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Colégio Internato dos Carvalhos

Ética Profissional – 12º Ano

CONTINUEMOS COM O NOSSO EXEMPLO…


Lembrei-me de uma antiga colega da Universidade. Ambos tínhamos sido dirigentes estudantis e tínhamo-nos mantido
em contacto ao longo de vários anos. No ano passado, a empresa onde ela trabalha tinha sido envolvida num
tremendo escândalo por causa de alguns diretores terem falsificado faturas de assistência médica, para os
empregados, conseguindo do Governo avultadas quantias. A partir de então foi nomeado um novo presidente, que
decidiu criar a figura do ombudsman (defensor do povo) ético para que resolvesse os assuntos desta natureza,
estabeleceu um novo Código de Ética e Linhas de Conduta, fez imprimir nas faturas de assistência médica a
advertência explícita de que usufruir de benefícios ilícitos era um delito e pôs em andamento um programa
obrigatório de formação ética para todo o pessoal da empresa. Nesta restruturação da empresa, a minha amiga
recebeu o encargo de trabalhar durante dois anos no novo programa de formação ética. A nomeação não me
surpreendeu na medida em que a sua honestidade e o seu sentido de jogo limpo eram mais que evidentes.
Por sorte, a minha amiga anuiu em reunir-se comigo naquela noite. Escutou o meu relato, e, ao terminar, perguntei-
lhe:
Se alguém, na tua empresa, te colocasse este dilema, que lhe aconselharias? Far-lhe-ia um compromisso ético –
respondeu-me sublinhando estas palavras. Um compromisso ético? Sim. O compromisso ético ajuda as empresas a
resolver os seus dilemas, mostrando-lhes a forma de examinar o problema a distintos níveis. Contém três
perguntas e cada uma delas serve para aclarar um aspeto distinto da discussão. O compromisso ético permite eliminar
as zonas cinzentas das situações éticas. Parece ser – acrescentou -, que as tensões que afligem muitas pessoas se devem
ao facto de terem tomado deliberadamente decisões pouco éticas, de cuja imoralidade eram basicamente conscientes.
Isso foi o que aconteceu na nossa empresa. Muitos afirmam, hoje em dia, que existe uma vasta zona de sombras entre o
que está bem e o que está mal, e utilizam essa zona como desculpa para não se preocuparem com a moralidade da sua
conduta. Nós questionamos esta lógica, porque nos demos conta de que se podem eliminar muitas sombras dos dilemas
éticos, sempre e quando alguém tiver a ousadia de analisar a situação. É muito fácil seguir em frente sem pensar em
nada e justificar depois o próprio comportamento uma vez consumados os factos. No entanto, a verdade da questão é
esta: Não existe nenhuma forma boa de fazer uma coisa má.

Depois de uma pausa, a minha amiga acrescentou:


