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FILOSOFIA incerteza.

O objetivo é encontrar
crenças indubitáveis e fundacionais:
O fundacionalismo cartesiano que sirvam de fundamento a todas as
outras, como o ponto de partida sólido
Descartes é um fundacionalista
a partir das quais será reconstruído
racionalista. Considera que o
todo o edifício do conhecimento.
conhecimento tem um fundamento
Assim, consegue comprovar que os
racional e que a razão é a fonte de
céticos estão errados: não há regressão
justificação última das nossas crenças.
infinita.
O filósofo não ignorou os principais
A dúvida é um instrumento colocado ao
argumentos dos céticos. O seu principal
serviço da verdade:
objetivo era demonstrar que os céticos
estavam enganados. Assim, procurou 1. Metódica – meio para alcançar um
demonstrar que há crenças justificadas conhecimento certo e indubitável. É
um instrumento da razão que permite
e que o conhecimento é possível.
evitar o erro.
Tese – o conhecimento é possível. A 2. Provisória – o objetivo não é concluir
que é tudo duvidoso, mas que há
razão é a principal fonte de justificação
crenças indubitáveis. A dúvida é
das nossas crenças. abandonada quando é alcançado o
objetivo de encontrar crenças
Preocupava-o a solidez do
fundacionais.
conhecimento e considerava que o 3. Universal – todas as crenças são
saber do seu tempo estava assente em submetidas à dúvida.
princípios frágeis. Como tal, era 4. Hiperbólica – exagerada: leva a supor
importante remover os velhos materiais que é falso tudo o que possa levantar a
mais pequena dúvida.
do edifício do conhecimento, antes de
iniciar a construção de um novo
sistema filosófico assente em
Crenças a posteriori
fundamentos absolutamente seguros e
inabaláveis. Precisava, para isso, de As crenças a posteriori são as primeiras
encontrar um ponto de partida sólido, a ser submetidas ao teste da dúvida.
do qual ninguém fosse capaz de Descartes começa por aceitar o
duvidar. argumento cético da ilusão: os sentidos
já nos enganaram. Assim, não passam
no teste da dúvida, pois embora não
A Dúvida Metódica nos enganem sempre, não sabemos
com rigor quando não nos estão a
Para Descartes, a dúvida é um método
enganar. Temos de ser cautelosos ao
infalível e simples de pôr à prova todas
confiar na experiência sensorial como
as nossas crenças. Todas as nossas
fonte de verdade ou justificação das
crenças terão de ser submetidas à
nossas crenças.
dúvida e só serão aceites como
justificadas se passarem no teste da Algumas crenças parecem difíceis de
dúvida, ou seja, se não encontrarmos duvidar: que temos nas mãos um livro,
nelas a mais pequena suspeita de por exemplo. No entanto, por vezes,
sonhamos quando dormimos e corpo, Descartes chega à primeira
podemos sonhar que temos nas mãos verdade «Penso, logo existo». Este
um livro. Enquanto sonhamos princípio resulta do ato de duvidar: ao
acreditamos que estamos acordados, duvidar, exercemos um ato de
mas tudo não passa de uma ilusão pensamento e, ao pensar, tem
criada pelo sonho. Assim, as crenças a claramente de existir. A clareza e
posteriori não podem ser o distinção do cogito é a prova de que
fundamento do conhecimento, já que existe enquanto ser pensante.
não são indubitáveis.
O critério da verdade consiste na
clareza e distinção das ideias, na
evidência. O critério da clareza e
Crenças a priori
distinção permite distinguir as ideias
Depois, Descartes submete as crenças a verdadeiras das falsas.
priori ao teste da dúvida metódica. Mas
O cogito cartesiano é:
mesmo que estejamos a sonhar “o
quadrado tem sempre quatro lados”. 1. Uma crença fundacional, refutando-se
Não parece ser tão possível duvidar o argumento da regressão infinita da
justificação dos céticos, porque é uma
destas crenças. crença básica.
A experiência do génio maligno é uma 2. Uma crença indubitável.
3. Uma verdade racional e a priori. Foi
experiência mental através da qual descoberta pela intuição racional e
Descartes imagina que existe uma não da dedução porque é indissociável
espécie de deus enganador, que se do pensamento.
diverte a manipular os nossos 4. Uma evidência que se impõe ao
pensamentos sem que nos pensamento como clara e distinta.
5. Uma substância pensante, distinta e
