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CONSTIPAÇÃO

NO IDOSO
MARIA ALICE DE VILHENA TOLEDO
RENATO FABBRI
MARINA MACHADO PEREIRA LINS

 INTRODUÇÃO
A constipação intestinal não decorre do processo fisiológico do
envelhecimento, embora constitua um dos achados gastrintestinais mais
comuns em idosos. Essa condição está associada à perda da qualidade de
vida e a custos elevados, por isso o reconhecimento e o tratamento adequado
são importantes.1,2
A prevalência de constipação aumenta com a idade, e alguns estudos estimam
acometimento de até 50% em idosos acima dos 80 anos. Em idosos residentes
na comunidade, a ocorrência de constipação varia entre 30-40%, enquanto em
idosos institucionalizados a prevalência pode ser superior a 50%.3,4 Estimativas
apontam uso diário de laxativos em 50 a 74% dos idosos residentes nas
instituições de longa permanência.4
Fatores de risco para constipação crônica incluem:

 sexo feminino;5
 sedentarismo;
 imobilidade parcial ou total;
 baixa escolaridade e baixa renda;
 uso de medicações com efeito constipante;
 sintomas depressivos;6
 baixa ingestão calórica;
 dieta pobre em fibras;7,8
 polifarmácia.9

A impactação fecal, uma das principais complicações da constipação, pode


ocasionar delirium, anorexia, náusea e dor, levando o paciente a declínio
funcional.5

 OBJETIVOS
Ao final da leitura deste artigo, o leitor deverá ser capaz de:

 interpretar, de forma precisa, casos de constipação no idoso, com


base na definição dessa condição clínica;
 identificar os fatores etiológicos e de risco para ocorrência da
constipação no idoso;
 avaliar clinicamente o paciente idoso com constipação e definir a
necessidade de exames complementares;
 desenvolver condutas que auxiliem em diagnósticos diferenciais e
forneçam base para terapêutica de constipação em paciente idoso;
 elaborar estratégias educativas para prevenção de constipação em
idosos.

 ESQUEMA CONCEITUAL

 APRESENTAÇÃO CLÍNICA DA CONSTIPAÇÃO NO IDOSO


Apesar de algumas vezes, na prática clínica, a constipação ser definida como a
diminuição na frequência das evacuações (tipicamente, menos de três vezes
por semana), a queixa do paciente nem sempre está relacionada a esse dado,
mas a sintomas qualitativos, como distensão abdominal, eliminação de fezes
endurecidas ou fragmentadas, defecação prolongada ou difícil (com esforço
excessivo), necessidade de manobras manuais para eliminar as fezes e
sensação de evacuação incompleta.
O critério diagnóstico utilizado em pesquisas clínicas e que proporciona
definição mais completa e reprodutível da constipação intestinal é o de Roma
III.10 A frequência das evacuações é apenas um dos aspectos.
Pelos critérios de Roma III, o paciente deve apresentar ao menos dois dos seis
sintomas por, pelo menos, três meses durante os últimos seis meses:

 esforço em pelo menos 25% das defecações;


 fezes endurecidas ou em cíbalos em pelo menos 25% das
defecações;
 sensação de evacuação incompleta em pelo menos 25% das
defecações;
 sensação de obstrução anorretal/bloqueio em pelo menos 25% das
defecações;
 necessidade de manobras manuais para facilitar as evacuações em
pelo menos 25% de defecações (como estímulo dígito-anal ou suporte
do assoalho pélvico);
 menos de três evacuações por semana.
O paciente também não deve preencher critério para síndrome do intestino
irritável e raramente eliminar fezes amolecidas sem o uso de laxativos.

