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“FAZENDO A AMÉRICA”

ALGUMAS HISTÓRIAS DE COLONOS E AVENTUREIROS


EM TERRITÓRIO FLUMINENSE
Guilherme Peres

Nomeado para cônsul-geral da Rússia no Brasil, o barão Georg Heinrich von Langsdorff
chegou ao Rio de Janeiro em 1813. Acumulando o cargo de encarregado de negócios, ainda
encontraria tempo para sua atividade favorita no campo da pesquisa científica visitando
freqüentemente a então Biblioteca Real, fazendo excursões pelos arredores da cidade e
coletando para estudo, espécimes minerais, vegetais e animais.
Numa dessas excursões visitou a Baixada Fluminense através do Porto de Estrela,
penetrando a subida da serra pelo Caminho do Inhomirim. Encantado com a região cercada de
montanhas, florestas, córregos e pássaros canoros, interessou-se pela compra de uma fazenda
denominada Mandioca, situada à margem desse caminho, de propriedade do sargento-mor
Manoel Joaquim de Oliveira Malta e sua mulher Marina Ludovina Freire, o que foi efetuada em
28 de setembro de 1816 pelo preço de Rs. 3:600$000, divididos em quatro prestações.
Ponto de partida para o interior do Brasil, o porto fluvial de Estrela ficava às margens do
Rio Inhomirim e era alcançado através da Baia de Guanabara, iniciando-se a viagem no Cais
dos Mineiros, situado nas proximidades da atual Praça Mauá. Ali chegando, o transporte era
feito em animais de cela, integrando-se a centenas de tropas que constantemente circulavam no
caminho calçado de pedras ainda no início do século XIX, em busca da subida da serra onde se
situava a fazenda.
Von Spix e von Martius, dois cientistas alemães interessados no estudo da geografia,
etnografia, botânica e zoologia, chegaram ao Rio de Janeiro em 1817. Percorrendo o país,
deixaram seus relatos no livro “Viagem pelo Brasil”, registrando referências sobre esta fazenda
e seu proprietário.
“Nosso amigo cônsul geral von Langsdorff, comprara uma grande propriedade pouco
antes de nossa chegada ao Rio de Janeiro, que se localizava ao norte da baia, no caminho para
Minas Gerais, e começara ali uma plantação de mandioca, construindo também para si uma casa
juntamente com outras dependências necessárias à fazenda. De bom grado aceitamos o convite
para visitar em sua companhia esta nova criação, sobre cuja vasta riqueza em aspectos históricos
naturais ele nos fizera um interessante relato. Devido a grande freqüência de passageiros que se
locomovem entre a capital e Minas Gerais, partem diariamente vários barcos para Porto da
Estrela, entre 11 e 12 horas logo que os ventos fazem favoráveis; chegando lá à tardinha”.
No desembarque, os viajantes se surpreendiam com o constante reboliço dos tropeiros:
“Porto da Estrela é um porto comum ao Rio de Janeiro e a província de Minas Gerais. Ali se
vêem longas tropas de mulas carregadas de caixas e bagagens chegarem do interior e para lá
retornarem”. E descrevem seu povoado: “cujas casas mal construídas e baixas, na verdade
barracos, formavam uma rua irregular na confluência do pequeno Saracuruna com o
Inhomirim”.
Após pernoitarem no povoado, o guia providenciou “os cavalos e as mulas necessárias à
nossa viagem”. Deixando o vilarejo com seu burburinho “tomamos a estrada, que se dirige ao
norte, para Minas”. Chegando à tardinha ao pé da serra, entraram em terras do Barão. “O Sr.
Langsdorff começara recentemente a desbravar as terras desta fazenda. Na estrada havia um
rancho espaçoso para acomodar as freqüentes caravanas de Minas, uma taberna de aguardente,
um moinho para o preparo da farinha de milho turco e uma pequena casa para o proprietário
construída no estilo da região. Essa pequena sede da fazenda possui alguns cômodos erguidos
sobre terra fresca, despidos de qualquer adorno e com janelas de grades ou contra-ventos; de um
dos lados da casa, o telhado avança alguns pés além das paredes, apoiando-se em pilares e num
muro baixo, formando o alpendre”.
Cercada por uma cadeia de montanhas cobertas de florestas, Langsdorff tentava aplicar
técnicas agrícolas européias em solo brasileiro, importando arados que se mostraram
impraticáveis devido a inclinação do solo, e o excesso de raízes. “O negro trabalha de maneira
mais conveniente e fácil com a enxada do que seria possível com o arado”. Spix e Martius
continuam narrando os investimentos aplicados pelo Barão: “Embora nosso hospitaleiro
fazendeiro contasse no início somente com uns vinte negros, ele suprira não só a necessidade de
sua casa com as plantações de milho e mandioca, como também já enviava seus produtos para a
venda na cidade”.
Através de seu diário, ficou constatado que Langsdorff não permitia a derrubada da
floresta através de queimadas, o que levaria um rápido esgotamento do solo. Em sua lavoura
plantava desde mandioca, legumes, frutas e até algodão. Segundo o viajante alemão Ritter von
Schaffer que visitou a fazenda “havia também uma lavoura de café que quando parti do Brasil,
possuía 25.000 pés”.
Diversificando com a pecuária iniciou a criação de jumentos, cavalos, bois, ovelhas,
aves, coelhos e cabras. Além dessas atividades realizava estudos de zoologia, entomologia,
geologia, etnografia e botânica, especializando-se em classificar samambaias e borboletas, das
quais possuía centenas de espécimes catalogadas.