apercebamos disso. Através desta independente da existência do corpo.
experiência, as crenças a priori não A distinção alma-corpo é uma verdade
passam no teste da dúvida metódica descoberta por dedução a partir do
uma vez que este génio nos faria cogito.
acreditar que são verdadeiras
proposições que podem ser falsas.
Descartes não afirma a existência deste Deus existe – Argumento ontológico
génio, mas que a hipótese da sua Descartes apresenta um argumento a
existência basta para duvidarmos das priori para provar a existência de Deus.
crenças a priori. A existência de Deus é a conclusão
Assim, Descartes derrubou todo o necessária da ideia de ser perfeito. A
edifício do conhecimento do seu existência de Deus é necessária, porque
tempo. a sua existência está contida
necessariamente na sua essência: logo
Deus é e existe.
Cogito Sendo Deus um ser perfeito, é de sua
Depois de colocar tudo em dúvida, natureza possuir todas as perfeições
inclusivamente a ideia de que tinha um concebíveis, entre elas, a da existência,
sem a qual não seria perfeito. A Argumento da causa da existência do
propriedade de existir é algo que um cogito
ser perfeito não pode deixar de ter. Se
O cogito é um ser pensante que duvida,
não existisse não era perfeito, faltava-
logo, é imperfeito, porque se não o
lhe essa perfeição.
fosse teria todos os conhecimentos.
Como ser perfeito, finito e contingente,
o cogito não pode ser a causa de si
Argumento da marca impressa
mesmo. Se existe é porque um ser
O cogito é uma substância pensante superior o conserva. Assim, conclui-se
que duvida e, por isso mesmo, que Deus existe e é a causa criadora e
imperfeito e limitado. Para se conservadora da existência do cogito.
reconhecer como imperfeito, tem de Deus existe por si e não depende de
ter em si a ideia de perfeição, com a nenhuma outra causa.
qual se compara. Então qual é a origem
desta ideia de perfeição? Não pode ser
adquirida pelos sentidos, porque nada Deus como princípio fundante de toda
que tenhamos observado é perfeito. a verdade e de toda a realidade
Também não pode ser sua invenção
Depois de provar a existência do cogito,
porque um ser imperfeito não pode ser
Descartes ficou preso ao solipsismo: um
a causa de uma ideia que o ultrapassa.
sujeito isolado que pensa e às suas
Assim, a ideia de perfeição é inata
ideias. Não podia provar a existência
colocada na sua mente por um ser
dos outros, de que tem um corpo ou
perfeito que a deixou como marca de
que existe um mundo exterior.
um artista impressa na sua obra. Assim,
a existência de Deus é comprovada. As provas da existência de Deus
Este argumento é a posteriori e baseia- resolveram este problema. Agora, para
se no princípio da causalidade. além do seu pensamento, existe
também o ser divino. Demonstrada a
existência de Deus, afasta-se da
Tipos de ideias hipótese do génio maligno. Deus existe
e é perfeito logo não pode ser
Inatas – ideias que nascem connosco e
enganador. Assim, podemos confiar na
são descobertas racionalmente. Ex: a
razão quando esta pensa descobrir
ideia de existência, de verdade e da
verdades. O fundamento de toda a
matemática.
racionalidade está no ser absoluto e
Factícias – ideias fabricadas pela perfeito. Deus é a garantia de tudo o
imaginação. Ex: sereia. que concebemos clara e distintamente.
Assim, Descartes conclui que tem um
Adventícias – ideias com origem na
corpo e que existe um mundo à sua
experiência sensível. Ex: oceano,
volta, incluindo a existência de outras
árvore.
pessoas. O cogito e Deus são as duas
crenças fundacionais para a
reconstrução do conhecimento certo,
seguro e indubitável e a razão é a fonte Tese – o conhecimento é possível. A
principal para a descoberta de verdades experiência é a fonte de justificação
objetivas. última das nossas crenças.
As perceções podem ser de dois tipos:
impressões ou ideias. As impressões ou
Críticas a Descartes - O argumento do
ideias distinguem-se pelo grau de força
cogito não é convincente
ou de vivacidade: as impressões ou as
As conclusões do cogito podem ser sensações são as perceções mais vivas e
mais limitadas do que aquelas que fortes; podem ser externas ou internas
Descartes retirou. A expressão “Eu – as externas são obtidas pelos dados
