Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Material Teórico
O Desenho Expressivo
Revisão Textual:
Profa. Dra. Selma Aparecida Cesarin
O Desenho Expressivo
OBJETIVO DE APRENDIZADO
· Abordar diversos aspectos que caracterizam a expressividade do de-
senho: o uso da cor e as técnicas pictóricas, a figuração e a abstração,
o desenho feito com o lado direito do cérebro, a representação de
emoções e o desenho livre infantil.
· Entender como cada um destes aspectos contribui para a compre-
ensão da diversidade da produção artística, ampliando a concepção
de desenho, com o foco voltado para as produções modernas e con-
temporâneas desta linguagem.
· Introduzir conhecimentos de modos de fazer, necessários para a
compreensão dos estudos em artes e, principalmente, do desenho,
contribuindo para sua formação e produção pessoal.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja uma maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.
Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.
Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.
Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como o seu “momento do estudo”.
No material de cada Unidade, há leituras indicadas. Entre elas: artigos científicos, livros, vídeos e
sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também
encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados.
Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão,
pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato
com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem.
UNIDADE O Desenho Expressivo
Contextualização
Nesta Unidade, você aprenderá, entre outros conteúdos, o uso de cores e a
representação das emoções. Um dos artistas citados é o brasileiro Iberê Camargo
que, por mais que grande parte de sua obra seja feita em pintura, ele torna-se
um artista importantíssimo para compreendermos os conteúdos já vistos até o
momento, como a representação da figura humana (o retrato e o autorretrato) e a
representação de objetos.
Sugerimos que você assista ao vídeo Conhecendo Museus – Ep. 59: Fundação Iberê
Explor
8
Técnicas Pictóricas: O Uso da Cor
O desenho a lápis, carvão e canetas fornece valiosa prática, sendo também
gratificante em termos estéticos e processuais por ser de fácil domínio manual e
permanência no suporte. Porém, com o meio colorido de desenho, pode-se expe-
rimentar e produzir trabalhos que são tão expressivos e refinados como a pintura.
Os artistas de hoje estão numa posição afortunada face à vasta gama de materiais
de alta qualidade disponíveis – sendo o único problema a escolha inicial.
Aqui abordaremos alguns materiais e técnicas que resultam em trabalhos que
ficam na fronteira entre o desenho e a pintura, como o giz pastel seco e oleoso e
os lápis coloridos aquareláveis.
Os lápis de cor aquareláveis são um ponto de partida democrático para qualquer
estudante que esteja interessado no das cores em seus trabalhos de desenho.
Assim como os demais lápis, eles são de fácil manuseio, iguais ao uso do lápis
grafite e possuem uma gama imensa de cores e tons que podem ser adquiridos e
experimentados de forma gradativa em seu processo de criação.
Sobre a diferença entre os lápis de cor normais e os aquareláveis, temos:
Por sua composição cerosa, os lápis convencionais não se dissolvem
quando umedecidos com água; ao contrário, eles a repelem. Os lápis-
-aquarela, porém – sobretudo os de boa qualidade – possibilitam uma
explosão de cores. Com a absorção de água, o desenho de hachura pode
até desaparecer. Normalmente, desenha-se com lápis-aquarela como se
fossem lápis convencionais, incorpora-se a água. Os traços duros do lápis
resistem e ficam visíveis por trás da aguada. Secas essas aguadas, é pos-
sível acrescentar mais cores e detalhes com os lápis (ROIG, 2007, p.43).
9
9
UNIDADE O Desenho Expressivo
Por exemplo, ao usarmos linhas cruzadas nas cores azul e amarelo, podemos
criar variações de áreas verdes, de acordo com a proporção do uso dessas duas
cores. Se quisermos verdes mais claros, utilizamos maior quantidade de amarelo;
caso contrário, utilizamos maior quantidade de azul para conseguirmos um tom de
verde mais escuro.
