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Bárbara Kristensen2
RESUMO: O presente artigo é uma pesquisa bibliográfica e documental que tem por
objetivo analisar como a “Declaração mundial sobre educação para todos”, documento
fruto da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em 1990
influenciou o “Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003)” e a Lei 9394/96
(LDB) no contexto da reforma neoliberal no país. Para isso, será feita uma breve
explicação a respeito da influência dos organismos multilaterais na educação na
América Latina, buscando compreender como as reformas propostas inseriram uma
lógica mercadológica na educação seguindo os preceitos neoliberais. Além disso, será
contextualizada a situação da educação brasileira durante os primeiros anos da
redemocratização, percebendo como os governos de Fernando Collor de Mello,
Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso conduziram suas políticas educacionais,
culminando com o “Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003)” e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96), documentos que serão
analisados e interpretados em conjunto com a “Declaração mundial sobre educação
para todos”, buscando compreender a influência deste naqueles.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo é uma pesquisa bibliográfica e documental que busca
analisar de que maneira a “Declaração mundial sobre educação para todos”,
documento resultado da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada
em março de 1990 em Jomtien, na Tailândia e convocada por agências multilaterais
como UNESCO, UNICEF, PNUD e Banco Mundial, influenciou o “Plano Decenal de
Educação para Todos (1993-2003)” e Lei 9394/96 (LDB) no contexto da reforma
neoliberal no país.
Sob essa perspectiva, será feita uma breve explicação a respeito da influência
dos organismos multilaterais na educação na América Latina, em especial a partir do
Consenso de Washington, ocorrido em 1969. Neste sentido, esses organismos
fomentaram reformas, particularmente nos anos 1990, que, apesar de expandirem o
acesso à educação, promoveram mudanças institucionais e reorganizaram o sistema
2 DESENVOLVIMENTO
Esse mesmo posicionamento é sustentado por Sanfelice (2011), que indica que
ao fazer uma análise dos organismos internacionais como Banco Mundial e UNESCO,
considerando o gerenciamento que fazem das políticas educacionais facilmente
encontraremos “[...] a matriz neoliberal sustentando o que é a pedagogia da
hegemonia”, acrescentando que “[...] quem está ditando o ordenamento educacional
é o capital e a determinação está acima dos Estados” (SANFELICE, 2011, p. 117).
Durante os governos Collor e Itamar Franco, não houve políticas públicas
consistentes voltadas à educação, e a recessão econômica ocorrida na primeira
metade dos anos 1990 intensificou a crise da educação, o que, de acordo com Santos
(2010, p. 77), também “[...] ajudou a justificar a necessidade das reformas na
educação pública”.
Nesse processo de reformas, em que “[...] o Estado de bem-estar social perdeu
espaços para o estado liberal e, de produtor de bens e serviços, assumiu a função de
coordenador das atividades privadas da sociedade civil” (SANFELICE, 2011, p. 113),
ficou evidente a influência dos parâmetros estabelecidos pelos organismos
internacionais (MACHADO, 2007). Sob esse ponto de vista, Dourado (2019, p. 8)
resume o processo das reformas neoliberais no Brasil:
A respeito disso, Oliveira (2016, p. 12) indica que essa visão, influenciada pelos
princípios econômicos, confere ao indivíduo e, neste caso, aos sistemas de ensino,
“[...] a responsabilidade de planejar, medir custos e benefícios em favor da eficiência
e eficácia do desenvolvimento do setor econômico”.
Essa ideia de gestão financeira autônoma encontra laços numa ideia de
produtividade, também muito presente no texto da LDB. Lauglo (1997, p. 30-31)
considera que a teoria do capital humano é influente neste sentido, visto que vê a
educação “como um investimento na futura produtividade do trabalho, tanto para a
sociedade quanto para o indivíduo que procura educação”.
A questão econômica aparece com frequência na Declaração que, em relação
aos recursos financeiros, reconhece a dificuldade dos organismos governamentais e
determina, no seu art. 7º:
Neste sentido, o Plano indica que, naquele contexto, as condições para retomar
os compromissos assumidos em Jomtien eram favoráveis, visto que havia, no país,
muitas ações de caráter inovador com a intenção de universalizar o ensino básico com
qualidade. Assim, sugere-se que há um “[...] reconhecimento, por vários segmentos
sociais, da importância da educação básica para a formação do cidadão e para a
retomada do desenvolvimento nacional sob novos valores e perspectivas” (BRASIL,
1993, p. 11), citando-se como exemplo a realização de um esforço de
Esse assunto encontra-se presente na LDB, em especial no seu art. 4º, cujo
texto original (atualmente modificado pela Lei nº 12.796, de 2013) indicava ser dever
do Estado a educação escolar pública, efetivado mediante a garantia de “[...] ensino
fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na
idade própria” (BRASIL, 1996, p. 2).
O amplo acesso à educação, embora à primeira vista possa parecer uma
solução formidável aos problemas de um país, quando analisados com cuidado sob a
ótica neoliberal podem revelar outros interesses. Mota Júnior e Maués (2014),
explicam, a partir da análise de documentos do Banco Mundial, que diante das
desigualdades políticas, aumentar a coesão social, evita protestos e
descontentamento e mantêm o apoio às reformas econômicas que incluem, por
exemplo, a privatização.
Além disso, considerar o amplo acesso à educação como responsável pela
redução da pobreza colabora com a difusão da ideia da educação como instrumento
para inserção no mercado de trabalho (OLIVEIRA, 2016). Sobre isso, Farias (2015, p.
205) percebe que, no Brasil, predomina uma “[...] tendência
tecnicista/profissionalizante no paradigma educacional almejado pelo capitalismo,
vistos os macro interesses em produzir e reproduzir mão de obra adequada às
demandas da produção”. Neste sentido, Sanfelice (2011, p. 118) sabiamente alerta:
No Brasil, a partir dos anos 90, não é para se estranhar que o foco das
reformas escolares tenha sido a reformulação da formação da classe
trabalhadora para ela aceitar a nova cidadania e a formação para o trabalho
adequado à re-estruturação produtiva e o desemprego estrutural.
LOPES, M. C.; FABRIS, E. H. Inclusão & educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.