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SEE-AC

Secretaria de Estado de Educação e Esporte

Comum a Todas as Áreas de Professor:


• Artes • Biologia • Ciências
• Educação Física • Filosofia
• Física • Geografia • História
• Língua Espanhola • Língua Inglesa
• Língua Portuguesa • Matemática
• Química
Edital Nº 001 SGA/SEE, de 05 de Dezembro de 2018
DZ015-2018
DADOS DA OBRA

Título da obra: Secretaria de Estado de Educação e Esporte - SEE-AC

Cargo: Comum a Todas as Áreas de Professor

(Baseado no Edital Nº 001 SGA/SEE, de 05 de Dezembro de 2018)

• Legislação Básica da Educação


• Língua Portuguesa
• Temas Educacionais e Pedagógicos
• História do Acre
• Geografia do Acre

Gestão de Conteúdos
Emanuela Amaral de Souza

Diagramação/ Editoração Eletrônica


Elaine Cristina
Ana Luiza Cesário
Thais Regis

Produção Editorial
Leandro Filho

Capa
Joel Ferreira dos Santos
APRESENTAÇÃO

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SUMÁRIO

Legislação Básica da Educação

Lei Federal nº 9.394/1996 e suas alterações (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). ............................................. 01
Lei Federal nº 8.069/1990 e suas alterações (Estatuto da Criança e do Adolescente). .............................................................. 18
Constituição da República Federativa do Brasil (Art. 205 a 214). ........................................................................................................ 71
Lei Federal 10.639/2003 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede
de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira). ............................................................................. 72
Lei Federal nº 11.645 de 08/03/2008 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena.). ........................ 73
Lei Federal 9.795/1999 (institui a Política Nacional de Educação Ambiental). ............................................................................... 73
Lei Federal nº 11.274/2006 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9
(nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.). ....................... 76
Resolução nº 4/CNE de 02/10/2009 – Institui as diretrizes para atendimento da Educação Especial. ................................ 76
Resolução nº 3/CNE 15/06/2010 Institui as diretrizes para atendimento da EJA. ........................................................................ 78
Resolução nº 02/CNE, de 03/04/2002 Diretrizes Educacionais para Educação do Campo........................................................ 80

Língua Portuguesa

1. Compreensão e interpretação de textos de gêneros variados (tipologia textual; identificação de informações implí-
citas; identificação do tema e da tese de um texto; diferenciação das partes principais das secundárias em um texto;
relações lógico-discursivas; comparação entre textos; relações entre imagens [fotos, ilustrações], gráficos, tabelas, in-
fográficos e o corpo de um texto; distinção entre fato e opinião; reconhecimento de estratégias argumentativas; reco-
nhecimento de posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao mesmo tema; relações
entre a tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la). .................................................................................................................. 01
2. Domínio da ortografia oficial (emprego das letras; emprego da acentuação gráfica). .......................................................... 16
3. Domínio dos mecanismos de coesão textual (emprego de elementos de referenciação, substituição e repetição, de
conectores e outros elementos de sequenciação textual; emprego/correlação de tempos e modos verbais). ............... 23
4. Domínio da estrutura morfossintática do período (relações de coordenação entre orações e entre termos da oração;
relações de subordinação entre orações e entre termos da oração; emprego dos sinais de pontuação; concordância
verbal e nominal; regência verbal e nominal; emprego do sinal indicativo de crase; colocação pronominal). ................. 25
5. Reescritura de frases e parágrafos do texto (substituição de palavras ou de trechos de textos)........................................ 98

Temas Educacionais e Pedagógicos

1. A didática e o processo de ensino e aprendizagem. ............................................................................................................................ 01


1.1 Organização do processo didático: planejamento, estratégias, metodologias, avaliação, organização da rotina
anual, semestral e diário. ................................................................................................................................................................................ 01
1.2 A sala de aula como espaço de aprendizagem e interação. ..................................................................................................... 01
1.3 A didática como fundamento epistemológico do fazer docente. ........................................................................................... 01
1.4 Contrato Didático. 1.5 Relação professor aluno. ............................................................................................................................ 01
2. Principais teorias da aprendizagem: Inatismo, comportamentalismo, behaviorismo, interacionismo, cognitivismo. .....25
2.1 As bases empíricas, metodológicas e epistemológicas das diversas teorias de aprendizagem. ................................ 25
2.2 Contribuições de Piaget, Vygotsky e Wallon para a psicologia e pedagogia. ................................................................... 25
2.3 Teoria das inteligências múltiplas de Gardner. ............................................................................................................................... 25
2.4 Temas contemporâneos: bullying, o papel da escola, a escolha da profissão, transtornos alimentares na adoles-
cência, família, escolhas sexuais. .................................................................................................................................................................. 25
3 Currículo: Propósitos da Educação Básica; Objetivos Educacionais; Conteúdos: procedimentais, atitudinais, conceituais
e factuais; .................................................................................................................................................................................................................... 47
Atividade de ensino e de aprendizagem; Avaliação como ato de investigar e intervir nos resultados de aprendizagem
dos alunos; Acesso, permanência e sucesso do aluno na escola; ........................................................................................................ 60
Gestão da aprendizagem. .................................................................................................................................................................................... 69
5 O Professor: formação e profissão; A pesquisa na prática docente; A dimensão ética da profissão. ................................ 72
SUMÁRIO

6 Educação Integral e de tempo integral. ...................................................................................................................................................... 85


7. Escola comum inclusiva. Aprendizagem significativa; Agrupamentos produtivos e circulação dos conhecimentos;
Recursos didáticos; Planejamento voltado para o desenvolvimento das capacidades dos alunos; O Projeto Pedagó-
gico e o trabalho coletivo; O Currículo centrado nas expectativas de aprendizagem; Organizadores de situações de
aprendizagem (competências e habilidades que os alunos deverão constituir; conteúdos curriculares selecionados;
atividades do aluno e do professor; avaliação e apoio pedagógico); A organização do tempo em sala de aula consi-
derando a diversidade dos alunos, os objetivos das atividades propostas e as características dos próprios conteúdos;
Estratégias diversificadas de avaliação da aprendizagem como norteadoras do planejamento de propostas de interven-
ção pedagógica, considerando o desenvolvimento de diferentes capacidades dos alunos; O registro como ferramenta
imprescindível para o planejamento da ação educativa; O respeito às diversas crenças e opções políticas dos membros
da equipe escolar e das famílias, como condição para o fortalecimento da instituição enquanto equipamento público,
laico, democrático e de qualidade..................................................................................................................................................................... 88

História do Acre

1. O processo de ocupação das terras acreanas, a ocupação indígena, a imigração nordestina e a produção da borracha,
a insurreição acreana e anexação do Acre ao Brasil. A chegada dos “paulistas” nas terras acreanas a partir dos anos 70
do século passado: êxodo rural, conflitos pela terra e invasões do espaço urbano...................................................................... 01
2. A evolução política do Acre: Território a Estado. Acre: desafios para um futuro sustentável............................................... 11
3. Trabalhos e produção nas diferentes nações indígenas, uso e posse da terra dos indígenas da Amazônia no auge
do ciclo da borracha, ocupação e utilização da terra, ocupação e disputa pela terra entre povos indígenas e grupos de
interesse socioeconômico e atividades econômicas mais relevantes no estudo da história da Amazônia e do Acre..... 12

Geografia do Acre

1. Aspectos geográficos e ecológicos da Amazônia e do Acre. Formação econômica do Acre. Processo de anexação do
Acre ao Brasil: tratados e limites........................................................................................................................................................................ 01
2. Municípios e populações do Acre: população e localização. Nova configuração do mapa. Microrregiões. Atuais mu-
nicípios.......................................................................................................................................................................................................................... 10
3. Relevo, vegetação, clima, solo, hidrografia, fluxo migratório, extrativismo e Zoneamento Ecológico do Acre. A paisa-
gem local e sua relação com outras paisagens (semelhanças e diferenças, permanências e transformações). ............... 14
4. Linguagem cartográfica: leitura de mapas................................................................................................................................................ 25
5. Modos de vida no campo e na cidade. ...................................................................................................................................................... 33
6. Papel da tecnologia na configuração de paisagens urbanas e rurais e na estruturação da vida em sociedade........... 40
7. Apropriação e transformação da natureza. Preservação e cuidados com o meio: como o homem usa a natureza e
constrói o seu espaço; o processo industrial e suas relações no município, no estado e no país........................................... 48
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Lei Federal nº 9.394/1996 e suas alterações (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). ............................................. 01
Lei Federal nº 8.069/1990 e suas alterações (Estatuto da Criança e do Adolescente). .............................................................. 18
Constituição da República Federativa do Brasil (Art. 205 a 214). ........................................................................................................ 71
Lei Federal 10.639/2003 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede
de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira). ............................................................................. 72
Lei Federal nº 11.645 de 08/03/2008 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena.). ........................ 73
Lei Federal 9.795/1999 (institui a Política Nacional de Educação Ambiental). ............................................................................... 73
Lei Federal nº 11.274/2006 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9
(nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.). ....................... 76
Resolução nº 4/CNE de 02/10/2009 – Institui as diretrizes para atendimento da Educação Especial. ................................ 76
Resolução nº 3/CNE 15/06/2010 Institui as diretrizes para atendimento da EJA. ........................................................................ 78
Resolução nº 02/CNE, de 03/04/2002 Diretrizes Educacionais para Educação do Campo........................................................ 80
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

I - igualdade de condições para o acesso e permanência


LEI FEDERAL Nº 9.394/1996 E SUAS na escola;
ALTERAÇÕES (LEI DE DIRETRIZES E BASES DA II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a
EDUCAÇÃO NACIONAL) cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas de
A lei estudada neste tópico, provavelmente a mais re- ensino;
levante deste edital, tanto que é repetida em dois outros VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos
tópicos, “estabelece as diretrizes e bases da educação oficiais;
nacional”. Data de 20 de dezembro de 2016, tendo sido VII - valorização do profissional da educação escolar;
promulgada pelo ex-presidente Fernando Henrique Car- VIII - gestão democrática do ensino público, na forma
doso, mas já passou por inúmeras alterações desde então. desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
Partamos para o comentário em bloco de seus dispositivos: IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extraescolar;
TÍTULO I XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
Da Educação práticas sociais.
XII - consideração com a diversidade étnico-racial.
Art. 1º A educação abrange os processos formativos XIII - garantia do direito à educação e à aprendizagem
que se desenvolvem na vida familiar, na convivência hu- ao longo da vida.
mana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesqui-
sa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil A educação escolar deve permitir a formação do cida-
e nas manifestações culturais. dão e do trabalhador: uma pessoa que consiga se inserir no
§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se de- mercado de trabalho e ter noções adequadas de cidada-
senvolve, predominantemente, por meio do ensino, em ins- nia e solidariedade no convívio social. Entre os princípios,
tituições próprias. trabalha-se com o direito de acesso à educação de quali-
§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo dade (gratuita nos estabelecimentos públicos), a liberdade
do trabalho e à prática social. nas atividades de ensino em geral (tanto para o educador
quanto para o educado), a valorização do professor, o in-
O primeiro artigo da LDB estabelece que a educação centivo à educação informal e o respeito às diversidades de
é um processo que não se dá exclusivamente nas escolas. ideias, gêneros, raça e cor.
Trata-se da clássica distinção entre educação formal e não
formal ou informal: “A educação formal é aquela desen- TÍTULO III
volvida nas escolas, com conteúdos previamente demarca- Do Direito à Educação e do Dever de Educar
dos; a informal como aquela que os indivíduos aprendem
durante seu processo de socialização - na família, bairro,
Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública
clube, amigos, etc., carregada de valores e cultura própria,
será efetivado mediante a garantia de:
de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4
não formal é aquela que se aprende ‘no mundo da vida’, via
(quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da
os processos de compartilhamento de experiências, princi-
seguinte forma:
palmente em espaços e ações coletivas cotidianas”1. A LDB
a) pré-escola;
disciplina apenas a educação escolar, ou seja, a educação
b) ensino fundamental;
formal, que não exclui o papel das famílias e das comuni-
c) ensino médio;
dades na educação informal.
II - educação infantil gratuita às crianças de até 5
TÍTULO II (cinco) anos de idade;
Dos Princípios e Fins da Educação Nacional III - atendimento educacional especializado gratuito
aos educandos com deficiência, transtornos globais do
Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, ins- desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, trans-
pirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solida- versal a todos os níveis, etapas e modalidades, preferencial-
riedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvi- mente na rede regular de ensino;
mento do educando, seu preparo para o exercício da cidada- IV - acesso público e gratuito aos ensinos fundamen-
nia e sua qualificação para o trabalho. tal e médio para todos os que não os concluíram na idade
própria;
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da
princípios: pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de
1 GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal, participação
cada um;
da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio: aval. VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às
pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 27-38, jan./mar. 2006. condições do educando;

1
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

VII - oferta de educação escolar regular para jovens e Conforme se percebe pelo artigo 4º, divide-se em eta-
adultos, com características e modalidades adequadas às pas a formação escolar, nos seguintes termos:
suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que - A educação básica é obrigatória e gratuita. Envolve a
forem trabalhadores as condições de acesso e permanência pré-escola, o ensino fundamental e o ensino médio. A edu-
na escola; cação infantil deve ser garantida próxima à residência. Com
VIII - atendimento ao educando, em todas as etapas da efeito, existe a garantia do direito à creche gratuita. No mais,
educação básica, por meio de programas suplementares pessoas fora da idade escolar que queiram completar seus
de material didático-escolar, transporte, alimentação e estudos têm direito ao ensino fundamental e médio.
assistência à saúde; - A educação superior envolve os níveis mais elevados
IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, defini- do ensino, da pesquisa e da criação artística, devendo ser
dos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de acessível conforme a capacidade de cada um.
insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de - Neste contexto, devem ser assegurados programas
ensino-aprendizagem. suplementares de material didático-escolar, transporte, ali-
X - vaga na escola pública de educação infantil ou de mentação e assistência à saúde.
ensino fundamental mais próxima de sua residência a O artigo 5º reitera a gratuidade e obrigatoriedade do
toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) ensino básico e assegura a possibilidade de se buscar judi-
anos de idade. cialmente a garantia deste direito em caso de negativa pelo
poder público. Será possível fazê-lo por meio de mandado
Art. 5º O acesso à educação básica obrigatória é direi- de segurança ou ação civil pública. Além da judicialização
to público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de para fazer valer o direito na esfera cível, cabe em caso de
cidadãos, associação comunitária, organização sindical, en- negligência o acionamento na esfera penal, buscando-se a
tidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o punição por crime de responsabilidade.
Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo. Adiante, coloca-se o dever dos pais ou responsáveis
§ 1º O poder público, na esfera de sua competência efetuar a matrícula da criança.
federativa, deverá: Por fim, o artigo 7º estabelece a possibilidade do en-
I - recensear anualmente as crianças e adolescentes em sino particular, desde que sejam respeitadas as normas da
idade escolar, bem como os jovens e adultos que não con- educação nacional, autorizado o funcionamento pelo po-
cluíram a educação básica; der público e que tenha possibilidade de se manter inde-
II - fazer-lhes a chamada pública; pendentemente de auxílio estatal, embora exista previsão
III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência de tais auxílios em circunstâncias determinadas descritas
à escola. no artigo 213, CF.
§ 2º Em todas as esferas administrativas, o Poder Públi-
co assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obri- TÍTULO IV
gatório, nos termos deste artigo, contemplando em segui- Da Organização da Educação Nacional
da os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as
prioridades constitucionais e legais. Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os
§ 3º Qualquer das partes mencionadas no caput deste Municípios organizarão, em regime de colaboração, os
artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judiciário, respectivos sistemas de ensino.
na hipótese do § 2º do art. 208 da Constituição Federal, sen- § 1º Caberá à União a coordenação da política nacional
do gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente. de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas e
§ 4º Comprovada a negligência da autoridade compe- exercendo função normativa, redistributiva e supletiva
tente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, em relação às demais instâncias educacionais.
poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade. § 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organi-
§ 5º Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade zação nos termos desta Lei.
de ensino, o Poder Público criará formas alternativas de
acesso aos diferentes níveis de ensino, independentemen- Art. 9º A União incumbir-se-á de:
te da escolarização anterior. I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em cola-
boração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a II - organizar, manter e desenvolver os órgãos e institui-
matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 ções oficiais do sistema federal de ensino e o dos Territórios;
(quatro) anos de idade. III - prestar assistência técnica e financeira aos Es-
tados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desen-
Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas volvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento
as seguintes condições: prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função
I - cumprimento das normas gerais da educação nacio- redistributiva e supletiva;
nal e do respectivo sistema de ensino; IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Dis-
II - autorização de funcionamento e avaliação de quali- trito Federal e os Municípios, competências e diretrizes
dade pelo Poder Público; para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino
III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o pre- médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos míni-
visto no art. 213 da Constituição Federal. mos, de modo a assegurar formação básica comum;

2
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV-A - estabelecer, em colaboração com os Estados, o II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
Distrito Federal e os Municípios, diretrizes e procedimen- III - baixar normas complementares para o seu siste-
tos para identificação, cadastramento e atendimento, na ma de ensino;
educação básica e na educação superior, de alunos com al- IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabele-
tas habilidades ou superdotação; cimentos do seu sistema de ensino;
V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a V - oferecer a educação infantil em creches e pré-
educação; -escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, per-
 VI - assegurar processo nacional de avaliação do ren- mitida a atuação em outros níveis de ensino somente quan-
dimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, do estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua
em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a área de competência e com recursos acima dos percentuais
definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino; mínimos vinculados pela Constituição Federal à manuten-
VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação ção e desenvolvimento do ensino.
e pós-graduação; VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede
  VIII - assegurar processo nacional de avaliação das municipal.
instituições de educação superior, com a cooperação dos siste- Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda,
mas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino; por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor
IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e com ele um sistema único de educação básica.
avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educa-
ção superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino. Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as
§ 1º Na estrutura educacional, haverá um Conselho Na- normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a in-
cional de Educação, com funções normativas e de supervi- cumbência de:
são e atividade permanente, criado por lei. I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;
§ 2° Para o cumprimento do disposto nos incisos V a II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e
IX, a União terá acesso a todos os dados e informações financeiros;
III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-
necessários de todos os estabelecimentos e órgãos edu-
-aula estabelecidas;
cacionais.
IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de
§ 3º As atribuições constantes do inciso IX poderão
cada docente;
ser delegadas aos Estados e ao Distrito Federal, desde que
V - prover meios para a recuperação dos alunos de
mantenham instituições de educação superior.
menor rendimento;
VI - articular-se com as famílias e a comunidade,
Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:
criando processos de integração da sociedade com a escola;
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e institui- VII - informar pai e mãe, conviventes ou não com seus
ções oficiais dos seus sistemas de ensino; filhos, e, se for o caso, os responsáveis legais, sobre a fre-
II - definir, com os Municípios, formas de colaboração quência e rendimento dos alunos, bem como sobre a exe-
na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar cução da proposta pedagógica da escola;
a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo VIII - notificar ao Conselho Tutelar do Município, ao juiz
com a população a ser atendida e os recursos financeiros competente da Comarca e ao respectivo representante do
disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público; Ministério Público a relação dos alunos que apresentem
III - elaborar e executar políticas e planos educacio- quantidade de faltas acima de cinquenta por cento do
nais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais percentual permitido em lei.
de educação, integrando e coordenando as suas ações e as IX - promover medidas de conscientização, de prevenção
dos seus Municípios; e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a
IV - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e ava- intimidação sistemática (bullying), no âmbito das escolas;
liar, respectivamente, os cursos das instituições de educação X - estabelecer ações destinadas a promover a cultura
superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino; de paz nas escolas.     
V - baixar normas complementares para o seu sistema
de ensino; Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com I - participar da elaboração da proposta pedagógica do
prioridade, o ensino médio a todos que o demandarem, estabelecimento de ensino;
respeitado o disposto no art. 38 desta Lei;  II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a
VII - assumir o transporte escolar dos alunos da rede proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
estadual. III - zelar pela aprendizagem dos alunos;
Parágrafo único. Ao Distrito Federal aplicar-se-ão as IV - estabelecer estratégias de recuperação para os
competências referentes aos Estados e aos Municípios. alunos de menor rendimento;
V - ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos,
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de: além de participar integralmente dos períodos dedicados ao
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e insti- planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
tuições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os VI - colaborar com as atividades de articulação da es-
às políticas e planos educacionais da União e dos Estados; cola com as famílias e a comunidade.

3
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da III - confessionais, assim entendidas as que são insti-
gestão democrática do ensino público na educação bá- tuídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais
sica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e
seguintes princípios: ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior;
I - participação dos profissionais da educação na elabo- IV - filantrópicas, na forma da lei.
ração do projeto pedagógico da escola;
II - participação das comunidades escolar e local em A LDB estabelece um regime de colaboração entre as
conselhos escolares ou equivalentes. entidades de ensino nas esferas federativas diversas, no en-
tanto, coloca competência à União de encabeçar e coorde-
Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades nar os sistemas de ensino. Tal papel de liderança, descrito
escolares públicas de educação básica que os integram pro- no artigo 9º, envolve poderes de regulação e de controle,
gressivos graus de autonomia pedagógica e administra- autorizando funcionamento ou suspendendo-o, realizando
tiva e de gestão financeira, observadas as normas gerais avaliação constante de desempenho, entre outros deveres.
de direito financeiro público. Uma nota interessante é reparar que o artigo 10 esta-
belece o dever dos Estados de garantir a educação no en-
Art. 16. O sistema federal de ensino compreende:  sino fundamental e priorizar a educação no ensino médio,
I - as instituições de ensino mantidas pela União; ao passo que o artigo 11 coloca o dever dos municípios
II - as instituições de educação superior criadas e manti- de garantir a educação infantil e priorizar a educação fun-
das pela iniciativa privada; damental. É possível, ainda, integrar educação municipal e
III - os órgãos federais de educação. estadual em um sistema único.
Quanto às questões pedagógicas e de gestão dos es-
Art. 17. Os sistemas de ensino dos Estados e do Dis- tabelecimentos de ensino, incumbe a eles próprios, em in-
trito Federal compreendem: tegração com seus docentes. Este processo de interação
I - as instituições de ensino mantidas, respectivamente, entre instituição e docente, bem como destes com a co-
pelo Poder Público estadual e pelo Distrito Federal;
munidade local, é conhecido como gestão democrática.
II - as instituições de educação superior mantidas pelo
Poder Público municipal;
TÍTULO V
III - as instituições de ensino fundamental e médio cria-
Dos Níveis e das Modalidades de Educação
das e mantidas pela iniciativa privada;
e Ensino
IV - os órgãos de educação estaduais e do Distrito Fede-
ral, respectivamente.
CAPÍTULO I
Parágrafo único. No Distrito Federal, as instituições de
educação infantil, criadas e mantidas pela iniciativa privada, Da Composição dos Níveis Escolares
integram seu sistema de ensino.
Art. 21. A educação escolar compõe-se de:
Art. 18. Os sistemas municipais de ensino compreendem: I - educação básica, formada pela educação infantil,
I - as instituições do ensino fundamental, médio e de ensino fundamental e ensino médio;
educação infantil mantidas pelo Poder Público municipal; II - educação superior.
II - as instituições de educação infantil criadas e manti-
das pela iniciativa privada; CAPÍTULO II
III - os órgãos municipais de educação. DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Art. 19. As instituições de ensino dos diferentes ní- Seção I


veis classificam-se nas seguintes categorias administrativas: Das Disposições Gerais
I - públicas, assim entendidas as criadas ou incorpora-
das, mantidas e administradas pelo Poder Público; Art. 22. A educação básica tem por finalidades desen-
II - privadas, assim entendidas as mantidas e adminis- volver o educando, assegurar-lhe a formação comum in-
tradas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. dispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe
meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.
Art. 20. As instituições privadas de ensino se enqua-
drarão nas seguintes categorias: Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em sé-
I - particulares em sentido estrito, assim entendidas as ries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância re-
que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas fí- gular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com
sicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as base na idade, na competência e em outros critérios, ou por
características dos incisos abaixo; forma diversa de organização, sempre que o interesse do
II - comunitárias, assim entendidas as que são insti- processo de aprendizagem assim o recomendar.
tuídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais § 1º A escola poderá reclassificar os alunos, inclusive
pessoas jurídicas, inclusive cooperativas educacionais, sem quando se tratar de transferências entre estabelecimentos
fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora situados no País e no exterior, tendo como base as normas
representantes da comunidade; curriculares gerais.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 2º O calendário escolar deverá adequar-se às pecu- os sistemas de ensino oferecer, no prazo máximo de cinco
liaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a cri- anos, pelo menos mil horas anuais de carga horária, a partir
tério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o de 2 de março de 2017.
número de horas letivas previsto nesta Lei. § 2º Os sistemas de ensino disporão sobre a oferta de
educação de jovens e adultos e de ensino noturno regular,
Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e adequado às condições do educando, conforme o inciso
médio, será organizada de acordo com as seguintes regras VI do art. 4º.
comuns: Art. 25. Será objetivo permanente das autoridades res-
I - a carga horária mínima anual será de oitocentas ponsáveis alcançar relação adequada entre o número de
horas para o ensino fundamental e para o ensino médio, alunos e o professor, a carga horária e as condições ma-
distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo tra- teriais do estabelecimento.
balho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, Parágrafo único. Cabe ao respectivo sistema de ensino,
à vista das condições disponíveis e das características regio-
quando houver; ;
nais e locais, estabelecer parâmetro para atendimento do
II - a classificação em qualquer série ou etapa, exceto a
disposto neste artigo.
primeira do ensino fundamental, pode ser feita:
a) por promoção, para alunos que cursaram, com apro- Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino
veitamento, a série ou fase anterior, na própria escola; fundamental e do ensino médio devem ter base nacional
b) por transferência, para candidatos procedentes de comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e
outras escolas; em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversifica-
c) independentemente de escolarização anterior, me- da, exigida pelas características regionais e locais da socie-
diante avaliação feita pela escola, que defina o grau de dade, da cultura, da economia e dos educandos.
desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua § 1º Os currículos a que se refere o caput devem abran-
inscrição na série ou etapa adequada, conforme regulamen- ger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e
tação do respectivo sistema de ensino; da matemática, o conhecimento do mundo físico e na-
III - nos estabelecimentos que adotam a progressão regu- tural e da realidade social e política, especialmente da
lar por série, o regimento escolar pode admitir formas de pro- República Federativa do Brasil, observado, na educação in-
gressão parcial, desde que preservada a sequência do currí- fantil, o disposto no art. 31, no ensino fundamental, o dis-
culo, observadas as normas do respectivo sistema de ensino; posto no art. 32, e no ensino médio, o disposto no art. 36.
IV - poderão organizar-se classes, ou turmas, com alu- § 2º O ensino da arte, especialmente em suas expres-
nos de séries distintas, com níveis equivalentes de adianta- sões regionais, constituirá componente curricular obrigató-
mento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras, rio da educação básica.
artes, ou outros componentes curriculares; § 3º A educação física, integrada à proposta pedagó-
V - a verificação do rendimento escolar observará os se- gica da escola, é componente curricular obrigatório da edu-
guintes critérios: cação infantil e do ensino fundamental, sendo sua prática
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho facultativa ao aluno:
do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os I - que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a
quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os seis horas;
de eventuais provas finais; II - maior de trinta anos de idade;
b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos III - que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em
situação similar, estiver obrigado à prática da educação física;
com atraso escolar;
IV - amparado pelo Decreto-Lei no 1.044, de 21 de ou-
c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries me-
tubro de 1969;
diante verificação do aprendizado;
V - (VETADO);
d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito; VI - que tenha prole.
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de pre- § 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as
ferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo contribuições das diferentes culturas e etnias para a forma-
rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições ção do povo brasileiro, especialmente das matrizes indí-
de ensino em seus regimentos; gena, africana e europeia.
VI - o controle de frequência fica a cargo da escola, § 5o No currículo do ensino fundamental, a partir do
conforme o disposto no seu regimento e nas normas do res- sexto ano, será ofertada a língua inglesa.
pectivo sistema de ensino, exigida a frequência mínima de § 6o As artes visuais, a dança, a música e o teatro são
setenta e cinco por cento do total de horas letivas para as linguagens que constituirão o componente curricular de
aprovação; que trata o § 2o deste artigo.
VII - cabe a cada instituição de ensino expedir histó- § 7º A integralização curricular poderá incluir, a critério
ricos escolares, declarações de conclusão de série e di- dos sistemas de ensino, projetos e pesquisas envolvendo
plomas ou certificados de conclusão de cursos, com as os temas transversais de que trata o caput.
especificações cabíveis. § 8º A exibição de filmes de produção nacional cons-
§ 1º A carga horária mínima anual de que trata o inci- tituirá componente curricular complementar integrado à
so I do caput deverá ser ampliada de forma progressiva, proposta pedagógica da escola, sendo a sua exibição obriga-
no ensino médio, para mil e quatrocentas horas, devendo tória por, no mínimo, 2 (duas) horas mensais. 

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 9o  Conteúdos relativos aos direitos humanos e Os critérios para mudança de série podem ser promo-
à prevenção de todas as formas de violência contra a ção (aprovação em etapa anterior), transferência (candida-
criança e o adolescente serão incluídos, como temas trans- tos de outras escolas) e avaliação (análise da experiência e
versais, nos currículos escolares de que trata o caput deste desenvolvimento do candidato). O ensino poderá ser ace-
artigo, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho lerado caso necessário. Nas situações de alunos que não
de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), observada acompanhem seu ritmo, deverá ser garantida recuperação.
a produção e distribuição de material didático adequado.  Exige-se, além do desempenho, a frequência de 75%,
§ 10. A inclusão de novos componentes curriculares de no mínimo, para aprovação.
caráter obrigatório na Base Nacional Comum Curricular de- O currículo da educação básica segue uma base na-
penderá de aprovação do Conselho Nacional de Educação cional comum. Devem abranger língua portuguesa e da
e de homologação pelo Ministro de Estado da Educação. matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e
da realidade social e política. A educação física deve ser
Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino fundamental oferecida obrigatoriamente, mas é facultativa ao aluno em
e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório certas situações, como de trabalho, serviço militar, idade
o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. superior a 30 anos. Em respeito ao pluralismo, deve consi-
§ 1o  O conteúdo programático a que se refere este ar- derar as matrizes indígena, africana e europeia como temas
tigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que transversais. Ainda em tal condição, cabe o aprendizado de
caracterizam a formação da população brasileira, a partir Conteúdos relativos aos direitos humanos e à prevenção
desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história de todas as formas de violência contra a criança e o ado-
da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos lescente. É obrigatório o estudo da história e cultura afro-
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e -brasileira e indígena. Ainda, a educação deve considerar
o negro e o índio na formação da sociedade nacional, res- as peculiaridades da zona rural quando nela for ministrada.
gatando as suas contribuições nas áreas social, econômica
e política, pertinentes à história do Brasil.  Seção II
§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-bra- Da Educação Infantil
sileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no
âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educa-
educação artística e de literatura e história brasileiras. ção básica, tem como finalidade o desenvolvimento inte-
gral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos
Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
observarão, ainda, as seguintes diretrizes: ação da família e da comunidade.
I - a difusão de valores fundamentais ao interesse so-
cial, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem Art. 30. A educação infantil será oferecida em:
comum e à ordem democrática; I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de
II - consideração das condições de escolaridade dos até três anos de idade;
alunos em cada estabelecimento; II - pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cin-
III - orientação para o trabalho; co) anos de idade.
IV - promoção do desporto educacional e apoio às prá-
ticas desportivas não-formais. Art. 31. A educação infantil será organizada de acordo
com as seguintes regras comuns:
Art. 28. Na oferta de educação básica para a população I - avaliação mediante acompanhamento e registro do
rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações ne- desenvolvimento das crianças, sem o objetivo de promoção,
cessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e mesmo para o acesso ao ensino fundamental;
de cada região, especialmente: II - carga horária mínima anual de 800 (oitocentas) ho-
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas ras, distribuída por um mínimo de 200 (duzentos) dias de
às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; trabalho educacional;
II - organização escolar própria, incluindo adequação do III - atendimento à criança de, no mínimo, 4 (quatro)
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições horas diárias para o turno parcial e de 7 (sete) horas para a
climáticas; jornada integral;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural. IV - controle de frequência pela instituição de educação
Parágrafo único.   O fechamento de escolas do campo, pré-escolar, exigida a frequência mínima de 60% (sessenta
indígenas e quilombolas será precedido de manifestação do por cento) do total de horas;
órgão normativo do respectivo sistema de ensino, que consi- V - expedição de documentação que permita atestar os
derará a justificativa apresentada pela Secretaria de Educa- processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança.
ção, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a mani-
festação da comunidade escolar. A educação infantil é ministrada em creches até os 3
anos de idade e em pré-escolas dos 3 aos 5 anos de idade.
A educação básica tem por papel a formação da base
do educado.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Seção III § 1º São ressalvados os casos do ensino noturno e das


Do Ensino Fundamental formas alternativas de organização autorizadas nesta Lei.
§ 2º O ensino fundamental será ministrado progressiva-
Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com dura- mente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino.
ção de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-
-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação O ensino fundamental inicia-se aos 6 anos de idade e
básica do cidadão, mediante: tem duração de 9 anos. Além de objetivar a alfabetização,
I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo também incentiva a formação do cidadão, da pessoa em
como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e contato com o mundo que o cerca estabelecendo vínculos
do cálculo; de solidariedade e amizade. O ensino fundamental deve
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sis- ser presencial, em regra. O ensino religioso é facultativo. A
tema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que carga horária diária é de no mínimo 4 horas.
se fundamenta a sociedade;
III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, Seção IV
tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades Do Ensino Médio
e a formação de atitudes e valores;
IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica,
de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que com duração mínima de três anos, terá como finalidades:
se assenta a vida social. I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimen-
§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o tos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o pros-
ensino fundamental em ciclos. seguimento de estudos;
§ 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão re- II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do
gular por série podem adotar no ensino fundamental o re- educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz
gime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupa-
ção ou aperfeiçoamento posteriores;
do processo de ensino-aprendizagem, observadas as nor-
III - o aprimoramento do educando como pessoa hu-
mas do respectivo sistema de ensino.
mana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da
§ 3º O ensino fundamental regular será ministrado em
autonomia intelectual e do pensamento crítico;
língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas
IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnoló-
a utilização de suas línguas maternas e processos próprios
gicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a
de aprendizagem.
prática, no ensino de cada disciplina.
§ 4º O ensino fundamental será presencial, sendo o en-
sino a distância utilizado como complementação da apren- Art. 35-A. A Base Nacional Comum Curricular defi-
dizagem ou em situações emergenciais. nirá direitos e objetivos de aprendizagem do ensino médio,
§ 5º O currículo do ensino fundamental incluirá, obri- conforme diretrizes do Conselho Nacional de Educação, nas
gatoriamente, conteúdo que trate dos direitos das crianças seguintes áreas do conhecimento:
e dos adolescentes, tendo como diretriz a Lei nº 8.069, de I - linguagens e suas tecnologias;
13 de julho de 1990, que institui o Estatuto da Criança e II - matemática e suas tecnologias;
do Adolescente, observada a produção e distribuição de III - ciências da natureza e suas tecnologias;
material didático adequado. IV - ciências humanas e sociais aplicadas.
§ 6º O estudo sobre os símbolos nacionais será incluído § 1º A parte diversificada dos currículos de que trata
como tema transversal nos currículos do ensino fundamental. o caput do art. 26, definida em cada sistema de ensino, de-
verá estar harmonizada à Base Nacional Comum Curricu-
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, lar e ser articulada a partir do contexto histórico, econômico,
é parte integrante da formação básica do cidadão e cons- social, ambiental e cultural.
titui disciplina dos horários normais das escolas públicas § 2º A Base Nacional Comum Curricular referente ao
de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversida- ensino médio incluirá obrigatoriamente estudos e práti-
de cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de cas de educação física, arte, sociologia e filosofia.
proselitismo. § 3º O ensino da língua portuguesa e da matemática
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedi- será obrigatório nos três anos do ensino médio, assegurada
mentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso às comunidades indígenas, também, a utilização das respec-
e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão tivas línguas maternas.
dos professores. § 4º Os currículos do ensino médio incluirão, obriga-
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, cons- toriamente, o estudo da língua inglesa e poderão ofertar
tituída pelas diferentes denominações religiosas, para a de- outras línguas estrangeiras, em caráter optativo, preferen-
finição dos conteúdos do ensino religioso. cialmente o espanhol, de acordo com a disponibilidade de
oferta, locais e horários definidos pelos sistemas de ensino.
Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental inclui- § 5º A carga horária destinada ao cumprimento da Base
rá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala Nacional Comum Curricular não poderá ser superior a mil
de aula, sendo progressivamente ampliado o período de e oitocentas horas do total da carga horária do ensino
permanência na escola. médio, de acordo com a definição dos sistemas de ensino.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 6º A União estabelecerá os padrões de desempenho § 8º A oferta de formação técnica e profissional a que


esperados para o ensino médio, que serão referência nos se refere o inciso V do caput, realizada na própria insti-
processos nacionais de avaliação, a partir da Base Nacional tuição ou em parceria com outras instituições, deverá ser
Comum Curricular. aprovada previamente pelo Conselho Estadual de Educa-
§ 7º Os currículos do ensino médio deverão considerar a ção, homologada pelo Secretário Estadual de Educação e
formação integral do aluno, de maneira a adotar um traba- certificada pelos sistemas de ensino.
lho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua § 9º As instituições de ensino emitirão certificado com
formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais. validade nacional, que habilitará o concluinte do ensino
§ 8º Os conteúdos, as metodologias e as formas de médio ao prosseguimento dos estudos em nível superior
avaliação processual e formativa serão organizados nas re- ou em outros cursos ou formações para os quais a conclu-
des de ensino por meio de atividades teóricas e práticas, são do ensino médio seja etapa obrigatória.
provas orais e escritas, seminários, projetos e atividades § 10. Além das formas de organização previstas no art.
on-line, de tal forma que ao final do ensino médio o edu- 23, o ensino médio poderá ser organizado em módulos e
cando demonstre: adotar o sistema de créditos com terminalidade específica.
I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que § 11. Para efeito de cumprimento das exigências cur-
presidem a produção moderna; riculares do ensino médio, os sistemas de ensino poderão
II - conhecimento das formas contemporâneas de lin- reconhecer competências e firmar convênios com institui-
guagem. ções de educação a distância com notório reconhecimento,
mediante as seguintes formas de comprovação:
Art. 36. O currículo do ensino médio será composto I - demonstração prática;
pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerários II - experiência de trabalho supervisionado ou outra ex-
formativos, que deverão ser organizados por meio da ofer- periência adquirida fora do ambiente escolar;
ta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância III - atividades de educação técnica oferecidas em outras
para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de en- instituições de ensino credenciadas;
sino, a saber:
IV - cursos oferecidos por centros ou programas ocupa-
I - linguagens e suas tecnologias;
cionais;
II - matemática e suas tecnologias;
V - estudos realizados em instituições de ensino nacio-
III - ciências da natureza e suas tecnologias;
nais ou estrangeiras;
IV - ciências humanas e sociais aplicadas;
VI - cursos realizados por meio de educação a distância
V - formação técnica e profissional.
ou educação presencial mediada por tecnologias.
§ 1º A organização das áreas de que trata o caput e das
§ 12. As escolas deverão orientar os alunos no processo
respectivas competências e habilidades será feita de acor-
do com critérios estabelecidos em cada sistema de ensino. de escolha das áreas de conhecimento ou de atuação pro-
§ 2º (Revogado) fissional previstas no caput.
§ 3º A critério dos sistemas de ensino, poderá ser
composto itinerário formativo integrado, que se traduz na A etapa final do ensino médio tem a duração de três
composição de componentes curriculares da Base Nacio- anos e busca fornecer a consolidação e o aprofundamento
nal Comum Curricular - BNCC e dos itinerários formativos, dos conhecimentos transmitidos no ensino fundamental,
considerando os incisos I a V do caput. com a devida atenção a conhecimentos que permitam o
§ 4º (Revogado) ingresso do aluno no ensino universitário e na carreira de
§ 5º Os sistemas de ensino, mediante disponibilidade trabalho. Neste ponto, a LDB sofreu alterações recentes
de vagas na rede, possibilitarão ao aluno concluinte do en- pela Medida Provisória nº 746/2016, convertida na Lei nº
sino médio cursar mais um itinerário formativo de que trata 13.415, de 2017, que foi alvo de inúmeras críticas, nota-
o caput. damente por estabelecer como facultativos conhecimen-
§ 6º A critério dos sistemas de ensino, a oferta de for- tos que antes eram tidos como obrigatórios. Para entender
mação com ênfase técnica e profissional considerará: melhor esta questão, percebe-se que na verdade a pro-
I - a inclusão de vivências práticas de trabalho no setor posta é a especificação de matrizes ainda durante o ensino
produtivo ou em ambientes de simulação, estabelecendo par- médio: o aluno poderá escolher em quais áreas de conheci-
cerias e fazendo uso, quando aplicável, de instrumentos es- mento pretende se concentrar. Por exemplo, um aluno que
tabelecidos pela legislação sobre aprendizagem profissional; não queira se especializar em ciências humanas, não teria
II - a possibilidade de concessão de certificados interme- a obrigação de cursar matérias como história e geografia.
diários de qualificação para o trabalho, quando a formação Um aluno que não tenha interesse em ir para a universida-
for estruturada e organizada em etapas com terminalidade. de e já queira ingressar no mercado de trabalho, terá aulas
§ 7º A oferta de formações experimentais relacionadas concentradas em formação técnica e profissional, apren-
ao inciso V do caput, em áreas que não constem do Catá- dendo marcenaria, mecânica, administração, entre outras
logo Nacional dos Cursos Técnicos, dependerá, para sua questões. As áreas que podem ser optadas são as seguin-
continuidade, do reconhecimento pelo respectivo Conse- tes: linguagens e suas tecnologias; matemática e suas tec-
lho Estadual de Educação, no prazo de três anos, e da inser- nologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências
ção no Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos, no prazo de humanas e sociais aplicadas; formação técnica e profissio-
cinco anos, contados da data de oferta inicial da formação. nal. As únicas matérias estabelecidas como obrigatórias

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

são: português, matemática, artes, educação física, filosofia Parágrafo único. Os cursos de educação profissional
e sociologia – estas quatro últimas inicialmente seriam fa- técnica de nível médio, nas formas articulada concomitante
cultativas, mas devido a pressões sociais foram colocadas e subsequente, quando estruturados e organizados em eta-
como obrigatórias. Ainda é cedo para dizer se realmente pas com terminalidade, possibilitarão a obtenção de certifi-
este será o rumo conferido pela reforma, eis que a Base cados de qualificação para o trabalho após a conclusão, com
Nacional Comum Curricular que detalhará estas questões aproveitamento, de cada etapa que caracterize uma qualifi-
ainda está em discussão. cação para o trabalho.

Seção IV-A A educação profissional e técnica pode se dar durante


Da Educação Profissional Técnica de Nível Médio o Ensino Médio, notadamente se o estudante fizer a op-
ção por esta categoria de ensino (o ensino médio pode
Art. 36-A. Sem prejuízo do disposto na Seção IV deste ser voltado à formação técnico-profissional, preparando o
Capítulo, o ensino médio, atendida a formação geral do edu- jovem para o ingresso no mercado de trabalho indepen-
cando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões dentemente de ensino universitário), quanto após o Ensino
técnicas. Médio, em instituições próprias de ensino técnico-profis-
Parágrafo único. A preparação geral para o trabalho sionalizante (neste sentido, há cursos técnicos-profissio-
e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser nais com menor duração que os cursos de ensino superior
desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino mé- e que são equiparados a este).
dio ou em cooperação com instituições especializadas em
educação profissional. Seção V
Da Educação de Jovens e Adultos
Art. 36-B. A educação profissional técnica de nível mé-
dio será desenvolvida nas seguintes formas: Art. 37. A educação de jovens e adultos será desti-
I - articulada com o ensino médio; nada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade
II - subsequente, em cursos destinados a quem já tenha
de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade
concluído o ensino médio.
própria e constituirá instrumento para a educação e a
Parágrafo único. A educação profissional técnica de ní-
aprendizagem ao longo da vida.
vel médio deverá observar:
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente
I - os objetivos e definições contidos nas diretrizes cur-
aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os es-
riculares nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de
tudos na idade regular, oportunidades educacionais apro-
Educação;
priadas, consideradas as características do alunado, seus
II - as normas complementares dos respectivos sistemas
interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cur-
de ensino;
III - as exigências de cada instituição de ensino, nos ter- sos e exames.
mos de seu projeto pedagógico. § 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso
e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações
Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível mé- integradas e complementares entre si.
dio articulada, prevista no inciso I do caput do art. 36-B § 3º A educação de jovens e adultos deverá articular-
desta Lei, será desenvolvida de forma: -se, preferencialmente, com a educação profissional, na
I - integrada, oferecida somente a quem já tenha con- forma do regulamento.
cluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de
modo a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames
de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando- supletivos, que compreenderão a base nacional comum do
-se matrícula única para cada aluno; currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em ca-
II - concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino ráter regular.
médio ou já o esteja cursando, efetuando-se matrículas dis- § 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:
tintas para cada curso, e podendo ocorrer: I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os
a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as maiores de quinze anos;
oportunidades educacionais disponíveis; II - no nível de conclusão do ensino médio, para os
b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se maiores de dezoito anos.
as oportunidades educacionais disponíveis; § 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos
c) em instituições de ensino distintas, mediante convê- educandos por meios informais serão aferidos e reconhe-
nios de intercomplementaridade, visando ao planejamento e cidos mediante exames.
ao desenvolvimento de projeto pedagógico unificado.
A educação de jovens e adultos objetiva permitir a
Art. 36-D. Os diplomas de cursos de educação profis- conclusão do ensino fundamental e médio para aqueles
sional técnica de nível médio, quando registrados, terão que já ultrapassaram a idade regular em que isso deveria
validade nacional e habilitarão ao prosseguimento de ter acontecido.
estudos na educação superior.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

CAPÍTULO III III - incentivar o trabalho de pesquisa e investigação


Da Educação Profissional e Tecnológica científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tec-
nologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, de-
Art. 39. A educação profissional e tecnológica, no senvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;
cumprimento dos objetivos da educação nacional, integra-se IV - promover a divulgação de conhecimentos cultu-
aos diferentes níveis e modalidades de educação e às dimen- rais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da
sões do trabalho, da ciência e da tecnologia. humanidade e comunicar o saber através do ensino, de pu-
§ 1º Os cursos de educação profissional e tecnológica blicações ou de outras formas de comunicação;
poderão ser organizados por eixos tecnológicos, possibili- V - suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento
tando a construção de diferentes itinerários formativos, ob- cultural e profissional e possibilitar a correspondente concre-
servadas as normas do respectivo sistema e nível de ensino. tização, integrando os conhecimentos que vão sendo adqui-
§ 2º A educação profissional e tecnológica abrangerá ridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhe-
os seguintes cursos: cimento de cada geração;
I – de formação inicial e continuada ou qualificação VI - estimular o conhecimento dos problemas do
profissional; mundo presente, em particular os nacionais e regionais,
II – de educação profissional técnica de nível médio; prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer
III – de educação profissional tecnológica de gra- com esta uma relação de reciprocidade;
duação e pós-graduação. VII - promover a extensão, aberta à participação da
§ 3º Os cursos de educação profissional tecnológica de população, visando à difusão das conquistas e benefícios re-
graduação e pós-graduação organizar-se-ão, no que con- sultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecno-
cerne a objetivos, características e duração, de acordo com lógica geradas na instituição.
as diretrizes curriculares nacionais estabelecidas pelo Con- VIII - atuar em favor da universalização e do aprimo-
selho Nacional de Educação. ramento da educação básica, mediante a formação e a
capacitação de profissionais, a realização de pesquisas pe-
Art. 40. A educação profissional será desenvolvida dagógicas e o desenvolvimento de atividades de extensão
em articulação com o ensino regular ou por diferentes que aproximem os dois níveis escolares.
estratégias de educação continuada, em instituições es-
pecializadas ou no ambiente de trabalho. Art. 44. A educação superior abrangerá os seguintes
cursos e programas:
Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profis- I - cursos sequenciais por campo de saber, de diferentes
sional e tecnológica, inclusive no trabalho, poderá ser objeto níveis de abrangência, abertos a candidatos que atendam
de avaliação, reconhecimento e certificação para prossegui- aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino, des-
mento ou conclusão de estudos. de que tenham concluído o ensino médio ou equivalente;
II - de graduação, abertos a candidatos que tenham
Art. 42. As instituições de educação profissional e tec- concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido clas-
nológica, além dos seus cursos regulares, oferecerão cursos sificados em processo seletivo;
especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula III - de pós-graduação, compreendendo programas de
à capacidade de aproveitamento e não necessariamente mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoa-
ao nível de escolaridade. mento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos
de graduação e que atendam às exigências das instituições
A educação profissional e tecnológica pode se dar não de ensino;
apenas no ensino médio, mas também em instituições pró- IV - de extensão, abertos a candidatos que atendam
prias, que podem conferir inclusive diploma de formação aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições
em nível superior. Exemplos: FATEC, SENAI, entre outros. de ensino.
O acesso a este tipo de ensino não necessariamente exige § 1º. Os resultados do processo seletivo referido no
conclusão dos níveis prévios de educação, eis que seu prin- inciso II do caput deste artigo serão tornados públicos
cipal objetivo não é o ensino de conteúdos típicos, mas sim pelas instituições de ensino superior, sendo obrigatória a
a capacitação profissional. divulgação da relação nominal dos classificados, a respec-
tiva ordem de classificação, bem como do cronograma das
CAPÍTULO IV chamadas para matrícula, de acordo com os critérios para
DA EDUCAÇÃO SUPERIOR preenchimento das vagas constantes do respectivo edital.
§ 2º No caso de empate no processo seletivo, as institui-
Art. 43. A educação superior tem por finalidade: ções públicas de ensino superior darão prioridade de matrí-
I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento cula ao candidato que comprove ter renda familiar inferior a
do espírito científico e do pensamento reflexivo; dez salários mínimos, ou ao de menor renda familiar, quan-
II - formar diplomados nas diferentes áreas de co- do mais de um candidato preencher o critério inicial.
nhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais § 3º O processo seletivo referido no inciso II conside-
e para a participação no desenvolvimento da sociedade bra- rará as competências e as habilidades definidas na Base
sileira, e colaborar na sua formação contínua; Nacional Comum Curricular.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 45. A educação superior será ministrada em ins- V - deve conter as seguintes informações:
tituições de ensino superior, públicas ou privadas, com a) a lista de todos os cursos oferecidos pela instituição
variados graus de abrangência ou especialização. de ensino superior;
b) a lista das disciplinas que compõem a grade curricular
Art. 46. A autorização e o reconhecimento de cursos, de cada curso e as respectivas cargas horárias;
bem como o credenciamento de instituições de educa- c) a identificação dos docentes que ministrarão as aulas
ção superior, terão prazos limitados, sendo renovados, em cada curso, as disciplinas que efetivamente ministrará
periodicamente, após processo regular de avaliação. naquele curso ou cursos, sua titulação, abrangendo a qualifi-
§ 1º Após um prazo para saneamento de deficiências cação profissional do docente e o tempo de casa do docente,
eventualmente identificadas pela avaliação a que se refere de forma total, contínua ou intermitente.
este artigo, haverá reavaliação, que poderá resultar, con- § 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveita-
forme o caso, em desativação de cursos e habilitações, em mento nos estudos, demonstrado por meio de provas e
intervenção na instituição, em suspensão temporária de outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados
prerrogativas da autonomia, ou em descredenciamento. por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a
§ 2º No caso de instituição pública, o Poder Executivo duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos
responsável por sua manutenção acompanhará o processo sistemas de ensino.
de saneamento e fornecerá recursos adicionais, se neces- § 3º É obrigatória a frequência de alunos e professores,
sários, para a superação das deficiências. salvo nos programas de educação a distância.
§ 4º As instituições de educação superior oferecerão,
Art. 47. Na educação superior, o ano letivo regular, in- no período noturno, cursos de graduação nos mesmos
dependente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de padrões de qualidade mantidos no período diurno, sendo
trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado obrigatória a oferta noturna nas instituições públicas, ga-
aos exames finais, quando houver. rantida a necessária previsão orçamentária.
§ 1º As instituições informarão aos interessados, antes
Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconheci-
de cada período letivo, os programas dos cursos e demais
dos, quando registrados, terão validade nacional como
componentes curriculares, sua duração, requisitos, qualifi-
prova da formação recebida por seu titular.
cação dos professores, recursos disponíveis e critérios de
§ 1º Os diplomas expedidos pelas universidades serão
avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas condi-
por elas próprias registrados, e aqueles conferidos por ins-
ções, e a publicação deve ser feita, sendo as 3 (três) primei-
tituições não-universitárias serão registrados em universi-
ras formas concomitantemente:
dades indicadas pelo Conselho Nacional de Educação.
I - em página específica na internet no sítio eletrônico
§ 2º Os diplomas de graduação expedidos por univer-
oficial da instituição de ensino superior, obedecido o seguinte: sidades estrangeiras serão revalidados por universidades
a) toda publicação a que se refere esta Lei deve ter como públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equi-
título “Grade e Corpo Docente”; valente, respeitando-se os acordos internacionais de reci-
b) a página principal da instituição de ensino superior, procidade ou equiparação.
bem como a página da oferta de seus cursos aos ingressan- § 3º Os diplomas de Mestrado e de Doutorado expe-
tes sob a forma de vestibulares, processo seletivo e outras didos por universidades estrangeiras só poderão ser reco-
com a mesma finalidade, deve conter a ligação desta com a nhecidos por universidades que possuam cursos de pós-
página específica prevista neste inciso; -graduação reconhecidos e avaliados, na mesma área de
c) caso a instituição de ensino superior não possua sítio conhecimento e em nível equivalente ou superior.
eletrônico, deve criar página específica para divulgação das
informações de que trata esta Lei; Art. 49. As instituições de educação superior aceitarão
d) a página específica deve conter a data completa de a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na
sua última atualização; hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo.
II - em toda propaganda eletrônica da instituição de en- Parágrafo único. As transferências ex officio dar-se-ão
sino superior, por meio de ligação para a página referida no na forma da lei.
inciso I;
III - em local visível da instituição de ensino superior e de Art. 50. As instituições de educação superior, quando
fácil acesso ao público; da ocorrência de vagas, abrirão matrícula nas disciplinas
IV - deve ser atualizada semestralmente ou anualmente, de seus cursos a alunos não regulares que demonstrarem
de acordo com a duração das disciplinas de cada curso ofe- capacidade de cursá-las com proveito, mediante processo
recido, observando o seguinte: seletivo prévio.
a) caso o curso mantenha disciplinas com duração dife-
renciada, a publicação deve ser semestral; Art. 51. As instituições de educação superior credencia-
b) a publicação deve ser feita até 1 (um) mês antes do das como universidades, ao deliberar sobre critérios e nor-
início das aulas; mas de seleção e admissão de estudantes, levarão em conta
c) caso haja mudança na grade do curso ou no corpo os efeitos desses critérios sobre a orientação do ensino mé-
docente até o início das aulas, os alunos devem ser comuni- dio, articulando-se com os órgãos normativos dos sistemas
cados sobre as alterações; de ensino.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 52. As universidades são instituições pluridiscipli- § 1º No exercício da sua autonomia, além das atribui-
nares de formação dos quadros profissionais de nível supe- ções asseguradas pelo artigo anterior, as universidades pú-
rior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do blicas poderão:
saber humano, que se caracterizam por: I - propor o seu quadro de pessoal docente, técnico e
I - produção intelectual institucionalizada mediante administrativo, assim como um plano de cargos e salários,
o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, atendidas as normas gerais pertinentes e os recursos dispo-
tanto do ponto de vista científico e cultural, quanto regional níveis;
e nacional; II - elaborar o regulamento de seu pessoal em conformi-
II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titu- dade com as normas gerais concernentes;
lação acadêmica de mestrado ou doutorado; III - aprovar e executar planos, programas e projetos de
III - um terço do corpo docente em regime de tempo investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em
integral. geral, de acordo com os recursos alocados pelo respectivo
Parágrafo único. É facultada a criação de universidades Poder mantenedor;
especializadas por campo do saber. IV - elaborar seus orçamentos anuais e plurianuais;
V - adotar regime financeiro e contábil que atenda às
Art. 53. No exercício de sua autonomia, são assegura- suas peculiaridades de organização e funcionamento;
das às universidades, sem prejuízo de outras, as seguintes VI - realizar operações de crédito ou de financiamen-
atribuições: to, com aprovação do Poder competente, para aquisição de
I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e bens imóveis, instalações e equipamentos;
programas de educação superior previstos nesta Lei, obede- VII - efetuar transferências, quitações e tomar outras
cendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do providências de ordem orçamentária, financeira e patrimo-
respectivo sistema de ensino; nial necessárias ao seu bom desempenho.
II - fixar os currículos dos seus cursos e programas, ob- § 2º Atribuições de autonomia universitária poderão
servadas as diretrizes gerais pertinentes; ser estendidas a instituições que comprovem alta qualifica-
III - estabelecer planos, programas e projetos de pesqui- ção para o ensino ou para a pesquisa, com base em avalia-
sa científica, produção artística e atividades de extensão; ção realizada pelo Poder Público.
IV - fixar o número de vagas de acordo com a capacida-
de institucional e as exigências do seu meio; Art. 55. Caberá à União assegurar, anualmente, em seu
V - elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos Orçamento Geral, recursos suficientes para manutenção e
em consonância com as normas gerais atinentes; desenvolvimento das instituições de educação superior por
VI - conferir graus, diplomas e outros títulos; ela mantidas.
VII - firmar contratos, acordos e convênios;
VIII - aprovar e executar planos, programas e projetos Art. 56. As instituições públicas de educação superior
de investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegu-
geral, bem como administrar rendimentos conforme dispo- rada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de
sitivos institucionais; que participarão os segmentos da comunidade institucional,
IX - administrar os rendimentos e deles dispor na forma local e regional.
prevista no ato de constituição, nas leis e nos respectivos es- Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocupa-
tatutos; rão setenta por cento dos assentos em cada órgão colegiado
X - receber subvenções, doações, heranças, legados e e comissão, inclusive nos que tratarem da elaboração e mo-
cooperação financeira resultante de convênios com entida- dificações estatutárias e regimentais, bem como da escolha
des públicas e privadas. de dirigentes.
Parágrafo único. Para garantir a autonomia didático-
-científica das universidades, caberá aos seus colegiados de Art. 57. Nas instituições públicas de educação superior,
ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos orçamentários o professor ficará obrigado ao mínimo de oito horas sema-
disponíveis, sobre: nais de aulas.
I - criação, expansão, modificação e extinção de cursos;
II - ampliação e diminuição de vagas; A educação superior se funda no tripé: ensino, pesqui-
III - elaboração da programação dos cursos; sa e extensão. No viés do ensino, objetiva-se propiciar o
IV - programação das pesquisas e das atividades de ex- acesso ao conhecimento técnico e científico, tanto dentro
tensão; do ambiente acadêmico quanto fora dele; no aspecto pes-
V - contratação e dispensa de professores; quisa, busca-se desenvolver os conhecimentos já existen-
VI - planos de carreira docente. tes; no aspecto extensão, pretende-se atingir a comunida-
de por meio de atividades que possam ir além dos ambien-
Art. 54. As universidades mantidas pelo Poder Público tes acadêmicos, inserindo-se no cotidiano da vida social.
gozarão, na forma da lei, de estatuto jurídico especial Classicamente, a educação superior se dá nos níveis de
para atender às peculiaridades de sua estrutura, organiza- graduação, cujo acesso se dá por meio dos vestibulares, e
ção e financiamento pelo Poder Público, assim como dos pós-graduação, cujo acesso também se dá por processos
seus planos de carreira e do regime jurídico do seu pessoal. seletivos próprios, funcionando como complementação

