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Constipação e hemorroidas

(S04P02)

ANATOMOMORFOFISIOLOGIA DO CANAL ANORRETAL

O canal anal é a última parte do trato gastrointestinal. Ele possui cerca de 3 a 4


cm de extensão e encontra-se completamente retroperitoneal. Ele se inicia na junção
anorretal, distalmente à flexura perineal, e termina no ânus. De forma geral, é uma
importante parte dos órgãos de continência.

Anatomicamente é subdividido em três zonas:

 Colunar: As válvulas anais em conjunto formam a linha denteada (ou pectínea),


influenciando o suprimento sanguíneo, inervação e drenagem linfática de/para o
canal anal.
 Intermediária
 Cutânea

A linha denteada serve como um importante marcador dos vasos superiores e


inferiores
O suprimento sanguíneo, inervação e drenagem linfática é influenciada pela linha
denteada – artérias retais superiores, média, inferiores.
O sangue venoso drena através do plexo hemorroidário interno e externo para
as veias retais superior, média e inferior (circulação corporal).
A linfa drena para os linfonodos/gânglios linfáticos lombrares e inguinais.
A inervação simpática é levada pelo plexo mesentérico inferior, enquanto a
parassimpática pelos nervos esplâncnicos pélvicos e o plexo hipogástrico inferior.
O nervo pudendo é responsável pela inervação sensorial.
Histologicamente, o canal anal consiste nas seguintes zonas:

 Colorretal: membrana mucosa preenchidas com pequenas artérias - epitélio


colunar (cilíndrico) simples
 Transicional: pregas mucosas transversais com criptas e glândulas anais (ductos
epiteliais tubulares) - epitélio colunar (cilíndrico) simples e escamoso
(pavimentoso) estratificado
 Anoderma: esfíncter anal externo - epitélio escamoso (pavimentoso)
estratificado não queratinizado
 Cutânea: semelhante a pele - epitélio escamoso (pavimentoso) estratificado
queratinizado

CONSTIPAÇÃO

 Significa movimento lento das fezes pelo intestino grosso.


 Definição variável: fezes dolorosas por um tempo igual ou superior a 3 dias.
 Associada a grande quantidade de fezes ressecadas e endurecidas no cólon
descendente, que se acumulam devido a absorção excessiva de líquidos.
 A eliminação dolorosa de fezes estimula o comportamento de retenção fecal e inibição
do relexo de defecação.
 Defecação: o acúmulo de fezes no reto causa o reflexo de defecação, que passa do
reto para a medula espinhal e então de volta para o intestino grosso, relaxando o
esfincter interno. Controle voluntário: esfincter anal externo.
 Quando a medula espinhal é lesada (em algum ponto entre o cérebro e o conus), a
parte voluntária da defecação é bloqueada (ato de fazer força para aumentar a
pressão intraabdominal e relaxar os esfincteres), porém a parte entre o conus e o
intestino ainda permanece presente. Ou seja, é preciso estimulo para que ocorra a
defecação (uso de enemas).
Etiologia

 Inibição dos reflexos normais de defecação


 O cólon pode ficar atonico ao longo dos anos devido a inibição dos reflexos normais ou
uso de laxantes.
 Se houver hábitos de defecação em horários e respeitar os reflexos gastrocólicos e
duodenocólicos que causam movimentos de massa no intestino grosso a constipação
será tardiada.
 Espasmos no sigmoide pode ser causa, pois a motilidade do intestino grosso já é fraca
 Constipação primária x idiopática (funcional) x secundária (orgânica)

Constipação funcional

 Atraso ou dificuldade de evacuação por um período superior a 2 semanas


 Idiopática, não relacionada a anormalidade estrutural ou funcional do TGI
 Ciclo vicioso: dor ao evacuação, retenção fecal
 Clínica: contração da musculatura glútea, extensão rígida das pernas, eliminação
de fezes de grande calibre.
 Encoprese: perda involuntária fecal aspecto pastoso ou líquido
(erroneamente diarreia)
 Exame físico: grande bolo fecal palpável na região suprapubica; toque retal:
ampola dilata e preenchida com fezes
 Tratamento
 Orientação para familia e paciente da benignidade
 Uso de lexativos a base de polietilenoglicol, lactulose e óleo mineral
 Treino de Toalete: sentar no vaso por 5-10m após as principais refeições
para aproveitar o reflexo gastrocólico
 Tratamento 3 etapas:
 Desimpactação (via retal e oral)
 Manutenção: formação de fezes macias para que as evacuações
não sejam dolorosas
 Treinamento: recondicionar o hábito intestinal e as evacuações

Desimpactação

Via retal: Enema fosfatado (fosfato de sódio)

Via oral:

 Óleo mineral: laxante emoliente

 Dose: 15-30ml/ ano de idade até 240ml/dia ml/vez.


