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— As estádias têm caído um pouco por conta desse novo vírus que está assombrando, mas nada
que possa prejudicar o hotel. — Patrizio, o sócio que cuida dos 4 hotéis que possuo pela Itália, disse,
através da nossa videoconferência. — Apesar disso, estamos recebendo ligações de todo o mundo
para hospedagens em breve.
Anuí.
Isso é bom. Com esse vírus pegando todos de surpresa, meus negócios na Europa e Ásia deram
uma diminuída. Nada muito grande, mas, ainda assim, não era uma coisa que eu apreciasse.
Descanso as costas em minha poltrona e relaxo as pernas, meu braço apoiado no braço da cadeira
enquanto arrasto meu indicador pelo queixo.
— Deixe-me saber se você precisar de alguma coisa, Patrizio. — falei para ele.
Patrizio assentiu, os cabelos grisalhos brilhando na tela do meu computador.
— Deixarei. — garantiu, então hesitou e sua testa enrugada pela idade se franziu. — Na verdade,
há uma coisa que eu gostaria de pedir.
Remexo na poltrona, ajeitando minha postura enquanto aceno.
— Fale.
Patrizio também se ajeitou e limpou a garganta antes de começar a falar:
— Você sabe que tenho uma filha, certo?
Anuí. Eu sabia de sua filha, apesar de não a ter visto há anos. Ela costumava vir para os Estados
Unidos com ele quase sempre.
— Bem — ele continuou —, com toda essa confusão do vírus circulando e tudo o mais, eu estou
preocupado com Giulia por aqui. Quase todo o país está entrando em quarentena. Carlotta e eu
estamos aflitos e gostaríamos de saber se nossa filha pode ficar... hm... uns dias aí com você?
Pego de surpresa, encarei a tela do computador, boquiaberto, sem dizer uma palavra. Considerei o
pedido do melhor amigo do meu falecido pai. Ele quer que sua filha venha para cá, ficar comigo? Por
quê? Claro, eu sabia muito bem o motivo, porque ele acabou de me explicar e era totalmente
compreensível, mas, por que logo eu?
— Ela não iria preferir ir, sei lá, passar umas férias no Brasil? — disse a primeira coisa que veio à
minha cabeça, que poderia me livrar dessa.
Mas Patrizio sacudiu a cabeça, sua mandíbula se contraindo.
— De jeito nenhum! — Ele logo se calou e me deu um olhar de desculpas.
Eu não dei a mínima para seu surto. Tudo que eu pensava era que eu não tinha tempo para uma
garota de...
— Giulia tem apenas dezenove anos. — disse ele, lendo meus pensamentos.
Dezenove anos! Pelo amor de Deus, dezenove anos já é praticamente uma adulta, por que diabos
ela não pode ir passar as férias no Brasil ou em algum lugar que não tenha risco do novo vírus ou que
não seja minha casa?
— Ela já atingiu a maioridade.
— Com todo respeito, Pedro. — ele pediu, sua voz dura, mas na medida certa para não ultrapassar
o meu limite. — Minha família tem certas regras, que não são quebradas só porque minha filha tem
mais de dezoito anos. Não nos importamos com isso.
Sim, família tradicional e blá blá blá. Essas regras não servem quando é para a garota ficar
sozinha com um cara?
Eu queria perguntar, mas uma das coisas que meu pai ensinou foi que não podemos zombar das
tradições das pessoas.
Respirando fundo, eu imaginei meu pai me aconselhando a quebrar esse galho para seu melhor
amigo. Ele sempre fazia de tudo para vê-lo feliz e vice-versa. Mesmo odiando a ideia, cedi e suspirei.
— Tudo bem.
Patrizio sorrio largamente.
Eu cerrei os dentes. O que estou fazendo?
— Vou enviar meu avião para busca-la com uma equipe médica para se certificar de que está tudo
bem. — avisei. — Só me diga quando quer manda-la.
— O mais rápido possível.
Eu quase fiz uma careta. Nem tempo de me organizar, eu tenho.
Anuí com dureza e fechei o laptop, finalizando a videoconferência. Passei as mãos pelo rosto,
frustrado. Era para ser apenas uma reunião para ficar a par de tudo que estava acontecendo por lá, e
agora eu tinha a responsabilidade de uma garota de dezenove anos que vem de uma família
tradicional do caralho e, provavelmente, ainda é virgem. Era como cuidar de uma adolescente —
apesar de que eu nunca fiz isso.
Ótimo.
Era tudo o que eu precisava para agora.
Cruzo os braços sobre o peito e encaro meu pai.
— Por que eu tenho que ir?
Minha mãe, que está sentada ao meu lado, me olha feio, com desaprovação, mas eu ignoro. Estou
mais focada na minha conversa e nas respostas que eu quero receber.
É simplesmente ridículo o fato de que meu pai está me mandando para outro país, com uma
desculpa idiota de que precisa me proteger das coisas que estão acontecendo no país.
Meu pai não esbouça nenhuma reação quando ele me responde:
— Porque estamos em luta contra esse novo vírus. As pessoas estão falando em quarentena, o que
significa que é grave. Não quero você aqui, exposta a isso.
— Ok. — Dou de ombros. — E por que você e a mamãe também não vão comigo?
— Giulia, apenas obedeça a seu babbo. — mamãe repreende. — Ele quer seu bem.
Viro o rosto para ela.
— Mesmo? — o sarcasmo pinga na minha voz. — Ou é apenas uma forma de me manter longe do
Mattia?
A mandíbula do meu pai se contrai e seu olhar sobre mim poderia me assassinar, se isso fosse
possível. Mamãe, suspira exasperada com minha pergunta.
Cerrto, bingo!
Eu toquei em seus pontos. Meus pais decidiram que, mesmo eu tendo dezenove anos, não posso
simplesmente decidir com quem devo ou não me relacionar. Recentemente, conheci Mattia Bianchi,
o filho de um arquiteto renomado aqui na Itália. Nós nos conhecemos através de uma amiga, e eu
imediatamente me apaixonei.
Mattia é o tipo de cara que você olha e não tem mais como escapar. Alto, um corpo perfeito, olhos
que chamam atenção e uma forma de se mover que deixa você querendo entrar no primeiro quarto
que encontra com ele, só porque sabe que vai ser bom.
Ele, com certeza, sabe que causa isso nas garotas, e ele pediu meu telefone para que possamos
trocar mensagens todos os dias. Em uma das nossas saídas, meu pai acabou descobrindo e, desde
então, está no meu pé com tudo isso.
— Não tente anular minha preocupação, Giulia. — Papai ergue um dedo em riste, avisando. —
Por mais que eu não queira você com aquele... carogna, também me preocupo com minha única
filha.
— Então me mande para outro lugar! — digo, levantando-me porque eu não consigo me manter
sentada. Estou nervosa demais por pensar que não poderei mais ver o Mattia. — Ou... Sei lá, mande a
mamãe comigo, pelo menos! — Bato as mãos nas pernas. — Eu não quero ficar com alguém
desconhecido, em um lugar desconhecido.
— Pedro não é um desconhecido.
Eu solto uma risada incrédula.
— Para você, babbo, mas para mim, ele é muito estranho sim.
Meu pai acena com a mão, balançando a cabeça quando volta para sua pilha de papéis, que estão
espalhados sobre sua mesa.
— Eu não vou discuti com você, Giulia. — ele avisa, sem me olhar. — Você vai e ponto final. Não
quero mais ouvir suas birras.
Estreito o olhar e abro a boca para falar, mas então torno a fechar. Não vai adiantar discutir quando
ele já está decidido. Sempre foi assim. Eu olho para minha mãe, que agora está fingindo checar suas
unhas bem-feitas, só para não me enfrentar. Como de costume, ela está do lado dele.
Minha mãe prefere morrer do que ver nossa família fora das tradições ridículas.
Bem, se é assim que eles querem, assim será.
Com um suspiro alto, ergo os ombros e arqueio uma sobrancelha.
— Tudo bem, então. — Eu me rendo, levantando as mãos com as palmas para cima. — Eu vou
para Miami, como você quer.
Meu pai levanta o rosto e me olha com desconfiança.
Abro um sorriso triunfante.
— Mas, não pensem que eu vou deixar de falar com o Mattia.
A expressão severa dele voltou, assim como a da minha mãe.
— Ele é meu namorado e não vou deixa-lo só porque meus vocês estão me obrigando ir para outro
continente.
Eu giro em meus calcanhares e saio pela porta, fechando-a atrás de mim, daí empurro minhas
costas contra ela, fechando os olhos com força para impedir as lágrimas de caírem. Odeio essa vida,
odeio meus pais por me mandarem embora, esse hotel idiota e, mesmo não o conhecendo, eu odeio
esse tal de Pedro Rodrigues.
Que cara imbecil aceitaria tomar conta da filha de outra pessoa? Ele nem me conhece. Não sabe
as coisas que gosto ou deixo de gostar, ou se eu sou comportada...
Puxo o celular do bolso e mando uma mensagem para Mattia, informando-o o que estava
acontecendo, enquanto ando pelo corredor do escritório do meu pai, que fica por trás da recepção do
hotel. Quando chego no lobby, o devolvo para o bolso, acenando para Greta, uma das recepcionistas
ao passar para alcançar o elevador.
Desde que me entendo por gente, eu moro aqui, no hotel. Meu pai achou que seria mais
conveniente morar no lugar do trabalho, porque assim ele pouparia a dor de cabeça de chegar tarde
em casa. Nem preciso dizer que odeio esse raciocínio.
Eu gostaria de viver em uma casa, com quintal grande e uma piscina só para mim, para nadar a
hora e quando quisesse. Eu nunca fui uma adolescente com privacidade. Mesmo agora, com
dezenove anos e idade o suficiente para morar sozinha, não posso, porque a família Esposito é uma
das “famílias originais” de Venrona, o que significa que a tradição de que filha mulher só pode sair
de casa casada com alguém da mesma nacionalidade e com caráter aprovado, é levada muito a
sério.
Nem a porcaria de uma faculdade, eu posso fazer!
Enquanto eu passo meu cartão-chave no painel do elevador, sinto meu celular vibrar. Suspirando,
puxo novamente do bolso e vejo uma mensagem de Mattia. Automaticamente, um sorriso se arrasta
pelo meu rosto e meu peito se enche de esperança.
Mattia: Não se preocupe, cuore. Vamos dar um jeito nisso.
•••
O avião particular que foi me buscar à mando de Pedro Rodrigues pousou em Miami pouco mais
do meio-dia.
Eu estou com o estômago apertado de tanta fome, mas neguei todas as vezes que as aeromoças
americanas de pernas longas, quiseram me oferecer algo para comer. Eu estou com raiva dos meus
país por eles terem em enviado para cá e também por terem confiscado meu celular, para que eu não
entrasse em contato com Mattia.
Seguro firme na alça da minha mochila quando desço os degraus da escada. Rapidamente, sou
envolvida pelo sol de Miami. Minha pele pinica com os raios solares e eu me lembro de que preciso
de um protetor solar, mas, nesse momento, apenas fecho os olhos, parando no meio da escada, só
para apreciar. Nos últimos meses, eu sequer vi o sol lá em Verona. As chuvas são constantes, com
máxima de 4°. Eu odeio estar aqui, mas eu amo o sol. Com toda a chuva, eu nem posso nadar um
pouco porque as águas estão congeladas.
— Você consegue terminar de descer ou está tendo um ataque aí?
Abro os olhos, logo procurando quem falou comigo e encontro um cara, que deve ter mais ou
menos uns quatro anos a mais que eu. Olho-o com cuidado e em silêncio. Ele é o tal de Pedro
Rodrigues?
Eu nunca o vi pessoalmente, porque as reuniões com o meu pai eram particulares e ele nunca foi
até Verona; eles sempre se encontravam em Roma ou Milão. Tampouco me interessei em procurar
sobre ele na internet, mas já ouvi falar sobre o grande Bilionário, dono de uma das redes de hotéis
mais luxuosas do mundo. As pessoas (mulheres) dizem que ele é muito bonito. Moreno, alto, um
pecado para os olhos...
Inclino levemente a cabeça, meus olhos sobre a figura do homem que acabou de falar comigo.
Moreno, alto, um pecado...
É, ele é bem bonito mesmo. Mesmo sob a calça jeans e a camisa preta, que agarra bem seus braços
fortes, pode se ver que seu corpo é definido, mas magro, como um nadador. Seus cabelos pretos são
curtos embaixo, mas um pouco comprido em cima, deixando algumas mexas rebeldes caindo em seu
rosto. Ele tem um óculos escuro arrastado para o topo da cabeça e um sorriso de cafajeste repuxando
seus lábios.
— Então? — ele abre os braços, ainda sorrindo. — Vai descer e vir comigo ou vai continuar aí, me
comendo com os olhos?
Meu olhar se estreita e eu logo decido que não gosto dele. Arrogante demais para o meu gosto.
Desço os últimos degraus e ando até parar em sua frente.
Ele é alguns bons centímetros mais alto, então preciso inclinar meu queixo para olhar em seu
rosto. Continuo em silêncio.
— Você fala? — ele pergunta.
Pressiono meus lábios juntos. Eu nem tinha tido a ideia de me manter em silêncio até agora. É uma
boa ideia. Talvez assim, ele canse e me mande de volta.
Ele sorri mais.
— Ok, então, mudinha. — Ele acena com a cabeça para que eu o siga, e eu faço. Quando
chegamos diante de um carro esportivo de dois lugares, que parecia bem caro, ele vai direto para
porta do motorista.
Eu fico parada, minhas mãos apertando a alça da mochila, enquanto observo ele.
Ele não vai abrir a porta do carro para mim?
— Não vai entrar? — ele pergunta.
Eu apenas pisco.
Ele acena para o avião.
— Já pedi para entregarem suas malas lá, não se preocupe.
Continuo parada.
Ele fica alguns segundos me encarando, esperando-me responder alguma coisa ou me mover, mas
quando ver que eu não vou fazer nada disso, ele me choca ao simplesmente dar de ombros e entrar no
carro.
Meu queixo cai. Ele vai sem mim?
O idiota liga o carro.
É, ele vai sem mim.
Corro para porta do passageiro, abro e me sento, fechando a porta com toda raiva que eu consigo
reunir.
Ele é tão idiota assim mesmo? Que homem não abre a porta para uma dama?
Escuto ele rir baixinho e cerro as mãos em punhos.
— Cinto, por favor. — ele pede.
Sem olhar para cara dele, puxo o cinto e o coloco. Com minha visão periférica, vejo-o anuindo.
— Aliás — ele diz antes de dar partida. —, sou Rafael, irmão mais novo do Pedro.
Por algum motivo, o alívio se estendeu pelo meu corpo. Gostei de saber que o pequeno idiota não
era o homem com quem estava destinada a passar meus próximos dias ou acabaria matando-o. Mas
também estou com um pouco de medo e ansiedade. Se o irmão é assim, ele pode ser bem pior, certo?
Chegamos em um hotel idêntico ao que eu vivo na Itália e eu desci do carro, carregando minha
mochila junto.
Rafael saiu também, como se fosse uma celebridade sendo fotografada, e joga a chave para um
manobrista.
— Aqui, vamos. — Ele aponta para a entrada luxuosa do hotel, e eu vou bem atrás dele.
Na viagem até aqui, que durou pouco mais de vinte minutos, eu não disse uma palavra e ele
também não tentou mais puxar assunto. Me senti um pouco culpada por estar fazendo greve de fala,
mas bem, ninguém pensou em mim ou no que eu achava quando me mandaram para cá.
Rafael cumprimenta alguns funcionários no caminho. Não passa despercebido por mim a forma
como as mulheres derretem quando ele abre seu sorriso para elas.
Reviro os olhos internamente e admiro o quanto também é idêntico no interior ao que eu moro. Eu
não acredito, no entanto, que me sentirei em casa, estando tão longe das pessoas que eu gosto.
Como Mattia, por exemplo.
Obviamente, como um dos donos do lugar, Rafael passa direto para os elevadores, retira um
cartão-chave e passa no elevador privado. Dentro da caixa de aço, eu permaneço do lado oposto dele,
sem olhar e sem abrir minha boca, mas posso senti-lo me observar com curiosidade e, após alguns
segundos, o elevador se abre na suíte presidencial.
Como todo o resto, é igual ao hotel de Verona.
Segurando minha bolsa pela alça, sou a primeira a sair do elevador e caminho direto para o sofá de
couro branco, onde me sento, mantendo meus olhos em um ponto à minha frente.
— Você já deve conhecer tudo, certo? — Rafael pergunta, de pé, ao lado do sofá.
Ergo queixo para encara-lo.
Ele arqueia uma sobrancelha em questão, mas não recebe uma resposta de mim. Então, ele suspira
sem paciência.
Quase sorrio. Se o irmão dele também tem essa falta de paciência, não vou demorar muito aqui.
— Você mora em um hotel, pelo que sei, então conhece. — ele diz, cerrando os dentes. — Ok,
foda-se!
Meus olhos se arregalam com as palavras dele. Ninguém nunca me mandou... Deixo o queixo cair,
surpresa, as lágrimas começando a querer se acumular nos meus olhos, por isso, desvio o olhar dele
para que ele não veja.
Quem ele pensa que é?
— Eu apenas fiz o que meu irmão pediu: te trouxe para cá. — ele diz, indo em direção ao frigobar
adaptado. Ele abre e pega uma cerveja de lá. — Tem água e refrigerante aqui e pode pedir qualquer
merda que quiser comer, mas não vou ficar insistindo. Não sou babá de menina mimada. — dito isso,
ele abre sua cerveja com os dentes e vai para a varanda.
Daqui de dentro, posso vê-lo esticar a coluna antes de se sentar em uma espreguiçadeira. Idiota.
Leva um tempo até o momento que eu saio do choque e me levanto, levando minha bolsa junto
quando vou para o quarto. De repente, me sinto cansada. Meu corpo reclama em todos os lugares.
Não dormi em nenhum momento nas doze horas de voo até aqui. Olho para a cama gigante e minha
mente é atraída para lá. Abandono minha mochila no chão e me apoio na parede para poder empurrar
meu tênis para fora do meu pé. Sem me importar se Rafael está logo ali e que eu não o conheço o
suficiente para saber se ele vai ou não me fazer algum mal, eu subo engatinhando na cama e deito no
travesseiro.
Mais tarde, quando acordar, eu daria um jeito de ligar para Mattia e dizer onde estou.
•••
Um barulho soa longe e eu aperto meus olhos fechados. Tento adivinhar o que é, sem precisar
acordar de verdade.
Primeiro, lembro onde estou. Não estou em casa; estou na suíte de um cara desconhecido, que eu
nem sequer conheço ainda. Isso me faz abrir os olhos abruptamente. Está escuro em relação a como
estava quando deitei para descansar. Sinto minha cabeça doer, como se estivesse carregando uma
tonelada sobre ela.
Outro barulho — dessa vez, mais perto. Talvez porque agora estou acordada o suficiente para
ouvir as coisas com clareza. Algo cai com um baque suave na cama, ao meu lado e eu pulo sentada,
assustada. Engulo em seco, meu peito subindo e descendo com rapidez, minhas mãos apoiadas no
colchão, atrás do meu corpo, enquanto meu pescoço gira à procura de que é. Encontro uma blusa
branca social ao meu lado, daí finalmente ergo os olhos e encontro quem a colocou ali.
Um homem — que não é Rafael — está parado ao lado da cama, sem camisa e com o cinto aberto.
Meu coração acelera e um grito fica preso em minha garganta quando olho seu rosto e, mesmo na
pouca luz, consigo notar os traços parecidos com os de Rafael.
Será que ele é o Pedro Rodrigues?
Enquanto se livra do relógio, ele olha para mim.
— Não se preocupe, eu sou Pedro. — ele esclarece.
Eu assinto devagar, ainda um pouco assustada.
— Meu irmão disse que você não fala. — ele diz calmamente, enquanto coloca seu relógio, com
cuidado, sobre a mesinha de cabeceira. — Mas, falei com seu pai e ele me disse que você sabe falar
muito bem.
Ele está falando, mas não sou capaz de assimilar muito. Rafael era muito bonito, mas esse cara era
tudo o que ouvi as mulheres falarem. Os meus olhos estão focados no seu abdômen. Dio Santo, é
como estar olhando para uma escultura de um deus. Ao contrário do seu irmão mais novo, que tem
músculos magros como de um nadador, ele tem músculos bonitos e definidos. Quer dizer, tenho
certeza que Rafael também tem um abdômen lindo, mas, caramba, eu apenas queria me arrastar até a
beira da cama e arrastar meus dedos pelos gominhos perfeitos dele. Sua pele é bronzeada. Uma
tatuagem está bem acima do seu peito direito, outra escrita em seu braço esquerdo e algumas
espalhadas pelos seus dedos e dorso da mão, mas não consigo entender o que é nenhuma delas.
— Giulia?
Eu pisco meus olhos para longe do seu abdômen e sinto meu rosto queimar com o
constrangimento. Por que eu estava babando em seu corpo? Encaro os olhos escuros.
— Você vai falar comigo ou vai continuar muda?
Dio, ele é mesmo lindo de rosto.
Balanço a cabeça devagar.
— Isso é um não de não vou falar ou de não vou continuar muda?
Franzo o cenho.
Por que ele está sendo gentil comigo? Seu irmão perdeu logo a paciência e mandou eu me foder.
Umedeço meus lábios com a ponta da língua.
— Não de não vou continuar muda. — finalmente falo. Ficar calada, obviamente, não funcionou
com ele, então, terei que tentar outra estratégia.
Mas a questão é: qual?
Eu nunca falei com ele, é o nosso primeiro encontro e eu não tenho nem um celular para me
conectar com Mattia. Eu tenho que ser esperta e esperar, ir com calma. Nada vai dar certo se eu for
com muita sede ao pote.
Pedro anui com firmeza, vai até uma porta que leva à um closet e entra, pegando uma camisa preta
de lá. Levando-a para cima, ela puxa ela sobre sua cabeça e cobre seu abdômen tanquinho. Eu vejo
tudo do lugar onde estou, babando. De cabeça baixa, ele retira o cinto da calça e inclina só um pouco
para me olhar. Seus olhos se estreitam por uns segundos ao ver que está sendo observado, então ele
se move, sumindo de vista, até que reaparece vestindo uma calça moletom que recai bem em seus
quadris estreitos.
— Ótimo. — ele diz, me olhando. — Rafael contou que você não comeu nada, e Leisa também
disse que você se negou a comer no avião. Está com fome?
— Quem é Leisa? — pergunto. Jogando as pernas para fora da cama, eu me levanto, sentindo-me
um pouco envergonhada.
Isso é tão ridículo. Eu nunca senti vergonha de conversar com ninguém, nem com Mattia isso
aconteceu.
Talvez seja porque estou em território desconhecido, com um cara lindo e desconhecido. Não
existe maneiras rápidas de voltar para casa. Eu nem conheço a merda dessa cidade!
— Uma das aeromoças que veio com você. — Pedro respondeu, arrancando-me dos meus
devaneios.
Eu olho para ele.
— Hum.
— Então?
Sacudo a cabeça.
— O quê?
Sua sobrancelha se arqueia.
— Fome?
Levo um momento para responder. Não por não querer responder, mas porque tenho que pensar se
realmente estou com fome. Foram doze horas de voo até aqui e mais umas quatro horas de dono, ou
seja, dezesseis horas sem comer. Eu ainda estou com muita raiva, mas morrer de fome não vai mudar
a opinião do meu pai.
Anuí, começando a sentir meu estômago doendo.
— Estou morrendo.
Pedro caminha até o criado-mudo, do outro lado da cama, retira o telefone do gancho e aperta o
número um. Ele leva o telefone à orelha e rapidamente é atendido.
— Mande subir o jantar para meu quarto. — ele escuta por um instante. — Tudo que tiverem. —
em seguida, desliga e me encara. — Suas malas chegaram, se quiser tomar um banho por enquanto
que eles não sobem, fique à vontade. — Ele sinaliza para um canto do quarto, onde minhas malas
estavam reunidas e eu nem tinha notado. Sem falar mais comigo, Pedro pega sua camisa que está
sobre a cama e a dobra, sumindo com ela dentro do banheiro, por uns segundos.
Só quando o banheiro esvazia, eu vou e me tranco lá. Dormi tantas horas e ainda consigo sentir
meu corpo exausto. Pego meu reflexo no espelho sobre a pia e fico chocada com o que vejo. Há fios
de cabelo para todo lado, como um redemoinho sobre minha cabeça. Em meu rosto, há marcas do
travesseiro e as maçãs do meu rosto estão avermelhadas. Minha roupa está toda amassada e eu faço
uma careta para minha imagem horrível.
Eu sempre amei me cuidar e agora parecia que fui atropelada por um caminhão.
Com um suspiro, ergo as mãos e começo a juntar meus cabelos no topo da cabeça, enrolando-os
em um coque e prendendo com a liga que eu mantenho envolta do meu pulso. Feito isso, começo a
tirar minha roupa. Eu preciso de um longo banho relaxante para me ajudar a pensar no que vou fazer
para conseguir me comunicar com Mattia.
De sutiã e calcinha, dou a volta no enorme banheiro, que conheço bem por também ser igual ao da
suíte em que vivo em Verona. Encontro o armário com toalhas e roupões e puxo um roupão para me
cobrir. Esqueci de pegar as coisas que preciso na minha mala, portanto, precisarei voltar até o quarto
para pegar.