COLONIA DE NOVA FRIBURGO

Em fins de 1820, Santo Antônio de Sá, uma pequena aldeia situada no fundo da Baia de
Guanabara, assistiu uma das últimas cenas dramáticas da viagem dos primeiros imigrantes
destinados a criação de uma colônia na Província do Rio de Janeiro denominado Morro
Queimado, futura Nova Friburgo. Originários da Suíça, do cantão de Fribourg, viajaram para
este país, centenas de famílias dispostas a “fazer a América”, em direção aos assentamentos
dessas terras. Durante oitenta dias atravessando o oceano, sofreram a companhia “do enjôo, da
diarréia e da morte! Nos sete veleiros que partiram da Holanda, conduzindo de início um total
de 2013 passageiros, sucumbiram e tiveram o oceano por túmulo 311 deles”, diz Rafael Luiz de
Siqueira Jaccoud em seu livro “Os Colonos”.
Ao desembarcarem no Rio de Janeiro, foram transportados em pequenos barcos até
Itamby, “pequeno porto fluvial, próximo à foz do rio Macacu, onde havia sido improvisado um
hospital para receber os colonos doentes”. Em seguida foram transferidos para o convento de
São Boaventura na Vila de Santo Antônio de Sá, já desativado quer pela decadência da
construção que ameaçava desabar, quer pelo surto de malária conhecida como ”febres de
macacu”, que começava fazer suas primeiras vítimas.
Ali o anjo da morte continuou estendendo suas azas “sobre aquela pobre gente durante
seis meses. As doenças contraídas na Holanda, a bordo dos navios e na baixada paludosa do
Macacu, ainda fizeram várias vítimas. Naquele interregno morreram mais 131 colonos, fora os
35 que foram sepultados na Vila de Macacu, inclusive o padre Joseph Aeby que se afogou no
rio quando nele se banhava”, registra Rafael Jacoud
A péssima qualidade das terras destinadas à agricultura, prenunciava a má qualidade de
vida que os esperavam. Um representante de seu país que veio visitá-los ficou chocado com o
que viu: “Não sei a que atribuir a escolha tão infeliz do local da Colônia, se a ignorância ou ao
desleixo... essas terras não tem para nós, nenhum valor, mas os pobres colonos as tornarão
cultiváveis e as aproveitarão, pois a miséria os obrigará a tal”.

A COLONIA DO BARÃO

O processo dessa colonização despertou o interesse de Langsdorff que conheceu a


adaptação dos seus emigrantes, inteirando-se dos detalhes da viagem e o seu fracasso. Em um
trecho do discurso pronunciado a bordo do navio “Doris” em 3 de março de 1822, durante sua
chegada ao porto do Rio de Janeiro, quando recrutou e financiou a viajem de 94 pessoas,
chamou a atenção daqueles que iam desembarcar como seus colonos, para as responsabilidades
de estar em um novo país:
“Sinto-me suficientemente disposto, perseverante e forte para fazer uma obra e leva-la a
cabo, a qual o governo português tentou realizar a três anos, investindo uma quantia de dinheiro
muito maior. Refiro-me a colônia suíça no Brasil, cujos planos e execução foram dirigidos
inadequadamente”.
“Esta expedição do governo português fracassou por completo. Está morta a maior parte
das pessoas vindas ao Brasil naquela época, e o restante se encontra dispersa. Aqueles colonos
foram transportados sem cuidados médicos e sem inspeção e, após sua chegada à América do
Sul, foram tratados sem nenhuma assistência especial. Imaginai a desgraça: de 1500 almas que
embarcaram na Holanda, faleceram 500 no caminho, em sua maioria mulheres e crianças. É
como se de 94 pessoas como nos encontramos agora, 30 tivessem morrido. Daí podeis concluir
que Deus em sua infinita bondade tem beneficiado meus nobres propósitos e nos protegido
misericordiosamente a todos. Com Seu auxílio fomos trazidos até aqui com saúde e
tranqüilidade; o número das almas foi até aumentado com o nascimento de uma pequena cristã”

O FRACASSO

No Arquivo Nacional do Rio de Janeiro encontra-se o seguinte registro datado de oito de


março de 1822, colhido por Hans Becher: “Para o distrito de Inhomirim na fazenda do cônsul-
geral da nação russiana do conselheiro Langsdorff, partem os alemães constantes da lista, que
nesta Intendência foi apresentada constando de 85 pessoas de família”.
Três meses após a chegada à fazenda, a indisciplina e os protestos se fizeram presentes,
cujo comportamento de rebeldia já havia anteriormente se manifestado em alguns colonos
durante a viajem. Segundo o próprio Langsdorff, contrariando o acordo existente no contrato,
pelo qual só era permitido levar na bagagem “instrumentos necessários à lavoura, ferramentas
etc.”, ao desembarcarem no Porto de Estrela, durante a fiscalização das malas, “os colonos
Michel Zanger, F. Schrenck e Fridolin Ludihuser não os obedeceu. Na bagagem deste último
foram encontradas duas espingardas que eles pretendiam vender na cidade”.
A rebeldia passou a contaminar os colonos bens comportados, iniciando-se em seguida
uma revolta que o próprio barão temeroso por sua integridade física, afastou-se para o
consulado no Rio de Janeiro, propondo ao primeiro-ministro José Bonifácio de Andrada e Silva
“que se anule a contratação dos mesmos, e solicita proteção para si e seus familiares”.
Diante do fracasso da colônia agrícola alemã na fazenda, fez o jovem oficial e agricultor
J. Friederich v. Weech, amigo do barão, que assumiu sua direção durante a viagem deste,
registrar: “percebe-se claramente como era difícil, ou melhor, quase sobre-humana, a tarefa que
von Langsdorff tomara sobre os ombros ao comprar a fazenda Mandioca”... “Os vinte negros
que Langsdorff possuía eram-lhe mais úteis do que as famílias alemãs que acabaram por deixá-
lo, restando somente duas. Mais tarde ele empregou colonos friburguenses, sem melhores
resultados”.