ETIOLOGIA
A constipação crônica pode ser dividida em duas categorias: primária e
secundária.
Na constipação primária, a avaliação do trânsito colônico e da função anorretal
é usada para categorizar os pacientes em três grupos, conforme apresenta o
Quadro 1.
Quadro 1
CLASSIFICAÇÃO DA CONSTIPAÇÃO
PRIMÁRIA
Classificação Descrição
Constipação Neste caso, o movimento das
com trânsito fezes é normal ao longo do
normal (ou cólon. O paciente geralmente
constipação relata sintomas de dor abdominal
intestinal e inchaço. A constipação com
funcional) trânsito normal foi associada a
um aumento do estresse
psicossocial.7
Constipação Neste caso, há lentificação do
com trânsito movimento do bolo fecal do
lentificado cólon proximal para o cólon
distal e o reto. Em alguns
indivíduos, a causa para o
trânsito lento pode ser alimentar
ou mesmo cultural. Outros
provavelmente apresentam uma
base fisiopatológica, embora não
se conheça ao certo seus
mecanismos. Tem sido proposto
que existem dois subtipos de
constipação de trânsito lento:11

 redução da propulsão
colônica (inércia
colônica),
possivelmente
relacionada à
diminuição do número
de contrações de
propagação de alta
amplitude, leva a um
tempo prolongado de
permanência do
resíduo fecal no colón
direito;
 aumento de atividade
motora incoordenada
no colón distal leva a
uma barreira ou a uma
resistência ao trânsito
normal.
Distúrbio da Neste caso – também
defecação denominado “constipação de
saída”, “obstrução da saída”,
“disfunção anorretal”,
“evacuação obstruída”,
“anismus” ou “dissinergia do
assoalho pélvico” –, ocorre
disfunção neuromuscular do
assoalho pélvico, levando à
retenção do resíduo fecal por
períodos prolongados no reto.
Caracteriza-se por evacuação
retal prejudicada devido à força
de propulsão retal inadequada
e/ou aumento da resistência à
evacuação, como pode ocorrer
em consequência da alta pressão
anal em repouso (anismus) e/ou
do relaxamento incompleto ou da
contração paradoxal do assoalho
pélvico e do esfíncter anal
externo durante a defecação.
Distúrbios estruturais (por
exemplo: retocele,
intussuscepção) e diminuição da
sensibilidade retal podem
coexistir.

A distinção entre a constipação com trânsito normal e a com trânsito lentificado


não é rotineiramente utilizada na prática clínica, pois requer a realização de
manometria colônica.
A constipação crônica secundária é causada por condições médicas – como
doenças primárias do cólon (estenose, câncer, proctite) ou distúrbios
metabólicos (hipercalcemia, hipotireoidismo, diabetes melito) –, uso de
medicações e distúrbios neurológicos (parkinsonismo, lesões na medula
espinhal).

A combinação ou a sobreposição de causas da constipação no idoso é


frequentemente observada na avaliação clínica; por exemplo, trânsito
lentificado associado a distúrbio da defecação.
No Quadro 2, a seguir, é apresentada uma síntese da etiologia da constipação.
Quadro 2
CAUSAS DA CONSTIPAÇÃO
Constipação Causas
Primária  Constipação com trânsito
(idiopática normal
ou  Constipação com trânsito
funcional) lentificado
 Redução da propulsão
colônica
 Aumento de atividade
motora incoordenada no
colón distal
 Distúrbio da defecação

Secundária  Uso de medicações


 Aspectos metabólicos
 Diabetes melito
 Hipocalemia
 Hipomagnesemia
 Hipercalcemia
 Hipotireoidismo
 Hipertireoidismo
 Hiperparatireoidismo
 Porfiria
 Megacólon
 Doença de Chagas
 Traumas psicológicos
 Abuso físico
 Abuso emocional
 Transtornos psiquiátricos
 Depressão
 Ansiedade
 Anorexia nervosa
 Síndromes dolorosas pélvicas
 Estruturais
 Tumor
 Retocele
 Prolapso retal
 Problemas neurológicos
 Lesão medular
 Esclerose múltipla
 Doença de Parkinson
 Amiloidose
 Imobilidade
 Síndrome paraneoplásica

COMPLICAÇÕES
A constipação pode levar a impactação fecal (fecaloma), que pode se
manifestar com náusea, anorexia ou dor.

