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Terapia

Analítico-
Comportamental
em Grupo

Maly Delitti e Priscila Derdyk


organizadoras

E S E T ec
2008
Copyright © desta edição:
ESETec Editores Associados, Santo A ndré, 2008.
Todos os direito s reservados

Delítti, M.

Terapia Analítico-Comportamental em Grupo. Maiy Oelitti e Priscila Derdyk.


Organizadoras 1a ed. Santo André, SP: ESETec Editores Associados, 2008.

264p. 23cm
1. Psicologia Comportamental
2. Análise do Comportamento
3. Terapia Analítico Comportamental em GTtipo

CDD 155.2
CDU 159.9.019.4

Solicitação de exem plares: com ercial@ uol.com .br

Tel. (11) 4990 56 83 (editorial) / 4438 68 66 (vendas)


w w w .esetec.com .br
I

Aquele que não vê, mas sabe que não vê, de


alguma forma vê...

Aquele que vê e acha que o todo que vê é


tudo o que há, não vê...

Aquele que vê, e sabe que tudo o que vê não é


tudo o que há,

... de alguma maneira, vê o


que não vê.

Bonder, N. (2008)
Sumário

A presentação................................................................................... 9

P refácio................................................. .............................. ....... 11

Terapia comportamental de grupo


Rachel Rodrigues Kerbauy...............................................................17

Terapia Analítico Comportamental em Grupo


Maly Delitti.....................................................................................31

Esquiva experiencial do clientb no grupo terapêutico e promo­


ção de aceitação emocional
Maria Zilah da Silva Brandão............................................................59

O trabalho em grupo para ansiedade de desempenho


Caroline Guisantes Salvo, Gabriela Mello Sabbag, Taísa Borges Grün,
Yara Kuperstein Ingberman..............................................................93

O uso da psicoterapia analítico funcional (FAP) em grupos


terapêuticos
Fátima Cristina de Souza Conte..................................................... 127

Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC): as propriedades


terapêuticas dos grupos de apoio
Regina Christina Wielenska........................................................... 157

7
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Fobia social, família e terapia em grupo: uma experiência


esperançosa
Silvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia................................. 173

A terapia analítico-comportamental em um grupo especial: a


terapia de famílias
Roberto Alves Banaco................................................. ................193

ATerapia Comportamental Infantil em Grupo


Jaíde Regra e Miriam Marinotti................................................... 213

Tornando-se um terapeuta de grupos


Priscila R. Derdyk e Silvia Sztamfater........................................... 249
Apresentação

A organização deste livro foi muito importante para nós.


Temos trabalhado com Terapia Analítica Comportamental em Grupo
desde 1984, na universidade, na^clínica particular e em hospitais.
Gostamos muito do que fazemos e de contar como fazemos. Já
aprendemos muito, continuamos a aprender e acreditamos que já
ensinamos também. Este livro foi planejado para descrever a forma
como entendemos e praticamos o atendimento em grupo segundo
os princípios da Análise do Comportamento. Partilham conosco
deste desafio alguns dos terapeutas que consideramos os melhores,
do ponto vista teórico e prático. Eles são, também, alguns dos nossos
amigos mais queridos. Assim, este é um produto do estudo, do
trabalho e de longas conversas em diferentes momentos e locais.
Apresentamos, inicialmente, um texto ainda inédito da
professora Rachel R.Kerbauy.Este texto, que tivemos o privilégio
de conhecer desde 1980, exerceu importante influencia sobre o
nosso trabalho e de outros profissionais da comunidade.
No capítulo 1, estão descritas as características mais
relevantes para a prática em grupo e alguns dos principais
procedimentos terapêuticos utilizados nos grupos que temos

9
Terapia Analrtteo-Compoftamental em Grupo

atendido. No capítulo 2, são feitas reflexões, questionamentos e


estudos de casos sobre a esquiva experiencial na Terapia de Grupo
e são descritas experiências terapêuticas em que os princípios da
ACT foram usados em grupos com formato tradicional. Em seguida,
no capítulo 3, são descritas diversas atividades planejadas e
organizadas em dez sessões de atendimento psicológico grupai
para o enfrentamento da ansiedade de desempenho acadêmico. A
força curativa do grupo, segundo a proposta da FAP, é apresentada
no capítulo 4, sendo enfatizado que os comportamentos dos
membros do grupo podem desenvolver funções evocadoras,
eliciadoras e reforçadoras reciprocamente. No quinto capítulo, são
abordadas as propriedades terapêuticas dos grupos de apoio para
portadores de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) com ênfase
nos grupos de apoio na ASTOC. O capítulo 6 analisa a fobia social,
descrevendo um estudo realizado com pacientes portadores de fobia
social e seus familiares em uma instituição de saúde. No capítulo 7,
um grupo especial, a família, é analisado e estratégias terapêuticas
são propostas. Finalmente, no oitavo e último capítulo, são sugeridas
reflexões para o profissional que queira se aprimorar nesta área.
Queremos agradecer à Teca, nossa editora e parceira.
Um agradecimento especial aos nossos clientes, que partilhando
conosco suas vidas, enriquecem a nossa, dando sentido ao nosso j
trabalho.
Esperamos que os leitores aproveitem.

Maly Delitti
e
Priscila Derdyk
Inverno 2008

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Prefácio

Um livro sobre terapia comportamental de grupo traz


certamente diferenças marcadas pela prática clinica dos autores.
No entanto, mostra a explosão de uma idéia e a maneira de trabalhar.
Partindo de princípios estabelecido^ em laboratório, em cinqüenta
anos do século passado, foi possível expandir esse conhecimento
para uma tecnologia e aplicação em humanos. As variáveis das
quais o comportamento é função mostraram que as causas do
comportamento eram externas e que a genética e a história pessoal
explicavam o desempenho num determinado momento. As
inferências para explicar o mundo privado de uma pessoa são
questionáveis. A própria pessoa não conhece bem seu mundo
privado e por isso temos tantas abordagens na psicologia.
Em um contexto com várias linhas teóricas tentando
explicar de maneira diversa a vida mental e trabalhando com essas
explicações, surgiu um conjunto de pessoas pressupondo que o
conhecimento dos princípios com portamentais perm itiria a
formulação de hipóteses clinicas para a adaptação da pessoa. De
fato, a pessoa pode se modificar identificando as variáveis
ambientais das quais o comportamento é função.
Terapia AnalHico-Comportarnental em Grupo

Nesse contexto, proceder-se a terapia de grupo fazia


sentido, pois era possível, com os princípios de aprendizagem,
explicar comportamentos na situação natural. O grupo propiciava
uma situação de aprendizagem melhor que a terapia individual para
adquirir comportamentos, através da imitação, reforçamento social
dos participantes, incluindo-se o próprio terapeuta, uma vez que as
situações sociais ocorrem naturalmente durante o tratamento. Além
disso, vivenciar as conseqüências do comportamento emitido em
uma situação de aceitação permite inúmeras tentativas de solução
de problemas, pois através da interação no grupo eles se tornam
mais claros.
Os terapeutas comportamentais costumam especificar
problemas e objetivos concretamente. Medem, também, as
mudanças decorrentes tanto de comportamentos problemáticos
como dos desejáveis, e empregam os princípios de aprendizagem
para facilitar mudanças relevantes. Geralmente, as técnicas
comportamentais são ensinadas independentemente da dinâmica
do grupo, mas de acordo com a análise do desenvolvimento dos
problemas apresentados. A situação terapêutica também controla o
desenrolar das mudanças, e não se recomenda seguir apenas um
programa pré-estabelecido. Há alguns terapeutas que preferem um
programa estruturado para aumentar o efeito das técnicas
comportamentais empregadas e desencorajam a manifestação
espontânea dos participantes. Geralmente, centram-se em uma
seqüência operacional e trabalham com problemas definidos: uma
doença especifica com pessoas no mesmo estágio, problemas de
separação de casais, e assim por diante. Há outros grupos, que se
denominam de apoio,voltados a problemas específicos e os
profissionais que os coordenam não se consideram como terapeutas
atuando stricto sensu.
Quem já participou de um grupo aberto,que precisa definir o
problema, pode ter ouvido frases, como as que ouvi como participante:
“Estou sofrendo, me ajudem”. Outra pessoa levantou-se do seu lugar
e foi segurar a mão de quem falara. Duas horas depois, o grupo ainda
não havia escolhido com o que trabalhar. Levantei-me e saí. Eu era
conhecida como comportamental... E portanto, teria gostado de analisar
os comportamentos que estavam sendo reforçados pelo grupo e a
dificuldade de escolher um objetivo nessa situação.Mas considerei que,

12
Rachel Rodrigues Kerbauy

se falasse, provocaria animosidades e prejudicaria a linha teórica que


escolhi, pelas bisbilhotices posteriores.
Na literatura comportamental há relatos de experimentos
segundo os quais quando o terapeuta reforça a expressão de
sentimentos e solidariedade entre os membros de um grupo: os
sintomas melhoram, em comparação com uma abordagem mais
intuitiva e não planejada. Essa questão está em aberto para
investigação e há opiniões divergentes.
Quando o papel causal do ambiente é compreendido, e
clínicos e pesquisadores dedicam-se a trabalhar com essa idéia, é
inevitável o desenvolvimento de estudos sobre os temas diversos e
variações na condução do grupo. Embora nem sempre os resultados
sejam divulgados, os participantes do grupo e terapeutas observam
as conseqüências daquilo que realizaram e dos comportamentos
aprendidos, e as dificuldades existentes na evolução da terapia ou
de outro grupo com enfoque diverso.
Os estudos deste livro mostram isso. Nem sempre os
leitores encontrarão relatos de pesquisa, mas sim maneiras de
trabalhar com os princípios de análise do comportamento.
Encontrarão também resultados obtidos nos grumos e questões a
serem investigadas em outros grupos, e talvez em estudos
controlados com protocolos bem definidos.
Os leitores identificarão, ainda, exemplos de comportamentos
e maneiras de agir, mantidas e eliminadas pelas variáveis do grupo que
libera as conseqüências momentâneas e positivamente reforçadoras
ou punitivas. É o reforçamento natural acontecendo, bem como
generalizações e manutenção do aprendido e o estabelecimento de
estímulos discriminativos para novos comportamentos.
O ponto mais importante é que, após quarenta e seis anos
de análise do comportamento no Brasil e trinta e seis de trabalho de
grupo, podemos ver que há profissionais conduzindo grupos grandes
e pequenos, sobre vários temas, e sendo positivamente reforçados.
Observamos, também, ter sido produzido um livro com esse amplo
conhecimento acumulado.

Rachel Rodrigues Kerbauy

13
Existem textos que se tornam
alicerces sobre os quais o trabalho de muitos
profissionais é desenvolvido.
O artigo apresentado a seguir, datado de
1980, é um desses textos.
Terapia comportamental
de grupo
Rachel Rodrigues Kerbauy*
Artigo originalmente aceito para publicação na Revista
Psicologia e Psicoterapia 2,1980, quando a autora ocupava a
posição de Professor assistente-doutor do mesmo
departamento. A Revista encerrou atividades sem que ocorresse
a publicação. Desde então, o artigo foi utilizado em diferentes
cursos, e cópias foram cedidas a interessados, todos cientes
da publicação. Decidiu-se, na época, não encaminhar o artigo
para outra publicação. A autora agradece a publicação tardia,
sem atualização, a Maly Delliti.

A ênfase da literatura no estudo dd caso único (Skinner,


1961) pode ser a responsável por essa situação, bem como a pouca
idade da terapia comportamental, que se iniciou na década de
cinqüenta. Realmente, os terapeutas concentraram seus esforços
no aprimoramento de técnicas e busca de procedimentos adequados
a casos individuais.
No entanto, a literatura dos últimos 15 anos, a partir de
1965, apresenta alguns trabalhos com grupos, procurando analisar
parte das variáveis envolvidas (Liberman, 1971; Goldstein, 1971;
Lazarus, 1971; Kass, Silvers e Abroms, 1973). Na revisão anual da
terapia comportamental, Franks e Wilson (1973) comentaram a
sessão de terapia de grupo, estabelecendo como importante a
distinção entre terapia comportamental em grupo e de grupo,
endossando uma idéia de Goldstein. Realmente, essa distinção
parece nortear o trabalho dos terapeutas comportamentais, levando-
os muito mais na direção de, em certo sentido, delegar parte da
autoridade terapêutica aos participantes. Os membros do grupo

P ro fe s s o ra T itu la r d o D e p a rta m e n to d e P s ic o lo g ia E x p e rim e n ta l d o In s titu to de P s ico lo g ia


d a USP.

17
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

participam no sentido de sugerir ou mesmo “cobrar1’ a definição dos


objetivos dos indivíduos.e do grupo, facilitar situações de treino,
auxiliar o trabalho, quer modelando comportamento, sugerindo
procedimentos adequados a instalação ou manutenção de
comportamentos, bem como reforçando o processo de tomada de
decisão pelos membros do grupo.
O presente trabalho não se propõe a analisar a literatura
existente sobre terapia comportamentaí em ou de grupos, mas
apresentar uma maneira de trabalhar com grupos, em situação
clínica. No entanto, uma formula pronta não é oferecida. A leitura do
texto não conduzirá a uma aplicação imediata, mas deverá gerar
duvidas e privar o leitor de mais informações, motivando a busca de
novos conhecimentos.
Realmente, poderíamos pensar que o trabalho com gru­
pos, seria justificado em função das tão citadas economia de tem­
po e esforço por parte do terapeuta, bem como no barateamento da
terapia para o cliente. No entanto, sobrepondo-se a essas justifica­
tivas, existe uma procura de transformar a terapia.num a^yaçfio
mais próxima ao amhjeolg natural, facilitando a aprendizagem de
comportamentos exigidos em situações de interação e uma busca
de maior generalização dos que foi aprendido. Essa generalização
é facilitada pela exposição a uma ampla variedade de opiniões, va­
lores e modelos de outros comportamentos, bem como pela opor­
tunidade de solucionar problemas de uma maneira mais realista, à
medida que se observam pessoas com problemas semelhantes ou
mesmo diferentes.

1. O cliente
Uma primeira pergunta: qual é o cliente para terapia de
grupo? Em princípio são todas as pessoas com problemas de
relacionamento, que tenham medo de pessoas ou grupos, bem
como aquelas pessoas que se disponham a trocar opiniões sobre
seus valores, atitudes e comportamentos, a realmente expor-se a
uma crítica construtiva. Segundo Lazarus (1973), aquelas pessoas
extremamente tímidas e hipersensíveis, os depressivos, os hostis
ou paranóicos parece que não se beneficiam muito do trabalho de

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Rachel Rodrigues Kerbauy

grupo. No entanto, os tímidos e aqueles que apresentam problemas


as hipersensibilidade podem fazer um período de terapia individual
e posteriormente beneficiar-se dos trabalhos em grupo. A menos
que exista uma evidência séria do dano que o grupo causaria, a
maioria das pessoas beneficia-se com o trabalho de grupo, uma
vez que os problemas de comportamento ocorrem em ambientes
naturais e são freqüentemente interpessoais. Sendo assim o grupo
é o local ideal para o diagnóstico e o desenvolvimento de
comportamentos mais adequados.

2. Decisões do terapeuta
Algumas decisões precisam ser tomadas pelo terapeuta
ao iniciar um grupo. A primeira delas e coriogmente ao local. Todas
as condições sociais e físicas devem ser bem estabelecidas. O
grupo não precisa necessariamente ter o consultório como local de
funcionamento. No entanto, a sala deve estar arrumada e esperando
o grupo, sem dar a impressão de improvisação ou ser sujeita a
interrupções. Os mesmos cuidados dedicados ao atendimento
individual devem existir neste caso.
Outra característica ainda preparatória, mas igualmente
necessária, seria o planejamento da seleção dos possíveis
membros do grupo. Quando se trata de grupo terapêutico, o próprio
terapeuta pode encontrar os membros entre seus clientes ou então
receber encaminhamentos por colegas ou profissionais de áreas
afins. Contudo, grupos também podem ser preventivos. Por
exemplo, visando desenvolver habilidades em mães de primeiro filho,
treinamento de pais quanto à maneira de lidar com seus filhos ou
ainda auxiliar pessoas próximas aposentadoria a planejar sua vida
para as mudanças que ocorrerão, entre outras possibilidades.
Nesses casos, o planejamento de como recrutar interessados é
mais problemático, uma vez que nenhuma urgência ou desconforto
as “obriga” a iniciar esse trabalho.
Juntamente com esse planejamento, antes de iniciar-se o
grupo, o objetivo do mesmo deve ser estabelecido pelo terapeuta.
Essa decisão implica na análise da composição do grupo. É possí­
vel maximizar a heterogeneidade do grupo quanto à variação em

19
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

idade, sexo, nível socioeconômico e problemas ou técnicas, ou


homogeneizar quanto a algumas dessas características. Na reali­
dade, em situação terapêutica, a homogeneidade quanto ao objeti­
vo pode ser encontrada, e o trabalhp_com problemas de comporta­
mento em comum tende a ser bastante produtivo. Este é o caso de
controle do comportamento alimentar (Kerbauy,1972), comportamen­
to assertivo (Lazarus,1968; Galassi, 1974). É possível o emprego
da mesma técnica para todo um grupo, afetado pelo mesmo pro­
blema, como a dessensibilização para tratamento da ansiedade ao
falar em público (Meichenbaum, Gilmore e Fedoravicious, 1971). O
grupo heterogêneo quanto à maior parte de suas características é
defendido por Johnson (1975), por possibilitar uma variedade de
experiências culturais e potencialidade para desempenho de papéis,
é também realizado com crianças por Gittelman (1965). Embora
Lazarus (1971) deixe claro que o grupo deva ser formado tendo
como base a avaliação comportamental de seus membros, escla­
rece que quando os membros do grupo são muito diferentes entre
si quanto à inteligência e nível social, é difícil ou impossível para eles
identificarem-se uns com os outros ou comunicarem-se de manei­
ra significativa.
Concluindo, diríamos que trabalhar com um grupo homo-
gêneo ou heterogêneo é da escoiha excltiSivaxlQ terapeuta, e das
condições de. que dispõe. Entretanto, nossa opinião é de que um
grupo heterogêneo apresenta a vantagem de enriquecer o treino
comportamental e a discussão sobre valores ou atitudes, enquanto
que o grupo homogêneo exige do terapeuta um repertório terapêutico
mais elaborado, considerando o problema específico do grupo.
JK recomendação quanto ao tamanho, do^rupo.varia entro
os autores. Elis (1977) propõe de 10 a 13 membros. Lazarus, em
1971 , propõe de 15 a 20. Cinco anos após, Lazarus menciona entre
dez e 12, e Johnson (1975), sugere entre sete e oito membros. Dar
início a um grupo de adultos de até dez membros permite desistên­
cias, é um número razoável, pois facilita a. participação individual e
mantém as características de grupo, embora consideremos mais
confortável contar com oito participantes. No caso de crianças, esse
número precisa ser menor, de cinco a oito membros aproximada­
mente.

20
Rachel Rodrigues Kerbauy

A .duração do grupo pode variar de acordo com a


homogeneidade ou héterogeneidade do mesmo e com os objetivos
propostos individualmente e pelo grupo. Geralmente tem uma
duração combinada de 3 a 6 meses, freqüentemente com uma
sessão semanal com duração entre 90 minutos e duas horas. Dessa
maneira, o grupo se configura como um trabalho transitório, uma
maneira de ajuda.
Além desses cuidados iniciais já citados, que propiciam o
bom funcionamento do grupo, é preciso considerar a seleção de
seus membros. Cabe ao terapeuta fazer uma ou duas entrevistm-
jniciais.(às vezes mais), para conhecer os p r o b le ^
determinar sè a terapíá é adequada, e qual o grupo que se adapta à
pessoa em questão. O terapeuta deve poder operacionalizar os
problemas de cliente em alguns objetivos que, mesmo não sendo
comunicados ao cliente, capacitam o profissional a fazer uma
programação razoável sobre o grupo. O cliente deve ficar informado
sobre como se desenvolve um trabalho de grupo e ter clareza de
seus próprios objetivos ao entrar no grupo, embora alguns deles
possam ser alterados no decorrer dos trabalhas.
Até aqui analisamos quase que somente as características
gerais que antecedem o trabalho com o grupo. A etapa seguinte
seria descrever como se processa o trabalho, do estágio inicial até
o fim, ou seja, como são conduzidas as sessões.

3. Condução de um grupo
As sessões iniciais, especialmente a primeira, necessi­
tam de um terapeuta treinado e tranquilo, que conduza o grupo a
um estado de confiança e cooperação. Isso geralmente é conse­
guido através das palavras iniciais do terapeuta sobre a conveniên­
cia de deixar claras as regras que conduzirão todos os trabalhos.
Pode iniciar falando do_sigilo eda.necessidad£-de.não se comentar
com terceiros fatos ocorridos no grupo, a fim de aumentar a proba­
bilidade das pessoas expressarem realmente aquilo que sentem,
além daquilo que fazem, e enfatizar como isso permitirá um clima
de confiança entre os membros. Pode-se continuar a estabelecer
as regras do grupo através da discussão quanto a horário, atraso,

21
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

freqüência das sessões, quantidade de verbalização dos membros


e discussões. ÈTconveniente que se discuta a maneira pela qual as
. críticas.podern ser-feitas e mesmo, se do interesse do grupo, ana­
lisar a crítica construtiva, a necessidade de justificar quando uma
crítica não é bem compreendida, como também os problemas de
suscetibilidade exagerada. Convém que o grupo se posicione sobre
esses assuntos. A atitude do terapeuta é mais no sentido de propici­
ar o aparecimento de sugestões, formulando perguntas de esclare- 1
cimento, reforçando liberalmente todas as sugestões dos membros
em direção a coesão e cooperação entre os membros envolvidos.
Qsobjetiv.QS-de.cada um.dQSjnemb.ro$ devem, ser formu­
lados, possivelmente na primeira sessão. Nas sessões seguintes,
a descrição dos objetivos deve ser orientada em direção à maior
precisão evitando-se termos vagos. São ferramentas úteis pergun­
tas iniciados por palavras como “quando, como, com que freqüên­
cia, onde” e assim por diante, da mesma maneira que se conduz
uma entrevista individual. Nas demais sessões, esses objetivos
poderão ser ainda mais esclarecidos, se já não o foram, através de
uma observação mais acurada dos acontecimentos da semana.
Convém que o terapeuta não “assuste" os membros do grupo pro­
pondo um registro detalhado e por escrito ou discutindo tarefas.
Freqüentemente acontece que algum dos membros anota seus
dados e outros membros começam a fazê-lo ou, posteriormente, o
próprio grupo ou o terapeuta dá ênfase à necessidade de mais da­
dos sistematicamente coletados.
C.^be...ao terapeuta iniciar o emprego, de alg.umas técnicas
muito utilizadas em grupo, como o caso de treino comportamental
7 ', e ou troca de papeis, para deixar claros os problemas e objetivos
,t 1 dos membros do grupo. Convém ainda que ele inicie a modeiação
de alguns comportamentos, sendo sempre direto ao dirigir-se aos
/ membros do grupo, e evitando enfocar só um problema ou só um
\ indivíduo.
À medida que todos os objetivos individuais estão definidos
e também se estabeleceu algum objetivo para o grupo, está na hora
de iniciar-se uma etapa intermediária. Ela consiste em gerar
alternativas para os problemas apresentados, selecionando-se
técnicas de tratamento individual ou algumas que se apliquem a

22
Rachel Rodrigues Kerbauy

mais de uma pessoa. Aqui, novamente, o terapeuta não é exatamente


o conselheiro, mas sim aquele que dispõe de um repertório técnico
e experiência de aprendizagem, e que, portanto, informará e
explicará as técnicas necessárias para as situações que apareçam.
As discussões que ocorrem e as soluções apresentadas devem
ser reforçadas pelo terapeuta, pois um dos comportamentos
importantes, que deverá ser instalado em qualquer terapia, é o de
estar centrado no problema, emitindo comportamentos em direção
a soluções possíveis.
Nesta etapa ainda, terapeuta e membros do grupo devem
estar preocupados em se informar sobre os progressos dos
membros do grupo, cobrando dados e analisando registros. Os
clientes progredirão em ritmo diferente: alguns evoluem muito
rapidamente, outros apresentam pouco ou mesmo nenhum
resultado. Nesses casos, o grupo todo terá oportunidade de se
fam iliarizar com os procedimentos para estabelecimento de
auto co ntro le e a técnica de aproxim ações sucessivas ao
desempenho final, possivelmente já erpprégadas, inicialmente, na
determinação de alguns programas, facilitando o desempenho
através de planejamentos ambientais ou controles instrucionais, e
mesmo por meio da modelação em situação natural, se for o caso.
Membros do grupa poderão atuar fora da sessão, se assim for
combinado, modelando e reforçando, por exemplo, comportamentos
sociais em festas ou reuniões, para uma pessoa que apresenta
esse problem a. Em todas essas sessões, o auto-relato é
empregado, levando a pessoa cada vez mais a uma explorar
aspectos de seu comportamento, bem como especificar o que as
outras pessoas realmente fazem em relação a ele, fora da terapia,
o que evitaria exigências irreais no caso de queixas constantes.
Essa fase d o jra ^ h J K lfi. 9 rupoé_a. mais rica, poispropjçia
o.empregcTde_álgumas técnicas como o treino comportamerital; a
m odelação; a aprendizagem de discrim inações, inclusive
discriminações finas da percepção do outro, de quais componentes
se destacam naquele contexto; reforçamento social; a utilização
sistem ática de co-terapeutas, inclusive de sexos ou idades
diferentes, muito úteis no caso de trabalho de um terapeuta mais
velho lidando com adolescentes, por exemplo etc.

23
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Portanto, um maior tempo de funcionamento do grupo é


dedicado à instalação e manutenção de alguns comportamentos e
da “descoberta” de que freqüentemente os comportamentos são
mantidos pelas suas conseqüências, de que é possível discutir e
alterar pensamentos, de quais problemas tem soluções. Os
princípios ou ações aprendidas passam a ser, pouco a pouco,
aplicadas no grupo. Mesmo fatos dramáticos, que estão acontecendo
ou polarizando as atenções de todos, podem ser vividos ou
executados na situação de grupo, aparentemente “prejudicando” um
pouco o andamento esperado da sessão, mas trazendo, quase
sempre, resultados excelentes.
Na maior parte das sessões, além de um resumo do
ocorrido na sessão anterior, é também planejado o que deverá ocorrer
na próxima. Episódios eventuais podem alterar essa situação,
retornando-se posteriormente à situação anterior. Os problemas
principais enfrentados na condução de grupos são as agressões
muito violentas, ou pessoas sensíveis que muitas vezes choram
durante a sessão. No caso do chorar, esse comportamento passa
a ser analisado pelo grupo com orientação segura do terapeuta, e a
manipulação que o comportamento pode envolver é dessa maneira
trabalhada. Quanto à forma de criticar, todo o cuidado deve ser
desenvolvido desde o primeiro dia de funcionamento do grupo,
procurando-se maneiras de realizar um trabalho construtivo, seja
alterando a forma, explicando melhor a crítica não aceita ou, ainda,
analisando a sensibilidade de quem a recebeu.
Em um grupo comportamental não se espera uma análise
de processos inconscientes, e o grupo é conduzido a uma
explicação mais parcimoniosa, a análise funcional, com. a
investigação do onde e quando determinado comportamento
ocorreu, e quais suas conseqüências. Busca-se, ainda, uma
exploração .dos .pensamentos ou sentimentos que surgem nessas
ocasiões, permitindo um trabalho bastante satisfatório para o
paciente e terapeuta.
Como a tendência atual é mais no sentido de trabalhar
em terapia dej^rupo e não em grupo,, todos os membros sen/em
comolãtõFde mudança e se analisa o que acontece dentro e fora
do grupo, com soluções e discussões em que todos os elementos

24
Rachel Rodrigues Kerbauy

participam. A riqueza de conteúdo é enorme, faltando pesquisas para


avalizar cada uma dessas fases e mostrar em detalhes as diferenças
que ocorrem em cada etapa do processo. Por isso, a maior parte
do trabalho está ainda sob o controle do terapeuta, de seu repertório
técnico e conteúdo humano.
Johnson (1975) dá ênfase aopapelda supervisão para os
terapeutas iniciantes, especialmente nas sessões preparatórias.
Nessas sessões, há fornecimento de “feeçlbsck”, manutenção da
discussão do grupo, aprendizagem de como dar dicas e saber
desviar os assuntos para pontos relevantes. Achamos que o grupo
deve ser conduzido por terapeuta com experiência e seu co-terapeuta
poderá ser um iniciante em treinamento. Em qualquer caso, de
preferência imediatamente após o término de cada sessão, o trabalho
deve ser avaliado pelos terapeutas, quç analisarão o desempenho
do grupo. Anotarão o quanto participaram as pessoas, quais os tipos
de problemas trazidos, as soluções apontadas e seus proponentes,
que membros são mais colaboradores, fazem mais piadas,
oferecem mais informações, promovem sentimentos positivos ou
negativos, mostram tensão ou antagonismo, pedem orientação ou
sugestões etc. Esse trabalho de avaliação é rápido, pode ser
transformado em uma tabela com comportamentos (na ordenada)
e nome dos membros (na abscissa), o que facilitará inclusive a
avaliação do desenvolvimento de cada participante no decorrer do
grupo. O co-terapeuta pode fazer essa análise ao mesmo tempo
que o terapeuta, mas separadamente, para que divergências possam
ser discutidas, bem como preparadas as dicas ou técnicas para as
próximas sessões. Um trabalho mais sistemático nesse sentido
conduzirá a pesquisas futuras, uma vez que, a despeito de suas
peculiaridades, cada grupo deve apresentar um desenvolvimento
comum.
Finalmente, mas não de menor importância, o terapeuta
deve ser capaz de dar dicas claras e reforçar a habilidade do
participante do grupo de ãbstrãír informações relevantes, mesmo
que ele não esteja sendo o toco de atenção. Como há muitos modelos
de relacionamento interpessoal, satisfatório ou não, é possível tornar
a sessão proveitosa à medida que se aprende a extrair dicas do que
acontece com os outros e das análises que vão sendo feitas.

25
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

No final do tempo determinado para o trabalho de grupo,


inicia-se e prepara-se seu término. Durante todo o trabalho, os mem­
bros do.grupo relataram seus progressos e/ou dificuldades. Nas
ultimas sessões, os dados existentes são comparados, de modo a
avaliar os objetivos individuais e gerais. Muitas vezes, o fato de exis­
tir o prazo especificado leva as pessoas a trabalharem arduamente
nesse final ou a apresentarem explicações, aceitas ou não, sobre
suas dificuldades
Cabe, ainda aqui, o planejamento da manutenção dos re­
sultados obtidos ou, mesmo, as sugestões de iniciar a modificação
de algum outro comportamento. Alguns membros combinam tele­
fonemas ou encontros para facilitar esse processo. Corno todo o
trabalho foi centrado na execução de tarefas específicas fora da
terapia, essa transferência é muitas vezes facilitada.
O terapeuta pode aproveitar as duas sessões finais para
uma análise ..d£_gua conduta como Jídei do grupo, e para colher im­
pressões dos clientes sobre a eficácia do grupo. Isto é, de certa ma­
neira, uma avaliação das modificações reais ocorridas com muitos
dos membros devidos às. críticas construtivas que apresentam.

4. Os grupos com crianças


O trabalho de grupo com crianças é pouco abordado na
literatura, embora Gittelman (1965) apresente uma proposta de tra­
balho com treino com portam ental. Neste artigo, propõe a
apre-sentação das situações nas quais os membros têm dificulda­
de, obedecendo a uma hierarquia desde as que provocam menores
reações ate as mais difíceis. À medida que a criança atua e tolera
bem essas situações, inicialmente aversivas, as outras serão apre­
sentadas e assim por diante. Gittelman trabalhou com crianças
agressivas, em sua maioria. Em determiandas situações, apresen­
tava a elas feedbacks negativos para as agressões abertas e res­
postas emocionais, neutros para respostas passivas e positivos para
respostas verbais.
Segundo Oliveira Lima (1980) o trabalho em grupos com
crianças precisa ser muito dinâmico e com materiais variados
disponíveis, desde marcenaria e argila, até de culinária e artes, sendo

26
Rachel Rodrigues Kerbauy

que a presença de alguém que funcione como modelo para


desempenho da tarefa e sirva de monitor é recurso muito eficaz e
produtivo. Realmente, é muito difícil, e talvez ineficiente, desenvolver
um trabalho puramente verbal com crianças até 11 ou 12 anos. É
importante um treino em concentração na atividade, organização
de trabalho, convivência cooperativa e amistosa, trabalho produtivo
com um material e conclusão das tarefas iniciadas.
Segundo Oaklander (1978), uma gestaltista que descreve
de maneira fascinante seu trabalho, “o processo de grupo é o aspecto
mais valioso de trabalho grupai com as crianças. A forma como
elas se experienciam mutuamente, e como reagem e se relacionam
umas com as outras na terapia de grupo, é algo que revela
abertamente as suas relações interpessoais de modo geral” (p. 318).
O terapeuta, trabalhando com a criança no grupo, propicia uma
experiência efetiva de compor tratamentos novos, além de a criança
perceber que as outras têm sentimentos ou problemas semelhantes.
As sessões de grupo com crianças ou adultos, em terapia
comportamental, são estruturadas, planejando-se os materiais,
atividades e jogos. No entanto, é preciso atuar com flexibilidade se
uma das crianças ou o grupo traz um problema de interesse pessoal
ou coletivo, que envolva a participação do grupo ou que precise ser
trabalhado individualmente, para que as atividades sejam alteradas
de acordo com o exigido pelo contexto. A avaliação diária do terapeuta
a respeito de seu trabalho mostrará seus acertos ou enganos no
processo de tomada de decisão, e servirá c o m o uma aprendizagem
a ambos, clientes e terapeuta.

5. Conclusão
Concluindo, diríamos que o trabalho de grupo é gratificante,
os resultados excelentes para a maioria dos participantes, pois,
embora nem sempre mudanças dramáticas ocorram, resta um
saldo positivo de participação em um grupo de discussão bastante
verdadeira e livre e, geralmente, é uma maneira de enfrentar
problemas de um modo mais realista.
Há, ainda, a colocar, um problema de posição pes-soal em
Psicologia. Em um país como o nosso, com problemas de nutrição,

27
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

desinformação em várias áreas, educação etc., formar psicólogos


em cursos dispendiosos para atuarem como clínicos para camadas
sociais que possam arcar com o ônus econômico desse trabalho
parece não satisfazer. A busca de uma maneira de trabalhar mais
adequada aos nossos problemas pode ser, em parte, satisfeita com
o trabalho de grupos, Os resultados são suficientemente bons para
que se aprimorem técnicas e se o material levantado foi sistematica­
mente analisado é possível começar a propor uma metodologia de
trabalho eficiente e facilitar o treino de novos profissionais.

Referências
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28
Rachel Rodrigues Kerbauy

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Skinner, B.F. (1961) Cumulative Record. New York: Appleton-Century-Crofts.

29
Capítulo 1
Terapia Analítico
Comportamental em
Grupo
Maly Delitti*1

1. Introdução

Nos últimos anos, a eficácia da Análise Aplicada do Com­


portamento na intervenção e mudança de muitos problemas huma­
nos vem sendo cada vez mais reconhecida. Nessa abordagem,
considera-se que o ambiente tem um papel fundamental na mode­
lagem e manutenção de padrões de comportamento. O comporta­
mento, qualquer que seja ele, tem uma função e é através da análi­
se das contingências de aquisição e/ou de controle dos mesmos
comportamentos que se quer poder chegar a mudanças. De acor­
do com Skinner (1974) se o indivíduo se tornar consciente das con­
tingências que controlam seu comportamento será mais eficaz em
controlar a sua vida. Analisar e modificar contingências é o objetivo
da aplicação clínica da análise do comportamento que tem sido

1 M a ly D elitti - D o u to ra e m P s ic o io g ia - P ro fe s s o ra d o D e p a rta m e n to d e M é to d o s e T é c n ic a s
da F a c u ld a d e de P s ic o lo g ia d a P o n tifíc ia U n iv e rs id a d e C a tó lic a P U C -S P . S u p e rv is o ra do
A m b u la tó rio d e A n s ie d a d e - IPq - HC - FM U S P , C o o rd e n a d o ra e T e ra p e u ta d o C e A C -
C e n tro de A n á lis e d o C o m p o rta m e n to , S ã o P a u lo , e -m a il: m a ly d e l@ u o l.c o m .b r

* F a c u ld a d e d e P s ic o lo g ia d a P o n tifíc ia U n iv e rs id a d e C a tó lic a PUC SP.

33
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

chamada Terapia Comportamental. Ferster (1979) afirma que a te­


rapia é um tipo de interação social que envolve o controle recíproco
do comportamento dos indivíduos envolvidos, e o “primeiro aspecto
a ser estudado consiste em saber como terapeuta e cliente alteram
o comportamento um do outro, no contexto da sessão de terapia” .
Esse autor ressalta que outro aspecto importante consiste em in­
vestigar se e como os comportamentos verbais que são emitidos
como resultado da terapia podem alterar os comportamentos emiti­
dos em situação natural. Ferster (1979) afirma, ainda, que a terapia
possibilita que o ciiente íale de seus eventos internos e “à medida
que o terapeuta torna-se um ouvinte há a possibilidade do cliente
observar os determinantes de seus comportamentos e de quais
variáveis são função”.
De acordo com Zettie (1990), as regras (ou crenças),
descrições verbais de contingências que o cliente faz na situação
terapêutica, podem vir a controlar seu comportamento. Quando o
indivíduo aprende a seguir suas próprias descrições verbais das
contingências nas quais está inserido, fica sob controle mais
adequado da correspondência dizer-fazer, e, então, emite
comportamentos mais adequados, pois ele poderá reagir eficazmente
quando o controle por contingências estiver enfraquecido. O cliente
que, a pedido ou sob controle de verbalizações do terapeuta, faz
descrições verbais de contingências que atuam sobre seus
comportamentos em situação natural, pode reagir mais eficazmente
quando estes controles não estiverem atuando. Para que isto ocorra,
o terapeuta deve planejar contingências que fortaleçam a
correspondência entre dizer, isto é, “ relatar” ou “descrever"
comportamentos na sessão, fazer, ou “emitir” outras categorias de
comportamento em seu ambiente natural, e voltar a dizer, ou seja,
“relatar” novamente para o terapeuta, o qual por sua vez deve
investigar se esta correspondência existe. Como na situação de
terapia em grupo os clientes fazem parte das contingências o
terapeuta deverá estar muito atento para que esta correspondência
ocorra evitando possíveis respostas de esquiva ou de agressividade
entre os clientes.

T: Olá pessoa! como foi a semana de vocês?

34
Maly Delltti

D (mulher, 58 anos): Eu pensei muito no que a gente conversou


aqui, sobre eu colocar limites para o meu filho e...
S (homem, 54 anos): (interrompendo D. e falando alto) Já sei, já
sei, mais uma vez você ficou só pensando e não fez nada e,
como sempre, depois ficou p... com você mesmo.
D: Não, dessa vez foi diferente, mas não quero falar mais nada...
Fale você V. (virando para outra cliente), como fo i sua
semana?
T: Espere um pouquinho D. Quero saber o que foi diferente dessa
vez. Parece-me que você ia falar sobre algo... quando S. a
interrompeu e eu estou interessada em ouvir você.

Neste trecho de sessão observa-se que quando D.


começa a fazer a descrição de uma contingência de sua relação
com o fiiho, o outro cliente S. parece punir sua verbalização, o que
se observa por sua resposta de esquiva. O terapeuta procurajmpedir
que a cliente se esquive demonstrando seu interesse.
Uma característica da abordagem comportamental que
aumenta sua eficácia e que fica evidente no trabalho com grupos é
o seu ^specto pedagógico ou instrucional. O terapeuta pode ensinar
a seus clientes sobre análise do comportamento: sobre relações
entre os comportamentos e as suas conseqüências, a descrever
contingências e construir suas próprias regras. Na realidade, os
resultados mais duradouros e generalizados são obtidos quando o
cliente aprende a analisar as contingências de seu ambiejite
envolvidas em suas queixas. Ensinar análise funcional ao cliente é
um dos melhores procedimentos terapêuticos. Cabe ressaltar, no
entanto, que para que esta estratégia seja efetiva é necessário
adequar a linguagem e utilizar exemplos da vida dos clientes, sem a
preocupação de utilizar termos técnicos que podem ser de difícil
entendimento para algumas pessoas.
No grupo, as regras decorrentes dahistória de vida dos
diferentes indivíduos podem ser evidenciadas, questionadas e
utilizadas como modelos para novos repertórios. É uma excelente
oportunidade para o individuo observar e refletir sobre a sua própria
habilidade social. Além disso, propicia condições de aprendizagem

35
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

\< ; laníoatravés de uma participação ativa como através da observação.


Por exemplo, já tivemos clientes que após algumas sessões nas
quais emitiram baixa frequência de verbalização relatam que “me
lembrei daquela situação que o V. contou da relação dele com o pai
e das alternativas que o grupo levantou e resolvi fazer igual com o
meu pai.. Deu certo, adorei...” .
Outra vantagem desta modalidade de atendimento decorre
do fato de o reforçamento ser diversificado $ imediato. Realmente,
os membros do grupo são capazes de prover uma fonte adicional de
reforçamento positivo social e uma preocupação com a melhora de
performance dos membros do grupo. O terapeuta não é mais o único
determinante do comportamento do grupo. A situação grupai pode
funcionar como um laboratório no qual se experimenta novos
comportamentos e se desenvolvem novas formas de relacionamento.
Os membros do grupo provêem um reforço imediato para aquilo que
se constitui num comportamento apropriado em dada situação. Além
disso, os membros do grupo podem experimentar novas formas de
comunicação com outras pessoas em situações que simulem mais
proximamente o mundo real. Há uma ampla base para modelação
social em grupos, e os membros do grupo podem facilitar a aquisição,
e a manutenção de comportamentos socialmente reforçados. No
grupo comportamental cada participante tem a possibilidade de
comportar-se como liderou de ensinar papéis para outros membros
do grupo. Se um dos membros do grupo tem habilidades que são
valorizadas por outros membros pode ensiná-las para o grupo; ele
pode ser convidado a ajudá-los a obter as mesmas habilidades e à
medida que aprende os conceitos e procedimentos pode dar modelo
para outros participantes.

2. Organização do grupo.

2.1. Planejamento
Antes do início da formação do grupo os terapeutas
deverão decidir e planejar vários aspectos em relação ao grupo,
respondendo as questões que se seguem.

36
M aly Deliti

a) Qual é o objetivo do grupo?


O grupo será para obtenção de dados para pesquisa?
Atendimento em consultório ou em instituição? Se instituição, trata-
se de uma dínica-escola, hospital psiquiátrico, posto de saúde ou
empresa? A resposta a esta questão determ inará todas as
características do grupo. Neste capítulo apresentamos um modelo
de atendimento que temos utilizado Janto com clientes de consultório
quanto com os de uma dínica-escola e os de hospital psiquiátrico.
Em outros capítulos deste livro, estão apresentados relatos de trabalho
de pesquisa e de atendimento em instituições. Uma das características
da Análise do Comportamento é a utilização de uma definição objetiva
dos probjemas para fins^a aná|ise funcional. A definição e descrição
operacional dos objetivos são indispensáveis para o planejamento
das intervenções e, também, para a avaliação dos resultados.

b) Quantos clientes participarão do grupo?


Não existe uma norma ou recomendação que especifique
o número ideal de participantes. Esta é uma das decisões que o
terapeuta deverá tomar, considerando seus objetivos e as demais
características do grupo. Grupos maiores (mais de 8 participantes)
demandam um maior treino-terapêutico, embora sejam muito úteis
nas instituições (hospitais, emprèsas) nas quais a demanda por
atendimento costuma ser maior. Terapeutas menos experientes
provavelmente se beneficiam se trabalharem com grupos menores
(4 a 5 pessoas) e, portanto, com menos diferenças individuais em
termos de problemas e de história de aprendizagem. Grupos
menores, por outro lado, podem trazer outro tipo de dificuldade: se
um participante faltar, o que realmente pode ocorrer, a interação na
sessão pode ficar pequena ou aversiva para os membros do grupo.
Em nossa experiência.eanciuímos que um grupo com 6 a 8 clientes,
traz vantagens em termos deinlecação, modelação e aprendizagem -
interpessoal ê, ao mesmo tempo, permite a atenção adequada para
a análise e intervenção com cada um dos clientes.

c) Quantos terapeutas?
Um terapeuta pode atender ao grupo sozinho. Entretanto,
contar com um co-terapeuta tem se mostrado extremamente produtivo.

37
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Na situação de grupo fica difícil para um único terapeuta observar e


/ discriminar os comportamentos verbais e não-verbais de todos os
clientes. Assim, enquanto um terapeuta está interagindo com um cliente,
o outro terapeuta observa os demais e. se preciso, interfere, mudando
o foco da análise ou completando a verbalização. Deve-se, entretanto,
tomar cuidado para que um terapeuta não fique constantemente
completando a afirmação do outro o que pode reduzir a oportunidade
de participação dos membros do grupo.
O trabalho em co-terapia vem sendo estudado por vários
autores (Zaro, Barach, Neldelman,1981), e, bem planejado, traz
muitas oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento para os
clientes, além de facilitar o treino e aprimoramento dos terapeutas.
Em situações que podem ser aversivas ou mais difíceis para um
dos terapeutas - por exemplo, quando o relato de um cliente evocar
encobertos intensos em um dos terapeutas - o outro terapeuta usar
modelação ou auto-revelação de forma mais objetiva. Cada
terapeuta pode funcionar como um controle para o comportamento
do outro, diminuindo a probabilidade de vieses e aumentando as
fontes de reforçamento. Por outro lado pode ocorrer de os dois
terapeutas competirem, pela atenção dos clientes, interrompendo
um ao outro ou discordando. Por isto, yuando há dois terapeutas, f
principalmente em situações de treino, cfêve-se píanejar antes quem “ '*
conduzirá a sessão e quem terá o papel de co-terapeuta! A falta de
contato entre os dois terapeutas e as dificuldades interpessoais
precisam ser resolvidas antes de iniciar o trabalho em equipe.
A presençade um observador na sala do atendimento,
mas fora do grupo (afastado do círculo) e que não participa da
sessão, peio menos em termos de comportamento verbai, tem sido
urn LecLLrso valioso tarito no desenvolvimento do grupo como "no
das habilidades dos terapeutas. Õs objetivos do observador são
observar e registrar os comportamentos verbais e não-verbais dos
membros do grupo em sua interações com os terapeutas para
aumentar a fidedignidade dos dados coletados.

d) O grupo será homogêneo ou heterogêneo? ^ ^


O grupo será composto por pessoas semelhantes em
termos de idade, tipo de problema, e sexo dos participantes ou não?

38
MalyDelliti

Esta decisão depende dos objetivos do trabalho, isto é, grupos


homogêneos são mais adequados para realizar uma pesquisa, para
discutir uma temática específica (por exemplo, grupo de mulheres
para discutir sexualidade), ou grupos heterogêneos com temas mais
genéricos como habilidades sociais, problemas de relacionamento,
ansiedade etc. Preferimos grupos heterogêneos porque, a partir da ,
prática clínica com estes grupos, concluímos que há uma maior L
probabilidade de generalização para a situação natural, dada a ;
diversidade de modelos e de reforçamento. J

e) O grupo será aberto/fechado?


Novos membros podem passar a participar do grupo
depois de seu início ou não? Se a opção for pelo grupo fechado
cada pessoa assume o compromisso de participar por algum tempo
específico (alguns meses, por exemplo). Quando se trabalha com
grupo aberto o terapeuta deve se lembrar que sempre que um novo
membro for acrescido deverá ser já ocorreu
no grupo e uma retomada das regras e condições do grupo. Nas
instituições como hospitais e centros de atendimento à saúde, este
tipo de grupo é mais freqüente nas enfermarias. No entanto, nos
ambulatórios, é possívei a realização de grupos fechados, temáticos,
e às vezes com número pré-determinado de sessões tanto para
pesquisa quanto para atendimento aos pacientes da instituição.

f) Local, duração, freqüência e valor das sessões.


Em nosso trabalho, grupos com encontros semanais de
^4 2 horàt\de duração têm se mostrado adequados. Sessões mais
ciJrfas impedem a participação da maioria dos clientes e sessões
mais longas costumam ser cansativas e pouco produtivas.
É difícil estabelecer ojDreçfuJa sessão de grupo. Para
atender seis ou mais pessoas é preciso uma ja la de tamanho
grande. Além disso, trabalham dois terapeutas e um observadõTêo
~pTãaejamen.to e discussão da.aès_são demanda „várias horas além
das utilizadas durante o. atendimento. Na nossa experiência, no
atendimento erri grupo em consultório particular, é justo cobrar 50%
do valor da sessão individual.

39
Terapia Analítíco-Comportamental em Grupo

Uma estratégia que tem trazido bons resultados é a que


chamamos de “ esquema combinado” : faz parte das regras
combinadas com ó grupo a possibilidade de ocorrerem eventuais
sessões individuais, solicitadas por um cliente ou pelo terapeuta,
para facilitar o desenvolvimento do grupo. Nestas sessões são
analisadas possíveis dificuldades do cliente em relação ao grupo,
quer por algum conteúdo aversivo, ou por alguma dificuldade em
relação a outro. Deve-se enfatizar que nestas sessões, que ocorrem
com pouca freqüência, o indivíduo é incentivado a contar quando
estiver em uma sessão com o grupo sobre os assuntos da sessão
individual, sendo ressaltado que o objetivo é participar efetivamente
do grupo.

2.2.0 início
Em sessões individuais (uma ou duas) antes da primeira
sessão do grupo, os terapeutas~coletàm TnTõfmáçõessobre as
expectativas dos clientes, os comportamentos que estes consideram
como problema e, se possível,, as contingências de aquisição e a
sua manutenção. A!ém djsso, os terapeutas procuram se estabelecer
como audiência não-punitiya, explicando o processo e os princípios
da terapia em grupo. Desde este" primeiro contato, deve-se ter a
preocupação de criar a coesão do grupo, uma condição
indispensável para o seu bom andamento.
Após essas prímeiraa-entrevistas-4fídivlcluaisT--podern jser
jdentifiçadas.diferentes fases na condução dos grupos. Na primeira
sessão, os T criam condições para os participantes se conhecerem,
com cada um dos membros se apresentando e colocando suas
expectativas iniciais. Uma outra forma de começar o grupo é pedindo
a um membro que se apresente à pessoa que está ao seu lado, falando
de suas características pessoais e de seus maiores interesses. Após
a dupla interagir por alguns minutos (2 ou 3) um apresenta o outro
para o grupo, Esta estratégia (duplas) pode facilitar a emissão de
relato verbal em clientes com mais dificuldade. De qualquer forma, o
importante é que os T esteiam atentos para reforçaras verbalizações
de cada cliente e para. mostrar aspectos de semelhança ou d¥
similaridade entre os membros. No início do grupo (nas primeiras 3
ou 4 sessões), os objetivos principais são reforçar o comportamento

40
Maly Delliti

de “ser cliente” (pontualidade, assiduidade, cooperação), retomara


cõTeta^elrHciar a análise dos dados que foram abordados nas
entrevístasjjndTviduaiã. É indispensável o estabelecimento de controle
positivo entre os membros, isto é, o terapeuta deverá reforçar os
comportamentos verbais do tipo tato e o de reforçamento recíproco
entre os membros. É também importante que o terapeuta esteja atento
para identificar e indicar aos clientes os comportamentos e
contingências de vida semelhantes ou que de alguma forma favoreçam
a interação e a aprendizagem de uns pelas contingências de
aprendizagem dos outros.
A atração ou coesão de um grupo é uma das variáveis
indispensáveis para o sucesso. Yalom (1985) afirma que “a coesão
é o resultado de todas as forças que atuam sobre todos os membros
do grupo, de maneira que permaneçam no grupo, ou de forma mais
simples a atração de um grupo por seus membros. jDs membros
de um grupo coeso sentem afeto, conforto j^ u m seiitido de
pertinência no grupo._Eles valorizam o grupn e sentem que-são
valorizados, aceitos e amparados pelos outros membros.” Pode-se
considerar a coesão como uma razão entre a taxa de reforçamento
e a de punição iiberada no grupo, isto é, grupos mais coesos são <
aqueles nos quais existem mais comportamentos mantidos por |
controle positivo do que por controle aversivo. Skinner“(1989) afirma J
que o” próprio terapeuta constitui uma audiência não punitiva... e o
comportamento que até então foi reprimido começa a aparecer no
repertório do paciente”. No contexto do grupo, a coesão faz com
que cada membro se estabeleça como parte de um ambiente não-
punitivo e, assim, favorece a emissão de padrões de comportamento
que são punidos na situação natural.
A coesão é tão importante p.ara a terapia em grupo quanto
o relacionamento terapêutico para a terapia individual. De acordo com
Rosenfarb (1992), freqüentemente, os indivíduos que procuram terapia
não aprenderam determinados padrões comportamentais em sua
história de vida, e o terapeuta pode, na situação de terapia, modelar
novos comportamentos. No grupo terapêutico as contingências de
controle são mais complexas. _QJatape iita fica sob controle rins V
comportamentos dos clientes e estes sob conlroledas contingências
liberadas pelo terapeuta e pelos membros do grupo. N i^tü ã ça ò de
grupo, cada individuo pode desempenhar ò papel de modelae.liberar

41
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

re fo g o ^ o c ia l para aprendizagem de novos padrões de


comportamento o que pode facilitar a generalização para a situação
natural. Quando os clientes identificam os efeitos de seus
comportamentos sobre o comportamento do terapeuta e dos outros
membros do grupo em uma situação de controle positivo, é maior a
probabilidade de discriminação de quais comportamentos serão
reforçados se emitidos na situação natural. Assim, a sessão de
terapia é a ocasião de aprendizagem na qual o terapeuta poderá
instalar comportamentos mais adequados, treinar discriminações de
encobertos e planejar a generalização destes padrões para a vida do
cliente. No grupo coeso a terapia pode ser entendida como um
processo de influência mútua no qual a interação que ocorre entre
clientes e terapeuta é um novo padrão de comportamento que pode
ser mais adaptativo na situação natural. A história de aprendizagem
que ocorre nesta interação é uma variável de mudança. Em outras
palavras quando os clientes identificam o grupo terapêutico como uma
situação em que são cuidados e apoiados, eles começam a revelar
informações, sentem-se protegidos, confiam no terapeuta e nos
outros participantes e identificam este relacionamento como especial,
diferente do que tem com outras pessoas. As respostas adquiridas e
reforçadas nesta interação freqüentemente se generalizam para outros
ambientes ficando sob controle das contingências naturais. Em
resumo, pode-se entender a coesão do grupo como resultado da
densidade de réfõrçamento ou o valor reforçador dê um membro para
o outro, dos terapeutas e das atividades do grupo para os participantes.
A transcrição abaixo descreve um trecho da primeira
sessão de um grupo de terapia durante a apresentação dos clientes:
M. (Mulher, 63 anos) relata: “Sou M. tenho 63 anos e meu problema
é com minhas filhas. Fico extremamente nervosa com o
egoísmo delas, que só me procuram quando querem alguma
coisa.”
T: “Acho que você é corajosa, pois foi a primeira a faiar e relatou
sua dificuldade.” T mostra empatia e reforça revelação.
F (Homem, 26 anos): “ Eu já fiz terapia individual e agora quero
me organizar em relação ao trabalho e também falar do meu
casamento que vai acontecer daqui há 6 meses e eu acho
que teremos problemas conjugais.”