UMA SURPRENDENTE IMIGRAÇÃO

A história da imigração para o Brasil é contemplada com episódios que vezes por outra
surpreendem os pesquisadores. As colônias de parcerias criadas em território fluminense
durante a metade do século XIX, eram o ensaio para a mão-de-obra assalariada nas fazendas de
café, antecipando-se a escassez de mão-de-obra escrava em conseqüência da proibição do
tráfego negreiro.
Um lote de cartas desse período enviadas por imigrantes alemães, instalados nas fazendas
de café do Rio de Janeiro, foi encontrada por Débora Bedocchi Alves do Instituto de História
Ibérica da Universidade de Colônia, e estavam publicadas nos jornais da cidade de Rudolstadt
entre os anos de 1852 e 1853.
O estranho dessas cartas é que todas são de elogios ao sistema de parceria, na qual o
imigrante estava preso a cláusulas contratuais durante cinco ou seis anos, período longo em que
frequentemente explodiam conflitos de interesses pessoais e coletivos entre os colonos e o
fazendeiro. Um exemplo disso é a revolta de colonos suíços em Ibicabas, província de São
Paulo quando, segundo o Dr. Heuber enviado ao Brasil pelos cantões suíços para examinar a
situação de seus compatriotas, revelou que várias cartas que chegaram à Suíça “não eram
escritas livremente pelos colonos, mas sim pelo controle de um empregado da fazenda. As
cartas com notícias negativas não eram remetidas”.
Citando um exemplo de Thomas Davatz, que relata em seu próprio livro, (escrito
posteriormente na volta à Europa), “ter tido suas cartas rasuradas e censuradas pelo diretor da
colônia de Ibicabas. Apesar de tal intimidação os colonos continuaram fazendo queixas de sua
miséria. Mas como estas cartas não chegavam à suíça, delas o público nunca tomou
conhecimento”.
Pertencente ao senador Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, a fazenda Ibicabas foi
uma das pioneiras na substituição da mão-de-obra escrava no Brasil. Iniciando um sistema de
parceria, fez vir da Europa imigrantes alemães e suíços, financiando suas passagens incluídas no
contrato, e resgatadas durante os anos trabalhados na fazenda. A cada família cabia
determinados pés de café que pudesse cultivar, colher e beneficiar. A grandiosidade da fazenda
é avaliada pelo número de colonos registrados no início da segunda metade século XIX, quando
ali se concentravam cerca de mil pessoas entre alemães, suíços e portugueses.
Administrando uma firma denominada Vergueiro & Cia., foram importados em escala
crescente, colonos não só destinados ao trabalho em sua fazenda, mas também distribuídos a
outros fazendeiros desde que cobertas as despesas acrescida de considerável juro. Colônias de
parceria passaram a existir nas comarcas de Campinas, Mogi-Mirim, Taubaté e municípios de
Jundiaí e Ubatuba. “Na província do Rio de Janeiro, também havia desses colonos em 5
fazendas, a maioria deles proveniente da Turíngia e do Holstein”
Uma das cláusulas do contrato previa que: “A companhia Vergueiro & Cia. Compromete-
se a por à disposição do colono, um terreno adequado no qual ele possa plantar aquilo que lhe é
necessário para seu sustento”. Entretanto nem todos os fazendeiros cumpriam o acordo.
Oferecendo terras impróprias para a lavoura ou locais distantes do cafezal, era uma das muitas
queixas dos colonos que iria contribuir para a revolta que os rondava.
Segundo Tschudi, “as famílias eram obrigadas a pagar despesas de viagem marítima e
terrestre, manutenção etc., acrescida dos respectivos juros. Se acontecia morrerem os mais
velhos, os filhos, mesmo ainda menores, ficavam entregue a arbitrariedade do fazendeiro. Os
juros de 6% a que eram obrigados, acumulavam-se assustadoramente... Não é, portanto, de
admirar que famílias honestas e laboriosas vivessem esmagadas sob o peso de tantas dívidas”.
Além de toda essa exploração sobre os colonos, a companhia cobrava a “taxa por
cabeça”, “que era estipulado em 10 mil réis por adulto e 5 mil réis por menor de 10 anos que
entrasse no país por intermédio da dita firma”
A revolta era esperada a qualquer momento. “A primeira sublevação teve lugar na
fazenda Nova Olinda, no município de Ubatuba. As reclamações do cônsul da Suíça no Rio de
Janeiro Sr. H. David, tiveram como conseqüência a intervenção do Governo Imperial, que
ordenou a transferência dos colonos suíços para a colônia Santa Leopoldina, na Província do
Espírito Santo... O Governo Imperial indenizou os fazendeiros da maior parte dos gastos que
tiveram”.
O movimento de maior revolta, porém deu-se na fazenda Ibicaba pertencente ao Senador
Vergueiro. No final de 1856, liderado pelo mestre-escola suíço Tomáz Davatz, os colonos
armados tentaram apoderar-se da fazenda, tendo sido seus proprietários feitos reféns para
negociarem os termos de novo contrato, sendo necessário a intervenção de tropas do exército
imperial para acalmar os ânimos. “Felizmente não chegaram as últimas, pois as tropas teriam
sido vencidas, se não contassem com reforços consideráveis”.
Baseada em uma contabilidade questionável, o clima de insubordinação foi se agravando
até explodir este levante liderado pelo este suíço, que voltou para a Europa onde denunciou os
falsos contratos e as más condições de vida dos colonos, “quando vários jornais alemães e
suíços passaram a fazer uma propaganda contrária a emigração para o Brasil”, ficou consenso
rejeitar a política imigratória para este país.
Os principais cabeças do motim foram expulsos da fazenda tentando afasta-los dos
colonos, mas o sistema de parceria sofreu um retrocesso, fazendo com que desde então
diminuísse o fluxo de imigração de colonos pertencentes a esses dois paises. (143)

COLONIAS FLUMINENSES

Voltando às cartas enviadas por colonos estabelecidos em fazendas da província do Rio


