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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ

CAMPUS PROF. ALEXANDRE ALVES DE OLIVEIRA


COORDENAÇÃO DO CURSO DE PEDAGOGIA
DISCIPLINA: HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA.
PROF(a): EMERSON BENEDITO FERREIRA.
Aluno (a): Bianca Cordeiro Lessa – 1078320

TEXTO REFLEXIVO SOBRE O DOCUMENTÁRIO MENINO 23.

Ao assistir o documentário Menino 23, diversos sentimentos


passaram pela mente, repensar nossa história, analisar a construção do país,
buscar os reflexos na atualidade construídos nessa história permeada de
exclusão desde os primórdios, e especialmente no quanto a educação que
vivenciamos agora pode ter de resquícios dessa construção histórica que foi
tão cheia de privilégios para alguns, e tão excludente para muitos outros.
Como profissional da educação em formação, penso que assistir o
documentário foi de imensa importância na minha construção como educadora
e sobretudo como forma de melhorar como pessoa, pois conhecimento nunca
é demais, especialmente quando ele traz à tona aspectos da história do Brasil
que foram deliberadamente obstruídos dos livros escolares, quando deveriam
ser de fácil conhecimento público afim de uma formação de cidadãos
conscientes de que nossa sociedade muito reflete desigualdades ainda
advindas de seu processo de formação.
Quando nos deparamos com uma sociedade que conhece apenas
um viés da história de seu país, em especial a visão do colonizador e das
classes dominantes, o efeito pode ser catastrófico e, no mínimo, produz
adultos sem consciência de classe e que não são capazes de refletir
criticamente sobre as diversas desigualdades sociais presentes, pois
desconhecem o quanto o processo de cidadania no Brasil foi discriminatório e
sem possibilidades de integração de diversas camadas sociais, e em especial
retratadas no documentário, a população negra, que por mais que liberta,
ainda era posta em posição de servidão e de sub-humanidade, não sendo lhes
dada oportunidades mínimas de integrar-se dignamente na sociedade.
Com o advento de políticas totalitárias e eugenistas pelo mundo,
o Brasil que tratava a população negra como um produto a ser explorado, foi
campo aberto para uma sorte de atrocidades cometidas. No documentário
Menino 23 pudemos conhecer uma parte do que as crianças negras sofreram
nesse período, onde no Brasil o movimento Integralista, que bebia
abundantemente na fonte do nazismo, via em crianças negras uma tela em
branco que poderia ser usada como bem entendessem, uma mão de obra
gratuita e da qual ninguém reclamaria por elas.
O documentário Menino 23, mostra com riqueza de informações
as ações eugenistas no Brasil no início do século XX, mais precisamente
década de 20 até o período da ditatura, focando nas ações nazistas no Brasil
em que o país tinha o segundo maior contingente do partido nazista fora da
Alemanha. Centrada na história da fazenda Albertina, onde se encontraram
tijolos com insígnias nazistas, onde centenas de meninos negros eram levados
com a justificativa de dar-lhes instrução e ensinar um oficio, sendo
selecionados sempre os meninos mais ágeis e fortes para ir para este local.
Os Integralistas ganhavam força no Brasil, se dizendo um partido
independente que não era nazista nem fascista, porém algo integralmente
brasileiro, porém a ideologia era a mesma do nazismo. As crianças já
chegavam pensando em fugir, mas a fala de um dos entrevistados no
documentário esclarece que já haviam cachorros para “caça” desses meninos
caso fugissem. Em 1942 quando Getúlio finalmente escolhe um lado para a
guerra, se aliando aos EUA, os símbolos nazistas foram criminalizados, e
Sérgio Rocha Miranda fugiu para os Estados Unidos. Com essa escolha para
se aliar aos EUA na guerra, ter os meninos doutrinados no integralismo
começou a ser desinteressante, e um fiscal foi nas fazendas recolher os
meninos, e o documentário relata que um dos meninos, chamado de número
