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CURSO

SAÚDE
MENTAL
E TRABALHO NO
PODER JUDICIÁRIO
TÓPICOS ESPECIAIS
EM SAÚDE MENTAL MÓDULO
4
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
Presidente: Ministro José Antonio Dias Toffoli
Corregedor Nacional de Justiça: Ministro Humberto Eustáquio Soares Martins
Conselheiros: Aloysio Corrêa da Veiga
Maria Iracema Martins do Vale
Márcio Schiefler Fontes
Daldice Maria Santana de Almeida
Fernando César Baptista de Mattos
Valtércio Ronaldo de Oliveira
Francisco Luciano de Azevedo Frota
Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva
Arnaldo Hossepian Salles Lima Junior
André Luis Guimarães Godinho
Valdetário Andrade Monteiro
Maria Tereza Uille Gomes
Henrique de Almeida Ávila

Secretário-Geral: Carlos Vieira von Adamek


Diretor-Geral: Johaness Eck

Secretário Especial de Programas,


Pesquisas e Gestão Estratégica: Richard Pae Kim

SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL


Secretário de Comunicação Social: Rodrigo Farhat
Projeto gráfico: Eron Castro
Revisão: Carmem Menezes

2019
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
SEPN Quadra 514 norte, lote 9, Bloco D, Brasília-DF
Endereço eletrônico: www.cnj.jus.br
Conteúdos deste módulo
4 Objetivos de aprendizagem
5 Apresentação
Unidade I
6 Estresse

Unidade II
9 Depressão

Unidade III
12 Violência doméstica

Unidade IV
16 Drogas e dependência química

Unidade V
19 Assédio moral e sexual

Unidade VI
21 Autoestima e valorização da vida

24 Referências bibliográficas

3
Objetivos de aprendizagem

»»Reconhecer problemáticas em saúde mental, para


a promoção de mudanças comportamentais;

»»Perceber a importância de compreensão adequada


dos fenômenos sociais por parte de todos os
profissionais que atuam na área de saúde mental;

»»Compreender a importância da construção


de um ambiente seguro e estimulante,
para uma boa saúde mental.

4
Apresentação
Bem-vindo à unidade 4 do curso!

Neste módulo, serão apresentadas as principais


problemáticas em saúde mental, como o estresse e a
depressão, e tópicos especiais relacionados ao tema, como
Violência Doméstica, Drogas e Dependência Química, Assédio
Moral e Sexual e Autoestima e Valorização da Vida.

Vamos trabalhar!

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Unidade I
Estresse
Estresse vem do verbo em inglês “to stress”, que são situações que, seja pelo grau de importân-
significa pressionar. cia, seja pelo nível de emoção, seja pelo que ima-
ginamos o que vem após tal conquista, podem
Assim, pode ser aplicado tanto para materiais,
também gerar mais emoções do que as que con-
como para nós, pessoas, ou seja, estresse teria
seguimos lidar.
o sentido de pressão e estar estressado é estar
pressionado. E aqui está a chave para entender e lidar com o
estresse. Os estudos mostram que, mais impor-
Não é difícil imaginar, ou lembrar, que já disse-
tante que a pressão que recebemos (doravante,
mos “Ando estressado” ou “Estou muito estres-
frequentemente chamaremos a isso, neste
sado”, quando passávamos por período de muita
texto, de Demanda), são as estratégias que
pressão, seja na nossa vida pessoal, seja na vida
desenvolvemos para enfrentá-la, chamadas
laboral, no trabalho. Alguns exemplos: dinheiro
de estratégias de enfrentamento do estresse
muito curto, aquém de nossas despesas habi-
(que podemos encontrar em nossas leituras na
tuais (ou muito curto por um prazo mais longo).
palavra inglesa coping), ou seja, você até pode
Às vésperas de um concurso, uma entrevista
ter ou estar com uma demanda (“a pressão que
de emprego muito importante (ou a perda do
recebemos”, lembra?) muito grande, mas se você
emprego), sobrecarregado no trabalho, em espe-
tem bem desenvolvidas estas estratégias, você
cial se o volume é grande e o prazo curto etc.
consegue passar bem por este momento.
Estes são exemplos típicos.
Isto é, grosso modo, o que popularmente cha-
É preciso salientar também que não só coisas
mamos de “recarregar as baterias”.
vistas como ruins, negativas, nos deixam ansio-
sos e/ou estressados. Passar no vestibular, pas- Quais são estas estratégias? Listaremos as prin-
sar “naquele” concurso, casar, ganhar na loteria, cipais, a seguir:1

1  Não necessariamente em ordem de importância.

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TÓPICOS ESPECIAIS EM SAÚDE MENTAL Módulo 4