de Janeiro, segundo Viotti da Costa em seu livro “Da Senzala à Colônia”, citado por Débora
Alves, a partir de 1850 começaram a surgir na região cafeeira fluminense, seguindo o exemplo
do senador Vergueiro, colônias de parcerias, registrando que em março de 1852, foram
embarcados em cinco navios hamburgueses entre 800 e 900 colonos alemães com destino ao
Brasil. Estes haviam sido solicitados por sete grandes proprietários do Rio de Janeiro, Minas
Gerais e São Paulo ao representante do Brasil em Hamburgo.
Foram criadas nesse ano na província do Rio de Janeiro, cinco colônias com a
participação de parte desses imigrantes: “Independência”, de Nicolau Antônio Vale da Gama;
“Santa Justa”, de Brás Carneiro Bellens; “Santa Rosa”, do Barão de Baipendi; e “Coroas”,
nas terras do marques de Valença”. Uma das cartas refere-se à fazenda “São Matheus” e uma
outra cita a fazenda “Independência”. As demais diz ela ser distante “12 léguas de Petrópolis,
todas com colonos alemães naturais da Prússia, Holstein, Turíngia, Hesse e Darmstadt”.
Em seu livro “História do Brasil”, lançado na Europa em 1860, e publicado no Brasil em
1931 com tradução de Lúcia Lahmeyer, o autor Heinrich Handelmann, confirma essas colônias
e acrescenta as de Nova Friburgo, Petrópolis e Valão dos Veados.
Ministro plenipotenciário da Suíça, Johann Jacob von Tschudi, registra rapidamente em
seu livro “Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e São Paulo”, observações feitas durante sua
visita nas fazendas de café das províncias do Rio de Janeiro, e mais demoradamente às de São
Paulo, após uma revolta de colonos em uma fazenda em Ibicaba,
Citando três colônias fluminenses, afirma que: “As colônias desse gênero na província do
Rio de Janeiro continuaram vegetando até 1860. Em outubro desse ano 89 famílias
abandonaram as três colônias então existentes, depois de haverem saldado suas dívidas, num
prazo de nove anos. Entre as 43 famílias restantes, surgiram em breve graves dissidências. Os
direitos dos colonos eram defendidos com grande habilidade e energia nos jornais da cidade do
Rio de Janeiro. Tive ocasião de falar com grande número desses colonos, no Rio de Janeiro e no
Sul do País, e não posso ocultar que vários deles, provenientes da fazenda Santa Rosa,
elogiavam seu proprietário, o visconde de Baependi, lastimando que se tivesse deixado levar
pelos seus patrícios de outras colônias a abandonar a fazenda”.
A restrição ao uso da terra era um artifício que os fazendeiros usavam para manter o
colono preso à produção, mesmo contrariando o contrato estipulando que a eles seria concedida
liberdade para plantar uma lavoura destinada ao seu sustento e venda do excedente,
contribuindo assim para saldar suas dívidas.
Segundo Tschudi: “Os colonos das fazendas Santa Cruz, pertencente ao sr. Brás Carneiro
Bellens e Independência do sr. Nicolau Antônio Nogueira Vale da Gama, tinham muitas razões
de queixas. Estes últimos eram tratados da maneira mais abjeta pelo administrador da fazenda,
José Antonio Furtado. Antes de que este administrasse a fazenda, os colonos plantavam muito
arroz. Furtado porém não consentiu mais nisto, pois dizia ele, “os estrangeiros não devem
plantar além daquilo que lhes é estritamente necessário para o consumo próprio, pois em caso
contrário, vendendo as sobras pagam suas dívidas mui rapidamente e a fazenda perde os braços
de que precisava. Nas três fazendas o preço do café era muito baixo, o que prejudicava os
colonos”.

RELATÓRIOS DA PROVÍNCIA

Durante as nossas pesquisas, depois de consultar vários autores que historiaram esta
região, encontramos os únicos rastros substanciais que podíamos confiar: os Relatórios da
Província do Rio de Janeiro. Na edição de 1852, em um capítulo dedicado a esta atividade que
então se iniciava intitulado: “colonização”; abre-se o parágrafo com o seguinte texto: “com
agradável notícia que vão felizmente medrando entre nós as sãs idéias em matéria de
colonização”. Após descrever o motivo de júbilo que envolve o governo, relaciona o
aparecimento de alguns fazendeiros que “promovem a substituição do serviço escravo pelo de
braços livres”, cita os “ricos fazendeiros do município de Valença”: o “visconde de Baependy,
os veadores Braz Carneiro Belens, Nicolau Antonio Vale Nogueira da Gama e o marquez de
Valença”.
Autorizando vir da Europa “em fins do ano passado, uma porção de famílias de colonos
suissos e alemães”, regidos por um contrato cujas condições eram assinadas “antes de
embarcarem na Europa e desconhecendo ainda completamente o meio e as condições do país
onde se engajavam, eram geralmente redigidos em proveito próprio exclusivo do empregador, e
não raro com acentuada má fé. Além disto, a coexistência nas fazendas lado a lado de escravos,
que ainda formavam a grande massa dos trabalhadores, não podia ser muito atraente para eles”,
diz Caio Prado Junior em “História Econômica do Brasil”. Estipulava o contrato que o
contratante devia pagar-lhes as passagens “até a Corte, e todas as mais despesas de transportes
dali até o ponto de seu destino”. Obrigando-se também a fornecer-lhes acomodações “logo que
cheguem as suas fazendas” assim como víveres e medicamentos.
Os contratos se estendiam por artigos e parágrafos, nos quais pinçamos alguns, por achar
mais interessante: Ao colono era entregue certo número de pés de café para tratar, colher e
beneficiar os frutos, recebendo também uma porção do terreno “para plantação da horta e de
cereais para seu sustento”.
Deveriam “viverem socegadamente”; indenizarem os proprietários “dos adiantamentos
que fizeram, quer com o seu transporte, quer com alimentos, curativo, vestuário, ou outras
cousas que possam necessitar”. Não praticarem qualquer tipo de comércio. Não se afastarem da
fazenda abandonando seus afazeres enquanto estiverem devendo ao contratante etc.etc.
E quanto aos direitos, cabia consumir os gêneros que fossem plantados e colhidos por ele
e seus familiares, repassando ao fazendeiro metade do excedente comerciado. Que no valor do
café colhido e beneficiado enviado ao mercado, seriam descontados o uso das máquinas de
beneficiamento, transporte, comissão do vendedor, e o saldo líquido divididos entre o colono e o
proprietário.