Giro a maçaneta com cuidado, então coloco a cabeça para fora, me certificando que Pedro
Rodrigues não está por perto. Quando noto sua ausência no meu campo de visão, vou na ponta dos
pés até minha mala de mão, que está sobre a mala grande. Volto correndo para o banheiro e tranco a
porta.
Eu não confio nesse homem e odeio muito meu pai por me colocar sob os cuidados dele.
•••
Uma coisa que me pegou desprevenida foi o fato de que Miami faz um calor dos infernos.
Claro, eu tinha ideia que era uma cidade de praias e tudo o mais, mas nunca que imaginaria ser tão
quente. Verona era um pouco mais frio, com isso, eu tinha roupas de frio. Nada na minha mala era
compatível com essa cidade e essa temperatura.
Sem saber o que fazer com minhas roupas e querendo gritar com o mundo, eu peguei um vestido
que minha mãe comprou, que era longo com alças quadradas, na cor amarela e pequenas florezinhas
marrons espalhadas por todo ele. Era a peça mais verão que eu tinha trazido.
Depois de vestida e perfumada, soltei meu cabelo, deixando-a cair em longos fios grossos em
minhas costas, e saí do quarto. Caminhei descalça pelo chão frio devido a temperatura da suíte, até
alcançar a varanda, onde encontrei os dois homens mais bonitos que já vi em toda minha vida.
Rafael, o mais novo, está de pé, com o quadril empurrado contra o parapeito e braços cruzados,
enquanto Pedro, o mais velho, está elegantemente sentado em uma das cadeiras ao redor da mesa. Ele
tinha o tornozelo direito sobre o joelho esquerdo e um iPad na mão, tão concentrado em alguma coisa
nele, que nem levantou a cabeça quando cheguei. Pelo cabelo molhado e a roupa nova que usava —
uma camisa de mangas curtas preta e uma calça jeans branca —, ele havia tomado um banho
enquanto eu tomava o meu.
Ao mesmo tempo em que ele nem ligava para minha presença, seu irmão abriu um sorrisinho
safado para mim, um que dizia claramente que ele estava sendo debochado. Idiota.
Meu pai passou minha vida inteira tentando evitar que eu
Sentiram a ironia?
ficasse só perto dos homens e para evitar um, ele me manda para ficar sob
os cuidados de dois.
Enviando ao pequeno idiota uma expressão fechada, sentei-me na cadeira que estava livre. A mesa
diante de mim estava farta, com comidas de vários tipos. A vista era perfeita, direto para a praia, o
que facilitava o calor já que os ventos do entardecer conseguiam faze-lo desaparecer um pouco.
— Certo, vamos lá. — Comecei a falar, e isso arrancou um grunhido surpresa de Rafael.
— Ih, tinha razão, mano, ela fala. — ele comentou, escárnio jorrando de seu tom.
Cerrei as pálpebras para ele, no entanto, ele era cínico demais para se abalar. Balancei a cabeça,
vendo que não valia a pena. Meu alvo aqui era seu irmão, não ele. Voltei a olhar para o homem do
meu lado, que nem se moveu.
— Pedro, eu sei que meu pai deve ter mandado uma lista de regras para você sobre o que eu posso
ou não fazer, mas acontece que eu não sou uma criança, está bem? Tenho dezenove anos e com isso,
tenho o direito de fazer da minha vida o que eu quiser.
Quando terminei de falar, fiquei encarando-o por uns 20 segundos até perceber que ele não estava
prestando atenção ou apenas não queria conversar. Isso me deixou incomodada. Apoiando as mãos
sobre a mesa, me inclinei um pouco e questionei:
— Você me ouviu?
Lentamente, como se não estivéssemos discutindo sobre minha vida aqui, ele ergueu a cabeça e
seus olhos escuros chegaram nos meus. Sua expressão era de uma surpresa genuína, como se não
esperasse pela minha pergunta.
— Desculpe, era para eu rebater seu aviso?
— Estou tentando conversar com você. Sei que não nos conhecemos, mas é educado responder
durante uma conversa.
— Ah, você aprendeu isso enquanto dormia agora? — E lá estava, o deboche do Rodrigues mais
novo.
Fechei os olhos ligeiramente, cerrando os dentes na tentativa de não cair na dele e tentar focar
apenas no seu irmão. Quando voltei a abrir os olhos, Pedro ainda me encarava com uma sobrancelha
erguida, esperando que eu falasse.
— Por favor — implorei, meu tom de voz falsamente calmo quando tudo que eu queria era gritar.
—, diga-me que entendeu o que eu disse.
— Sim. — Ele anuiu com firmeza. — Você fala inglês muito bem, Giulia.
Bufei.
— E qual seu ponto de vista no que eu falei? — Eu estava esperançosa, admito. Estar longe da
supervisão dos meus pais pela primeira vez, me deixava com um gostinho de liberdade que nunca
tive. Saber que eu posso respirar, sair e viver sem eles nos meus pés, ditando as regras idiotas e sem
noção da família, me deixava muito animada.
Com um movimento desleixado, Pedro acenou para a mesa.
— O meu ponto de vista é que você ainda não tocou na comida. — disse ele com uma elegância
invejável e uma paciência chata. — Coma!
Sacudi a cabeça, ficando irritada com toda essa serenidade que ele exala.
— Não estou com fome. E não estou falando disso, você sabe.
— Giulia, eu não vou contra o seu pai. — ele deixou claro. — Ele falou qual eram suas regras e eu
as seguirei, nada além disso. Você ficará aqui pelo tempo que precisar, mas não permitirei que me
faça bater de frente com um sócio meu. Agora coma porque ainda não comeu nada e havia dito que
estava com fome.
Dito isso, ele voltou para seu iPad, me ignorando completamente de novo. Eu senti meu sangue
ferver com o ódio que estava sentindo com toda a situação. Eu sabia que precisava resolver isso o
mais rápido possível para poder entrar em contato com Mattia, mas não fazia ideia de como fazer isso
ainda. Foi preciso levar tudo de mim para não acabar gritando quando perguntei:
— Posso ter pelo menos um celular ou um computador? Sei lá, acho justo já que vai me manter
presa aqui dentro!
— Vou providenciar. — ele diz, sem levantar a cabeça.
Suspiro, um pouco menos irritada. Pelo menos isso. Olhei para Rafael, que me encarava de olhos
apertados, como se estivesse lendo bem as engrenagens na minha cabeça.
— Coma, Giulia! — Sua voz rouca penetrou minha espinha em forma de arrepio.
Mas como a teimosia faz parte da minha vida, eu só me levantei e disse:
— Ho perso l’appetito. — E me retirei, voltando para o quarto.
Estava ansiosa para receber um celular para poder falar com meu namorado.
Muito ansiosa.
— Tem certeza que vai dar um celular pra ela? — Rafael questionou ao depositar a sacola de uma
loja de eletrônicos. Ele não confiava na garota, e eu não tirava sua razão.
Havia algo sobre essa menina que me deixou intrigado. Algo sobre sua relação com os pais, na
forma que ela age. Aparentemente é uma garota durona, que não gosta de abaixar a cabeça, no
entanto, Rafael me contou como ela ficou abalada quando ele xingou perto ou quando ele agiu como
ele mesmo, não ligando para nada, tampouco para a birra que ela estava fazendo.
Meu irmão mais novo, ao contrário de mim, não tem um pingo de paciência. Ele odeia qualquer
tipo de drama. É do tipo que explode e joga tudo para cima quando não aguenta mais. E só foi
preciso um tempinho com Giulia Russo para ele decidir que não é fã dela.
— Ela só tem dezenove anos. — disse, enquanto prendia meu Omega no pulso. — Garotas da
idade dela precisam de um.
— Acho que no caso dela está mais precisando de um livro. — ele zombou. — Sei lá, uma bíblia
seria o ideal.
Eu acabei sorrindo.
Mais uma coisa sobre meu irmão: ele é o típico palhaço da turma. Ele herdou o temperamento da
minha mãe e o humor do meu pai.
— Esqueça a garota e me diga se está tudo certo para você ir à Califórnia amanhã. — Eu mudei de
assunto, porque não ia discutir com ele sobre Giulia.
Com as mãos enfiadas nos bolsos, ele empurrou seu quadril contra a porta da varanda.
— Claro. Devo estar lá depois das nove da manhã, o que é tranquilo já que a reunião é às onze.
— Certo. — Eu pego a carteira, enfiando-a em meu bolso, bem no momento em que Giulia invade
o local.
Ela olha entre nós dois, a expressão fechada como sempre, tentando mostrar o quanto ela é uma
garota durona, quando já está claro que é só fingimento.
— Vai sair? — me perguntou.
— É. — Me movi, pegando a sacola que Rafael trouxe e a entreguei. — Aí está o que pediu.
Os olhos cor de mel de arregalaram quando recebeu o presente. Ela foi logo abrindo, deixando um
sorriso abrir pela primeira vez desde que chegou aqui.
— Nossa! — falou, surpresa. — Pensei que tinha se esquecido.
— Não costumo esquecer da minha palavra. — Enfiei meu próprio celular no bolso, vendo-a
maravilhada com o aparelho em mãos. — E já deixei seu pai sabendo que você está com um celular.
Ela bufou, revirando os olhos. Só quando meu irmão começou a ir em direção à porta, ela parou
para analisar o local, nós dois. Franziu o cenho para mim.
— Você vai demorar?
— Não sei. — respondi. — Mas você pode ficar à vontade. Deve saber como as coisas funcionam
no hotel, então, se quiser comer alguma coisa, basta pedir. Pode descer para piscina externa, caso se
sinta sufocada de ficar aqui dentro.
Ela prendeu o lábio inferior entre os lábios por um momento, ponderando.
— Posso sair?
Estreitei os olhos com o tom malicioso que ela usou para fazer a pergunta.
— Sabe que não.
Novamente, bufou.
— Eu não quero ficar aqui dentro o tempo todo! É chato pra caramba.
— Ordens do seu pai, Giulia.
— E daí? — ela ergueu as mãos, vindo mais para perto de mim. Seu nariz estava empinado, os
olhos segurando os meus. — Babbo está na Itália, não aqui. Me leve com você, seja lá para onde vai.
Prometo que vou fica quieta.
A risada incrédula do meu irmão fez ela enviar um olhar mortal para ele.
Giulia era uns vinte centímetros mais baixa que eu, fazendo com que eu precisasse olhar para
baixo para poder encara-la de volta. Ela me lembrava seu pai. O cabelo ondulado, com certeza, era de
sua mãe, mas todo o resto — olhos, nariz, cor de pele — era de Patrizio. Claro, era uma versão mais
bonita e obviamente feminina.
E ainda tem toda a marra que ela exala e faz questão de demonstrar. O melhor amigo do meu pai
me avisou sobre ela, do que ela era capaz de fazer para desestabilizar uma pessoa. Ela terá que
trabalhar em dobro para me enrolar.
No entanto, não acredito que há algum mal sobre leva-la comigo ao clube. Estaria com um olho
sobre ela o tempo todo.
— Tudo bem. — cedi, deixando-a chocada por um instante. Eu tive a impressão que ela esperava
que eu dissesse o contrário. — Vamos lá, então!
Mesmo um pouco hesitante, ela se dirigiu para o elevador. Estava vestida com uma calça jeans e
uma blusa de mangas curtas ensacada. Os cabelos estavam soltos e pesados em suas costas. Quando
chegou perto do meu irmão, torceu o nariz, e Rafael apenas ergueu uma sobrancelha debochada para
ela, então virou e apertou o botão do elevador.
Nós três descemos juntos. Eu me mantive ocupado, respondendo uns e-mails no meu celular.
Rafael girava a chave de sua Ducati Superleggera V4 enquanto olhava para os números do elevador.
E Giulia, como era seu normal, estava de braços cruzados e de cara fechada. Uma olhada rápida nela
e constatei um biquinho nos seus lábios cheios.
Ao sairmos do hotel, um dos manobristas me entregou a chave do meu carro. Agradeci e acenei
para meu irmão.
— Para onde você vai agora?
Ele deu de ombros de forma desleixada.
— Fiquei de encontrar uma pessoa antes de viajar. — respondeu, montando em sua moto. — Vejo
você outro dia, irmão.
— Me mantenha informado sobre a reunião. — pedi.
Ele me deu um sorrisinho e colocou o capacete. Depois de um aceno de despedida, acelerou,
sumindo do meu campo de vista em questão de segundos.
— Mio Dio! — Giulia exalou. — Ele gosta de adrenalina, não é?
Apertei o controle do carro e as portas se elevaram.
— Faz parte da personalidade dele. — Gesticulei para que ela entrasse no carro e dei a volta pela
frente, sentando no bando do motorista.
Giulia ficou de pé na calçada, as mãos na cintura e o queixo caído, olhando para mim como se não
acreditasse em alguma coisa.
— Não vai entrar? — perguntei.
— Ovviamente! — disse em italiano, soando muito cética. Entrou, sentando-se ao meu lado,
bufando, os braços cruzados com força.
Com um click, as portas se fecharam e eu dei partida. Eu poderia perguntar para ela o motivo de
estar assim, tão chateada, mas não faria. Me meter nos sentimentos de uma adolescente não era algo
que eu gostaria de fazer agora. Eu mal a conhecia!
Bem... paciência.
Se tem algo a incomodando, que arrume uma terapeuta ou simplesmente fale. Não vou perguntar.
Foi comprovado.
Esses homens não são nem um pouco cavalheiros.
A educação passou bem longe desses irmãos Rodrigues.
Qual a dificuldade que eles têm em abrir a porta para uma mulher?
Todas as vezes em que fugi para sair com Mattia, ele sempre abria a porta do carro, pegava na
minha mão e me ajudava a entrar. Até chegou a beijar meu dorso algumas vezes. Estava sempre
sorrindo, atencioso com meu bem-estar. Bellissimo amore mio!
No entanto, esse Pedro era o completo oposto. Ele pode até ser um homem lindo, o tipo que
qualquer mulher ficaria de joelhos com apenas uma palavra dele, mas tudo nele me irrita. A calma, o
jeito de falar, de olhar, a sua paciência... ela me deixa completamente estressada e impaciente.
Talvez porque eu sempre tive pessoas agitadas e ranzinzas ao meu redor e, por isso, a paciência que
esse homem exala é assustadora. Não fazia ideia, mas eu odiava e ponto final.
Como agora, que estamos dentro de seu carro esportivo, e ele está dirigindo calado. Tudo que se
ouve aqui dentro é a batida de uma música instrumental, que está me deixando agoniada. Minhas
pernas não param de se mexer, para cima para baixo, enquanto eu olho para fora da janela,
admirando a beleza dessa cidade tropical.
Na minha cabeça, estava bolando um plano de como ligar para Mattia sem que Pedro veja. Eu
precisava escutar sua voz, saber como ele estava. Estava ansiosa demais por isso, mas não fazia ideia
para onde estávamos indo.
— Para onde estamos indo? — me virei para perguntar e quase tive uma tontura. O homem era
bonito demais, devo confessar, e de óculos escuros ficava de tirar a estabilidade de qualquer pessoa.
— Para o The Caliste Club. — Sem tirar os olhos da estrada, me respondeu.
Já tinha ouvido falar sobre esse clube. Há um lá em Verona e as pessoas mais ricas da cidade
frequentam. Menos meu pai, que tinha aversão a certas coisas.
— O que vamos fazer lá?
— Vou encontrar uns amigos e nós vamos almoçar.
— Hum. Seus amigos frequentam esse clube?
Ele anuiu.
— A maioria, sim.
— O que tem de especial lá?
Pedro me olhou de soslaio, bem rapidamente para não perder o foco. Era óbvio que ele estava
estranhando a conversa, mas fazia parte do meu novo plano: conquistar a confiança dele. Se ele era
paciente demais para conseguir me aturar, eu precisaria dobra-lo de outro jeito.
— Muitas coisas. — ele disse, meneando a cabeça. — Restaurantes, academias, piscinas... É
apenas um lugar onde as pessoas vão para relaxar.
— Um relaxamento bem caro, não é?
Os cantos da boca dele se curvam para baixo ligeiramente.
— Não é um problema para mim, tampouco para as pessoas que frequentam lá.
Anuí, concordando. No mundo em que vivemos — principalmente que ele vive —, não
precisamos nos preocupar se uma coisa é “muito cara” porque nada é caro o suficiente. Não entendo
muito dessas coisas, meu pai tem muito dinheiro de verdade, e apenas cuida das sedes do hotel na
Itália, o que o torna dono de um total de 10% da rede, enquanto os Rodrigues têm a maior parte.
Portanto, se meu pai não tem com o que se preocupar, acredito que o dinheiro na conta bancária de
Pedro pode facilmente comprar a Coca-Cola e a Disney à vista e ainda receber troco.
— Meu pai gosta mais de frequentar clubes de golfe. — eu disse.
— O meu também preferia.
— Você não gosta de golfe?
Ele virou em uma rua, totalmente concentrado e tranquilo. Que ódio eu estava começando a sentir
pela beleza dele!
— Prefiro esportes mais pesados, agressivos.
— Deixe-me adivinhar — bati meu dedo indicador contra o queixo, fingindo pensar. — futebol
americano?
— É um deles. — ele concorda, balançando a cabeça para cima e para baixo. — Mas também
curto futebol normal, basquete, hóquei.
— Beisebol? — inquiri, irônica. Bufei, revirando os olhos. — Homens e seus gostos óbvios.
O comentário chamou sua atenção e ele virou me olhar quando estacionou.
— Você não pode falar sobre isso quando está claro que você é uma bailarina.
Ok. Isso me deixou surpresa. Remexendo-me no banco, fiquei de frente para ele, ignorando
totalmente a presença de um rapaz, um manobrista, muito bem vestido em um uniforme vinho, do
lado de fora, pronto para receber a chave do carro de Pedro.
— Como sabe disso?
Claro, tinha a opção de que meu pai poderia ter contado para ele, mas a forma confiante como ele
falou me deixou intrigada.
A mansidão de seus olhos negros quando encararam os meus, realmente me deixaram irada.
Respirei fundo para poder ouvir sua resposta:
— Sua postura quando anda ou senta. — Ele acenou entre meu corpo e o banco. — Todo gesto
que você faz, mesmo quando está querendo dar uma de durona, mostra a graciosidade de uma
bailarina. E você anda na ponta dos pés.
— Uh, nossa! — Impressionada, percebi que as palavras sumiram em algum momento na saída da
minha boca. Ninguém nunca tinha me dito isso. As pessoas só sabiam que eu fazia balé quando eu
contava. — Conhece alguma bailarina?
Ele meneou a cabeça, sem muita intenção de continuar a conversa.
— Algumas.
Nós saímos do carro e ele jogou a chave para o rapaz, então me guiou para dentro de uma mansão
de vidro.
O lugar era enorme e muito luxuoso. Logo no hall de entrada, tudo gritava uma explicação do
porquê era tão caro frequentar.
Pedro parou na recepção, e não foi difícil ver o brilho nos olhos das duas mulheres, uma loira e
outra morena, que estavam ali para recebe-lo.
— Essa é Giulia Russo. — ele me apresentou. — Ela vai entrar comigo hoje.
— Claro, senhor Rodrigues! — a loira concordou quase que no mesmo instante.
Eu tinha a impressão que ela precisava registrar meu nome ou algo do tipo, mas estava tão
hipnotizada pelo homem de 1,90 metros diante dela, que nem sequer moveu um músculo para fazer
isso.
Patético.
Retirando os óculos, Pedro o pendurou na gola de sua camisa quando estávamos entrando em uma
área coberta, muito parecida com aquelas praças de alimentações que há em shoppings.
Haviam muitas pessoas, para todo lado, conversando, sorrindo, exalando dinheiro. Uma olhada ao
redor me deixou de queixo caído. Como Pedro havia me dito, tinha restaurantes, academia, um
espaço de jardins... Mais adiante, eu podia ver quadras de tênis, piscinas e muito mais.
Segui o homem até a parte externa, onde entramos em uma espécie de cafeteria que ficava de
frente para a área de piscinas, bem ao lado de uma quadra de tênis. Nos aproximamos de uma mesa
onde dois homens estavam sentados, ambos elegantes e muito bonitos, por sinal. Eles se levantaram
assim que nos viram.
— Não acreditei quando Ryle me disse que você estava em Miami. — Pedro comentou, com um
largo sorriso, batendo sua mão na do outro homem grande, juntamente com batidinhas nas costas. O
típico cumprimento masculino.
— Londres não é tão bom quanto aqui, todo mundo sabe disso. — O homem também estava rindo.
Ele era branco, com corte de cabelo baixo dos lados e um pouco mais alto em cima. Assim como o
outro cara que Pedro estava cumprimentando agora, era muito lindo e com os braços cheios de
tatuagens.
Só quando os cumprimentos acabam que Pedro acena para mim:
— Essa é Giulia Russo, filha do Patrizio. — Então ele faz o mesmo comigo, acenando para cada
um dos homens quando os apresenta. Primeiro, apontou para o que estava em Londres: — Esse é
Titus Caliste e esse — apontou para o outro — Ryle Christ.
Cerrrrto! Ainda bem que meu pai tem muito dinheiro, porque juro que vou precisar de uma
plástica no queixo de tanto que ele cai com as coisas aqui.
— Ryle Christ como o dono da Fontaine? — Pisquei atordoada quando ele me ofereceu um sorriso
amarelo. É claro que era ele! Apesar do fato de que eu evito o máximo ver páginas e blogs de fofoca
e celebridades, eu já tinha visto uma foto dele com sua esposa antes. — Uau, grande! — Eu olhei
para Titus agora. — Seu nome está na entrada do clube. Coincidência?
Ele sorriu, balançando a cabeça numa negativa. Então estendeu a mão para apertar a minha.
— Na verdade, eu o coloquei lá. Achei que ficaria bonito.
— Você é o dono!?
Ele piscou.
— O próprio.
— Sorprendente!
E era muito surpreendente. Ele não deveria ter muito mais que trinta anos e já era dono de um
negócio como esse. Lá na Itália, as pessoas comentam sobre os preços e eu já ouvi dizer que para ser
sócio desse clube tem que pagar um total de 25 mil por mês, e esse é apenas o pacote mais simples.
Se você quer ter direito a todas as áreas do clube, é muito mais que o dobro. Mattia chegou a falar
comigo uma vez sobre isso, já que seu pai é um sócio.
E falando em Mattia, eu precisava ligar para ele, mas não podia fazer isso perto de Pedro. Quando
os três homens se sentaram em volta da mesa do Café, eu troquei meu peso de perna, tentando me
manter o mais neutra possível, para não me entregar.
— Tudo bem se eu der uma volta para conhecer o clube? — Olhei diretamente para Pedro ao
perguntar.
Como sempre, claramente desconfiado, ele fixou os olhos em mim, estudando meu rosto, minha
expressão e, por fim, ele anuiu devagar.
— Tudo bem.
Ofereci um sorriso doce para eles e, com um movimento de cabeça em despedida, disse:
— A presto.
O clube é gigante.
Andei bastante até chegar em um lugar mais “tranquilo” e que é o mais longe possível da área em
que Pedro estava com seus amigos.
Era uma outra área aberta, com piscinas e espreguiçadeiras. Ao contrário da outra, essa estava
quase vazia, com exceção de duas mulheres, que estavam tomando sol e conversando.
Sentei-me na espreguiçadeira mais afastada, para que eu pudesse ter um pouco de privacidade.
Então peguei meu celular novo, fechando os olhos com tranquilidade, recordando do número de
Mattia que eu havia decorado, porque sabia que não podia salvá-lo em lugar nenhum para o meu pai
não ver. Ao lembrar, digitei e levei o aparelho ao ouvido, meu coração acelerado em antecipação,
ciente que a voz que atenderia era do amor da minha vida.
— Ciao. — a voz suave e perfeita soou em meu ouvido, arrancando de mim um suspiro cheio de
lamento de saudade.
— Mattia, amore mio, sou eu, Giulia!
— Giulia? — Eu podia escutar o sorriso em sua voz. — Mia passione! Como é bom ouvir sua voz.
Estava morrendo de saudades de você, e muito preocupado. Você não me deu notícias como
combinamos.
— Desculpe. Eu estou com um sócio do meu pai, que faz tudo o que ele manda. Ele só me deu um
celular hoje, então não tinha como falar com você quando cheguei.
— Aonde você está, passione?
— Miami. — Eu fiz uma careta. — Acredita nisso? Aqui parece um inferno de tão quente!
— Não se preocupe, irei amanhã mesmo para Miami! — ele me garantiu, a voz cheia de carinho,
como sempre. — Só tente ficar calma e não foda com tudo, tutto bene? Seja legal com o sócio do teu
babbo e nós combinaremos direitinho para nos encontrar aí.
Eu me derreti inteira com um sorriso bobo, mas meus olhos estavam sempre na entrada da área,
para me certificar de que Pedro não iria chegar e me pegar no flagra.
— Você vem mesmo?
— Irei para onde você estiver, passione! Mas agora preciso desligar para resolver umas coisas
antes de ir. — ele diz. — Per favore, nunca se esqueça que eu ti amo tantissimo!
— Ti amo anch’io.
Ao desligar, meus ombros caíram por saber que estava tão longe dele. Tudo não podia ser mais
fácil? Meu pai não podia simplesmente me deixar ficar com Mattia, já que ele faz tanta questão que
eu me case com um italiano legítimo?
Eu sabia que era muito errado, mas odiava meu babbo por isso. Tudo que ele está fazendo só me
deixa infeliz cada vez mais. É por isso que eu não irei pensar duas vezes quando Mattia disser que
podemos fugir. Ele só tem que resolver algumas coisas com seu pai, por conta de dinheiro e tudo o
mais.