A impactação fecal refere-se ao acúmulo de fezes endurecidas no reto ou no


cólon.
A massa fecal endurecida pode ocasionar sensação retal diminuída e levar a
incontinência fecal, diarreia paradoxal, obstrução intestinal ou até mesmo
ulcerações do cólon. Pode ainda deflagrar quadros de delirium.

Em idosos frágeis, uma força excessiva para evacuar pode levar a episódios de
síncope e isquemia cerebral.5
Alguns trabalhos relatam que a qualidade de vida de idosos com constipação é
menor quando comparados a idosos sem essa complicação.5
 AVALIAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO
São fundamentais a obtenção de história clínica detalhada e a realização de
exame físico completo no idoso com queixa de constipação.

HISTÓRIA CLÍNICA
A anamnese deve conter descrição acerca do início e da duração da
constipação, além de buscar elementos para o diagnóstico de causas
secundárias a essa condição. Muitas doenças sistêmicas e/ou neurológicas
que alteram a motilidade do cólon afetam órgãos fora do trato gastrintestinal,
por isso esses pacientes podem apresentar outros sintomas, além de prisão de
ventre.

Durante a história clínica, é essencial investigar o hábito intestinal do paciente


(frequência da defecação, coloração, consistência e quantidade de fezes),
mudança recente desse padrão, presença de sangramento, de dor ou de
tenesmo (esforço à evacuação), ocorrência de perda ponderal e outros
sintomas associados, como dor abdominal, náuseas e vômitos.
Deve-se questionar o idoso com queixa de constipação quanto ao uso de
próteses dentárias, qualidade da mastigação, dificuldade para deglutição,
características da dieta e prática de atividade física, além de grau de
imobilismo, e realizar testes cognitivos e de rastreio para depressão e
ansiedade.
Deve ser feito inventário de todas as medicações utilizadas pelo paciente,
tentando identificar causas iatrogênicas, em particular a relação temporal entre
o início de um determinado fármaco e o aparecimento de constipação. É
interessante também questionar sobre o uso crônico de laxativos.
A ocorrência de constipação crônica não associada a uma causa facilmente
identificável (como uso de medicações) deve motivar a investigação para
causas estruturais ou doenças orgânicas. Isso é particularmente importante em
idosos que:12

 queixam-se de esforço excessivo ou de sensação de evacuação


incompleta;
 apresentam perda ponderal significativa;
 relatam dor abdominal recorrente e intensa;
 experimentaram mudança súbita do hábito intestinal;
 apresentam hematoquezia ou enterorragia;
 possuem história familiar de câncer de cólon ou de doença
inflamatória intestinal;
 apresentam anemia ou positividade na pesquisa de sangue oculto nas
fezes.
O diagnóstico de constipação funcional deve ser considerado somente após a
exclusão de todas as outras possíveis doenças.
O Quadro 3 apresenta uma lista de medicações que podem causar
constipação.
Quadro 3
MEDICAÇÕES QUE PODEM CAUSAR
CONSTIPAÇÃO

 Medicações com ação anticolinérgica


 Anti-histamínicos
 Antiespasmódicos
 Antidepressivos
 Antipsicóticos
 Analgésicos/opioides
 Suplementos de ferro
 Antiácidos contendo alumínio
 Anti-hipertensivos
 Anti-hipertensivos de ação central
 Bloqueadores do canal de cálcio
 Diuréticos
 Medicações antiparkinsonianas
(anticolinérgicos ou dopaminérgicos)

EXAME FÍSICO
O exame físico completo pode identificar possíveis causas sistêmicas de
constipação, como doenças metabólicas ou neuromusculares.
A cavidade oral deve ser inspecionada para avaliação da dentição e pesquisa
de lesões que possam interferir na ingestão dos alimentos. Já o exame
abdominal deve buscar a presença de distensão, dor, tumorações ou hérnias,
alteração da sensibilidade ou dos ruídos intestinais.

