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O princípio da indução e sua relação com as ciências empíricas

Rodrigo Albuquerque Prudente

RA: 236201

Usando aquilo que nos é dado na sensação, produzimos relações espaciais e temporais,
que nos permitem localizar os objetos no espaço e apreender a ordem de ocorrência dos
eventos. Seguindo o pensamento de Russell, o Sol é um aglomerado de dados dos sentidos
que apresenta certa forma, calor e cores, e está posicionado e ordenado no espaço e no tempo.
Ele pode ser percebido imediatamente pelos sentidos ou conhecido, de modo mais amplo, por
descrições definidas. Estas maneiras de conhecer os objetos do mundo estão inseridas no
“conhecimento de coisas”.

Além disso, podemos expandir ainda mais o nosso conhecimento sobre o Sol. As
pessoas estão seguras em afirmar que o Sol nascerá amanhã. Ao fazer tal afirmação, elas estão
inferindo uma informação que ainda não foi experimentada, pois ninguém vivenciou o dia
seguinte ainda. Estas inferências surgem de nossas crenças sobre as regularidades do mundo,
que buscamos explicar pela noção de causa e efeito. Esta maneira de inferir fenômenos não
observados do mundo, está contida no “conhecimento de verdades” que é obtido por meio de
alguns princípios. Assim, as inferências ampliam nosso conhecimento para além de nossa
experiência do presente, e de nossa memória individual.

Contudo, se pensarmos num futuro longínquo, podemos acreditar que o Sol continuará
nascendo? Segundo Russell, a nossa convicção sobre as aparições futuras do Sol é uma crença
baseada em eventos do passado. Disto, não podemos provar se este tipo de crença é razoável e
que continuará se cumprindo futuramente, mas podemos classificar crenças gerais para
justificar, suficientemente, nossos juízos do mundo. Assim, a constante repetição de
experiências do passado é o único motivo que temos para tentar justificar as crenças sobre
nossas expectativas.

Se transferíssemos nossa dúvida para algo mais geral, como as leis do movimento,
recorreríamos ao mesmo tipo de crença para tentar justificá-la; mas o que garante que elas
continuarão ocorrendo para sempre? A única razão que temos para acreditar nisto, é porque
até hoje elas atuaram (na medida do conhecimento que possuímos do passado), e isto permite
explicar muitos outros fenômenos do mundo, como o próprio nascer do Sol que é uma

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particularidade destas leis. Entretanto, a constância destas leis nos oferece apenas expectativas
e nunca uma certeza. Desta maneira, Russell não visa encontrar provas que expliquem os
fenômenos, mas busca razões para demonstrar que essas crenças são confiáveis.

Temos assim, que frequentes repetições de experiências são as causas de nossas


expectativas criadas pelo hábito. No entanto, sabemos que estas expectativas estão sujeitas ao
erro. Umas mais e outras menos, visto que certos fenômenos estão inseridos em leis mais
gerais, assim como o nascer do Sol é um caso particular das leis do movimento. Se o Sol
deixasse de existir, as leis do movimento continuariam agindo em outros corpos do Universo.
Mesmo que as leis do movimento sejam mais gerais, não sabemos se elas serão eternas. Por
isso, devemos distinguir a expectativa causada por regularidades, da confiança atribuída
nessas expectativas, mais ou menos, suscetíveis de mudança.

Este é justamente o objetivo dos cientistas, isto é, descobrir leis gerais da natureza que
não possuam exceções; quanto maior o número de repetições invariáveis, menos sujeitas
estarão ao erro. Eles buscam elaborar teorias e aperfeiçoá-las para que estejam em
conformidade com as leis mais gerais da natureza; e a partir delas elaboram leis mais
específicas, alcançando resultados práticos em diversas áreas. Teorizando estas leis da
natureza a partir de regularidades observadas, os cientistas inferem informações sobre o futuro
e passado. Por exemplo, os astrônomos que teorizam sobre o fim do Sol, ou os geólogos, que
buscam explicar a formação do planeta Terra.

No entanto, para Russell, inúmeros casos de repetições não provam, racionalmente,


que estas leis gerais (como as leis do movimento) continuarão ocorrendo. Ainda assim, quanto
mais frequente forem suas manifestações, maiores serão as probabilidades que continuem
atuando em ocasiões futuras, ou que atuavam em tempos remotos; logo, sua ocorrência se
aproxima de uma “quase certeza”. Esta aproximação da certeza, é um processo indefinido e
ocorre enquanto os casos investigados continuarem se repetindo. Ao tratarmos nossas crenças
sobre os fenômenos do mundo desta maneira, na verdade estamos utilizando o “princípio da
indução”.