Agora muito feliz por ter, finalmente, falado com o meu amor, eu me permito abrir um sorriso
grande e aliviado. Faria qualquer coisa para ir vê-lo amanhã, quando ele chegasse em Miami. Quero
abraça-lo, beija-lo e, quem sabe, pela primeira vez, fazer amor com ele!
Sem conseguir para de sorrir, digitei uma mensagem de texto para ele:
Non vedo l'ora di vederti, amore.
(Mal posso esperar para te ver, amor.)
•••
De volta à área em que Pedro e seus amigos se encontram, notei agora uma mulher sentada com
eles. Era uma mulher linda, com longos cabelos dourados presos em um rabo de cavalo, vestida com
um conjuntinho de jogadora de tênis e óculos escuro de aros brancos puxados para o alto de sua
cabeça. Suas pernas longas e bonitas estavam cruzadas e uma mão com unhas muito bem-feitas
estava pousava no braço de Pedro enquanto ela ria de alguma coisa que estavam conversando.
Eu me aproximei, ficando bem no meio de suas cadeiras, com um sorriso forçado nos lábios.
Ignorei os dois e foquei em Titus:
— Seu clube é belíssimo! Da próxima vez que eu vier com Pedro, estarei com uma roupa de banho
apropriada para aproveitar todas essas piscinas.
— Fico feliz que tenha gostado. Espero que aproveite bastante. — o homem diz, em seu sotaque
britânico e educação elegante, muito parecida com a de Pedro, no entanto, ele exalava uma
personalidade forte, meio rebelde.
Seu outro amigo, o dono da marca de sandálias de luxo, Fontaine, apenas observava, sem dar
muita importância, com um jeito frio e marcante.
A mulher olhou para cima, seus olhos azuis me pegando, depois se voltou para meu “tutor”.
— Ela veio com você? — perguntou, soando curiosa. — Não me contou que tinha uma irmã além
do Rafa.
Ah, fala sério!
— Sou só eu e Rafael. — ele responde, a voz séria como sempre. — Essa é Giulia Russo, filha de
um sócio meu. Ela veio passar umas férias em Miami.
— Ah. — Finalmente, ela se levantou, só para comprovar minha observação de pernas longas,
ficando muito mais alta que eu, estendeu a mão com um sorriso simpático nos lábios rosados. — Oi,
querida. Sou Margot Montana, amiga do Pedro.
Ela parecia muito amável e seu sorriso e apresentação pareciam sinceros. Ainda chocada com sua
beleza impressionante, aceitei sua mão e tentei o meu máximo para sorrir de volta.
Bene. Eu era bonita e sabia disso. As pessoas costumavam me dizer isso o tempo todo, e, claro, eu
tinha espelhos em casa. Desde pequena, fazia parte da equipe de corrida da escola e sempre adorei
me exercitar. Era uma forma que eu havia encontrado para parar um pouco de pensar em como minha
vida era super controlada pelos meus pais e as regras das famílias tradicionais italianas. E, com isso,
meu corpo ficou muito chamativo. Eu tinha pernas grossas, bunda grande e bem redonda, cintura
fina, zero barriga e meus peitos eram medianos — nem tão grande, nem tão pequenos. Grazie Dio
nunca tive problemas com autoestima.
Pelo menos não até olhar para essa mulher!
Ela não tinha apenas pernas longas, ela parecia uma modelo tirada dos catálogos da Victória’s
Secret. Com exceção, claro, dos seus peitos enormes e bem redondinhos, que mal conseguiam se
esconder dentro da blusa branca. Não fazia ideia se eram naturais ou silicones, só sabia que qualquer
homem ficaria de joelhos por ela.
E eu não duvidava, pela forma que vi ela toca-lo, que Pedro já se aproveitou de tudo isso — ou
ainda aproveita. Olhando bem, os dois dão um belo casal, digno daqueles casais lindos de
Hollywood, que têm bebês lindos também.
Pela primeira vez na minha vida, me senti para baixo em relação a mim, a minha roupa. Sì,
precisava fazer compras com urgência!
Margot se sentou novamente e pediu para que eu me sentasse também. Ela foi legal comigo do
começo ao final, me entrosando na conversa, mas não me passou despercebido que ela fazia questão
de tocar Pedro sempre que podia, ou seja, o tempo todo.
Quando enfim ele decidiu que iriamos voltar para o hotel e se levantou para se despedir de seus
amigos, eu agradeci a todos pela boa recepção e me afastei, alegando dar espaço para que eles se
falassem, mas minha intenção era checar se havia alguma mensagem de Mattia.
E havia:
Presto saremo insieme, mia principessa.
(Estaremos juntos em breve, minha princesa)
Eu me desmanchei em um sorriso, a ansiedade tomando conta de mim, mas logo desfiz o sorriso
bobo quando notei Pedro de aproximando. Precisava tomar cuidado com esse homem, sabia disso.
Ele era observador demais, paciente demais. Pessoas assim são perigosas.
— Nos veremos hoje? — Margot pergunta em meu ouvido quando me inclino para abraça-la em
despedida.
Sorri, beijando seu rosto.
— Estarei esperando por você no nosso quarto do hotel mais tarde.
— Ok, baby. — Ela riu, prendendo o lábio inferior entre os dentes, daquele jeito safado que só ela
sabe fazer para me deixar sacudido e de pau duro.
Não se enganem. Eu podia ter outras mulheres e já fodi com muitas por aí, mas meu
relacionamento com Margot era uma coisa que se encaixava bem com meu estilo de vida.
Nenhum dos dois se iludia, nem esperava nada sério do outro. Temos relações sexuais com outras
pessoas, e até já chegamos a dividir em alguns ménages do caralho. Ela ama sexo mais do que tudo
em sua vida, e eu sigo seu pensamento em relação a isso e nós dois nos damos muito bem na cama...
ou fora dela, não importava. O sexo com Margot era sempre explosivo porque ela sabia como fazer e
o que fazer na hora certa. E, no final, cada um ia para seu lado e seguia a vida.
Após me despedir de todos, virei para sair e não perdi o momento em que Giulia estava rindo toda
boba para o celular. Franzi o cenho quando ela tornou a ficar séria novamente e enfiou o celular de
volta no bolso de trás de sua calça, tentando fingir que nada aconteceu.
Tenho certeza que qualquer outra pessoa cairia em seu pequeno teatro, mas, para seu azar, eu
tenho bom olho para as ações das pessoas ao meu redor. Eu posso não me pronunciar, nem me meter
na vida alheia, mas eu vejo muita coisa que muitas pessoas não conseguem ver.
— Vamos? — Eu perguntei, vendo-a enfiar uma mecha de cabelo atrás da orelha.
— De volta ao hotel?
Anuí, pegando meu óculos-escuro da gola da minha camisa e devolvendo-o para meu rosto.
— Tenho umas coisas para resolver ainda hoje. — Isso foi tudo que eu disse, antes de sair andando
na frente dela.
Dentro do carro, ela cruzou os braços, virando o corpo para me encarar. Estava emburrada, como
já era corriqueiro. Questionou, quase irritada:
— Você tem algum problema em abrir a porta para uma mulher?
Acionei o botão que fechava as portas do carro e pressionei minha digital para ligar o motor.
— Coloque o sinto, por favor, Giulia.
— Não vai responder minha pergunta?
Suspirei, tombando a cabeça meio que de lado, olhando-a através das lentes dos meus óculos.
— Não tenho um problema com isso. — respondi sua pergunta. — Mas e você, tem algum
problema em entrar sozinha?
Ela me olha chocada, de queixo caído.
— Meu pai sempre abre a porta para minha mãe e segura em sua mão para que ela entre em
segurança, sabia? Por mais que eu o odeie agora, sei que ele é um cavalheiro.
— Bom para sua mãe. — Balancei a cabeça, meneando devagar. — Mas eu não sou seu pai e
tenho total consciência que você não é aleijada e não tem nenhuma outra dificuldade que te impeça
de fazer isso sozinha. Agora, podemos ir?
Tenho certeza que, se essa menina pudesse, ela teria me matado com a olhada que ela me deu
nesse instante. Estou morrendo de medo de beiço dela...
— Coloque o sinto, por favor.
Ela puxou o sinto com força, prendendo-o com tanto ódio, que eu juro que, se ela usasse mais um
pouco de sua raiva, quebrava tudo. Resmungou sobre eu ser um ogro e seu beicinho era capaz de
alcançar o vidro do carro.
Sem dar palco para ela, liguei o som e coloquei o carro em movimento, fazendo-a praticamente
voar sobre a pista de tão leve que o motor dele é. Eu sabia que Giulia me daria um pouco de trabalho,
e só estava no segundo dia dela aqui.
Eu precisava juntar toda paciência do mundo agora.
No dia seguinte, acordei mais leve, menos preocupada e assustada. Havia passado a noite sozinha,
já que Pedro disse que dormiria essa noite em outro quarto porque ele tinha trabalho a fazer, então
aproveitei e passei boa parte da noite com Mattia no telefone.
Já passava das nove da manhã, então, muito provavelmente ele já estava em um avião a caminho
da América.
Eu estava tão feliz e ansiosa, que não conseguia parar de sorrir. Olhando-me no espelho do
banheiro, constatei que precisava ficar bonita para quando o encontrar de novo e, para isso, eu
precisava de roupas, sapatos e um novo corte de cabelo. Depois de fazer minha higiene matinal e
trocar meu pijama por uma roupa decente, eu saí do quarto e me encontrei com Pedro, sentado na
cadeira da mesa da varanda, concentrado em seu iPad.
— Preciso fazer compras. — Eu fui logo dizendo, sentando-me para tomar meu café da manhã. —
As minhas roupas são bonitas, mas são muito italianas e nada a ver com Miami. E também preciso ir
à um salão para um corte de cabelo novo. Gosto dos cachos, mas me deixam com cara de menininha.
Pedro ergueu os olhos e analisou meu rosto, meus cabelos, e, enfim, encolheu os ombros antes de
voltar para o que estava fazendo:
— Se você diz.
— Sì. — Eu sirvo meu café em uma xícara sem açúcar e pego uma torrada. Observo o homem
diante de mim, tão sério e tranquilo, que me deixava querendo arrancar os cabelos de frustração.
Hoje ele estava vestido com uma calça jeans e camisa cinza de mangas curtas e, como ontem, ele não
tocou na comida. — Você não come nada? — perguntei.
— Já comi. — diz ele, sem olhar para mim.
Os cantos de minha boca se curvaram para baixo, em uma expressão impressionada.
— Sei que você não é meu pai e tudo o mais, mas nem para me esperar para tomar café da manhã?
Isso faz com que ele levante a cabeça de novo, seus olhos escuros encontrando os meus.
— Eu acordo todos os dias às 4:40 da manhã, faço exercícios, tomo um banho e me sento para
trabalhar. Às 7:00, eu tomo meu café da manhã enquanto leio um livro, e então volto para trabalhar
de novo. Agora já são quase dez da manhã e eu estou revisando alguns contratos. — ele fala tudo isso
com a maior serenidade do mundo. — Tenho hábitos, Giulia. Hábitos esses que não vou abandonar
porque você tem uma coisa estranha com atenção. Se quer tomar café da manhã acompanhada,
acorde cedo. Caso não queira acordar cedo, sempre pode descer e tomar café junto com os outros
hóspedes.
— Sei molto scortese! — resfoleguei, revirando os olhos para ele e me concentrando em meu café.
O idiota nem respondeu ao meu insulto, apenas abaixou a cabeça de volta para seu iPad.
Ridicolo!
Após terminar, fui escovar os dentes enquanto ele encerrava seja lá o que estava fazendo. Quando
voltei, dei uma pausa nos passos ao ouvi-lo no telefone com alguém:
— Ela quer ir comprar roupas novas e cortar o cabelo. — ele, claramente, fala sobre mim. Sua voz
soa cansada, mas nem um pouco raivosa. O homem tem uma paciência de dar inveja a qualquer
pessoa! — É, Rafael, me arrependo de ter te mandado para LA agora!
Com cuidado, espiei no canto da parede que dividia o quarto do resto da suíte e o vi passando a
mão livre pelo cabelo, exasperado, de frente para a vista.
— Tudo bem, vou leva-la. — ele coça a mandíbula, rendido. — Depois me mande o relatório de
como foi a reunião... Tchau. — Desliga e enfia o celular no bolso, então eu saio do meu esconderijo e
abro um sorriso de falsa doçura para ele.
Obviamente, ele estava odiando essa história de ter que ir às compras comigo, mas ia de todo jeito
porque ele não queria uma discussão com meu pai, por ter me deixado sair sozinha.
Enquanto estou sentada no banco do passageiro de seu carro — um novo e mais espaçoso que o
outro —, eu começo a criar formas que usarei para me encontrar com Mattia. Não seria fácil com o
Pedro sendo tão... centrado e observador, mas eu daria um jeito.
Ou não me chamaria Giulia Russo.
Uma coisa de bom eu podia dizer sobre essa cidade: as lojas de roupas
são muito mais legais que as da Itália.
Claro, são culturas diferentes, o que, consequentemente fazem estilos
diferentes, mas eu estava tão apaixonada pela variação de roupas, sapatos e
acessórios que estava pensando seriamente em mudar meu próprio estilo,
mesmo depois que voltar para Itália.
Ou talvez Mattia decida que devemos ir para outro lugar...
Eu estava tão empolgada, que a vendedora da loja em que estávamos
estava muito animada. E eu não poderia dizer isso de Pedro, que estava
sentado em uma poltrona especial para clientes, de cara fechada,
transparecendo o tédio que havia tomado conta dele, enquanto bebia um
copo de água que lhe ofereceram. De primeira, ofereceram café, porém,
segundo ele e sua mania de hábitos e regras, ele não toma café preto depois
do horário de café da manhã. É uma forma saudável de fazer seu corpo
funcionar sem a dependência da cafeína.
Dio mio, ele era tão certinho!...
Eu entrei no provador pela décima vez, com uma roupa diferente pra
experimentar. Era um short cintura alta de alfaiataria branco e um top
cropped rosinha, que ficou uma graça no meu corpo. Sorri para mim mesma
no espelho, satisfeita com o que estava vendo.
As roupas que eu estava acostumada a vestir na Itália era algo mais
chique, elegante, comportado. Meu pai teria um ataque do coração se me
visse vestindo algo assim. No entanto, a cidade de Miami exigia algo mais
verão, com menos tecido e mais sofisticação, eu acho. Pelo menos é o que o
calor e as lojas me dizem.
Decidida, optei por ficar com essa roupa no corpo e saí do provador,
dando de cara com a vendedora sorridente.
— Vou levar tudo! — anunciei, tão animada quando ela acaba de ficar.
Com essas peças de roupas que levaria, ela receberia uma ótima comissão,
já que a loja é extremamente calma.
— Que ótimo! — Ela recolheu todas as roupas, dobrando-as em seu
antebraço. — Essa roupa ficou perfeita em você! — elogiou. — Quer ver
mais algumas coisas? Talvez uns vestidos?
— Não, grazie. — Sacudi a cabeça em negativa. — Não estou
precisando agora.
— Certo. Vou embalar tudo para você, então.
Quando ela saiu, apressada para fazer tudo, eu me voltei para Pedro, que
checava seu telefone. Ao seu lado, outra vendedora só faltava babar em
cima dele e eu não a julgava; ele parecia um peccato de homem. Estava
vestindo algo mais casual, como uma camisa cinza de mangas curtas e gola
V e uma calça jeans folgada. Os óculos escuro ray-ban estavam presos na
gola da camisa e seus cabelos estavam bagunçados porque ele passou o
tempo inteiro passando as mãos nele.
— O que achou? — Como eu gostava de testar sua paciência irritante,
me aproximei, abrindo os braços para sinalizar minha roupa.
Ele tinha seus olhos nos meus e, com toda tranquilidade do mundo,
começou a desce-los. Havia algo lá como o que eu nunca tinha visto antes
nos olhos de um homem, e logo me arrependi de ter provocado. Quando ele
alcançou o cropped, meu peito subiu e desceu com força e pesado. Seu
olhar estava queimando minha pele. Ele continuou descendo, bem devagar,
até que chegou em minhas pernas nuas.
Era a sensação que eu estava agora: como se estivesse despida, sem nada.
E fervendo.
Eu já tinha dado uns amasso com Mattia antes, mas nem ele conseguiu
me deixar do jeito que estou agora: nervosa, tremendo, com vontade de
tomar um banho em uma banheira cheia de gelo.
— Está bonita, Giulia. — Ele falou, com um meneio calmo de cabeça.
Engolindo em seco com muita dificuldade, anuí em forma de
agradecimento, porque estava sem palavras e me afastei quando a mulher
do caixa da loja chegou perto dele com uma maquineta para o pagamento.
O que foi aquilo?
Aproveitei que ele estava distraído, peguei o celular para checar as
mensagens de Mattia. Ainda nada. Ele ainda não deve ter chegado no país.
Eu estava com tanta saudade e tão confusa com tudo que estava
acontecendo na minha vida nesses últimos meses, que meu estômago dá um
nó sempre que paro para pensar.
Enviei uma mensagem antes de voltar para perto de Pedro, pedindo para
que ele me avisasse assim que chegasse e que eu o amava. Depois guardei o
telefone no bolso do meu short novo e voltei para minhas compras.
Após entrar em mais duas lojas de roupas e fazer o amigo do meu pai
carregar todas as sacolas, avistei uma loja da Victoria’s Secret e tenho
certeza que meus olhos brilharam.
— Ah, eu amo as lingeries da VS! — Sorri, puxando-o pelo braço em
direção à loja. — Você sabe, até uma dama adora vestir lingeries lindas e
sexys.
Ele alçou uma sobrancelha.
— Você é uma dama?
Eu fiz uma carranca para ele. Così ridicolo...
— Sou sim. — Ergui o queixo, empinando o nariz. — Você descorda?
Sem me responder logo, Pedro encontrou um sofá na loja e se jogou nele,
deixando todas as sacolas no chão, ao seu lado. Ele colocou seu tornozelo
direito sobre o joelho esquerdo e me olhou de baixo, como na outra loja:
com uma intensidade tenebrosa.
— Eu tenho minhas dúvidas, mas, se você diz, então está bem.
De queixo caído, me segurei para não começar ali uma discussão sobre o
que eu era ou deixava de ser.
— Você sabia que é um ogro, não é?
A forma como ele me olhou, deixou claro que, apesar de toda a paciência
que exercia, ele era, de fato, irmão de Rafael.
— Pois é. Meu apelido na escola era Sherek.
Eu não queria bufar, nem sair batendo pé, então apenas balancei a cabeça
e segui uma vendedora para escolher minhas novas lingeries que ele
pagaria. Logo após escolher várias peças da nova coleção da marca, eu
estava pronta para ir. Nós passamos em umas duas lojas de sapatos e, com
ajuda das vendedoras, escolhi alguns sapatos que combinavam com minhas
roupas novas e com o clima da cidade. Eu sabia que era o efeito Pedro
Rodrigues, mas fiquei surpresa como as mulheres das lojas me receberam
tão bem e foram tão solicitas e legais.
— Agora estou com fome. — Falei para meu querido acompanhante da
cara séria.
— Tem alguma preferência?
— Estou com saudade de uma boa massa.
Ele anuiu.
— Conheço um bom restaurante aqui perto. Só preciso colocar tudo isso
no carro. — ele levantou as sacolas de suas mãos, numa demonstração.
Eu quase deixei meu sorriso aparecer quando vi sua careta por ter que
carregar tantas sacolas. Chegava a ser irônico a cena.
Um dos homens mais lindos e poderosos do mundo, com uma fortuna
que era incapaz de ser contada, estava no meio de uma rua, em pleno
horário de almoço, carregando mais de uma dúzia de sacolas para uma
mulher desconhecida.
Ele andou até seu Range Rover preto-fosco e apertou o botão para abrir
as portas. Jogou tudo no banco de trás, como se estivesse se livrando de
algo ruim, em seguida, moveu os braços, flexionando os ombros com a
boca e o nariz torcido.
Eu não podia ver seus olhos por causa dos óculos, mas sabia que ele não
estava feliz. Porém, o pouco que conhecia de Pedro Rodrigues, deixava
claro que ele não era um homem que deixava transparecer seus sentimentos.
Fechando a porta do carro com uma batida, ele bloqueou as portas e
acenou para o outro lado da rua.
— Vamos lá.
— Não vamos de carro? — questionei.
Ele sacudiu a cabeça.
— É bem perto, não precisa.
Encarei as sandálias de salto que havia escolhido e senti que foi uma
escolha bem errada, mas não disse nada, apenas o segui. Nós caminhamos
dois quarteirões inteiros para poder chegar em um restaurante italiano.
Sorri, animada porque iria comer um prato típico do meu país.
Ao sentarmos em uma mesa no centro do restaurante, sem delongas, pedi
uma lasagna. Pedro concordou e o garçom se foi com um sorriso esticado
nos lábios para fazer nosso pedido.
Sentada bem na frente dele, eu cruzei meus dedos uns nos outros e o
encarei, as sobrancelhas juntas, em uma expressão curiosa. Tomando
coragem, perguntei:
— Por que você é tão paciente assim?
— Aquele que tiver paciência terá o que deseja. — disse ele. —
Benjamin Franklin quem disse. — Ele encolheu os ombros e seus olhos
seguraram os meus, daquele mesmo jeito da loja, causando-me um arrepio
indesejado. — Eu gosto de conseguir o que eu desejo.
Sim. Eu estava entendendo um pouco o motivo das mulheres serem tão
iludidas por ele. Basta um olhar...
Limpei a garganta e aprumei meus ombros, lutando, dando tudo de mim
para não mostrar o quanto ele me afeta. Ele nem deveria me afetar assim!
— E quanto ao seu irmão? Ele não é nada paciente.
Pedro meneou a cabeça, com um leve sorrisinho de lado.
— Rafael tem o mesmo temperamento difícil da minha mãe, mas apesar
de ser muito impaciente, ele é uma ótima pessoa. Você acostuma com o
tempo.
— Se com temperamento difícil você quis dizer idiota e grosseiro, eu
posso garantir que não me acostumo com essas coisas.
— Um idiota e grosseiro muito inteligente. — defendeu o irmão e bebeu
um pouco da água que foi servida antes da comida enquanto me olhava com
aquela tranquilidade invejável.
Meu celular começou a tocar no bolso e eu o tirei de lá, muito rápido,
sem conseguir disfarçar que estava ansiosa por aquilo. As minhas
bochechas foram tingidas de rosa e eu dei um sorriso amarelo para ele:
— Eu estava esperando notícias de uma amiga da Itália. — Inventei uma
desculpa. — Deve ser ela. Se você me dá licença...
— Tudo bem. — Ele anuiu, mas seus olhos estavam cerrados,
observando, desconfiando. Não era apenas seu irmão que era inteligente.
Eu me levantei e, seguindo as orientações, corri para o banheiro feminino
e atendi o celular rapidamente, antes que ele parece de tocar.
— Mattia.
— Amore mio! — a linda voz de Mattia soou do outro lado, fazendo-me
derreter por inteira e lembrando-me que tudo que senti pelo olhar de Pedro
não posava de algo momentâneo, que só ele podia me causar essas coisas;
só ele era capaz de me deixar sem fôlego. — Acabei de pousar em Miami.
Diga-me onde você está ficando.
— No The Palace Miami.
Houve silêncio no outro lado da linha por alguns segundos. Eu já ia
chama-lo, quando sua vez chegou ao meu ouvido de novo.
— Para não chamar muita atenção, eu vou me hospedar no Plazza
Miami, que fica mais próximo, tutto bene?
— Sì. — Eu me encostei na pia quando uma mulher entrou e foi para
uma das cabines.
— Perfetto, mia vita.
— Por favor, não demore. — Implorei, sussurrando para que a mulher
não escutasse. — Não aguento mais ter que ficar com esse homem! Parece
que ainda estou na Itália e que só mudou o cão de guarda. Sem contar que
ele é muito calado, mas quando abre a boca para falar, é rude comigo!
— Não quero que fique preocupada, Giulia. Nos veremos muito em
breve, prometo. Fique calma e não faça nada que o deixe desconfiado de
você.
— É o que estou tentando fazer! Hoje mesmo passamos o dia fazendo
compras de roupas e sapatos novos. Você vai ver, meu amor, são lindas!
— Tenho certeza que sim. E seu cabelo, passione?
Franzi o cenho.
— O que tem meu cabelo?
— Nada, é perfetto como tudo em você! Mas, lembra quando
conversamos sobre você mudar um pouco?
Eu me virei para me olhar no espelho e foquei nos meus cachos longos e
naturais. Anuí, mesmo que ele não pudesse ver.
— Sì. Lembro que me disse que um corte bonito me deixaria mais
mulher, mais... sensual.
— Isso, mia vita! Por que não experimenta, hã? Eu amaria vê-la com
um novo corte de cabelo, sexy.
— Tutto bene, amore mio. — Concordei, tocando os cachos que estava
sobre meu ombro. Eu amava meu cabelo da forma que ele era, e nunca me
importei se ele me fazia parecer menos mulher, mas se era algo que deixaria
Mattia feliz, eu faria.
Depois que desligou com uma promessa de me ver muito em breve, eu
voltei para a mesa, onde encontrei Pedro ainda com aquela cara,
observando-me. Forcei um sorriso em meus lábios, completamente
decidida:
— Você conhece um pouco salão de beleza?