penso” não prova a existência de um dos sentidos; as internas são as
sujeito pensante. Do cogito apenas emoções, como o medo ou a alegria. As
podemos concluir que “Há ideias ou pensamentos são cópias das
pensamentos”. Haver pensamentos não impressões e, por isso, menos fortes e
significa que tem de haver um intensas; são produtos da memória ou
pensador. Assim, é duvidoso concluir da imaginação.
“Penso, logo existo”.
Todas as nossas ideias derivam de
impressões. Para Hume, não haveria
pensamento sem sentidos e todas as
Crísticas a Descartes - Círculo
nossas ideias têm correspondências
cartesiano
com impressões, o que significa que
Deus desempenha um papel não existem ideias inatas.
fundamental na filosofia cartesiana
As impressões podem ser simples ou
uma vez que é a garantia de que
complexas. Simples quando não podem
Descartes não se engana quando
ser decompostas, ou seja, não admitem
concebe clara e distintamente as ideias.
separação. Ex: cor verde. Complexas
Mas Descartes cometeu a falácia da
quando podem ser decompostas, ou
petição de princípio porque utiliza o
seja, admitem ser divididas em partes.
critério da evidência para provar a
Ex: maçã (cor, forma e sabor).
existência de Deus e usa Deus para
fundamentar o critério da evidência. O As ideias simples derivam das
raciocínio é circular. impressões simples e as ideias
complexas derivam da combinação de
várias ideias simples. A ideia de
Hume e a resposta empirista montanha de oiro é complexa, pode ser
decomposta em ideias simples (oiro e
Segundo David Hume, o ponto de
montanha).
partida para o conhecimento são as
perceções, que são tudo o que há na
nossa mente. A perceção é o processo
Associação de ideias
pelo qual, começando pelos nossos
sentidos, adquirimos informação acerca Para Hume, as ideias seguem um
do mundo. princípio de associação. A semelhança –
se dois objetos se assemelham, então a crença na existência de um nexo entre
ideia de um objeto conduz ao outro. um facto e o que lhe sucede
Contiguidade no tempo e no espaço – necessariamente. Mas Hume apresenta
quando duas ideias são contíguas no uma perspetiva diferente da
tempo e no espaço, a consideração de causalidade e defende que as causas e
uma delas lembra a consideração da os efeitos não podem ser conhecidos
outra. Causalidade – a consideração de pela razão. É a experiência que nos diz
dois objetos como estando ligados que os objetos caem porque vimos os
sendo um a causa e outro o efeito. objetos caírem muitas vezes. Assim,
concluímos que existe uma relação de
causalidade entre largar o objeto e este
Relações de ideias e questões de facto cair, tendo por base uma conjunção
constante e não uma conexão
Hume acredita que todas as ideias têm
necessária.
origem empírica, mas não nega a
existência de conhecimento a priori,
reconhecendo que há conhecimento
Conexão necessária
que apenas pode ser obtido pelo
raciocínio. Hume considera que A ideia de conexão necessária não é
podemos obter dois tipos de resultado de qualquer impressão; o que
conhecimento: a priori (relações de verificamos é uma conjunção constante
ideias) e a posteriori (questões de entre os acontecimentos, o que leva a
facto). considerar uma causalidade entre eles.
Se vemos que a bola A bate em B e
Todas as ideias que obtemos sem
provoca o seu movimento
recurso às impressões são relações de
repetidamente, concluímos que sempre
ideias obtidas por intuição ou
que a bola A embate em B, provocará o
demonstração. Conhecimentos deste
seu movimento. Esta crença é resultado
tipo são verdades necessárias, mas não
do costume ou hábito. Eu não tenho
acrescentam conhecimento extra sobre
conhecimento para acreditar que
o mundo.
sempre que a bola A bate em B
Tudo o que podemos saber sobre o provocará o seu movimento, mas o
mundo refere-se a questões de facto, hábito deste acontecimento faz me
dado que todas as ideias têm origem na acreditar que acontecimentos do
experiência sensível. Conhecimentos passado sejam semelhantes a
deste tipo são verdadeiros, mas acontecimentos do futuro. Este
poderias sem falsos e a sua negação pensamento baseia-se na indução, mas
não implica contradição. que razões temos para acreditar que o
futuro será igual ao passado?