É importante observar que a ordem das cores aplicadas sobre o papel altera
o seu resultado, porque a composição cerosa das minas dos lápis de cor faz com
que a primeira camada funcione como reserva em relação às seguintes. Sobre-
pondo uma cor clara a outra escura, não se obterá o mesmo resultado da sobre-
posição contrária.
10
Figura 3 – Lápis aquarela – cores justapostas e aquareladas
Fonte: Acervo do Conteudista
Com os lápis aquareláveis, as misturas das cores ficam mais visíveis. Pode-se
espalhar a cor numa aguada com pincel limpo logo após a sobreposição de duas
cores ou mais. Pode-se, ainda, usar somente uma cor, aquarelar, esperar secar e
depois inserir outra, num processo de acúmulo de cores por etapas.
Na pintura em aquarela, pouco se usa o branco, pois se trata de uma técnica em que
o papel e as transparências é que são a base para a aplicação da luz na composição.
11
11
UNIDADE O Desenho Expressivo
Figura 4 – Técnica do branqueamento com lápis aquarela
Fonte: Acervo do Conteudista
Figura 5 – Miguel Ambrizzi, Cena com lápis aquarela, 2008. Observe os detalhes com
técnica do branqueamento na montanha ao fundo da composição. Tanto na vegetação,
quanto no animal, há o uso de diferentes tons, enriquecendo o resultado
Fonte: Acervo do Conteudista
12
Linhas “cegas” são impressas no papel com o uso de uma agulha de tricô, um
capo de um pincel ou até com uma caneta com o uso de um desenho prévio em
outro papel menos encorpado. Esse método também é conhecido como desenho
de linhas brancas.
Por fim, trabalhamos com a sobreposição de cores, as quais não serão aplicadas
sobre as linhas do desenho que foram riscadas previamente, pois o papel foi
sulcado, pressionado, deixando as linhas em baixo-relevo. Ao aplicarmos a cor, as
linhas brancas aparecerão na composição.
O lápis aquarela ainda pode ser aplicado em papel úmido. Ao riscar, a ponta
do lápis amolece e se dissolve com facilidade, criando efeitos suaves e aveludados,
com efeitos de aguada ao redor do traço.
Outro material muito comum no uso da cor em desenho é o giz pastel, em sua
variação de seco e oleoso:
A técnica do pastel está tão próxima da técnica pictórica quanto do
desenho; por isso, seria difícil tentar vincular de maneira exclusiva esse
procedimento a uma das duas disciplinas. Essa dicotomia se deve ao
13
13
UNIDADE O Desenho Expressivo
Figura 8 – Mistura de cores com uso dos dedos: linhas paralelas
azuis e amarelas ou com cores justapostas (amarelo e vermelho)
Fonte: Acervo do Conteudista
14
Figura 9 – Giz pastel seco puro e com aguada
Fonte: Acervo do Conteudista
Os pastéis oleosos também não produzem linhas bem definidas, mas são ideais
para desenhos arrojados e vivos, com áreas sólidas de cor. Os pastéis oleosos não
são tão macios e não esfarelam muito como os secos, justamente por levarem óleo
na composição, não exigindo, assim, o uso de um fixador. Artistas como Manet e
Toulouse-Lautrec utilizaram muito este material em seus trabalhos de retratos.
15
15
UNIDADE O Desenho Expressivo
Podemos obter uma variedade de efeitos com essa técnica utilizando instrumentos
de pontudos para linhas mais finas ou com espátulas ou facas para raspar camadas
maiores, criando texturas diferenciadas.
Figura 13 – Exemplos de uso do giz pastel oleoso (da esquerda para a direita: esfumaçado,
sgraffito, degradê de várias cores e degradê do azul com sobreposição do branco (branqueamento)
Fonte: Acervo do Conteudista
Figura 14 – Giz pastel oleoso: linhas paralelas e branqueamento
Fonte: Acervo do Conteudista
Figuração e Abstração
Até o presente momento, nesta Disciplina, estudamos o desenho no seu
viés figurativo. A arte figurativa corresponde aos trabalhos que se desenvolvem
principalmente pela representação de seres e objetos cujas formas são reconhecíveis
pelos seus observadores, não somente pelas formas, mas pela maneira como as
formas compositivas de um desenho ou pintura, por exemplo, foram organizadas,
permitindo associações com o mundo real.