Pedro alçou uma sobrancelha como se dissesse “Eu tenho cara de quem
conhece salões de beleza?”
— Preciso de um novo corte de cabelo. — Expliquei para ele. — País
novo, roupas novas, cabelo novo!
Eu olhei para seus cabelos longos e ondulados. Eles batiam facilmente
em sua bunda. Sabia que era normal as mulheres daqui terem cortes da
moda, principalmente por conta do calor que torna ruim ter cabelos tão
grandes, mas ela não era daqui; ficaria só por um tempo. Dava para ver que
ela não queria mesmo fazer isso, mas eu não sabia o motivo de estar falando
que quer.
Talvez o brilho hesitante em seus olhos que estou vendo seja apenas por
uma insegurança. Pode ser que ela nunca o cortou antes e está com medo do
que está por vir.
— Vai me levar à um salão ou não? — perguntou, sem paciência.
Apoiei o queixo em meus punhos fechados e balancei a cabeça
negativamente.
— Não. Como falei antes, não sou um cara que conhece esse tipo de
coisa, mas conheço alguém que pode ajudar.
— Está falando da loira do clube, não é? Margot alguma coisa?
— Ela mesma.
Ela se encosta na cadeira, seus olhos apertando levemente sobre mim.
— Vocês fazem amor, não fazem? — Ela joga, sem nenhum aviso
prévio. Algumas pessoas, sentadas ao nosso redor, olha em sua direção, o
que a deixa corada.
Eu não me importo com esse tipo de conversa, apesar de ter consciência
de que minha vida sexual não interessa a ninguém. No entanto, um sorriso
arrasta meus lábios por conta das palavras que ela usou. Quando respondo,
meu tom de voz é baixo, para que nenhum intrometido escute:
— Nós transamos, não fazemos amor.
Suas bochechas, já coradas, se tornam ainda mais avermelhadas.
— Não é a mesma coisa?
— De jeito nenhum. — Sacudo a cabeça.
— Por quê?
Ela é virgem.
— Nunca leu aquele livro famoso Cinquenta Tons de Cinza?
— Não.
— E o filme?
Ela torceu o nariz, exasperada.
— No, per Dio! Meus pais me matariam se me pegasse assistindo algo
assim.
Sorri de lado, observando o constrangimento tingindo todo seu rosto
bonito.
— Se não viu, por que ficou tão constrangida?
— Porque tenho amigas que já leram esse livro ou assistiram o filme.
Elas me falaram algumas coisas... vergognosa. — Ela fez uma careta
engraçada, mas logo empinou o nariz de novo. — Talvez eu leia qualquer
dia, mas o assunto não era esse. Tem certeza que a Margot não vai ter
nenhum tipo de ciúmes?
Anuí.
— Temos um lance legal e sem compromissos. Acima de qualquer coisa,
ela é minha amiga há anos. Eu vou mandar uma mensagem para ver quando
pode estar disponível para ir com você ao salão. — Já vou logo pegando o
celular do bolso e envio a mensagem.
— Vocês formam um casal bonito. — ela diz enquanto guardo o celular.
— Por que não casa com ela?
— Porque não é algo que nenhum dos dois quer.
Confusa, ela enruga a testa e inclina levemente a cabeça.
— Você é um homem muito bonito e é um bom partido. Por que ela não
iria querer se casar com você?
Dessa vez, minha risada foi mais alta.
Já ouvi falar sobre as tradições da família dela. Mulheres são criadas para
se resguardarem para o casamento, como naqueles filmes de máfias
italianas ou tempos muito antigo. Esse foi um dos motivos que me deixaram
diligente com essa decisão de Patrizio, de mandar sua única filha para um
lugar longe e desconhecido, onde ela ficaria com um total estranho.
— Primeiro — comecei a falar com cuidado e calmo, para que ela
entenda direito. —, Margot não se casaria com um homem só porque ele é
um bom partido. Acredite em mim, a família dela tem muito dinheiro.
Segundo, já falei que não queremos isso. Gostamos da forma que estamos.
— Certo. — Ela disse, mesmo demonstrando que não tinha nada certo.
— Eu não entendo essas coisas que você fala. Sério, eu sou apaixonada por
um homem muito bom. Sonho todos os dias em poder me casar com ele,
viver juntos e ter filhos. Não entendo como alguém tem liberdade para estar
com quem quer, mas não fica.
— Bem-vindo ao mundo real, Giulia. Nem todo mundo sonha com o
casamento perfeito com pétalas de rosas e vestidos brancos.
O garçom chegou com o nosso pedido: lasanha italiana. O cheiro era
magnífico, fez até meu estômago se contorcer, dando sinal de vida e
mostrando que eu estava com fome. A lasanha com um aspecto bom, mas,
mesmo sem prova-la, tinha certeza que não chegava aos pés da lasanha que
minha tia costumava fazer quando eu era mais novo, lá no Brasil. Sem
dúvidas, a melhor lasanha do mundo.
Giulia lambeu os lábios e pressionou as mãos em seu estômago. Devia
estar se lembrando também da sua comida típica também.
— Querem beber alguma coisa? — o garçom perguntou, educadamente.
— Vocês têm Cabernet Sauvignon? — Giulia perguntou, parecendo
saber bem do assunto, como uma boa italiana. O garçom assentiu com a
cabeça, e ela sorriu largamente. — Então vou querer, per favore!
— E o senhor? — Ele se virou para mim.
Balancei a cabeça.
— Só água para mim, por favor.
Quando ele saiu, ela me deu um olhar questionador.
— O que foi? Suas regras não te deixam beber durante o dia?
— Não quando estou dirigindo.
— Ah. — Ela se serviu com um pedaço de lasanha e quando pegou um
pouco para colocar na boca, gemeu, se desfazendo com o sabor. — Dio,
como é bom!
Foi estranho a forma como aquilo chamou minha atenção para seu rosto
— os olhos fechados, o semblante de prazer puro. Eu me senti como um
fodido porque foi meio que impossível não imaginar que aquela seria
exatamente a mesma expressão que ela faria durante um sexo lento e
quente. Ou enquanto recebe um oral de qualidade... Deu até água na boca, e
eu agradeci quando o garçom chegou com minha água e o seu vinho. Nem
esperei ele me servir; eu mesmo peguei a garrafinha, torci a tampa e a levei
à boca.
Quantos anos eu tinha? Quinze?
Tentando focar na comida e nos meus 30 anos, eu me alimento em
silêncio.
•••
Quando voltamos ao hotel, fomos direto para o quarto. Giulia foi para
seu quarto, tomar um banho, e eu fiquei na sala, esperando por Margot.
Eu estava respondendo uns e-mails importantes quando o elevador
apitou, anunciando a chegada. Margot saiu de lá, vestida da forma elegante
de sempre, com seu salto enorme e o típico sorriso safado que sempre
carregava nos lábios. Logo atrás dela, um homem com uma roupa cheia de
purpurina e uns óculos com aros de tigre, caminhava e puxava uma mala de
rodinhas.
Fechei o notebook e me levantei para cumprimenta-los. Beijei o rosto da
mulher primeiro, e ela devolveu,
— Fiquei surpresa com sua mensagem. — disse ela, arqueando as
sobrancelhas bem feitas.
— Pois é. Giulia agora inventou que quer cortar o cabelo.
Ela tocou meu braço, sorrindo como se eu fosse um sem noção.
— Ela é uma mulher, querido, e nós gostamos de mudar de vez em
quando.
— É, eu sei. — Cocei a nuca, realmente me sentindo estranho. — Não
sei se é coisa da minha cabeça, mas não acho que é uma coisa que ela
realmente quer, entende?
Franzindo o cenho, ela pergunta:
— Como assim? Acha que ela está fazendo contra a vontade?
Encolhi os ombros.
— Não faço ideia porque não a conheço. Talvez você possa falar com
ela, já que você é mulher e entende mais dessas coisas, vai saber se tem
algo de errado.
— Tudo bem. — Ela assentiu, ficando preocupada, sua mão fazendo
movimentos para cima e para baixo em meu braço.
Somos interrompidos quando Giulia entra na sala, vestida com um dos
vestidos de verão que comprou hoje. Seus cabelos estão soltos e jogados
para cima dos ombros e está descalça. Ela olha entre Margot e eu, pausa um
pouco na mão em meu braço, mas acaba sorrindo com uma simpatia que
não é algo comum dela.
— Olá, querida. — Margot cumprimenta, sorrindo de volta para ela. —
Pedro me disse que quer mudar o visual, então eu trouxe meu cabelereiro,
que é o único que pode encostar nos meus cabelos. Esse é o Gigi.
O homem se apressa para dar dois beijinhos em Giulia e fica hipnotizado
com suas mechas castanhas.
— Estou passada com esse cabelo! — Ele diz, puxando os cachos entre
os dedos, radiante. — Podemos fazer tantas coisas magnificas com ele,
deixa-lo ainda melhor!
— Eu gostaria de algo que me deixasse com mais cara de mulher, sabe?
— Claro, claro. Tenho muitas ideias e vou te mostrar todas elas! — Gigi
bateu palminhas. — Aonde vamos ficar?
Giulia ri e aponta para seu quarto.
— Pode ser no meu banheiro? É bem grande e espaçoso.
— Vamos lá! — Animado, ele pegou sua mala de rodinhas e saiu a
arrastando com Giulia do seu lado, enquanto tagarelava sobre os possíveis
cortes.
Quando sumiram de vista, Margot se virou totalmente para mim,
segurando meu rosto entre as mãos.
— Não se preocupe, Pedro. Vou ficar lá e tentar descobrir se o motivo é
o errado. — me garante.
— Tudo bem. — Enfio as mãos nos bolsos. — Preciso ir resolver umas
coisas do hotel e tenho uma reunião com o pessoal da França.
— Nos veremos mais tarde? — Procura saber, e eu sei que essa pergunta
significa sexo.
Sorri para ela.
— Com certeza.
Satisfeita, ela aperta a ponta do meu nariz e sai andando em direção ao
quarto de Giulia, toda elegante.
•••
Quase duas horas depois — já que cortamos e escovamos para dar mais
qualidade ao corte, finalmente eu podia me olhar no espelho e... Dio mio!
Mesmo sendo algo tão básico, como eles falaram, era como se eu tivesse
encarando outra pessoa naquele espelho. Ali, me encarando de volta, havia
uma mulher, não uma menina que viveu a vida inteira sob regras e tradições
ridículas. Eu estava com tanto receio de cortar, de mudar, mas agora
conseguia ver que Mattia estava certo, que isso me deixava mais bonita,
mais sensual.
— Uau! — Margot se levantou, chegando bem perto de mim, com um
sorriso cheio de admiração. — Você ficou mais linda do que já era!
— Obrigada. — Sorri com timidez.
Ela era uma mulher incrivelmente linda e tê-la me elogiando assim me
deixava envergonhada.
— Está muito linda mesmo. — Gigi concorda, emocionado com seu
trabalho, as mãos juntas debaixo do queixo. — Você só precisa ter alguns
cuidados. Se quiser ele mais liso, assim como está, basta escova-lo, mas
nunca esqueça do protetor térmico para não acabar afetando os fios, ok?
— Ok. — Anuí. — Obrigada, Gigi.
— Ah, que isso! — Ele faz um movimento de desdém com as mãos. —
Eu que agradeço por ter colocado minhas mãos em uma maravilha dessa!
Qualquer coisa que precisar, grite por mim! — Ele me dá um cartão com
seu número de telefone. — Ficarei muito feliz em correr para ajuda-la.
Eu sorri, agradecendo de novo, e ele foi arrumar suas coisas na mala.
Margot guardar seu celular e me encara.
— Vou precisar ir agora, querida, mas o que Gigi falou também serve
para mim, certo? Pedro tem meu número, então, não hesite em me ligar se
quiser fazer compras, comer ou apenas conversar. — Ela toca meu rosto e
faz um carinho. — É sério, qualquer coisa. Sou uma boa ouvinte.
— Tudo bem, eu ligo sim. — Garanti com um frio na barriga por tê-la
tão preocupada com essa coisa de conversar.
Só quando eles foram embora, eu peguei meu celular para ver se tinha
alguma mensagem de Mattia. Um sorriso feliz e automático se abriu em
meus lábios quando vi o nome dele.
Muito ansiosa, abri a câmera e tirei uma foto para que ele veja o novo
corte. Enviei, e ele respondeu rapidamente.
Sorri, lendo. Cruzei as pernas quando sob mim quando sentei na cama.
Olhei ao redor, me certificando de que Pedro não estava por perto antes
de responder muito empolgada:
•••
Depois de vestir uma roupa mais apresentável — calça jeans cintura alta
com um body azul com decote quadrado e sandálias de salto alto —, peguei
meus óculos de estilo olho de gato, com os aros também azuis, meu celular
e saí.
Rafael ainda estava sentado no sofá, mas se levantou quando me viu
chegar. Ele andou sem olhar para trás e apertou o botão do elevador, que
logo se abriu. Dentro do elevador enquanto eu checava meu cabelo no
espelho, escutei quando seu celular apitou com uma mensagem. Observei-o
quando checou e sua expressão ficou dura, chateada. Ele xingou um
palavrão baixinho e devolveu o celular para o bolso frontal de sua calça.
Eu me virei, cruzando os braços e empurrando minhas costas contra o
espelho atrás de mim. Inclinei um pouco a cabeça, sem tirar meus olhos do
perfil dele.
Problemas? Quis saber, meu tom cínico, porque da mesma forma
que era bom tentar tirar Pedro do sério, também era bom conseguir fazer
seu irmão perder a paciência.
Ele olhou para mim, então seus olhos foram para trás, para a parte
transparente do elevador, que dava para ver tudo lá fora. Estávamos muito
alto ainda, e eu vi em seu olhar a malícia de que, se pudesse, ele quebraria o
vidro e me jogava dali.
Precisei morder o interior da minha bochecha para não rir e coloquei dois
dedos sobre meus lábios.
Ah, calmati! falei quando consegui controlar a crise de riso que
queria sair. Só estou preocupada. Você não parece bem.
Não é nada. Respondeu, emburrado.
Não parece nada.
Sua mandíbula contraiu.
Mas é exatamente isso: nada.
Ergui minhas mãos em rendição.
Va bene, va bene. Anuí, novamente precisando prender o riso.
Va tutto bene. Acredito em você, ragazzo.
•••
•••
Ele não discutiu, apenas ficou em silêncio durante todo o filme. Quando
terminou, fomos para um restaurante dentro do shopping mesmo. Todo o
tempo, seu telefone não parava de tocar, nem de chegar mensagens.
Sentados em uma mesa do lado de fora do restaurante, esperando nosso
almoço chegar, eu encarei seu celular sobre a mesa.
Sua namorada?
Não mais. Ele olhou para o outro lado.
Por que não?
Ele me olhou com exaustão.
Porque não, Giulia.
“Porque não” não é resposta Fiz aspas com os dedos.
Ele cruzou os braços sobre a mesa e me deu um sorriso debochado.
Porque não é da sua conta, serve?
Revirei os olhos.
Você é irritante assim mesmo ou aprendeu na faculdade?
Dessa vez, ele solta uma risada.
A hipocrisia é uma filha da puta mesmo, não é?
Seu celular volta a apitar com mensagens, e eu sou mais rápida que ele,
pegando o aparelho em cima da mesa.
Mas que merda! Ele tenta me alcançar, mas eu me estico para trás,
vendo a tela piscar com as mensagens de Sasha chegando. São várias, uma
atrás da outra, e ela não parece nada legal.
Responde, Rafael!
Você não pode desligar na minha cara!
Com quem você pensa que está falando!????
Idiota, filho da mãe!
Nós fomos para a suíte de costume no meu hotel. Depois de uma boa
sessão de muito sexo sujo, eu estava pronto para voltar para minha suíte.
Margot precisava ir logo também, porque teria um almoço com sua irmã,
Madison e seus pais. Nos despedimos e eu subi para suíte em que eu ficava,
e quando entrei dei de cara com Giulia, esparramada no sofá, de bruços, as
pernas para o ar, enquanto lia um livro com muito gosto.
Ela vestia um short jeans e uma blusa folgada, e eu fui capaz de notar sua
bunda empinada.
Maravilha!
— Boa noite. — Chamei sua atenção, quando dobrei o paletó em meu
antebraço.
Com um sobressalto, ela se sentou, os olhos cor-de-mel arregalados,
completamente assustados. Sua mão foi para o peito quando ela tentou se
controlar e fechou os olhos ligeiramente.
— Buona Notte, Pedro. — ela cumprimentou com um menear de cabeça,
engolindo em seco logo em seguida. — Você me assustou.
— Sinto muito. — falei, com sinceridade. — Você estava tão entretida
no seu livro, que nem escutou o apito do elevador.
Ela puxou o livro, marcando-o com um marca-página e fechou.
Cinquenta Tons de Cinza.
Eu vi a capa e levantei uma sobrancelha questionadora para ela, que
ficou com as bochechas coradas e se mexeu envergonhada.
— Fiquei curiosa depois que você falou. — Justificou.
— Tudo bem. — Eu anuí devagar e tentei mudar de assunto para que ela
não fique mais constrangida do que aparenta estar: — Você já jantou?
Ela negou com um gesto de cabeça.
— Ainda não. Me esqueci completamente enquanto lia.
— Então, por que não vai se arrumar? Vamos jantar fora.
Ela me olha, surpresa.
— Vai jantar comigo hoje?
Desatei o primeiro botei da minha camisa, piscando um olho para ela.
— Prometi ontem e vou cumprir, ragazza. — Imitei seu sotaque,
arrancando um sorrisinho dela antes que caminhasse para seu quarto com o
livro nas mãos e na ponta dos pés descalços.
O vestido vermelho estava estendido sobre a cama, no lugar onde eu havia
deixado, quando saí do banheiro com o corpo envolvido em um roupão
macio. Eu o comprei hoje mais cedo, quando fui ao shopping com Rafael.
Ele simplesmente chamou minha atenção quando passava na frente da loja.
Tive uma pequena discussão com meu acompanhante até que ele cedesse e
me deixasse entrar lá. Saí da loja com meia dúzia de sacolas.
Deixando o roupão de lado, vesti uma lingerie nova também. Essa eu
havia comprado no dia em que fui com Pedro. Era preta, de renda, o sutiã
era meia taça e a calcinha fio-dental. Ficava linda no corpo. Sorri para
minha imagem no espelho enquanto arrumava a calcinha no meu quadril.
Depois disso hidratei o meu corpo inteiro antes de finalmente colocar o
vestido.
Ele tinha as mangas caídas nos ombros, no estilo ombro-a-ombro e seu
comprimento estava um pouco acima nas minhas pernas. Satisfeita com o
resultado, coloquei um colar das minhas joias e um par de brincos de
pérolas pequenas.
Na hora da maquiagem, hesitei quando peguei um batom.
Lembrar da carinha de sem graça que Mattia fez quando me pediu isso,
me faz pensar no quanto foi difícil para ele fazer e o quão importante isso é
para ele. Abandono o batom com uma dor no coração e pego o rímel para
dar um jeito nos meus cílios e aplico um pouquinho de blush, o suficiente
para que eu sinta que estou com alguma coisa.
Quando termino, calço uma sandália de salto preta com uma tirinha
envolvendo meus tornozelos e solto meus cabelos do coque que estava.
Coloco um pouco de perfume e encerro. Antes de sair do quarto, pego o
celular, tiro uma foto de corpo todo e enviou para Mattia, perguntando o
que ele achou.
Ele não havia me respondido o dia inteiro, mas entendo que ele é um
homem ocupado, então apenas deixo para quando ele puder falar comigo.
Encontro Pedro na sala um minuto depois, falando ao telefone com sua
típica cara séria. Ele está lindo — como sempre —, com uma camisa branca
com seus primeiros botões abertos, facilitando a visão de seu peito
musculoso para qualquer pessoa que quiser olhar, e um terno preto por
cima.
Ao se virar, seus olhos se chocaram com os meus e estreitaram quando
desceram pelo meu corpo, analisando minha roupa. Algo gelado rodopiou
dentro de mim, como um calafrio.
Eu tinha apenas o celular na mão, então o segurei com as duas mãos e o
apertei, para tentar me livrar dessa sensação estranha. Respiro fundo
quando ele desliga o telefone e abro os braços, sorrindo.
— O que você acha? — pergunto, um pouco nervosa pelo que ele possa
dizer.
Com as mãos na cintura e a expressão séria, ele assentiu positivamente
com a cabeça, parecendo mesmo impressionado.
— Você gosta? — Ele devolveu a pergunta.
Surpresa, eu dou uma olhada no espelho da sala e meu sorriso aumenta
com o que vejo.
— Sì. Eu amei esse vestido desde que coloquei meus olhos nele mais
cedo. Acho que caiu bem no meu corpo.
Pedro meneou a cabeça, finalmente abrindo um sorriso quando disse:
— Então eu gostei também. Você está linda. — Ele aperta para chamar o
elevador e me olha: — Vamos lá?
•••
Quando nossa comida chegou, fiquei com água na boca. Optamos por
frutos do mar. Havia lagostas, ostras, peixe fresco e alguns molhos par
acompanhar. Pedro também pediu um vinho maravilhoso. Na hora de servir,
ele colocou um pouco na minha taça, mas seu olhar era de aviso quando eu
tomei um pequeno gole.
— Eu sei que você costuma beber vinho. — ele começa a dizer enquanto
serve sua própria taça, a voz baixa, rouca e serena. — Ficou claro no nosso
último almoço, mas pegue leve. Aqui nos Estados Unidos há restrições
sobre pessoas com menos de 21 ingerir bebidas alcoólicas.
— Na Itália não tem isso. Aos dezesseis, você já está liberado para
comprar bebidas.
— É, mas são culturas diferentes.
Anuí, concordando.
— Va bene. Vou ter cuidado.
Eu como um pedaço da lagosta depois de afogar em um molho delicioso,
e fica impossível não gemer ao provar. Eu já tinha comido muitas lagostas,
mas nenhuma supera essa. A carne era tão branquinha e derretia na boca,
fazendo-me derreter junto.
Enquanto mastigo, dou uma olhada na vista. Era perfeita. O barulho
calmante do mar, as luzes da cidade, o vento gostoso.
— Ali é o bairro South Beach Art Deco District. — Pedro explica,
apontando para as luzes.
Meu queixo caiu.
— Gianni Versace morava ali, sabia?
Ele me olhou como se eu estivesse falando uma língua diferente.
— Quem é Gianni Versace?
Levei uma mão ao peito, fingindo indignação com sua pergunta.
— Ele é um estilista italiano. — respondi para ele, explicando. — Fui
para alguns desfiles dele com minha mãe. As roupas são perfetta.
— Sinto muito, eu não sei muito dessas coisas. — Ele me pareceu
realmente sincero, não havia deboche em sua voz.
Eu entendia ele não saber disso. Provavelmente, ele não segue essa coisa
toda de moda, além do seu amigo Ryle Fontaine, claro. Essa é o tipo de
coisa que Mattia saberia, não Pedro Rodrigues.
— Foi o que imaginei. — Eu sorri para ele. — Non preoccuparti, sei que
você é muito ocupado. — Encolho os ombros. — Tiro pelo babbo, que não
para em momento algum. Está sempre para lá e para cá e nunca foca em
nada além do trabalho, trabalho e mais trabalho... Eu entendo! Se para ele é
difícil que só cuida de um hotel, para você deve ser mil vezes mais difícil,
já que cuida de todos os outros.
Ele anuiu.
— É verdade.
Comi outro pedaço de lagosta e sorvi um pouco de vinho da minha taça
para ajudar a engolir.
— Para onde você foi hoje? — perguntei. Não era apenas curiosidade, eu
só queria puxar conversa. Sempre achei interessando duas pessoas
conversando sobre o dia delas e tudo o mais.
— Tive uma reunião em Los Angeles. — respondeu ele, após engolir
uma ostra e lambeu os lábios.
Como algo hipnotizante, meus olhos focaram em sua boca e foi esquisito
a forma que aquilo foi sexy. O homem chamava atenção mesmo quando ele
não estava fazendo nada de mais.
Limpei a garganta, aprumando meus ombros para tentar disfarçar a
minha inquietação no momento.
— Ãhn..., mas o Rafael não foi para lá ontem?
Ele fez que sim com a cabeça, depositando sua taça de volta em seu lugar
na mesa.
—Rafael é responsável por toda parte financeira do negócio, enquanto eu
tenho a administração e toda a parte mais pesada. — ele esclarece. —
Estamos com um projeto de um hotel em French Rivera e a Lazzari
Engenharia & Arquitetura vai ficar responsável pela construção, como
sempre. Rafael foi ontem cuidar dos acertos de custos com Enzo Lazzari, e
minha reunião hoje foi com a arquiteta e o engenheiro responsável, mas,
infelizmente, eles não puderam vir, por conta de um imprevisto familiar,
então eu fui até lá.
— Ah. — Eu estava realmente pasma por ele ter me explicado tudo isso.
— Grazie por ter me falado tudo isso, Pedro. Babbo nunca fala sobre
trabalho quando está perto de nós, mulheres.
Ele mexe a cabeça, o cenho levemente franzido.
— Eu não vejo problema nenhum em falar sobre isso perto de mulheres.
— disse. Ele acenou para mim, de repente, mudando de assunto: — Vi que
estava lendo o livro que falei.
Ma che bellezza!
Meu rosto começou a queimar, mas eu não abaixei a cabeça. Ele não era
meu pai para me repreender, certo?