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

ao ensino superior. Entretanto, o ensino superior também II - terminalidade específica para aqueles que não
pode se dar em cursos sequenciais e em cursos de exten- puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino
são, de menor duração e complexidade. fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração
O ensino superior pode ser ministrado em instituições para concluir em menor tempo o programa escolar para os
públicas ou privadas. Independentemente da natureza da superdotados;
instituição, é necessário respeitar as regras mínimas sobre III - professores com especialização adequada em ní-
duração do ano letivo, programas de curso, componentes vel médio ou superior, para atendimento especializado, bem
curriculares, etc. como professores do ensino regular capacitados para a inte-
O diploma faz prova da formação. gração desses educandos nas classes comuns;
É possível a transferência entre instituições. A transfe- IV - educação especial para o trabalho, visando a sua
rência a pedido está condicionada a número de vagas e a efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições
processo seletivo. As transferências de ofício se sujeitam a adequadas para os que não revelarem capacidade de inser-
critérios próprios. Um exemplo de transferência de ofício ção no trabalho competitivo, mediante articulação com os
se dá no caso de remoção de servidor público de ofício no órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresen-
interesse da Administração (caso o servidor ou seu depen- tam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual
dente estude em instituição pública na cidade onde estava ou psicomotora;
lotado, tem o direito de ser transferido para a instituição V - acesso igualitário aos benefícios dos programas
pública da nova lotação). sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do
É possível que uma pessoa assista aulas nas instituições ensino regular.
públicas independentemente de vínculo com o curso, des-
de que haja vagas disponíveis. Art. 59-A. O poder público deverá instituir cadastro na-
Para propiciar o desenvolvimento institucional, exige- cional de alunos com altas habilidades ou superdotação
-se que pelo menos 1/3 do corpo docente da instituição matriculados na educação básica e na educação superior, a
possua mestrado ou doutorado, bem como que 1/3 do fim de fomentar a execução de políticas públicas destinadas
ao desenvolvimento pleno das potencialidades desse alunado.
corpo docente se dedique exclusivamente à docência.
Parágrafo único. A identificação precoce de alunos com
Em que pesem as regras mínimas acerca do ensino su-
altas habilidades ou superdotação, os critérios e procedi-
perior, as instituições de ensino superior são dotadas de
mentos para inclusão no cadastro referido no caput deste
autonomia para se organizarem.
artigo, as entidades responsáveis pelo cadastramento, os
As universidades públicas gozam de estatuto jurídico
mecanismos de acesso aos dados do cadastro e as políticas
especial.
de desenvolvimento das potencialidades do alunado de que
As instituições públicas devem obedecer ao princípio
trata o caput serão definidos em regulamento.
da gestão democrática, assegurado pela existência de ór-
gãos colegiados deliberativos que mesclem membros da Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino
comunidade, do corpo docente e do corpo discente. estabelecerão critérios de caracterização das instituições
privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação
CAPÍTULO V exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e
DA EDUCAÇÃO ESPECIAL financeiro pelo Poder Público.
Parágrafo único. O poder público adotará, como alter-
Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efei- nativa preferencial, a ampliação do atendimento aos edu-
tos desta Lei, a modalidade de educação escolar oferecida candos com deficiência, transtornos globais do desenvolvi-
preferencialmente na rede regular de ensino, para educan- mento e altas habilidades ou superdotação na própria rede
dos com deficiência, transtornos globais do desenvolvi- pública regular de ensino, independentemente do apoio às
mento e altas habilidades ou superdotação. instituições previstas neste artigo.
§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio es-
pecializado, na escola regular, para atender às peculiarida- A educação especial volta-se a educandos com defi-
des da clientela de educação especial. ciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, habilidades ou superdotação. Para que ela seja efetivada,
escolas ou serviços especializados, sempre que, em função exige-se a especialização das instituições de ensino e de
das condições específicas dos alunos, não for possível a sua seus profissionais.
integração nas classes comuns de ensino regular.
§ 3º  A oferta de educação especial, nos termos TÍTULO VI
do  caput deste artigo, tem início na educação infantil e Dos Profissionais da Educação
estende-se ao longo da vida, observados o inciso III do art.
4º e o parágrafo único do art. 60 desta Lei.  Art. 61. Consideram-se profissionais da educação
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educan- escolar básica os que, nela estando em efetivo exercício e
dos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento tendo sido formados em cursos reconhecidos, são:
e altas habilidades ou superdotação: I – professores habilitados em nível médio ou supe-
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos rior para a docência na educação infantil e nos ensinos
e organização específicos, para atender às suas necessidades; fundamental e médio;

13
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

II – trabalhadores em educação portadores de di- programa institucional de bolsa de iniciação à docência a


ploma de pedagogia, com habilitação em administração, estudantes matriculados em cursos de licenciatura, de gra-
planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacio- duação plena, nas instituições de educação superior.
nal, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas § 6º O Ministério da Educação poderá estabelecer
mesmas áreas; nota mínima em exame nacional aplicado aos concluintes
III - trabalhadores em educação, portadores de diplo- do ensino médio como pré-requisito para o ingresso em
ma de curso técnico ou superior em área pedagógica ou cursos de graduação para formação de docentes, ouvido o
afim; e Conselho Nacional de Educação - CNE.
IV - profissionais com notório saber reconhecido pelos § 7º (VETADO).
respectivos sistemas de ensino para ministrar conteú- § 8º Os currículos dos cursos de formação de docentes
dos de áreas afins à sua formação para atender o dispos- terão por referência a Base Nacional Comum Curricular.
to no inciso V do caput do art. 36.
Parágrafo único. A formação dos profissionais da edu- Art. 62-A. A formação dos profissionais a que se refere o
cação, de modo a atender às especificidades do exercício inciso III do art. 61 far-se-á por meio de cursos de conteúdo
de suas atividades, bem como aos objetivos das diferentes técnico-pedagógico, em nível médio ou superior, incluindo
etapas e modalidades da educação básica, terá como fun- habilitações tecnológicas.
damentos: Parágrafo único. Garantir-se-á formação continuada
I – a presença de sólida formação básica, que propi- para os profissionais a que se refere o caput, no local de
cie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de trabalho ou em instituições de educação básica e superior,
suas competências de trabalho; incluindo cursos de educação profissional, cursos superiores
II – a associação entre teorias e práticas, mediante de graduação plena ou tecnológicos e de pós-graduação.
estágios supervisionados e capacitação em serviço;
III – o aproveitamento da formação e experiências Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
anteriores, em instituições de ensino e em outras atividades. I - cursos formadores de profissionais para a edu-
cação básica, inclusive o curso normal superior, destinado
IV - profissionais com notório saber reconhecido pe-
à formação de docentes para a educação infantil e para as
los respectivos sistemas de ensino, para ministrar conteúdos
primeiras séries do ensino fundamental;
de áreas afins à sua formação ou experiência profissional,
II - programas de formação pedagógica para portado-
atestados por titulação específica ou prática de ensino em
res de diplomas de educação superior que queiram se dedi-
unidades educacionais da rede pública ou privada ou das
car à educação básica;
corporações privadas em que tenham atuado, exclusivamen-
III - programas de educação continuada para os pro-
te para atender ao inciso V do caput do art. 36;
fissionais de educação dos diversos níveis.
V - profissionais graduados que tenham feito com-
plementação pedagógica, conforme disposto pelo Conse- Art. 64. A formação de profissionais de educação para
lho Nacional de Educação. administração, planejamento, inspeção, supervisão e orien-
tação educacional para a educação básica, será feita em
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educa- cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-gra-
ção básica far-se-á em nível superior, em curso de licencia- duação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
tura plena, admitida, como formação mínima para o exercí- formação, a base comum nacional.
cio do magistério na educação infantil e nos cinco primeiros
anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na Art. 65. A formação docente, exceto para a educação su-
modalidade normal. perior, incluirá prática de ensino de, no mínimo, trezentas
§ 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu- horas.
nicípios, em regime de colaboração, deverão promover a
formação inicial, a continuada e a capacitação dos profis- Art. 66. A preparação para o exercício do magistério
sionais de magistério. superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritaria-
§ 2º A formação continuada e a capacitação dos pro- mente em programas de mestrado e doutorado.
fissionais de magistério poderão utilizar recursos e tecno- Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por uni-
logias de educação a distância. versidade com curso de doutorado em área afim, poderá su-
§ 3º A formação inicial de profissionais de magisté- prir a exigência de título acadêmico.
rio dará preferência ao ensino presencial, subsidiariamente
fazendo uso de recursos e tecnologias de educação a dis- Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valori-
tância. zação dos profissionais da educação, assegurando-lhes,
§ 4º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu- inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira
nicípios adotarão mecanismos facilitadores de acesso e do magistério público:
permanência em cursos de formação de docentes em nível I - ingresso exclusivamente por concurso público de pro-
superior para atuar na educação básica pública. vas e títulos;
§ 5º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Mu- II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive
nicípios incentivarão a formação de profissionais do ma- com licenciamento periódico remunerado para esse fim;
gistério para atuar na educação básica pública mediante III - piso salarial profissional;

14
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV - progressão funcional baseada na titulação ou habi- § 2º Serão consideradas excluídas das receitas de im-
litação, e na avaliação do desempenho; postos mencionadas neste artigo as operações de crédito
V - período reservado a estudos, planejamento e avalia- por antecipação de receita orçamentária de impostos.
ção, incluído na carga de trabalho; § 3º Para fixação inicial dos valores correspondentes
VI - condições adequadas de trabalho. aos mínimos estatuídos neste artigo, será considerada a re-
§ 1º A experiência docente é pré-requisito para o exer- ceita estimada na lei do orçamento anual, ajustada, quan-
cício profissional de quaisquer outras funções de magisté- do for o caso, por lei que autorizar a abertura de créditos
rio, nos termos das normas de cada sistema de ensino. adicionais, com base no eventual excesso de arrecadação.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 5º do art. 40 e § 4º As diferenças entre a receita e a despesa previstas
no § 8º do art. 201 da Constituição Federal, são conside- e as efetivamente realizadas, que resultem no não atendi-
radas funções de magistério as exercidas por professores mento dos percentuais mínimos obrigatórios, serão apu-
e especialistas em educação no desempenho de ativida- radas e corrigidas a cada trimestre do exercício financeiro.
des educativas, quando exercidas em estabelecimento de
§ 5º O repasse dos valores referidos neste artigo do
educação básica em seus diversos níveis e modalidades,
caixa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Mu-
incluídas, além do exercício da docência, as de direção de
nicípios ocorrerá imediatamente ao órgão responsável pela
unidade escolar e as de coordenação e assessoramento pe-
dagógico. educação, observados os seguintes prazos:
§ 3º A União prestará assistência técnica aos Estados, I - recursos arrecadados do primeiro ao décimo dia de
ao Distrito Federal e aos Municípios na elaboração de con- cada mês, até o vigésimo dia;
cursos públicos para provimento de cargos dos profissio- II - recursos arrecadados do décimo primeiro ao vigési-
nais da educação. mo dia de cada mês, até o trigésimo dia;
III - recursos arrecadados do vigésimo primeiro dia ao
Os profissionais da educação devem possuir formação final de cada mês, até o décimo dia do mês subsequente.
específica, notadamente possuir habilitação para a docên- § 6º O atraso da liberação sujeitará os recursos a cor-
cia, que pode se dar pelas licenciaturas e magistérios em reção monetária e à responsabilização civil e criminal das
geral, bem como pela pedagogia, ou ainda por formação e autoridades competentes.
área afim que habilite para o ensino de matérias específicas
(ex.: profissional do Direito pode lecionar português, filoso- Art. 70. Considerar-se-ão como de manutenção e
fia e sociologia). Além disso, devem possuir experiência em desenvolvimento do ensino as despesas realizadas com
atividades de ensino. Quanto ao ensino superior, exige-se vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições
pós-graduação, que pode ser uma simples especialização, educacionais de todos os níveis, compreendendo as que se
embora deva preferencialmente se possuir mestrado ou destinam a:
doutorado. No âmbito do ensino público, exige-se valori- I - remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente e
zação do profissional, criando-se plano de carreira e aper- demais profissionais da educação;
feiçoando-se as condições de trabalho. II - aquisição, manutenção, construção e conservação de
instalações e equipamentos necessários ao ensino;
TÍTULO VII III – uso e manutenção de bens e serviços vinculados ao
Dos Recursos financeiros ensino;
IV - levantamentos estatísticos, estudos e pesquisas vi-
Art. 68. Serão recursos públicos destinados à educa- sando precipuamente ao aprimoramento da qualidade e à
ção os originários de:
expansão do ensino;
I - receita de impostos próprios da União, dos Estados, do
V - realização de atividades-meio necessárias ao funcio-
Distrito Federal e dos Municípios;
namento dos sistemas de ensino;
II - receita de transferências constitucionais e outras
transferências; VI - concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas
III - receita do salário-educação e de outras contribui- públicas e privadas;
ções sociais; VII - amortização e custeio de operações de crédito des-
IV - receita de incentivos fiscais; tinadas a atender ao disposto nos incisos deste artigo;
V - outros recursos previstos em lei. VIII - aquisição de material didático-escolar e manuten-
ção de programas de transporte escolar.
Art. 69. A União aplicará, anualmente, nunca menos
de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, Art. 71. Não constituirão despesas de manutenção e
vinte e cinco por cento, ou o que consta nas respectivas desenvolvimento do ensino aquelas realizadas com:
Constituições ou Leis Orgânicas, da receita resultante de I - pesquisa, quando não vinculada às instituições de en-
impostos, compreendidas as transferências constitucionais, sino, ou, quando efetivada fora dos sistemas de ensino, que
na manutenção e desenvolvimento do ensino público. não vise, precipuamente, ao aprimoramento de sua qualida-
§ 1º A parcela da arrecadação de impostos transferida de ou à sua expansão;
pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí- II - subvenção a instituições públicas ou privadas de ca-
pios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios, não será ráter assistencial, desportivo ou cultural;
considerada, para efeito do cálculo previsto neste artigo, III - formação de quadros especiais para a administração
receita do governo que a transferir. pública, sejam militares ou civis, inclusive diplomáticos;

15
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV - programas suplementares de alimentação, assistên- Art. 77. Os recursos públicos serão destinados às esco-
cia médico-odontológica, farmacêutica e psicológica, e ou- las públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias,
tras formas de assistência social; confessionais ou filantrópicas que:
V - obras de infraestrutura, ainda que realizadas para I - comprovem finalidade não-lucrativa e não distri-
beneficiar direta ou indiretamente a rede escolar; buam resultados, dividendos, bonificações, participações ou
VI - pessoal docente e demais trabalhadores da educa- parcela de seu patrimônio sob nenhuma forma ou pretexto;
ção, quando em desvio de função ou em atividade alheia à II - apliquem seus excedentes financeiros em educação;
manutenção e desenvolvimento do ensino. III - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra
escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder
Art. 72. As receitas e despesas com manutenção e de- Público, no caso de encerramento de suas atividades;
senvolvimento do ensino serão apuradas e publicadas nos IV - prestem contas ao Poder Público dos recursos rece-
balanços do Poder Público, assim como nos relatórios a que bidos.
se refere o § 3º do art. 165 da Constituição Federal. § 1º Os recursos de que trata este artigo poderão ser
destinados a bolsas de estudo para a educação básica, na
Art. 73. Os órgãos fiscalizadores examinarão, prioritaria- forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de
mente, na prestação de contas de recursos públicos, o cum- recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares
primento do disposto no art. 212 da Constituição Federal, no da rede pública de domicílio do educando, ficando o Poder
art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e Público obrigado a investir prioritariamente na expansão
na legislação concernente. da sua rede local.
§ 2º As atividades universitárias de pesquisa e extensão
Art. 74. A União, em colaboração com os Estados, o Dis- poderão receber apoio financeiro do Poder Público, inclu-
trito Federal e os Municípios, estabelecerá padrão mínimo sive mediante bolsas de estudo.
de oportunidades educacionais para o ensino fundamen-
tal, baseado no cálculo do custo mínimo por aluno, capaz de No aspecto orçamentário, merece destaque a exigên-
cia de dedicação de parcela mínima dos impostos da União
assegurar ensino de qualidade.
(18%) e dos Estados e Distrito Federal (25%) voltada à edu-
Parágrafo único. O custo mínimo de que trata este ar-
cação. Ainda, coloca-se o papel de suplementação e redis-
tigo será calculado pela União ao final de cada ano, com
tribuição da União em relação aos Estados e Municípios
validade para o ano subsequente, considerando variações
e dos Estados com relação aos Municípios, repassando-se
regionais no custo dos insumos e as diversas modalidades
verbas para permitir que estas unidades federativas consi-
de ensino.
gam lograr êxito em oferecer parâmetro mínimo de quali-
dade no ensino que é de sua incumbência.
Art. 75. A ação supletiva e redistributiva da União e
dos Estados será exercida de modo a corrigir, progressiva- TÍTULO VIII
mente, as disparidades de acesso e garantir o padrão mí- Das Disposições Gerais
nimo de qualidade de ensino.
§ 1º A ação a que se refere este artigo obedecerá a Art. 78. O Sistema de Ensino da União, com a colaboração
fórmula de domínio público que inclua a capacidade de das agências federais de fomento à cultura e de assistência
atendimento e a medida do esforço fiscal do respectivo aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e
Estado, do Distrito Federal ou do Município em favor da pesquisa, para oferta de educação escolar bilíngue e inter-
manutenção e do desenvolvimento do ensino. cultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos:
§ 2º A capacidade de atendimento de cada governo I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos,
será definida pela razão entre os recursos de uso constitu- a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação
cionalmente obrigatório na manutenção e desenvolvimen- de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas
to do ensino e o custo anual do aluno, relativo ao padrão e ciências;
mínimo de qualidade. II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o
§ 3º Com base nos critérios estabelecidos nos §§ 1º e acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos
2º, a União poderá fazer a transferência direta de recursos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não-
a cada estabelecimento de ensino, considerado o número -índias.
de alunos que efetivamente frequentam a escola.
§ 4º A ação supletiva e redistributiva não poderá ser Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os
exercida em favor do Distrito Federal, dos Estados e dos sistemas de ensino no provimento da educação intercultural
Municípios se estes oferecerem vagas, na área de ensino às comunidades indígenas, desenvolvendo programas inte-
de sua responsabilidade, conforme o inciso VI do art. 10 grados de ensino e pesquisa.
e o inciso V do art. 11 desta Lei, em número inferior à sua § 1º Os programas serão planejados com audiência das
capacidade de atendimento. comunidades indígenas.
§ 2º Os programas a que se refere este artigo, incluí-
Art. 76. A ação supletiva e redistributiva prevista no dos nos Planos Nacionais de Educação, terão os seguintes
artigo anterior ficará condicionada ao efetivo cumprimento objetivos:
pelos Estados, Distrito Federal e Municípios do disposto nesta I - fortalecer as práticas socioculturais e a língua mater-
Lei, sem prejuízo de outras prescrições legais. na de cada comunidade indígena;

16
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

II - manter programas de formação de pessoal especia- Art. 84. Os discentes da educação superior poderão ser
lizado, destinado à educação escolar nas comunidades in- aproveitados em tarefas de ensino e pesquisa pelas respecti-
dígenas; vas instituições, exercendo funções de monitoria, de acordo
III - desenvolver currículos e programas específicos, neles com seu rendimento e seu plano de estudos.
incluindo os conteúdos culturais correspondentes às respec-
tivas comunidades; Art. 85. Qualquer cidadão habilitado com a titula-
IV - elaborar e publicar sistematicamente material didá- ção própria poderá exigir a abertura de concurso públi-
tico específico e diferenciado. co de provas e títulos para cargo de docente de instituição
§ 3º No que se refere à educação superior, sem prejuízo pública de ensino que estiver sendo ocupado por professor
de outras ações, o atendimento aos povos indígenas efe- não concursado, por mais de seis anos, ressalvados os direi-
tivar-se-á, nas universidades públicas e privadas, mediante tos assegurados pelos arts. 41 da Constituição Federal e 19
a oferta de ensino e de assistência estudantil, assim como do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
de estímulo à pesquisa e desenvolvimento de programas
Art. 86. As instituições de educação superior constituídas
especiais.
como universidades integrar-se-ão, também, na sua condi-
ção de instituições de pesquisa, ao Sistema Nacional de
Art. 79-A. (VETADO).
Ciência e Tecnologia, nos termos da legislação específica.
Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de no- TÍTULO IX
vembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’. Das Disposições Transitórias
Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvi- Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se
mento e a veiculação de programas de ensino a distân- um ano a partir da publicação desta Lei.
cia, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de § 1º A União, no prazo de um ano a partir da publica-
educação continuada. ção desta Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Pla-
§ 1º A educação a distância, organizada com abertura no Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os
e regime especiais, será oferecida por instituições especifica- dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial
mente credenciadas pela União. sobre Educação para Todos.
§ 2º A União regulamentará os requisitos para a reali- § 2º (Revogado).
zação de exames e registro de diploma relativos a cursos § 3º O Distrito Federal, cada Estado e Município, e, su-
de educação a distância. pletivamente, a União, devem:
§ 3º As normas para produção, controle e avaliação de I - (Revogado).
programas de educação a distância e a autorização para II - prover cursos presenciais ou a distância aos jovens e
sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de adultos insuficientemente escolarizados;
ensino, podendo haver cooperação e integração entre os III - realizar programas de capacitação para todos os
diferentes sistemas. professores em exercício, utilizando também, para isto, os
§ 4º A educação a distância gozará de tratamento recursos da educação a distância;
diferenciado, que incluirá: IV - integrar todos os estabelecimentos de ensino funda-
I - custos de transmissão reduzidos em canais comer- mental do seu território ao sistema nacional de avaliação do
ciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens e em outros rendimento escolar.
§ 4º (Revogado).
meios de comunicação que sejam explorados mediante au-
§ 5º Serão conjugados todos os esforços objetivando a
torização, concessão ou permissão do poder público;
progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino
II - concessão de canais com finalidades exclusivamente
fundamental para o regime de escolas de tempo integral.
educativas;
§ 6º A assistência financeira da União aos Estados, ao
III - reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Distrito Federal e aos Municípios, bem como a dos Estados
Público, pelos concessionários de canais comerciais. aos seus Municípios, ficam condicionadas ao cumprimen-
to do art. 212 da Constituição Federal e dispositivos legais
Art. 81. É permitida a organização de cursos ou insti- pertinentes pelos governos beneficiados.
tuições de ensino experimentais, desde que obedecidas as
disposições desta Lei. Art. 87-A. (VETADO).

Art. 82. Os sistemas de ensino estabelecerão as normas Art. 88. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Mu-
de realização de estágio em sua jurisdição, observada a lei nicípios adaptarão sua legislação educacional e de ensino às
federal sobre a matéria. disposições desta Lei no prazo máximo de um ano, a partir
da data de sua publicação.
Art. 83. O ensino militar é regulado em lei específica, § 1º As instituições educacionais adaptarão seus esta-
admitida a equivalência de estudos, de acordo com as nor- tutos e regimentos aos dispositivos desta Lei e às normas
mas fixadas pelos sistemas de ensino. dos respectivos sistemas de ensino, nos prazos por estes
estabelecidos.

17
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 2º O prazo para que as universidades cumpram o dis- § 2º A lei disporá sobre normas de construção dos lo-
posto nos incisos II e III do art. 52 é de oito anos. gradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de
veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso
Art. 89. As creches e pré-escolas existentes ou que ve- adequado às pessoas portadoras de deficiência.
nham a ser criadas deverão, no prazo de três anos, a contar § 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguin-
da publicação desta Lei, integrar-se ao respectivo sistema de tes aspectos:
ensino. I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao
trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;
Art. 90. As questões suscitadas na transição entre o re- II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
gime anterior e o que se institui nesta Lei serão resolvidas III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e
pelo Conselho Nacional de Educação ou, mediante delega- jovem à escola; 
ção deste, pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino, IV - garantia de pleno e formal conhecimento da
preservada a autonomia universitária. atribuição de ato infracional, igualdade na relação pro-
cessual e defesa técnica por profissional habilitado, se-
Art. 91. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. gundo dispuser a legislação tutelar específica;
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcio-
Art. 92. Revogam-se as disposições das Leis nºs 4.024, nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em de-
de 20 de dezembro de 1961, e 5.540, de 28 de novembro de senvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida
1968, não alteradas pelas Leis nºs 9.131, de 24 de novembro privativa da liberdade;
de 1995 e 9.192, de 21 de dezembro de 1995 e, ainda, as Leis VI - estímulo do Poder Público, através de assistência
nºs 5.692, de 11 de agosto de 1971 e 7.044, de 18 de outubro jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei,
de 1982, e as demais leis e decretos-lei que as modificaram e ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou ado-
quaisquer outras disposições em contrário. lescente órfão ou abandonado;
VII - programas de prevenção e atendimento especia-
lizado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de
entorpecentes e drogas afins.
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a
LEI FEDERAL Nº 8.069/1990 E SUAS exploração sexual da criança e do adolescente.
ALTERAÇÕES (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO § 5º A adoção será assistida pelo Poder Público, na
ADOLESCENTE). forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efe-
tivação por parte de estrangeiros.
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casa-
mento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qua-
Noções introdutórias e disciplina constitucional lificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias
relativas à filiação.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Es- § 7º No atendimento dos direitos da criança e do ado-
tado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com lescente levar-se-á em consideração o disposto no art. 2042.
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimenta- § 8º A lei estabelecerá: 
ção, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à I - o estatuto da juventude, destinado a regular os di-
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar reitos dos jovens; 
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma II - o plano nacional de juventude, de duração dece-
de negligência, discriminação, exploração, violência, nal, visando à articulação das várias esferas do poder públi-
crueldade e opressão.  co para a execução de políticas públicas. 
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência
integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, ad- 2 Art. 204. As ações governamentais na área da assistência
mitida a participação de entidades não governamentais, social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade
mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas
preceitos:  com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-
I - aplicação de percentual dos recursos públicos desti- -administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera
federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às
nados à saúde na assistência materno-infantil; esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e
II - criação de programas de prevenção e atendimen- de assistência social; II - participação da população, por meio de
to especializado para as pessoas portadoras de deficiência organizações representativas, na formulação das políticas e no con-
física, sensorial ou mental, bem como de integração social trole das ações em todos os níveis. Parágrafo único. É facultado aos
do adolescente e do jovem portador de deficiência, me- Estados e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à inclusão
diante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a e promoção social até cinco décimos por cento de sua receita tribu-
tária líquida, vedada a aplicação desses recursos no pagamento de:
facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eli- I - despesas com pessoal e encargos sociais; II - serviço da dívida;
minação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas III - qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos
de discriminação.  investimentos ou ações apoiados.

18
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

No caput do artigo 227, CF se encontra uma das prin- jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de
cipais diretrizes do direito da criança e do adolescente que juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE.
é o princípio da prioridade absoluta. Significa que cada Mais informações sobre a Política mencionada no inciso II
criança e adolescente deve receber tratamento especial do e sobre a Secretaria e o Conselho Nacional de Juventude
Estado e ser priorizado em suas políticas públicas, pois são que direcionam a implementação dela podem ser obtidas
o futuro do país e as bases de construção da sociedade. na rede3.
A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 dispõe sobre o Aprofundando o tema, a cabeça do art. 227, da Lei Fun-
Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providên- damental, preconiza ser dever da família, da sociedade e do
cias, seguindo em seus dispositivos a ideologia do princí- Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
pio da absoluta prioridade. absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,
No §1º do artigo 227 aborda-se a questão da assistên- à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dig-
cia à saúde da criança e do adolescente. Do inciso I se de- nidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
preende a intrínseca relação entre a proteção da criança e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
do adolescente com a proteção da maternidade e da infân- negligência, discriminação, exploração, violência, cruelda-
cia, mencionada no artigo 6º, CF. Já do inciso II se depreen- de e opressão.
de a proteção de outro grupo vulnerável, que é a pessoa A leitura do art. 227, caput, da Constituição Federal
portadora de deficiência, valendo lembrar que o Decreto nº permite concluir que se adotou, neste país, a chamada
6.949, de 25 de agosto de 2009, que promulga a Convenção “Doutrina da Proteção Integral da Criança”, ao lhe assegu-
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência rar a absoluta prioridade em políticas públicas, medidas
e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em sociais, decisões judiciais, respeito aos direitos humanos,
30 de março de 2007, foi promulgado após aprovação no e observância da dignidade da pessoa humana. Neste sen-
Congresso Nacional nos moldes da Emenda Constitucional tido, o parágrafo único, do art. 5º, do “Estatuto da Crian-
nº 45/2004, tendo força de norma constitucional e não de ça e do Adolescente”, prevê que a garantia de priorida-
lei ordinária. A preocupação com o direito da pessoa porta- de compreende a primazia de receber proteção e socorro
em quaisquer circunstâncias (alínea “a”), a precedência de
dora de deficiência se estende ao §2º do artigo 227, CF: “a
atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública
lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e
(alínea “b”), a preferência na formulação e na execução das
dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos
políticas sociais públicas (alínea “c”), e a destinação privi-
de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado
legiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a
às pessoas portadoras de deficiência”.
proteção à infância e à juventude (alínea “d”).
A proteção especial que decorre do princípio da prio-
Ademais, a proteção à criança, ao adolescente e ao jo-
ridade absoluta está prevista no §3º do artigo 227. Liga-se,
vem representa incumbência atribuída não só ao Estado,
ainda, à proteção especial, a previsão do §4º do artigo 227: mas também à família e à sociedade. Sendo assim, há se
“A lei punirá severamente o abuso, a violência e a explora- prestar bastante atenção nas provas de concurso, tendo
ção sexual da criança e do adolescente”. em vista que só se costuma colocar o Estado como obser-
Tendo em vista o direito de toda criança e adolescente vador da “Doutrina da Proteção Integral”, sendo que isso
de ser criado no seio de uma família, o §5º do artigo 227 da também compete à família e à sociedade.
Constituição prevê que “a adoção será assistida pelo Poder Nesta frequência, o direito à proteção especial abran-
Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condi- gerá os seguintes aspectos (art. 227, §3º, CF):
ções de sua efetivação por parte de estrangeiros”. Neste - A idade mínima de dezesseis anos para admissão ao
sentido, a Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009, dispõe trabalho, salvo a partir dos quatorze anos, na condição de
sobre a adoção. aprendiz (inciso I de acordo com o art. 7º, XXXIII, CF, pós-al-
A igualdade entre os filhos, quebrando o paradigma da teração promovida pela Emenda Constitucional nº 20/98);
Constituição anterior e do até então vigente Código Civil - A garantia de direitos previdenciários e trabalhistas
de 1916 consta no artigo 227, § 6º, CF: “os filhos, havidos (inciso II);
ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os - A garantia de acesso ao trabalhador adolescente e
mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer de- jovem à escola (inciso III);
signações discriminatórias relativas à filiação”. - A garantia de pleno e formal conhecimento da atri-
Quando o artigo 227 dispõe no § 7º que “no atendi- buição do ato infracional, igualdade na relação processual
mento dos direitos da criança e do adolescente levar-se-á e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dis-
em consideração o disposto no art. 204” tem em vista a puser a legislação tutelar específica (inciso IV);
adoção de práticas de assistência social, com recursos da - A obediência aos princípios de brevidade, excepcio-
seguridade social, em prol da criança e do adolescente. nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em de-
Por seu turno, o artigo 227, § 8º, CF, preconiza: “A lei senvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida
estabelecerá: I - o estatuto da juventude, destinado a re- privativa de liberdade (inciso V);
gular os direitos dos jovens; II - o plano nacional de juven- - O estímulo do Poder Público, através de assistência
tude, de duração decenal, visando à articulação das várias jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao
esferas do poder público para a execução de políticas pú- acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adoles-
blicas”. A Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013, institui cente órfão ou abandonado (inciso VI);
o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos 3 http://www.juventude.gov.br/politica

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

- Programas de prevenção e atendimento especializa- ao menos passavam a ensinar seus ofícios a estes jovens.
do à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de Já as meninas permaneciam marginalizadas das atividades
entorpecentes e drogas afins (inciso VII). educacionais e profissionalizantes, apenas lhes era ensina-
Prosseguindo, o parágrafo sexto, do art. 227, da Cons- do como desempenhar atividades domésticas.
tituição, garante o “Princípio da Igualdade entre os Filhos”, Desde o final da Revolução Francesa e, com destaque,
ao dispor que os filhos, havidos ou não da relação do ca- a partir da Revolução Industrial, que alterou substancial-
samento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e quali- mente os modos e métodos de produção, a criança e o
ficações, proibidas quaisquer designações discriminatórias adolescente passam a ocupar papel central na sociedade,
relativas à filiação. desempenhando atividades trabalhistas de caráter equiva-
Assim, com a Constituição Federal, os filhos não têm lente a dos adultos. Foram vítimas de inúmeros acidentes
mais “valor” para efeito de direitos alimentícios e suces- de trabalho, morriam em meio à insalubridade das fábricas,
sórios. Não se pode falar em um filho receber metade da então movidas predominantemente a carvão. Foi apenas
parte que originalmente lhe cabia por ser “bastardo”, en- com a emergência da Organização Internacional do Tra-
balho – OIT, em 1919, que aos poucos se consolidou uma
quanto aquele fruto da sociedade conjugal receber a quan-
consciência a respeito da necessidade de se limitar a parti-
tia integral. Aliás, nem mesmo a expressão “filho bastardo”
cipação das crianças e adolescentes no espaço de trabalho.
pode mais ser utilizada, por representar uma forma de dis- Este foi o estopim para o reconhecimento da condição es-
criminação designatória. pecial da criança e do adolescente.
Também, o art. 229 traz uma “via de mão dupla” entre Internacionalmente, a proteção efetiva da criança e
pais e filhos, isto é, os pais têm o dever de assistir, criar e do adolescente começa a tomar corpo com o reconheci-
educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever mento internacional dos direitos humanos e a fundação
de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou en- da UNICEF. A UNICEF, inicialmente conhecida como Fundo
fermidade. Tal dispositivo, inclusive, permite que os filhos Internacional de Emergência das Nações Unidas para as
peçam alimentos aos pais, e que os pais peçam alimentos Crianças, foi criada em dezembro de 1946 para ajudar as
aos filhos. crianças da Europa vítimas da II Guerra Mundial. No início
Por fim, há se mencionar o acrescentado parágrafo oi- da década de 50 o seu mandato foi alargado para respon-
tavo (pela Emenda Constitucional nº 65/2010), ao art. 227, der às necessidades das crianças e das mães nos países em
da Constituição Federal, segundo o qual a lei estabelecerá desenvolvimento. Em 1953, torna-se uma agência perma-
o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos nente das Nações Unidas, e passa a ocupar-se especial-
jovens (inciso I), e o plano nacional de juventude, de du- mente das crianças dos países mais pobres da África, Ásia,
ração decenal, visando à articulação das várias esferas do América Latina e Médio Oriente. Passa então a designar-se
poder público para a execução de políticas públicas (inciso Fundo das Nações Unidas para a Infância, mas mantém a
II). Nada obstante a exigência constitucional desde 2010, sigla que a tornara conhecida em todo o mundo – UNICEF.
somente bem recentemente o Estatuto da Juventude foi Desde então, sobrevieram no âmbito das Nações Unidas
aprovado (Lei nº 12.852/2013), como visto acima, carecen- documentos bastante relevantes sobre a condição jurídica
do, ainda, o Plano Nacional de Juventude de maior regula- peculiar da criança, já estudados neste material.
mentação infraconstitucional. No Brasil, no final do século XIX e início do século XX,
foi instituído no Rio de Janeiro o Instituto de Proteção e
Evolução histórica Assistência à Infância, primeiro estabelecimento público
nacional de atendimento a crianças e adolescentes. Em se-
guida, veio a Lei nº 4.242/1921, que autorizou o governo
Na Grécia antiga, a criança era colocada numa posição
a organizar o Serviço de Assistência e Proteção à Infância
de inferioridade, tida como um ser irracional, sem capaci-
Abandonada e Dellinquente. Em 1927 foi aprovado o pri-
dade de tomar qualquer tipo de decisão. Trata-se de marco
meiro Código de Menores. Em 1941, durante o governo
da cultura grega, que enxergava apenas poucos homens de Vargas, foi criado o Serviço de Assistência ao Menor, cujo
posses como cidadãos. Estes homens concentravam para fim era dar tratamento penal teoricamente diferenciado
si o pátrio poder, isto é, o poder do pai. Devido ao pátrio aos menores (na prática, eram tratados como criminosos
poder, o pai de família concentrava em suas mãos plena comuns). Em 1964 surge a Política Nacional do Bem-estar
possibilidade de gerir a vida das crianças e adolescentes do Menor (Lei nº 4.513/1964), que criou a FUNABEM. Surge
e estes não tinham nenhuma possibilidade de participar novo Código de Menores em 1979 (Lei nº 6.697), cujo ob-
destas decisões. Na Idade Média se manteve o sistema do jeto era a proteção e vigilância de crianças e adolescentes
“pátrio poder”. As crianças eram submetidas ao absoluto em situação irregular. Na década de 80 começa um mo-
poder do pai e seus destinos seguiam a mesma sorte. vimento de reelaboração da concepção de infância e ju-
A partir da Idade Moderna, com o Renascimento e o ventude. O destaque repercute na Constituição Federal de
Iluminismo, as crianças e os adolescentes saíram ligeira- 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990,
mente da margem social. A moral da época passa a impor que revogou o Código de Menores e substituiu a doutrina
aos pais o dever de educar seus filhos. Entretanto, a educa- da situação irregular pela doutrina da proteção integral4.
ção costumava ser oferecida apenas aos homens. Aqueles
4 DEZEM, Guilherme Madeira; AGUIRRE, João Ricardo Bran-
que possuíam melhores condições enviavam seus filhos dão; FULLER, Paulo Henrique Aranda. Estatuto da Criança e do Ado-
para estudarem nas universidades que começavam a des- lescente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. (Coleção Elementos
pontar na Europa, aqueles que possuíam condições piores do Direito)

20
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Relações jurídicas no direito da criança e nas Constituições); a suspensão da distinção clássica entre
do adolescente princípios e normas; o deslocamento dos princípios da es-
fera da jusfilosofia para o domínio da Ciência Jurídica; a
“As relações jurídicas são formas qualificadas de re- proclamação de sua normatividade; a perda de seu cará-
lações interpessoais, indicando, assim, a ligação entre ter de normas programáticas; o reconhecimento definitivo
pessoas, em razão de algum objeto, devidamente regu- de sua positividade e concretude por obra sobretudo das
lada pelo direito. Desta forma, o Direito da Criança e do Constituições; a distinção entre regras e princípios, como
Adolescente, sob o aspecto objetivo e formal, representa espécies diversificadas do gênero norma, e, finalmente, por
a disciplina das relações jurídicas entre Crianças e Adoles- expressão máxima de todo esse desdobramento doutriná-
centes, de um lado, e de outro, a família, a comunidade, a rio, o mais significativo de seus efeitos: a total hegemonia
sociedade e o próprio Estado. [...] Percebemos que a inten- e preeminência dos princípios7.
ção dos doutrinadores e do próprio legislador foi, sempre, No campo do direito da criança e do adolescente, al-
criar uma doutrina da proteção integral não somente para guns princípios assumem destaque, entre eles:
a Criança, como, ainda, para o Adolescente, ambos ainda a) Princípio da prioridade absoluta: previsto nos ar-
em desenvolvimento, posto que, somente com o término tigos 227, CF e 4º, ECA preconiza que é dever de todos –
da adolescência é que o menor completará o processo de Estado, sociedade, comunidade e família – assegurar com
aquisição de mecanismos mentais relacionados ao pensa- absoluta prioridade direitos fundamentais às crianças e
mento, percepção, reconhecimento, classificação etc. [...] adolescentes. Por isso, estabelece-se com primazia a ado-
Com isso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, sabia- ção de políticas públicas, a destinação de recursos e a pres-
mente, se preocupou em envolver não somente a família, tação de serviços essenciais àqueles que se encontram na
mas, ainda, a comunidade, a sociedade e o próprio Estado, faixa etária inferior a 18 anos.
para que todos, em conjunto, exerçam seus direitos e deve- b) Princípio da proteção integral: previsto no artigo
res sem oprimir aqueles que, em condição inferior, viviam 1º, ECA estabelece que a proteção da criança e do adoles-
a mercê da sociedade. Mas, qual a razão dessa inclusão tão cente não pode se restringir às situações de irregularidade,
o que teria um caráter estigmatizante, mas deve abranger
abrangente? Pois bem, a intenção do Estatuto da Criança
todas as situações de vida pelas quais passa a criança e o
e do Adolescente foi conferir ao menor, de forma integral,
adolescente, mesmo as regulares. Neste sentido, ao se as-
todas as condições para que o mesmo possa desenvolver-
segurar direitos na regularidade, evita-se que a criança e o
-se plenamente, evitando-se, com isso, que haja alguma
adolescente caiam em irregularidade.
deficiência em sua formação. Desta forma, a melhor solu-
c) Princípio da dignidade da pessoa humana: A dig-
ção apresentada pelo legislador foi incluir todos os seg-
nidade da pessoa humana é o valor-base de interpretação
mentos da sociedade, para que ninguém ficasse isento de
de qualquer sistema jurídico, internacional ou nacional,
qualquer responsabilidade, uma vez que a doutrina da pro- que possa se considerar compatível com os valores éticos,
teção integral apresentada pelo Estatuto da Criança e do notadamente da moral, da justiça e da democracia. Pensar
Adolescente exige a participação de todos, sem qualquer em dignidade da pessoa humana significa, acima de tudo,
exceção”5. Com efeito, o objeto formal do direito da criança colocar a pessoa humana como centro e norte para qual-
e do adolescente é a proteção jurídica especial da criança quer processo de interpretação jurídico, seja na elaboração
e do adolescente. Já o objeto material é a própria criança da norma, seja na sua aplicação.
ou adolescente. Sem pretender estabelecer uma definição fechada ou
plena, é possível conceituar dignidade da pessoa humana
Princípios como o principal valor do ordenamento ético e, por con-
sequência, jurídico que pretende colocar a pessoa humana
Não se pode olvidar que os princípios sempre desem- como um sujeito pleno de direitos e obrigações na or-
penharam um importante papel social, mas foi somente na dem internacional e nacional, cujo desrespeito acarreta a
atual dogmática jurídica que eles adquiriram normativida- própria exclusão de sua personalidade.
de. Hoje em dia, os princípios servem para condensar va- Aponta Barroso8: “o princípio da dignidade da pessoa
lores, dar unidade ao sistema e condicionar a atividade do humana identifica um espaço de integridade moral a ser
intérprete. Os princípios são normas jurídicas, não meros assegurado a todas as pessoas por sua só existência no
conteúdos axiológicos, aceitando aplicação autônoma6. mundo. É um respeito à criação, independente da crença
Em resumo, a teoria dos princípios chega à presente que se professe quanto à sua origem. A dignidade rela-
fase do Pós-positivismo com os seguintes resultados já ciona-se tanto com a liberdade e valores do espírito como
consolidados: a passagem dos princípios da especulação com as condições materiais de subsistência”.
metafísica e abstrata para o campo concreto e positivo do O Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, do
Direito, com baixíssimo teor de densidade normativa; a Tribunal Superior do Trabalho, trouxe interessante conceito
transição crucial da ordem jusprivatista (sua antiga inser- numa das decisões que relatou: “a dignidade consiste na
ção nos Códigos) para a órbita juspublicística (seu ingresso percepção intrínseca de cada ser humano a respeito dos
5 MENDES, Moacyr Pereira. As relações jurídicas decorrentes 7 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 26.
do Estatuto da Criança e do Adolescente. Âmbito Jurídico, Rio Grande, ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 294.
XII, n. 70, nov. 2009. 8 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da
6 Ibid., p.327. Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 382.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

direitos e obrigações, de modo a assegurar, sob o foco de g) Princípio da condição peculiar da pessoa em de-
condições existenciais mínimas, a participação saudável e senvolvimento: a criança e o adolescente estão em pro-
ativa nos destinos escolhidos, sem que isso importe des- cesso de formação e de transformação física e psíquica,
tilação dos valores soberanos da democracia e das liber- logo, possuem uma condição peculiar que deve ser respei-
dades individuais. O processo de valorização do indivíduo tada quando da aplicação da lei.
articula a promoção de escolhas, posturas e sonhos, sem
olvidar que o espectro de abrangência das liberdades in- Autonomia da criança e do adolescente
dividuais encontra limitação em outros direitos fundamen-
tais, tais como a honra, a vida privada, a intimidade, a ima-
Coloca-se o trecho do trabalho de Cláudio Leone12 em
gem. Sobreleva registrar que essas garantias, associadas ao
que reflete sobre a construção da autonomia do infante:
princípio da dignidade da pessoa humana, subsistem como
conquista da humanidade, razão pela qual auferiram pro- “Conceitualmente, a análise do respeito à autonomia
teção especial consistente em indenização por dano moral de uma criança ou de um adolescente só tem sentido se for
decorrente de sua violação”9. conduzida a partir do conhecimento da evolução de suas
Para Reale10, a evolução histórica demonstra o domínio competências nas diferentes idades. É de conhecimento
de um valor sobre o outro, ou seja, a existência de uma de todos que a criança nasce totalmente dependente de
ordem gradativa entre os valores; mas existem os valores cuidados alheios e que passa por um processo de desen-
fundamentais e os secundários, sendo que o valor fonte volvimento progressivo que a leva a alcançar a completa
é o da pessoa humana. Nesse sentido, são os dizeres de independência na maturidade, o que, nas sociedades mo-
Reale11: “partimos dessa ideia, a nosso ver básica, de que a dernas, se situa por volta dos vinte anos de idade.
pessoa humana é o valor-fonte de todos os valores. O ho- Entretanto, para que este processo de análise de sua
mem, como ser natural biopsíquico, é apenas um indivíduo autonomia transcorra de maneira isenta, fundamentalmen-
entre outros indivíduos, um ente animal entre os demais te centrado nas peculiaridades do desenvolvimento do ser
da mesma espécie. O homem, considerado na sua objeti- humano, o primeiro ponto a ser considerado é a necessida-
vidade espiritual, enquanto ser que só realiza no sentido de de abdicar de alguns conceitos preestabelecidos, como
de seu dever ser, é o que chamamos de pessoa. Só o ho- é o caso da atitude paternalista. [...]
mem possui a dignidade originária de ser enquanto deve O segundo ponto a considerar neste percurso, em ge-
ser, pondo-se essencialmente como razão determinante
ral decorrente do primeiro, é a própria legislação que, mes-
do processo histórico”.
Quando a Constituição Federal assegura a dignidade mo tendo o melhor dos intuitos, praticamente nivela todos
da pessoa humana como um dos fundamentos da Repúbli- os menores a uma mesma condição: a de incapacidade,
ca, faz emergir uma nova concepção de proteção de cada criando a necessidade de se ter figuras aptas a decidir e
membro do seu povo. Tal ideologia de forte fulcro huma- responder por eles, como se estas figuras fossem sempre e
nista guia a afirmação de todos os direitos fundamentais inevitavelmente imbuídas das melhores intenções em rela-
e confere a eles posição hierárquica superior às normas ção à criança e ao adolescente.
organizacionais do Estado, de modo que é o Estado que No entender de Kopelman, para que toda esta legisla-
está para o povo, devendo garantir a dignidade de seus ção fosse realmente válida seria necessário definir melhor,
membros, e não o inverso. de maneira bem precisa, o que se entende por um padrão
d) Princípio da participação popular: previsto no ar- mínimo de benefício ou o que é ‘o melhor’ para os interes-
tigo 227, §§ 3º e 7º e no artigo 204, II, CF, assegura a par- ses da criança ou do adolescente, de modo que a definição
ticipação popular, através de organizações representativas, não fique em aberto para a interpretação de quem detém
na elaboração de políticas públicas direcionadas à infância o poder de decidir em nome deles. Além disso, estas defi-
e à juventude. nições deveriam estar em constante revisão, para que não
e) Princípio da excepcionalidade: previsto no artigo acabem sendo ultrapassadas, frente à evolução histórico-
227, §3º, V, CF assegura que quando da imposição de me- -social dos fatos que geraram a necessidade de sua criação.
dida privativa de liberdade esta não será imposta a não
Superados estes dois pontos, que apesar de potencial-
ser que se trate de um caso excepcional, em que nenhuma
mente limitantes do processo de discussão da autonomia
outra medida sócio-educativa possa ser utilizada.
f) Princípio da brevidade: previsto no artigo 227, §3º, da criança e do adolescente não podem ser simplesmente
V, CF assegura que quando da aplicação de medida privati- ignorados, como se não existissem, chega-se ao terceiro e
va de liberdade esta não se estenderá no tempo, devendo mais importante: a interpretação do conceito de autono-
ser a mais breve possível, perdurando apenas pelo prazo mia à luz do momento de desenvolvimento em que uma
necessário para a ressocialização do adolescente. No caso, determinada criança ou adolescente se encontra.
o ECA limita a aplicação de medidas desta natureza ao pra- Nesse sentido, diversas características do desenvolvi-
zo máximo de 3 anos. mento devem ser levadas em consideração:
1. Trata-se de um processo que evolui continuamente
9 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista à medida que habilidades se aperfeiçoam, novas capaci-
n. 259300-59.2007.5.02.0202. Relator: Alberto Luiz Bresciani de Fon- dades são adquiridas, novas vivências são acumuladas e
tan Pereira. Brasília, 05 de setembro de 2012j1. Disponível em: www.
integradas e, portanto, passível de rápidas e extremas mu-
tst.gov.br. Acesso em: 17 nov. 2012.
10 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 19. ed. São Paulo: Sa-
danças no tempo;
raiva, 2002, p. 228. 12 LEONE, Cláudio. A criança, o adolescente e a autonomia.
11 Ibid., p. 220. Revista Bioética, v. 6, n. 1.