»» Atividade física; preparado para uma destas duas ações. Para


»» Espiritualidade; isso, e alicerçado nessas reações físicas e psíqui-
cas, ele rapidamente avaliava os riscos, optando
»» Relacionamentos interpessoais: amigos,
por uma das duas atitudes: lutar ou fugir.
família;
»» Práticas de meditação, Yoga etc.; O problema é que milhões de anos se passaram
»» Psicoterapia. e as nossas reações químicas são as mesmas,
diante de potenciais ameaças – que muitas
Vale lembrar ainda outro aspecto importante vezes nem são reais e, principalmente, não
sobre o estresse: o que nos deixa estressado hoje ameaçam a nossa existência, como ocorria com
pode não o fazer amanhã e vice-versa. Por exem- o homem primitivo.
plo, posso estar estressado com meu chefe hoje
Ocorre que, se permanecemos nessa condição
e, daqui a 2, 3 ou 5 anos, com o mesmo chefe, já
por um muito tempo, aqueles eventos químicos,
não fico estressado, seja por que amadureci, seja
importantes em uma situação aguda, tornam-
por que já o conheço melhor e sei lidar melhor
-se nocivos quando mantidos por tempo pro-
com ele.
longado. Lembrando aqui que o hormônio por
Em resumo, uma situação de estresse ocorre no excelência do estresse é o cortisol. Importante
momento em que o volume de demanda (ou para uma tomada de decisão rápida, mas muito
pressão) é maior que minha capacidade de lidar nocivo se mantido em níveis altos por bastante
com ele. tempo – é como se estivéssemos tomando doses
altas, diárias, de corticoide. Dá para imaginar, né?
O estresse não é algo próprio do mundo con-
As consequências são conhecidas: elevação da
temporâneo. Ele acompanha nossa espécie há
pressão, do nível do açúcar no sangue (podendo
milhões de anos e é vital para nossa sobrevi-
piorar uma diabetes, por exemplo), redução da
vência e para nosso crescimento – tanto indi-
imunidade, entre muitas outras.
vidual quanto coletivo. Por isso, o dividimos em
eustresse e distresse. Aquele, o estresse positivo, Assim, aqui também vale a máxima: “Melhor
que nos impulsiona para frente, por exemplo nos prevenir que remediar!”. Por isso, vamos investir
animando a estudar para progredir na carreira. nas ações de prevenção – citadas anteriormente
O segundo, o estresse que faz mal, seja por sua como Estratégias para lidar com o estresse.
clara inadequação, seja por ser excessivo.
Caso isso não tenha sido feito, ou, apesar das
Como se sabe, o estresse desencadeia em nós estratégias empreendidas, o estresse se insta-
a chamada Síndrome Geral de Adaptação (SGA), lou, passamos para o que os médicos chamam
com uma cascata de eventos químicos em nosso de prevenção secundária, isto é, uma vez ins-
organismo, que geram uma série de reações físi- talado um quadro, vamos tratá-lo, evitando,
cas e psíquicas. É a chamada Reação de Luta assim, seu agravamento e as consequências
e Fuga. No Homem primitivo, era essencial que, disso (como as citadas logo acima). É hora de
diante de uma potencial ameaça ele estivesse implementar as outras estratégias e procurar a

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ajuda de um profissional médico ou psicólogo


para uma avaliação e orientação.

PARA SABER MAIS:


https://www.youtube.com/watch?v=YcJ1ZwM-
GkKY – palestra “Como promover a Saúde Mental:
uma perspectiva psiquiátrica”, no IV Congresso
Brasileiro dos Serviços de Saúde do Poder Judi-
ciário, com o prof. Valentim Gentil Filho.

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Unidade II
Depressão
Passemos, então, ao nosso próximo tópico, que »» Raciocínio lentificado;
é a depressão, até porque estresse crônico é »» Apatia;
importante fator de risco para a depressão,
»» Choro;
ou seja, a presença, por tempo prolongado, o
estresse, aumenta, e muito, o risco de uma pes- »» Pessimismo, pensamentos negativos, deses-
soa desenvolver depressão. perança;
»» Alteração do apetite (principalmente para
Hoje fala-se muito, e com razão, em depressão. menos, mas, também pode ser para mais);
Então, vamos primeiro dar um alerta para o que
»» Alteração do sono (principalmente para
não é depressão:
menos, mas, também pode ser para mais);
»» Tristeza (apenas) não é depressão;
»» Redução da libido;
»» Luto não é depressão.
»» Dores no corpo etc.
Depressão é um quadro caracterizado, principal-
É importante notar que, para falarmos em
mente, por uma tríade de sinais e sintomas:2
depressão, esse quadro precisa permanecer por
»» Humor rebaixado – tristeza; um tempo maior.
»» Desânimo;
Fala-se em muitos tipos de depressão e é ver-
»» Anedonia – falta de prazer (em especial com dade. Isso porque existem várias formas de ela
as coisas que antes lhe davam prazer). se apresentar, tanto pela quantidade e inten-
Ademais, podem e costumam também estar pre- sidade dos sinais e sintomas, quanto pela sua
sentes algum(uns) desses sinais e/ou sintomas: evolução.

»» Redução da concentração;

