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Descartes – a resposta racionalista

René Descartes procurou arduamente responder ao desafio lançado ao ceticismo e


propôs encontrar, pelo menos, uma crença que fosse absolutamente certa e indubitável.

Racionalismo cartesiano
Projeto Cartesiano
Descartes viveu numa época marcada por grandes transformações sociais, políticas e
ideológicas. Instalou assim, um clima de ceticismo generalizado, capaz de alcançar
qualquer conhecimento solido e duradouro.
Descartes decide escapar à conclusão aparentemente inevitável de que nada se pode
saber, logo leva o ceticismo ao extremo, recorrendo à própria duvida como método para
provar a impossibilidade do ceticismo.
Para edificar a segurança do conhecimento, descartes tinha que achar uma crença
básica, autoevidente com base solida.
Objetivo > conhecimento seguro
Método > duvida metódica

Duvida metódica
Duvida cartesiana ponto de partida, um meio para alcançar a verdade.
Duvida cética original ponto de chegada, um desfecho inevitável de um rigoroso
processo de reflexão.
Não se trata, então, de uma suspensão permanente do juízo, mas sim de uma decisão de
considerar provisoriamente falso tudo aquilo que seja meramente duvidoso.
A dúvida cartesiana não conhece limites e não há nada que não seja legitimo duvidar.

Universal Hiperbólica

Pode aplicar-se a tudo, não se limita a suspender


pelo menos até que se o juízo, mas rejeita como
encontre algo que seja falso tudo aquilo que seja
absolutamente indubitável. meramente duvidoso.
Duvida cartesiana
Universal metódica provisoria hiperbólica

Razoes para duvidar


Se decidirmos rejeitar todas as crenças meramente duvidosas, basta-nos debruçar sobre
as principais fontes das nossas crenças.
Pondo em causa tudo aquilo que julgamos saber, ou seja, o seu objetivo era deitar
abaixo todas as nossas convicções e verificar se alguma resistia a tamanha devastação.
As ilusões dos sentidos
De acordo com este argumento, uma vez que os nossos sentidos nos enganam algumas
vezes, nunca podemos saber se nos estão a enganar ou não. Portanto nunca devemos
confiar nas informações adquiridas através deles.
Princípio hiperbólico da dúvida:
1. Se os nossos sentidos nos enganam algumas vezes.
2. Não podemos saber se nos estão a enganar neste momento ou não.
3. Então não podemos confiar neles.
4. Logo não podemos confiar nos nossos sentidos.
Os nossos sentidos nos enganam, mas não quer dizer que temos boas razoes para nunca
confiar neles, até porque a maior parte dessas ilusões recorrem aos nossos sentidos.
Exemplo: aproximar-me de um objeto mais perto.
Posso sempre usar outros sentidos para me certificar.

A indistinção vigília-sono
Uma vez que a vivacidade e a intensidade de certos sonhos nos convencem muitas vezes
que estamos a ter experiências reais, quando na realidade estamos apenas a sonhar. Não
temos forma de distinguir as nossas experiências vigília, daquelas que temos quando
sonhamos.
As crenças que formamos a partir de experiências sensíveis podem ser falsas (porque
estamos a sonhar) ou verdadeiras (porque não sabemos se estamos efetivamente a
sonhar ou não).
1. Não podemos distinguir por nenhum sinal seguro as experiências que temos
durante os sonhos, daquelas que temos durante o estado vigília.
2. Então as crenças que formamos a partir da experiência sensível não estão
devidamente justificadas, logo não podem construir conhecimento.
Erros de raciocínio
Quer estejamos a dormir ou acordados, descartes apercebe-se que estas crenças
“2+2=4” ou “se Smith ou Jones assaltaram o banco e não foi Smith, logo foi Jones.”
Não são absolutamente certas e indubitáveis, pois podemos cometer erros mesmo nos
raciocínios mais elementares.
Princípio:
Baseia-se na ideia de que todos podemos cometer erros nos raciocínios mais simples e,
por isso, não podemos justificadamente acreditar em crenças que tenham origem no
nosso raciocínio.

A hipótese do Génio Maligno


Descartes convida-nos a imaginar que existe um génio maligno, um ser tao poderoso
quanto perverso, que se diverte a usar os seus poderes para nos induzir em erro
relativamente a tudo.
Mesmo as proposições aparentemente mais evidentes de geometria e aritmética, como
por exemplo “um quadrado é uma figura geométrica com 4 lados”, sejam postas em
causa.
1. Se não podemos saber se existe ou não um génio maligno.
2. Então não temos justificação para acreditar que a nossa crença não tem origem
nas suas maquinações.
3. Logo, não temos conhecimento.

O cogito (a priori)
Descartes apercebe-se que existe algo que pode saber-se com toda a certeza: “penso,
logo existo”.
Esta asserção não pode ser posta em causa, pois para duvidar do quer que seja, é preciso
existir.
1. Se fosse verdade que nada se pode saber, então nem sequer poderíamos saber
que existimos.
2. Mas sabemos que existimos (essa ideia não pode ser seriamente posta em causa).
3. Logo, é falso que nada se pode saber.
Mas com a hipótese do génio maligno, descartes constata que não é suficiente para nos
assegurarmos que temos corpo, nem verdade das nossas experiências.
Com isso, conclui que pelo menos é uma substância pensante, isto é, uma mente ou
alma imaterial que subsiste independentemente do corpo, e que é da natureza
inteiramente distinta do mesmo.
Dualismo cartesiano (mente-corpo)
A clareza e a distinção das ideias como critério de verdade
 O cogito representa o triunfo sobre o ceticismo.
 A priori- basta pensar para saber que esta proposição é verdadeira e fornece-nos
informação acerca do mundo, a saber.
Existe um ser pensante
Critério da verdade: Só devemos aceitar como verdadeiras as ideias que, á semelhança
do cogito, somos capazes de conceber de forma absolutamente clara e distinta.
Tipos de ideias