42
Maly Delliti

T: “Oba, temos um noivo aqui... Em que você trabalha mesmo?


Eu já sei, porque já nos falamos, mas conte para os outro.”
(Terapeuta dá atenção e solicita informação para o grupo)
F: “Informática, mas como lhe faiei quero mudar de área...”
T: “O F. quer se organizar pois acha que perde tempo em seu
trabalho e que poderia render mais” (T explica.)
T: “E você G., não quer se apresentar?” (dirigindo-se à outra
cliente que estava se mexendo muito na cadeira).
G: (Mulher,(24 anos): “Como já lhe fale.i tenho um namorado com
quem vivo brigando, mas não posso viver sem ele... Sou filha
única de pais bem velhos e caretas... eles implicam comigo...”
T: “É, a gente já conversou mesmo. Não pode viver sem o
namorado, mas também não pode ficar sem brigar não é G.?
Não sei se você concorda, mas parece você se esforça para
se dar bem com ele, mas parece também que há algo que
sempre atrapalha vocês. Vamos descobrir o que é para poder
mudar... Quero, agora, chamar a atenção de vocês para o
fato de termos aqui alguém que fala de como é ser uma filha,
a G .e também uma mãe, a M. Vai ser bom podermos observar
os 2 pontos de vista.” (O terapeuta reforça a verbalização e
traça uma relação entre as 2 clientes).
A forma com que o terapeuta verbaliza suas análises pode
ter um efeito importante.^^AojJsarjíQcnpartamentq
autoclítico, por exemplo, ao empregar expressões como: “Não sei
se você concorda com o que eu penso.” ou “Parece que você está
me falando que...” o terapeuta pode diminuir possíveis impactos ^
aversivos de sua verbalização e aumentar a receptividade do cliente, ^
dando condições para que ele concorde ou não.

3. Avaliação inicial (assessmenf)


Muitos clientes começam a terapia em grupo relatando suas
queixas de modo genérico, como os clientes M. do exemplo anterior
(fico nervosa...) ou F. que relata “problemas conjugais”. A primeira
tarefa do terapeuta será analisar tais queixas. descrevencTo-asem
termos de comportamentos específicos passíveis de observação

43
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

(direta ou indireta) e de mudança. Além disso, a descricão das


contingências permitirá que seiamJdentificadas as m n^eniiôncias
advindas de tais c o m p o r t a m e n t o s q n p r p a r a n p r ó p r io, indivíduo quer
para as pessoas com gn^m Dois tipos de problemas
têm sido descritos na literatura: excessos e déficits comportamentais.
Os excessos comportarnaníais referem-se àqueles comportamentos
que são emitidos em freqüência, duração ou intensidade muito alta
ou em situações inadequadas. Déficits comportamento são, os
padrões de comportamentõque não são emitidos na freqüência,
intensidade ou duração necessária, da forma apropriada ou em
situações inadequadas para trazer reforçamento positivo ou evitar
punições (reforçamento negativo). Tanto os excessos quanto os
déficits comportamentais podem ocorrer com comportamento abertos
oj j encobertos, verbais ou nao-verbais e, portanto, passíveis de análise
ejntervençãõsegundo os princípios da análise do comportamento.
Em relação aos encobertos ou eventos privados, tais como
pensamentos, sentimentos, e respostas fisiológicas deve-se ressaltar
que na análise clínica do comportamento estes são considerados
comportamentos como quaisquer outros, a única diferença é o acesso
que o observador externo tem a eles. Isto é, quando se conduz uma
análise funcional, os eventos privados são analisados de acordo com
suas funções examinando as variáveis de controle relevantes. Por
exempio, um cliente diz: “Penso que eu sou um fracasso completo!”.
Na perspectiva de análise comportamental é preciso compreender a
função ou a finalidade destes pensamentos e do relato dos mesmos,
examinando as variáveis ambientais que o controlam. ,Quais são os
antecedentes sob os quais o estes pensamento ocorrem? Q que
acontece quando o cliente relata estes pensam entos? _E,
independentemente do relato, como estes pensamentos se relacionam
com outros comportamentos e contingências da vida ria pes-gna?
B t T quiTsIfuaçoesÜao maislreqüentes? Quais são as contingências
de reforço que mantem tais pensamentos e talsTélatos?
Entretanto, existem outras solicitações ou demandas que
os indivíduos apresentam que influenciam suas vidas e vão além
das queixas comportamentais. Privações econômicas, problemas
legais ou de saúde precisam ser levados em conta. Por exemplo,
existem pessoas que não podem vir ao grupo por não terem com
quem deixar os filhos, por não terem dinheiro para condução, por

44
Maly Deliiti

limitação física etc... Em muitos casos é necessário o apoio e


encaminhamento para outros profissionais e o terapeuta precisa ter
conhecimento e acesso a esta rede de apoio social.
Na análise clínica do comportamento, a mensuração e a
avaljaçãp .fazem parte constante da prática com os seguintes

!
objetivQSJ
a) identificar os comportamentos-alvo e as circunstâncias que
mantêm tais comportamentos;

b) auxiliar na seleção de uma intervenção apropriada;


c) fornecer meios de m onitoram ento dos progressos do
tratamento;
d) auxiliar na avaliação da eficácia de uma intervenção.
Para fazer a avaliação na situação de grupo, vários proce­
dimentos podem ser utilizados. Os clientes podem aprender a obser­
var a , <usjArAftRÁrio. registrar os próprios comportamentosTrespon­
dendo a questionários ou inventários já padronizados (Rathus,1972;
Teste de Discriminação de Comportamentos Assertivo, Inassertivo e
Agressivo de Lange e Jakubowski 1977; Inventário de Beck 1997; In­
ventário de Assertividade de Alberti e Emmons 1983), ou fazendo re­
gistros ds certos comportamentos em situações específicas. Esta
segunda alternativa, a observação do comportamento, propicia da­
dos qualitativos e o terapeuta irá áriàlísár, corffõcnente, qüü^contin-
gênnias estão em operação para levá-lo a emitir aquela resposta. Ãs
contingências a serem consideradas são aquelas que, na sua histó­
ria de vida, instalaram o comportamento e, também aquelas que
mantêm seu comportamento no presente. As novas contingências
que passarão a ser manejadas nas sessões pelo terapeuta na
interação com os membros do grupo poderão produzir novos com­
portamentos alterando o repertório dos clientes.
lim a estratégia sim ples que temos utilizado para
observação e avaliação de comportamento no grupo de terapia é a
observação em intervalo fixo. A cada 10 ou 20 segundos, registra-
45
se a inicial do nome da pessoa__^ye_eslá^iaiando e, assim, a
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

diferentes sessões. A tabela e a figura a seguir são exemplos deste


tipo de registro realizado em sessões de terapia em grupo com
clientes na clinica de Psicologia da PUC-S. Paulo.2 *

Tabela 1. Observação da porcentagem de ocorrência de


verbalizações emitidas por clientes e terapeutas registrados em
intervalo de 20", durante a primeira sessão de grupo.

0 1
00 I
2o 3o 40 5o 6o 7o

LR LR D D N TE N
1 TE
2 TE LR AS D D R TE TE
TE LR LR D D N TE D
3
4 TE AS LR D D N TE TE
CO AS R TE D R C TE
5
6 TE TE R D N R C TE

7 TE AS LR R AS R c TE
8 TE N R D R R TE TE
9 TE N R D TE R C TE
10 TE TE TE D TE R c D
11 TE TE R TE R C TE TE
12 TE TE R D TE D c C
13 TE N R TE TE TE c TE
14 TE N AS CO N D C TE
15 TE TE AS TE N R C TE
16 D TE TE TE N D TE
17 TE TE TE TE N D C
18 D TE TE D N AS TE
19 TE N R D N AS TE
20 TE N TE TE N D TE
21 TE AS R TE N D C
22 R TE AS D N TE C
23 TE TE TE D N TE C
24 R AS D D N TE TE
25 R AS TE D TE D C
26 CO AS LR LR TE D AS
27 R TE LR TE N N AS
28 TE AS LR D N R AS
29 TE LR LR D N CO TE
30 LR LR LR D N TE TE

AS 18 8% LR 16 7%
TE 83 37% C 16 7%
CO 4 2% R 25 11%
D 36 16% N 27 12 %

2 A g ra d e ç o a R e b e c a A y a b e B a ssi p e la o rg a n iz a ç ã o e p e lo e n tu s ia s m o co m os re g istro s
das sessões.

46
Maly Delliti

Tabela 2. Porcentagem de ocorrência de verbalizações


emitidas por clientes e terapeutas registradas em intervalo de
20" durante cinco sessões de grupo.

Sessão 1 Sessão 2 Sessão 3 Sessão 4 Sessão 5

TC 33% 49% 57% 68% 79%


CO 1% 5% 22% 24% 30%
C02 0% 0% 0% 18% 34%
D 17% 27% 31% 46% 46%
LR 11% 27% 51% 7 9% 79%
C 9% 50% 84% 97% 117%
R 9% 15% 20% 31% 42%
N 13% 13% 13% 13% 13%
AS 7% 14% 23% 23% 55%
S 0% 0% 0% 0% 0%
T 0% 0% 0% 0% 5%

Figura 1. Porcentagem acumulada de ocorrência de emissão


verbai de clientes e terapeutas registradas em amostragem
de tempo durante 5 sessões de grupo.

47
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

A figura 1 apresenta os dados registrados da ocorrência


acumulada de emissão verbal por amostragem de tempo. Esta
observação é realizada registrando-se a inicial do sujeito (cliente ou
terapeuta) que está verbalizando ao final de cada o intervalo de
vinte segundos. No eixo da abscissa, estão os dados das sessões
realizadas em diferentes datas. O eixo da ordenada representa a
porcentagem acumulada de ocorrência de emissão verbal de cada
sujeito. É possível constatar que, nas primeiras sessões, o terapeuta
emitiu mais verbalizações que os clientes. Este padrão é esperado
por se tratar da fase de orientação inicial e estabelecimento de regras
do grupo. Observa-se que esta participação diminuiu nas sessões
seguintes e que a figura expõe uma tendência de equilíbrio de
emissão verbal dos clientes com o passar das sessões, cada um

4. O desenvolvim ento do grupo


Como um contato tão curto como a sessão de terapia
pode modificar o comportamento de uma pessoa? Esta é uma
pergunta que é feita frequentemente para os analistas clínicos do
comportamento. Realmente, 50 ou 60 minutos semanais são uma
parcela muito pequena da vida de uma pessoa. Entretanto, a sessão
de terapia é a única situação em que o terapeuta pode observar o
comportamento do cliente e, ao mesmo tempo, também fazer parte
das contingências. De acordo com Skinner

“uma pequena parte da vida do cliente se passa na presença


do terapeuta (...) ocorre uma grande quantidade de modelagem
mútua em encontros face a face”. (Skinner, 1953).

O trabalho do terapeuta será criar condições oue levem o


cliente ajdentificar as ClasspR rte mntínqénria.q de reforçamentn na
sua história de vida que o levaram a emitir aquele comportamento
que ele relata ffíélrazèr sofrimento (tem conseqüências averslvas).
Além dissn T ^rá n e r g c c á r i n lm / g r r T H iõ n t P a identificar Q U e éxistêm
hoje, no seu cotidiano, contingências que mantém os padrões
relatados como problema, incluindo-se aí padrões de fuga/esquiva

48
Maly Delllti

a finalmente levarem o cliente, através de controle por instruções


ou regras, a testar a realidade, a emitir comportamentos no contexto
social reaí. aue tenham grande probabilidade de serem reforçados.
Para executar seu trabalho o terapeuta irá se utilizar dos
princípios de análise do comportamento, ouvindo o relato verbal do
cliente acerca das_situaçõés d ^su á vídã cofícíianã e observando e.
interpretando os comportamentõsque são emitidos riã~sessão- Tsai
e Kohlenberg (1991) afirmam que “a observação e interpretação de
um terapeuta sobre um comportamento é uma função da história
do terapeuta, que inclui também seu referencial teórico” . O tipo
específico de interpretação escolhido pelo terapeuta varia de acordo
com o seu propósito e com o contexto da terapia. Contingências da
história de vida do próprio terapeuta também estarão sempre
presentes, seus valores, regras e experiência de vida. O terapeuta
neutro ou “distante” é uma falácia no processo terapêutico.
Entretanto, deve-se tomar cuidado para não transmitir seus próprios
valores. Isto significa que o terapeuta não pode falar de si mesmo
ou e sua vida?
A “análise da transferência e contra transferência”, uma das
estratégias fundamentais das abordagens psicanalíticas, na análise
clínica do comportamento pode ser entendida como um processo
que envolve discriminação e generalização por parte do terapeuta e
do cliente. Tudo que o cliente faz na sessão são comportamentos,
que foram aprendidos e ocorrem devido à similaridade funcional entre
pgtími jjnp prftçiftntefi na sessão e na situação de aprendizagem. Por
exemplo, quando se sente irritado corrTum comportamento do cliente
o terapeuta deve se perguntar: será que este comportamento do cliente
é uma amostra de seu comportamento na situação natural e dos
respondentes que evoca nas outras pessoas ou eu estou irritado
porque estou cansado? Ao fazer este auto-questionamento o terapeuta
estará procurando identificar se seus eventos privados foram
evocados pelo comportamento do cliente ou por contingências de
sua história pessoal. Na sessão de grupo esta reflexão é facilitada,
pois pode-se fazer a validação consensual, isto é, perguntar aos outros
membros do grupo e ao co-terapeuta como se sentiram naquela
situação. A partir dos relatos dos outros clientes pode verificar se eles
identificam os mesmos respondentes e, portanto, não foi uma
resposta evocada apenas por contingências da história de vida do

49
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

terapeuta. Pode acontecer, também, que vários (ou todos) os


membros do grupo considerem que o terapeuta foi autoritário, punitivo
ou distante. Neste caso, o terapeuta deve reconhecer que seus
clientes provavelmente estão fazendo uma análise realista e, portanto,
precisa rever e mudar seus comportamentos. Nas situações de
pressão ou confrontação do grupo em relação ao terapeuta, o co-
terapeuta tem um papel fundamental, pois pode auxiliar o terapeuta
na manutenção da objetividade. Estas situações, cuja ocorrência é
comum no grupo terapêutico, mostram a importância da relação
harmoniosa entre o terapeuta, o co-terapeuta e os clientes e a
necessidade do autoconhecimento por parte do terapeuta, repertório
este que pode ser adquirido e/ou aprimorado com terapia pessoal e
supervisão.
Os princípios e procedim entos da Análise do
Comportamento são utilizados durante todas as sessões do grupo.
Reforçamento, extinção, treino de discriminação, modelagem
(shAofna), modelação {m odeling), treino de auto observação,
desenvolvim ento de repertório alternativos, observação' e
reforçamento de CRBs (FAP, Kohlenberg, 1991) são algumas das
estratégjasjerapêuticas utilizadas durante todo o processo. Inúmeros
recursos, como fotografias, poesias, letras de música, recortes de
jornais e revistas podem ser utilizados como um conjunto de
estímulos textuais, verbais, com diferentes funções, eficazes para
controlar os comportamentos do terapeuta e dos clientes. Estes
princípios e procedimentos são conhecidos de todo analista do
comportamento, e existem inúmeros trabalhos e pesquisas sobre
seus efeitos na prática clínica. Entretanto, a modelação e o ensaio
de comportamento, por serem estratégias fundamentais para
atendimento de grupo, serão enfatizados neste trabalho.

5. Modelação e Ensaio de Comportamento*3


Modelação (modelingy. na terapia em grupo 9 modelação
ou .aprendizagem por observação è um dos instrumentos de maior
importância. O terapeuta é um modeio para comportamentos" no
grupo e estes também são modeios uns para os outros. Bandura

3 Modeling (inglês) tem sido traduzido por modelação e shaping por modelagem

50
Maly Delliti

(1969,1971) foi um dos primeiros autores a pesquisar e analisar as


evidências empíricas da aprendizagem por modelação e demonstrou
que a_modelação pode ter três efeitos sobre os clientes: primeiro os
observadores podem adquirir novos padrõesjje~cõmportamento;
além disso, a modelação também pode fortalecer ou inibir respostas
que ]á existem no repertório do observador, e estão reprimidaspor
contingências aversivas; e, finalmente, a modelação podelacintàr
respostas que já existem no repertório do indivíduo, mas são emitidas
emT5aixa freqüência.
Baum (1994/1999) afirma que os indivíduos nascem com
uma sensibilidade específica para serem afetados por estímulos
que vêm de outros seres humanos, estímulos estes essenciais para
o desenvolvimento normal, e que esta sensibilidade específica em
relação a determinados estímulos é que o torna apto a imitar.
A imitação é fundamental para a existência de uma cultura,
pois p e r m ite a r e p r r HH ?äft 9 ^ n tin iiid a rie dos seus valores,
egonomizando tempo de a p re n d iz a g e m p garantindo a a q u is iç ã o
de comportamentos adaotativos à sobrevivência da espécie. Os
indivíduos que aprendem a imitar comportamentos provenientes de
gerações anteriores, em contraposição àqueles que aprendem por
si próprios através, por exemplo, de tentativas e erros, aumentam a
probabilidade da sobrevivência e manutenção da cultura (Bandura,
1969/1979; Baum, 1994/1999).
De acordo com Baum (1999), “a imitação orovê a base
da aprendizagem operante"e pode ser não-aprendida ou aprendida.
Ò primeiro tipo (imitaçáo~~njo-aprendidal não exige nenhuma
experiência especial. A imitaçãoTiã^aprendida. c ombinada com a
modelagem, é responsável pêíaãquisição do comportamento verbaL
.lá a imitaça?Taprendlda é~úiTia forma de comportamento governado
por regras. Quando alguém verbaliza para 0 outro “faça assim” e
mostra còmo fazê-lo, esta pessoa será capaz de seguir esta
instrução e este m odelo, dependendo de sua história de
reforçamento do comportamento de imitar no passado. A imitação
permite que regras sejam passadas para outras gerações,
possibilitando a transmissão da cultura e aumentando a sua
probabilidade de sobrevivência.

51
Terapia Analítico-Comportamenta! em Grupo

Osj>ais_sgo os pnmeiros modelos a serem seguidos por


seus filhos e servem de modelo para muitos comportamentos
diferentes. Esses comportamentos podem ser mais aceitas
socialmente, como por exemplo, o comportamento amoroso, ou ser
menos aceitos, como a imitação de comportamentos violentos por
crianças que têm pais agressivos. Deve- se, entretanto, salientar que
o que é adequado socialmente depende do contexto: o comportamento
assertivo e cooperativo de uma criança pode ser adeqüadõ~õu
inadequado, istn é, trazer conseqüências positivas ou negativas
dependendo do fato dela viver em uma famjíja de classe média õu
alta, em um orfanato, um abrigo para menores. Èm gerai, uma pessoa
não copia só um modelo, mas sim vários e também não copia a
íntegra do comportamento do modelo, mas sim alguns aspectos deste
comportamento. Conforme vai ficando exposta a novas contingências
ou novos modelos, o comportamento imitado vai mudando de aspecto,
acrescido ou modificado. Esta possibilidade de mudança de padrões
de comportamento é uma variável relevante no trabalho com grupos.
Há alguns fatores que facilitam a aprendizagem por
modelação: a habilidade do cliente em ohsftryar è discriminar
determ inados aspectos do com portam ento do modelo; as
características do modelo, suas similaridades em relação idade,
raça, gruposocial etc. e as contingência nas quais o modelo se
encontra ao ser apresentado ao observador. Bandura (1977) afirmou
que se um modelo for reforçado na presença de um observador a
probabilidade da imitação é maior. Além disso, de acordo com este
autor, o papel do controle social sobre o comportamento do modelo
deve ser lembrado. Istoé, o comportamento do modelo dependerá
das regras sociais e estas variam de cultura para cultura. Na situação
natural pode ocorrer, também, que alguém que desempenhe papel
de modelo apresente um amplo repertório de esquiva, o que poderá
im pedir que o indivíduo entre em contato com inúm eras
contingências. Na situação clínica observa-se que pessoas com
problemas de fobia ou de ansiedade exagerada relatam histórias de
aprendizagem destes padrões (“meu pai e meu avô também eram
como eu”).
Um outro aspecto a ser considerado é que a aprendizagem
por modelação ocorre ainda que a relação de contingência não esteja
explicitada. Por exemplo, comportamentos liberais em relação a

52
Maly Dellrti

sexo, cuidados com limpeza pessoal, a forma de administrar dinheiro


são aprendidas através dos anos em nosso ambiente social, ainda
que as contingências não estejam explicitadas. Bandura (1977)
chamou de modelos simbólicos aqueles que não eram apresentados
"ao vivo” , como os personagens de filmes ou livros. Neste sentido,
as regras sociais podem ser consideradas como um modelo
importante. Baum (1999) ressaltou que a regra “imite o sucesso”
faz parte da cultura. Assim, os indivíduos imitam ídolos da TV ou do
esporte, que são m odelos apresentados pela mídia em
contingências de reforço identificadas como sucesso ou prestígio.
Na clinica, o estabelecimento de uma boa relação
terapêutica significa que o terapeuta adquiriu propriedades de modelo
com valor reforçador. Na terapia em grupo a variedade de modelos
é maior, isto é, podem ser modelos os terapeutas, outros membros
do grupo, e pessoas do ambiente natural do cliente.
O trecho abaixo, transcrito de uma sessão de grupo pode
ser tomado como um exemplo de aprendizagem por observação
de modelo.

Cliente J: (entregando uma pasta para o T “Trouxe uns textos


que escrevi e que gostaria de transformar em um livro algum
dia."
Terapeuta: “Que legal! Você quer que eu leia aqui ou prefere que
eu ieia sozinha depois? (T da atenção e investiga, respeitando
o direito do cliente à privacidade).
Cliente J: “Não, pode ler para todo mundo.”
O terapeuta lê o texto para o grupo e em seguida diz:
T: “Gostei de você ter trazido. Gostei também de ler, porque assim
conheci melhor você. Percebo que você é muito sensível,
entretanto acho que é hora de parar de pensar no passado
onde ocorreram m uitas coisas ruins, e pensar nas suas
conquistas pessoais e nas coisas que você quer conseguir
daqui para frente.”

Na sessão seguinte, uma outra cliente, R diz ao terapeuta:

53
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

R: “Eu trouxe um CD que tem uma música que é muito importante


para mim e expressa o que eu gostaria de conseguir..."
T: “Ótimo... então eu vou pegar o aparelho de som para nós
ouvirmos”.
Esta interação parece indicar que a cliente R imitou o
comportamento que observou ser reforçado no cliente J, isto é, trazer
algo da sua vida para o grupo. Além disso, ela parece ter aprendido
a instrução do terapeuta: “olhar daqui para frente”.
A m odelação e o ensaio de com po rta m e nto são
estratégias fundam entais no trabalho com grupos. Ensajo
comportarneintãFe a simulação de situações~reais da vida do
indivíduo, situações nas quais ele apresenta algum grau de
dificLjBadêTe pode ser utilizado para avaliação e para intervenção!
A Modelação e o ensaio de com portam ento como
estratégia de avaliação: Quando o indivíduo representa uma
situação que tenha ocorrido em sua vida pode se observar seu
comportamento verbal e não-verbal, a topografia dos mesmos, tom
de voz, gestos, entonação e postura. Esta observação costuma
fornecer dados importantes para a análise das contingências.
M odelação e o e n sa io de com po rta m e n to com o
estratégia de Intervenção: são inúmeros os comportamentos que
podem ser instalados ou alterados, desde comportamento de observar
a si e aos outros, analisar e descrever contingências, habilidades
sociais, empatia, comunicação, auto-revelação, enfrentamento etc.
Vale a pena salientar que os primeiros modelos de comportamentos
que o terapeuta apresenta para os clientes são os auto-relatos,
principalmente aqueles cujo conteúdo mostre empatia e aceitação
social, isto é, o terapeuta dá modelo de como os clientes podem liberar
reforço social. A modelação pode ser facilitada quando, por exemplo,
durante um ensaio de comportamento no grupo, o terapeuta der uma
instrução prévia oral ou escrita em cartões levando os clientes a
ficarem sob controle dos estímulos relevantes, dizendo, por exemplo:
‘'prestem atenção ao tom de voz e aos gestos do P nesta situação”.
Uma variação de modelação ocorre quando o terapeuta atua
como espelho, isto é. emite um comportamento (verba[oumãõysimiFar
a um comportamento emitido, ou descrito pelo cliente para o grupo

54
Maly Delllti

observar, reforçar diferencialmente e. se necessário e possível, emitir


nnmpnrtamftntos alternativos, Além disso, pode ser feita a troca de
papéis: o cliente troca de papel com outro participante da dramatização,
seja ele terapeuta ou outro membro do grupo. De qualquer forma, para
que a modelação seja uma estratégia efetiva devem ser seguidos os
seguintes passos: descrever a situação problema, decompor a
seqüência comportamental (operacionalização), dar instruções ou
modelo de desempenho, ensaio, dicas sobre o desempenho, inverter
papéis, re-ensaiar, reavaliar o desempenho, programar a generalização,
avaliar o desempenho na situação real.

6. O término do grupo
A afirmação de Skinner (1953) “uma pequena parte davida
do cliente se passa na presença do terapeuta (...) ocorre uma grande
quantidade de modelagem mútua em encohjos face a face" já citada
neste trabalho, levanta uma pergunta relevante para quem trabalha
em clínica: como facilitar a transposição dos padrões aprendidos
na situação de grupo para a situação natural?
Realmente, no atendimento em grupo assim como na
terapia individual, é importante que o terapeuta crie condições para
a manutenção e generalização dos comportamentos aprendidos na
situação do grupo para a situação natural. “Entretanto ’ aquilo que o
cííérrtêlaz na clínica não é a preocupação básica. O que acontece
lá é uma preparação para um mundo que não está sob controle do
terapeuta.” Skinner Q nhjftttM"» terapeuta não fi.tfir.um
cliente oue se desempenhe bem na sessão ou que sejacompetente
na realização de ensaio de comportamento, mas sim que estes
nnmprtrjamftntns aprendidos sejam emitidos e reforçados em
contingências da vida real e que se mantenham no tempo. Além
flTssnr é im portante também que esses comportamentos se
mantenham após o términoda experiência de oruoo o que pode ser
investigado em entrevistas ó e jo llo w upy por exemplo, seís meses
após a sessão de encerramento. Quando o cliente consegue, em
sua vida cotidiana, aplicar os princípios de cornportamento que
aprendeu no^gaipo-enL-situação natural, pode-se afirmar gue_a
intervenção foi bem sucedida. Entretanto a de generalização (e

55
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

manutenção) não ocorre naturalmente, eia deve ser facilitada pelo


terapeuta. Neste aspecto a situação de grupo tem vantagens sobre
a situação de terapia individual, isto é, no grupo é mais fácil planejar
na generalização pela diversidade de modelos e de contingências
de reforçamento. O terapeuta solicita e incentiva os clientes a
emitirem aqueles comportamentos que são aprendidos e ensaiados
no grupo na vida real. As chamadas “tarefas” são propostas aos
clientes para que estes emitam os comportamentos no ambiente
natural, expondo-se as contingências que fortaleçam e mantenham
tais padrões. Durante várias sessões, a cliente R. relatou que não
conseguia colocar limites para sua família, “fazendo só o que eles
querem sem nunca dizer minha opinião.” Depois de identificar as
contingências relacionadas à aquisição e manutenção destes
padrões (as regras principais de sua mãe eram “Em boca calada
não entra mosca.” e “Não sei, não vi, não escutei cabem em qualquer
lugar.”) esta cliente fez vários ensaios dos comportamentos que
gostaria de emitir, escolhendo diferentes membros do grupo para
desempenhar o papel de seu filho. Após esta sessão, a cliente foi
incentivada pelo terapeuta a emitir o novo padrão e também foram
levantadas alternativas para o caso de seu filho não ser reforçador.
Ela relatou na sessão seguinte que “deu certo e até minha filha mais
velha disse que estou sendo mais forte agora”. A emissão dos
comportamentos na situação natural é também importante para levar
o cliente à independência em relação ao terapeuta e demais
membros do grupo, identificando-se como no verdadeiro agente de
sua mudança.
A probabilidade de generalização para a situação natural
é aumentada se o cliente aprender os princípios que explicam seus
comportamentos. Uma das características fascinantes da análise
aplicada do comportamento é seu aspecto pedagógico. O cliente
pode e deve aprender a se observar e identificar as contingências
de controle de seus comportamentos. Este conhecimento aumentará
a sua eficiência no planejamento de seus comportamentos em
diferentes ocasiões, aumentando a probabilidade de reforçamento
na situação natural. Este é o objetivo mais importante e quando
acontece dizemos que a terapia foi um sucesso.

56
Maly Delllti

7. Considerações finais
É impossível escrever uma conclusão sobre algo que está
mudando e se desenvolvendo a cada dia, como ocorre com a prática
terapêutica. A avaliação cuidadosa, planejamento e execução de
pesquisas são indispensáveis para que a área continue a se
desenvolver.
Este capítulo (e também este livro) é resultado de como
entendo a análise clínica do comportamento em sua aplicação à
situação de grupo. Trabalho de acordo com o modelo do
behaviorismo radical e meu comportamento tem sido modelado e
mantido por contingências liberadas por meus clientes, meus alunos
e meus colegas. Espero que os leitores aproveitem.

Referências

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de Auto-Expressão. Belo Horizonte: Interlivros.
Bandura, A. (1969). Principles of Behavior Modification. New York: Holt,
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Rathus, S.A. (1973). A 30 item schedule for assessing assertive behavior.
Behavior Therapy, 4, 398-406.

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Rosenfarb, I. S. (1992). A Behavior Analytic Interpretation of the Therapeutic


Relationship. The Psychological Record, 42,341 -354..
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Brasília.
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Publishing Company.
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prática psicoterapêutica. Ed.Pedagógica e Universitária.
Yalom, I. (1985). The theory and practice of group psychotherapy. Basic
Books
Capítulo 2
Esquiva experiencial do
cliente no grupo
terapêutico e promoção
de aceitação emocional
Maria Zilah da Silva Brandão *1

O presente capítulo tem como objetivos apresentar


reflexões, questionamentos e estudos de caso sobre a Esquiva
Experiencial na Terapia de Grupo.
Para isso o capitulo foi dividido em tópicos, onde serão
encontrados:

* Esquiva Experiencial, Terapia de Aceitação e Compromisso


(ACT) e a condição humana perante a dor.
• Experiências terapêuticas em que os princípios da ACT foram
usados em grupos com formato tradicional.
• ACT: Estratégias didáticas e exercícios experienciais para
grupos
* ACT: fundamentos íilosóficos e teóricos; metas propostas para
a situação terapêutica e pesquisas sobre ACT em grupos.

A experiência de trabalhos com esta proposta tem sido


bastante enriquecedora para a terapeuta e autora deste capitulo.
’ PsicC - Instituto de Psicoterapia e Análise do Comportamento, Londrina, PR.

61
Terapia Analífico-Comportamental em Grupo

1. A condição humana perante a dor


“Um monge caminha na floresta, pensativo e preocupado. É
apenas um monge comum, não um sábio, não um liberto vivo:
não conheceu o despertar, não conheceu a iluminação. Por
que está preocupado? Porque ficou sabendo que seu mestre -
que era, por sua vez, um sábio, um liberto vivo, um desperto -
, que seu mestre, portanto morreu, o que não é grave,
assassinado a pauladas por salteadores, o que tampouco o é.
Não há a menor necessidade de ser um sábiopara compreender
que é preciso morrer mais dia menos dia e que a causa não
importa muito, que isso apenas impermanência e vacuidade.
Qualquer monge que seja sabe disso. Por que, então essa
fronte preocupada, essa perplexidade, essa inquietude vaga?
Porque uma testemunha, que viu a cena, contou a nosso monge
que o sábio, durante as pauladas, gritava atrozmente. B era
isso que perturbava o nosso monge. Como um liberto vivo, um
desperto, um Buda, podia gritar atrozmente por algumas
pauiadas impermanentes e vazias? Para que sen/e a sabedoria,
se é para gritar como um ignorante qualquer? Absorto nessa
meditação, nosso monge não viu aproximar-se um bando de
salteadores, que o atacam de repente e partem-lhe os ossos a
pauladas. Durante as pauladas nosso monge gritou atrozmente.
Ao gritar, conheceu a iluminação.

Que lição tiro disso? Entre outras, esta, que a dor e a angústia
fazem_partejio real. Que jazem parte da salvação. Que são
eternas e verdadeiras, tanto quanto o resto, Ejguea sabedoria
está na aceitação do real, nào~&m.su&-nagã_çâo. O que mais
natural, quando se sente dor do que gritar? O que mais sábio,
quando se está angustiado, do que aceitá-lo? “Enquanto fazes
uma diferença entre o samsara e o nirvana", dizia Nagarjuna,
“estás no samsaraEnquanto você faz diferença entre sua
pobre vida e a redenção, está em sua pobre vida.” (Comte
Sponville, 1997, pp 19-20)
rLbloqiiftio_dn de iiiga-ffsguiv^na sessão
tempêutiça terri sido amplamente discutido porseussupostosejeitos
aversivos para o cliente e para o terapeuta.
Sabe-se que alguns assuntos e algumas reações
emocionais do terapeuta que acontecem na sessão provocam
estados corporais negativos no cliente, levando-o a fugir e, assim,

62
Maria Zilah da Silva Brandão

sentir-se aliviado. No entanto, muitas vezes, fugir de tudo ruim é


justamente o comportamento..clinicamente relevante do cliente.
Hayes e Wilson (1994) discutem a aquisição do conceito
verbal “ruim” e a forma como o termo se associa verbalmente a
muitas outras palavras, participando da formação e mudança do
significado de muitos eventos da vida. Assim, passa-se a fugir ou
evitar m uitos eventos associados a ruim , mesmo os não
experienciados como tal.
Infoli7mopto| polg prnprin rvatn ro a fin <;p.r hiim ann não
poderemos nunca evitar todos os eventos ruins. Este é o caso dos
comportamentos encobertos como os pensamentos e sentimentos.
Como mudá-los se as contingências aversivas permanecerão, em
algum grau, sempre presentes ou com a probabilidade real de se
fazerem presentes?
A terapia deve evitar técnicas aversivas para promover ■
mudança compartamental; talvez não sè deva jamaisusaTas. Õ
que é impossível evitar..são.cespostas emocionais negativas que o
clientej á jr a z para a sessão. Não se trata de “produzir” essas /
sensações ou sentimentos, mas sirrTdé “aceitar” com que elas
ocorram iivrêmehTè na sessão, em função não só do contexto da '
terapia, mas também em função das próprias associações verbais j
inérentes ao seu relato.
O terapeuta reforçador, que constrói uma relação de
confiança com o cliente, não pode, mesmo assim, evitar sentimentos
dolorosos do cliente, produtos de sua história e de seu dia-a-dia. O
que esse relacionamento faz é ajudá-lo a suportar melhor seu
sofrimento e as sensações positivas provenientes dele.
A redução do sofrim ento acontece em função de
processos de inibição recíproca, quando a confiança se contrapõe
à ansiedade em função da extinção respondente, e segundo Hayes
e Wilson (1994) em decorrência da recontextualização que se refere
à idéia de que não é mais necessário lutar contra a ansiedade.
Para Hayes esse processo de diminuição do sofrimento
do cliente também pode ocorrer em função da modificação dos
contextos sócio-verbais de literalidade, razão e controle, que
sustentam o significado das palavras e dos eventos. Quebrando

63
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

esses contextos, na terapia, as emoções poderiam ser sentidas de


outra forma ou com menor intensidade.
As terapias comportamentais tiveram pormultOjempo um
enfoque nas mudanças....de comportamento; a ACT, Terapia de
Aceitação e Compromisso, propõe a aceitação. Esta se reíéreaos
comportamentos encobertos ou aos respondentes. O termo ó a
aceiíacâo emocional. A ação, em contrapartida, pode estar sujeita
as mudanças. É o enfrentamento gradual da vida.
Revendo, não se trata de dizer que o terapeuta possa ou
deva usar técnicas aversivas; não pode e n ã o jjave. A técnica
chamada,bloqueio de fuaa-esquiva, refere-se a ajudar o clientela
viveflciar.aquilo mie é inescapável: seus sentimentos, sensações e
pensamento^ ruins, produtos de contingências reais da vida. Não é
o terapeuta que, deliberadamente, constrói na sessão experiências
aversivas. Ele apenas permite a ocorrência de algumas_delas^ e
ajuda o cliente a aceitá-las, usandolnfrTélãciõnamento elaborado
ém bases^-positívàsT.. .. ...... “ "
Quanto à Psicoterapia Analítica Funcional, a idéia de
produzir Comportamentos Clinicamente Relevantes (CRBs) que
representem o problema do cliente, não trata de criar sentimentos,
mas, sim, de levá-los a ocorrer em um ambiente que tem o objetivo
de consequenciar, positivamente, o comportamento antes punido e
levar os clientes a identificar a tríplice relação de contingência
(Kohlenberg & Tsai, 1991/2001).
O cliente que procura terapia nem sempre é um ignorante
da vida. Ele já tentou não sofrer, e ele já sabe não ser possível viver
sem passar por eventos aversivos. Talvez ele espere que o terapeuta
tenha uma solução mágica; mas o terapeuta não a tem.
A mágica consiste em aceitar sentimentos e sensações,

contingênciâS-maLs amenas e^põsitivãsque, com o passar do tempo,


produzirão os sentimentos positivos que o cliente tanto busca.
Infelizmente, os negativos também continuarão a existir, uma vez
que contingências aversivas podem acontecer independentemente
ou não das ações. Entretanto, espera-se que a experimentação do
bom e do ruim melhore o suporte do cliente para sua vida. Muitos

64
Marla Zllah da Silva Brandão

clientes relatam, na terapia, achar que não “darão conta” do


sofrimento inevitável, e a aceitação modifica essa percepção, permite
reformular essa regra.
As terapias de tolerância e aceitação emocional não são
uma proposta sádica para levar o cliente a aprender a sofrer, criando,
arbitrariamente, tal sentimentos na sessão, por meio de técnicas
aversivas. Elas representam uma estratégia para lidar com a esquiva
experiencial, um padrão comportamental comum na psicopatologia
que dificulta o contato com as situações potencialmente reforçadoras,
restringindo o repertório comportamental do indivíduo.
Carlos procurou terapia aos 16 anos, por não estar mais
saindo de casa, como forma de evitar ansiedade decorrente de
encontrar colegas vistos como líderes. Carlos havia se assustado
muito com algumas reações de ansiedade que ocorreram em uma
viagem com eles, onde se sentiu constrangido e envergonhado pela
sua “timidez". A sensação foi tão aversiva que, para não se sentir
mais assim, passou a evitar qualquer contato com eles e com outras
pessoas de sua idade.
A apresentação pelo cliente do comportamento previamen­
te punido (estabelecer contato) na sessão, foi inicialmente aversiva,
até que contingências positivas de apoio do terapeuta e de outras,
proveniente da não ocorrência do estimulo aversivo, tomasse lugar.
A to le râ n cia ^o tempo que o cliente precisa agüentar
entre a apreserrfaçao do estimulo e extinção da resposta., para a
aosiedade-decrescer.
AioJfiJâmâ.fi-a_aceüaçãP emocional são facilitadas pela
empatia e análise funcional do comportamento e pelo grau de.
.confiança do cliente no terapeuta e jío procedimento clínico. Esses
fatoresTTiã vercfade funcíoriam como eventos disposicíonais que
alteram a probabilidade do cliente engajar-se na experiência do
momento. O enfrentamento apropriado tenderá a diminuir os déficits
comportamentais.
A aceitação e a tolerância emocional são processos
diferentes sendo que o primeiro envolve mais aspectos do que o
segundo. São recomendados para tratar clientes submetidos a
contingências aversivas traumáticas e outros que vivenciam

65
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

problemas existenciais, entendidos aqui como a experienciação


emocional negativa. Esta experienciação é proveniente do
conhecimento da inevitabilidade de contingências aversivas futuras,
resultantes de aprender o significado dos eventos por meio da
equivalência que as palavras têm com os fatos e atos, através da
possibilidade das prim eiras se desprenderem destes e se
associarem a outros estímulos verbais, mudando seus significados
iniciais.
Temos medo da morte embora ainda não tenhamos
morrido e esse medo é em grande parte construído verbalmente,
uma vez que a vida nem sempre é tão boa que a morte pudesse ser
encarada como a punição negativa (retirada de algo bom).
A esquiva experiencial é um padrão comportamental
baseado numagênerafização inadequada, construída verbalmente,
partindo do pressuposto de que é possível livrar-se dos sentimentos
negativos, da mesma forma que nos desviamos de um objeto
cortante que nos machuca fisicam ente. Não é bem assim;
sentimentos negativos, assim como a esquiva, são decorrentes de
situações aversivas passadas, atuais e dos significados das palavras
dos quais não conseguimos nos livrar por meio da luta.
Sentimentos não são passíveis de controle voluntário e
sua experienciação colocada num contexto terapêutico de confiança
pode produzir aceitação, entendida como um comportamento ativo
de dispor-se a viver a experiência, até que se reduza a aversividade.
Comte-Sponville (1997) ajuda a entender esses processos
comportamentais, indicando que a vivência da angustia, por exemplo,
paradoxalmente, melhora a “sanidade mental”. O autor faz um belo
comentário a esse respeito no trecho a seguir.

Não esqueçamos, porém, que a medicina só é válida para os


doentes, e que não se poderia considerar como tal todo o
indivíduo que teme morrer, sofrer ou não ser amado. Onde está
o sintoma? Onde está a patologia? Ele sofrerá de fato, ejamais
será amado, com toda evidencia, como teria desejado. E então?
Resta-lhe enfrentar isso, se puder, em vez de fugir. Sofre com
isso? Mas onde já se viu que todo sofrimento seja patológico?
Que todo sofrimento seja nefasto? Ele o ê, se impede viver ou

66
Maria Zilah da Silva Brandão

agir. Mas se ele ajuda? Se impele isso? Se é fator de revolta


ou de combate? Vai-se renunciar a pensar, por que isso
angustia? A viver porque isso causa medo? A amar, porque
isso causa dor? Aceitemos, ao contrário, tanto quanto
pudermos, e o podemos apesar de tudo, ao menos um pouco,
ao menos às vezes, e esse é justamente o sinal de nossa
sanidade, aceitemos em vez de sofrer e de tremer. (Comte-
Sponville, 1997, pp 16-17).

2. Grupos terapêuticos: criando contextos para


promover aceitação emocional.
"... mas o homem, como o conhecemos, melhorou pior, é o
que o homem fez do homem'’ (Skinner, 1971).

Para o trabalho do analista do comportamento a situação


de terapia de grupo provê oportunidades únicas para o
desenvolvimento de processos de mudança comportamental que
utilizam a força grupai para criarum contexto sócio verbal que permite
e valorize a quebra de alguns paradigmas e regras que estão
prendendo o cliente em seus problemas.
Inicialmente, os clientes temem o julgamento e a critica
dos demais membros do grupo. Isto acontece porque eles a levam
a sério, como se fosse verdade e também porque não conseguem
restringir a critica ao seu comportamento: encaram-na como uma
critica, ao seu “eu” , não enxergam a separação entre o “self” e o
comportamento.
O medo da critica faz com que os relatos dos clientes
estejam sob controle do grupo e que os controles internos estejam
enfraquecidos. O terapeuta deverá buscar procedimentos que levem
seus membros a mudar a fonte de controle, e que comecem a
responder mais aos seus sentimentos produzidos pelo aqui e agora
da sessão. O exem plo e estim ulação do terapeuta para
participações que não são punidas, também facilitam esta mudança.
Os membros podem ajudar a pessoa a reconhecer e
agüentar o medo da critica e praticarem a difusão cognitiva, ou seja,
separar o pensamento sobre a critica e suas conseqüências, da
critica em si mesmo. Strosahl, Hayes, Wilson e Gifford (2004)

67
Terapia Analítico-Comporfamental em Grupo

definem fusão cognitiva como a crença de que um pensamento que


interpreta a experiência é realmente verdade.
Segundo Walser e Pistorello (1994), o processo de
trabalho em grupo de ACT, está focado em minar aspectos da
comunidade sócio-verbal que promove esquiva da experienciação
e fusão cognitiva. Estes aspectos são particularmente importantes
quando se conduz um grupo de ACT, porque o contexto do grupo
em si mesmo, é uma comunidade social que exerce algumas
influencias previsíveis em seus membros.
Qualquer reaçãoemocional agradável ou desagradável que
surja na sessão, assim como qualquerfatolmprêvisível que ocorra
epoderiãser considerado desruptivo em outra abordagem, é material
importante para o aqui e agora da sessão.
Excelentes experiências grupais podem ser observadas
quando o terapeuta ou algum elemento do grupo aponta para os
contextos sócio-verbais que estão determinando as ações e relações
do grupo. Hayes e Wilson, (1994), descrevem o feito dos contextos
de literalidade, controle e das razões na busca desesperada que o
cliente faz para controlar seus eventos privados. Nesta luta, as
reações emocionais aparecem com mais força e os clientes
começam a vivenciar o contrário do desejado: a ansiedade aumenta.
O contexto de literalidade faz com que as palavras por
associação com os fatos aversivos produzam reações semelhantes
a eles.
Essa reação, explicada experimentalmente nas pesquisas
sobre equivalência de estímulos e pela teoria dos quadros relacionais
(R.ET) (Hayes, Barnes-Holmes, & Roche, 2001), é automática e parece
natural para as pessoas em geral e para clientes em particular, que
nem sempre discriminam a diferença entre palavra e fato. As reações
podem parecer deslocadas e exageradas quando estas palavras
começam a ter independência e a produzir reações aversivas distantes
da realidade que as produziram. Este é o caso do medo de crítica, da
avaliação negativa do outro sobre você: a palavra '‘crítica” (dita ou
pensada) produz a esquiva pelo seu significado, mesmo que não tenha
havido experiência aversiva direta com ela e que as pessoas,
concretamente, nada possam fazer contra você.

68
Maria Zilah da Silva Brandão

Uma cliente com fala fantasiosa, que a protegia da


realidade e da verificação alheia, provocava reações estranhas no
grupo que não sabia como mostrar o que era real e o que era exagero.
Por via das dúvidas, o grupo dava atenção para tudo. A situação foi
ficando insuportável.
A T. não queria ajudar, pois achava que o grupo poderia
resolver sozinho. Eia também lembrou das dicas de Walser e
Pistorello (2004) em relação aos erros mais freqüentes do terapeuta,
nas suas experiências: pensar que o grupo é fraco demais e
superproteger, não querendo que eles sofram; e/ou querer proteger
a cliente que estava na “berlinda” pensando que ela não iria agüentar.
Infelizmente, isto sempre pode acontecer no meio de uma
sessão na qual o terapeuta "muda de idéia” ou “vira a casaca”, e
modifica a proposta do grupo cortando a experienciação e aceitação
de emoções negativas.
Nesse caso, a “sabedoria” venceu e o terapeuta calou-se.
O grupo fez silêncio e ficou ouvindo a cliente que depois de alguns
minutos disse ao grupo que achava que todos estavam olhando para
ela com uma “cara esquisita”. Um membro do grupo disse que
também achava isso e perguntou o que ela pensava estar acontecendo
naquele momento. A cliente respondeu que achava que ela não estava
“agradando”. Um membro do grupo disse que gostava dela, mas que
sua fala fantasiosa o deixava irritado (separou a pessoa de seu
comportamento). Outros elementos do grupo concordaram e o
terapeuta sugeriu que ela tentasse, agora, falar o que tinha realmente
acontecido na sua vida tentando só descrever o fato sem avaliá-lo ou
julgá-lo (separar o fato do julgamento ou avaliação do fato). O grupo
reforçou diferencialmente o esforço da cliente em desenvolver uma
fala convencional que atingisse esse objetivo.
Nesse caso, é importante ressaltar a diferença entre
promover aceitação e retirar a contingência reforçadora que poderia
estar mantendo o relato fantasioso da cliente. Apenas não dar
atenção à fala fantasiosa poderia ter mantido o medo de crítica,
provocado raiva ou esquiva, e o grupo também se esquivaria do
constrangimento em analisar assuntos pessoais delicados, não
levando, assim, à aceitação emocional.

69
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

O processo de aceitação no grupo terapêutico pode ocorrer


com muita freqüência e na presença de controles bastante sutis.
O terapeuta do grupo precisa saber se a confrontação
entre grupo, terapeuta e cliente foi .avêrsiva e até que ponto, dá
formas diretas e indiretas para se obter essas respostas. Entre as
lormas diretas ha apossibílidade de questionários pós-sessão e, o
que é mais freqüenliráãnalísj^go^aqui e agora” após cada situação
deconfrontp.
A forma “indireta” seria observar, na mesma ou em outra
sessão, o movimento do grupo para fazer outros confrontos, quando
necessários.
Brandão (1999) discute esse assunto procurando diminuir
a conotação aversiva desse termo e definindo confronto como um
“convite” a terapeutas e clientes para debruçarem-se sobre o “aqui
e agora” da sessão e expor opiniões e sentimentos sinceros sobre
o assunto em questão.
.Para a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT),
diferentemente da Psicoterapia Analítica Funcional (FAP), as
situações de confrontação são convites à reflexão, precisam
estimular a percepção e vivência do cliente dos seus próprios
sentimentos e sensações. Nem sempre a relação terapêutica é o
objetivo de interesse. O que foi vivenciado pelo cliente é o que precisa
ser captado. Essa é uma diferença entre FAP e ACT nos processos
grupais:,a FAP estimula qnálises internessqais e a ACT intrapesfinate
sem nue uma análise exclua a outra. Ao contrário, a proposta para o
grupo seria uma associação entre ACT e FAP denominada FACT,
termo bastante sugestivo (Callaghan, Gregg, Marx, Kohlenberg, &
Gifford, 2004).
O foco até agora tem sido a promoção de aceitação
emocional e a difusão cognitiva como estratégias para romper a
esquiva experiencial, para superar os controles sócio-verbais que
empurram para as tentativas de controle dos pensamentos e
sentimentos, vistos como causa do comportamento.
Um dos exemplos interessantes sobre a tentativa de
controlar sentimentos pode ser visto no caso de Maria (recebeu esse
nome popular por representar muitos clientes com este padrão de
comportamento).

70
Maria Zilah d a Silva Brandáo

Maria, uma cliente de 30 anos, freqüentava o grupo para


ser menos ansiosa, menos “estressada”; seus padrões de esquiva
experiencial eram tão freqüentes e consistentes que pareciam uma
“característica inata de personalidade”. Ela respondia racionalmente
às experiências do grupo mesmo quando se emocionava; não
demonstrava sua emoção, apenas falava sobre ela.
Nos seus relatos sobre sua história de vida chegou um
dia a contar para o grupo que a mãe tinha tido um “problema” quando
ela tinha 10 anos e, em função disso, teve que se mudar para outra
cidade, deixando a filha e o irmão (dois anos mais velho) com o pai,
por 4 anos. Ao relatar esse fato a cliente falou tanto, explicando,
dando razões convincentes ao comportamento da mãe que o grupo
todo “entrou” na análise de Maria e não questionou as razões e as
justificativas dadas pelo cliente sobre o comportamento da mãe e
os sentimentos provocados por ela na cliente.
O grupo passou batido peia “frieza” inerente ao relato da
cliente. Estava óbvio o controle que a cliente exercia sobre seus
sentimentos e os do grupo; o rol de razões usadas como causa
para o comportamento da mãe e, principalmente, o controle da raiva,
mágoa, decepção e tristeza que o abandono da mãe havia lhe
causado.
O contexto sócio-verbal em que vivemos torna muito difícil
admitir raiva ou desprezo pelos próprios pais. Esses sentimentos
(dado esses contextos) geram culpa e vergonha. Como quase todos
os seres humanos têm sentimentos fortes (negativos e positivos)
com relação aos pais, a empatia pelos clientes do grupo que poupam
os pais é muito grande. Esse era o caso de Maria. Esse era o caso
do grupo. Presos no contexto que os mantinha na busca de controlar
a dor.
A terapeuta não poderia deixar passar essa oportunidade
de evidenciar o controle dos contextos sócio-verbais e de promover
aceitação, bloqueando a esquiva do grupo. A terapeuta também não
queria desrespeitar a dor da cliente e a empatia do grupo; escolheu,
então, uma estratégia indireta para lidar com o problema. Ela
começou dizendo que pais e mães são pessoas imperfeitas como
todos os seres humanos, e que só agora, com 40 anos, tendo
também vivenciado o papel de mãe, é que compreendia os ataques

71
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

agressivos de seu pai na infância quando ela o contrariava por coisas


sem grande importância. Um cliente do grupo falou que também
tinha sofrido muito com a falta de participação da mãe em sua vida,
em vários momentos, em que a mãe estava ocupada com outros
filhos ou problemas.
Vários elementos do grupo interromperam o relato da T.
e também começaram a falar de suas experiências e dores na
infância. Um cliente, que teve um pai muito autoritário, falou de sua
raiva e ódio por nunca ter sido ouvido pelo pai. Chorou ao contar as
situações nas quais teve que se submeter às vontades dele. AT.
validou a expressão de raiva do cliente mostrando que determinadas
situações inevitavelmente geram este sentimento.
Nesse momento, outra cliente perguntou para Maria se ela
não tinha raiva da mãe tê-la abandonado. Maria disse que não, que
tinha pena da mãe e entrou em outro rol de explicações.
A colega que havia feito a pergunta respondeu que achava
que ela estava protegendo, defendendo a mãe. Que as justificativas
dela pareciam esquivas. Por que você não teve raiva dela? Quatro
anos de afastamento dos filhos é algo sério. Maria permaneceu em
silêncio e outras pessoas do grupo contaram suas mágoas (as
dizíveis) sobre seus pais.
Em outras sessões, Maria foi reconhecendo seus
verdadeiros sentimentos com relação à ausência da mãe e até as
dificuldades atuais que vivenciava com ela. Maria também
reconheceu (e falou) da raiva que sentiu do grupo nesse primeiro
dia, quando foi sugerido que sua mãe tinha falhado muito e ela estava
tentando “tapar o Sol com a peneira”.
Maria realmente tinha acreditado nas explicações e
justificativas que foram montadas com relação ao abandono da
família pela mãe. A aceitação dos fatos e dos sentimentos que eles
provocavam, sem possibilidade de explicá-los, tornou a esquiva
desnecessária, reduziu a ansiedade e Maria desenvolveu
comportamentos sociais mais adequados.
Hayes (1997), numa conferência sobre a Integração das
Psicoterapias, disse que a esquiva experiencial é algo como “lobotomia
psicológica”, referindo-se ao déficit e limites comportamentais que

72
Maria Zilah d a Silva Brandão

ela provoca nas pessoas que as praticam e no trabalho de terapias


que impedem a experienciaçâo, Hayes continua dizendo que o suicídio
é uma tentativa de evitar dor, como por exemplo, o caso de uma garota
que tentou se jogar na frente de um trem porque a mãe estava
morrendo.
A sociedade contemporânea tem criado pessoas que cada
vez mais querem evitar a dor e obter prazer. Pais, escolas e outros
grupos sociais e comerciais facilitam a vida diária a tal ponto que
muitas vezes o contato com frustrações é raro ao ponto de levar ao
medo ou revolta na hora de vivenciá-las. Assim, criam-se pessoas
fracas, e não fortes.
Até este momento, as intervenções exemplificadas são
decorrentes do material que surge no “aqui e agora” das relações
grupais, a partir de interações entre membros do grupo, e dos seus
relatos “espontâneos” sobre as dificuldades que estão vivendo a
partir de seus problemas psicológicos que os trouxeram para a
terapia. No entanto, exercícios específicos têm se mostrado
necessários para problemas psicológicos graves (alguns tipos de
transtornos de ansiedade, como pânico ou transtorno obsessivo-
compulsivo), e também para “firmar" a posição e disposição dos
clientes de viver a idéia de aceitação emocional.
Walser e Pistorello (2004) sugerem que a ACT em grupos
possa manter as estratégias didáticas e vivenciais propostas para
o trabalho individual tal como exposto no Manual do Distanciamento
Com preensivo (Hayes, 1987) e na Terapia de Aceitação e
Compromisso (Hayes & Wilson, 1994).
As extrapolações para o trabalho de grupo não precisam
seguir a risca a seqüência dos exercícios apresentados, muitas
adaptações tem se mostrado úteis e até mais adequadas, no sentido
terapêutico.