 Não é recomendada em <2 anos, neuropatas e DRGE.

 Polietilenoglicol 3350:

 Dose: 1- 1,5/kg/dia VO por 3-6 dias. A dose diária deve ser dissolvida em
aproximadamente 10ml/kg de água. (sucesso com 3 doses chega a
95%).

Manutenção

 Após a resolução da desimpactação, o foco do tratamento é a prevenção da


recorrência.
 A manutenção consiste em intervenções dietéticas, modificações do
comportamento e laxativos a fim de assegurar que as evacuações ocorram em
intervalos normais e sem desconforto.
 O aleitamento artificial aumenta em 4,5 vezes o risco de constipação, em
relação ao aleitamento natural predominante (exclusivo ou leite materno, água
e chá). Deve-se encorajar ingesta de líquidos e de carboidratos absorvíveis e
não absorvíveis. Sorbitol (suco de maçã, pera e ameixa) aumenta a frequência e
a quantidade de água nas fezes.
 Dieta balanceada, incluindo grãos integrais, frutas e vegetais (feijão, ervilha,
lentilha, grão-de-bico, milho, pipoca, coco, verduras, aveia em flocos, frutas
com casca e bagaço). Pode-se utilizar farelos e cereais integrais para o preparo
de massas, tortas, pães, bolos e farofas, na proporção de 1/3 das farinhas.
 Probióticos: microorganismos vivos que atuam beneficamente no organismo,
melhorando o equilíbrio da microbiota intestinal.
 Prebióticos: substâncias que, quando ingeridas, não são digeridas e nem
absorvidas no intestino delgado. Quando atingem o cólon, estimulam
seletivamente uma bactéria ou um grupo delas que têm característica de
probióticos. Poucos estudos com probióticos e constipação.

Treinamento

 Ter um tempo pra ir ao banheiro sem pressa após as refeições principais


(reflexo gastrocólico). Permanecerem sentadas no vaso sanitário, com
apoio fixo para os pés. Diário da frequência das evacuações. Sistema de
recompensas (reforço positivo). Psicoterapia.

Constipação funcional – critérios de Roma III


Constipação secundária (orgânica)

 Tumores, aderências que causam constrição ou úlceras


 Se as fezes se acumularem acima do cólon sigmoide espásticos, secreções colônicas
excessivas causarão diarreia. Ocorrerá alternancia entre diarreia e constipação
 Megacólon (Doença de Hirschprung): a permanência de fezes por vários dias no cólon
faz com que haja distensão de 7-10 cm.
 Possível causa também é a deficiência de células ganglionares no plexo
mioentérico do cólon, causando pouco reflexo de defecação e pouca
motilidade peristáltica.
 Ampola vazia ao toque; fezes de pequeno volume e tamanho
 Dx.: biópsia da submucosa 2 cm acima da linha denteada
 Tratamento cirúrgico: colostomia temporária, retirada do segmento
agangliônico.

Diagnóstico
 Anamnese convencional
 Duração do sintoma
 Frequência das evacuações
 Consistência das fezes
 Hábitos de evacuação
 Estilo de alimentação
 Sangue nas fezes?
 Sintomas sistêmicos associados?
 Aspectos psicossociais (ansiedade? depressão? violência sexual?)

Tratamento convencional
 Individualizar, orientar em conformidade.
 Intervenções não farmacológicas (mudanças alimentares e aumento de atividade
física): úteis para constipação com trânsito normal e casos leves de constipação com
trânsito lento.
 Laxativos: não é aconselhado o uso rotineiro na constipação crônica.
 Biofeedback e reeducação intestinal: particularmente úteis em casos de disfunção do
assoalho pélvico.

Interpretações possíveis da psicanálise

A psicanálise interpreta a defecação como um ato de doação e generosidade.


A prisão de ventre pode evidenciar um apego excessivo às coisas materiais e à
incapacidade de conseguir desapegar-se desse âmbito da vida.
Se o intestino grosso simboliza o inconsciente, o nosso “lado sombrio”, e as fezes
correspondem aos conteúdos do inconsciente, a constipação é uma tentativa de
mantê-lo oculto.

