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O que é a filosofia?

1
Descrição e interpretação
da atividade cognoscitiva
[Filosofia do Conhecimento]
2. Descartes, a resposta racionalista
René Descartes
(1596-1650)

Filósofo racionalista

A razão é a fonte principal de conhecimento:


há crenças que a razão, e apenas a razão, é capaz de justificar.

É na razão que se encontra o fundamento do conhecimento.

Descartes pretendeu mostrar que o conhecimento é possível e que,


por conseguinte, os céticos radicais não têm razão
e os seus argumentos devem ser abandonados.
O método
Evidência

Leitura do texto 5, pág. 35 Análise

Método Regras

Síntese

Enumeração
e revisão
Deve guiar o espírito no exercício das
duas operações fundamentais do
entendimento.
Operações fundamentais do entendimento

Intuição Dedução

Ato puramente intelectual ou Ato de concluir, a partir de


racional de apreensão direta e determinadas verdades
imediata de noções ou ideias tomadas como princípios,
simples, evidentes e outras que lhes estão
indubitáveis. necessariamente ligadas.
Sabedoria humana
Moral

Medicina
permanece una e idêntica, por muito diferentes
que sejam os objetos a que se aplique.
Mecânica

A filosofia é comparada a uma árvore: Física


• raízes – metafísica;
• tronco – física;
• ramos – todas as outras ciências, sendo as três
principais a medicina, a mecânica e a moral.

É pela metafísica que se deve começar. Metafísica

obedecendo às regras do método, Descartes procede a uma investigação de caráter


metafísico, a fim de encontrar os princípios fundamentais do conhecimento humano.
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A dúvida
Dúvida

Constitui uma exigência quando a razão inicia a aplicação do método.

Dúvida metódica

Recusar (ou tomar como falsas) todas as crenças em relação às quais


se levante a mínima suspeita de dúvida ou de incerteza.

A dúvida é posta ao serviço da verdade e da procura


de uma justificação para as nossas crenças.

Pág. 38
Descartes – perspetiva infalibilista

Leitura da informação da margem direita (pág. 39)

O conhecimento é incompatível com a possibilidade do erro:


as justificações para as nossas crenças terão de garantir a verdade de tais crenças.

Se alguma crença resistir à dúvida, poderá ser a base ou o fundamento para outras crenças.
Uma crença fundacional permitirá evitar a regressão infinita da justificação.
Características da dúvida

Metódica e provisória Hiperbólica Universal e radical Voluntária

É um meio para atingir, Incide sobre todas as


É uma dúvida
de modo organizado, nossas crenças (a priori
exagerada ou levada ao
um conhecimento e a posteriori) e põe em Não é uma dúvida
extremo. Considera
seguro, a certeza e a questão a possibilidade sofrida em termos
como falso tudo aquilo
verdade, não de construir o psicológicos, mas sim
que for meramente
constituindo um fim em conhecimento (as artificial e estabelecida
duvidoso ou em que se
si mesma. Mantém-se faculdades do livremente.
note a mínima suspeita
apenas até se descobrir conhecimento são
de incerteza.
algo indubitável. postas em causa).
Dúvida

Possui uma função catártica.

Liberta o espírito dos erros que o podem perturbar ao longo


do processo de indagação da verdade.

Permite que nos libertemos dos juízos precipitados que formulámos na infância,
dos preconceitos adquiridos, das opiniões erróneas, da confiança cega nas
informações dos sentidos, assim como da tradição e da autoridade.

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Razões para duvidar

Hipótese
Falta de critério
Ilusões e enganos Enganos e da existência de um
para distinguir
dos sentidos erros de raciocínio deus enganador ou
o sonho da vigília
génio maligno

Pode existir um ser


Dado que não sabemos poderoso que faz com
Os sentidos por vezes se estamos a sonhar, Alguns seres humanos que estejamos sempre
enganam-nos não temos justificação enganaram-se e enganados: no tocante
iludem-nos, e é para acreditar que cometerem erros ao às verdades
Pág. 40 e às
prudente nunca confiar estamos despertos. raciocinar, inclusive nas demonstrações das
totalmente naqueles Assim, também não questões mais simples matemáticas, às
que nos enganaram, sabemos se as nossas da geometria e da crenças sobre os
mesmo que só uma vez. perceções sensíveis matemática em geral. objetos físicos, e à
são ou não ilusórias. própria existência do
mundo exterior.

Texto de apoio
Da dúvida ao cogito

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Da dúvida ao cogito

Cogito
Dúvida Sou um ser Afirmação Não posso
– “Penso,
– ato livre que pensa e da minha duvidar
logo
da vontade. duvida. existência. sem existir.
existo”.
Critério de verdade

Clareza Distinção

Evidência

Equivale à
separação de uma
Diz respeito à
ideia relativamente
presença da ideia à
a outras, de modo
mente que a
que ela não
considera com
contenha elementos
atenção.
que não lhe
pertençam.
É um princípio É conhecido por
É uma ideia clara e
evidente e indubitável, intuição
distinta
uma certeza – é uma verdade da
– uma ideia evidente.
inabalável. razão (a priori).

Fornece o critério de
verdade.
Cogito É a primeira verdade.

É uma crença Revela o atributo


É uma crença
autoevidente e essencial da alma:
fundacional ou básica.
autojustificada o pensamento.

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Do cogito a Deus
Cogito

Não é suficiente para garantir que a existência do corpo ou de um mundo exterior e independente do pensamento.

Embora tendo um critério de verdade, o sujeito pensante, limitado e imperfeito, é incapaz, por si só,
de garantir a verdade objetiva daquilo que pensou com clareza e distinção.