3. ACT: aspectos didáticos e exercícios estru­


turados na terapia de grupo
”A sanidade mentaf não pode medir-se apenas pelo bem
estar.... E não será pagar caro, muito amiúde, suprimir o
sofrimento —mediante medicação ou diversão —em troca

73
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

da coragem e da lucidez? Será a saúde que se quer, ou o


conforto? A capacidade de enfrentar o real, ou a
possibilidade de fugir dele?”

“Muitos, constatando que a vida não corresponde às suas


esperanças, vão então acusar a vida, censurá-la
absurdamente por ser o que ela é (como ela seria outra
coisa?), enfim enterrar-se vivos no rancor ou no
ressentimento... Prefiro o alegre amargor do amor,\ do
sofrimento, da desilusão, do combate, vitórias e derrotas,
da resistência, da lucidez, da vida em ato e em verdade.
Prefiro a realidade, e a dureza da realidade. Se a vida não
corresponde às nossas esperanças, não é forçosamente a
vida que está errada: pode ser que sejam as nossas esperanças
que nos enganam, desde o início (desde a nostalgia primeira
que as alimenta), e que a vida só possa desde então não
desenganar. ” (Comte-Sponville, 1997, pp55).

A ACT, tanto na proposta para indivíduos quanto para


grupos, pode apoiar-se em estratégias didáticas que visem
promover a compreensão do trabalho a ser desenvolvido. A
apresentação didática também propicia oportunidades para o
terapeuta discutir o comprometimento do cliente para com a terapia
e sua concordância em passar por algumas estratégias que irão
mobilizar respostas emocionais.
Como sugestão, as primeiras sessões de grupo podem
enfocar a explicação do nome ACT e a questão da aceitação e fusão
cognitiva. Exempíos de processos grupais podem ser usados para
deixar .mais claro aos clientes experiências que eles passarão.
. Cuidado deveser tomado para não revelar tudo que será apresentado
aps clientes, pois os fatores desconhecimento e falta de previsibilidade
podem ser importantes em alguns momentos da terapia.
As estratégias didáticas também permitem criar um
melhor vínculo entre os membros do grupo antes que a vivência
dos exercícios tenha início. Em outros casos tais estratégias podem
servir para produzir contextos favoráveis ao desenvolvimento dos
exercícios ou para graduar o caráter aversivo de algum confronto.
Ao explicar didaticamente o que é ACT para os clientes, o
terapeuta pode falar da dificuldade em se fazer entender, uma vez

74
Maria Zilah da Silva Brandão

que a ACT é de difícil aceitação para todos porque é contrária ao


senso comum no que diz respeito ao que é problema psicológico e
suas causas.
Dizer que o problema não é o problema, que as razões
dadas aos problemas (sentimentos) não são suas causas e que
tentativas de controlar os sentimentos dolorosos são inúteis, dá uma
idéia ao cliente da diferença entre a ACT e outros tratamentos e
pode produzir um leve, mas produtivo, sentimento de desamparo
criativo (Hayes e Wilson, 1994).
Propor a aceitação do sofrimento humano em vez de
mudança comportamental para não sofrer mais, cria uma confusão,
mas, no fundo, o cliente já sabe que este é o caminho.
Deve-se explicar que a aceitação emocional diminui as
esquivas de situações importantes, das quais os clientes vinham
se esquivando para não sofrer, e aumenta o contato dos clientes
com situações reforçadoras.
Outros aspectos da ACT que podem dar início.as sessões
de forma didática são os esclarecimentos de valores dos clientes e
compromissos de agir em função das metas estabelecidas. E
comum que clientes voltem às questões de valores e metas no
decorrer da terapia, uma vez que a intimidade entre os membros do
grupo propicia o aprofundamento dessas discussões.
Depois da aceitação e em conseqüência das ações em
prol dos valores estabelecidos, novos e mais agradáveis sentimentos
e sensações poderão surgir e serem experienciados.
Uma cliente, com diagnóstico de stress pós-traumático,
vinha tendo crises de enxaqueca e insônia. A cliente relutava em
contar detalhadamente a história do trauma devido a um duplo medo
(assumido na sessão individual): medo das lembranças ruins e
medo da rejeição ou pena dos membros do grupo. Pensava em
resolver o problema ajudando “o outro”, fazendo ações voluntárias
em prol de pessoas agredidas, sem precisar se expor.
No entanto, a cliente também apresentava dificuldade em
sair de casa por muito tempo, o que vinha causando prejuízo à sua
vida pessoal e profissional.

75
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

O grupo explicou a ela o que era Terapia de Aceitação e


Compromisso, e ela se dispôs a “enfrentar” o grupo porque achava
que precisava melhorar, uma vez que seus valores e objetivos eram
bem definidos: trabalhar na Cruz Vermelha Internacional. Mas sentia-
se amarrada. Ela não conseguia falar do trauma e durante uma
sessão, quando o grupo a estimulou para contar, teve um
“desligamento” e não conseguia se conectar a nenhum assunto.
Neste momento, a terapeuta foi até a cliente, segurou-lhe a mão
enquanto o grupo as observava e voltou ao assunto, contando
baixinho para ela a historia do trauma que T. já sabia. Ela ficou
olhando-a apavorada e depois caiu no choro.
Alguns elementos do grupo foram até ela choraram juntos
ou demonstraram seu apoio. Em outras sessões ela foi conseguindo
falar do trauma, tolerar cada vez mais suas emoções produzidas
pelas lembranças e chegar à exposição da situação traumática de
forma cada vez mais descritiva e nua de adjetivos ou superlativos.
O grupo ouviu, fez perguntas, fez auto-revelações, e cada
um de seus membros demonstrou-se disposto a entrar no processo
de grupo e falar de suas dores.
Essa forma de trabalhar, usando explicações e as
interações do “aqui e agora” do grupo, em nada se opõe aos
exercícios estruturados, que podem ser desenvolvidos na mesma
sessão para aliviar o impacto negativo que algumas vivências da
ACT, colocadas diretamente, podem provocar no inicio do grupo.
No entanto, n w ça uma estratégia didática pode substituir
uma vivência ou uma experiência produzida por um exercício ou
análise do"“ãqüi e agora” da sessão do grupo.
A proposta da ACT, só para lembrar, é evitar o controle
excessivo, por regras na psicoterapia e produzir mudanças por meio
da recontextualização, permitindo que os contextos de literalidade,
da razão é controle sejam flexibilizados pela vivência grupai. Quanto
aos exercícios propostos no protocolo da ACT, estes são usados tanto
para o grupo quanto para o atendimento individual, mas a seqüência
pode ter variações. Com o desenvolvimento das sessões, muitas
das oportunidades de apresentar os exercícios são produzidas pelos
próprios clientes. Em alguns momentos do processo, dada a avaliação
do progresso ou dificuldades encontradas pelo grupo, a terapeuta

76
Maria Zilah d a Silva Brandão

prepara os exercícios que poderão ser úteis, mesmo que alguns deles
já tenham sido vivenciados.
Os exercícios para cada meta da ACT, descritas neste
capitulo, são apresentados aos clientes, sendo que alguns têm se
mostrado mais “naturais” e produzido melhores resultados, segundo
avaliações informais do terapeuta e mudanças do comportamento
do cliente na sessão.
É o caso dosexercfcios para promover o contexto do self,
que podem ser apresentados, segundo Walser e Pistorello (2004),
no começo ou fim de cada sessão grupai. Essa repetição dos
exercícios pode ser usada mesmo em terapia individual, tornando a
experiência do self, como contexto, natural no dia-a-dia dos clientes.
As explicações sobre o self como contexto tendem a criar
certa confusão entre os clientes do grupo, mas essas sensações
podem ser aproveitadas para trabalhar desesperança criativa, falta
de controle e aceitação, £ J s e ií”. çomo contexto é definido como
uma perspectiva de ver a vida a partir de um referencia! unico e
[mutável que permite ao indivíduo “se ver” e "ver o mundo” sem se
confundir com ele. O “eu” não é o seu comportamento; não é seu
sentimento, pensamento ou ação. É o observador de tudo isso; o
contexto em que tudo ocorre.
A metáfora do tabuleiro de xadrez (Hayes, 1987) é muito
interessante para o cliente entender e vivenciar seu eu. É pedido
aos clientes que fechem os olhos e imaginem em jogo de xadrez
em que as peças brancas são seus pensamentos e sentimentos
bons e as pretas os ruins. Todos estão alinhados em cima do tabuleiro
e o jogo começa. Vocês ora correm com a peça branca, ora com a
peça preta. Vocês se sentem divididos nesse jogo. Assim, quem
vocês precisariam ser para sentirem-se melhor? As peças brancas
ou as pretas? A pergunta é lançada ao grupo que fica a vontade para
discutir sua experiência e responder a pergunta. A resposta certa é
que-eles precisariam ser o tabuleiro, onde o jogo acontece.
Outro exercício, para desenvolver o “eu observador"
consiste em pedir aos clientes que, sentados, fechem os olhos e se
imaginem em pé na porta da sala olhando para si mesmos. Depois
de alguns minutos a T pergunta: quem viu você sentado aqui? Quem
estava lá na porta? Por que esse desdobramento do “eu” é possível?

77
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Abrir mão das tentativas de controle dos sentimentos


dolorosos também é uma necessidade constante no processo de
grupo. Dois exercícios são interessantes. O “algemas chinesas”,
no qual as pessoas ficam com os^ dedos presos em canudos de
palha se tentarem tirá-los com força. Só com jeitinho, sem forçar,
eíèslrão sálr. A"reação do grupo é de estranheza e nenhuma
explicação deve ser dada até que todos terminem o exercício e
discutam suas sensações.
Outro exercício para abandonar o controle é o “cabo_.de
guerra”, luta imaginária, à beira do precipício, entre ansiedade
(imagine um dragão) e o cliente tentando controlá-lo. Quem vai ganhar
a luta? Quem vai cair no precipício? Como vencer a luta? As melhores
respostas são as que sugerem largar a corda, abandonar a luta
contra a ansiedade e aceitá-la.
O grupo oferece boas oportunidades para exercícios de
difusão de idéias. A “fala convencionada" é o mais fácil deles, e pode
se tornar um hábito entre as pessoas do grupo. Assim, em vez de
dizer que “meu marido acordou com cara feia e queria me provocar
para poder sair de casa....” poderia ser dito “eu achei que meu marido
acordou de cara feia e pensei que ele poderia querer...”. Esta simples
mudança deixa clara a diferença entre o fato (estar de cara feia) e o
julgamento do fato (eu acho que está).
Outro exercício de difusão cognitiva bem interessante para
grupos, proposto por Walser e Pistorello (2004), consiste em pedir
a todos que escrevam, em cartões, seus principais defeitos e depois
os cotem em suas roupas, para que possam ver um ao outro e ler
seus cartões enquanto passeiam pela sala. Depois de um tempo
as pessoas se acostumam com o que está escrito e as palavras
vão se livrando de seus significados. Õ grupo fica ligado apenas
nas pessoas. Há uma perda de respostas ao contexto de literalidade.
Outro exercício é o de disposição e aceitação, escrito na
integra por ser muito útil e interessante para grupos de ACT. Proposto
por Walser e Pistorello (2004), funciona destacando as diferenças
entre^dqr e trauma, usando uma abordagem didática e interativa.
Utilize um quadro “negro" e desenhe um círculo. Enquanto
escreve no seu interior a palavra “d o r, explique que ela é inavitável
na vida. Independentemente se somos “bons” ou “habilidosos”

78
Maria Zilah da Silva Brandão

alguma dor vai acontecer, seja ela alguma morte inesperada ou não
conseguirmos uma promoção, dentre outras. Explique que não há
forma de evitar completamente a dor} mas que se deve avaliar “o
que é que nós tentamos fazer quando experimentamos dor?”. Peça
aos integrantes do grupo para que mostrem algumas formas de
como evitamos a dor. Ao dizer isso desenhe um círculo maior em
volta do primeiro, e escreva o que eles dirão entre os dois círculos.
Algumas das estratégias que eles dirão provavelmente serão a de
beber, buscar brigas, trabalhar longas horas, tentar suicídio e vários
outros. Então, perceba que o círculo vai crescendo: nós sentimos
dor, então bebemos, faltamos às aulas, e depois nos culpamos por
faltar às aulas. Depois de cada camada desenhe outro círculo em
volta e explique que o círculo mais interno de dor é somente isto.
Então escreva “trauma” no círculo mais externo, observando que,
por não aceitar a dor, criamos o trauma.
Os membros do grupo freqüentemente referem-se aos
círculos nas sessões seguintes. Isso pode servir de gancho para
perguntar aos clientes que estão discutindo suas lutas: ‘Você acha
que está dentro ou fora do círculo?”. w
Em sua maioria, as experiências aversivas que tentamos
evitar ou controlar, tornam-se medos de rejeição interpessoal. O
grupo é um meio rico para a exposição e transformação das funções
de estímulos de tais eventos privados. Outros exercícios podem
contribuir para o movimento terapêutico.
Um exemplo disto é o exercício “olhar para”, no qual os
indivíduos sentam-se de frente um para o outro em pares. São
instruídos a olhar o outro nos olhos, sem conversar ou se comunicar,
enquanto percebem as reações e as deixam acontecer. Algumas
das respostas defensivas mais freqüentes são as de risos,
ansiedade e esquiva do contato visual.
Oriente os participantes com sentenças do tipo: “perceba
que os olhos para os quais você está olhando são humanos”; “deixe
qualquer restrição que você tenha sobre a outra pessoa e permita-
se estar com ela". Continue esse processo por mais três ou 5
minutos e, então, permita que os membros do grupo compartilhem
entre eles suas experiências. Evite expressar interpretações
premeditadas em relação aos comentários deles. Este não é um

79
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

momento adequado para apontar comportamentos de esquiva sutis,


apenas ouça. Waiser e Pistorello (2004) relatam que este exercício
foi unanimemente declarado como o mais benéfico da terapia, em
um dos seus grupos.
O objetivo da ACT é a construção de ação comprometida,
e o contexto de grupo pode ser bem útil para se conseguir motivação,
já que comprometimentos feitos em grupo são mais prováveis de
serem seguidos.
Um exercício de comprometimento é conhecido como a
“GrandÊ^lhada". Ela consiste em fazer com que todos os membros
sentem-se e, um por um, devem ir até a frente e passar um ou dois
minutos olhando nos olhos de cada cliente, despindo-se de todas
as suas defesas. Isto deve acontecer com o silêncio dos membros
do grupo e com o encorajamento verbal da terapeuta.
Você pode encontrar um cliente que se recuse a se
levantar e se comprometer na frente do grupo. Quando isso
acontecer, direcione-se a outro membro, fazendo assim com que o
outro membro saiba que retornarão em alguns minutos.
Já que este tende a ser um exercício poderoso, é
necessário compaixão por parte da terapeuta. Mas se o cliente ainda
se recusar, continue. Ele saberá que o problema é fusão com o
conteúdo negativo e é importante que você converse com ele após
o exercício.
A prática clínica tem demonstrado uma ótima aceitação
do exercício “motorista do ônibus” proposto por Hayes e Smith (2005);
Wasíere Pistorello (2004); cuja vivência pode levar a vários objetivos
tais como desenvolver o contexto do self; praticar difusão cognitiva;
e manter compromisso com a ação e direção escolhida. Deve-se
fazer com que o grupo represente fisicamente um ônibus com um
dos clientes como motorista, e os outros como passageiros (pode
ter um ou dois observadores). Cada passageiro já deve ter recebido
antes um cartão (ou recebido instrução) dizendo qual o seu papel
como passageiro. Urn será ajansiedade pedindo para parar, outro
será a raiva gritando_gue está no caminho errado, e outro pode ser
a crítica dizendo que está dirigindo mal ou o medo dizendo que o
ônibus vai bater. O motorista deve continuar na direção que tinha

80
Maria Zilah d a Silva Biandão

estabelecido mesmo que as dúvidas, os gritos, e os sentimentos


contraditórios estejam presentes. O grupo, em silêncio, de olhos
fechados4isso pode ser sugerido em quase todos os exercícios), ,
pensa no que acabou de viver, e depois discute suas impressões.
Para finalizar este capitulo, nada melhor do que voltar a
falar de aceitação como saída para a esquiva emocional. Um cliente
do grupo, que já tinha sido tratado de TOC na terapia individual,
apresentou dificuldade em praticar aceitação de seu sofrimento
causado pelas obsessões, e o grupo tentou ajudá-lo usando
exemplos pessoais, pedindo sua disposição para vivenciar o que
estava sendo proposto, sem relutar. A sua resistência em aceitar o
sofrimento mobilizou o grupo. AT. pediu que ele durante a meditação,
no inicio da sessão, olhasse para seus pensamentos obsessivos
como se eles fossem parte de um filme, no qual ele não tinha controle
sobre as próximas cenas, e que fosse falando em voz alta o que
estava sentindo e que não tinha controle sobre isso. Na terceira
repetição o cliente caiu no choro e gritou que não queria mais pensar,
que estava cansado e que não tinha cura. Os membros do grupo se
aproximaram e o confortaram dizendo para ele não entrar na luta e
aceitar sua angústia. Quando o cliente parou de chorar a T. disse
que ele estava tendo três sofrimentos: um pela dor real da obsessão;
o segundo por lutar contra ela e assim torná-la mais poderosa; e o
terceiro por estar parado, perdendo oportunidades de ter prazer em
outras atividades do seu dia-a-dia. Quantas dores você quer ter?
Só a primeira é real e inevitável!
Alguns membros do grupo concordaram e deram
exemplos de como tocaram sua vida em direção aos seus valores,
apesar da dor e de outros sintomas psicológicos.
O uso de metáforas também é uma excelente forma de
agir indiretamente, evitando o controle instrucional na terapia; uma
metáfora, colocada na hora certa pode produzir material importante,
reduzindo esquivas e graduando o contato com a dor.
Hayes e Wilson (1994) descrevem várias delas, que se
tornaram imprescindíveis na aplicação formal ou informal da ACT.
A aceitação emocional não é apenas uma proposta de
psicoterapia, ela é uma necessidade humana, buscada pela filosofia,

81
Terapia Analftico-Comportamental em Grupo

pela religião e outras áreas, como forma de lidar com o sofrimento e


não de evitá-lo.

4. Resumo da ACT - Definição; bases filosóficas


e teóricas; proposta original de intervenção
clínica e pesquisas com grupos

“Não é a vida que a pessoa recusa; é o sofrimento> é a


velhice, é a doença, é o isolamento... Não é a felicidade
que ela despreza; é da infelicidade que foge. “Todos os
homens buscam ser felizes'', dizia Pascal,"até aqueles que
vão enforcar-se. ” Matam-se para não sofrer mais, para não
ser mais infelizes. Isso ainda é procurar a felicidade que é
fugir do sofrimento. O suicídio não escapa ao principio de
prazer... Não se dá fim aos seus dias senão por sofrimento
ou tristeza... ’’(Comte-Sponville, 1997, pp 47).

Muito já foi dito sobre ACT neste capítulo, mas,


considerando a pouca literatura no Brasil sobre essa área,
foi acrescentado esse tópico que pode fornecer melhor base para
terapeutas que são iniciantes no assunto e, também, oferecer alguma
idéia sobre pesquisa nesta área.
A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) é baseada
na visão de que a linguagem coloquial pode ser fator responsável
por muitos problemas do sofrimento humano. Essa terapia integra
conhecimento científico sobre comportamento modelado por
contingências e relações verbais, o que torna o contexto terapêutico
mais eficaz. A ACT está ligada a um programa de pesquisa básica
por ter um compromisso com uma análise com precisão, e tende a
não ver sentimentos ou pensamentos com causas no sentido
mecânico (Hayes, Strosahl, Bunting, Twohig & Wilson, 2004).
ATerapia de Aceitação e Compromisso tem como objetivo
fazer com que o cliente aceite seus estados do organismo,
pensamentos e emoções, considerados por ele como aversivos.
Quando a pessoa pára de lutar contra seus próprios pensamentos,
sentimentos e emoções, ela pode agir de diferente maneira no

82
Maria Zilah d a Silva Brandão

ambiente a fim de ter resultados mais produtivos para o seu bem


estarJHayes, 1987).
J|sta terapia tem como base teórica a Teoria dos Quadros
Relacionais (RFT). A RFT é uma teoria da linguagem e cognição
humana, que tem como ponto central a premissa de que humanos
aprendem a relacionar eventos sob controle contextuai arbitrário.
Humanos, como também não-humanos, são capazes de responder
a relações de estímulos que são definidas pela propriedade formal
de eventos relacionados (relações não-arbitrárias), por exemplo,
escolher o maior de dois objetos, independentemente de quais
objetos são comparados. Mas apenas humanos conseguem ter o
responder relacionado com o controle contextuai e aplicá-lo em
eventos que não são relacionados formalmente.
A baseiílosófica da ACT é uma variação do pragmatismo
conhecida como Contextualismo Funcional. O Contextualismo vê
os eventos psicológicos como uma interação entre o organismo e o
contexto, que podem ser definidos historicamente (história de
aprendizado) e pela situação (antecedentes e conseqüentes atuais,
regras). Ações comuns podem ser utilizadas para ilustrar esse
modelo, por exemplo, ir a uma loja. ir a uma loja implica uma razão
para ir, um lugar, um meio para se chegar lá, tudo isso junto. Se o
todo se perde, a ação perde o sentido. Esses eventos implicam
uma interação do organismo com o ambiente, e são eventos com
uma história e propósito (Hayes et al., 2004).
Q processo clínico da ACT foi descrito em detalhes pela
primeira vez no Manual de Desesperança Criativa (Hayes, 1987). A
proposta de intervenção veio bastante detalhada e com várias
metáforas e exercícios para cada passo do processo terapêutico.
Asjrie ta s são resumidas a seguir.
Meta 1 - estabelecer um estado de desesperança criativo - nesta
etapa tenta-se quebrar as regras e estratégias que o cliente possui
para fugir ou se esquivar de seus pensamentos. O Terapeuta deve
indicar para o paciente que todos os seus comportamentos
apresentados até agora não surgiram efeito “benéfico” em suas
emoções aversivas, pelo contrário, tais emoções em alguns casos
até aumentaram de freqüência, portanto, o cliente deve abandonar
todos os comportamentos que envolvem a tentativa de controlar os

83
Terapia Analítico-Camportamental em Grupo

pensamentos. Nesta etapa, a literalidade das palavras é posta em


cheque pelo terapeuta; literalidade se refere ao conceito que certas
palavras têm para a comunidade verbal, por exemplo, a palavra
ansiedade tem valor ruim, aversivo para nossa sociedade.
Na meta 2 - 0 problema é o controle - o terapeuta enfatiza que,
mujtaavezes, a tentativa de controlar os pensamentos e sentimentos
se torna o próprio problema. Ou seja, o cliente tenta, de várias
maneiras, controlar suas emoções aversivas; tais tentativas são
fracassadas, o que traz maior desconforto psicológico para o cliente.
Sendo assim o terapeuta deve enfatizar a dificuldade que se tem
em controlar os sentimentos, além disso, deve levar o cliente a aceitar
suas emoções de modo natural.
Na meta 3 - Distinguir as pessoas de seu comportamento - é
er^inado para o cliente a discriminar o que está pensando do~qüe
realmente estáacontecendo. Mostrar para o cliente que sensaçoÜs
e pensamentos, muitas vezes não correspondem ao estado real
das coisas, e que essas emoções não impedem de realizar nenhuma
de suas ações, em suma, que pensamento não é causa de
comportamento. Nessa meta é, também, esclarecer para o cliente
como os pensamentos diferem de pessoa para pessoa, como
esses são particulares da história de vida de cada organismo,
exemplificando para o cliente que o mesmo evento ambiental pode
evocar diferentes comportamentos em diferentes pessoas.
Na meta 4 - Permitir que a luta pare - o cliente, com o auxilio do
terapeuta, "deve perm itir quèalU faparê^ ou seiã, o cliente “acèitã”
seus_sentimentos fazendo parte da sua naturalidade, apresentapdo
um jjjlis L d e tõlerancia maior aos pensamentos aversivos. O
terapeuta deve elucidar que sentimentos aversivos fazem parte da
vida de todos e que temos que aprender a conviver e aceitá-los.
Nas meta 5 - Assumindo um compromisso de ação o clienle
ãgç>ra mais preparado deve assumir um com prom issojle ação, ou
seja, junto com o terapeuta deve^fraçarestrãíègiàs para uma
intervenção efetiva nas contingências, assumindo compromisso de
açiíu a mudança de seu comportaméTrto."
Recentemente, foram realizadas várias publicações na
área que sugerem seqüências e exercícios de intervenção clínica

84
Maria Zilah da Silva Brandão

modificados, alguns com propostas interessantes e dirigidas a


grupos específicos, como por exemplo, o livro de Hayes e Smith
(2005) que é destinado a clientes e o dos autores Luoma, Hayes e
Walser (2007), que é um manual treinamento de terapeutas.
O modelo de intervenção da ACT, de 1987, foi atuali
em vários momentos da obra de Hayes, embora sua essência
sempre tenha continuado a mesma, e pode ser descrito por seis
processos (Strosahl, Hayes, Wilson & Gifford, 2004):
1. Aceitação - envolve tomar uma pnstura de não-iulaarnento e
de levar em consideraçãp...a.experiência de pensamentos,
sentimentos e sensações corporais como eíaa. ocorrem. O
cliente “aceita” seus sentimentos como fazendo parte de sua
natureza, para passar a apresentar um nível de tolerância maior
aos pensamentos aversivos. Para ajudar o cliente a promover
a aceitação, o terapeuta pode, por exemplo, pedir pra que ele
escreva sobre eventos dolorosos.
2. Difusão cognitiva - A tendência que os humanos têm de viver
em um mundo excessivamente estruturado pela linguagem
literal é chamada de Fusão. Humanos normalmente não
conseguem distinguir uma palavra conceituada verbalmente
de uma que está sendo diretamente experienciada, ^ o bjetivo
da ^ifnfiãn nnqnjtiva é ajudar o c liente a detectar as
^propriedades escondidas da linguagem qué produzenLessa
fusão. Ó terapeuta pode ensinar o cliente mudar a linguagem
na sessão para descrever éventos privados.
3. Entrar em contato com o momento presente - AACT promove
'ifetivo, aberto e indefeso contato com o momento presente.
Para isso os clientes são treinados a observar e notar o que
está presente no ambiente e em experiências privadas. Depois,
é pedido a eles que descrevam o que está presente, sem
julgamento ou avaliação excessiva. Isso os ajuda a começar
a descrever suas experiências.
4. “f ifí ir como contexto - Ajuda o cliente a distinguir entre
experiências humanas privadas e o contexto em que essa
experiência acontece. Os sentimentos e os pensamentos, que
não eram distinguidos da pessoa que sentia ou pensava, têm

85
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

que passar a serem vistos como produtos de uma história


comportamental. O terapeuta deve ajudar o cliente a perceber
que ele não é seus pensamentos, memórias, emoções.
5. Valores- A ACT ensina aos clientes a distinguir entre escolhas
.e lulqámefffõsTe a selecionar valores~còmo omH^uebtt3Qj3e_
esco]ha; Õs clientes são desafiados a corisíclèTãr o que eles
querem em diferentes áreas de sua vida.
6. Ação e nf>fnprnmis$o —o compromisso envolve definir metas
em áreas especificas e agir sobre essas metas. O cliente,
junto com o terapeuta, deve traçar estratégias para uma
intervenção efetiva nas contingências. A meta é construir
padrões comportamentais que comecem a trabalhar a favor
do cliente, e não contra eles.

em que este pára d e ^ e e s q u iv a ^^e s e ^ 0 pensamentos e


sentimentos considerados aversivos e que entra em contato com o
( contexto que evoca tais sentimentos, provavelmente as emoções
aversivas associadas a esse evento perdem força e entram em
extinção. Outro beneficio é o contato com reforçadores que em
virtude do comportamento de esquiva não eram experienciados, ou
f seja, o cliente entra no contexto que antes se esquivava ou fugias
i obtém reforçadqresiesaÊ.Jí.ontext9 . Um terceiro benefício é_o_
„aumento do potencial para a ação produtiva, sendo assim o cliente
j mafi^itac Ho agir nrTrnnteytn averfiivo obtendo
í melhores resultados de sua interação com o mesmo (Brandão,
| 1997).
Enfim, a Terapia de Aceitação e Compromisso ganhou,
nessa última década, grandes adeptos no mundo. Tal terapia sofreu
muitas criticas por parte dos Analistas do Comportamento por ser
considerada “cognitivista”. Porém está idéia já está ultrapassada e
novos estudos sobre esta área têm sido desenvolvidos.
Muitas pesquisas na área clínica têm mostrado a diferença
entre as duas abordagens e a ACT e mais efetiva. Uma pesquisa
em particular pode mostrar a confibialidade das medidas utilizadas
e apresentar excelentes informações para o terapeuta trabalhar com
fobia social ou outras queixas.

86
Maria Zilah d a Silva Brandão

O artigo escrito por Ossman, Wilson, Storaasli & McNeiil


(2006) procurou investigar o impacto da Psicoterapia de grupo
baseada na Terapia de Aceitação e Compromisso, proposta por
Steven Hayes com clientes fóbicos sociais e teve como principal
objetivo investigar o efeito da ACT no tratamento de indivíduos com
fobia social, explorando a efetividade da ACT na diminuição do nível
de evitação experiencial, o impacto desta estratégia no tratamento
dos sintomas da fobia social em comparação com intervenções
cognitivo-comportamentais e mudanças no valor das relações
sociais e amizades para os participantes.
Atualmente, a terapia cognitivo-comportamental é o modelo
mais disseminado e pesquisado de tratamento para a fobia social,
incluindo inúmeras estratégias clínicas, ora de forma isolada, ora
de forma combinada com outras técnicas. Dentre as formas de
tratamento cognitivo-comportamentais mais estudadas, encontra-
se a psicoterapia de grupo cognitivo-comportamental. que combina
técnicas de reestruturaçao cognitiva, com sessões de exposição,
além de instruções para os clientes praticarem as habilidades
aprendidas nas situações cotidianas no contexto socjaií. No caso
da fobia social, a principal premissa que guia as intervenções
cognitivo-comportamentais é a de que os indivíduos podem superar
ou manejar os sintomas de ansiedade através da mudança do
conteúdo e da forma dos eventos cognitivos ou comportamentais.
Já a ACT, como estratégia de intervenção comportamental, v?
difere do modelo cognitivo-comportamental, visto que não implica /
apenas am ujança, alteração ou eliminação dos conteúdos privados, ■
mas considera' a tentativa de controle ou Tnudança do conteúdo
psicológico como probl^m4tiCQS, e desta maneira não avalia a
presença da experiência privada indesejável como alvo definitivo d o ,
processo de mudança comportamental.
No caso da ansiedade social, ligada intimamente à
evitação experiencial, definida como um processo comportamental
em que a pessoa evita contato com determinadas situações e
experiências por medo das sensações, sentimentos, pensamentos
que as situações evocam. Nestes casos, a ACT pode ser utilizada
na tentativa de passar do enfoque na forma e no conteúdo do medo
de eventos psicológicos, para mudanças no contexto e na função
do responder que sustentam o ciclo de sofrimento psicológico.

87
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

No estudo foram incluídos 22 participantes (11 homens e


11 mulheres) que foram recrutados via anúncio de jornal e,
posteriormente contatados por telefone. Neste primeiro contato por
telefone foi administrado,, ainda um breve “inventário”, com as
categorias diagnósticas do DSM para a fobia social. Estes
participantes foram divididos em três grupos, e receberam a mesma
intervenção, realizada terapeutas-estudantes, treinados para intervir
utilizando ACT.
No protocolo de pesquisa havia 10 sessões, com dura­
ção de 2 horas cada uma, sendo adotados inúmeros padrões
comportamentais baseados na aceitação e organizados em torno
dos 6 eixos principais. Estes foram integrados às sessões de trata­
mento utilizando-se para isto metáforas e exercícios de grupos
experienciais. Além disso, foram incorporados no estudo quatro
medidas dependentes, uma medida de resultado principal e três
processos de medição. A medida principal e os processos de medi­
ção foram administrados durante a etapa iniciai da terapia.
Para a medida principal foi utilizado o Inventário de fobia
social e ansiedade, que avalia aspectos somáticos, cognitivos e
comportamentais da fobia social através de uma ampla gama de
ambientes e situações sociais. Já para os processos de medição,
foram utilizados o Questionário de Aceitação e Ação, que objetiva
principalmente medir a disposição individual para a experienciação
de sentimentos e pensamentos e a capacidade para se engajar em
ações que propiciem superá-las; a Escala Multidimensional de
Controle, que procura mensurar a percepção dos indivíduos quanto
ao nível de controle individual em relação aos eventos cotidianos ou
dos outros e o Questionário de “importância da vida”, que investiga
os domínios da vida considerados mais im portantes pelos
participantes.
Os resultados encontrados nos estudos apóiam a
premissa que, com a utilização da ACT, pode-se reduzir a evitação
experiencial e aumentar a adoção de valores nos relacionamentos
sociais, além da diminuição dos sintomas de fobia social entre os
participantes. Além do mais, a escala individual de adoção de
relacionamentos sociais e de amizade aumentou significativamente
ao longo das 10 sessões, além da sessão de acompanhamento,
após cerca de três meses depois de finalizada as intervenções.

88
Maria Zilah da Silva Brandão

Enquanto a medida da fobia social não tenha sido alvo


direto da intervenção terapêutica, os dados obtidos mostram redução
no pós-tratamento e a redução foi mantida no acompanhamento.
Esta positiva correlação entre a diminuição da evitação experiencial
e os sintomas de fobia social é algo importante para estudos futuros.
De forma geral, é importante salientar que a fobia social considera
possível alcançar am plas metas terapêuticas sem adotar,
necessariamente, a redução de sintomas como meta do tratamento.
Entre as limitações do estudo podem-se citar a ausência de
condições formais de um grupo controle, bem como a amostra
relativamente pequena de participantes.
Os resultados aqui apresentados têm algo de sério e
surpreendente ao apontar que a redução da esquiva experiencial e
a promoção de aceitação emocional pode produzir aumento de
comportamentos que eram conseguidos por estratégias especificas
para lidar com ansiedade, tais como dessensibilização sistemática,
reestruturação cognitiva, estratégias de enfrentamento e exercícios
de relaxamento.
Hayes, (1997), numa conferencia no Canadá, sugere que
as diversas psicoterapias, de diversas abordagens, pudessem ser
integradas por meio de processos considerados universais,
observados em todas elas. A redução da Esquiva Experiencial e a
promoção da Aceitação parecem atender perfeitamente aos
requisitos a ser adotados no processo de integração das
psicoterapias. Kohlenberg (1997), na mesma ocasião, também
sugere a análise da relação terapêutica como base para a tal
processo.
Por tudo que foi discutido neste capítulo, espera-se que
fiquem claras a seriedade da proposta da ACT, a sua coerência com
os princípios do behaviorismo radical e riqueza do material já testado
e disponível para a clínica, individual e em grupo, o que é um presente
para terapeutas que procuram intervenções eficazes para os clientes,
mas que também atendam a audiência cientifica.
As fobias, não os medos, poderiam ser evitadas se, no
inicio de tudo, aprendêssemos a valorizar e respeitar a dor inerente
às situações inevitáveis e às contingências que as acompanham.
Não temos controle sobre a dor, apenas podemos nos comportar

89
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

(em algumas ocasiões) de formar a produzir contingências menos


aversivas. Os sentimentos, então, possuem esta característica da
incontrolabilidade que tanto incomoda. Quanto mais você se esconde
mais o medo aparece!

Costuma-se distinguir o medo, que suporia um perigo real, da


angustia, que só se basearia nos perigos imaginários, até
mesmo não teria objeto. E, por certo, não é a mesma coisa ter
medo de um cão real, que ameaça você, e de sabe-se lá o quê,
que oprime você. Será tão simples, porém? (Comte-Sponville,
1999, pp 13).

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91
Capítulo 3
O trabalho em grupo
para ansiedade de
desempenho
Caroline Guisantes Salvo, Gabriela
Mello Sabbag, Taísa Borges Grün, Yara
Kuperstein Ingberm an *1

1. Manejo da ansiedade em grupos

Q ritmo de vida moderno tem sido contexto para um


aumento..significativo .das-diversas manifestações comportamentais
da ansiedade (Banaco, 2001). Devido a esta grande demanda,
observa-se um vasto acervo de pesquisas sobre esta classe de
comportamentos, sendo inclusive um dos grandes temas de pesquisa
em Psicologia (Pessotti, 1978). Para este autor, a ansiedade implica
a ocorrência de uma condição aversiva ou penosITalgum grau de
Tncerteza oudiJvidã"_e_aJguma forma de impotência do organismoem
ümà dada conjuntura. Segundo Banaco (2001) o modelo skinneriano
de análise caracteriza-se por considerar qualquer manifestação
humana, seja ela interna ou externa, como comportamento. Assim,
na análise do comportamento, a ansiedade é considerada uma
resposta, sendo que é nominada como tal a partir do~reforço dadõàs r /
descrições dessas repostas pela comunidade 'sócTo-verbal, que <
partilha das mesmas ÇQrSinatel^.Qburinhp^1999). Segundo Silva
■72ÕÕÍ), Skinner se refere à ansiedade como o nome usualmente dado

' IEPAC - Instituto de Estudos e Psicoterapia Analítico Comportamental, Curitiba, PR.

95
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

a condições resultantes da presença.dfinjtnestímub. jaue__a precede


tipicamente um estímulo aversivo, com um intervalo de tempo
suficiente para que se observem mudanças comportamentaisi fortes
respostas emocionais, elas próprias aversivas, respostas do sistema
nervoso autônomo, comportamento de esquiva, interferência-HQ
comportamento operante. A condição antecedente pode ser composta
por múltiplos estímulos: tanto se o evento aversivo foi inêspérado^ou
se genèrãíízãdoTÃssímro indivíduo pode não apenas esquivar-se do
éSTÍmulo aversivo, como a própria reação de ansiedade. Para Banaco
(2001, p. 204) a ansiedade é definida como “um conjunto de respostas
reflexas eliciadas por um estímulo aversivo que interferem sõEre ações
operantes”, dessa forma suprimindo comportamentos positivamente
reforçadores e facilitando operantes negativamente reforçados.
Banaco e Zamignani (2004), ao se ocupar do fenômeno clínico da
ansiedade, a definem com base em três_contingências: (1) quando a
ansiedade implica comprometimento ocupacTõnáT do indivíduo,
impedindo o desempenho adequado de atividades profissionais,
acadêmicas e sociais, (2) quando envolve sofrimento considerado
significativo pelo indivíduo e (3) quando resposta de fuga e esquiva
ocupam tempo considerável do dia. Segundo os autores, esses casos
são tratados pela literatura médica e psicológica como transtornos
{d e ansiedade. Assim, para uma descrição tnpngráfira da ansipriarip
yj-teríamos a descrição da taquicardia, sudorese etc. (comportamentos
rj reflexos) e na descrição funcional além das respostas observadas
i
no indivíduo, os estímulos desencadeantes do reflexo e as
—------------------------- ------------------------ --------------------— -------------- —— ----------------------------------------------
conseqüências mantenedoras da fuga.
Lundin (1972/2006) aponta três condições que ocorrem
freqüentemente na vida diária e que se enquadram na definição
operacional de ansiedade: 1. Impossibilidade evidente de fuga: o
organismo não pode fugir do estímulo aversivo; 2. Antecipação da
punição: a punição é anunciada e posteriormente executada; e 3.
Separação do apoio: a retirada de um reforçador positivo como
punição, passando ser essa situação aversiva. Segundo Lundin
(1972/2006), nem todo o organismo reage da mesma forma quando
colocados em situações ansiógenas. É a partir da análise dos
eventos da história de reforçamento do indivíduo que podemos
entender essas diferenças. O autor destaca alguns pontos
importantes na história de condicionamento do sujeito que devem

96
Caroline G. Salvo. Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

ser levadas em conta: 1. A punição que é inevitável, de esquiva \


impossível e precedida por alguma forma de ameaça, está
literalmente treinando a criança em ansiedade. 2. Treinamento
perfeccionista: pais exigentes que esperam dos filhos desempenhos
sempre melhores, quando não atingidos, geram ocasiões para
condicionamento aversivo dos filhos, uma vez que estes sabem
que serão punidos por não alcançarem as metas que os pais
estipularam. Outro ponto a ser ressaltado, são os casos de Jares
nos quais o padrão dominante é o de ansiedade. A Imitação seria
uma forma de se adquirir padrões comportamentais ansiosos, uma
vez que o comportamento de outro organismo pode constituir
exemplos (estímulos discriminativos) para respostas que conduzem
a reforçamento. O último ponto relativo à ansiedade seria o da
generalização da ansiedade. Nele, o autor ressalta que a ansiedade,
uma vez condicionada, funciona aumentando e espalhando seus
efeitos, sendo que sem prevenção há uma intensificação das
respostas com a passagem do tempo.
Quanto à generalização da ansiedade. Lundin (1972/2006,
pág. 448) coloca que “no processo de condicionamento da ansiedade
crônica, freqüentemente se desenvolve uma variedade de respostas
emocionais. Sendo que cada resposta está condicionada a um
estímulo específico que pode provocar a ansiedade quando
apresentado”. Como cada um dos estímulos originais pode ser
generalizado, acaba por haver uma ansiedade crônica, já que existem
muitos estímulos que produzem reações de ansiedade, mais as
generalizações. Assim, se as respostas não se extinguem, crescem
em magnitude e a pessoa vive em estado de ansiedade permanente.
Em crianças, além das respostas descritas anteriormente,
há predomínio de queixas somáticas. Também", parecem existir
certas situações associadas ao início ou aumento da ansiedade,
como ingresso na escola, mudança de casa ou escola. separagão
oifperda dos pais, jjravidez da mãe,,nascimento de irmão, doença
ou hospÍía[ízação da própria criança. Segundo Malagris e Castro
(2000), a criança ansiosa se estressa com praticamente todos os
eventos de vida, pois constantemente antecipa fracassos, e
experimenta sintomas desagradáveis frente a atividades simples,
como fazer lição, avaliação ou ir à escola. Para as autoras (pág. 92)
na criança ansiosa “o stress que ela sofre para enfrentar cada

97
Terapia Analítlco-Comportamenfal ©m Grupo

situação vista como ameaçadora acentua os sintomas e contribui


para que a criança reforce uma baixa auto-estima normalmente já
existente”.
A ansiedade, conforme citam Banaco e Zamignani (2004),
é um tipo de evento muito descrito por clientes que buscam
psicoterapia. Assim, diversos métodos foram criados para o seu
tratamento. Entre estes métodos, podem-se destacar os trabalhos
em grupo envolvendo diversas técnicas, que, obviamente, sempre
prescidem de análise funcional.
-— Rose (1977) cita alguns procedimentos comumente
$}. usados no tratamento de problemas relacionados à ansiedade
O- excessiva. Entre eles est4a..aTá.axai^ntó^3e55êDSÍbÍÍizaçâo
sistemática e reestruturação cognitiva. A autora afirma que, embora
muitos grupos de terapeutas tenham usado estas estratégias como
procedimento de intervenção primária em suas abordagens, esses
procedimentos de manejo de ansiedade em Terapia de Grupo e
Projeto de Pesquisa geralmente têm servido como um suplemento
para procedimentos de modelagem, ensaio comportamental,
treinamento, reforçamento e intervenção em grupo.
O procedimento de manejo de ansiedade mais utilizado é
o treino deTelaxaipárito. o qual têm sido usado daraI r atar diversos
problemas como insônia, dores de cabeça, dores nas costas, cólicas
menstruais, formas leves de depressão e ansiedade geriêrálízãcía.
Fofesse motivo, em grupos heterogêneos, o relaxamento é pensáclo
como uma habilidade útil, que pode beneficiar a maior parte dos
clientes (Rose, 1977). Assim, o relaxamento toma-se um instrumento
importante para manejar uma grande variedade de situações
estressantes ou pode ser incorporado à dessensibilização
sistemática.
Já no procedimento de d^^s^nsibilização sistemática, o
terapeuta pede aos participaates-do grupja^após realizarem„o
relaxamento, para imaginarem situações que provoquem ansiedade,
iniciando pela cena que produz menor ansiedade até a cena que
produz maior, ansied.ade. Essa._hi£mrquia é estabelecida em
discussões de grupo com os clientes. Geralmente o terapeuta só
passa para um próximo passo da hierarquia quando todos os
pacientes tiverem experienciado de forma satisfatória o passo

98
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa ß. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

anterior (Rose, 1977). Como conseqüência o procedimento é mais


lento do que o realizado individualmente (média de 20,4 sessões),
mas, segundo resultados apontados pela autora, mais efetivos do
que o realizado individualmente.
O utros autores que usaram o procedim ento de
dessensibilização sistemática com grupos ou clientes individuais
notaram que a interação do grupo parece facilitar a redução da
ansiedade. Katahn e colaboradores (1966, citado por Rose, 1977)
indicaram que os seus clientes - nesse caso estudantes -
invariavelmente relataram que se sentiam mais aptos para falar com
outros estudantes no contexto do tratamento, estando cientes de
que os outros tinham problemas similares, e aprender melhores
hábitos de estudo foi o fator crucial na redução da ansiedade.
Lazarus (1961, citado por Rose, 1977) também notou que a
dessensibilização é facilitada por falar com pessoas com problemas
similares.
Rose (1977) também descreve procedimentos cognitivos
utilizados em grupos para o manejo da ansiedade. Entre eles estão

objetivo modificar os pensamentos inadequados relacionados à


ansiedade; a parada de pensamento, cõm o objetivo de interromper
pensam entos relacionados à ansiedade; dissipar crenças
irracionais, visando a eliminação de crenças ligadas ao aparecimento
da ansiedade; e renomear eventos, sentimentos e pensamentos
relacionados à ansiedade.
Ainda existem clientes que apresentam falta de habilidades
para solucionar problemas. O treinamento em solução problemas
dá instrumentos para o cliente lidar com situações inevitáveis durante
e após o tratamento ter terminado. Eni grupos~pará manejo de
ansiedade, os estágios operacionais envolvidos na solução efetiva
de problemas (D’Zurilla & Goldfried, 1971, citado por Rose, 1977) são
discutidos no grupo. Para definir e formular o problema adequadamente
deve-se tomar cuidado para identificar em termos observáveis todos
os elementos do problema. Isso é necessário porque freqüentemente
os indivíduos não respondem às dicas relevantes do problema, o que
acaba impedindo a sua solução (Rose, 1997).

99
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Esses procedimentos descritos acima, comumente usa­


dos no tratamento de problemas relacionados à ansiedade exces­
siva, também são aplicados na terapia comportamental em grupo
para transtornos de ansiedade, como agorafobia, ansiedade social,
fobias específicas e transtorno obsessivo-compulsivo. Emmelkamp
e Kuipers (1985) desenvolveram vários estudos nessa área com o
foco no trabalho em clínica. Seus dados indicam que a terapia em
grupo é útil para pacientes com esses transtornos de ansiedade,
mas sugerem a continuação de pesquisas na área.
Apesar dos resultados citados acima, ainda existem
poucas pesquisas focando a evolução da terapia cognitivo-
comportamental para o manejo da ansiedade em grupos para
pessoas com problemas de aprendizagem. Pesquisa recente
(Douglass, Palmer & 0 ’Connor; 2007) foi realizada com um grupo
de seis pessoas com dificuldades de aprendizagem e ansiedade
excessiva. O objetivo do estudo foi investigar a efetividade de uma
intervenção cognitivo-comportamental em grupo para esses
indivíduos. O grupo ocorreu durante doze semanas e cada
participante levou um acompanhante. Foram utilizadas estratégias
cognitivo-comportamentais, tais como: discriminação e expressão
de sentimentos; treino de respiração profunda e relaxamento;
técnicas de distração; role-play etc. Os resultados demonstraram
que dois participantes obtiveram uma redução clinicamente
significativa nos níveis de ansiedade. Os participantes e seus
cuidadores relataram que o grupo auxiliou na aprendizagem de
estratégias para enfrentar a ansiedade. Outras medidas também
indicaram que os cuidadores dem onstraram uma melhor
compreensão das dificuldades dos participantes e estavam mais
aptos a dar suporte efetivam ente. Os autores apontam a
necessidade de mais pesquisas para que o grupo possa auxiliar
ainda mais seus participantes.

2. Ansiedade de desempenho acadêmico


A ansiedade pode exercer grande influência sobre o
desempenho do indivíduo e na demonstração de suas habilidades.
Ao sentir ansiedade nos momentos de desempenhar tarefas, a

100
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

pessoa pode apresentar um desempenho de menor qualidade do


que o seu repertório comportamental permitiria, tal fenômeno é
denominado ansiedade de desempenho (Zacar, 2006). A ansiedade
de desempenho pode ocorrer em diversas situações: Powell (2004)
cita algumas situações acadêmicas que são geradoras de
ansiedade como realizar provas e falar em público que a depender
da severidade colocam em risco a vida acadêmica e profissional. O
estudo japonês desenvolvido por Madoka e colaboradores (2000)
identificou a ansiedade de performance, como um subtipo de
ansiedade social, que entre os japoneses ocorre em situações como
falar em público, ler e escrever em público. Lazarus (2004) cita o
violinista da orquestra que sente ansiedade ao tocar em público e
cuja carreira corre perigo caso ele não o faça. Diversos estudos
sobre ansiedade de desempenho são encontrados na literatura.
O estudo sobre ansiedade escolar de Oliveira e Sisto
(2002) aponta que tal reação pode ocorrer nos mais diversos mo­
mentos da vida escolar do aluno e em diversas faixas etárias. Du­
rante a fase inicial da vida escolar há diversas situações que são
novas para a criança, as quais podem ser geradoras de ansiedade.
A criança mais nova, que está ingressando na escola, encontra uma
realidade diferente da sua, que muitas vezes exige o desenvolvi­
mento de novas habilidades como, por exemplo: entrar na fila, ficar
em silêncio, escutar e não responder, obedecer, encontrar diversas
pessoas estranhas as quais ela está conhecendo, fazer atividades
com pessoas desconhecidas, escutar e realizar a atividade pro­
posta pela professora. Todos os eventos citados exigirão, por parte
da criança, a adaptação a esta nova realidade, a qual pode ser ge­
radora de ansiedade para a ela. Da mesma forma, o estudante
veterano também pode sentir-se impotente para resolução de pro­
blemas escolares, como realizar provas e testes, o que pode influ­
enciar na ansiedade escolar, pois a sensação de incontrolabilidade
dos eventos externos gera ansiedade e o sentim ento de
vulnerabilidade afeta o bem estar emocional do estudante.
As crenças individuais e a percepção de controle sobre
os sucessos e fracassos escolares da criança são fatores influentes
sobre o desempenho acadêmico (Mayer, 1998). A pesquisa de Mayer
(1998) buscou a relação entre a percepção do controle e o
desempenho acadêmico de crianças de nível socioeconômico baixo.