2  A um conjunto de sinais e sintomas, a Medicina chama Síndrome. Então, podemos falar em Síndrome Depressiva.

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Assim, segundo a Organização Mundial de Saúde tratamento. É sabido que pacientes com depres-
(OMS), existe a depressão leve, moderada ou são têm maior tendência a abandonar tratamen-
grave, a depressão recorrente, a depressão bipo- tos – ou não realizá-los de modo correto!
lar, a distimia, e outras.
Um lembrete importante: o fato de a depressão
O mais importante é saber identificar, seja em ter um fator desencadeante claro, não a torna
si, seja nos outros, uma alteração recente no menos depressão (a isso chamamos depressão
padrão de comportamento, justamente carac- reativa) e muito menos significa que não precisa
terizada por tristeza constante, lentidão de racio- de tratamento.
cínio, redução da capacidade de concentração,
desânimo (em geral este começa pelo lazer e Depressão é doença e precisa ser tratada. O trata-
pelas atividades prazerosas e só depois atinge mento a ser instituído é que deve ser individuali-
o trabalho, podendo chegar a coisas básicas zado e deve ser avaliado pelo especialista. Assim,
como se cuidar e tomar banho), tendência a iso- no caso de uma depressão leve, pode ser que
lamento social – a pessoa começa a recusar con- apenas mudanças de hábitos de vida (incluindo
vites e depois já nem atende o telefone. O choro atividade física regular) sejam suficientes.
é comum, no início, especialmente o choro fácil, A psicoterapia, provavelmente, sempre estará
mas não é imprescindível que esteja presente. indicada; as chamadas práticas alternativas,
Outro problema é o que se chama de comorbi- como meditação e yoga, também.
dade, ou seja, a chance de uma doença estar Nas depressões de moderada para grave há
associada a outra.
necessidade de se instituir uma terapia medi-
A depressão está associada a uma série de outras camentosa (ou outra, como a EMTr ou a ECT3).
doenças, como asma, diabetes e Infarto Agudo do Em relação aos medicamentos, muitas vezes o
Miocárdio (IAM), entre outras Doenças Cardiovas- que existem são verdadeiros mitos, como: “todo
culares (DCV). Há muito tempo se sabe, por exem- remédio para depressão engorda”, ou “remédio
plo, que DCV, quando associadas à depressão, controlado vicia”, ou considerar que os psicofár-
têm mortalidade aumentadas (em até 3 vezes!). macos (remédios que agem no Sistema Nervoso
Central – SNC) sejam “remédios fortíssimos!”.
Por outro lado, a ocorrência de diabetes aumenta
em duas vezes o risco de surgimento de depres- Converse com o psiquiatra e esclareça essas e
são – independentemente se tipo 1 ou tipo 2. outras dúvidas, se houver.
Inversamente, pacientes com depressão também
Por fim, a ainda segundo a OMS, a depressão
têm maior risco de desenvolver diabetes tipo 2.
afeta mais de 300 mil pessoas em todo o mundo,
Aspecto muito importante, ao se analisar depres- sendo a principal causa de incapacidade para
são e outras doenças, é a questão da adesão ao o trabalho. E, apesar de existirem tratamentos

3  EMTr: Estimulação Magnética Transcraniana. ECT: Eletroconvulsoterapia.

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eficazes, em mais da metade dos casos ela não Uma nota final, antes de concluir: segundo a
é tratada. A depressão afeta mais mulheres que ABP/CFM (Associação Brasileira de Psiquiatria/
homens, em uma proporção geral de 2 mulheres Conselho Federal de Medicina), quase todos as
para cada homem (esta proporção varia muito, pessoas que cometeram suicídio tinham uma
conforme a faixa etária).4 doença mental e mais de um terço dos casos de
suicídio está associado a transtornos do humor
Desse modo, depressão no ambiente de trabalho
(depressão é um transtorno do humor). Conforme
(não necessariamente associado a este) é algo
essas entidades, todos os anos são registrados
muito frequente. A compreensão e o apoio de
cerca de dez mil suicídios no Brasil.6 Isso torna
colegas e chefes é de suma importância, seja no
a depressão uma doença potencialmente fatal,
processo de recuperação/volta ao trabalho, seja
em especial, nos estágios moderado e grave.
no estímulo e incentivo à adesão ao tratamento.
Como depressão pode ser uma doença crônica, E, lembre-se, existem vários tipos de depressão.
a adesão é condição sine qua non para um bom Só o médico pode diagnosticar corretamente.
prognóstico, isto é, uma evolução mais favorável. Sempre que houver esta suspeita, procure ou
ajude a pessoa a procurar um psiquiatra.
Nesse sentido, a Associação Brasileira de Psi-
quiatria, em parceria com outras entidades e per-
sonalidades, há anos desenvolve a Campanha PARA SABER MAIS (E LEITURAS
Todos contra o Preconceito: psicofobia é crime, COMPLEMENTARES):
para alertar e desestimular o estigma.5
Para entender melhor a depressão (?) Revista
Lembrando que, além de ser a principal causa de Mente & Cérebro
incapacidade para o trabalho, as licenças médi-
https://www.youtube.com/watch?v=oSe-
cas por depressão costumam gerar quantidade
7v-RTIss&t=621s
de dias maior de afastamento. Para se ter uma
ideia, em determinado ano e tribunal, apenas Filme Depressão – OMS: https://www.youtube.
4,4% dos servidores tiveram licença médica por com/watch?v=dFKsN9J0hTM
algum tipo de transtorno mental. Entretanto,
Psicofobia é Crime: https://www.psicofobia.com.br/
isso foi responsável por mais de 25% de todos
os dias de afastamento do trabalho por motivo https://www.youtube.com/watch?v=oSe7v-
de doença da própria pessoa! E os transtornos RTIss&t=621s
do humor (capítulo onde se inserem os vários
tipos de depressão, foram responsáveis por 35%
de todos estes dias.

4  Disponível em: <https://www.who.int/es/news-room/fact-sheets/detail/depression>. Acesso em: 12 jul. 2019.


5  Disponível em: <https://www.psicofobia.com.br/>.
6  ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA. Comissão de Estudos e Prevenção de Suicídio. Suicídio: informando para prevenir. Brasília: CFM/ABP, 2014.