— Sì. — Suspirei um sorriso. — Já estou quase no final. Passei o resto
do dia lendo e posso dizer que é uma leitura... — Eu tentei encontrar uma
palavra que se encaixasse, mas Pedro foi mais rápido:
— Quente?
Levantei os olhos para os seus, me arrependendo logo em seguida com a
intensidade que irradiada das suas íris escuras. Todo meu corpo se arrepiou
e eu me encolhi.
— Está com frio? — perguntou, preocupado, já se apressando para tirar o
terno. Ele se levantou, deu a volta na mesa e cobriu meus ombros, em
seguida, voltou para seu lugar.
— Grazie. — disse com sinceridade.
— Não por isso. — Ele olhou para meu rosto e, por um segundo, eu
percebi que sua fisionomia estava relaxada e não dura, séria.
Limpei a garganta novamente, tomando mais um pouco do meu vinho
para esquentar por dentro.
— O que eu iria dizer era diferente, não quente, apesar de que, realmente,
é muito quente. Você já leu?
Ele negou.
— Não gosto de ler livros assim.
Revirei os olhos de brincadeira.
— Ah, esqueci que você lê Einsten. — Zoei. — Além disso, o que você
gosta de ler?
— Eu gosto muito de livros que ajudam você a aprender novas coisas
sobre o mundo e sobre você mesmo, porém — Ele meneou a cabeça
devagar, ponderando um pouco. — Também gosto dos livros de Oscar
Wilde, George Orwell, Stieg Larsson, Machado de Assis...
Franzi o cenho.
— Nunca ouvi falar de Machado de Assis.
— É um grande autor brasileiro. Você iria gostar de ler um livro dele.
— Então, quero ler um dia. — Afirmei, sorrindo. — Mas, nunca leu
livros assim, de romance?
— William Shakespeare, serve?
Bati a palma da mão contra a testa.
— Per favore, não me diga que seu livro favorito é Hamlet!
Ele sorri sem mostrar os dentes e se encosta na cadeira de forma
relaxada.
— Apesar de ser um livro muito bom, meu favorito é A Tempestade.
Mais uma vez, apoiei o cotovelo na mesa e o queixo na mão, olhando-o
com interesse.
— Por quê?
— Porque se trata de perdão e arrependimento. O perdão é um valor
cristão que Shakespeare também elogia em sua vida, e eu também.
Alcei uma sobrancelha.
— Você é cristão?
Ele assente, engolindo mais uma ostra.
— Claro.
— Isso é interessante. — falei, os cantos da minha boca se curvando para
baixo.
Ele pisca um olho para mim, um sorrisinho ladino.
— Eu sou um homem interessante, Giulia.
Sorri.
— Giusto, giusto!
— E o que você achou do livro? — ele questionou.
Bebi mais um pouco de vinho.
— Humm..., como falei, é um pouco diferente de tudo que já li. Sempre
gostei de livros cheio de romances, mas esse livro foi mais intenso, sabe?
— Meu rosto queimou ainda mais. — A história é intrigante.
O sorrisinho que ele me deu foi como se dissesse “Intrigante? Sei.” de
forma maliciosa.
Nós conversamos sobre várias outras coisas durante o jantar e na volta
para casa também. Quando entramos na suíte do hotel, meu corpo parecia
que tinha carregado uma tonelada de pedras. Fui logo me livrando das
sandálias enquanto ele desfazia os botões de seus pulsos. Retirei seu terno e
o devolvi.
— Grazie por isso. Foi muita gentileza sua.
— Não me agradeça por isso. — ele descartou com um gesto de cabeça.
— É o mínimo que eu poderia fazer.
Franzo as sobrancelhas.
— Mínimo?
Ele sacode a cabeça.
— Deixa pra lá.
Torci o nariz, mas anuí. Ele parecia cansado, principalmente porque já
viajou hoje, então não iria tomar mais do seu tempo.
— Va bene. Você não vai encontrar com a Margot hoje?
— Não. — Ele respondeu simplesmente, como se estivesse conversando
sobre algo muito simples. — Nós não nos vemos todos os dias, Giulia.
— Ah. — Comecei a caminhar até o meu quarto e antes de entrar, eu me
virei e falei: — Buona Notte, Pedro. Grazie pelo jantar.
Ele assentiu, com um sorrisinho.
— Boa noite.
Mattia: È bellissima, amore mio. Mas, não acha que está muito curto?
Não gosto da ideia de outros caras olhando para suas pernas.
A mensagem foi como um banho de água gelada, desfazendo meu sorriso
e murchando as borboletas. Sentei-me na cama, sentindo-me envergonhada
de repente.
Giulia: Ninguém ficou olhando para minhas pernas, amore mio. Giuro
di no.
•••
Eu troquei apenas minha blusa por uma de alça fina e quadrada, coloquei
uma sandália de salto não muito alto e peguei um óculos estilo olho de gato
com aros vermelhos. Encontrei com Pedro já perto do elevador.
•••
•••
•••
•••
Eu conseguia ouvir o celular tocando, mas estava tão longe. Todo o meu
corpo doía, como se eu tivesse corrido uma maratona, então eu gemi,
mexendo-me sobre a cama, pedindo aos céus para que fizessem esse toque
irritante parar.
E ele parou.
Juntando minhas mãos, as enfiei sob meu rosto para tentar voltar a
dormir. Mas então as imagens começaram a aparecer na minha memória,
trazendo tudo à tona.
O sexo.
A balada.
Mattia.
Natasha.
As palavras.
A briga.
Veio tudo como uma avalanche de lembranças ruins e explodiram na
minha cabeça. Abri os olhos, sentindo uma lágrima escorrer. Tudo o que eu
queria era dormir por uma semana — só assim, talvez, quando eu
acordasse, tudo já estaria bem. Ou, pelo menos, melhor.
O toque do celular começou novamente, me assustando dessa vez, e eu
fiquei surpresa por encontra-lo na mesinha de cabeceira, ao lado da cama.
Eu sabia que não tinha deixado ali. Muito provavelmente, deixei no bolso
da calça que usei ontem, mas Margot deve ter pegado para mim.
Margot.
Eu lembro de ter chorado no colo dela como uma criança assustada. Era
exatamente como eu estava me sentindo — como estou me sentindo.
Minhas bochechas queimaram com vergonha e eu fechei os olhos,
desejando desaparecer.
Esticado a mão, alcancei meu telefone. O nome da minha mamma
piscava na tela. Per Dio, era tudo que eu não precisava agora. Sem coragem
de falar com ela ou com o babbo, desliguei o celular e o joguei na gaveta da
mesinha de cabeceira, voltando a cobrir até minha cabeça com o lençol.
Era dessa forma que eu queria ficar por uma semana, porém, como se
fosse um martírio completo, o despertador começou a soar, me lembrando
que faltava apenas meia hora para o café da manhã.
Eu não queria ir. Não hoje. Eu só queria me cobrir e chorar porque meu
coração estava doendo. No entanto, não era justo. Pedro entrou em uma
briga por mim, apesar de mal ter conseguido ver, já que meus olhos estavam
nublados com lágrimas depois de tudo que aconteceu. Ele merecia, pelo
menos, minha companhia no café da manhã.
Deixando de lado todo orgulho e vergonha, joguei o edredom de lado e
estiquei minhas pernas para fora. Eu estava quebrada, tanto física, quanto
emocionalmente, então meu corpo parecia pesar ainda mais hoje. Eu me
arrastei para dentro do banheiro, evitando o espelho quando comecei minha
higiene matinal.
Eu não queria me olhar e ver o quanto estou parecendo um lixo humano.
Isso só pioraria tudo.
Depois de me higienizar, enxugando as lágrimas com o dorso da mão, fui
ao closet e escolhi roupa mais decente que eu consegui achar: uma calça
capri jeans, na cor branca, e uma camisa preta, que era a mais larga que eu
tinha. Havia um símbolo pequeno da marca em seu peito e ela alcançava
logo abaixo do meu bumbum. Perfetto.
Sem me olhar no espelho, puxei meus cabelos para o alto da cabeça em
um rabo de cavalo frouxo. Descalça, andei para sala. Engoli em seco
quando avistei Pedro e Rafael no terraço, já sentados na mesa para o café da
manhã. Minhas mãos suaram e algo em meu estômago se apertou.
Eles tentaram me avisar e eu não acreditei. Precisei de provas físicas. A
vergonha e a culpa me corroeram por dentro, mas eu não voltaria agora.
Mesmo trêmula, andei até lá e ainda peguei um pedaço da conversa antes
que eles me notassem:
— Há uns cinquenta repórteres lá fora e tem mais chegando. — Rafael
rosnou. — Eles deveriam estar atrás do filho da puta!
Pedro foi o primeiro a me notar quando cheguei no limiar da porta de
vidro. Ele não estava com seu kindle como era de costume e sua roupa não
era de trabalho. Ele estava com uma camisa azul-marinho de mangas curtas
e uma calça preta. Seus olhos negros encontraram os meus, intensos e
preocupados, e muito surpresos por me ver ali. Depois do que aconteceu,
acredito que eles pensavam que eu não iria querer sair do quarto tão cedo.
Bene, eles acertaram.
Arrastei o olhar do seu rosto bonito e sério para sua mão enfaixada. Ele
havia se machucado quando distribuiu socos na cara de Mattia. Eu me
encolhi.
Logo, Rafael percebeu para onde ele estava olhando e virou para me ver
também. No lugar da ironia e impaciência de sempre, estava a preocupação
também.
Mais uma vez, eu estava me sentindo como uma criança assustada.
— Buongiorno — cumprimentei baixinho, quase inaudível, quando
deslizei sentada em uma cadeira, meu rosto corando com a atenção deles.
— Giulia — A forma aveludada como meu nome escorregou para fora
da boca de Pedro fez meus olhos lacrimejarem e eu os fechei numa tentativa
de evitar que as lágrimas caíssem, meu coração pulando com força total em
minha caixa torácica. Eu sabia que a coisa que viria a seguir ia me fazer
desabar de novo. —, me diga como você está, por favor.
E eu desabei, mais uma vez.
As lágrimas caíram, mas eu as segurei com o dorso da mão. Eu não levantei
da cama para chorar no café da manhã, na frente de Pedro e Rafael, mas
como eu conseguiria impedir a dor?
Ao contrário dos livros, em que a personagem consegue prender o choro,
a minha garganta queimou com as lágrimas, meu peito doeu com a
compressão, com o buraco que estava lá. Não tinha como eu controlar.
— Seria a coisa certa e elegante dizer que estou bem — Funguei, meus
dedos apalpando minhas bochechas. —, mas acontece que não estou nada
bem. Grazie por me perguntar, de todo modo. — Eu olhei nos seus olhos
escuros de Pedro, a mágoa e a vergonha se espalhando pelo meu corpo
todo. — E grazie por... pelo o que você fez por mim ontem. Sinto muito por
ter trazido problemas para você.
Na hora em que cheguei, ouvi Rafael falar sobre alguns repórteres que
estavam na frente do hotel. Pelo seu tom de voz, notei que não era coisa
boa.
Eu estremeci.
Era óbvio que a confusão já devia estar circulando pelo mundo.
— Não foi você quem me trouxe problemas, Giulia. — Ele assegurou
com gentileza. — Tudo que eu fiz ontem, eu faria novamente.
Engoli em seco, anuindo e virei a cabeça para Rafael, que pela primeira
vez, estava calado, sem sua impaciência típica. Meu rosto corou e meu
corpo se encolheu, ciente do que eu estava prestes a fazer. Eu sempre tive o
orgulho como um dos meus defeitos. Confessar que eu estava errada para
alguém com quem bati de frente era um desafio terrível, porém, esse
alguém me ajudou bastante, e eu lhe devia um pedido de desculpas.
— Rafael — uma lágrima escapou pelo canto do meu olho e o interior da
minha garganta queimou. —, scusi por ter duvidado de você. Eu... — eu
mal estava conseguindo falar. Toda as lembranças voltavam com violência,
me fazendo querer chorar com mais força. — Eu fui tão... stupida! Deveria
ter visto o que estava acontecendo, certo? Ninguém pode ser tão perfeito,
ninguém...
— Você foi uma vítima. — Pedro me interrompeu. Ele se inclinou sobre
a mesa e sua mão alcançou a minha. Quando seus dedos quentes tocaram os
meus, algo me forçou a encarar seus olhos. Era reconfortante, gentil,
diferente. — Não foi burra e não tinha como ver. Você não fez nada de
errado, apenas acreditou no que sentia.
Eu estava me sentindo a pessoa mais sentimental do mundo, porque era
só um olhar para o homem na minha frente, que eu queria desmoronar outra
vez. Novamente, enxuguei meu rosto com o dorso, muito embaraçada por
estar chorando diante de dois homens lindos, que tinham seus olhares
apreensivos sobre mim.
— Eu sinto muito por parecer uma poça de água. — Eu falei em
italiano, porque no momento não estava conseguindo pensar nas palavras
em inglês e sabia que eles me entenderiam.
— Não se desculpe. Chore tudo que tiver que chorar, Giulia. Estamos
aqui por você. — Pedro apertou levemente minha mão, com carinho e
firmeza, fazendo com que meus olhos encontrassem os deles de novo: —
Eu estou aqui por você.
Anuí em agradecimento, incapaz de falar qualquer coisa por conta da dor
no meu peito e garganta.
— Eu vou matar o filho da puta por isso! — Rafael se exaltou,
empurrando sua cadeira para trás, fazendo-a gritar contra o chão.
— Rafael. — Pedro chamou seu nome com a paciência de sempre, mas
eu podia ver nos seus olhos aquele mesmo brilho perigoso de ontem,
quando ele estava socando o rosto de Mattia.
— Não! — Seu irmão apontou, furioso. — Não venha com sua calma
agora, Pedro! Olhe para ela! — Ele me indicou. — Está acontecendo tudo
de novo, você sabe disso.
Pedro concordou.
— Eu sei, mas matar ele só vai te levar para cadeia.
— Não é o meu lugar; é o dele! Por tudo o que ele fez!
— Não será assim que a justiça verá.
— Foda-se a justiça! Aonde eles estavam quando... — Pela primeira vez,
eu vi Rafael vacilar com sua impaciência. Seus olhos chegaram em mim,
arregalados, sem fôlego, completamente revoltado, e aliviaram um pouco
com um suspiro. —, quando tudo aconteceu?
— Ele não vai voltar. — Pedro garantiu, se levantando e colocando uma
mão sobre o ombro do irmão, levando toda sua atenção para ele. — Ele já
deve ter pousado na Itália e nunca mais vai voltar.
— Quem garante? — As palavras saíram cheias de nojo e incrédulas. —
Ele é idiota, debochado. Gosta de confrontar...
E foi como se uma máscara tivesse descido pelo rosto de Pedro,
transformando sua expressão calma em algo sinistro, ameaçador.
— Aí, eu mostrarei a ele que não me conhece de verdade.
Ele assentiu, e eu percebi o quanto eles confiam um no outro. Apesar de
todo temperamento ruim de Rafael, Pedro é capaz de acalmá-lo ou pelo
menos amenizar o clima. É uma relação bonita entre irmãos que eu nunca
vou saber como é.
Funguei, lembrando como sempre estive sozinha. Mal via minhas
amigas, porque meus pais proibiam de tê-las. Não tenho irmãos. Minhas
primas são sempre muito ocupadas em busca de ensinamentos para serem
umas perfeitas donas de casa. Babbo tem uma pedra no lugar do coração, e
mamma está sempre atrás dele, para todos os lados, fazendo seu papel de
esposa magnifica para agrada-lo em tudo.
Por um longo tempo, eu só tinha uma esperança, que era o Mattia. Ele
me prometeu tudo que eu sonhava: viver longe daquele lugar, fazer parte de
uma família melhor, viajar para conhecer lugares bonitos e ser, finalmente,
feliz.
Mas era tudo um sonho e eu acordei dentro de um pesadelo.
O meu choro trouxe a atenção dos irmãos, e Rafael cerrou a mandíbula,
desviando da mão de Pedro.
— Não consigo ver isso de novo. — ele disse em tom de desculpas para
mim. — De jeito nenhum eu consigo. — Então ele deu as costas e foi para
elevador, parecendo atordoado.
Pedro suspirou, enfiando as mãos nos bolsos frontais de sua calça jeans e
se virou para mim.
— Eu sinto muito. — murmurei para ele, que balançou a cabeça em
negação.
— Não é culpa sua, Giulia. — garantiu, voltando a se sentar. — Nada
disso é, portanto, não se preocupe com isso, por favor.
Enxuguei o rosto, respirando fundo e me inclinando para frente, para me
servir com uma xícara de café. Olhei entre todas as opções de comidas ali e
um nó apertou meu estômago ao lembrar das palavras de Mattia.
“Já deu uma boa olhada naquela morena que estava comigo? Ela é
gostosa pra caralho!”
“Você é gorda!”
•••
•••
•••
•••
•••
Durante todo o voo, a voz de Giulia me atormentou. Não a voz dela aqui,
já que ela resolveu jogar dama com Rafael e não estava conversando
comigo; mas sua voz em italiano, sendo sussurrada na porra do meu ouvido,
depois do quase beijo que ela me deu.
“Grazie, davvero. Non dimenticherò mai le cose che stai facendo per
me.”
Eu já tive outras mulheres sussurrando em meu ouvido, mas nenhuma
me deixou tão aceso como Giulia deixou. Apoiei minha cabeça no encosto
do banco de couro e fechei os olhos, buscando minha calma de sempre. Eu
odiava sair do controle por vários motivos, mas o que mais pesava era o
fato de que minhas escolhas se tornavam erráticas e precipitadas. Como
meu pensamento no momento que estava me questionando porque não a
segurei e a beijei.
Isso era errado de muitas maneiras. Eu nunca traí a confiança de
ninguém, e não seria legal começar com o melhor amigo do meu pai.
Quando, finalmente, chegamos no evento, Giulia deslizou sua mão na
dobra do meu braço. Inclinei a cabeça para olha-la e peguei seu sorriso
adorável.
Rafael estava do seu outro lado, os olhos estreitos enquanto olhava ao
redor, provavelmente em busca de Athena, sua nova amizade estranha.
— Uau. — Giulia também deu uma olhada no local, seu corpo ficando
tenso. — Quantas pessoas lindas e elegantes.
Sem pensar direito, com minha parte protetora tomando lugar, levantei a
outra mão e coloquei sobre a dela, dando um aperto de leve.
— Você está ainda mais linda e elegante do que qualquer pessoa presente
nesse evento. Não se esqueça disso.
Ela engoliu com dificuldade, mas assentiu devagar, seus ombros
aliviando com minhas palavras.
— Meu irmão tem razão. — Os olhos escuros de Rafael se voltaram para
ela, seu sorriso era levado. — Não se preocupe. Você está maravilhosa e, se
alguém ousar dizer o contrário, grite por mim e eu quebrarei os dentes do
desgraçado.
Prendi um sorriso, sacudindo a cabeça. É claro que ele sempre demonstra
sua impaciência. Eu não rebato, porque eu seria capaz de fazer a mesma
coisa por ela.
Nós entramos, nos misturando. As pessoas iam nos cumprimentando
enquanto andávamos, e eu estava tão acostumado com elas querendo
chamar minha atenção, que já acenava e sorria em automático.
Ao contrário de mim, meu irmão enfiava as mãos nos bolsos e só falava
com as pessoas que ele gostava. Sempre deixou claro que não suportava boa
parte daquelas pessoas e odiava falsidade. Não iria julga-lo por isso.
Um garçom passou por nós com uma bandeja de drinks, e Rafael pegou
um.
— Eu posso tomar também? — Giulia me perguntou baixo. Depois da
nossa última conversa sobre limites de bebidas alcoólicas para menores de
21 no país, ela não estava mais pedindo vinho em restaurantes.
Levantei a mão e peguei um dos drinks, entregando para ela. Pisquei um
olho e falei:
— Você está comigo. Eles não vão te pedir a identidade aqui.
Eu realmente não ligava para isso. No Brasil, comecei a ingerir bebidas
alcoólicas com quinze anos para me enturmar com as pessoas. Entendo que
ela goste e queira beber, só não iria permitir que passe dos limites e fique
muito alterada.
— Você não vai beber também?
Balancei a cabeça, negando.
— Não isso.
Finalmente, chegamos perto de quem queríamos. Margot foi a primeira a
nos ver e abriu um sorriso radiante quando se aproximou para abraçar
Giulia. Ela estava linda, como sempre, em um longo vestido branco, tomara
que caia e uma fenda que deixava sua perna do lado de fora, assim como o
de Giulia. Em suas laterais, haviam uma lista preta para quebrar mais o
efeito do branco.
— Você parece uma princesa de filmes de romance de tão linda que está!
— Ela elogiou Giulia, que abriu um sorriso tímido.
— Grazie. — Minha acompanhante acenou para seu vestido, parecendo
estar chocada. — Eu nem preciso dizer o quanto você está deslumbrante,
certo?
Margot descartou com um aceno e sorriu.
— Foi o primeiro vestido que vi na minha frente. Não foque nisso
porque você é, definitivamente, a mulher mais linda desse evento.
— Eu disse exatamente isso para ela. — Eu inclinei a cabeça para o rosto
corado de Giulia, e seus olhos brilharam para mim.
Ela podia ser menos linda do que é. Ou, pelo menos, não ser filha do
melhor amigo do meu pai. Ou ter mais idade...
— Claro que você disse. — Margot me abraçou rapidamente, deixando
um beijo em meu rosto. — Você é um cavalheiro e sempre diz as coisas
certas.
Eu sorri para ela e senti a mão de Giulia apertando meu braço. Inclinei a
cabeça para ela, e seus lábios estavam apertados em uma linha fina. Encolhi
meus olhos para ela, que revirou os seus e moveu a cabeça para Margot
com um sorriso.
— Venha, quero te apresentar para uma pessoa. — Margot falou,
estendendo a mão para ela, que rapidamente pegou e me deixou.
Senti-me estranho pra caralho com o que acabou de acontecer, eu decidi
colocar isso de lado e focar nas outras pessoas. Comecei dando um abraço
em Titus, César e Kaan, que estavam presentes.
•••
— Eu vou esperar você aqui nesse café e nem venha com o biquinho e o
olhar pidão, porque vou manter minha palavra! — Rafael estava
gesticulando enquanto falava. Estávamos parados diante de um café chique
dentro do Bal Harbour Shops, esperando Margot aparecer. Depois que ele
me mostrou que sabe falar “não” em mais de oito línguas diferentes,
incluindo bielo-russo e gaélico-escocês, que eu nem sabia que existia, ele
me trouxe.
Eu sorri para ele, anuindo.
— Tudo bem, você pode ficar aqui.
Ele resmungou algum palavrão em português e entrou no café.
Depois que eu e Margot entramos e compramos na Prada, Chanel, Dolce
& Gabanna, Dior e, claro, Fontaine, nós fomos para a minha loja de
lingeries favorita. Era a coisa que eu mais amava comprar e por mais que eu
não esteja ainda tão confiante de usar de novo, eu gostava de olhar os
modelos novos e imagina-los no meu corpo.
— Eu amei essa! — Margot apontou para uma lingerie toda preta, com
calcinha minúscula e cinta-liga que estava em uma manequim. — O que
você acha?
Assenti, sorrindo.
— É linda e vai ficar perfetta no seu corpo. — Apontei, as palavras
pesando na minha língua após meu cérebro idiota formar a imagem dela
usando-o para Pedro ver.
Ela inclinou a cabeça com seu sorriso gentil para mim.
— Eu não estou dizendo para mim, baby. É para você.
Surpresa, olhei de novo para manequim. Era realmente linda e, apesar de
estar decidida a comprar algo vermelho, eu tinha que confessar que ela me
ganhou. Anuí, com um sorriso e pedi para a vendedora pegar meu tamanho.
Enquanto pagávamos nossas lingeries, fiquei inquieta. Pensar sobre
Pedro e roupas intimas me deixou com um calor fora do comum. E saber
que esse calor não iria passar tão cedo porque o bendito homem não queria
entrar em uma “discussão” com meu pai, me deixava frustrada.
Quando pisamos para fora da loja, tomei uma respiração profunda e reuni
toda a coragem que eu tinha. Virando para Margot, questionei:
— Quando você está querendo fazer... sexo, mas não tem ninguém para
fazer com você, o que você faz para liberar a excitação? — Eu despejei de
uma vez, o que fez a pobre mulher hesitar na caminhada, as sobrancelhas se
erguendo em surpresa e seu queixo caiu ligeiramente.
— Bom — ela começou, meio que sem saber como falar, mas ela não era
do tipo de mulher que se esquivava dessas conversas. Assim como Pedro,
era bem resolvida demais para isso. —, não é comum não ter ninguém para
isso. — Seus lábios se curvaram em um pequeno sorriso sensual. Ela
meneou a cabeça — Mas, claro, quando estou com muita vontade e acordo
no meio da noite, por exemplo, eu uso meus brinquedos sexuais.
Corei, arregalando os olhos.
— Você quer dizer... pênis de plástico?
— Também. — Ela mexeu levemente a cabeça. — Mas tenho alguns
outros. — Ela olhou para mim com curiosidade. — Você está excitada?
— No! — Respondi rapidamente. — Agora não, pelo menos.
Ela soltou uma risadinha e tocou meu braço.
— Tudo bem, fique calma. É muito normal, principalmente quando
sabemos o quão bom é fazer sexo.