22
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

2. A aquisição das competências é progressiva, não se servirá de embasamento para um trabalho, muitas vezes
dá saltos, como se se tratasse de compartimentos estan- exaustivo, de apresentação, de reflexão e de discussão de
ques, e segue sempre uma ordem preestabelecida, sendo, argumentos e fatos, capaz de conduzir a uma decisão ama-
portanto, razoavelmente previsível; durecida e o mais isenta possível, que, respeitando a po-
3. Os tempos e o ritmo em que o desenvolvimento se sição da criança ou do adolescente, poderá efetivamente
processa são muito individualizados, fazendo com que dois redundar em seu benefício.
indivíduos de uma mesma idade possam estar em momen- No leque das diferentes situações da prática pediá-
tos diferentes de desenvolvimento; trica, que se estende desde o recém-nascido no limite de
4. No caso específico da inteligência, o desenvolvimen- viabilidade ao qual se quer prestar cuidados intensivos de
to é extremamente influenciável por fatores extrínsecos ao validade questionável naquelas circunstâncias, passando
indivíduo: as experiências, os estímulos, o ambiente, a edu- pelas pesquisas científicas que envolvem crianças e ado-
cação, a cultura, etc., o que também acaba por reforçar sua lescentes, até a criança cujo pátrio poder pertence a pais
adolescentes, portanto autônomos nas decisões que lhes
evolução extremamente individualizada.
dizem respeito, todas estas situações, onde nem sempre o
Segundo Piaget, a capacidade de operar o pensamen-
real interesse que está em jogo é o da criança, mas sim o
to concreto estendendo-o à compreensão do outro e às
dos responsáveis por ela, clarificam que não há uma única
possíveis consequências de boa parte dos seus atos se resposta ou solução mágica, perfeita, para a questão da
aperfeiçoa na idade escolar, entre os 6 e os 11 anos de vida. autonomia da criança e do adolescente.
Este amadurecimento se completa na adolescência, com a Na realidade, o que deve existir é a construção conjun-
capacidade crescente de abstração que a criança desenvol- ta de uma verdade para aquele momento, amadurecida no
ve nesta fase da existência. Como consequência, é possível crescimento e evolução de todos: juízes e legisladores, pais
admitir que é na segunda fase da adolescência, em geral a ou responsáveis, médicos e profissionais de saúde e, prin-
partir dos 15 anos, que o indivíduo atingiria as competên- cipalmente, a criança ou o adolescente, como parte de um
cias necessárias para o exercício de sua autonomia, com- processo de interação franco, sincero, isento e realmente
petências estas que necessitariam apenas serem lapidadas participativo que de fato respeite a autonomia, qualquer
ao longo das vivências e de uma maior experiência de vida. que seja o nível de competência que a criança ou o adoles-
Entretanto, isto não significa que a autonomia da crian- cente estejam apresentando para tal”.
ça e do adolescente só possa (ou deva) ser respeitada a
partir desta fase. Imputabilidade penal
Compete ao pediatra e aos demais profissionais de
saúde, utilizando suas competências profissionais, definir Art. 228, CF. São penalmente inimputáveis os menores
já desde os primeiros anos de vida em que etapa a criança de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
se encontra ao longo do seu processo evolutivo, tentando
diferenciar se se está diante de uma tomada de decisão O artigo 228, CF dispõe: “são penalmente inimputáveis
ditada apenas pelo receio do desconhecido, por um capri- os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legis-
cho ou vontade decorrente apenas de sua visão egocên- lação especial”. Percebe-se que a normativa não está no
trica, natural em determinadas idades, ou se a mesma já é rol de cláusulas pétreas, razão pela qual seria possível uma
o resultado de uma reflexão mais amadurecida. São estes emenda constitucional que alterasse a menoridade penal.
extremos que dão a entender a ampla gama de estágios de Inclusive, há projetos de lei neste sentido.
desenvolvimento, portanto de autonomia, que entre eles
Comentários à lei
podem se apresentar. [...]
Novamente, cabe enfatizar que o risco que se corre ao
Parte geral
se utilizar definições bastante precisas como estas é o de
acabar classificando um indivíduo de maneira dicotômica, Título I
no caso específico da autonomia, como sendo capaz ou Das Disposições Preliminares
incapaz, desistindo assim de uma possível análise de sua
real capacidade. Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à
Consequentemente, a ausência de uma ou de mais das criança e ao adolescente.
características anteriormente citadas não deve ser utilizada O princípio da proteção integral se associa ao princípio
para qualificar a criança ou o adolescente como incapaz. da prioridade absoluta, colacionado no artigo 4º do ECA
Deve, isto sim, servir de embasamento para que se possa e no artigo 227, CF. “Com a positivação desse princípio
tentar entender como suas decisões se originaram. tem-se também a positivação da proteção integral, que se
Em face de situações específicas, individualizadas, opõe à antiga e superada doutrina da situação irregular,
como ocorre no dia-a-dia da prática pediátrica, esta é a que era prevista no antigo Código de Menores e espe-
única forma que o profissional tem de realmente respeitar cificava que sua incidência se restringia aos menores em
a autonomia da criança ou do adolescente. situação irregular, apresentando um conjunto de normas
A interpretação adequada da legislação e o dimen- destinadas ao tratamento e prevenção dessas situações”13.
sionamento correto da decisão dos pais ou responsáveis
13 DEZEM, Guilherme Madeira; AGUIRRE, João Ricardo Bran-
dependerão fundamentalmente deste tipo de análise da dão; FULLER, Paulo Henrique Aranda. Estatuto da Criança e do Ado-
autonomia da criança ou adolescente. Deste modo, mes- lescente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. (Coleção Elementos
mo que resulte em situações de conflito entre as posições, do Direito)

23
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Basicamente, tinha-se na doutrina da situação irregu- no que se refere ao Estado, mostra-se essencial que ele
lar que era necessário disciplinar um estatuto jurídico da desenvolve políticas públicas adequadas em respeito à pe-
criança e do adolescente que apenas abordasse situações culiar condição do infante.
em que ele estivesse irregular, seja por uma desproteção, “O Direito da Criança e do Adolescente deve ter con-
como no caso de abandono, ou pela violação da lei, como dições suficientemente próprias de promoção e concreti-
nos casos de atos infracionais. zação de direitos. Para isso deve-se desvencilhar do dog-
Entretanto, o direito evoluiu e passou a contemplar matismo e do mero positivismo jurídico acrítico. O Direito
uma noção de proteção mais ampla da criança e do ado- da Criança e do Adolescente enquanto ramo autônomo
lescente, que não apenas abordasse situações de irregula- do direito é responsável por ressignificar a atuação estatal,
ridade (embora ainda o fizesse), mas que abrangesse todo principalmente no campo das políticas públicas e impõe
o arcabouço jurídico protetivo da criança e do adolescente. corresponsabilidades compartilhadas”14.
Vale ressaltar que às crianças e aos adolescentes são
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a garantidos os mesmos direitos fundamentais que aos
pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente adultos, entretanto, o ECA aprofunda alguns direitos fun-
aquela entre doze e dezoito anos de idade. damentais em espécie, abordando-os na vertente da con-
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se dição especial dos que pertencem a este grupo.
excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e As crianças e adolescentes gozam de igualdade de di-
vinte e um anos de idade. reitos em relação às demais pessoas, podendo usufruir de
O Estatuto da Criança e do Adolescente opta por cate- todos eles. O próprio estatuto contempla em seu título II
gorizar separadamente estas duas categorias de menores. os direitos fundamentais da criança e do adolescente, entre
Criança é aquele que tem até 12 anos de idade (na data eles incluindo-se: vida, saúde, liberdade, respeito, dignida-
de aniversário de 12 anos, passa a ser adolescente), ado- de, convivência familiar e comunitária, educação, cultura,
lescente é aquele que tem entre 12 e 18 anos (na data de esporte, lazer, profissionalização e proteção no trabalho.
aniversário de 18 anos, passa a ser maior). Em situações Não se trata de rol taxativo de direitos fundamentais ga-
rantidos à criança e ao adolescente, eis que ele possui to-
excepcionais o ECA se aplica ao maior de 18 anos, até os
dos os direitos humanos e fundamentais que as demais
21 anos de idade, por exemplo, no caso do menor infrator
pessoas. O título II do ECA tem por objetivo aprofundar
sujeito a internação em fundação CASA que tenha 17 anos
especificidades acerca de algumas das categorias de direi-
e 11 meses na data do ato infracional poderá ficar detido
tos fundamentais assegurados à criança e ao adolescente.
até o limite de seus 20 anos e 11 meses (eis que 3 anos é o
Deste artigo 3º do ECA é possível, ainda, extrair o des-
tempo máximo de internação).
taque ao princípio da igualdade, no sentido de que há ple-
na igualdade na garantia de direitos entre todas as crian-
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os di- ças e adolescentes, não sendo permitido qualquer tipo de
reitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem discriminação.
prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegu-
rando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as opor- A leitura dos artigos 4º e 5º, em conjunto com outros
tunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desen- dispositivos do ECA, por sua vez, permite detectar a pre-
volvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em sença de um tríplice sistema de garantias.
condições de liberdade e de dignidade. Assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente adota
Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei apli- uma estrutura que contempla três sistemas de garantia –
cam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discrimi- primário, secundário e terciário.
nação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, a) Sistema primário – artigos 4º e 87, ECA – aborda po-
etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal líticas públicas de atendimento de crianças e adolescentes.
de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica,
ambiente social, região e local de moradia ou outra condição Art. 4º É dever da família, da comunidade, da socie-
que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em dade em geral e do poder público assegurar, com abso-
que vivem. luta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida,
O artigo 3º volta-se à concretização dos direitos da à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
criança e do adolescente. Concretização significa viabiliza- à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
ção prática, consecução real dos fins que a lei descreve. liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Como se percebe pela leitura até o momento, o legislador Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
brasileiro preocupou-se em elaborar uma legislação cujo a) primazia de receber proteção e socorro em quais-
objetivo é concretizar estes direitos da criança e do adoles- quer circunstâncias;
cente. Entretanto, a lei é apenas uma carta de intenções. É b) precedência de atendimento nos serviços públicos
necessário colocar seu conteúdo em prática, porque sozi- ou de relevância pública;
nha ela nada faz. c) preferência na formulação e na execução das po-
A implementação na prática dos direitos da criança e líticas sociais públicas;
do adolescente depende da adoção de posturas por parte d) destinação privilegiada de recursos públicos nas
de todos aqueles colocados como responsáveis para tanto: áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Estado, sociedade, comunidade e família. Especificamente 14 http://t.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=2236

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

O artigo 4º do ECA colaciona em seu caput teor idênti- b) Sistema secundário – artigos 98 e 101, ECA – abor-
co ao do caput do artigo 227, CF, onde se encontra uma das da as medidas de proteção destinadas à criança e ao ado-
principais diretrizes do direito da criança e do adolescente lescente em situação de risco pessoal ou social.
que é o princípio da prioridade absoluta. Significa que cada Obs.: as medidas de proteção são estudadas adiante
criança e adolescente deve receber tratamento especial do neste material.
Estado e ser priorizado em suas políticas públicas, pois são c) Sistema terciário – artigo 112, ECA – aborda as
o futuro do país e as bases de construção da sociedade. medidas socioeducativas, destinadas à responsabilização
Explica Liberati15: “Por absoluta prioridade, devemos penal do adolescente infrator, isto é, àquele entre 12 e 18
entender que a criança e o adolescente deverão estar em anos que comete atos infracionais.
primeiro lugar na escala de preocupação dos governantes; Obs.: as medidas socioeducativas são estudadas adian-
devemos entender que, primeiro, devem ser atendidas to- te neste material.
das as necessidades das crianças e adolescentes [...]. Por O sistema tríplice deve operar de forma harmônica,
absoluta prioridade, entende-se que, na área administra- com o acionamento gradual de cada um deles. Nas situa-
tiva, enquanto não existirem creches, escolas, postos de ções em que a criança ou adolescente escape ao sistema
saúde, atendimento preventivo e emergencial às gestantes primário de prevenção, ou seja, nos casos de ineficácia das
dignas moradias e trabalho, não se deveria asfaltar ruas, políticas públicas específicas, deve ser acionado o sistema
construir praças, sambódromos monumentos artísticos secundário, operado predominantemente pelo Conselho
etc., porque a vida, a saúde, o lar, a prevenção de doenças Tutelas. Por sua vez, em casos extremos, é necessário partir
são importantes que as obras de concreto que ficam par a para a adoção de medidas socioeducativas, operadas pre-
demonstrar o poder do governante”. dominantemente pelo Ministério Público e pelo Judiciário.
O parágrafo único do artigo 4º especifica a abrangência
da absoluta prioridade, esclarecendo que é necessário con- Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de
ferir atendimento prioritário às crianças e aos adolescentes qualquer forma de negligência, discriminação, explora-
diante de situações de perigo e risco (como no salvamento ção, violência, crueldade e opressão, punido na forma da
lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
em incêndios e enchentes, etc.), bem como nos serviços
fundamentais.
públicos em geral (chegada aos hospitais, por exemplo).
O artigo 5º ressalta o verdadeiro objetivo geral do ECA:
Além disso, devem ser priorizadas políticas públicas que
proteger a criança de qualquer forma de negligência, dis-
favoreçam a criança e o adolescente e também devem ser
criminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
reservados recursos próprios prioritariamente a eles.
Neste sentido, coloca-se a possibilidade de responsabiliza-
ção de todos que atentarem contra esse propósito. A res-
Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:
ponsabilização poderá se dar em qualquer uma das três es-
I - políticas sociais básicas; feras, isolada ou cumulativamente: penal, respondendo por
II - serviços, programas, projetos e benefícios de as- crimes e contravenções penais todo aquele que praticá-lo
sistência social de garantia de proteção social e de preven- contra criança e adolescente, bem como respondendo por
ção e redução de violações de direitos, seus agravamentos atos infracionais as crianças e adolescentes que atentarem
ou reincidências; um contra o outro; civil, estabelecendo-se o dever de inde-
III - serviços especiais de prevenção e atendimento nizar por danos causados a crianças e a adolescentes, que
médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tra- se estende a toda e qualquer pessoa física ou jurídica que
tos, exploração, abuso, crueldade e opressão; o faça, inclusive o próprio Estado; e administrativa, impon-
IV - serviço de identificação e localização de pais, do-se penas disciplinares a funcionários sujeitos a regime
responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; jurídico administrativo em trabalhos privados ou em car-
V - proteção jurídico-social por entidades de defesa gos, empregos e funções públicos.
dos direitos da criança e do adolescente.
VI - políticas e programas destinados a prevenir ou Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta
abreviar o período de afastamento do convívio familiar os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem
e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a
familiar de crianças e adolescentes; condição peculiar da criança e do adolescente como pes-
VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob soas em desenvolvimento.
forma de guarda de crianças e adolescentes afastados do
convívio familiar e à adoção, especificamente inter-racial, de É pacífico que o processo de interpretação hoje faz
crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades espe- parte do Direito, principalmente se considerada a constan-
cíficas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos.  te evolução da sociedade, demandando diariamente por
O artigo 87 descreve linhas de ação na política de novos modos de aplicação das normas. Como a sociedade
atendimento, que compõem a delimitação do princípio da é dinâmica e o Direito existe para servi-la, cabe a ele ade-
prioridade absoluta na vertente da priorização na adoção quar-se às novas exigências sociais, aplicando-se da ma-
de políticas públicas e na delimitação de recursos financei- neira mais justa à vasta gama de casos concretos. Sobre a
ros para execução de tais políticas. interpretação, explica Gonçalves16: “Quando o fato é típico
15 LIBERATI, Wilson Donizeti. O Estatuto da Criança e do 16 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 9. ed.
Adolescente: Comentários. São Paulo: IBPS. São Paulo: Saraiva, 2011, v. 1.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

e se enquadra perfeitamente no conceito abstrato da nor- § 1º O atendimento pré-natal será realizado por pro-
ma, dá-se o fenômeno da subsunção. Há casos, no entanto, fissionais da atenção primária.
em que tal enquadramento não ocorre, não encontrando o § 2º Os profissionais de saúde de referência da gestan-
juiz nenhuma norma aplicável à hipótese sub judice. Deve, te garantirão sua vinculação, no último trimestre da ges-
então, proceder à integração normativa, mediante o em- tação, ao estabelecimento em que será realizado o parto,
prego da analogia, dos costumes e dos princípios gerais do garantido o direito de opção da mulher.
direito. [...] Para verificar se a norma é aplicável ao caso em § 3º Os serviços de saúde onde o parto for realizado
julgamento (subsunção) ou se deve proceder à integração assegurarão às mulheres e aos seus filhos recém-nascidos
normativa, o juiz procura descobrir o sentido da norma, in- alta hospitalar responsável e contrarreferência na atenção
terpretando-a. Interpretar é descobrir o sentido e o alcance primária, bem como o acesso a outros serviços e a grupos
da norma jurídica”. de apoio à amamentação.
A hermenêutica possui 3 categorias de métodos. § 4º Incumbe ao poder público proporcionar assis-
Quanto às fontes ou origem, a interpretação pode ser tência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e
autêntica ou legislativa, jurisprudencial ou judicial e dou- pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as
trinária. Quanto aos meios, pode ser gramatical ou literal, consequências do estado puerperal.
examinando o texto normativo linguísticamente; lógica ou § 5º A assistência referida no § 4º deste artigo deverá
racional, apurando o sentido e a finalidade da norma; sis- ser prestada também a gestantes e mães que manifestem
temática, analisando a lei de maneira comparativa com ou- interesse em entregar seus filhos para adoção, bem como
tras leis pertencentes à mesma província do Direito (livro, a gestantes e mães que se encontrem em situação de pri-
título, capítulo, seção, parágrafo); histórica, baseando-se vação de liberdade.
na verificação dos antecedentes do processo legislativo; § 6º A gestante e a parturiente têm direito a 1 (um)
sociológica, adaptando o sentido ou finalidade da nor- acompanhante de sua preferência durante o período do
ma às novas exigências sociais (artigo 5°, LINDB). Quanto pré-natal, do trabalho de parto e do pós-parto imediato.
aos resultados pode ser declarativa, quando o texto legal § 7º A gestante deverá receber orientação sobre alei-
corresponde ao pensamento do legislador; extensiva ou tamento materno, alimentação complementar saudável e
ampliativa, quando o alcance da lei é mais amplo que o in- crescimento e desenvolvimento infantil, bem como sobre
dicado pelo seu texto; e restritiva, na qual se limita o cam- formas de favorecer a criação de vínculos afetivos e de es-
po de aplicação da lei. Nenhum destes métodos se opera timular o desenvolvimento integral da criança.
isoladamente17. § 8º A gestante tem direito a acompanhamento sau-
O artigo 6º do ECA, tal como o artigo 5º da LINDB, ex- dável durante toda a gestação e a parto natural cuidadoso,
pressa o método de interpretação sociológico, chamando estabelecendo-se a aplicação de cesariana e outras inter-
atenção à interpretação da lei levando em conta os seus venções cirúrgicas por motivos médicos.
fins sociais, as exigências do bem comum, os direitos e de- § 9º A atenção primária à saúde fará a busca ativa da
veres individuais e coletivos, e vai além: exige que se leve gestante que não iniciar ou que abandonar as consultas de
em conta a condição peculiar da criança e do adolescente. pré-natal, bem como da puérpera que não comparecer às
Logo, ao se interpretar o ECA não se pode nunca perder de consultas pós-parto.
vista que o seu objeto material, a criança e o adolescente, é § 10. Incumbe ao poder público garantir, à gestante e
extremamente peculiar, dotado de especificidades as quais à mulher com filho na primeira infância que se encontrem
sempre se deve atentar. sob custódia em unidade de privação de liberdade, am-
biência que atenda às normas sanitárias e assistenciais do
Título II Sistema Único de Saúde para o acolhimento do filho, em
Dos Direitos Fundamentais articulação com o sistema de ensino competente, visando
ao desenvolvimento integral da criança.
Capítulo I
Do Direito à Vida e à Saúde Art. 9º O poder público, as instituições e os emprega-
dores propiciarão condições adequadas ao aleitamento
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a me-
à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais dida privativa de liberdade.
públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimen- § 1º Os profissionais das unidades primárias de saúde
to sadio e harmonioso, em condições dignas de existência. desenvolverão ações sistemáticas, individuais ou coletivas,
visando ao planejamento, à implementação e à avaliação
Art. 8º É assegurado a todas as mulheres o acesso aos de ações de promoção, proteção e apoio ao aleitamento
programas e às políticas de saúde da mulher e de pla- materno e à alimentação complementar saudável, de for-
nejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequa- ma contínua.
da, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpé- § 2º Os serviços de unidades de terapia intensiva neo-
rio e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral natal deverão dispor de banco de leite humano ou unidade
no âmbito do Sistema Único de Saúde. de coleta de leite humano.
17 Ibid.

26
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de § 2º Os serviços de saúde em suas diferentes portas de
atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são entrada, os serviços de assistência social em seu compo-
obrigados a: nente especializado, o Centro de Referência Especializado
I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de Assistência Social (Creas) e os demais órgãos do Siste-
de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos; ma de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente
II - identificar o recém-nascido mediante o registro deverão conferir máxima prioridade ao atendimento das
de sua impressão plantar e digital e da impressão digital crianças na faixa etária da primeira infância com suspeita
da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela ou confirmação de violência de qualquer natureza, formu-
autoridade administrativa competente; lando projeto terapêutico singular que inclua intervenção
III - proceder a exames visando ao diagnóstico e tera- em rede e, se necessário, acompanhamento domiciliar.
pêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nasci-
do, bem como prestar orientação aos pais; Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá progra-
mas de assistência médica e odontológica para a pre-
IV - fornecer declaração de nascimento onde constem
venção das enfermidades que ordinariamente afetam a po-
necessariamente as intercorrências do parto e do desenvol-
pulação infantil, e campanhas de educação sanitária para
vimento do neonato;
pais, educadores e alunos.
V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neo-
§ 1º É obrigatória a vacinação das crianças nos casos
nato a permanência junto à mãe. recomendados pelas autoridades sanitárias.
VI - acompanhar a prática do processo de amamen- § 2º O Sistema Único de Saúde promoverá a atenção à
tação, prestando orientações quanto à técnica adequada, saúde bucal das crianças e das gestantes, de forma trans-
enquanto a mãe permanecer na unidade hospitalar, utili- versal, integral e intersetorial com as demais linhas de cui-
zando o corpo técnico já existente. dado direcionadas à mulher e à criança.
§ 3º A atenção odontológica à criança terá função
Art. 11. É assegurado acesso integral às linhas de educativa protetiva e será prestada, inicialmente, antes de
cuidado voltadas à saúde da criança e do adolescen- o bebê nascer, por meio de aconselhamento pré-natal, e,
te, por intermédio do Sistema Único de Saúde, observado posteriormente, no sexto e no décimo segundo anos de vida,
o princípio da equidade no acesso a ações e serviços para com orientações sobre saúde bucal.
promoção, proteção e recuperação da saúde. § 4º A criança com necessidade de cuidados odontoló-
§ 1º A criança e o adolescente com deficiência serão gicos especiais será atendida pelo Sistema Único de Saúde.
atendidos, sem discriminação ou segregação, em suas § 5º É obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos
necessidades gerais de saúde e específicas de habilitação e seus primeiros dezoito meses de vida, de protocolo ou ou-
reabilitação. tro instrumento construído com a finalidade de facilitar a
§ 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamen- detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da
te, àqueles que necessitarem, medicamentos, órteses, criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico.
próteses e outras tecnologias assistivas relativas ao tra-
tamento, habilitação ou reabilitação para crianças e adoles- Capítulo II
centes, de acordo com as linhas de cuidado voltadas às suas Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade
necessidades específicas.
§ 3º Os profissionais que atuam no cuidado diário ou Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberda-
frequente de crianças na primeira infância receberão for- de, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em
processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis,
mação específica e permanente para a detecção de sinais
humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
de risco para o desenvolvimento psíquico, bem como para
Entre os direitos fundamentais garantidos à criança e
o acompanhamento que se fizer necessário.
ao adolescente que são especificados e aprofundados no
ECA estão os direitos à liberdade, ao respeito e à dignidade.
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde,
inclusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de cui- Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes
dados intermediários, deverão proporcionar condições para aspectos:
a permanência em tempo integral de um dos pais ou res- I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços
ponsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II - opinião e expressão;
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de cas- III - crença e culto religioso;
tigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigato- V - participar da vida familiar e comunitária, sem
riamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva discriminação;
localidade, sem prejuízo de outras providências legais. VI - participar da vida política, na forma da lei;
§ 1º As gestantes ou mães que manifestem interesse VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamen- O artigo 16 aborda diversas facetas do direito de liber-
te encaminhadas, sem constrangimento, à Justiça da Infân- dade: locomoção, opinião e expressão, religiosa e política.
cia e da Juventude. Cria, ainda, duas facetes específicas deste direito: liberdade

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

para brincar e divertir-se e liberdade para buscar refúgio, Os artigos 18-A e 18-B foram incluídos no ECA pela Lei
auxílio e orientação, processos estes essenciais para o de- nº 13.010, de 26 de junho de 2014, que estabelece o direito
senvolvimento do infante. da criança e do adolescente de serem educados e cuidados
sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou de-
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilida- gradante. Também ficou conhecida como “Lei do Menino
de da integridade física, psíquica e moral da criança e Bernardo”18 e “Lei da Palmada”.
do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da Em que pesem as aparentes boas intenções da lei no
identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos sentido de evitar situações extremas como a do menino
espaços e objetos pessoais. Bernardo, assassinado após incontáveis ameaças e agres-
sões físicas por parte de seus responsáveis, seu conteúdo
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da é bastante criticado. Afinal, é claro que a lei coloca todo e
criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer qualquer tipo de agressão física no mesmo patamar. Con-
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexató-
siderado o teor da lei, mesmo uma palmada numa criança
rio ou constrangedor.
é proibida.
Os direitos ao respeito e à dignidade abrangem a pro-
Os críticos da “Lei da Palmada” apontam que ela adota
teção da criança e do adolescente em todas facetas de sua
integridade: física, psíquica e moral. uma posição extrema e impõe uma indevida intervenção
do Estado nos ambientes familiares, retirando o poder dis-
Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ciplinar garantido aos pais na educação de seus filhos.
ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou Os defensores da “Lei da Palmada” utilizam estudos de
de tratamento cruel ou degradante, como formas de cor- psicólogos e educadores para argumentar que não é ne-
reção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, cessário utilizar qualquer tipo de agressão física, mesmo a
pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos res- mais leve, para educar uma criança.
ponsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas so-
cioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar Capítulo III
deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los. Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária
Parágrafo único.  Para os fins desta Lei, considera-se:
I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou pu- Seção I
nitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança Disposições Gerais
ou o adolescente que resulte em: 
a) sofrimento físico; ou Quando se aborda o direito à convivência familiar e
b) lesão; comunitária no ECA confere-se destaque à distinção entre
II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou for- família natural e substituta e aos procedimentos que carac-
ma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adoles- terizam a inserção e a retirada da criança e do adolescente
cente que: destes ambientes.
a) humilhe; ou
b) ameace gravemente; ou Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser
c) ridicularize. criado e educado no seio de sua família e, excepcional-
mente, em família substituta, assegurada a convivência
Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada, os familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desen-
responsáveis, os agentes públicos executores de medidas so-
volvimento integral.
cioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de cuidar
§ 1o Toda criança ou adolescente que estiver inserido em
de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou pro-
programa de acolhimento familiar ou institucional terá
tegê-los que utilizarem castigo físico ou tratamento cruel ou
degradante como formas de correção, disciplina, educação sua situação reavaliada, no máximo, a cada 3 (três) me-
ou qualquer outro pretexto estarão sujeitos, sem prejuízo de ses, devendo a autoridade judiciária competente, com base
outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão em relatório elaborado por equipe interprofissional ou
aplicadas de acordo com a gravidade do caso: multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela pos-
I - encaminhamento a programa oficial ou comunitá- sibilidade de reintegração familiar ou pela colocação em
rio de proteção à família; família substituta, em quaisquer das modalidades previs-
II - encaminhamento a tratamento psicológico ou tas no art. 28 desta Lei.
psiquiátrico; § 2o A permanência da criança e do adolescente em pro-
III - encaminhamento a cursos ou programas de grama de acolhimento institucional não se prolongará por
orientação; mais de 18 (dezoito meses), salvo comprovada necessida-
IV - obrigação de encaminhar a criança a tratamento de que atenda ao seu superior interesse, devidamente funda-
especializado; mentada pela autoridade judiciária.
V - advertência.
Parágrafo único.  As medidas previstas neste artigo se- 18 O nome da lei é uma homenagem ao menino Bernardo
Boldrini, morto em abril de 2014, aos 11 anos, em Três Passos (RS). Os
rão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras
acusados são o pai e a madrasta do menino, com ajuda de uma amiga
providências legais.  e do irmão dela. Segundo as investigações, Bernardo procurou ajuda
para denunciar as ameaças que sofria.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 3º A manutenção ou a reintegração de criança ou § 8o Na hipótese de desistência pelos genitores - ma-


adolescente à sua família terá preferência em relação a nifestada em audiência ou perante a equipe interprofissional
qualquer outra providência, caso em que será esta incluí- - da entrega da criança após o nascimento, a criança será
da em serviços e programas de proteção, apoio e promoção, mantida com os genitores, e será determinado pela Justiça
nos termos do § 1o do art. 23, dos incisos I e IV do caput do da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar
art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei.  pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.
§ 4º Será garantida a convivência da criança e do § 9o É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nas-
adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, cimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei.
por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável § 10. (VETADO).
ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade O artigo 19-A trata do procedimento aplicável nos
responsável, independentemente de autorização judicial. casos em que a família biológica pretenda entregar re-
§ 5o Será garantida a convivência integral da crian- cém-nascido para adoção, assegurando-se o acompanha-
ça com a mãe adolescente que estiver em acolhimento mento por equipe multidisciplinar e também a tomada de
institucional. providências de busca de pessoa da família extensa apta a
§ 6o A mãe adolescente será assistida por equipe espe- assumir o encargo.
cializada multidisciplinar.
Como se depreende do artigo 19, a família natural é Art. 19-B. A criança e o adolescente em programa de
a regra e a família substituta é a exceção. A criança e o acolhimento institucional ou familiar poderão participar de
adolescente podem ser inseridos em programa de acolhi- programa de apadrinhamento.
mento familiar ou institucional, pelo limite temporal de 18 § 1o O apadrinhamento consiste em estabelecer e propor-
meses, cujo caráter é o de permitir a sua retirada de poten- cionar à criança e ao adolescente vínculos externos à ins-
cial ou efetiva situação de risco. Durante este programa, tituição para fins de convivência familiar e comunitária
reavaliado a cada 3 meses, se verificará se é possível a rein- e colaboração com o seu desenvolvimento nos aspectos
serção no ambiente da família natural (o que é preferencial) social, moral, físico, cognitivo, educacional e financeiro.
ou se é o caso de colocação definitiva em família substituta. § 2o (VETADO).
§ 3o Pessoas jurídicas podem apadrinhar criança ou
Art. 19-A. A gestante ou mãe que manifeste interesse adolescente a fim de colaborar para o seu desenvolvimento.
em entregar seu filho para adoção, antes ou logo após § 4o O perfil da criança ou do adolescente a ser apa-
o nascimento, será encaminhada à Justiça da Infância e drinhado será definido no âmbito de cada programa de
da Juventude. apadrinhamento, com prioridade para crianças ou ado-
§ 1o A gestante ou mãe será ouvida pela equipe in- lescentes com remota possibilidade de reinserção familiar
terprofissional da Justiça da Infância e da Juventude, que ou colocação em família adotiva.
apresentará relatório à autoridade judiciária, conside- § 5o Os programas ou serviços de apadrinhamento
rando inclusive os eventuais efeitos do estado gestacional apoiados pela Justiça da Infância e da Juventude poderão
e puerperal. ser executados por órgãos públicos ou por organizações
§ 2o De posse do relatório, a autoridade judiciária po- da sociedade civil.
derá determinar o encaminhamento da gestante ou mãe, § 6o Se ocorrer violação das regras de apadrinhamen-
mediante sua expressa concordância, à rede pública de saúde to, os responsáveis pelo programa e pelos serviços de aco-
e assistência social para atendimento especializado. lhimento deverão imediatamente notificar a autoridade
§ 3o A busca à família extensa, conforme definida nos judiciária competente.
termos do parágrafo único do art. 25 desta Lei, respeitará Os programas de apadrinhamento visam permitir a
o prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogável por convivência comunitária da criança e do adolescente que
igual período. estão no sistema de adoção, especialmente com relação
§ 4o Na hipótese de não haver a indicação do genitor àqueles que dificilmente sairão dele.
e de não existir outro representante da família extensa
apto a receber a guarda, a autoridade judiciária competente Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casa-
deverá decretar a extinção do poder familiar e determinar mento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qua-
a colocação da criança sob a guarda provisória de quem lificações, proibidas quaisquer designações discrimina-
estiver habilitado a adotá-la ou de entidade que desen- tórias relativas à filiação.
volva programa de acolhimento familiar ou institucional. O artigo 20 destaca a igualdade entre todos os filhos,
§ 5o Após o nascimento da criança, a vontade da mãe sejam eles havidos dentro ou fora do casamento, sejam
ou de ambos os genitores, se houver pai registral ou pai eles inseridos em família natural ou substituta.
indicado, deve ser manifestada na audiência a que se refere
o § 1o do art. 166 desta Lei, garantido o sigilo sobre a entrega. A disciplina sobre a perda e suspensão do poder de fa-
§ 6o (VETADO). mília no ECA se encontra em dois blocos, o primeiro do ar-
§ 7o Os detentores da guarda possuem o prazo de 15 tigo 21 ao 24, que aborda questões materiais, e o segundo
(quinze) dias para propor a ação de adoção, contado do do artigo 155 a 163, que foca em questões procedimentais:
dia seguinte à data do término do estágio de convivência.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualda- O Código Civil de 2002, por seu turno, seguindo a toa-
de de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que da da Constituição Federal de 1988, trouxe significativas
dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o modificações ao instituto em análise, surgindo então o
direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade chamado poder familiar, onde ambos os pais exercem de
judiciária competente para a solução da divergência.  forma igualitária o poder sobre os filhos menores, equili-
brando dessa forma a relação familiar.
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guar- O artigo 1.630 do atual Código Civil, sem definir o po-
da e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no der familiar, dispõe que “os filhos estão sujeitos ao poder
interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as familiar enquanto menores”, ou seja, enquanto não com-
determinações judiciais. pletarem dezoito anos ou não alcançarem a maioridade
Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm civil por meio de uma das formas previstas no artigo 5º,
direitos iguais e deveres e responsabilidades comparti- parágrafo único e seus incisos, do mesmo diploma legal.
lhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser No mesmo sentido, o citado artigo 21, ECA.
O poder familiar, conhecido também como autoridade
resguardado o direito de transmissão familiar de suas cren-
parental, é um conjunto de direitos e deveres que são atri-
ças e culturas, assegurados os direitos da criança estabele-
buídos aos pais para que esses administrem de forma legal
cidos nesta Lei.
a pessoa dos filhos e também de seus bens.
“O poder familiar pode ser definido como um conjunto
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais de direitos e obrigações, quanto às pessoas e bens do filho
não constitui motivo suficiente para a perda ou a sus- menor não emancipado, exercido, em igualdade de condi-
pensão do poder familiar.  ções, por ambos os pais, para que possam desempenhar os
§ 1º Não existindo outro motivo que por si só autorize encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o
a decretação da medida, a criança ou o adolescente será interesse e a proteção do filho”21.
mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigato-
riamente ser incluída em serviços e programas oficiais de Artigo 1.634, CC. Compete aos pais, quanto à pessoa dos
proteção, apoio e promoção. filhos menores:
§2º A condenação criminal do pai ou da mãe não im- I – dirigir-lhes a criação e educação;
plicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese II – tê-los em sua companhia e guarda;
de condenação por crime doloso, sujeito à pena de reclu- III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
são, contra o próprio filho ou filha. casarem;
IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento
Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobre-
decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, vivo não puder exercer o poder familiar;
nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese V – representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da
de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que fo-
que alude o art. 22.  rem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
O instituto do poder familiar surgiu no direito romano e VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os
era conhecido naquela época como pátrio poder, pois o pai serviços próprios de sua idade e condição.
exercia mais poderes sobre os filhos do que a mãe, o que vi-
nha a representar um poder absoluto por parte do genitor, Em relação às suas características, o poder familiar é
indisponível e decorre da paternidade natural ou legal,
inclusive sobre a vida e a morte dos próprios filhos19.
por isso, não há a possibilidade de seu titular o transfe-
O Código Civil de 1916 atribuiu o poder familiar ao pai,
rir a terceiros por iniciativa própria, tampouco existindo a
que era considerado o chefe da sociedade conjugal, e a
viabilidade de ocorrer a sua prescrição pelo desuso. O po-
mãe possuía um papel secundário, conforme apontava o der familiar é indelegável, sendo, em regra, irrenunciável e
artigo 380 do Código Civil de 1916 que dizia que “durante sempre intransferível. Logo, não sendo possível ao titular
o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo- do poder familiar abrir mão de seu dever, a renúncia é in-
-o o marido com a colaboração da mulher [...]”. viável, existindo apenas uma exceção, qual seja, a decor-
De acordo com Santos Neto20: “[...] o exercício da auto- rente da adoção.
ridade parental pela mãe era admitido apenas em caráter Existe apenas uma exceção, que é o caso do pedido de
excepcional. Ao homem era dada, em condições normais, colocação do menor em família substituta, disponibilizan-
a titularidade exclusiva do direito em pauta. Sua vontade do o filho para a adoção, caso em que os direitos e deveres
prevalecia e contra ela não havia remédio previsto, salvo, é decorrentes do poder familiar serão exercidos por novos
claro, no caso de comportamento abusivo e contrário aos titulares, ou seja, pelos pais adotivos.
interesses dos menores”. A esse respeito, os direitos e deveres dos pais dispos-
tos nos artigos 1.630 a 1.638 do Código Civil regulam, den-
19 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda Compartilhada: um
Avanço para a Família. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
tre os deveres e poderes decorrentes do poder familiar,
20 SANTOS NETO, José Antônio de Paula. Do Pátrio Poder. 21 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Di-
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. reito de Família. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5.

30
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

também os de ordem pessoal, ou seja, o cuidado existen- São bastante frequentes nos casos de pais que perdem
cial do menor, a educação, a correição, e os de ordem ma- o poder familiar os atos de violência e espancamento; as-
terial, que envolvem a administração dos bens dos filhos. sim como o de abandono, no qual os menores, ao se ve-
Os principais atributos do poder familiar são a guarda, a rem abandonados, começam a relacionar-se com pessoas
criação e a educação, que se refletem nos deveres dos pais delinquentes e usuárias de drogas, que não vão colaborar
para com os filhos; tanto que, não cumprindo algum des- em nada com seu desenvolvimento e crescimento. Nessas
ses atributos, o detentor do poder poderá sofrer sanções situações, os detentores do poder familiar podem sofrer a
cíveis e até criminais. perda do poder familiar.
O poder familiar, conforme disposição do próprio or- Cabe aqui consignar que, no caso da perda do poder
denamento civil, não é um instituto irrevogável e pode ser familiar, se no decorrer do tempo o menor não vier a ser
extinto, suspenso ou destituído a qualquer tempo. Basica- adotado por outra família e as causas que levaram a perda
mente, as formas de extinção se aplicam quando o exercí- do poder desaparecerem, os genitores poderão requerer
cio do poder familiar não é mais necessário; ao passo que judicialmente a reintegração do poder familiar, desde que
as regras de perda e suspensão constituem casos de priva- comprovem realmente que o motivo que os levou a perder
ção do exercício do poder familiar pelo descumprimento esse poder já não existe mais.
de seus deveres. Por seu turno, pelo que se verifica na análise da legis-
Sendo assim, o Estado poderá interferir na relação fa- lação, quando o legislador estabeleceu as hipóteses de ex-
miliar, com o objetivo de resguardar os interesses do me- tinção do poder familiar, em regra, o fez por perceber que a
nor, sendo que a lei disciplina os casos em que o titular do pessoa que a ele se encontrava sujeita adquiriu maturidade
poder familiar ficará privado de exercê-lo, seja de forma o suficiente para guiar a sua vida, não havendo razão para
temporária ou até mesmo definitiva. que permaneça tal vínculo. Há casos, entretanto, que a vio-
lação aos direitos inerentes ao poder familiar tornou irre-
Artigo 1.637, CC. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua auto- versível o seu restabelecimento, como ocorre na adoção.
ridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando
os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente,
Artigo 1.635, CC. Extingue-se o poder familiar: I – pela
ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça re-
morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos termos
clamada pela segurança do menor e seus haveres, até sus-
do artigo 5º, parágrafo único; III – pela maioridade; IV – pela
pendendo o poder familiar, quando convenha.
adoção; V – por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do
poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença ir-
A extinção do poder familiar é mais complexa, pois
recorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos
nesta situação os pais, extintos do poder, não poderão
de prisão.
requerer a reintegração do poder familiar se houve inter-
Nestes casos, a suspensão não será definitiva, é apenas ferência deles para sua extinção. Na maioria dos casos, é
uma sanção imposta pelo Poder Judiciário visando preser- possível identificar facilmente a existência da extinção do
var os interesses dos filhos, assim, diante da comprovação poder familiar, por se tratarem de hipóteses objetivas.
de que os problemas que levaram à suspensão desapare-
ceram, o poder familiar poderá retornar aos genitores. Seção II
Assim sendo, os pais podem ser suspensos de exercer Da Família Natural
os direitos e deveres decorrentes do poder familiar quando
ficar evidenciado perante a autoridade competente o abuso. Dos artigos 25 a 27 o ECA aborda a família natural, nos
Como visto, existe, também, a probabilidade de se decretar seguintes termos:
a suspensão do poder familiar, caso um dos pais seja con-
denado por crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade for-
Há, ainda, as hipóteses de perda ou destituição do po- mada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.
der familiar, que é a sanção mais grave imposta aos pais Parágrafo único.  Entende-se por família extensa ou
que faltarem com os deveres em relação aos filhos: ampliada aquela que se estende para além da unidade
pais e filhos ou da unidade do casal, formada por paren-
Artigo 1.638, CC. Perderá por ato judicial o poder fami- tes próximos com os quais a criança ou adolescente convive
liar o pai ou a mãe que: e mantém vínculos de afinidade e afetividade. 
I – castigar imoderadamente o filho; A família natural é composta por pais e filhos que
II – deixar o filho em abandono; formam vínculo entre si desde o nascimento, por questão
III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; biológica.
IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no arti- O conceito de família pode ser visto de uma maneira
go antecedente. mais ampla, o que se denomina família extensa ou am-
pliada. Por exemplo, avós e tios que sejam muito próxi-
Nessa linha de pensamento, os artigos 24 e 22 do Es- mos e participem diretamente do convívio familiar, for-
tatuto da Criança e do Adolescente, citados anteriormente, mando para com a criança e o adolescente vínculos de
além de preverem a suspensão e destituição do poder fami- afinidade e afetividade.
liar, trazem também os motivos que poderão acarretá-las.

31
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão § 5o  A colocação da criança ou adolescente em família
ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, substituta será precedida de sua preparação gradativa e
no próprio termo de nascimento, por testamento, me- acompanhamento posterior, realizados pela equipe inter-
diante escritura ou outro documento público, qualquer profissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude,
que seja a origem da filiação. preferencialmente com o apoio dos técnicos responsáveis
Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o pela execução da política municipal de garantia do direito à
nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se convivência familiar. 
deixar descendentes. § 6o  Em se tratando de criança ou adolescente indí-
Como o artigo 20 estabelece a igualdade entre os filhos gena ou proveniente de comunidade remanescente de qui-
havidos dentro ou fora do casamento, sentido em que se lombo, é ainda obrigatório: 
compreende que tanto os filhos inseridos no matrimônio I - que sejam consideradas e respeitadas sua identidade
quanto os que não o estão fazem parte da família natural, o social e cultural, os seus costumes e tradições, bem como
suas instituições, desde que não sejam incompatíveis com os
artigo 26 tece detalhes sobre a possibilidade de reconheci-
direitos fundamentais reconhecidos por esta Lei e pela Cons-
mento do vínculo de filiação, que pode se dar antes mesmo
tituição Federal; 
do nascimento do filho ou extrapolar a sua vida, devendo
II - que a colocação familiar ocorra prioritariamente
ser feito em documento público.
no seio de sua comunidade ou junto a membros da mes-
ma etnia; 
Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é di- III - a intervenção e oitiva de representantes do órgão
reito personalíssimo, indisponível e imprescritível, po- federal responsável pela política indigenista, no caso de
dendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, pe-
qualquer restrição, observado o segredo de Justiça. rante a equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá
O direito à filiação é personalíssimo, indisponível e im- acompanhar o caso. 
prescritível. Mesmo que um filho passe a vida toda ou boa
parte de sua vida sem buscar o seu reconhecimento, ele Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta
não se perde. Logo, a ação de investigação de paternidade a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilida-
é imprescritível, pois também o é o vínculo que ela reco- de com a natureza da medida ou não ofereça ambiente
nhece em caso de procedência. familiar adequado.

Seção III Art. 30. A colocação em família substituta não admitirá


Da Família Substituta transferência da criança ou adolescente a terceiros ou
a entidades governamentais ou não-governamentais,
Subseção I sem autorização judicial.
Disposições Gerais
Art. 31. A colocação em família substituta estrangei-
Dos artigos 28 a 32 aborda-se a família substituta, nos ra constitui medida excepcional, somente admissível na
seguintes termos: modalidade de adoção.

Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á Art. 32. Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável
mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o
encargo, mediante termo nos autos.
da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos
desta Lei.
Existem três formas de colocação em família substituta:
§ 1o  Sempre que possível, a criança ou o adolescen-
guarda, tutela e adoção. Neste sentido, a criança é retirada
te será previamente ouvido por equipe interprofissional,
da esfera do poder familiar de ambos os pais (o que pode
respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de com- acontecer na tutela e na adoção), ou então permanece
preensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião vinculado ao poder familiar de ambos genitores enquanto
devidamente considerada.  apenas um ou um terceiro exerce a guarda (o que ocorre
§ 2o  Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, apenas na guarda). Trata-se de situação excepcional, eis
será necessário seu consentimento, colhido em audiência.  que em regra a criança deve permanecer na família natural,
§ 3o  Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o vinculada ao poder familiar atribuído a ambos os pais.
grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afeti- Neste tipo de circunstância, deve-se buscar sempre
vidade, a fim de evitar ou minorar as consequências decor- ouvir a criança ou o adolescente. Caso já possua 12 anos
rentes da medida.  completos, a oitiva é obrigatória. Trata-se de respeito à au-
§ 4o  Os grupos de irmãos serão colocados sob ado- tonomia da criança e do adolescente.
ção, tutela ou guarda da mesma família substituta, res- Os irmãos devem permanecer unidos em qualquer cir-
salvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra cunstância, sendo a separação de irmãos medida excep-
situação que justifique plenamente a excepcionalidade de cional. Por exemplo, se um casal estiver disposto a adotar
solução diversa, procurando-se, em qualquer caso, evitar o 4 filhos e existirem 4 irmãos, será dada prioridade a ele,
rompimento definitivo dos vínculos fraternais.  passando na frente dos demais candidatos à adoção.