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Unidade III
Violência doméstica
A violência contra as mulheres foi assumida doméstica, no âmbito da família e nas relações
como bandeira de luta e como um processo íntimas de afeto. A lei visa criar as condições visi-
social por meio do qual o movimento feminista bilidade da violência contra as mulheres nesses
afirmou a ilegitimidade das várias formas de contextos privados que têm longo histórico de
agressões de homens contra mulheres. Esse amparo do poder dos homens por uma ideologia
processo de luta política resultou na criação machista. A intervenção do Estado nas esferas
de condições para que as mulheres pudessem doméstica e íntima é condição importante para
denunciar a violência por meio de uma rede de as mulheres vítimas de violência poderem superar
serviços. Vale destacar a criação do Conselho a condição de opressão nesses relacionamentos.
Nacional e dos Conselhos Estaduais dos Direi- A violência contra as mulheres deve ser compreen-
tos das Mulheres, das Delegacias Especiais de dida de maneira complexa em três níveis comple-
Atendimento às Mulheres (DEAMS) na década mentares: a dimensão social do machismo – como
de 1980, das Casas Abrigo e o desenvolvimento uma estrutura de poder que legitima a violência
de políticas específicas para superação de assi- contra as mulheres e as tornam vulneráveis –; a
metrias resultantes de uma ideologia machista. dimensão do relacionamento interpessoal entre
o homem que pratica a violência e a mulher; e a
O esforço para criar condições de visibilidade e
dimensão pessoal – subjetiva que impõe limites
vias institucionais para intervir em casos de vio-
para o entendimento e mesmo a naturalização da
lência contra mulheres culminou na promulgação
violência vivenciada ao longo da história de vida.
da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006). Essa Lei
Essas três dimensões estão presentes em todas
define a violência contra as mulheres como “qual-
as situações de violências contra as mulheres.
quer ação ou omissão baseada no gênero que lhe
cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou Quando a dimensão social do machismo é
psicológico e dano moral ou patrimonial” e con- ignorada, há uma tendência a pensar que há
textualiza essas ações nos âmbitos da unidade equilíbrio de oportunidades e de desempenho

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de papéis sociais entre homens e mulheres. Em havia ocorrido ainda na fase de aumento da
uma cultura machista, há hierarquia entre mas- tensão. Após o momento de tensão máxima, há
culino e feminino com uma propensão a uma maior possibilidade de a mulher buscar ajuda
favorecimento e superioridade do masculino e considerar uma separação, entretanto, após
(SAFFIOTI, 2004; ZANELLO, 2015). Isso é notável de essa fase, é comum que o homem que agre-
maneira bastante objetiva quando comparamos diu inicie um processo de pedido de desculpas,
a média salarial de homens e mulheres, quando reconsiderações e investidas românticas, carac-
comparamos divisão do trabalho doméstico, terizado por Walker como 3 “Lua de Mel”. Após
quando comparamos a divisão do trabalho de a fase de “Lua de Mel”, inicia um novo ciclo de
cuidado com familiares (filhos, pais, mães e aumento da tensão. Esse ciclo se repete reite-
avós) e também quando comparamos os dados radas vezes e, pela própria repetição e constân-
de violência nos quais a maioria esmagadora de cia ele acaba por naturalizar agressões físicas,
violência realizada por pessoas conhecidas é de psicológicas, morais e patrimoniais nas fases de
homens contra mulheres. A ideologia machista aumento da tensão.
impõe restrições às mulheres dificultando sua A psiquiatra argentina Cristina Ravazzola (1997)
autonomia e preservando espaços de subjetiva- trouxe outras contribuições pertinentes para a
ção na perspectiva do cuidado com a educação compreensão da violência contra as mulheres
dos filhos, preservação da unidade familiar e ao identificar a forma pela qual elas se isolam
cuidado com o marido – essas dimensões são socialmente ao longo de um relacionamento
particularmente importantes para manter um violento. O isolamento social advém na maioria
relacionamento violento. das vezes pelo controle dos homens em rela-
No relacionamento conjugal, já é bem estabe- ção às mulheres, impondo restrições a grupos
lecido, na literatura especializada, que a vio- sociais a que elas podem ter acesso, pela perda
de vínculos com familiares e amigos em razão
lência contra as mulheres ocorre na forma de
das rupturas e retomada dos relacionamentos
um padrão relacional conhecido como ciclo de
após as agressões e para tentar se preservar do
violência. Lenore Walker (1979, 2000) observou
julgamento das pessoas.
que existe um padrão de escalonamento da vio-
lência (em intensidade e frequência), permeado Em um padrão relacional violento, portanto,
por momentos de maior aproximação do casal há escalada da violência em intensidade e
no relacionamento violento. Walker (1979, 2000) frequência e diminuição do círculo social de
considera três fases no ciclo dos relacionamen- convivência das mulheres. Na medida em que
tos violentos: 1) a primeira fase se caracteriza as mulheres ficam mais isoladas socialmente,
pelo aumento da tensão no relacionamento, na elas têm menos condições de refletirem sobre o
qual pode ocorrer uma agressão verbal ou uma padrão relacional violento. Ao refletirem menos
agressão física mais leve. Essa fase termina no sobre as violências vivenciadas no cotidiano do
momento de 2) tensão máxima, quando ocorre relacionamento, elas passam a não reconhece-
uma agressão com maior intensidade que não rem agressões mais brandas como violências