Durante o exame físico, examinar a região perianal e realizar o toque retal são
sempre ações obrigatórias em casos de constipação.Para realizar o exame de
toque retal, o paciente deve ser adequadamente posicionado. A posição mais
cômoda para o paciente é a lateral de Sims, que consiste no decúbito lateral
direito ou esquerdo com as pernas fletidas sobre o abdome. O exame também
pode ser realizado na posição genupeitoral (posição de prece maometana).
A região perianal deve ser inspecionada quanto à presença de escoriações,
marcas na pele, hemorroidas, fístulas, fissuras e prolapso retal. Ao toque retal,
devem ser avaliados o tônus do esfíncter anal e a presença de massas,
retocele e fezes na ampola retal.

Para verificar constipação, durante o exame digital com a mão direita, o


examinador procura por áreas de sensibilidade aumentada, massas, estenoses
e fezes (quando presentes, avaliar consistência). O tônus do esfíncter é
classificado como normal, diminuído ou aumentado. Enquanto o paciente faz
força para baixo, como se fosse evacuar, o examinador coloca a mão esquerda
no abdome do paciente para avaliar o esforço de pressão. Normalmente, a
contração dos músculos abdominais é acompanhada por relaxamento do
esfíncter anal e da musculatura puborretal e descida perineal. Pacientes com
discinesia podem apresentar incapacidade para relaxar o esfíncter anal,
contração paradoxal do esfíncter anal ou ausência da descida perineal.11
Quando se suspeitar de prolapso retal e isso não for visível com o paciente
deitado, deve-se tentar identificar essa condição pedindo ao paciente que fique
em posição de cócoras, fazendo esforço evacuatório.

Embora o toque retal cuidadoso seja útil na identificação de disfunção do


assoalho pélvico, o exame normal não é suficiente para exclusão desse
diagnóstico.

INVESTIGAÇÃO
Para investigação da constipação, podem ser necessários exames
complementares com o intuito de afastar causas secundárias ou de
diagnosticar prontamente doenças graves, como o câncer de cólon.
A Figura 1 apresenta informações para investigação da constipação. Esses
aspectos serão mais bem detalhados a seguir.
PSOF: presença de sangue oculto nas fezes.
Figura 1 – Investigação da constipação.
Fonte: Tack e colaboradores (2011).13

Exames laboratoriais

Hemograma completo, glicemia, creatinina sérica, cálcio sérico (iônico e total) e


TSH (hormônio estimulante da tireoide) devem ser solicitados para pacientes
constipados que apresentem hematoquezia, perda ponderal significativa,
história familiar de neoplasia de cólon ou de doença inflamatória intestinal,
anemia. Tais exames também são indicados para pacientes com mudança
recente do padrão de funcionamento intestinal. Havendo epidemiologia
sugestiva de doença de Chagas, deve-se solicitar também a sorologia
específica para essa tripanossomíase.
Outros exames

Em relação a outros exames para verificar constipação, a radiografia simples


de abdome permite identificar a impactação fecal, que pode decorrer de
megacólon. As endoscopias (retossigmoidoscopia flexível e colonoscopia)
proporcionam a identificação de lesões que provocam estreitamento ou oclusão
de segmento intestinal, a realização de biópsia de lesão suspeita e a
polipectomia.
A American Gastroenterological Association Medical Position Statement on
Constipation (2013) apresenta o algoritmo de avaliação de constipação com
outros exames, como a manometria anorretal, o teste de expulsão do balão
intraretal, o tempo de trânsito colônico e a defecografia. Esses exames são
raramente solicitados para os pacientes idosos, sendo reservados apenas para
os casos refratários.

 TRATAMENTO
O tratamento da constipação intestinal pode ser dividido em medidas gerais e
terapêutica farmacológica.