32
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Subseção II No entender de Ishida23, a guarda é vinculada ao poder


Da Guarda familiar, “todavia, pode ocorrer a separação dos dois ins-
titutos, por exemplo, com a separação judicial do marido
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência e da mulher, onde o poder familiar continua pertencendo
material, moral e educacional à criança ou adolescente, aos dois, no entanto um só poderá ficar com a guarda da
conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, prole”. ou seja, tanto o pai como a mãe são detentores do
inclusive aos pais.  poder familiar mesmo após a separação, mas nos tipos de
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de guarda comum, apenas um terá a guarda do filho.
fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos Logo, a dissolução do vínculo conjugal não exclui o
procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por poder familiar, mas pode excluir a guarda de um dos pais,
estrangeiros. reservando-o apenas o direito de visitas, dependendo da
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos modalidade de guarda adotada. Com a dissolução da união
casos de tutela e adoção, para atender a situações pecu- conjugal, hoje se estabeleceu que a prole poderá ficar com
liares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, o genitor que tiver melhor condições de assistir o filho.
podendo ser deferido o direito de representação para a práti- “Mesmo que a mãe seja considerada culpada pela se-
ca de atos determinados. paração, pode o juiz deferir-lhe a guarda dos filhos me-
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a con- nores, se estiver comprovado que o pai, por exemplo, é
dição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, alcoólatra e não tem condições de cuidar bem deles. Não
inclusive previdenciários. se indaga, portanto, quem deu causa à separação e quem
§ 4o  Salvo expressa e fundamentada determinação em é o cônjuge inocente, mas qual deles revela melhores con-
contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando dições para exercer a guarda dos filhos menores, cujos
a medida for aplicada em preparação para adoção, o de- interesses foram colocados em primeiro plano. A solução
ferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros será, portanto, a mesma se ambos os pais forem culpados
não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, pela separação e se a hipótese for de ruptura da vida em
assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto
comum ou de separação por motivo de doença mental. A
de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do
regra amolda-se ao princípio do melhor interesse da crian-
Ministério Público. 
ça, identificado como direito fundamental na Constituição
Federal (art. 5º, §2º), em razão da ratificação pela Conven-
Art. 34.  O poder público estimulará, por meio de as-
ção Internacional sobre os Direitos da Criança – ONU/89”24.
sistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, o acolhi-
O juiz antes de decidir o mérito de uma ação de guar-
mento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente
afastado do convívio familiar.  da, separação ou divórcio, tem que determinar a guarda
§ 1o  A inclusão da criança ou adolescente em pro- provisória do menor a um dos pais, o qual não se trata de
gramas de acolhimento familiar terá preferência a seu um modelo de guarda, mas de definir uma situação mo-
acolhimento institucional, observado, em qualquer caso, o mentânea em que a prole se encontra. Somente com o jul-
caráter temporário e excepcional da medida, nos termos gamento do mérito será estabelecida a guarda definitiva,
desta Lei.  que deverá adotar um dos modelos de guarda permitida
§ 2o  Na hipótese do § 1o deste artigo a pessoa ou casal no ordenamento jurídico brasileiro.
cadastrado no programa de acolhimento familiar poderá A guarda definitiva expressa o modelo de guarda ado-
receber a criança ou adolescente mediante guarda, obser- tado pelos pais. Porém, mesmo tratando-se de guarda de-
vado o disposto nos arts. 28 a 33 desta Lei.  finitiva, tal modelo poderá ser alterado a qualquer tempo,
§ 3º A União apoiará a implementação de serviços pois o que regula o instituto da guarda é o melhor interes-
de acolhimento em família acolhedora como política se do menor e, não sendo isso possível, a guarda é passível
pública, os quais deverão dispor de equipe que organize o de modificação.
acolhimento temporário de crianças e de adolescentes em a) Guarda Comum ou Guarda Originária
residências de famílias selecionadas, capacitadas e acompa- A guarda comum ou guarda originária não é uma guar-
nhadas que não estejam no cadastro de adoção. da judicial, existindo quando os genitores possuem vínculo
§ 4º Poderão ser utilizados recursos federais, esta- matrimonial ou vivem em união estável e moram juntos
duais, distritais e municipais para a manutenção dos ser- com seus filhos, situação na qual exercem plenamente e
viços de acolhimento em família acolhedora, facultando-se o simultaneamente todos os poderes inerentes do poder fa-
repasse de recursos para a própria família acolhedora. miliar e, consequentemente, a guarda. Não existe a figura
do guardião e nem arbitramento judicial sobre a questão.
Art. 35. A guarda poderá ser revogada a qualquer tem- Ambos pais exercem juntos a guarda em plenitude.
po, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério b) Guarda Unilateral ou Guarda Única
Público. Observando-se sempre o princípio do melhor interesse
do menor, a guarda excepcionalmente poderá ser atribuí-
Na definição de Santos Neto22 a guarda trata-se de um da de forma unilateral a uma terceira pessoa quando os
“direito consistente na posse de menor oponível a terceiros
23 ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescen-
e que acarreta deveres de vigilância em relação a este”.
te: Doutrina e Jurisprudência. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
22 SANTOS NETO, José Antônio de Paula. Do Pátrio Poder. 24 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direi-
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. to de Família. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 6.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

genitores não estiverem em condições de exercê-la, pois, d) Guarda Dividida


conforme determina o artigo 1.583, §1º, do Código Civil, Na guarda dividida, são os próprios pais que contes-
“compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só tam e procuram novos meios de garantir uma maior parti-
dos genitores ou a alguém que o substitua”. Neste viés, cipação na vida da prole, pois neste modelo o menor vive
dispõe o artigo 1.584, §5º, do mesmo diploma legal: “Se o em um lar fixo e determinado e recebe periodicamente a
juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda visita do pai ou da mãe que não tem a guarda.
do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele Na guarda dividida o filho tem um lar fixo e recebe
compatibilidade com a natureza da medida, considerados, nele a visita de ambos os genitores em tempos diferentes,
de preferência, o grau de parentesco e as relações de afini- sendo que a guarda é exercida por aquele que estiver com
dade e afetividade”. Vale ressaltar que a guarda unilateral a criança, o que é diferente da guarda unilateral, pois nela
também é possível quando nenhum dos pais tem condi- a guarda é de um dos genitores e o infante vai, em dias
ções de exercê-la, por exemplo, atribuindo a guarda aos determinados, receber a visita do outro não guardião.
avós ou aos tios. e) Guarda por Aninhamento ou Nidação
Usualmente, nesse contexto, podemos constatar a A guarda por aninhamento, conhecida também como
existência da guarda unilateral, que é atribuída somen- guarda por nidação, ocorre quando a prole possui um lar
te a um dos genitores, e da guarda compartilhada, que é fixo e os pais se revezam, mudando-se para a casa do(s)
atribuída a ambos, sendo que a previsão das duas moda- filho(s) em períodos alternados de tempo, para conviver e
lidades de guarda encontra-se no artigo 1.583, da Lei n. atender as suas necessidades. Basicamente, os pais se reve-
11.698/2008, que constitui que “a guarda será unilateral ou zam na residência do filho.
compartilhada”. f) Guarda Compartilhada
A Lei alterou a redação do artigo 1.583 e passou a es- Considerando a evolução da família, especialmente a
tabelecer nos incisos do §2º do dispositivo algumas das da mulher na sociedade, bem como o grande número de
situações que deverão ser consideradas pelo magistrado separações ocorridas nos últimos anos, o ordenamento ju-
ao atribuir a guarda a um dos genitores: afeto nas relações rídico busca com o instituto da guarda compartilhada evitar
com o genitor e com o grupo familiar; saúde e segurança; prejuízos ainda maiores aos filhos de casal separado, que,
e educação. além de não terem o convívio diário com um dos genitores,
Na guarda unilateral atribuída a apenas um dos pais, têm que vivenciar os problemas conjugais de seus pais e
apesar de um dos genitores não ser o guardião, continuam ainda se tornarem, em muitos casos, vítimas da Síndrome
ambos a exercerem a guarda jurídica. A diferença é que, da Alienação Parental.
em virtude da guarda, o genitor guardião tem o poder de Segundo Akel26, “a guarda compartilhada surgiu da ne-
decisão, enquanto o genitor não guardião tem o poder de cessidade de se encontrar uma maneira que fosse capaz de
fiscalização, podendo contestar a decisão do genitor guar- fazer com que os pais, que não mais convivem, e seus filhos
dião e até mesmo recorrer à justiça, caso entenda que a mantivessem os vínculos afetivos latentes, mesmo após o
decisão tomada não seja a melhor para a prole, conforme rompimento”.
prevê o artigo 1.583, §3º, do Código Civil: “a guarda unila- Com esse propósito, a recente Lei nº 11.698/2008 insti-
teral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervi- tuiu expressamente no ordenamento jurídico o instituto da
sionar os interesses dos filhos”. guarda compartilhada. Embora tenha sido sancionada em
c) Guarda Alternada ou Guarda Partilhada 13 de junho de 2008 e publicada no Diário Oficial da União
Nesse modelo de guarda, cada um dos genitores terá em 16 de junho do mesmo ano, por força da vacatio legis
a possibilidade de ter sobre sua guarda o menor ou ado- instituída no artigo 2º, a lei somente entrou em vigor no
lescente de forma alternada e exclusiva, ou seja, o casal país 60 (sessenta) dias após a sua publicação, ou seja, em
determinará o período em que o menor ficará com o pai 16 de agosto de 2008 (vide anexo).
ou com a mãe, existindo dessa forma sempre uma alter- A nova lei trás em seu bojo o conceito de guarda com-
nância na guarda jurídica do menor. O período em que a partilhada nos seguintes termos: “compreende-se por [...]
guarda ficará com o pai ou com a mãe na guarda alternada, guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o
poderá ser de um dia, uma semana, uma parte da semana, exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não
um mês, um ano, ou até mais, dependendo do acordo dos vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar
genitores, sendo que, ao término desse período, os papéis dos filhos comuns”.
se invertem. Os direitos e deveres deste modelo de guarda Assim, de acordo com o novo diploma legal, pode-
ficarão sempre com o cônjuge que estiver com a guarda -se verificar que na guarda compartilhada os pais terão os
do menor, cabendo ao outro os direitos inerentes do não mesmos direitos e deveres com relação ao filho, ou seja, as
guardião, ou seja, o de visita e o de fiscalização25. tarefas serão divididas de forma igualitária, não sobrecar-
regando somente um dos genitores.
25 COSTA, Luiz Jorge Valente Pontes. Guarda Conjunta: em
busca do maior interesse do menor. Disponível em: <http://jus.uol.
com.br/revista/texto/13965/guarda-conjunta-em-busca-do-maior- 26 AKEL, Ana Carolina Silveira. Guarda Compartilhada: um
-interesse-do-menor/2>. Acesso em: 16 out. 2010. Avanço para a Família. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

34
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Subseção III Art. 40. O adotando deve contar com, no máximo, de-
Da Tutela zoito anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a guar-
da ou tutela dos adotantes.
Art. 36.  A tutela será deferida, nos termos da lei civil, a
pessoa de até 18 (dezoito) anos incompletos.  Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado,
Parágrafo único. O deferimento da tutela pressupõe a com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios,
prévia decretação da perda ou suspensão do poder fa- desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo
miliar e implica necessariamente o dever de guarda. os impedimentos matrimoniais.
§ 1º Se um dos cônjuges ou concubinos adota o filho
Art. 37.  O tutor nomeado por testamento ou qual- do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adota-
quer documento autêntico, conforme previsto no parágra- do e o cônjuge ou concubino do adotante e os respectivos
fo único do art. 1.729 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de parentes.
§ 2º É recíproco o direito sucessório entre o adotado,
2002 - Código Civil, deverá, no prazo de 30 (trinta) dias
seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descen-
após a abertura da sucessão, ingressar com pedido des-
dentes e colaterais até o 4º grau, observada a ordem de
tinado ao controle judicial do ato, observando o procedi-
vocação hereditária.
mento previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei. 
Parágrafo único.  Na apreciação do pedido, serão ob- Art. 42.  Podem adotar os maiores de 18 (dezoito)
servados os requisitos previstos nos arts. 28 e 29 desta Lei, anos, independentemente do estado civil. 
somente sendo deferida a tutela à pessoa indicada na dispo- § 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do
sição de última vontade, se restar comprovado que a medida adotando.
é vantajosa ao tutelando e que não existe outra pessoa em § 2o  Para adoção conjunta, é indispensável que os ado-
melhores condições de assumi-la.  tantes sejam casados civilmente ou mantenham união es-
tável, comprovada a estabilidade da família. 
Art. 38. Aplica-se à destituição da tutela o disposto no § 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos
art. 24. mais velho do que o adotando.
§ 4o  Os divorciados, os judicialmente separados e os
A tutela é forma de colocação de criança e adolescente ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto
em família substituta. Pressupõe, ao contrário da guarda, que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde
a prévia destituição ou suspensão do poder familiar dos que o estágio de convivência tenha sido iniciado na cons-
pais (família natural). Visa essencialmente a suprir carência tância do período de convivência e que seja comprovada a
de representação legal, assumindo o tutor tal munus na existência de vínculos de afinidade e afetividade com aque-
ausência dos genitores. Na hipótese de os pais serem fale- le não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionali-
cidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do poder fa- dade da concessão.  
miliar, ou houverem aderido expressamente ao pedido de § 5o  Nos casos do § 4o deste artigo, desde que de-
colocação em família substituta, este poderá ser formulado monstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada
diretamente em cartório, em petição assinada pelos pró- a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da
prios requerentes, dispensada a assistência por advogado Lei no10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. 
(art. 166, ECA). Em outras circunstâncias, deve passar pelo § 6o  A adoção poderá ser deferida ao adotante que,
crivo do Judiciário. após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no
curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
Subseção IV
Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais
Da Adoção
vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.
A disciplina do ECA a respeito da adoção também se Art. 44. Enquanto não der conta de sua administração
divide em dois blocos, um voltado a aspectos materiais, e saldar o seu alcance, não pode o tutor ou o curador ado-
do artigo 39 ao 52-D, e outro voltado a aspectos procedi- tar o pupilo ou o curatelado.
mentais, notadamente no que se refere à habilitação para a
adoção, do artigo 197-A a 197-D. Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais
ou do representante legal do adotando.
Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se-á § 1º O consentimento será dispensado em relação à
segundo o disposto nesta Lei. criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou
§ 1o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à tenham sido destituídos do poder familiar.
qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos § 2º Em se tratando de adotando maior de doze anos
de manutenção da criança ou adolescente na família natural de idade, será também necessário o seu consentimento.
ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei. 
§ 2o É vedada a adoção por procuração.  Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convi-
§ 3o Em caso de conflito entre direitos e interesses do vência com a criança ou adolescente, pelo prazo máxi-
adotando e de outras pessoas, inclusive seus pais biológicos, mo de 90 (noventa) dias, observadas a idade da criança ou
devem prevalecer os direitos e os interesses do adotando. adolescente e as peculiaridades do caso.

35
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 1o  O estágio de convivência poderá ser dispensado § 10. O prazo máximo para conclusão da ação de ado-
se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do ção será de 120 (cento e vinte) dias, prorrogável uma única
adotante durante tempo suficiente para que seja possível vez por igual período, mediante decisão fundamentada da
avaliar a conveniência da constituição do vínculo.  autoridade judiciária.
§ 2o  A simples guarda de fato não autoriza, por si só, a
dispensa da realização do estágio de convivência.   Art. 48.  O adotado tem direito de conhecer sua origem
§ 2o-A. O prazo máximo estabelecido no caput deste biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo
artigo pode ser prorrogado por até igual período, mediante no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes,
decisão fundamentada da autoridade judiciária. após completar 18 (dezoito) anos. 
§ 3o Em caso de adoção por pessoa ou casal residente Parágrafo único.  O acesso ao processo de adoção pode-
ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência será rá ser também deferido ao adotado menor de 18 (dezoito)
de, no mínimo, 30 (trinta) dias e, no máximo, 45 (quarenta e anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurí-
dica e psicológica. 
cinco) dias, prorrogável por até igual período, uma única vez,
mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária.
Art. 49. A morte dos adotantes não restabelece o poder
§ 3o-A. Ao final do prazo previsto no § 3o deste artigo,
familiar dos pais naturais. 
deverá ser apresentado laudo fundamentado pela equipe
mencionada no § 4o deste artigo, que recomendará ou não o Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada co-
deferimento da adoção à autoridade judiciária. marca ou foro regional, um registro de crianças e ado-
§ 4o O estágio de convivência será acompanhado pela lescentes em condições de serem adotados e outro de
equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da pessoas interessadas na adoção.  
Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos res- § 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia
ponsáveis pela execução da política de garantia do direito consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Minis-
à convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso tério Público.
acerca da conveniência do deferimento da medida. § 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não
§ 5o O estágio de convivência será cumprido no terri- satisfazer os requisitos legais, ou verificada qualquer das
tório nacional, preferencialmente na comarca de residência hipóteses previstas no art. 29.
da criança ou adolescente, ou, a critério do juiz, em cidade § 3o  A inscrição de postulantes à adoção será prece-
limítrofe, respeitada, em qualquer hipótese, a competência dida de um período de preparação psicossocial e jurídica,
do juízo da comarca de residência da criança. orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da
Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos res-
Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença ponsáveis pela execução da política municipal de garantia
judicial, que será inscrita no registro civil mediante manda- do direito à convivência familiar. 
do do qual não se fornecerá certidão. § 4o  Sempre que possível e recomendável, a prepa-
§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes ração referida no § 3o deste artigo incluirá o contato com
como pais, bem como o nome de seus ascendentes. crianças e adolescentes em acolhimento familiar ou insti-
§ 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará tucional em condições de serem adotados, a ser realizado
o registro original do adotado. sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica
§ 3o A pedido do adotante, o novo registro poderá ser da Justiça da Infância e da Juventude, com apoio dos téc-
lavrado no Cartório do Registro Civil do Município de sua nicos responsáveis pelo programa de acolhimento e pela
execução da política municipal de garantia do direito à
residência.
convivência familiar. 
§ 4o Nenhuma observação sobre a origem do ato po-
§ 5o  Serão criados e implementados cadastros esta-
derá constar nas certidões do registro.  
duais e nacional de crianças e adolescentes em condições
§ 5o A sentença conferirá ao adotado o nome do ado- de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à
tante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a adoção. 
modificação do prenome.   § 6o  Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais
§ 6o Caso a modificação de prenome seja requerida pelo residentes fora do País, que somente serão consultados na
adotante, é obrigatória a oitiva do adotando, observado o inexistência de postulantes nacionais habilitados nos ca-
disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei.   dastros mencionados no § 5o deste artigo. 
§ 7o A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito § 7o  As autoridades estaduais e federais em matéria de
em julgado da sentença constitutiva, exceto na hipótese adoção terão acesso integral aos cadastros, incumbindo-
prevista no § 6o do art. 42 desta Lei, caso em que terá força -lhes a troca de informações e a cooperação mútua, para
retroativa à data do óbito.  melhoria do sistema. 
§ 8o O processo relativo à adoção assim como outros a § 8o  A autoridade judiciária providenciará, no prazo
ele relacionados serão mantidos em arquivo, admitindo-se de 48 (quarenta e oito) horas, a inscrição das crianças e
seu armazenamento em microfilme ou por outros meios, ga- adolescentes em condições de serem adotados que não
rantida a sua conservação para consulta a qualquer tempo.  tiveram colocação familiar na comarca de origem, e das
§ 9º Terão prioridade de tramitação os processos de pessoas ou casais que tiveram deferida sua habilitação à
adoção em que o adotando for criança ou adolescente adoção nos cadastros estadual e nacional referidos no §
com deficiência ou com doença crônica. 5o deste artigo, sob pena de responsabilidade. 

36
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 9o  Compete à Autoridade Central Estadual zelar pela § 2o  Os brasileiros residentes no exterior terão prefe-
manutenção e correta alimentação dos cadastros, com rência aos estrangeiros, nos casos de adoção internacional
posterior comunicação à Autoridade Central Federal Bra- de criança ou adolescente brasileiro. 
sileira.  § 3o  A adoção internacional pressupõe a intervenção
§ 10. Consultados os cadastros e verificada a ausência das Autoridades Centrais Estaduais e Federal em matéria
de pretendentes habilitados residentes no País com perfil de adoção internacional. 
compatível e interesse manifesto pela adoção de criança
ou adolescente inscrito nos cadastros existentes, será reali- Art. 52.  A adoção internacional observará o procedi-
zado o encaminhamento da criança ou adolescente à ado- mento previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei, com as seguin-
ção internacional. tes adaptações: 
§ 11.  Enquanto não localizada pessoa ou casal interes- I - a pessoa ou casal estrangeiro, interessado em adotar
sado em sua adoção, a criança ou o adolescente, sempre criança ou adolescente brasileiro, deverá formular pedido
que possível e recomendável, será colocado sob guarda de de habilitação à adoção perante a Autoridade Central em
família cadastrada em programa de acolhimento familiar.  matéria de adoção internacional no país de acolhida, assim
§ 12.  A alimentação do cadastro e a convocação cri- entendido aquele onde está situada sua residência habitual; 
teriosa dos postulantes à adoção serão fiscalizadas pelo II - se a Autoridade Central do país de acolhida consi-
Ministério Público.  derar que os solicitantes estão habilitados e aptos para ado-
§ 13.  Somente poderá ser deferida adoção em favor tar, emitirá um relatório que contenha informações sobre a
de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previa- identidade, a capacidade jurídica e adequação dos solicitan-
mente nos termos desta Lei quando:  tes para adotar, sua situação pessoal, familiar e médica, seu
I - se tratar de pedido de adoção unilateral;  meio social, os motivos que os animam e sua aptidão para
II - for formulada por parente com o qual a criança ou assumir uma adoção internacional; 
adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade;  III - a Autoridade Central do país de acolhida enviará o
III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda relatório à Autoridade Central Estadual, com cópia para a
legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde
Autoridade Central Federal Brasileira; 
que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação
IV - o relatório será instruído com toda a documenta-
de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a
ção necessária, incluindo estudo psicossocial elaborado por
ocorrência de má-fé ou qualquer das situações previstas nos
equipe interprofissional habilitada e cópia autenticada da
arts. 237 ou 238 desta Lei. 
legislação pertinente, acompanhada da respectiva prova de
§ 14.  Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o
vigência; 
candidato deverá comprovar, no curso do procedimento,
que preenche os requisitos necessários à adoção, confor- V - os documentos em língua estrangeira serão devida-
me previsto nesta Lei.  mente autenticados pela autoridade consular, observados os
§ 15. Será assegurada prioridade no cadastro a pes- tratados e convenções internacionais, e acompanhados da
soas interessadas em adotar criança ou adolescente com respectiva tradução, por tradutor público juramentado; 
deficiência, com doença crônica ou com necessidades es- VI - a Autoridade Central Estadual poderá fazer exigên-
pecíficas de saúde, além de grupo de irmãos. cias e solicitar complementação sobre o estudo psicossocial
do postulante estrangeiro à adoção, já realizado no país de
Art. 51. Considera-se adoção internacional aquela na acolhida; 
qual o pretendente possui residência habitual em país-parte VII - verificada, após estudo realizado pela Autoridade
da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à Central Estadual, a compatibilidade da legislação estrangei-
Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Ado- ra com a nacional, além do preenchimento por parte dos
ção Internacional, promulgada pelo Decreto no 3.087, de 21 postulantes à medida dos requisitos objetivos e subjetivos
junho de 1999, e deseja adotar criança em outro país-parte necessários ao seu deferimento, tanto à luz do que dispõe
da Convenção. esta Lei como da legislação do país de acolhida, será expe-
§ 1o A adoção internacional de criança ou adolescente dido laudo de habilitação à adoção internacional, que terá
brasileiro ou domiciliado no Brasil somente terá lugar quan- validade por, no máximo, 1 (um) ano; 
do restar comprovado: VIII - de posse do laudo de habilitação, o interessado
I - que a colocação em família adotiva é a solução ade- será autorizado a formalizar pedido de adoção perante o
quada ao caso concreto; Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra
II - que foram esgotadas todas as possibilidades de colo- a criança ou adolescente, conforme indicação efetuada pela
cação da criança ou adolescente em família adotiva brasilei- Autoridade Central Estadual. 
ra, com a comprovação, certificada nos autos, da inexistên- § 1o  Se a legislação do país de acolhida assim o autorizar,
cia de adotantes habilitados residentes no Brasil com perfil admite-se que os pedidos de habilitação à adoção interna-
compatível com a criança ou adolescente, após consulta aos cional sejam intermediados por organismos credenciados. 
cadastros mencionados nesta Lei; § 2o  Incumbe à Autoridade Central Federal Brasileira
III - que, em se tratando de adoção de adolescente, este o credenciamento de organismos nacionais e estrangeiros
foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de de- encarregados de intermediar pedidos de habilitação à ado-
senvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, ção internacional, com posterior comunicação às Autorida-
mediante parecer elaborado por equipe interprofissional, des Centrais Estaduais e publicação nos órgãos oficiais de
observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei.  imprensa e em sítio próprio da internet. 

37
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 3o  Somente será admissível o credenciamento de or- § 9o  Transitada em julgado a decisão, a autoridade ju-
ganismos que:  diciária determinará a expedição de alvará com autoriza-
I - sejam oriundos de países que ratificaram a Conven- ção de viagem, bem como para obtenção de passaporte,
ção de Haia e estejam devidamente credenciados pela Auto- constando, obrigatoriamente, as características da criança
ridade Central do país onde estiverem sediados e no país de ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo, eventuais
acolhida do adotando para atuar em adoção internacional sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a
no Brasil;  aposição da impressão digital do seu polegar direito, ins-
II - satisfizerem as condições de integridade moral, com- truindo o documento com cópia autenticada da decisão e
petência profissional, experiência e responsabilidade exigi- certidão de trânsito em julgado. 
das pelos países respectivos e pela Autoridade Central Fede- § 10.  A Autoridade Central Federal Brasileira poderá, a
ral Brasileira;  qualquer momento, solicitar informações sobre a situação
III - forem qualificados por seus padrões éticos e sua forma- das crianças e adolescentes adotados. 
ção e experiência para atuar na área de adoção internacional; 
§ 11.  A cobrança de valores por parte dos organismos
IV - cumprirem os requisitos exigidos pelo ordenamento
credenciados, que sejam considerados abusivos pela Auto-
jurídico brasileiro e pelas normas estabelecidas pela Autori-
ridade Central Federal Brasileira e que não estejam devida-
dade Central Federal Brasileira. 
mente comprovados, é causa de seu descredenciamento. 
§ 4o  Os organismos credenciados deverão ainda: 
I - perseguir unicamente fins não lucrativos, nas condi- § 12.  Uma mesma pessoa ou seu cônjuge não podem
ções e dentro dos limites fixados pelas autoridades compe- ser representados por mais de uma entidade credenciada
tentes do país onde estiverem sediados, do país de acolhida para atuar na cooperação em adoção internacional. 
e pela Autoridade Central Federal Brasileira;  § 13.  A habilitação de postulante estrangeiro ou domi-
II - ser dirigidos e administrados por pessoas qualificadas ciliado fora do Brasil terá validade máxima de 1 (um) ano,
e de reconhecida idoneidade moral, com comprovada for- podendo ser renovada. 
mação ou experiência para atuar na área de adoção inter- § 14.  É vedado o contato direto de representantes de
nacional, cadastradas pelo Departamento de Polícia Federal organismos de adoção, nacionais ou estrangeiros, com
e aprovadas pela Autoridade Central Federal Brasileira, me- dirigentes de programas de acolhimento institucional ou
diante publicação de portaria do órgão federal competente;  familiar, assim como com crianças e adolescentes em condi-
III - estar submetidos à supervisão das autoridades com- ções de serem adotados, sem a devida autorização judicial. 
petentes do país onde estiverem sediados e no país de aco- § 15.  A Autoridade Central Federal Brasileira poderá
lhida, inclusive quanto à sua composição, funcionamento e limitar ou suspender a concessão de novos credenciamen-
situação financeira;  tos sempre que julgar necessário, mediante ato administra-
IV - apresentar à Autoridade Central Federal Brasilei- tivo fundamentado. 
ra, a cada ano, relatório geral das atividades desenvolvidas,
bem como relatório de acompanhamento das adoções inter- Art. 52-A.  É vedado, sob pena de responsabilidade e
nacionais efetuadas no período, cuja cópia será encaminha- descredenciamento, o repasse de recursos provenientes de
da ao Departamento de Polícia Federal;  organismos estrangeiros encarregados de intermediar pe-
V - enviar relatório pós-adotivo semestral para a Autori- didos de adoção internacional a organismos nacionais
dade Central Estadual, com cópia para a Autoridade Central ou a pessoas físicas. 
Federal Brasileira, pelo período mínimo de 2 (dois) anos. O Parágrafo único.  Eventuais repasses somente poderão
envio do relatório será mantido até a juntada de cópia au- ser efetuados via Fundo dos Direitos da Criança e do Adoles-
tenticada do registro civil, estabelecendo a cidadania do país cente e estarão sujeitos às deliberações do respectivo Conse-
de acolhida para o adotado; 
lho de Direitos da Criança e do Adolescente. 
VI - tomar as medidas necessárias para garantir que os
adotantes encaminhem à Autoridade Central Federal Brasi-
Art. 52-B.  A adoção por brasileiro residente no ex-
leira cópia da certidão de registro de nascimento estrangeira
terior em país ratificante da Convenção de Haia, cujo pro-
e do certificado de nacionalidade tão logo lhes sejam con-
cedidos.  cesso de adoção tenha sido processado em conformidade
§ 5o  A não apresentação dos relatórios referidos no § com a legislação vigente no país de residência e atendido o
4o deste artigo pelo organismo credenciado poderá acarre- disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da referida Convenção,
tar a suspensão de seu credenciamento.  será automaticamente recepcionada com o reingresso
§ 6o  O credenciamento de organismo nacional ou es- no Brasil. 
trangeiro encarregado de intermediar pedidos de adoção § 1o  Caso não tenha sido atendido o disposto na Alínea
internacional terá validade de 2 (dois) anos.  “c” do Artigo 17 da Convenção de Haia, deverá a sentença
§ 7o  A renovação do credenciamento poderá ser con- ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.  
cedida mediante requerimento protocolado na Autoridade § 2o  O pretendente brasileiro residente no exterior em
Central Federal Brasileira nos 60 (sessenta) dias anteriores país não ratificante da Convenção de Haia, uma vez rein-
ao término do respectivo prazo de validade.  gressado no Brasil, deverá requerer a homologação da sen-
§ 8o  Antes de transitada em julgado a decisão que con- tença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça. 
cedeu a adoção internacional, não será permitida a

38
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 52-C.  Nas adoções internacionais, quando o dados que vão completar não só a ficha do casal ou pessoa
Brasil for o país de acolhida, a decisão da autoridade que deseja adotar, mais da família onde o menor vai residir
competente do país de origem da criança ou do adolescen- e ter sua formação os documentos pessoais como cópias
te será conhecida pela Autoridade Central Estadual que de certidão de nascimento (quando solteiros), de certidão
tiver processado o pedido de habilitação dos pais ado- de casamento (quando casados), cópias de declaração de
tivos, que comunicará o fato à Autoridade Central Fe- período de união estável, Cópias de Certidão de identidade
deral e determinará as providências necessárias à expedição (RG), Comprovante da renda da pessoa ou casal, compro-
do Certificado de Naturalização Provisório.   vante que demostre que as condições vão suprir a neces-
§ 1o  A Autoridade Central Estadual, ouvido o Ministério sidade de se incluir mais um membro naquele lar, compro-
Público, somente deixará de reconhecer os efeitos daquela vante de moradia em que prove a pessoa ter sua residência
decisão se restar demonstrado que a adoção é manifesta- que acolherá o novo integrante.
mente contrária à ordem pública ou não atende ao interes- O interessado em adotar deve juntar atestados de saú-
se superior da criança ou do adolescente.  de física onde a pessoa vai demonstrar ser capaz de cuidar
§ 2o  Na hipótese de não reconhecimento da adoção, e garantir uma boa vida para o adotando e atestado de
prevista no § 1o deste artigo, o Ministério Público deverá saúde mental, comprovando que a pessoa é capaz legal-
imediatamente requerer o que for de direito para resguar- mente.
dar os interesses da criança ou do adolescente, comunican- Nos aspectos judiciais inerentes ao caso devem ser
do-se as providências à Autoridade Central Estadual, que juntados Certidão de antecedentes criminais, que demos-
fará a comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira tra conduta legal do indivíduo perante a sociedade, Cer-
e à Autoridade Central do país de origem.  tidão negativa de distribuição civil, além da manifestação
do M.P (Ministério Público) apresentando quesitos a serem
Art. 52-D.  Nas adoções internacionais, quando o Brasil respondidos pela equipe interdisciplinar, designação de
for o país de acolhida e a adoção não tenha sido deferida no audiência para oitiva de testemunhas e requerentes, soli-
país de origem porque a sua legislação a delega ao país de citar juntada de documentos complementares que sejam
acolhida, ou, ainda, na hipótese de, mesmo com decisão, a
necessários. Deve ser obrigatório o estudo psicossocial
criança ou o adolescente ser oriundo de país que não tenha
onde se testa a capacidade dos indivíduos para se torna-
aderido à Convenção referida, o processo de adoção segui-
rem pai ou mãe, o de incluir mais um membro junto aos
rá as regras da adoção nacional. 
filhos já existente. Os programas de capacitação também
devem ser aderido a este sistema, levando esclarecimentos
A adoção no Código Civil de 1916 era tratada em seu
aos pretendentes a adoção além, de manter contato com a
capítulo V. A adoção seguia um critério de ter um filho
criança em regime de acolhimento familiar.
para que a família tivesse sucessão e para configurar a fa-
mília da época que só tinha uma configuração costumeira Sendo os adotantes inscritos são chamados por ordem
se houvesse pai, mãe e filhos. A idade de 30 (trinta) anos cronológica de acordo com a habilitação, e que só poderá
para que as pessoas pudessem não se arrepender do feito. ser dispensada se for pelo melhor interesse do adotando.
Quando se falava do casamento criava-se o critério de que Os seguintes princípios e diretrizes devem guiar a de-
tenha se passado 05 (cinco) anos de matrimônio para que cisão pela adoção:
o casal possa adotar, pois o ideal era que os filhos fossem - Condição da criança e do adolescente como ser de
consanguíneos. A adoção poderia se dissolver por vontade direitos: As crianças são detentoras de direitos previstos na
das partes. Caso houvessem filhos naturais reconhecidos lei 8.069/90 e na Constituição Federal de 1988;
ou legitimados os filhos adotivos não participavam da su- - Proteção integral e prioritária: Toda e qualquer norma
cessão além de não se desfazer o vínculo com os parentes contida dentro da lei 8.069/90 deve ser voltada a proteção
naturais, somente no que dizia respeito ao pátrio poder. integral dos interesses do menor;
Houve um grande salto no que concerne a adoção que - Responsabilidade primária e solidaria do poder pú-
foi a letra trazida pela Constituição Federal de 1988 em seu blico: tanto nos casos ressalvados pelo E.C.A (Estatuto da
artigo 227 e com o ECA, que versa sobre todas as garantias Criança e do Adolescente) quanto nos casos que a CF/88
constitucionais e no que tange a adoção vem dos artigos (Constituição Federal de 1988) e demais objetos legais es-
39 ao 52-D falando sobre a regularização da adoção e traz pecíficos, é, dever dos três poderes atuarem no que for ne-
como princípio basilar o melhor interesse da criança, além cessário para a proteção do menor;
de ter como fundamento o afeto de pai para filho sem que - Interesse superior da criança e do adolescente: me-
haja qualquer diferenciação para com os filhos biológicos. diante a necessidade da intervenção estatal é necessário
Ainda no que concerne a adoção, foi criada para dar que se dê privilégio ao interesse do que for melhor para a
efetividade ao ECA a Lei nº 12.010 de 03 de agosto de 2009, criança e/ou adolescente. O primeiro interesse a ser obser-
que tem o intuito de alterar o direito à convivência familiar vado é o que trouxer melhor benefício a estes;
mostrando com clareza como deve ocorrer a adoção. - Privacidade: A promoção dos direitos deve ser sem-
Para ser candidato a adoção deve ter cumprido uma pre feita respeitando a privação e o direito da imagem, a
série de requisitos para se tornar hábil, estes requisitos são sua vida privada e a intimidade;
elencados na lei. O primeiro deles é a qualificação comple- - Intervenção precoce: Ao primeiro sinal de perigo e
ta: da pessoa que deseja adotar ou das pessoas que dese- risco ao menor, o Estado deve intervir para reverter a situa-
jam no caso de casais juntamente com os dados familiares, ção presente;

39
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

- Intervenção mínima; I - igualdade de condições para o acesso e perma-


- Proporcionalidade e atualidade: Ser a atitude tomada nência na escola;
de acordo com a proporção de perigo existente no mo- II - direito de ser respeitado por seus educadores;
mento, evitando e revertendo o risco de morte; III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo
- Responsabilidade parental: a intervenção deve ser a recorrer às instâncias escolares superiores;
princípio para que os pais tomem responsabilidade sobre IV - direito de organização e participação em entida-
seus filhos; des estudantis;
- Prevalência da família: Primeiro se dará a preferên- V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua
cia a família natural para que a criança continue com seus residência.
pais depois a preferência vai ser da família contínua (família Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis
natural a primeira e extensa a segunda), em último caso a ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da
criança/adolescente vai ser direcionada a família substituta. definição das propostas educacionais.
- Obrigatoriedade da informação: respeitando o es-
tágio de desenvolvimento e compreensão da criança ou Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao ado-
adolescente, além de seus pais e responsáveis devem ser lescente:
informados o motivo em que se dá a intervenção e como I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclu-
esta se processou; sive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
- Oitiva obrigatória e participação: a criança ou adoles- II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gra-
cente separados ou na companhia de seus pais, responsá- tuidade ao ensino médio;
veis ou pessoas por ela indicados; bem como seus pais e III - atendimento educacional especializado aos por-
responsáveis, tem o direito de serem ouvidas e sua opinião tadores de deficiência, preferencialmente na rede regular
deve ser considerada pelas autoridades do judiciário. de ensino;
- Afastamento da criança e do adolescente do conví- IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de
vio familiar: É um processo contencioso que importara aos zero a cinco anos de idade;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da
pais o direito do contraditório e da ampla defesa, este pro-
pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de
cedimento é de competência do judiciário (procedimento
cada um;
judicial) artigo 28 §§ 1° e 2° do E.C.A;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às
- Acolhimento familiar: medida de proteção criada para
condições do adolescente trabalhador;
o amparo da criança até que seja resolvida a situação;
VII - atendimento no ensino fundamental, através de
- Guia de acolhimento: será elaborado pelo poder Ju-
programas suplementares de material didático-escolar,
diciário um guia para encaminhar à criança a entidade de transporte, alimentação e assistência à saúde.
acolhimento (guia deve conter a causa da retirada e per- § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é di-
manência do menor fora da sua família natural além de reito público subjetivo.
todos os dados) § 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo
- Plano individual de atendimento: cada criança vai ter poder público ou sua oferta irregular importa responsabi-
um plano a ser desenvolvido visando sua adaptação a nova lidade da autoridade competente.
família; § 3º Compete ao poder público recensear os educan-
- Destituição do poder familiar: Promovida pelo M.P dos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
(Ministério público) sendo para isto necessário prévio aviso junto aos pais ou responsável, pela frequência à escola.
a entidade de acolhimento familiar, ou, responsáveis pela
execução da política municipal de garantia do direito a Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de ma-
convivência familiar. tricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
- Cadastro de crianças a adolescentes à regime institu-
cional e familiar: é um cadastro para crianças e adolescen- Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino
tes que necessitem de acolhimento familiar ou institucional fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de:
devido a algum registro de maus tratos. I - maus-tratos envolvendo seus alunos;
A Lei no 13.509 de 22 de novembro de 2017 surgiu com II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão es-
o propósito de maximizar a efetividade das disposições do colar, esgotados os recursos escolares;
ECA, inclusive no âmbito da adoção, possuindo a peculia- III - elevados níveis de repetência.
ridade de ser mais rigorosa no que tange ao cumprimento
de prazos para maior celeridade do processo. Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiên-
cias e novas propostas relativas a calendário, seriação,
Capítulo IV currículo, metodologia, didática e avaliação, com vistas
Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao à inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino
Lazer fundamental obrigatório.

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educa- Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os va-
ção, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, pre- lores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto
paro para o exercício da cidadania e qualificação para o tra- social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a
balho, assegurando-se-lhes: liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da Art. 65. Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze
União, estimularão e facilitarão a destinação de recursos anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previden-
e espaços para programações culturais, esportivas e de ciários.
lazer voltadas para a infância e a juventude. Uma vez que o adolescente está autorizado a trabalhar,
mesmo que na condição de menor aprendiz, possui direi-
Capítulo V tos trabalhistas e previdenciários.
Do Direito à Profissionalização e à Proteção no
Trabalho Art. 66. Ao adolescente portador de deficiência é asse-
gurado trabalho protegido.
Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de O adolescente que possui deficiência não pode ser ex-
quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz.  posto a uma situação de risco em decorrência da atividade
Preconiza o artigo 7º, XXXIII, CF a “proibição de traba- laboral.
lho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoi-
to e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regi-
salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”. me familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido
Portanto, em decorrência da própria norma constitu- em entidade governamental ou não-governamental, é ve-
cional, nenhuma criança ou adolescente pode trabalhar an- dado trabalho:
tes dos 14 anos de idade. Evidentemente que há algumas I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um
exceções a esta regra, devidamente fiscalizadas pelo Con- dia e as cinco horas do dia seguinte;
selho Tutelar, como é o caso dos artistas mirins. II - perigoso, insalubre ou penoso;
Entre 14 anos e 16 anos de idade somente será possí- III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e
vel o trabalho na condição de menor aprendiz, cuja natu- ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
reza é de ensino técnico-profissional, viabilizando a futura IV - realizado em horários e locais que não permitam a
inserção do adolescente no mercado de trabalho. frequência à escola.
O menor aprendiz está proibido de trabalhar no perío-
A partir dos 16 anos, o menor pode trabalhar, mas não
do noturno, em trabalho que o coloque exposto a pericu-
no período noturno ou em condições de periculosidade e
losidade (ex.: em andaimes, em áreas com risco de incêndio
insalubridade.
ou choques), insalubridade (ex.: em freezers de frigoríficos,
expostos a radiação) ou penosidade (ex.: excesso de força
Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é re-
física exigida).
gulada por legislação especial, sem prejuízo do disposto
nesta Lei. Art. 68. O programa social que tenha por base o trabalho
educativo, sob responsabilidade de entidade governamental
Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação téc- ou não-governamental sem fins lucrativos, deverá assegurar
nico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases ao adolescente que dele participe condições de capacitação
da legislação de educação em vigor. para o exercício de atividade regular remunerada.
§ 1º Entende-se por trabalho educativo a atividade
Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao
seguintes princípios: desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem
I - garantia de acesso e frequência obrigatória ao en- sobre o aspecto produtivo.
sino regular; § 2º A remuneração que o adolescente recebe pelo tra-
II - atividade compatível com o desenvolvimento do balho efetuado ou a participação na venda dos produtos de
adolescente; seu trabalho não desfigura o caráter educativo.
III - horário especial para o exercício das atividades. Os programas sociais voltados à capacitação dos ado-
Aquele que trabalha na condição de menor aprendiz lescentes devem sempre ter por objetivo educá-lo para
é obrigado a frequentar a escola, devendo ser facilitadas que ele adquira condições de inserir-se no mercado de
as condições para que o faça, notadamente pelo estabe- trabalho. Deve ser ensinado, logo, dele não se deve cobrar
lecimento de horário especial de trabalho. Além disso, a tanta produtividade, mas sim deve ser avaliado pelo seu
atividade laboral deve ser compatível com as atividades de aprendizado. O fato do trabalho ser remunerado não des-
ensino, até mesmo por se tratar de ensino técnico-profis- virtua este propósito.
sionalizante.
Ex.: um jovem pode trabalhar no período matutino, fre- Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização
quentar o SENAI na parte da tarde e ir ao colégio no ensino e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspec-
médio noturno. tos, entre outros:
I - respeito à condição peculiar de pessoa em desen-
Art. 64. Ao adolescente até quatorze anos de idade é volvimento;
assegurada bolsa de aprendizagem. II - capacitação profissional adequada ao mercado de
Toda criança e adolescente que necessitar receberá fo- trabalho.
mento para que não se desvincule das atividades de ensi- Com efeito, profissionalização e proteção no traba-
no. Trata-se de incentivo àquele que sem auxílio acabaria lho são direitos fundamentais garantidos ao adolescen-
entrando em situação irregular e trabalhando. te, exigindo-se neste campo que sua condição peculiar

41
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

inerente ao processo de aprendizado seja respeitada e que Art. 70-B.  As entidades, públicas e privadas, que atuem
o trabalho sirva para permitir a sua inserção no mercado nas áreas a que se refere o art. 71, dentre outras, devem con-
de trabalho. tar, em seus quadros, com pessoas capacitadas a reconhe-
cer e comunicar ao Conselho Tutelar suspeitas ou casos de
Título III maus-tratos praticados contra crianças e adolescentes.
Da Prevenção Parágrafo único.  São igualmente responsáveis pela co-
municação de que trata este artigo, as pessoas encarrega-
Capítulo I das, por razão de cargo, função, ofício, ministério, profissão
Disposições Gerais ou ocupação, do cuidado, assistência ou guarda de crianças
e adolescentes, punível, na forma deste Estatuto, o injustifi-
Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de cado retardamento ou omissão, culposos ou dolosos. 
ameaça ou violação dos direitos da criança e do ado-
lescente. Art. 71. A criança e o adolescente têm direito a infor-
mação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e
Art. 70-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de
Municípios deverão atuar de forma articulada na elabo- pessoa em desenvolvimento.
ração de políticas públicas e na execução de ações des-
tinadas a coibir o uso de castigo físico ou de tratamento Art. 72. As obrigações previstas nesta Lei não excluem
cruel ou degradante e difundir formas não violentas da prevenção especial outras decorrentes dos princípios
de educação de crianças e de adolescentes, tendo como por ela adotados.
principais ações:
I - a promoção de campanhas educativas permanentes Art. 73. A inobservância das normas de prevenção im-
para a divulgação do direito da criança e do adolescente de portará em responsabilidade da pessoa física ou jurídica,
serem educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou nos termos desta Lei.
de tratamento cruel ou degradante e dos instrumentos de
proteção aos direitos humanos; Capítulo II
II - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Da Prevenção Especial
Ministério Público e da Defensoria Pública, com o Conselho
Tutelar, com os Conselhos de Direitos da Criança e do Ado- Seção I
lescente e com as entidades não governamentais que atuam Da informação, Cultura, Lazer, Esportes, Diversões
na promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do e Espetáculos
adolescente;
III - a formação continuada e a capacitação dos profis- Art. 74. O poder público, através do órgão competente,
sionais de saúde, educação e assistência social e dos demais regulará as diversões e espetáculos públicos, informan-
agentes que atuam na promoção, proteção e defesa dos di- do sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se
reitos da criança e do adolescente para o desenvolvimento recomendem, locais e horários em que sua apresentação se
das competências necessárias à prevenção, à identificação mostre inadequada.
de evidências, ao diagnóstico e ao enfrentamento de todas Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e es-
as formas de violência contra a criança e o adolescente; petáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil
IV - o apoio e o incentivo às práticas de resolução pací- acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada
fica de conflitos que envolvam violência contra a criança e sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada
o adolescente; no certificado de classificação.
V - a inclusão, nas políticas públicas, de ações que visem
a garantir os direitos da criança e do adolescente, desde a Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às di-
atenção pré-natal, e de atividades junto aos pais e respon- versões e espetáculos públicos classificados como ade-
sáveis com o objetivo de promover a informação, a reflexão, quados à sua faixa etária.
o debate e a orientação sobre alternativas ao uso de casti- Parágrafo único. As crianças menores de dez anos so-
go físico ou de tratamento cruel ou degradante no processo mente poderão ingressar e permanecer nos locais de apre-
educativo; sentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou
VI - a promoção de espaços intersetoriais locais para a responsável.
articulação de ações e a elaboração de planos de atuação
conjunta focados nas famílias em situação de violência, com Art. 76. As emissoras de rádio e televisão somente exi-
participação de profissionais de saúde, de assistência social birão, no horário recomendado para o público infanto ju-
e de educação e de órgãos de promoção, proteção e defesa venil, programas com finalidades educativas, artísticas,
dos direitos da criança e do adolescente. culturais e informativas.
Parágrafo único.  As famílias com crianças e adoles- Parágrafo único. Nenhum espetáculo será apresentado
centes com deficiência terão prioridade de atendimento nas ou anunciado sem aviso de sua classificação, antes de sua
ações e políticas públicas de prevenção e proteção. transmissão, apresentação ou exibição.

42
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 77. Os proprietários, diretores, gerentes e funcioná- b) a criança estiver acompanhada:


rios de empresas que explorem a venda ou aluguel de fitas 1) de ascendente ou colateral maior, até o terceiro
de programação em vídeo cuidarão para que não haja grau, comprovado documentalmente o parentesco;
venda ou locação em desacordo com a classificação 2) de pessoa maior, expressamente autorizada pelo
atribuída pelo órgão competente. pai, mãe ou responsável.
Parágrafo único. As fitas a que alude este artigo deverão § 2º A autoridade judiciária poderá, a pedido dos pais ou
exibir, no invólucro, informação sobre a natureza da obra e a responsável, conceder autorização válida por dois anos.
faixa etária a que se destinam.
Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a au-
Art. 78. As revistas e publicações contendo material torização é dispensável, se a criança ou adolescente:
impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes de- I - estiver acompanhado de ambos os pais ou res-
verão ser comercializadas em embalagem lacrada, com a ponsável;
advertência de seu conteúdo. II - viajar na companhia de um dos pais, autorizado
Parágrafo único. As editoras cuidarão para que as capas expressamente pelo outro através de documento com
que contenham mensagens pornográficas ou obscenas se- firma reconhecida.
jam protegidas com embalagem opaca.
Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, ne-
Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao pú- nhuma criança ou adolescente nascido em território na-
blico infanto-juvenil não poderão conter ilustrações, fo- cional poderá sair do País em companhia de estrangeiro
tografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas al- residente ou domiciliado no exterior.
coólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar
os valores éticos e sociais da pessoa e da família. Parte Especial
Art. 80. Os responsáveis por estabelecimentos que explo- Título I
rem comercialmente bilhar, sinuca ou congênere ou por
Da Política de Atendimento
casas de jogos, assim entendidas as que realizem apostas,
ainda que eventualmente, cuidarão para que não seja per-
Capítulo I
mitida a entrada e a permanência de crianças e adoles-
Disposições Gerais
centes no local, afixando aviso para orientação do público.
Art. 86. A política de atendimento dos direitos da criança
Seção II
e do adolescente far-se-á através de um conjunto articu-
Dos Produtos e Serviços
lado de ações governamentais e não-governamentais,
Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adoles- da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.
cente de:
I - armas, munições e explosivos; Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:
II - bebidas alcoólicas; I - políticas sociais básicas;
III - produtos cujos componentes possam causar depen- II - serviços, programas, projetos e benefícios de as-
dência física ou psíquica ainda que por utilização indevida; sistência social de garantia de proteção social e de preven-
IV - fogos de estampido e de artifício, exceto aqueles ção e redução de violações de direitos, seus agravamentos
que pelo seu reduzido potencial sejam incapazes de provocar ou reincidências;
qualquer dano físico em caso de utilização indevida; III - serviços especiais de prevenção e atendimento
V - revistas e publicações a que alude o art. 78; médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tra-
VI - bilhetes lotéricos e equivalentes. tos, exploração, abuso, crueldade e opressão;
IV - serviço de identificação e localização de pais,
Art. 82. É proibida a hospedagem de criança ou ado- responsável, crianças e adolescentes desaparecidos;
lescente em hotel, motel, pensão ou estabelecimento V - proteção jurídico-social por entidades de defesa
congênere, salvo se autorizado ou acompanhado pelos dos direitos da criança e do adolescente;
pais ou responsável. VI - políticas e programas destinados a prevenir ou
abreviar o período de afastamento do convívio familiar
Seção III e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência
Da Autorização para Viajar familiar de crianças e adolescentes;
VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob forma
Art. 83. Nenhuma criança poderá viajar para fora de guarda de crianças e adolescentes afastados do convívio
da comarca onde reside, desacompanhada dos pais ou familiar e à adoção, especificamente inter-racial, de crianças
responsável, sem expressa autorização judicial. maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de
§ 1º A autorização não será exigida quando: saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos.
a) tratar-se de comarca contígua à da residência da
criança, se na mesma unidade da Federação, ou incluída na Art. 88. São diretrizes da política de atendimento:
mesma região metropolitana; I - municipalização do atendimento;

43
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

II - criação de conselhos municipais, estaduais e V - prestação de serviços à comunidade;


nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos VI - liberdade assistida;
deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, VII - semiliberdade; e
assegurada a participação popular paritária por meio de or- VIII - internação.
ganizações representativas, segundo leis federal, estaduais e § 1o  As entidades governamentais e não governamen-
municipais; tais deverão proceder à inscrição de seus programas, es-
III - criação e manutenção de programas específicos, pecificando os regimes de atendimento, na forma definida
observada a descentralização político-administrativa; neste artigo, no Conselho Municipal dos Direitos da Crian-
IV - manutenção de fundos nacional, estaduais e mu- ça e do Adolescente, o qual manterá registro das inscrições
nicipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da e de suas alterações, do que fará comunicação ao Conselho
criança e do adolescente; Tutelar e à autoridade judiciária.
V - integração operacional de órgãos do Judiciário, § 2o  Os recursos destinados à implementação e ma-
Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e As- nutenção dos programas relacionados neste artigo serão
sistência Social, preferencialmente em um mesmo local, previstos nas dotações orçamentárias dos órgãos públicos
para efeito de agilização do atendimento inicial a adoles- encarregados das áreas de Educação, Saúde e Assistência
cente a quem se atribua autoria de ato infracional; Social, dentre outros, observando-se o princípio da priori-
VI - integração operacional de órgãos do Judiciário, dade absoluta à criança e ao adolescente preconizado pelo
Ministério Público, Defensoria, Conselho Tutelar e en- caput do art. 227 da Constituição Federal e pelo caput e
carregados da execução das políticas sociais básicas e de parágrafo único do art. 4o desta Lei.
assistência social, para efeito de agilização do atendimento § 3o  Os programas em execução serão reavaliados pelo
de crianças e de adolescentes inseridos em programas de Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adoles-
acolhimento familiar ou institucional, com vista na sua rá- cente, no máximo, a cada 2 (dois) anos, constituindo-se
pida reintegração à família de origem ou, se tal solução se critérios para renovação da autorização de funcionamento:
mostrar comprovadamente inviável, sua colocação em famí- I - o efetivo respeito às regras e princípios desta Lei, bem
lia substituta, em quaisquer das modalidades previstas no como às resoluções relativas à modalidade de atendimento
art. 28 desta Lei; prestado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e
VII - mobilização da opinião pública para a indispen- do Adolescente, em todos os níveis; 
sável participação dos diversos segmentos da sociedade; II - a qualidade e eficiência do trabalho desenvolvido,
VIII - especialização e formação continuada dos pro- atestadas pelo Conselho Tutelar, pelo Ministério Público e
fissionais que trabalham nas diferentes áreas da atenção à pela Justiça da Infância e da Juventude; 
primeira infância, incluindo os conhecimentos sobre direitos III - em se tratando de programas de acolhimento insti-
da criança e sobre desenvolvimento infantil; tucional ou familiar, serão considerados os índices de sucesso
IX - formação profissional com abrangência dos di- na reintegração familiar ou de adaptação à família substitu-
versos direitos da criança e do adolescente que favoreça ta, conforme o caso.
a intersetorialidade no atendimento da criança e do adoles-
cente e seu desenvolvimento integral; Art. 91. As entidades não-governamentais somente
X - realização e divulgação de pesquisas sobre de- poderão funcionar depois de registradas no Conselho
senvolvimento infantil e sobre prevenção da violência. Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, o
qual comunicará o registro ao Conselho Tutelar e à autori-
Art. 89. A função de membro do conselho nacional e dos dade judiciária da respectiva localidade.
conselhos estaduais e municipais dos direitos da criança e do § 1o  Será negado o registro à entidade que: 
adolescente é considerada de interesse público relevante a) não ofereça instalações físicas em condições adequa-
e não será remunerada. das de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança;
b) não apresente plano de trabalho compatível com os
Capítulo II princípios desta Lei;
Das Entidades de Atendimento c) esteja irregularmente constituída;
d) tenha em seus quadros pessoas inidôneas.
Seção I e) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e
Disposições Gerais deliberações relativas à modalidade de atendimento pres-
tado expedidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do
Art. 90. As entidades de atendimento são respon- Adolescente, em todos os níveis.
sáveis pela manutenção das próprias unidades, assim § 2o  O registro terá validade máxima de 4 (quatro) anos,
como pelo planejamento e execução de programas de prote- cabendo ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e
ção e socioeducativos destinados a crianças e adolescentes, do Adolescente, periodicamente, reavaliar o cabimento de
em regime de:  sua renovação, observado o disposto no § 1o deste artigo.
I - orientação e apoio sociofamiliar;
II - apoio socioeducativo em meio aberto; Art. 92.  As entidades que desenvolvam programas de
III - colocação familiar; acolhimento familiar ou institucional deverão adotar os se-
IV - acolhimento institucional; guintes princípios:

44
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

I - preservação dos vínculos familiares e promoção Parágrafo único.  Recebida a comunicação, a autoridade
da reintegração familiar; judiciária, ouvido o Ministério Público e se necessário com o
II - integração em família substituta, quando esgotados apoio do Conselho Tutelar local, tomará as medidas neces-
os recursos de manutenção na família natural ou extensa; sárias para promover a imediata reintegração familiar da
III - atendimento personalizado e em pequenos grupos; criança ou do adolescente ou, se por qualquer razão não for
IV - desenvolvimento de atividades em regime de isso possível ou recomendável, para seu encaminhamento a
coeducação; programa de acolhimento familiar, institucional ou a família
V - não desmembramento de grupos de irmãos; substituta, observado o disposto no § 2o do art. 101 desta Lei. 
VI - evitar, sempre que possível, a transferência para
outras entidades de crianças e adolescentes abrigados; Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de
VII - participação na vida da comunidade local; internação têm as seguintes obrigações, entre outras:
VIII - preparação gradativa para o desligamento; I - observar os direitos e garantias de que são titula-
IX - participação de pessoas da comunidade no pro- res os adolescentes;
cesso educativo. II - não restringir nenhum direito que não tenha sido
§ 1o  O dirigente de entidade que desenvolve progra- objeto de restrição na decisão de internação;
ma de acolhimento institucional é equiparado ao guardião, III - oferecer atendimento personalizado, em peque-
para todos os efeitos de direito.  nas unidades e grupos reduzidos;
§ 2o  Os dirigentes de entidades que desenvolvem pro- IV - preservar a identidade e oferecer ambiente de
gramas de acolhimento familiar ou institucional remeterão respeito e dignidade ao adolescente;
à autoridade judiciária, no máximo a cada 6 (seis) meses, V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da
relatório circunstanciado acerca da situação de cada crian- preservação dos vínculos familiares;
ça ou adolescente acolhido e sua família, para fins da rea- VI - comunicar à autoridade judiciária, periodica-
valiação prevista no § 1o do art. 19 desta Lei.  mente, os casos em que se mostre inviável ou impossível o
§ 3o  Os entes federados, por intermédio dos Poderes reatamento dos vínculos familiares;
VII - oferecer instalações físicas em condições ade-
Executivo e Judiciário, promoverão conjuntamente a per-
quadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segu-
manente qualificação dos profissionais que atuam direta
rança e os objetos necessários à higiene pessoal;
ou indiretamente em programas de acolhimento institucio-
VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e
nal e destinados à colocação familiar de crianças e adoles-
adequados à faixa etária dos adolescentes atendidos;
centes, incluindo membros do Poder Judiciário, Ministério
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos, odonto-
Público e Conselho Tutelar. 
lógicos e farmacêuticos;
§ 4o  Salvo determinação em contrário da autorida-
X - propiciar escolarização e profissionalização;
de judiciária competente, as entidades que desenvolvem XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de
programas de acolhimento familiar ou institucional, se ne- lazer;
cessário com o auxílio do Conselho Tutelar e dos órgãos XII - propiciar assistência religiosa àqueles que deseja-
de assistência social, estimularão o contato da criança ou rem, de acordo com suas crenças;
adolescente com seus pais e parentes, em cumprimento ao XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
disposto nos incisos I e VIII do caput deste artigo.  XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com inter-
§ 5o  As entidades que desenvolvem programas de aco- valo máximo de seis meses, dando ciência dos resultados à
lhimento familiar ou institucional somente poderão rece- autoridade competente;
ber recursos públicos se comprovado o atendimento dos XV - informar, periodicamente, o adolescente interna-
princípios, exigências e finalidades desta Lei.  do sobre sua situação processual;
§ 6o  O descumprimento das disposições desta Lei XVI - comunicar às autoridades competentes todos os
pelo dirigente de entidade que desenvolva programas de casos de adolescentes portadores de moléstias infectocon-
acolhimento familiar ou institucional é causa de sua desti- tagiosas;
tuição, sem prejuízo da apuração de sua responsabilidade XVII - fornecer comprovante de depósito dos perten-
administrativa, civil e criminal.  ces dos adolescentes;
§ 7o  Quando se tratar de criança de 0 (zero) a 3 (três) XVIII - manter programas destinados ao apoio e
anos em acolhimento institucional, dar-se-á especial aten- acompanhamento de egressos;
ção à atuação de educadores de referência estáveis e quali- XIX - providenciar os documentos necessários ao
tativamente significativos, às rotinas específicas e ao atendi- exercício da cidadania àqueles que não os tiverem;
mento das necessidades básicas, incluindo as de afeto como XX - manter arquivo de anotações onde constem data
prioritárias.  e circunstâncias do atendimento, nome do adolescente, seus
pais ou responsável, parentes, endereços, sexo, idade, acom-
Art. 93.  As entidades que mantenham programa de panhamento da sua formação, relação de seus pertences e
acolhimento institucional poderão, em caráter excepcional demais dados que possibilitem sua identificação e a in-
e de urgência, acolher crianças e adolescentes sem prévia dividualização do atendimento.
determinação da autoridade competente, fazendo comuni- § 1o  Aplicam-se, no que couber, as obrigações cons-
cação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao Juiz da tantes deste artigo às entidades que mantêm programas
Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade.  de acolhimento institucional e familiar. 