Pensamos que a maioria das pessoas sabe distinguir entre o que está bem e o que está mal, mas o
compromisso ético ajuda a clarificar as questões no caso de não se saber responder a estas três perguntas quando se
enfrenta um problema ético.
Puxei então do meu caderno de notas.
A primeira pergunta é muito simples: «É legal?»
Anotei e, ao levantar o olhar, observei que a minha amiga me olhava com uma expressão inquisitória. Diz-me lá:
é ou não legal?
Não tenho a menor dificuldade em responder a essa pergunta – respondi. A minha resposta tem de ser um rotundo
«não» na medida em que este vendedor roubou uma informação pertencente a terceiros.
A nossa empresa – disse a minha amiga – considera que quando se responde «não» a esta primeira pergunta, já não é
necessário colocar as outras duas. Apesar disso – acrescentou -, eu nem sempre estou de acordo e, por isso, digo
sempre às pessoas que respondam às perguntas antes de tomarem uma decisão definitiva.
Quando dizes «legal», referes-te apenas ao código civil ou penal?
Não, - respondeu a minha amiga -. Temos também em consideração a política da empresa que, no nosso caso,
inclui agora um novo código de ética e linhas de conduta.
E o que é isso?
Uma norma segundo a qual cada um dos nossos empregados é responsável pela honestidade como pelas
consequências da sua conduta. Todos e cada um dos empregados se devem situar no patamar mais
elevado, de honra, integridade e justiça em qualquer atividade relacionada com a empresa e muito
especialmente na relação com os clientes, os concorrentes, os fornecedores, o público e os outros
empregados.
«Contudo, dentro de uma banda mais larga – acrescentou -, a nossa empresa espera agora que nenhum
empregado desenvolva, no âmbito da empresa ou em transações em seu nome, nenhuma atividade que
seja (ou pareça) imprópria, ilegal ou imoral, o que prejudicaria ou colocaria em apuros a empresa ou os
clientes.
Surpreendido diante da sua capacidade de expor com tanta precisão a política da sua empresa, disse-lhe:
Creio que esta seria muito boa política para a nossa empresa.
É evidente que se trata de uma clara mensagem, desde cima, sobre o tipo de empresa que queremos ser –
explicou a minha amiga. Mas antes de nos elogiarmos, recorda que esta nova política faz parte de uma
resposta a uma conduta imoral que antes era muito generalizada na nossa empresa.
Bom, não há dúvidas de que é um bom começo para mudar as coisas – disse. Isso significa que uma
empresa deve ter uma clara política escrita se quiser fomentar o comportamento ético entre os seus
empregados. Qual é a segunda pergunta do compromisso ético?
É equilibrado? É J u s t o ? – respondeu a minha amiga. Com esta pergunta, queremos estabelecer se a
decisão será justa ou se favorecerá uma parte em detrimento da outra, a curto ou a médio prazo.
Ou seja, respondi, anotando a segunda pergunta – tem de existir um grande vencedor ou um grande
perdedor? Isso faz-me lembrar a epidemia das ofertas hostis da Bolsa que tanto se realizam ultimamente e
nas quais os grandes acionistas e agentes financeiros obtêm benefícios astronómicos enquanto muitos
outros perdem.
- É um bom exemplo – disse a minha amiga. Nós consideramos que as decisões desequilibradas nas quais
se ganha ou se perde, terminam invariavelmente em situações nas quais sempre se acaba por perder.
Por outras palavras, se um empregado da nossa empresa toma uma decisão que o beneficia a ele ou à
nossa empresa à custa de terceiros (seja este, outro empregado, um fornecedor, um cliente, ou até um
concorrente), esse facto repercutir-se-á mais tarde negativamente nesse empregado ou na empresa.
Nem sempre se pode ganhar de forma equilibrada em todas as situações, mas o que nós pretendemos
é evitar os grandes desequilíbrios nas nossas relações e nas nossas transações.
Se decidir contratar este vendedor – disse, pensando no meu próprio caso -, e utilizo a sua informação
confidencial, obterei um grande benefício para a nossa empresa e causarei uma grande perda à
concorrência.
Exatamente – disse a minha amiga. E quando se averiguar aquilo que aconteceu, a empresa concorrente
procurará os meios de reparar o mal. Tentarão saber que executivos poderão contratar ou que tipo de
informação poderão conseguir sobre a tua empresa com o fim de vos prejudicar.
As nossas relações com eles poderiam ser, nesse caso, muito piores do que a mera concorrência de mercado
– anotei.
E enquanto vocês estiverem envolvidos nessa disputa, poderá surgir outro concorrente que suplante os dois.
Ou, ainda pior, ambos poderiam causar um grave descrédito no meio empresarial ao qual pertencem. Ao
analisar o tema da ética, os membros da Direção da nossa empresa, compreenderam que a lealdade da
empresa se deve estender a todo o setor industrial. O facto de ser o número um num determinado setor
industrial irregular, não traz a menor satisfação. Quando os clientes começam a desconfiar de uma
empresa, todo o setor industrial se recente disso.
Oxalá pudesse estar seguro de que o nosso concorrente não contrataria nenhum dos nossos empregados
