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434 TAPAJÓS / MADEIRA POVOS INDÍGENAS NO BRASIL 2011/2016 - INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL POVOS INDÍGENAS NO BRASIL 2011/2016 - INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL TAPAJÓS / MADEIRA 435
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MOVIMENTO IPEREĞ AYU
© LETÍCIA LEITE/ISA, 2013
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© ANTÔNIO CRUZ /ABr, 2013
Pik, Pusuru kao, Waremucu Pak Pak, Surup Surup e Wakobur¤. como uma forma de intimidação para viabilizar a implantação Após inúmeras reuniões e pressões do Governo Federal
Como o mito, o MMIA se organiza em cinco grupos, cada qual do Complexo Hidrelétrico do Tapajós. A truculenta e inesperada para que uma comitiva de poucos Munduruku partisse
associado ao nome de um dos guerreiros de Karodaybi, sendo invasão da aldeia Teles Pires teve como principal saldo 19 indí- para uma reunião em Brasília, a proposta do número
um deles (Wakobur¤) formado por mulheres guerreiras. Em genas feridos e o assassinato da uma liderança, Adenilson Kirixi restrito foi rejeitada pelo MMIA, apontando que só acei-
cada um deles há um pajé na linha de frente, que “conserva o Munduruku. Em 2013, a consequência direta foi um expressivo tariam a reunião com todos os 150 manifestantes e dois
sagrado forte”, para acompanhar o grupo. Sua importância vai aumento da tensão entre os Munduruku e as tropas que escolta- cachorros. E assim foi aceita a condição pelo Governo,
da proteção espiritual que invoca aos guerreiros, ao uso de suas vam os autores da dita pesquisa, quando estas cercavam por dias que enviou dois aviões da Força Aérea Brasileira (FAB)
duas visões, que permitem ver para além do plano material. seguidos as aldeias e comunidades beiradeiras, efetuando atos para transportar todos os manifestantes. Uma vez em
Os pajés são capazes de compreender para além, conseguem de violência, intimidação e forte pressão psicológica1. Brasília, o então ministro Gilberto Carvalho, entretanto,
prever o que está por vir e o que pode lhes afetar. E, por apontar limitou-se a dizer que o Governo não abriria mão dos
Esses ocorridos e o posicionamento do Governo Federal em não
caminhos, são consultados nos diversos momentos e contextos projetos de barramento no Rio Tapajós e, quanto à
dialogar – embora estivesse sempre disposto a um simulacro
do movimento. CLPI, afirmou que, embora a consulta prévia tivesse
de comunicação, por meio da Secretaria Geral da Presidência
que ser ampla e devesse acolher sugestões, não haveria
As ações do MMIA são, também, momentos de reprodução ritu- da República (SGPR) – concorreram para que os Munduruku, Munduruku protestam em pista de pouso em Brasília contra a construção de hidrelétricas
qualquer direito de veto. Assim, os representantes do no Tapajós, Xingu e afluentes.
alística. Canções são evocadas em ações de vigilância e disputa, em 2013, acirrassem seus ímpetos de resistência. No cerne de
MMIA decidiram retornar para o seu território na bacia
como nas ocupações dos canteiros de obras da UHE Belo Monte suas reivindicações estava o direito de serem consultados nos
do Tapajós e empreender outras formas de defesa. captura dos pesquisadores, representantes da Funai de Brasília
(ver adiante). Os/As “cantores(as) munduruku” são importantes termos da Consulta Livre Prévia e Informada (CLPI), pactuada
No final de junho, no retorno de Brasília, mais uma vez o MMIA (falando também em nome da SGPR) estavam em Jacareacanga,
membros integrantes do MMIA, já que conhecem e bem entoam pela Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário. Ou seja,
se deparou com denúncias de pesquisadores empenhados com prometendo, em praça pública, a imediata suspensão dos estu-
os cantos rituais munduruku, que têm o poder de enfraquecer lutavam para que o próprio Governo Federal cumprisse a lei.
o licenciamento do CHT em território munduruku. Já não era a dos e garantindo que sua continuidade estaria condicionada a
o inimigo, entre muitas outras coisas.