45
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 2º No cumprimento das obrigações a que alude este Capítulo II


artigo as entidades utilizarão preferencialmente os recur- Das Medidas Específicas de Proteção
sos da comunidade.
Art. 99. As medidas previstas neste Capítulo poderão
Art. 94-A.  As entidades, públicas ou privadas, que abri- ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como
guem ou recepcionem crianças e adolescentes, ainda que em substituídas a qualquer tempo.
caráter temporário, devem ter, em seus quadros, profissio-
nais capacitados a reconhecer e reportar ao Conselho Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em con-
Tutelar suspeitas ou ocorrências de maus-tratos. ta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas
que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e co-
Seção II munitários.
Da Fiscalização das Entidades Parágrafo único.  São também princípios que regem a
aplicação das medidas: 
Art. 95. As entidades governamentais e não-governamen- I - condição da criança e do adolescente como sujeitos
tais referidas no art. 90 serão fiscalizadas pelo Judiciário, de direitos: crianças e adolescentes são os titulares dos direi-
pelo Ministério Público e pelos Conselhos Tutelares. tos previstos nesta e em outras Leis, bem como na Constitui-
ção Federal;  
Art. 96. Os planos de aplicação e as prestações de II - proteção integral e prioritária: a interpretação e apli-
contas serão apresentados ao estado ou ao município, cação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser
conforme a origem das dotações orçamentárias. voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que
crianças e adolescentes são titulares;  
Art. 97. São medidas aplicáveis às entidades de aten- III - responsabilidade primária e solidária do poder pú-
dimento que descumprirem obrigação constante do art. 94, blico: a plena efetivação dos direitos assegurados a crianças
sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal de e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição Federal,
seus dirigentes ou prepostos: salvo nos casos por esta expressamente ressalvados, é de
I - às entidades governamentais: responsabilidade primária e solidária das 3 (três) esferas de
a) advertência; governo, sem prejuízo da municipalização do atendimento
b) afastamento provisório de seus dirigentes; e da possibilidade da execução de programas por entidades
c) afastamento definitivo de seus dirigentes; não governamentais;  
d) fechamento de unidade ou interdição de programa. IV - interesse superior da criança e do adolescente: a in-
II - às entidades não-governamentais: tervenção deve atender prioritariamente aos interesses e di-
a) advertência; reitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da conside-
b) suspensão total ou parcial do repasse de verbas ração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito
públicas; da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;  
c) interdição de unidades ou suspensão de programa; V - privacidade: a promoção dos direitos e proteção da
d) cassação do registro. criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela
§ 1o  Em caso de reiteradas infrações cometidas por intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; 
entidades de atendimento, que coloquem em risco os di- VI - intervenção precoce: a intervenção das autoridades
reitos assegurados nesta Lei, deverá ser o fato comunicado competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo
ao Ministério Público ou representado perante autoridade seja conhecida;  
judiciária competente para as providências cabíveis, inclu- VII - intervenção mínima: a intervenção deve ser exerci-
sive suspensão das atividades ou dissolução da entidade.  da exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação
§ 2o  As pessoas jurídicas de direito público e as organi- seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à prote-
zações não governamentais responderão pelos danos que ção da criança e do adolescente; 
seus agentes causarem às crianças e aos adolescentes, ca- VIII - proporcionalidade e atualidade: a intervenção
racterizado o descumprimento dos princípios norteadores deve ser a necessária e adequada à situação de perigo em
das atividades de proteção específica.  que a criança ou o adolescente se encontram no momento
em que a decisão é tomada; 
Título II IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser
Das Medidas de Proteção efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres
para com a criança e o adolescente; 
Capítulo I X - prevalência da família: na promoção de direitos e na
Disposições Gerais proteção da criança e do adolescente deve ser dada preva-
lência às medidas que os mantenham ou reintegrem na sua
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adoles- família natural ou extensa ou, se isso não for possível, que
cente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos promovam a sua integração em família adotiva;
nesta Lei forem ameaçados ou violados: XI - obrigatoriedade da informação: a criança e o ado-
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; lescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e capa-
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou respon- cidade de compreensão, seus pais ou responsável devem ser
sável; informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram
III - em razão de sua conduta. a intervenção e da forma como esta se processa; 

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

XII - oitiva obrigatória e participação: a criança e o ado- ressalvada a existência de ordem escrita e fundamentada
lescente, em separado ou na companhia dos pais, de respon- em contrário de autoridade judiciária competente, caso em
sável ou de pessoa por si indicada, bem como os seus pais que também deverá contemplar sua colocação em família
ou responsável, têm direito a ser ouvidos e a participar nos substituta, observadas as regras e princípios desta Lei. 
atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de § 5o  O plano individual será elaborado sob a respon-
proteção, sendo sua opinião devidamente considerada pela sabilidade da equipe técnica do respectivo programa de
autoridade judiciária competente, observado o disposto nos atendimento e levará em consideração a opinião da criança
§§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei.  ou do adolescente e a oitiva dos pais ou do responsável. 
§ 6o  Constarão do plano individual, dentre outros: 
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no I - os resultados da avaliação interdisciplinar; 
art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre II - os compromissos assumidos pelos pais ou respon-
outras, as seguintes medidas: sável; e 
I - encaminhamento aos pais ou responsável, me- III - a previsão das atividades a serem desenvolvidas com
diante termo de responsabilidade; a criança ou com o adolescente acolhido e seus pais ou res-
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; ponsável, com vista na reintegração familiar ou, caso seja
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabele- esta vedada por expressa e fundamentada determinação ju-
cimento oficial de ensino fundamental; dicial, as providências a serem tomadas para sua colocação
IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou co- em família substituta, sob direta supervisão da autoridade
munitários de proteção, apoio e promoção da família, da judiciária. 
criança e do adolescente; § 7o  O acolhimento familiar ou institucional ocorrerá
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou no local mais próximo à residência dos pais ou do respon-
psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; sável e, como parte do processo de reintegração familiar,
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário sempre que identificada a necessidade, a família de origem
de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxi- será incluída em programas oficiais de orientação, de apoio
cômanos; e de promoção social, sendo facilitado e estimulado o con-
VII - acolhimento institucional;   tato com a criança ou com o adolescente acolhido. 
VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;  § 8o  Verificada a possibilidade de reintegração familiar,
IX - colocação em família substituta.  o responsável pelo programa de acolhimento familiar ou
§ 1o O acolhimento institucional e o acolhimento fa- institucional fará imediata comunicação à autoridade judi-
miliar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis ciária, que dará vista ao Ministério Público, pelo prazo de 5
como forma de transição para reintegração familiar ou, não (cinco) dias, decidindo em igual prazo.
sendo esta possível, para colocação em família substituta, § 9o  Em sendo constatada a impossibilidade de reinte-
não implicando privação de liberdade.  gração da criança ou do adolescente à família de origem,
§ 2o  Sem prejuízo da tomada de medidas emergenciais após seu encaminhamento a programas oficiais ou comu-
para proteção de vítimas de violência ou abuso sexual e nitários de orientação, apoio e promoção social, será envia-
das providências a que alude o art. 130 desta Lei, o afasta- do relatório fundamentado ao Ministério Público, no qual
mento da criança ou adolescente do convívio familiar é de conste a descrição pormenorizada das providências toma-
competência exclusiva da autoridade judiciária e importará das e a expressa recomendação, subscrita pelos técnicos
na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem da entidade ou responsáveis pela execução da política mu-
tenha legítimo interesse, de procedimento judicial conten- nicipal de garantia do direito à convivência familiar, para a
cioso, no qual se garanta aos pais ou ao responsável legal destituição do poder familiar, ou destituição de tutela ou
o exercício do contraditório e da ampla defesa. guarda. 
§ 3o  Crianças e adolescentes somente poderão ser enca- § 10. Recebido o relatório, o Ministério Público terá o
minhados às instituições que executam programas de aco- prazo de 15 (quinze) dias para o ingresso com a ação de
lhimento institucional, governamentais ou não, por meio de destituição do poder familiar, salvo se entender necessária
uma Guia de Acolhimento, expedida pela autoridade judiciá- a realização de estudos complementares ou de outras pro-
ria, na qual obrigatoriamente constará, dentre outros:  vidências indispensáveis ao ajuizamento da demanda.
I - sua identificação e a qualificação completa de seus § 11. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca
pais ou de seu responsável, se conhecidos;  ou foro regional, um cadastro contendo informações atua-
II - o endereço de residência dos pais ou do responsável, lizadas sobre as crianças e adolescentes em regime de aco-
com pontos de referência;  lhimento familiar e institucional sob sua responsabilidade,
III - os nomes de parentes ou de terceiros interessados com informações pormenorizadas sobre a situação jurídica
em tê-los sob sua guarda;  de cada um, bem como as providências tomadas para sua
IV - os motivos da retirada ou da não reintegração ao reintegração familiar ou colocação em família substituta,
convívio familiar.  em qualquer das modalidades previstas no art. 28 desta
§ 4o  Imediatamente após o acolhimento da criança ou Lei. 
do adolescente, a entidade responsável pelo programa de § 12. Terão acesso ao cadastro o Ministério Público, o Con-
acolhimento institucional ou familiar elaborará um plano selho Tutelar, o órgão gestor da Assistência Social e os Con-
individual de atendimento, visando à reintegração familiar, selhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

da Assistência Social, aos quais incumbe deliberar sobre a - abrigo em entidade (não se fala em orfanato). A dou-
implementação de políticas públicas que permitam reduzir trina chama de “Tutela de Estado” quando a criança está
o número de crianças e adolescentes afastados do convívio em abrigo sob a proteção do Estado;
familiar e abreviar o período de permanência em programa - colocação em família substituta (é utilizada somente
de acolhimento. em situações muito graves).
O Juiz pode aplicar essas medidas isolada ou cumulati-
Art. 102. As medidas de proteção de que trata este Capítu- vamente. Pode, também, substituir uma medida pela outra
lo serão acompanhadas da regularização do registro civil.  a qualquer tempo (art. 99 do ECA). Antes de aplicar qual-
§ 1º Verificada a inexistência de registro anterior, o as- quer uma dessas medidas, o Juiz deverá ouvir os pais ou
sento de nascimento da criança ou adolescente será feito responsáveis, realizar estudo social do caso e ouvir o MP.
à vista dos elementos disponíveis, mediante requisição da Essa oitiva do MP é obrigatória, sob pena de nulidade (art.
autoridade judiciária. 204 do ECA). Esse rol do art. 101 é taxativo.
§ 2º Os registros e certidões necessários à regulariza-
ção de que trata este artigo são isentos de multas, custas e
Título III
emolumentos, gozando de absoluta prioridade.
Da Prática de Ato Infracional
§ 3o  Caso ainda não definida a paternidade, será  defla-
grado procedimento específico destinado à sua averigua-
ção, conforme previsto pela Lei no 8.560, de 29 de dezem- Capítulo I
bro de 1992.  Disposições Gerais
§ 4o  Nas hipóteses previstas no § 3o deste artigo, é dis-
pensável o ajuizamento de ação de investigação de pater- Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta des-
nidade pelo Ministério Público se, após o não compareci- crita como crime ou contravenção penal.
mento ou a recusa do suposto pai em assumir a paternida-
de a ele atribuída, a criança for encaminhada para adoção.  Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores
§ 5º Os registros e certidões necessários à inclusão, a de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
qualquer tempo, do nome do pai no assento de nascimento Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser con-
são isentos de multas, custas e emolumentos, gozando de siderada a idade do adolescente à data do fato.
absoluta prioridade.
§ 6º São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação re- Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança
querida do reconhecimento de paternidade no assento de corresponderão as medidas previstas no art. 101.
nascimento e a certidão correspondente.
Capítulo II
As normas de prevenção do ECA são destinadas a Dos Direitos Individuais
crianças e adolescentes em situação de risco. Existirá situa-
ção de risco quando a criança ou o adolescente estiverem Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua
privados de assistência. Essa assistência pode ser material liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por
(quando não se tem onde dormir, o que comer, vestir etc.), ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária
moral (quando a criança ou o adolescente permanece em competente.
local inadequado, como locais de prática de jogo, prostitui- Parágrafo único. O adolescente tem direito à identifi-
ção etc.) ou jurídica (quando não tem quem o represente). cação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser
O menor que pratica ato infracional está em situação
informado acerca de seus direitos.
de risco por estar privado de assistência moral. A situação
de risco pode decorrer de ação ou omissão do Poder Pú-
Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local
blico; ação ou omissão dos pais ou dos responsáveis; por
conduta própria. onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados
O art. 101 do ECA traz um rol das medidas protetivas à autoridade judiciária competente e à família do apreendi-
diante da situação de risco. Essas medidas poderão ser do ou à pessoa por ele indicada.
aplicadas tanto para a criança quanto para o adolescente. Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de
São elas: responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.
- encaminhamento da criança e do adolescente aos
pais ou responsáveis, mediante termo ou responsabilidade; Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser de-
- orientação, apoio e acompanhamentos temporários terminada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.
por pessoa nomeada pelo Juiz; Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e
- matrícula e frequência obrigatória em estabelecimen- basear-se em indícios suficientes de autoria e materia-
to oficial de ensino fundamental (o Juiz determina aos pais lidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.
a obrigação);
- inclusão em programa comunitário ou oficial de auxí- Art. 109. O adolescente civilmente identificado não
lio à família, à criança e ao adolescente; será submetido a identificação compulsória pelos ór-
- requisição de tratamento médico, psicológico ou psi- gãos policiais, de proteção e judiciais, salvo para efeito
quiátrico em regime hospitalar (internação) ou ambulato- de confrontação, havendo dúvida fundada.
rial (consultas periódicas);

48
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

O adolescente não é preso, é apreendido. Art. 114. A imposição das medidas previstas nos incisos
A internação é a medida mais gravosa para o adoles- II a VI do art. 112 pressupõe a existência de provas suficien-
cente. O ECA permite a internação provisória durante o tes da autoria e da materialidade da infração, ressalva-
processo. É fixado o prazo máximo de 45 dias. Os funda- da a hipótese de remissão, nos termos do art. 127.
mentos para que o Juiz decrete essa internação provisória Parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada
são: indícios suficientes de autoria e materialidade e neces- sempre que houver prova da materialidade e indícios sufi-
sidade da medida. cientes da autoria.
Esse prazo de internação provisória será descontado
na internação definitiva. Em nenhuma hipótese a criança As medidas socioeducativas dependem de um proce-
poderá ser internada. Criança, que é todo aquele menor dimento judicial, só podendo ser aplicadas pelo Juiz. O ECA
de 12 anos, não se sujeita a medida sócio-educativa, mas apresenta dois critérios genéricos para a aplicação de me-
apenas a medida de proteção. dida socioeducativa:
- capacidade do adolescente para cumprir a medida;
Capítulo III
- circunstâncias e gravidade da infração.
Das Garantias Processuais
A internação é uma exceção, existindo hipóteses legais
Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua liber- para sua aplicação.
dade sem o devido processo legal. A medida de segurança não poderá ser aplicada ao
adolescente, tendo em vista ser medida para maior de ida-
Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, de que apresenta periculosidade. No caso de adolescente
as seguintes garantias: doente mental, será aplicada medida de proteção, poden-
I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato do ser requisitado tratamento médico.
infracional, mediante citação ou meio equivalente; O Juiz poderá cumular medidas socioeducativas, desde
II - igualdade na relação processual, podendo con- que sejam compatíveis (ex.: prestação de serviço à comu-
frontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as nidade cumulada com reparação de danos). Com exceção
provas necessárias à sua defesa; da internação, o Juiz poderá substituir as medidas socioe-
III - defesa técnica por advogado; ducativas de acordo com o caso concreto, visto não haver
IV - assistência judiciária gratuita e integral aos ne- taxatividade.
cessitados, na forma da lei; Se o Promotor discordar com a medida socioeducati-
V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade va aplicada, deverá entrar com recurso de apelação. Essa
competente; apelação do ECA possui juízo de retratação, ou seja, o Juiz
VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou pode voltar atrás na decisão. O Tribunal competente para
responsável em qualquer fase do procedimento. julgar essa apelação é o TJ.

Capítulo IV Seção II
Das Medidas Socioeducativas Da Advertência
Seção I Art. 115. A advertência consistirá em admoestação
Disposições Gerais verbal, que será reduzida a termo e assinada.
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autori-
Disposta no art. 115 do ECA, é uma medida sócio-e-
dade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes
ducativa que consiste em uma admoestação verbal que é
medidas:
aplicada pelo Juiz ao adolescente e que é reduzida a termo.
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano; É destinada a atos de menor gravidade.
III - prestação de serviços à comunidade; Para a aplicação da advertência, o Juiz deve levar em
IV - liberdade assistida; consideração a prova da materialidade e indícios suficien-
V - inserção em regime de semi-liberdade; tes de autoria. É a única medida que o Juiz poderá aplicar
VI - internação em estabelecimento educacional; fundamentando-se somente em indícios de autoria.
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em con- Seção III
ta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a Da Obrigação de Reparar o Dano
gravidade da infração.
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será Art. 116. Em se tratando de ato infracional com refle-
admitida a prestação de trabalho forçado. xos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou defi- caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressar-
ciência mental receberão tratamento individual e espe- cimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo
cializado, em local adequado às suas condições. da vítima.
Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a
Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts. medida poderá ser substituída por outra adequada.
99 e 100.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Obrigação de reparar o dano (art. 116 do ECA). Há um É a última medida em que o adolescente permanece
pressuposto: o ato infracional deve ter causado um dano à com sua família. O Juiz irá determinar um acompanhamen-
vítima. Essa reparação é para a vítima que sofreu o dano. É to permanente ao adolescente, designando, para isso, um
uma medida voltada para o adolescente, então deve ser es- orientador, que poderá ser substituído a qualquer tempo. A
tabelecida de acordo com a possibilidade de cumprimento lei fixa um prazo mínimo de 6 meses para a duração dessa
pelo adolescente (ex.: devolução da coisa furtada, peque- medida. O orientador terá as seguintes obrigações legais:
nos serviços a título de reparação etc.). - promover socialmente o adolescente, bem como a
A jurisprudência admite que essa reparação de dano sua família, inserindo-os em programas sociais. Promover
pode ser aplicada à criança (ex.: devolução da coisa furtada). socialmente é fazer com que o adolescente realize ativida-
des valorizadas socialmente (teatro, música etc.);
Seção IV - supervisionar a frequência e o aproveitamento esco-
Da Prestação de Serviços à Comunidade lar do adolescente;
- profissionalizar o adolescente (nos termos da EC n. 20);
Art. 117. A prestação de serviços comunitários consis-
- apresentar relatório do caso ao Juiz.
te na realização de tarefas gratuitas de interesse geral,
por período não excedente a seis meses, junto a entida-
des assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimen- Seção VI
tos congêneres, bem como em programas comunitários ou Do Regime de Semiliberdade
governamentais.
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determi-
aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jor- nado desde o início, ou como forma de transição para o
nada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domin- meio aberto, possibilitada a realização de atividades exter-
gos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a nas, independentemente de autorização judicial.
frequência à escola ou à jornada normal de trabalho. § 1º São obrigatórias a escolarização e a profissio-
nalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os
Disposta no art. 117 do ECA, o adolescente será obri- recursos existentes na comunidade.
gado a prestar serviços em benefício da coletividade. São § 2º A medida não comporta prazo determinado
tarefas gratuitas de interesse geral junto a entidades assis- aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à in-
tenciais, hospitais, escolas ou estabelecimentos congêneres. ternação.
Como a medida é mais gravosa, a lei fixa um prazo
máximo de 6 meses para essa prestação e um máximo de Disposta no art. 120 do ECA, é uma medida que impor-
8 horas semanais. Essas 8 horas poderão ser estabeleci- ta em privação de liberdade ao adolescente que pratica um
das discricionariamente, desde que não prejudiquem a fre- ato infracional mais grave. O adolescente é retirado de sua
quência ao trabalho e à escola. Deverá ser levada em conta família e colocado em um estabelecimento apropriado de
a aptidão do adolescente para a aplicação da medida. semiliberdade, podendo realizar atividades externas (estu-
dar, trabalhar etc.) somente com autorização do diretor do
Seção V estabelecimento, não havendo necessidade de autorização
Da Liberdade Assistida judicial. Pode ser usada tanto como medida principal quan-
to como medida progressiva ou regressiva.
Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre A semiliberdade não tem prazo fixado em lei, nem míni-
que se afigurar a medida mais adequada para o fim de
mo nem máximo. A doutrina e a jurisprudência determinam
acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.
a aplicação da medida por analogia dos prazos da interna-
§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para
ção, tendo como prazo máximo 3 anos. Há a obrigatorieda-
acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por
entidade ou programa de atendimento. de de escolarização e profissionalização na semiliberdade.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo míni-
mo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorro- Seção VII
gada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o Da Internação
orientador, o Ministério Público e o defensor.
Art. 121. A internação constitui medida privativa da
Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a su- liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcio-
pervisão da autoridade competente, a realização dos seguin- nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
tes encargos, entre outros: desenvolvimento.
I - promover socialmente o adolescente e sua família, for- § 1º Será permitida a realização de atividades externas,
necendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em pro- a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa de-
grama oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; terminação judicial em contrário.
II - supervisionar a frequência e o aproveitamento es- § 2º A medida não comporta prazo determinado, de-
colar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; vendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão
III - diligenciar no sentido da profissionalização do ado- fundamentada, no máximo a cada seis meses.
lescente e de sua inserção no mercado de trabalho; § 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de inter-
IV - apresentar relatório do caso. nação excederá a três anos.

50
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo ante- § 2º A autoridade judiciária poderá suspender tem-
rior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regi- porariamente a visita, inclusive de pais ou responsável, se
me de semiliberdade ou de liberdade assistida. existirem motivos sérios e fundados de sua prejudicialida-
§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de aos interesses do adolescente.
de idade.
§ 6º Em qualquer hipótese a desinternação será prece- Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física
dida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público. e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas ade-
§ 7o  A determinação judicial mencionada no § 1o pode- quadas de contenção e segurança.
rá ser revista a qualquer tempo pela autoridade judiciária.
Disposta no art. 121 e seguintes do ECA, é a medida re-
Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada servada para os atos infracionais de natureza grave. O ECA
quando: estabelece princípios específicos para a internação, pois é
I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave medida de privação de liberdade sempre excepcional.
ameaça ou violência a pessoa; A internação deve durar o menor tempo possível (prin-
II - por reiteração no cometimento de outras infrações cípio da brevidade), é uma medida de exceção que só de-
graves; verá ser utilizada em último caso (princípio da excepcio-
III - por descumprimento reiterado e injustificável da nalidade) e deve seguir o princípio do respeito à condição
medida anteriormente imposta. peculiar do adolescente como pessoa em desenvolvimen-
§ 1o  O prazo de internação na hipótese do inciso III des- to. Em nenhuma hipótese pode ser aplicada à criança.
te artigo não poderá ser superior a 3 (três) meses, devendo O ECA estabelece hipóteses de internação para:
ser decretada judicialmente após o devido processo legal. - prática de ato infracional mediante grave ameaça ou
§ 2º Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, violência à pessoa;
havendo outra medida adequada. - reiteração de infrações graves;
- descumprimento reiterado e injustificado da medi-
da anteriormente imposta (é uma hipótese de regressão).
Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entida-
Neste caso, a internação não pode ultrapassar o prazo de
de exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele
3 meses.
destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por cri-
Nas duas primeiras hipóteses, o prazo máximo para in-
térios de idade, compleição física e gravidade da infração.
ternação é de 3 anos. Por força desse prazo, o ECA poderá
Parágrafo único. Durante o período de internação, inclu-
atingir o maior de 18 anos. Em rigor, todas as medidas só-
sive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas.
cio-educativas poderão atingir o maior de 18 anos.
A medida só poderá ser aplicada com o devido pro-
Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberda- cesso legal e em nenhuma hipótese poderá ser aplicada à
de, entre outros, os seguintes: criança. Quando o adolescente completar 21 anos, a libe-
I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do ração será obrigatória. Caso o adolescente tenha passado
Ministério Público; por internação provisória, esses dias serão computados na
II - peticionar diretamente a qualquer autoridade; internação (detração). A diferença entre semi-liberdade e
III - avistar-se reservadamente com seu defensor; internação é que, nesta, o adolescente depende de auto-
IV - ser informado de sua situação processual, sempre rização expressa do juiz para praticar atividades externas,
que solicitada; ou seja, o adolescente internado somente se ausentará do
V - ser tratado com respeito e dignidade; estabelecimento em que se achar se autorizado pelo juiz.
VI - permanecer internado na mesma localidade ou na- O art. 123 dispõe que o local para a internação deve
quela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável; ser distinto do abrigo, devendo-se obedecer a separação
VII - receber visitas, ao menos, semanalmente; por idade, composição física (tamanho), sexo e gravidade
VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos; do ato infracional. Há, também, a obrigatoriedade de reali-
IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio zação de atividades pedagógicas.
pessoal; O art. 124 dispõe sobre direitos específicos dos ado-
X - habitar alojamento em condições adequadas de hi- lescentes:
giene e salubridade; - entrevista pessoal com o representante do MP;
XI - receber escolarização e profissionalização; - entrevista reservada com seu defensor, dentre outros.
XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer: As visitas podem ser suspensas pelo juiz, sob o funda-
XIII - ter acesso aos meios de comunicação social; mento de segurança e proteção do menor, entretanto, em
XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, nenhuma hipótese o menor poderá ficar incomunicável.
e desde que assim o deseje;
XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de Capítulo V
local seguro para guardá-los, recebendo comprovante da- Da Remissão
queles porventura depositados em poder da entidade;
XVI - receber, quando de sua desinternação, os docu- Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial
mentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade. para apuração de ato infracional, o representante do
§ 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade. Ministério Público poderá conceder a remissão, como

51
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias - maior ou menor participação no ato infracional.
e consequências do fato, ao contexto social, bem como à per- A remissão, quer concedida pelo MP quer pelo Juiz,
sonalidade do adolescente e sua maior ou menor participa- não implica confissão de culpa. Existe uma divergência na
ção no ato infracional. doutrina em considerar a remissão como um acordo ou
Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão não. A posição majoritária entende que a remissão não é
da remissão pela autoridade judiciária importará na suspen- um acordo, tendo em vista a lei falar em concessão e, ain-
são ou extinção do processo. da, pelo fato de não haver nenhum prejuízo para o adoles-
cente, não possuindo a remissão nenhum efeito, podendo
Art. 127. A remissão não implica necessariamente o ser concedida quantas vezes forem necessárias.
reconhecimento ou comprovação da responsabilidade,
nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo in- Título IV
cluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas Das Medidas Pertinentes aos Pais ou Responsável
previstas em lei, exceto a colocação em regime de semi-li-
berdade e a internação. Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:
I - encaminhamento a serviços e programas oficiais ou
Art. 128. A medida aplicada por força da remissão pode- comunitários de proteção, apoio e promoção da família;
rá ser revista judicialmente, a qualquer tempo, mediante II - inclusão em programa oficial ou comunitário de au-
pedido expresso do adolescente ou de seu representante le- xílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
gal, ou do Ministério Público. III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psi-
quiátrico;
Tem por conceito o perdão, a indulgência ao menor. IV - encaminhamento a cursos ou programas de orien-
Podem conceder remissão tanto o MP quanto o Juiz. São tação;
hipóteses de natureza jurídica diferentes. A remissão ju- V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompa-
dicial é forma de extinção ou de suspensão do processo nhar sua frequência e aproveitamento escolar;
VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente
(portanto, pressupõe o processo em curso). Já a remissão
a tratamento especializado;
ministerial é forma de exclusão do processo (logo, deve
VII - advertência;
ser concedida antes do processo - administrativamente).
VIII - perda da guarda;
Quando a remissão é concedida pelo MP, segue-se o se-
IX - destituição da tutela;
guinte procedimento:
X - suspensão ou destituição do poder familiar.
- o menor é ouvido pelo Promotor que concederá a
Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas
remissão;
nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos
- o Promotor encaminha a remissão para homologação arts. 23 e 24.
pelo Juiz;
- se o Juiz não aceitar a remissão, deverá remeter para Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão
o Procurador de Justiça, que poderá insistir na remissão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a auto-
ou designar outro representante do MP para apresentar ridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar,
representação contra o menor. Essa remissão concedida o afastamento do agressor da moradia comum.
pelo MP é causa de exclusão do processo, visto que, ao Parágrafo único.  Da medida cautelar constará, ainda, a
conceder a remissão, inexiste o processo. fixação provisória dos alimentos de que necessitem a criança
Quando a remissão é concedida pelo Juiz, segue-se o ou o adolescente dependentes do agressor.
seguinte procedimento:
- o Promotor oferece a representação; Capítulo I
- na audiência de apresentação, o menor será ouvido Disposições Gerais
pelo Juiz, que poderá decidir pela remissão;
- o representante do MP deverá, obrigatoriamente, ser Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e au-
ouvido sobre a possibilidade da remissão antes de ela ser tônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de
aplicada. A remissão concedida pelo Juiz causa extinção do zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adoles-
processo. Havendo discordância por parte do MP, este deverá cente, definidos nesta Lei.
ingressar com uma apelação para reformar a decisão do Juiz.
Tanto a doutrina quanto a jurisprudência admitem a Art. 132.  Em cada Município e em cada Região Admi-
cumulação da remissão com uma medida sócio-educativa nistrativa do Distrito Federal haverá, no mínimo, 1 (um)
que seja compatível (ex.: reparação do dano, advertência etc.). Conselho Tutelar como órgão integrante da administração
Neste caso, a remissão é causa de suspensão do processo. pública local, composto de 5 (cinco) membros, escolhidos
O ECA traz quatro requisitos genéricos para a aplicação pela população local para mandato de 4 (quatro) anos,
da remissão, devendo ficar a critério do membro do MP ou permitida 1 (uma) recondução, mediante novo processo
do Juiz a sua concessão. São eles: de escolha. 
- circunstâncias e conseqüências do fato;
- contexto social em que o fato foi praticado; Art. 133. Para a candidatura a membro do Conselho
- personalidade do agente; Tutelar, serão exigidos os seguintes requisitos:

52
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

I - reconhecida idoneidade moral; XII - promover e incentivar, na comunidade e nos gru-


II - idade superior a vinte e um anos; pos profissionais, ações de divulgação e treinamento para o
III - residir no município. reconhecimento de sintomas de maus-tratos em crianças e
adolescentes.
Art. 134.  Lei municipal ou distrital disporá sobre o Parágrafo único.  Se, no exercício de suas atribuições, o
local, dia e horário de funcionamento do Conselho Tu- Conselho Tutelar entender necessário o afastamento do con-
telar, inclusive quanto à remuneração dos respectivos mem- vívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério
bros, aos quais é assegurado o direito a: Público, prestando-lhe informações sobre os motivos de tal
I - cobertura previdenciária; 
entendimento e as providências tomadas para a orientação,
II - gozo de férias anuais remuneradas, acrescidas de 1/3
o apoio e a promoção social da família. 
(um terço) do valor da remuneração mensal;
III - licença-maternidade;
IV - licença-paternidade;  Art. 137. As decisões do Conselho Tutelar somente po-
V - gratificação natalina.  derão ser revistas pela autoridade judiciária a pedido de
Parágrafo único.  Constará da lei orçamentária munici- quem tenha legítimo interesse.
pal e da do Distrito Federal previsão dos recursos necessários
ao funcionamento do Conselho Tutelar e à remuneração e Capítulo III
formação continuada dos conselheiros tutelares. Da Competência

Art. 135.  O exercício efetivo da função de conselheiro Art. 138. Aplica-se ao Conselho Tutelar a regra de com-
constituirá serviço público relevante e estabelecerá presun- petência constante do art. 147.
ção de idoneidade moral. 
Capítulo IV
Capítulo II Da Escolha dos Conselheiros
Das Atribuições do Conselho
Art. 139. O processo para a escolha dos membros do
Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar: Conselho Tutelar será estabelecido em lei municipal e rea-
I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses pre- lizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal dos
vistas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no
Direitos da Criança e do Adolescente, e a fiscalização do
art. 101, I a VII;
Ministério Público. 
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplican-
do as medidas previstas no art. 129, I a VII; § 1o  O processo de escolha dos membros do Conse-
III - promover a execução de suas decisões, podendo lho Tutelar ocorrerá em data unificada em todo o territó-
para tanto: rio nacional a cada 4 (quatro) anos, no primeiro domingo
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, edu- do mês de outubro do ano subsequente ao da eleição
cação, serviço social, previdência, trabalho e segurança; presidencial. 
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de § 2o  A posse dos conselheiros tutelares ocorrerá no dia
descumprimento injustificado de suas deliberações. 10 de janeiro do ano subsequente ao processo de escolha. 
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato § 3o  No processo de escolha dos membros do Con-
que constitua infração administrativa ou penal contra os di- selho Tutelar, é vedado ao candidato doar, oferecer, pro-
reitos da criança ou adolescente; meter ou entregar ao eleitor bem ou vantagem pessoal de
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua qualquer natureza, inclusive brindes de pequeno valor. 
competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade Capítulo V
judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o Dos Impedimentos
adolescente autor de ato infracional;
VII - expedir notificações; Art. 140. São impedidos de servir no mesmo Conse-
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de
lho marido e mulher, ascendentes e descendentes, sogro
criança ou adolescente quando necessário;
e genro ou nora, irmãos, cunhados, durante o cunhadio,
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da
tio e sobrinho, padrasto ou madrasta e enteado.
proposta orçamentária para planos e programas de atendi-
mento dos direitos da criança e do adolescente; Parágrafo único. Estende-se o impedimento do conse-
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra lheiro, na forma deste artigo, em relação à autoridade judi-
a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da ciária e ao representante do Ministério Público com atuação
Constituição Federal; na Justiça da Infância e da Juventude, em exercício na co-
XI - representar ao Ministério Público para efeito das marca, foro regional ou distrital.
ações de perda ou suspensão do poder familiar, após esgota-
das as possibilidades de manutenção da criança ou do ado-
lescente junto à família natural;

53
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Título VI Jurisdição é o poder-dever do Estado de dizer o Direi-


Do Acesso à Justiça to. Sendo assim, trata-se de atividade estatal exercida por
intermédio de um agente constituído com competência
Capítulo I para exercê-la, o juiz.
Disposições Gerais Nos primórdios da humanidade não existia o Direito e
nem existiam as leis, de modo que a justiça era feita pelas
Art. 141. É garantido o acesso de toda criança ou próprias mãos, na denominada autotutela. Com a evolução
adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério Público das instituições, o Estado avocou para si o poder-dever de
e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos. solucionar os litígios, o que é feito pela jurisdição.
§ 1º. A assistência judiciária gratuita será prestada aos O poder-dever de dizer o direito é uno, apenas existin-
que dela necessitarem, através de defensor público ou ad- do uma separação de funções: o Legislativo regulamenta
vogado nomeado. normas gerais e abstratas (função legislativa) e o Judiciário
§ 2º As ações judiciais da competência da Justiça da
as aplica no caso concreto (função jurisdicional).
Infância e da Juventude são isentas de custas e emolu-
Entretanto, vale destacar que na sociedade contempo-
mentos, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé.
rânea, devido às inúmeras mazelas que se apresentaram
envolvendo o abarrotamento de processos pelo Judiciário,
Art. 142. Os menores de dezesseis anos serão repre-
sentados e os maiores de dezesseis e menores de vinte e passou-se a incentivar a adoção de métodos de autocom-
um anos assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na posição, como conciliação, mediação e arbitragem.
forma da legislação civil ou processual. Tradicionalmente, são enumerados pela doutrina os
Parágrafo único. A autoridade judiciária dará curador seguintes princípios inerentes à jurisdição: investidura,
especial à criança ou adolescente, sempre que os interes- porque somente exerce jurisdição quem ocupa o cargo de
ses destes colidirem com os de seus pais ou responsável, ou juiz; aderência ao território, posto que juízes somente têm
quando carecer de representação ou assistência legal ainda autoridade no território nacional e nos limites de sua com-
que eventual. petência; indelegabilidade, não podendo o Poder Judiciário
delegar sua competência; inafastabilidade, pois a lei não
Art. 143. E vedada a divulgação de atos judiciais, po- pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma
liciais e administrativos que digam respeito a crianças e lesão ou ameaça a direito.
adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. Embora a jurisdição seja una, em termos doutrinários
Parágrafo único. Qualquer notícia a respeito do fato é possível classificá-la: a) quanto ao objeto – penal, traba-
não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se lhista e civil (a civil é subsidiária, envolvendo todo direito
fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco, material que não seja penal ou trabalhista, não somente
residência e, inclusive, iniciais do nome e sobrenome.  questões inerentes ao direito civil); b) quanto ao organismo
que a exerce – comum (estadual ou federal) ou especial
Art. 144. A expedição de cópia ou certidão de atos a (trabalhista, militar, eleitoral); c) quanto à hierarquia – su-
que se refere o artigo anterior somente será deferida pela perior e inferior.
autoridade judiciária competente, se demonstrado o interes- Neste sentido, com vistas a instrumentalizar a jurisdi-
se e justificada a finalidade. ção, impedindo que ela seja exercida de maneira caótica,
ela é distribuída entre juízos e foros (órgãos competentes
O homem necessita do convívio social, não é um ser em localidades determinadas). A esta distribuição das par-
capaz de viver de maneira autônoma e totalmente des- celas de jurisdição dá-se o nome de competência.
vinculada dos demais. Neste sentido, a imposição de re-
As tutelas jurisdicionais diferenciadas, por sua vez,
gramentos e normas permitiu que a sociedade atingisse o
são aquelas que apresentam procedimentos diversos do
atual grau de evolução.
comum. Possuem procedimentos ditos especiais, os quais
Obviamente, no ambiente social surgem conflitos de
buscam garantir um processo mais rápido e compatível
interesses. Afinal, nem sempre os bens e valores existem
em quantidade suficiente para atender a todas as pessoas. com as necessidades específicas do direito em discussão.
Inicialmente, estes conflitos eram solucionados pelos pró- No âmbito do direito da criança e do adolescente, tem-se
prios envolvidos, na denominada fase da autotutela. o estabelecimento de uma tutela jurisdicional diferencia-
Contudo, a solução possibilidade pela autotutela era da, eis que existem inúmeras regras específicas aplicáveis
bastante insatisfatória e fazia com que prevalecesse a lei do aos processos que envolvem de algum modo criança ou
mais forte. Então, surgiu o Estado apresentando um melhor adolescente.
sistema para a solução dos conflitos. A noção de jurisdição inclusiva também se aplica à tu-
O Estado assumiu para si o poder-dever de dizer o Di- tela jurisdicional da criança e do adolescente. Basicamente,
reito, de solucionar os conflitos, conhecido como jurisdi- refere-se à propiciação de uma jurisdição que esteja atenta
ção. Assim, o Estado irá elaborar as leis (direito material) às peculiaridades das minorias e dos grupos vulneráveis.
e prever como elas serão aplicadas (direito processual). A No caso, as crianças e adolescentes são considerados um
autotutela para a ser punida como regra geral e o Estado grupo vulnerável devido à condição especial que ocupam.
exerce a heterotutela por meio da atividade jurisdicional.

54
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Capítulo II c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casa-


Da Justiça da Infância e da Juventude mento;
d) conhecer de pedidos baseados em discordância pater-
Seção I na ou materna, em relação ao exercício do poder familiar; 
Disposições Gerais e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil,
quando faltarem os pais;
Art. 145. Os estados e o Distrito Federal poderão criar f) designar curador especial em casos de apresentação
varas especializadas e exclusivas da infância e da juventude, de queixa ou representação, ou de outros procedimentos ju-
cabendo ao Poder Judiciário estabelecer sua proporcionali- diciais ou extrajudiciais em que haja interesses de criança ou
dade por número de habitantes, dotá-las de infra-estrutura e adolescente;
dispor sobre o atendimento, inclusive em plantões. g) conhecer de ações de alimentos;
h) determinar o cancelamento, a retificação e o supri-
Seção II mento dos registros de nascimento e óbito.
Do Juiz
Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar,
Art. 146. A autoridade a que se refere esta Lei é o Juiz da através de portaria, ou autorizar, mediante alvará:
Infância e da Juventude, ou o juiz que exerce essa função, na I - a entrada e permanência de criança ou adolescente,
forma da lei de organização judiciária local. desacompanhado dos pais ou responsável, em:
a) estádio, ginásio e campo desportivo;
Art. 147. A competência será determinada: b) bailes ou promoções dançantes;
I - pelo domicílio dos pais ou responsável; c) boate ou congêneres;
II - pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas;
à falta dos pais ou responsável. e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão.
§ 1º. Nos casos de ato infracional, será competente a II - a participação de criança e adolescente em:
a) espetáculos públicos e seus ensaios;
autoridade do lugar da ação ou omissão, observadas as re-
b) certames de beleza.
gras de conexão, continência e prevenção.
§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade
§ 2º A execução das medidas poderá ser delegada à
judiciária levará em conta, dentre outros fatores:
autoridade competente da residência dos pais ou respon-
a) os princípios desta Lei;
sável, ou do local onde sediar-se a entidade que abrigar a
b) as peculiaridades locais;
criança ou adolescente.
c) a existência de instalações adequadas;
§ 3º Em caso de infração cometida através de trans- d) o tipo de freqüência habitual ao local;
missão simultânea de rádio ou televisão, que atinja mais e) a adequação do ambiente a eventual participação ou
de uma comarca, será competente, para aplicação da pe- freqüência de crianças e adolescentes;
nalidade, a autoridade judiciária do local da sede estadual f) a natureza do espetáculo.
da emissora ou rede, tendo a sentença eficácia para todas § 2º As medidas adotadas na conformidade deste ar-
as transmissoras ou retransmissoras do respectivo estado. tigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as
determinações de caráter geral.
Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é compe-
tente para: Seção III
I - conhecer de representações promovidas pelo Minis- Dos Serviços Auxiliares
tério Público, para apuração de ato infracional atribuído a
adolescente, aplicando as medidas cabíveis; Art. 150. Cabe ao Poder Judiciário, na elaboração de sua
II - conceder a remissão, como forma de suspensão ou proposta orçamentária, prever recursos para manutenção de
extinção do processo; equipe interprofissional, destinada a assessorar a Justiça da
III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes; Infância e da Juventude.
IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses indi-
viduais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescen- Art. 151. Compete à equipe interprofissional dentre outras
te, observado o disposto no art. 209; atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, for-
V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades em necer subsídios por escrito, mediante laudos, ou verbalmente,
entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis; na audiência, e bem assim desenvolver trabalhos de aconse-
VI - aplicar penalidades administrativas nos casos de in- lhamento, orientação, encaminhamento, prevenção e outros,
frações contra norma de proteção à criança ou adolescente; tudo sob a imediata subordinação à autoridade judiciária, as-
VII - conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tu- segurada a livre manifestação do ponto de vista técnico.
telar, aplicando as medidas cabíveis. Parágrafo único. Na ausência ou insuficiência de servido-
Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou ado- res públicos integrantes do Poder Judiciário responsáveis pela
lescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a realização dos estudos psicossociais ou de quaisquer outras
Justiça da Infância e da Juventude para o fim de: espécies de avaliações técnicas exigidas por esta Lei ou por de-
a) conhecer de pedidos de guarda e tutela; terminação judicial, a autoridade judiciária poderá proceder à
b) conhecer de ações de destituição do poder familiar, nomeação de perito, nos termos do art. 156 da Lei no 13.105,
perda ou modificação da tutela ou guarda;  de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Capítulo III atribuído a adolescente, apuração de irregularidades em


Dos Procedimentos atendimento, apuração de infração administrativa às nor-
mas de proteção da criança e do adolescente e habilitação
Seção I em adoção.
Disposições Gerais
Seção II
Art. 152. Aos procedimentos regulados nesta Lei apli- Da Perda e da Suspensão do Poder Familiar
cam-se subsidiariamente as normas gerais previstas na
legislação processual pertinente. Art. 155. O procedimento para a perda ou a suspensão
§ 1o É assegurada, sob pena de responsabilidade, prio- do poder familiar terá início por provocação do Ministério
ridade absoluta na tramitação dos processos e proce- Público ou de quem tenha legítimo interesse.
dimentos previstos nesta Lei, assim como na execução dos
atos e diligências judiciais a eles referentes.  Art. 156. A petição inicial indicará:
§ 2º Os prazos estabelecidos nesta Lei e aplicáveis aos I - a autoridade judiciária a que for dirigida;
seus procedimentos são contados em dias corridos, ex- II - o nome, o estado civil, a profissão e a residência do
cluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento, veda- requerente e do requerido, dispensada a qualificação em se
do o prazo em dobro para a Fazenda Pública e o Ministério tratando de pedido formulado por representante do Minis-
Público. tério Público;
III - a exposição sumária do fato e o pedido;
Art. 153. Se a medida judicial a ser adotada não cor- IV - as provas que serão produzidas, oferecendo, desde
responder a procedimento previsto nesta ou em outra lei, a logo, o rol de testemunhas e documentos.
autoridade judiciária poderá investigar os fatos e ordenar
de ofício as providências necessárias, ouvido o Ministé- Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade ju-
rio Público. diciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do
Parágrafo único.  O disposto neste artigo não se aplica poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o julgamen-
para o fim de afastamento da criança ou do adolescente de to definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente con-
sua família de origem e em outros procedimentos necessa- fiado a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade. 
riamente contenciosos.  § 1o Recebida a petição inicial, a autoridade judiciária
determinará, concomitantemente ao despacho de citação e
Art. 154. Aplica-se às multas o disposto no art. 214. independentemente de requerimento do interessado, a reali-
zação de estudo social ou perícia por equipe interprofissional
A tutela sócio-individual abrange aspectos do direito ou multidisciplinar para comprovar a presença de uma das
da criança e do adolescente voltado à criança e ao adoles- causas de suspensão ou destituição do poder familiar, ressal-
cente individualmente concebidos, isto é, pensados como vado o disposto no § 10 do art. 101 desta Lei, e observada a
sujeitos de direitos individuais que possam ser por eles Lei no 13.431, de 4 de abril de 2017.
exercidos. § 2o Em sendo os pais oriundos de comunidades indíge-
A tutela sócio-educativa abrange aspectos do direito nas, é ainda obrigatória a intervenção, junto à equipe inter-
da criança e do adolescente voltados às atividades de en- profissional ou multidisciplinar referida no § 1o deste artigo,
sino e aprendizagem, tanto no que se refere à educação de representantes do órgão federal responsável pela política
formal quanto em relação à educação informal. indigenista, observado o disposto no § 6o do art. 28 desta Lei.
A tutela coletiva volta-se à proteção de direitos difu-
sos e coletivos da criança e do adolescente. Aos direitos Art. 158. O requerido será citado para, no prazo de dez
difusos e coletivos são conferidos mecanismos de tutela dias, oferecer resposta escrita, indicando as provas a serem
específicos para sua proteção, bem como atribuída com- produzidas e oferecendo desde logo o rol de testemunhas
petência para tanto a órgãos determinados que exercerão e documentos.
um papel representativo. No Brasil, destacam-se institui- § 1º A citação será pessoal, salvo se esgotados todos os
ções como o Ministério Público e a Defensoria Pública. Sem meios para sua realização.
prejuízo, como visto, há remédios constitucionais que se § 2º O requerido privado de liberdade deverá ser cita-
voltam à proteção de interesses desta categoria, como o do pessoalmente.
mandado de segurança coletivo e a própria ação popu- § 3o Quando, por 2 (duas) vezes, o oficial de justiça hou-
lar, sem falar na ação civil pública, também mencionada no ver procurado o citando em seu domicílio ou residência sem
texto constitucional. o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, informar
Considerados os diferentes tipos de tutelas inseridas qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho
no direito da criança e do adolescente, justifica-se a tutela do dia útil em que voltará a fim de efetuar a citação, na hora
jurisdicional diferenciada, adaptada à condição em desen- que designar, nos termos do art. 252 e seguintes da Lei no
volvimento da criança e do adolescente, que deve ser ágil, 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
efetiva, atenta às peculiaridades do caso concreto. § 4o Na hipótese de os genitores encontrarem-se em lo-
Os procedimentos especiais do ECA se referem a: per- cal incerto ou não sabido, serão citados por edital no prazo
da e suspensão de poder familiar, destituição de tutela, co- de 10 (dez) dias, em publicação única, dispensado o envio de
locação em família substituta, apuração de ato infracional ofícios para a localização.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 159. Se o requerido não tiver possibilidade de cons- Art. 163. O prazo máximo para conclusão do proce-
tituir advogado, sem prejuízo do próprio sustento e de sua dimento será de 120 (cento e vinte) dias, e caberá ao juiz,
família, poderá requerer, em cartório, que lhe seja nomea- no caso de notória inviabilidade de manutenção do poder
do dativo, ao qual incumbirá a apresentação de resposta, familiar, dirigir esforços para preparar a criança ou o adoles-
contando-se o prazo a partir da intimação do despacho de cente com vistas à colocação em família substituta.
nomeação. Parágrafo único. A sentença que decretar a perda ou
Parágrafo único. Na hipótese de requerido privado de a suspensão do poder familiar será averbada à margem do
liberdade, o oficial de justiça deverá perguntar, no momento registro de nascimento da criança ou do adolescente.
da citação pessoal, se deseja que lhe seja nomeado defensor.
Seção III
Da Destituição da Tutela
Art. 160. Sendo necessário, a autoridade judiciária re-
quisitará de qualquer repartição ou órgão público a apre- Art. 164. Na destituição da tutela, observar-se-á o pro-
sentação de documento que interesse à causa, de ofício ou cedimento para a remoção de tutor previsto na lei proces-
a requerimento das partes ou do Ministério Público. sual civil e, no que couber, o disposto na seção anterior.