HEMORROIDAS

 Se desenvolvem secundariamente a pressão venosa persistente no plexo


hemorroidal
 Consistem em vasos submucosos de paredes finas e dilatados que se projetam
abaixo da mucosa anal ou retal

 Hemorroidas internas: acima da linha anorretal


 Hemorroidas externas: abaixo da linha anorretal
A doença hemorroidária surge quando há congestão, dilatação e aumento dos
corpos cavernosos do canal anal formando grandes emaranhados vasculares,
submucosos e/ou subcutâneos, flexíveis, que se enchem de sangue, constituindo os
mamilos hemorroidários, os quais constituem os plexos hemorroidários INTERNO e
EXTERNO.

Etiopatogenia
 Veia varicosa: dificuldade do esvaziamento sanguíneo do canal anal no ato
defecatório, com congestão e dilatação dos corpos cavernosos.
 Degenerativa: prolapso anormal do plexo hemorroidário interno, durante a
evacuação, por deficiência de sua fixação pela musculatura longitudinal da
submucosa (músculo de Treitz).
 Mecânica: excessivo esforço defecatório e/ou pela dieta pobre em resíduos
(fibras) e pouca ingestão de líquidos, que pode acarretar o endurecimento das
fezes e aumentar ainda mais o esforço evacuatório.
 Hiperplasia vascular: hiperplasia dos corpos cavernosos do canal anal que
poderá ocasionar sua dilatação e aumento.
 Hemodinâmica: comunicações arteriovenosas, muito calibrosas, na submucosa
do canal anal, facilitando o aumento e dilatação dos corpos cavernosos.
 Disfunção do esfíncter anal interno: Hiperatividade do esfíncter anal interno do
ânus com hipertonia ocasionando distensão dos corpos cavernosos.
 Fatores agravantes: hábitos defecatórios errôneos, tais como: insistência em
evacuar todos os dias, esforçar-se para defecar em um determinado horário
por conveniência ou forçar o esvaziamento total do conteúdo retal de uma só
vez.
 Fatores desencadeantes são: constipação intestinal, abuso de laxativos (em
especial, os catárticos), diarreia crônica, gravidez (pelo aumento da pressão
intra-abdominal), e a posição bípede do ser humano.
 Não há remissão espontânea para a doença hemorroidária; uma vez
manifestada e sem tratamento, sua evolução é progressiva.

Classificação
 Localização do mamilo hemorroidário no canal anal e com a presença ou não
de seu prolapso.
 Os mamilos podem ser: internos, externos ou mistos no canal anal. Apresentam
consistência amolecida e forma abaulada. Devido à ramificação arterial da retal
superior, pode haver três mamilos internos, de localização anterior direita,
posterior direita e lateral esquerda, denominados principais, e os demais,
quando existentes, são ditos secundários

Mamilo hemorroidário interno


 Situado acima da linha pectínea, na parte interna ou proximal do canal anal
1. 1º GRAU. Mamilo hemorroidário interno que não prolaba pelo canal anal quando da
evacuação ou aos esforços
2. 2º GRAU. Quando ele prolaba através do canal anal durante o esforço evacuatório,
exteriorizando-se pelo ânus, porém retraindo-se, espontaneamente, cessado esse
esforço
3. 3º GRAU. Mamilo que prolaba à evacuação e/ou aos esforços e não retorna
espontaneamente, necessitando ser recolocado digitalmente para o interior do canal
anal.
4. 4º GRAU. Mamilo interno permanentemente prolabado pelo canal anal (lado externo),
sem possibilidade de ser recolocado para o interior do canal anal

Mamilo hemorroidário externo


 Localizado abaixo da linha pectínea, no anoderma
 Caracteriza-se por dilatações dos vasos subcutâneos do anoderma, formando
um abaulamento de consistência mole, indolor e, às vezes, de coloração
vinhosa.

Mamilo hemorroidário misto


 Na existência, concomitante, de mamilos internos e externos

Clínica
 Sangramento
 Prolapso: quando o mamilo hemorroidal interno se exterioriza
 Exsudação perianal: irritação da mucosa, acompanhado por prurido e
dermatite
 Desconforto anal
 Dor: a presença de dor no canal anal concomitante à doença hemorroidária ou
é causada pelas suas complicações, como a trombose vascular (endoflebite), o
hematoma, ou pela presença concomitante de outras enfermidades dolorosas
dessa região, como a fissura anal, a infecção perianal (criptite, papilite ou
abscesso), as lesões inflamatórias ou tumorais

Diagnósticos diferenciais
 procidência retal, papila anal hipertrófica, hemangiomas perianais, condiloma,
plicomas, fissura anal, processos infecciosos (criptites, papilites ou abscessos),
doenças inflamatórias, tumores benignos ou malignos do canal anal e tumores
retais prolabados benignos.