16
De forma bem simples, um triângulo, um quadrado e um retângulo podem con-
tinuar a ser formas geométricas numa composição ou serem configurados e organi-
zados, possibilitando o entendimento da imagem como representação de uma casa.
Figura 15
Fonte: Acervo do Conteudista
17
17
UNIDADE O Desenho Expressivo
18
Na arte abstrata, temos duas vertentes, uma mais voltada para as emoções,
pelo uso e ritmo das cores e a expressão de impulsos individuais, conhecido
por abstracionismo lírico ou informal, cujas bases estão nos movimentos do
Expressionismo e do Fovismo.
A outra vertente tem suas bases nos fundamentos racionalistas das composições
cubistas, no rigor matemático e no estudo da forma e é conhecida como abstração
geométrica ou formal.
Kasimir Malevich (1878-1935) é um dos grandes nomes da arte abstrata
geométrica. Líder do movimento do Suprematismo (1915), sua arte está voltada
para o estudo sistemático da estrutura da imagem.
Ainda na arte abstrata geométrica, temos suas vertentes dos movimentos do
Construtivismo, do Realismo e do Neoplasticismo com nomes como Alexander
Rodchenko, Naum Gabo, Piet Mondrian e Theo van Doesburg.
Esses artistas influenciaram fortemente a produção na área do design gráfico,
na elaboração de cartazes e na produção editorial por meio da diagramação
de materiais impressos como livros e revistas. Esses movimentos tiveram como
propósito encontrar novas formas de expressão plástica, fugindo das ideias e
princípios da representação. As obras são elaboradas em composições que utilizam
elementos básicos como linhas, retângulos, cores primárias, forte uso do preto e
tons de cinza.
19
19
UNIDADE O Desenho Expressivo
Mel Goodman (2002, p.11) ainda ressalta que a arte figurativa seria aquela que
representa a “ilusão de uma realidade percebida, por mais que seja simplificada,
distorcida, exagerada ou ampliada”.
Para Gooding:
Os artistas abstratos criaram imagens originais que se equiparam em
intensidade e força às da grande tradição da arte figurativa. A abstração
não suplantou a arte representacional, mas ocupou um lugar a seu lado,
descobrindo novas possibilidades de visão, mudando a maneira como as
coisas são vistas e conhecidas (GOODING, 2002, p. 9).
20
Desenhando com o Lado Direito do Cérebro
A autora Betty Edwards é uma referência no que diz respeito ao desenho feito
utilizando o lado direito do cérebro. Mas o que vem a ser isso?
Para ela, o desenho é uma habilidade possível de aprender; não se trata de dom,
mas de aprendizado e exercício do olhar e da percepção, os quais são resultado de
uma transição mental, ou seja, acionar o lado direito do cérebro para perceber o
mundo de modo diferente e vê-lo de modo diferente.
Para Edwards:
Desenhar não é difícil. O problema é ver, ou, de modo mais específico,
passar a ver de uma forma específica. (...) Muitos artistas já falaram de
ver as coisas de maneira diferente ao desenhar e costumam mencionar
que ao fazê-lo entram em estado alterado de consciência. Neste estado
subjetivo diferente, dizem se sentir transportados, “em comunhão com o
trabalho”, capazes de perceber relacionamentos que normalmente não
captam. A noção de tempo se esvai e as palavras deixam de ter lugar
na consciência. Sentem-se alertas e conscientes, porém relaxados, sem
ansiedade, vivenciando uma ativação mental agradável, quase mística
(EDWARDS, 2000, p.30)
21
21
UNIDADE O Desenho Expressivo
O livro Desenhando com o Lado Direito do Cérebro, de Betty Edwards é uma leitura
Explor
importante para a sua formação acadêmica. Nele, você encontrará vários exercícios
explicados passo a passo, seguidos de questionamentos que estimularão sua reflexão sobre
a sua produção em desenho. O livro se encontra digitalizado e disponível em vários sites da
internet e também em: https://goo.gl/HtBouf
Normalmente, nós temos o hábito de perceber as coisas pela sua posição usual,
ou seja, de topo para cima. Essa posição nos facilita o reconhecimento dos objetos
cotidianos, identificamos com um nome e classificamos, comparando-os com os
conceitos e lembranças que temos armazenadas na memória.