101
A autora utilizou o conceito de controle percebido de Skinner (1988,
1990, citado por Mayer, 1998) que é uma capacidade individual que
as pessoas desenvolvem com a intenção de aprender a lidar com
os acontecimentos da vida e entender como e por que estes eventos
acontecem, desenvolvendo uma maneira particular de tratá-los. A
percepção de controle das situações e acontecimentos de vida é
uma habilidade aprendida que pode ser considerada um mecanismo
protetivo. A autora cita estudos nos quais as crianças que acreditam
serem responsáveis por suas boas notas e serem habilidosas,
apresentam melhor desempenho e rendimento acadêmico que as
demais crianças (Harter, 1981; Stipek, 1980, citado em Mayer, 1998).
Quando a criança passa a perceber que é capaz de influenciar as
conseqüências dos eventos através do seu próprio comportamento,
ela pode desenvolver maior auto-controle, o que, no caso do controle
sobre o desempenho acadêmico, pode ser benéfico, pois a criança
aprende a discriminar quais comportamentos serão benéficos para
atingir suas metas e quais influenciarão o fracasso, isso possibilita
o aumento da percepção de controle das situações, o que pode
diminuir a ansiedade pela sensação de incontrolabilidade. Mayer
(1998) sugere a implementação de programas de estimulação para
o desenvolvimento do controle percebido como uma forma de
prevenção ao baixo rendimento e desempenho escolar, contendo
atividades para discriminação da causalidade, responsabilidade
pelos próprios atos e auto-eficácia.
No estudo sobre fatores geradores de ansiedade no
vestibular, a ansiedade é apontada como uma das causas da não
aprovação (D‘Avila & Soares, 2003). Para detectar os fatores
,v geradores de ansiedade em estudantes as pesquisadoras aplicaram,
num primeiro momento, questionários com um mês de antecedência
ao vestibular via internet e num segundo momento realizaram
' entrevistas nos dias de prova. As autoras encontraram fatores
geradores de ansiedade como: a realidade coercitiva brasileira em
que as vagas em universidades públicas são restritas (90% dos
vestibulandos não são aprovados nas universidades públicas); o
fato de três anos do ensino médio serem totalmente dedicados como
preparação para o vestibular e a escolha profissional. Tais eventos
geram sentimentos de ansiedade que dificultam o ato de estudar, a
dificuldade para estudar acarreta a autopunição que por

102
conseqüência provoca a diminuição da auto-eficácia e da auto-
estima, o jovem passa a se sentir culpado pelo fracasso (D‘Avila &
Soares, 2003). Ao serem questionados sobre os métodos de preparo
psicológico para o vestibular 35% dos vestibulandos responderam
que o esporte foi a atividade que mais contribuiu; 26% iam ao cinema
e assistiam TV para relaxar. A partir desta constatação, as autoras
sugeriram que métodos mais adequados sejam utilizados para tal
enfrentamento, justificando e propondo a elaboração de programas
de orientação psicológica para vestibulandos.
Propostas de intervenções para diminuição da ansiedade
de desempenho vêm sendo realizadas, como o trabalho de Oliveira
e Duarte (2004), no qual foi elaborada e realizada uma série de
atividades para diminuição da ansiedade em exposição oral de
alunos universitários em sala de aula. As atividades de intervenção
continham: leitura de textos didáticos; treinamento de exercícios de
respiração abdominal e relaxamento; treinamento de habilidades
sociais, em específico a habilidade para apresentações em público
e aprovação social da adesão às recomendações. O resultado obtido
foi a diminuição da ansiedade medida por três instrumentos, a Escala
de Medo de Avaliação Negativa, o Inventário de Ansiedade e a medida
de Freqüência Cardíaca em situações estruturadas (Oliveira e
Duarte, 2004).
Uma das propostas de tratamento de ansiedade de
desempenho de Lazarus (2004), denominada modelo multimodal
de tratam ento da ansiedade, propõe a atuação sobre sete
dimensões: emoção, pensamento, comportamento, sensação,
imaginação, relações interpessoais e fatores biológicos. Os casos
de ansiedade de desempenho mais difíceis e complexos devem
ser tratados agindo as sete áreas do modelo. O procedimento da
dessensibilização sistemática é adotado e a hierarquização das
situações de ansiedade e medo são construídas abrangendo
diversas dim ensões e suas inter-relações. Além da
dessensibilização, o autor propõe a ação do comportamento
ansiógeno em situação clínica protegida, pelo fato de que na situação
clínica o enfrentamento da ansiedade pode ser menor do que na
situação real, ao mesmo tempo pode ser um treino para o
enfrentamento posterior. No caso da terapia de um violinista que

103
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

sofria de ansiedade de tocar em público foram realizadas 20 sessões


psicoterápicas durante três meses utilizando o modelo multi-modal.
Este estudo propõe uma intervenção em grupo para o
manejo da ansiedade de desempenho acadêmico, os procedimentos
utilizados para a diminuição e tratamento da ansiedade estão
descritos a seguir.

3. Sessões em grupo para enfrentamento da


ansiedade de desempenho acadêmico
Nesta seção serão descritas uma série de atividades que
foram planejadas e organizadas em dez sessões de atendimento
psicológico grupai para o enfrentam ento da ansiedade de
desempenho acadêmico.
1a. Sessão: Aplicação de Pré-Testes.
O bjetivo: Realização de dois pré-testes a serem aplicados
individualmente.
Materiais: Quebra-cabeças, fichas de observação do quebra
cabeças (Anexo 1), gravador, cronômetro e questionário de
auto-avaliação para jovens de 11 a 18 anos de idade (YSR,
Achenbach, 1991).
Explicação de procedimentos da 1a. sessão: Realização de
pré-teste para avaliação do nível de ansiedade inicial.
Procedimentos:
1. Pré-teste: experimento dos quebra-cabeças (Zanoni Júnior,
2004; Grün, 2004):
Esta atividade é dividida em duas partes (I e II,
respectivamente), apresentando um grau de dificuldade
compatível com a faixa etária do participante, sendo cada parte
realizada com limite de tempo estabelecido de 4,5 minutos (o
qual não é falado para o participante). O experimento deve ser
realizado individualm ente, isto é, o coordenador/
experimentador o realiza com cada participante. Na parte I o

104
C aroline G, Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

participante recebe o quebra-cabeça e é instruído a montá-lo


sem que o experimentador estabelecesse verbalmente o limite
de tempo para finalizar a tarefa. Enquanto este realiza a tarefa,
o experimentador cronometra o tempo, marcando erros e
acertos. Após os 4,5 minutos, o experimentador retira o quebra-
cabeça. Então, o experimentador convida o participante para
tomar um copo de refrigerante e comer algumas bolachas de
chocolate (dez minutos). Em seguida, dá-se início à parte II
do experimento. O experimentador instrui o participante a
montar um segundo quebra-cabeça, mas, neste momento,
estabelece verbalmente o limite de tempo de 4,5 minutos para
terminar a tarefa, por exemplo: “Agora você irá montar este
outro quebra-cabeça e terá quatro minutos e meio para terminá-
lo”. Nesta parte, o experimentador verbaliza o tempo restante
para finalizar a atividade, por exemplo: “Faltam 4 minutos...
Faltam 3 minutos... Faltam 2 minutos... Falta 1 minuto...”
(Zanoni Junior, 2004; Grün, 2004).
Ambas as partes do experimento são observadas e registradas
em uma ficha contendo uma coluna referente aos acertos e
outra referente aos erros realizados pela criança em cada
minuto do experimento (Anexo 1). Cada acerto corresponde a
uma peça encaixada corretamente no quebra-cabeça e cada
erro corresponde a uma tentativa de encaixar uma peça
incorretamente no quebra-cabeça. Também deve ser registrado
se houve ou não supressão de resposta, por exemplo, o
participante interromper a execução do quebra-cabeça e se
recusar a continuar a tarefa. O tempo de execução do quebra-
cabeça deve ser registrado para cada participante nos dois
experimentos. A análise dos dados será realizada a partir da
comparação da freqüência de acertos e erros durante as duas
partes do experimento (Zanoni Junior, 2004; Grün, 2004).
2. Aplicação do questionário de auto-avaliação para jovens de
11 a 18 anos de idade (YSR, Achenbach, 1991 ).
3. Solicitar para que o participante responda a pergunta: “Estar/ fa­
zer __________________ tem coisas boas mas traz algumas di­
ficuldades. Quais você diria que são as suas dificuldades?”(gravar
para utilizar como medida de avaliação qualitativa).

105
Terapia Analltico-Comportamental em Grupo

2a. Sessão: Apresentação e regras do grupo.


Objetivos: Apresentação das pessoas e dos objetivos do grupo,
delimitação das regras para o bom funcionamento do grupo.
Materiais: Gravador, papel sulfite, material para desenho, bexigas,
papel cortado para nomes.
Explicação de procedimentos da 2a. Sessão: Para apresen­
tação e “quebra-gelo” são propostas as dinâmicas da bexiga
ou da almofada. A solicitação para que cada um fale sobre o
fato de estar numa instituição (agência controladora) e que
isto pode acarretar dificuldades é utilizada com o intuito de
que os participantes discriminem os reforçadores e punidores
das situações existentes em determinada contingência que é
estar dentro de uma instituição, também para que discrimi­
nem que as demais pessoas, assim como elas também apre­
sentam dificuldades. O termo dificuldade é utilizado por ser
um termo geral, para que não haja indução sobre a explica­
ção do que cada participante pensa e sente sobre suas ações
nesta contingência. As regras para o bom andamento do gru­
po são instruções ditas cuidadosamente para que cada pes­
soa discrimine a importância de sua participação e para que o
grupo seja uma nova contingência que traga conseqüências
reforçadoras positivas para cada integrante. Neste momento
destaca-se o cuidado de explicar verbalmente a importância
de cada participante com o intuito de que seu comportamento
seja controlado por um estímulo reforçador positivo, o quanto
cada um é importante e de que seja agradável ir ao grupo.
Visto que tal grupo tem o intuito de promover a diminuição de
comportamentos de ansiedade, busca-se não ser um grupo
coercitivo. A conclusão realizada pelo coordenador do grupo
busca auxiliá-los a discriminar o objetivo deste trabalho que
são propostas de modificação do comportamento, em espe­
cífico alternativas comportamentais que podem servir como
solucionadoras de problemas relacionados à ansiedade.
Procedimentos:
1. Apresentação: Para grupos com maior número de participantes
(de 6 a 10 integrantes) sugere-se a dinâmica da Bexiga. Para

106
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

grupos com menor número de participantes (de 3 a 5


integrantes) sugere-se a dinâmica da almofada.
a) Dinâmica da Bexiga: Solicita-se para que cada participante
escreva seu nome num recorte de folha e coloque-a dentro
de uma bexiga que a mesma irá encher. Os participantes
brincam com os balões e estouram quando o terapeuta
solicitar, os papéis com os nomes caem no chão, cada
participante pega um papel e procura a pessoa cujo nome
está escrito na folha. Elas apresentam-se e conversam um
pouco.
Em seguida, deverão procurar outra pessoa para conversar
mais um pouquinho. Finalmente, solicita-se para que formem
uma roda e para que cada participante fale o nome daquelas
pessoas com as quais conversou.
Antes de iniciar a atividade a terapeuta pode apresentar
sugestões de perguntas a serem realizadas como: Onde você
mora? Quantos anos você tem? Estuda em qual colégio? O
que gosta de comer? Tem irmãos?
b) Dinâmica da Almofada: Solicita-se para que os participantes
formem um círculo. A coordenadora se apresenta, fala algo
sobre si e joga a almofada para uma criança, fazendo uma
pergunta qualquer. E assim sucessivamente.
Ao final de qualquer uma das dinâmicas, realizar o contrato
de sigilo, de respeito mútuo e de freqüência.
2. Realização do desenho que explique o que o trouxe para este
grupo. Apresentação e discussão em grupo. Lembrar a
pergunta realizada na primeira sessão para promover
discussão em grupo: “Estar/ fa z e r___________________ tem
coisas boas mas traz algumas dificuldades. Quais você diria
que são as suas dificuldades?".
3. Fechamento das coordenadoras: citar que todos no grupo
apresentam dificuldades, explicar que as dificuldades sempre
irão existir, mas podemos encontrar formas de minimizá-las.

107
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

3a. Sessão: Aprendendo sobre ansiedade


Objetivos: Possibilitar que os participantes discriminem quais
são as sensações corporais da ansiedade e ensinar uma
estratégia de enfrentamento da ansiedade.
Materiais: Tapete de borracha para amarelinha, papel bobina e
material para desenho.
Explicação de procedim entos da 3a. Sessão: Para que os
participantes experimentem e discriminem as sensações
corporais semelhantes às sensações que as pessoas sentem
quando estão ansiosas são sugeridas brincadeiras como
amarelinha e pega-pega. Como forma de enfrentamento da
ansiedade é proposta a respiração abdominal, para que a
pessoa discrimine que ao relaxar tem sensações opostas às
da ansiedade e também como forma de relaxamento e
diminuição da ansiedade. Além disso, são realizadas perguntas
para estimular que os participantes discriminem que todas as
pessoas sentem ansiedade, nem toda ansiedade é maléfica,
cada pessoa sente de forma diferente da outra.
Procedimentos:
1. Dinâmica inicial: Para grupos maiores brincadeira sugere-se
a brincadeira de pega-pega (uma criança tem que correr atrás
da outra e pegá-la e assim sucessivamente); para grupos
menores realizar a brincadeira de amarelinha. Discussão após
a brincadeira de pega-pega ou amarelinha questionando o
participante sobre quais sensações corporais ele sente, como
está o corpo e a comparação destas sensações com outras
situações de sua vida.
2. Técnica de respiração (Davis, 1996): Aplicação da técnica da
respiração abdominal, ensinando a criança a fazer a respiração
abdominal. Realizar a discussão comparativa das sensações
corporais quando se faz a respiração abdominal com a
brincadeira anterior. Auxiliar o participante a perceber como
se sente, como está o corpo e a comparação destas
sensações com outras situações de sua vida (provas,
apresentações de trabalhos). Solicitar que as crianças ou

108
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B, Grün, Yara Kupersteln Ingberman

adolescentes treinem a técnica duas vezes por dia, todos os


dias, até o próximo encontro.
3. Solicitar para que realizem um desenho em grupo, de dois ou
três participantes, que mostre a ansiedade. Feito o desenho
cada um vai responder as seguintes perguntas, a serem
entregues digitadas em uma folha de papel para cada
participante (Anexo 2):
- Todo mundo tem ansiedade?
- Como é a ansiedade para cada um?
- Por que acontece a ansiedade?
- Quais são os pontos positivos e negativos da ansiedade?
Discutir sobre o que cada um respondeu e auxiliá-los a
encontrar estratégias de enfrentamento, relembrando a
estratégia aprendida nesta sessão.

4a. Sessão: Avaliação dos benefícios e problemas da ansiedade.


Treino em relaxamento.
Objetivos: Possibilitar aos participantes discriminar os pontos
positivos (que podem trazer benefícios) e os negativos
(excesso) da ansiedade. Treino de relaxamento para manejo
da ansiedade.
Materiais: Sucatas, cola, tesoura, papel bobina e material para
desenho.
Explicação de procedim entos da 4a. Sessão: Em geral, os
participantes, devido à ansiedade excessiva, tendem a acreditar
que a ansiedade sempre atrapalha. Assim, a partir da
construção das situações geradoras de ansiedade, busca-se
discriminar com os participantes quando a ansiedade pode
colaborar aumentando sua atenção, mantendo-os em
atividades etc., e quando a ansiedade passa a ocorrer de forma
excessiva, daí atrapalhando seu desempenho. Após essas
discriminações, passa-se ao treino de relaxamento. É indicado
retomar a sessão anterior, em que se iniciou o treino de

109
Terapia Analrfico-Comportamental e m Grupo

discriminação de sensações corporais. A partir disso, utiliza-


se uma técnica de relaxamento m uscular progressivo
adaptada a crianças, na qual os participantes irão experimentar
as sensações de tensão e relaxamento. Ao final da técnica,
retomam-se as discriminações e buscam-se generalizações
destas para o ambiente natural.
Procedimentos:
1. Construção das situações geradoras de ansiedade: dividir o
grupo em dois. Entregar sucata e material de apoio (cola,
tesoura, papel etc.). Solicitar a cada grupo que monte situações
da escola, família etc., que são geradoras de ansiedade.
Importante destacar que devem, primeiro, discutir em grupo
as semelhanças e as diferenças das situações que cada um
vivência. Após a construção, cada grupo se apresenta.
Discussão sobre semelhanças e diferenças das diversas
situações facilitadoras e problem áticas. Levantam-se
alternativas com o grupo para cada situação relatada.
2. Discussão sobre pontos positivos e negativos da ansiedade:
a partir das descrições das situações feitas pelo grupo, o
terapeuta discrimina com os participantes os pontos em que
a ansiedade pode ajudar, e quando, por excesso, esta
atrapalha. Os participantes devem ser levados a discriminar
seus próprios limiares de ansiedade, identificando, nas
situações descritas em grupo, quando e como a ansiedade
colabora e atrapalha.
3. Técnica de Relaxamento: Começando com a idéia de tensão
relaxamento a e discriminação das sensações corporais
trabalhados na sessão anterior, adaptar uma técnica de
relaxamento de Jacobson (Caballo 1996/ 2002) simplificado,
como “boneco duro, b o n ^õ l1 lg tgVt=}ggfá técnica ensinam-
se os participantes a ^iscrim ín a r sensações de tensão
(“Boneco Duro”) e de relaxamento (“Boneco mole”). Após o
treino, busca-se discriminar com os participantes suas
sensações corporais e sentimentos, e a comparação destas
sensações com outras situações de sua vida (provas,
apresentações de trabalhos).
4. Treino em respiração profunda (ver sessão 3).

no
Caroline G. Salvo, Gabriela M, Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

5a. Sessão: Vivenciando a ansiedade.


Objetivos: Propiciar aos participantes uma situação de vivência
da ansiedade, possibilitando a identificação dos sinais de
ansiedade e manejo da mesma.
M ateriais: Caneta, lápis, borracha. Fotocópia da prova da
dinâmica 45 do livro Toc Toc. .. Plim, Plim (Virgolim, Fleith, &
Neves-Pereira, 1999); e fotocópia do roteiro de perguntas
sobre a prova simulada (anexo 3).
Explicação de procedimentos da 5a. Sessão: Esta sessão visa
possibilitar aos participantes vivenciarem uma situação de
ansiedade próxima à do ambiente natural, e assim, discriminar
todas as manifestações da ansiedade (abertas e encobertas).
Como neste momento o repertório de enfrentamento da
ansiedade já esta sendo modelado, essa sessão possibilita
que os participantes comecem a discriminar os eventos e
como é possível manejá-los.
Procedimentos:
1. Retomar as atividades trabalhadas até o momento: retomam-
se com os participantes todos os passos do grupo até o
momento: provocar a auto-observação, situações que geram
ansiedade, comportamentos abertos e encobertos que fazem
parte da classe de respostas ansiedade, e as estratégias de
enfrentamento, em especial, a respiração.
2. Simulação de Prova: Estabelecendo um contexto de dia de
prova na escola, propõe-se um desafio: dinâmica 45 “Na
Classe da tia Suzy” do livro Toc,Toc... Plim, Plim. Avisa-se
aos participantes que eles terão 10 minutos para completar a
tarefa. Ao final do tempo, recolhe-se os materiais da “prova”.
3. Discriminação da tarefa: Entregar o roteiro de perguntas sobre
a atividade prova simulada. O roteiro contém as seguintes
questões:
- Como se sentiu ao ouvir que você realizaria uma prova?
- Como se sentiu durante a atividade?
- O que passou pela sua cabeça durante a atividade?

ni
Terapia Anaírtico-Comportamental em Grupo

- Como se manifestou o seu corpo durante a atividade?


- Como se sentiu ao término do tempo?
- Você acha que foi bem? Por quê?
4. Discussão das questões: após todos concluírem as perguntas,
faz-se um levantamento com os participantes de cada uma
das discriminações, buscando am pliar essas para as
situações do dia-a-dia geradoras de ansiedade. Traça-se um
paralelo das similaridades e diferenças da situação vivenciada
pelo grupo e as situações da escola, bem como as diversas
formas utilizadas para manejar a ansiedade.
5. Levantamento de estratégias de enfrentamento da ansiedade:
a partir da discussão anterior, faz-se o levantamento das
diversas estratégias para manejo da ansiedade: a) preparação
adequada para um evento aversivo, como provas; importante
discriminar com participantes as etapas da preparação, como
hábitos de estudo, treino de relaxamento em casa, atividades
físicas etc.; b) Estratégias a serem utilizadas durante o evento
aversivo: respiração, relaxamento, prestar atenção a um
estímulo, mesmo que outros pensamentos estejam ocorrendo
de forma concorrente, etc.
6. Técnica de Relaxamento: retomando respiração {ver 3a
sessão) e técnica “Boneco Duro, Boneco Mole” (ver 4a
sessão).
6a. Sessão: Expressar verbalmente avaliação de situações; lidar
com erros e expectativas.
Objetivos: Discriminar e expressar verbalmente seqüência de
eventos, avaliando-os, e assim lidar com a expectativa dos
outros participantes e terapeuta nessa situação; lidar com
erros.
Materiais: Dinâmica 41 “Cientista Desastrado” do livro Toc Toc..
. Plim, Plim (Virgolim, Fleith, & Neves-Pereira, 1999);
Explicação de procedimentos da 6a. Sessão: discriminar a
seqüência de eventos das situações em relação às respostas
abertas e encobertas, propícia aos participantes discriminarem

112
C a ro lin e G, Saivo, Gabriela M, Sabbag, Taísa B, Grün, Yara Kuperstein Ingberman

as relações funcionais entre os eventos. Desta forma, nesta


sessão será treinada a discrim inação funcional do
comportamento e sua expressão verbal, uma vez que
sistematizar as observações é um passo importante para
generalização. Também, esse tipo de atividade propicia o
ambiente ideal para se modelar com os participantes o lidar
com problemas e enfrentá-los.
Procedimentos:
1. Discriminação de pontos positivos e negativos das situações:
solicitar a cada participante que relate pontos positivos e
negativos das suas situações de ansiedade a partir da frase:
“Estar/ fazer ___________________ tem coisas boas, mas traz
algumas dificuldades. Quais você diria que são as suas
dificuldades?” (gravar para utilizar como medida de avaliação
qualitativa).
2. Técnica do cientista desastrado - Livro Toc-toc... Plim, Plim.
(pg. 109): cada participante deverá relatar as conseqüências
de um erro cometido em laboratório pelo cientista desastrado.
Para tanto, deverá relatar cada passo do problema,
identificando como o cientista se sentia e pensava em cada
momento. Após a apresentação, cada participante deverá
relatar como se sentiu fazendo o papel de cientista desastrado.
3. Comparando a situação do cientista com as situações de erros
escolares: buscar discriminar com os participantes as relações
funcionais entre o que o cientista fez, pensou e sentiu, traçando
um paralelo com as situações escolares. Podem-se utilizar
questões como “Quais são as conseqüências destes erros e
como você se sente nestas situações?”; “Todo mundo erra?”;
“Será que bons alunos podem errar?” , para facilitar a
discriminação.
4. Aprendendo com nossos erros: discriminar com os partici­
pantes como o errar pode colaborar com a aprendizagem.
Levantar situações em que aprendemos com os nossos er­
ros, tanto as situações engraçadas, quando aquelas ruins.
Levar os participantes a discriminar que o errar faz parte das
contingências e que dependendo de como se avalia a situa-

113
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

ção, pode-se agir de forma a aproveitar o erro ou perder-se no


processo, como o cientista maluco.
5. Técnica de relaxamento: Treino de respiração e de relaxamento,
conforme descrito em sessões anteriores. Retomar a
importância do uso das técnicas em casa e a necessidade de
treino. Verificar a utilização das técnicas fora das sessões.
6. Discussão sobre as técnicas de relaxamento: discriminar com
os participantes quais técnicas trazem mais ganhos e quais
são mais difíceis de serem executadas e o porquê. Corrigir
eventuais falhas. Reforçar a utilização fora da sessão.

7a Sessão: Solução de problemas 1


Objetivos: Treinar estratégias de solução de problemas.
Explicação dos procedimentos da 7a sessão: o objetivo da
sessão é treinar estratégias de solução de problemas com os
participantes, uma vez que essas são fundamentais para o
manejo da ansiedade, permitindo que situações aversivas
sejam manejadas adequadamente. Para tal, propõe-se que
os integrantes sejam divididos em dois grupos menores, cada
qual recebendo uma tarefa envolvendo problemas a serem
solucionados praticamente. Ao final, discutem-se as estraté­
gias utilizadas, se foram efetivas ou não e os passos neces­
sários para solucionar problemas são discriminados.
Procedimentos:
1. Dividir os participantes em dois grupos, propor uma tarefa
desafio para que cada grupo discuta soluções. Sugestões para
cada grupo:

Grupo 1 : Vocês terão uma fábrica de chocolates que tem alguns


problemas para serem resolvidos:
a) Faltam ingredientes: cacau e leite, como consegui-los em
grande quantidade?

114
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grüa Yara Kuperstein Ingberman

b) Um empregado precisa ser mandado embora por justa causa,


como proceder?
c) É necessária uma forma mais eficiente para vender mais
chocolates, o que fazer?

Grupo 2: Vocês serão responsáveis em montar uma propaganda


para uma fábrica de chocolates, sendo necessário decidir
algumas coisas:
a) O que será utilizado na propaganda?
b) Qual será o roteiro da propaganda?
c) O que fazer para reduzir gastos?

2. Discussão: Ao final da atividade o coordenador propõe uma


discussão para discriminar as contingências envolvidas na
mesma. Sugestão de perguntas para facilitar a discussão:
- Como foi? Fácil ou difícil? Agradável ou não?
- Surpreenderam-se com o desempenho?
- Ficaram ansiosos durante a atividade? Isto atrapalhou o
desempenho?
3. Discriminar e analisar as estratégias de solução de problemas
passo a passo: O coordenador dirige a discussão para a
discriminação das estratégias de solução de problemas
utilizadas por cada grupo. Ao final sintetizam-se os passos
gerais necessários para solucionar problemas e como manejar
a situação caso haja a necessidade da intervenção de um
adulto. Sugestão de perguntas:
- As estratégias de resolução de problemas foram as
melhores?
- Existem outras formas?
- Depois do término da atividade surgiram novas idéias? Por
quê?

115
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

- Que passos foram utilizados para chegarem a essas


conclusões?
4. Técnica de relaxamento: Treino de respiração e de relaxamento,
conforme descrito em sessões anteriores.

8a. Sessão - Solução de problemas 2.


Objetivos: Treino em estratégias de solução de problemas (parte 2).
Materiais: Fotocópia da atividade para cada participante, canetas,
cavalete/quadro para anotações.
Explicação dos procedimentos da 8a sessão: As atividades
dessa sessão têm por objetivo treinar as habilidades de
solução de problemas - desenvolvidas na 7a sessão - em
situações do dia-a-dia vivenciadas pelos participantes. Para
tal, propõe-se, inicialmente, que cada participante resolva uma
atividade de seguimento de regras com bastante atenção
(anexo 3). A atividade consiste em responder diversas
perguntas com base em uma poesia. A penúltima questão
orienta que apenas as duas primeiras sejam respondidas e
nada mais. Espera-se que a maior parte dos integrantes
responda todas as questões anteriores a essa, devido ao
histórico de ansiedade. Em seguida, discute-se a atividade.
Encerra-se a sessão com o treino de relaxamento.
1. Relacionar as situações-problema da sessão anterior com as
situações escolares do dia-a-dia dos alunos (Bom Aluno,
escola, provas, situações do dia-a-dia). Importante anotar o
que os alunos falam. Descrever passo a passo as estratégias
utilizadas e discutir sobre novas formas de solução de
problemas.
2. Você sabe seguir instruções? - Pedir aos alunos que realizem
a atividade com bastante atenção (anexo 3). Quando todos
tiverem terminado, o coordenador pergunta sobre o que
acharam da atividade, como a resolveram e propõe uma
discussão sobre a importância da atenção para a organização
e solução de problemas.

116
Caroline G. Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B, Grün, Yara Kuperstein Ingberman

3. Técnica de relaxamento (ver 4a sessão).

9a. Sessão - Fechamento (parte I).


Objetivos: Aplicação dos pós-testes; realizar a primeira atividade
de feedback; treinar o relaxamento.
Materiais: Quebra-cabeças, fichas de observação do quebra
cabeças (Anexo 1), gravador, cronômetro e questionário de
auto-avalíação para jovens de 11 a 18 anos de idade (YSR,
Achenbach, 1991).
E xplicação dos procedim entos da 9a sessão: Aplicar os
instrumentos de pós-teste. Em seguida, o coordenador pede
que cada participante dê um feedback sobre as atividades
realizadas no grupo, com o objetivo de aprimorá-lo para futuros
participantes. Finalmente, treina-se novamente a técnica de
relaxamento, pois a continuidade de seu uso permite maior
efetividade quando em situações de ansiedade.
1. Pós-teste: experimento dos quebra-cabeças (Zanoni Júnior,
2004; Grün, 2004): (ver 1a sessão).
2. Aplicação do questionário de auto-avaliação para jovens de 11
a 18 anos de idade (YSR, Achenbach, 1991) (ver 1a sessão).
3. Solicitar para que cada participante fale: “ Estar/ fazer
tem coisas boas mas traz algumas difi­
culdades. Quais você diria que são as suas dificuldades?”
(gravar para utilizar como medida de avaliação qualitativa) (ver
1a sessão).
4. Feedback 1 - Avaliação do programa pelas crianças: Solicita-
se às crianças que falem sobre críticas, sugestões, o que
gostaram, o que não gostaram durante as sessões, que
técnicas utilizaram, quais técnicas foram mais úteis etc.
5. Técnica de relaxamento (ver 4a sessão).

117
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

10a sessão - Fechamento (parte II).


Objetivos: Fechamento; sintetizar temas abordados; segundo
feedback do grupo; confraternização.
Materiais: papel bobina, papel sulfite, papéis coloridos diversos,
materiais para desenho, tesoura, cola, bexigas, comes e bebes.
Explicação de procedimentos da 10a. Sessão: Inicialmente
retomam-se os temas trabalhados durante os encontros para
verificar a aprendizagem dos participantes e corrigir possíveis
erros na mesma. Em seguida, solicita-se um segundo feedback
(primeiro realizado na 9a sessão) enfocando os sentimentos
eiiciados ao longo dos encontros, pois os mesmos podem
indicar reforços e punições ocorridos durante o programa.
Passa-se então para a confecção de cartões com dicas sobre
o manejo da ansiedade de despenho. Esses possibilitarão aos
integrantes relembrarem o aprendizado do grupo.
Procedimentos:
1. Retomar os temas abordados e atividades trabalhadas durante
o grupo: Solicita-se ao grupo que façam o desenho de um
caminho em papel bobina. Em seguida, pede-se que marquem
algumas paradas/ placas no caminho, as quais devem ser
nomeadas com os assuntos trabalhados no grupo. Discute-
se o que foi aprendido.
2. Feedback 2 - “Como se sentiram ao longo dos encontros
grupo?”: Solicita-se aos participantes para relatarem como se
sentiram ao longo de sua participação nos encontros. Propõe-
se uma discussão sobre os diferentes sentimentos, bem como
levantam-se hipóteses sobre possíveis causas.
3. Confecção de cartões para os colegas com dicas sobre como
lidar com a ansiedade: Propõe-se que cada participante
confeccione um cartão com dicas sobre como lidar com a
ansiedade. Ao final da atividade, faz-se um amigo secreto dos
cartões, situação em que cada um entrega seu cartão para
um colega e recebe o cartão de alguém.
4. Lanche / confraternização: O coordenador convida todos para
montar a mesa e lanchar. É importante que sejam facilitadas

118
Caroline G. Salvo. Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kupersteln Ingberman

interações reforçadoras entre os participantes. Pode-se propor


uma brincadeira com bexigas para essa finalidade. Ao final
todos trocam contatos e se despedem.

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120
Caroline G, Salvo, Gabriela M. Sabbag. Taísa B. Gfün, Yara Kuperstein Ingberman

Anexo 1: Folha de registro do experimento de montagem dos


quebra-cabeças (Zanoni Júnior, 2004; Grün, 2004) - 1 a. Sessão

Nome:
Data: / / Escolaridade: Idade:
Parte 1
Tempo de realização do quebra-cabeça: início fim
Tempo de reação: fs / min)
Supressão de resposta: ( ) sim ( ) não

Tempo Tempo Acertos Erros

(em min) (em s)

0-1 0-30
31-60

1 -2 0-30
31-60

2 -3 0-30
31-60

3 -4 0-30

31-60

Observações de respostas fisiológicas e motoras (sudorese,


vermelhidão, empalidecimento, falas, movimentação, boca
seca etc.):

121
Terapia Analftico-Comportamenta! em Grupo

Parte I
Tempo de realização do quebra-cabeça: início fim
Tempo de reação:____________ (s / min)
Supressão de resposta: ( ) sim ( ) não

Tempo Tempo Acertos Erros

(em min) (em s)

0-1 .0 -30
31-60

1 -2 0 -30
31-60

2 -3 0 -30
31-60

3 -4 0 -30

31-60

Observações de respostas fisiológicas e motoras (sudorese,


vermelhidão, empalidecimento, falas, movimentação, boca
seca etc.):
Caroline G, Salvo, Gabriela M. Sabbag, Taísa B. Grün, Yara Kuperstein Ingberman

Anexo 2: Questões sobre ansiedade (3a. Sessão)


1. Todo mundo tem ansiedade?

2. Como é a ansiedade para cada um?

3. Por que acontece a ansiedade?

4. Pontos positivos e negativos da ansiedade.

Anexo 3: Roteiro de perguntas sobre a atividade prova simulada


(4a. Sessão)
1. Como se sentiu ao ouvir que você realizaria uma prova?

2. Como se sentiu durante a atividade?

3. O que passou pela sua cabeça durante a atividade?

4. Como se manifestou o seu corpo durante a atividade?

5. Como se sentiu ao término do tempo?

6. Você acha que foi bem? Por quê?

123
Terapia Analftico-Comportamental e m Grupo

Anexo 4: Você sabe seguir instruções? (8a Sessão)


Pois bem, siga corretamente as instruções abaixo:
1. Leia tudo antes de fazer qualquer coisa, mas trabalhe o mais
rapidamente que puder.
2. Leia a poesia abaixo.
Poemas para Brincar - José Paulo Paes
Convite
Poesia
é brincar com palavras
como se brinca
com bola, papagaio, pião.
Só que
bola, papagaio, pião
de tanto brincar
se gastam.

As palavras não:
quanto mais se brinca
com elas
mais novas ficam.
Como a água do rio
que é água sempre nova.
Como cada dia
que é sempre um novo dia.
Vamos brincar de poesia?

3. Sublinhe a palavra brincar em toda a poesia.

124
4. Além de brincar com bola, papagaio e peão, o que mais você
poderia brincar?
5. Circule a brincadeira que você mais gosta na questão acima.
$. Por que quanto mais se brinca com as palavras mais novas
elas ficam?
7. Você conhece outros escritores de poesia? Quais?
8. Vá até a cadeira do seu amigo e convide-o para brincar.
9. Releia tudo o que você escreveu até aqui.
10. Faça uma poesia sobre brincar.
11. Agora que você leu as instruções cuidadosamente, faça
apenas aquilo que as sentenças 1 e 2 pedem para fazer. Ignore
todas as outras informações.
12. Por favor, não faça comentários ou dê explicações a seus
companheiros. Se você leu até aqui, faça de conta que ainda
está escrevendo.
Capítulo 4
O uso da psicoterapia
analítico funcional (FAP)
em grupos terapêuticos
Fátima Cristina de Souza C onte 1

A psicoterapia analítico funcional (FAP ou PAF, no Brasil),


prgpofitfijjõr j<ohlenberg e Tsai Í1991V é uma das três formas de
intervenção psicoterápica aue integram a chamada “torneira gera­
ção” da Terapia Comportamental (Hayes, Luoma, Bond, Masuda &
Lilis, 2006). Mantém=se-atrelada aos compromissosj n j ciais propos-
tos pela terapia comporta.menta! e .acrescenta os conhecimentos
atualizados conceituais, filosóficos e pragmáticos dec o rre rjg s ja
pesquisa cientifica e da prátlci~clínica. A FAP é, sem dúvida, uma
proposta de psicoterapia comportamental baseada filosófica e cien­
tificamente no Behaviorismo radical, que representa um momento
em que vertentes de pesquisa e da terapia se encontram de forma
especialmente equilibrada e promissora.
Seus idealizadores, Kohlenberg e Tsai (1991), propuseram-
na com o intuito de ate ndçfjao^cliente IPI£n_tHoje, aqui,
serão feitas considerações sobre como pode ser feita a sua inser­
ção nos processos psicoterápicos analítico-comportamentais
grupais, uma extrapolação que começa a povoar as práticas dos
terapeutas que assim atuam. Q objetivo central da FAP é lidar com

1 Doutora em Psicologia (IPUSP), Psicoterapeuta cio Instituto de Psicoterapia e Análise do


Comportamento (PSICC) Londrina,PR.

129
Terapia Analítico-Comportamentai em Grupo

os problem as de natureza interpessoal, cujas classes


comportamentais funcionais possuam elementos que possam vir a
ocorrer na interação do terapeütacom o cliente, no sefflng
terapêutico. Tal perspectiva tende a combinar-se facilmente com os
propósitos dos grupos psicoterapêuticos.
Antes de falar sobre a FAP em grupo, mais especifica­
mente, dada a escassez de literatura sobre tal extensão, serão apre­
sentados alguns aspectos gerais, de forma a introduzir o leitor nes­
ta proposta. Espera-se que o caminho delineado ajude-o a entender
como pode, ele mesmo, fazer suas próprias explorações no uso da
FAP em grupos psicoterápicos.

1. FAP - A psicoterapia analítico funcional


A história do nascimento da FAP é interessante. Kohlenberg
e Tsai (1991), terapeutas-pesquisadores, observaram que os melho­
res resultados terapêuticos obtidos com seus clientes ocorriam quan­
do estabeleciam, espontaneamente, uma relação intensa, pessoal e
comprometida com eles. Tal constatação não consiste em si mesma
^maTnõvídãde. Contudo, os que observaram fatos semelhantes, por
inúmeras razões sobre as quais não cabe discussão neste momen­
to, avançaram muito pouco além de considerações gerais. De toda
forma, contribuíram para que, historicamente, a relação terapêutica
fosse deixando de ser vista como um contexto de aplicação de técni­
cas comportamentais simplesménte e lapidasse suas várias funções
possíveis. Para isso, deveria manter-se sempre genuína, transpa­
rente, de cuidado com o cliente e minimamente aversiva. Finalmente,
Kohlenberg e Tsai intrigaram-se com “a mágica” que ocorria e exerci­
taram o desafio de descrever cuidadosamente tal fenômeno e analisá-
lo à luz dos conhecimentos Behavioristas Radicais. E aí está.a FAP
/ de hoje, que propõe a análise da interação cliente-terapeuta como
' como principal instrumento de m u d a n ç a do comportamento do clien-
( í ‘ ter com seus procecjimento&-de-tal forma ftxpiytados^e^erm ítem
aos terapeutas saírem do acaso e criarem de maneira planejada,
contingências para que as relações realmente terapêuticas ocorram
entre eles e seus clientes.
A FAP (ou PAF, como também tem sido usada no Brasil)
portanto, é a proposta de Kohlenberg e Tsai (1991) para atendimen-

130
Fátima Cristina de Souza Conte

to clínico, em que o principal instrumento de mudança é a análise


funcional da relação e das interações terapeuta-cliente, e acredita
que muito da psicopatologia ou do sofrimento humano ou é de natu­
reza interpessoal ou neie ocorre. Sendo a relação terapeuta-cliente
de natureza social, em si mesma ela constituiria um contexto_no
quárcõmpõftamehfõs-qü do cliente poderiam se apresentar.
Como já dito, ela se destina ao tratamento de problemas
da vida cotidiana que podem ocorrer na relação terapeuta-cliente e
é o comportamento do terapeuta, em sessão, contingente ao com­
portamento do cliente, a ferramenta especial para a mudança. O
terapeuta “ produz mudanças através de contingências de
reforçamento natural, que ocorrem dentro de uma relação terapeuta-
cliente, que é emocional, próxima e com alto grau de comprometi­
mento” (Kohlenberg, Tsai, Ferro Garcia, Aguayo, Fernández Parra,
& Virués-Ortega, 2005, pp. 352). Assim, a sessão é ao mesmo tem­
po um contexto no qual condutas clinicamente relevantes serão
apresentadas pelo cliente e, também, ocorrerão as ajudas terapêu­
ticas oportunas.
A relação terapêutica tenderia a evocar comportamentos
do cliente que ocorrem fora da clínica e que fazem parte de seus
problemas. E, se assim ocorrer, também os comportamentos no­
vos que aparecerem na interação do C (Cliente) com o T (Terapeuta)
poderão ser generalizados para outras relações sociais. Isso se
daria pela ocorrência de equivalência funcional entre a situação te­
rapêutica e a~vidã~cõtidiana. Esta estratégia é favorecida, além dis­
so, pela possibilidade de modelagem direta e imediata dos novos
comportamentos em sessão, através de intervenções em tempo
real e, bem como, pelo aumento da consciência do cliente (e
terapeuta) das suas classes de respostas mais amplas e das clas­
ses de estímulos a elas relacionadas.
Evidentemente, muitos clientes podem melhorar sem a
consciência das contingências que determinam seus comportamen­
tos clinicamente relevantes. Contudo, parece útil, para muitos, es;
tarem nifintesdeseuscomportamentos-problemaou incompatíveis,
ter conhecimento sobre as circunstâncias nas quais são prováveis
suas ocorrências e, ainda, quando ele deve, por exemplo, tentar
praticar o que foi aprendido nà sessâo t¥rlpeÜtK^-(^ãllaghan, Gregg,
Marx, Kohlenberg, & Gifford, 2004).

131
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Comportamentos clinicamente relevantes, ou C R B sl, ou


C C R sl, é como sao nomeados os comportamentos do cliente que
tem relação com o problema-queixa, enquanto elemento de^urna
classe funcional; já os comportamentos diretamente indicativos de
melhora seriam os CRBs2 ou CCRs2. Estes são geralmente in-
cmipã!íveís"cõ7n os primeiros. Finalmente, os comportamentos
relativos à realização de análise funcional do próprio comportamen­
to. uQr_parte-da£l[ente. sãõ~õs^RBs3 ouTJÜR^. Para õ terceFo.
importam as causas, razões, justificativas e, principalmente, as
observações e descrições das relações entre as respostas e os
seus prováveis estímulos de controle (antecedentes e conseqüen­
tes) e as verbalizações sobre as equivalências funcionais entre a
clínica e a vida cotidiana. Os comportamentos indicativos de me­
lhora mais do que esperados, devem ser modelados e fortalecidos
na interação do cliente com o terapeuta e relacionados com os que
ocorrem fora da sessão, de forma a favorecer ao primeiro a discri­
minação de sua ocorrência e o controle de estímulos presente na
situação “natural”. Assim, o estímulo ou a sua propriedade que an­
tes discriminava o CRB1 poderá sinalizar agora a possibilidade de
emissão CRB2. E se ele ocorrer e for seguido de conseqüênciação
positiva, a cadeia tenderia a se fortalecer.
Um exemplo de aplicação individual da FAP pode ser visto
no caso que se segue, atendido pela autora. Paulo, um rapaz de 18
anos, trouxe, como parte de sua queixa, a dificuldade de manter a
rotina e manter-se num determinado curso de ação. Relatava muito
sono durante o dia e nenhum sono a noite. Trazia o diagnóstico
formal de depressão. Observou-se que ele tinha uma história de
muita punição por parte dos pais por não conseguir ótimas notas e
não seguir um determinado curso de conduta. Observou-se, tam­
bém, que nunca fora “treinado” para tal e que tinha dificuldades de
aprendizagem acadêmica. Embora financeiramente abastado, não
tivera boa estimulação social e cognitiva, nem para desenvolver
hábitos de estudos eficazes. Havia aprendido a prometer aos pais
que iria fazer diferente, como fuga e esquiva dos inúmeros sermões
e castigos. De fato, desenvolvia tentativas, mas não conseguia o
desempenho e desistia. Gradualmente, passou a apresentar vômi­
tos em diversificadas situações nas quais poderia ser avaliado. Suas
tentativas de explicar sentimentos e pensamentos aos pais eram
seguidas de explosões e xingamentos por parte deles e, frustrado,

132
Fátima Cristina de Souza Conte

na seqüência, Paulo dormia durante o dia. Sentia que isso o fazia


“melhorar” momentaneamente (fuga/esquiva de emoções).
Quando foi nomeado psiquiatricamente como “depressivo,
as punições parentais cessaram. Foi medicado, e, mesmo assim,
como esperado, não conseguia apresentar as respostas deseja­
das e cada vez mais se afastava dos seus objetivos e da vida aca­
dêmica.
Durante o processo, T observou que, só o fato de falarem
sobre isso ou ouvir considerações de sua parte sobre a propriedade
de realizar enfrentamentos graduais e adquirir habilidades lhe provo­
caram raiva e sono. (CRB1 ?). Quando T lhe descreveu esta situação
(avaliando sua suposição, como recomenda a FAP) ele concordou
com a observação e relatou que sentia muito mal nestas horas por­
que sabia que certamente fracassaria. Durante a conversa dizia que
não poderia assumir compromisso porque isso ficava obsessivamente
em sua cabeça, o impedia de dormir à noite e lhe dava sono durante
o dia. Depois, não queria vir mais às sessões para não contar o que
não fazia! (CRB2, diferente do que ocorre com os pais).
Verificada a adequação da suposição do CRB1, T tentou
valorizar o relato de Paulo e suas falas sobre sentimentos. A ação
da terapeuta, diversa da dos pais, pode agora iniciar a quebra da
equivalência funcional e de uma possível regra: “falar sobre senti­
mentos e dificuldades será sempre punido”. (CRB1). T ainda com­
binou com ele que ela apenas lhe daria idéias, por acreditar que
elas são boas e que ele poderia realizá-las, mas ele só se arriscaria
quando achasse que deveria e depois lhe contaria, quando quises­
se. Apenas ouvir e agüentar os respondentes, não se esquivando
deles ou da interação já seria um bom passo (um CRB2). Ele disse
que não aceitava “tarefas" (o que parece um CCR2 novo, mais
assertivo, de enfrentamento emocional gradual). T disse que já se
sentia bem com isso e que ele tinha esse direito.
Paulo pensou, concordou e começou a dar exemplos de
como esquivar-se. Aqui, assemelha-se com o jeito como tem admi­
nistrado sua vida e não tem dado certo. Novas interpretações sobre
causação de seus problemas, da suas generalizações inadequadas
e das esquivas foram então possíveis, ocorrendo agora o
enfrentamento da fala sobre isso, na interação com a terapeuta (CRB

133
Terapia Anaiítico-Comportamental em Grupo

2) e análise (CRB3) que lhe permite discriminar muitas esquivas e


organizá-las em uma mesma classe funcional. Se isso ocorreu, pro­
vavelmente houve similaridade funcional entre os ambientes clínico e
cotidiano. Esperava-se, portando, peia reversibilidade, que pudesse
ocorrer a generalização dos CCRs2 e 3 para a situação “natural”.2
Neste caso, ela ocorreu e, em passos lentos e irregulares, o cliente
experimentou uma redução sensível de ansiedade e o desenvolvi­
mento de hábitos de estudos suficientes para continuar na escola. E,
essencialmente, desenvolveu mais comportamentos eficientes de
enfrentamento e luta como alternativa para a fuga e esquiva.

2. A FAP e a Psicoterapia de Grupo Analítico


Funcional
Se a terapia individual já é uma instância na qual os com-
portamentos clinicamente relevantes podem ser evocados, o grupo
é, sem dúvida alguma, um contexto no qual redes de relações soci-
a i^ complexas são mais possíveis e, portanto, mais do que na"pri-
vacidade da relação um a um, o cliente provavelmente está, natural
e fortemente, mais sujeito à influência de estimulação semelhante à
qual se expõe no seu dia-a-dia.
No momento em que o processo grupai se inicia, é .natu­
ral que as interações envolvam a participação do terapeuta mais
frequentemente. Contudo, ele não deverá fortalecer esta ocorrência
e sim envolver os demais integrantes/lo grupo na jnteragãn defor^
ma que, gradualmente, as relações entre seus membros ocorram
de forma mais espontânea e íntima. Assim sendo, os comporta­
mentos de todos podem desenvolver funções evocadoras,
eliciadoras e reforçadoras reciprocamente, para classes de com­
portamentos relevantes, favorecendo a força curativa do grupo.
Kohlenberg e Tsai (1991) destacam que estas são as funções que
os comportamentos dos terapeutas podem assumir frente aos dos
clientes. No caso do grupo, portanto, espera-se que tais funções
também se apliquem para os comportamentos dos clientes entre
si. Para ilustrar tal processo, a seguir será apresentada uma ses­
são de FAP que a autora fez com um grupo familiar, que contou

2 Termo usado aqui somente para ajudar na compreensão, já que neste contexto é possível
ver as duas situações como naturais.

134
Fátima Cristina de Souza Conte

com a presença da mãe e seus três meninos, P de 9 anos, S de 5


anos e F de 3 anos .
Uma das queixas da mãe era de que seus filhos tinham
muito ciúmes uns dos outros, brigavam muito e era difícil para ela
lidar com isso. O objetivo, neste momento, era ajudar a mãe a divi­
dir atenção entre os filhos de forma equilibrada, enquanto eles brin­
cavam juntos. Num primeiro momento, o comportamento de T de­
veria servir de estímulo para imitação e depois a mãe deveria com-
portar-se na mesma direção. T propôs aos três que fizessem uma
construção de blocos, em conjunto.
Tendo os blocos a sua frente, as crianças começaram a
estruturar um prédio e uma rua de casas. Os mais novos imitavam
bastante o mais velho. Vendo isso, T começou a dizer a ele o quan­
to isso mostrava que eles o admiravam (tentando ressaltar uma a
propriedade da estimulação que poderia favorecer a cooperação,
mais do que a briga, que era a sua resposta mais comum nestas
situações). E dizia aos demais o quanto era “legal" ver como cada
um colocava “seu jeito” ao fazê-lo, tentando evitar a ocorrência de
comparações com avaliação negativa, outro estímulo para brigar. T,
ainda, tentava que seu comportamento funcionasse como evocador
para condutas de cooperação, de cuidado e de valorização recípro­
cas, assertividade, entre outros CRBs 2; e os elogiava quando apa­
reciam. Às vezes um ou outro a ajudava e ela agradecia. A terapeuta
respondia prontamente às perguntas e se alternava em atenção,
dirigindo-se a um de cada vez. Tentava apresentar comportamen­
tos que pudessem se constituir de estimulação antecedente
discriminativa e conseqüente positiva para comportamentos ade­
quados das crianças.
A mãe assistia e, na seqüência, se disse pronta para “ser a
terapeuta”. Quando ela começou a sua intervenção, T afastou-se um
pouco e então o menor, F, pegou algumas peças já separadas por P,
sem lhe pedir (A presença da mãe seria Sd para isso?). P disse um
firme “não” (CRB2?) e F choramingou (CRB1?). A mãe pegou os
blocos, devolveu-os à P (CRB2) e F chorou mais alto (CRB1 como
estimulação aversiva para mãe?). Então, ela os devolveu à F, dizen­
do a P que cedesse. (CRB1 da mãe, fortalecido por reforçamento
negativo, com função de Sr+ para o CRB1 de F?). P disse-lhe que
ela não era justa, nunca era, nunca lhe dava razão, nunca o entendia

135
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

etc. (CRB1, queixa generalizada e inespecífica). Começaram, então,


a discutir; a mãe tentava explicar-lhe as razões (CRB1?) e P embur­
rava cada vez mais (CRB1?). S observava tudo e disse:
S - não pode dar pra ele, não pode dar para F, mãe, dá pro P!
(CRB1, já que poderia ter função de ampliar a briga? Ou seria
comportamento adequado ao fornecer estimulação para evo­
car condutas mais justas por parte da mãe?).
F - Porque você disse que não gosta de mim? Você não gosta
de mim, né? (emburrado). (CRB1, e provavelmente o com­
portamento anterior de S teria sido inadequado neste contex­
to, evocando respostas indesejáveis de F).
Mãe - Parem com isso! S ajude seu irmão que vou conversar
com P. (CRB1 da mãe reforçando o CRB1 de P?).
S - (gritando e tremendo irado) - Não vou ajudar nada você, bobo!
Estraga tudo! (CRB1M!).
F destrói tudo e emburra, S parece querer avançar nele,
enquanto a mãe e P discutem. (Todos em CRB1!!!). T interrompe o
ciclo, dizendo para pararem e se acalmarem, segura os dois meno­
res pelo braço, gentilmente e os dirige para as cadeiras ao redor da
mesa, a mãe faz o mesmo. Diz que esta parte não foi legal, que
virou uma guerra e todos devem estar como ela, sentindo-se mal.
Pede para todos respirarem e segue-se a interação. Disse a todos
que o que aconteceu aqui parece com o que acontece em casa e,
então, todos saem perdendo. P disse que era porque a mãe não era
tão calma como a terapeuta, com o que a mãe concordou e
complementou dizendo que todos também ficam nervosos. Disse
que está tentando aprender e pede a ajuda de todos. T valorizou a
fala da mãe ( CRB2) e finalizou. Após tal episódio, marcou um novo
encontro com esta, sozinha, para analisar seu comportamento e,
na seqüência, uma com todos os presentes.
A interação que se segue, entre pessoas mais velhas tam­
bém demonstra as relações entre os CRBs e as funções de estí­
mulo dos comportamentos apresentados, e suas conseqüências
para o grupo. A interação abaixo ocorreu em um trabalho em grupo
com funcionários de uma empresa, realizado pela autora, e uma
estagiária, cujo objetivo era “lidar melhor com o estresse”.

136
Fátima Cristina de Souza Conte

Os terapeutas (T) propuseram aos presentes, R, S, L, N,


V, uma atividade-problema. Todos tinham uma empresa em socie­
dade e deveriam decidir seus rumos. Um deles traria uma propos­
ta, para abrir uma nova área de atuação. Esta área era uma novida­
de no mercado e implicava em investir 20% do patrimônio de todos.
O risco seria apenas a demora em render frutos, mas, a longo pra­
zo, não perderiam o investimento feito. Foi proposto que qualquer
um fizesse a proposta, a defendesse e coordenasse a sua realiza­
ção. Os demais deveriam decidir quem seria esta pessoa e tam­
bém qual seria a atividade de cada um durante a realização de tra­
balho como um todo. Teriam diferentes tarefas e seriam remunera­
dos também por isso. Ou seja, o investimento teria um custo total,
um lucro que seria dividido igualmente pelas partes e cada um que
realizasse as tarefas para implantar o novo produto no mercado
ganharia também pelo trabalho extra que estava fazendo para a
empresa.
Todos tiveram um tempo para pensar e R fez uma pro­
posta e defendeu-a. Outras propostas foram feitas, mas eram mui­
to vagas, por isso foram abandonadas seguiu-se o dialogo.
R—Bem, já que eu fiz a proposta acho justo que eu a coordene.
Todos concordaram prontamente.
N~ Eu acho que posso ajudar a fazer as contas e ver onde vamos
gastar o dinheiro, qual o custo do produto. Parte financeira.
S quis ajudá-lo. L disse que estava com muito trabalho e
então preferia não pegar mais nada pra fazer (provável CRB1, como
já observado pelas terapeutas). Iria ajudar a todos e V disse que o
que decidissem estava bom pra ele (idem, CRB1) e para irem fa­
lando o que ele tinha que fazer.
Começaram a ver a remuneração de cada um. R disse
que queria ganhar 1000 por mês, N e S acharam que de podiam
ganhar 500 e dividir entre eles, já que iam trabalhar juntos e era uma
parte mais fácil e de menos responsabilidade. Os demais não se
manifestaram. Tudo corria bem e R colocou seu planos para o novo
produto, quanto tempo iriam demorar pra colocar no mercado, dar
lucro etc. Todos demonstravam aprovação. N fez as contas de quan­
to iriam gastar, por quanto teriam que vender etc.