Tratamento
 Depende de haver sintomas e de seu tipo e gravidade.
 Tratamento clínico:
 sintomas discretos e esporádicos ao paciente, com longos períodos de
acalmia. Está indicado, também, nas gestantes com doença
hemorroidária não complicada, em especial no terceiro trimestre. Em
doentes terminais, cirróticos, cardiopatas graves ou com importante
comprometimento do estado geral.
 Medidas higiênico-dietéticas. Orientar os hábitos evacuatórios
do paciente, tais como o fato de evacuar sempre que sentir
desejo. Provocar amolecimento das fezes e diminuição do
tempo de trânsito intestinal, evitando o trauma local e o esforço
evacuatório. É importante a proibição do uso de laxativos, em
especial dos catárticos. Orientar a utilização de uma dieta rica
em fibras (farelos, germe de trigo etc). Indicar a ingestão
abundante de líquidos (aproximadamente 2 l/dia) e evitar
bebidas alcoólicas, pimentas e condimentos pela ação irritante
sobre a mucosa do canal anal.
 Cuidados locais. Deve-se proibir a utilização de papel higiênico
para limpeza anal, substituindo-o por banhos de assento com
água morna.
 Medicação tópica. É indicada para aliviar o desconforto local,
fazendo-se uso de pomadas e/ou supositórios à base de
anestésicos e anti-inflamatórios.
 Drogas vasoativas. A administração oral de drogas va- soativas
na doença hemorroidária está indicada para comple- mentar o
tratamento clínico e, muitas vezes, também, nas crises de
agudização.

 Tratamento ambulatorial de hemorroidas internas


 É procedimento que não necessita de anestesia, permitindo o tratamento de
vários mamilos hemorroidários internos em uma mesma sessão, podendo-se,
inclusive, associar diferentes métodos em um mesmo paciente.
 Escleroterapia
 Crioterapia
 Fotocoagulação.
 Ligadura elástica

 1º grau: crioterapia ou fotocoagulação;


 2º grau: fotocoagulação ou ligadura elástica;
 3º grau: ligadura elástica;
 4º grau: ligadura elástica ou hemorroidectomia (gram-
peamento).

 Técnicas de hemorroidectomia
 Mamilos hemorroidários externos ou mistos. Este procedimento pode
ser realizado em ambulatório ou com o paciente hospitalizado. Em
nosso serviço, somente indicamos a hospitalização para a cirurgia na
doença hemorroidária mista de grandes proporções em que para sua
realização seja necessária a anestesia por bloqueio ou em situações
especiais do enfermo.
 Durante a dissecção dos mamilos hemorroidários, é importante a
correta delimitação do plano anatômico entre eles e o esfíncter anal
interno, pois sua lesão poderá acarretar graus variáveis de incontinência
fecal.
 Hemorroidectomia aberta: excisão de todo o mamilo
hemorroidário com ligadura do seu pedículo vascular,
mantendo-se a área de dissecção aberta para a sua cicatrização
por segunda intenção (3 e 4 semanas).
 Hemorroidectomia fechada: fechamento das feridas operatórias
com sutura contínua, tendo como vantagens a cicatrização mais
rápida (2 semanas), com pouca secreção local e menor
incidência de defeitos cicatriciais.

Trombose hemorroidária
 Alguns pacientes podem apresentar estase sanguínea, aguda e volumosa, nos
plexos hemorroidários, tanto externos quanto internos, que, com frequência,
evoluem para um processo inflamatório endoflebítico, desencadeando uma
trombose hemorroidária
 Quando a trombose hemorroidária é extensa, também pode ser chamada de
pseudoestrangulamento hemorroidário. Caracteriza-se por apresentar, além do
processo inflamatório endoflebítico, intenso edema e necrose. Sem tratamento
correto, pode evoluir para ulceração e dor intensa da região afetada
 Quadro clínico:
 aparecimento é abrupto.
 Dor local intensa, contínua e latejante
 edema local e sensação de tenesmo retal.
 Poderá haver secreção perianal com mau cheiro associado, ou não, ao
sangramento do mamilo trombosado. Poderá provocar dificuldade
evacuatória e retenção urinária.
 Tratamento: banhos de assento mornos, bolsa quente perianal, uso de
analgésicos e inflamatórios tópicos, na forma de pomadas, e parenterais,
auxiliares da defecação, como mucilagens e fibras, e repouso físico.
 Cirúrgico: hemorroidectomia.

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