Lemos um texto da direita para a esquerda e de cima para baixo, não é mesmo?
E se invertermos, o que acontece? E quando se trata de uma imagem?
Para Edwards, quando a imagem está invertida, de cabeça para baixo, os sinais
visuais não são os mesmos. “A mensagem fica estranha e o cérebro se confunde.
Vemos as formas e as áreas de luz e sombra” (EDWARDS, 2000, p.77).
22
Figura 20 – Albert Einsten Figura 21 – Giovanni Battista Tiepolo,
Fonte: Wikimedia Commons Madona e Criança com o Santo, 1750-1760
Fonte: Wikimedia Commons
23
23
UNIDADE O Desenho Expressivo
24
• você ficará satisfeito com seu desenho, especialmente se você pensava que
jamais seria capaz de desenhar;
• as partes “mais difíceis”, as “áreas escorçadas” estarão bem desenhadas, dan-
do uma ilusão espacial;
• as pernas do retratado ficaram bem desenhadas em vista escorçada.
Para Edwards, essas partes “difíceis” foram bem desenhadas porque quem
desenhou não sabia o que estava desenhando, ou seja, desenhou apenas o que viu,
conforme enxergou, caracterizando o que ela define como uma das chaves mais
importantes para se desenhar bem.
Entretanto, a autora afirma que pode não fazer sentido que um desenho feito de
cabeça para baixo possa ser tão superior ao feito de cabeça para cima:
Este quebra-cabeça coloca a modalidade E (lado esquerdo) num dilema
de lógica: como explicar a súbita aptidão para o desenho quando ele (o
hemisfério esquerdo que sabe de tudo) foi dispensado da tarefa? O hemis-
fério esquerdo, que admira toda tarefa bem feita se vê forçado a admitir a
possibilidade de que o hemisfério direito, tão menosprezado, sabe dese-
nhar bem. Por razoes que ainda não estão muito claras, o sistema verbal
imediatamente rejeita a tarefa de “ler” e denominar imagens de cabeça
para baixo. Com efeito, a modalidade E parece estar dizendo “não faço
nada de cabeça para baixo. É difícil dar nomes a coisas que sejam vistas
desta forma; além do que, o mundo não é de cabeça para baixo! Por que
eu deveria me preocupar com uma coisa destas (EDWARDS, 2000, p.82)
Esse exercício tem sua razão, dentro da proposta teórica da autora, no sentido de
fugir do combate entre as modalidades conflitantes, o lado direito e o lado esquerdo.
Depois de concluído o exercício, você tornará consciente de como se sentiu após
ter feito a transição cognitiva do lado esquerdo para o direito, permitindo vermos
as coisas como o artista vê, desenhando aquilo que vemos.
25
25
UNIDADE O Desenho Expressivo
Representando Emoções
Até o presente momento, fomos conhecendo os jogos entre representação e
interpretação da realidade no pensamento criativo dos artistas.
Historicamente, conforme vimos, a interpretação da realidade foi se tornando
cada vez mais presente na produção artística a partir do século XIX, com os artistas
românticos, com forte presença na Alemanha, voltados para a expressão subjetiva
do artista.
