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Resultado parcial de pesquisa para dissertação (mestrado PPGIDH UFG, 2020) (XAVIER, Gyzele Cristina.
Do Corpo Extendido ao Julgamento: assassinato de mulheres em Goiânia, 2016. UFG, Goiânia-GO, 2021).
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Doutoranda e Mestra em Direitos Humanos (PPGIDH/UFG); Perita Criminal da SPTCGO.
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Como, por exemplo, algumas sociedades primitivas estudadas pela antropóloga Margareth Mead (1901-
1978) em sua obra Sexo e Temperamento (MEAD, 2000).
ordens. Exemplos de dominação tradicional são a monarquia, o Estado Feudal, a
autoridade conferida às divindades, a autoridade sacerdotal e a dominação patriarcal,
sendo que esta última é o tipo mais puro e comum do estabelecimento da autoridade cuja
dominação tem caráter tradicional.
Na concepção weberiana, a associação doméstica é uma célula a partir da qual
as relações tradicionais de domínio são reproduzidas. Na dominação patriarcal, a
autoridade é conferida ao pai, ao chefe da família ou do clã. A fidelidade patriarcal está
intrínseca na educação tanto formal quanto cotidiana, nas relações das crianças com o
chefe da família, e reflete-se nas outras esferas, como na relação chefe-funcionário. O
patriarca seria o correspondente do senhor patrimonial.
No âmbito de cada tipo de dominação, existem níveis de transição, dentre os
quais há um grau maior ou menor de voluntariedade na aceitação. Em muitos casos, o
indivíduo se vê diante de opções (ou ausência delas) que o obrigam a se submeter ao
poder, não por vontade, mas por ausência de alternativas ou condições de exercer suas
escolhas. Podemos contemporizar com Zizek (2010), que levanta a questão da
pseudoescolha, sendo este o lugar em que aparentemente dá-se ao indivíduo a liberdade
de escolher o que lhe aprouver, entretanto, a este mesmo indivíduo é dada apenas uma
quantidade restrita de informações, com as opções quase sempre acarretando situações de
desigualdade. Assim, a dominação, apesar de estar aparentemente revestida de
legitimidade, pode tratar-se de contingenciamento e direcionamento do consentimento e
da liberdade, beneficiando determinada classe, de modo que esta ascenda, detenha e/ou
mantenha o seu poder de domínio em detrimento dos dominados.
Nas palavras de Marx, “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem
como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim, sob aquelas com que
se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado” (MARX, 2003, p. 7), daí
o surgimento da alienação da consciência em decorrência da massificação ideológica,
conquistada pelo dominador por meio das superestruturas (cultura, educação, religião),
às quais os dominados estão submetidos. Tanto a obra gramsciniana quanto a
bourdieusiana trabalham a noção dicotômica entre liberdade e necessidade suscitada por
Marx; e, ao pensarem a dominação social através da cultura, expandem o conceito
marxista de ideologia para os conceitos de hegemonia e violência simbólica,
respectivamente, por meio das quais os autores analisam a questão da dominação social,
pensada não apenas enquanto construção de conflito social, mas também como estrutura
socioeconômica, ampliando para a dimensão simbólica e cultural.
Para Gramsci, hegemonia é um tipo particular de dominação consentida, de
modo que as estruturas de poder e autoridade são aceitas como naturais e legítimas,
havendo uma subordinação/sujeição do dominado em relação ao dominador. Neste
processo, a construção da consciência do dominado é baseada nos interesses e
conveniências do dominador. Uma classe impõe ao resto da sociedade um sistema de
significados próprios acerca de como é e como se deve estar no mundo. Impõe-lhe que é
correto uma determinada cosmovisão do mundo, como, por exemplo, a dominação
patriarcal. Isso acontece por meio de uma hegemonia cultural, educando os dominados
para que concebam a forma de ver o mundo construída pela classe dominante como algo
naturalizado (ALVES, A., 2010; ASSUNÇÃO, 2016; GRAMSCI, 2000).
A violência simbólica é essa violência que extorque submissões que não são
sequer percebidas como tais, apoiando-se em ‘‘expectativas coletivas’’,
crenças socialmente inculcadas. Como a teoria da magia, a teoria da violência
simbólica assenta numa teoria da crença, ou melhor, numa teoria da produção
da crença, do trabalho de socialização necessário para produzir agentes dotados
dos esquemas de percepção e de apreciação que lhes permitirão perceber as
injunções inscritas numa situação ou num discurso e obedecer-lhes. A crença
de que falo não é uma crença explícita, posta explicitamente como tal
relativamente à possibilidade de uma não-crença, mas uma adesão imediata,
uma submissão tóxica às injunções do mundo, obtida quando as estruturas
materiais daquele a quem a injunção se dirige concordam com as estruturas
implicadas na injunção que lhe é dirigida. (BOURDIEU, 1997 apud
ASSUNÇÃO, 2016, p. 168).
MEAD, Margaret. Sexo e temperamento. 4. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000.