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O BRANQUEAMENTO SOCIAL E SUAS IMPLICAÇÕES

No fim do regime escravocrata, no período pós-abolicionista, o negro


tornou-se livre perante a lei, mas essa liberdade não lhe garantiu os mesmos
direitos e nem a sua aceitação perante a sociedade. Após a abolição da
escravatura, o negro foi largado a própria sorte, muitos deles não tiveram sua
mão de obra aproveitada na fazenda na qual eram escravos, alguns fazendeiros
optaram em trazer mão de obra da Europa ao invés de dar espaço e criar
oportunidades ao negro, os deixando às margens da sociedade.

Com a chegada dos imigrantes europeus para ocupar o lugar do negro e


trabalhar nas fazendas, ao contrário dos escravos, os novos trabalhadores
imigrantes tinham tratamento diferenciado e, por sua vez, não queriam de
maneira nenhuma ser comparados aos negros, pois os consideravam uma sub-
raça desprovida de inteligência. Assim, os conflitos étnico-raciais estavam
ganhando mais força através dessa divisão, pois os europeus se achavam
superiores aos negros, mesmo realizando as mesmas atividades nas fazendas,
achavam que pelo fato de serem brancos, faziam parte de uma classe especial
de pessoas.

Naquele contexto histórico, com uma visão eurocêntrica e totalmente


etnocêntrica, surgiu uma das tentativas de eliminar e neutralizar o povo negro do
contexto brasileiro, chamada de branqueamento social.

O Branqueamento social foi uma ideologia que permeou o Brasil no final


do século XIX, cuja tentativa era neutralizar a existência do povo negro. A
humilhação social que acometeu o negro, foi além do seu estado de escravo,
chegando à anulação de sua identidade, sua cultura, sua crença.
Cabe ressaltar, que neste período fez parte da estratégia de
branqueamento “civilizar” os indígenas, vistos como “selvagens”, para tanto,
surgiram políticas e ações com este objetivo em âmbito nacional (FERREIRA,
2021).

De acordo com Nascimento (1978), as tentativas de branqueamento da


população brasileira, faziam parte de um projeto de sociedade que tinha como
base estratégica eliminar a população negra do cenário brasileiro, o objetivo era,
de maneira estratégica extinguir o elemento negro da sociedade brasileira, com
isso, se “embranqueceria”, de forma paulatina e estimava-se que em um
período de até três gerações a sociedade brasileira se tornaria branca.

Diante dos fatos, surgiram alguns intelectuais naquela época que


desejavam o branqueamento social no Brasil, dentre eles está Raimundo Nina
Rodrigues (médico legista, psiquiatra, epidemiologista professor, escritor,
antropólogo e etnógrafo) que utilizava dos seus conhecimentos médicos para
classificar, de maneira estereotipada, e inferiorizar o negro em todos os seus
aspectos. Segundo ele, em uma visão totalmente darwiniana, o negro estaria em
um estágio inferior de evolução.

Embora Raimundo Nina Rodrigues fosse mestiço, não se via como tal e
acreditava que a mistura de raças seria muito prejudicial para a formação
psíquica, considerando, a inferioridade intelectual do negro. Para ele, as três
raças predominantes na formação do povo brasileiro (branca, indígena e negra)
transmitiriam aos seus descendentes através da miscigenação, doenças
mentais, que resultaria em indivíduos desequilibrados, híbridos fisicamente,
degenerados intelectualmente e com desvios comportamentais.

Uma das demonstrações da ideologia do branqueamento social, é vista


na pintura chamada de “A Redenção de Cam” do espanhol Modesto Brocos.

A pintura foi produzida em 1895, logo após o período pós-abolicionista no


Brasil, e traz consigo a face revelada do preconceito étnico-racial, nela, é
possível observar a tese do branqueamento social de que a população brasileira
se “embranqueceria” em até três gerações.
Ao observar a pintura, as três figuras principais (a senhora negra, a mulher
mestiça e a criança branca) representariam as três gerações necessárias para
que o Brasil se tornasse um país branco. O homem branco à direita, ao que tudo
indica, seria o marido da mulher ao centro e pai da criança, que olha para a
criança com admiração. Ele foi o elo que permitiu o branqueamento completo
dos descendentes da senhora negra, que levanta os braços em agradecimento.
Esse era o retrato esperado para a sociedade brasileira através de um olhar
eurocêntrico.
O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL

No período entre o fim do século XIX e meados do século XX, após


fracassadas as tentativas do branqueamento social, surge no Brasil, uma
ideologia que tinha como objetivo, neutralizar, mesmo que de maneira
superficial, toda forma de racismo e segregação social. A intenção era elucidar
que no Brasil as relações entre brancos, indígenas e negros seriam amistosas e
não existiam conflitos, discriminações ou qualquer tipo de preconceito.