MEDIDAS GERAIS
Inicialmente, deve-se investigar e tratar todas as causas secundárias da
constipação.4 O tratamento sintomático sem investigação adequada pode
esconder um diagnóstico de doença potencialmente grave. A anamnese tem
papel fundamental, e a presença de sinais de alerta – como início recente,
alternância do hábito intestinal, perda de peso, sangramento intestinal, anemia
e história familiar de neoplasia intestinal – reforça a necessidade na busca de
uma causa orgânica.

Sempre que possível, deve-se substituir fármacos que possam contribuir para a
constipação intestinal.
Na constipação crônica funcional, deve-se orientar o paciente quanto ao melhor
horário para a evacuação, estimulando-o a fazê-la na presença dos reflexos
fisiológicos ortocólico e gastrocólico, ao se levantar e 30 minutos após as
refeições. Deve-se também evitar o bloqueio voluntário e repetido do desejo de
evacuar, que contribui para diminuir os reflexos sensitivos causados pelo bolo
fecal no reto. Quanto à postura, a posição de cócoras pode facilitar a
evacuação. Atividades cotidianas de distração no momento da evacuação,
como leitura, por exemplo, podem ser prejudiciais quando se pretende
reestabelecer o funcionamento intestinal regular, porém não deve ser
desestimulada para pacientes que já criaram um condicionamento.

A dieta tem papel fundamental na terapêutica não farmacológica da


constipação, incluindo fibras e líquidos. As fibras constituem a porção não
digerível dos vegetais (suas fontes principais são os cereais, as frutas, as
verduras e as leguminosas), pois atuam na retenção de água e aumentam o
bolo fecal. Habitualmente, devem ser ingeridas entre 10 e 25g ao dia. Os
efeitos adversos mais usuais do consumo de fibras incluem dor abdominal e
flatulência, especialmente nas fases iniciais de uso.
A ingestão frequente de líquidos deve ser estimulada, respeitando-se, porém,
as comorbidades associadas, como a insuficiência cardíaca e a insuficiência
renal.13

TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA
Os laxativos devem ser usados quando medidas não farmacológicas para o
tratamento da constipação não forem satisfatórias. Existem diferentes
substâncias disponíveis, muitas delas limitadas para uso crônico em idosos
pelos potenciais efeitos colaterais. Elas são classificadas de acordo com seu
principal mecanismo de ação, sendo que muitos fármacos são comercializados
em associação.14
Os laxativos usualmente utilizados no tratamento da constipação intestinal são
mostrados na Tabela 1.
Tabela 1
VO: via oral; VR: via retal; IRC: insuficiência renal crônica; min: minutos.

Laxativos formadores de bolo fecal

Os laxativos formadores de bolo fecal apresentam mecanismos semelhantes


aos das fibras dietéticas, pois retêm líquido e aumentam o bolo fecal. São
constituídos por derivados da celulose e polissacarídeos semissintéticos, como
metilcelulose, plântago, ágar e farelo e têm como feitos principais adversos
o desconforto abdominal e a flatulência. Previamente ao seu uso, deve-se
sempre avaliar o risco de impactação fecal (uso de opioides, desidratação,
confinamento crônico ao leito, obstrução intestinal, megacólon), quando pode
haver contraindicação.

Laxativos osmóticos

No grupo de laxativos osmóticos, estão os laxativos salinos, representados


pelos sais de magnésio e sódio, bem como por dissacarídeos não
reabsorvíveis. Os laxativos salinos provocam retenção de água na luz intestinal
e estimulam a liberação da colecistoquinina, que aumenta a atividade motora
do cólon. Não devem ser utilizados por tempo prolongado em razão de seus
efeitos adversos potenciais.
Os sais de magnésio, com o uso crônico, podem levar
a hipermagnesemia, insuficiência renal, além de interferir na absorção de
vários fármacos, como dicumarínicos, digoxina, clopromazina, tetraciclina e
isoniazida. Precaução também deve ser tomada quanto ao uso de sais de
sódio em pacientes com insuficiências cardíaca e renal.