137
Terapia Analrtico-Comportamental e m Grupo

Em um dado momento, L disse que R iria ganhar muito e


que deveriam pensar se iriam mesmo colocar este novo produto no
mercado, que iria ficar caro e que achava que não tinham discutido
ainda o suficiente se era bom negocio ou não. Será que não vai ser
bom só para o R? ( Provável CRB1 - omitir-se, depois voltar atrás
e indicar que alguém estaria vendo só seu lado e não o de todos, já
observado em outras situações, mas não discutido).
N - Meu, a gente já viu que era bom, a gente já decidiu!(lrritado).
V concordou. (CRB1 de L tem efeito evocador e eliciador de
CRB1 para N e este, por sua vez, é Sr+ para o CRB1 de L?)
L - N ão, acho que a gente não discutiu muito. Não acho que era
pra já ir fazendo assim, tem que pensar melhor. É bom para a
empresa? (CRB1 reforçado pelo CRB1 de N?).
N - No fim a gente vai ganhar, o negócio seria lucrativo, fizemos
as contas e dá, meu! (mais calmo) - (CRB1, já que poderia
estar com função de Sr+ para CRB1 de L? CRB2 consideran­
do seu comportamento anterior?).
R" Olha, eu não quero impor, pressionar ninguém. Eu sei mes­
mo fazer isso, mas, se a empresa não quer, tá, volta atrás. Eu
não ia ser burro de querer perder dinheiro. Só vou receber o
que foi combinado. Mas se vocês acham isso, não quero im­
por nada. (CRB2, já que, em outras situações semelhantes,
Ts observaram que R respondia agressivamente. Será que
neste momento também poderia ter efeito de SR+ para CRB1
de L ou seria Sd para L observar-se mais adequadamente? E
para N, qual seria a função, aversiva? ).
N - Nada a ver. É legal pra todos, (mais calmo, CRB2, mas com
função SR+ para L? E para V, seria Sd para posicionar-se
mais adequadamente?).
V - Se tem gente descontente, vamos pensar melhor e o impor­
tante é não haver briga. (Parecia CRB1, já que Ts observaram
que ele raramente falava o que pensava em situações de con­
flito e sim tentava desmontar a discussão, parecendo conci­
liador, mas geralmente não era este o resultado. Era inade­
quado para ele e para o grupo, parecia uma fuga/esquiva
disfuncional. Também seria Sd para S explicitar sua posição?)
N - O que você acha, V? (CRB2)

138
Fátima Cristina d e Souza Conte

V - O principal é não quebrar a nossa equipe (CRB 1, da mesma


classe, esquivar-se de conflitos, omitir-se).
T pediu para analisarem o que aconteceu até agora. (Sd
para descreverem seus comportamentos, os dos demais e as con­
seqüências na realização da tarefa).
N disse, com tranqüilidade, que ficou irritado com L e que
V deveria se posicionar mais, que ele poderia ter definido a situação
(CRB2). T diz que foi importante ele expressar sua opinião e que o
fez sem agressividade e que esperava que todos vissem as falas
dos colegas como contribuições para seu desenvolvimento pes­
soal. (Sr+ para CRB2 de N e Sd para todos falarem como se sen­
tiam, desejavam ou percebiam e não se punissem reciprocamente
por isso?). T acreditava que os sentimentos e percepções de N
sobre o ocorrido poderiam indicar como outras pessoas se sentiri­
am com os colegas referidos em situações semelhantes. Na se­
qüência, L e V nada disseram (CRB1 ?).
R disse que antes ficava bravo quando acontecia isso,
(relacionando experiências de fora com o que ocorreu no grupo),
pois, além de atrasar tudo, parecia que falavam que ele não era
honesto e que agora pensara que podia ser insegurança da pes­
soa, que ele era honesto e não achava nada de mal em ser ambi­
cioso (CRB3, analisando o próprio comportamento). Falou sem iro­
nia ou com qualquer outra “dica” agressiva (CRB2), o que fez T
intervir e relacionar sua fala com discussões que já haviam tido so­
bre perceber a diferença entre a opinião de alguém sobre nós e o
que somos (Sr+ para CRB3 de R e Sd para os demais fazerem o
mesmo?). R lembrou-se de outras situações nas quais já havia bri­
gado por coisas semelhantes e que hoje tentava olhar para essas
situações profissionalmente e não se envolver pessoalmente (de­
monstrando que o comportamento de T poderia ter sido Sr-*- para
seu CRB3). Como todos estavam quietos, observando, Ts pediram
para todos falarem o que estavam pensando (tentativa de
estimulação para imitação do CRB3 de R ou para qualquer fala pes­
soal). Todos pareceram aprovar a análise , mas não faiaram sobre
eles (não foi Sd?). T disse ter sentido apreensão quando o debate
começou e muito alívio e bem estar com a reação de R. Achou que
ele iria brigar. (S para imitação?). Riram, parecendo aliviados, mas

139
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

não falaram nada pessoal. T perguntou como S sentiu-se e ele


disse que Concordava com N e que era chato ficar discutindo (início
de CRB2, já que parecia ter déficit de repertorio de expressão de
sentimentos. T demonstrou-se satisfeita com a resposta (Sr+ ?) e
pediu para L dizer o que sentiu (Sd para L falar como se sente?
Instigação?). L, finalmente, disse que não se sentiu mal, não quis
acusar “ninguém” e que iria pensar sobre o que aconteceu (inicio de
CRB2?). T aceitou e disse para V também falar algo. V disse que
achava que deveria ter agido como fez, porque poderia ser pior dei­
xar a confusão acontecer (continua no CRB1?). As Ts não insisti­
ram com ele, diretamente, neste momento e falaram ao grupo.
Pediram a todos para pensarem um pouco mais sobre
como agiram aqui, agora no grupo, e o quanto seu comportamento
foi semelhante ao que ocorria em situações parecidas cotidianas. N
disse que geralmente se oferece para fazer sua parte, que era obje­
tivo e que era bom ser assim, não gostava de “enrolar”, mas, mui­
tas vezes acabava “comprando” brigas. T disse que ele havia feito
uma boa auto- observação e que isso poderia ajudá-lo a ter mais
auto-controle, quando previsse resultados não desejados. Instigou,
L S, V sem muito sucesso. Tentou então uma atitude menos direta
(aproximando-se sucessivamente de confrontos individuais), dizendo
que o que tinha ocorrido era muito rico e que seria muito terapêutico
aproveitarem este episódio para questionar suas atitudes cotidia­
nas, em contextos semelhantes, investigando a ocorrência de CRB3
no grupo, poderiam ser perguntar: como se sentem quando pesso­
as da sua equipe (felizmente, para a terapeuta, não era a mesma
do grupo!) tem ganhos pessoais diferentes, mesmo que combina­
dos, decorrentes de uma ação grupai? O quanto calar e outras
atitudes que tinham como objetivo “para evitar problemas” não
ajudamna sua proliferação? Haviam outros caminhos? E que con­
seqüências teriam? Seria esta mesma a “razão” de calar-se? Não
seriam outras as “verdadeiras razões” de tais atitudes? Quais seri­
am os medos, os riscos a serem evitados? Lembrou que os com­
portamentos são aprendidos e passam a configurar um tipo de “per­
sonalidade* e que ninguém tem “culpa” de sua aprendizagem, que
certamente atua hoje com “o seu melhor”, desenvolvido e mantido
pelas conseqüências de cada ação. Olhar com distanciamento e
avaliar seu comportamento, porém, dá a chance de “sair do piloto

140
Fátima Cristina de Souza Conte

automático” certamente cada um “pegar no volante” e dirigir-se


para novas oportunidades de aprendizagem. Disse que sentia-se
“dando sermão” e que poderia estar chateando-os. Pediu para pas­
sarem por cima de algum sentimento deste tipo, fizessem a analise
e falassem sobre isso em outros momentos, quando se sentissem
prontos.
Finalmente, retomou a tarefa, propôs que a finalizassem
enquanto ela procurava apenas valorizar comportamentos apropri­
ados. A sessão finalizou-se com a troca de feedbacks positivos so­
bre o crescimento que cada um observara em si e nos demais,
tendo as Ts bloqueado gentilmente, críticas e críticas neste mo­
mento.
Em sessões posteriores a este episodio, estando as Ts
caminhando com o grupo desta forma, observou-se cada vez maior
aumento de intimidade (aproximação física, fala sobre experiências
mais pessoais, fala sobre assuntos difíceis etc.). O confronto pare­
ceu ter sido terapêutico. Após as demais sessões, no momento de
avaliação final do processo grupai, entre falas dos demais, R agra­
deceu ao grupo porque havia desenvolvido mais equilíbrio e sereni­
dade para lidar com situações difíceis, afirmou que estava menos
explosivo e mais capaz de olhar os vários pontos de vista com com­
preensão. Muitos descreveram momentos nos quais observaram
generalização de comportamentos novos no dia-a-dia V foi o cliente
que menos mudanças apresentou.
No setting grupai, como se pretendeu expor através do
relato acima, os terapeutas podem observar, mais rapidamente,
padrões comportamentais dos clientes e como eles se entrelaçam
e assumem funções de estímulos variadas para os comportamen­
tos uns dos outros , e para funcionamento do grupo ou de uma
equipe. Torna-se mais fácil a previsão das interações possíveis e o
estabelecimento de estratégias para lidar com elas. Da mesma for­
ma, há oportunidade de intensa auto-observação e descrição de
seus comportamentos e conseqüênciação por parte dos próprios
clientes, de validação da auto-observação, dos sentimentos e das
percepções expressas e, como em outros contextos, de indicação
e demonstração de novas condutas e seu reforçamento natural. O
montante de estímulos para imitação presente também é especial­

141
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

mente enriquecedor e acelera o processo. A volta para o aqui e ago­


ra, a extensão da análise da interação entre ambientes (grupoo e
extra grupo), ajuda os clientes (e terapeutas) a realizarem analises
sobre classes comportamentais mais amplas, mais rapidamente,
potencializando a generalização. A FAP e O GRUPO parecem for­
mar um “saudável casal”!

3. Cuidados e habilidades do terapeuta na


realização da FAP em grupos
Os autores das FAP descrevem as habilidades necessá­
rias ao terapeuta que atua através dela, individualmente. Ressaltam
o cuidado em agir na direção de estabelecer-se como reforçador e
de desenvolver uma observação sobre o efeito do seu comporta­
mento sobre o do outro. Mais recentemente, Kohlenberg e colabo­
radores (2005) descrevem uma situação interessante, de atendi­
mento individual, que pode ser facilmente generalizada para gru­
pos, na qual o terapeuta, hábil em usar procedimentos, princípios e
técnicas comportamentais. erra em não observar o efeito da aplica­
ção de um procedimento típico sobre comportamentos clinicamen­
te relevantes do clienteTacabando por punir a sua melhora (o CRB2).
No caso, uma mulher que buscou ajuda por depressão relacionada
com sua pouca assertividade foi convidada pelo terapeuta a fazer
ensaios comportamentais para desenvolvê-la. Ela então lhe pergun­
tou se não haveria outras formas de fazer tal treinamento (sendo
assertiva pela primeira vez com o terapeuta). O terapeuta reagiu
dizendo que ela estava fazendo uma esquiva disfuncional e fez com
que ela fizesse o ensaio. O terapeuta parece ter punido, na sessão,
exatamente o comportamento que ele queria que ela apresentasse
na vida cotidiana!
E o que falar sobre as habilidades pessoais que favorecem
a ocorrência de relacionamentos íntimos? Entre elas estão a
tolerância e o acolhimgnto de_comentários dos clientes sobre o
terapeuta, seu próprio comportamento ou ambiente. Eles nem
sempre são os mãls~ãgradáveis, principalmente em se tratando de
clientes que tendem a apresentar respostas agressivas ou
impulsivas.

142
Fátima Cristina d e Souza Conte

A FAP tem uma vantagem interessante: ela favorece


francamente a modelagem, por parte do terapeuta, do falar sobre o
controle do fazer ou vice-versa e a modelagem da equivalência
fTíndõnãrêntre o talar e o fazêtTÕqueTemTnüitos casos, e importanti.
Assim como também ajuda no inverso, quando ocorre, por exemplo,
a “difusão cognitiva” decorrente do estabelecimento de equivalências
impróprias, (pode-se ver sobre isso na ACT e FACT, em outro capítulo
desta obra).
Da mesma forma que o terapeuta pode fortalecer estes
repertórios mais amplos, deve atentar para a possibilidade de
modelar também somente uma “boa interpretação” (o que pareceria
um CRB3), que, ao invés de ser um propulsor para a ocorrência do
CRB2 na clínica e fora dela, possa ser, se não somente inútil,
também como uma estratégia de fuga e esquiva. Como bem coloca
Hayes (1987), aprende-se, nesta cultura, a apresentar respostas
sobre os “porquês de ações” mais sobre controle das reações da
audiência ao relato do que sob controle dos estímulos antecedentes
e conseqüentes associados com a ocorrência do comportamento
de fato. E pior, passa-se facilmente a crer em tais “justificativas” e,
assim, há um desfocar-se das variáveis relevantes que ajudariam
no autogerenciamento. A habilidade de discriminar o que é um
verdadeiro CRB3, de fato, é importante.
A FAP questiona a adequação da indicação de exercícios
de casa, dotípo treinamento, por considerar que, nesta situação, as
respostas apresentadas pelo indivíduo tenderiam a ser mais
topograficamente semelhantes às que estão sendo modeladas no
sfíFfinnterapêPTtanffilJLÍè funcionalmentesemelhantes, o que seria
olMi^'õ5TgTTVõ^sTãríãm sobre controle das regras do terapeuta do
que das contingências usuais do ambiente. Contudo, em nossa
cultura, desenvolve qeterminaaas
variações de resposta acabam sendo importantes e o “treino”, a
repetição é um instrumento útil para isso. Veja-se o caso de
habilidades sociais, muito bem destacado por Andery3(Comunicação
Pessoal). Questiona-se o quanto o foco no “aqui e agora”, num grupo,
encurtaria este caminho e quão importante é desenvolver critérios

3 Aula ministrada no Núcleo Paradigma no curso "Tópicos Avançados e Análise do


Comportamento”, em 2006.

143
Terapia Analílico-Comportamental em Grupo

para inserir ou não as “tarefas de casa” em grupos de FAP, assim


como no atendimento individual.
O uso da FAP em grupo é bastante novo (ou o relato destas
experiências é), para que se possa responder a muitas questões
que são levantadas sobre habilidades, caminhos, riscos e mesmo
sobre as semelhanças com outros enfoques terapêuticos grupais.
Contudo, os relatos (Vandenberghe, Furtado da Cruz & Ferro, 2003;
Conte & Coelho, 2003) mostram que tal extensão é interessante e
deve ter méritos e alcances específicos, a serem desvendados.

4. Um pouco sobre metodologia para inserir a


FAP em grupos
Conte (1996), realizou uma intervenção na qual utilizou
procedimentos baseados na FAP para lidar com grupos de adoles­
centes de baixa renda com comportamentos agressivos e delin­
qüentes. Deste trabalho foi possível depreender alguns procedimen­
tos aparentemente facilitadores da inserção da FAP em um proces­
so psicoterápico grupai, que foram, depois, exploratoriamente exer­
citados em outros trabalhos. Eles combinam com as sugestões
dos autores sobre as propostas para terapia individual.
Um aspecto im portante refere-se ao processo de
identificação dos CRBs, para os quais podem ser usados vários
recursos.
O primeiro instrumento, indicado pelos autores da FAP, é
a análise funcional da conduta verbal, ressaltando-se a importância
da distinção entre os tatos e mandos como ponto de partida para a
análise (Skinnen 1957) Mandos disfarçados são muitas vezes com­
portamentos de esquiva, modelados na historia de vida do cliente e
não devem ser fortalecidos. Ao invés disso, as condutas do T deve­
riam favorecer a ocorrência de tatos e mandos mais precisos. Aper-
í feiçoar tatos sobre si mesmo é muito importante, assim como fo.r-
mular auto-mandos e se controlar por eles. Além disso, solicitam
í atenção especial dos terapeutas para falas dos clientes que estão
sob controle de duas fontes de estimulação: as do ambiente exter­
no somadas às do ambiente terapêutico, que ajudam na generali­
zação entre ambientes, e também entre dois momentos distintos
do processo grupai, que podem ajudar na generalização no tempo.

/*\ s"
'. 144
Fátima Cristina d e Souza Conte

0 relato abaixo se refere a um trabalho em grupo realizado por Oliani


(Comunicação Pessoal)4. Ele ilustra este ponto e permite explora­
ções posteriores.
A terapeuta atendia a um grupo de oito adultos
diagnosticados como apresentando Transtorno de Déficit de Atenção
e Hiperatividade DSM IV - 314 (1994). A maioria apresentava déficits
em habilidades de relacionamento, baixa tolerância à frustração,
baixa auto-estima e segurança e, ainda, reações intensas ao
expressar emoções. Em uma sessão, uma das participantes
chegou chorando intensamente. Acabara de receber a notícia de
que uma amiga (de outra cidade) havia falecido.
T: Como era a relação com sua amiga?
C1: Foi minha aluna de pintura (choro). Não acredito...Não eta!
Tão....Tão alegre...de bem com a vida... Tinha programado
uma viagem... Agora...me sinto culpada! Não cheguei a dizer
que a amava como minha irmã...(choro).
C2: Como? Não estou entendendo.
T: Explique melhor, o que aconteceu e o seu sentimento...
C3 (único homem do grupo): M ulheres...são muito
complicadas...pra que chorar deste jeito? Detesto isto!
C4: Sinto-me irritada com sua insensibilidade!
C1: Desculpem...(choro), mas eu preciso falar... as pessoas
podem não entender, eu também não estou entendo porque
estou chorando assim... meus sentimentos estão confusos.
Talvez por ter tido inveja dela...(choro) ...Queria ser como
ela...(choro) Não acredito que ela morreu...Estou triste, estou
com raiva,..não sei o que sinto...(choro).
T: Alguém já teve perdas de pessoas queridas e próximas?
C5: Eu já perdi pessoas muito queridas... e sei que é difícil no
começo...
C3: Eu não... Bom, acho que tive...não morreram, mas é como
se tivessem (morrido)... Tive uma namorada que gostei muito...
4 Relato de caso realizado em maio d© 2008 para autora do trabalho, que agradece Oliani
pela colaboração.

145
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Ela me abandonou... trocou por outro. Ela queria casar e eu


não sabia se gostava dela... ela sempre perguntava e eu não
respondia...Um dia ela term inou. Com os outros
relacionamentos foi parecido...
T: O que você sentiu quando ela terminou?
C3: Não sei... nunca quis pensar. Normal.
C4: (demonstrando irritação )...É igual meu marido...não fala!
T: E agora, com a expressão de tristeza de C t, você ficou com
raiva.
C3: Não, acho que é exagero.
T: Percebo que está difícil admitir que sente certos sentimentos
como a raiva, a tristeza, e até solidariedade com a dor de C1.
(Neste momento C3 corou e os olhos se encheram de
lágrimas).
C3: É que ninguém percebe que eu também sofro, que dói ser
abandonado, que homem precisa ser compreendido, e que
quer amar e ser amado, que quer demonstrar carinho...mas
se demonstrar é fraco...Eu sou homem e tenho sentimento
(choro intenso).
C6 oferece lenço para C3, demonstrando aceitação da
resposta deste e diz :
C6: Parece que a dor de C1 afetou todos nós... eu não estou
conseguindo falar.
C7 e C8 Também pegam lenço e a T pergunta se querem
falar e negam com a cabeça.
C1: Estou me sentindo melhor, por ter falado e por C3 ter contado
destes sentimentos.
T: Estou percebendo você mais próximo do grupo hoje e percebo
os participantes do grupo próximos de você C3. Você foi
corajoso de admitir seus sentimentos.
Segue-se uma discussão sobre varias questões, morte,
perdas, sentimentos que cada pessoa tem na situação e o que oca­
siona a diversidade, intensidade etc. Neste momento, C3 descreve

146
Fátima Cristina de Souza Conte

o acolhimento como importante para ele ter se sentido bem ao se


expor. No final desta sessão, C3 pede desculpas para C1 e para C4
por ter sido ríspido. O grupo se despede com abraço de solidarieda­
de para com C1 e C3.

Após 5 meses deste episódio, ocorre outra interação:

C1 compartilha com o grupo a morte de seu tio mais querido,


ocorrido de forma súbita.
C1: Estou vivendo uma dor diferente daquela daquele dia, estou
triste mais estou serena... Venho pensando muito sobre a
morte... No velório do meu tio, minha mãe fez um escândalo
igual ao meu aquele dia no grupo... Fiquei com vergonha...
Acho que eu tinha aprendido com ela a ver a morte com de­
sespero e a me comportar daquele jeito... Com a participação
no grupo sei que posso expressar minha dor, meus sentimen­
tos... Que minha dor é parecida com a dos outros, e não é
igual. E não precisa ser expressada igual. Todo mundo espe­
rava meu “piti" Estou me sentindo tão melhor, tão aliviada...
Acho que no grupo posso ser eu mesma e lá fora as pessoas
estão notando a diferença. Estou gostando de mim”.
E após 6 meses: morre o pai de C7f que compartilha sua
dor e complementa:
C7: “parece que estes meses que temos conversado sobre morte
facilitou eu poder expressar o que sinto agora... Lembram
aquele dia da amiga de C1.... fiquei com raiva, com dó, queria
gritar como a C1, e pedir pra ela parar e não falei nada... Eu
estava com medo, pois meu pai já estava com diagnóstico de
câncer. Agora que ele se foi...Vivi todos aqueles sentimentos
daquele dia de outro jeito...chorei...de tristeza e saudade. Me
surpreendeu como eu pude resolver as questões práticas. O
grupo ajudou-me a aceitar meus sentimentos, falar sobre eles
e escolher o que vou fazer com eles, sem precisar agredir
ninguém. Acho que amadureci, mudei para melhor”.
Posteriormente C7 declarou ter interesse homossexual e
estar se apaixonando pela primeira vez.

147
Terapia Analítico-Comportamen+al ©m Grupo

Avajon^açãade. falas sob controle de duas fontes de e_s-


timulos;olTp7esentes_no grupo e os equivalentes fora deíe;”qs que
se referem a ^ ú ã ç õ e s passadas é as que se relacionam’ com qué
èstãõ presentes nesta situação grupai e, ainda, as que relacionam
comportamentos funcionalmente equivalentes dos membros do gru­
po, (o que é favorecido por este contexto), provavelmente ajudaram
no desenvolvim ento e generalização de um repertório de
expressividade emocional mais adequado por parte de todos os
membros do grupo.
Além da relevância da atenção às falas que relacionam
comportamentos equivalentes que ocorrem em ambientes, momen­
tos e entre clientes, e, da necessidade do fortalecimento de tatos e
mandos “mais puros”, observa-se que outras categorias de com­
portamentos verbais também merecem atenção neste processo.
Uma destas categorias é a dos intraverbais (Skinner,
1957). A cultura modela e considera adequadas longas cadeias
comportamentais verbais nas quais boa parte das interações é cheia
de intraverbais. A ausência, os excessos e os déficits de intraverbais,
ou ainda o seu uso de forma inadequada, está presente em muitas
dificuldades em habilidades sociais. Por vezes o que parece um
tato ou um mando disfarçado é, na verdade, um intraverbal, ressal­
ta Andery (comunicação pessoal). . Por exemplo, C1 poderia ter
relatado a morte da amiga enquanto o grupo estava se organizando
para começar e dizer: “foi minha aluna de pintura. Não acredito...
Não ela! Tão....Tão alegre...de bem com a vida...Tinha programado
uma viagem... Agora...me sinto culpada! Não cheguei a dizer que a
amava como minha irmã..” e não chorar ou parecer emocionada.
Os demais poderiam dizer coisas gerais, sobre morrer e depois
falar sobre outros assuntos dos quais C1 participaria da mesma
forma. Ao iniciar a sessão C1 poderia fazer um relato sobre sua
última discussão com a filha, fato que considerava mais importan­
te. O relato da morte da amiga poderia ser visto como um intraverbal
e seria inadequado responder a ele como se fosse um mando
disfarçado, por sua topografia (“estou sofrendo”, “me acolham”).
Os autoclítjcos (Skinner, 1957). também não foram ainda
destacados nos escritos tradicionais sobre FAP. Contudo, Meyer5(Co­

5 Aula ministrada no Núcleo Paradigma no curso “Tópicos Avançados e Análise do


Comportamento", em 2006.

148
Fátima Cristina de Souza Conte

municação Pessoal) ressaltou sua preocupação com eles com mui­


ta propriedade. A autora lembra que tais comportamentos verbais são
baseados ou dependem de outros comportamentos verbais e ten­
dem a afetar a reação do ouvinte aos comportamentos aos quais ele
está associado. Mayer (2006) pondera que a presença de poucos
autoclíticos nas falas de clientes e terapeutas pode indicar uma rela­
ção mais estável. Já seu uso permite suavizar a crítica, aumentar a
adesão do cliente ao que lhe é dito etc. Observa o fato de que os
clientes que usam muitos autoclíticos podem estar sempre tentando
evitar punições. Por exemplo, se C3, que parecia ter avaliado apropri­
adamente a reação de C1 como excesso comportamental, ao invés
de dizer “mulheres... são muito complicadas... pra que chorar deste
jeito? Detesto isto!” naquele momento, aguardasse a diminuição da
resposta emocional da colega e, mais a frente dissesse algo mais
sustentado por autoclíticos, como “pude perceber que esta perda está
sendo muito sentida por você e talvez você estranhe o que vou lhe
dizer agora, talvez nem seja o momento,., enfim, me senti incomoda­
do com a sua reação, achei um pouco extremada, não por causa do
sentimento... sei que é intenso e verdadeiro, mas ... . Bem, acho um
pouco complicado entender as mulheres... mas queria lhe dizer isso,
sem ofender, o que você acha?” C3 e os demais presentes pode­
riam ter tido uma reação diversa e mais produtiva para todos.
Outra fonte realmente importante para o levantamento de
possíveis classes CRBs específicos e idiossincráticos é a análise
funcional do problema de cada cliente do grupo, mesmo que apre­
sentem queixas topograficamente semelhantes ou “homogêneas”.
Isso ajuda o terapeuta a conduzir interações direcionadas a cada
um e identificar quando eles estão apresentando seus CRBs no
grupo, como já visto em exemplos anteriores. Para isso, além das
entrevistas iniciais, a observação dos comportamentos nas primei­
ras sessões parece desejável. No caso de grupos de pesquisa-
intervenção mais ainda, pois esta fase “sem FAP’, ou “modelando a
introdução de interações FAP”, permite análises interessantes so­
bre efeitos específicos da FAP. A observação fora do contexto grupai,
quando possível e a aplicação de inventários também já se mostra­
ram úteis (Conte, 1996). Conte (1996) usou as informações
coletadas através do inventário YSR (Achenbach, 1991) para elabo­
rar classes de respostas e comportamentos amplos, que deveriam
ser intensificados nos grupos, para todos os clientes com exces­
sos comportamentais agressivos e delinqüentes segue uma expia-

149
Terapia Analítico-Comportamentai em Grupo

nação ilustrando este ponto. Para Achenbach (1991), a^síndrome


“Comportamento Agressivo" poderia ser discriminada pela concor­
dância com as seguintes afirmações: discuto muito; gabo-me, sou
vaidoso; sou mau para com as outras pessoas; tento que me dêem
muita atenção; destruo as minhas próprias coisas; destruo coisas
que pertencem a outras pessoas; sou desobediente na escola; te­
nho ciúmes dos outros; meto-me em brigas; ataco fisicamente as
outras pessoas; grito muito; exibo-me ou faço palhaçadas; sou tei­
moso; tenho mudanças súbitas de humor ou sentimentos; falo de­
mais; provoco (arrelio) muito os outros; tenho temperamento exal­
tado; ameaço ferir as pessoas; falo mais alto que a maioria das
moças e rapazes. Já “Comportamento. Delinqüente” teria as seguin­
tes: não sinto culpa após fazer algo que não devo; ando com rapa­
zes ou moças que se metem em confusões; minto ou engano; pre­
firo estar com moças ou rapazes mais velhos do que eu; fujo de
casa; provoco incêndios; roubo coisas em casa; roubo coisas em
lugares que não são a minha casa; praguejo ou uso linguagem obs­
cena; falto às aulas; uso álcool ou outras drogas sem ser para fins
medicinais. Tais comportamentos foram aprendidos e são manti­
dos e intensificados por contingências de reforçamento a curto e
médio prazos, mas tendem a ser punidos a longo prazo. Trazem
dano imediato aos demais, mas não são benéficos para quem os
emite. Nele está presente o controle coercitivo, como definido por
Sidman, (1995).
Conhecendo o perfil do grupo para estas respostas, a T
pôde identificar, observar e descrever, com mais especificidade, as
respostas de interesse e seus antecedentes e conseqüentes em
contextos extra-clínicos, e, a partir daí, deduzir possíveis eventos
que, no grupo, poderiam favorecer a ocorrência e manutenção de
comportamentos da mesma classe funcional. Com isso, poderia
ficar atenta ao início de cadeias comportamentais a serem inter­
rompidas e reconduzidas rapidamente, na direção da apresenta­
ção de outras mais adaptativas. Ainda pode levantar quais eram as
que mereceriam reforçamento positivo intenso.
A grosso modo, para este grupo, a observação também
mostrou que poderiam haver alguns repertórios maiores a ser mo­
delados, fortalecidos ou mantidos para todos os integrantes do gru­
po. Descreveu-se então, possíveis CRBs 2 para todos os compor­
tamentos que levavam ao autoconhecimento, como pré-requisito

150
Fátima Cristina de Souza Conte

para o autocontrole; comportamentos ou habilidades grupais e so­


ciais, de maneira geral e os comportamentos francamente incom­
patíveis com a classe de comportamentos agressivos/delinqüentes
relatados anteriormente.
Os CRB3 descritos referiam-se às analises funcionais ou
fragmentos destas. Por exemplo, elas poderiam ser a identificação
e descrição das respostas, abertas e encobertas em curso, e seus
antecedentes e conseqüentes a curto e médio prazos; identificação
de outros comportamentos da mesma classe que se apresentam
no contexto clinico e em outros contextos; historia de aprendiza­
gem de tais comportamentos; tendência comportamental futura ,
comportamentos da mesma classe apresentados por outros mem­
bros do grupo etc.
Neste estudo, como havia vários terapeutas atendendo a
vários grupos, e por tratar-se de um trabalho de pesquisa-interven-
ção, descreveu-se claramente as respostas que compunham as
classes funcionais e, para cada cliente era mantida uma ficha de
observação comportamental que ajudava nas intervenções indivi­
dualizadas. Mais detalhes sobre isto podem ser vistos em Conte
(1996). De forma semelhante, procedeu Coelho (2001) em traba­
lhos que tiveram como objetivo descrever processos grupais base­
ados na FAP para desenvolver comportamentos incompatíveis (CRB
2 e 3) com as classe funcionais “provocar e reagir inadequada­
mente à provocação”, apresentadas por crianças de baixa renda
com queixa de comportamento agressivo exacerbado. Neste caso,
foram feitas 16 sessões, iniciais de observação e seleção de com­
portamentos clinicamente relevantes, enquanto se estabeleciam as
regras de convivência do grupo, antes de introduzir a FAP e outras
estratégias de intervenção para os comportamentos em questão.
Foram também definidos, para todos os trabalhos mencionados,
as condutas desejáveis a serem apresentadas pelas terapeutas.
Conte e Coelho (2003) (...) compararam episódios de sessões mos­
trando mudanças comportamentais que ocorrerem no decorrer do
processo, tendo o sujeito como seu próprio controle. De forma ge­
ral, Conte (1996), Coelho (2001) e Conte e Coelho (2003), demons­
traram resultados terapêuticos importantes usando a FAP e tais es­
tratégias.

151
Terapia Analrtico-Compoitamental e m Grupo

Vandembergue, Cruz e Ferro (2003) têm interessantes


estudos em grupo com queixosos de dor crônica orofacil, no qual
combinam uma proposta didático-informativa com a FAP, obtendo
excelentes resultados. Apresentam vinhetas ilustrativas da
intervenção e dos seus resultados comportamentais. Vandembergue
e Ferro (2005) e Vandembergue; Cruz e Ferro (2003) apresentam
também seu trabalho de psicoterapia com FAP para dor crônica.
Todos são altamente estimulantes.

5. Considerações finais
A FAP, como bem coloca Alvaréz, (1996), indica, de for­
ma, filosófica e conceitualmente coerente com o Behaviorismo Ra­
dical, como devem ocorrer os intercâmbios verbais entre o terapeuta
e cliente para que a sua relação possa ter efeitos altamente curati­
vos. Os estudos já feitos por seus proponentes e outros, descre­
vem diretrizes claras, lógicas e precisas que podem ser seguidas
passo a passo, no decorrer da psicoterapia. A magia que cercava
este processo torna-se cada vez mais cientificamente desvenda­
da. O comportamento verbal torna-se* com a FAP, uma ferramenta
definitiva de intervenção terapêutica que, a partir disto, não mais se
limita a falar de algo que ocorre na vida real, distante do terapeuta,
mas traz o foco do trabalho para o momento e tempo presentes.
Poderia se questionar o quanto as contingências podem
manter os comportamentos desenvolvidos no contexto terapêutico,
o quanto a generalização não deveria ser esperada ou o quanto de
empenho seria necessário para fortalecer a força do novo compor­
tamento apresentado em sessão, para que ele fosse mais resisten­
te a contingências adversas. São aspectos sob os quais cabe pen­
sar, assim como há que avaliar ainda o quanto a FAP é necessária
em todos os processos terapêuticos ou descobrir onde sua aplica­
ção é especialmente recomendada.
De toda forma, o que se tem até agora sobre ela indica
que ela é altamente indicada para exercer o papel a que se propôs:
o trato e a superação de problemas interpessoais, ao lado daqueles
que sãó de natureza intrapessoal, como os decorrentes de esquiva
experiencial. Neste caso (de esquiva experiencial), o comportamento

152
Fátima Cristina d e Souza Conte

do terapeuta na interação com seu cliente, pode eliciar emoções e


sentimentos indesejados, condicionados inadequadamente, em si­
tuações equivalentes. Neste caso, a interação em si mesma é tam­
bém um contexto seguro para que o cliente se arrisque a desenvol­
ver a aceitação e a tolerância emocional que lhe permitam agir na
direção de sua melhora (Hayes, 1987 & Kohlenberg & Tsai, 2001)*.
Por todas estas possibilidades e pelos confrontos que são
prováveis de acontecerem no processo, uma;oompreensão^errôneaj)
da FAP é a de que o terapeuta cria oportunidiHeFpara"eliciar ou
evocar os CRBs 1, sejam eles operantes ou respondentes., como
estratégia preferencial. A verdade é que ele deve aproveitar, f
parcimoniosamente, a sua ocorrência. Contudo, a ênfase é no esta-
belecimento dosCREí 2 e 3. ÕsCRBsl são capitalizadoslno intuito
de ajudar o cliente a discriminar seu próprio comportamento e a
estimulação relevante. As interações de caráter mais aversivo, como
já dito, devem ser realizadas de forma a minimizar tal efeito, para que
tenham efeito terapêutico. As reações dos clientes mostrarão se tal
intervenção os afastou ou não da relação com o terapeuta, dos cole­
gas de grupo, da terapia, da auto-exposição ou se os levou a se apro­
ximarem de sua melhora e de tudo o que a favorece.
Enfim, tudo o que já se conhece sobre a FAP (parcial­
mente exposto aqui) tem sido descrito de forma a permitir aos
terapeutas fazerem incursões sobre ela na psicoterapia de grupo.
Trabalhar com a FAP não isenta os condutores de caminhar por
todas as etapas de estruturação do trabalho grupai, comoocorre
com outras propostas, conforme já indicado anteriormente. É preci­
so organizar o funcionamento do grupo, estabelecer conjuntamente
as regras de funcionamento, fortalecer comportamentos cooperati­
vos, de confiabilidade e vinculação positiva, criar um clima de
reforçamento positivo mútuo, entre tantos outros quesitos que favo­
recem o trabalho em grupo e a auto-exposição de todos.
Provavelmente os clientes que se submetem a trabalhos
terapêuticos grupais esperam ser ouvidos, compreendidos e ajuda­
dos por seus colegas, além do terapeuta e sabem que estão sujei­
tos a ouvirem observações sobre seu próprio comportamento por

*Sugere-se que se relacione a leitura deste capítulo com o escrito por Brandão sobre ACT,
neste livro.

153
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

parte dos demais. Isto parece facilitar a introdução de análises de


interações. Contudo, mesmo assim, a inserção da FAP deve ocor­
rer gradualmente, de forma a gerar a menor resistência possível.
A FAP é uma proposta terapêutica que se apóia no que
Skinner coloca sobre o comportamento verbal e no que destaca Fester
(1967, como citado por Kohlenberg, e Tsai, 1991) sobre reforçamento
natural. O efeito das reações do terapeuta e dos demais integrantes
do grupo às condutas uns dos outros deve ser avaliado continua­
mente. A todo o tempo, os terapeutas em FAP são solicitados a fazer
um movimento de inserção e distanciamento do processo do grupo.
Precisam envolver-se pessoalmente nos processos de
interação, uma vez que seus sentimentos podem lhes indicar qual
é estimulação relevante presente e o efeito dos comportamentos
de uns sobre os outros enquanto amostras do que ocorre no ambi­
ente não-terapêutico.
Ao mesmo tempo, é preciso distanciar-se para perceber
as funções que seu comportamento e o dos demais exercem nas
cadeias de interação e apresentar uma resposta que possa trans­
formar a situação vigente em uma oportunidade de aprendizagem.
Por isso, muitas vezes são envolvidos em conflitos entre prevenir
ou não, inadvertidamente, a ocorrência de qualquer comportamen­
to indesejável que ameace as relações e promove confrontos.
Além disso, muitas propostas podem provocar reações ines­
peradas. Os erros ou falhas dos terapeutas são mais facilmente evi­
denciadas nos grupos do que nos processos individualizados. Estas
falhas, como apontam os proponentes da FAP, muitas vezes encer­
ram em si oportunidades altamente terapêuticas (Kohlenberg & Tsai,
1991), mas nem sempre é fácil fazer esta transposição. Aqui tam­
bém, erros nos limites da auto-exposição e auto-revelação por parte
dos terapeutas podem trazer custos adicionais importantes para os
mesmos. Ainda, o conhecimento que os clientes têm sobre o com­
portamento do terapeuta fora da clínica, também podem ser trazidos
mais facilmente para tal contexto. Tornar o ambiente das sessões o
mais funcionalmente similar possível ao “ambiente natural”, de forma
a favorecer a generalização, impõe riscos adicionais. No entanto, a
equação não tem tido resultados negativos, quando nela se integram
os resultados que se obtém passo a passo junto aos clientes. Isso dá

154
Fátima Cristina de Souza Conte

aos terapeutas, motivação extra para superar as dificuldades ou cus­


tos adicionais. Um quesito importante destacado por Kohlenberg e
Tsai (1991), para que os terapeutas consigam bem realizar a FAP, é a
sua sensibilidade às melhoras dos clientes e a sua propriedade
reforçadora para os comportamentos do terapeuta. Seria necessário
a cada um “afinar muito bem seu instrumento, de fora pra dentro e de
dentro pra fora”, para que qualquer melhora do cliente ressoe agrada­
velmente aos ouvidos do terapeuta, fazendo-o desejar produzir mais
movimentos na mesma direção e, no caso dos grupos, que ele pos­
sa escutar, como um maestro, a orquestra toda e cada instrumento,
ao mesmo tempo, especialmente.

Referências
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Terapia Analítlco-Comportamental em Grupo

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156
Capítulo 5
Transtorno Obsessivo-
Compulsivo (TOC): as
propriedades
terapêuticas dos grupos
de apoio
Regina Christina Wielenska* 1

O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) configura-se


como potencial fonte de sofrimento e prejuízo psicossocial para
portadores e familiares. Sem o diagnóstico e tratamento adequado,
o indivíduo consegue exercer pouco, ou nenhum, controle sobre os
sintomas, tanto obsessões (pensamentos intrusivos, sob a forma
de imagens, sons ou palavras), como compulsões (comportamentos
repetitivos). Para .reduzir a. estimulação aversiva gerada pelos
pensamentos desagradáveis, o indivíduo aprende a emitir rituais de
neutralização e busca formas de reasseguramento, compreendidos
como comportamentos com função de fu,p a_s_esciulva. Um
significativo comprometimento da qualidade de vida ocorre pela
crescente emissão das respostas que, aparentemente, neutralizam
algum risco (“será que eu não ofendi alguém quando fiz a pergunta?”,
“se eu não conseguir cruzar a rua antes do semáforo mudar de cor,
minha filha vai morrer”) e também removem temporariamente o
desconforto subjetivo (tensão, agitação, angústia). Num curto prazo,
0 ritual é.efetivo. No entanto, em breve o portador estará escravizado
pela necessidade progressiva de ritgalizar, em troca de uma fugaz
paz de espíritó;,Dèritro deste quadro, a qualidade de vida se afunila.
1 Mestre e Doutora em Psicologia Experimental (IPUSP), supervisora dos facilitadores de
grupos de apoio (ASTOC),

159
Terapia Analítlco-Comportamental em Grupo

Geralmente, os portadores demoram a buscar ajuda. A


vergonha, advinda da iminência de ter que relatar seus sintomas, e
o temor de ser considerado louco são poderosos impeditivo». Na
nossa cultura vigora uma regra de que os indivíduos são instados a
resolver sozinhos “os problemas de cabeça”. No caso de portado­
res jovens, os pais e a escola interpretam os comportamentos bi­
zarros como “vontade de chamar a atenção", recorrem a medidas
disciplinares indevidas; é rara a intervenção precoce e eficaz. Nin­
guém censura um diabético por procurar ajuda médica. O portador
de TOC, comparativamente, tem muito mais chance de sofrer cen­
suras e ser mal-compreendido na família e sociedade.
Estudos sugerem que a farmacoterapia do TOC benefi­
cia entre 75 e 85% dos pacientes. No entanto, cerca de metade
deles apresentará apenas um grau moderado de resposta ao trata­
mento. Ou seja, há uma população grande de portadores que a des­
peito do uso adequado de fármacos responde parcialmente ao tra­
tamento. São pessoas que precisam de formas complementares
de tratamento (associação de dois ou mais fármacos, terapia indivi­
dual ou em grupo, orientação familiar etc.), ou de tratamentos isola­
dos capazes de alcançar melhores índices de sucesso. Não se pode
esquecer que as medicações produzem, em grande parte dos ca­
sos, efeitos colaterais (Jenike, 2007). Ganho de peso, prejuízo da
libido e aumento da ansiedade ao início do tratamento são apenas
parte da vasta lista de inconveniências reconhecidas. Outro entrave
é o custo do tratamento, particularmente em caso de associações
entre fármacos, com doses maiores e por períodos extensos de
tempo.
A terapia comportamental-cognitiva (TCC) é uma alterna­
tiva científícãrhente^váiídàdà, disponível como tratamento isolado ou
associada a medicamentos. Sabemos que produz mudanças ex­
pressivas (redução de sintomas, ampliação da qualidade de vida,
desenvolvimento de repertório para enfrentamento de estressores)
e que reduz a probabilidade de recaída no momento da retirada dos
medicamentos. Sua ênfase em procedimentos de exposição gra­
dual a estímulos ansiogênicos e de prevenção da resposta ritualística
mostrou resultados favoráveis e duradouros. No entanto, a comple­
xidade do transtorno e a aversividade dos procedimentos reduzem
a adesão à TCC. O auxílio é possível apenas para pacientes alta­
mente motivados, tratados adequadamente por terapeutas experi­
entes (profissionais bem treinados em técnicas de entrevista

160
Regina Christina Wielenska

motivacional, exposição e prevenção de resposta, construção da


relação terapTiTtíca "e anaíiseluncional clínica, entre outros temas);
Tal como na farmacoterapía, a terapia envolve investimento pesso­
al, custo financeiro e dedicação prolongada.
No^Brasil, a rede pública de serviços de saúde mental é
relativamente restrita erém muitas instituições, longos intervalos se
interpõem entre a busca pelo atendimento, triagem, realização de
exames subsidiários (perfil hormonal, função hepática, neuroimagem
etc.) e início do tratamento. Não podemos esquecer que nem todos
os fármacos necessários ao tratamento do TOC são distribuídos
gratuitamente aos portadores, outro problema num país em que
muitos possuem baixa renda.
Em síntese, há tratamentos razoavelmente eficazes para
o TOC, capazes de elevar a qualidade de vida dos portadores de
TOC. No entanto há muitas barreiras a vencer: preconceito,
desinformação, medo da insanidade, escassez de profissionais bem
qualificados, dificuldades de acesso, além das seqüelas advindas
da cronificação de um transtorno grave. A família se envolve com o
portador, até porque ocasionalmente precisa prover o sustento de
quem não mais tem condição de estudar e/ou trabalhar. Há familia-
res que_ comptementam os rituaia. tornam-se cúmplice dos sinto-
mas: é o caso da mãe que aceita lavar as roupas do filho segundo
regras rígidas e insensatas de para lavar, passar e guardar as pe­
ças, a mãe fica refém das normas impostas pelo filho obcecado
com idéias de contaminação. Em outro momento, essa mãe ou o
pai podem se revoltar e forçam o portador a se “sujar, brigam com
ele, fazem ameaças e aplicam castigos inúteis. Ambivalentes, aca­
bam se arrependendo e tudo retorna à patológica serenidade.
O panorama aqui traçado revela sinais de desamparo e
pouca informação adequada. Muitas vezes portadores ou familiares
fazem verdadeira peregrinação em busca de tratamentos que
prometam curas milagrosas. Mesmo quando, por fim, os portadores
de TOC encontram os tratamentos corretos, há risco de desistência,
pelos motivos discutidos acima. Neste contexto situa-se uma
instância terapêutica de grande valor: os grupos de apoio a portadores
e famttrãrés.
Antes de iniciar a discussão sobre aspectos específicos
dos grupos de apoio para TOC, vale ressaltar que nem todo grupo
de apoio será necessariamente benéfico para determinado indivíduo,

161
Terapia Analrtlco-Comportamental em Grupo

ao menos na área dos transtornos psiquiátricos. Por exemplo, uma


paciente com TOC foi convidada a participar de um grupo, mas
sentiu-se abalada após o encontro porque os demais participantes
estavam bem mais comprometidos do que ela. Continuar no grupo,
este foi seu argumento, “seria me considerar um caso perdido,
alguém grave demais, sem condição alguma de sair dessa”. Uma
das funções possíveis do grupo é instilar esperança realista de
mudança, mas, neste caso, seria inviável acreditar em mudança ao
se espelhar em pessoas cuja condição parecia tão mais grave do
que a sua. A respeito desta questão, os efeitos adversos de um
grupo de apoio, Johnsen, Rosenvinge e Gammon (2002) analisaram
três grupos noruegueses de discussão online, cada um com foco
em um transtorno diferente. Qualquer mecanismo de busca pela
Internet oferece ao interessado infinitos grupos de discussão sobre
patologias diversas, este é um fenômeno novo, o que justifica
pesquisas sistemáticas. No caso, quatro grupos foram objeto de
análise. A interação entre os membros foi avaliada segundo uma
dimensão denominada “construtiva-destrutiva”, com base nos temas
abordados, nível e natureza do envolvimento profissional. Os
resultados sugerem que o envolvimento de algum profissional
habilitado pode ampliar a qualidade das discussões e favorecer
efeitos construtivos, por exercer alguma influência em termos de
forma e conteúdo compatíveis com o melhor ambiente online. Grupos
de portadores, baseados em autogestão, dependem de uma
liderança hábil em relacionamentos interpessoais, que tenha acesso
ao state-of-the-art no que tange aos recursos terapêuticos
disponíveis, que conduza a interações em clima cooperativo e
estimulante, em benefício da maioria dos interessados.

1.Dissecando modalidades: características


possíveis dos grupos de apoio.

a)Formação acidental ou planejada


Em primeiro lugar: grupos podem se formar de maneira
quase acidentai ou de acordo com algum planejamento. Um exemplo
que ilustra a construção acidental de um grupo de apoio: pacientes
que se reencontram repetidas vezes nas salas de espera de um
ambulatório especializado acabam por trocar informações, partilham

162
Regina Christina Wielenska

seus temores e terminam por combinar que se encontrarão


especificamente para conversar sobre o impacto do transtorno em
suas vidas, ou temas similares, mas agora sem o horário da consulta
como razão principal do comparecimento. Outra possibilidade: um
portador constrói um blog sobre TOC, no intuito de relatar - a uma
audiência (incerta) - sua história de enfrentamento do TOC. Com o
tempo torna-se mais conhecido, recebe mensagens de outros
portadores, se corresponde com eles. Por fim, pessoas entrelaçadas
peia Internet e com um problema em comum decidem abrir um fórum
de discussão ou se encontrarem ao vivo com alguma regularidade.
Nestes casos, nada foi planejado, mas a afinidade entre as pessoas
e seu interesse sobre o TOC seria motivo para encontros, ao vivo
ou virtuais.
Mas o percurso poderia ser outro: uma ou duas pessoas,
portadores ou familiares, que geralmente leram a respeito de grupos
de apoio mútuo ou participaram de algum deles, resolvem fundar
um grupo em sua localidade. Divulgam a proposta, convidam
pessoas e, a partir do primeiro passo, o grupo pode ganhar corpo
ou se dissolver. Aqui o grupo se formou a partir da iniciativa e algum
nível de planejamento proposto pelo fundador. E a qualidade desta
iniciativa tem razoável peso para determinar a sobrevida inicial do
grupo. Ainda que o líder tenha as melhores intenções, decisões
impulsivas, erros de planejamento estratégico e um repertório social
deficitário podem levar ao término precoce do grupo.

b) Distribuição do poder: centralização ou partilha


Vimos, então, que um grupo de apoio pode se formar de
modo planejado ou ao acaso. Outra distinção se refere à distribui­
ção do poder dentro do grupo. Como se deduz facilmente, a gestão
do processo pode permanecer nas mãos de um ou poucos indiví­
duos, ou ser posteriormente distribuída entre mais pessoas. Na ver­
dade, o que mais importa é que as decisões produzam resultados
que respondam aos anseios da maioria dos interessados. Há parti­
cipantes para os quais ter que propor soluções e escolher a melhor
alternativa seria enfadonho ou excruciantemente difícil. Para esses,
o conforto incide na direção de uma gestão centralizadora do poder.
O oposto pode ser verdade, e neste caso seria essencial que as

163
Terapia Analítico-Comportamenta! em Grupo

decisões fossem construídas a partir das decisões explicitadas e


avaliadas pela maioria dos interessados. O que parece importar é
que o poder se distribua ou permaneça concentrado conforme o
perfil dos participantes. Ao longo do tempo, com a entrada de novos
membros, saída de antigos ou como decorrência da melhora clíni­
ca, as preferências podem se inverter. A liderança precisa ser sen­
sível a mudanças de contingências para manter o sucesso do gru­
po de apoio.

c) Programa pré-definido ou discussões ao sabor dos


ventos?
E possível conduzir as reuniões com base em um protocolo
inédito ou reproduzindo outro, já testado e aprovado por outros grupos.
Por mais coeso e bem planejado que seja o protocolo, sempre surgirá
a necessidade de reservar tempo para surpresas, ajustes e
adaptações. A vantagem de estruturar as reuniões, em termos de
forma e/ou conteúdo, é instituir uma racionalidade ao processo,
maximizar o tempo e recursos disponíveis, fornecer segurança aos
participantes, assegurar a discussão de temas que não poderiam
ser esquecidos, entre outros pontos positivos. No entanto, a estrutura
e o teor bem planejados e dispostos de modo lógico e organizado
precisam estar a serviço do grupo. Temas que, por exemplo, pareçam
repetitivos, herméticos ou tratados com superficialidade favorecem
desistências. Uma estrutura de funcionamento engessada, rígida, pode
tolher a participação dos indivíduos.
Por outro lado, é viável propor o encontro sem definição
prévia de temas ou atividades. Surpresas agradáveis ocorrem nes­
tas ocasiões, com relatos e discussões relevantes. Neste caso,
abre-se amplo espaço para a espontaneidade e livre-expressão e
também para a distração, monopolização da palavra, arborização
temáticaexcessiva, que são fontes de desestímulo à participação
v regularjU m meio termo, que mescle planejamento coerente com
oportunidade para o novo parece o melhor dos mundosjDifícil é
acertar tal medida. Em casos de grupos que atuam sem pré-defini-
ção de pauta, mas que são providos de liderança profissional, é
mais viável manter, a título de reserva técnica, exercícios, ativida­
des e temas de discussão, para uso nas ocasiões em que os parti­
cipantes se mostrem calados ou percam o rumo do processo.

164
Regina Christina Wieienska

A título de ilustração, uma experiência bem sucedida de


grupo de apoio baseado num protocolo pré-definido a ser seguido a
cada encontro foi descrito por Black e Blum (1992). Em lowa, nos
Estados Unidos, estes especialistas em TOC ofereceram grupos a
portadores e familiares, com planejamento prévio das etapas de
trabalho, com fins de psicoeducação e apoio emocional. Os
pesquisadores salientam que este tipo de grupo também foi benéfico
para a formação prática de profissionais em saúde mental, que se
qualificaram como multiplicadores da experiência.

d) Grupo de apoio para quem? Portadores e familiares


num mesmo grupo?
Conforme se afirmou logo ao início deste artigo, o
relacionamento do portador de TOC com sua família geralmente é
pontuado por desapontamentos, confrontos e incomunicabilidade.
O apoio inicial acaba por ceder sua vez ao desânimo e conflitos.
Neste sentido, um grupo de apoio no qual o portador e seus familiares
estejam presentes simultaneamente pode se transformar num
campo de guerra, a mera reprodução dos problemas cotidianos. Se
'for este o caso, pode ser recomendável formar grupos separados,
por favorecerem uma interação empática e mais eficaz entre os
participantes que pertencem ao “mesmo lado do balcão”, todos na
condição de familiar ou portador. Ainda assim pequenas experiências
de mesclar os dois grupos podem ser tentadas: em celebrações de
fim de ano, em ocasionais reuniões temáticas de interesse geral,
ou quando esta demanda pela integração for expressa pelos
participantes.
Tynes, Salins, Skiba e Winstead (1992) descrevem o
sucesso de uma experiência com duração de dez semanas, na
qual familiares e portadores faziam parte de um mesmo grupo,
organizado por especialistas que seguiam um protocolo bem
definido, para fins de prover apoio emocional e informações
relevantes acerca do TOC. Em média, 21 pessoas participaram de
cada encontro. A sessão final contou com a presença de 17. O
sucesso do grupo foi medido pelo escore que os participantes deram
a cada encontro. Numa escala de 0 (péssimo) a 4 (ótimo), o grupo
de apoio recebeu avaliação média de 3.8, indicativo do sucesso do
modelo proposto.

