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Módulo IV

O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica.


Filosofia – 11.º Ano – 2019-20 – Doc. 6

1.2. Análise Comparativa de Teorias Explicativas do Conhecimento

1. O problema da possibilidade do conhecimento (Será o conhecimento possível?)

A Resposta Fundacionalista

B – O Fundacionalismo clássico (ou empirista) – David Hume (1711-1776)

3. Princípios de associação de ideias

Hume não se limitou a classificar os tipos de conhecimento e a determinar a origem das nossas
ideias; ele pretendia fazer uma verdadeira ciência da natureza humana. Daí que tenha
procurado estabelecer os princípios de associação de ideias na mente humana, tal como
Newton estabeleceu as leis de atração entre os corpos e o mundo físico. Na sua opinião,
existem três princípios de associação de ideias, a saber:

 A Semelhança: quando duas ideias são semelhantes, a consideração de uma delas


conduz-nos à consideração da outra. Por exemplo, é natural que a contemplação de
um retrato nos faça pensar na pessoa retratada.
 A Contiguidade: quando duas ideias são contíguas no espeço ou no tempo, a
consideração de uma delas evoca a consideração da outra. Por exemplo, se sei que a
sala de estar se situa no alinhamento da entrada de minha casa, é natural que me
venha à mente a representação de um desses espaços sempre que penso no outro. O
mesmo acontece quando dois acontecimentos são contíguos no tempo: se é costume
jantar depois do pôr-do-sol, é natural que pense em comida de cada vez que o Sol se
põe.
 A Causalidade: quando representamos duas ideias como correspondendo a uma
relação causa-efeito, é natural que a consideração da causa nos transporte para a
consideração do efeito. Por exemplo, se pensarmos numa ferida é comum pensarmos
na dor que naturalmente lhe está associada.

Estes três princípios de associação parecem triviais e incontroverso, mas será que o empirismo
de Hume está devidamente equipado para lidar com todos eles?

Se prestarmos a devida atenção, não será difícil perceber que o princípio da causalidade
coloca sérios problemas à abordagem empirista de David Hume.

4. O problema da causalidade

A ideia de causalidade coloca um enorme desafio ao empirismo de Hume, pois, embora


aparentemente seja inquestionável que somos detentores dessa ideia, a sua origem não
aprece ser tão clara. Afinal, de onde vem a ideia de causalidade?

Não se trata de uma relação de ideias, pois da sua negação não resulta qualquer contradição.
Por exemplo, ao ver uma bola de bilhar mover-se em direção a outra posso perfeitamente
conceber uma série de acontecimentos alternativos: posso imaginar que ambas as bolas ficam
paradas, que a segunda fica parada e a primeira volta para trás, que a primeira para e a
segunda se desloca numa ou noutra direção, etc. Resta-nos a possibilidade de se tratar de uma
questão de facto, pelo que a veracidade do princípio da causalidade não pode ser estabelecida

Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, Figueira da Foz


Professor: Elisa Matos 2
Módulo IV
O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica.
Filosofia – 11.º Ano – 2019-20 – Doc. 6
senão através da experiência. No entanto, a experiência não nos responde a isto, pois tudo o
que vemos são dois acontecimentos surgirem frequentemente associados, mas não temos
qualquer impressão sensível do que é essa suposta conexão necessária entre ambos.

Apesar destas dificuldades, Hume não fica sem resposta para os problemas suscitados pelo
Princípio da Causalidade e recorre a uma experiência mental para nos mostrar que, apesar de
não haver uma impressão que lhe corresponda diretamente, a ideia de causalidade tem
origem na experiência.

Um Adão inexperiente

“Apresente-se um objeto a um homem dotado da mais forte capacidade e razão natural; se


esse objeto for inteiramente novo para ele, mesmo o exame minucioso das suas qualidades
sensíveis não lhe permitirá descobrir quaisquer das suas causas ou efeitos. Adão, ainda que
supuséssemos que as suas faculdades racionais fossem inteiramente perfeitas desde o início,
seria incapaz de inferir da fluidez e transparência da águia que o sufocaria, nem da
luminosidade e calor do fogo que este o poderia consumir. (…)
Observaria imediatamente uma contínua sucessão de objetos e um evento a seguir a outro,
mas não conseguiria descobrir nada mais além disso. (…) Não seria, no início, capaz de
apreender por meio de quaisquer raciocínio a ideia de causa e efeito; (…) sem mais
experiência, jamais poderia conjeturar ou raciocinar acerca de qualquer questão de facto ou
assegurar-se de alguma coisa além do que estivesse imediatamente presente à sua memória e
aos seus sentidos.
Suponhamos agora que ele tenha adquirido mais experiência e tenha vivido no mundo o
suficiente para observar que objetos ou acontecimentos similares estão constantemente
conjugados uns com os outros. Qual a é a consequência desta experiência? Que ela passa
imediatamente a inferir a existência de um objeto a partir do aparecimento do outro. (…) Há
um (…) princípio que o obriga a chegar a essa conclusão.
Esse princípio é o costume ou hábito.”
David Hume (1748), Investigação sobre o Entendimento Humano, Lisboa, ONCM, 2002, pp.46-57.

Tarefa: Para Hume, qual é a origem da ideia de causalidade?

Na opinião de Hume a ideia de relação causal ou conexão necessária entre dois


acontecimentos mais não é do que a expectativa de que um deles, a que chamamos efeito, irá
ocorrer sempre que o outro, a que chamamos causa, ocorra. Esta expectativa resulta do
hábito, ou costume, isto é, da experiência que temos de uma conjunção constante desses dois
acontecimentos.

Esta experiência mental serve para mostrar que alguém inexperiente, ainda que dotado das
mais desenvolvidas capacidades racionais, nunca poderia inferir um efeito a partir da sua
respetiva causa numa única ocorrência, apenas seria capaz de o fazer após verificar que estes
dois acontecimentos aparecem constantemente um a seguir ao outro.

Deste modo, Hume conclui que a ideia de relação causal ou conexão necessária entre dois
acontecimentos mais não é do que a expetativa de que um deles, a que chamamos efeito, irá
ocorrer sempre que o outro, a que chamamos causa, ocorra. Esta expectativa resulta do
hábito, ou costume, isto é, da experiência que temos de uma conjunção constante desses dois
acontecimentos, pelo que não se funda na razão, mas sim num impulso natural irresistível e
fundamental para o nosso dia a dia.

Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, Figueira da Foz


Professor: Elisa Matos 2

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