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O Brasil é hoje o quarto maior emissor de gases de efeito estufa no mundo. Nos
dois primeiros, China e Estados Unidos, o principal emissor é a queima de combustíveis
fósseis, já na Indonésia e no Brasil, o desmatamento e as queimadas respondem
primordialmente pelo aumento e concentração de carbono na atmosfera, afetando o
clima no planeta.
Cientistas calculam que o desmatamento e queimadas na Amazônia resultem em
torno de 75% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa, como ozônio (O3),
metano (CH4), dióxido de nitrogênio (NO2), dióxido de carbono (CO2), monóxido de
carbono (CO) e óxido nitroso (N2O). No total, segundo Carlos Nobre, do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, no Brasil, desmatamento e queimadas
respondem pela emissão de 200 a 300 milhões de toneladas/ano, contra menos de 100
milhões de toneladas/ano resultantes da queima de combustíveis fósseis.
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Amazônia I aquecimento global I setembro 2007 especial caros amigos
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Invasões bárbaras
Até a década de 1970, apesar da muito antiga ocupação dessas florestas, menos de
4% da cobertura florestal da Amazônia era modificada. Além da imemorial presença de
centenas de povos indígenas, a Amazônia há muito é habitada por populações
extrativistas, como seringueiros, pescadores, castanheiros etc. Nessa época, talvez por
profunda ignorância, talvez por não considerar como humana essa população, a ditadura
militar propagou a idéia da Amazônia como um vazio demográfico, um deserto humano,
e deu início aos programas estatais para a “ocupação” da Amazônia. Foi também quando
vieram as grandes obras. Como conta o jornalista Lúcio Flávio Pinto, dizia-se na época
que quando a rodovia Transamazônica estivesse terminada, poderia ser, como a muralha
da China, vista da Lua. “A diferença é que a muralha da China foi construída para defesa
contra os bárbaros e a Transamazônica foi a estrada dos bárbaros”.
Logo em seguida aos projetos de colonização, o governo empenhou uma grande
campanha de atração do grande capital para a Amazônia. E nesse momento se pôde
entender a verdadeira intenção dessa colonização: abastecer de mão-de-obra a região
para viabilizar a instalação de grandes grupos econômicos.
As florestas habitadas e usadas como fonte de vida de inúmeras populações
originárias foram entregues à empresas do centro-sul do país que, após expropriar seus
legítimos ocupantes, deu à terra um uso diferente do que havia até então. A floresta
passou a ser concebida não como fonte, mas como obstáculo. As matas com castanhais
do Sul do Pará, por exemplo, que abrigavam uma população de coletores de castanha-
do-pará, tornam-se pastos de empresários do centro-sul do país, generosamente
financiados pela Sudam. O mesmo começou a acontecer nos seringais do Acre quando o
movimento de resistência pela proteção das florestas e pelo reconhecimento direito dos
seringueiros à terra freou a derrubada dos seringais. Ou ainda com os tantos povos que
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Desenvolvimento e fetichismo
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Desenvolvimento sustentável
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se seu povo. Aliás, é procedimento bastante comum não só no Brasil, como em todo o
terceiro mundo.
Muitas e diversas organizações levantaram-se contra os dizeres do presidente,
porém, a grande maioria das manifestações não escaparam do conceito hegemônico de
desenvolvimento. Queixavam-se do que fora chamado de “entrave”, e pleiteavam um
“desenvolvimento sustentável”. O desenvolvimento sustentável, então, põe-se acima de
qualquer discussão, um consenso mudo a servir de ponto de partida para se pensar
qualquer ação, inclusive, as que tangem a preservação ambiental. Desenvolvimento
sustentável é, antes de tudo, desenvolvimento, no sentido clássico de industrialização e
concentração de riquezas, e mesmo as mais sinceras preocupações com o meio, acabam,
submetendo os critérios ambientais à lógica de, como nos casos do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (MDL), onde se pretende criar um mercado de CO2, ou os
Mecanismos de Certificação Florestal (MCF), onde supostamente se garantiria a
consumidores “conscientes” a origem sustentável da madeira.
O verniz de “desenvolvimento sustentável” legitima e revigora uma premissa
que perdura desde a colônia. A Amazônia é concebida em um olhar que reduz toda a
floresta a “recursos”, matéria-prima para abastecer as necessidades do colonizador.
Minérios, carne, grãos, madeira, energia (principalmente na forma de alumínio) e outros
recursos para suprir o Primeiro Mundo são as principais causas da imensa devastação. E
basta olhar as ações previstas pelo PAC para a Amazônia para ver o norte escolhido.