165
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Sempre que há escassez de recursos (pessoal treinado,


voluntários, salas disponíveis, etc.), compensa formar grupos que
abarquem famílias e portadores, mesmo sob risco de exacerbação
de interações tensas.
Sabe-se que as famílias se acomodam frente ao transtorno
e prejudicam o progresso clínico ao atenderem a demandas como
realizar rituais de limpeza, obedecer regras rígidas e reassegurar o
portador por ocasião de suas repetidas e intermináveis dúvidas
(Guedes, 1997).
Steketee e Van Noppen (2003) salientam que a hostilidade
dos familiares e seu excessivo envolvimento emocional são fatores
desfavoráveis à melhora e manutenção dos ganhos terapêuticos.
Há casos nos quais um dos pais é também portador, e isto favorece
o desenvolvimento da cumplicidade entre ambos na execução de
rituais e conseqüente agravamento do TOC. Não foi possível, até o
presente momento, estabelecer consenso acerca da direcionalidade
da relação causal entre presença de TOC e disfuncionalidade nos
relacionamentos na família. Sabe-se apenas da correlação entre
essas variáveis.
De qualquer modo, não é possível ignorar os relatos
qualitativos dos resultados positivos alcançados por grupos de apoio
a famílias, com duração limitada, para ensinar acerca do diagnóstico,
avaliação, teorias sobre TOC, terapia comportamental (exposição
e prevenção de resposta), farmacoterapia e prevenção da recaída
(Tynes e cols. 1992; Black e Blum, 1992). Nestes grupos havia
oportunidade para apoio emocional e discussão de estratégias para
enfrentamento dos problemas, entre outros temas, o que parece
contribuir para sua eficácia.

e) A longevidade do grupo de apoio e outras questões:


duração, freqüência e intervalo entre os encontros.
Quanto tempo deve durar um grupo é questão relativa.
Para aqueles com protocolo pré-determinado é mais provável que
nele esteja contemplado um número pré-definido de encontros, con­
siderado tempo necessário e suficiente para se atingir certos obje­
tivos. Por exemplo, um grupo de apoio, oferecido por profissionais,

166
Regina Christina Wielenska

com finalidade psicoeducacional e dirigido a famílias, pode funcio­


nar a contento ao longo de oito encontros semanais, com duração
de 90 minutos cada. O término do processo decorre, portanto, da
meta que se buscou atingir. No exemplo, oferecer informações rele­
vantes, de interesse geral.
Nos grupos com término indeterminado faz-se conveniente
avaliar, de tempo em tempo, o interesse dos participantes, os
benefícios das reuniões e a regularidade da presença, de modo a
justificar a manutenção do grupo. Um grupo talvez alcance seu ocaso
quando o absenteísmo esteja elevado e os ocasionais participantes
não mais demonstrem entusiasmo ou interesse. Problemas de
horário, dificuldade de locomoção, interferência de rituais, estes são
alguns dos problemas a considerar.
É interessante observar que podem surgir muitas faltas
também num grupo de apoio cujos membros estejam
significativamente melhores, e capazes de funcionar com autonomia
em prol de áreas da vida antes negligenciadas. A atratividade do
qrupo diminuiu exatamente em função do sucesso do trabalho até
aqueíêponto e talvez fosse hora de “cair o pano”.
A duração dos encontros decorre da necessidade de
oferecer voz a todos os participantes e facilitar a interação produtiva
entre eles. Para evitar monopolizações da palavra, um grupo pode
combinar um tempo máximo para as intervenções dos seus
membros. Encontros longos demais geram perda de foco e fadiga,
desestimulando a adesão. Tempo escasso é outro problema, porque
a restrição excessiva prejudicaria a fluidez dos relatos, a troca de
sugestões e a expressão de dúvidas.
Os grupos podem funcionar com intervalos semanais,
quinzenais ou mensais. O horário ou dia da semana ideal é
simplesmente aquele no qual o máximo de pessoas tem condição
de comparecer. Estas escolhas decorrem da disponibilidade de
recursos (equipe de trabalho, espaço físico livre etc.), do perfil dos
participantes e dos objetivos previstos. Períodos de férias escolares
e emendas de feriados geralmente não são datas propícias. O local
das reuniões deveria propiciar um mínimo de conforto e garantir a
privacidade da interação.

167
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

f) Grupos abertos ou fechados?


Há relatos de sucesso em ambos os modelos. A vanta­
gem de grupos abertos é que novas adesões alimentam ó grupo e
compensam numericamente as desistências. No entanto, se a po­
pulação presente flutuar em demasia, é pouco provávet que se es­
tabeleçam relações interpessoais significativas e motivadoras. Se
a liderança permanecer estável, tiver pulso sóbreós processos
grupais e interesse em manter a linearidade do processo, é prová­
vel que um grupo de apoio se distancie do caos, um efeito indesejá­
vel capaz de precipitar a desintegração.
Manter um grupo aberto não significa que dele possa
participar qualquer pessoa que compareça à reunião. Uma entrevista
de triagem, realizada pelo líder ou outra pessoa qualificada, previne
equívocos e problemas de confidencialidade. Imagine que um
jornalista interessado em apresentar apenas um lado sensacionalista
e grotesco do TOC se disfarce em portador e entre num grupo de
apoio. Depois de coletar subsídios para a matéria, ele desaparece e
publica tudo o que ouviu. Tal risco seria diminuído por meio de uma
triagem cautelosa.
Certas comorbidades também dificultam a participação:
paranóia, presença de humor maníaco (seja eufórico ou irritável),
intenção suicida ou comportamentos agressivos dirigidos a terceiros,
sintomas psicóticos, estes são alguns dos impeditivos relativos. A
triagem, na qual seja solicitado um parecer médico pode se
estabelecer como um dos pré-requisitos para eventual entrada no
grupo, e representa uma forma de cuidado com o bem estar dos
participantes e a maximização dos resultados.
Um grupo fechado, por sua vez, tende a estimular menos
a diversidade, mas os laços afetivos poetem sé estreitar mais
facilmente através da presença regular das mesmas pessoas, e
torna possível aprofundar progressivamente as discussões. Não há
resposta pronta para o quesito “aberto ou fechado”, e a decisão
quanto a manter ou impedir o livre o fluxo de pessoas deveria ser
tarefa sob controle dos líderes, os principais responsáveis pela
preservação do grupo.

168
Regina Christina Wlelenska

g) Grupos de apoio na ASTOC: uma história de sucesso


e transformações.
A ASTOC, Associação Brasileira de Portadores de
Síndrome de Tourette, Tiques e Transtorno Obsessivo-Compulsivo,
surgiu em 1996, em São Paulo, Capital, pela iniciativa de familiares
de portadores. De início proporcionou entrevistas de orientação a
portadores e familiares, com finalidade de esclarecimento e orien­
tação acerca das alternativas terapêuticas.
No ano seguinte, em resposta aos anseios detectados pela
equipe, teve início o primeiro grupo de apoio aos portadores adoles­
centes de TOC, com idade entre 12 e 21 anos. Foi iniciativa inédita
no Brasil, implementada com o apoio de um comitê científico, e
construída em moldes similares ao proposto em lowa por Black e
Blum (1992). Era um grupo aberto e gratuito, assistido profissional­
mente por um psicólogo comportamental e acompanhado por um
dos membros da Diretoria da ASTOC. Nas reuniões, aos sábados
de manhã, com duração de duas horas cada, os principais objeti­
vos eram troca de informações e de experiências, afém de incenti­
vo aos tratamentos e à sociabilização. Pela idade dos participantes,
surgiram muitas discussões acerca da vida escolar e problemas
com a família. Os participantes mantiveram o compromisso com a
confidencialidade dos dados. Em todas as etapas do trabalho bus­
cava-se enfatizar que o grupo era complementar aos demais trata­
mentos, jamais um substituto.
Foi interessante que os pais na sala de espera acabaram
por constituir um grupo de discussão eapolô, formado acidentàlmente
e sem planejamento prévio. Atenta a esse fato, a Diretoria passou a
contar com um representante no grupo de sala de espera e, togo
depois, este se tornou um segundo grupo de apoio, nos moldes do
anterior, e voltado para responder às necessidades parentais.
Em 2002 surgiu um segundo grupo de familiares. Em
novembro daquele ano, foi constituído o primeiro grupo de apoio
para adultos, em função do número maior de psicólogos voluntários,
qualificados para tratar o TOC e conduzir grupos de apoio.
Esta complexa experiência, de natureza científica e
assistencial, foi descrita e analisada em detalhes por Zamignani e

169
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Labate (2002). Nesta obra, foi possível à ASTOC aglutinar dados


sobre a formação dos grupos de apoio e seu valor terapêutico. E
mais: acrescentou-se neste livro um conjunto de informações, divi­
didas por blocos temáticos, sobre TOC, tiques e ST. Sua linguagem
precisa e acessível visava divulgar informações relevantes a um
público misto: portadores, familiares, profissionais de educação e
saúde, agentes sociais, entre outros segmentos da sociedade.
Ocorrem mudanças na maneira de funcionar dos grupos
de apoio e na forma de treinamento de novos facilitadores (os psi­
cólogos voluntários) sempre que as contingências assim o deter­
minam. O presente artigo não se propõe a historiar tais mudanças,
mas é essencial ressaltar que uma atitude sensível aos aconteci­
mentos, criativa e reflexiva propicia o crescimento do trabalho ár­
duo desenvolvido pela Diretoria e colaboradores científicos. Estar
aberto aos dados da ciência, ouvir cada pessoa, negociar possibili­
dades de ação e manter vivo o interesse de todos os envolvidos são
termos ainda vagos, mas que fornecem pistas acerca dos compor­
tamentos (emitidos por portadores, voluntários e lideranças) que se
relacionam com o sucesso de grupos de apoio no contexto dos
transtornos psiquiátricos como TOC.

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Capítulo 6
•f

Fobia social, família e


terapia em grupo: uma
experiência esperançosa

Silvia Sztamfater1
Mariangela Gentil Savoia2

1. Apresentação
Este capítulo decorre de um estudo realizado com
pacientes portadores de fobia social e seus familiares, em uma
instituição de saúde, que ocorreu no período de Outubro de 2006 a
Maio de 2008. Para tanto, está organizado da seguinte forma: há
uma introdução que contextualiza e define fobia social, do ponto de
vista psiquiátrico e psicológico, tendo como enfoque a análise
experimental do comportamento. Após, é fornecido um panorama
da recuperação de portadores de doenças psiquiátricas na atualidade
e o que a análise experimental do comportamento tem a contribuir.
Finalmente, é descrita a forma de intervenção utilizada: terapia em
grupo, tanto para portadores como para familiares.

1Doutoranda do Departamento de Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Santa


Casa de São Paulo, Pesquisadora da Fundação Carlos Chagas
2 Professora da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, Coordenadora do
Setor de Psicologia do Centro de Atenção Integrada da Santa Casa de São Paulo, Psicóloga
do Ambulatório de Ansiedade - IPq - HC - FMUSP.

175
Terapia Analrfico-Comportamental em Grupo

2. Contextualizando a fobia social


Inicialmente, é importante situar quem é o fóbico social:

"... Me sinto muito perturbado pelos medos que sinto, muita


timidez, a chamada fobia social, que me atrapalha a vida. Fico
desesperado por não conseguir lidar com situações simples,
de por exemplo, cumprimentar as pessoas. Sinto que cheguei
no meu lim ite: com 25 anos, não consigo enfrentar uma
entrevista de emprego. Não sei mais o que fazer, chego até a
sentirdores no corpo quando sou colocado numa situação onde
tenho que me expor. As pessoas falam que quem não se expõe
não faz seu espaço, mas eu não consigo. Preciso de uma
orientação psicológica, mas não posso pagar” (palavras de um
participante do projeto).

Este trecho é uma simples transcrição de uma das falas


de um portador de fobia social que participou da pesquisa. A partir
dela, podemos perceber que esta patologia versa sobre dificuldades
de interação social produzícTas pelo medo excessivo de ser
observado e avaliado pelos demais e poder apresentar
comportamentos inadequados e embaraçosos, responsáveis pela
presença persistente de sentimentos de incapacidade, desaprovação
e rejeição por parte dos outros.
Estamos falando de um transtornq.de ansiedade que, além
de ser denominado como fobia social, é chamado de transtorno de
ansiedade social, caracterizado por respostas de ansiedade intensa
a estímulos sociais percebidos, como aversivos. A ansiedade social,
decorrente destes estímulos, passa a ser patológica devido à
ocorrência de comportamentos de fuga e esquiva, que impedem a
pessoa de desempenhar os seus papéis sociais a contento. Se o
comportamento de fuga ou esquiva não é possível, o contato é
realizado com grande sofrimento e comprometimento do indivíduo,
que se apresenta tenso, apreensivo, inquieto, com alterações
motoras, cognitivas e do sistema nervoso autônomo Pode ocorrer
em uma grande variedade de situações de contato interpessoal ou
de desempenho, ou mesmo ambas, acarretando sofrimento
excessivo ou interferindo de forma acentuada no dia-a-dia da pessoa.
Eis alguns exemplos de outras situações de interação,
além de falar em público, temidas peio portador: comer e beber na

176
Silvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia

frente dos outros, entrar em uma sala na qual já se encontram


pessoas sentadas, interagir com o sexo oposto, manter contato
ocular com pessoas estranhas, e assim por diante (Falcone, 2000).

"... Sofro de fobia social, acompanhada de um complexo de


inferioridade muito forte, desde os meus 10 anos de idade. Por
conta disso, jamais consegui me estabelecer socialmente,
inclusive no campo profissional. Hoje tenho 41 anos, sou
solteiro e mal consigo sair de casa devido aos implacáveis
complexos e à dificuldade de me socializar com as pessoas.
Sou muito pobre, vivo com minha mãe que é doente e
aposentada e sobrevivo graças a ajuda de alguns parentes.
(relato de um portador).

Estas palavras ressaltam as dificuldades anteriormente


descritas e acrescentam outras informações até agora produzidas
por estudos na área: j* primeira manifestação costuma ser na
adolescência (Isolan et al, 2007) e impacta significativamente na
vida do indivíduo, limitando o seu funcionamento. Ainda, pensar no
perfil do fóbico social, quando comparado a sujeitos-controle, é
conceber alguém com um baixo poder aquisitivo, pouco estudo,
solteiro, dependente economicam ente, portador de outros
transtornos psicológicos, dificuldade em se manter no mesmo
emprego ou funcionar bem no trabalho, socialmente isolado,
habilidades sociais mais deficitárias, apoio social deficiente e
ideações com probabilidade de cometer suicídio (Hazen e Stein,
1995; Savoia 2001; Caballo, 2003).
Pesquisas neste campo de estudos só começaram a
ser feitas no final da década de 80 e, atualmente, elas revelam que
existe uma tendência a considerar a fobia sociai como um dos
transtornos mais freqüentes, com porcentagens que variam de 3 a
13% (Caballo, 2003). De acordo com Ross (1995), “só recentemente
a fobia social fo i reconhecida como um distúrbio distinto”, fato que
pode justificar a desinformação por parte das pessoas, inclusive
possíveis portadores. Por conta deste panorama, podemos
hipotetizar a existência de possíveis portadores sofrendo, sem ter
noção do que possa ser e, dificilmente, serão diagnosticadas e
encaminhadas para um tratamento especializado. Além do que, os
sintomas psiquiátricos (como ansiedade, isolamento social,

177
laopiu AnalHco-Comportamental em Grupo

depressão) são menos aceitos como manifestações de uma doença


e, constantemente, acredita-se que os portadores controlem de
forma voluntária estas manifestações (Yacubian, 1997).

3. Fobia social e a Análise Experimental do


Comportamento
É através da teoria da evolução (variação associada com
transmissão seletiva) que os analistas do comportamento procuram
compreender todas as espécies e tipos de comportamento dentro
do mesmo quadro geral de referência (Baum, 1999). Nesta
perspectiva, o comportamento pode ser explicado a partir do modelo
de seleção pelas conseqüências, no qual dois processos, a variação
e a seleção, ocorrem concomitantemente em três níveis: filogenético
(contingências de sobrevivência da espécie), ontogenético
(contingências de reforçamento) e cultural (contingências mantidas
pelo ambiente social).
Partindo deste modelo, a fobia social pode ser analisada
dentro das contingências de sobrevivência,-tendo em vista que o
medo é um legado evolutivo, normal e adaptativo, inerente à nossa
espécie, ligado, em geral, a predisposições filogenéticas - perigos
específicos do processo de evolução (exemplo: medo de escuro,
medo de altura, medo de pequenos animais, medo de pessoas
desconhecidas). Njjrna situação típica de medo, ativa-se o circuito
de detecção da presença de algo ameaçador ê ocorrem mudanças
na percepção e na atenção. Há um ceciirecionamento de objetivos;
a prioridade passa a ser determinadas categorias, como perigoso
ou seguro (Oliva et al, 2006).
Portanto, podemos entender a fobia social como uma
resposta de medo não adaptativa, uma vez que é desproporcional
às exigências da situação, não é explicada pelo indivíduo, está além
do controle voluntário, leva à evitação da situação temida e persiste
ao longo da vida, não sendo específica a uma fase ou idade
determinada.
O processo evolutivo, fundamental para os analistas do
comportamento, pode estar relacionado com ansiedade social, quan­
do analisamos o papel da atração, da competição e das hierarquias

178
Sitvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia

sociais. A ansiedade social humana não está predominantemente


sobre o medo de dano físico ou ataque de outros animais. Incide
sobre a necessidade de aceitação social, ao mesmo tempo em que
há o medo de não consegui-la. Partindo deste ponto de vista, pes­
soas com fobia social são passivas às suas necessidades,
priorizando as necessidades do outro, para serem aceitas pelo gru­
po (Gilbert, 2001).
Ligada à ontogênese está a história de vida do indivíduo.
É pela análise da história de vida do fóbico social, que podemos
entender como situações sociais ou de desempenho puderam ter
adquirido propriedades aversivas e se tornar estím ulos
condicionados aversivos.
Em suma, uma comparação direta entre ontogênese e
filogênese das fobias revela que a forma da resposta é caracterizada
pelo viés da interpretação das situações desencadeadas por
estímulos específicos e presumivelmente baseadas em uma
preparação biológica (Mühlberger et al, 2006).
Ao conceber a fobia social do ponto de vista da análise do
comportamento, partimos do pressuposto que a ansiedade intensa
frente estímulos sociais percebidos como aversivos e outros
possíveis sentimentos, como medo e nervosismo, são considerados
comportamentos e não suas causas. Assim como os sentimentos
são comportamentos, os pensamentos também o são. Desta forma,
pensamentos negativos, comuns aos fóbicos, não causam a fobia,
fazem parte dela. O portador de fobia sócia I também apresenta
comportamentos autonômicos (reflexos), tais como: taquicardia,
rubor, boca seca, tremedeira, suor excessivo, dentre outros.
Se fizermos uso da.análise funcionaJ skinneriana, ou seja,
explicarmos o comportamento em termos de relações funcionais,
estaremos identificando mediante qual situação (antecedente) o
fóbico social emite determinado comportamento e qual é a
conseqüência deste comportamento. Neste caso, realizar a análise
funcional é descrever as contingências correntes que estão operando
para manter o comportamento da pessoa fóbica. A partir daí,
comportamentos alternativos e adaptativos poderão ser ensinados
e os disfuncionais extintos.

179
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Dentro da proposta da análise funcional, podemos


considerar como antecedente qualquer situação que sinalize uma
possibilidade de contato social, como: falar em público, ser
observado ao fazer algo, ser entrevistado para um emprego, falar
com um desconhecido, dentre outros. Já a principal conseqüência
do comportamento do fóbico, conforme dito anteriormente, é a fuga
ou esquiva da situação social ou de desempenho. Pelo fato destas
situações terem se tornado estímulos condicionados aversivos,
qualquer comportamento que elimine ou diminua a ansiedade
sentida é reforçado (reforçamento negativo).
Diante destas considerações, percebem os que o
entendimento da fobia social, tendo como referencial a análise do
comportamento, possibilita ao profissional analisá-la funcionalmente
e não olhá-fa apenas como uma patologia, ou seja, a sua forma
estrutural.

4. Tratamento psiquiátrico: um panorama da


atualidade e as perspectivas para o portador
de fobia social
Até aqui pontuamos que a fobia social provoca prejuízo
funcional elevado na vida do portador, interferindo no seu desempenho
cotidiano. Entretanto, estudos realizados desde o final da década
de 50, início da década de 60, começaram a mostrar também o
impacto da doença mental na família (Lange, Schaap e van
Widenfelt, 1993). Atualmente, houve um avanço significativo neste
campo de estudos e as pesquisas mostram que, além do impacto,
as famílias podem ter um papel importante no tratamento do portador:
como cuidadora.
Com a desinstitucionalização do tratamento psiquiátrico,
a família foi transformada em figura central na recuperação do
portador. Pickett-Schenk et al (2006) afirma que a família passou a
ser a primeira fonte de cuidados de adultos portadores de algum
transtorno mental; no entanto, prestam estes cuidados com pouca
ou nenhuma informação sobre a doença, o tratamento psiquiátrico
realizado, ou mesmo, de como lidar com os sintomas do portador.
Com este despreparo, pode haver uma sobrecarga para o familiar
com quem o paciente normalmente vive, acarretando efeitos

180
Silvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia

negativos na sua vida psicológica (ansiedade, depressão, medo e


culpa), além de atritos e críticas com relação ao doente (Yacubian,
1997; Tsang et al, 2003; Rossler, 2006; Reinares et al, 2006; Pickett-
Schenk et al, 2006). Devido a este fato, progressos neste campo de
estudo vêm sendo feitos e achados recentes beneficiaram a
compreensão da situação dos cuidadores, podendo ser efetivos para
propiciar o desenvolvimento de estratégias que visem apóia-los
(Schulze et al, 2005). Embora haja esta preocupação, Yacubian
(1997) salienta que:

apesar dos avanços da psiquiatria, o número de serviços de


saúde mental que oferecem programas específicos de apoio
para os cuidadores e que os aceitam como aliados na
elaboração de projetos terapêuticos e de reabilitação é
extremamente reduzido. Infelizmente, na maioria dos serviços
o único papel reservado para a família é o de agente custodiai
e, normalmente, não se considera a necessidade que eles têm
de receberem informações sobre a doença, de expressarem
os seus pontos de vista e as suas dificuldades (p. 2).

É de se esperar que, com a evolução do tratamento


psiquiátrico para fora da instituição, e o reposicionamento da família
como peça chave para a recuperação do portador, a sociedade
mudasse frente àquele acometido por alguma patologia. Entretanto,
mesmo que tais fatos comprovassem um movimento de mudança
no paradigma saúde-doença em relação ao campo de saúde mental,
não poderíamos deixar de mencionar que, ainda hoje, os portadores
vivenciam a realidade de ser rotulados como diferentes. As
consequências desta discriminação são a dificuldade de inserção
no m ercado de trabalho, dificuldades financeiras, poucos
relacionamentos sociais e baixa qualidade de vida (Bhugra, 1989;
Jorm, 2000; Lauber et al, 2001; Tsang et al, 2003; Lauber et al, 2004).
Podemos associar estas dificuldades às características do perfil do
fóbico social, reforçando as barreiras que enfrentam em seu cotidiano
para uma recuperação saudável, na qual deveriam contar com o
apoio de seus familiares e da sociedade como um todo.

Está sendo muito difícil encarar a vida cotidiana, é muito


difícil ter que sair de casa e encarar situações em que me

181
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

deparo com muitas pessoas, seja no mercado, feira, faculdade,


conduções ou até mesmo nas ruas. Sinto vontade de cavar
um buraco e me esconder diante dessas situações. Ainda tem
mais um problema, meus pais acham que é frescura, ao invés
de me ajudarem estão piorando a situação” (relato de um
portador).
Este relato comprova a importância do suporte familiar
para facilitar a recuperação do portador, especialmente do fóbico
social.
UrpgL forma de inserção do familiar no tratamento do
paciente psiquiátrico é o uso de medidas educativas, como grupos
educacionais sobre saúde mental (psicoeducação). Klimitz (2006)
afirma que esta maneira de intervenção só é efetiva se houver a
participação de algum membro da família. Quanto ao seu histórico,
a psicoeducação começou a ser utilizada para cuidadores de
pacientes esquizofrênicos. A partir da década de 90, passou a ser
indicada para outras patologias, como Transtorno Afetivo Bipolar e
Depressão (Yacubian, 1997). O principal objetivo deste método é o
de ensinar o cuidador de um doente mental sobre a patologia, os
tratamentos, capacidade de desenvolvimento e habilidades,
prevenção de recaídas, estratégias para a solução de problemas e
convivência harmônica. Estudos em diversos países mostram que
a psicoeducação proporciona uma maior satisfação do cuidador em
lidar com o portador, diminuindo a sobrecarga para a família, maior
aderência e aceitação do paciente ao tratamento, redução da
preocupação e frustração do cuidador para com o doente, redução
de níveis de recaídas e reinternações (principalmente no tratamento
da esquizofrenia), além de fornecer informações necessárias sobre
a patologia (Xiang et al, 1994; Pitschel-Walz et al, 2001; Sherman
2003; Dixon et al, 2004; Lukens et al, 2004; Pickett-Schenk et al,
2006).
Yacubian (1997) ressalta que a psicoeducação pode ser
organizada de várias maneiras, através da transmissão de
conhecimentos de modo escrito, (livros, folhetos informativos,
apostilas) e oral, reunindo famílias isoladamente ou até realizando
sessões em grupo. Eis aqui um ponto importante: o grupo de família,
criado originalmente para tratam ento psicoterápico, sem a
associação conjunta da psicoeducação. Não faz muito tempo,

182
Silvia Sztamfater © Mariangela Gentil Savoia

Anderson et ai (1986) já afirmava que ojrabalho em grupo^com


familiares era vantajoso quando comparado ao individual, visto que
o grupo era considerado menos ameaçador aos membros da família
para expor suas dificuldades em relação ao parente doentejjem
como era dado a oportunidade destes indivíduos se sentirem
reconfortados por encontrarem outras pessoas na mesma situação.
Ãíém destes aspectos citados por Anderson et al, um estudo mais
atual (Sherman et ali, 2005) revela que não é a simples inserção da
família no tratamento do doente mental que garantirá o seu sucesso.
Os autores afirmam que esta participação é complexa por se tratar
de um processo multideterminado, o que implica em atender a
demanda da família de uma forma flexível e criativa, o que reforçaria
a importância da associação psicoeducação-psicoterapia.
É vasto o número de estudos existentes na área
psiquiátrica e psicológica, quanto à necessidade e eficácia deste
tipo de tratamento para a recuperação do paciente psiquiátrico. Em
contrapartida, pesquisas envolvendo familiares na recuperação do
fóbico social adulto são nulas, embora recentemente, este campo
de pesquisa tenha progredido de forma expressiva no que diz
respeito a outras patologias. Espera-se que, no caso específico da
fobia social, a participação de familiares no tratamento possibilite
uma diminuição da cobrança de comportamentos que o portador
não está preparado para apresentar, aumento do apoio e
compreensão, legitimação da doença, ciência da necessidade do
treino de habilidades sociais, podendo o familiar servir como
facilitador, apoio ao tratamento medicamentoso e psicoterápico,
diminuindo as chances da não aderência do fóbico social.

5. O analista do comportamento e as questões


sociais: a família como ponto de partida para o
entendimento da saúde-doença
Diante do panorama descrito acima, é fundamental
entender como o analista do comportamento pode tratar da questão
psiquiátrica fazendo uso dos pressupostos da sua ciência e garantir
que portadores das diversas patologias possam ser beneficiados

183
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

pelo cabedal de conhecimento que a análise experimental do


comportamento cftsponibtttea aos ptotisstonate da área da saúde.
Skinner foi um pesquisador que se preocupou em propor
uma ciência que fosse capaz de lidar com as questões humanas e
pudesse ser aplicada às práticas sociais. Tal fato pode ser
evidenciado na sua obra intitulada “Ciência e Com portamento
Humano”, na qual discute conceitos como comportamento de
pessoas em grupo e agências controladoras (governo, religião,
economia, psicoterapia, educação).
Segundo Otero (2003), a análise experim ental do
comportamento tem se mostrado um instrumental adequado para
lidar com os aspectos sociais, uma vez que busca oferecer
propostas de análise e atuação aos mais diversos problemas sociais.
A autora ainda sugere que os conhecimentos produzidos por esta
ciência também visam à proposição e análise de práticas sociais
mais saudáveis.
Partindo desta perspectiva e considerando que, atualmen­
te, referir-se à recuperação do portador psiquiátrico é ter a família
como peça chave, é que pesquisadores que adotam a perspectiva
comportamental para entender o fenômeno saúde-doença, têm es­
tudado as contingências de reforçamento envolvidas na dinâmica
familiar, dando especial ênfase ao relacionamento entre os mem­
bros. Segundo Malerbi (2002), as seguintes contingências de
reforçamento podem ser destacadas:
1. Os pais funcionando como modelos para a apresentação de
comportamentos saudáveis petos seus filhos ou reforçando
estes comportamentos;
2. O ambiente familiar fornecendo estímulos discriminativos para
comportamentos de risco;
3. A família buscando informações sobre a doença (participando
de associações de portadores de doença, freqüentando
cursos de atualização), que poderão funcionar como estímulos
discriminativos para respostas apropriadas ao tratamento;
4. A fam ília fornecendo instruções para mudar hábitos
inadequados do indivíduo doente ou de outros membros
familiares;

184
Silvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia

5. A fam ília fornecendo reforçam ento social para os


comportamentos de adesão ao tratamento;
6. A função do estímulo doença sendo estabelecida pela família:
a) um estímulo aversivo para o qual o paciente responderá
fugindo ou se esquivando (negação da doença), b) um estímulo
neutro (sem importância) que não controlará as respostas do
paciente (com implicações para dificuldades de adesão ao
tratamento) ou c) um problema que poderá ser solucionado
se o paciente apresentar as respostas apropriadas
(estratégias de enfrentamento);
7. A família determinando a aquisição e a manutenção de
comportamentos que tornam o indivíduo funcionalmente
incapaz (p. 124).

A partir da análise das contingências expostas acima, o


analista do comportamento poderá entender como as variáveis
fam iliares atuam e influenciam o curso da doença, tendo a
oportunidade de propor procedimentos de intervenção que garantam
uma melhora no tratamento da patologia em questão.

6. A inserção de familiares no tratamento: uma


nova proposta
A intervenção do estudo, como dito acima, ocorreu em
uma instituição de saúde com portadores de fobia social, através
de terapia em grupo. No intuito de aumentar a eficácia desta
intervenção, um grupo de familiares foi realizado concomitantemente
ao grupo de portadores.
Logo na primeira sessão do grupo de portadores, os
membros eram informados da possibilidade de participação de seus
familiares no tratamento, que não seria obrigatória e, portanto,
voluntária, e ocorreria separadamente, em horário específico, através
de sessões em grupo com duração de uma hora, quinzenalmente.
Desta forma, ao longo do processo haveria 10 sessões em grupo
para os familiares dos portadores e 20 sessões em grupo destinadas
aos fóbicos sociais, todas conduzidas pelos mesmos psicólogos.

185
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

0 potencial da terapia em grupo, afirma Vinogradov e


Yalom (1992)

"... deriva-se, também, de um curioso fenômeno reiatado em


muitos segmentos de nossa sociedade: uma pervasiva sensação
de crescente isolamento interpessoal e sociar (p. 14).

Os autores afirmam que o estilo de vida adotado pelos


homens na atualidade é alienante, de isolamento e fragmentação
social. A terapia em grupo surge para ir contra este Jeito de viver, isto
é, mostrar uma forma de relacionamento interpessoal em que haja
apoio, coesão, sentimento de pertinência.
Esta introdução pontua claramente a importância do uso
da terapia em grupo no tratamento de fóbicos sociais, visto que uma
das características que a define é a falta de habilidades sociais por
parte do portador, o que gera conseqüências de evitação das
situações de interação social. Assim, uma das form as de
intervenção esperada é o treinamento de habilidades-sociais, que
geralmente acontece em grupo. De acordo com Falcone (2001)

"... o desenvolvim ento de tais habilidades perm ite o


entrosamento do indivíduo em situações interpessoais,
reduzindo a sua ansiedade de forma significativa. (...) O paciente
pratica o ensaio comportamental durante as sessões
terapêuticas e tenta aplicar o que aprendeu na vida diária, a
fim de aprimoraras habilidades sociais e elevara auto-estima”
(p. 144).

Neste ponto, também estamos nos referindo à imitação,


como um processo de aprendizagem pelo qual indivíduos aprendem
com portamentos novos ou modificam antigos por meio da
observação de um modelo (Derdyk e Sztamfater, 2004). Portanto, a
conjunção: terapia em grupo com treinamento de habilidades sociais,
fazendo uso da imitação, é bastante praticada entre os profissionais
que lidam com este tipo de paciente.
Nesta mesma perspectiva, Caballo (1993) afirma que o
treinamento de habilidades sociais em grupo é mais vantajoso devido
V ao fato de ser uma situação social já estabelecida, na qual os

186
Silvia Sztamfater e M arbngeia Gentil Savoia

participantes podem praticar com as demais pessoas, além de


fornecer vários modelos de atuação e poder questionar a idéia de
que o modelo fornecido pelo terapeuta é o único correto. Também
acrescenta que a aprendizagem por imitação ocorre mais facilmente
quando as características do modelo são comuns às do observador,
daí a importância de se ter um grupo formado só por fóbicos sociais
e outro por familiares destes participantes. É importante notar que,
ao mesmo tempo em que o autor demonstra que características
comuns entre pessoas facilitam a imitação, vários modelos a serem
imitados também é benéfico. Deste fato, podemos depreender que
ter um grupo homogêneo é vantajoso no sentido dos membros se
sentirem apoiados, entendidos e acolhidos. Por outro lado, um grupo
heterogêneo é uma oportunidade para os participantes aprenderem
novos comportamentos e, no caso específico dos fóbicos sociais,
uma oportunidade para que o portador tenha como modelo de
aprendizagem de novos comportamentos pessoas cujas relações
interpessoais são reforçadas socialmente. Ainda, cita que a terapia
em grupo economiza tempo e é menos custosa, o que reforça a
sua utilização em instituições públicas de saúde, pelo fato de
oportunizar atendimento psicológico a mais pacientes.
A consideração de Vinogradov e Yalom (1992) quanto à
forma de vida alienante e de isolamento e fragmentação social vem
de encontro a uma situação bastante comum com a qual nos
deparamos na pesquisa: a pouca disponibilidade dos familiares em
participar do tratamento justificada pela faita de tempo. Tal fato nos
remete à análise da relação entre padrões comportamentais
familiares e fobia social, que, para ser aprofundada, precisa fazer
uso dos pressupostos da fobia social relacionados às suas origens.
De acordo com Bruch (1989), o ambiente familiar pode
influenciar na manifestação de determinados comportamentos em
situações específicas. Indo de encontro a este fato, Falcone (2001)
acrescenta que a fobia social é um transtorno complexo, cuja
etiologia é multicausal, operando variáveis genéticas, familiares,
desenvolvimentais e culturais conjuntamente.
Em ambas as colocações, percebemos o peso da família
como um dos determinantes para o aparecimento da patologia em
questão. Se relacionarmos a maneira alienante e isolada do ser

187
Terapia Analrtico-Comporfamental em Grupo

humano de viver atualmente, com o fato dos comportamentos serem


aprendidos ao longo da nossa história de vida (Skinner, 2003) e a
família ser a matriz de identidade do indivíduo (Minuchin, 1990),
poderemos supor que uma criança, ao nascer, tem como modelo
inicial de aprendizagem os familiares. Partindo desta constatação,
é neste grupo que as primeiras relações com o ambiente são
aprendidas; relações estas que permitirão a maior adaptabilidade
do homem ao meio no qual está inserido. Assim, ter familiares como
participantes do tratamento de um portador de fobia social, é ter a
oportunidade de estudar como determ inados padrões de
comportamentos se instalaram no repertório do paciente, atuando,
enquanto profissional, diretamente na variável familiar ligada à
etiologia desta síndrome.
Voltando então à pouça_disponibilidade dos familiares, o
questionamento é: a não participação demonstra a nacTabertura a
novos relacionamentos interpessoais; neste sentido, como o familiar
pode ser um modelo de aprendizagem de comportamentos
adaptativos em termos de relações sociais, se ele mesmo não
apresenta tais comportamentos? Mais do que isso, o familiar passa
a ser um antim odelo à aprendizagem de com portamentos
socialmente reforçados e ajuda nã mariCite”nção do repertório
empobrecido do fóbico social, o que é mais um dado para o
profissional no entendimento das origens da fobia social e como
este repertório é mantido pelo ambiente familiar.
Um outro aspecto importante desta não disponibilidade da
família é a negação de que este seja um problema de seus membros,
mas sim do portador isoladamente. Desta forma, não haveria
necessidade e motivo para o seu envolvimento, visto que a solução
às dificuldades do fóbico social dependeria unicamente dele. Nesta
situação, fica evidente que o portador é um estímulo aversivo
sinalizador de contingências ameaçadoras à dinâmica familiar;
assim, a negação significa a fuga-esquiva ao enfrentamento destas
dificuldades e manutenção das contingências atuais. Dito de outra
forma, a família estaria atuando na manutenção do portador como
alguém funcionalmente incapaz.
A relação familiar-portador, à qua! estamos fazendo
menção, foi assim caracterizada por um participante do grupo
terapêutico:

188
Silvia Sztamfater e Mariangela Gentil Savoia

"... por favor, não comente com minha família sobre isso,
ninguém entende essa doença, acham que é frescura de quem
não tem o que inventar, por isso procurei ajuda fora de casa"
(relato de um portador).

Este trecho mostra alguns fatos evidenciados anteriormente:


• A negação: esta doença não existe, “é frescura, de quem não
tem o que inventar”;
• A indisponibilidade dos familiares para participar do tratamento
e o desespero do fóbíco que se vê sem apoio;
• O fóbico como um estímulo aversivo sinalizador de ameaças
à dinâmica familiar;
• A família determinando a aquisição e a manutenção de
comportamentos que tornam o indivíduo funcionalmente
incapaz;
• A necessidade da psicoeducação familiar e envolvimento direto
do familiar no tratamento.

7. Considerações finais
As considerações feitas neste capítulo demonstram alguns
aspectos fundamentais na intervenção do profissional da área de
saúde, principalmente psicólogos, com portadores de fobia sociai.
Podemos destacar: a participação dos familiares no tratamento
auxilia tanto os pacientes como os familiares; o uso da terapia em
grupo, tanto para portadores quanto para familiares, tem se mostrado
a modalidade de terapia mais eficaz, principalmente no treino de
habilidades sociais, o que beneficia o fóbico na diminuição da
ansiedade ao enfrentar contingências aversivas de relacionamento
interpessoal, tendo em vista que os portadores de fobia social emitem
comportamentos mais adaptativos; o uso da psicoeducação como
uma maneira de informar os familiares sobre a doença e formas de
ajudar o portador.

189
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

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192
Capítulo 7
A terapia analítico-
comportamental em um
grupo especial: a terapia
de famílias
Roberto Alves Ba naco *1

Os artigos deste livro têm apresentado a noção de que


uma terapia pode acontecer “em grupo” , em contraposição a uma
abordagem que fala de “terapia de grupo” . Isto ocorre porque, em
geral, as pessoas que vêm para uma terapia em grupo não se
conhecem, e vão participar de um processo terapêutico que se dá
em grupo. Este artigo trata da terapia de um grupo já formado quando
chega aos nossos consultórios: a família.
Considerando-se o modelo de análise do comportamento
no qual a interação entre as ações de um indivíduo e seu ambiente,
especialmente o social, é de extrema importância, assumir um
trabalho terapêutico sobre um grupo social de características tão
relevantes parece ser bastante sensato.
Tomando-se por base a premissa de que, quando se
modifica um comportamento está se modificando na realidade as

1Professor Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Psicologia da


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Terapeuta e coordenador do Núcleo
Paradigma, São Paulo, SP.
* Faculdade de Psicologia da Pontilícia Universidade Católica de São Paulo.

195
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

relações observadas entre o indivíduo e o ambiente social sobre o


qual ele age, pode-se admitir que mudanças ocorridas no repertório
de um deva produzir mudanças também no repertório de outros.
Por esta razão, pode-se afirmar que, mesmo quando o
indivíduo venha para a terapia individual, ele nunca vem "sozinTícf:
os resultados das intervenções realizadas sobre seu repertório
necessariamente envolverão outras pessoas, que também terão
seus repertórios modificados a partir dessa mudança.
A família é um grupo social: essencialmente, é o primeiro
grupo com o qual o indivíduo tem contato. Muito do repertório das
pessoas é instalado e fortalecido por meio do responder dos
indivíduos que formam esse grupo. Há, por esta razão, inúmeras
vantagens em desenvolver um trabalho terapêutico analisando as
relações estabelecidas nesse grupo social tão especial.

1. Interações sociais entrelaçadas


A família, na verdade, é um conjunto de indivíduos que se
comporta conjuntamente, o que responde ao critério de ser um grupo
social. Muitas definições de família foram tentadas pelos profissionais
de psicologia e sociologia, mas a diversidade exibida pela cultura e
o desenvolvimento das práticas culturais venceram as tentativas de
definição. Dada a multiplicidade de formas que uma família, enquanto
grupo social, possa assumir, uma definição de família poderia ficar
tão ampla que seria inútil. No entanto, pode-se considerar nnmn
Família um grupo social que tenha enquanto característica básica a
tarefa de formar indivíduos com habilidades para cuidar e manter o
bem estar dos membros do próprio grupo. Esse bem-estar também
tem uma definição muito ampla: pode ser considerado físico,
psicológico, emocional, espiritual, de desenvolvimento, etc. Para que
isto ocorra, o grupo social mais amplo investe a família de poderes
de apJicaçãode yárjgsxeiQrçadQresepunidores, ficando responsável
pela seleção das respostas que comporão o repertório social dos
indivíduos que dela fazem parte. Q indivíduo acaba assumindo, além
de um norrçe que lhe dá identidade pessoal, um sobrenome, que lhe
dá uma identidade de grupo: a do grupo que o formou. Assim, os
membros do grupo são socialmente afetados amplamente pelo

196
Roberto Alves Banoco

comportamento do indivíduo, já que um representa todos em todas


as situações. O controle do comportamento do indivíduo pelo grupo
familiar, então passa a ser importante para cada membro do grupo.
Isso também torna a família, qualquer que seja a queixa
(ou o comportamento-problema) que um indivíduo apresente uma
das primeiras responsáveis por seu repertório problemático. Desse
ponto de vista a família pode ser iniciadora ou mantenedora do
comportamento-alvo. Por essa razão, a intervenção nas relações
familiares parece lógica. Muitas vezes, devem-se considerar para
análise os episódios que compõem um evento social (Skinner, 1953).
Um indivíduo funciona como ambiente social para o outro indivíduo, • :
e alterações no responder de um deve, para ser efetivo, produzir'
mudanças no responder do outro. Ocorre que, então, temos muitas
contingências entrelaçadas funcionando e que devem ser analisadas:
pelo menos dois indivíduos em relação entre si (por exemplo, uma
mãe e uma criança), relações de outros indivíduos sobre essa relação
(por exemplo, um pai relacionando-se com a relação entre a mãe e
a criança), relações de outros grupos sociais com esse grupo (por
exemplo, as famílias de origem da mãe e do pai avaliando e
interferindo sobre as relações entre a mãe, a criança e o pai), e
assim sucessivamente, em uma miríade de relações sociais que
interferem umas nas outras.
Os processos comportamentais que agem sobre esses
grupos devem ser analisados lembrando sempre, ainda conforme
Skinner propôs, que são os comportamentos dos indivíduos que
explicam os comportamentos do grupo. Esses indivíduos estarão
todo o tempo, ao responderem, aplicando conseqüências sobre o
responder de cada um dos membros do grupo familiar. E é aqui que
se identifica o começo do problema: esses processos de controle
sobre o comportamento podem causar problemas sociais e
individuais.

2. Família e controle coercitivo


Como acontecem com todos os grupos sociais, algumas
formas de controle que a família exerce sobre o comportamento do
indivíduo podem ser coercitivas. Na verdade, a família acaba sendo
a primeira instância de contato social do indivíduo com o grupo maior,

197
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

e para a formação de um repertório social, a família acaba reprodu­


zindo critérios para a liberação de reforços e punidores sobre o res­
ponder dos indivíduos. Assim como ocorre com as agências
controladoras (tais como a Educação, o Governo, a Economia e a
Religião), a família modela repertórios facilitando determinadas clas­
ses de respostas e coibindo outras, por meio de controle coercitivo.
Sidman (1995) fez uma belíssima análise sobre os problemas ge­
rados por controle coercitivo do comportamento. Entre eles, Sidman
destaca respostas emocionais intensas, elas próprias aversivas (tais
como ansiedade e raiva) que são incompatíveis com a aprendiza­
gem de novas respostas e redução de repertório (no caso da fuga e
da esquiva). Além disso, Sidman aponta que o controle coercitivo
não ensina o que deve ser feito, apenas ensina o que não deve ser
feito (no caso da punição), além de promover fuga/esquiva da fonte
do controle coercitivo, diminuindo enormemente a efetividade dos
processos de discriminação. Pode debilitar o organismo (no caso
de privação intensa) e produz procrastinação e preguiça quando se
utiliza de custo de resposta elevado para pouco reforço.
O proceder da família, portanto, caso se utilize de controle
coercitivo para a formação do indivíduo, pode produzir repertórios
típicos de serem levados à terapia. Não à toa, o início da terapia de
família se deu com a identificação de problemas em crianças e o
treino de pais para se utilizarem de processos que pudessem
melhorar os desempenhos de ambos, crianças e adultos (Sanders
& Dadds, 1993). Pressionados por contingências bastante aversivas
(falta de suporte social, condições econômicas e de trabalho
desfavoráveis, falta de repertório para criar crianças, etc.) e
avaliações constantes de seus desempenhos por meio do
desempenho dos filhos, vários adultos acabam assumindo um
controle aversivo sobre os comportamentos das crianças como
resposta de esquiva das punições sinalizadas para seus próprios
“maus desempenhos” enquanto pais.

3. Terapia de família
As características listadas até aqui fazem com que a
terapia de família tenha que ser realizada com alguns cuidados
importantes:

198
Roberto Alves Banaco

a) O terapeuta deve descrever as relações familiares e não julgá-


las. Uma descrição de possíveis rêíações que possam estar
justificando a criação e manutenção dos problemas familiares
pode ser suficiente para engajar os membros do grupo familiar
em um trabalho conjunto em busca da solução;
b) Deve ter o cuidado de apontar parcela de cada um na
manutenção do problema, demonstrando que comportamento
é interação;
c) Propor novas respostas a todos os envolvidos de forma a
buscar transformações nas relações;
d) Promover avaliação de resultados por todos os membros da
família.

Para que isso ocorra, é necessário que o terapeuta


reconheça que ele próprio é um dos indivíduos em relação com os
outros indivíduos da família, enquanto está na sessão terapêutica.
Dessa maneira, deve reconhecer suas próprias respostas
influenciando as relações familiares. Para que possa fazer boas
intervenções, deve ser capaz de reconhecer quais reforçadores
detém para cada membro da família, o quanto o uso desses
reforçadores com um dos membros influencia a relação terapêutica
com os outros membros da família, e, mais delicado que tudo, evitar
que o reforçador para um membro da família seja punitivo para outro.
Quando a relação terapêutica estiver razoavelmente
estabelecida com todos os membros da família, o terapeuta pode
então lançar-se em sua nova tarefa: ensinar controle sem çoerção.
Esta não é uma tarefa fácil, já que õ controle do comportamento,
em si, tem sido visto como um meio coercitivo de influência sobre
as pessoas. Assumir e desvelar o controle mútuo é uma das tarefas
mais difíceis a serem desenvolvidas na terapia de família.
Essa tarefa será mais bem desenvolvida se for possível
ensinar observação do repertório atual de cada uma das pessoas
da família para todas as outras. Dessa forma, será possível promover
o conhecimento sobre os reforçadores que cada membro da família
tem em seu poder para aplicar sobre as respostas dos outros
membros da família.

199
Terapia Analítlco-Comportamental em Grupo

O terapeuta também deverá buscar, junto com o grupo,


um objetivo que seja razoavelmente comum. Esse tema tem sido
desenvolvido todas as vezes em que se trabalha com grupos em
geral, mas o grupo familiar não foge à regra. Pelo contrário, este é
mais um desafio que o terapeuta enfrenta, dadas as características
do grupo. Algumas vezes, os objetivos podem ser diversos entre os
membros da família, e o terapeuta terá que ser mediador em algumas
negociações sobre este tópico. Neste momento, especialmente,
ficam mais delicadas algumas questões importantes sobre os
valores do terapeuta. Uma má condução no levantamento e no
estabelecimento dos objetivos do grupo familiar pode conduzir ao
fracasso de todo o processo terapêutico. A construção das relações
com cada membro da família fica ameaçada caso o terapeuta
demonstre pender mais para os objetivos de um dos membros em
detrimento dos objetivos de outro membro.
Superada e estabelecida a fase do estabelecimento de
objetivos terapêuticos, e com o repertório de observação sendo
desenvolvido no decorrer das sessões, aj>róxim a _fase no
estabelecimento do controle sem coerção é ensinar modelagem
dos comportamentos a serem instalados.
Para isso, o conceito de aproximações sucessivas é
extremamente útil. Algumas frases de condução do grupo familiar
costumam facilitar e promover o engajamento da família nesta fase.
Por exemplo: “eu sei que vocês estão sofrendo e que gostariam de
solucionar o quanto antes esta problemática, mas lembrem-se que
o problema foi se criando por 10 anos, e portanto, não será em
alguns poucos meses que se observará grandes mudanças. Assim
como o problema foi insidioso e foi se criando paulatinamente sem
que vocês percebessem, agora deveremos procurar pistas
pequenas de que ele está sendo solucionado”.
Também é importante deixar claro que os comportamentos
novos são mais fracos, por terem menor história de reforçamento
que comportamentos já conhecidos por todos. Dessa maneira é
absolutamente assumido pelo terapeuta, e deve ser também
discutido com a família, que “recaídas”, ou seja, episódios de
comportamentos-problema continuarão ocorrendo, sem prejuízo do
processo. Este ponto é importante para que quando (e se) ocorrer

200
Roberto Alves Banaco

um episódio de “recaída” do comportamento-problema a família não


desanime e continue promovendo a mudança.
O próximo passo é realizar com a família uma análise do
objetivo. Isto implica em assumir que o comportamento novo deva
ser difícil de ser executado, por sua baixa probabilidade (conforme
já falado acima, ele estará ainda “fraco”), por sua dificuldade e
complexidade (não fosse assim, o problema já estaria resolvido),
ou por sua “novidade” . O importante é reconhecer as várias
“pequenas ações” que compõem um comportamento maior ou mais
complicado de ser exibido.
Assim, deixar de dormir na cama dos pais durante a noite
e ficar em seu próprio quarto, por exemplo, é composto de várias
ações. Uma delas é ficar em seu próprio quarto por algum tempo (e
lá ter reforçadores e ausência de punidores). Depois, ficar em seu
próprio quarto no horário próximo a dormir, com a presença dos
pais. Eventualmente, dependendo de como o problema foi instalado,
os pais devem dorm ir no quarto da criança, retirando-se
gradativamente, noite a noite, cada vez mais cedo depois de ter
deitado. Isso tudo, sem esquecer de elogiar muito o repertório
adequado exibido pela criança.
Em outras palavras, é essencial que se ensine modelagem
do comportamento por reforçamento positivo. Para que isso ocorra,
é necessário identificar respostas que levariam ao repertório
desejado, e ainda que sejam distantes do repertório final, aplicar
reforçadores à emissão dessas respostas. Em seguida, detectar
pequenos progressos para poder exigir novas respostas mais
complexas ou difíceis de serem emitidas, ou mesmo fazer a retirada
gradual do reforçamento extrínseco sempre observando as
mudanças que cada passo produz no repertório global do membro
da família çm questão.
Esse repertório de observação e avaliação constante do
repertório do outro costuma ter um impacto interessante sobre o
repertório do aplicador da técnica da modelagem. Vai ficando cada
vez mais clara a sua “cumplicidade” no processo de mudança, e a
sua contrapartida também se torna evidente: a existência do
problema também tem (ou teve) a sua própria participação. Se o
problema existe, é bom que o indivíduo que se queixa venha a se

201
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

perguntar qual é a sua parcela de responsabilidade na existência do


problema.
Isso vai facilitar o próximo passo para a condução do
processo de terapia de fam ília: o ensino do controle do
comportamento com o mínimo de aversividade possível.