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(empurrões, xingamentos, tapas, cerceamento prejudicar a imagem do pai diante dos filhos.
da liberdade de ir e vir podem ser compreen- (ANGELIM, 2009; GUIMARÃES, 2015).
didos como idiossincrasias relacionais). O ciclo
Muitas vezes, as mulheres estão inseguras
de violência se mantém e torna-se cada vez
quanto à forma como lembram dos episódios
mais difícil que a mulher elabore um pedido de
de agressão. Não é incomum que a mulher com
ajuda. Daí a importância de que as pessoas que
hematomas e cortes relate o episódio violento de
se relacionam com mulheres vítimas de violência
maneira atenuada. Minimizar os relatos é uma
aproveitem a oportunidade em que elas buscam
ajuda para poderem acolhê-las no sofrimento, forma de conter o sofrimento que lhes aflige.
permitir um espaço de conversa e encaminhar Lidar com a história de violência reconhecendo-
para os profissionais que possam ajudá-la. Cam- -se como vítima e um parceiro como agressor é
panhas que promovem a participação de todos um processo doloroso. Muitas vezes é necessário
na superação da violência contra as mulheres superar vivências traumáticas, constrangimen-
têm sido uma abordagem importante para com- tos, sintomas ansiosos e depressivos para poder
bater o isolamento social das mulheres vítimas seguir adiante com uma queixa de violência. Indo
de violência. além, existem as consequências psicológicas
afetando a autoestima, impondo sofrimentos
Ao nível pessoal é importante compreender graves como quadros de ansiedade e depressão
que a percepção da violência pode ser muito e a falta de perspectivas. Nesse sentido, é que
ambivalente para as mulheres, pois a pessoa cada vez mais serviços de apoio psicossocial às
que as agride é também uma pessoa que tem mulheres vítimas de violência têm sido criados
uma história de envolvimento amoroso e afetivo. somando-se à rede de proteção das mulheres
Um fenômeno recorrente nos casos de violên- (CAMPOS e ZANELLO, 2017).
cias contra as mulheres é a retirada de queixas
contra os parceiros agressores. Considerando Nos últimos anos, também tem sido mais fre-
a estrutura disponível para as mulheres apre- quente o cuidado com os homens autores de
sentarem suas queixas e as medidas protetivas violência contra as mulheres. Preocupação
cabíveis para viabilizar uma separação, muitos importante e pertinente por buscar promover
profissionais culpam as mulheres por não man- reflexões e processos de mudança em homens
terem as queixas e se separem dos agressores que têm histórico de violência. Essas ações ocor-
(GUIMARÃES e DINIZ, 2017). Para entender as rem muitas vezes em meio ao processo de inter-
motivações das mulheres para não criminaliza- venção do Estado, encaminhando os homens
rem os agressores, destacam-se o medo resul- para intervenções psicossociais. A compreen-
tante de ameaças de morte à vítima, aos filhos são do ciclo de violência, o reconhecimento do
e familiares; o receio de perder apoio financeiro padrão relacional violento e do peso do discurso
para educação dos filhos, a culpa por expor o machista para os homens são tópicos aborda-
parceiro agressor publicamente, culpa por sen- dos constantemente nessas intervenções (GUI-
tir que mandou prender o parceiro, o receio de MARÃES e DINIZ, 2017).

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CONSIDERAÇÃO FINAL
A gravidade dos casos de violência contra mulhe-
res e a complexidade de fatores envolvidos exi-
gem contextualização política dos processos
sociais que criaram as condições de visibilidade
desse tipo específico de violência. A compreensão
adequada desse fenômeno por parte de todos
os profissionais que atuam nessa área exige que
eles conheçam o percurso histórico que permitiu
a construção e a politização da definição da vio-
lência contra as mulheres, o papel do Estado no
controle e na intervenção em casos de violência.

Toda intervenção deve buscar legitimar a per-


cepção de violência da mulher, contextualizar
possíveis vieses machistas que dificultem a
percepção do padrão relacional violento, iden-
tificar ao longo da história do relacionamento
os momentos de tensão máxima (as agressões
mais marcantes), descrever o padrão relacional
violento e, por fim, viabilizar espaço e tempo
qualificados de reflexão para as mulheres ava-
liarem quais os impactos das violências em suas
vidas. A compreensão integrada do fenômeno da
violência contra as mulheres permite melhores
chances para que as mulheres vítimas lidem com
os desafios impostos para a superação dessas
histórias.

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Unidade IV
Drogas e
dependência
química
Ao pesquisar no Google a expressão dependên- soa que as usa, da droga escolhida, da quanti-
cia química, após demorado levantamento de dade, frequência, expectativas e circunstâncias
47 segundos, o buscador identificou 2.320.000 em que é consumida”.7
resultados!!! Precisamos tratar disso em umas 2
Vale lembrar que existem drogas (substâncias
horas! Então precisamos ser, mais que sintéticos,
psicoativas) legais (como o cigarro, o álcool, medi-
objetivos.
camentos e o café) e as ilegais (como maconha,
Comecemos pelos conceitos. cocaína, crack, ecstasy e tantas e tantas outras).

A Cartilha sobre Drogas, elaborada pela Secre- Por sua vez, a Organização Mundial de Saúde
taria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD), (OMS) conceitua Dependência Química (DQ), por
conceitua drogas como: “substâncias que pro- meio da Classificação Internacional de Doenças
duzem mudanças nas sensações, no grau de – a CID 10 (por ser a 10ª Revisão da Classifica-
consciência e no estado emocional das pessoas. ção), pela presença de, no mínimo, três entre os
As alterações causadas por essas substâncias critérios abaixo, em qualquer momento durante
variam de acordo com as características da pes- o ano anterior:

7  BRASIL. Ministério da Justiça. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD). Drogas: cartilha sobre maconha, cocaína e inalantes.
Conteúdo e texto original: Beatriz H. Carlini. 2. ed., reimpr. Brasília: Ministério da Justiça, 2011. (Série Por dentro do assunto)

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TÓPICOS ESPECIAIS EM SAÚDE MENTAL Módulo 4