Os dissacarídeos são substâncias que chegam inalteradas ao cólon, onde são


degradadas por bactérias intestinais em ácidos orgânicos, que elevam a
osmolaridade intraluminal e a acidez das fezes, contribuindo para o aumento
da motilidade colônica. Constituem-se em terapêutica farmacológica efetiva em
idosos, mas, apesar de bem tolerados, têm como efeitos adversos flatulência e
dor abdominal.

Laxativos estimulantes

Os laxativos estimulantes são representados pelas antraquinonas (sene,


cáscara-sagrada) e pelos difenilmetanos (fenolftaleína, bisacodil, picossulfato
de sódio). O seu uso desses fármacos é frequente, inclusive, como
automedicação.
Os difenilmetanos inibem a absorção de sódio e glicose, aumentando o teor de
água no cólon e estimulando sua motilidade. Quanto aos efeitos adversos
principais, apresentam dor abdominal, distúrbio eletrolítico e reação alérgica,
associada especialmente à fenolftaleína.
As antraquinonas promovem a estimulação direta do plexo mioentérico e
alteram o transporte de eletrólitos, aumentando a quantidade de líquido
intraluminal e a atividade propulsiva do cólon. Seu uso regular pode
causar melanosis coli(coloração melanocítica na mucosa do cólon), condição
benigna e frequentemente reversível, além de distúrbio eletrolítico,
especialmente a hipocalemia. Embora descrita na literatura, não há relatos
definitivos sobre carcinogênese ou lesão da inervação mioentérica com o uso
prolongado desse laxativo.

Laxativos lubrificantes e emolientes

Os laxativos lubrificantes e emolientes têm como ação amolecer e lubrificar as


fezes, bem como diminuir a absorção de água do cólon.

Laxativos lubrificantes não devem ser utilizados em idosos com déficit cognitivo
grave ou em casos de disfagia, em razão do risco de pneumonia lipoídica.
Recomenda-se evitar seu uso no período noturno pela possiblidade de
broncoaspiração em portadores de refluxo gastresofágico. Seu emprego
prolongado, superior a um ano, pode contribuir para a malabsorção das
vitaminas lipossolúveis.
Os emolientes reduzem a tensão superficial das fezes, aumentando a retenção
de água e substâncias gordurosas no bolo fecal. São representados pelos sais
de docusato (docusato de sódio, potássio e cálcio) e frequentemente
encontrados nas farmácias em associação com laxativos estimulantes.

Enemas e supositórios

Os enemas (fosfato de sódio) têm indicação apenas para o tratamento da


impactação fecal e para a terapêutica intermitente da constipação crônica
quando outras medidas não foram eficazes. Seu uso crônico tem como
potenciais efeitos adversos irritação retal e hiperfosfatemiaem portadores de
insuficiência renal crônica. Os supositórios (glicerina) estão indicados durante o
regime de treinamento intestinal. O uso prolongado também pode levar à
irritação retal.

Medicamentos pró-cinéticos

Os medicamentos pró-cinéticos são utilizados primariamente no tratamento dos


distúrbios funcionais do trato intestinal alto; porém, mais recentemente, têm
sido relacionados no tratamento adjuvante da constipação intestinal. Novos
compostos, como o prucaloprida (agonista da serotonina), foram recentemente
introduzidos no país com resultados promissores, mas ainda sem estudos
consistentes na população idosa. A cisaprida não está mais disponível, em
razão de efeitos adversos cardíacos relacionados.