A ideia de Deus
Entre as várias ideias que Descartes encontra na sua mente, existe uma que se distingue
de todas as outras: a ideia de Deus, ou ser perfeito.
Esta ideia é especial porque provar que Deus existe e não é enganador talvez seja a
única forma de podermos estar certos de muitas outras coisas para além da nossa
existência enquanto pensamento, pois um criador supremo e sumamente bom não nos
teria criado de forma que estivéssemos permanentemente a ser enganados e nunca
pudéssemos conhecer a verdade.
Para provar que Deus existe, Descartes recorre, entre outros, ao chamado “argumento da
marca”.

Argumento da marca
Descartes afirma:
“Depois disto, tendo refletido que duvidava e que, por consequência, o meu ser não era
inteiramente perfeito, pois via claramente que conhecer é uma maior perfeição do que
duvidar, lembrei-me de procurar de onde me teria vindo o pensamento de alguma coisa
mais perfeita do que eu; e conheci, com evidência, que se devia a alguma natureza que
fosse, efetivamente, mais perfeita. […] De maneira que restava apenas que ela tivesse
sido posta em mim por uma natureza que fosse verdadeiramente mais perfeita do que
eu, e que até tivesse em si todas as perfeições de que eu podia ter alguma ideia, isto é,
para me explicar com uma só palavra, que fosse Deus.”
1. Tenho a ideia de “ser perfeito”.
2. Se eu tenho a ideia de “ser perfeito”, é porque existe um ser perfeito que é a
origem desta ideia.
3. Ou eu mesmo sou o ser perfeito ou há outra coisa (além de mim) que é o ser
perfeito e que deu origem à minha ideia de perfeição.
4. Eu não sou perfeito.
5. Logo, existe outra coisa (além de mim) que é o ser perfeito e que deu origem à
minha ideia de perfeição.

 A ideia de deus é uma ideia inata.


Lei da causalidade: qualquer causa tem de ser pelo menos tao perfeita e tao completa
quanto os seus efeitos.

O papel da existência de Deus


“E por mais que os melhores espíritos estudem isto, tanto quanto lhes agradar, não creio
que possam apresentar alguma razão que seja suficiente para eliminar essa dúvida, se
não pressupuserem a existência de Deus. Pois, primeiramente, aquilo mesmo que há
pouco tomei como regra, isto é, que são inteiramente verdadeiras as coisas que
concebemos muito clara e distintamente, só é certo porque Deus é ou existe, e porque é
um ser perfeito e tudo o que existe dele nos vem. Donde se segue que as nossas ideias
ou noções, sendo coisas reais e que provêm de Deus em tudo aquilo em que são claras e
distintas, unicamente podem ser verdadeiras.”
Deus garante que:
 Podemos confiar nas nossas ideias claras e distintas atuais e passadas.
 Podemos confiar nos nossos raciocínios apoiados em premissas claras e
distintas.
 O mundo material existe.
 Podemos, geralmente, saber quando estamos apenas a sonhar, ou seja, podemos
distinguir a vigília do sono.

Objeções ao dualismo cartesiano


Objeção à hipótese do Génio Maligno:
O filósofo George Edward Moore considera que, ao recorrer à hipótese do Génio
Maligno para descobrir o que é que podemos efetivamente saber, Descartes está a
estabelecer padrões demasiado elevados para o conhecimento. É certo que se não
tivermos forma de justificar uma dada crença, não podemos dizer que temos
conhecimento, mas isso não significa que a nossa justificação tem de ser absolutamente
infalível, à prova de Génio Maligno.

Objeção ao cogito:
Alguns autores consideram que o cogito não é algo absolutamente certo e indubitável.
Em vez de o entenderem como uma proposição simples, que se limita a afirmar: “Há
pensamento”, veem nessa afirmação uma conjunção de várias ideias: “Há pensamento e
há um e apenas um ser pensante a quem esse pensamento pertence e esse ser pensante
sou Eu”. Ora, Descartes não se encontrava em condições de afirmar que sabia tudo isso.

Objeção ao argumento da marca:


Para alguns filósofos, na melhor das hipóteses, temos uma conceção vaga e difusa do
que possa ser um ser perfeito, mas dadas as nossas capacidades limitadas, não somos
capazes de abarcar através do nosso pensamento um conceito tão vasto e ilimitado
quanto o conceito de Deus. Assim sendo, nem sequer podemos dizer que temos
propriamente a ideia de “ser perfeito”.
Podemos ser nós mesmos a criar a ideia de “ser perfeito” através da nossa imaginação.
Tal como formamos a ideia de “Super-Homem”, imaginando um homem dotado de
capacidades extraordinárias, também podemos imaginar o que seria um ser dotado de
todas as perfeições de que nos conseguimos lembrar. Nesse caso, o facto de termos a
ideia de “ser perfeito” não implica que o ser perfeito existe na realidade e que é ele
quem está na origem da nossa ideia de perfeição. - Dualismo cartesiano

Objeção do círculo cartesiano:


Esta objeção acusa Descartes de cometer uma falácia da petição de princípio, pois
procura estabelecer a existência de Deus raciocinando a partir de ideias claras e distintas
(através do argumento da marca, por exemplo), enquanto admite que só podemos estar
certos de que as nossas ideias claras e distintas atuais e passadas são verdadeiras porque
Deus existe.

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