1) Um desejo forte ou compulsivo para consumir De modo sucinto, dizemos que alguém é ou está
a substância; dependente de uma droga/substância, quando
observamos nele uma compulsão para o con-
2) Dificuldades para controlar o comportamento
sumo, o que habitualmente vem associado à
de consumo de substância em termos de iní-
dificuldade para controlar-se quanto ao início,
cio, fim ou níveis de consumo;
ao fim ou aos níveis de consumo, mas, princi-
3) Estado de abstinência fisiológica quando o palmente, quando a suspensão gera um estado
consumo é suspenso ou reduzido, eviden- de abstinência. À medida que a dependência
ciado por: síndrome de abstinência caracte- avança, observamos o fenômeno da tolerância
rística; ou consumo da mesma substância (ou – que é a necessidade de consumo de quan-
outra muito semelhante) com a intenção de tidades cada vez maiores para se obterem os
aliviar ou evitar sintomas de abstinência; mesmos efeitos de antes – e o aumento do
tempo empregado em conseguir ou consumir a
4) Evidência de tolerância, segundo a qual há a substância ou recuperar-se dos seus efeitos (são
necessidade de doses crescentes da substân- clássicos, como exemplos disso, as ressacas e as
cia psicoativa para obter-se os efeitos ante- ausências ao trabalho nas segundas-feiras) e a
riormente produzidos com doses inferiores; persistência no consumo de substâncias apesar
5) Abandono progressivo de outros prazeres ou de provas evidentes de consequências manifes-
interesses devido ao consumo de substâncias tamente prejudiciais, tais como lesões hepáti-
psicoativas, aumento do tempo empregado cas causadas por consumo excessivo de álcool,
em conseguir ou consumir a substância ou humor deprimido consequente a um grande con-
recuperar-se dos seus efeitos; sumo de substâncias, ou perturbação das fun-
ções cognitivas relacionada com a substância.
6) Persistência no consumo de substâncias ape-
sar de provas evidentes de consequências As drogas possuem efeitos diversos, conforme
manifestamente prejudiciais, tais como lesões sua natureza química. Assim, existem as esti-
hepáticas causadas por consumo excessivo de mulantes (cocaína, anfetamina, cafeína), as
álcool, humor deprimido consequente a um depressoras do Sistema Nervoso Central (álcool),
grande consumo de substâncias, ou perturba- as alucinógenas – produzem alucinação (LSD).
ção das funções cognitivas relacionada com a É importante dizer que o desenvolvimento da
substância.8 dependência varia em função do tipo da droga,
Então, existe dependência tanto de drogas legais da forma de consumo (por via oral, inalada, inje-
como ilegais – embora mais frequentemente tada), da quantidade e frequência e também da
pensamos nestas, quando pensamos em depen- personalidade de quem a consome (pessoas com
dência de substâncias. tendência a serem dependentes têm um risco

8  ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) (Coord.). Classificação de transtorno mentais e de comportamento da CID 10: descrições clínicas
e diretrizes diagnósticas. trad. Dorgival Caetano. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

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aumentado), além de características genéticas de prescrição (aqui incluídas as prescrições que


(já que já se observou que o risco é maior para médicos fazem sem o devido acompanhamento
quem já tem casos na família). do paciente).

Poderíamos então, resumidamente distinguir, O Brasil é o quinto maior consumidor de remédios


quanto ao consumo de substâncias psicoativas, no mundo. Não há razão para se ser contra remé-
o uso, abuso e dependência. O uso seria qual- dio, aprioristicamente falando. O que é preciso,
quer consumo da substância, seja episódico ou sim, é uma avaliação criteriosa da indicação e do
esporádico; o abuso – ou uso nocivo – seria o modo de usar do medicamento, o que só poderá
consumo associado já a algum tipo de prejuízo, ser feito pelo médico assistente ou pelo profis-
seja ele biológico, psicológico ou social; e depen- sional farmacêutico.
dência seria o consumo sem controle.9

Pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde LEITURAS COMPLEMENTARES


dá conta de que, em 2018, 26% dos homens no (PARA SABER MAIS):
Brasil fizeram uso abusivo de bebida alcoólica,10
Drogas: Cartilha sobre maconha, cocaína e ina-
ou seja, mais de um quarto da população mas-
lantes – Senad, 2011 (veja as demais cartilhas
culina (na faixa de 25 aos 34 anos de idade isso
da Série: “Por dentro do assunto”, sobre outras
salta para mais de um terço!!!) Por outro lado, a
drogas).
mesma pesquisa também identificou que, nos
últimos anos, tem havido aumento maior entre Livreto informativo sobre drogas psicotrópicas,
as mulheres que entre os homens. elaborado pelo Cebrid e distribuído pela Senad
– Disponível em: <www.obid.senad.gov.br e www.
Por outro lado, assim como qualquer hábito,
cebrid.epm.br>.
comportamento ou substância, também as dro-
gas legais como café e medicamentos, quando Autoavalie seu consumo de álcool: <https://
em excesso, têm muita chance de serem preju- vivamais.cecom.unicamp.br/wp-content/uplo-
diciais. ads/2015/01/Audit1.pdf>.

Lembrando que a dependência de medicamen-


tos é algo muito frequente. As causas? Como
toda dependência, são várias: facilidade de
acesso (mais de duas vezes o que preconiza a
OMS, “há mais pontos-de-venda de remédios no
Brasil do que de pão”11), automedicação, excesso

9  FEGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química. São Paulo: Roca, 2004.
10  Disponível em: <https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2019/07/25/uso-abusivo-de-bebida-alcoolica-teve-aumento-maior-
-entre-mulheres-do-que-homens-diz-levantamento.ghtml – acessado em 25/07/2019>.
11  Disponível em: <https://super.abril.com.br/saude/viciados-em-remedios/>.