CHEGADA DOS COLONOS ÀS FAZENDAS


E SUAS LOCALIZAÇÕES

O mesmo Relatório assinala a chegada dos primeiros colonos alemães, para trabalharem
no sistema de parceria destinados às fazendas fluminenses. Originários de Hamburgo, aportaram
no Rio de Janeiro em 6 de maio de 1852, conduzidos pela barca “Princess Louise”. Com 54 dias
de viagem, e o número de 173 imigrantes, “todos protestantes”, falecendo durante a viagem
nove pessoas entre crianças e adultos. Eram contratados pelo veador Nicolau Antonio Nogueira
Valle da Gama proprietário da fazenda Independência, situada no município de Valença.
No dia 17 do mesmo mês, depois de uma viajem de 65 dias na barca “Catharina”,
desembarcaram 149 imigrantes, dos quais faleceram 4 crianças. Originários também de
Hamburgo, vieram contratados pelo barão de Baependy, dono da fazenda “Santa Rosa”, no
mesmo município, empregando “para com eles bastante generosidade, perdoando-lhes as
despesas de sustento e o transporte desde o Porto da Estrela até o lugar do seu destino”.
Junto a essa embarcação, aportava também a barca “Lorenz” com 185 passageiros dos
quais faleceram 4 crianças e nasceram 3, destinados à fazenda “Santa Justa” de propriedade do
veador Braz Carneiro Belens, no referido município.
Chegados de Hamburgo no dia 12 do mesmo mês, pela barca “Colonist” com 66 dias de
viagem desembarcaram 173 passageiros dos quais nasceram duas crianças, sem nenhum
falecimento. Todos destinados à fazenda das “Coroas” de propriedade do marques de Valença,
“situada a 25 léguas de distância da cidade de Valença”.
A única referência que temos sobre a colônia “Martim de Sá” fomos encontrar no
Relatório da Província no ano de 1854, sendo esta pertencente a José Cardoso de Menezes,
seguido de um lacônico texto registrando o número de: “66 indivíduos engajados em Hamburgo
e situada na fazenda daquele nome no município de Paraty, que ocupa a ponta da Joatinga. Os
empresários desejam vende-lo ao governo”.
Quanto a fazenda Santa Rosa, encontramos no Relatório referente ao ano de 1857, um
registro assinalando que esta colônia “pertence ao gentilhomem visconde de Baependy que a
fundou, igualmente em maio de 1852, na fazenda desse nome. Conta com 128 colonos dos quais
65 homens e 63 mulheres” entre as 34 crianças menores de 12 anos.
Estas fazendas colonizadas por este sistema, são confirmadas no Relatório da Província
do Rio de Janeiro do ano de 1854, quando registra: “Pelo sistema de parceria, como V. Ex. sabe,
nesta província as colônias de Independência, Santa Justa, Coroas, Santa Rosa e Martim de
Sá”.
Fechamos aqui o círculo de localização das cinco fazendas onde foram criadas as
colônias de parceria em substituição ao trabalho escravo, referentes às cartas enviadas para a
Alemanha, e publicadas no jornal local como incentivo à emigração. Apesar do otimismo
contido nelas, concluímos que este sistema iniciado pelo senador Vergueiro em São Paulo e
imitado por fazendeiros na província fluminense, resultou após dez anos de tentativas em
completo fracasso.

AS CARTAS

Em junho de 1852, o capitão L. Saabye, comandante do navio hamburguês “Lorenz”,


visitou três dessas fazendas onde estavam localizadas as colônias: Independência, Santa Justa
e Santa Rosa. “Como eram famílias muito distintas” escreveu ele em uma carta remetida à sua
pátria: “eu teria ficado muito sentido se elas tivessem sido frustradas nas suas esperanças. As
três fazendas estão localizadas numa bela região montanhosa distando uma da outra
aproximadamente uma hora a cavalo e, do Rio de Janeiro, três dias de viagem”.
O capitão elogia a recepção oferecida pelo Sr. Bellens, na fazenda Santa Justa, o qual
falava inglês e puderam conversar demoradamente. Indo em seguida ao encontro de seus
antigos passageiros que o saudou alegremente, e o recebeu dançando “na casa do proprietário”,
toda decorada para a festa de Pentecostes, “com coroas e folhagens”. Segundo o capitão, todos
estavam morando em casas provisórias afirmando que mais tarde receberiam uma casa com 4
cômodos, “bem pintada, coberta de telha e a quantia de terra que desejarem e puderem cultivar”.
No final da carta acrescenta: “nota-se que todos os emigrantes da Turíngia permaneceram
nas três fazendas acima mencionadas e, por conseguinte, moram todos juntos numa pequena
área. No total estão ai alojados mais de 600 cabeças para os quais serão contratados um
religioso e um professor”.
Ainda em uma carta (por nós resumida), enviada da colônia Independência, encontrada
na Alemanha, assinada por F. Robach dirigida a seus pais, tece estremados elogios de sua nova
vida de colono no Brasil: “Louvado seja Deus, queridos pais! Podemos agora afirmar que as
cartas impressas que lemos em Ranis só continham verdades. As casas foram sorteadas; eu
tenho a de n. 4 com a mais bela plantação de café” Afirma que ele e a esposa podem trabalhar
quando “nos apetece, ninguém nos diz nada”.
A liberdade é frequentemente elogiada afirmando que vivem livres “como passarinhos”.
O lazer consiste em “caçar, pescar e fazer o que nos agrada. Todos os domingos há música para
dançar. Minha esposa e filha receberam de presente de boas-vindas brincos de ouro e nós logo
compramos roupas melhores e de acordo com a moda daqui. Mesmo os escravos vivem aqui
melhor do que um camponês mediano na Alemanha”. Ou seja, um paraíso bíblico onde jorrava
leite e mel.
Da colônia Santa Justa, em uma carta datada de 9 de novembro de 1852, e assinada por
Henrique Möller destinada “Ao regedor (da comunidade), Sr. Bolgt em Sitsendorf”, relata que a
viagem foi tranqüila. Apenas uma “pequena tempestade” e o nascimento de seu filho cujo
batizado foi realizado no próprio navio, de cujo nome recebeu: Lorenzine.
“No dia 18 de maio aportamos no Porto Estrela, passamos pela cidade alemã de Petrópolis
onde fomos gentilmente recebidos pelos nossos conterrâneos servidos e presenteados, e
chegamos no dia 27 de maio na fazenda Santa Justa. Depois de uma semana de descanso nosso
primeiro trabalho foi na colheita de café, que ocorre nos três meses de inverno. Aqui pode-se
plantar batatas três vezes por ano. Todas as casas são caiadas e cobertas com telhas e possuem 4
aposentos. Comemos diariamente a nossa carne; usamos também semanalmente 3 quilos de
toucinho, a mesma quantidade de açúcar, além dos demais legumes. Ignoramos tributos e temos
a esperança que em poucos anos pagar como nosso trabalho o custo da nossa travessia”.
Ainda da Colônia Santa Justa, encontramos na carta assinadas por Chistian Mab,
relatando que após uma viagem de 67 dias por mar e desembarcando no Rio de Janeiro, seguiu
viagem até Porto da Estrela. “Não tivemos que nos preocupar com alojamento e alimentação
pois o administrador da colônia do nosso senhor já estava nos esperando. A viagem terrestre foi
um tanto penosa, mas com o acolhimento amistoso que encontramos, logo a esquecemos”.
Após a chegada, Chistian revela que caiu doente por um mal que ataca “mais ou menos
todos os recém chegados: o mal do clima”, afirmando que durante esse período, não passou
nenhuma necessidade, “recebi as refeições da mesa do proprietário e a minha esposa podia
buscar quanto alimento desejasse”. Foram entregues a essa família 1000 pés de café para
colheita, entretanto, afirma Christian: “não acreditem que sejamos escravos; não só vivemos
como homens livres, mas também despreocupados. As despesas da nossa viagem esperamos
pagar logo”.
A alimentação diária entregue pelo fazendeiro consistia em meio-quilo de carne, e por
semana; 2 quilos de toucinho e 1 quilo de açúcar acompanhados de legumes. Quanto às bebidas
só havia aguardente. “Se queremos beber cerveja, temos que ir até Petrópolis, a 10 milhas de
distância onde há cervejarias alemãs”.