Eu torci o nariz, lembrando que eu só sei isso porque deixei Mattia tirar
minha virgindade. Foi um pouco dolorido, mas, com toda merda, o diabo
fez de uma forma que fosse boa para mim.
— Por que não compra um vibrador? — Margot sugeriu. — Ele não
precisa introduzir para que você chegue ao orgasmo, caso você ainda esteja
desconfortável, e é fácil de usar.
Minha boca secou.
— Eu nunca usei um.
— Não tem segredos, você vai. — Ela segurou minha mão. — Eu
conheço um sexshop aqui, vamos lá.
•••
•••
•••
•••
•••
Dessa vez, não fiz nada. Deixei que ele fosse na janela, mesmo que eu
ame ir para assistir a cidade e conhecer um pouco sobre ela. Mas,
aparentemente, Rafael tinha uma cisma gigante de ir na janela, então não
briguei.
Dessa vez.
Peguei a mão de Pedro e a segurei sobre meu colo. Ele abaixou a cabeça
e franziu a sobrancelha para o gesto, observando meu dedo delinear a
tatuagem de pássaro no seu dorso.
Eu tinha notado suas tatuagens, mas nunca tinha realmente parado para
analisa-las. Essa, em particular, era linda e incomum. Mesmo na pouca luz
de dentro do carro, consegui ver que era uma Phoenix com um crânio
dentro. Olhei para cima, para Pedro e não precisei nem perguntar, ele viu a
curiosidade nos meus olhos.
— Ressurgimento e imortalidade. — explicou baixinho, seu polegar
passou sobre meu dedo, que descansava sobre a tatuagem.
Eu anuí, gostando do significado, mesmo não sabendo o motivo de ele
ter feito. Eu queria perguntar das outras, mas não tive tempo porque o carro
estacionou diante de um hotel 5 estrelas.
Como sempre, Rafael saiu primeiro, depois Pedro saiu, e eu estava
prestes a sair — porque já estava acostumada com a falta de cavalheirismo
desses dois, quando Pedro estendeu a mão para me ajudar a sair. Surpresa,
demorei alguns segundos para, finalmente, colocar minha mão sobre a ele.
Eu nem consegui evitar o sorrisinho satisfeito com aquilo.
Quando já estava de pé, ele me ajudou a colocar o sobretudo e com a
mão em minha coluna, me guiou para a entrada do prédio. No lobby
luxuoso — não tanto quando o lobby do The Palace —, fomos abordados
por um homem tão alto como os dois irmãos. Sua aparência asiática e a
beleza que toma conta dele chama atenção de qualquer pessoa.
Geralmente, eu vejo as pessoas falando como as pessoas asiáticas são
todas iguais, mas esse homem desfaz esses comentários apenas com sua
presença. Ele apertou a mão de Pedro e a de Rafael, em seguida, quando
fomos apresentados, ele apertou a minha. Seu nome era Cassian Jin.
— É um prazer conhece-la, srta. Russo.
— O prazer é todo meu. — Devolvi a gentileza, e ele nos levou para o
35º andar, onde havia um restaurante muito chique.
Pelo que eu entendi da conversa, Cassian era dono da maior parte dos
prédios de Nova York. Sua empresa comprava empresas falidas ou prestes a
falir, as reerguiam e quando não mantinham, as vendias por um preço muito
maior. Ou seja, mais um bilionário na parada. Ele não hesitou quando
apertou a mão de Pedro para fechar negócios e vender dois dos seus prédios
comerciais em Albany para que um novo The Palace nascesse.
Quando o almoço terminou, eles marcaram de se encontrar com seus
advogados para assinar os papéis da venda e nos despedimos no mesmo
lugar em que nos encontramos.
— Diga a Clara que eu lhe enviei um abraço. — Rafael falou ao dar
tapinhas em suas costas.
Cassian meneou a cabeça, um sorriso divertido nos lábios.
— Eu te desafio a fazer isso. Ela não quer me ver no momento.
— Estão brigados de novo?
— Eu comprei o prédio onde fica a loja dela e acho que ela não achou
muito legal.
Pedro riu.
— Você a conhece por sete anos e ainda não a entendeu?
— Às vezes, a minha vontade era apenas de não conhecer, sabia? —
Cassian coçou a nuca. — Ela sabe me deixar maluco quando quer.
— E por que você não dar a ela? — Rafael perguntou. — Tipo um
presente. Eu tenho certeza que não vai fazer falta para você.
— Acha que não tentei? Ela não quer de jeito nenhum!
Pedro bateu em suas costas de forma camarada.
— Ela te ama, cara. Vai voltar ao normal logo, logo.
•••
•••
Alguns dias depois, eu me deito no sofá em frente a piscina na casa de
Pedro. Meus óculos escuros impedem que o sol incomode meus olhos e,
pela primeira vez em um tempo, eu vesti um biquíni de novo.
O dia estava perfeito para pegar um sol e minha pele me agradeceria por
isso, pois já estava quase se tornando verde. Warren me trouxe um suco de
limão para que eu ficasse hidratada, segundo ele.
Pedro não estava em casa. Logo depois do café da manhã, ele saiu para
umas reuniões, e como eu não tinha o que fazer, resolvi me bronzear e curtir
um pouco a piscina.
Coloquei uma música no meu celular e o deixei de lado, então fechei os
olhos, curtindo o som alegre.
— Não sabia que a Itália tinha músicas além daquela que fala do furico
dos outros. — A voz familiar e debochada de Rafael soou por cima da
música.
Levantei a cabeça e ergui meus óculos quando ele se sentou ao meu lado,
capturou meu celular e olhou o nome da música na tela.
— Que música fala sobre isso? — questionei, sem entender.
— Aquela do Luciano Pavarotti. Furico li, furico lá...
Meus olhos se arregalaram e eu explodi em uma gargalhada quando
entendi de qual música ele estava falando.
— Você quer dizer funiculí, funiculá, certo?
Ele deu de ombros, um meio sorriso nos lábios e falou em italiano:
— Eu sei que é assim, mas falar do cu das pessoas é mais emocionante.
Segurei minha barriga de tanto rir dele.
— Claro que é. — Revirei os olhos, mas não consegui parar de rir. Só
depois que me acalmei, eu voltei a falar: — Pedro não está em casa.
— Ele me falou, mas eu estou aqui porque não consegui um tempo para
falar com você desde Nova York.
Anuí, ficando sentada e empurrei os óculos para cima da minha cabeça.
Eu sabia bem o que ele queria falar comigo, então apenas esperei.
Colocando meu celular de volta ao seu lado no sofá, ele se inclinou para
frente, apoiando os braços em suas pernas e olhou para mim. Eu podia ver a
preocupação neles, coisa que só tinha visto algumas poucas vezes desde que
cheguei em Miami.
— Você realmente está bem com o que está acontecendo entre você e o
Pedro?
— Sim, estou. Por que eu não estaria?
Ele deu de ombros.
— Porque eu sei como é difícil se envolver com uma pessoa depois de
ter passado em um relacionamento abusivo.
Eu encolhi e cruzei as pernas debaixo de mim.
— Pedro não é como Mattia.
Uma risada incrédula escapou de sua boca.
— Eu sei que meu irmão não é como o fodido italiano, Giulia. Mas estou
falando de você. Por mais irritante que você seja, eu me preocupo e, por
algum motivo filho da puta, eu sinto que preciso te proteger.
— Talvez seja por conta do que aconteceu com sua melhor amiga? — Eu
inclinei minha cabeça, observando-o. Meu peito contraiu com sua
preocupação por mim. Esses irmãos Rodrigues estão me fazendo apaixonar
por eles desse jeito. Eles estão me dando o cuidado que eu nunca tive na
vida.
Um brilho triste passou em seus olhos e sua mandíbula apertou. Ele
desviou os olhos de mim, fixando-os longe, na praia. O vento soprava,
bagunçando seus cabelos, levando alguns para seus olhos, mas ele nem se
importou.
Vê-lo dessa forma me deixou com o coração doendo, então eu me
aproximei e segurei sua mão, apertando de leve, o suficiente para trazer de
volta para mim.
— Independente do que te levou a ter esse senso de proteção comigo, eu
agradeço. Eu sei como sou irritante às vezes-
— Sempre. — ele interrompeu, mas eu não parei:
— Mas eu já te tenho como um irmão mais velho.
Ele fez uma careta.
— Isso significa que Pedro também é seu irmão, sabe disso, né?
Ri, meu rosto também se transformando em uma careta. Sacudi em
negativa.
— Não, você é um irmão de coração. Pedro é muitas outras coisas... —
Meu rosto corou com as lembranças de nossos momentos íntimos.
Momentos deliciosos, aliás.
Rafael beliscou o dedo da minha mão que estava sobre a sua.
— Foque na nossa conversa, não nas suas lembranças.
Sufoquei um sorriso.
— Estava tão óbvio assim?
— Você parece um tomate vermelho!
Eu cai na gargalhada de novo.
— É sério, Rafael! — reclamei, batendo em seu ombro. — Muito
obrigada pela preocupação. Eu sempre tive pessoas olhando por mim, mas o
intuito era me manter nas rédeas. Nada de namorados, amigos, nada
mesmo. Eu precisava ser uma mulher de respeito e aprender a ser a esposa
perfeita e linda para um homem rico que fizesse parte do ciclo da família.
Ele bufou, seu semblante se tornando revoltado. Mas antes que ele
pudesse falar uma de suas pérolas, eu apertei minha mão na dele e
continuei:
— A sua preocupação é diferente, assim como a preocupação do seu
irmão. Ambos me fazem sentir protegida porque se importam com meu
bem-estar, não com meu futuro casamento ou a imagem da família e dos
negócios. Eu me sinto segura quando estou perto dos dois e isso é uma
sensação tão boa, que você não pode nem imaginar. — Dei a ele um sorriso
doce. — Mesmo que briguemos um com o outro, como duas crianças de 5
anos, como seu irmão diz.
Nós rimos juntos.
— Eu até gosto de te irritar. — Confessei.
Ele estreitou os olhos.
— Eu sempre desconfiei disso. Não é possível uma pessoa ser tão chata
sem querer.
Já estava prestes a rebater com uma gracinha quando seu celular
começou a apitar com mensagens. Ele grunhiu e se mexeu, soltando minha
mão para pegar o celular dentro do bolso de sua bermuda jeans. Ele leu, seu
rosto se transformando em uma careta chateada.
— Athena? — Arrisquei. Eu tinha notado que sua relação com a loirinha
estava muito além que uma amizade simples.
— Não. — ele fez que não com a cabeça. — É Sasha.
— A ruiva chata?
Anuiu.
— Sim, a enviada do Satanás para me atentar.
Fiz uma carranca. Eu tinha visto como ele ficou no dia em que ela
terminou com ele pelo celular.
— O que ela fez agora?
— Ela quer me ver.
Indignada, me inclinei para ver o que tinha na mensagem. Meu queixo
caiu quando vi uma foto de Sasha com os peitos de fora.
— Jura que ela te manda nudes?
Ele torceu o nariz e bloqueou o celular.
— Você precisa parar de olhar ou pegar meu telefone sem permissão. —
disse ele, e eu dei de ombros, pegando meu copo de suco para tomar um
pouco. — O que foi, nunca mandou nudes para ninguém?
Fiz que não com a cabeça.
— Mattia?
Balancei a cabeça novamente, negando.
— Meu irmão?
— Não, não e não. — Eu falei com firmeza. — Eu não teria coragem. É
você que pede essas coisas?
— Eu nunca pedi nada disso. Elas apenas me mandam o tempo todo.
Eu fiz uma careta.
— Pensei que você e Athena estavam juntos.
Com uma expressão chateada, ele coçou a nuca.
— Eu também pensei, mas estava errado.
— Então voltou a falar com a Sasha?
— Não, mas ela é insistente e tem me ligado e mandado esse tipo de
mensagem que você acabou de ver.
Eu não fazia ideia do motivo — claro que fazia —, mas eu não gostava
dessa garota. Ela tinha jurava que era o centro das atenções e, se você não
concordasse com ela e não desse o que ela queria, ela ficava com raiva.
Eu sou uma pessoa mimada, não nego, mas aquela garota, conseguia ser
pior que eu.
Depois das reuniões, eu fui para o Clube encontrar alguns amigos. E, o mais
importante, eu precisava encontrar com Margot.
Eu sabia que ela costumava jogar tênis toda segunda, então eu dirigi até
lá. Desde que comecei a me envolver com Giulia, mal tinha falado com ela,
o que não foi difícil, já que ela também não tinha ligado para nos
encontrarmos.
Assim como eu, Margot tinha outros lances casuais, então com certeza
não tinha ficado sem sexo durante todos esses dias. Ela não escondia para
ninguém que era ninfomaníaca.
Quando entrei no Caliste Club, fui direto para a área que mantém as
quadras de tênis, futebol e vôlei, e também algumas piscinas. Logo
encontrei ela jogando contra o ex caso do meu irmão, Sasha Wesley.
Eu me sentei em uma das mesas do Café da área para esperar e pedi dois
copos de suco de laranja enquanto assistia o jogo das meninas.
Margot Montana era linda demais. Eu conhecia muitas mulheres bonitas,
claro, mas ela sempre chamou minha atenção. Seu corpo magro, com
longas pernas e peitos grandes me deixavam louco só de olhar, da mesma
forma que fazia com a maior parte dos homens que a olhava.
Só que agora, eu olho para ela e, apesar de achar a mesma coisa que
antes, mesmo sabendo que ela seria capaz de me deixar duro a qualquer
momento, eu não tinha vontade nenhuma de leva-la para nosso quarto de
hotel para fodermos como fazíamos. Tudo que passa na minha cabeça, é a
visão de Giulia debaixo de mim, em cima, de lado, com ou sem roupa.
Margot era linda, mas Giulia era a perfeição para meus olhos.
Enquanto estivermos nessa coisa de sexo, eu não precisaria de mais
ninguém. E era isso que eu precisava falar para Margot. Eu não queria estar
com Giulia e outra pessoa, simplesmente porque não dou aos outros o que
não quero para mim. Eu nem consigo imagina-la com outro homem lhe
tocando, então eu não tocaria em outra mulher que não seja ela.
Quando a partida acabou, Margot e Sasha se cumprimentaram e ela abriu
seu sorriso bonito quando me viu sentado. Com a raquete na mão, ela
caminhou para mim.
— Ei, sumido. — ela brincou.
Eu me levantei, e ela beijou meu rosto antes de se sentar na cadeira na
minha frente. Sentei-me novamente e acenei para o outro copo de suco
intocável.
— Pedi para você.
— Oh, obrigada. — Ela pegou o copo e bebeu um pouco. Pousou sua
raquete sobre a mesa, seus olhos azuis me olhando com curiosidade. —
Você não está aqui para me levar ao hotel, certo?
Balancei a cabeça, sorrindo.
— Não. Era o que você esperava?
Ela bufou com um sorriso divertido.
— Eu ficaria surpresa se me chamasse. — declarou. — Como estão as
coisas com Giulia?
Alcei a sobrancelha e, mais uma vez, ela bufou:
— Fala sério, Pedrinho. Eu te conheço há anos. Eu fodi com você há
anos, então sei te ler como ninguém faz. Era meio óbvio que alguma coisa
aconteceria com vocês. Por que acha que eu tenho me mantido afastada
desde que você arrebentou a cara do filho da puta do Mattia? Eu vi como
você ficou transtornado e preocupado com a Giulia.
Eu sabia que ela estava certa, no entanto, ainda queria rebater. Impedir
que meus lábios se transformassem em um sorriso e disse:
— Todo mundo ficou, não fui o único.
Ela assentiu.
— Claro, mas eu olhei nos seus olhos, bebê. Não era preocupação de
amigo ou irmão mais velho, como foi comigo ou com Rafael. Você estava
atraído pela gata italiana.
Cocei a nuca, lembrando daquele dia. Eu fiquei louco de raiva e depositei
todo ódio na cara perfeita de filhinho de papai que Mattia tem. Eu não me
lembrava de muita coisa, mas lembro como meu coração diminuiu,
apertando com violência enquanto voltávamos para o hotel e eu assistia
Giulia encolhida e chorando. A sensação era estranha. Era como se o fodido
tivesse machucado algo que era meu, que eu precisava proteger.
E, sim, eu havia notado Giulia desde o primeiro dia em que a vi deitada
na minha cama de hotel, descansando da viagem. Era impossível não notar
as curvas perfeitas do seu corpo, as pernas grossas, bunda empinada e seios
médios que se encaixavam bem em seu corpo pequeno. Eu sempre estive
atraído por ela, mas até o dia em que a peguei com um vibrador no banheiro
do seu quarto, eu me segurei, sem querer me envolver e acabar com uma
discussão com o seu pai.
— Você sabe que estou certa. — Ela me deu um sorriso de felina, como
quem sabia do que estava falando. — Eu sempre estou certa.
— Você está certa. — Confirmei, com um aceno de cabeça.
Ela suspirou, teatralmente, pegou o copo e bebeu mais um pouco do seu
suco.
— Ai, ai. Eu sei que estou. — cantarolou, brincalhona, Em seguida,
estudou meu rosto por um instante, balançou a cabeça e lambeu os lábios
quando colocou o copo de volta a mesa com cuidado. — Pode parar.
Olhei-a sem entender.
Ela gesticulou em minha direção.
— Não sou nenhuma piranha louca, que vai surtar e começar a bolar
planos para separar vocês dois porque, por algum motivo, não posso viver
sem sua pica de ouro.
Engasguei em uma risada surpresa.
— Pica de ouro?
— É, esses lances malucos de livros e novelas. — Ela revirou os olhos.
— A Mad conta comigo para resolver os perrengues da empresa, portanto,
sou muito ocupada para ficar pensando sobre essas coisas. E, você sabe que
eu posso ter o homem que eu quiser no meio das minhas pernas. Até dois,
se for nos meus dias mais safados.
— Sei bem disso.
Ela se debruçou sobre a mesa, me olhando por baixo de sua viseira e me
deu um sorriso amigável e gentil.
— Qual é, Pedro! Sou sua amiga desde sempre e sabia que isso um dia
iria acontecer. Se não fosse com você, talvez fosse comigo.
— Não poderíamos acabar nos casando? — Sugeri, só para saber onde
iria dar.
Seu sorriso aumentou.
— Teríamos bebês lindos. — ela se divertiu. — Mas, no fundo, sempre
soubemos que acabaríamos como amigos. E eu simplesmente me apaixonei
pela italiana! Eu super shippo vocês dois.
— Super shippa? — Sorri, incrédulo. Essa era uma coisa que eu nunca
imaginei ouvir de Margot.
Ela riu, deu de ombros e pegou seu copo para terminar o líquido laranja.
Era o aniversário de Giulia.
Ela havia ficado até tarde lendo um livro e acabou não acordando hoje
para nossa corrida matinal, nem apareceu no café da manhã. Antes de sair
para trabalhar, eu subi ao meu quarto, onde a encontrei ainda deitada na
minha cama japonesa. Seus cabelos estavam espalhados em meu travesseiro
e suas mãos estavam enfiadas debaixo do seu rosto enquanto ela estava em
posição fetal.
Ajoelhei-me ao seu lado e pressionei meus lábios em sua têmpora,
desejando beijar sua boca e reivindica-la por toda a manhã, mas como era
seu dia especial, eu a deixaria descansar mais um pouco.
Quando joguei a chave do meu carro para o manobrista do hotel, assisti
meu irmão estacionar sua Ducati Superleggera v4 e descer. Ele retirou seus
óculos escuros com uma careta e entregou sua chave para outro manobrista,
junto com seu capacete.
— Ei, feliz aniversário! — Eu o puxei em um abraço, e ele gemeu em
frustração.
— Valeu, cara. — Ele se afastou, o nariz torcido.
— O que houve?
— Mulheres. O que mais seria?
Ri, sacudindo a cabeça enquanto subíamos em direção às escadas.
— Athena está dando problemas?
— Antes fosse. — resmungou. — Eu gosto dos problemas que Athena
me dar. É a Sasha que não me deixa em paz.
— E você não quer mais nada com ela?
Ele empurrou a porta de vidro, a expressão indignada, deixando-me
entrar primeiro:
— Ela acabou comigo pela porra de um telefone! É claro que não quero
nada, mas acho que ela está sentindo falta da atenção, porque não para de
pegar no caralho do meu pé e eu estou prestes a jogar meu celular na caceta
da parede!
Eu segurei em seu ombro quando nossa equipe nos alcançou.
— É seu aniversário, Rafa. Se acalme só por hoje, ok?
Ele bufou, completamente sem paciência. Quando entramos no elevador,
ele se encostou na parede de aço e cruzou os braços, irritado.
Arrisquei um sorrisinho para ele:
— Sabia que hoje também é o aniversário de Giulia?
Ele franziu a testa.
— Sério?
— Sério. Isso diz muita coisa sobre vocês, não acha?
— Do que está falando?
Ri mais um pouco, enfiando as mãos nos bolsos.
— Vocês são muito parecidos. Se eu soubesse que você não era meu
irmão de verdade, apostaria que era o irmão dela.
— Há-há. — Ele torceu o nariz de novo, fechando a cara. — E você é
claramente a alma gêmea dela, todo cheio de gracinha. De repente, todo
mundo está com gracinha para o meu lado!
As portas do elevador se abriram no andar em que ficava a sala de
reuniões, e ele saiu irritado, comigo logo atrás rindo da sua situação.
•••
Eu também não parava de pensar nela durante todo o dia, como a porra
de um maníaco possessivo do caralho. Eu sentia que poderia morrer se não
estivesse enterrado nela, pelo menos, em algum momento do dia.
Segurando minha mão, sem dizer mais uma palavra, Giulia me levou
para piscina. Ela desceu pelas escadas, e eu a segui. A água estava morna,
com aquecedor ligado por conta do tempo frio. Quando estávamos dentro, a
água chegando ao meu peito, ela veio montar em mim, abraçando-me com
as pernas e braços.
Eu estava com muito tesão para dizer algo, então apenas a beijei,
espremendo seu corpo contra o meu. Instigando, ela pincelou sua língua
macia na minha, aprofundando o beijo, e uma mão minha subiu e se fechou
em seu pescoço. Meu lado insano e exigente queria muito assumir o
controle, e quando ela gemeu com a forma áspera em que a segurei pela
garganta, eu sabia que ela iria gostar.
Virei-me com ela no braço e a levantei, colocando-a sentada no degrau
mais alto da escada.
— Você vai precisar apoiar as mãos atrás de você.
Ela me olhou sem entender, seus olhos pesados de desejo. Eu segurei a
sua bunda com as duas mãos, puxando-a para cima da água, e ela soltou um
gritinho surpreso e fez o que eu disse.
— Você vai me chupar aqui? — Seus olhos dispararam para a casa, que
tinha as paredes em vidro.
— Os sofás estão impedindo sua visão, porque eu não sou louco de
deixar ninguém ver sua boceta, Giulia. — Dei a ela um sorriso pervertido.
— E eu disse que iria comer você aqui. Como achou que seria?
— Dentro da água, onde poderíamos nos esconder, caso Warren
resolvesse aparecer.
Balancei a cabeça.
— Vamos chegar lá. — Afastei sua calcinha para o lado, gemendo com a
visão molhada de sua boceta, os lábios inchados e bonitos. — E Warren está
resolvendo uma coisa para mim. Não se preocupe.
A minha cabeça abaixou e eu lambi a água antes de fechar minha boca na
pequena boceta. Eu a beijei com vontade, como se tivesse beijando a boca
de Giulia.
A mulher se contorceu, empurrando seus quadris para minha boca, em
busca do máximo de prazer que ela conseguiria com isso. Os gemidos
abafavam o som das ondas tranquilas do oceano. Seu gosto era tão bom,
que eu ficaria aqui o tempo inteiro, se pudesse.
— Pedro... — Ela implorou, choramingando.
Eu ri contra sua intimidade, exultante com a reação do seu corpo. Eu a
devorei da forma que eu gosto: sem hesitação, sem delicadeza. Enfiando
meu dedo nela, comecei a meter rapidamente enquanto a suspendia com
uma mão.
— Oh Dio! — Ela sufocou, seus olhos se fechando. Então ela fez algo
que me deixou insano:
Apoiando-me nos cotovelos, Giulia puxou a parte de cima do biquíni
para o lado, liberando seus seios perfeitos e os apertou, como se aquilo
fosse ajudar a liberar a tensão gostosa de seus músculos.
Acrescentei outro dedo, os torcendo bem fundo quando suguei seu
clitóris, logo em seguida, sacudindo minha língua nele. O corpo pequeno de
Giulia estremeceu de forma violenta em um orgasmo e ela gritou junto,
resmungando em italiano algo do tipo “oh, merda! Merda, merda, merda!”.
Meu sorriso estava radiante quando a puxei para meus braços de novo, já
colocando minha cueca para baixo e procurando me posicionar em sua
entrada. Assim que voltamos de NY, eu insisti para que fossemos em uma
nova consulta. Não que eu duvidasse que ela tomava anticoncepcional, mas
queria fazer direito.
Ela foi a uma nova ginecologista, que acabou mudando sua injeção para
uma, segundo ela, seria bem melhor para o organismo de Giulia. E eu refiz
meus exames. Desde então, não temos nos preocupado com camisinhas,
apesar de que eu ainda estava com um pé atrás sobre isso.
Giulia era jovem e, mesmo sabendo que eu nunca a deixaria na mão,
caso rolasse uma gravidez, eu não tinha certeza se ela gostaria disso agora.