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Unidade V
Assédio moral
e sexual
As relações de trabalho conturbadas são bem dável também pode ser considerado autoritário,
comuns, sendo que todos já passamos por situ- humilhante, perturbador, aborrecedor, incômodo,
ações difíceis ou conhecemos alguém que já inoportuno, insistente, abusivo, ameaçador e
teve más experiências. Entretanto, para caracte- antiético, caracterizado por comportamentos
rizar o assédio moral no trabalho, as situações inadequados, atitudes e diálogos violentos,
humilhantes ou constrangedoras precisam ser que ferem a pessoa em sua dignidade e inte-
repetidas e prolongadas em um espaço longo gridade física, psíquica e social. O trabalhador
de tempo, por exemplo, algumas semanas. Além geralmente se sente impotente e teme por per-
disso, devem possuir direcionalidade a pessoas ou der seu emprego, o que inibe a denúncia.
grupos específicos e intencionalidade de gerar um
No Brasil, não há lei específica para assédio moral,
ambiente degradado de trabalho e impossibilitar
apesar de ser realidade constatada. Geralmente
a convivência, ou ainda forçar que a pessoa peça
a vítima precisa conseguir provar o que ocorreu,
demissão. Também devem acontecer durante a
nem sempre sendo fácil. Algumas das possíveis
jornada de trabalho, no exercício das atividades
provas são gravações, cópias de e-mails, atas de
ou em função delas. Conheça um pouco mais
reunião, fichas de acompanhamento de desem-
sobre o assédio moral nesse artigo e nesse vídeo:
penho, testemunhas, registros de advertências
https://www.youtube.com/watch?v=-f40RjR-r7Q.
e de ponto eletrônico e conversas privativas
O mais comum é que aconteçam em relações em aplicativos de mensagens. É comum que o
hierárquicas assimétricas de chefia para subor- assediador possua maior influência dentro da
dinado, mas também pode acontecer entre empresa, podendo interferir nas etapas de inves-
colegas. Esse tipo de relacionamento não sau- tigação, podendo até eliminar provas.

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O assédio também pode ser disfarçado de com- lho digno. Confira a convenção na íntegra, em
petitividade, de exigências do cargo ou de dis- inglês, nesse site: <https://www.ilo.org/global/
ponibilidade para a empresa, mas atentem que lang--en/index.htm>.
o assédio ultrapassa os limites contratuais ou
Neste vídeo da ONU, é explicado o que é o assédio
de capacidade saudável de produtividade, tor-
sexual: <https://www.youtube.com/watch?v=lKI-
nando o trabalho exaustivo e sendo uma das
1kM9HgiU>. Nesta cartilha da Fiocruz, são abor-
causas de depressão, Síndrome de Burnout e
dados o assédio sexual e moral: <https://www.
síndrome do pânico. Por vezes, o assediador, o
far.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/07/
gestor ou a empresa gera culpabilização e res-
Cartilha_assedio_moral_e_sexual.pdf>. Este
ponsabilização da vítima, acusando-o de não ser
outro artigo fala um pouco sobre o assédio moral
bem preparado, não ter formação suficiente, não
e o sexual: <https://www12.senado.leg.br/insti-
compreender o mercado de trabalho, ser desor-
tucional/procuradoria/proc-publicacoes/carti-
ganizado ou entrar muito em conflito.
lha-assedio-moral-e-sexual>.
Assédio sexual são vantagens ou favores sexu-
As políticas de gestão de pessoas devem inves-
ais ou coerção e avanços sexuais indesejados e
tir na prevenção de qualquer forma de assédio
inoportunos no ambiente de trabalho ou relacio-
e na melhoria do clima psicológico no traba-
nados a este, podendo ser verbais, gestuais ou
lho. Geralmente, as medidas tomadas pelas
físicos. É crime e uma violência contra a mulher,
empresas vêm sendo estimuladas indireta-
quando perpetrado contra esta, mas pode ser
mente pelas sanções financeiras conseguidas
feito por homens ou mulheres e contra homens
judicialmente e a queda de produtividade dos
e mulheres. O assediador pode ser um cliente,
trabalhadores assediados. A cultura e o clima
um colega, ou mais frequentemente, um supe-
institucional não podem favorecer ou menos-
rior. O assédio cria atmosfera hostil, é uma forma
prezar o sofrimento psíquico, devendo acolher
de tratamento discriminatória e é considerado
e investigar essas situações. Conheça mais
violência de gênero, já que as mulheres são as
sobre as intervenções que podem ser realiza-
maiores vítimas, com frequência sendo tratadas
das em instituições neste artigo: <http://pepsic.
como objetos sexuais. Ao contrário do assédio
bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
moral, pode ser de longa duração ou apenas
d=S1413-389X2016000100018>.
uma ocorrência em uma oportunidade.

No ano de 2019, a Organização Internacional do


Trabalho (OIT) aprovou uma nova convenção de
combate à violência e ao assédio no ambiente de
trabalho. Acompanhada de uma recomendação,
pauta que a violência e o assédio no trabalho
são violações ou abusos aos direitos humanos,
ameaçando a igualdade de oportunidades e
são inaceitáveis e incompatíveis com o traba-