Também ainda não afastámos a hipótese da existência do génio maligno ou deus enganador.

É necessário demonstrar a existência de um Deus que não nos engane,


ultrapassando o solipsismo e quaisquer ameaças do ceticismo radical.
Ideias

Atos mentais (ou modos Representações, quadros


de pensamento). ou imagens das coisas.

As ideias possuem um conteúdo que representa alguma coisa.

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Tipos de ideias

Adventícias Factícias Inatas

Têm origem na São ideias


experiência sensível, São fabricadas pela constitutivas da
nas impressões que imaginação, a partir de própria razão e já as
os objetos físicos outras ideias. possuímos à
causam nos sentidos. nascença.

Exemplos: Exemplos: Exemplos:


• ideias de cavalo e de • ideias de centauro e • ideias de triângulo e
rio. de sereia. de Deus.
Ideia de ser perfeito

Um ser omnisciente, sumamente inteligente, infinito, eterno, independente,


omnipotente, sumamente bom e criador de toda a realidade.

Esta ideia serve de ponto de partida para a


investigação relativa à existência de Deus.
Provas da existência de Deus

O sujeito pensante e imperfeito


A causa da ideia de ser perfeito A existência faz parte da
não pode existir se Deus não
terá de ser Deus. essência de Deus.
existir.

Logo, Deus existe.


É a garantia da verdade das É um ser perfeito, bom
É infinito e a fonte do bem.
ideias claras e distintas. e não é enganador.

Deus: Embora criador do Universo,


É o criador das verdades importância no não é autor do mal nem
eternas, a origem do ser e o sistema responsável pelos nossos
fundamento da certeza. cartesiano erros.

Confere valor à ciência e É o princípio do ser


objetividade ao conhecimento. e da verdade.

Provada a existência de Deus, Descartes irá deduzir muitas verdades, provando igualmente a existência do
corpo e de um mundo exterior.

Será agora possível construir o edifício do conhecimento e superar todos os argumentos dos céticos radicais
Os três tipos de substâncias e o fundacionalismo de Descartes

Tipos de substâncias

Substância Substância Substância


pensante extensa divina

Vários atributos,
Pensamento Extensão decorrentes da
perfeição infinita.

Atributos essenciais
Dualismo cartesiano

Alma (mente) Corpo

Substância pensante Substância extensa


(desprovida de extensão) (desprovida de pensamento)

Dualismo substancial
Principais verdades
(das quais se deduzirão outras)

Existência do eu Existência de Existência de


pensante (alma), Deus, ser perfeito, corpos extensos
traduzida no com os atributos em comprimento,
cogito. respetivos. largura e altura.
Fundacionalismo racionalista de Descartes

O fundamento do conhecimento encontra-se no cogito, enquanto


crença básica ou fundacional e primeira verdade, e noutras ideias
claras e distintas da razão, obtidas de modo intuitivo.

Mas só Deus é que permite construir o edifício do conhecimento.


Críticas a Descartes
Objeção ao cogito: Descartes
apenas poderia ter intuído a
existência do pensamento e não a de
um eu pensante.

Objeções em torno da ideia de ser


Objeção do círculo cartesiano:
perfeito: esta pode não ter sido
Descartes terá incorrido num Críticas a
causada por um ser perfeito;
argumento circular ou petição de Descartes Descartes pode estar a ser
princípio.
enganado pelo génio maligno.

Objeção ao dualismo cartesiano:


dificuldade em explicar a interação
da alma com o corpo.
«Se queremos libertar-nos do erro, disse Descartes, temos de pôr de parte tudo aquilo que admita dúvida e partir de premissas que
estejam fora de dúvida. Perguntou assim: o que podemos saber sem margem para dúvida? O que podemos saber com uma certeza
total e absoluta?
O conhecimento que deriva dos nossos sentidos não serve, pois pode ser colocado em dúvida. Para mostrar isto, Descartes apelou ao
facto de termos o mesmo tipo de experiências quando estamos a sonhar e quando estamos acordados. […]
Descartes acrescentou que “não há indícios conclusivos pelos quais se possa distinguir a vigília do sono”, e disto concluiu que as nossas
experiências sensoriais não são, por si, fontes fiáveis de conhecimento. Não sabemos que algo é verdade pelo simples facto de termos
uma experiência que nos faz pensar isso.
Este argumento tem a célebre designação de Argumento do Sonho. Numa formulação mais desenvolvida, apresenta-se assim:
1. Quando sonhamos, temos experiências de um certo tipo.
2. Se as experiências deste tipo fossem, por si, uma fonte fiável de conhecimento, então, quando sonho que estou a marcar um golo
num desafio importante, estaria realmente a marcar um golo num desafio importante.
3. Mas, quando sonho com isso, não estou realmente a marcar um golo num desafio importante.
4. Logo, as experiências deste tipo não são, por si, uma fonte fiável de conhecimento.
5. Mas essas experiências são exatamente do mesmo tipo das que temos quando estamos acordados.
6. Logo, mesmo quando estamos acordados, as experiências deste tipo não são, por si, uma fonte fiável de conhecimento.
O Argumento do Sonho aborda a questão da experiência sensorial, mas nada diz sobre a segunda fonte de conhecimento: os nossos
poderes de raciocínio. Assim, mesmo que o Argumento do Sonho seja sólido, pode ainda ser verdade que podemos saber com toda a
certeza, por pura reflexão, que 2 + 3 = 5. Contudo, Descartes tem outro argumento, conhecido por Argumento do Génio Maligno, para
mostrar que também não podemos confiar nos nossos poderes de raciocínio.» ◄
James Rachels (2009), Problemas da Filosofia, Lisboa, Gradiva, pp. 210-211.

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