CARTAS SUSPEITAS

Escritas entre os anos de 1852 e 1853, estas cartas foram publicadas na mesma época nos
“Folhetos para Emigrantes” e no “Suplemento do Semanário”, ambos propriedade de Günther
Fröbel, dono também de uma agencia de imigração. Mais tarde Fröbel fundou um novo jornal, o
“Allgemeine Auswaderungs - Zeitung” (Jornal Geral de Emigração) que junto com o “Jornal
Alemão de Emigração”, se tornariam os jornais especializados neste assunto “mais importante
da Alemanha no decorrer do século XIX”, diz Débora Bedocchi.
Além disto, sua editora publicava livros de viagem, guias etc., contando com auxílio de
homens que conheciam os países de destino dos alemães: Hermann Blumenau, Friederich
Gerstacker e Fritz Müler, afirmando através de editorias, que “não pretendiam incentivar a
imigração, mas sim ajudar e orientar os seus compatriotas que já haviam tomado tal decisão”,
deixando transparecer entretanto, o progresso empresarial de seus negócios
Segundo Fröbel escrevendo em um dos folhetos: “a imigração para as fazendas de café
era a única opção para os mais pobres, pois no caso, a quantia a ser despendida tanto para a
passagem marítima quanto para a viajem por terra e ainda para a acomodação e alimentação era
adiantada pelos fazendeiros”. Citando as vantagens oferecidas “pelo governo brasileiro ao
emigrante alemão”, aconselhava a iniciar “a viagem através do porto de Hamburgo” indicando
“os nomes dos corretores do navio, (Sr. Knöhr e Burchardt); preços e tipos de contrato de
emigração (Sr. Kleudgen)”, recomendando a leitura “dos livros de Hermann Blumenau e do Dr.
Schmidt para aqueles que desejem maiores informações sobre “o maravilhoso e abençoado
país”.
Débora Bedocchi, que examinou na Alemanha os jornais da época, suspeita que Fröbel,
agente de emigração e dono destes meios de comunicação, manipulava as informações a serviço
de seus interesses econômicos, parecendo a ela, entretanto, ser “difícil acreditar que ele tentasse
“enganar” os emigrantes com o intuito de vender um número maior de passagens. Será que
podemos afirmar que especularam com os emigrantes como, por exemplo, as companhias de
navegação e seus corretores que viviam do transporte de “mercadoria-humana”, ou foram
ambos movidos por um ideal maior?”.
Hoje é extremamente temeroso autenticar a veracidade dessas cartas escritas com
espontaneidade. Teriam sido elas censuradas pelo próprio Fröbel ou pelos fazendeiros
fluminenses, “filtrando” as missivas enviadas das fazendas fluminenses como acontecia em
Ibicabas, no intuito de incentivar a colonização a serviço de seus interesses, em substituição a
mão de obra escrava?

OUTRAS COLONIAS

Outras colônias ou projetos criados nesse período, encontramos nos Relatórios da


Província:

Santa Fé, no município de Canta Galo, freguesia de Nossa senhora da Conceição do


Paquequer, de Nova Friburgo, iniciada no ano de 1846, pertencente ao padre Francisco de
Castro Abreu Bacellar, que mandou contratar em Portugal 23 rapazes de 12 a 16 anos de idade,
exigindo que “fossem afeitos à lavoura, moralizados e amigos do trabalho”. Anos mais tarde
este núcleo colonial era composto de “100 indivíduos”, assalariados que “segundo informa o
fundador da colônia prestam-se não só ao serviço de plantação, como mesmo a derrubada das
matas”.
Em Canta Galo também foram criadas pelo barão de Nova Friburgo e seus sócios as
colônias de: “Santa Rita, São Martinho, Laranjeiras, Macuco, Boa Sorte e Boa Vista”. “O
número de colonos é superior ao de 900 compreendendo todas as idades de ambos os sexos, e
sua nacionalidade é portuguesa”.
Qualificando o comendador Antonio Clemente Pinto de “opulento fazendeiro”, o
Relatório afirma que em suas terras tem já plantado “mais de cem mil pés de café em uma das
fazendas”, e já estava iniciando uma sociedade com o “hábil engenheiro Jacob Van-Erven, onde
tenciona, assim que os cafezais tiverem próximo a produzir, empregar não pequena porção de
colonos, mandando-os engajar na Bélgica e na Holanda pelo dito engenheiro”.

União: no mesmo município, do cidadão Pio Correa de Azevedo, “contém mais de 60


pessoas, também vindas de Portugal, e das suas ilhas européias. Está situada na paróquia do
Carmo, e os empregam por parceria ou salário”.