4. Como ensinar controle sem coerção?


Esta talvez seja a parte mais demorada de uma interven­
ção em um grupo familiar. Longa história de uso de aversividade já
foi vivida, com alguns resultados esporadicamente “bons" por certo
tempo. Pedir simplesmente que as pessoas não se utilizem de con­
trole aversivo é bastante improdutivo. O.terapeuta dev_e,.al_érn de
fazer algumas previsões sobre o controle do comportamento-alvo,
instalar em todos os membros da família algumas habilidades que
serão importantes na mudança das relações familiares. Uma delas
já foi mencionada, que é a observação cuidadosa dos eventos que
“precipitam” a ocorrência do problema.
Reconhecer que o problem a ocorre em certo(s)
contexto(s) é de grande ajuda para a continuidade do trabalho. Isso
pode produzir uma noção importante: a de que o problema não é,
em geral, súbito. As condições para que o problema aconteça são,
muitas vezes, uma combinação de fatores que vão se reunindo até
que finalmente o evento indesejado ocorra.
Mais uma vez, a noção de cadeia de eventos pode ser
útil. Sabendo que um problema pode ser composto por uma série
de eventos na qual as ações indesejadas de um membro da família
sejam parte e conseqüência das ações dos outros membros, pode-
se agora impedir em algum ponto que essa cadeia siga à frente,
produzindo mudanças nas seqüências. Em geral, reconhecer que
tipo de ações cada um assume quando a cadeia está se formando
pode ser útil.
Por exemplo, chegar a casa e, antes mesmo de olhar para
a mulher, o marido ligar a televisão pode ser um “gatilho” para uma
série de eventos gradativamente mais irônicos e agressivos que
podem redundar em uma briga. A mudança pode ser experimentada
pelo marido, que pode chegar a casa, procurar pela esposa, e

202
Roberto Alves Banaco

cumprimentá-la, perguntando como foi o seu dia. Em seguida,


informar-lhe que vai assistir ao noticiário e convidá-la para estar com
ele enquanto assiste. Se ela não puder ou não quiser assistir,
declarar-lhe que irá assistir um pouquinho, que voltará para o lado
dela o mais rapidamente possível, e, obviamente, voltar. Por outro
lado, a mulher pode “prevenir” a exibição da resposta inadequada
do marido. Assim que ele ligar a televisão, pedir-lhe uma opinião ou
ajuda em alguma tarefa simples e rápida, sabendo que de início
isso vai custar-lhe algum mau humor por parte do marido. Não deve
esquecer nunca de observar que, mesmo mal-humorado, o marido
já iniciou a mudança: participar sem mau humor nessa condição
virá com o tempo. Agradecer também a participação do marido será
importante neste momento. Ela pode, também, sentar-se ao seu
lado durante alguns momentos, acompanhando-o em seu interesse,
antes de propor-lhe a nova atividade.
O importante nestes exemplos é a prevenção da resposta
inadequada, seja de um, seja do outro. Ao reconhecer que um
problema ocorre em uma cadeia de eventos, quanto mais inicial for
a mudança, mais cedo o processo problemático será impedido,
Outra habilidade importante para ser instalada é a
prevenção do uso de punição por parte dos membros da família.
Perceber as situações em que cada um se utiliza mais comumente
da punição do comportamento do outro pode ser bastante relevante.
Se a situação ocorrer, pode-se utilizar, por exemplo, da retirada do
ambiente, para não ficar sob controle daquíTò quelrrita, e do qual se
tenta fugir ou esquivar impedindo que ocorra. Neste ponto deve-se
assumir que, se uma resposta qualquer “precisa" ser punida, deve-
se ao fato de que algum reforçador ela deve produzir para quem a
emite. A emissão da resposta irrita ou prejudica quem a pune, não
quem a emite. Então, uma boa estratégia de controle de
comportamento sem coerção é retirar-se do ambiente enquanto o
indivíduo-problema coleta seu reforçador. Isso também impedirá ou
revelará outro problema bastante comum em situações de casa[ e
de família: a liberação de atenção ao comportamento-problema.
Esta estratégia lembra outra questão bastante importante:
caso se resolva utilizar do procedimento de extinção, este deve ser
muito bem planejado. Sabe-se que a extinção por suspensão de re­

203
Terapia Analíflco-Comportamental em Grupo

forço produz alterações bastante indesejadasno ambiente: aumento


da variabilidade do responder, agressões à fonte de reforçamento ou
ao ambiente, emoções de frustração, raiva e ansiedade. Por esta
razão, se possível, ao tentar enfraquecer um responder, deve-se uti­
lizar da alocação do reformador que até então se seguia àquele res­
ponder a um novo repertório e não simplesmente suspender a libera­
ção do reforçador. Este procedimento de enfraquecimento do res­
ponder recebe os nomes de reforçamento diferencial de outras res­
postas, ou de respostas alternativas (ao responder do qual se quei­
xa). Ele evita as reações emocionais descritas, mas é bastante exi­
gente em termos de detecção do que seria o “responder alternativo”.
Muitas vezes, pelas características do comportamento humano, ele
pode_ser simplesmente um responder de menor magnitude, ou me­
nos exuberante (por exemplo, a criança deixou apenas seu quarto
desarrumado, mantendo a sala intacta), menos intenso (por exem­
plo, apenas fechar a cara, ao invés de fazer birra), menos freqüente
(levantar mais tarde “só” em 3 dias da semana), etc. O importante é
deixar claro para o membro da família não só a mudança detectada,
mas também o efeito que ela produz em quem a percebeu, e se
possível, também em quem não percebeu.

5. Algumas armadilhas na condução da vida


em família
Vários autores têm se debruçado sobre a questão dos
relacionamentos familiares e sobre questões da terapia de famílias.
Latham (1996) indica que vários pais reclamam que não há um lugar
que ensine formalmente a construir uma família estável e sem
problemas.
Esse autor, então, aponta diversos tipos de relações
familiares que podem originar problemas de convivência e de
relacionamento familiar. Conhecer e utilizar alguns princípios básicos
do comportamento humano é de grande ajuda e a proposta do autor
é de se ensinar esses princípios aos membros da família, com vistas
a produzir controle sem coerção. Os princípios que o autor em sua
obra aponta são os seguintes:

204
Roberto Alves Banoco

• Comportamento é melhor modelado por conseqüências


positivas do que por conseqüências negativas.
• Só se sabe se o comportamento foi punido ou reforçado pelo
curso do comportamento no futuro
• Comportamento é em grande parte produto do ambiente
imediato
• Comportamento é modelado pelas conseqüências

Vimos falando sobre o primeiro princípio ao longo deste


capítulo. Segundo Bijou (1988) “as pesquisas têm demonstrado que
a forma mais efetiva para reduzir comportamentos problemáticos
em crianças é fortalecer comportamentos desejáveis por meio de
reforçam ento positivo, ao invés de tentar enfraquecer os
comportamentos indesejáveis usando processos negativos ou
aversivos”.
De fato, já foram aqui apontados os diversos problemas .
oriundos de controle aversivo. Em um ambiente familiar, nada é mais
(Xffiroso. enquanto conseqüência, do que a atenção dos pais e
èstudos sobre relações familiares já demonstr^nTque^95% dos
comportamentos apropriados das crianças não recebem a atenção
dos pais. Outros ainda demonstraram que é entre 5 a 6 vezes mais
provável que comportamentos impróprios recebam a atenção dos
pais do que os comportamentos impróprios.
A questão que se coloca agora é saber se, de fato, o
controle exercido é aversivo ou não. Dada a natureza relacional do
comportamento, nem sempre o controle que se imagina é o que
está ocorrendo. Assim, muitas vezes pretende-se fortalecer um
comportamento por meio de elogios, mas o que se observa é que
aquele comportamento se torna cada vez mais raro. Isto pode apontar
um controle aversivo que o elogiar tem sobre o comportamento em
questão. Por outro lado, observamos inúmeros exemplos de pais
que tentam punir o responder de seus filhos com reprimendas e
ameaças e o que se observa é o aumento na freqüência ou
magnitude deste responder.

205
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Essas observações é que tornam importante o reconhe­


cimento do segundo princípio do comportamento, listado acima. É
no decorrer de um processo que se conhecerá se ele está sendo
de punição ou de reforçamento. Obviamente o conhecimento mais
completo das contingências em operação sobre um dado compor-
tamento-queixa poderá auxiliar na escolha de um procedimento
adequado com menos problemas.
Por exemplo, em am_bientes_pobres de atenção social, o
ralhar, repreender, xingar, bater etc., embora pareçam à primeira
vista como estímulos aversivos, nesse contexto tornam-se um tipo
de reforçador extremamente poderoso em relações humanas,. Eles
são a única forma de atenção social que as pessoas obtêm nessa
situação, mantendo ò responder prõbíemático.

j “As pesquisas têm demonstrado que a forma mais efetiva para


/ reduzircomportamentos problemáticos em crianças é fortalecer
comportamentos desejáveis por meio de reforçamento positivo,
ao invés de tentar enfraquecer os comportamentos indesejáveis
\ usando processos negativos ou aversivos”. (Bijou, 1988).

Por outro lado, comparações aparentemente elogiosas


(“Você é tão esperto quanto seu pai”, por exemplo) podem em alguns
contextos nos quais ser igual seja no mínimo levemente aversivo
pode se tornar um punidor, dado o caráter de indicar a similaridade
(Barnes-Holmes, Stewart, Dymond e Roche, 1999). Por essas
razões, a observação do processo e a detecção de tendências do
responder são extremamente importantes.
O terceiro item elencado por Latham (1996) indica a crença
na plasticidade do comportamento. Embora seja notável a influência
de toda uma história de reforçamento sobre o comportamento atual,
é nas contingências presentes que se dará a transformação de um
comportamento-queixa em um comportamento de boa convivência
social. Este princípio também faz parte daquilo que vinha sendo
apresentado sobre cadeias de comportamentos e suas mudanças.
Sabe-se que o comportamento de um indivíduo é fruto também de
sua interação com os comportamentos de outras pessoas, inclusive
dos comportamentos de quem se queixa dele. Mudanças, portanto,
nas contingências atuais poderão mudar toda a história futura.

206
Roberto Alves Banaco

Por fim, o quarto princípio básico, o comportamento é


modelado por suas conseqüências é essencial para a condução do
procedimento de mudança. Uma história é formada por seqüências
de responderes e suas conseqüências, e, como tem se apontado
aqui, várias delas sociais. A possibilidade de mudança na
manutenção do comportamento está na força das conseqüências.
Sejam elas retiradas, o que levaria a um enfraquecimento, sejam
elas aplicadas, o que levaria ao fortalecimento de determinado
responder, é nelas que se encontra a possibilidade das mudanças
pretendidas.

6. Recomendações finais
Um terapeuta de famílias de abordagem analítico-
comportamental deve, com esses argumentos arrolados neste tex­
to, produzir um levantamento de variáveis de controle sobre as quei­
xas a ele apresentadas de forma a produzir uma formulação de
problemas compatível com os conhecimentos da análise do com­
portamento. Notadamente, a formulação deve considerar primeira­
mente se o problema é composto por relações respondentes,
operantes, ou por interação entre as duas. Assim, a formulação em
sí já indíca possíveis operações a serem executadas.
O segundo passo é determinar a parte social do problema,
identificando respostas de pessoas chamadas comumente como
significativas (leia-se aquelas que detêm os reforçadores e estímulos
aversivos) como componentes do problema para continuar o
delineamento da solução procurada. Em geral, essas pessoas se
utilizam de métodos aversivos de controle de comportamento porque
parecem bons, mas são ruins, por duas razões:
a) Têm a aparência de serem efetivos, porque funcionam
imediatamente evitando o que não deve ser feito. No entanto,
o que se observa mais amplamente é que a pessoa evita o
agente punitivo, a punição não ensina o que deve ser feito,
aumenta ó repertório de esquiva e o repertório de habilidades
desejáveis diminui.
b) Adquirem pseudo validade, passando de geração a geração.
Não é incomum em sessões de terapia de família ouvir frases

207
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

tais como “Meu avô criou meu pai assim, meu pai me criou
assim e nós demos certo. Então, este é o jeito correto de
criar” . (Latham, 1996). Isto só perpetua um clim a de
aversividade que pode redundar em desistência da vida familiar
e/ou social (Sidman, 1989).
Algumas recomendações de Latham f 1996) para a criação
de filhos podem ser adaptadas para quaisquer relações familiares
que sejam o foco de mudanças.
Uma delas é quando se tem um comportamento do qual
uma das pessoas se queixa. A primeira recomendação a ser dada é
que, se possível, deve-se ignorar o comportamento-queixa.
Conçomitantemente, a La tenção. elogios ou presença devem
acompanhar outros comportamentos que sejam incompatíveis com
aqueles dos quais se queixa, e que não sejam problemáticos.
Quando não houver jeito, parar (impedir a continuidade) o mau
comportamento sem dar destaque a ele, redirecionar a ação
solicitando ou sugerindo uma nova ação e então, muito importante,
elogiar o novo comportamento, ou demonstrar satisfação com ele.
Imprescindível neste ponto é a observação do efeito desta operação
sobre o comportamento-queixa e sobre o comportamento alternativo.
O primeiro deveria diminuir de freqüência e exuberância, e o segundo,
aumentar. Se isto não ocorrer, novos problemas de relacionamento
podem ser identificados. Por exemplo, a pessoa que se queixa pode
ser aversiva para a pessoa que exibe o comportamento-queixa.
Latham indica ainda algumas armadilhas envolvidas em
relações sociais. Uma delas são as chamadas “críticas construtivas”.
Elas dão um destaque demasiado ao comportamento que não deve
ser emitido, e não apontam as alternativas que seriam esperadas.
Além disso, podem representar uma expectativa tão elevada que
em alguns contextos apontam a falha como uma situação de possível
punição, aumentando a produção de ansiedade. Um dos exemplos
bem conhecidos pode ser o seguinte:

“Eu simplesmente não entendo como você pode ir tão ma! nessa
prova! Todos nós sabemos que você tem a capacidade de ser
mais aplicado. É demais pedir para que você se saia tão bem
quanto a gente sabe que você pode se sair?” (Latham, 1996).

208
Roberto Alves Banaco

Em lugar disso, deve-se sempre expressar genuinamente


a preocupação que se tem com o comportamento problema,
tomando o cuidado para não responder àquilo que não seja o foco
da discussão no momento. Novamente, Latham apresenta um bom
exemplo disto:
Pai: Filho, queremos que você saiba que estamos preocupados
com seu desempenho na escola e esperamos que você faça
o melhor que puder.
Filho: Eu estou fazendo o que posso. O que mais vocês querem
de mim?
Pai: Nós esperamos que você seja aplicado e que estude. O que
você entende quando dizemos “seja aplicado”?
Filho: (contrariado) Eu sei o que vocês querem dizer. Vocês
querem que eu pegue essa droga de lição de casa e que eu a
faça. Eu odeio essa aula. O professor é um idiota. E isso é
um saco!
Pai: Perfeito! Pegar sua lição de casa e fazê-la a tempo é um
ótimo primeiro passo. O que mais nós esperamos?
(note que nenhuma menção foi feita a “essa droga de lição”, ao
“professor idiota", ou à aula ser “um saco”. A atenção focalizou
apenas o “pegar a lição e fazê-la”).
Filho: Eu não sei.
Pai: Quando a prova se aproxima, como a gente espera que você
se prepare para ela?
(note que neste exemplo, o pai não diz ao filho algo que ele já saiba;
em lugar disso, criou uma oportunidade na qual a criança seja
convidada, com segurança, a dizer o que deve ser dito)
Filho: Estudar, eu sei, estudar. Que perda de tempo estudar pra
essa aula idiota!
Pai: Você acertou! Estudar! (novamente, separou-se o que é
adequado do que não é adequado, dando-se destaque ao
acerto e não à resposta-problema)E quando você estuda, meu
filho, quer dizer, quando faz sua lição de casa e estuda para

209
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

as provas, você só tem a ganhar. Você sabe o que poderia


ganhar estudando?
(nota: a partir daqui, pode-se discutir as conseqüências por estudar
e não estudar)”.
Outras armadilhas que Latham indica são o uso de
sarcasmo como uma “espécie de tratamento de choque, esperando
que sirva como incentivo” . O único resultado observado desse
procedimento é o afastamento da pessoa sarcástica.
Ameaças também são apontadas como improdutivas,
especialmente por raramente serem executadas até o fim, com
destaque para as ameaças aumentadas. Por exemplo, ameaçar
com grandes medidas de tempo para castigos (“vai ficar de castigo
por 6 meses”) e decisões absolutas (“vai ficar sem sair de casa,
carro, sobremesa, etc.”) que costumam não serem cumpridas e
perdem a funcionalidade enquanto ameaça.
Outra forma infeliz de controle do comportamento é a
lógica. Ela raramente funciona porque não é atraente (leia-se não
leva em consideração os reforçadores envolvidos na ação) para a
outra pessoa. Latham declara que

Ainda não tive a oportunidade de ver um pai ou uma mãe que


venha até mim dizer “Depois que eu expliquei tudo logicamente
para meu filho ele me disse: ’Mamãe, que explicação esperta
você acabou de me dar! Eu agora posso enxergar claramente
os erros do meu raciocínio. Deste dia em diante, eu tenho
certeza que meu comportamento será guiado pelo seu conselho
tão esperto e maduro’", (p.377)

Deve-se também evitar discussões que revelem


compaixão. Em geral provocam ira na outra pessoa, ou se a resposta
a ser analisada for de esquiva acabam funcionando como
reforçamento negativo.
Outras formas de armadilha são aquelas que questionam
sobre o comportamento impróprio. Perguntar “Por que você fez
isso?”, em geral, força a pessoa a mentir, e em geral não exigem
uma resposta, exige apenas submissão à pessoa que fez a pergunta.

210
Roberto Alves Banaco

Usar força (física ou verbal) também produz conseqüên­


cias óbvias sobre as relações: as pessoas que são alvo dela tende­
ram a esquivar, fugir ou contracontroiar a discussão.
Por fim, Latham aponta que demonstrar desespero,
contestação, desânimo, tais como “Não sei mais o que fazer com
você. Eu já tentei tudo o que eu sabia” , sp afirma ao filho a
incompetência dos pais em educá-lo ou do cônjuge em se relacionar
com o outro.
Por outro lado, não se deve esquecer o que fazer quando
as pessoas comportam-se do jeito que gostaríamos que elas se
comportassem. Reconhecer verbalm ente o comportamento
desejado, de uma maneira positiva, intermitentemente, casualmente
(sem estardalhaço) e brevemente é uma boa estratégia para isso.
Se possível, deve-se descrever o comportamento que está
sendo reconhecido como bom, sem grandes minúcias, óu falatórios
intermináveis. Falar o'suficiente para ser pontual e descritivo do que
foi feito, e quais efeitos produziram sobre quem está se manifestando.
Deve-se também fazer um esforço para criar um ambiente
pró-ativo visando aumentar o nível geral de reforçamento. Alguns
comportamentos de todos os envolvidos na família são relativamente
fáceis de serem produzidos e costumam melhorar muito o ambiente.
Rir junto com as pessoas (e não das pessoas) é uma
forma boá de produzir urrTbõm ambiente. Fazer elogios e expressar
bons afetos, mesmo que se considere que a pessoa saiba que você
sinta boas coisas por ela. M o s tra rre c o n h e c im e n to de.
comportamento gentil, apropriado de maneira verbal é também
importante. Sidman (1989) lembra que “não é incomum encontrar
pais que raramente falam com suas crianças, exceto para ralhar,
corrigir ou criticar” .
Ouvir (com interesse e atenção) a outra pessoa quando
ela precisar falar. Isto significa que, enquanto estiver falando com a
pessoa se deve desligar a televisão, “sair" do computador, colocar
o jornal ou o livro de lado, ou seja, eliminar todos os elementos de
distração. De preferência, mesclar o ouvir com frases encorajadoras
de partes do discurso que sejam produtoras de boas contingências
de reforçamento, e/ou de bons comportamentos.
Terapia Analítico-Comporfamenfal em Grupo

Tocar a outra pessoa também produz um bom ambiente


na maioria dos casos. Latham lembra que “abraçar não engorda, é
naturalmente doce, e não contém nenhum ingrediente artificial. É
saudável, puro e, mais importante, completamente restituível”. Por
mais que pareça estranho a algumas pessoas (e muitas vezes
observa-se em famílias com problemas que as pessoas não se
tocam), abraços, um tapinha nas costas, um carinho leve nos
braços, ou mesmo algumas brincadeiras mais “pesadas” (tais como
uma cotovelada nas costelas em um menino adolescente, por seu
pai brincalhão) podem ter efeitos de aumento de intimidade.
Por fim, o terapeuta analítico-comportamental deve
desenvolver todas essas habilidades para poder promover esse tipo
de responder dentro das sessões terapêuticas e poder, ao fortalecer
esse responder nesse contexto, criar oportunidades para que essas
novas respostas sejam emitidas em ambiente natural.

Referências
Bames-Holmes, D.; Stewart, I.; Oymond, S. and Roche, B. A behavior-analytic
approach to some of the problems of the self: a relational frame analysis. In
Michael J. Dougher(Ed.), Clinical BehaviorAnalysis, chapter 3,47-74. Reno:
Context Press.
' Latham, Glenn 1. (1996). The making of a stable family. In J.R. Cautela & W.
Ishaq (eds.). Contemporary Issues in Behavior Therapy. New York: Plenum
Press. Chapter 19,357-382.
Sanders, M.R. and Dadds, M.R. (1993). Clinical and empirical foundations
of behavioral family intervention. In Behavioral family intervention. Boston:
Allyn and Bacon. Chapter 2,26-45.
Sidman, M. (1995). A coerção e suas implicações. Tradução de Maria Amália
P. A. Andery e Tereza Maria A.P. Serio. Campinas: Editorial Psy. Original de
1989, Coercion and its fallout. Boston: Authors Cooperative.
Skinner, B. F. (1989): Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins
Fontes Ed. 7aedição. Tradução de João Claudio Todorov e Rodolpho Azzi.
Original de 1953, Science and Human Behavior. New Yorfc: MacMillan.
Capítulo 8
A Terapia
Comportamental
Infantil em Grupo
Jaíde Regra1
Míriam Marinotti2

A Terapia Comportamental Infantil é fundamentada nos


mesmos pressupostos da Terapia Comportamental com Adulto, mas
apresenta algumas especificidades. Dentre essas especificidades,
se coloca a análise das relações que a criança estabelece erifreõs
personagens fictfctos, retirados de suas fantasias (Nalin, 1993), além
dos comportamentos observados diretamente nas sessões, e dos.
relatos verbais sobre os eventos fora da sessão terapêutica.
Não se pode esperar que a criança descreva seus
problemas de comportamento como os pais descrevem, pois_nern
sempre coincide o que os pais desejam que a criança mude com
os desejos especificados pela própria c rià n ç à rN a Terapia
Comportamental em grupo, como na individual, a criança deve ser
vista como um membro de seu grupo familiar, e pode querer
mudanças no comportamento de cada um dos familiares, do mesmo
modo que eles desejam mudanças no comportamento dela. Ser
ouvida pelo terapeuta amplia seu comprometimento com a terapia.
Á criança deve considerar à terapia como algo que provocará
mudanças em seu comportamento, as quais ajudarão no aumento
de seu próprio bem estar. Terá pouco compromisso se acreditar
1Jaíde Regra, Doutora em Psicologia Experimental pela USP, trabalha em consultório particular
em Terapia Comportamental Infantil.
2 Míriam Marinotti, Doutora em Psicologia da Educação peia PUC-SP, trabalha em consultório
particular em Terapia Comportamental Infantil.

215
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

que deverá mudar alguns comportamentos para que haja maior bem
estar para os pais e irmãos. A terapia é dela.
Na Terapia Comportamental para Adultos, Rose (1989) cita
a técnica de role piav (dramatização), na qual o cliente, frente a um
dado problema, pratica modos majs efetivos de lidar com^uailuação.
Nos relatos abaixo, sobre sessão de grupo com crianças,
foi utilizada esta técnica onde as crianças faziam uma dramatização
a partir do relato de uma criança sobre um evento de confronto,
ocorrido na semana.
A Terapia Comportamental Infantil em grupo se propõe a
traçar objetivos relacionados aos problemas de cada criança. No­
vos objetivos podem ser traçados durante o processo terapêutico,
quando forem identificadas novas metas relevantes para o desen­
volvimento emocional da criança.
Ao analisar o processo do trabalho em grupo, iremos
descrever algumas aplicações clínicas relacionadas a três tipos de
problemas apresentados pelas crianças:
1) inabilidades sociais e agressividade;
2) problemas de atenção, hiperatividade, dificuldade em lidar com
limites e com situações em que sentem desconforto, os quais
são nomeados pela criança como “medo”;
3) problemas de aprendizagem enfocando a aquisição de
conteúdos acadêmicos.
Na relação um a um, o terapeuta tem maior controle para
conseqüenciar os comportamentos da criança. Neste contexto, o
terapeuta libera conseqüências para o comportamento da criança e
a criança libera conseqüências para o comportamento do terapeuta.
Enfocar a relação terapêutica, conseqüenciando os com­
portamentos no momento em que eles ocorrem, foi proposto por
Kohlenberg e Tsai (1991) com adultos, através da FAP (Functtonal
Analytic Psychotherapy- Psicoterapia Analítica Funcional) e adapta­
do para a terapia infantil por Conte e Brandão (1999).
No grupo, o terapeuta trabalha as interações entre os
membros do grupo e libera conseqüências para A, B e C e recebe
as conseqüências da emissão de seu comportamento de A, B e C,
isolada ou conjuntamente. Forma-se uma rede de interações.

216
Jaíde Regra e Miriam Marinottl

Consideramos que a Terapia Comportamental Infantil ,eoi


grupo tem como principal objetivo fazer um recorte da situação grupai,
do"ambiente natural; levar seus membros^perceberem este recorte
ampliado com as contingências em vigor; levar seus membros a
explicitarem e vivenciarem essas contingências, no momento em que
ocorrem. Cada membro do grupo deverá identificar essas contingên­
cias, das quais seu comportamento é função e as contingências das
quais é função o comportamento de cada um dos outros membros
do grupo.
Alguns procedimentos grupais se mostraram efetivos para
a mudança de comportamento de seus membros, dentre eles: des­
crever e dramatizar situações ocorridas em contextos cotidianos; criar
novas contingências que favorecem o desenvolvimento de habilida­
des sociais e sua generalização para situações de vida diária da cri­
ança. Passamos, abaixo, a descrever a experiência de trabalho em
grupos coordenados pela primeira autora.

1. O trabalho em grupo com queixas sócio-


emocionais
Todas as crianças dos grupos descritos abaixo passa­
ram primeiro por Terapia Comportamental individual para serem tra­
balhados objetivos específicos. Houve progressos na mudança de
vários comportamentos-problema, permanecendo a dificuldade em
relação às habilidades sociais. A proposta de Terapia Compor­
tamental em grupo surgiu para agilizar o processo terapêutico das
interações sociais.3
Na situação grupai, quando a criança descreve uma
interação conflitante fora do consultório, um recurso que tem se
mostrado útil é fazer uma dramatização da situação, junto com os
membros do grupo. É importante discutir com o grupo a seqüência
comportamental ocorrida na situação, levando cada membro a
identificar um comportamento da seqüência que poderia ser alterado
para que a seqüência toda se altere e seja mudada a conseqüência
3 é importante salientar a dificuldade existente na formação de grupos em consultório
devido à necessidade de juntar crianças com idades próximas, alguns interesses comuns
e principalmente a possibilidade de horário comum. Conseguir horário comum antre as
crianças foi o quesito mais difícil, pelo fato de elas participarem de muitas atividades
extracurriculares, em horários diversos.

217
1
Terapia Anatítico-Comportamental e m Grupo

final. Após ter Identificado uma alternativa de comportamento que


poderia ser emitida, para que ocorra uma mudança na conseqüência
final (ao invés da briga, poderia ter ocorrido um entendimento), o
grupo é solicitado a dramatizar a nova seqüência comportamental.
A participação em grupo também se toma importante pelo
fato de serem criados novos contextos que favorecem o desenvol­
vimento de habilidades sociais. O uso da Modelasfç, ou seja, apren­
der observando o modelo, citadá por Rose (1989) como a interven­
ção mais comum com adultos, também é muito utilizada com cri­
anças. Este autor cita a modificação de antecedentes e conseqüen­
tes. Modificar os estímulos antecedentes e os conseqüentes, du­
rante o trabalho em grupo, favorece as mudanças comportamentais.
Esta proposta foi também aplicada no grupo de crianças em todo o
contexto terapêutico. Na dramatização, os estímulos antecedentes
são modificados e os estímulos conseqüentes são muito diferentes
daqueles que ocorreram na situação real. A criança não é punida e
nem desaprovada pelos comportamentos inadequados emitidos; é
reforçada positivamente pelos comportamentos adequados. Isto
favorece o aumento dos comportamentos adequados em contexto
semelhante, nos quais a criança mostrava-se inábil. Favorece tam­
bém o aumento da freqüência do comportamento de relatar even­
tos aversivos dos quais participou, sem que as conseqüências
aversivas sejam liberadas. O ambiente terapêutico seria desprovi­
do de características aversivas, uma vez que a criança deve ser
reforçada positivamente pelo “comportamento corajoso” de fazer o
retato aversivo.
Para ilustrar a aplicação dos procedimentos em pequenos
grupos, serão feitos relatos de parte de sessões, com crianças que
apresentaram queixas variadas.

1.1. Grupo 1
a) Composição do Grupo
O Grupo 1 foi formado por três membros4 que haviam
freqüentado sessões de terapia comportamental individual, com

4 A fim de se preservar o anonimato dos clientes, todas as referências a eles utilizarão


nomes fictícios, ao longo de todo o texto. Da mesma forma, a descrição dos eventos será
adaptada de forma a impossibilitar sua identificação.

218
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

orientação de pais feita mensalmente, por aproximadamente seis


meses.
Júlio (J), de oito anos, foi encaminhado pela escola por
queixa de agressividade com os colegas. Era bom aluno, muito
inteligente, com boas notas. Falava muito durante a aula e tomava
conta dos alunos, repreendendo-os por qualquer comportamento
que achasse inadequado. Fazia “gracinhas” na classe e contava
piadas no meio da aula. A professora chamava sua atenção e o
repreendia. Ao ser solicitado a parar continuava com as “gracinhas",
desrespeitando a professora. Com muita dificuldade em seguir
regras, na escola e em casa, apresentava comportamento opositor
em muitas situações, fazendo ao contrário do que o outro solicitava.
Brigava muito com os colegas e acabou sendo isolado pelo grupo.
Ninguém brincava com ele. Neste contexto de isolamento, a raiva e
as brigas aumentaram.
Antônio (A) era um garoto de sete anos que apresentava
dificuldades em seguir regras na escola e em casa. Era “mandão” e
queria que as crianças fizessem tudo que ele mandasse. Quando
não obedecido, brigava e se isolava. Em outras situações, agredia
fisicamente as crianças; ao ser contido pela professora, Antônio a
agredia, chegando a situações em que houve a necessidade de
três adultos para contê-lo, até que se acalmasse.
Fábio (F), de sete anos, era muito tímido, com dificuldades
de se comunicar em classe, com a professora e com os colegas.
Falava muito baixo. Em casa era considerado agressivo, pois
xingava os avós que moravam junto. Os avós de Fábio eram muito
permissivos e apresentavam dificuldades em seguir orientação.
Quando Fábio gritava e exigia que o atendessem imediatamente,
os avós sempre o obedeciam.

b) Objetivos terapêuticos
Após essas crianças terem sido trabalhadas em terapia
individual e orientação da família, foi proposta Terapia Comporta-
mental em Grupo, com o objetivo de desenvolver padrões de intera­
ção sociai necessários a uma adequação em situações de grupo.
Desta forma, podia-se observar como cada criança interagia com
os outros membros do grupo e seria possível aplicar procedimen­

219
Terapia Analrtíco-Comportamental e m Grupo

tos para lidar com situações grupais. Era necessário que apren­
dessem a identificar os comportamentos alternativos que deveriam
emitir nas situações de conflito e que resultariam na solução do
confronto, ao invés de briga. O terapeuta pôde ensinar as crianças
a fazerem análise dos comportamentos em grupo e os comporta­
mentos das crianças foram conseqüenciados pelo terapeuta, no
momento em que ocorreram.
Através do exemplo abaixo descrito, de uma sessão de
grupo, quando as três crianças conseguiam contar detalhes sobre
brigas ocorridas, pretende-se mostrar a aplicação dos procedimen­
tos em grupo.
Júlio chega contapdo que teve uma briga na escola, com
um menino que é muito chato, o Carlos. O menino estava fazendo
lição escondido da professora, enquanto ela dava aula.

Seqüência comportamental em sala de aula


Carlos estava fazendo lição de casa escondido da
professora Júlio conta para a professora que Carlos faz a lição
escondido professora manda Carlos parar de fazer isso e prestar
atenção na aula -> Carlos olha muito bravo para Júlio.

Seqüência comportamental no recreio


As crianças saem para o lanche -> Júlio está comendo o
lanche -> Carlos se aproxima e xinga Júlio Júlio xinga Carlos
Carlos briga com Júlio Júlio bate em Carlos professora leva
os dois para a diretoria Júlio recebe advertência escrita -> em
casa, os pais deixam Júlio de castigo.
Foi solicitado, pela terapeuta, que as crianças fizessem
uma dramatização dessa situação.
Cada um escolheu o personagem que queria representar.
Júlio escolheu ser ele mesmo e Antônio também queria ser Júlio.
Diante do impasse, foi solicitado que cada um apresen­
tasse os argumentos sobre a sua escolha e o melhor argumento
venceria. Júlio disse que como aconteceu com ele poderia fazer
melhor o papel para mostrar ao grupo. Antônio concordou e esco­
lheu ser o Carlos. Fábio aceitou ser a professora e não reivindicou
nenhum outro papel.

220
Jaíde Regra e Míriam Marinotti

(T) Como você se sente sendo a professora?


(F) Eu gostaria mais de ser o Júlio, mas tá bom assim.

As crianças desempenham os papéis e depois são solicitadas a


fazer análise do comportamento.

(Antônio para Júlio): Qual um outro jeito que você poderia ter feito
para não ter acontecido a briga?
(Júlio para Antônio): Não devia ter contado para a professora o
que o Carlos estava fazendo.
(T) Isso seria interessante porque não teria acontecido nenhuma
briga. Mas vamos supor que isto já aconteceu. O que você
poderia fazer quando o Carlos te xingou?
(Júlio para (T): Eu sairia de perto e ia perto de um adulto. Aí eles
podiam ver que eu não fiz nada.
(T) É uma possibilidade que pode funcionar para brecar uma briga.
Vamos fazer agora a cena em que Júlio não deixa a briga
acontecer.

(T)Cena 1: Júlio vê Carlos fazendo a lição escondido da


professora e pensa: - O que você pensa, Júlio?
(J) Eu penso que se eu contar para a professora o Carlos vai
ficar com raiva de mim e vai dar briga.
(T) Se der briga quem sai perdendo?
(J) Eu levo advertência e fico de castigo em casa e o Carlos não
vai querer brincar comigo.
(T) Quem deve tomar conta de Carlos?
(J) A professora.
(T) Júlio e Carlos devem aprender a tomar conta de si mesmos e
a professora pode ajudá-los nisso. E o que você pode fazer
quando vê o Carlos fazendo lição escondido?
(J) Finjo que não vejo e continuo prestando atenção na aula.
(T)Então vamos fazer a cena. Júlio fará o papel de Carlos e
imaginará o que Carlos sentiu quando foi “dedado” por Júlio.
Fábio fará o papel de Júlio. Antônio será a professora.

221
Terapia Anafitico-Comportamental em Grupo

As crianças fazem a cena de modo muito compenetrado


e depois analisam. Júlio diz que também ficaria com raiva se alguém
contasse para a professora alguma coisa que estava fazendo
escondido dela.
Na cena 2, Júlio faz papel de Júlio, Antônio faz papel de
Carlos e Fábio é a professora. Agora tudo acabou bem, sem briga.

c) Tarefas
(T) Agora, cada um vai escolher um comportamento para treinar
durante a semana. Vou dar alguns exemplos:
-Júlio pode treinar não contar nada de outro colega para a professora
e contar quantas brigas teve na semana. Cada semana terá que reduzir
uma briga no total para bater o recordda semana anterior.
- Carlos irá descobrir um jeito de brecar uma briga e nos contará o
que fez para conseguir isso. Quando não conseguir, nós o ajudare­
mos aqui a fazer um plano para acabar com as brigas e ele sair
ganhando.
- Fábio irá contar uma situação em que teve coragem de enfrentar.
Pode ser: fazer uma pergunta na classe, fazer a leitura em voz alta
na saia de aula, conversar com um colega da sala ou alguma coisa
que ele decidiu fazer. Vamos contar quantas situações novas
conseguiu enfrentar.
Observa-se que as crianças voltam na próxima sessão e
retomam os combinados da sessão anterior. Contam quando reduzi­
ram as brigas e também contam quando brigaram. Isto nos mostra
que o contexto terapêutico onde se realizam as sessões pode ser con­
siderado um contexto sem crítica, no qual ocorre o relato do problema
e se procura achar uma solução para ser testada fora do consultório.
O comportamento que ocorre na sessão de grupo está
sob controle do terapeuta e dos outros membros do grupo e pode
ser alterado neste contexto. Os procedimentos devem ser aplica­
dos de forma sistemática.
Os relatos sobre os comportamentos ocorridos fora do
consultório que colaboram para execução das cenas de dramatização
favorecem a aprendizagem pelas crianças da análise de comporta-

222
Jaíde Regra e Míriam Marinotti

mento. Ajudam a identificar as variáveis que controlam o próprio com­


portamento de cada criança e o comportamento dos outros mem­
bros do grupo. Levam a criança a identificar comportamentos alternati­
vos a serem emitidos e seus efeitos sobre õ comportamento do outro.
As tarefas planejadas semanalmente para serem execu­
tadas fora do consultório favorecem a ggneralização de comporta­
mentos, para que as mudanças possam s ir duradouras.

1.2. Grupo 2
a) Composição do Grupo
Luís (L), de oito anos, foi encaminhado pela escola por
dificuldades de concentração, autocontrole e interação social,
brigando e batendo nos colegas de classe, em ocorrências diárias.
Na classe, às vezes, se deitava no chão como uma criança pequena.
Demonstrava comportamento opositor e era desafiador. Em casa,
os pais relatavam dificuldades em seguir regras e combinados, o
que dificultava a rotina da casa e gerava muitas brigas familiares.
Cícero (C), oito anos, veio encaminhado pela escola por
atrapalhar as aulas, fazer “gracinhas” , conversar muito durante as
explicações, não esperar a vez para falar e ter dificuldades em seguir
regras. Em casa, a mãe encontrava dificuldades com a rotina e as
lições, embora ele fosse bom aluno. Cícero gritava e emburrava
quando não era atendido imediatamente.
Marc (M), nove anos, bom aluno, morava com a mãe que se
queixava de sua dificuldade em seguir combinados e regras, o que
fazia com que ocorressem muitas brigas entre mãe e filho. Marc relatava
ter medo de escuro e de ficar sozinho em qualquer cômodo da casa.
O grupo foi iniciado com dois membros (Cícero e Luís) e
após 2 meses foi introduzido Marc.
Luís entrava na sala atrasado e ia para o sofá. Tirava os
sapatos e escorregava pelo sofá virando-se de ponta cabeça. Por
outro lado, era meigo e agradável e atendia a alguns combinados.
Cícero era exageradamente adequado com adultos, quando
tinha a atenção só para ele. Procurava a atenção direta do adulto e
dirigia-se apenas a este quando estava ao lado de outra criança.

223
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

A sessão era iniciada com conversa livre e uma revisão


das tarefas executadas fora do consultório.

Luís era o primeiro a avisar: - Esta semana consegui


passar sem briga.
Era feito um gráfico para que visualizassem “as
conquistas” da semana: sete dias sem briga; quatorze dias sem
briga; vinte e um dias sem briga, e assim por diante. Quando era
colocado fora da sala de aula, relatava ao grupo e descrevia a
seqüência comportamental.

Cícero perguntava sobre as alternativas de comportamen­


to que Luís poderia ter emitido para não brigar e Luís identificava
várias delas. Cícero assumia o papel do terapeuta em várias situa­
ções. Em seguida, eram propostas pelo terapeuta atividades próxi­
mas às da escola e desenhos individuais e em grupo.

Exemplo de sessão em que foi solicitado que escrevessem


uma história. Foram feitos os seguintes combinados semelhantes
aos da escola:
- Vou observar a concentração, levantar a mão para
esperar a vez, pedir emprestado quando precisar de algum objeto.
O terapeuta avisa que fará o papel de uma criança
barulhenta, que tira a concentração dos colegas e irá observar se
conseguem se concentrar numa situação com barulho.
As crianças foram elogiados pelo tempo de concentração
em situação com barulho e por todos os comportamentos
adequados. Ocorreu boa concentração durante toda a atividade e
observou-se uma preocupação em seguir os combinados.
Ao final da sessão saíram gritando e abriram a sala ao lado.
Na sessão seguinte foram feitos vários combinados para
sair da sala em silêncio. Foram feitos desafios com combinados,
descrevendo a seqüência de comportamentos: Vamos ver quem
consegue sair da sala em silêncio, andar devagar sem barulho, não
abrir nenhuma porta, conversar baixo na sala de espera e sair sem
barulho até o carro”. Os dois conseguiram. Em toda sessão
comentava-se sobre o comportamento na saída e sobre como tinha

224
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

ocorrido na sessão anterior. Eles sempre conseguiram emitir toda


a seqüência combinada.

Nas primeiras sessões foi observado que Luís chegava


muito agitado, ia para o sofá e começa a se contorcer, deitava e
virava de ponta cabeça, grita e imitava relinchos -> era ignorado
pelo terapeuta. Cícero ria e a terapeuta dizia:
- Para ajudar o Luís a participar do grupo vamos ign
quando fizer gracinhas e dar muita atenção para todas as coisas
legais que ele fizer e falar.
Cícero segurou a risada algumas vezes e depois passou
a ignorar, seguindo o modelo da terapeuta.
Cícero falava, olhando para a terapeuta, como se
ignorasse a presença de Luís. Raramente dirigia-se a Luís.
Terapeuta disse: —Olhe para o Luís e fale isso para ele.
Gradualmente foi aumentando a freqüência de Cícero olhar
para Luís e dirigir a palavra para ele antes de olhar para a terapeuta.
Cícero solicitava todo o tempo a atenção da terapeuta, se
aproximando para mostrar coisas, olhando, falando, só com eia. O
comportamento de Cícero de dirigir-se somente ao adulto, ignorando
a criança ao seu lado, foi especificado como um padrão de
comportamento a ser alterado, pois dificultava a aquisição de
habilidades sociais com as crianças. A maioria das vezes que se
dirigia à terapeuta era solicitado que se dirigisse à criança ao lado.
Houve situações em que ficou emburrado e depois aumentou a
freqüência do comportamento de se dirigir a Luís.
Nas primeiras sessões, Cícero falava coisas desconectadas
do contexto, que não eram respondidas por ninguém. Luís deitava no
chão, se arrastava pelo sofá, ficava de ponta cabeça e imitava relin­
chos. Gradualmente, esses padrões de comportamento foram se
alterando e os dois passaram a iniciar uma interação adequada, como
escolher o jogo que queriam jogar (usando critérios e argumentos
para convencer o outro e cedendo frente ao melhor argumento). Pas­
saram a surgir conversas sobre as atividades que faziam em conjun­
to e eles começaram a contar coisas que aconteceram na semana,
um para o outro. Abriu-se um canal de comunicação.

225
Terapia AnalíticoComportamental e m Grupo

De acordo com os comportamentos ocorridos na sessão,


os combinados podiam ser reformulados.
Após dois meses, foram descritos cinco comportamentos
que fariam parte dos combinados:
1. Saber ouvir - esperar o outro falar e responder ao que o outro
falou (estava ocorrendo de modo muito freqüente esperar o
outro terminar de falar e falar sobre outro conteúdo não
relacionado com o que acabara de ouvir).
2. Permanecer sentado no sofá para conversar, olhando para
os membros do grupo sem virar de ponta cabeça e sem deitar
no chão.
3. Esperar o outro acabar de falar sem interromper.
4. Não entrar com assunto diferente enquanto não se encerrasse
o assunto anterior.
5. Conversar somente com a criança (brincar de: O ac/u/to sumiu
ou A terapeuta sumiu).

Esses novos padrões de comportamento foram gradual­


mente adquiridos. Eventualmente, Cícero levantava a mão e dizia: -
Posso falar? É sobre o mesmo assunto. Os padrões de interação
estavam mudando.
Luís chegou a uma sessão, sentou no sofá sem
escorregar e disse: - Eu saí fora da classe e me arrependi. O Flávio
Sil fala gritando na minha orelha. Empurrei ele e gritei bem alto. A
professora me mandou sair da sala.
Cícero disse: - É só ignorar ele. Se você não conseguir, vá
apontar o lápis e conte para a professora. Pede para mudar de lugar.
Luís descreveu uma regra sobre o bater: - Se eu não bater
no José quando ele me xinga ele fala que eu fiquei com medo.
(T) - Se ele fala que ficou com medo é porque ele quer
que você bata nele, para você ir falar com a coordenadora e levar
advertência. Pode ser uma armadilha. Daí ele se torna o vencedor,
sai ganhando e você sai perdendo. Mesmo assim você prefere bater
nele, para ele não achar que você ficou com medo?
(Luís) - Eu não gosto que ele fale que fiquei com medo.

226
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

(T) - Mas se você cai na armadilha e bate nele, você leva


advertência. Como você sabe que você não está com medo e só
está usando um truque para as coisas melhorarem para você, então
não importa o que ele diga porque é você quem sairá ganhando.
Após aproximadamente cinco meses, aumentaram os
relatos de “não ser mandado para fora da sala de aula” e de “não ter
queixas das escolas de Luís e Cícero” . Esses relatos eram
checados com a orientadora. Durante as sessões, as crianças
passaram a seguir todas as regras e brincavam e interagiam entre
si com pequena interferência da terapeuta.
Os pais recebiam orientação mensal para lidar com os
comportamentos em casa, situação na qual a mudança foi grande.
A família passou a interagir com grande redução de brigas.
Neste ponto entra Marc.
Após apresentações entre as crianças, foi solicitado um
desenho comunitário.
Os três constroem uma cidade e funcionam como um
grupo democrático: alternam-se os membros que dão sugestões e
cada um é ouvido em suas propostas.
Numa das sessões, Cícero fala sobre o pesadelo que teve
à noite e diz que ficou com medo de ficar sozinho.
Cícero fala que tem medo de ladrão.
Marc, que tinha dificuldades em falar sobre seus medos,
diz que tem medo de escuro, de ir sozinho para um cômodo da
casa e que a mãe briga e grita muito com ele.
A situação de grupo se tomou facilitadora para falarem de
si mesmos, o que antes era muito difícil. Cada um fala de seus
medos e a terapeuta propõe formas de enfrentar o medo.
Cícero diz que quando tiver medo vai pensar que pode
enfrentar o medo.
Marc recebeu informações sobre: “Medo só se perde
enfrentando” :
(T) - Você pode ir até a cozinha para pegar água e pedir
para sua mãe ficar um passo atrás, assim você pode enfrentar um
pouquinho. Depois sua mãe vai junto e fica dois passos atrás, até

227
Terapia AnalíticoComporfarnental em Grupo

que a sua coragem vá aumentando aos poucos e você consiga ir


para os cômodos sozinho.
Em todas as sessões eles faziam relatos sobre a evolução
do medo. Relatavam os enfrentamentos e as conquistas. Após seis
sessões, as crianças dizem que não sentem mais medo e que estão
enfrentando as situações sem problemas.
Esses dados foram checados com os pais.

1.3. Considerações gerais


O trabalho em grupo favoreceu a aquisição de habilidades
sociais que seriam mais difíceis de serem adquiridas num contexto
individual. Observar o comportamento do outro sendo reforçado e
emitir o mesmo comportamento e ser também reforçado é um
procedimento importante no trabaJho_da£Uip0 .
Colocar-se no papel do outro, imaginar como o outro se
sente em situação semelhante, favorece o desenvolvimento da
percepção do outro, que é fundamental para a aquisição de
habilidades sociais.
Poder fazer relatos verbais de situações com conseqü­
ências aversivas, fora do consultório, sem que as conseqüências
aversivas ocorram, favorece a redução de emoções desconfortáveis.
Isto, por sua vez, favorece a identificação de variáveis que contro­
lam o comportamento inadequado.
Identificar as alternativas de comportamento que podem
ser emitidas numa situação de conflito, encontrar a solução para o
problema e obter uma conseqüência positiva para o comportamento
alternativo adequado, reduz a freqüência do comportamento
agressivo e favorece o aumento de habilidades sociais.
Executar tarefas acadêmicas em situações adversas
(alguém fazendo barulho) e manter-se concentrado auxilia o
comportamento de atenção. Porém, se a criança tiver pequenas
dificuldades em relação ao material acadêmico, precisará de ajuda
pedagógica específica.
O trabalho em grupo agiliza o processo terapêutico, pois
o terapeuta pode observar os comportamentos de inabilidade social

228
Jaíde Regra e Míriam Marinotti

ocorrendo na sua frente e fazer intervenções imediatamente após a


ocorrência desses comportamentos.
Os relatos da mãe, da professora e da psicóloga da escola
não continham a identificação do padrão de interação social
disfuncional de Cícero, que não olhava para outra criança quando
tinha um adulto por perto. Somente a observação direta da interação
de Cícero com outra criança ajudou o terapeuta nessa identificação.
Observar diretamente esse comportamento e intervir sobre
ele favoreceu a mudança.

2. O trabalho em grupo com crianças que


apresentam dificuldades ortográficas
O relato abaixo se refere a um trabalho que foi desenvolvido
em uma clínica particular (e coordenado pela segunda autora), cuja
equipe era formada por psicólogos e fonoaudiólogos que atendiam
a crianças com queixas diversificadas, incluindo dificuldades
acadêmicas.5
Dentre as dificuldades apresentadas pelas crianças,
destacavam-se aquelas relativas à aprendizagem da leitura e da
escrita, fosse pela alta freqüência com que ocorriam, fosse pela
relevância deste repertório para toda a aprendizagem subseqüente,
acadêmica ou não. Tais dificuldades variam muito e, a depender de
sua natureza, requerem intervenções diferenciadas.6
Podemos citar como alguns dos erros mais freqüentes:
trocas de letras (d/t; b/p; ch/j; s/ss/c/ç etc); omissões (cato ao invés
de canto) e acréscimos (sarborao invés de sabo?); inversões (vrede
ao invés de verde); erros de segmentação (da quela ao invés de
daquela; amenina ao invés de a menina).
6 Por se tratar de um trabalho de cunho psicopedagógico - e, portanto, um trabalho que
envolve, necessariamente, uma análise do objeto de ensino (no caso, convenções
ortográficas da língua portuguesa) - abordaremos este assunto antes de nos dedicarmos
ao relato do trabalho propriamente dito.
6 É importante lembrar que os erros aqui mencionados são bastante comuns durante o
processo de alfabetização de qualquer criança, inclusive em etapas posteriores desta
aprendizagem. Sua ocorrência somente se constituirá em queixa clínica em situações
especiais, como por exemplo: se persistirem por tempo muito maior do que o esperado;
quando ocorrem com freqüência tal que comprometam acentuadamente o desempenho do
aluno e aprendizagem de outros conteúdos etc.

229
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Especificamente no que tange à troca de letras, podemos


identificar trocas entre letras:
a) cujo som é semelhante (d/t; c/g; ch/j etc), comumente
denominadas “trocas auditivas”;
b) cuja grafia é semelhante (b/p/d/q; u/n/v; j/z - no alfabeto cursivo
etc), denominadas “trocas visuais”;
c) cujo som e grafia se assemelham (b/p; m/n etc);
d) que correspondem ao mesmo som, em diferentes palavras (c/
s/ss/ç/x; x/ch; j/g etc) - aqui denominadas “trocas ortográficas”.

Os procedimentos envolvidos nos casos citados em a), b)


e c) incluem, entre outras coisas, treino discriminativo com poder
considerável de generalização. Isto é, o treino bem sucedido com um
determinado conjunto de vocábulos tende a se generalizar para
qualquer outro vocábulo - conhecido ou não da criança - que apresente
a mesma característica. Assim, uma vez discriminados o som e grafia
de ÍM e N i num determinado conjunto de palavras, a probabilidade de
que a resposta discriminativa se generalize para outros vocábulos
em que estas letras aparecem torna-se bastante aumentada.
Por outro lado, as dificuldades apresentadas no item d)
tornam a possibilidade de generalização bastante limitada.
Isto se deve, primeiramente, ao fato de que a língua
portuguesçtnãa£present§ uma correspondência grafema-fonema
e^sata; isto é, há letras que podem corresponder a mais de um som
(por exemplo, o som do xque é diferente em cada uma das palavras:
xícara, sexo, experiência) e sons que podem ser representados por
diferentes letras (som de /s/ que pode ser representado pelo c, como
em cebola; s como em sapo; ss como em pássaro', x como em
texto; ç como em pescoço). Esta característica do nosso idioma
dificulta generalizações: saber que osso é escrito com ss nada nos
informa sobre a grafia de pescoço, por exemplo.
Além disso, as diferenças de pronúncia regionais adicionam
uma dificuldade extra, principalmente nas séries iniciais, quando a
criança ainda se apóia bastante na oralidade para escrever. Assim,
freqüentemente omitimos o r final do infinitivo (vou compra ao invés
de vou comprar), quando falamos, porém a grafia correta exige sua

230
Jaíde Regra e Mlrlam Marinotti

presença; em São Paulo falamos leiti, mas a grafia correta é leite, a


pronúncia de sons nasais como am e ão tendem a apresentar
variações sutis e assim por diante.
Como resultado, o processo de aprendizagem das
convenções ortográficas torna-se dificultado, dada a baixa
possibilidade de generalização de aprendizagens prévias.
Por outro lado, mesmo aquelas características da língua
portuguesa que facilitariam a generalização parecem exercer pouco
controle sobre o comportamento das crianças, principalmente na
escrita. Um primeiro exemplo que podemos citar se refere ao
processo de derivação das palavras: se o verbo passar é grafado
com ss, a maior probabilidade é de que todas as suas conjugações
também o sejam (passei, passado, passando...), bem como outras
palavras daí derivadas: passagem, passageiro etc. No entanto, nem
todas as crianças ficam sob controle destas semelhanças. Da
mesma forma, algumas regras do idioma (m antes de p e b\ m ao
final das palavras), apesar de corretamente enunciadas pelas
crianças, raramente controlam seu comportamento ao escrever.
Desta forma, a aprendizagem das convenções ortográfi­
cas é particularmente difícil e a superação de dificuldades nesta
área tende a ser mais penosa do que quando as dificuldades se
referem a trocas auditivas e visuais.

2.1. O ensino das convenções ortográficas


Tradicionalmente, a escola tem utilizado como recurso
para o ensino nas convenções ortográficas:
1) cópia
2) ditado
3) exercícios do tipo “Complete com g ou /:
__enipapo
berin__ela
__iió
__elatina”
4) ensino de regras

231
Terapia Analítlco-Comporfamental e m Grupo

Entretanto, a ortografia das crianças e adolescentes nos


indica que este ensino carece de eficácia. Enumeramos, abaixo,
algumas hipóteses de por quê tais procedimentos não alcançam os
resultados desejados.