Outros agentes

Alguns agentes, conforme descreve a literatura, apresentam ação laxativa,


todavia são utilizados primariamente com outros fins terapêuticos e, portanto,
não empregados no tratamento primário da constipação intestinal, como a
colchicina e o misoprostol. Outros fármacos, como linaclotide, lubiprostona e
elobixibat, surgem como opções emergentes, porém sem evidências para uso
na prática diária.5

OUTRAS MEDIDAS TERAPÊUTICAS


Outras opções terapêuticas têm sido descritas, embora não utilizadas na rotina
do tratamento da constipação intestinal, incluindo:

 técnicas de biofeedback;
 cirurgia;
 uso de toxina botulínica;
 acupuntura.
O biofeedback tem como princípio resgatar um reflexo preexistente,
reeducando o paciente. Inicialmente proposto na terapêutica de pacientes
jovens com constipação crônica com desordens defecatórias, tem sido utilizado
mais recentemente em pacientes idosos, em casos refratários às medidas
habituais.

A colectomia subtotal é proposta em algumas situações como opção


terapêutica, tal como na constipação idiopática crônica com inércia colônica.
O uso de toxina botulínica tem sido descrito em idosos com constipação
intestinal relacionada à doença de Parkinson. Já alguns estudos ligados à
medicina tradicional chinesa mostram o uso da acupuntura no tratamento da
constipação.

 ABORDAGEM GERAL DA CONSTIPAÇÃO CRÔNICA


A Figura 2 apresenta de forma sistematizada os passos necessários para uma
abordagem padrão da constipação crônica.
Figura 2 – Tratamento da constipação intestinal crônica.
Fonte: Tack e colaboradores (2011).13

 CONCLUSÃO
A prevalência de constipação aumenta com o envelhecimento, mas não deve
ser considerada parte do processo de envelhecimento fisiológico
(senescência). É comum que os idosos se queixem mais de sintomas
qualitativos, como esforço excessivo ao evacuar, do que diminuição da
frequência de evacuações.
Para a avaliação do idoso constipado, devem ser contempladas as condições
de saúde oral, o uso de próteses dentárias, a presença de disfagia, as
características da dieta, a ingestão de líquidos, os sinais de desidratação
crônica, o sedentarismo e o grau de imobilidade. Sempre fazer o inventário
medicamentoso, buscando identificar medicações potencialmente constipantes,
é essencial para o diagnóstico.
Algumas complicações devem ser consideradas e merecem atenção, como a
formação de fecaloma, que é frequente e relaciona-se ao surgimento
de delirium, com seu impacto cognitivo, funcional, econômico e de morbidade e
mortalidade descritos em literatura. Também deve-se estar atento para
presença de impactação fecal, pois pode provocar diarreia paradoxal.
Para os casos de pacientes com sinais de alarme – hematoquezia, perda
ponderal, anemia, história familiar de câncer de cólon/doença inflamatória
intestinal, positividade na pesquisa de sangue oculto fecal e mudança recente
no hábito intestinal –, devem ser solicitados exames complementares.
Pacientes hígidos sem sinais de alarme que não respondem de forma
satisfatória ao tratamento conservador instituído também devem ser avaliados
de maneira invasiva (preferencialmente pela colonoscopia) para exclusão de
doença neoplásica e megacólon.
A abordagem terapêutica sempre deve contemplar mudanças no estilo de vida
com adequação da dieta, da ingestão de líquidos e dos hábitos relacionados à
evacuação. O tratamento pode ser realizado com laxativos formadores de bolo,
osmóticos, estimulantes (irritativos), lubrificantes (emolientes) ou, ainda, com
supositórios e enemas, de forma isolada ou em combinações, sempre depois
de orientadas as medidas gerais não farmacológicas.

 REFERÊNCIAS
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Como citar a versão impressa deste documento

Toledo MAV, Fabbri R, Lins MMP. Constipação no idoso. In: Sociedade


Brasileira de Geriatria e Gerontologia; Kitner D, Jaluul O, organizadores.
PROGER Programa de Atualização em Geriatria e Gerontologia: Ciclo 1. Porto
Alegre: Artmed Panamericana; 2015. p. 89-116. (Sistema de Educação
Continuada a Distância, v.3).

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