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Por Que a Maioria Das Pessoas é Covarde?

Obediência e o Aumento do Autoritarismo

"O autoritarismo na religião e na ciência, para não falar na política, está se


tornando cada vez mais aceito, não exatamente porque muitas pessoas acreditam
explicitamente nisso, mas porque se sentem individualmente impotentes e ansiosas.
Então, o que mais se pode fazer... senão seguir o líder político das massas... ou
seguir a autoridade dos costumes, da opinião pública e das expectativas sociais?"

— Rollo May, O Homem à Procura de Si Mesmo

O psicólogo americano Rollo May escreveu estas palavras em 1953, e nas décadas que
se seguiram, o Ocidente caminhou cautelosamente rumo à tirania. Um estado de
vigilância em massa foi estabelecido, a liberdade de expressão cedeu lugar a
crescentes níveis de censura, a burocracia estatal e regulamentações opressivas
invadiram cada vez mais áreas da vida, e as taxas de impostos alcançaram níveis
que, no passado, teriam provocado uma revolução. Entretanto, nos últimos anos, esse
caminhar cauteloso rumo à tirania se transformou em uma corrida, já que alguns
países ocidentais flertam com um regime totalitário completo. Mas a existência de
políticos sedentos de poder e psicologicamente perturbados que desejam controle
total não é o que torna nossa situação particularmente precária, pois tais
indivíduos existem em todas as épocas. Em vez disso, nossos problemas residem no
fato de que pouquíssimas pessoas possuem a única virtude capaz de reverter a maré
em direção à liberdade, ou seja, a virtude da coragem. E conforme advertiu
Aleksandr Solzhenitsyn em 1978:

"Um declínio na coragem pode ser o aspecto mais marcante que um observador externo
percebe no Ocidente em nossos dias... Será que devemos destacar que, desde os
tempos antigos, a queda da coragem tem sido considerada o começo do fim?"

— Aleksandr Solzhenitsyn, Um Mundo Dividido

Neste ensaio, vamos explorar como uma hiperconformidade e obediência cega e


irresponsável contaminaram o Ocidente e, no processo, ofuscaram o cultivo da
coragem. Discutiremos como a covardia generalizada está permitindo o surgimento do
autoritarismo e como o renascimento da coragem é o antídoto para nossa difícil
situação política.

A conformidade patológica que afeta o Ocidente é resultado de gerações e de uma


confluência de fatores. É impulsionada por um sistema de valores em que a validação
social ocupa uma posição proeminente. É agravada pelo uso das redes sociais e pelo
fato de que o sucesso nessas plataformas é alcançado através da sinalização de
virtude e da conformidade com os sabores morais do dia. Também é produto de um
sistema educacional que diviniza o ideal democrático e promove os direitos da
maioria sobre os direitos do indivíduo. Esses fatores, combinados com outros,
criaram uma sociedade de hiperconformistas, e como o psicólogo Rollo May explicou:

"O oposto da coragem... em nossa época específica, é a conformidade automática."

— Rollo May, O Homem à Procura de Si Mesmo

Uma das formas em que o conformismo ocidental se manifesta é através da adesão


inquestionável e do desejo patológico de seguir normas estabelecidas. Muitas
pessoas acreditam que ser um bom cidadão envolve acatar o que lhes é ordenado por
aqueles em posições de autoridade política, bem como por seus representantes na
mídia e no mundo das celebridades. Ao agir com submissão cega, o conformista não
distingue a moralidade da legalidade e, assim, permanece intencionalmente alheio ao
fato de que regulamentos governamentais podem ser antiéticos, impulsionados pela
corrupção e, por vezes, conduzir à degradação individual e coletiva. Ou como Rollo
May explica:

"...nosso problema específico nos dias atuais... é uma tendência avassaladora à


conformidade... Em tempos assim, a ética tende cada vez mais a ser identificada com
a obediência. Alguém é 'bom' na medida em que obedece aos ditames da sociedade... É
como se a obediência inquestionável fosse melhor... Mas o que realmente há de ético
na obediência? Se o objetivo fosse simplesmente a obediência, poder-se-ia treinar
um cachorro para cumprir muito bem os requisitos."