A ilegalidade da degradação é flagrante e tão evidente quanto irrelevante frente
ao argumento do desenvolvimento que trazem. Os desmatamentos para pecuária são
sempre criminosos, sem as devidas licenças, mesmo porque a grande maioria está em
terras públicas griladas. O mesmo acontece com a madeira extraída ou com a soja
plantada na Amazônia. Nesse particular, é exemplar o caso do grande porto da
multinacional Cargill, construído à revelia da lei, às margens da foz do rio Tapajós, em
Santarém. O empreendimento não cumpriu uma das etapas básicas do processo de
licenciamento: a elaboração do Estudo de Impactos Ambientais (EIA). Vários grupos
populares de Santarém não aceitam o desrespeito legal da Cargill e, menos ainda, a
conversão das suas florestas em campos de soja incentivados pela Cargill. Também o
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Ministério Público Federal, há anos, empenha uma acirrada batalha jurídica contra a
empresa. Segundo o Procurador da República, Felipe Fritz Braga, a decisão dos
desembargadores no, até então, último julgamento envolvendo a questão mostra “uma
situação contraditória, pois, por um lado declara a obrigatoriedade de se realizarem os
Estudos de Impactos Ambientais para que se emita a licença de operação, mas por outro
permite a operação sem que haja licença. Enquanto isso, os danos ambientais causados
pelo porto proliferam”.
O preço do progresso
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bem ao gosto do Presidente, isso significa que entre o segundo semestre do ano
passado e o primeiro semestre de 2007, desmatou-se a área equivalente a um campo
de futebol a cada 17 segundos na Amazônia. E durante os doze meses do período,
uma porção de floresta quase do tamanho do Líbano foi posta a baixo.
O motivo da comemoração deve-se também ao fato de ser o terceiro ano
consecutivo de queda nos índices de desmatamento na Amazônia, o que foi atribuído
pelo governo aos seus supostos sucessos na política de controle ambiental. Sem
dúvida, a intensificação de ações do Ibama no período influíram na mudança de uma
tendência crescente de destruição das florestas, porém, foram ignorados todos os
fatores conjunturais que desmotivaram alguns tradicionais agentes causadores do
desmatamento, como a pecuária e o agronegócio. Os baixos preços da carne bovina e
da soja, e os interditos à comercialização de carne de muitas regiões da Amazônia
em virtude da contaminação pela febre aftosa desencorajaram a expansão dessas
atividades. Um quadro que não se repetirá no próximo período e ao qual se somará a
euforia especulativa em torno dos agrocombustíveis.
É importante saber, portanto, que a queda do desmatamento não se deve, na
grande maioria dos casos, a ações de controle e de um Estado que se faz presente.
No caso do eixo da BR-163, no sudoeste do Pará, por exemplo, uma das regiões com
os maiores índices de desmatamento nos anos anteriores, a sensível queda se
relaciona diretamente à criação de 6,4 milhões de hectares de unidades de
conservação na região. Não que essas reservas tenham sido implantadas, muito ao
contrário, limitaram-se à decretação, não saíram do papel. Sua função no controle do
desmatamento se deve ao estreito laço entre o desmatamento e a grilagem de terras.
Acredita-se que mais de 80% das terras na Amazônia sejam públicas, nem o
Incra sabe ao certo. Esse caos fundiário abriga, na Amazônia, uma verdadeira guerra
por terra e, apesar da imensidão de terras públicas, não se encontra um só palmo que
não esteja sendo disputado por meio da violência e poder político. Grandes grupos
econômicos se dizem donos de gigantescas porções de florestas, expulsam índios,
populações tradicionais, camponeses e também grileiros menores. Nesse processo de
apropriação, os grileiros desmatam, queimam e criam gado para demonstrar a “posse
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financiada nos países do terceiro mundo. O hilário é que isso ainda vem como
“impulso para o desenvolvimento”.
A degradação não se limita aos milhares de hectares de florestas alagadas, à
barreiras biogeográficas erigidas e mais um sem fim de impactos diretos. Mas
estende-se às populações indígenas e ribeirinhos que vivem a montante e que
resistem bravamente à imposição da barragem. O enfraquecimento dessas
populações talvez seja o maior impacto ambiental das grandes obras, pois
efetivamente eles são o verdadeiro obstáculo à destruição da floresta.
Das unidades de conservação que têm sua criação retida na Casa Civil, várias
cumprem a vital missão de reconhecer o direito à terra aos seus ocupantes originais,
como a Reserva Extrativista (Resex) Médio Xingu, que beneficiaria a floresta e a
população tradicional que dela vive. A não criação da Resex beneficia diretamente a CR
Almeida, que tenta se apoderar de mais de 7 milhões de ha e, para isso, tenta expulsar a
gente que lá vive há anos.