No entanto, sem tempo de discutir de novo sobre isso, porque meu pau
estava muito duro e dolorido, eu a segurei e a abaixei seu corpo mole do
orgasmo anterior. Ela era tão apertada e quente ao redor do meu pau.
Sua cabeça caiu para trás, com um gemido de deleite puro. Eu aproveitei
para sugar um pouco do seu pescoço.
Ela me segurou como se dependesse daquilo para viver, para respirar,
enquanto eu a guiava para cima e para baixo em minha dureza, devagar no
começo, deixando seu corpo acostumar com a invasão. Assim que ela
mesma começou a quicar e nossos gemidos começaram a ficar mais altos,
eu aumentei a pressão.
Giulia segurou meu rosto, seus peitos pulavam juntos com ela, seus olhos
pegaram os meus:
— Eu amo fazer isso com você. — Ela declarou, sua boca raspando na
minha. — Você fica tão perfeito dentro de mim... e com a água é...
— Ainda melhor. — Completei, mordiscando seu queixo.
Ela acenou, como se estivesse em outro mundo, bêbada.
— Eu amo fazer isso com você também.
Seus olhos cor-de-mel se arregalaram, mas ela apenas sorriu lento e
quicou com mais força.
— Eu vou gozar de novo.
Eu a pressionei para baixo, até que sua vagina começou a roçar em
minha virilha, causando o atrito perfeito.
— Goze no meu pau. — Ordenei, indo mais e mais fundo.
Sua boceta se apertou ao redor do meu pau, deixando-me ainda mais
selvagem, então eu meti mais rápido e nós dois gozamos juntos. Ambos
estremecendo com violência. Ela se agarrou em mim, e eu a abracei pela
cintura para não a deixar deslizar enfraquecida.
Foi a primeira vez que gozei junto com ela e foi a melhor sensação da
porra da minha vida.
Depois do nosso sexo na piscina, subimos para tomar um banho e se trocar.
Pedro falou que teríamos um jantar especial por conta do meu aniversário e
o de Rafael, então, para não acabarmos em outra sessão de foda intensa, eu
optei por me arrumar em meu quarto. Ele não ficou satisfeito, mas não
discutiu.
Eu tinha optado por um vestido preto de alcinha, que delineava bem meu
corpo e ia até a parte de cima das minhas pernas. Isso me deixou um pouco
hesitante, o que me deixou mal.
Olhando-me no espelho, eu sabia que Pedro iria amar no meu corpo. Ele
sempre parece amar tudo que eu visto. Mas Mattia conseguiu plantar isso na
minha cabeça e não é tão fácil de arrancar de lá, por mais que eu tentasse.
Eu precisava de ajuda para isso, mas hoje era meu aniversário e eu não iria
deixar isso me afetar.
Eu encerro, soltando meu cabelo do nó que estava preso no alto da minha
cabeça e sento-me na beira da cama para prender as tiras da minha sandália
de salto alto ao redor dos meus tornozelos.
Descendo as escadas, avistei Pedro na sala de estar junto com Rafael e
Athena. Ele correu os olhos pelo meu corpo, admiração brilhando nas íris
escuras. Estava usando uma camisa social preta, com as mangas dobradas
até os cotovelos e os primeiros botões abertos. Como sempre, perfeito, de
dar água na boca.
Rafael estava com uma camisa parecida, mas na cor azul-marinho. E o
vestido de Athena era vermelho, com um decote generoso e muito sexy. A
forma como Rafael a olhava, me fez querer rir. Ele foi o primeiro a me
abraçar quando, finalmente, cheguei perto.
— Feliz aniversário, chatinha.
Eu ri e beijei seu rosto.
— Feliz aniversário, coisa sem paciência.
— Eu sei que você gosta de ler esse tipo de coisa, então, comprei para
você. — Ele me entregou uma sacola bonita e pesada.
Pega de surpresa, com um sorriso bobo, eu me sentei no sofá porque era
bastante pesado. Abrindo, encontrei uma série de 10 livros de Christina
Lauren, chamada Cretino Irresistível. Meus olhos brilharam com carinho
para ele. Desde que cheguei aqui, tenho lido bastante e fico feliz em receber
livros de presente de aniversário.
— Vou ler todos com muito carinho. — eu disse para ele, levantando-me
para lhe dar outro abraço apertado. — Pedro só me disse que era seu
aniversário também agora pouco, então, por isso não deu tempo de comprar
nada para você. Mas prometo que amanhã mesmo resolverei isso.
Ele balançou a cabeça e apertou a ponta do meu nariz com um sorriso
maroto.
— Não se preocupe com isso, eu não ligo muito para esse tipo de coisa.
Pedro limpou a garganta, como se dissesse “Ah, jura?”, e seu irmão
soltou uma risada, apontando para ele.
— Só ligo para os seus presentes, porque eles sempre são os melhores,
mano.
Ele me contou que havia dado uma moto nova para o irmão mais novo.
Sacudindo a cabeça, Pedro me puxou pela mão para que eu ficasse mais
perto dele. Sem tirar os olhos de mim, ele alcançou uma caixa de veludo
que estava perto.
— Agora é a vez do meu presente.
Encantada, peguei a caixa. Minhas mãos tremiam de ansiedade. Dei uma
olhada incrédula para ele:
— Falei que não precisava.
— Você merece. — Ele acenou com o queixo para que eu abrisse logo.
Eu fiz e meu peito apertou com a simplicidade do presente. Era um colar
de ouro, com um pequeno pingente em formato de um pé de bailarina. Na
ponta da sapatilha havia um diamante.
— Pedro, isso é tão lindo! — Meus dedos traçaram a corrente delicada.
Eu já havia ganhado algumas joias durante minha vida, mas todas eram com
a intenção de chamar atenção quando eu chegasse ao local. Nenhuma delas
era tão pequena e simples como essa era.
— Deixe-me ajuda-la a colocar. — Ele pediu, e eu anuí.
Ficando de costas, arrastei meus cabelos para o lado e permiti que ele
colocasse o colar em meu pescoço. Eu o toquei com cuidado sobre meu
colo e abri um sorriso radiante quando me virei de volta para Pedro.
— Grazie. — Minha voz mal saiu com a felicidade envolvendo minha
garganta. — Sério, foi o melhor presente que alguém já me deu.
Um som incrédulo soou, e todos rimos quando percebemos que Rafael
quem o fez:
— Não é legal da sua parte dizer isso quando eu acabei de lhe entregar
um presente!
— O seu também foi maravilhoso, bambino. — Garanti. — Vou devora-
los amanhã mesmo.
Athena veio me felicitar por último. Ela era uma mulher linda e
combinava bastante com Rafael. Mil vezes melhor que a ruiva mal amada.
Seus cabelos dourados estavam soltos e rebeldes e seu batom combinava
perfeitamente com o vermelho de vestido.
— Pensei que estava em Chicago. — eu disse.
— Pois é, eu estava, mas eu prometi que estaria aqui para o aniversário
de Rafael. — Ela deu uma espiada nele e sorriu. Quando ele devolveu o
sorriso, eu captei os sentimentos que já estavam impregnados neles.
Warren apareceu e pediu para que fossemos para a parte externa.
Sentindo a mão de Pedro nas minhas costas, eu caminhei para a área da
piscina e fiquei boquiaberta quando notei a mesa repleta e linda.
Tinha de tudo. De comida italiana a comida brasileira. Até mesmo
comida japonesa. Nós nos sentamos na mesa e o cheiro de lasagna chegou
nas minhas narinas, e eu gemi com água na boca.
Pedro tinha me levado para comer isso em nossa primeira sessão de
compras, mas era como se já fossem anos sem comer.
Eu me sentei de frente para a piscina e isso trouxe as recordações do que
aconteceu lá mais cedo. Corei com força enquanto os outros se
acomodavam e arrisquei uma olhada para Pedro, que me deu um sorrisinho
de lado, levado, sabendo exatamente o que eu estava pensando. Balancei a
cabeça, quase revirando os olhos, mas não consegui impedir meus lábios,
que formaram um grande sorriso conhecedor.
— Hum, eu amo sushi! — Athena bateu palminhas, ansiosa com toda a
comida em nossa frente.
— É por isso que eu falo para você que somos almas gêmeas. — Rafael
cutucou a costela dela com um dedo, fazendo-a se remexer com cócegas,
enquanto ele pegava uma peça de sushi com seus hashis, o melava no
molho. Ele o levou em direção à boca de Athena, mas quando os lábios dela
se abriram animados, ele mudou o percurso e o enfiou em sua própria boca,
rindo da cara dela.
Deixei uma risada escapar quando vi a cara feia que ela fez para ele.
Pedro sacudiu a cabeça, com uma risadinha baixa. Ele estava encostado em
sua cadeira, de forma desleixada, observando-nos. Sua postura estava
tranquila, como sempre e quando seus olhos escorregaram de volta para
mim, arfei com a intensidade.
Eu estava amando esse jantar que ele arrumou para nós, mas é claro que
eu preferiria estar deitada em sua cama, com ele embalando meu corpo ou
apenas dentro de mim. O dia todo, enquanto ele estava fora, eu pensei sobre
isso. Tentei fazer outras coisas, ler, focar minha mente, mas só vinha ele.
A cada passo que eu dava pela casa.
A cada parágrafo que eu lia.
A cada momento desse dia eu só queria vê-lo chegar para abraça-lo e
sentir seu corpo no meu.
O que fizemos na piscina foi perfeito, delicioso, e eu nunca pensei que
ele fosse capaz de deixar o sexo ainda melhor. Eu estava enganada.
— Eu pedi que fizessem bistecca alla fiorentina para você. — Pedro me
disse, indicando a travessa com os bifes bem suculentos. Os meus favoritos.
Olhei para ele, espantada.
— Como sabia que era meu favorito?
Seu sorriso se tornou radiante, lindo.
— Liguei para sua mãe, e ela me contou que era seu prato favorito, logo
depois da lasanha.
Minha boca se abriu em surpresa. Eu nunca tinha contado isso para
ninguém, nem mesmo para minha mãe, então era estranho ver que ela sabia
disso.
Enquanto ele pegava a garrafa de vinho e colocava para todos na mesa,
eu me servi com a bistecca alla fiorentina, minha boca cheia d’água.
Depois, eu pegaria um pouco de lasagna e experimentaria os pratos
brasileiros, mas agora, eu iria matar minha saudade.
Cortei um pedaço da carne e quando a maciez atingiu minha língua, eu
gemi, fechando os olhos, me deliciando com aquela coisa gostosa.
Perfetta.
Aparentemente, o som que eu fiz, chamou a atenção de Pedro. Ele estava
se servindo com um prato brasileiro que continha arroz, feijão, carne seca e
queijo, tudo misturado, mas sua mão congelou no meio do caminho do seu
prato, com a colher cheia de comida, e seus olhos piscaram para mim. Sua
expressão gritava excitação, como se ele me perguntasse “Quer subir para
o quarto?”.
Meu coração bateu forte e duro dentro do meu peito. Sim, eu adoraria,
mas meu gemido agora era voltado para minha comida. Com um sorrisinho
forçando para sair em meus lábios, eu coloquei outro pedaço de carne na
boca e mastiguei.
Ele riu e piscou um olho para mim antes e continuar a se servir.
Rafael estava relaxado, seu braço descansando a parte de trás da cadeira
de Athena. Eles pareciam mais próximos, o que me leva a acreditar que o
problema que estava acontecendo entre eles da última vez que conversei
com Rafael, já foi resolvido.
Athena mastigou seu sushi, torcendo o nariz para ele em brincadeira. Em
seguida, ela bebeu um pouco de seu vinho. Rafael sorriu, extasiado com sua
parceira. E meu peito explodia de satisfação em vê-lo assim, leve, sem a
impaciência corriqueira ou a tensão que seus ombros carregavam sempre
que Sasha o infernizava com mensagens e ligações. Eu ainda diria umas
poucas e boas para ela em breve.
Minha atenção é puxada para o meu parceiro quando sua mão grande
envolve minha perna por baixo da mesa, arrepiando todo o meu corpo. Seus
olhos quentes me consomem por completo enquanto ele toma um pouco do
seu vinho, em seguida, lambe os lábios com sua língua perfeita. Isso atrai
meus olhos para sua boca, ansiando por um beijo seu.
Como seu irmão, ele se inclina, colocando um braço no encosto da
minha cadeira. O vento balança nossos cabelos e leva os deles — um tanto
grandes já — para sua testa. Ele me dá um sorriso secreto e erótico quando
pega uma garfada de sua comida e força na direção da minha boca:
— Experimente. — Ele pede, e eu não hesito em envolver meus lábios
em volta de seu garfo.
Era um gosto diferente, porém gostoso. Deixei um som de satisfação
escapar e acenei em positivo.
— Que delícia! Como se chama?
— Baião de dois. — Ele respondeu. — Comida típica do nordeste do
Brasil.
— E um dos meus pratos favoritos. — Rafael completou, orgulhoso. —
Se achou esse gostoso, espere até experimentar um feito pela nossa prima,
Thammy. É perfeito. Aquela garota sabe como nos fazer delirar por uma
comida.
— Mmm. Eu adoraria experimentar o dela, então.
— Você vai, um dia. — Pedro garantiu com os olhos brilhando.
Nós seguimos conversando animados e divertidos. Foi engraçado ver que
Athena conseguia deixar Rafael mais leve, mais paciente, como se perto
dela, ele não ficasse chateado. Eu também estava mais tranquila e, pela
primeira vez, me sentia em casa de verdade. Esse simples jantar que Pedro
fez questão de fazer, com as minhas comidas favoritas e as de seu irmão, foi
de longe o melhor aniversário que eu já tive.
Com o melhor presente. As melhores pessoas.
•••
•••
Assim que nos sentamos na mesa, meu irmão apareceu. Ele tinha um
sorriso gigante, de orelha a orelha quando viu nossa mãe. Se sentou ao lado
dela e se deixou ser mimado quando ela o apertou e o encheu de beijos pelo
rosto.
— Quem diria que você era um filhinho da mamãe, Rafa. — Giulia
comentou, brincando com ele.
Sua mandíbula contraiu quando ele olhou feio para ela.
— Eu não sou, apenas estava com saudades da minha mãe.
— Giusto, giusto. — Ela escondeu o sorriso com um gole de seu suco.
Sabendo onde isso ia dar, eu sorri e me concentrei em meu Kindle,
deixando que eles se resolvessem, como sempre.
— Mas você é meu bebê mais novo, sim. — A mãe falou, apertando suas
bochechas. Era a única pessoa que conseguia fazer meu irmão se derreter e
se desmanchar fácil em um sorriso.
— Que fofo! — Giulia entrelaçou as duas mãos, seus olhos brilhando
enquanto ela observava a interação entre mãe e filho. — Você fica tão
lindinho assim, todo derretido para sua mãe.
Rafa mostrou a língua para ela, e ela devolveu.
Eu ainda não conseguia acreditar que duas pessoas adultas poderiam
brigar desse jeito.
Após algum tempo, minha mãe se virou para mim e perguntou:
— Querido, você disse que tinha uma surpresa para mim. O que é?
— Ainda não. — Balancei a cabeça. — Amanhã nós iremos para French
Rivera e só lá você vai descobrir.
Seus olhos escuros se arregalaram. Eu podia ver as lembranças do meu
pai passando por eles.
— Nós vamos?
Anuí com firmeza.
— Amanhã cedo.
— E o que vamos fazer lá?
— Você vai ver.
— Pedro, eu nem vou conseguir dormir, pensando sobre isso. Você sabe
como sou ansiosa.
Dou de ombros, meus lábios se curvando com diversão ao ver sua cara
de desespero.
— Ansiosa, não. Como foi mesmo que você disse lá dentro? — Ergui um
dedo em riste, meus olhos se apertando, fingindo que estava ponderando. —
Ah, sim. Curiosa.
Com ofensa fingida, ela alcança um pão de queijo e o lança em mim, mas
eu sou mais rápido e o pego antes que ele chegue ao meu rosto. Dou uma
mordida, rindo dela.
Rafael riu também, mas se inclinou e beijou seu rosto, dando a ela o seu
sorriso de menino doce — que ele só dar para ela —, e diz:
— É uma boa surpresa, mãe. Não se preocupe.
•••
•••
•••
•••
— Per Dio, pode me dizer o que está acontecendo? — Giulia quis saber,
já muito nervosa, quando entramos no nosso quarto com minha mãe e
Rafael. — Por que vocês dois estão tão nervosos assim? E por que a Margot
precisa fazer um contrato de confidencialidade?
— Andem, meninos, falem! — Minha mãe colocou as mãos na cintura.
Ela estava parada bem ao lado de Giulia, ambas nos enviando olhares
assassinos e curiosos.
Com uma carranca, meu irmão atravessou o quarto, indo direto para o
frigobar, pegando a bebida mais forte dali.
Eu deixei uma respiração brusca escapar e abri o vídeo no meu celular,
entregando para as duas. Enquanto elas assistiam, eu observei a reação de
Giulia.
A minha estava segurando o celular, então não tinha como ele cair
quando os ombros de Giulia caíram e seus olhos se encheram de lágrimas.
Dor.
Era isso que eu sentia, vendo-a chorar. Isso acabava comigo.
Ela começou a pisar para trás, o mais longe possível do vídeo. Minha
mãe desligou o celular, horrorizada. Giulia olhou para mim, sua cabeça
inclinada, chorando.
— Como... — ela acenou para minha mãe, soluçando. — Como você...
— Mattia enviou para um blogueiro famoso postar, mas, por sorte, esse
cara conhece minha chefe de relações públicas.
— E-ele vai... postar?
Sacudi a cabeça rápido, indo para perto dela.
— De jeito nenhum. Ele quer dinheiro, e eu darei. — prometi, pegando
sua mão para impedi-la de ir mais para trás. — Por isso preciso do contrato,
para que ele apague tudo que tem.
Ela soluçou baixinho, balançando a cabeça, assustada.
— Por que ele está fazendo isso? — Ela me perguntou. — Ele já não me
humilhou o bastante?
— Porque ele é um filho da puta sádico, Giulia.
— Eu juro que eu não sabia que ele estava filmando!
— Eu sei que não. — A puxo para mim, abraçando-a forte.
Ela enfia o rosto no meu peito e se permite chorar mais.
— Minha nossa. — Minha mãe se senta no sofá, mas ela não parece
muito perturbada. Está mais preocupada, a expressão é séria, quase
profissional. — Esse garoto tem sérios problemas.
— Jura, mãe? — Rafael soou irônico depois de tomar um gole de uísque
direto do gargalho da garrafa. — Ele sempre foi um psicopata do caralho e
todo mundo sabia disso. As únicas diferenças de antes para agora é que Ana
não aguentou e se matou, e não deu tempo pra ele gravar a porra de um
vídeo!
Giulia tremia em meu aperto, então caí sentado em um sofá e a levei
junto. Ela se aninhou em meu peito de novo, ainda chorando.
— Ele já acabou comigo. — Ela escondeu o rosto com as mãos. — Me
humilhou na frente de todas aquelas pessoas, brincou com meus
sentimentos, destruiu minha autoestima e agora isso? O que falta mais para
ele fazer?
— Giulia — eu a chamo, minha voz muito séria quando pego em seus
pulsos e tiro suas mãos do seu rosto molhado e avermelhado. —, ele não
fará absolutamente nada com você outra vez. Eu não vou deixar, você
entendeu? Nunca mais alguém vai machucar você. Nem ele, nem ninguém.
Com o queixo tremendo, ela assentiu.
Eu beijo seu nariz, enxugando seu rosto com meus dedos.
— Eu preciso ligar para Margot agora. Eu vou resolver tudo isso, te
prometo.
— Va bene. — Ela engoliu em seco.
— Vá deitar um pouco. Depois que eu terminar, vou encontrar você.
— Eu preciso de um banho. — Ela se levantou devagar, nos deu uma
última olhada e foi para a suíte.
A minha mãe também se levantou e tocou meu braço.
— Faça o que for preciso, querido. Não o deixe vencer dessa vez.
Assenti com firmeza, meu coração destruído por saber que Giulia está
mal de novo.
— Eu não vou.
— Ótimo. — Ela me beija no rosto. — Vão lá e acabem com isso. Não
se preocupe, eu cuidarei dela o tempo que for preciso.
Depois que minha mãe foi ao encontro de Giulia, eu e Rafael fomos para
o escritório do quarto, e começamos a organizar as coisas.
Eu podia sentir a raiva circulando meu corpo através das minhas veias.
Eu queria matar Mattia, bem lentamente. Queria mostrar para ele que eu
posso sair do sério como qualquer outra pessoa.
Quando tudo aconteceu com Ana, não podíamos provar porque o abuso
era psicológico e ela nunca quis admitir isso. Mas agora, ele foi muito além
do abuso. Ele quer expor algo íntimo, faze-la se sentir ainda pior do que já
estava, e tudo porque ele não conseguiu ir até o final com sua manipulação.
Eu não deixaria isso acontecer. De jeito nenhum.
Disquei o número de Margot e a coloquei no viva-voz para Rafael poder
escutar também. Ela atendeu no primeiro toque:
— Eeei, moço. Conte-me as novidades!
Duas semanas se passaram e eu já estava bem melhor. Nos últimos dias
conversei com Polly, que acabou me aconselhando e comecei a fazer terapia
com uma psicóloga conhecida dela. As sessões têm me ajudado a entender
melhor tudo que aconteceu durante toda minha vida.
Eu entendi que acabei me envolvendo com Mattia, como se ele fosse
minha tábua de salvação, porque foi uma forma que encontrei de escapar do
relacionamento abusivo e controlar que eu tinha com meus pais. Eles me
privavam de tudo. Sem amigos, sem saídas, sem namorados. Era uma
criação severa, onde tudo que importava era que eu tivesse um ótimo
comportamento para não manchar a imagem da família que eles
empregaram. Disso, eu já estava ciente. O que eu não sabia era que pessoas
com esse tipo de criação tendem a procurar parceiros com os mesmos
traços, porque nosso subconsciente acaba aceitando que aquela forma de
viver é a correta.
Gostei tanto, que estou fazendo duas vezes na semana. A dra. Lush até já
me pediu para fazer alguns “deveres de casa” como escolher uma roupa que
eu me sinta confortável e realmente goste para sair, sem pedir a opinião de
ninguém. Estamos trabalhando na minha autoestima, e eu estou muito feliz
que em apenas duas semanas, eu estou melhorando bastante.
Há mais ou menos uma semana, recebemos a notícia de que Mattia havia
sido encontrado morto. Ninguém ainda sabia o que havia acontecido, mas
eu procurei não me envolver nisso e focar na minha melhora.
Hoje, Pedro decidiu trabalhar de casa. Ele se sentou, relaxadamente, em
seu sofá em formato de espreguiçadeira com o laptop e o celular, enquanto
eu nadava um pouco na piscina.
Observando-o de longe, senti minha boca secar. Sim, ele era lindo
demais. E sim, eu já pensei isso muitas vezes, mas é simplesmente
impossível não o desejar. O homem era gato, com mais de 1,90 metros, um
corpo bem estruturado, gominhos maravilhosos e ainda fazia sexo
deliciosamente.
Eu precisaria ser uma lésbica para não babar por ele.
Sentindo-me necessitada — o que não era uma novidade —, saí da
piscina devagar e comecei a caminhar até ele. Percebendo meus
movimentos, ele colocou o laptop de lado e me olhou sob os óculos escuros.
Prendendo o canto do lábio inferior com os dentes, sorri, segurei em seus
ombros e o montei.
— Ops. — brinquei, acenando para os lugares onde eu o molhei. —
Sinto muito, você ficou todo molhado.
Ele sorriu, uma expressão safada em seu rosto bonito. Suas mãos
seguraram minhas nádegas e apertou. Eu gemi e desci minha boca na sua.
Era perfeito. Eu amava como seus lábios e língua me deixavam nas
nuvens, necessitada de mais.
Mas esse efeito durou pouco porque a voz do meu pai encheu o lugar, me
assustando:
— Eu peço para você cuidar da minha filha, e você começa a comer ela?
Rapidamente, saí de cima de Pedro, todo o meu corpo tremendo, a
confusão e a surpresa me deixando de boca aberta. Eu gaguejo alguma coisa
enquanto alçando minha saída de banho preta e a visto com pressa, em
seguida cruzo os braços sobre o peito para tentar esconder minha quase
nudez dos meus pais.
— Babbo!? O que está fazendo aqui? — Quando olho para minha mãe,
ela está chocada, olhando-me como se eu fosse alguém que ela desconhecia.
Ela estava com nojo. Eu me encolhi.
— Bom, eu só queria ver com meus próprios olhos. — Ele acenou entre
Pedro e eu, mas sua expressão não era da forma severa como costumava ser.
Era estranha. Uma expressão que eu nunca tinha visto em seu rosto.
Pedro, calmamente, se levantou e acenou com a cabeça para meus pais.
Como ele estava tão calmo agora?
— Como chegaram na minha casa? — foi a única coisa que ele
perguntou.
Babbo deu de ombros, olhando-o com uma sobrancelha erguida.
— Só precisei pagar alguém para seguir vocês. — disse ele. — Não
demorou muito para descobrir onde era sua casa. — Ele olhou ao redor, os
cantos de seus lábios curvados para baixo. — Aliás, é uma bela casa. Eu
gostei. Bem melhor que uma suíte de hotel. — Então seus olhos cor-de-mel
como os meus pousaram em mim, e eu me arrepiei com a frieza neles, a
malícia: — Tudo que você sempre quis, Giulia.