Art. 161. Se não for contestado o pedido e tiver sido A destituição da tutela pode, assim, ser decretada ju-
concluído o estudo social ou a perícia realizada por equi- dicialmente, em procedimento contraditório, nos casos
pe interprofissional ou multidisciplinar, a autoridade judi- previstos na legislação civil, bem como na hipótese de des-
ciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por 5 cumprimento injustificado dos deveres e obrigações.
(cinco) dias, salvo quando este for o requerente, e decidirá
em igual prazo. Seção IV
§ 1º A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimen- Da Colocação em Família Substituta
to das partes ou do Ministério Público, determinará a oi-
tiva de testemunhas que comprovem a presença de uma Dos artigos 165 a 170 estão descritos procedimentos
das causas de suspensão ou destituição do poder familiar adotados na colocação em família substituta:
previstas nos arts. 1.637 e 1.638 da Lei no 10.406, de 10 de
Art. 165. São requisitos para a concessão de pedidos de
janeiro de 2002 (Código Civil), ou no art. 24 desta Lei.
colocação em família substituta:
§ 2o (Revogado). I - qualificação completa do requerente e de seu even-
§ 3o Se o pedido importar em modificação de guarda, tual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste;
será obrigatória, desde que possível e razoável, a oitiva da II - indicação de eventual parentesco do requerente e de
criança ou adolescente, respeitado seu estágio de desen- seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente,
volvimento e grau de compreensão sobre as implicações da especificando se tem ou não parente vivo;
medida. III - qualificação completa da criança ou adolescente e
§ 4º É obrigatória a oitiva dos pais sempre que eles de seus pais, se conhecidos;
forem identificados e estiverem em local conhecido, ressal- IV - indicação do cartório onde foi inscrito nascimento,
vados os casos de não comparecimento perante a Justiça anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão;
quando devidamente citados. V - declaração sobre a existência de bens, direitos ou
§ 5o Se o pai ou a mãe estiverem privados de liberda- rendimentos relativos à criança ou ao adolescente.
de, a autoridade judicial requisitará sua apresentação para Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-
a oitiva. -ão também os requisitos específicos.

Art. 162. Apresentada a resposta, a autoridade judi- Art. 166.  Se os pais forem falecidos, tiverem sido
ciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por destituídos ou suspensos do poder familiar, ou houve-
rem aderido expressamente ao pedido de colocação em
cinco dias, salvo quando este for o requerente, designando,
família substituta, este poderá ser formulado diretamente
desde logo, audiência de instrução e julgamento.
em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes,
§ 1º (Revogado). dispensada a assistência de advogado. 
§ 2o Na audiência, presentes as partes e o Ministério Pú- § 1o Na hipótese de concordância dos pais, o juiz:
blico, serão ouvidas as testemunhas, colhendo-se oralmen- I - na presença do Ministério Público, ouvirá as partes,
te o parecer técnico, salvo quando apresentado por escrito, devidamente assistidas por advogado ou por defensor públi-
manifestando-se sucessivamente o requerente, o requerido e co, para verificar sua concordância com a adoção, no prazo
o Ministério Público, pelo tempo de 20 (vinte) minutos cada máximo de 10 (dez) dias, contado da data do protocolo da
um, prorrogável por mais 10 (dez) minutos. petição ou da entrega da criança em juízo, tomando por ter-
§ 3o A decisão será proferida na audiência, podendo a mo as declarações; e
autoridade judiciária, excepcionalmente, designar data para II - declarará a extinção do poder familiar.
sua leitura no prazo máximo de 5 (cinco) dias. § 2o O consentimento dos titulares do poder familiar será
§ 4o Quando o procedimento de destituição de poder fa- precedido de orientações e esclarecimentos prestados pela
miliar for iniciado pelo Ministério Público, não haverá neces- equipe interprofissional da Justiça da Infância e da Juventu-
sidade de nomeação de curador especial em favor da criança de, em especial, no caso de adoção, sobre a irrevogabilidade
ou adolescente. da medida.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 3o São garantidos a livre manifestação de vontade Art. 172. O adolescente apreendido em flagrante de ato
dos detentores do poder familiar e o direito ao sigilo das infracional será, desde logo, encaminhado à autoridade po-
informações. licial competente.
§ 4o O consentimento prestado por escrito não terá va- Parágrafo único. Havendo repartição policial especiali-
lidade se não for ratificado na audiência a que se refere o § zada para atendimento de adolescente e em se tratando de
1o deste artigo. ato infracional praticado em co-autoria com maior, prevale-
§ 5o O consentimento é retratável até a data da reali- cerá a atribuição da repartição especializada, que, após as
zação da audiência especificada no § 1o deste artigo, e os providências necessárias e conforme o caso, encaminhará o
pais podem exercer o arrependimento no prazo de 10 (dez) adulto à repartição policial própria.
dias, contado da data de prolação da sentença de extinção
do poder familiar. Art. 173. Em caso de flagrante de ato infracional come-
§ 6o O consentimento somente terá valor se for dado tido mediante violência ou grave ameaça a pessoa, a auto-
após o nascimento da criança. ridade policial, sem prejuízo do disposto nos arts. 106, pará-
§ 7o A família natural e a família substituta receberão grafo único, e 107, deverá:
a devida orientação por intermédio de equipe técnica inter- I - lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e
profissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, o adolescente;
preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela II - apreender o produto e os instrumentos da infração;
execução da política municipal de garantia do direito à con- III - requisitar os exames ou perícias necessários à com-
vivência familiar. provação da materialidade e autoria da infração.
Parágrafo único. Nas demais hipóteses de flagrante,
Art. 167. A autoridade judiciária, de ofício ou a reque- a lavratura do auto poderá ser substituída por boletim de
rimento das partes ou do Ministério Público, determinará a ocorrência circunstanciada.
realização de estudo social ou, se possível, perícia por equi-
pe interprofissional, decidindo sobre a concessão de guarda Art. 174. Comparecendo qualquer dos pais ou responsá-
provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o estágio de vel, o adolescente será prontamente liberado pela autorida-
convivência. de policial, sob termo de compromisso e responsabilidade de
Parágrafo único.  Deferida a concessão da guarda pro- sua apresentação ao representante do Ministério Público, no
visória ou do estágio de convivência, a criança ou o ado- mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil ime-
lescente será entregue ao interessado, mediante termo de diato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e
responsabilidade.   sua repercussão social, deva o adolescente permanecer sob
internação para garantia de sua segurança pessoal ou ma-
Art. 168. Apresentado o relatório social ou o laudo pe- nutenção da ordem pública.
ricial, e ouvida, sempre que possível, a criança ou o adoles-
cente, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo Art. 175. Em caso de não liberação, a autoridade poli-
prazo de cinco dias, decidindo a autoridade judiciária em cial encaminhará, desde logo, o adolescente ao representan-
igual prazo. te do Ministério Público, juntamente com cópia do auto de
apreensão ou boletim de ocorrência.
Art. 169. Nas hipóteses em que a destituição da tutela, a § 1º Sendo impossível a apresentação imediata, a au-
perda ou a suspensão do poder familiar constituir pressupos- toridade policial encaminhará o adolescente à entidade de
to lógico da medida principal de colocação em família subs- atendimento, que fará a apresentação ao representante do
tituta, será observado o procedimento contraditório previsto Ministério Público no prazo de vinte e quatro horas.
nas Seções II e III deste Capítulo.   § 2º Nas localidades onde não houver entidade de
Parágrafo único. A perda ou a modificação da guarda atendimento, a apresentação far-se-á pela autoridade po-
poderá ser decretada nos mesmos autos do procedimento, licial. À falta de repartição policial especializada, o adoles-
observado o disposto no art. 35. cente aguardará a apresentação em dependência separada
da destinada a maiores, não podendo, em qualquer hipó-
Art. 170. Concedida a guarda ou a tutela, observar-se-á o tese, exceder o prazo referido no parágrafo anterior.
disposto no art. 32, e, quanto à adoção, o contido no art. 47.
Parágrafo único.  A colocação de criança ou adolescente Art. 176. Sendo o adolescente liberado, a autoridade po-
sob a guarda de pessoa inscrita em programa de acolhimento licial encaminhará imediatamente ao representante do Mi-
familiar será comunicada pela autoridade judiciária à enti- nistério Público cópia do auto de apreensão ou boletim de
dade por este responsável no prazo máximo de 5 (cinco) dias.   ocorrência.

Seção V Art. 177. Se, afastada a hipótese de flagrante, houver in-


Da Apuração de Ato Infracional Atribuído dícios de participação de adolescente na prática de ato infra-
a Adolescente cional, a autoridade policial encaminhará ao representante
do Ministério Público relatório das investigações e demais
Art. 171. O adolescente apreendido por força de ordem documentos.
judicial será, desde logo, encaminhado à autoridade judiciária.

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 178. O adolescente a quem se atribua autoria de § 1º O adolescente e seus pais ou responsável serão
ato infracional não poderá ser conduzido ou transportado cientificados do teor da representação, e notificados a
em compartimento fechado de veículo policial, em condições comparecer à audiência, acompanhados de advogado.
atentatórias à sua dignidade, ou que impliquem risco à sua § 2º Se os pais ou responsável não forem localizados, a
integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade. autoridade judiciária dará curador especial ao adolescente.
§ 3º Não sendo localizado o adolescente, a autoridade
Art. 179. Apresentado o adolescente, o representante judiciária expedirá mandado de busca e apreensão, determi-
do Ministério Público, no mesmo dia e à vista do auto de nando o sobrestamento do feito, até a efetiva apresentação.
apreensão, boletim de ocorrência ou relatório policial, devi- § 4º Estando o adolescente internado, será requisitada
damente autuados pelo cartório judicial e com informação a sua apresentação, sem prejuízo da notificação dos pais
sobre os antecedentes do adolescente, procederá imediata e ou responsável.
informalmente à sua oitiva e, em sendo possível, de seus pais
ou responsável, vítima e testemunhas.
Art. 185. A internação, decretada ou mantida pela au-
Parágrafo único. Em caso de não apresentação, o repre-
toridade judiciária, não poderá ser cumprida em estabeleci-
sentante do Ministério Público notificará os pais ou respon-
mento prisional.
sável para apresentação do adolescente, podendo requisitar
o concurso das polícias civil e militar. § 1º Inexistindo na comarca entidade com as carac-
terísticas definidas no art. 123, o adolescente deverá ser
Art. 180. Adotadas as providências a que alude o artigo imediatamente transferido para a localidade mais próxima.
anterior, o representante do Ministério Público poderá: § 2º Sendo impossível a pronta transferência, o adoles-
I - promover o arquivamento dos autos; cente aguardará sua remoção em repartição policial, desde
II - conceder a remissão; que em seção isolada dos adultos e com instalações apro-
III - representar à autoridade judiciária para aplicação priadas, não podendo ultrapassar o prazo máximo de cinco
de medida sócio-educativa. dias, sob pena de responsabilidade.

Art. 181. Promovido o arquivamento dos autos ou con- Art. 186. Comparecendo o adolescente, seus pais ou res-
cedida a remissão pelo representante do Ministério Público, ponsável, a autoridade judiciária procederá à oitiva dos mes-
mediante termo fundamentado, que conterá o resumo dos mos, podendo solicitar opinião de profissional qualificado.
fatos, os autos serão conclusos à autoridade judiciária para § 1º Se a autoridade judiciária entender adequada a
homologação. remissão, ouvirá o representante do Ministério Público,
§ 1º Homologado o arquivamento ou a remissão, a au- proferindo decisão.
toridade judiciária determinará, conforme o caso, o cum- § 2º Sendo o fato grave, passível de aplicação de medi-
primento da medida. da de internação ou colocação em regime de semi-liberda-
§ 2º Discordando, a autoridade judiciária fará remessa de, a autoridade judiciária, verificando que o adolescente
dos autos ao Procurador-Geral de Justiça, mediante des- não possui advogado constituído, nomeará defensor, de-
pacho fundamentado, e este oferecerá representação, de- signando, desde logo, audiência em continuação, podendo
signará outro membro do Ministério Público para apresen- determinar a realização de diligências e estudo do caso.
tá-la, ou ratificará o arquivamento ou a remissão, que só § 3º O advogado constituído ou o defensor nomeado,
então estará a autoridade judiciária obrigada a homologar. no prazo de três dias contado da audiência de apresenta-
ção, oferecerá defesa prévia e rol de testemunhas.
Art. 182. Se, por qualquer razão, o representante do Mi-
§ 4º Na audiência em continuação, ouvidas as testemu-
nistério Público não promover o arquivamento ou conceder
nhas arroladas na representação e na defesa prévia, cumpri-
a remissão, oferecerá representação à autoridade judiciária,
das as diligências e juntado o relatório da equipe interpro-
propondo a instauração de procedimento para aplicação da
medida sócio-educativa que se afigurar a mais adequada. fissional, será dada a palavra ao representante do Ministério
§ 1º A representação será oferecida por petição, que Público e ao defensor, sucessivamente, pelo tempo de vinte
conterá o breve resumo dos fatos e a classificação do ato minutos para cada um, prorrogável por mais dez, a critério
infracional e, quando necessário, o rol de testemunhas, po- da autoridade judiciária, que em seguida proferirá decisão.
dendo ser deduzida oralmente, em sessão diária instalada
pela autoridade judiciária. Art. 187. Se o adolescente, devidamente notificado, não
§ 2º A representação independe de prova pré-consti- comparecer, injustificadamente à audiência de apresenta-
tuída da autoria e materialidade. ção, a autoridade judiciária designará nova data, determi-
nando sua condução coercitiva.
Art. 183. O prazo máximo e improrrogável para a con-
clusão do procedimento, estando o adolescente internado Art. 188. A remissão, como forma de extinção ou sus-
provisoriamente, será de quarenta e cinco dias. pensão do processo, poderá ser aplicada em qualquer fase
do procedimento, antes da sentença.
Art. 184. Oferecida a representação, a autoridade judi-
ciária designará audiência de apresentação do adolescente, Art. 189. A autoridade judiciária não aplicará qualquer
decidindo, desde logo, sobre a decretação ou manutenção medida, desde que reconheça na sentença:
da internação, observado o disposto no art. 108 e parágrafo. I - estar provada a inexistência do fato;

59
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

II - não haver prova da existência do fato; Art. 190-B. As informações da operação de infiltração
III - não constituir o fato ato infracional; serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela
IV - não existir prova de ter o adolescente concorrido autorização da medida, que zelará por seu sigilo.
para o ato infracional. Parágrafo único. Antes da conclusão da operação, o
Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, estando o acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Públi-
adolescente internado, será imediatamente colocado em li- co e ao delegado de polícia responsável pela operação, com
berdade. o objetivo de garantir o sigilo das investigações.

Art. 190. A intimação da sentença que aplicar medida de Art. 190-C. Não comete crime o policial que oculta a
internação ou regime de semi-liberdade será feita: sua identidade para, por meio da internet, colher indícios de
I - ao adolescente e ao seu defensor; autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts. 240,
II - quando não for encontrado o adolescente, a seus pais 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts. 154-
ou responsável, sem prejuízo do defensor. A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7
§ 1º Sendo outra a medida aplicada, a intimação far-se- de dezembro de 1940 (Código Penal).
-á unicamente na pessoa do defensor. Parágrafo único. O agente policial infiltrado que deixar
§ 2º Recaindo a intimação na pessoa do adolescente, de- de observar a estrita finalidade da investigação responderá
verá este manifestar se deseja ou não recorrer da sentença. pelos excessos praticados.

Seção V-A Art. 190-D. Os órgãos de registro e cadastro público po-


Da Infiltração de Agentes de Polícia para a Investi- derão incluir nos bancos de dados próprios, mediante proce-
gação de Crimes contra a Dignidade Sexual de Criança dimento sigiloso e requisição da autoridade judicial, as infor-
e de Adolescente mações necessárias à efetividade da identidade fictícia criada.
Parágrafo único. O procedimento sigiloso de que trata
Art. 190-A. A infiltração de agentes de polícia na inter- esta Seção será numerado e tombado em livro específico.
net com o fim de investigar os crimes previstos nos arts. 240,
Art. 190-E. Concluída a investigação, todos os atos ele-
241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts. 154-
trônicos praticados durante a operação deverão ser registra-
A, 217-A, 218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7
dos, gravados, armazenados e encaminhados ao juiz e ao
de dezembro de 1940 (Código Penal), obedecerá às seguin-
Ministério Público, juntamente com relatório circunstanciado.
tes regras:
Parágrafo único. Os atos eletrônicos registrados citados
I – será precedida de autorização judicial devidamente
no caput deste artigo serão reunidos em autos apartados e
circunstanciada e fundamentada, que estabelecerá os limites
apensados ao processo criminal juntamente com o inquéri-
da infiltração para obtenção de prova, ouvido o Ministério to policial, assegurando-se a preservação da identidade do
Público; agente policial infiltrado e a intimidade das crianças e dos
II – dar-se-á mediante requerimento do Ministério Pú- adolescentes envolvidos.
blico ou representação de delegado de polícia e conterá a
demonstração de sua necessidade, o alcance das tarefas dos Seção VI
policiais, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e, Da Apuração de Irregularidades em Entidade de
quando possível, os dados de conexão ou cadastrais que per- Atendimento
mitam a identificação dessas pessoas;
III – não poderá exceder o prazo de 90 (noventa) dias, Art. 191. O procedimento de apuração de irregularida-
sem prejuízo de eventuais renovações, desde que o total não des em entidade governamental e não-governamental terá
exceda a 720 (setecentos e vinte) dias e seja demonstrada início mediante portaria da autoridade judiciária ou repre-
sua efetiva necessidade, a critério da autoridade judicial. sentação do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, onde
§ 1º A autoridade judicial e o Ministério Público pode- conste, necessariamente, resumo dos fatos.
rão requisitar relatórios parciais da operação de infiltração Parágrafo único. Havendo motivo grave, poderá a auto-
antes do término do prazo de que trata o inciso II do § 1º ridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar limi-
deste artigo. narmente o afastamento provisório do dirigente da entidade,
§ 2º Para efeitos do disposto no inciso I do § 1º deste mediante decisão fundamentada.
artigo, consideram-se:
I – dados de conexão: informações referentes a hora, Art. 192. O dirigente da entidade será citado para, no
data, início, término, duração, endereço de Protocolo de In- prazo de dez dias, oferecer resposta escrita, podendo juntar
ternet (IP) utilizado e terminal de origem da conexão; documentos e indicar as provas a produzir.
II – dados cadastrais: informações referentes a nome e
endereço de assinante ou de usuário registrado ou autenti- Art. 193. Apresentada ou não a resposta, e sendo neces-
cado para a conexão a quem endereço de IP, identificação sário, a autoridade judiciária designará audiência de instru-
de usuário ou código de acesso tenha sido atribuído no mo- ção e julgamento, intimando as partes.
mento da conexão. § 1º Salvo manifestação em audiência, as partes e o
§ 3º A infiltração de agentes de polícia na internet não Ministério Público terão cinco dias para oferecer alegações
será admitida se a prova puder ser obtida por outros meios. finais, decidindo a autoridade judiciária em igual prazo.

60
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 2º Em se tratando de afastamento provisório ou de- II - dados familiares; 


finitivo de dirigente de entidade governamental, a auto- III - cópias autenticadas de certidão de nascimento ou ca-
ridade judiciária oficiará à autoridade administrativa ime- samento, ou declaração relativa ao período de união estável; 
diatamente superior ao afastado, marcando prazo para a IV - cópias da cédula de identidade e inscrição no Ca-
substituição. dastro de Pessoas Físicas; 
§ 3º Antes de aplicar qualquer das medidas, a autorida- V - comprovante de renda e domicílio; 
de judiciária poderá fixar prazo para a remoção das irregu- VI - atestados de sanidade física e mental; 
laridades verificadas. Satisfeitas as exigências, o processo VII - certidão de antecedentes criminais; 
será extinto, sem julgamento de mérito. VIII - certidão negativa de distribuição cível. 
§ 4º A multa e a advertência serão impostas ao dirigen-
te da entidade ou programa de atendimento. Art. 197-B.  A autoridade judiciária, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas, dará vista dos autos ao Ministério
Seção VII Público, que no prazo de 5 (cinco) dias poderá: 
Da Apuração de Infração Administrativa às Nor- I - apresentar quesitos a serem respondidos pela equipe
mas de Proteção à Criança e ao Adolescente interprofissional encarregada de elaborar o estudo técnico a
que se refere o art. 197-C desta Lei; 
Art. 194. O procedimento para imposição de penalidade II - requerer a designação de audiência para oitiva dos
administrativa por infração às normas de proteção à criança postulantes em juízo e testemunhas; 
e ao adolescente terá início por representação do Ministério III - requerer a juntada de documentos complementares
Público, ou do Conselho Tutelar, ou auto de infração elabo- e a realização de outras diligências que entender necessárias. 
rado por servidor efetivo ou voluntário credenciado, e assi-
nado por duas testemunhas, se possível. Art. 197-C.  Intervirá no feito, obrigatoriamente, equi-
§ 1º No procedimento iniciado com o auto de infração, pe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da
poderão ser usadas fórmulas impressas, especificando-se a Juventude, que deverá elaborar estudo psicossocial, que con-
natureza e as circunstâncias da infração.
terá subsídios que permitam aferir a capacidade e o prepa-
§ 2º Sempre que possível, à verificação da infração se-
ro dos postulantes para o exercício de uma paternidade ou
guir-se-á a lavratura do auto, certificando-se, em caso con-
maternidade responsável, à luz dos requisitos e princípios
trário, dos motivos do retardamento.
desta Lei. 
§ 1o É obrigatória a participação dos postulantes em
Art. 195. O requerido terá prazo de dez dias para apresen-
programa oferecido pela Justiça da Infância e da Juventu-
tação de defesa, contado da data da intimação, que será feita:
de, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis
I - pelo autuante, no próprio auto, quando este for lavra-
do na presença do requerido; pela execução da política municipal de garantia do direito
II - por oficial de justiça ou funcionário legalmente habi- à convivência familiar e dos grupos de apoio à adoção devi-
litado, que entregará cópia do auto ou da representação ao damente habilitados perante a Justiça da Infância e da Ju-
requerido, ou a seu representante legal, lavrando certidão; ventude, que inclua preparação psicológica, orientação e es-
III - por via postal, com aviso de recebimento, se não for tímulo à adoção inter-racial, de crianças ou de adolescentes
encontrado o requerido ou seu representante legal; com deficiência, com doenças crônicas ou com necessidades
IV - por edital, com prazo de trinta dias, se incerto ou não específicas de saúde, e de grupos de irmãos.
sabido o paradeiro do requerido ou de seu representante legal. § 2o Sempre que possível e recomendável, a etapa obri-
gatória da preparação referida no § 1o deste artigo incluirá
Art. 196. Não sendo apresentada a defesa no prazo le- o contato com crianças e adolescentes em regime de acolhi-
gal, a autoridade judiciária dará vista dos autos do Ministé- mento familiar ou institucional, a ser realizado sob orien-
rio Público, por cinco dias, decidindo em igual prazo. tação, supervisão e avaliação da equipe técnica da Justiça
da Infância e da Juventude e dos grupos de apoio à adoção,
Art. 197. Apresentada a defesa, a autoridade judiciária com apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de aco-
procederá na conformidade do artigo anterior, ou, sendo ne- lhimento familiar e institucional e pela execução da política
cessário, designará audiência de instrução e julgamento. municipal de garantia do direito à convivência familiar.
Parágrafo único. Colhida a prova oral, manifestar-se-ão § 3o É recomendável que as crianças e os adolescentes
sucessivamente o Ministério Público e o procurador do re- acolhidos institucionalmente ou por família acolhedora se-
querido, pelo tempo de vinte minutos para cada um, prorro- jam preparados por equipe interprofissional antes da inclu-
gável por mais dez, a critério da autoridade judiciária, que são em família adotiva.
em seguida proferirá sentença.
Art. 197-D.  Certificada nos autos a conclusão da par-
Seção VIII ticipação no programa referido no art. 197-C desta Lei, a
Da Habilitação de Pretendentes à Adoção autoridade judiciária, no prazo de 48 (quarenta e oito) ho-
ras, decidirá acerca das diligências requeridas pelo Minis-
Art. 197-A.  Os postulantes à adoção, domiciliados no tério Público e determinará a juntada do estudo psicosso-
Brasil, apresentarão petição inicial na qual conste:  cial, designando, conforme o caso, audiência de instrução
I - qualificação completa;  e julgamento. 

61
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Parágrafo único.  Caso não sejam requeridas diligências, pedido do recorrente; se a reformar, a remessa dos autos
ou sendo essas indeferidas, a autoridade judiciária determi- dependerá de pedido expresso da parte interessada ou do
nará a juntada do estudo psicossocial, abrindo a seguir vista Ministério Público, no prazo de cinco dias, contados da in-
dos autos ao Ministério Público, por 5 (cinco) dias, decidindo timação.
em igual prazo. 
Art. 199. Contra as decisões proferidas com base no art.
Art. 197-E.  Deferida a habilitação, o postulante será ins- 149 caberá recurso de apelação.
crito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo a
sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem Art. 199-A.  A sentença que deferir a adoção produz efei-
cronológica de habilitação e conforme a disponibilidade de to desde logo, embora sujeita a apelação, que será recebida
crianças ou adolescentes adotáveis.  exclusivamente no efeito devolutivo, salvo se se tratar de
§ 1o A ordem cronológica das habilitações somente po- adoção internacional ou se houver perigo de dano irrepará-
derá deixar de ser observada pela autoridade judiciária nas vel ou de difícil reparação ao adotando. 
hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quando com-
provado ser essa a melhor solução no interesse do adotando. Art. 199-B.  A sentença que destituir ambos ou qualquer
§ 2o A habilitação à adoção deverá ser renovada no mí- dos genitores do poder familiar fica sujeita a apelação, que
nimo trienalmente mediante avaliação por equipe interpro- deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo. 
fissional.
§ 3o Quando o adotante candidatar-se a uma nova ado- Art. 199-C.  Os recursos nos procedimentos de adoção e
ção, será dispensável a renovação da habilitação, bastando de destituição de poder familiar, em face da relevância das
a avaliação por equipe interprofissional. questões, serão processados com prioridade absoluta, de-
§ 4o Após 3 (três) recusas injustificadas, pelo habilitado, à vendo ser imediatamente distribuídos, ficando vedado que
adoção de crianças ou adolescentes indicados dentro do per- aguardem, em qualquer situação, oportuna distribuição, e
fil escolhido, haverá reavaliação da habilitação concedida. serão colocados em mesa para julgamento sem revisão e
§ 5o A desistência do pretendente em relação à guarda com parecer urgente do Ministério Público.  
para fins de adoção ou a devolução da criança ou do adoles-
cente depois do trânsito em julgado da sentença de adoção Art. 199-D.  O relator deverá colocar o processo em
importará na sua exclusão dos cadastros de adoção. mesa para julgamento no prazo máximo de 60 (sessenta)
dias, contado da sua conclusão. 
Art. 197-F. O prazo máximo para conclusão da habili- Parágrafo único.  O Ministério Público será intimado da
tação à adoção será de 120 (cento e vinte) dias, prorrogável data do julgamento e poderá na sessão, se entender neces-
por igual período, mediante decisão fundamentada da auto- sário, apresentar oralmente seu parecer. 
ridade judiciária.
Art. 199-E.  O Ministério Público poderá requerer a ins-
Capítulo IV tauração de procedimento para apuração de responsabili-
Dos Recursos dades se constatar o descumprimento das providências e do
prazo previstos nos artigos anteriores.  
Art. 198.  Nos procedimentos afetos à Justiça da Infância
e da Juventude, inclusive os relativos à execução das me- Capítulo V
didas socioeducativas, adotar-se-á o sistema recursal da Lei Do Ministério Público
no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Ci-
vil), com as seguintes adaptações: (Redação dada pela Lei nº Art. 200. As funções do Ministério Público previstas nesta
12.594, de 2012) Lei serão exercidas nos termos da respectiva lei orgânica.
I - os recursos serão interpostos independentemente de
preparo; Art. 201. Compete ao Ministério Público:
II - em todos os recursos, salvo nos embargos de decla- I - conceder a remissão como forma de exclusão do pro-
ração, o prazo para o Ministério Público e para a defesa será cesso;
sempre de 10 (dez) dias; (Redação dada pela Lei nº 12.594, II - promover e acompanhar os procedimentos relativos
de 2012) às infrações atribuídas a adolescentes;
III - os recursos terão preferência de julgamento e dis- III - promover e acompanhar as ações de alimentos e os
pensarão revisor; procedimentos de suspensão e destituição do poder familiar,
VII - antes de determinar a remessa dos autos à superior nomeação e remoção de tutores, curadores e guardiães, bem
instância, no caso de apelação, ou do instrumento, no caso como oficiar em todos os demais procedimentos da compe-
de agravo, a autoridade judiciária proferirá despacho funda- tência da Justiça da Infância e da Juventude; 
mentado, mantendo ou reformando a decisão, no prazo de IV - promover, de ofício ou por solicitação dos interes-
cinco dias; sados, a especialização e a inscrição de hipoteca legal e a
VIII - mantida a decisão apelada ou agravada, o escri- prestação de contas dos tutores, curadores e quaisquer ad-
vão remeterá os autos ou o instrumento à superior instância ministradores de bens de crianças e adolescentes nas hipó-
dentro de vinte e quatro horas, independentemente de novo teses do art. 98;

62
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para c) efetuar recomendações visando à melhoria dos serviços
a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos re- públicos e de relevância pública afetos à criança e ao adoles-
lativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no cente, fixando prazo razoável para sua perfeita adequação.
art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal;
VI - instaurar procedimentos administrativos e, para ins- Art. 202. Nos processos e procedimentos em que não for
truí-los: parte, atuará obrigatoriamente o Ministério Público na defesa
a) expedir notificações para colher depoimentos ou es- dos direitos e interesses de que cuida esta Lei, hipótese em
clarecimentos e, em caso de não comparecimento injusti- que terá vista dos autos depois das partes, podendo juntar do-
ficado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela polícia cumentos e requerer diligências, usando os recursos cabíveis.
civil ou militar;
b) requisitar informações, exames, perícias e documen- Art. 203. A intimação do Ministério Público, em qualquer
tos de autoridades municipais, estaduais e federais, da admi- caso, será feita pessoalmente.
nistração direta ou indireta, bem como promover inspeções e
diligências investigatórias; Art. 204. A falta de intervenção do Ministério Público
c) requisitar informações e documentos a particulares e acarreta a nulidade do feito, que será declarada de ofício
instituições privadas; pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado.
VII - instaurar sindicâncias, requisitar diligências inves-
tigatórias e determinar a instauração de inquérito policial, Art. 205. As manifestações processuais do representante
para apuração de ilícitos ou infrações às normas de proteção do Ministério Público deverão ser fundamentadas.
à infância e à juventude;
VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias Capítulo VI
legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo Do Advogado
as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis;
IX - impetrar mandado de segurança, de injunção e ha- Art. 206. A criança ou o adolescente, seus pais ou res-
beas corpus, em qualquer juízo, instância ou tribunal, na de-
ponsável, e qualquer pessoa que tenha legítimo interesse na
fesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis afetos à
solução da lide poderão intervir nos procedimentos de que
criança e ao adolescente;
trata esta Lei, através de advogado, o qual será intimado
X - representar ao juízo visando à aplicação de penali-
para todos os atos, pessoalmente ou por publicação oficial,
dade por infrações cometidas contra as normas de proteção
respeitado o segredo de justiça.
à infância e à juventude, sem prejuízo da promoção da res-
Parágrafo único. Será prestada assistência judiciária in-
ponsabilidade civil e penal do infrator, quando cabível;
tegral e gratuita àqueles que dela necessitarem.
XI - inspecionar as entidades públicas e particulares de
atendimento e os programas de que trata esta Lei, adotando
de pronto as medidas administrativas ou judiciais necessá- Art. 207. Nenhum adolescente a quem se atribua a prá-
rias à remoção de irregularidades porventura verificadas; tica de ato infracional, ainda que ausente ou foragido, será    
XII - requisitar força policial, bem como a colaboração processado sem defensor.
dos serviços médicos, hospitalares, educacionais e de assis- § 1º Se o adolescente não tiver defensor, ser-lhe-á no-
tência social, públicos ou privados, para o desempenho de meado pelo juiz, ressalvado o direito de, a todo tempo,
suas atribuições. constituir outro de sua preferência.
§ 1º A legitimação do Ministério Público para as ações § 2º A ausência do defensor não determinará o adiamen-
cíveis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas to de nenhum ato do processo, devendo o juiz nomear subs-
mesmas hipóteses, segundo dispuserem a Constituição e tituto, ainda que provisoriamente, ou para o só efeito do ato.
esta Lei. § 3º Será dispensada a outorga de mandato, quando
§ 2º As atribuições constantes deste artigo não ex- se tratar de defensor nomeado ou, sido constituído, tiver
cluem outras, desde que compatíveis com a finalidade do sido indicado por ocasião de ato formal com a presença da
Ministério Público. autoridade judiciária.
§ 3º O representante do Ministério Público, no exercí-
cio de suas funções, terá livre acesso a todo local onde se Capítulo VII
encontre criança ou adolescente. Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais,
§ 4º O representante do Ministério Público será res- Difusos e Coletivos
ponsável pelo uso indevido das informações e documentos
que requisitar, nas hipóteses legais de sigilo. Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações
§ 5º Para o exercício da atribuição de que trata o inci- de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à
so VIII deste artigo, poderá o representante do Ministério criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou
Público: oferta irregular:
a) reduzir a termo as declarações do reclamante, ins- I - do ensino obrigatório;
taurando o competente procedimento, sob sua presidência; II - de atendimento educacional especializado aos por-
b) entender-se diretamente com a pessoa ou autoridade tadores de deficiência;
reclamada, em dia, local e horário previamente notificados III - de atendimento em creche e pré-escola às crianças
ou acertados; de zero a cinco anos de idade;

63
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV - de ensino noturno regular, adequado às condições § 1º Aplicam-se às ações previstas neste Capítulo as
do educando; normas do Código de Processo Civil.
V - de programas suplementares de oferta de material § 2º Contra atos ilegais ou abusivos de autoridade pú-
didático-escolar, transporte e assistência à saúde do educan- blica ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribui-
do do ensino fundamental; ções do poder público, que lesem direito líquido e certo
VI - de serviço de assistência social visando à proteção à previsto nesta Lei, caberá ação mandamental, que se rege-
família, à maternidade, à infância e à adolescência, bem como rá pelas normas da lei do mandado de segurança.
ao amparo às crianças e adolescentes que dele necessitem;
VII - de acesso às ações e serviços de saúde; Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de
VIII - de escolarização e profissionalização dos adoles- obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela es-
centes privados de liberdade. pecífica da obrigação ou determinará providências que asse-
IX - de ações, serviços e programas de orientação, apoio gurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
e promoção social de famílias e destinados ao pleno exercício § 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e ha-
do direito à convivência familiar por crianças e adolescentes.  vendo justificado receio de ineficácia do provimento final,
X - de programas de atendimento para a execução das é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após jus-
medidas socioeducativas e aplicação de medidas de prote- tificação prévia, citando o réu.
ção. (Incluído pela Lei nº 12.594, de 2012)  § 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior
§ 1o As hipóteses previstas neste artigo não excluem da ou na sentença, impor multa diária ao réu, independente-
proteção judicial outros interesses individuais, difusos ou mente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível
coletivos, próprios da infância e da adolescência, protegi- com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumpri-
dos pela Constituição e pela Lei.  mento do preceito.
§ 2o A investigação do desaparecimento de crianças § 3º A multa só será exigível do réu após o trânsito em
ou adolescentes será realizada imediatamente após noti- julgado da sentença favorável ao autor, mas será devida des-
ficação aos órgãos competentes, que deverão comunicar de o dia em que se houver configurado o descumprimento.
o fato aos portos, aeroportos, Polícia Rodoviária e compa-
nhias de transporte interestaduais e internacionais, forne-
Art. 214. Os valores das multas reverterão ao fundo ge-
cendo-lhes todos os dados necessários à identificação do
rido pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente
desaparecido.
do respectivo município.
§ 1º As multas não recolhidas até trinta dias após o
Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propos-
trânsito em julgado da decisão serão exigidas através de
tas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou
execução promovida pelo Ministério Público, nos mesmos
omissão, cujo juízo terá competência absoluta para proces-
sar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e autos, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.
a competência originária dos tribunais superiores. § 2º Enquanto o fundo não for regulamentado, o di-
nheiro ficará depositado em estabelecimento oficial de cré-
Art. 210. Para as ações cíveis fundadas em interesses dito, em conta com correção monetária.
coletivos ou difusos, consideram-se legitimados concorren-
temente: Art. 215. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos re-
I - o Ministério Público; cursos, para evitar dano irreparável à parte.
II - a União, os estados, os municípios, o Distrito Federal
e os territórios; Art. 216. Transitada em julgado a sentença que impuser
III - as associações legalmente constituídas há pelo me- condenação ao poder público, o juiz determinará a remessa
nos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a de peças à autoridade competente, para apuração da res-
defesa dos interesses e direitos protegidos por esta Lei, dis- ponsabilidade civil e administrativa do agente a que se atri-
pensada a autorização da assembleia, se houver prévia au- bua a ação ou omissão.
torização estatutária.
§ 1º Admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Mi- Art. 217. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado
nistérios Públicos da União e dos estados na defesa dos da sentença condenatória sem que a associação autora lhe
interesses e direitos de que cuida esta Lei. promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, fa-
§ 2º Em caso de desistência ou abandono da ação por cultada igual iniciativa aos demais legitimados.
associação legitimada, o Ministério Público ou outro legiti-
mado poderá assumir a titularidade ativa. Art. 218. O juiz condenará a associação autora a pagar
ao réu os honorários advocatícios arbitrados na conformi-
Art. 211. Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dade do § 4º do art. 20 da Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de
dos interessados compromisso de ajustamento de sua con- 1973 (Código de Processo Civil), quando reconhecer que a
duta às exigências legais, o qual terá eficácia de título exe- pretensão é manifestamente infundada.
cutivo extrajudicial. Parágrafo único. Em caso de litigância de má-fé, a as-
sociação autora e os diretores responsáveis pela propositura
Art. 212. Para defesa dos direitos e interesses protegidos por da ação serão solidariamente condenados ao décuplo das
esta Lei, são admissíveis todas as espécies de ações pertinentes. custas, sem prejuízo de responsabilidade por perdas e danos.

64
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 219. Nas ações de que trata este Capítulo, não ha- Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as
verá adiantamento de custas, emolumentos, honorários pe- normas da Parte Geral do Código Penal e, quanto ao     pro-
riciais e quaisquer outras despesas. cesso, as pertinentes ao Código de Processo Penal.

Art. 220. Qualquer pessoa poderá e o servidor público Art. 227. Os crimes definidos nesta Lei são de ação pú-
deverá provocar a iniciativa do Ministério Público, prestan- blica incondicionada.
do-lhe informações sobre fatos que constituam objeto de
ação civil, e indicando-lhe os elementos de convicção. Seção II
Dos Crimes em Espécie
Art. 221. Se, no exercício de suas funções, os juízos e
tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar Art. 228. Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente
a propositura de ação civil, remeterão peças ao Ministério de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de man-
Público para as providências cabíveis. ter registro das atividades desenvolvidas, na forma e prazo
referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à par-
Art. 222. Para instruir a petição inicial, o interessado turiente ou a seu responsável, por ocasião da alta médica,
poderá requerer às autoridades competentes as certidões e declaração de nascimento, onde constem as intercorrências
informações que julgar necessárias, que serão fornecidas no do parto e do desenvolvimento do neonato:
prazo de quinze dias. Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Art. 223. O Ministério Público poderá instaurar, sob sua Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa.
presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pes-
soa, organismo público ou particular, certidões, informações, Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de
exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não pode- estabelecimento de atenção à saúde de gestante de identifi-
rá ser inferior a dez dias úteis. car corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do
§ 1º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas
parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no
as diligências, se convencer da inexistência de fundamento
art. 10 desta Lei:
para a propositura da ação cível, promoverá o arquivamen-
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
to dos autos do inquérito civil ou das peças informativas,
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
fazendo-o fundamentadamente.
Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa.
§ 2º Os autos do inquérito civil ou as peças de informa-
ção arquivados serão remetidos, sob pena de se incorrer
Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liber-
em falta grave, no prazo de três dias, ao Conselho Superior
do Ministério Público. dade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante
§ 3º Até que seja homologada ou rejeitada a promoção de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autorida-
de arquivamento, em sessão do Conselho Superior do Mi- de judiciária competente:
nistério público, poderão as associações legitimadas apre- Pena - detenção de seis meses a dois anos.
sentar razões escritas ou documentos, que serão juntados Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que pro-
aos autos do inquérito ou anexados às peças de informação. cede à apreensão sem observância das formalidades legais.
§ 4º A promoção de arquivamento será submetida a
exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério Art. 231. Deixar a autoridade policial responsável pela
Público, conforme dispuser o seu regimento. apreensão de criança ou adolescente de fazer imediata co-
§ 5º Deixando o Conselho Superior de homologar a municação à autoridade judiciária competente e à família
promoção de arquivamento, designará, desde logo, outro do apreendido ou à pessoa por ele indicada:
órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação. Pena - detenção de seis meses a dois anos.

Art. 224. Aplicam-se subsidiariamente, no que couber, as Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua auto-
disposições da Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985. ridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Título VII
Dos Crimes e Das Infrações Administrativas Art. 234. Deixar a autoridade competente, sem justa
causa, de ordenar a imediata liberação de criança ou ado-
Capítulo I lescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade da
Dos Crimes apreensão:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Seção I
Disposições Gerais Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado
nesta Lei em benefício de adolescente privado de liberdade:
Art. 225. Este Capítulo dispõe sobre crimes praticados Pena - detenção de seis meses a dois anos.
contra a criança e o adolescente, por ação ou omissão, sem
prejuízo do disposto na legislação penal.

65
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 236. Impedir ou embaraçar a ação de autoridade II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de
judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata
Ministério Público no exercício de função prevista nesta Lei: o caput deste artigo.
Pena - detenção de seis meses a dois anos.  § 2o  As condutas tipificadas nos incisos I e II do §
1o deste artigo são puníveis quando o responsável legal
Art. 237. Subtrair criança ou adolescente ao poder de pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa
quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judi- de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata
cial, com o fim de colocação em lar substituto: o caput deste artigo. 
Pena - reclusão de dois a seis anos, e multa.
 Art. 241-B.  Adquirir, possuir ou armazenar, por qual-
Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pu- quer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que
pilo a terceiro, mediante paga ou recompensa: contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolven-
Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa. do criança ou adolescente: 
Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece
 Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. 
ou efetiva a paga ou recompensa.
 § 1o  A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois ter-
ços) se de pequena quantidade o material a que se refere
Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato des-
tinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior o caput deste artigo. 
com inobservância das formalidades legais ou com o fito de  § 2o  Não há crime se a posse ou o armazenamento
obter lucro: tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes
Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa. a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-
Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por:
ameaça ou fraude:   I – agente público no exercício de suas funções; 
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena  II – membro de entidade, legalmente constituída, que
correspondente à violência. inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento,
o processamento e o encaminhamento de notícia dos cri-
Art. 240.  Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar mes referidos neste parágrafo; 
ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou  III – representante legal e funcionários responsáveis de
pornográfica, envolvendo criança ou adolescente:   provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.  de computadores, até o recebimento do material relativo à
§ 1o  Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou
recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a par- ao Poder Judiciário. 
ticipação de criança ou adolescente nas cenas referidas  § 3o  As pessoas referidas no § 2o deste artigo deverão
no caputdeste artigo, ou ainda quem com esses contracena.   manter sob sigilo o material ilícito referido. 
§ 2o  Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente
comete o crime:   Art. 241-C.  Simular a participação de criança ou adoles-
I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto cente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de
de exercê-la;   adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabita- ou qualquer outra forma de representação visual: 
ção ou de hospitalidade; ou    Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. 
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consan-
Parágrafo único.  Incorre nas mesmas penas quem ven-
güíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tu-
de, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga
tor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem,
por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material
a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com
seu consentimento.   produzido na forma do caput deste artigo. 

Art. 241.  Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou  Art. 241-D.  Aliciar, assediar, instigar ou constranger,
outro registro que contenha cena de sexo explícito ou porno- por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de
gráfica envolvendo criança ou adolescente:  com ela praticar ato libidinoso: 
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.   Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. 
 Parágrafo único.  Nas mesmas penas incorre quem: 
Art. 241-A.  Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir,  I – facilita ou induz o acesso à criança de material con-
distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive tendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de
por meio de sistema de informática ou telemático, fotogra- com ela praticar ato libidinoso; 
fia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo ex-  II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo
plícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:   com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográ-
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.  fica ou sexualmente explícita. 
§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem: 
I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento  Art. 241-E.  Para efeito dos crimes previstos nesta
das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfi-
artigo;  ca” compreende qualquer situação que envolva criança

66
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança cando-se o dobro em caso de reincidência.
ou adolescente para fins primordialmente sexuais. 
Art. 246. Impedir o responsável ou funcionário de enti-
Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou dade de atendimento o exercício dos direitos constantes nos
entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente arma, incisos II, III, VII, VIII e XI do art. 124 desta Lei:
munição ou explosivo: Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos.  cando-se o dobro em caso de reincidência.
Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autoriza-
ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou ção devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato
a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros ou documento de procedimento policial, administrativo ou
produtos cujos componentes possam causar dependência fí-
judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua
sica ou psíquica:
ato infracional:
Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se
Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
o fato não constitui crime mais grave.
cando-se o dobro em caso de reincidência.
Art. 244. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou § 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou par-
entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente fogos cialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido
de estampido ou de artifício, exceto aqueles que, pelo seu em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga res-
reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer peito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma
dano físico em caso de utilização indevida: a permitir sua identificação, direta ou indiretamente.
Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa. § 2º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou
emissora de rádio ou televisão, além da pena prevista neste
Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais artigo, a autoridade judiciária poderá determinar a apreen-
definidos no caput do art. 2o desta Lei, à prostituição ou à são da publicação ou a suspensão da programação da emis-
exploração sexual:  sora até por dois dias, bem como da publicação do periódico
Pena – reclusão de quatro a dez anos e multa, além da até por dois números. (Expressão declarada inconstitucional
perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em pela ADIN 869-2).
favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da
unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em que foi Art. 248. Deixar de apresentar à autoridade judiciária de
cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé. seu domicílio, no prazo de cinco dias, com o fim de regula-
§ 1o Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o ge- rizar a guarda, adolescente trazido de outra comarca para a
rente ou o responsável pelo local em que se verifique a prestação de serviço doméstico, mesmo que autorizado pe-
submissão de criança ou adolescente às práticas referidas los pais ou responsável:
no caputdeste artigo.  Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
§ 2o Constitui efeito obrigatório da condenação a cas- cando-se o dobro em caso de reincidência, independente-
sação da licença de localização e de funcionamento do es- mente das despesas de retorno do adolescente, se for o caso.
tabelecimento. 
Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deve-
Art. 244-B.  Corromper ou facilitar a corrupção de menor
res inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou
de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou
guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária
induzindo-o a praticá-la: 
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.  ou Conselho Tutelar: 
§ 1o  Incorre nas penas previstas no  caput deste arti- Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli-
go quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de cando-se o dobro em caso de reincidência.
quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da
internet.  Art. 250.  Hospedar criança ou adolescente desacompa-
§ 2o  As penas previstas no caput deste artigo são au- nhado dos pais ou responsável, ou sem autorização escrita
mentadas de um terço no caso de a infração cometida ou desses ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel
induzida estar incluída no rol do art. 1o da Lei no 8.072, de ou congênere: 
25 de julho de 1990.  Pena – multa. 
§ 1º  Em caso de reincidência, sem prejuízo da pena de
Capítulo II multa, a autoridade judiciária poderá determinar o fecha-
Das Infrações Administrativas mento do estabelecimento por até 15 (quinze) dias. 
§ 2º  Se comprovada a reincidência em período inferior
Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por a 30 (trinta) dias, o estabelecimento será definitivamente
estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamen- fechado e terá sua licença cassada. 
tal, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade com-
petente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo Art. 251. Transportar criança ou adolescente, por qual-
suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou quer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e
adolescente: 85 desta Lei:

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli- Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00
cando-se o dobro em caso de reincidência. (três mil reais). 
Parágrafo único.  Incorre nas mesmas penas a autori-
Art. 252. Deixar o responsável por diversão ou espetá- dade que deixa de efetuar o cadastramento de crianças e de
culo público de afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à adolescentes em condições de serem adotadas, de pessoas
entrada do local de exibição, informação destacada sobre a ou casais habilitados à adoção e de crianças e adolescentes
natureza da diversão ou espetáculo e a faixa etária especifi- em regime de acolhimento institucional ou familiar.  
cada no certificado de classificação:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, apli- Art. 258-B.  Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de
cando-se o dobro em caso de reincidência. estabelecimento de atenção à saúde de gestante de efetuar
imediato encaminhamento à autoridade judiciária de caso
Art. 253. Anunciar peças teatrais, filmes ou quaisquer re- de que tenha conhecimento de mãe ou gestante interessada
presentações ou espetáculos, sem indicar os limites de idade em entregar seu filho para adoção:  
a que não se recomendem: Pena - multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00
Pena - multa de três a vinte salários de referência, du- (três mil reais). 
plicada em caso de reincidência, aplicável, separadamente, Parágrafo único.  Incorre na mesma pena o funcionário
à casa de espetáculo e aos órgãos de divulgação ou publi- de programa oficial ou comunitário destinado à garantia do
cidade. direito à convivência familiar que deixa de efetuar a comu-
nicação referida no caput deste artigo. 
Art. 254. Transmitir, através de rádio ou televisão, espe-
táculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua Art. 258-C. Descumprir a proibição estabelecida no in-
classificação: ciso II do art. 81:
Pena - multa de vinte a cem salários de referência; du- Pena - multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$
plicada em caso de reincidência a autoridade judiciária po- 10.000,00 (dez mil reais);
derá determinar a suspensão da programação da emissora
Medida Administrativa - interdição do estabelecimento
por até dois dias.
comercial até o recolhimento da multa aplicada.
Art. 255. Exibir filme, trailer, peça, amostra ou congêne-
Disposições Finais e Transitórias
re classificado pelo órgão competente como inadequado às
crianças ou adolescentes admitidos ao espetáculo:
Art. 259. A União, no prazo de noventa dias contados da
Pena - multa de vinte a cem salários de referência; na
publicação deste Estatuto, elaborará projeto de lei dispondo
reincidência, a autoridade poderá determinar a suspensão
sobre a criação ou adaptação de seus órgãos às diretrizes da
do espetáculo ou o fechamento do estabelecimento por até
quinze dias. política de atendimento fixadas no art. 88 e ao que estabele-
ce o Título V do Livro II.
Art. 256. Vender ou locar a criança ou adolescente fita Parágrafo único. Compete aos estados e municípios pro-
de programação em vídeo, em desacordo com a classificação moverem a adaptação de seus órgãos e programas às dire-
atribuída pelo órgão competente: trizes e princípios estabelecidos nesta Lei.
Pena - multa de três a vinte salários de referência; em
caso de reincidência, a autoridade judiciária poderá deter- Art. 260.  Os contribuintes poderão efetuar doações aos
minar o fechamento do estabelecimento por até quinze dias. Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente nacional,
distrital, estaduais ou municipais, devidamente comprova-
Art. 257. Descumprir obrigação constante dos arts. 78 e das, sendo essas integralmente deduzidas do imposto de
79 desta Lei: renda, obedecidos os seguintes limites: 
Pena - multa de três a vinte salários de referência, du- I - 1% (um por cento) do imposto sobre a renda devido
plicando-se a pena em caso de reincidência, sem prejuízo de apurado pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lu-
apreensão da revista ou publicação. cro real; e
II - 6% (seis por cento) do imposto sobre a renda apu-
Art. 258. Deixar o responsável pelo estabelecimento ou o rado pelas pessoas físicas na Declaração de Ajuste Anual,
empresário de observar o que dispõe esta Lei sobre o acesso observado o disposto no art. 22 da Lei no 9.532, de 10 de
de criança ou adolescente aos locais de diversão, ou sobre dezembro de 1997.
sua participação no espetáculo: § 1º - (Revogado)
Pena - multa de três a vinte salários de referência; em § 1o-A.  Na definição das prioridades a serem atendidas
caso de reincidência, a autoridade judiciária poderá deter- com os recursos captados pelos fundos nacional, estaduais
minar o fechamento do estabelecimento por até quinze dias. e municipais dos direitos da criança e do adolescente, serão
consideradas as disposições do Plano Nacional de Promo-
Art. 258-A.  Deixar a autoridade competente de provi- ção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes
denciar a instalação e operacionalização dos cadastros pre- à Convivência Familiar e Comunitária e as do Plano Nacio-
vistos no art. 50 e no § 11 do art. 101 desta Lei:  nal pela Primeira Infância.  