em circunstâncias similares – disse eu. Contudo, quando me pergunto se é justo que contrate este vendedor,
com a informação confidencial de que dispõe, a resposta continua a ser «não». Apesar de já ter dado duas
respostas negativas, qual é a última questão desse compromisso ético?
A última pergunta é de uma importância fundamental – disse a minha amiga. Todas as pessoas que têm de
enfrentar uma decisão ética devem perguntar-se: Como me sentirei?
Surpreende-me que isso seja uma pergunta. Pensava que, com a questão sobre a legalidade, ficava
resolvida a bondade de uma decisão, independentemente daquilo que uma pessoa possa sentir sobre o
facto.
É por essa razão que escolhemos estas três perguntas. A pergunta sobre a legalidade obriga-te a examinar
as condições existentes; a pergunta sobre o equilíbrio, ativa o sentido da justiça e da racionalidade; esta
última questão centra-se nas emoções, no teu código moral, quadro de valores e respetiva hierarquia.
Estás a querer dizer-me que quando alguém faz alguma coisa que vai contra o seu próprio sentido inato
daquilo que é bem, não tem outro remédio senão sentir-se mal em relação a isso – assinalei.
Sim – disse ela. Os atos imorais destroem a própria autoestima. Perguntas como, «que sentiria se o que me
proponho fazer fosse publicado nos jornais?» ou, «gostaria que a minha família soubesse?» podem aplicar-
se também a este caso. A propósito das coisas que podem aumentar ou diminuir o sentido da nossa própria
estima, o legendário treinador de basquetebol da Universidade de Califórnia em Los Angeles, John Wooden,
costumava dizer:
Não há almofada mais fofa que uma consciência tranquila.
Entendo perfeitamente, disse eu. Desde que tive de enfrentar-me com esta decisão ética, nunca mais pude
conciliar o sono.
Esta inquietação significa provavelmente que a tua consciência luta contra o teu instinto de sobrevivência.
Pretendes alcançar os objetivos da tua carreira e fazer ao mesmo tempo o que é justo. Olha – acrescentou a
minha amiga -, eu penso que a tua consciência te dizia desde o princípio que o comportamento do vendedor
não era correto. Este homem tinha roubado, e se tu o contratasses seria como se justificasses a sua conduta
imoral. Não te parece? Evidentemente.
A tua consciência censurava-te constantemente e por isso não conseguias dormir uma vez que querias fazer
algo que estava mal a fim de melhorar a tua carreira profissional a curto prazo, não é assim?
Nem mais, nem menos. Por isso mesmo, não me sentia bem. Este compromisso ético é muitíssimo útil
porque verdadeiramente, ajuda a tomar as decisões justas – fiz uma pausa para tomar algumas notas e
depois acrescentei: - Vamos ver se anotei bem as três questões.
Resumo: as perguntas do compromisso ético
É legal? Transgredirei as leis civis ou a política da empresa?
É equilibrado? É justo para todos os interessados, quer a curto, quer a longo prazo? Favorecerá as relações
de cordialidade entre todas as partes implicadas?
Como me sentirei? Orgulhoso? Gostaria que a minha decisão se publicasse nos jornais ou que a minha
família o soubesse?
A IMPORTÂNCIA DE DAR EXEMPLO
Enquanto olhava as minhas notas, a minha amiga comentou:
Os responsáveis pelo programa de formação ética descobriram que o uso constante das perguntas do
compromisso ético favorece linhas de conduta correta que acabam por se converter em hábitos.
Muitos diretores necessitam simplesmente de um pouco de conselhos e de apoio para tomarem as decisões
corretas – acrescentou a minha amiga. Agora que já resolveste a questão, poderias ser um exemplo para os
outros. Na nossa empresa procuramos que os nossos diretores compreendam que têm a obrigação de fazer
o que é correto não apenas pelo bem da empresa como também pelas pessoas que estão sob as suas
ordens e que veem neles um exemplo a seguir. Tu poderias exercer uma influência significativa entre as
pessoas que te rodeiam.
Ou seja, tu pensas que, para conseguir o melhor daqueles que colaboram connosco, é necessário que os
seus superiores deem exemplo? – Perguntei.
Sem quaisquer dúvidas – respondeu. Nunca me cansarei de sublinhar a importância do exemplo. Há muitos
pais que desviam os olhos quando veem que os seus filhos fazem alguma coisa de incorreto. Estou segura
de que muitos administradores fazem o mesmo relativamente aos seus subordinados. O pretexto habitual
costuma ser: «Toda a gente o faz ou o permite. Porque iria eu tomar uma posição contrária?»
Isso parece-se bastante com alguns dos conselhos que me deram relativamente à contratação deste
vendedor tão pouco escrupuloso, - disse.
E no entanto, quando evitas enfrentar uma questão ética – continua a minha amiga – dizes essencialmente
que isso está bem. E ao fazer assim, dás um mau exemplo.

ATIVIDADE: Elabora um comentário ao desfecho do caso e reflete acerca da pertinência da elaboração de


compromissos éticos no mundo de hoje. Estarão as nossas empresas preparadas para a implementação
destes sistemas de controlo ético?

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