Pedro olhou para mim, o cenho franzido. Era exatamente essa reação que
o tom de voz do meu pai buscava.
Eu apertei mais meus braços ao meu redor e dei um passo a frente.
Perguntei em italiano:
— Do que você está falando, babbo?
Eu sonhava em ter uma casa com Mattia, claro. Quando você cresce em
um hotel, tudo que você mais deseja é ter uma casa com privacidade, e não
um lugar cheio de gente indo e vindo, onde todas as refeições precisam ser
pedidas e a piscina compartilhada. Eu queria paz, um lugar meu, onde eu
pudesse fazer o que quiser sem a sensação de que alguém está observando.
Mas a forma quase irônica que ele falou, me deixou com uma pulga atrás
da orelha. E, pela cara de Pedro, ele também tinha percebido. Eu nem
consegui olhar em sua direção.
— Ah, pelo amor de Deus, querida! Não seja tímida, diga a verdade.
Não tem para quê mentir mais. — Ele respondeu.
— Que verdade? — Pedro questionou em inglês ao mesmo tempo em
que eu fazia em italiano.
Seus olhos frios voltaram para Pedro e o sorriso que ele abriu me causou
arrepios. Foi sinistro.
— Bene, bene. — Babbo meneou a cabeça devagar. — Eu sinto lhe dizer,
meu querido, mas a minha filha linda não veio para cá sem um propósito.
Eu precisava casa-la com um bom partido, e quem melhor que você para ser
seu marido?
Algo dentro da minha cabeça estalou e eu engasguei, chocada.
A cabeça da minha mãe virou rápido para meu pai, os olhos arregalados,
tão surpresa quanto eu.
— Infelizmente, teve o imprevisto com o menino Mattia, mas depois ela
conseguiu se reerguer, não é mesmo? Ela conseguiu conquista-lo direitinho.
Há até fotos dos dois de mãos dadas na mídia!
— Como é que é? — A fisionomia de Pedro me fez encolher, e o
desespero tomou conta de mim:
— É mentira! — disse, indignada. — Eu nunca fiz parte de plano
nenhum!
Mas Pedro não olhou para mim; ele continuava a encarar meu pai, que
logo continuou a falar:
— Eu posso provar. Sei de cada coisinha que aconteceu entre vocês.
— O quê!? — Eu arregalei os olhos, exasperada.
— Sei quando você a comeu pela primeira vez. — ele continua, me
ignorando. — Você a masturbou no banheiro primeiro. Foi inteligente o que
ela fez. Sei de Nova York, French Rivera... Sei de tudo. Cada detalhe.
Como eu poderia saber disso?
Com aquela tranquilidade irritante, Pedro se virou para mim. Ele me
olhou nos olhos, e eu murchei quando vi decepção e mágoa nos seus lindos
olhos escuros.
Eu balancei a cabeça, de um lado para o outro, meus olhos nublaram com
lágrimas, mas as palavras travaram em minha garganta, que ardia e doía,
assim como meu coração nesse momento.
Por favor, acredite em mim! Eu não tenho nada a ver com isso!
Era o que eu estava tentando dizer para ele, mas não conseguia. As
lágrimas começaram a cair, o desespero tomou conta por completo.
É mentira!
Eu gritei mentalmente. O medo apertou em meu coração e eu dei um
passo para frente, em sua direção, mas ele só franziu o cenho, parecendo
atormentado e pisou para trás. Eu paralisei.
Ele olhou para meu pai, a mandíbula travada:
— Por que se deu ao trabalho de armar tudo isso, Patrizio? Pensei que
era amigo do meu pai. — A sua voz era rude, séria.
— Eu era amigo dele sim. — Babbo rosnou, ficando furioso. — Fui leal
a ele por anos, mas tudo que recebi em troca foram 10% de todo o negócio!
Eu merecia mais! Eu lutei junto com ele, o apoiei e ele só me dar essa
porcaria!? Ele me devia. Você me deve!
— Eu não devo nada a você. — Pedro replicou. Eu estava com pavor da
sua calma. Seus olhos estavam ainda mais escuros quando ele se aproximou
do meu pai, abaixando um pouco para ficar cara a cara: — Meu pai não te
devia nada. Tudo que ele construiu é mérito apenas dele. Agora, vai me
dizer que quer que eu te der o quê? Meus 45% porque dormi com a sua
filha? — Ele riu, sinistro. — Não vai rolar, Patrizio. De jeito nenhum.
— E você acha mesmo que eu faria dessa forma tão fácil? — Meu pai
enfiou as mãos nos bolsos de sua calça cara e abriu um sorrisinho
satisfatório: — Eu soube que teve um pouco de trabalho e gastou alguns
milhões para livrar o rabo da sua bocetinha doce.
Minha mãe soltou uma exclamação afetada, levando a mão à boca.
Eu engasguei com as lágrimas, meu corpo parecia que estava tendo uma
convulsão.
O que ele está fazendo?
Tirando o celular do bolso, ele desbloqueia a tela e vira para que Pedro
possa ver. Eu choro ainda mais quando as imagens do vídeo que Mattia fez
aparece na tela. Os ombros de Pedro se tencionam. Eu corro para frente, me
enfiando entre eles e empurro o peito do meu pai. Grito, chorando:
— Por que está fazendo isso?
Mas ele continua a encarar Pedro:
— Se não quer que esse vídeo vá para internet e termine de acabar com a
vida de vergonha que ela escolheu ter, eu sugiro que você faça exatamente o
que eu falar.
— Para com isso! — Eu implorei, empurrando-o novamente.
Ele segurou meus pulsos, o semblante maníaco, mas antes que ele
pudesse fazer qualquer movimento, Pedro arrancou suas mãos e me puxou
para trás dele, voltando a encara-lo.
— Jogue a porra da merda para fora e termine logo com isso. — exigiu.
Minha mãe me pegou e me afastou dos dois. Era como se eu tivesse
dopada. Tudo que eu fazia era chorar, e senti que minha mãe estava
tentando me tranquilizar, apesar de estar tremendo como eu.
Eu sempre soube que meu pai era um homem ruim, mas nunca imaginei
que ele seria esse monstro.
— Trouxe um contrato para que você assine. — Meu pai disse. — Nesse
contrato diz que você deve se casar com Giulia e isso dará a ela metade de
tudo o que tem, e também me dará o direito de administrar essa parte, já que
ela não entende nada disso.
— Não! — Eu gritei, e minha mãe me apertou em seus braços. — Eu
não quero isso!
Eles não me deram atenção e a aflição ainda mais o interior da minha
garganta.
— Ela é a sua filha. — Pedro jogou na sua cara, com desprezo.
— Eu já falei para você que ela aceitou esse jogo.
— Mentira! — Eu tentei ir de novo para cima dele, mas minha mãe me
segurou e sussurrou no meu ouvido em nossa língua:
— Pare com isso, filha. Não é assunto seu para se meter.
Com muita raiva, o rosto todo molhado, eu me desvencilhei dela:
— É claro que é assunto meu, mamma! Ele está mentindo sobre mim. Eu
não concordei com isso, pelo amor de Deus! — Eu comecei a ir até Pedro.
Eu precisava olhar nos olhos dele e fazê-lo acreditar em mim, mas,
novamente, minha mãe me segurou pela mão. — Pedro, olha para mim, por
favor! — Chorei.
Ele não fez.
Eu lamentei mais.
Os dois homens ficaram em silêncio, um desafiando o outro com os
olhos duros. Meu coração estava prestes a quebrar minha caixa torácica,
com o desespero. Por fim, a voz de Pedro foi como uma facada em meu
estômago:
— Traga o contrato amanhã. Eu farei o que você quer, mas depois disso,
não quero mais ver sua cara de merda.
Então ele desviou do meu pai e foi para dentro da casa.
Não. Não. Não.
Eu me soltei do aperto da minha mãe e corri atrás dele, gritando seu
nome. Ele não parou, e quando alcancei a porta da frente de sua casa, ele já
estava dentro de um carro, cantando pneu.
O desespero cresceu. Eu chorei ainda mais, percebendo que estava com
falta de ar de tanta dor. Eu me segurei na grande porta, minha cabeça
rodava, as lágrimas caíam sem parar. Então foi aí que eu percebi: eu estava
com medo de perde-lo.
O aperto no peito ao vê-lo partir entregou tudo. Eu percebi que eu estava
completamente apaixonada por ele e me sentia sufocada só de imaginar ele
saindo da minha vida. Eu não poderia deixar isso acontecer.
De jeito nenhum.
Eu prometi para mim mesma que meus pais não ditariam mais a minha
vida. Prometi que eu iria fazer isso. Iria viver minha vida de acordo com
minhas próprias regras e escolher as pessoas que fariam parte dela.
Pedro é, definitivamente, a primeira pessoa dessa lista.
Em seguida, a raiva tomou conta. Eu me endireitei, enxugando as
lágrimas do meu rosto com força. Quando me voltei para dentro, encontrei
os dois já na sala de estar.
Warren nem tinha aparecido ainda. Tenho certeza que ele deduziu que
isso era um assunto de família e ele não iria se meter.
Eu avancei para frente do meu pai, que me olhava com aquele jeito de
superioridade machista que ele sempre fazia:
— Por que está fazendo isso? — Eu questionei quase gritando. — Por
que mentiu para ele desse jeito? Você sabe que eu não fiz planos nenhum
com você!
— Giulia! — Foi minha mãe quem repreendeu.
Eu virei para ela, olhando-a feio. Eu sabia que ela fazia tudo para agradar
meu pai, mas isso era além dos limites.
Era doentio.
— Sabia disso, mamma?
Ela nem precisava responder. Seus ombros se encolheram e ela desviou
os olhos para longe de mim. Isso doeu muito em mim, e mais uma lágrima
escorreu.
— Ora, pare de drama, menina. — Meu pai zombou. — Tenho certeza
que não será nenhuma tortura se casar com um homem como Pedro
Rodrigues. Vocês já estão fodendo, então...
O olhei com nojo.
— Eu não vou me casar com ele!
— Pedro é um homem que tem o hábito de proteger quem ele gosta. —
Eu odiava a forma como ele sorria para mim agora, como se estivesse
satisfeito com o mal que estava causando. Ele acena o celular para mim: —
E ele pagou milhões para que esse vídeo não fosse publicado, portanto, sim,
ele se casará com você.
Revoltada, eu arranquei o celular da sua mão e o arremessei longe. O
aparelho se espatifou contra a parede e caiu no chão em pedaços.
— Eu sou sua filha! — Gritei, ignorando a reação assustada da minha
mãe. — Você quem deveria me proteger, não ameaçar me expor dessa
maneira!
A fúria tomou conta de seus olhos e ele agarrou meu braço com força,
enfiando a cara na minha quando cuspiu as palavras com raiva:
— Tudo o que você fez durante toda sua vida foi me dar trabalho. Nunca
andou na linha, nunca ficou quieta como deveria. Você estragou essa família
e a expôs quando começou a sair com aquele merdinha do Mattia Bianchi.
Eu precisava dar um jeito de consertar as coisas, e por isso te mandei para
cá.
Eu tremia com o choro enquanto escutava. Ele nem se importava e cada
vez mais apertava meu braço.
— Pedro sempre foi muito tranquilo, retraído, então talvez ele não
olhasse você com outros olhos. Mas ainda tinha Rafael, que é mais novo,
mulherengo e tem a mesma quantidade de ações que o irmão. — Ele riu de
forma sinistra, olhando para mim. — Tinha certeza que você acabaria dando
para um dos dois. Claro — meneou a cabeça devagar. —, o plano era o usar
o método da virgindade para fazê-lo se casar com você, mas então o fodido
do Mattia entrou no jogo, e você não pôde conter a porra da sua boceta, não
é mesmo?
Eu solucei, minha cabeça balançando, chocada.
— Então eu precisei fazer um acordo com o idiota. — ele continua. —
Eu o deixaria comer você primeiro, como ele queria, e em troca, ele me
daria esse vídeo e colocaria uma escuta no seu telefone. Foi um longo
caminho, confesso. Quase tedioso. — Ele fez uma careta, soltando meu
braço abruptamente e se afastando. — Vocês foram muito lerdos. Parecia a
porra de uma eternidade até que, finalmente, resolveram começar a foder.
Massageando o lugar que ele apertou, eu fiquei ali, de pé, olhando-o com
decepção. Foi assim que ele soube de tudo. Eu nem conseguia olhar na
direção da minha mãe.
Com o canto dos meus olhos, eu vi Warren parado na entrada na sala. Ele
deveria ter entrado em algum momento no discurso psicótico do meu pai.
Solucei, dando alguns passos para trás. Quando consegui falar, minha
voz soou baixa e quebrada:
— Você é tão doente...
Ele me deu uma olhada severa, como se não concordasse comigo e
achasse ofensivo.
Mas eu não me importei.
— Espero que saiba que não vou deixa-lo ganhar isso.
— E o que pretende fazer? — Ironizou. — O idiota ama você e não vai
deixar o vídeo parar na internet. Ou você acha que quebrar meu celular vai
me impedir de fazer isso?
Sacudi a cabeça, encolhendo os ombros.
— Warren, o Joel está disponível? — perguntei, sem tirar os olhos do
meu pai, que franziu o cenho.
— Sim, senhorita.
— Ótimo. — Com um olhar gélido para minha mãe, eu saí, sem me
importar em deixa-los sozinhos na casa de Pedro. Tinha certeza que Warren
não iria permitir que eles mexessem em qualquer coisa.
No carro, eu não conseguia controlar as lágrimas que caíam pelo meu
rosto. Tampouco conseguia respirar direito, pois o medo de Pedro não
querer mais olhar na minha cara era muito grande.
Eu tinha medo de perde-lo. Eu não podia mais nem imaginar uma vida
sem ele olhando para mim com aqueles olhos calmos e intensos.
A dor no meu peito só aumentou.
Joel me olhou através do retrovisor com preocupação.
— Para onde quer que eu vá, senhorita Russo?
Respirando fundo, enxuguei o rosto com os dedos, ciente de que parecia
um tomate vermelho. A verdade era que eu queria encontrar Pedro, mas não
fazia ideia para onde ele foi.
— Será que você sabe para onde Pedro foi?
Ele negou com a cabeça.
— Não, desculpe.
— Tudo bem. — Sacudi a cabeça. — Pode me emprestar seu celular, por
favor?
Eu não tinha nem me dado ao trabalho de pegar meu celular, já que meu
pai havia confessado que o violou com uma escuta.
Joel me entregou seu celular, e minha primeira reação foi ligar para
Pedro, mas as três vezes que tentei, estava desligado. Então, liguei para
Rafael, porque ele poderia ter uma ideia de onde o irmão estava.
— Rafael falando. — ele atendeu rapidamente.
— Ei, é a Giulia.
— Giulia? Cadê seu celular?
— Deixei em casa, mas esse não é o problema.
— Existe um problema?
— Meus pais apareceram na casa do Pedro e meu pai o ameaçou com o
vídeo que o Mattia gravou, e colocou na cabeça do seu irmão que isso foi
um plano que ele arquitetou comigo, então Pedro saiu e não atende o
telefone, e eu estou desesperada porque juro que não fiz nada disso, mas
não posso dizer isso para ele porque não o encontro, e...
— Ow, ow, ow. Calma, mulher! Respira. — Ele pede, e eu escuto um
barulho no fundo, como se ele tivesse acabado de se levantar de uma
cadeira e a arrastou no chão sem querer.
Eu fiz o que ele disse. Fechei os olhos e respirei fundo, mas não consegui
parar de chorar.
— Va bene. — eu falei, mostrando estar mais calma, mesmo não estando.
— Certo. Agora me explica o que aconteceu, com calma.
Então eu comecei a contar tudo, devagar, desde o momento em que meu
pai nos pegou, até a hora que saí da casa. Eu não conseguia controlar as
lágrimas que caíam pelo meu rosto.
— Caralho, que filho da puta! — Rafael xingou, com raiva, do outro
lado da minha.
— Eu juro pela minha vida que não sabia de nada disso! — solucei. —
Eu não seria capaz de fazer algo assim. E-eu sei que você me acha teimosa,
mimada, irritante, e eu sou tudo isso, mas eu nunca, jamais, armaria algo
tão feio para outra pessoa. Tudo que eu sempre quis foi viver a minha vida
livre, sem todas as regras da minha família.
— Você está certa. Eu acho todas essas coisas de você, mas sei que não
seria capaz de uma coisa dessas. — ele disse.
— De jeito nenhum. — eu reforcei. — Mas agora estou com tanto medo,
que estou sufocada. Pedro não atende o telefone, e eu não tenho ideia para
onde ele foi.
Escutei o suspiro dele. Silêncio. Em seguida, ele perguntou:
— O que você sente pelo meu irmão, Giulia?
Meus batimentos pararam e eu engoli em seco. O que eu sentia por
Pedro? Eu nunca realmente tinha parado para pensar sobre isso porque os
últimos dias tinham sido tão bons, que não me deram tempo para questionar
meus sentimentos.
Então, levei um momento para colocá-los na balança agora. Antes, eu
pensava que o que eu sentia por Mattia era um amor arrebatador. Eu fiz
planos e sonhos para viver uma vida inteira ao lado dele. Todos os dias,
quando me deitava, eu imaginava como sempre nosso futuro, nossa casa,
nossos filhos. Eu pensava como seria perfeito me casar com alguém tão
bonito e, até então, tão doce e gentil, que se preocupava comigo.
Mas logo veio o banho de água fria bem na minha cara e eu percebi que
não era nada daquilo. O que eu sentia por ele, na verdade, era esperança de
que ele me salvasse da minha vida de regras chatas. E tudo foi por água
abaixo quando conheci o verdadeiro Mattia.
Agora, ponderando sobre a pergunta de Rafael, eu conseguia sentir as
borboletas fazendo a festa em meu estômago, o coração contraído. Todos os
sentimentos com Pedro foram construídos com calma, tranquilamente como
ele. Foi algo tão natural, que me pegou desprevenida. Eu não precisava
imaginar como seria nosso futuro, porque com ele, eu aprendi que
deveríamos viver o hoje e o agora.
Eu não precisava fazer planos sobre nós, porque ele me ensinou que eu
deveria fazer planos apenas para mim; que eu deveria começar a pensar
mais nos meus sonhos, nas minhas vontades, não na vontade das outras
pessoas.
Arfei quando percebi o que estava sentindo de verdade e levei minha
mão à boca, confusa e feliz ao mesmo tempo.
— Eu o amo. — soltei. — Eu o amo, Rafael. — repeti.
A satisfação tomou conta da voz dele:
— Espere um segundo, então, que eu vou descobrir onde ele está. — E
desligou.
Eu esperei, minhas mãos apertando o celular, ansiosa para tocar
novamente. Eu estava com muito mais medo agora que confessei o que
sentia, porque se Pedro realmente acreditou no que meu pai disse e não
querer mais saber de mim, eu não sei se poderei superar.
Alguns minutos depois, Rafael retorna:
— Ele está no Palace. Eu chego lá em vinte minutos.
— Não. — eu me apressei a falar. — Eu preciso falar com ele sozinha.
— Se tudo aconteceu como você disse, meu irmão está puto da vida,
Giulia. Ele não fica muito bem quando está assim.
Estremeci, recordando como ele ficou no dia em que bateu no Mattia.
— Eu vou arriscar. Sei que ele não me machucaria. Só, por favor, peça
para que me deixem subir.
•••
•••
— Papai!
Eu peço licença para as pessoas com quem estou conversando e virou
meu corpo para encontrar minha filha correndo em minha direção. Ela pula,
e eu a pego no ar e a sento em meu colo.
— O que foi, minha vida?
Ela afastou os cabelos que o vento tinha soprado para frente do seu
rostinho e me olha com expectativa:
— Posso ter aulas de karatê?
Ergo uma sobrancelha para ela.
— Por que quer ter aulas de karatê?
— Porque com balé eu não posso bater no Matt! — Ela fala,
gesticulando com as mãozinhas.
— E por que quer bater no Matt?
Ela torce o nariz pequeno em uma careta fofa. Bufa e bate a palma de sua
mão em sua própria testa:
— Porque ele acaba com minha paciência! — A forma como ela diz isso
é como se fosse uma coisa muito óbvia.
Rafael, que está sentado perto de mim, tenta abafar uma risada, mas não
consegue. Eu o olho feio.
Minha filha tem apenas cinco anos, mas desde cedo ela demonstrou ter o
mesmo temperamento do meu irmão. Qualquer coisa a faz perder a
paciência.
Nós decidimos procurar uma psicóloga para ela, na intenção de melhorar
um pouco suas atitudes, mas não têm funcionado. Sua tolerância, assim
como seu tio, era muito pequena.
Como era de se esperar, eles não se desgrudam, e Fiorella é a única capaz
de amolecer meu irmão, principalmente depois que Athena voltou para
França, há cinco anos.
Eu apertei seu narizinho empinado, igual o de Giulia:
— Vida, se quer fazer aulas de karatê, tudo bem, mas não para bater no
Matt ou em qualquer outra pessoa. — eu falei para ela.
— Mas, papai, ele é me deixa muito irritada!
Eu ri.
— Ele não é o único que te deixa assim, princesa.
Ela faz um biquinho, que me derrete todo. Eu nunca pensei que fosse
amar tanto uma pessoa na vida, como eu a amo.
Rafael se levantou e estendeu a mão para ela:
— Vem, meu amor. Vamos assaltar alguns doces daquela mesa antes que
sua mãe apareça por aqui!
Ela saltou do meu colo com um grande sorriso, pegou na mão dele e foi
para a grande mesa de doces que Giulia preparou.
Balançando a cabeça divertido, eu me levantei e segui para dentro, à
procura da minha linda esposa. A casa estava cheia de pessoas e tinha
crianças correndo para todo lado, curtinho a festa de aniversário de Fiorella.
Warren me alertou que Giulia havia subido para nosso quarto, então eu
fui atrás, ansioso para vê-la.
Era estranho. Eu a via todos os dias, mas quanto mais eu colocava meus
olhos sobre ela, mais eu ficava viciado.
Quando entrei no quarto, ela estava saindo do banheiro, arrumando um
brinco. Estava linda com um short cintura alta branco, cropped meia taça e
cabelos soltos e bem escovados. Seu sorriso alcançou os olhos quando me
viu:
— Ei, amor. Eu só precisei pegar uma tarraxa nova, porque perdi a que
eu tinha. — ela se explicou. — Aconteceu alguma coisa?
Eu segurei sua cintura, puxando-a para mim, e ela deu uma risadinha,
envolvendo seus braços ao redor do meu pescoço.
— Aconteceu que eu estou com saudade de você.
— Ah, mesmo? — Ela provocou, raspando seus lábios nos meus,
deixando-me imediatamente duro por ela. — Prometo que mais tarde, eu
deixo você matar toda essa saudade, va bene? Agora temos uma festa para
fazer lá embaixo.
Ela se afastou, e eu gemi em frustração, ajeitando a ereção dolorida
dentro da bermuda. Sorrindo, Giulia se aproximou da janela de vidro e
espiou a festa. Quando ela pareceu prestes a revirar os olhos, eu me
aproximei para ver do que se tratava.
Rafael tinha Fiorella sentada em seus ombros enquanto eles roubavam
alguns doces da mesa. Eu ri e beijei a têmpora da minha mulher.
— É o aniversário dela, amor. Fique calma, deixe-a curtir. Ela ficará
bem.
— Eu sei disso, mas Rafael faz tudo que ela quer. — Ela fingiu estar
chateada, mas parecia se divertir. — As vezes eu acho que ela que manda
nele.
— Eu tenho certeza disso. — declarei.
Nós assistimos mais algum tempo, até que meu irmão colocou nossa
filha no chão e ficou de cócoras para poder ficar do tamanho dela. Ela o
abraçou com seus pequenos bracinhos e beijou seu rosto antes de sair
correndo para as outras crianças.
Giulia deitou a cabeça em meu peito enquanto via tudo e suspirou
lentamente.
— Ela é tão linda, que eu ainda não acredito que é nossa.
— Mas ela é. — Eu a abraço por trás, descansando meu queixo no topo
de sua cabeça. — Ela é perfeita e é toda nossa, bambina.
Anuiu.
— Grazie por me dar ela. — ela tinha a voz cheia de emoção.
A apertei mais em meus braços.
— Eu que te agradeço. — Eu beijei seu rosto. — Vocês duas são tudo
para mim.
Ela se virou para me encarar, os olhos nublados com lágrimas.
— Eu sempre planejei ter uma vida boa com Mattia. Eu idealizei tudo, a
vida perfeita. Iria ter uma casa boa, filhos, iria ser uma esposa maravilhoso.
Tudo isso. Mas nunca, em toda minha vida, eu imaginei que iria dar tantas
voltas apenas para estacionar aqui, com você, com a nossa Ella. Vocês dois
são a coisa mais importante que eu tenho também. Eu os amo com toda a
minha vida. Grazie por tudo, amore mio. — ela chorou um pouco, mas não
parou. — Eu te agradeço por me enxergar, por me acolher, por me escolher.
Te agradeço por me proteger, por confiar em mim. Te agradeço por tudo, va
bene?
Eu segurei seu rosto perfeito e beijei sua boca com todo amor que eu era
capaz de lhe dar.
— E eu agradeço a você por existir. — eu sussurro em sua boca. — Você
e a Ella são minha vida.
E eu daria tudo, todo meu dinheiro, até mesmo a porra do mundo, para
protegê-las de todo o mal.
Elas eram o meu mundo.
Nos vemos no 2º livro da série, que será do César e da Blake.