68
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

§ 2o   Os conselhos nacional, estaduais e municipais Art. 260-B.  A doação de que trata o inciso I do art. 260
dos direitos da criança e do adolescente fixarão critérios de poderá ser deduzida:
utilização, por meio de planos de aplicação, das dotações I - do imposto devido no trimestre, para as pessoas jurí-
subsidiadas e demais receitas, aplicando necessariamen- dicas que apuram o imposto trimestralmente; e
te percentual para incentivo ao acolhimento, sob a forma II - do imposto devido mensalmente e no ajuste anual,
de guarda, de crianças e adolescentes e para programas de para as pessoas jurídicas que apuram o imposto anualmente. 
atenção integral à primeira infância em áreas de maior ca- Parágrafo único.  A doação deverá ser efetuada dentro
rência socioeconômica e em situações de calamidade.   do período a que se refere a apuração do imposto.
§ 3º O Departamento da Receita Federal, do Ministé-
rio da Economia, Fazenda e Planejamento, regulamentará Art. 260-C.  As doações de que trata o art. 260 desta Lei
a comprovação das doações feitas aos fundos, nos termos podem ser efetuadas em espécie ou em bens. 
deste artigo. Parágrafo único.  As doações efetuadas em espécie de-
§ 4º O Ministério Público determinará em cada comar-
vem ser depositadas em conta específica, em instituição fi-
ca a forma de fiscalização da aplicação, pelo Fundo Muni-
nanceira pública, vinculadas aos respectivos fundos de que
cipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, dos incen-
trata o art. 260.
tivos fiscais referidos neste artigo.
§ 5o  Observado o disposto no § 4o do art. 3o da Lei no
9.249, de 26 de dezembro de 1995, a dedução de que trata Art. 260-D.  Os órgãos responsáveis pela administração
o inciso I do caput:  das contas dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adoles-
I - será considerada isoladamente, não se submetendo a cente nacional, estaduais, distrital e municipais devem emitir
limite em conjunto com outras deduções do imposto; e recibo em favor do doador, assinado por pessoa competente
II - não poderá ser computada como despesa operacio- e pelo presidente do Conselho correspondente, especificando:
nal na apuração do lucro real. I - número de ordem; 
II - nome, Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ)
Art. 260-A.  A partir do exercício de 2010, ano-calen- e endereço do emitente; 
dário de 2009, a pessoa física poderá optar pela doação de III - nome, CNPJ ou Cadastro de Pessoas Físicas (CPF)
que trata o inciso II do caput do art. 260 diretamente em sua do doador;
Declaração de Ajuste Anual.  IV - data da doação e valor efetivamente recebido; e
§ 1o  A doação de que trata o caput poderá ser deduzida V - ano-calendário a que se refere a doação.
até os seguintes percentuais aplicados sobre o imposto apu- § 1o  O comprovante de que trata o caput deste artigo
rado na declaração: pode ser emitido anualmente, desde que discrimine os valo-
I - (VETADO); res doados mês a mês. 
II - (VETADO);  § 2o  No caso de doação em bens, o comprovante
III - 3% (três por cento) a partir do exercício de 2012. deve conter a identificação dos bens, mediante descrição
§ 2o  A dedução de que trata o caput: em campo próprio ou em relação anexa ao comprovante,
I - está sujeita ao limite de 6% (seis por cento) do impos- informando também se houve avaliação, o nome, CPF ou
to sobre a renda apurado na declaração de que trata o inciso CNPJ e endereço dos avaliadores.
II do caput do art. 260;
II - não se aplica à pessoa física que:  Art. 260-E.  Na hipótese da doação em bens, o doador
a) utilizar o desconto simplificado; deverá:
b) apresentar declaração em formulário; ou 
I - comprovar a propriedade dos bens, mediante docu-
c) entregar a declaração fora do prazo;
mentação hábil;
III - só se aplica às doações em espécie; e 
II - baixar os bens doados na declaração de bens e direi-
IV - não exclui ou reduz outros benefícios ou deduções
em vigor. tos, quando se tratar de pessoa física, e na escrituração, no
§ 3o  O pagamento da doação deve ser efetuado até a caso de pessoa jurídica; e
data de vencimento da primeira quota ou quota única do III - considerar como valor dos bens doados:
imposto, observadas instruções específicas da Secretaria a) para as pessoas físicas, o valor constante da última
da Receita Federal do Brasil. declaração do imposto de renda, desde que não exceda o
§ 4o  O não pagamento da doação no prazo estabeleci- valor de mercado;
do no § 3o implica a glosa definitiva desta parcela de dedu- b) para as pessoas jurídicas, o valor contábil dos bens.
ção, ficando a pessoa física obrigada ao recolhimento da di- Parágrafo único.  O preço obtido em caso de leilão não
ferença de imposto devido apurado na Declaração de Ajuste será considerado na determinação do valor dos bens doados,
Anual com os acréscimos legais previstos na legislação.  exceto se o leilão for determinado por autoridade judiciária.
§ 5o  A pessoa física poderá deduzir do imposto apu-
rado na Declaração de Ajuste Anual as doações feitas, no Art. 260-F.  Os documentos a que se referem os arts.
respectivo ano-calendário, aos fundos controlados pelos 260-D e 260-E devem ser mantidos pelo contribuinte por um
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente mu- prazo de 5 (cinco) anos para fins de comprovação da dedu-
nicipais, distrital, estaduais e nacional concomitantemente ção perante a Receita Federal do Brasil.
com a opção de que trata o caput, respeitado o limite pre-
visto no inciso II do art. 260. Art. 260-G.  Os órgãos responsáveis pela administração

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

das contas dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adoles- Art. 261. A falta dos conselhos municipais dos direitos da
cente nacional, estaduais, distrital e municipais devem: criança e do adolescente, os registros, inscrições e alterações
I - manter conta bancária específica destinada exclusi- a que se referem os arts. 90, parágrafo único, e 91 desta Lei
vamente a gerir os recursos do Fundo;  serão efetuados perante a autoridade judiciária da comarca
II - manter controle das doações recebidas; e  a que pertencer a entidade.
III - informar anualmente à Secretaria da Receita Fede- Parágrafo único. A União fica autorizada a repassar aos
ral do Brasil as doações recebidas mês a mês, identificando estados e municípios, e os estados aos municípios, os recur-
os seguintes dados por doador: sos referentes aos programas e atividades previstos nesta Lei,
a) nome, CNPJ ou CPF; tão logo estejam criados os conselhos dos direitos da criança
b) valor doado, especificando se a doação foi em espécie e do adolescente nos seus respectivos níveis.
ou em bens.
Art. 262. Enquanto não instalados os Conselhos Tute-
Art. 260-H.  Em caso de descumprimento das obrigações lares, as atribuições a eles conferidas serão exercidas pela
previstas no art. 260-G, a Secretaria da Receita Federal do autoridade judiciária.
Brasil dará conhecimento do fato ao Ministério Público.
Art. 263. O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
Art. 260-I.  Os Conselhos dos Direitos da Criança e do 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes alte-
Adolescente nacional, estaduais, distrital e municipais divul- rações:
garão amplamente à comunidade: 1) Art. 121 (...)
I - o calendário de suas reuniões; § 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de um
II - as ações prioritárias para aplicação das políticas de terço, se o crime resulta de inobservância de regra técnica
atendimento à criança e ao adolescente; de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar
III - os requisitos para a apresentação de projetos a se- imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conse-
rem beneficiados com recursos dos Fundos dos Direitos da quências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante.
Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de um terço,
Criança e do Adolescente nacional, estaduais, distrital ou
se o crime é praticado contra pessoa menor de catorze anos.
municipais;
2) Art. 129 (...)
IV - a relação dos projetos aprovados em cada ano-ca-
§ 7º Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qual-
lendário e o valor dos recursos previstos para implementa-
quer das hipóteses do art. 121, § 4º.
ção das ações, por projeto;
§ 8º Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do
V - o total dos recursos recebidos e a respectiva destina-
art. 121.
ção, por projeto atendido, inclusive com cadastramento na
3) Art. 136 (...)
base de dados do Sistema de Informações sobre a Infância e § 3º Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é prati-
a Adolescência; e cado contra pessoa menor de catorze anos.
VI - a avaliação dos resultados dos projetos beneficiados 4) Art. 213 (...)
com recursos dos Fundos dos Direitos da Criança e do Ado- Parágrafo único. Se a ofendida é menor de catorze anos:
lescente nacional, estaduais, distrital e municipais. Pena - reclusão de quatro a dez anos.
5) Art. 214 (...)
Art. 260-J.  O Ministério Público determinará, em cada Parágrafo único. Se o ofendido é menor de catorze anos:
Comarca, a forma de fiscalização da aplicação dos incenti- Pena - reclusão de três a nove anos.”
vos fiscais referidos no art. 260 desta Lei.
Parágrafo único.  O descumprimento do disposto nos Art. 264. O art. 102 da Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro
arts. 260-G e 260-I sujeitará os infratores a responder por de 1973, fica acrescido do seguinte item:
ação judicial proposta pelo Ministério Público, que poderá “Art. 102 (...)
atuar de ofício, a requerimento ou representação de qual- 6º) a perda e a suspensão do pátrio poder.”
quer cidadão.
Art. 265. A Imprensa Nacional e demais gráficas da
Art. 260-K.  A Secretaria de Direitos Humanos da Pre- União, da administração direta ou indireta, inclusive funda-
sidência da República (SDH/PR) encaminhará à Secretaria ções instituídas e mantidas pelo poder público federal pro-
da Receita Federal do Brasil, até 31 de outubro de cada ano, moverão edição popular do texto integral deste Estatuto, que
arquivo eletrônico contendo a relação atualizada dos Fundos será posto à disposição das escolas e das entidades de aten-
dos Direitos da Criança e do Adolescente nacional, distrital, dimento e de defesa dos direitos da criança e do adolescente.
estaduais e municipais, com a indicação dos respectivos nú-
meros de inscrição no CNPJ e das contas bancárias especí- Art. 265-A.  O poder público fará periodicamente am-
ficas mantidas em instituições financeiras públicas, destina- pla divulgação dos direitos da criança e do adolescente nos
das exclusivamente a gerir os recursos dos Fundos. meios de comunicação social.
Parágrafo único.  A divulgação a que se refere o caput
Art. 260-L.  A Secretaria da Receita Federal do Brasil ex- será veiculada em linguagem clara, compreensível e ade-
pedirá as instruções necessárias à aplicação do disposto nos quada a crianças e adolescentes, especialmente às crianças
arts. 260 a 260-K. com idade inferior a 6 (seis) anos.

70
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 266. Esta Lei entra em vigor noventa dias após sua Art. 207. As universidades gozam de autonomia didá-
publicação. tico-científica, administrativa e de gestão financeira e pa-
Parágrafo único. Durante o período de vacância deverão trimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade
ser promovidas atividades e campanhas de divulgação e es- entre ensino, pesquisa e extensão.
clarecimentos acerca do disposto nesta Lei. § 1º É facultado às universidades admitir professores,
técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei. (Incluído
Art. 267. Revogam-se as Leis nº 4.513, de 1964, e 6.697, pela Emenda Constitucional nº 11, de 1996)
de 10 de outubro de 1979 (Código de Menores), e as demais § 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições
de pesquisa científica e tecnológica. (Incluído pela Emenda
disposições em contrário.
Constitucional nº 11, de 1996)
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efeti-
Brasília, 13 de julho de 1990; 169º da Independência e vado mediante a garantia de:
102º da República. I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (qua-
tro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclu-
sive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tive-
ram acesso na idade própria; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA nº 59, de 2009)
DO BRASIL (ART. 205 A 214). II - progressiva universalização do ensino médio gra-
tuito; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de
1996)
III - atendimento educacional especializado aos por-
CAPÍTULO III tadores de deficiência, preferencialmente na rede regular
DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO de ensino;
Seção I IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crian-
DA EDUCAÇÃO ças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela Emen-
da Constitucional nº 53, de 2006)
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesqui-
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Esta-
sa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
do e da família, será promovida e incentivada com a cola- VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às
boração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento condições do educando;
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da
qualificação para o trabalho. educação básica, por meio de programas suplementares
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos se- de material didáticoescolar, transporte, alimentação e as-
guintes princípios: sistência à saúde. (Redação dada pela Emenda Constitucio-
I - igualdade de condições para o acesso e permanên- nal nº 59, de 2009)
cia na escola; § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar público subjetivo.
o pensamento, a arte e o saber; § 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabi-
e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; lidade da autoridade competente.
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimen- § 3º Compete ao Poder Público recensear os educan-
tos oficiais; dos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar,
V - valorização dos profissionais da educação escolar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.
garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingres- Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas
as seguintes condições:
so exclusivamente por concurso público de provas e títulos,
I - cumprimento das normas gerais da educação na-
aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Cons-
cional;
titucional nº 53, de 2006) II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder
VI - gestão democrática do ensino público, na forma Público.
da lei; Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o en-
VII - garantia de padrão de qualidade. sino fundamental, de maneira a assegurar formação básica
VIII - piso salarial profissional nacional para os profis- comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacio-
sionais da educação escolar pública, nos termos de lei fe- nais e regionais.
deral. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006) § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, cons-
Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de tituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas
trabalhadores considerados profissionais da educação bá- de ensino fundamental.
sica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou ade-
quação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos § 2º O ensino fundamental regular será ministrado em
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (Incluído pela língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas
Emenda Constitucional nº 53, de 2006) também a utilização de suas línguas maternas e processos
próprios de aprendizagem.

71
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os colas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitá-
Municípios organizarão em regime de colaboração seus rias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:
sistemas de ensino. I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e seus excedentes financeiros em educação;
o dos Territórios, financiará as instituições de ensino pú- II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra
blicas federais e exercerá, em matéria educacional, função escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Po-
redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização der Público, no caso de encerramento de suas atividades.
de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qua- § 1º - Os recursos de que trata este artigo poderão ser
lidade do ensino mediante assistência técnica e financeira destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; (Redação e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insu-
dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996) ficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cur-
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino sos regulares da rede pública na localidade da residência
fundamental e na educação infantil. (Redação dada pela do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir
Emenda Constitucional nº 14, de 1996) prioritariamente na expansão de sua rede na localidade.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão priorita- § 2º As atividades de pesquisa, de extensão e de estí-
riamente no ensino fundamental e médio. (Incluído pela mulo e fomento à inovação realizadas por universidades e/
Emenda Constitucional nº 14, de 1996) ou por instituições de educação profissional e tecnológica
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a poderão receber apoio financeiro do Poder Público.   (Re-
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios defini- dação dada pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015)
rão formas de colaboração, de modo a assegurar a univer- Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de edu-
salização do ensino obrigatório.(Redação dada pela Emen- cação, de duração decenal, com o objetivo de articular o
da Constitucional nº 59, de 2009) sistema nacional de educação em regime de colaboração
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritaria- e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de imple-
mente ao ensino regular. (Incluído pela Emenda Constitu- mentação para assegurar a manutenção e desenvolvimen-
cional nº 53, de 2006) to do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades
Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos por meio de ações integradas dos poderes públicos das
de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios diferentes esferas federativas que conduzam a: (Redação
vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
impostos, compreendida a proveniente de transferências, I - erradicação do analfabetismo;
na manutenção e desenvolvimento do ensino. II - universalização do atendimento escolar;
§ 1º A parcela da arrecadação de impostos transferida III - melhoria da qualidade do ensino;
pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí- IV - formação para o trabalho;
pios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios, não é V - promoção humanística, científica e tecnológica do País.
considerada, para efeito do cálculo previsto neste artigo, VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos
receita do governo que a transferir. públicos em educação como proporção do produto interno
§ 2º Para efeito do cumprimento do disposto no bruto. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
«caput» deste artigo, serão considerados os sistemas de
ensino federal, estadual e municipal e os recursos aplicados
na forma do art. 213.
§ 3º A distribuição dos recursos públicos assegurará LEI FEDERAL 10.639/2003 (ESTABELECE
prioridade ao atendimento das necessidades do ensino
AS DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO
obrigatório, no que se refere a universalização, garantia de
padrão de qualidade e equidade, nos termos do plano na- NACIONAL, PARA INCLUIR NO
cional de educação. (Redação dada pela Emenda Constitu- CURRÍCULO OFICIAL DA REDE DE ENSINO
cional nº 59, de 2009) A OBRIGATORIEDADE DA TEMÁTICA
§ 4º Os programas suplementares de alimentação e “HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA).
assistência à saúde previstos no art. 208, VII, serão financia-
dos com recursos provenientes de contribuições sociais e
outros recursos orçamentários.
§ 5º A educação básica pública terá como fonte adicio- LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.
nal de financiamento a contribuição social do salário-edu-
cação, recolhida pelas empresas na forma da lei. (Redação Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006) estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
§ 6º As cotas estaduais e municipais da arrecadação da incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatorie-
contribuição social do salário-educação serão distribuídas dade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá
proporcionalmente ao número de alunos matriculados na outras providências.
educação básica nas respectivas redes públicas de ensi-
no. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)  O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o
Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às es- Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

72
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, pas- o negro e o índio na formação da sociedade nacional, res-
sa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B: gatando as suas contribuições nas áreas social, econômica
«Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino funda- e política, pertinentes à história do Brasil.
mental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório § 2o  Os conteúdos referentes à história e cultura afro-
o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. -brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão minis-
§ 1o O conteúdo programático a que se refere trados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial
o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África nas áreas de educação artística e de literatura e história
e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileiras.” (NR)
brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, Art. 2o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publi-
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, cação.
econômica e política pertinentes à História do Brasil. Brasília,  10  de  março  de 2008; 187o da Independência
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro- e 120o da República.
-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-
escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de 2010/2008/Lei/L11645.htm>
Literatura e História Brasileiras.
§ 3o (VETADO)»
«Art. 79-A. (VETADO)»
“Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de no-
vembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’.” LEI FEDERAL 9.795/1999 (INSTITUI A
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e AMBIENTAL).
115o da República.
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/
L10.639.htm> Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política
Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Con-
gresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
LEI FEDERAL Nº 11.645 DE 08/03/2008
(ESTABELECE AS DIRETRIZES E BASES DA
CAPÍTULO I
EDUCAÇÃO NACIONAL, PARA INCLUIR NO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
CURRÍCULO OFICIAL DA REDE DE ENSINO
A OBRIGATORIEDADE DA TEMÁTICA Art. 1o Entendem-se por educação ambiental os pro-
“HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E cessos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade
INDÍGENA.). constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, ati-
tudes e competências voltadas para a conservação do meio
ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia
qualidade de vida e sua sustentabilidade.
Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, mo- Art. 2o A educação ambiental é um componente es-
dificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que sencial e permanente da educação nacional, devendo estar
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para presente, de forma articulada, em todos os níveis e moda-
incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatorie- lidades do processo educativo, em caráter formal e não-
dade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indí- -formal.
gena”. Art. 3o Como parte do processo educativo mais amplo,
todos têm direito à educação ambiental, incumbindo:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Con- I - ao Poder Público, nos termos dos  arts. 205 e 225
gresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: da Constituição Federal,  definir políticas públicas que in-
Art. 1o  O art. 26-A da Lei no 9.394, de 20 de dezembro corporem a dimensão ambiental, promover a educação
de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: ambiental em todos os níveis de ensino e o engajamento
“Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino funda- da sociedade na conservação, recuperação e melhoria do
mental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se meio ambiente;
obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e II - às instituições educativas, promover a educação
indígena. ambiental de maneira integrada aos programas educacio-
§ 1o  O conteúdo programático a que se refere este ar- nais que desenvolvem;
tigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que III - aos órgãos integrantes do Sistema Nacional de
caracterizam a formação da população brasileira, a partir Meio Ambiente - Sisnama, promover ações de educação
desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história ambiental integradas aos programas de conservação, recu-
da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos peração e melhoria do meio ambiente;
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e

73
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV - aos meios de comunicação de massa, colaborar de CAPÍTULO II


maneira ativa e permanente na disseminação de informa- DA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL
ções e práticas educativas sobre meio ambiente e incorpo- Seção I
rar a dimensão ambiental em sua programação; Disposições Gerais
V - às empresas, entidades de classe, instituições públi-
cas e privadas, promover programas destinados à capaci- Art. 6o É instituída a Política Nacional de Educação Am-
tação dos trabalhadores, visando à melhoria e ao controle biental.
efetivo sobre o ambiente de trabalho, bem como sobre as Art. 7o A Política Nacional de Educação Ambiental en-
repercussões do processo produtivo no meio ambiente; volve em sua esfera de ação, além dos órgãos e entidades
VI - à sociedade como um todo, manter atenção per- integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - Sis-
manente à formação de valores, atitudes e habilidades que nama, instituições educacionais públicas e privadas dos
propiciem a atuação individual e coletiva voltada para a pre- sistemas de ensino, os órgãos públicos da União, dos Esta-
dos, do Distrito Federal e dos Municípios, e organizações
venção, a identificação e a solução de problemas ambientais.
não-governamentais com atuação em educação ambiental.
Art. 4o São princípios básicos da educação ambiental:
Art. 8o As atividades vinculadas à Política Nacional de
I - o enfoque humanista, holístico, democrático e par-
Educação Ambiental devem ser desenvolvidas na educação
ticipativo;
em geral e na educação escolar, por meio das seguintes
II - a concepção do meio ambiente em sua totalidade, linhas de atuação inter-relacionadas:
considerando a interdependência entre o meio natural, o I - capacitação de recursos humanos;
sócio-econômico e o cultural, sob o enfoque da sustenta- II - desenvolvimento de estudos, pesquisas e experi-
bilidade; mentações;
III - o pluralismo de idéias e concepções pedagógicas, III - produção e divulgação de material educativo;
na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade; IV - acompanhamento e avaliação.
IV - a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e § 1o Nas atividades vinculadas à Política Nacional de
as práticas sociais; Educação Ambiental serão respeitados os princípios e ob-
V - a garantia de continuidade e permanência do pro- jetivos fixados por esta Lei.
cesso educativo; § 2o A capacitação de recursos humanos voltar-se-á para:
VI - a permanente avaliação crítica do processo edu- I - a incorporação da dimensão ambiental na formação,
cativo; especialização e atualização dos educadores de todos os
VII - a abordagem articulada das questões ambientais níveis e modalidades de ensino;
locais, regionais, nacionais e globais; II - a incorporação da dimensão ambiental na forma-
VIII - o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à ção, especialização e atualização dos profissionais de todas
diversidade individual e cultural. as áreas;
Art. 5o São objetivos fundamentais da educação am- III - a preparação de profissionais orientados para as
biental: atividades de gestão ambiental;
I - o desenvolvimento de uma compreensão integrada IV - a formação, especialização e atualização de profis-
do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, sionais na área de meio ambiente;
envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, polí- V - o atendimento da demanda dos diversos segmen-
ticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos; tos da sociedade no que diz respeito à problemática am-
II - a garantia de democratização das informações am- biental.
bientais; § 3o As ações de estudos, pesquisas e experimentações
voltar-se-ão para:
III - o estímulo e o fortalecimento de uma consciência
I - o desenvolvimento de instrumentos e metodolo-
crítica sobre a problemática ambiental e social;
gias, visando à incorporação da dimensão ambiental, de
IV - o incentivo à participação individual e coletiva, per-
forma interdisciplinar, nos diferentes níveis e modalidades
manente e responsável, na preservação do equilíbrio do
de ensino;
meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade am- II - a difusão de conhecimentos, tecnologias e informa-
biental como um valor inseparável do exercício da cidadania; ções sobre a questão ambiental;
V - o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do III - o desenvolvimento de instrumentos e metodolo-
País, em níveis micro e macrorregionais, com vistas à constru- gias, visando à participação dos interessados na formula-
ção de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada ção e execução de pesquisas relacionadas à problemática
nos princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, demo- ambiental;
cracia, justiça social, responsabilidade e sustentabilidade; IV - a busca de alternativas curriculares e metodológi-
VI - o fomento e o fortalecimento da integração com a cas de capacitação na área ambiental;
ciência e a tecnologia; V - o apoio a iniciativas e experiências locais e regio-
VII - o fortalecimento da cidadania, autodeterminação nais, incluindo a produção de material educativo;
dos povos e solidariedade como fundamentos para o futu- VI - a montagem de uma rede de banco de dados e
ro da humanidade. imagens, para apoio às ações enumeradas nos incisos I a V.

74
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Seção II III - a participação de empresas públicas e privadas no


Da Educação Ambiental no Ensino Formal desenvolvimento de programas de educação ambiental
em parceria com a escola, a universidade e as organizações
Art. 9o Entende-se por educação ambiental na educa- não-governamentais;
ção escolar a desenvolvida no âmbito dos currículos das IV - a sensibilização da sociedade para a importância
instituições de ensino públicas e privadas, englobando: das unidades de conservação;
I - educação básica: V - a sensibilização ambiental das populações tradicio-
a) educação infantil; nais ligadas às unidades de conservação;
b) ensino fundamental e VI - a sensibilização ambiental dos agricultores;
c) ensino médio; VII - o ecoturismo.
II - educação superior;
III - educação especial; CAPÍTULO III
IV - educação profissional; DA EXECUÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE EDU-
V - educação de jovens e adultos. CAÇÃO AMBIENTAL
Art. 10. A educação ambiental será desenvolvida como
uma prática educativa integrada, contínua e permanente Art. 14. A coordenação da Política Nacional de Educa-
em todos os níveis e modalidades do ensino formal. ção Ambiental ficará a cargo de um órgão gestor, na forma
§ 1o A educação ambiental não deve ser implantada definida pela regulamentação desta Lei.
como disciplina específica no currículo de ensino. Art. 15. São atribuições do órgão gestor:
§ 2o Nos cursos de pós-graduação, extensão e nas I - definição de diretrizes para implementação em âm-
áreas voltadas ao aspecto metodológico da educação am- bito nacional;
biental, quando se fizer necessário, é facultada a criação de II - articulação, coordenação e supervisão de planos,
disciplina específica. programas e projetos na área de educação ambiental, em
§ 3o Nos cursos de formação e especialização técni- âmbito nacional;
III - participação na negociação de financiamentos a pla-
co-profissional, em todos os níveis, deve ser incorporado
nos, programas e projetos na área de educação ambiental.
conteúdo que trate da ética ambiental das atividades pro-
Art. 16. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
fissionais a serem desenvolvidas.
na esfera de sua competência e nas áreas de sua jurisdi-
Art. 11. A dimensão ambiental deve constar dos currí-
ção, definirão diretrizes, normas e critérios para a educação
culos de formação de professores, em todos os níveis e em
ambiental, respeitados os princípios e objetivos da Política
todas as disciplinas.
Nacional de Educação Ambiental.
Parágrafo único. Os professores em atividade devem
Art. 17. A eleição de planos e programas, para fins de
receber formação complementar em suas áreas de atua-
alocação de recursos públicos vinculados à Política Nacio-
ção, com o propósito de atender adequadamente ao cum- nal de Educação Ambiental, deve ser realizada levando-se
primento dos princípios e objetivos da Política Nacional de em conta os seguintes critérios:
Educação Ambiental. I - conformidade com os princípios, objetivos e diretri-
Art. 12. A autorização e supervisão do funcionamento zes da Política Nacional de Educação Ambiental;
de instituições de ensino e de seus cursos, nas redes públi- II - prioridade dos órgãos integrantes do Sisnama e do
ca e privada, observarão o cumprimento do disposto nos Sistema Nacional de Educação;
arts. 10 e 11 desta Lei. III - economicidade, medida pela relação entre a mag-
nitude dos recursos a alocar e o retorno social propiciado
Seção III pelo plano ou programa proposto.
Da Educação Ambiental Não-Formal Parágrafo único. Na eleição a que se refere
o caput deste artigo, devem ser contemplados, de forma
Art. 13. Entendem-se por educação ambiental não-for- equitativa, os planos, programas e projetos das diferen-
mal as ações e práticas educativas voltadas à sensibilização tes regiões do País.
da coletividade sobre as questões ambientais e à sua or- Art. 18. (VETADO)
ganização e participação na defesa da qualidade do meio Art. 19. Os programas de assistência técnica e financei-
ambiente. ra relativos a meio ambiente e educação, em níveis federal,
Parágrafo único. O Poder Público, em níveis federal, es- estadual e municipal, devem alocar recursos às ações de
tadual e municipal, incentivará: educação ambiental.
I - a difusão, por intermédio dos meios de comunicação
de massa, em espaços nobres, de programas e campanhas CAPÍTULO IV
educativas, e de informações acerca de temas relacionados DISPOSIÇÕES FINAIS
ao meio ambiente;
II - a ampla participação da escola, da universidade Art. 20. O Poder Executivo regulamentará esta Lei no
e de organizações não-governamentais na formulação e prazo de noventa dias de sua publicação, ouvidos o Con-
execução de programas e atividades vinculadas à educação selho Nacional de Meio Ambiente e o Conselho Nacional
ambiental não-formal; de Educação.

75
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

Art. 21. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.


Brasília, 27 de abril de 1999; 178o da Independência e RESOLUÇÃO Nº 4/CNE DE 02/10/2009
111  da República.
o
– INSTITUI AS DIRETRIZES PARA
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9795.htm>
ATENDIMENTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do


LEI FEDERAL Nº 11.274/2006 (ESTABELECE Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribui-
AS DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO ções legais, de conformidade com o disposto na alínea “c”
NACIONAL, DISPONDO SOBRE A DURAÇÃO do artigo 9º da Lei nº 4.024/1961, com a redação dada
DE 9 (NOVE) ANOS PARA O ENSINO pela Lei nº 9.131/1995, bem como no artigo 90, no § 1º
FUNDAMENTAL, COM MATRÍCULA do artigo 8º e no § 1º do artigo 9º da Lei nº 9.394/1996,
OBRIGATÓRIA A PARTIR DOS 6 (SEIS) ANOS considerando a Constituição Federal de 1988; a Lei nº
10.098/2000; a Lei nº 10.436/2002; a Lei nº 11.494/2007;
DE IDADE.). o Decreto nº 3.956/2001; o Decreto nº 5.296/2004; o De-
creto nº 5.626/2005; o Decreto nº 6.253/2007; o Decreto
nº 6.571/2008; e o Decreto Legislativo nº 186/2008, e com
fundamento no Parecer CNE/CEB nº 13/2009, homologado
Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação,
de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e publicado no DOU de 24 de setembro de 2009, resolve:
bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de
9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula Art. 1º Para a implementação do Decreto nº 6.571/2008,
obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. os sistemas de ensino devem matricular os alunos com de-
ficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Con- habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino
gresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE),
Art. 1o (VETADO) ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em
Art. 2o (VETADO) centros de Atendimento Educacional Especializado da
Art. 3o O art. 32 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais
1996, passa a vigorar com a seguinte redação: ou filantrópicas sem fins lucrativos.
“Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com dura- Art. 2º O AEE tem como função complementar ou su-
ção de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando- plementar a formação do aluno por meio da disponibili-
-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação zação de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias
básica do cidadão, mediante: que eliminem as barreiras para sua plena participação na
...................................................................................” (NR) sociedade e desenvolvimento de sua
Art. 4o O § 2o e o inciso I do § 3o do art. 87 da Lei nº aprendizagem.
9.394, de 20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com Parágrafo único. Para fins destas Diretrizes, conside-
a seguinte redação: ram-se recursos de acessibilidade na educação aqueles
“Art. 87 ................................................................................... que asseguram condições de acesso ao currículo dos alu-
................................................................................... nos com deficiência ou mobilidade reduzida, promoven-
§ 2o O poder público deverá recensear os educandos do a utilização dos materiais didáticos e pedagógicos, dos
no ensino fundamental, com especial atenção para o grupo espaços, dos mobiliários e equipamentos, dos sistemas de
de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos de idade e de 15 (quinze) a comunicação e informação, dos transportes e dos demais
16 (dezesseis) anos de idade. serviços.
§ 3o ................................................................................... Art. 3º A Educação Especial se realiza em todos os ní-
I – matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) veis, etapas e modalidades de ensino, tendo o AEE como
anos de idade no ensino fundamental; parte integrante do processo educacional.
a) (Revogado) Art. 4º Para fins destas Diretrizes, considera-se públi-
b) (Revogado) co-alvo do AEE:
c) (Revogado) I – Alunos com deficiência: aqueles que têm impedi-
...................................................................................” (NR) mentos de longo prazo de natureza física, intelectual, men-
Art. 5o Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal tal ou sensorial.
terão prazo até 2010 para implementar a obrigatoriedade II – Alunos com transtornos globais do desenvolvimen-
para o ensino fundamental disposto no art. 3o desta Lei e a to: aqueles que apresentam um quadro de alterações no
abrangência da pré-escola de que trata o art. 2o desta Lei. desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas
Art. 6o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras.
Brasília, 6 de fevereiro de 2006; 185o da Independência Incluem-se nessa definição alunos com autismo clássico,
e 118o da República. síndrome de Asperger, síndrome de Rett, transtorno desin-
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- tegrativo da infância (psicoses) e transtornos invasivos sem
2006/2006/Lei/L11274.htm> outra especificação.

76
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

III – Alunos com altas habilidades/superdotação: aque- IV – plano do AEE: identificação das necessidades edu-
les que apresentam um potencial elevado e grande envol- cacionais específicas dos alunos, definição dos recursos ne-
vimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas cessários e das atividades a serem desenvolvidas;
ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e V – professores para o exercício da docência do AEE;
criatividade. VI – outros profissionais da educação: tradutor e intér-
Art. 5º O AEE é realizado, prioritariamente, na sala de prete de Língua Brasileira de Sinais, guia-intérprete e ou-
recursos multifuncionais da própria escola ou em outra es- tros que atuem no apoio, principalmente às atividades de
cola de ensino regular, no turno inverso da escolarização, alimentação, higiene e locomoção;
não sendo substitutivo às classes comuns, podendo ser rea- VII – redes de apoio no âmbito da atuação profissional,
lizado, também, em centro de Atendimento Educacional Es- da formação, do desenvolvimento da pesquisa, do acesso
pecializado da rede pública ou de instituições comunitárias, a recursos, serviços e equipamentos, entre outros que ma-
confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, con- ximizem o AEE.
veniadas com a Secretaria de Educação ou órgão equiva- Parágrafo único. Os profissionais referidos no inciso VI
atuam com os alunos público-alvo da Educação Especial
lente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios.
em todas as atividades escolares nas quais se fizerem ne-
Art. 6º Em casos de Atendimento Educacional Especia-
cessários.
lizado em ambiente hospitalar ou domiciliar, será ofertada Art. 11. A proposta de AEE, prevista no projeto peda-
aos alunos, pelo respectivo sistema de ensino, a Educação gógico do centro de Atendimento Educacional Especiali-
Especial de forma complementar ou suplementar. zado público ou privado sem fins lucrativos, conveniado
Art. 7º Os alunos com altas habilidades/superdotação para essa
terão suas atividades de enriquecimento curricular desen- finalidade, deve ser aprovada pela respectiva Secretaria
volvidas no âmbito de escolas públicas de ensino regular de Educação ou órgão equivalente, contemplando a orga-
em interface com os núcleos de atividades para altas habili- nização disposta no artigo 10 desta Resolução.
dades/superdotação e com as instituições de ensino supe- Parágrafo único. Os centros de Atendimento Educacio-
rior e institutos voltados ao desenvolvimento e promoção nal Especializado devem cumprir as exigências legais esta-
da pesquisa, das artes e dos esportes. belecidas pelo Conselho de Educação do respectivo siste-
Art. 8º Serão contabilizados duplamente, no âmbito ma de ensino, quanto ao seu credenciamento, autorização
do FUNDEB, de acordo com o Decreto nº 6.571/2008, os de funcionamento e organização, em consonância com as
alunos matriculados em classe comum de ensino regular orientações preconizadas nestas Diretrizes Operacionais.
público que tiverem matrícula concomitante no AEE. Art. 12. Para atuação no AEE, o professor deve ter for-
Parágrafo único. O financiamento da matrícula no AEE mação inicial que o habilite para o exercício da docência e
é condicionado à matrícula no ensino regular da rede pú- formação específica para a Educação Especial.
blica, conforme registro no Censo Escolar/MEC/INEP do Art. 13. São atribuições do professor do Atendimento
ano anterior, sendo contemplada: Educacional Especializado:
a) matrícula em classe comum e em sala de recursos I – identificar, elaborar, produzir e organizar serviços,
multifuncionais da mesma escola pública; recursos pedagógicos, de acessibilidade e estratégias con-
b) matrícula em classe comum e em sala de recursos siderando as necessidades específicas dos alunos público-
multifuncionais de outra escola pública; -alvo da Educação Especial;
c) matrícula em classe comum e em centro de Atendi- II – elaborar e executar plano de Atendimento Educa-
mento Educacional Especializado de instituição de Educa- cional Especializado, avaliando a funcionalidade e a apli-
cabilidade dos recursos pedagógicos e de acessibilidade;
ção Especial pública;
III – organizar o tipo e o número de atendimentos aos
d) matrícula em classe comum e em centro de Atendi-
alunos na sala de recursos multifuncionais;
mento Educacional Especializado de instituições de Edu- IV – acompanhar a funcionalidade e a aplicabilidade
cação Especial comunitárias, confessionais ou filantrópicas dos recursos pedagógicos e de acessibilidade na sala de
sem fins lucrativos. aula comum do ensino regular, bem como em outros am-
Art. 9º A elaboração e a execução do plano de AEE são bientes da escola;
de competência dos professores que atuam na sala de re- V – estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais na
cursos multifuncionais ou centros de AEE, em articulação elaboração de estratégias e na disponibilização de recursos
com os demais professores do ensino regular, com a parti- de acessibilidade;
cipação das famílias e em interface com os demais serviços VI – orientar professores e famílias sobre os recursos
setoriais da saúde, da assistência social, entre outros neces- pedagógicos e de acessibilidade utilizados pelo aluno;
sários ao atendimento. VII – ensinar e usar a tecnologia assistiva de forma a
Art. 10. O projeto pedagógico da escola de ensino re- ampliar habilidades funcionais dos alunos, promovendo
gular deve institucionalizar a oferta do AEE prevendo na autonomia e participação;
sua organização: VIII – estabelecer articulação com os professores da
I – sala de recursos multifuncionais: espaço físico, mo- sala de aula comum, visando à disponibilização dos ser-
biliário, materiais didáticos, recursos pedagógicos e de viços, dos recursos pedagógicos e de acessibilidade e das
acessibilidade e equipamentos específicos; estratégias que promovem a participação dos alunos nas
II – matrícula no AEE de alunos matriculados no ensino atividades escolares.
regular da própria escola ou de outra escola; Art. 14. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
III – cronograma de atendimento aos alunos; publicação, revogadas as disposições em contrário.

77
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

de Nível Médio, tal como estabelece a Resolução CNE/CEB


RESOLUÇÃO Nº 3/CNE 15/06/2010 INSTITUI nº 4/2005, e para o ProJovem, a duração estabelecida no
AS DIRETRIZES PARA ATENDIMENTO DA EJA. Parecer CNE/CEB nº 37/2006.
Art. 5º Obedecidos o disposto no artigo 4º, incisos I e
VII, da Lei nº 9.394/96 (LDB) e a regra da prioridade para o
atendimento da escolarização obrigatória, será considera-
O Presidente da Câmara de Educação Básica do Con- da idade mínima para os cursos de EJA e para a realização
selho Nacional de Educação, de conformidade com o dis- de exames de conclusão de EJA do Ensino Fundamental a
posto na alínea “c” do § 1º do artigo 9º da Lei nº 4.024/61, de 15 (quinze) anos completos.
com a redação dada pela Lei nº 9.131/95, nos artigos 39 Parágrafo único. Para que haja oferta variada para o
a 41 da Lei nº 9.394/96, no Decreto nº 5.154/2004, e com pleno atendimento dos adolescentes, jovens e adultos si-
fundamento no Parecer CNE/CEB nº 6/2010, homologado tuados na faixa de 15 (quinze) anos ou mais, com defasa-
por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação, gem idade-série, tanto sequencialmente no ensino regular
publicado no DOU de 9/6/2010 resolve: quanto na Educação de Jovens e Adultos, assim como nos
Art. 1º Esta Resolução institui Diretrizes Operacionais cursos destinados à formação profissional, nos termos do
para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) nos aspectos § 3º do artigo 37 da Lei nº 9.394/96, torna-se necessário:
relativos à duração dos cursos e idade mínima para ingres- I - fazer a chamada ampliada de estudantes para o Ensi-
so nos cursos e exames de EJA, à certificação nos exames no Fundamental em todas as modalidades, tal como se faz a
de EJA, à Educação de Jovens e Adultos desenvolvida por chamada das pessoas de faixa etária obrigatória do ensino;
meio da Educação a Distância (EAD), a serem obrigatoria- II - incentivar e apoiar as redes e sistemas de ensino a
mente observadas pelos sistemas de ensino, na oferta e na estabelecerem, de forma colaborativa, política própria para
estrutura dos cursos e exames de Ensino Fundamental e o atendimento dos estudantes adolescentes de 15 (quinze)
Ensino Médio que se desenvolvem em instituições próprias a 17 (dezessete) anos, garantindo a utilização de mecanis-
integrantes dos Sistemas de Ensino Federal, Estaduais, Mu- mos específicos para esse tipo de alunado que considerem
nicipais e do Distrito Federal. suas potencialidades, necessidades, expectativas em relação
Art. 2º Para o melhor desenvolvimento da EJA, cabe à vida, às culturas juvenis e ao mundo do trabalho, tal como
a institucionalização de um sistema educacional públi- prevê o artigo 37 da Lei nº 9.394/96, inclusive com progra-
co de Educação Básica de jovens e adultos, como política mas de aceleração da aprendizagem, quando necessário;
pública de Estado e não apenas de governo, assumindo a III - incentivar a oferta de EJA nos períodos escolares
gestão democrática, contemplando a diversidade de sujei- diurno e noturno, com avaliação em processo.
tos aprendizes, proporcionando a conjugação de políticas Art. 6º Observado o disposto no artigo 4º, inciso VII, da
públicas setoriais e fortalecendo sua vocação como instru- Lei nº 9.394/96, a idade mínima para matrícula em cursos
mento para a educação ao longo da vida. de EJA de Ensino Médio e inscrição e realização de exames
Art. 3º A presente Resolução mantém os princípios, os de conclusão de EJA do Ensino Médio é 18 (dezoito) anos
objetivos e as Diretrizes formulados no Parecer CNE/CEB nº completos.
11/2000, que estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacio- Parágrafo único. O direito dos menores emancipados
nais para a Educação de Jovens e Adultos e, quanto à Re- para os atos da vida civil não se aplica para o da prestação
solução CNE/CEB nº 1/2000, amplia o alcance do disposto de exames supletivos.
no artigo 7º para definir a idade mínima também para a Art. 7º Em consonância com o Título IV da Lei nº
frequência em cursos de EJA, bem como substitui o termo 9.394/96, que estabelece a forma de organização da edu-
“supletivo” por “EJA”, no caput do artigo 8º, que determi- cação nacional, a certificação decorrente dos exames de
na idade mínima para o Ensino Médio em EJA, passando EJA deve ser competência dos sistemas de ensino.
os mesmos a terem, respectivamente, a redação constante § 1º Para melhor cumprimento dessa competência, os
nos artigos 4º, 5º e 6º desta Resolução. sistemas podem solicitar, sempre que necessário, apoio
Art. 4º Quanto à duração dos cursos presenciais de EJA, técnico e financeiro do INEP/MEC para a melhoria de seus
mantém-se a formulação do Parecer CNE/CEB nº 29/2006, exames para certificação de EJA.
acrescentando o total de horas a serem cumpridas, inde- § 2º Cabe à União, como coordenadora do sistema na-
pendentemente da forma de organização curricular: cional de educação:
I - para os anos iniciais do Ensino Fundamental, a dura- I - a possibilidade de realização de exame federal como
ção deve ficar a critério dos sistemas de ensino; exercício, ainda que residual, dos estudantes do sistema fe-
II - para os anos finais do Ensino Fundamental, a dura- deral (cf. artigo 211, § 1º, da Constituição Federal);
ção mínima deve ser de 1.600 (mil e seiscentas) horas; II - a competência para fazer e aplicar exames em
III - para o Ensino Médio, a duração mínima deve ser de outros Estados Nacionais (países), podendo delegar essa
1.200 (mil e duzentas) horas. competência a alguma unidade da federação;
Parágrafo único. Para a Educação Profissional Técnica III - a possibilidade de realizar exame intragoverna-
de Nível Médio integrada com o Ensino Médio, reafir- mental para certificação nacional em parceria com um ou
ma-se a duração de 1.200 (mil e duzentas) horas desti- mais sistemas, sob a forma de adesão e como consequên-
nadas à educação geral, cumulativamente com a carga cia do regime de colaboração, devendo, nesse caso, garan-
horária mínima para a respectiva habilitação profissional tir a exigência de uma base nacional comum.

78
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

IV - garantir, como função supletiva, a dimensão ética as práticas relativas à formação profissional, de avaliação e
da certificação que deve obedecer aos princípios de legali- gestão coletiva do trabalho, conjugando as diversas políti-
dade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência; cas setoriais de governo;
V - oferecer apoio técnico e financeiro aos Estados, ain- VII - a interatividade pedagógica será desenvolvida
da como função supletiva, para a oferta de exames de EJA; por professores licenciados na disciplina ou atividade, ga-
VI - realizar avaliação das aprendizagens dos estudan- rantindo relação adequada de professores por número de
tes da Educação de Jovens e Adultos, integrada às avalia- estudantes;
ções já existentes para o Ensino Fundamental e o Ensino VIII - aos estudantes serão fornecidos livros didáticos
Médio, capaz de oferecer dados e informações para sub- e de literatura, além de oportunidades de consulta nas bi-
sidiar o estabelecimento de políticas públicas nacionais bliotecas dos polos de apoio pedagógico organizados para
compatíveis com a realidade, sem o objetivo de certificar o tal fim;
desempenho de estudantes. IX - infraestrutura tecnológica como polo de apoio pe-
§ 3º Toda certificação decorrente dessas competências dagógico às atividades escolares que garanta acesso dos
possui validade nacional, garantindo padrão de qualidade. estudantes à biblioteca, rádio, televisão e internet aberta às
Art. 8º O poder público deve inserir a EJA no Sistema possibilidades da chamada convergência digital;
Nacional de Avaliação da Educação Básica e ampliar sua X - haja reconhecimento e aceitação de transferências
ação para além das avaliações que visam identificar de- entre os cursos de EJA presencial e os desenvolvidos com
sempenhos cognitivos e fluxo escolar, incluindo, também, mediação da EAD;
a avaliação de outros indicadores institucionais das redes XI - será estabelecido, pelos sistemas de ensino, pro-
públicas e privadas que possibilitam a universalização e a cesso de avaliação de EJA desenvolvida por meio da EAD,
qualidade do processo educativo, tais como parâmetros de no qual:
infraestrutura, gestão, formação e valorização dos profis- a) a avaliação da aprendizagem dos estudantes seja
sionais da educação, financiamento, jornada escolar e or- contínua, processual e abrangente, com autoavaliação e
ganização pedagógica. avaliação em grupo, sempre presenciais;
Art. 9º Os cursos de EJA desenvolvidos por meio da b) haja avaliação periódica das instituições escolares
EAD, como reconhecimento do ambiente virtual como es- como exercício da gestão democrática e garantia do efeti-
paço de aprendizagem, serão restritos ao segundo seg- vo controle social de seus desempenhos;
mento do Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, com as c) seja desenvolvida avaliação rigorosa para a oferta de
seguintes características: cursos, descredenciando práticas mercantilistas e institui-
I - a duração mínima dos cursos de EJA, desenvolvidos ções que não zelem pela qualidade de ensino;
por meio da EAD, será de 1.600 (mil e seiscentas) horas, XII - os cursos de EJA desenvolvidos por meio da EAD,
nos anos finais do Ensino Fundamental, e de 1.200 (mil e autorizados antes da vigência desta Resolução, terão o pra-
duzentas) horas, no Ensino Médio; zo de 1 (um) ano, a partir da data de sua publicação, para
II - a idade mínima para o desenvolvimento da EJA adequar seus projetos políticopedagógicos às presentes
com mediação da EAD será a mesma estabelecida para a normas.
EJA presencial: 15 (quinze) anos completos para o segun- Art. 10. O Sistema Nacional Público de Formação de
do segmento do Ensino Fundamental e 18 (dezoito) anos Professores deverá estabelecer políticas e ações especí-
completos para o Ensino Médio; ficas para a formação inicial e continuada de professores
III - cabe à União, em regime de cooperação com os de Educação Básica de jovens e adultos, bem como para
sistemas de ensino, o estabelecimento padronizado de professores do ensino regular que atuam com adolescen-
normas e procedimentos para os processos de autoriza- tes, cujas idades extrapolam a relação idade-série, desen-
ção, reconhecimento e renovação de reconhecimento dos volvidas em estreita relação com o Programa Universidade
cursos a distância e de credenciamento das instituições, Aberta do Brasil (UAB), com as Universidades Públicas e
garantindo-se sempre padrão de qualidade; com os sistemas de ensino.
IV - os atos de credenciamento de instituições para a Art. 11. O aproveitamento de estudos e conhecimentos
oferta de cursos a distância da Educação Básica no âmbito realizados antes do ingresso nos cursos de EJA, bem como
da unidade federada deve ficar ao encargo dos sistemas os critérios para verificação do rendimento escolar, devem
de ensino; ser garantidos aos jovens e adultos, tal como prevê a LDB
V - para a oferta de cursos de EJA a distância fora da em seu artigo 24, transformados em horas-atividades a se-
unidade da federação em que estiver sediada, a instituição rem incorporados ao currículo escolar do(a) estudante, o
deverá obter credenciamento nos Conselhos de Educação que deve ser comunicado ao respectivo sistema de ensino.
das unidades da federação onde irá atuar; Art. 12. A Educação de Jovens e Adultos e o ensino
VI - tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino regular sequencial para os adolescentes com defasagem
Médio, a EAD deve ser desenvolvida em comunidade de idade-série devem estar inseridos na concepção de escola
aprendizagem em rede, com aplicação, dentre outras, das unitária e politécnica, garantindo a integração dessas face-
Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) na “bus- tas educacionais em todo seu percurso escolar, como con-
ca inteligente” e na interatividade virtual, com garantia de signado nos artigos 39 e 40 da Lei nº 9.394/96 e na Lei nº
ambiente presencial escolar devidamente organizado para 11.741/2008, com a ampliação de experiências tais como

79
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

os programas PROEJA e ProJovem e com o incentivo insti- inserção em áreas urbanas ou rurais, deverá garantir a uni-
tucional para a adoção de novas experiências pedagógicas, versalização do acesso da população do campo à Educação
promovendo tanto a Educação Profissional quanto a eleva- Básica e à Educação Profissional de Nível Técnico.
ção dos níveis de escolaridade dos trabalhadores. Art. 4° O projeto institucional das escolas do campo,
Art. 13. Esta Resolução entra em vigor na data de sua expressão do trabalho compartilhado de todos os setores
publicação, ficando revogadas as disposições em contrário. comprometidos com a universalização da educação escolar
com qualidade social, constituir-se-á num espaço público
de investigação e articulação de experiências e estudos di-
recionados para o mundo do trabalho, bem como para o
desenvolvimento social, economicamente justo e ecologi-
RESOLUÇÃO Nº 02/CNE, DE 03/04/2002 camente sustentável.
DIRETRIZES EDUCACIONAIS PARA Art. 5º As propostas pedagógicas das escolas do cam-
EDUCAÇÃO DO CAMPO po, respeitadas as diferenças e o direito à igualdade e cum-
prindo imediata e plenamente o estabelecido nos artigos
23, 26 e 28 da Lei 9.394, de 1996, contemplarão a diversida-
de do campo em todos os seus aspectos: sociais, culturais,
Prezado candidato, a resolução indicada sobre Educa- políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia.
ção do Campo e de acordo com a data é a resolução de Parágrafo único. Para observância do estabelecido nes-
número 01 como segue: te artigo, as propostas pedagógicas das escolas do campo,
elaboradas no âmbito da autonomia dessas instituições,
serão desenvolvidas e avaliadas sob a orientação das Di-
O Presidente da Câmara da Educação Básica, reconhe- retrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica e a
cido o modo próprio de vida social e o de utilização do Educação Profissional de Nível Técnico.
espaço do campo como fundamentais, em sua diversidade, Art. 6º O Poder Público, no cumprimento das suas
para a constituição da identidade da população rural e de responsabilidades com o atendimento escolar e à luz da
sua inserção cidadã na definição dos rumos da sociedade diretriz legal do regime de colaboração entre a União, os
brasileira, e tendo em vista o disposto na Lei nº 9.394, de Estados, o Distrito Federal e os Municípios, proporcionará
20 de dezembro de 1996 -LDB, na Lei nº 9.424, de 24 de Educação Infantil e Ensino Fundamental nas comunidades
dezembro de 1996, e na Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de rurais, inclusive para aqueles que não o concluíram na ida-
2001, que aprova o Plano Nacional de Educação, e no Pa- de prevista, cabendo em especial aos Estados garantir as
recer CNE/CEB 36/2001, homologado pelo Senhor Ministro condições necessárias para o acesso ao Ensino Médio e à
de Estado da Educação em 12 de março de 2002, resolve: Educação Profissional de Nível Técnico.
Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Ope- Art. 7º É de responsabilidade dos respectivos sistemas
racionais para a Educação Básica nas escolas do campo a de ensino, através de seus órgãos normativos, regulamen-
serem observadas nos projetos das instituições que inte- tar as estratégias específicas de atendimento escolar do
gram os diversos sistemas de ensino. campo e a flexibilização da organização do calendário es-
Art. 2º Estas Diretrizes, com base na legislação educa- colar, salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos
cional, constituem um conjunto de princípios e de proce- e tempos de aprendizagem, os princípios da política de
dimentos que visam adequar o projeto institucional das igualdade.
escolas do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais para § 1° O ano letivo, observado o disposto nos artigos 23,
a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e Médio, a Edu- 24 e 28 da LDB, poderá ser estruturado independente do
cação de Jovens e Adultos, a Educação Especial, a Educa- ano civil.
ção Indígena, a Educação Profissional de Nível Técnico e a § 2° As atividades constantes das propostas pedagógi-
Formação de Professores em Nível Médio na modalidade cas das escolas, preservadas as finalidades de cada etapa
Normal. da educação básica e da modalidade de ensino prevista,
Parágrafo único. A identidade da escola do campo é poderão ser organizadas e desenvolvidas em diferentes
definida pela sua vinculação às questões inerentes à sua espaços pedagógicos, sempre que o exercício do direito
realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes pró- à educação escolar e o desenvolvimento da capacidade
prios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza dos alunos de aprender e de continuar aprendendo assim
futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na so- o exigirem.
ciedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos Art. 8° As parcerias estabelecidas visando ao desen-
que associem as soluções exigidas por essas questões à volvimento de experiências de escolarização básica e de
qualidade social da vida coletiva no país. educação profissional, sem prejuízo de outras exigências
Art. 3º O Poder Público, considerando a magnitude da que poderão ser acrescidas pelos respectivos sistemas de
importância da educação escolar para o exercício da ci- ensino, observarão:
dadania plena e para o desenvolvimento de um país cujo I - articulação entre a proposta pedagógica da institui-
paradigma tenha como referências a justiça social, a soli- ção e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a respectiva
dariedade e o diálogo entre todos, independente de sua etapa da Educação Básica ou Profissional;

80
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

II - direcionamento das atividades curriculares e peda- Art. 14. O financiamento da educação nas escolas do
gógicas para um projeto de desenvolvimento sustentável; campo, tendo em vista o que determina a Constituição Fe-
III - avaliação institucional da proposta e de seus im- deral, no artigo 212 e no artigo 60 dos Atos das Disposi-
pactos sobre a qualidade da vida individual e coletiva; ções Constitucionais Transitórias, a LDB, nos artigos 68, 69,
IV - controle social da qualidade da educação escolar, 70 e 71, e a regulamentação do Fundo de Manutenção e
mediante a efetiva participação da comunidade do campo. Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização
Art. 9º As demandas provenientes dos movimentos so- do Magistério - Lei 9.424, de 1996, será assegurado me-
ciais poderão subsidiar os componentes estruturantes das diante cumprimento da legislação a respeito do financia-
políticas educacionais, respeitado o direito à educação es- mento da educação escolar no Brasil.
colar, nos termos da legislação vigente. Art. 15. No cumprimento do disposto no § 2º, do art.
Art. 10. O projeto institucional das escolas do campo, 2º, da Lei 9.424, de 1996, que determina a diferenciação
considerado o estabelecido no artigo 14 da LDB, garantirá do custo-aluno com vistas ao financiamento da educação
a gestão democrática, constituindo mecanismos que pos- escolar nas escolas do campo, o Poder Público levará em
sibilitem estabelecer relações entre a escola, a comunidade consideração:
local, os movimentos sociais, os órgãos normativos do sis- I - as responsabilidades próprias da União, dos Estados,
tema de ensino e os demais setores da sociedade. do Distrito Federal e dos Municípios com o atendimento
Art. 11. Os mecanismos de gestão democrática, tendo escolar em todas as etapas e modalidades da Educação Bá-
como perspectiva o exercício do poder nos termos do dis- sica, contemplada a variação na densidade demográfica e
posto no parágrafo 1º do artigo 1º da Carta Magna, contri- na relação professor/aluno;
buirão diretamente: II - as especificidades do campo, observadas no aten-
I - para a consolidação da autonomia das escolas e o dimento das exigências de materiais didáticos, equipamen-
fortalecimento dos conselhos que propugnam por um pro- tos, laboratórios e condições de deslocamento dos alunos
jeto de desenvolvimento que torne possível à população e professores apenas quando o atendimento escolar não
do campo viver com dignidade; puder ser assegurado diretamente nas comunidades rurais;
II - para a abordagem solidária e coletiva dos proble- III - remuneração digna, inclusão nos planos de carreira
mas do campo, estimulando a autogestão no processo de e institucionalização de programas de formação continua-
elaboração, desenvolvimento e avaliação das propostas da para os profissionais da educação que propiciem, no
pedagógicas das instituições de ensino. mínimo, o disposto nos artigos 13, 61, 62 e 67 da LDB.
Art. 12 O exercício da docência na Educação Básica, Art. 16. Esta Resolução entra em vigor na data de sua
cumprindo o estabelecido nos arts. 12, 13, 61 e 62 da LDB publicação, ficando revogadas as disposições em contrário.
e nas Resoluções CNE/CEB nº 3/97 e nº 2/99, assim como
os Pareceres CNE/CP nº 9/2001, nº 27/2001 e nº 28/2001,
e as Resoluções CNE/CP nº 1/2002 e nº 2/2002, a respeito QUESTÕES
da formação de professores em nível superior para a Edu-
cação Básica, prevê a formação inicial em curso de licen- 1. (FCC/2014 - Prefeitura de Recife/PE - Procurador)
ciatura, estabelecendo como qualificação mínima, para a Nos termos do art. 226 da Constituição Federal, “a família,
docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Entre
Fundamental, o curso de formação de professores em Nível os aspectos abrangidos pelo direito à proteção especial, se-
Médio, na modalidade Normal. gundo o texto constitucional, encontram-se os seguintes:
Parágrafo único. Os sistemas de ensino, de acordo com a) garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; e
o artigo 67 da LDB desenvolverão políticas de formação obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade
inicial e continuada, habilitando todos os professores lei- e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvi-
gos e promovendo o aperfeiçoamento permanente dos mento, quando da aplicação de qualquer medida privativa
docentes. da liberdade.
Art. 13. Os sistemas de ensino, além dos princípios b) garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; e
e diretrizes que orientam a Educação Básica no país, ob- acesso universal à educação infantil, em creche e pré-esco-
servarão, no processo de normatização complementar da la, às crianças até 5 (cinco) anos de idade.
formação de professores para o exercício da docência nas c) erradicação do analfabetismo; e estímulo do Poder
escolas do campo, os seguintes componentes: Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e
I - estudos a respeito da diversidade e o efetivo prota- subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma
gonismo das crianças, dos jovens e dos adultos do campo de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.
na construção da qualidade social da vida individual e co- d) punição severa ao abuso, à violência e à exploração
letiva, da região, do país e do mundo; sexual da criança e do adolescente; e garantia às presidiá-
II - propostas pedagógicas que valorizem, na organiza- rias de condições para que possam permanecer com seus
ção do ensino, a diversidade cultural e os processos de in- filhos durante o período de amamentação.
teração e transformação do campo, a gestão democrática, e) punição severa ao abuso, à violência e à exploração
o acesso ao avanço científico e tecnológico e respectivas sexual da criança e do adolescente; e estímulo do Poder Pú-
contribuições para a melhoria das condições de vida e a blico, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e sub-
fidelidade aos princípios éticos que norteiam a convivência sídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de
solidária e colaborativa nas sociedades democráticas. guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.