Valão dos Veados; situada à margem de “Dois Rios” no município de São Fidélis, tendo
o empresário Eugenio Aprisco da Veiga criado uma Sociedade denominada “Colônia Agrária
do Vallão dos Veados”, oferecendo ações no “valor de 100$00 cada uma”, nomeando uma
diretoria composta de seis membros “a qual tratou logo de dar princípio a execução do seu
sistema: ligar o colono ao solo tornando-o proprietário, mediante uma renda módica”
estabelecendo na colônia um “depósito de trabalhadores livres, a fim de que os fazendeiros das
circunvizinhanças possam ali contratar os serviços de que precisarem”. A Sociedade propunha
oferecer “engenho de açúcar e máquinas para outros produtos, percebendo o estabelecimento
pelo uso delas”. Finaliza dizendo que esta população colonial que em 1832, época em foi criada,
era de 235 indivíduos, compunha-se até 1852 de 309 colonos.
Floresta; propriedade do conselheiro Barreto Pedroso que mandou vir da suíça “por
intermédio do cônsul geral do Brasil na Bélgica, uma porção de colonos que pretende empregar
na sua fazenda situada no termo de Itaguaí, paróquia de São Pedro e São Paulo”.

Pedra Lisa; fundada em 12 léguas de terras doadas pelo governo imperial por decreto
de 21 de janeiro de 1842, “para o fim de se estabelecerem colônias agrícolas e industriais”...
“Ficam elas entre os fundos do sertão do Nogueira e as férteis margens do rio Itabapuana,
estende-se para o centro pelo Carangola, sertão do Pury e do Pomba até as divisas do município
de Cantagalo e da província de Minas Gerais”.
Com destino a esta colônia aportaram no Rio de Janeiro 130 colonos, seguindo para
Pedra Lisa aonde chegaram em 30 de janeiro de 1844 “sem que encontrassem aí construídas
habitações para moradia”, além de amargarem a falta de “bagagem, máquinas e ferramentas
detidas na alfândega”, sendo-lhes entregues meses depois quase inutilizadas. Com a dispersão
das famílias, esta colônia teve vida efêmera, com mútuas acusações entre o governo e o
empresário.

Belgasse; para a fundação desta colônia o presidente da Província em 26 de outubro de


1843, contratou com “o francês Luiz José Maria Belgasse, a introdução de 600 colonos, com
passagens pagas pelos cofres provinciais, concedendo-lhe para isso 2 léguas quadradas de
terras”, para seu projeto de ampliar a cultura da cana e fabricação de açúcar..

Passa Três; colônia fundada em 14 de setembro de 1855, na freguesia do mesmo nome


com o título de Nossa senhora da Freguesia do Passa Três, pertencente ao comendador Joaquim
José de Souza Breves no município de São João do Príncipe, com os colonos distribuídos em
quatro fazendas, “na distância de um quarto de légua uma da outra” denominando-se: “São
Joaquim; São José; São Gabriel e São João Baptista”.
Esta colônia era composta de 29 famílias de lavradores originários da Ilha da Madeira,
com um total de 228 indivíduos de ambos os sexos. Havia 61 crianças entre 1 e 7 anos; 76
jovens entre 7 e 15 anos; 13 rapazes entre 15 e 25 anos e 78 adultos entre 25 e 60 anos.

Colônia do Nelis: Concedida pelo governo provincial meia légua de terras ao empresário
belga Ludgero José Nelis, que “se estavam demarcando na Pedra Lisa, a fim de se estabelecer
nela uma colônia agrícola”, obrigando-o por contrato “de 10 de maio de 1843, a mandar vir da
Bélgica, ou da Alsácia, 125 colonos para ali se ocuparem na lavoura e cultura das terras”.
Adiantando o pagamento das passagens dos colonos, o governo também se comprometia a
construir casas para suas residências, o que seria mais tarde reposto por Nelis em 3 prestaçãos.
“No intento de animar a colonização, estabeleceu-se que se o empresário desempenhasse bem
seus compromissos seria auxiliado nas despesas de transporte dos colonos de Niterói a Campos,
e com distribuição de casais de animais para começo da criação”.
Com a falta de cumprimento dos contratos de ambas as partes, agravado por conflitos
relativo “a exagerada pretensão dos colonos, relativamente ao pagamento de salários,
motivaram graves desinteligência que deram em resultado a retirada destes, com exceção de 10
que ali ficaram”, tendo o mesmo fim da colônia da Pedra Lisa.

São Julião - na fazenda do mesmo nome. Seu proprietário Julião Baptista Coqueiro,
mandou contratar na cidade do Porto 116 colonos para empregá-los em seu engenho de açúcar
“moente e corrente, com grande cultura de cana e de mantimentos. Tem já começada uma
plantação de café que será aumentada”, situada às margens do rio Imbé, “com meia légua de
frente e uma de fundo, no termo de Campos”.
O contrato original foi assinado na Corte no dia 22 de abril de 1851 “com João Joaquim
Correa de Brito, capitão da galera Nova-Subtil”, comprometendo-se o proprietário a pagar a este
as passagens, em prestações, durante três anos e “a entregar aos colonos metade de todos os
lucros da fazenda, depois de divididas as despesas de seu custeio” obrigando-se a fornecer-lhes
“médico e botica”.

Sapucaia – Pertencente ao comendador José Ribeiro da Castro, esta fazenda achava-se


“distante duas léguas da cidade de Campos”, à margem direita do rio Muriaé. Ali chegaram em
15 de agosto de 1856, 55 pessoas contratadas em Portugal, fazendo um total de 17 famílias, ao
juntar-se com mais algumas que já se encontravam. Destinavam-se a plantação de cana e
“produtos de gêneros alimentícios, como informa o proprietário”, afirmando que os colonos
“tem tirado bons lucros com seu trabalho”.
Os conflitos, porém são percebidos através da reclamação do comendador revelando que
“não está satisfeito com alguns deles, por se terem tornado desordeiros, irreverentes e infratores
do contrato; achando-se resolvido a despedi-los, conservando os melhores, e a mandar contratar
outros de boa conduta”.