dois, fora escolhido para ir morar na casa grande, porém apenas para ser
serviçal, um escravo da casa, depois de adulto a família comenta que ele
nunca quis falar sobre o período em que morou na casa grande, mas era muito
ligado ao local, e se sentia como da família, que como estudado na disciplina
de sociologia, ele sofria uma violência simbólica, onde era um escravo,
serviçal, porém como foi o escolhido para a casa grande tendeu a pensar que
havia algo de especial nisso, quando era apenas vítima de uma violência
diferente dos demais meninos. E quanto disso ainda não foi visto ao longo da
história quando moças negras e/ou de classe baixa eram trazidas para casas
de família para trabalhar por moradia ou pagamento ínfimo, sem direitos
trabalhistas. Segundo o documentário, as demais crianças ficaram entregues
à própria sorte, e esse espaço de tempo que eles esperavam para saber para
onde iriam, pairava um desespero entre eles. O sr. Agemiro relata que antes
do fiscal busca-los na fazenda, ele fugiu, correndo mata adentro, atravessando
rio à nado, e indo parar em São Paulo e trabalhando como engraxate vivendo
nas ruas, até quando a força expedicionária brasileira foi destinada para à
guerra, e ele logo se prontificou ao alistamento, pois talvez para ele a
alternativa de ir para a guerra, com grande risco de morrer lá, fosse melhor do
que a vida nas ruas. Essas crianças foram abandonadas à própria sorte nas
cidades, simplesmente descartadas como lixo nas ruas, isso quando não eram
mantidas como servas em casas de família, trabalhando análogas à
escravidão.
No documentário o pesquisador comenta que uma das coisas mais
doloridas era saber que isso era plenamente naturalizado na época, e não
podemos deixar isso ser esquecido, pois a estes meninos foi negado a
inserção e até mesmo a convivência em sociedade, eles eram isolados de
tudo, e quando foram simplesmente abandonados muitos caíram no
alcoolismo, depressão e extremo abandono, pois a maioria sentia que não
havia futuro para eles. O documentário traz uma importantíssima reflexão para
a sociedade, sobre o quanto ainda não sabemos sobre nossa história pelo viés
do povo oprimido, das pessoas que sofreram imensamente no curso da
história do Brasil, e o quanto disso ainda não se reflete na nossa sociedade
atualmente, seja a influência direta das classes dominantes, seja o grande
desconhecimento da história dos oprimidos no país.
Quais oportunidades esta geração e as seguintes tiveram de
conseguir alguma condição digna de vida? Quando eram vistos pela sociedade
ainda como pessoas que deviam servir, quando a escravidão ainda era algo
presente dentro da cabeça da população brasileira, não somente da elite, mas
de quem apenas por ter pele clara se via como superior. E durante as décadas
em diante a população negra se viu em situação de abandono e preconceito
constantes, não evoluindo igualitariamente em condições de oportunidades na
sociedade brasileira. O quanto isso ainda se reflete na população atual, em
que políticas públicas como cotas raciais são vistas como um erro e uma
“vantagem” para a população negra? Dado o grande cerceamento da história
pelo viés do oprimido, não se tem noção do quanto à esta parcela da
população, historicamente, no Brasil não foram dadas sequer oportunidades
mínimas de inserção digna na sociedade após a escravidão.
Quando uma sociedade se forma consumindo em livros escolares
e obras literárias majoritariamente o viés do opressor, das classes dominantes,
não se cria consciência política, pensamento crítico sobre os problemas
sociais presentes no país, e mais que isso, abre portas para que atrocidades
cometidas retornem a acontecer. Como educadora me sinto na obrigação de
conhecer cada vez mais as raízes da educação em todos os seus aspectos, e
como ser humano buscar sempre compreender o mundo que me cerca e olhar
com respeito a trajetória de vida de cada pessoa que chegar até mim.

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