A tentativa em romantizar as relações preconceituosas entre brancos,


indígenas e negros no período pós-abolicionista, foram relatadas por Gilberto
Freyre em sua obra Casa Grande e Senzala, onde de maneira superficial e com
um linguajar peculiar, narra os abusos sofridos pelos negros. A intenção de
mascarar a veracidade dos fatos, relatou uma falsa realidade exaltando uma
pseuda harmonia que sobressaia sobre as desigualdades e a violência
escravagista, fazendo vistas grossas e minimizando toda humilhação sofrida
pelo negro.
Naquele contexto histórico seria interessante passar uma visão para os
outros países de que no Brasil, não existia mais aquele regime que oprimia e
maltratava o negro em todos os sentidos, e sim, transmitir a falsa sensação de
que viviam em harmonia e igualdade de direitos. A miscigenação entre o branco
e o negro que antes fora abominada, e que traria malefícios cognitivos,
psicológicos e sociais aos seus descendentes, passa a ser, como um toque de
mágica, bem vista e necessária para a construção da identidade e perfil da
sociedade brasileira, agora, essa miscigenação não seria tão prejudicial o quanto
parecia.
Nascimento (1978) com uma visão mais realista dos fatos, salienta que
essa harmonia não passava de uma falácia, pois, a abolição não eximiu o negro
da segregação e da exclusão social, pois ainda eram rejeitados. Uma das formas
de discriminação estava relacionada na tentativa de pleitear uma vaga de
emprego, onde no cartaz já excluía o negro com a frase “Não aceitamos gente
de cor”, porém, após a instituição de uma lei que proibia utilizar esse tipo de
escrita, passaram a usar uma outra expressão nas ofertas de emprego, mas
agora tinha outro pré-requisito: “ter boa aparência”, e assim, a exclusão social e
o racismo eram vistos em sua forma mais velada, caindo por terra a ideologia de
democracia racial.
De acordo com Florestan Fernandes (2008), as questões relacionadas à
democracia racial entre brancos, indígenas e negros são fantasiosas, pois a
partir do momento em que não existe a igualdade nos direitos, não há
democracia, dessa forma, torna-se um mito. A democracia só será uma
realidade quando houver, de fato, igualdade racial entre todos os povos e não
existir nenhuma espécie de discriminação, de preconceito, de estigmatização e
segregação, seja em termos de classe, seja em termos de raça. Por isso, a luta
de classes, deve caminhar juntamente com a luta racial propriamente dita.
Os trechos das poesias abaixo evidenciam que após tantos anos, ainda
não existe democracia racial, ou a igualdade racial entre os povos que
constituíram o Brasil, portanto não basta apenas leis, as ações e políticas
públicas precisam ser revistas, aprimoradas ou criadas.
Ficou curioso (a)? Quer conhecer um pouco mais? Acesse as referências e
procure os links para ouvir estas poesias declamadas na íntegra.

Para conhecer um pouco mais a respeito de como abordar questões


relacionadas aos povos indígenas, desmistificar conceitos e desconstruir
estereótipos relacionados ao período histórico, acesse a link abaixo:

O que fazer (e o que não fazer) ao abordar os povos indígenas em suas


aulas
https://box.novaescola.org.br/etapa/2/educacao-fundamental-1/caixa/268/muito-alem-
do-cocar-leve-a-diversidade-indigena-aos-alunos/conteudo/20259
REFERÊNCIAS

EVARISTO, Conceição. Poemas da recordação e outros movimentos. Belo


Horizonte: Nandyala, 2008.

FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes: o


legado da "raça branca". V. 1. 5ª ed. São Paulo: Globo, 2008.

FERREIRA, Samuel Rocha. Branqueamento, indígenas e o tráfico de


escravos. Portal Geledés. 13 jan. 2021. Disponível em:
<https://www.geledes.org.br/branqueamento-indigenas-e-o-trafico-de-
escravos/>. Acesso em: 07 abr. 2022.

GONZALES, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências


Sociais Hoje, Anpocs, 1984, p. 223-244.

MUNDURUKU, Daniel. Minha vó foi pega a laço. 02 nov 2017. Disponível em:
<http://danielmunduruku.blogspot.com/2017/11/minha-vo-foi-pega-laco.html>.
Acesso em: 07 abr. 2022.

NASCIMENTO, Abdias. O genocídio do negro brasileiro, processo de um


racismo mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978. p. 1.

SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na sociabilidade brasileira. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2013.
Expediente
Secretário Municipal de Educação
Alex Viterale

Subsecretária de Educação
Fábia Aparecida Costa

Diretora do Departamento de Orientações Educacionais e Pedagógicas


Solange Turgante Adamoli

Centro Municipal de Educação a Distância Maria Aparecida Contin


Coordenação Geral
Patrícia Cristiane Tonetto Firmo

Autoria

Cristiane Inocencio, Débora Rosangela, Lilian Fernandes Negreiros de Oliveira, Patrícia


Macieira de Souza, Raquel Carapello, Silvia Piedade de Moraes, Tatiane Campos dos
Santos, Thaís Andrea de Carvalho Calhau.

Revisão de Texto
Flávia Aparecida Ferretti de Lima

Equipe CEMEAD
Adriana Hollais Santos, Cristiane Inocencio, Daniele Araújo Brum, Débora Rosangela
Philomeno Caputi, Dosilia Espírito Santo Barreto, Eliane de Siqueira, Fabiana Soares,
Flávia Aparecida Ferretti de Lima, Giuliane Almeida Cubas, Juliana Portella de Freitas,
Lilian Fernandes Negreiros de Oliveira, Luciana Caliente de Souza, Marcilene de Jesus
Elvira, Patrícia Cristiane Tonetto Firmo, Patrícia Macieira de Souza, Patrícia Yuriko
Geronazzo, Raquel Carapello, Regiane dos Santos Costa, Sergio Henrique de Santana,
Silvia Piedade de Moraes, Tatiane Campos dos Santos, Thaís Andrea de Carvalho
Calhau, Verônica Freires da Silva.

Guarulhos, 2022.

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