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Unidade VI
Autoestima e
valorização da vida
Ao falarmos em valorização da vida no campo da e que a mídia não deve divulgar esses dados. Ao
saúde mental, invariavelmente falaremos sobre o contrário, o Ministério da Saúde, em seu guia de
fenômeno do suicídio. Ao contrário do que se pode comunicação de suicídio para a mídia (https://
pensar, o suicídio não é um fenômeno individual. É www.youtube.com/watch?v=k-287JT7OKo), for-
um fenômeno social, complexo, multicausal, que nece informações e cuidados sobre o tema.
sempre existiu em todas as sociedades. Assim
Outros mitos são que a pessoa não dá sinais de
sendo, pode afetar qualquer pessoa, em qualquer
pensar em suicídio, que as pessoas fazem “chan-
lugar, de qualquer sexo ou classe social.
tagens emocionais” ameaçando suicídio e quem
O suicídio é atualmente grave problema de quer cometer suicídio não avisa. Não se pode
saúde pública e uma das prioridades da OMS. acreditar ou reproduzir essas falácias, pois foram
A cada hora no Brasil, quatro pessoas tentam há muito tempo desmentidas. Qualquer alerta
suicídio e uma consegue efetivamente morrer. deve ser considerado um risco real. A pessoa com
No mundo, 800 mil pessoas morrem por suicídio ideação suicida fala bastante sobre sua morte,
todos os anos e é a segunda maior causa de demonstra falta de esperança no futuro, cos-
morte entre jovens entre 15 e 29 anos de idade. tuma ser pessimistas e emitir vontade de sumir,
Entretanto, o que mais vale a pena se destacar é desaparecer, dormir para sempre ou morrer. Tam-
que o suicídio pode ser prevenido. Conheça mais bém são comuns o isolamento social e a falta de
sobre a prevenção do suicídio nesse link: <http:// interesse em atividades antes prazerosas.
www.saude.gov.br/saude-de-a-z/suicidio>.
Alguns grupos exigem mais atenção com relação
Por ser um tabu, o suicídio é cercado de mitos. O ao risco de suicídio, sendo um deles o de pessoas
primeiro deles é que não se deve falar do assunto com qualquer transtorno psiquiátrico ou de per-

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sonalidade, em especial a depressão. Conheça, atenção e mente aberta, ofereça apoio, se ofereça
nesse link do Ministério da Saúde, um pouco para acompanhar a pessoa em um tratamento
mais sobre a depressão (http://www.saude.gov. de saúde. Incentive a pessoa a buscar ajuda
br/saude-de-a-z/saude-mental/depressao) profissional de um psicólogo e caso avalie que a
e sobre a atuação do SUS no tratamento da situação é de perigo, não deixe a pessoa sozinha.
depressão neste vídeo: <https://www.youtube.
Com relação aos aspectos individuais, podemos
com/watch?v=ia-nNnLaf6A&feature=youtu.be>.
discutir todos os sentimentos, positivos ou nega-
Outros grupos que têm mais chances de apresen- tivos. Entre eles, a autoestima, definida como a
tar ideação suicida são pessoas em situação de maneira pela qual nos percebemos, que se rela-
vulnerabilidade, como, por exemplo, desempre- ciona ao que cada um fala, pensa e espera de si
gados, dependentes químicos e alcoolistas, quem mesmo. A forma que nos percebemos repercute
vive em locais com crises políticas e econômicas, em nossas ações. Alguém com autoestima ele-
quem sofre discriminação por orientação sexual vada e saudável sente-se amado, livre, forma
e identidade de gênero, quem sofreu agressões vínculos saudáveis, consegue ser assertivo e dizer
psicológicas e/ou físicas, quem apresenta sofri- não quando necessário, é criativa e empática, tem
mento no trabalho, quem tem muitos conflitos capacidade de iniciativa e lida adequadamente
familiares, quem sofreu a perda de um ente que- com situações sociais, tais como frustrações, con-
rido, portadores de doenças crônicas, dolorosas flitos, demandas, críticas e desafios cotidianos.
e/ou incapacitantes, população encarcerada e, Sendo um sentimento tão importante, a autoes-
em especial, os sobreviventes do suicídio, ou seja, tima estabelece a capacidade da pessoa em ser
quem perdeu alguém próximo por suicídio. bem ou malsucedida em algumas situações. Ao
Caso você esteja passando por um momento vul- contrário do que se pensa, a autoestima e outros
sentimentos não são inatos, ou seja, não nasce-
nerável e tenha pensado em suicídio, o ideal é
mos com eles predeterminados. Aprendemos a
pedir ajuda o quanto antes. Você pode procurar
lidar com nossos sentimentos e até a nos sentir
uma unidade do CAPS perto de você, ligar no Cen-
de determinada forma em alguma situação.
tro de Valorização da Vida (CVV), discando 188, ou
contar sua ideação suicida para um familiar ou A autoestima e tantos outros sentimentos sau-
amigo próximo em que confie. Neste link, você dáveis podem ser ensinados, praticados, cons-
pode conhecer um pouco sobre o CVV e sobre a truídos, estimulados e desenvolvidos, conforme
prevenção ao suicídio: <https://www.cvv.org.br/ esse interessante artigo: <http://www.itcrcam-
wp-content/uploads/2017/05/Falando-Aberta- pinas.com.br/pdf/helio/Autoestima_conf_res-
mente-CVV-2017.pdf>. pons.pdf>.

Se você suspeita que alguém próximo de você Como em tudo que é aprendido, os pais, a
tem ideações suicidas, procure local reservado sociedade e a escola têm papel fundamental
em um momento apropriado e aborde essa ques- no desenvolvimento dos sentimentos, em um
tão. Falar sobre o suicídio salva vidas. Ouça com ambiente seguro e de valorização, em que a

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auto-observação, o autoconhecimento e o auto-


-reconhecimento são ensinados e incentivados.

Podemos encerrar essa unidade refletindo sobre


a importância de construirmos ambiente seguro
e estimulante, para nós mesmos e para as pes-
soas próximas a nós. Ao desenvolvermos empa-
tia e sentimentos positivos em relação a nós
mesmos, nos capacitamos a lidar com nossos
sentimentos negativos e com os de outras pes-
soas, auxiliando na valorização da vida.

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Referências bibliográficas
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