São Paulo – Propriedade do Dr. Antonio Ribeiro de Castro, foi fundada nesta fazenda em
1856, “à margem do norte das cachoeiras do rio Muriaé, em Campos”, a colônia São Paulo.
Mandando vir da Ilha de São Miguel “36 indivíduos”, contava em 1860, segundo o Relatório
daquele ano, com 28 famílias com um total de 131 pessoas.
Dedicado lavoura de cana de açúcar que abastecia o engenho, e a cultura de gêneros
alimentícios, estes colonos “vivem satisfeitos, e o proprietário da fazenda procura todos os
meios de melhorar-lhes a sorte, favorecendo a construção de casas, e em outros objetos do
serviço da lavoura”, afirma o Relatório.

Americanos do Norte – Em um contrato encontrado por nós no Relatório da Província


de 1869, na página 27, assinado em 25 de janeiro daquele ano entre o Governo Provincial e o
Sr. Carlos Nathan, obrigava-o a assentar nesta província dentro do prazo de um ano “seiscentas
famílias ou três mil imigrantes, procedentes de Nova Orleans, Mobile e outros Estados do Sul
da União Americana”.
Exigia também que esses colonos chegassem dentro de seis meses a partir da assinatura
do contrato. Foi adiantado ao contratante a quantia de 20.000$000, correspondendo a 1/3 do
total para fazer face às despesas como: “fretamento de navios, aquisição de casas para agasalho
dos imigrantes, guarda de suas bagagens e instrumentos, tendo ele prestado fiança idônea, e se
obrigado a restituir a importância recebida e seus juros, no caso de falta de execução do
contrato”.
Entretanto o contratante alegou que seria impossível atender aquela exigência no prazo
estipulado, pois havia “encalhado no rio Mississipe o vapor que conduzia os colonos que
deviam seguir no navio Elisa Stevens”, pedindo para prorrogar o prazo por mais seis meses.
Um ano depois, não satisfeita as exigências para a vinda dos colonos, o Governo negou
novo prazo e intimou-o para que devolvesse a quantia “e os juros legais correspondentes ao
tempo que teve em seu poder, o que efetivamente foi realizado por seu fiador”.
Muito estranha esta tentativa de trazer colonos dos Estados Unidos da América do Norte,
num período de pleno processo de colonização daquele país.

NOVA TENTATIVA

Após o fracasso das “parcerias”, o Governo divulgou em 1867 um regulamento


estabelecendo novas colônias na Província, com distribuição de terras e condições de
propriedade, distribuídos em 45 parágrafos agrupados em quatro capítulos. Resumindo os
diversos artigos, assinalamos ao que se referia, “a designação do respectivo nome e distrito
colonial previamente escolhido, medido e demarcado por engenheiro do governo”.
Seria elaborada uma planta da respectiva colônia com demarcação de lotes, “o traço das
estradas e pontes projetadas, rios e grandes córregos, como terrenos reservados para a povoação
destinados para ruas, praça, logradouros públicos, igreja, escola, cemitério, casa de
administração, cadeia e outros edifícios coloniais”.
Aos colonos seriam destinados estes lotes escolhidos livremente “pagando à vista o preço
fixado ou à prazo, adicionando 20% feito em cinco prestações”. Previa também que o colono
que ali não fizesse dentro do prazo de dois anos, “morada habitual e cultura efetiva”, perderia o
direito ao lote, sendo este “vendido em hasta pública”.
Uma junta composta de oito membros nomeada pelo governo administraria a colônia,
com o objetivo de construir “um edifício especial onde se recolham provisoriamente os colonos
recém-chegados até receberem seus respectivos lotes”. Teriam o direito de receber nesta ocasião
“as sementes mais necessárias para as primeiras plantações destinadas ao seu sustento, e bem
assim os instrumentos agrários de que precisarem”.
No artigo final datado de 19 de janeiro de 1867, o regulamento determinava que às
colônias que se fundassem dentro deste critério “seria proibido sob qualquer pretexto a
residência de escravos”, sós ou com família.
Não sabemos o destino destas colônias, seu êxito ou fracasso. Sabemos apenas que o
trabalho assalariado medrou durante o final do século XIX, constituindo daí em diante a relação
de trabalho entre o capital e a mão de obra.

POSFÁCIO

O processo das migrações é um estudo apaixonante que revela uma valiosa compreensão
das relações culturais e econômicas entre dois países. O presente ensaio é apenas uma
contribuição aos que se dedicam ao assunto, seguindo um retrospecto histórico de seu início no
Brasil durante o século XIX, e procurando examinar as raras fontes existentes em relação ao Rio
de Janeiro.
Por meio delas podemos observar a tentativa de substituir a mão-de-obra escrava pelo
trabalho assalariado nas regiões cafeeiras. “A fazenda fluminense, como as do vale do Paraíba e
as dos primeiros tempos em São Paulo, formava uma unidade fechada, suficiente, quase
autárquica” assinala Sérgio Buarque de Holanda, e acrescenta: “a estrutura dessas propriedades
fundava-se tão profundamente no braço escravo, que mal se podia conceber nelas o emprego
proveitoso de trabalhadores europeus”.
Alcançando a última fase da economia escravocrata, o café iniciaria na segunda metade
do século XIX uma experiência com o trabalho do imigrante, em um sistema de parceria
introduzido nas fazendas do senador Nicolau Vergueiro, em Ibicabas, São Paulo, cujo fracasso
não impede afirmar que foi o que facilitou a substituição do trabalho escravo para o trabalho
assalariado. “Utilizou-se também um sistema de empreitada. Por essa maneira o empreiteiro
recebia um pedaço de terra, obrigando-se a restituí-la plantada de cafeeiros passados quatro
anos. Aí recebia então do proprietário 400 réis por pé de café. Participaram desse sistema,
principalmente nos trabalhos de arroteamento do terreno, elementos alemães”.
Em conclusão muito sucinta esses resultados são bastante significativos, não apenas por
terem ampliado nossos conhecimentos a respeito da imigração em solo fluminense durante o
período monárquico, como as contribuições econômicas e culturais que elas trouxeram e
semearam, abrindo caminhos para novas linhas de investigação, revelando fontes até aqui
inéditas ou pouco utilizadas.

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