Princípio da causalidade e problema


da indução Uniformidade da natureza

As questões de facto assentam na O nosso raciocínio indutivo tem por


relação de causa e efeito, ou seja, a base o princípio da uniformidade da
natureza, ou seja, a natureza é Quando perguntamos se o mundo
uniforme e regular, comportando-se exterior é real, perguntamo-nos se os
sempre da mesma maneira. Esta crença objetos que percecionamos têm uma
baseia-se no que se tem observado até existência independente da nossa
aqui, ou seja, baseia-se numa indução. perceção. Para Hume, não devemos
A justificação é circular pelo que não se confundir a perceção de um objeto com
justifica coisa alguma. O princípio da esse objeto. Como só temos acesso às
uniformidade da natureza não é uma lei perceções que se encontram na nossa
objetiva é antes a projeção sobre a mente, não sabemos se o mundo
natureza de uma uniformidade exterior existe.
pressuposta pelo ser humano. Mas
Hume considera a crença na
uniformidade da natureza e no hábito O ceticismo de David Hume
útil para a nossa vida.
Hume é defensor de um ceticismo
moderado, porque não rejeita a
possibilidade de conhecer a realidade,
Eu
mas reconhece a imperfeição e os
Para David Hume, a ideia de eu resulta limites do entendimento humano, que
de um conjunto de impressões não pode ir além da experiência,
particulares que nunca exigindo que sejamos moderados nas
experimentamos simultaneamente e nossas opiniões. A realidade reduz-se
que não permanecem. A ideia de um eu aos fenómenos, fenomenismo. As
imutável e permanente é uma ideia crenças de um eu permanente, de Deus
complexa, produto da imaginação e, e do mundo exterior são racionalmente
como tal, uma ficção, dado que eu não injustificadas.
tenho a perceção de um núcleo de
personalidade inalterável.
Críticas ao empirismo de David Hume
– Princípio da Causalidade
Deus
Para Hume, a noção de causa é a de
David Hume afirma que a ideia de Deus algo ser seguido constantemente pelo
é uma ideia complexa que resulta da efeito: a causa corresponde ao primeiro
nossa imaginação. A ideia de Deus acontecimento e o efeito corresponde
parte das impressões que temos, o que ao segundo. Mas há acontecimentos
faz a minha imaginação é elevar as que se sucedem, mas que não são a
qualidades das quais tive impressão e causa ou efeito um do outro (dia e
reuni-las criando uma ideia complexa noite). A explicação de David Hume
de Deus, mas nenhuma impressão segundo a qual a relação de causa e
corresponde à ideia de Deus, pelo que efeito se reduz à observação de uma
não podemos afirmar a sua existência. regularidade entre fenómenos não
oferece um critério que distinga as leis
da natureza de generalizações fortuitas
Mundo exterior porque a conjunção constante é um
critério necessário, mas não suficiente
para admitirmos a relação de causa e
efeito.

Críticas ao empirismo de David Hume


– Ceticismo e irracionalismo
Para David Hume o nosso
conhecimento depende de inferências
causais que fazemos formando
raciocínios indutivos. Mas a ideia de
causalidade e indução não podem ser
justificados pela razão ou experiência.
Este ceticismo coloca em causa a
pretensão humana à racionalidade.

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