No século XX, também na Alemanha, surgiu um movimento artístico e cultural
de vanguarda, chamado Expressionismo, presente em todas as linguagens artísticas,
arquitetura, literatura, música, cinema, artes visuais, dança, teatro e fotografia. Nas
artes visuais, principalmente na pintura, esse movimento teve forte influência do
fovismo francês e teve como princípio uma reação ao positivismo associado aos
movimentos impressionismo e naturalismo.
Será com o Expressionismo que a subjetividade do artista será foco de interesse
poético, no qual a arte seria uma expressão pessoal e intuitiva, revelando a visão
interior do artista, ou seja, não mais a “impressão” visual do mundo, mas uma
“expressão” individual, interna.
Dessa forma, o artista expressionista não se prende mais à aparência das coisas,
mas as deforma, com o intuito de expressar de forma subjetiva a natureza e o ser
humano, expressando seus sentimentos em relação à realidade, e não mais uma
descrição objetiva da mesma.
Investigue mais sobre os artistas do Expressionismo e veja como cada um explorou os ideais
Explor
deste movimento de acordo com sua forma de ver, interpretar e sentir o mundo em que está
inserido. Entre os artistas, citamos: Franz Mark, Ernst Ludwig Kirchner, Vincent Van Gogh,
Egon Schiele, Marc Chagall e Cândido Portinari.
26
distorções da forma, de gestualidades no uso do pincel ou de outros materiais
plásticos. Essas questões foram iniciadas no Expressionismo, influenciaram, e
influenciam até hoje, a produção artística.
Sendo a morte um dos temas marcantes do Expressionismo, sugerimos que você conheça
Explor
alguns exemplos de obras que tratam de um tema muito denso e triste, a perda da mãe.
No texto Modernismo e Vanguarda: o caso Flávio de Carvalho, Rui Moreira Leite analisa a
produção europeia e a sua influência na produção artística brasileira, especificamente na de
Flávio de Carvalho, cuja série Trágica (1947) retrata a própria mãe do artista em seu leito de
morte (Texto disponível em: https://goo.gl/lfCgmo
27
27
UNIDADE O Desenho Expressivo
“Eu não pinto modelos, pinto emoções” (apud MORAIS, 1986, p. 161).
Todas estas frases revelam um artista que se desdobra sobre suas próprias
memórias e emoções para se expressar por meio da arte. Suas obras resgatam
experiências de vida, histórias da sua infância, de morte e dos amores.
28
Figura 27 – Iberê Camargo, La madre y sus hijas, 1984.
Fonte: itaucultural.org.br
29
29
UNIDADE O Desenho Expressivo
Iberê também teve a miséria humana como uma constância em suas obras nas
quais, por meio de tons escuros e muitas camadas espessas de tinta, o artista criava
personagens sombrios e tristes que revelavam os aspectos negativos da condição
humana.
Tanto Iberê quanto Picasso são artistas que nos permitem pensar sobre outro
lado da produção artística, seja ela em qual linguagem for realizada. Mais que
representar o mundo como ele é, ou até distanciando-se dele em obras totalmente
abstratas, há ainda um entremeio que se refere ao lado interno do artista, um ser
pensante, um ser que sente e que quer expressar esses sentimentos na arte. Ou
seja, a arte não está preocupada somente com a aparência das coisas, mas com a
essência e como que as coisas do mundo podem representar sentimentos internos,
por meio das simbologias que o homem atribuiu aos objetos ao longo da história e
que até hoje continua a atribuir ou ressignificá-los.
Esta frase nos permite estabelecer questões que podem instigar exercícios de
criação em desenho que expressem emoções pessoais atuais, mas também com
base em nossas memórias.
30
Não se trata de um desenho de memória, de desenhar sem ter um objeto de
referência à nossa frente, mas de utilizarmos nossas memórias para estimular nossa
percepção de um mundo atual.
