;
MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil (LGL\1973\5). São Paulo: Saraiva,
Tomo IX, 1976, p. 483.

(48) QUIJANO, Jairo Parra. "Abuso de derechos procesales" in BARBOSA MOREIRA, José Carlos
(Coord). Abuso dos Direitos Processuais, Op. cit., p. 91.

(49) LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de Direito Processual Civil. Trad. Cândido Rangel Dinamarco.
Rio de Janeiro: Forense, vol. I, 1984, p. 123.

(50) AROCA, Juan Montero. "Los poderes del juez en el proceso civil. Las ideologíasautoritarias y la
pérdida de sentido de la realidad", in BENABENTOS, Omar (Org.). Teoría Unitaria del Proceso.
Rosário: Editorial Júris, 2001, p. 228.

(51) MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Op. cit., p. 58; MORELLO, Augusto.
Op. cit., p. 193;AROCA, Juan Montero. Op. cit., pp. 232-233, onde se nota posicionamento cético em
relação à concepção de boa-fé processual.

(52) As indagações sobre os limites entre os poderes do juiz e a atuação das partes no Processo
Civil são tratadas no clássico estudo de HABSCHEID, Walther. "Richtermacht oder Parteifreiheit:
über Entwicklungstendenzen des modernen Zivilprozeßrechts", in Zeitschrift für Zivilprozeß, 81.
Band, Heft 3, 1968, pp. 175-176. O autor, antes de examinar as tendências do direito comparado,
situa a problemática dentro da extensão do princípio dispositivo: "(...)Die Bestimmung über Streit und
Streitstoff den Parteien obliegt. Ob und worüber gestritten wird, entscheiden die Parteien: Das Gericht
wird nur auf Klage tätig und darf dem Kläger auch nicht mehr zusprechen als er beantragt hat. (...)
Das Problem der Abgrenzung von Richtermacht und Parteifreiheit stellt sich für den Gesetzgeber
jedoch noch in anderem Zusammenhang: Jeder Prozeß, auch der Zivilprozeß, ist durch eine
Entwicklung, ein Vorwärtsschreiten gekennzeichnet. Man kann nun die Initiative für das procedere in
Richtung auf das die Instanz abschließende Urteil grundsätzlich den Parteien überlassen oder die
Verantwortung für eine Herbeiführung der Spruchreife dem Gericht auferlegen".

(53) REISCHL, Klaus. "Der Umfang der richterlichen Instruktionstätigkeit (...)", Op. cit., p. 105, onde
afirma o autor que o princípio dispositivo (Verhandlungsgrundsatz) impõe um dever de neutralidade (
Neutralitätspflicht) e um mandado de distanciamento (Distanzgebot).

(54) BARBOSA MOREIRA, José Carlos. "Os poderes do juiz na direção e na instrução do processo."
in Revista de Direito Comparado Luso-Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 110, onde afirma
o professor que "o uso das faculdades instrutórias não é incompatível com a preservação da
imparcialidade do juiz."

(55) Diz o dispositivo: "§ 138 Erklärungspflicht über Tatsachen; Wahrheitspflicht. (1) Die Parteien
haben ihre Erklärungen über tatsächliche Umstände vollständig und der Wahrheit gemäß abzugeben.
(2) Jede Partei hat sich über die von dem Gegner behaupteten Tatsachen zu erklären. (3) Tatsachen,
die nicht ausdrücklich bestritten werden, sind als zugestanden anzusehen, wenn nicht die Absicht, sie
bestreiten zu wollen, aus den übrigen Erklärungen der Partei hervorgeht. (4) Eine Erklärung mit
Nichtwissen ist nur über Tatsachen zulässig, die weder eigene Handlungen der Partei noch
Gegenstand ihrer eigenen Wahrnehmung gewesen sind".

(56) Assim, JAUERNIG, Othmar, p. 102, "Die Partei muß nicht Tatsachen vorbringen, die ihr zur
Unehre gereichen oder die Gefahr strafgerichtlicher Verfolgung heraufbeschwören würden.
Ebensowenig sind Tatsachen anzuführen, die dem Gegner zur Erhebung einer (Wider-)Klage oder
zum Prozeßsieg verhelfen können. (...)"Damit sind die Anforderungen an die Parteien bedeutend
gesteigert, denn jede ist gehalten, auch solche Tatsachen zu bringen, die sich für sie ungünstig
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auswirken können. Günstige Tatsachen wird die Partei aus eigenem Antrieb vorbringen. Die
Vollständigkeitspflicht zwingt sie hierzu nicht, denn nach Sinn und Zweck verbietet diese Pflicht
lediglich die Sachverhaltsverfälschung zu Lasten des Gegners".

(57) Na moldura publicista do processo, percebe-se que, ao punir a conduta processual antiética e
lesiva, protege o juiz principalmente um interesse estatal, qual seja, de integridade do instituto
destinado à composição da lide: o processo. O Estado tem interesse na sua correta utilização, sem
que haja abuso dos mecanismos postos à disposição das partes. Devemos admitir que há
disposições sancionatórias dos comportamentos de má-fé processual que revertem em benefício da
parte prejudicada, destinando o produto da sanção pecuniária ao adversário do transgressor das
normas de conduta ética. Isto se baseia na constatação de que a condenação por litigância de má-fé
não importa necessariamente derrota na lide. Essa destinação não nos permite inferir que estas
normas tenham por finalidade tutelar interesse das partes. Ao contrário, seu objetivo é tutelar o
processo e, de forma reflexa, indireta, terminam por servir de escudo aos interesses privados dos
demais litigantes ao educar o improbus litigator, desestimulando-o a incorrer em tais práticas
novamente. Subsiste, outrossim, nesses dispositivos legais, relevante aspecto psicológico, no
sentido de que, ao reverter o produto da arrecadação das sanções pecuniárias ao adversário do
litigante ímprobo, este se sinta, ao menos em parte, "vencido" e não torne a praticar condutas
indesejáveis.