Cópia - a atividade de cópia (de palavras ou frases; em


caderno de caligrafia ou não) usualmente é empregada de
forma mecânica e pouco interessante para as crianças. Tanto
a observação da criança ao realizar a atividade, quanto a
constatação de que ela erra mesmo na situação de cópia
sugerem que o suposto comportamento de transcrição tende
a ser substituído por um auto-ditado. Ou seja, a criança não
se mantém “copiando” a palavra (ou frase), mas a decora e
passa a escrever sob controle de seu próprio comportamento
verbal oral (aberto ou encoberto). Daí, grafias distintas numa
mesma tarefa.
Ditado - trata-se de uma atividade que, na melhor das hipóte­
ses, poderia ser empregada como forma de avaliação e não
de ensino. Ainda assim, com cautela, pois sabemos que as
respostas textuais, como qualquer outro tipo de resposta
operante, estão sujeitas a controle de estímulos; assim, a
mesma palavra que é grafada corretamente numa situação
de ditado de palavras (situação em que a criança só necessi­
ta atentar para a grafia da palavra) poderá ser escrita de for­
ma incorreta numa situação de ditado de frases ou de reda­
ção, situações que exigem da criança atenção simultânea a
diversos aspectos da escrita. Analogamente, a escrita de ou­
tra palavra poderá ser facilitada numa frase ou oração devido
a dicas contextuais ausentes num ditado de vocábulos.
Exercícios do tipo complete com __o u ___- novamente, se
observarmos as crianças realizando esta atividade, com fre­
qüência teremos a impressão de que este exercício serve
mais para confundi-las do que para ensinar. A apresentação
simultânea de vocábulos que são grafados com as letras em
oposição {j!g\ x/ch etc), vocábulos estes que, de resto, não
guardam qualquer outra relação entre si, não parece compa­
tível com qualquer procedimento de ensino cientificamente va­
lidado.

232
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

Ensino de regras - conforme já mencionado anteriormente,


mesmo quando as crianças sabem enunciar corretamente a
regra, esta não se constitui num controle efetivo de seu
comportamento ao escrever.
Considerando, então: a) a alta freqüência com que crian­
ças apresentam dificuldades no domínio das convenções ortográfi­
cas; b) as características de nosso idioma que favorecem o
surgimento e manutenção destas dificuldades e c) a ineficácia dos
procedimentos tradicionais para lidar com o problema, buscávamos,
na clínica, procedimentos alternativos para trabalhar com as crian­
ças que nos procuravam.
Inicialmente, o trabalho era realizado individualmente
(profissional - criança), mas a partir da experiência com os
atendimentos individuais, surgiu a idéia de montar grupos com
dificuldades semelhantes para realizar este trabalho, pelas razões
descritas na seção seguinte.

2.2. Formação e funcionamento dos grupos7


a) Justificativas
A idéia de estender para o contexto grupai um trabalho
que já vinha sendo realizado nas sessões individuais deveu-se a
vários fatores.
Uma das preocupações básicas era aumentar a densidade
de reforçamento para estas crianças, cuja história de fracasso
escolar já causara grandes prejuízos. Para tanto, o contexto de grupo
parecia mais indicado, conforme descrito abaixo.
Em primeiro lugar, ficou evidente, a partir dos atendimentos
individuais, que o contexto grupai permitiria uma diversificação maior
de atividades que as atividades realizadas pela dupía terapeuta-
cliente ocorressem de forma mais rica e “natural” (uma vez que as

7 Na impossibilidade de descrever aqui todo o processo desenvolvido com os grupos,


optou-se por salientar aqueles aspectos que consideramos mais ilustrativos da aplicação
dos princípios da Análise do Comportamento na situação descrita, enfatizando o repertório
a ser trabalhado (ortografia) e as peculiaridades do contexto grupai em que o trabalho se
desenvolveu.

233
Terapia Analítlco-Comportamental em Grupo

crianças estariam interagindo entre si e não com um adulto) ou ainda


que se desenvolvessem de forma mais lúdica e informal.
Além disso, o trabalho em grupo facilita a programação de
atividades que envolvem cooperação por parte das crianças, e não
competição. Considerava-se que tal variável era bastante importante
para crianças que tinham uma história de fracasso escolar e que sempre
estavam expostas ao fato de que “outros conseguiam coisas que, para
ela, eram tão difíceis, sem grande esforço aparente". Esta condição,
por si só, caracterizava um contexto competitivo, no qual a maior
probabilidade é que saíssem como “perdedoras”. Embora a situação
diádica também permita a ocorrência de atividades cooperativas entre
terapeuta e criança, devido à diferença de repertórios existente,
raramente soam como naturais para a criança. Com freqüência elas
emitem verbalizações que deixam isto claro (- Ah, mas você tá me
dando mole; - Não acredito que você não saiba etc), ou se acomodam
e esperam que a terapeuta desenvolva a atividade sozinha.
O trabalho em grupo permite, ainda, enfocar diretamente
alguns dos efeitos nocivos da história de controle aversivo referente
ao desempenho escolar, tais como: apatia e tim idez ou
comportamentos agressivos, provocativos e opositores; baixa
tolerância à frustração; comportamentos de esquiva, tais como
envolver-se em atividades que competem com aquela proposta etc.
A situação de grupo permite às crianças conviverem com
outras que apresentam dificuldades semelhantes, enfraquecendo
auto-regras indesejáveis tais como “só eu não consigo, todo mundo
consegue”. Estar junto a crianças com históricos de dificuldades
semelhantes também aumenta a probabilidade de a criança se engajar
nas atividades, “arriscar” respostas e perseverar na tarefa, pois o
contexto gera menos ansiedade do que a situação escolar.
Por outro lado, o planejamento das atividades levava em
conta variáveis cujo manejo aumentava muito a chance de as
crianças acertarem. Abaixo, a descrição de alguns critérios utilizados
para este fim.
- Gradação das dificuldades;
- Diversificação do tipo de atividade de tal forma que se a criança
tivesse maior dificuldade em algumas, se saísse bem em

234
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

outras. Conforme dito anteriormente, a despeito das dificuldades


em ler e escrever, as crianças apresentavam outros repertórios
bem desenvolvidos ou menos comprometidos. Assim, as
atividades eram planejadas de modo que as habilidades mais
desenvolvidas fossem necessárias.
A emissão de respostas adequadas - relativas às
habilidades menos com prom etidas - era conseqüenciada
positivamente de várias formas: pelo prosseguimento da tarefa e/
ou aceitação das sugestões, comentários e respostas por parte dos
colegas; por aprovação social por parte dos colegas; por feedback
descritivo positivo fornecido pelas terapeutas. Tal procedimento
visava o aprimoramento nos critérios de auto-observação e auto-
avaliação por parte das crianças. Por exemplo, ejas_deixayam.de
se considerar “burras” ou “um caso perdido" e recolocavam a
questão de forma mais analítica, identificando no que eram “boas” e
em que necessitavam melhorar.
Por exemplo, a criança passava a perceber que tinha
dificuldades de escrita mas ia muito bem em tarefas que exigiam
interpretação de texto ou raciocínio lógico; ou notava que suas
dificuldades em escrita restringiam-se à correção ortográfica, mas
que conseguia produzir histórias interessantes e bem encadeadas.
Novamente, o contexto de grupo mostrava-se importante,
pois os “pontos fortes” de cada criança e seus acertos ganhavam
destaque, sendo conseqüenciados por todo o grupo, o que
contrastava fortemente com as conseqüências liberadas por colegas
e professores, na escola. Portanto, na impossibilidade de se
modificar, a curto prazo, o esquema aversivo vigente no ambiente
escolar, novas contingências eram criadas as quais “competiam
com as primeiras. Além disso, considerava-se que a presença de
outras crianças poderia se constituir num tipo de Operação
Estabelecedora que in te n sifica ria o poder reforçador de
conseqüências positivas contingentes aos acertos, persistência na
tarefa etc.
Finalmente, a situação de grupo assemelhava:se mais à
situação de sala de aula, se comparada ao atendimento individual,
o que poderia facilitar a manutenção e generalização dos resultados
obtidos para o ambiente “natural”.

235
Terapia Analrtico-Comportamental e m Grupo

b) Composição dos Grupos


O principal objetivo dos grupos era trabalhar com as
dificuldades ortográficas (vide conceituação acima) apresentadas
pelas crianças. Paralelamente a isto eram trabalhados aspectos
sócio-emocionais diretamente relacionados à queixa ou a dificuldades
das crianças em situações sociais.
Os grupos eram formados com crianças que já se
encontravam em atendimento individual fonoaudiológico, psicológico
ou psicopedagógico. Os profissionais que realizavam os atendimentos
individuais indicavam crianças que, julgavam, poderiam se beneficiar
do atendimento grupai, e a equipe procedia à discussão de critérios
de agrupamento destas crianças. Os pais eram informados desta
modalidade de trabalho e das razões pelas quais o profissional
responsável fazia esta indicação; as crianças eram convidadas a
integrar um grupo e também eram informadas das vantagens que o
profissional via nesta alternativa. Caso os pais e/ou a criança não
concordassem com o atendimento em grupo, prosseguia-se com o
trabalho individual, da forma como vinha sendo realizado.
Os grupos foram planejados para funcionarem com 4 a 8
participantes; entretanto, devido às restrições colocadas pelos
critérios adotados, bem como à incompatibilidade de horários, os
maiores grupos atingiram apenas 6 participantes.
Dentre os critérios utilizados para a formação dos grupos,
podemos citar:
R epertório das crianças em relação à le itu ra e à e scrita - Os
grupos eram constituídos de crianças que tinham repertórios
similares em relação às habilidades a serem trabalhadas, para
evitar que as atividades do grupo atendessem mais a algumas
crianças do que às outras. A avaliação do repertório das
crianças era feita com base nos dados fornecidos pela(s)
profissional(ais) que já as conheciam dos atendimentos
individuais.
E sco la rid a d e - Em geral a formação dos grupos envolvia
crianças de séries próximas (2a/ 3 a; 3a/4a séries). Tal decisão
levava em conta o fato de que o universo de palavras que
apresentam uma determinada característica ortográfica (u/t,

236
Jaíde Regra e Mirlam Marlnottl

xlch; j/g etc) é extenso e é impossível dar conta dele em


qualquer situação de ensino. Desta forma, era selecionado
um vocabulário básico a ser trabalhado com os grupos, tendo
como referência seu nível de escolaridade. Pretendia-se, com
isto, aumentar a chance de utilização das palavras trabalhadas,
o que geraria melhora no desempenho da criança na escola e
poderia contribuir para a manutenção e generalização dos
ganhos obtidos no atendimento psicopedagógico. Para tanto,
era importante que as crianças cursassem séries próximas.
Pela mesma razão, alunos de 2a a 4a série eram alocados em
grupos distintos daqueles de 5a em diante.

C aracterísticas in d ivid u a is relevantes - Uma das dificuldades


sentidas por todos aqueles que trabalham com crianças que
apresentam dificuldades de leitura e de escrita é a jregüente
defasaqem observada entre seu nível de leitura e os assuntos
que lhes interessam. Isto é, apesar de apresentarem
dificuldades acentuadas de leitura e escrita, as crianças podem
apresentar, em outras áreas, repertórios adequados e/ou
próximos do esperado para sua faixa etária e de escolaridade,
o que gera desinteresse na leitura de textos mais simples.
Assim sendo, com freqüência é necessário que os
profissionais responsáveis pelo atendimento busquem e/ou
produzam materiais que possam atender, simultaneamente,
a repertórios de leitura mais precários e interesses mais
desenvolvidos.
Isto era considerado quando da formação dos grupos e
procurava-se agrupar crianças que tivessem interesses mais
ou menos próximos, evitando deixar num mesmo grupo, por
exemplo, crianças muito “ in fa n tis” com outras mais
“desenvolvidas”. Esta opção não era ingênua no sentido de
ignorar eventuais ganhos advindos da interação entre crianças
com repertórios distintos. Entretanto, considerava-se que, por
ser o objetivo prioritário do grupo o atendimento a dificuldades
ortográficas, esta composição teria mais chance de atendê-
lo. Além disso, as crianças tinham oportunidades de conviver
com crianças mais novas ou velhas, mais ou menos
desenvolvidas, em várias outras situações sociais extra-grupo.

237
Terapia Anaiftico-Comportamental em Grupo

Por outro lado, tentava-se formar grupos heterogêneos em


relação a outras características comportamentais, sempre que
se considerasse que o contexto de grupo possibilitaria traba­
lhar estas diferenças, e que este trabalho seria benéfico para
as crianças. Assim, por exemplo, crianças mais “tímidas” eram
colocadas no mesmo grupo de crianças mais “assertivas” ou
"agressivas” ; o mesmo grupo incluía crianças cuja queixa
básica era de dificuldades ortográficas e outras que tinham
dificuldades mais generalizadas, acadêmicas ou não etc. A
inclusão de crianças com diferentes graus de comprometi­
mento, num mesmo grupo, tinha seu suporte na manutenção
dos atendimentos individuais, quando necessário. Assim, por
exemplo, uma criança poderia freqüentar a sessão semanal
em grupo para trabalhar as dificuldades ortográficas e manter
seu atendimento fonoaudiólogo individual para trabalho com
outras queixas específicas (trocas auditivas; imprecisões
fonoarticulatórias etc). Ou, poderia freqüentar o grupo e conti­
nuar em atendimento psicológico ou psicopedagógico nos
quais outras questões seriam trabalhadas. Da mesma forma,
as crianças poderiam ingressar no grupo em um momento tal
que este lhes bastasse e não mais necessitassem do atendi­
mento individual.

Freqüência aos atendim entos in d ivid u a is - Qptou-se por não


inserir nenhuma criança diretamente nos grupos antes que
tivesse passado pelos atendimentos individuais. Considerava-
se ser necessário algum tempo de atendimento individual para
que o profissional pudesse conhecer mais detalhadamente o
repertório acadêmico da criança, bem como características
comportamentais suas, e desta forma poder avaliar a
adequação do atendimento em grupo e se algum dos grupos
existentes ou em formação poderia ser benéfico para aquela
criança, em particular.

c) Condução do trabalho
Sempre havia duas profissionais responsáveis por cada
grupo; em geral, uma psicóloga e uma fonoaudióloga (não neces­
sariamente aquelas com quem as crianças faziam o atendimento

238
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

individual). A decisão de se manter duas profissionais nos grupos


visava a: a) gerar condições que facilitassem atenção individualiza­
da, fosse no auxílio às crianças durante a realização das atividades,
fosse na liberação de reforços imediatos e contingentes a compor­
tamentos desejáveis; b) facilitar a identificação e intervenção sobre
ocorrências durante as sessões grupais que pudessem interferir
com a coesão e funcionamento do grupo e/ou dificultar o alcance
dos objetivos propostos. Além disto, este formato permitia que as
terapeutas se inserissem como membros de eventuais subgrupos,
de forma a coordenar melhor a atividade e/ou compensar eventuais
“desequilíbrios” entre os subgrupos, quando fosse apropriado.

d) Manejo do Grupo
O funcionamento dos grupos era planejado de forma a
atender o objetivo principal dos mesmos, a saber, o aprendizado de
convenções ortográficas da língua portuguesa. Simultaneamente,
eram implementadas regras e dinâmicas que visavam a fortalecer'
o funcionamento adequado de qualquer grupo, independente de sua
meta específica, tais como: coesão grupai; redução da
competitividade e incentivo à cooperação; fortalecimento de
repertórios assertivos, em detrim ento de com portam entos
agressivos ou omissos etc.
Assim, a preocupação inicial centrava-se na constituição
do grupo como tal.
Após a apresentação dos membros e objetivos do grupo,
solicitava-se às crianças que escolhessem um nome e/ou que
elaborassem algum símbolo ou representação para o grupo (por
exemplo, um desenho feito em conjunto que representasse, de
alguma forma, aquele grupo especificamente).
Também era solicitado que as crianças sugerissem regras
para o funcionamento do grupo, tendo como critérios a consecução
dos objetivos (facilitar a aprendizagem) e a convivência harmônica
entre os membros.
Cada regra sugerida era analisada considerando-se sua
conveniência e aplicabilidade.

239
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

Se na lista elaborada pelas crianças não aparecesse


alguma regra que as coordenadoras julgassem importante, esta era
acrescentada e justificava-se sua relevância.
Todo este processo já envolvia o treino de comportamen­
tos importantes para o grupo, como por exemplo: expressar sua
discordância de forma não-aversiva (evitar comportamentos agres­
sivos, “gozações” etc); argum entar pela concordância ou
discordância em relação a alguma sugestão dada, por si ou pelos
outros etc.
À medida que o processo ia se desenvolvendo, as regras
eram revistas e, eventualmente, alteradas, eliminadas ou novas
regras eram inseridas.
Exemplos de regras adotadas pelos grupos:
• Não “gozar” do am igo quando ele não souber ou e rra r
(geralmente, esta regra era sugerida pelas próprias crianças,
provavelmente sob controle do que lhes acontecia na escola,
ou mesmo em casa, em sua interação com pais, irmãos etc).
* Valorizar boas idéias que um colega apresentar para a
realização das atividades (regra geralmente inserida pelas
terapeutas, a fim de aumentar a probabilidade de ocorrência
de conseqüências positivas).
Obviamente, o seguimento das regras dependia de suporte
consistente. Assim, as terapeutas programavam as atividades, bem
como suas intervenções durante os encontros de grupo, de modo a
fornecer condições para que as regras fossem mantidas.
Por exemplo, se as terapeutas observassem a formação
de “panelinhas” que comprometiam a coesão grupai, as atividades
passavam a ser programadas de forma a impedir a cristalização
destes subgrupos. Se algumas crianças passassem a monopolizar
exageradamente a condução das atividades, as terapeutas
interferiam diretamente, solicitando e facilitando a participação de
outros membros ou, indiretamente, programando atividades que
necessitassem da participação alternada de todas as crianças.
Problemas e/ou dificuldades na realização das atividades
e/ou entre os membros do grupo eram abordados tão logo percebidos
e discutidos com o grupo todo.

240
Jaíde Regra e Míriam Marlnofti

Em resumo, além dos cuidados comuns a qualquer


trabalho em grupo, o manejo dos grupos envolvia adaptações e
estratégias específicas a cada grupo em particular, tanto no que
dizia respeito às dificuldades acadêmicas trabalhadas, quanto no
tocante às características dos membros individualmente e da
constituição grupai.

e) Diretrizes psicopedagógicas
Visto que o enfoque do presente volume é sobre o trabalho
com grupos, não será possível uma abordagem aprofundada em
relação ao trabalho com ortografia. Serão fornecidas apenas
algumas informações básicas acerca do embasamento do trabalho
e exemplos de atividades que podem ser desenvolvidas, a título de
contextualização do leitor, sendo que uma análise mais detalhada é
fornecida em publicações anteriores (Marinotti, M., 2001; Marinotti,
M., 2004).
De forma bastante sintética, então, podemos dizer que o
planejamento das atividades obedecia a algumas pressuposições
e critérios, descritos abaixo.
Relações entre escrita e leitura
A concepção corrente, entre leigos e muitos educadores,
de que quem lê mais necessariamente escreve melhor, não parece
encontrar subsídios nem nos dados oriundos da prática clínica ou
educacional, nem no que as pesquisas em Análise do
Comportamento têm evidenciado (Lee, V.L. e Pegler, A.M. ,1982;
Lamarre, J. e Holland, J.G. 1985; Polson, D.A., Grabavac, D.M.e
Parsons, J.A .,1997).
Aqueles que têm experiência com crianças que
apresentam dificuldades de aprendizagem constatam com
freqüência que os avanços em algum repertório (por exemplo, na
leitura) não necessariamente se generalizam para avanços
correspondentes em outro (por exemplo, na escrita).
As pesquisas citadas acima, por outro lado, sugerem que
a interdependência de repertórios verbais, longe de ser um fato na­
turalmente esperado, muitas vezes requer cuidadoso planejamento

241
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

para que possa ocorrer. Ou seja, leitura e escrita parecem consti­


tuir repertórios distintos e, em grande parte, independentes no início
de sua aquisição. Há uma tendência a se tornarem progressiva­
mente interligados à medida que o indivíduo progride em cada um
deles; porém, especialmente aquelas crianças que apresentam di­
ficuldades de aprendizagem terão necessidade de estratégias de
ensino especificamente voltadas para favorecerem esta integração.
A partir destas considerações, as sessões do grupo en­
volviam sempre atividades de leitura e de escrita das mesmas pala­
vras ou palavras delas derivadas, bem como diversificação de ativi­
dades em cada modalidade (leitura ou escrita). Assim, por exem­
plo, a escrita dos mesmos vocábulos seria exigida em diferentes
contextos (identificação de palavras com determinada característi­
ca em um texto e listagem dos mesmos; utilização destes vocábu­
los na elaboração de frases; derivação de palavras a partir dele etc).
O procedimento visava a colocar a emissão da resposta (escrita
correta do vocábulo) sob controle de diferentes contextos, de forma
a aumentar a probabilidade de manutenção e generalização desta
resposta.
Procurava-se, também, colocar a criança sob controle de
dimensões relevantes da língua escrita, não presentes na oralidade.
Uma das formas de fazer isto era ressaltando as diferenças entre
oralidade e escrita. Um exemplo seria extrair de um texto todas as
palavras cujo som inicial correspondia a alguma vogal para, em
seguida, proceder à separação daquelas que efetivamente inicia­
vam por vogal daquelas que iniciavam com h. Nesta situação, es­
pecificamente, tornava-se claro que a semelhança existente na
modalidade oral (leitura), poderia ou não se manter na escrita. A
seguir, eram trabalhadas dimensões da língua escrita que aumen­
tavam a probabilidade de as crianças identificarem palavras inicia­
das por h. y
Quanto à crença de que “quanto mais a pessoa lê, melhor
ela escreve”, considera-se que isto só tem chance de ocorrer se,
ao ler, a criança estiver sob controle de múltiplos aspectos do texto,
dentre os quais, a ortografia das palavras. Via de regra, não é o que
acontece: os aspectos que parecem exercer o controle mais forte
sobre as crianças, quando lêem, são a semântica e a decodificação
correta. Ou seja, pronunciar corretamente as palavras e entender a

242
Jaíde Regra e Miriam Marinotti

história são as preocupações mais comuns e, até certo ponto, isto


está de acordo com o contexto de leitura: em geral, utilizamos a
leitura para adquirir informações, como forma de lazer etc. A utiliza­
ção da leitura como um meio de aprender a escrita é um objetivo
eminentemente acadêmico e, para ser alcançado, necessita de pla­
nejamento deliberado (principalmente quando se trata de crianças
com dificuldades nestes repertórios).
Assim sendo, os textos eram abçrdados, em um primeiro
momento, visando ao seu entendimento e a interpretações a partir
dele. Num segundo momento, eram destacados e isolados os as­
pectos ortográficos dos vocábulos e passava-se a um trabalho in­
tensivo com esta dimensão da palavra.

Seleção dos vocábulos a serem trabalhados


Conform e apontado anteriorm ente, o conjunto de
vocábulos que compartilham uma determinada característica
ortográfica tende a ser bastante numeroso e, conseqüentemente,
impossível de ser trabalhado em qualquer situação de ensino. Na
realidade, mesmo adultos fluentes e bons conhecedores do idioma
eventualmente se deparam com dúvidas quando necessitam
escrever alguma palavra nova ou pouco usual.
Assim, torna-se necessário adotar critérios que norteiem
a escolha do vocabulário básico a ser trabalhado.
Um primeiro critério utilizado envolvia o levantamento de
palavras em livros didáticos e de literatura voltados para crianças
daquele nível escolar e/ou faixa etária. Tal cuidado nos fornecia, por
um lado, um referencial de um vocabulário apropriado para ser
utilizado e, por outro, favorecia a manutenção ou generalização de
eventuais progressos.
Outro critério se referia ao aspecto gerativo, isto é, o fato
de o conhecimento da grafia de um vocábulo permitir derivar a grafia
de outros. Assim, por exemplo, o trabalho com verbos permitia ge­
neralizações em relação à conjugação do mesmo verbo em outros
tempos, modos ou pessoas. Analogamente, o levantamento de pa­
lavras iniciadas por h evidenciou a existência de vários prefixos
(hemo; hemi; homo; hetero; hiper etc) que poderiam embasar ativi­
dades visando à generalização da aprendizagem. Tal possibilidade

243
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

era ainda intensificada pelo fato de que muitas destas palavras es­
tavam presentes em conteúdos de Geografia e Ciências às quais
as crianças estavam expostas.
Finalmente, as palavras sugeridas pelas próprias crianças
eram incorporadas às atividades de forma a ampliar este vocabulário
básico.
Uma vez selecionado o vocabulário básico a ser instalado,
passava-se à seleção daquelas palavras que mais se adequassem
à elaboração da atividade que introduziria o trabalho com a
característica ortográfica atual. Tais atividades introdutórias variavam
muito: textos, músicas, dramatizações etc. O fator comum entre
elas era o fornecimento de um contexto para os vocábulos
apresentados.
Para ilustrar: o levantamento de palavras que contêm uma
sílaba terminada por-/incluía: sol, azul, quintal, avental, varal, lençol,
anzol, anel, cachecol..., palavras estas que favoreciam a elaboração
de histórias cotidianas. A atividade inicial com palavras contendo - I
consistiu em fornecer estas palavras às crianças e solicitar que
montassem uma história a ser dramatizada, utilizando-as. As
crianças elaboraram o cenário e o roteiro que se passava no quintal
de uma chácara, e dramatizaram a história.
A partir deste vocabulário apresentado inicialmente eram
propostas atividades que expandiam o conjunto de vocábulos
trabalhados via processos de derivação, conjugação verbal e outros
atributos lingüísticos que pudessem conferir alguma generalidade
ao conhecimento adquirido.

O papel do exercício repetitivo no aprendizado da ortografia


Evidências empíricas - advindas da observação das
crianças em situações de intervenção como clínica ou escola, bem
como resultantes de pesquisas, conforme as citadas anteriormente
- reforçam a idéia de que a exposição repetida a um mesmo estímulo
(no caso, a um mesmo vocábulo) pode ser um recurso importante
para a aprendizagem de sua grafia correta.
Por outro lado, conforme já citado anteriormente, fazer a
criança copiar vinte vezes a mesma palavra não tem se mostrado

244
Jaíde Regra e Mlrlam Marinottl

eficaz, tendo ainda como efeito colateral indesejável tomar a


aprendizagem da escrita muito aversiva para as crianças.
A partir destas considerações, as atividades envolviam a
exposição repetida da criança ao mesmo vocábulo (ou vocábulos
correlatos como, por exemplo, singular/plural; masculino/feminino
etc) em diferentes momentos, fazendo-o de forma a evitar a
reprodução mecânica da palavra (como na situação de “copie X
vezes....”)
Isto poderia ser feito de inúmeras maneiras das quais a
citada em seguida é meramente um exemplo.
A introdução do trabalho com determinada dificuldade
ortográfica - por exemplo, x com som de icsí (óxido; intoxicação;
sexo etc) era sempre feita de maneira contextualizada. Por exemplo,
iniciava-se o trabalho com a apresentação de um texto com lacunas
a serem preenchidas; para tanto, as crianças contavam com a lista
de palavras que deveriam ser incluídas e com pistas referentes a
cada lacuna (Marinotti, M. 2001). Esta atividade, por si só, obrigava
as crianças a lerem várias vezes o mesmo trecho. Além disso, as
dicas ressaltavam dimensões das palavras relevantes para a grafia
correta. Por exemplo, uma das palavras omitidas constituiria o início
de uma frase e, portanto, estaria grafada com letra maiúscula na
lista de palavras fornecida. Eventualmente, as palavras com a
dificuldade trabalhada encontravam-se entre aquelas que deveriam
ser inseridas no texto, o que já poderia constituir uma primeira
oportunidade de cópia da palavra, de um modo menos mecânico.
Completado o texto, as crianças seriam solicitadas a copiar as
palavras que apresentavam a letra x, em diferentes colunas,
considerando o som desta letra em cada uma das palavras,
Novamente, a atividade de cópia existia, porém fortalecendo a
relação grafema-fonema e tornando mais saliente a característica
relevante naquela atividade. Feita a separação em colunas, as
atividades subseqüentes enfocavam as palavras onde o x
apresentava o som de Ics! e envolviam desde atividades mais
tradicionais, tais como: ordenar alfabeticamente as palavras;
separação de sílabas etc até atividades lúdicas que podiam ser
elaboradas pelas próprias crianças ou que já eram previamente
programadas pelas terapeutas. Como resultado, as crianças eram

245
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

expostas intensivamente a determinado conjunto de vocábulos e


palavras correlatas em situações bastante distintas que evitavam a
mecanização da cópia tradicional; estendiam o controle de estímulos
para diferentes contextos e propiciavam maior motivação para sua
realização por parte das crianças.

Análise e síntese lingüísticas


Além dos recursos já descritos que visavam ampliar a
generalização do aprendizado, procurava-se incluir no trabalho
atividades que enfocassem a análise e síntese de palavras,
vocábulos, frases e textos, em seus diferentes componentes.
Já abordamos em texto anterior (Marinotti, M., 2001) a
importância de se identificar unidades verbais mínimas relevantes na
aprendizagem da leitura e da escrita. Em síntese, podemos dizer que:
a) a capacidade de compor e decompor unidades verbais é
essencial para o aprendizado da língua escrita; por exemplo:
identificar frases num texto, palavras numa frase, sílabas e
letras numa palavra e vice-versa;
b) a sílaba parece ser uma unidade fundamental na aprendizagem
dos fundamentos alfabéticos da língua portuguesa, entretanto
c) quando se trata da aprendizagem de convenções ortográficas,
unidades maiores adquirem importância, pois dicas contextuais
muitas vezes são fundam entais (por exemplo, na
discriminação de quando se escreve seia ou ce/a; conserto
ou concerto etc).
Assim sendo, independentem ente da dificuldade
ortográfica trabalhada, atividades de análise e síntese sempre eram
incluídas visando a colocar o comportamento de escrita sob controle
de variáveis relevantes o que, por sua vez, poderia facilitar a
generalização da aprendizagem.

2.3. Considerações gerais


O trabalho acima delineado se mostrou promissor no
sentido de melhorar a produção ortográfica das crianças nele
envolvidas. Tanto nas situações de grupo, quanto nos atendimentos

246
Jaíde Regra e Míriam Marinottl

individuais observou-se um aumento de acertos relativos àquelas


dificuldades trabalhadas. A avaliação da generalização destes
ganhos para o ambiente escolar foi insuficiente por vários motivos,
porém houve indícios de que vários vocábulos que foram trabalhados
diretamente passaram a ser escritos corretamente em tarefas
escolares.
O contexto grupai mostrou-se adequado a vários dos
objetivos a que se propunha: a participação e engajamento das
crianças nas atividades ocorriam de forma mais freqüente, criativa
e produtiva do que o observado na escola ou no atendimento
individual. A observação do grupo ao realizar as tarefas mostrava
que as crianças as realizavam motivadas e, naquelas atividades
mais lúdicas, divertiam-se durante sua execução.
Observou-se, também, aprimoramento nos repertórios de
auto-observação e auto-descrição, quer nos encontros do grupo,
quer nos atendimentos individuais. Paralelamente a isto, as crianças
foram tornando-se mais “ seguras” : dim inuíram m uito os
comportamentos de esquiva e as crianças passaram a arriscar
mais, mesmo quando não tinham certeza. Por exemplo, elas diziam:
- não tenho certeza, mas acho que a palavra........ também faz
parte deste grupo; - acho que horário tem h porque é um pouco
parecido com hora etc.
Foi possível notar, ainda, que as crianças exibiram algum
nível de generalização no sentido de atentarem mais para a ortografia
de vocábulos, que não aqueles diretamente trabalhados, em
situações diversas: leituras realizadas durante o atendimento
individual; auto-correção de textos produzidos por elas na clínica ou
na escola etc.
Entretanto, dificuldades de ordem prática dificultaram a
manutenção dos grupos por longos períodos. Em geral, conseguia-
se manter o grupo em funcionamento por, no máximo, um semestre
letivo (aproximadamente quatro meses). Assim, a (curta) duração
dos grupos, a amplitude do repertório a ser instalado e a ausência
de procedimentos de registro eficazes impediram uma avaliação
mais adequada dos resultados.
A despeito da exigüidade de dados sistem áticos,
acreditamos que este relato possa servir de incentivo para que

247
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

experiências de intervenção semelhantes, com maior rigor na coleta


e registro dos dados sejam conduzidas, bem como pesquisas
voltadas para a questão do ensino da ortografia da língua portuguesa.

Referências
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relação terapêutica e a Análise Comportamental Clínica (1999). Em: R.R.
Kerbauy e R.C. Wielenska (org.). Sobre Comportamento e Cognição -
Psicologia Comportamental Cognitiva - da reflexão teórica à diversidade na
aplicação, vol.4, pp. 134-148, Santo André: Esetec
Lamarre, J. e Holland, J.G. (1985) The functional independence of Mands
and Tacts. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 43, 5-19.
Lee, V.L. e Pegler, A .M. (1982) Effects on Spelling of Training Children to
Read. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 37, 311-322.
Kohlenberg, R. J. e Tsai. M. (1991). Functional analytic psychotherapy:
Creating intense and curative therapeutic relationship. Nova York: Plenum
Press.
Marinotti, M. (2001) Dificuldades ortográficas: análise de algumas variáveis
relevantes para o aprimoramento do controle de estímulos. Em: H.J. Guilhardi
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André: ESETec Eds. Associados.
Marinotti, M. (2004) Processos comportamentais envolvidos na aprendizagem
da Leitura e da Escrita. Em: Hübner, M.M.C. e Marinotti, M. (org.) Análise
do Comportamento para a Educação - Contribuições Recentes, pp. 205-
223, Santo André: ESETec.
Nalin, J. A. R. (1993). “O uso da fantasia como instrumento na psicoterapia
infantil”. Temas em Psicologia, 2, pp. 47-56.
Poison, D. AGrabavac, D.M. e Parsons, J.A. (1997) Intraverbal stimulus-
response reversibility: fluency, familiarity effects and implications for stimulus
equivalence. The Analysis of Verbal Behavior, 14,19-40.
Rose, D. S. (1989). Working with adults in groups: Integrating Cognitive-
Behavioral and small group strategies. Jossey-Bass Publishers

248
Capítulo 9
Tornando-se um
terapeuta de grupos
Priscila R. Derdyk1e Silvia Sztamfater2

Este capítulo tem como objetivo mostrar como um


terapeuta analista do comportamento pode trabalhar com grupos.
Para tanto, irá enfatizar os diversos comportamentos que este
profissional deve apresentar para liderar um grupo. Assim, estaremos
fazendo menção a duas vertentes: uma relacionada às questões e
valores pessoais e profissionais do terapeuta que influenciam a sua
intervenção e a outra relacionada às habilidades que o terapeuta
precisa ter em seu repertório clínico para facilitar as mudanças dos
membros do grupo. Além disso, aspectos relacionados ao
desenvolvimento do processo grupai serão abordados.
Após a leitura do capítulo, esperamos que aqueles que
trabalham somente com terapia individual possam ser capazes de
iniciar um trabalho com grupos.

1 Mestre em Psicologia, terapeuta e coordenadora do CeAC (Centro de Análise do


Comportamento), São Paulo, SP.

2 Doutoranda do Departamento de Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Santa


Casa de São Paulo,Pesquisadora da Fundação Carlos Chagas,Terapeuta do CeAC - Centro
de Análise do Comportamento.

251
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

1. Grupo e a análise do comportamento


Para iniciar o capítulo, é interessante retomar o conceito
de_gaipLQ.„proposto por Skinner. Na sua obra C iência e
Comportamento Humano, datada de 1953, o autor afirma que

"... o comportamento social pode ser definido como o


comportamento de duas ou mais pessoas em relação a uma
outra ou em conjunto em relação ao ambiente comum”(p. 325).

Assim, trabalhar com a idéia de grupo, é considerar que


o comportamento social surge “... porque um organismo é importante
para o outro como parte de seu ambiente” (p.326). Partindo desta
concepção, trabalhar com grupos é fazer uma análise do ambiente
social considerando os reforços e os estímulos sociais, os episódios
sociais e verbais e a interação entre elas ,uma vez que, estas
variáveis atuam nas contingências grupais.
Ao propor o modelo causal de seleção pelas conseqüên­
cias como responsável pela explicação do comportamento operante,
Skinner buscou pressupostos que pudessem sustentar a idéia de
adaptabilidade ao ambiente, garantindo a evolução das espécies.
Afirmou que o comportamento humano é produto conjunto de três
níveis de seleção: filogênese (contingências de sobrevivência da
espécie), ontogênese (condicionamento operante) e cultura (çoa-
tingências sociais). Esteúltimo nível, produziu a capacidade do ser
tiumano de se organizar em grupos, o que favorece a sobrevivência
e adaptação dos indivíduos a um ambiente complexo e em cons­
tante mudança .
De acordo com Darwich e Tourinho (2005),

“a seleção comportamentalpor contingências sociais garante


O que, participando de grupos, cada indivíduo usufrua da
aprendizagem de outros, de forma que a aquisição de seu
. repertório comportamentalnão permaneça limitado às relações
estabelecidas diretamente com o ambiente” (p. 109).

Portanto, estar em grupos é uma característica essencial


dos seres humanos que passam suas vidas inseridos em grupos
sociais. É em grupo que se desenvolvem as habilidades sociais,
indispensáveis para o indivíduo se adaptar ao meio em que está
inserido.

252
Priscila R. Derdyk e Silvia Sztamfaíer

2. Por que terapia em grupo


Em geral, achamos que os nossos problemas são únicos
e que existe pouca probabilidade de solucioná-los. Também, temos
dificuldade em conviver bem com as pessoas ao nosso redor.^Gru­
pos terapêuticos podem ser uma das melhores formas de ajuda no
entendimehtoê superação destes problemas, pois criam um senti­
mento de pertinência e são como um antídoto à cultura impessoal
em que vivemos. Funcionam como um laboratório protegido, uma
vez que situações do ambiente natural são reproduzidas, porém de
uma forma gradual e controlada, facilitando a aquisição e treino de
comportamentos que não seriam emitidos fora deles.

3. Considerações sobre o terapeuta de grupos


Na terapia individual, o terapeuta estabelece o vínculo com
o cliente, ou seja, o que está em análise é a díade terapeuta-cliente.
Já na terapia de grupo, a interação ocorre entre terapeuta(s) e
clientes, assim como entre os próprios clientes. O terapeuta é
também umjnembxadQ grupo, o que o torna mais exposto» já que é
alvo não só de um, mas de vários clientes simultaneamente. Mesmo
sendo membro do grupo, seu papel é diferente e ele precisa saber
claramente quais são os comportamentos que devem fazer parte
do seu repertório enquanto líder do grupo, de modo a preservar a
sua função e diferenciar-se dos demais participantes.
Há dois aspectos que influenciam o desempenho do líder
de um grupo. O primeiro está ligado ao repertório adquirido ao longo
dos anos que determinam suas características pessoais . Já o
segundo, refere-se ao conhecimento teórico e prático que acumulou
enquanto profissional.
a) Características pessoais
Estas características são adquiridas através de eventos
comportamentais da vida de cada um. Assim, quanto mais o
terapeuta tiver se exposto e continuar a se expor à diversos eventos
ao longo de sua vida, maior será_.o se.u repertório. Estes eventos
referem-se a todas as experiências que vão formar o repertório do
indivíduo: tipo de família, escolas, educação informal, religião, fazer
terapia, viagens, envolvimentos em momentos sociais e políticos,
classe social, relacionamentos, tipos de vínculos que estabeleceu

253
Terapia Analftlco-Comportamental e m Grupo

etc.. Quanto maior o contato com diferentes contingências maior


será a'capacidade de Identificar nuances das relações que se'
estabelecem entre o organismo e o ambiente, isto é, jufihor^a
discriminação de estímulos sutis que poderiam estar controlando ò
comportamento dele e das outras pessoas. Não bastaria aprender
apenas lendo e estudando sobre grupos já que isto traria só o
conhecimento teórico. Alguns comportamentos tais como: auto-
revelação, esquiva, confrontação, dar e receber feedback e
identificar-se com outros participantes são melhor aprendidos quando
o terapeuta já participou como membro de um grupo, vivenciando
todos estes aspectos. Ou seja, adquirir experiência em eventos
comportamentais correspondentes, neste caso outros grupos, é
importante na medida em que permite ao terapeuta possuir
conhecimentos para predizer e controlar a interação grupai.

b) Conhecimento teórico e prático


O conhecimento teórico é adquirido com o estudo do
assunto específico, através de cursos para formação de terapia em
grupo, palestras, seminários, workshops, congressos, discussão
com pares, leitura de bibliografia da área, supervisão etc...

4. Questões para serem respondidas antes de


se formar um grupo
Grupos são altamente eficazes como instrumentos de
mudança. No entanto, podem ser extremamente prejudiciais caso
o terapeuta não esteja bem preparado para conduzi-los. Antes de
formar um grupo, algumas questões devem ser respondidas:
a. Que tipo de grupo você está interessado em formar?
Um jjrupo pode ser terapêutico ou apenas educativo ou
até mesmo com estas duas funções. O grupo terapeutico pode ir
trabalhando os assuntos trazidos por seus membros, ao longo do
tem po. Eventualm ente, se o terapeuta tive r um foco em
aprendizagem, ele poderá aproveitar alguma questão trazida por
um participante e ensinar algo tal como assertividade, processos
de tomada de decisão, questões sexuais etc... Quando o grupo é
.específico, o terapeuta define o tema e quantas sessões serão

254
Priscila R. Derdyk © Silvia Sztamfater

necessárias antes de iniciar o grupp. Por exemplo, um grupo para


gestantes, crianças asmáticas, orientação de pais etc...

b. Quais as vantagens da Terapia em Grupo?


Como o grupo é composto por muitas pessoas, os
indivíduos têm oportunidades de se expor para um ambiente mais
complexo e comjyiais, modelos, aumentando suas chances de
aprendizagem e modificação
Para uma instituição como um hospital psiquiátrico,
centros de saúde, escolas etc..., noas quais a demanda por um
atendimento psicoterápico é muito grande, este tipo de àténdimento
é bastante importante.
Existe também um ganho econômico já que um mesmo
profissional pode atender um maior número de pessoas.

c. Quais as vantagens para a instituição em q. você


trabalha, utilizar esta forma de trabalho comparado, por
exemplo, com a terapia individual?
Em geral, o fator econômico é um grande atrativo para as
instituições aliado à possibiiídade de atendimento de um maior
número de pessoas em um menor espaço de tempo.

d. Quais os conceitos teóricos que embasarão o trabalho


em grupo?
As interações interpessoais em uma situação de grupo
são bastante com plexas exigindo do terapeuta um bom
conhecimento da teoria que irá direcionar a terapia. ATerapia Analítico
Comportamental mostra-se um excelente instrumento de análise
de relatos da vida do cliente e para manejar os comportamentos
que ocorrem na sessão, facilitando uma aprendizagem em loco.

e. Pode- se usar conceitos e/ou técnicas com


perspectivas teóricas diferentes?
Algumas pessoas gostam de mesclar conhecimentos. No
entanto, explicar comportamentos através de teorias diferentes pode
confundir o processo. Uma coisa que poderia ser usada, com

255
Terapia Analrtico-Comportamental em Grupo

cautela, é o uso de técnicas desenvolvidas por outras teorias e que


possam ajudar os participantes atingirem seus objetivos. Por
exemplo, o uso de roleplaying desenvolvido originalmente pelos
psicodramatistas, técnicas de relaxamento, etc...

f. A terapia em grupo serve para todos os clientes?


Algumas pessoas podem não se beneficiar do trabalho em
grupo. Pessoas que tiveram experiências negativas com grupos no
passado, pessoas em fase de mania ou depressão profunda etc...

g. Quando se deve trabalhar com grupos homogêneos


ou heterogêneos?
Grupos heterogêneos reproduzem melhor o modelo de
sociedade em que vivemos, assemelhando-se mais com o ambiente
natural dos participantes. Desta forma facilita a generalização das
novas respostas aprendidas. Porém, quando o trabalho êfeítõnuma
instituição, às vezes só existem pessoas com um mesmo tipo de
problema Por exemplo, no ambulatório de pessoas com transtorno
de humor só encontraremos pessoas com este problema.

h. Que habilidades você tem para ser um terapeuta de


grupos?
É importante que a pessoa que pretende ser terapeuta de
grupos faça um levantamento de suas habilidades como terapeuta.
Isso vai deixá-lo mais confiante e ao mesmo tempo indica que
habilidades ele ainda precisa aprender.

i. Que habilidades você precisa aprender para ser um


terapeuta de grupos?
Após a identificação do repertório clínico, caso seja
necessário, o terapeuta deve procurar todos os recursos disponíveis,
como os citados anteriormente, para aprimorá-lo.

j. É importante o uso de um co-terapeuta?


Para iniciar um grupo, o terapeuta deve decidir se irá
desenvolver o trabalho junto com um outro terapeuta que é chamado

256
Priscila R. Derdyk e SiMa Sztamfater

de co~terapeuta. É possível conduzir um grupo sozinho, mas o


trabalho em dupla permite que os terapeutas complementem e
apoiem um ao outro, troquem opiniões além de aumentar o poder
de observação dos comportamentos dos membros do grupo.
O sistema de co-terapia é uma forma eficaz de se ensinar
o terapeujôiniciante pois permite que novos comportamentos sejam
adquiridos, mais rapidamente, em situação natural e com o terapeuta
mais experiente guiando e apoiando este processo de aprendizagem.
Ao escolher um co-terapeuta deve ser considerada a
afinidade de abordagens e uma forma de trabalhar congruente e
harmônica, de maneira que não ocorram desentendimentos na hora
da sessão. Antes de cada sessão deve ficar decidido quem fará o
papel de terapeuta e de co-terapeuta e como será a atuação de
cada um.

5. Repertório de um terapeuta de grupos


Na terapia de grupo, é esperado que o líder tenha
habilidades pontuais: fa cilita r a participação e interação dos
membros, de modo que~possam verbalizar livremente o que queiram,
guiar o g rupo de forma que se mantenha o foco no assunto
discutido, apoiar os membros que demonstrem mais dificuldade
em se expor, m ediar c o n flito s e assegurar que as regras
estabelecidas pelo próprio grupo sejam cumpridas. Além destas
habilidades, é fundamental que o líder trabalhe o vínculo terapêutico
entre ele e os clientes e entre os próprios clientes, visto que a
interação grupai é um instrumento de mudança poderoso, que
diferencia a terapia grupai da terapia individual. Esta diferença é
notória, quando consideramos que os próprios participantes podem
ser considerados como agentes de mudança, uma vez que podem
servir como modelos para os demais na aprendizagem ou mudança
de comportamentos.
Nas primeiras sessões, o terapeuta além de crjar um
ambiente reforçador, isto é, garantir que as sessões de terapia
em grupo estejam livres de punições, deverá também estruturar o
grupo, estabelecendo as regras e os comportamentos esperados

257
Terapia Analítico-Comportamental em Grupo

de cada participante. Por exemplo: saber ouvir sem interromper,


colocar-se no lugar do outro, sigilo, respeito, pontualidade,
assiduidade e comprometimento com o grupo.
A terapia em grupo torna o cliente bastante participativo
no processo terapêutico, já que o esperado é que a interação ocorra
praticamente entre os membros e que o terapeuta tenha importância
“secundária”. Isto difere do modelo médico, no qual o profissional
em questão é que sabe de tudo, capaz de definir o que é certo e
errado. Também é função do terapeuta encorajar os participantes
a expressarem sentimentos, quer sejam positivos ou negativos,
afetuosos ou hostis, ou de qualquer outro tipo e, ao mesmo tempo,
estimular a honestidade na aceitação do que foi verbalizado e
nos com entários tecidos. É necessário que o terapeuta ouça
atentamente cada participante, de forma que aquele que verbaliza,
sinta-se reforçado por fazê-lo, independente do relato. Esta escuta,
além de levar em conta o conteúdo, precisa observar os gestos e
mudanças súbitas na voz ou na expressão do falante (congruência
entre conteúdo verbalizado e expressão corporal e/ou facial), bem
como considerar as mensagens implícitas. O terapeuta deve
também evitar desviar a sua atenção daquilo que está sendo dito ou
evitar ficar preocupado com o que ou como responder a outra
pessoa. Outra situação observada em grupos é o confronto entre
os participantes. Neste caso, o terapeuta deve m anter a sua
neutralidade e buscar apoio dos demais participantes para resolver
o conflito. Ele pode perguntar aos demais componentes o que acham
e como estão se sentindo naqueia situação.
A ocorrência de silencio entre os membros também é
uma forma de interação grupai. Nesta situação, o líder deve
considerar possíveis motivos, como: uma sessão monótona e
cansativa, que causa a passividade do grupo; um membro que não
pára de falar ou interrompe demasiadamente os outros, etc. Estas
hipóteses levantadas pelo terapeuta também devem ser trabalhadas
com o grupo, para que todos possam entender a dinâmica do
momento e identificar quais as variáveis que estão controlando o
comportamento dos membros.
É também importante que o terapeuta esteja atento na
identificação das contingências que atuam durante a sessão,

258
Priscila R. Derdyk e Silvia Sztamfaíer

principalmente nas interações e verbalizações entre os membros.


Quando o terapeuta analisa e mostra para o grupo algum evento
comportamental que está ocorrendo naquele momento, está
fazendo uma análise funcional, que facilita a compreensão e
aceitação da situação pelos participantes. Tomemos como exemplo,
um participante que afirma que não tem amigos ou qualquer relação
afetiva mais significativa. No grupo ele se comporta de uma forma
prepotente e agressiva. Em uma ocasião em que isso ocorre, o
terapeuta usa a oportunidade para apontar esta interação e envolve
os demais membros, perguntando-lhes, por exemplo, como vêem
esta situação e como relacionam isso com o problema do colega.
Kohlenberg e Tsai (2001), já enfatizavam a importância de se
observar e manejar comportamentos que ocorrem na sessão, que
denominaram comportamentos clinicamente relevantes, como uma
forma bastante eficiente de se alterar padrões comportamentais.
Saber resum ir é também uma habilidade útil. Pode ser
usada quando o processo grupai está confuso e/ou fragmentado.
Por exemplo: quando em uma sessão, diversos temas são
discutidos, o terapeuta pode resumi-los apontando os elementos
comuns a todos. Outra forma de resumir é, ao final da sessão,
pedir que cada membro diga uma frase que expresse o que foi
importante no encontro e o que gostaria de discutir no próximo.

6. Estágios de um grupo
Um grupo passa por diferentes momentos ao longo do
processo terapêutico. Um terapeuta precisa saber da existência
destes momentos a fim de decidir como conduzir a dinâmica do
grupo, levando em conta as particularidades de cada um destes
momentos. A seguir, descreveremos as principais etapas do “ciclo
de vida” de um grupo terapêutico e o que é esperado do líder:

Início: No início do grupo o terapeuta deverá estruturar as sessões


de forma mais diretiva. Cada membro que inicia o grupo vem
com a sua história de vida, a sua experiência pessoal, que
inclui as relações familiares e demais relações sociais, as

259
Terapia Analrtico-Comportamental e m Grupo

suas crenças e valores, bem como as dificuldades que tem


perante o ambiente no qual está inserido. É também esperado
que o indivíduo que inicia um processo terapêutico não tenha
clareza de como a terapia poderá auxiliá-lo nas mudanças
em seu repertório. Pode acreditar que seja função do terapeuta
descobrir as causas dos seus sintomas e propor soluções.
Tendo como princípio esta visão, cada integrante do grupo
pode pressupor que os demais membros sejam secundários
na dinâmica, pois o que vale é a sua relação com o terapeuta
por ser quem decidirá como deve proceder. É claro que uma
pessoa que nunca participou de terapia em grupo, não tem
como saber sobre o seu funcionamento, devendo o líder
fornecer informações sobre a sua estrutura e quais os
comportamentos esperados do participante para obter melhor
aproveitamento. Por exemplo, o terapeuta deve informar que
as decisões serão tomadas pelos próprios participantes junto
com os terapeutas .
No começo do grupo há uma maior demanda pela figura do
líder! Como é nesta fase que os membros do grupo ainda estão
se conhecendo, é fundamental que o terapeuta trabalhe
especificamente as relações entre ele e os vários membros e
os mesmos entre si, modelando o comportamento de ser
cliente de um grupo. Neste momento inicial os participantes
são cautelosos, podem permanecer mais em silêncio
observando os demais para saber como devem se comportar.
O ambiente deve ser reforçador para que os participantes
possam, num outro momento, verbalizar aspectos íntimos da
sua vida.
Desenvolvim ento do grupo: é nesta fase que o grupo se
consolida, adquire a sua identidade e coesão. Espera-se que
os membros do grupo sintam-se motivados e encorajados a
participar ativamente visto que esta é a fase caracterizada
pela interação grupai propriamente dita. São os próprios
integrantes que desenvolvem a terapia e rompem com o
“modelo médico” de intervenção, citado anteriormente. Isto
significa que, em condições favoráveis, os participantes vão,
gradualmente, encontrando auxílio mútuo, o que permite a
espontaneidade, o diálogo, a reflexão e o esclarecimento das
diferentes contingências.

260
Priscila R. Derdyk e Silvia Szfamfcrter

Entretanto, isto não quer dizer que o terapeuta não tenha mais
função, ou que a sua atuação seja menos importante. Sua
função será criar condições para que os participantes possam
identificar as variáveis de controle e desenvolver repertórios
alternativos.
Término: Ojérmino. de grupo ocorre quando seus membros já
atingiram seus objetivos e relatam que já emitem novos
cpmportamentos no seu ambiente natural.

7. Considerações finais
Concluindo, para tornar-se um terapeuta de grupo, alguns
aspectos devem ser ressaltados: o primeiro é que aprender uma
nova habilidade complexa leva tempo, portanto, não se deve esperar
reforços imediatos. Outro aspecto é saber que dúvidas, medos e
erros fazem parte da aprendizagem.
Em suma, o terapeuta nunca pode se esquecer de que
ser terapeuta exige um aperfeiçoamento contínuo e que para isso,
deve estar sempre disposto a se aprimorar estudando, participando
de supervisões e, ele próprio, submetendo-se a uma terapia.

Referências
Darwich, R.A., Tourinho, E.Z. Respostas emocionais à luz do modo causal
de seleção por conseqüências. Revista Brasileira de Terapia Comportamentaf
e Cognitiva, 7(1), p. 107-118,2005.
Kohlenberg, R., Tsai,M (2001) Psícoterapia Analítico Funcional. SanyoAndré:
Esetec.
Skinner,B.F. (1953) Ciência e Comportamento Humano. Martins Fontes

Bibliografia recomendada
Corey, M.A.S, Corey, G. (2002). Groups: process and practice. Brooks/
Cole ed.Yalom
Rose D. R. (1989). Working with adults in groups. Jossey-Bass Inc.
Publishers.

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