Quais os sentimentos que tenho diante das situações do meu cotidiano? Que
coisas eu gostaria de dizer ou até mesmo gritar e não tenho coragem? Quais as
sensações que despertam em mim referente a questões políticas, afetivas, sociais
ou pessoais, que eu gostaria de expressar em desenho? Como eu classifico essas
emoções e sentimentos: positivos, negativos, neutros, tristes, alegres, raivosos? E,
por fim, quais materiais expressariam melhor esses sentimentos: carvão, lápis de
cor, giz pastel seco ou oleoso, caneta, nanquim ou grafite?
Tal como vimos nos retratos que Flávio de Carvalho fez de sua mãe, o artista
escolhe o carvão, um material frágil e suave, que permanece pouco sobre o papel
e que num sopro pode praticamente sumir da superfície, para representar um mo-
mento frágil, de perda, como uma representação da brevidade e fragilidade da vida.
Não entraremos nessas questões, pois nosso foco se trata de apresentar alguns
aspectos da produção gráfica da criança por meio do desenho em seus aspectos de
liberdade, os quais foram de grande interesse dos artistas.
31
31
UNIDADE O Desenho Expressivo
Segundo Mèredieu:
Primeiro, de 1880 a 1900, descobre-se a originalidade da infância,
depois a influência das ideias de Rousseau em Pedagogia leva a distinguir
diferentes etapas no desenvolvimento gráfico da criança. Em seguida,
o desenho é introduzido no tratamento psicanalítico: em 1926, Sophie
Morgenstern trata desse modo um caso de mutismo numa criança de 9
anos. Paralelamente, prosseguem estudos sobre o “sentido estético” da
criança; estabelecem-se comparações entre o estilo infantil e os quadros
dos mestres, submetem-se as produções infantis aos cânones da beleza;
consagram-se estudos à escolha da cor e ao repertório gráfico da criança
(...) (MÈREDIEU, 2006, p.2).
O autor ainda cita várias outras vertentes científicas que estudou o desenho
infantil e ressalta que Piaget contribuiu muito, com sua psicologia infantil, para
compreendermos os mecanismos de expressão gráfica, gestual e musical infantil.
Esses conceitos são adquiridos durante a vida, em relação com os mais velhos,
com os adultos. “Nunca será demais repetir: o meio em que a criança se desenvolve
é o universo adulto, e esse universo age sobre ela da mesma maneira que todo o
contexto social, condicionando-a ou alienando-a” (MÈRIDIEU, 2006, p.3).
Pablo Picasso e Paul Klee são dois artistas que, no século XX, rejeitaram o
museu, o ensino e a produção tradicional da arte, buscando, de um ponto zero da
criação, recomeçar toda a produção artística desde as bases primitivas, um “estágio
primitivo”, um “espírito branco” (MÈRIDIEU, 2006).
Essa tentativa de apagar toda a cultura repetitiva das mesmas formas e dos
cânones também se deu por um desejo de regressão, também direcionado ao
desenho infantil, visto que este é feito pela criança que desenha pela primeira vez.
32
O desenho é uma das primeiras expressões
da criança. Para além dos cinco sentidos, a
criança se comunica e se expressa com os ins-
trumentos e materiais que o adulto lhe forne-
ce, sendo que os mais comuns são o papel e
o lápis, as canetas hidrográficas e o lápis de
cor ou de cera.
33
33
UNIDADE O Desenho Expressivo
Por mais que possamos conceber o desenho infantil como sendo um desenho
livre, há muitos momentos em que o adulto conduz a criança para uma representação
gráfica codificada em elementos e formas simples como o círculo, o quadrado, o
triângulo, as imagens da abóboda, do funil, os signos em Vetc.
Estes são elementos que, nas mais variadas combinações, geram diversas figuras
do vocabulário infantil e que, muitas vezes, permanecem conosco por toda a vida,
gerando um repertório visual que se repete. No entanto, a criança naturalmente
busca formas novas, criando uma profusão de desenhos que fogem dos esquemas
reduzidos criados pelos adultos.