(58) MORELLO, Augusto. Op.cit., p. 75.

(59) RODRIGUES, Francisco César Pinheiro. "Indenização na litigância de má-fé" in Revista dos
Tribunais, vol. 584, junho de 1984, p. 15, onde afirma que também o tempo é fator objetivo para que
se possa aferir o intuito protelatório dos expedientes manejados pelas partes.

(60) TARZIA, Giuseppe. "Problemas atuais da execução forçada" in Revista de Processo, n. 90,
abril-junho de 1998, p. 78, onde aponta o autor que, na Itália, não existe um dever do devedor de
nomeação de bens à penhora, como a disposição do art. 600 do CPC (LGL\1973\5).

(61) Sob a rubrica "Temeridad o Malicia", o texto integral do dispositivo, alterado em 2001, assim
estabelece: "Art. 45. Cuando se declarase maliciosa o temeraria la conducta asumida en el pleito por
alguna de las partes, el juez le impondrá a ella o a su letrado o a ambos conjuntamente, una multa
valuada entre el diez y el cincuenta por ciento del monto del objeto de la sentencia. En los casos en
que el objeto de la pretensión no fuera susceptible de apreciación pecuniaria, el importe no podrá
superar la suma de $ 50.000. El importe de la multa será a favor de la otra parte. Si el pedido de
sanción fuera promovido por una de las partes, se decidirá previo traslado a la contraria. Sin perjuicio
de considerar otras circunstancias que estime corresponder, el juez deberá ponderar la deducción de
pretensiones, defensas, excepciones o interposición de recursos que resulten inadmisibles, o cuya
falta de fundamento no se pueda ignorar de acuerdo con una mínima pauta de razonabilidad o
encuentre sustento en hechos ficticios o irreales o que manifiestamente conduzcan a dilatar el
proceso".

(62) MORELLO, Augusto. Op.cit., pp. 81-82, onde se lê: "los modernos códigos procesales están
estructurados a través de un director de orquestra, que es el juez (no ya dictador ni espectador), que
no puede limitarse a contemplar cómo se hace jugar a las marionetas en el proceso, garante de que
esa línea moral del debate no pueda menoscabarse."

(63) GREIF, Jaime, "El abuso del derecho y la responsabilidad civil emergente en el derecho
uruguayo" in BARBOSA MOREIRA, José Carlos (Coord.). Abuso dos Direitos Processuais. Op. cit.,
p.156.

(64) Confira-se AZEVEDO, Antonio Junqueira de. "Insuficiências, deficiências e desatualização do


projeto de Código Civil (LGL\2002\400) na questão da boa-fé objetiva nos contratos" in Revista dos
Tribunais, vol. 775, maio de 2000, pp. 11-17. Ressalte-se, entretanto, que cabe importar do direito
civil este conceito sob prisma consentâneo com a principiologia do direito processual. Portanto,
boa-fé objetiva não significa, no âmbito do processo, boa-fé na interpretação do contrato ou de sua
execução mas uma pauta de conduta a ser seguida pelos sujeitos processuais, ou ainda, segundo
GREIF, Jaime. Op. cit., p. 157, "una particular escrupulosidad al usar los mecanismos de la justicia
que puedan dañar sin derecho a la otra parte en el proceso".
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O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ
PROCESSUAL OBJETIVA

(65) TEPEDINO, Gustavo. "O Código Civil (LGL\2002\400), os chamados microssistemas e a


constituição: premissas para uma reforma legislativa", in TEPEDINO, Gustavo (Org.). Problemas de
direito civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, pp. 10-14.

(66) GARCIA, José Augusto. "O princípio da dimensão coletiva das relações de consumo: reflexos no
'processo do consumidor', especialmente quanto aos danos morais e às conciliações", in Revista de
Direito do Consumidor, n. 28, out-dez, 1998, p. 77.

(67) Sobre o tema, no direito civil, MOTA, Maurício Jorge. "A pós-eficácia das obrigações", in
TEPEDINO, Gustavo (Org.). Problemas de direito civil-constitucional, Op.cit., pp. 194-195, onde
afirma: "Na concepção objetiva, a boa-fé contrapõe-se à má-fé. Assim, em princípio, a atuação em
desconformidade com os padrões de conduta exigíveis caracteriza violação do dever de agir de
boa-fé (objetiva), mesmo sem má-fé (ou dolo) e sem culpa. Portanto, nem sempre a atuação não
conforme a boa-fé (objetiva) será ilícita, mas, mesmo quando não ilícita, em princípio continuará
sendo geradora de responsabilidade". A expressão "arquétipo moral" é atribuída a Judith
Martins-Costa.

(69) Assim, por exemplo, no Processo Penal, onde em jogo o direito de liberdade, o dever de
veracidade não se observa com a mesma intensidade. O réu não é obrigado a dizer a verdade,
embora a matéria seja polêmica no que se refere ao interrogatório de qualificação. Cf. OLIVEIRA,
Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 3.ª ed., 2004, pp. 383-384.

(70) Como bem assevera Alcides de Mendonça Lima, em verdade, "chega um momento em que é
difícil regular e comprovar a atitude necessária honesta na defesa do direito, diferenciando-a da que
for ociosa e ímproba". LIMA, Alcides de Mendonça. Op. cit., pp. 40-41.

(71) BARBOSA MOREIRA, José Carlos. "Direito e ética no Brasil de hoje" in Temas de Direito
Processual - 6.ª Série.Op. cit., loc. cit.

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