Estrategicamente, o MMIA entendeu que conseguiria maior re- primeira vez: ao menos desde agosto de 2012, havia denúncias realização da CLPI. Mediante essas condições, os pesquisadores
percussão política se ocupasse o canteiro de obras de Belo Monte. sobre pesquisas realizadas pelas empresas envolvidas com o li- foram soltos. Porém, confirmando a precariedade da palavra do
TRAVESSIAS DE (R)EXISTÊNCIAS Parada a maior obra de engenharia do Programa de Aceleração Governo Federal empenhada com o MMIA, menos de um mês
cenciamento ambiental do CHT. A fim de apurarem as denúncias,
Em uma das ações do MMIA, quando pararam o canteiro de do Crescimento (PAC) em andamento, certamente, o Governo não o grupo realizou uma expedição e encontrou 25 pesquisadores depois, o Ibama ratificou a autorização de pesquisa à Concremat,
obras de Belo Monte, os Munduruku ouviram de um cacique do poderia ignorá-los. Maio e junho de 2013 foram dois meses em contratados pela empresa Concremat para a realização dos estu- garantindo assim continuidade arbitrária dos estudos. A Concremat,
povo Arara – que havia vivido a trágica experiência do “licencia- que os Munduruku, em analogia com suas expedições ancestrais, dos demandados para o licenciamento da hidrelétrica de Jatobá, então, retornou ao Tapajós tendo, de um lado, pesquisadores que
mento cosmético” de Belo Monte – que, se quisessem impedir percorreram mais de 900 quilômetros de distância até o Rio também planejada para a região. se submetem a esse tipo de trabalho e, de outro, um aparato de
a construção das hidrelétricas no Tapajós, teriam que evitar a Xingu. Fizeram duas ocupações no canteiro de obras da UHE Belo guerra para constranger ou mesmo impedir à força a mobilização
O Governo alegava que tais pesquisadores estavam fora da TI
conclusão dos estudos. Os Munduruku o ouviram e decidiram Monte; a primeira de 2 a 9 de maio, e a segunda de 27 de maio a dos Munduruku. Daí em diante, todos os trabalhos de pesquisa
Munduruku formalmente demarcada. Por outro lado, o MMIA
resistir a todas as pesquisas efetivadas sem qualquer processo 4 de junho. A entrada para ocupação dos canteiros foi pacífica e foram realizados sob escolta da FN, que acompanhou cada um dos
dizia que os estudos eram realizados em todo o curso do Tapajós,
de consulta, como entendiam ter direito. contou com cerca de 170 pessoas das etnias Munduruku, Juruna, pesquisadores todo o tempo. Como fruto da resistência mundu-
que integra o território munduruku. Chocavam-se, assim, concep-
Kayapó, Xipaya, Kuruaya e Arara, além de pescadores e ribeiri- ruku, tivemos, pela primeira vez na história do Brasil, estudos de
Em meio a esse conturbado processo de realização dos estudos ções distintas do que seriam as terras e o território munduruku.
nhos. Durante as duas ocupações manteve-se a mesma pauta, impacto ambiental conduzidos sob escolta armada.
para o licenciamento ambiental, em março de 2013, o Governo Enquanto o governo sustentava que o território seria equivalente
clara e anunciada por cartas e pronunciamentos, demonstrando
Federal editou o Decreto 7.957, que formalizou a participação da à terra estipulada por atos normativos, os Munduruku entendiam Com o arquivamento do processo de licenciamento do barra-
que não estavam lá para negociar com os construtores de Belo
Força Nacional de Segurança Pública (FN) na escolta aos pesqui- como seu território a porção tradicionalmente ocupada por eles mento planejado em São Luiz do Tapajós, o projeto de aprovei-
Monte e, menos ainda, para apresentar uma lista de pedidos a
sadores, a fim de garantir a realização dos estudos exigidos. No e seus ancestrais. E, de fato, conforme o item 2 do artigo 13 da tamento hidrelétrico de Jatobá será o próximo a ser protocolado
serem atendidos, conforme destacaram em uma carta pública
mesmo mês, foi iniciada a Operação Tapajós e enormes contin- Convenção 169 da OIT, a alegação do movimento encontra base pelo Governo Federal para a região. Será a próxima ameaça ao
divulgada em 3 de maio de 2013:
gentes da FN, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, legal, pois o conceito de terra toma por referência o conceito de povo Munduruku, mas também, certamente, a próxima pauta
com forte aparato militar aéreo e terrestre, deslocaram-se ao Nós estamos aqui para dialogar com o governo. Para território, que “abrange a totalidade do habitat das regiões que os de resistência. (outubro, 2016)
Médio e Alto Rio Tapajós para escoltar os técnicos que iriam protestar contra a construção de grandes projetos que im- povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma”.
realizar os estudos de viabilidade do Complexo Hidrelétrico do pactam definitivamente nossas vidas. Para exigir que seja Nesse sentido, o local onde os pesquisadores foram encontrados NOTAS
Tapajós (CHT); uma verdadeira operação de guerra. regulamentada a lei que vai garantir e realizar a consulta era território munduruku, por ser em frente à pedra do Cantagalo, 1
Para mais, leia M. TORRES. 2014. “De seringais, gateiros e garimpos: o Alto
prévia – ou seja, antes de estudos e construções! Por fim, onde há pinturas rupestres que são fundamentais à sua cosmologia. Tapajós e suas gentes”. In: Sousa Jr., Wilson Cabral de (org.). Tapajós: hidrelétri-
É importante lembrar que, em novembro de 2012, na TI Kayabi, cas, infraestrutura e caos: elementos para a governança da sustentabilidade
e mais importante, ocupamos o canteiro para exigir que em uma região singular. São José dos Campos: ITA/CTA.
Rio Teles Pires, o Governo Federal já havia deflagrado a polêmica Então, os Munduruku abordaram a equipe de pesquisa, con-
seja realizada a consulta prévia sobre a construção de
e trágica Operação Eldorado, anunciada como um esforço de com- fiscaram seus materiais e detiveram três pesquisadores, de 2
Esta carta e outros materiais podem ser acessados em: <https://ocupacao-
empreendimentos em nossas terras, rios e florestas2. belomonte.wordpress.com>.
bate à garimpagem irregular, que foi entendido pelos Munduruku forma a garantir a atenção do Governo Federal. Dois dias após a
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