É também o caso da Resex Montanha-Mangabal, onde mais de uma centena de
famílias resiste a mais de 140 anos, enfrentando as mais violentas pressões de grileiros
para expulsá-los da terra. Essa área é o último remanescente de população tradicional do
alto curso do rio Tapajós e, não por coincidência, é um dos últimos remanescentes de
mata nativa às margens desse trecho do rio. Em todos os demais trechos onde a
população local foi expulsa, a floresta foi derrubada.
Seja na Médio Xingu, seja em Montanha-Mangabal, aquela gente resistiu a
intimidações e violência de grileiros, madeireiros e pistoleiros. Resta saber se resistirão
ao posicionamento do governo federal em negar-lhes o reconhecimento do direito ao
território que ocupam.
Além de socialmente insana, essa postura é ambientalmente perniciosa. Bem se
sabe como é inocente crer na eficácia de ações de fiscalização para deter a degradação
ambiental na Amazônia. Os vários movimentos que brotam nas florestas de todos os
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A população indígena talvez seja atingida de forma ainda mais violenta. Para o
antropólogo e professor da Universidade Federal do Acre, Jacó Piccoli, o Estado não
tem a menor condição de controlar a exploração de florestas próximas às Terras
Indígenas e, “se hoje existe retirada ilegal de madeira do interior de Terras Indígenas,
agenciadas por grandes madeireiras, mas executada por pequenas, de modo sutil e com
o aliciamento de lideranças indígenas, imaginemos quando a exploração de madeira em
grande escala for autorizada nas proximidades das Terras Indígenas”.
Outro ponto que preocupa Piccoli é a ameaça de que a concessão de florestas
para extração madeireira sobreponha-se a áreas de ocupação indígena ainda sem seus
territórios reconhecidos, “só no Acre, há pelo menos 7 Terras Indígenas a serem
definidas contando-se apenas os povos já integrados”. Além disso, há vastas áreas
ocupadas por povos indígenas isolados e não contactados. Segundo o antropólogo
“só na fronteira Brasil-Peru, sabe-se da existência de, no mínimo, 6 povos nessa
situação, também sem seus territórios reconhecidos”. A concessão de florestas
públicas, nesse caso, representa uma grande ameaça a essas populações, “haverá
muita proximidade, quando não, sobreposição, entre as terras ocupadas por índios
isolados e as atividades das madeireiras. Isso provocará contágio endêmico de
conseqüências imprevisíveis. Populações inteiras poderão, da noite para o dia, ser
completamente dizimadas. O que no fundo acabaria indo ao encontro dos interesses
empresariais: um território livre da presença de seus ocupantes e aberto à exploração
econômica indiscriminada”, explica Piccoli.
O reconhecimento do direito à terra dos povos da floresta já mostraram muito
claramente sua eficiência em deter o desmatamento e a degradação ambiental. Ainda
assim, processos de criação de Reservas Extrativistas ou de homologação de Terras
Indígenas são retidos na Casa Civil, enquanto a concessão dos territórios dessa gente
às madeireiras corre livre.
Tanto socialmente, como ambientalmente, a formalização da situação da terra
em favor de seus legítimos ocupantes seria uma completa obviedade. Porém, hoje como
nos anos 70, como disse o presidente, esses são entraves ao desenvolvimento. E ele tem
razão. A ideologia do desenvolvimento pressupõe incorporar a floresta, como matéria-
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prima, à economia de mercado. Se esses recursos já estão em uso por pessoas que daí
tiram sua sobrevivência e reproduzem seu modo de vida com suficiente tecnologia para
permitir que a floresta se renove, isso impede a apropriação pelo mercado desses
recursos e, portanto, obstaculiza o desenvolvimento. Mas se o desenvolvimento chega,
expulsando os inconvenientes ou, como sugerem as novas propostas do
desenvolvimento sustentável, transformando-os e reduzindo-os a pequenos madeireiros,
criam-se novas formas de pobreza social e degradação ambiental. Mas isso também é
visto como desenvolvimento.
Mais do que nunca, todo o mundo se volta ao maior desmatamento do planeta e
atenta à importância da Amazônia como um regulador climático global. De maneira
nova, se pensam em novas tecnologias que tornem a vida nos centros urbanos menos
impactante e que demandem uma menor devastação da Amazônia. Porém, mantém-se,
como sempre, a visão da Amazônia como um banco de recursos a ser predatoriamente
explorado e uma veemente recusa em reconhecer a vital função dos povos que habitam
as matas da Amazônia em deter sua devastação.
A maior causa de desmatamento é o não reconhecimento do direito à terra dos
povos da floresta.
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