O princípio indutivo é um mecanismo cognitivo usado para projetar regularidades, não


observadas, baseando-se na coleção de casos experimentados. Se relâmpagos (A) foram
percebidos sempre acompanhados de trovões (B), e nunca separados, então, quanto maior for
o número de casos dessa associação (A e B), maior será a probabilidade de que o próximo

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relâmpago (A) visto estará conectado a um trovão (B). O princípio indutivo nos aproxima de
uma quase certeza e nos possibilita fazer associações regulares, mas não nos garante que os
fenômenos continuarão ocorrendo para sempre e em todos os casos.

Apesar do fato de que eventos possam contrariar nossas expectativas, isso não
impossibilita que o princípio seja bem sucedido em casos particulares, pois a probabilidade
sempre estará relacionada a dados experimentados. Assim, alguns dados não observados
poderiam alterar tal probabilidade. Por exemplo: uma pessoa que durante toda sua vida
observou apenas a existência de cisnes brancos, poderia inferir que todos os cisnes são dessa
cor. De acordo com Russell, a existência de cisnes negros não observados pelo sujeito, não
poderia provar que a indução usada por ele estava errada. Pois, o princípio foi aplicado dentro
de sua amostra de dados particulares, mostrando apenas que a indução está correta se ela for
restrita aos fatos observados até o momento. Logo, o princípio indutivo não é passível de ser
refutado experimentalmente.

O princípio também não pode ser provado pela experiência, pois todas as explicações
atribuídas aos fenômenos não experienciados, estão baseadas nele. É por meio dele, que os
cientistas inferem o passado da Terra e o futuro do Sol. O problema que surge disso, é que ao
tentarmos provar o princípio indutivo por meio da experiência, cairíamos em uma “petição de
princípio”. Quer dizer, ao tentar explicar um fato usando o próprio fato, criamos um
argumento circular vicioso. Por exemplo: o Sol nascerá amanhã porque durante todos os dias
de nossas vidas ele tem nascido; isso não é uma justificativa, visto que as regularidades
causam as expectativas, mas não justificam a repetição dos fenômenos.

David Hume que tratou do problema anteriormente, afirmou que ele não tem solução,
pois não há justificativa racional para o princípio. Segundo o autor, existem apenas dois tipos
de raciocínios: dedutivos e indutivos; ambos não são capazes de justificar o princípio. Ao
tentarmos justificar o princípio como uma dedução, encontraríamos um problema de
contradição, pois um argumento dedutivo, por definição, implica necessariamente, que a
conclusão se siga logicamente das premissas (e isso contradiz a indução). Se buscarmos uma
justificativa indutiva - dizer que o princípio é verdadeiro, porque raciocínios indutivos foram
bem sucedidos no passado -, então esbarraríamos em um argumento circular vicioso. Assim, a
indução não seria um mecanismo racional, mas sim intuitivo, derivado de nossa natureza
animal.

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A forma que Russell encontra para lidar com o problema, apresenta uma dupla via
para seguirmos. A primeira, é aceitar a “evidência intrínseca” do princípio indutivo, isto é, por
ser um princípio geral, ele é fundamental para explicação de outras coisas e não há algo mais
básico que o explique. Este tipo de argumento, é conhecido na filosofia como “argumento
transcendental”. O outro caminho é abdicar do princípio e, consequentemente, renunciar todas
as nossas expectativas em relação ao futuro ou passado.

Se não admitirmos o princípio, perdemos a razão não somente em acreditar que o Sol
nascerá amanhã, mas também em todos os princípios gerais das ciências empíricas (biologia,
física, química, etc.), e suas explicações mais simples baseadas na noção de causa e efeito; por
exemplo: a crença de que uma caneta cairá quando for solta de uma determinada altura, seria
desmanchada. Portanto, toda ciência baseada na experiência, que nos possibilita inferir novos
conhecimentos daquilo que não foi observado, é fundamentada numa crença (princípio
indutivo) que não pode ser provada, nem refutada, pela própria experiência.

Referência Bibliográfica

RUSSELL, Bertrand. Os Problemas da Filosofia. Tradução: Jaimir Conte. Home


University Library, 1912. Oxford University Press paperback, 1959.

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