34
Aos poucos, a criança aprende a usar elementos gráficos universais para se
comunicar com o adulto, num processo de socialização. E paralela à evolução
psicomotora da criança, é elaborado o seu sistema gráfico, ou seja, trata-se de
um processo progressivo e evolutivo de acordo com o desenvolvimento das suas
experiências, sentimentos, crescimento, os quais atuam sobre a evolução dos signos
da linguagem plástica (MÉREDIEU, 2006).
Estes aspectos do desenho infantil são revelados pela forma como a criança
explora os materiais que tem acesso, e sim, pode possuir limites motores que
resultem em linhas não muito definidas, em formas distorcidas e desproporcionais.
Mas um bom desenho é definido por precisão, virtuosismo e proporção exata?
35
35
UNIDADE O Desenho Expressivo
Nesta Unidade, estudamos Arte Figurativa e Abstrata e o Desenho Infantil. No seu texto
Explor
36
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Gaveta dos Guardados
CAMARGO, Iberê. Gaveta dos guardados. São Paulo: Edusp, 1998.
No Andar do Tempo: 9 Contos e um Esboço Autobiográfico
CAMARGO, Iberê. No andar do tempo: 9 contos e um esboço autobiográfico. Porto
Alegre: L&PM, 1988.
O Desenho da Figura Humana
DERDYK, Edith. O desenho da figura humana. São Paulo: Scipione, 1990.
Desenhando com o Lado Direito do Cérebro
EDWARDS, Betty. Desenhando com o lado direito do cérebro. Rio de Janeiro:
Ediouro, 2000.
O Desenho Infantil
MÈREDIEU, Florence de. O desenho infantil. São Paulo: Cultrix, 2006.
Abstração Informal
MORAIS, Frederico. Abstração informal. In: DA COLEÇÃO: os caminhos da arte
brasileira. São Paulo: Júlio Bogoricin, 1986. p.161.
Fundamentos do Desenho Artístico
ROIG, Gabriel Martín. Fundamentos do Desenho Artístico. Barcelona: Parramón, 2007.
Manual Prático do Artista
SMITH, R. Manual Prático do Artista. Porto: Civilização, 2006.
Iberê Camargo, Desassossego do Mundo
VENÂNCIO FILHO, Paulo. Iberê Camargo, Desassossego do Mundo. Brasília:
Pactual, 2001.
A Imaginação e a Arte na Infância
VYGOTSKY, Lev. A imaginação e a arte na infância. Lisboa: Relógio D’água,
1990.
Leitura
Iberê Camargo: Matéria da Memória / Instituto Arte na Escola
EGAS, OLGA. Iberê Camargo: matéria da memória / Instituto Arte na Escola. In:
MARTINS, Mirian Celeste; PICOSQUE, Gisa (coords.). São Paulo: Instituto Arte na
Escola, 2006.
https://goo.gl/gDJD1s
37
37
UNIDADE O Desenho Expressivo
Arte Abstracta
GOODING, Mel. Arte Abstracta. Lisboa: Presença, 2002;
Arte infantil: Do Pré-Simbolismo ao Abstracionismo
IAVELBERG, R.; TRINDADE, R. G. Arte infantil: do Pré-Simbolismo ao Abstracionismo.
In: ARS (São Paulo) vol.7 n.14, São Paulo, 2009.
https://goo.gl/mFNbhq
Modernismo e Vanguarda: O Caso Flávio de Carvalho
LEITE, Rui Moreira. Modernismo e Vanguarda: o caso Flávio de Carvalho. On-line.
https://goo.gl/5Fcx2j
Entrevista com Iberê Camargo
REIS, Paulo. Entrevista com Iberê Camargo. In: ARS (São Paulo) vol.1 no.2 . São
Paulo, Dec. 2003.
https://goo.gl/VsWPkP
38
Referências
DERDYK, E. Disegno. Desenho. Desígnio. São Paulo: SENAC, 2008.
39
39