— Rollo May, O Homem à Procura de Si Mesmo

Ver outras pessoas exercerem julgamento independente, responsabilidade pessoal e


autossuficiência perturba a crença do conformista no valor da obediência e ameaça
seu senso de identidade. Não é o caso, portanto, de o conformista obedecer enquanto
permite que os outros tenham a liberdade de fazer suas próprias escolhas; pelo
contrário, como Stanley Feldman explica em um artigo intitulado "Exigindo
Conformidade Social":

"...pessoas que valorizam a conformidade social... apoiam o governo quando este


deseja aumentar seu controle sobre o comportamento social e punir a não
conformidade... valorizar a conformidade social aumenta a motivação para impor
restrições ao comportamento... o desejo de liberdade social agora é subordinado à
aplicação de normas e regras sociais. Assim, grupos serão alvo de repressão na
medida em que desafiarem a conformidade social...

— Stanley Feldman, Exigindo Conformidade Social: Uma Teoria do Autoritarismo

Quando a maioria defende a imposição governamental da conformidade, uma sociedade


se coloca no que o psicólogo Ervin Staub chamou de "continuum de destruição". À
medida que o governo usa coerção e força para punir uma minoria não complacente, a
maioria racionaliza seu apoio a tais medidas autoritárias, demonizando ainda mais
os não complacentes, levando a medidas governamentais cada vez mais severas.

"Uma consequência psicológica da prática do mal é a desvalorização adicional das


vítimas... as pessoas tendem a assumir que as vítimas mereceram seu sofrimento por
suas ações ou caráter."

— Ervin Staub, A Psicologia do Bem e do Mal

Em vários países no século XX, como União Soviética, Turquia, Alemanha, Camboja e
China, medidas governamentais como proibir certos grupos minoritários de frequentar
restaurantes, bares, cafés e outros espaços públicos, impor toques de recolher,
expulsá-los de seus empregos, obrigá-los a pagar multas e restringir sua liberdade
de movimento e encontros, funcionaram como os primeiros passos em um continuum de
destruição que culminou em bodes expiatórios em massa, encarceramento e
assassinatos em massa. Em seu livro "A Psicologia do Bem e do Mal", Ervin Staub
elabora sobre o mecanismo psicológico que facilita um continuum de destruição.

"Como se estabelece o comportamento nocivo como norma?... Causar dano a alguém bom
ou assistir passivamente a isso é incompatível com o senso de responsabilidade pelo
bem-estar alheio e a crença em um mundo justo. Essa incoerência nos incomoda.
Buscamos minimizar tal desconforto, diminuindo nossa preocupação com o bem-estar
daqueles que prejudicamos ou permitimos que sejam maltratados. Desqualificamos
essas pessoas, justificamos seu sofrimento por seu suposto caráter maligno ou por
ideais superiores. Surge, então, uma perspectiva diferente em relação às vítimas,
uma postura distinta frente ao sofrimento e um conceito transformado de nós
mesmos."

— Ervin Staub, A Psicologia do Bem e do Mal


Para combater o continuum de destruição que é produto de excessiva conformidade e
excessiva força governamental, mais pessoas precisam agir com coragem moral. A
coragem moral implica a disposição para enfrentar riscos a fim de desafiar ordens
imorais, rejeitar o controle governamental autoritário e defender os valores cada
vez mais escassos de verdade, liberdade e justiça. E como Rushworth Kidder explica
em seu livro Coragem Moral:

"Onde não há perigo, não há coragem... Qualquer um pode 'suportar' segurança e bem-
estar. Os verdadeiros desafios... surgem diante do perigo... Assim acontece com a
coragem moral, onde o perigo é suportado em nome de um compromisso abrangente com a
consciência, com os princípios ou valores fundamentais.

— Rushworth Kidder, Coragem Moral

Certos atos de coragem moral envolvem riscos relativamente menores, como enfrentar
ridicularização, insultos ou ostracismo. Por exemplo, se nos posicionarmos contra
uma crença dominante diante de um grupo de conformistas, ou nos recusarmos a seguir
práticas sociais ou imposições que consideramos imorais ou insensatas, podemos
acabar perdendo amigos ou receber críticas por parte daqueles que obedecem
cegamente. Mas este é um pequeno preço a pagar em troca de fazer o que acreditamos
ser certo, pois, como Rollo May explica:

"A marca da coragem em nossa era de conformidade é a capacidade de defender as


próprias convicções..."

— Rollo May, O Homem à Procura de Si Mesmo

No entanto, às vezes os atos de coragem moral são acompanhados por riscos mais
graves, incluindo, mas não se limitando a, perda de emprego, penalidades físicas ou
financeiras, prisão ou, em alguns casos, até mesmo morte.

"De todos os dilemas éticos angustiantes que a humanidade enfrenta, poucos são mais
dolorosos do que a escolha entre o que é certo para o mundo e o que é certo para
[você e] sua família."

— Rushworth Kidder, Coragem Moral

Carl Jung chamou os homens e mulheres dispostos a enfrentar grandes perigos em


desafio à tirania de "verdadeiros líderes da humanidade". E para aprender sobre a
mentalidade de um desses líderes, podemos recorrer à história de Viktor Pestov.

Em 1967, Pestov era um jovem de 20 anos vivendo na União Soviética. Sua família
tinha uma situação confortável pelos padrões soviéticos, e sua mãe era uma membro
de alta patente da KGB. No entanto, Pestov não conseguia desviar os olhos da bota
da tirania que esmagava a sociedade e, por isso, interessou-se profundamente por
questões políticas. Quando os tanques soviéticos invadiram a Checoslováquia e
reprimiram violentamente o protesto pelos direitos humanos conhecido como Primavera
de Praga, Pestov disse a um amigo:

"Temos que fazer algo a respeito disso."

— Viktor Pestov, citado em Coragem Moral de Rushworth Kidder

Pestov e seu irmão criaram um grupo clandestino chamado "Rússia Livre" e ele
alertou aqueles que uniram-se ao grupo que provavelmente seriam presos em menos de
um ano. No entanto, todos concordaram que a luta pela liberdade justificava o risco
e, assim, começaram a publicar panfletos expondo as mentiras do regime soviético e
saíram sorrateiramente na calada da noite para distribuí-los. A KGB rapidamente
identificou o grupo como uma ameaça e, em 1970, Pestov foi preso, sua mãe foi
demitida da KGB e nunca mais pôde trabalhar na Rússia, e Pestov foi condenado a 5
anos em um campo de prisioneiros soviético.

Pestov decidiu enfrentar o regime soviético e, assim, colocar-se a si mesmo, e


inadvertidamente sua mãe, em grande perigo, porque não podia, em boa consciência,
ficar inerte enquanto um regime corrupto de milhares destruía a vida de milhões.
Ele entendeu que, se não defendesse a liberdade dos outros, não poderia esperar que
outros defendessem a dele e que, se ninguém fizesse nada, todos estariam
condenados. E então, escolheu enfrentar o perigo, lutar pela liberdade e colocar
uma parte do destino da sociedade em seus ombros. Ele se via lutando contra a ideia
malevolente de que: "alguém vai pensar por você, alguém vai tomar decisões por
você" e, como ele explicou:

"Uma pessoa deve ser a mestra de seu próprio destino."

— Viktor Pestov, citado em Coragem Moral de Rushworth Kidder

Em uma conversa com Rushworth Kidder, Pestov refletiu sobre os graves perigos que
enfrentou voluntariamente e sobre os 5 anos que passou na prisão:

“Acredito que fiz a coisa certa, não fiquei em silêncio. Eu estava dizendo e
fazendo o que tinha que ser feito. Minha contribuição foi muito pequena para o fato
de os comunistas terem sido tirados do poder.”

— Viktor Pestov, citado em Coragem Moral de Rushworth Kidder

A menos que um número maior de pessoas consiga reunir a coragem moral para
abandonar a conformidade em prol da defesa da liberdade e do que é correto, fazendo
pelo menos uma pequena contribuição na luta contra a tirania, as sociedades
ocidentais continuarão avançando em direção ao que Ayn Rand denominou como estágio
de inversão final. Ou como ela adverte:

“Estamos nos aproximando rapidamente do estágio da inversão final: o estágio em que


o governo é livre para fazer o que quiser, enquanto os cidadãos só podem agir com
permissão; que é o estágio dos períodos mais sombrios da história humana, o estágio
do governo pela força bruta.”

— Ayn Rand, Capitalismo: O Ideal Desconhecido

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