81
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

R: A. O artigo 227, §3º, CF fixa os aspectos que abran- e) o estágio de convivência que precede a adoção não
gem a proteção especial da criança e do adolescente: “I - poderá, em nenhuma hipótese, ser dispensado pela auto-
idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, ridade judiciária.
observado o disposto no art. 7º, XXXIII; II - garantia de di-
reitos previdenciários e trabalhistas; III - garantia de acesso R: C. Neste sentido, disciplina o art. 41, § 1º, ECA: “Se
do trabalhador adolescente e jovem à escola; IV - garantia um dos cônjuges ou concubinos adota o filho do outro,
de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato in- mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o côn-
fracional, igualdade na relação processual e defesa técnica juge ou concubino do adotante e os respectivos parentes”.
por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação A alternativa “a” está errada porque o adotante deve ser,
tutelar específica; V - obediência aos princípios de brevi- pelo menos, 16 anos mais velho que o adotado e possuir
dade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pelo menos 18 anos (art. 42, § 3º, ECA); a alternativa “b”
pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qual- está incorreta porque é vedada a adoção por procuração,
quer medida privativa da liberdade; VI - estímulo do Poder pois a adoção é ato personalíssimo (art. 39, § 2º, ECA); a
Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e alternativa “d” está incorreta porque é possível a adoção
subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma conjunta desde que preencha os requisitos de serem casa-
de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandona- dos civilmente ou mantenham união estável, comprovada
do; VII - programas de prevenção e atendimento especiali- a estabilidade da família (art. 42, § 1º, ECA); e a alternativa
zado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de “e” está incorreta porque pode ser dispensado o estágio de
entorpecentes e drogas afins”. convivência quando o adotando já estiver sob a tutela ou
guarda do adotante (art. 46, § 1º, ECA).
2. (Alternative Concursos/2017 - Prefeitura de Sul
Brasil/SC - Agente Educativo) De acordo com o Estatu- 4. (FCC/2016 - AL-MS - Agente de Polícia Legislati-
to da Criança e do Adolescente, Lei n.º 8.069/90, art. 60, é vo) Sobre a prática de ato infracional à luz do Estatuto da
proibido qualquer trabalho a menores: Criança e do Adolescente, é INCORRETO afirmar que a
a) De quatorze anos de idade, inclusive na condição de a) medida socioeducativa de internação pode ser de-
aprendiz. terminada por descumprimento reiterado e injustificável
b) De quatorze anos de idade, salvo na condição de da medida anteriormente imposta.
aprendiz. b) internação, antes da sentença, poderá ser determi-
c) De dezesseis anos de idade, salvo na condição de nada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.
aprendiz. c) medida socioeducativa de internação não pode-
d) De dezesseis anos de idade, inclusive na condição rá exceder em nenhuma hipótese três anos, liberando-se
de aprendiz. compulsoriamente o menor infrator aos vinte e um anos
e) De dezessete anos de idade, inclusive na condição de idade.
de aprendiz. d) medida socioeducativa de liberdade assistida será
fixada pelo prazo mínimo de trinta dias, podendo a qual-
R: B. Em que pese o teor do art. 64 do ECA, que pode- quer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por
ria dar a entender que um menor de 14 anos pode traba- outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e
lhar, prevalece o que diz o texto da Constituição Federal: o defensor.
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, e) remissão não implica necessariamente o reconhe-
além de outros que visem à melhoria de sua condição so- cimento ou comprovação da responsabilidade, nem pre-
cial: [...] XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou valece para efeito de antecedentes, podendo incluir even-
insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a tualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas
menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e
a partir de quatorze anos”. Logo, o menor pode trabalhar a internação.
em qualquer serviço, desde que não seja noturno, perigoso
e insalubre, dos 16 aos 18 anos; e entre 14 e 16 anos ape- R: D. A lei exige como prazo mínimo de medida so-
nas pode trabalhar como aprendiz. cioeducativa o período de 6 meses, conforme art. 118, § 2º,
ECA, não 30 dias conforme a alternativa “d”, razão pela qual
3. (FCC/2016 - AL-MS - Agente de Polícia Legislati- está incorreta. A alternativa “a” está prevista no art. 122, §
vo) Sobre a adoção, nos termos preconizados pelo Estatu- 1º, ECA; a alternativa “b” está prevista no art. 108 do ECA;
to da Criança e do Adolescente, a alternativa “c” está prevista no art. 121, §§ 3º e 5º, ECA; a
a) o adotante deve ser, no mínimo, 18 anos mais velho alternativa “e” está prevista no art. 127 ECA.
que o adotando.
b) é permitida a adoção por procuração. 5. (COMPERVE/2016 - Câmara de Natal/RN - Guar-
c) se um dos cônjuges adota o filho do outro, mantêm- da Legislativo) As crianças e os adolescentes, qualificados
-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge do pelo direito hoje vigente como pessoas em desenvolvimen-
adotante e os respectivos parentes. to, receberam do direito positivo brasileiro, tutela especial
d) é vedada a adoção conjunta pelos divorciados, se- através da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, mais conhe-
parados judicialmente e pelos ex-companheiros. cida como Estatuto da Criança e do Adolescente. Seguindo

82
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

as diretrizes traçadas pela Constituição de 1988, o Estatuto 6. (FUNRIO/2016 - IF-PA - Assistente de Alunos)
da Criança e do Adolescente trouxe a previsão normativa Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
da absoluta prioridade e de variados direitos fundamentais. 8.069/90), é considerado criança
Em tal seara, foi determinado que as crianças e os adoles- a) a pessoa até seis anos incompletos de idade.
centes têm direito, b) a pessoa até oito anos incompletos de idade.
a) à liberdade, de forma a compreender a liberdade de c) a pessoa até 12 anos incompletos de idade.
ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitá- d) a pessoa até 18 anos incompletos de idade.
rios, ressalvadas as restrições legais; a liberdade de opinião e) a pessoa até 14 anos incompletos, desde que não
e de expressão; a liberdade de brincar e de praticar espor- tenha cometido nenhum crime.
tes, a liberdade de participar da vida familiar e comunitária;
a liberdade de buscar refúgio, auxílio e orientação, exce- R: C. O Estatuto da Criança e do Adolescente opta por
tuadas dessa tutela a liberdade de crença e culto religioso categorizar separadamente estas duas categorias de me-
e de participar da vida política. nores. Criança é aquele que tem até 12 anos de idade (na
b) ao respeito, consistente na inviolabilidade da sua data de aniversário de 12 anos, passa a ser adolescente),
integridade física, psíquica e moral, abrangendo a preser- adolescente é aquele que tem entre 12 e 18 anos (na data
vação da imagem, da identidade, da autonomia, de seus de aniversário de 18 anos, passa a ser maior), conforme o
valores, ideias e crenças, excluída a tutela dos seus espaços artigo 2º do ECA.
e objetos pessoais.
c) de serem educados e cuidados sem o uso de castigo 7. (FUNRIO/2016 - IF-PA - Assistente de Alunos) A
físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas intenção principal do Estatuto da Criança e do Adolescente
de correção, disciplina, educação ou a qualquer outro pre- (Lei nº 8.069/90) é
texto, por parte dos pais, de integrantes da família amplia- a) prover uma boa escola para que crianças e adoles-
da, dos responsáveis, dos agentes públicos executores de centes possam trabalhar o mais cedo possível.
medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarre- b) questionar políticas sociais que venham a proteger
gada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.
quem não merece.
d) de serem criados e educados no seio de sua família
c) distribuir renda entre os mais empobrecidos da po-
biológica, não se admitindo a sua inserção em família subs-
pulação.
tituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em
d) proteger integralmente crianças e adolescentes, ga-
ambiente que garanta seu desenvolvimento integral.
rantindo políticas públicas neste sentido.
e) proteger crianças e adolescentes da prisão.
R: C. Nestes termos, preconiza o artigo 18-A do ECA:
“A criança e o adolescente têm o direito de ser educados
R: D. Conforme o artigo 1º do ECA, “esta Lei dispõe
e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento
cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”. O
educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos in- princípio da proteção integral se associa ao princípio da
tegrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos prioridade absoluta, colacionado no artigo 4º do ECA e no
agentes públicos executores de medidas socioeducativas artigo 227, CF. De uma doutrina da situação irregular, o
ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tra- direito evoluiu e passou a contemplar uma noção de prote-
tá-los, educá-los ou protegê-los”. A alternativa “a” está er- ção mais ampla da criança e do adolescente, que não ape-
rada porque o artigo 16 do ECA fixa que o direito à liber- nas abordasse situações de irregularidade (embora ainda
dade envolve os seguintes aspectos: “I - ir, vir e estar nos o fizesse), mas que abrangesse todo o arcabouço jurídico
logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas protetivo da criança e do adolescente, que é a doutrina da
as restrições legais; II - opinião e expressão; III - crença e proteção integral.
culto religioso; IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discrimi- 8. (Prefeitura de Cruzeiro - SP - Auxiliar de Desen-
nação; VI - participar da vida política, na forma da lei; volvimento Infantil - Instituto Excelência/2016) O Esta-
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação”. A alternativa “b” tuto da Criança e do Adolescente em seu art. 4º, parágrafo
está errada porque o artigo 17 do ECA prevê que “o direito único fixa a garantia de prioridade. Assinale a alternativa
ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, CORRETA que compreende uma dessas prioridades:
psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a) Nenhuma criança ou adolescente será objeto de
a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, qualquer forma de negligência, descriminação e exploração.
dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pes- b) É assegurado atendimento integral á saúde da crian-
soais”. A alternativa “d” está errada porque o artigo 18 do ça e do adolescente por intermédio do sistema único de
ECA assegura que “é direito da criança e do adolescente ser saúde.
criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmen- c) Precedência de atendimento, nos serviços públicos
te, em família substituta, assegurada a convivência familiar ou de relevância pública.
e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvi- d) Manter alojamento conjunto, possibilitando ao neo-
mento integral”. nato a permanência junto á mãe.

83
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

R: C. Conforme o artigo 4º, parágrafo único, ECA, “a 11. (TRT - 1ª REGIÃO - Juiz do Trabalho Substituto
garantia de prioridade compreende: [...] b) precedência de - FCC/2016) Sobre o trabalho da criança e do adolescente,
atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública”. é correto afirmar:
a) É proibido o trabalho de adolescentes em atividades
9. (FUNDAÇÃO CASA - Agente Administrativo - VU- lúdicas.
NESP/2010) Relativamente às Disposições Preliminares do b) É proibido para os menores de 16, salvo na condição
Estatuto da Criança e do Adolescente, assinale a alternativa de aprendizes.
correta. c) É proibido o trabalho noturno de menores de 16
a) Considera-se criança a pessoa com até doze anos anos, salvo na condição de aprendizes.
completos, e adolescente aquela entre treze e dezoito anos d) É proibido o trabalho de adolescentes em hospitais,
de idade incompletos. salvo na condição de aprendizes de enfermagem.
b) Nos casos em que a lei determinar, deverá ser cons- e) É proibido o trabalho de crianças em peças teatrais e
atividades cinematográficas.
tantemente aplicado o Estatuto da Criança e do Adolescen-
te às pessoas entre dezenove e vinte anos de idade.
R: B. Nos termos do artigo 60, ECA, “é proibido qual-
c) A garantia de prioridade para o adolescente com-
quer trabalho a menores de quatorze anos de idade, sal-
preende a primazia na formulação das políticas sociais pú- vo na condição de aprendiz”. Aceita-se o trabalho como
blicas para o lazer. aprendiz entre 14 e 16 anos. A partir dos 16 anos, o adoles-
d) Na aplicação dessa Lei, deverão ser levados em con- cente pode trabalhar, não necessariamente como aprendiz,
ta os fins políticos a que ela se destina. embora a lei fixe outras restrições.
e) Destinação privilegiada de recursos públicos nas
áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. 12. (TRT - 1ª REGIÃO - Juiz do Trabalho Substituto -
FCC/2016) A formação técnico-profissional do adolescen-
R: E. Conforme o artigo 4º, parágrafo único, ECA, “a te NÃO deverá obedecer a
garantia de prioridade compreende: [...] d) destinação pri- a) horário especial, estabelecido em lei.
vilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com b) horário especial, de acordo com a atividade.
a proteção à infância e à juventude”. c) peculiaridades do seu desenvolvimento pessoal.
d) adequação ao mercado de trabalho.
10. (Prefeitura de Cruzeiro - SP - Auxiliar de Desen- e) prevalência das atividades educativas sobre as pro-
volvimento Infantil - Instituto Excelência/2016) Assinale dutivas.
a alternativa CORRETA conforme o artigo 15 do ECA:
a) na dignidade da criança e do adolescente, pondo-os R: A. Dispõe o ECA: “Art. 63. A formação técnico-pro-
a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, ater- fissional obedecerá aos seguintes princípios: [...] III - horário
rorizante, vexatório ou constrangedor. especial para o exercício das atividades”. Especificamente,
b) no direito de ser educados e cuidados sem o uso de o horário deve ser fixado sem prejudicar a frequência à es-
castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como cola (artigo 67, IV, ECA) e é proibido o trabalho noturno.
formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro Entretanto, a lei não fixa com precisão o horário de traba-
pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, lho permitido ao adolescente.
pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de
medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarre- 13. (IDECAN/2016 - UFPB - Auxiliar em Assuntos
Educacionais) Considerando a prática de ato infracional
gada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.
por adolescentes e os direitos individuais assegurados,
c) no direito à liberdade, ao respeito e à dignidade
nessa situação, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
como pessoas humanas em processo de desenvolvimento
(ECA), assinale a alternativa correta.
e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garan- a) Considera-se ato infracional a conduta descrita como
tidos na Constituição e nas leis. crime e não a estabelecida como contravenção penal.
d) na inviolabilidade da integridade física, psíquica e b) O adolescente não pode ser privado de sua liberda-
moral da criança e do adolescente, abrangendo a preserva- de senão em flagrante de ato infracional ou por ordem es-
ção da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, crita e fundamentada da autoridade judiciária competente.
ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. c) O adolescente que comete ato infracional perde o di-
reito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão,
R: D. Dispõe o ECA em seu artigo 15: “A criança e o devendo, contudo, ser informado acerca de seus direitos.
adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à digni- d) O adolescente civilmente identificado será subme-
dade como pessoas humanas em processo de desenvolvi- tido à identificação compulsória pelos órgãos policiais, de
mento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais proteção e judiciais, independente se para efeito de con-
garantidos na Constituição e nas leis”. frontação em caso de dúvida fundada.

R: B. Conforme preconiza o art. 106, “nenhum adoles-


cente será privado de sua liberdade senão em flagrante de
ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente”.

84
LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

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LEGISLAÇÃO BÁSICA DA EDUCAÇÃO

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LÍNGUA PORTUGUESA

1. Compreensão e interpretação de textos de gêneros variados (tipologia textual; identificação de informações implí-
citas; identificação do tema e da tese de um texto; diferenciação das partes principais das secundárias em um texto;
relações lógico-discursivas; comparação entre textos; relações entre imagens [fotos, ilustrações], gráficos, tabelas, info-
gráficos e o corpo de um texto; distinção entre fato e opinião; reconhecimento de estratégias argumentativas; reconhe-
cimento de posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao mesmo tema; relações entre
a tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la). .............................................................................................................................. 01
2. Domínio da ortografia oficial (emprego das letras; emprego da acentuação gráfica). .......................................................... 16
3. Domínio dos mecanismos de coesão textual (emprego de elementos de referenciação, substituição e repetição, de
conectores e outros elementos de sequenciação textual; emprego/correlação de tempos e modos verbais). ............... 23
4. Domínio da estrutura morfossintática do período (relações de coordenação entre orações e entre termos da oração;
relações de subordinação entre orações e entre termos da oração; emprego dos sinais de pontuação; concordância
verbal e nominal; regência verbal e nominal; emprego do sinal indicativo de crase; colocação pronominal). ................. 25
5. Reescritura de frases e parágrafos do texto (substituição de palavras ou de trechos de textos)........................................ 98
LÍNGUA PORTUGUESA

mas achou que tudo isso estava relacionado com as árias


1. COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO que soavam inaudíveis em torno dele. Logo, porém, tudo
DE TEXTOS DE GÊNEROS VARIADOS deslizou do seu olhar dirigido para a distância, as sereias
(TIPOLOGIA TEXTUAL; IDENTIFICAÇÃO literalmente desapareceram diante da sua determinação, e
quando ele estava no ponto mais próximo delas, já não as
DE INFORMAÇÕES IMPLÍCITAS;
levava em conta.
IDENTIFICAÇÃO DO TEMA E DA TESE DE
Mas elas - mais belas do que nunca - esticaram o corpo
UM TEXTO; DIFERENCIAÇÃO DAS PARTES e se contorceram, deixaram o cabelo horripilante voar livre
PRINCIPAIS DAS SECUNDÁRIAS EM UM no vento e distenderam as garras sobre os rochedos. Já
TEXTO; RELAÇÕES LÓGICO-DISCURSIVAS; não queriam seduzir, desejavam apenas capturar, o mais
COMPARAÇÃO ENTRE TEXTOS; RELAÇÕES longamente possível, o brilho do grande par de olhos de
ENTRE IMAGENS [FOTOS, ILUSTRAÇÕES], Ulisses.
GRÁFICOS, TABELAS, INFOGRÁFICOS E O Se as sereias tivessem consciência, teriam sido então
CORPO DE UM TEXTO; DISTINÇÃO ENTRE aniquiladas. Mas permaneceram assim e só Ulisses escapou
FATO E OPINIÃO; RECONHECIMENTO delas.
DE ESTRATÉGIAS ARGUMENTATIVAS; De resto, chegou até nós mais um apêndice. Diz-se
que Ulisses era tão astucioso, uma raposa tão ladina, que
RECONHECIMENTO DE POSIÇÕES DISTINTAS
mesmo a deusa do destino não conseguia devassar seu
ENTRE DUAS OU MAIS OPINIÕES RELATIVAS
íntimo. Talvez ele tivesse realmente percebido - embora isso
AO MESMO FATO OU AO MESMO TEMA; não possa ser captado pela razão humana - que as sereias
RELAÇÕES ENTRE A TESE E OS ARGUMENTOS haviam silenciado e se opôs a elas e aos deuses usando como
OFERECIDOS PARA SUSTENTÁ-LA). escudo o jogo de aparências acima descrito.

(KAFKA, Franz. O silêncio das sereias. In. http://


almanaque.folha.uol.com.br/kafka2.htm)
Leia o texto abaixo de Franz Kafka, O silêncio das sereias:
O que nos diz Franz Kafka a respeito do silêncio das
Prova de que até meios insuficientes - infantis mesmo sereias? Por que o silêncio seria mais mortal do que o seu
podem servir à salvação: canto?
Para se defender da sereias, Ulisses tapou o ouvidos Ler um texto é muito mais do que decodificar um
com cera e se fez amarrar ao mastro. Naturalmente - e código, entender seu vocabulário. Isso porque o conjunto
desde sempre - todos os viajantes poderiam ter feito coisa de palavras que compõem um texto são organizados de
semelhante, exceto aqueles a quem as sereias já atraíam modo a produzir uma mensagem. Há várias formas de
à distância; mas era sabido no mundo inteiro que isso não se ler um texto. Iniciamos primeiramente pela camada
podia ajudar em nada. O canto das sereias penetrava tudo mais superficial, que é justamente o início da “tradução”
e a paixão dos seduzidos teria rebentado mais que cadeias do vocabulário apresentado. Compreendidas as palavras,
e mastro. Ulisses porém não pensou nisso, embora talvez ainda nesse primeiro momento, verificamos qual tipo de
tivesse ouvido coisas a esse respeito. Confiou plenamente no texto se trata: matéria de jornal, conto, poema. Entretanto,
punhado de cera e no molho de correntes e, com alegria ainda assim não lemos esse conjunto de palavras em sua
inocente, foi ao encontro das sereias levando seus pequenos plenitude, isso porque ler é, antes de mais nada, interpretar.
recursos. A palavra interpretação significa, literalmente, explicar
As sereias entretanto têm uma arma ainda mais terrível algo para si e para o outro. E explicar, outra palavra
que o canto: o seu silêncio. Apesar de não ter acontecido importante numa leitura, consiste em desdobrar algo que
isso, é imaginável que alguém tenha escapado ao seu canto; estava dobrado. Assim sendo, podemos entender que ler
mas do seu silêncio certamente não. Contra o sentimento um texto é interpretá-lo, e para tanto se faz necessário
de ter vencido com as próprias forças e contra a altivez daí desdobrar suas camadas, suas palavras, até fazê-las suas,
resultante - que tudo arrasta consigo - não há na terra o que para assim chegar a uma camada mais profunda do que a
resista. inicial – a da mera “tradução” das palavras.
E de fato, quando Ulisses chegou, as poderosas cantoras Um texto é sempre escrito por alguém. Um autor,
não cantaram, seja porque julgavam que só o silêncio poderia quando lança as palavras num papel, faz na intenção de
conseguir alguma coisa desse adversário, seja porque o ar de passar uma mensagem específica para o leitor. Muitas vezes
felicidade no rosto de Ulisses - que não pensava em outra temos dificuldades em captar qual a mensagem ele está
coisa a não ser em cera e correntes - as fez esquecer de todo tentando nos dizer. Entretanto, algo é sempre importante
e qualquer canto. lembrar: textos são feitos de palavras, e todas as ferramentas
Ulisses no entanto - se é que se pode exprimir assim - para se entender o texto estão no próprio texto, no modo
não ouviu o seu silêncio, acreditou que elas cantavam e que como o autor organizou as palavras entre si.
só ele estava protegido contra o perigo de escutá-las. Por Tudo isso pode ser resumido numa simples frase: texto
um instante, viu os movimentos dos pescoços, a respiração é uma composição estruturada em camadas de sentido.
funda, os olhos cheios de lágrimas, as bocas semiabertas, Da mesma forma que para conhecer uma casa é preciso

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LÍNGUA PORTUGUESA

adentrá-la e entender sua estrutura, compreender um texto 2) Ideia central


é decompô-lo, camada a camada, desde o conhecimento
da autoria até o sentido final. Isso requer uma atitude ativa Um texto sempre apresenta uma ideia central e, muitas
do leitor, e não meramente passiva. vezes, na primeira leitura não a captamos. Assim, algumas
Você já se perguntou por que em concursos públicos e estratégias são válidas para atingir esse propósito.
vestibulares é sempre exigida interpretação textual? Pense.
Não basta apenas conhecer as regras gramaticais de uma 1) Qual o gênero textual?
língua, também é importante entender os sentidos que essa 2) O texto poderia ser resumido numa frase, qual?
língua pode expressar. Se não conseguimos interpretar um 3) A frase representa a ideia central, qual é essa ideia?
texto, como conseguiremos interpretar o mundo em que 4) Como o autor desenvolve essa ideia ao longo do
vivemos? texto?
Assim sendo, ler o texto se faz da mesma forma que se 5) Quais as palavras mais recorrentes nesse texto?
lê o mundo: a partir de suas peculiaridades, ultrapassando
a camada mais ingênua da vida e do texto, entendo as Caso você consiga responder essas perguntas
entrelinhas da mensagem, ou seja, o que está subentendido. certamente você terá as ferramentas necessárias para
Quando falamos de leitura, falamos antes de níveis de interpretar o texto.
leitura, pois é a partir desse processo que alcançamos uma Utilizemos como exemplo o texto de Franz Kafka citada
interpretação efetiva. Vejamos: anteriormente. Leia o texto novamente. Agora responda as
questões:
1 – Níveis de leitura 1) Qual o gênero textual?
Trata-se de um conto, ou seja, um texto de ficção.
a) Primeiro Nível – é o mais superficial e consiste em
iniciar o aprendizado dos significados das palavras. É o 2) O texto poderia ser resumido numa frase, qual?
próprio ato de decodificação de uma língua. Nesse nível Utilizando as palavras do autor: As sereias entretanto
ainda não é possível realizar a interpretação de um texto, têm uma arma ainda mais terrível que o canto: o seu silêncio
já que não se possui ainda familiaridade com os sentidos
de uma palavra. 3) A frase representa a ideia centra, qual é essa ideia?
b) Segundo Nível – é o contato mais familiar com um O autor parece nos dizer que o silêncio é mais mortal
texto, através do conhecimento de qual gênero se trata que a própria fala, ou seja, pode ferir mais.
(notícia, conto, poema), do seu autor e dos benefícios que
essa leitura poderia trazer. Imagine você uma livraria. Há 4) Como o autor desenvolve essa ideia ao longo do
vários exemplares para escolher. Então você analisa o título texto?
do livro, o autor, lê rapidamente a contracapa e também a) Muitos já escaparam do canto das sereias, nunca do
um trecho do livro. O segundo nível da leitura diz respeito seu silêncio;
a essa primeira familiarização com um texto. b) Quando o herói Ulisses passa pelas sereias, elas não
cantam, precisam de uma arma maior;
c) Terceiro Nível – é o momento da leitura c) Ulisses foi mais astuto que as sereias – frente o
propriamente dita. O primeiro passo é entender em silêncio mortal que elas lançavam, ele o ignorou, usando a
qual gênero se encontram as palavras. Se forem textos mesma arma do inimigo para enfrentá-lo.
de ficção (como conto, romance) devemos nos atentar
às falas e ações das personagens. Caso se trate de uma 5) Quais as palavras mais recorrentes no texto?
crônica ou texto de opinião, é importante prestar atenção Silêncio, canto, sereias, Ulisses, herói, astucioso.
no vocabulário utilizado pelo autor, pois nestes gêneros as Assim sendo, o texto que inicialmente parecia
palavras são escolhidas minuciosamente a fim de explicitar enigmático, após as respostas das perguntas sugeridas,
um determinado sentido. Quando se tratar de um poema, parece mais claro. Ou seja, Franz Kafka se utiliza da ficção
também é importante analisar o vocabulário do poeta, para nos dizer que a indiferença é uma arma mais mortal
lembrando-se que na poesia a mensagem sempre diz mais que o próprio enfrentamento.
do que parece dizer.
No momento de interpretar um texto, geralmente Analisemos agora um poema, um dos mais conhecidos
ultrapassamos o terceiro nível da leitura, chegando ao da literatura brasileira, No meio do caminho, de Carlos
quarto e quinto, quando precisamos reler o material em Drummond de Andrade:
questão, centrando-se em partes específicas. Frente as
perguntas de interpretação, cuidado com as opções No Meio do Caminho – Carlos Drummond de
muito generalizadoras, estas tentam confundir o leitor, já Andrade
que representam apenas leituras superficiais do assunto.
Por isso mesmo, sempre muita atenção no momento da No meio do caminho tinha uma pedra
leitura, para que não caia nas famosas “pegadinhas” dos tinha uma pedra no meio do caminho
avaliadores. tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Nunca me esquecerei desse acontecimento - Das alternativas propostas, haverá uma completamente
na vida de minhas retinas tão fatigadas. sem sentido (para captar o leitor mais desatento) e duas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho mais convincentes. Para escolher a correta, procure no
tinha uma pedra texto indícios que a fundamente.
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra
(ANDRADE, Carlos Drummond de. No meio do EXERCÍCIOS
caminho. In. http://www.revistabula.com/391-os-dez-
melhores-poemas-de-carlos-drummond-de-andrade/) 1. De acordo com o ditado popular “invejoso nunca
medrou, nem quem perto dele morou”,
A mensagem parece simples, mas se trata de um a) o invejoso nunca teve medo, nem amedronta seus
poema. Quando precisamos interpretar esse tipo de vizinhos;
gênero, é essencial perceber que as palavras dizem mais do b) enquanto o invejoso prospera, seus vizinhos
que o senso comum, por isso se faz importante interpretá- empobrecem;
las com cuidado. Vamos às perguntas sugeridas: c) o invejoso não cresce e não permite o crescimento
dos vizinhos;
1) Qual o gênero textual? d) o temor atinge o invejoso e também seus vizinhos;
Poema e) o invejoso não provoca medo em seus vizinhos.

2) O texto poderia ser resumido numa frase, qual? 2. Leia e responda:


Tinha uma pedra no meio do caminho “O destino não é só dramaturgo, é também o seu
próprio contra-regra, isto é, designa a entrada dos
3) A frase representa a ideia central, qual é essa ideia? personagens em cena, dá-lhes as cartas e outros objetos, e
Pedra no caminho é uma frase de sentido popular que executa dentro os sinais correspondentes ao diálogo, uma
significa dificuldade. O poeta parece usar uma frase banal trovoada, um carro, um tiro.”
num poema para indicar que pedra é muito mais do que Assinale a alternativa correta sobre esse fragmento
pedra, é uma dificuldade. deD. Casmurro, de Machado de Assis:
4) Como o autor desenvolve essa ideia ao longo do
texto? a) é de caráter narrativo;
Através da repetição da frase “tinha uma pedra no b) é de caráter reflexivo;
meio caminho”. Escrito diversas vezes, soa como uma lição c) evita-se a linguagem figurada;
a ser aprendida. d) é de caráter descritivo;
e) não há metalinguagem.
5) Quais as palavras mais recorrentes nesse texto?
Pedra, meio, caminho 3. “Tão barato que não conseguimos nem contratar
Quando realizamos essas perguntas, paramos para uma holandesa de olhos azuis para este anúncio.”
refletir sobre a mensagem do texto em questão. E mais, No texto, a orientação semântica introduzida pelo
quando precisamos interpretar um texto, após a leitura termo nem estabelece uma relação de:
inicial, é necessário ler detalhadamente cada parte (seja a) exclusão;
parágrafo, estrofe) e assim construir passo a passo o b) negação;
“desdobramento” do texto. c) adição;
d) intensidade;
3) Dicas importantes para uma interpretação de e) alternância.
texto
- Faça uma leitura inicial, a fim de se familiarizar com o Texto para a questão 4.
vocabulário e o conteúdo;
- Não interrompa a leitura caso encontre palavras – Ah, não sabe? Não o sabes? Sabes-lo não?
desconhecidas, tente inicialmente fazer uma leitura geral; – Esquece.
- Faça uma nova leitura, tentando captar as entrelinhas – Não. Como “esquece”? Você prefere falar errado? E o
do texto, ou seja, a intenção do autor ao escrever esse certo é “esquece” ou “esqueça”? Ilumine-me. Mo
material; diga. Ensines-lo-me, vamos.
- Lembre-se que no texto não estão as suas ideias, – Depende.
e sim as do autor, por isso cuidado para não interpretar – Depende. Perfeito. Não o sabes. Ensinar-me-lo-ias se
segundo o seu ponto de vista; o soubesses, mas não sabes-o.
- Nas questões interpretativas, atente para as – Está bem. Está bem. Desculpe. Fale como quiser.
alternativas generalizadoras, as que apresentam palavras (L. F. Veríssimo,Jornal do Brasil, 30/12/94)
como sempre, nunca, certamente, todo, tudo, geralmente
tentem confundir aquele que realiza uma leitura mais
superficial;

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LÍNGUA PORTUGUESA

4. O texto tem por finalidade: De acordo com o que o texto permite deduzir, apenas:
a) satirizar a preocupação com o uso e a colocação das a) as afirmações I e III estão corretas;
formas pronominais átonas; b) as afirmações I e II estão corretas;
b) ilustrar ludicamente várias possibilidades de c) as afirmações II e III estão corretas;
combinação de formas pronominais; d) a afirmação I está correta;
c) esclarecer pelo exemplo certos fatos da concordância e) a afirmação II está correta.
de pessoa gramatical;
d) exemplificar a diversidade de tratamentos que é Texto para as questões 8 e 9.
comum na fala corrente.
e) valorizar a criatividade na aplicação das regras de “Em nossa última conversa, dizia-me o grande
uso das formas pronominais. amigo que não esperava viver muito tempo, por ser um
“cardisplicente”.
5. Bem cuidado como é, o livro apresenta alguns
defeitos. Começando com “O livro apresenta alguns – O quê?
defeitos”, o sentido da frase não será alterado se continuar – Cardisplicente. Aquele que desdenha do próprio
com: coração.
a) desde que bem cuidado; Entre um copo e outro de cerveja, fui ao dicionário.
b) contanto que bem cuidado; – “Cardisplicente” não existe, você inventou – triunfei.
c) à medida que é bem cuidado; – Mas seu eu inventei, como é que não existe? –
d) tanto que é bem cuidado; espantou-se o meu amigo.
e) ainda que bem cuidado. Semanas depois deixou em saudades fundas
companheiros, parentes e bem-amadas. Homens de bom
Texto para as questões 6 e 7. coração não deveriam ser cardisplicentes.”
8. Conforme sugere o texto, “cardisplicente” é:
“Eu considerei a glória de um pavão ostentando o a) um jogo fonético curioso, mas arbitrário;
esplendor de suas cores; é um luxo imperial. Mas andei b) palavra técnica constante de dicionários
lendo livros, e descobri que aquelas cores todas não especializados;
existem na pena do pavão. Não há pigmentos. O que há c) um neologismo desprovido de indícios de
são minúsculas bolhas d’água em que a luz se fragmenta, significação;
como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas. d) uma criação de palavra pelo processo de composição;
e) termo erudito empregado para criar um efeito
Eu considerei que este é o luxo do grande artista, atingir cômico.
o máximo de matizes com um mínimo de elementos. 9. “– Mas se eu inventei, como é que não existe?”
De água e luz ele faz seu esplendor, seu grande Segundo se deduz da fala espantada do amigo do
mistério é a simplicidade. Considerei, por fim, que assim é o narrador, a língua, para ele, era um código aberto:
amor, oh minha amada; de tudo que ele suscita e esplende a) ao qual se incorporariam palavras fixadas no uso
e estremece e delira em mim existem apenas meus olhos popular;
recebendo a luz do teu olhar. Ele me cobre de glórias e me b) a ser enriquecido pela criação de gírias;
faz magnífico.” c) pronto para incorporar estrangeirismos;
(Rubem Braga,200 Crônicas Escolhidas) d) que se amplia graças à tradução de termos científicos;
e) a ser enriquecido com contribuições pessoais.
6. Nas três “considerações” do texto, o cronista preserva,
como elemento comum, a idéia de que a sensação de Texto para as questões 10 e 11.
esplendor:
a) ocorre de maneira súbita, acidental e efêmera; “A triste verdade é que passei as férias no calçadão
b) é uma reação mecânica dos nossos sentidos do Leblon, nos intervalos do novo livro que venho
estimulados; penosamente perpetrando. Estou ficando cobra em
c) decorre da predisposição de quem está apaixonado; calçadão, embora deva confessar que o meu momento
d) projeta-se além dos limites físicos do que a motivou; calçadônido mais alegre é quando, já no caminho de volta,
e) resulta da imaginação com que alguém vê a si vislumbro o letreiro do hotel que marca a esquina da rua
mesmo. onde finalmente terminarei o programa-saúde do dia. Sou,
digamos, um caminhante resignado. Depois dos 50, a gente
7. Atente para as seguintes afirmações: fica igual a carro usado, é a suspensão, é a embreagem, é o
I - O esplendor do pavão e o da obra de arte implicam radiador, é o contraplano do rolabrequim, é o contrafarto do
algum grau de ilusão. mesocárdio epidítico, a falta da serotorpina folimolecular, é
II - O ser que ama sente refletir em si mesmo um o que mecânicos e médicos disseram. Aí, para conseguir
atributo do ser amado. ir segurando a barra, vou acatando os conselhos. Andar
III - O aparente despojamento da obra de arte oculta é bom para mim, digo sem muita convicção a meus
os recursos complexos de sua elaboração. entediados botões, é bom para todos.”
(João Ubaldo Ribeiro,O Estado de S. Paulo, 6/8/95)

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LÍNGUA PORTUGUESA

10. No período que se inicia em “Depois dos 50...”, o Somando-se os números à esquerda das declarações
uso de termos (já existentes ou inventados) referentes a corretas com referência a Y, o resultado é:
áreas diversas tem como resultado: a) 6
a) um tom de melancolia, pela aproximação entre um b) 7
carro usado e um homem doente; c) 8
b) um efeito de ironia, pelo uso paralelo de termos da d) 9
medicina e da mecânica; e) 10
c) uma certa confusão no espírito do leitor, devido à
apresentação de termos novos e desconhecidos; 15. “(...) a gíria desceu o morro e já ganhou rótulo de
d) a invenção de uma metalinguagem, pelo uso de linguagem urbana. A gíria é hoje o segundo idioma do
termos médicos em lugar de expressões corriqueiras; brasileiro. Todas as classes sociais a utilizam.”
e) a criação de uma metáfora existencial, pela oposição (Rodrigues, Kanne. Língua Solta.O Povo. Fortaleza,
entre o ser humano e objetos. 30/12/93. Caderno B, p. 6)

11. Na frase “Aí, para conseguir ir segurando a barra, vou Assinale a letra em que não se emprega o fenômeno
acatando os conselhos...”. Aí será corretamente substituído, lingüístico tratado no texto.
de acordo com seu sentido no texto, por: a) A linguagem tida como padrão, galera, é a das
a) Nesse lugar classes sociais de maior prestígio econômico e cultural
b) Nesse instante b) Gíria não é linguagem só de marginal, como pensam
c) Contudo alguns indivíduos desinformados.
d) Em conseqüência c) Apesar de efêmera e descartável, a gíria é um barato
e) Ao contrário que enriquece o idioma.
12. A prosopopéia, figura que se observa no verso d) “A gíria enriquece tanto a linguagem como o poder
“Sinto o canto da noite na boca do vento”, ocorre em: de interação entre as comunidades. Sacou?!”
a) “A vida é uma ópera e uma grande ópera.” e) O economista começou a falar em indexação,
b) “Ao cabo tão bem chamado, por Camões, de quando rolava um papo super cabeça sobre babados mil.
‘Tormentório’, os portugueses apelidaram-no de ‘Boa
Esperança’.” (Exercícios retirados de http://soldosana.blogspot.com.
c) “Uma talhada de melancia, com seus alegres caroços.” br/2012/03/simulado-portugues-iii-20-questoes-com.html)
d) “Oh! eu quero viver, beber perfumes, Na flor silvestre,
que embalsama os ares.”
e) “A felicidade é como a pluma...” GABARITO
13. 01. C
Folha: De todos os ditados envolvendo o seu nome, 02. B
qual o que mais lhe agrada? 03. B
Satã: O diabo ri por último. 04. A
Folha: Riu por último. 05. E
Satã: Se é por último, o verbo não pode vir no passado. 06. C
(O Inimigo Cósmico, Folha de S. Paulo, 3/9/95) 07. D
08. C
Rejeitando a correção ao ditado, Satã mostra ter usado 09. E
o presente do indicativo com o mesmo valor que tem em:
10. B
a) Romário recebe a bola e chuta. Gooool!
11. C
b) D. Pedro, indignado, ergue a espada e dá o brado de
12. C
independência.
13. E
c) Todo dia ela fez tudo sempre igual.
14. E
d) O quadrado da hipotenusa é igual à soma dos
15. B
quadrados dos catetos.
e) Uma manhã destas, Jacinto, apareço no 202 para
almoçar contigo.
Características dos diversos tipos de texto (gênero):
14. Reflita sobre o diálogo abaixo: publicitários, jornalísticos, instrucionais, narrativos,
X – Seu juízo melhorou? poéticos, epistolares, história em quadrinhos.
Y – Bom... é o que diz nosso psiquiatra.
Em Y: É uma forma de interação social, podem ter caracterís-
(1)Bomnão se classifica como adjetivo. ticas faladas ou escritas, tamanhos diversificados. Por meio
(2)éedizestão conjugados no mesmo tempo. de um objetivo gira em torno de ideias e sentidos, se ex-
(3)oé pronome demonstrativo. pressa de forma verbal e não-verbal.
(4)psiquiatraé o núcleo do sujeito.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Os Textos estruturam-se de acordo com algumas re- ARGUMENTAÇÃO


gras, fatores e características:
Contexto – como, com quem ocorrem as formas co- Argumentar faz parte de toda atividade humana. A pala-
municativas; dados comuns ao emissor e ao receptor. Busca vra argumentação, do latim argumentum, significa defender
representar o ouvinte e o leitor, estabelecer o lugar que uma ideia, um ponto de vista, a partir de uma linha de racio-
acorre a interação e quais finalidades. cínio. Para isso, é necessário produzir argumentos, séries de
Intertextualidade – é ser capaz de observar ou fazer afirmações embasadas em alguma estrutura concreta.
ligações de um texto sobre outro, seja ou não do mesmo Argumentamos em vários momentos da vida. Seja
autor, porém de mesmo assunto. Quando lemos ou ouvi- quando se tenta convencer um amigo a nos acompanhar
mos um texto é necessária uma série de informações exter- numa festa, apresentando os benefícios desse ato, seja
nas para um melhor entendimento do texto. quando, durante a infância, solicita-se aumento de mesada
Parágrafo – um texto pode ser formado por diversos aos pais, a argumentação está justamente nesse trabalho
parágrafos, apresentado de acordo com o grupo de ideias. verbal que visa que o interlocutor siga o caminho apresen-
O parágrafo é composto de frases, é uma mudança de li- tado pelo emissor. Por isso mesmo, não se pode pensar
nha. Frase é expressa sentido. As frases podem ser: interro- na argumentação sem o conceito de persuasão, ou seja,
gativas, afirmativas, negativas, exclamativas e imperativas. comunicação estratégica que é feita através de argumentos
Fatores na construção do texto – o texto enseja coe- lógicos.
rência, trabalhar com coesão. Argumentação pressupõe um diálogo de ideias, ini-
A coerência é um fator importante para a estruturação ciado por um emissor que expõe sua maneira de pensar
do texto, no ponto em que não se podem contradizer as sobre determinado assunto e o porquê disso; e o interlocu-
outras partes do texto. Na verdade o texto deve ser coe- tor, aquele que deve ser convencido a assumir tal posição.
rente em um todo. Assim sendo, a questão a ser tratada numa argumentação
A coesão é uma conexão interna entre as várias partes não é exatamente a verdade, mas antes aceitar a fala do
de um texto. A melhor forma de usar esta ferramenta e emissor como verdade.
dispor de forma correta o uso da gramática. O filósofo Sócrates nos diz: “argumentos são úteis
Organização dos textos – primeiro buscar uma fina- quando se tem que escolher entre duas ou mais coisas”. Ou
lidade, depois decidir sobre uma sequência. As sequências seja, frente a vários pontos de vistas a argumentação surge
dividem-se em: narrativas, descritivas, dissertativas, instru- para defender apenas um. E aí surge a arte da persuasão. O
tivas e com diálogos. tema de um debate argumentativo nunca gira em torno de
Gêneros de textos  – são grupos de textos com ca- temas banais ou de fácil escolha, como, por exemplo, a op-
racterísticas e formatos parecidos. Dividem-se em: textos ção entre ser saudável ou enfermo, já que aqui a escolha é
científicos, textos de correspondência, textos instrucionais, fácil e simples. A grande argumentação pressupõe debate
textos jornalísticos, textos literários, textos literários com o de vários pontos de vistas plausíveis, importantes, válidos.
uso de linguagem visual e verbal e textos publicitários. E assim, como uma vitória, quando o receptor é convenci-
Textos científicos – são divulgações científicas. Podem do, a tarefa da argumentação é concluída.
ser lidos em periódicos científicos, em revistas, em livros Um dos erros mais comuns da argumentação é o equí-
didáticos, em dicionários e enciclopédias. voco na defesa do ponto de vista. Se argumentar é defen-
Textos de correspondência – com o objetivo de outra der uma ideia, esta deve estar bem clara para, em seguida,
pessoa ler ou visualizar. Podem ser divididos em: bilhete, escolher os argumentos, os “porquês”. O que acontece,
carta, cartão-postal, e-mail e telegrama. muitas vezes, é a escolha de argumentos frágeis que po-
Textos instrucionais  – sugere a função apelativa da dem, inclusive, gerar o efeito contrário: fazer com que o
linguagem. Podem ser: bulas, folhetos explicativos, guias interlocutor pense o contrário do que se defende.
de cidades, instruções de provas, manuais de instruções, Assim, ao longo da história, muito se discutiu e se argu-
receitas de cozinha, regras de jogos etc. mentou, com erros e acertos. E quanto mais a ciência evo-
Textos jornalísticos  – podem ser: anúncios, car- luiu, mais se sofisticaram as estratégias argumentativas, divi-
tas, editorial, entrevista, notícia e reportagens. didas em vários tipos, conforme o ponto de vista defendido.
Textos literários – nos textos literários é usada a criati-
vidade, o jogo de imagens e figuras. Dividem-se em: conto, Tipos de argumentação
crônica, fábula, novela, peça teatral, poema e romance.
Textos literários com o uso de linguagem visual e verbal 1. Argumentação por autoridade
– podem ser: charge, cartum, história em quadrinhos e tira.
Textos publicitários – o objetivo do texto é seduzir o Defende-se um ponto de vista utilizando como recurso
leitor ou convencer o consumidor de algo. Características: persuasivo a citação de alguma autoridade do assunto em
o uso de vários adjetivos, verbos no imperativo (apelativos), questão, a fim de mais efetivamente convencer o interlocu-
argumentativo e o uso de metáforas. tor. Recurso típico de argumentações acadêmicas e cientí-
ficas, demonstra saber formal da questão e propriedade no
FONTE: http://www.infoescola.com/linguistica/texto/ momento da defesa da ideia.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: Trabalho, do latim tripalium, significava original- Ex.: Ainda que o governo sustente a ascensão da eco-
mente instrumento de tortura. Parece que hoje, no mundo nomia brasileira no último ano, os números parecem indi-
capitalista em que vivemos, tal palavra não se distancia de car o contrário. Segundo dados recentemente divulgados
sua origem etimológica. Já nos dizia o pensador Karl Marx: pelo IBGE, a taxa de desempregou atingiu seu ápice, che-
“O trabalhador só se sente a vontade no seu tempo de fol- gando aos inacreditáveis quatorze milhões de brasileiros
ga, porque o seu trabalho não é voluntário, é imposto, é desempregados.
trabalho forçado.”
5. Argumentação por analogia
2.Argumentação por causa e consequência
Neste tipo de argumentação se defende que se duas
Método clássico e efetivo de argumentação, consiste coisas são semelhantes em algum aspecto, devem ser si-
em defender uma ideia iniciando as causas de um proble- milares em outros também. É o princípio do raciocínio por
ma e suas respectivas consequências, a fim de desenvolver analogia, que possui a seguinte fórmula:
um raciocínio lógico embasado em fatos consistentes.
X é como Y.
Ex.: Vive-se numa sociedade marcada ainda pelos ideais Y é A.
da Revolução francesa. A fraternidade, a igualdade e a liber- Logo, X é A.
dade deram origem ao sujeito moderno, aquele que respon- Ex.: Pode-se afirmar os brasileiros apresentam o mes-
de pelos próprios atos. Entretanto, o mesmo sujeito que se mo comportamento que os espanhóis quando o assunto
diz livre para escolher, está “sujeito” às escolhas do mercado. é futebol. Grandes torcedores, os representantes dos dois
(tese). Uma das causas desse problema é a falsa ideia de países dedicam grande parte do seu final de semana ao seu
liberdade que as propagandas oferecem ao indivíduo. Com time do coração. Verificou-se que os brasileiros estão cada
estratégicas cinematográficas, criam uma narrativa em que vez mais violentos nos estádios, causando brigas e tumul-
apresenta o cidadão como herói no momento em que ele tos a cada partida. Logo, pode-se inferir que também na
opta pelo produto sugerido. (causa). Assim sendo, a conse- Espanha ocorre o mesmo problema, já que quando se une
quência dessa persuasão mercadológica é o verdadeiro su- paixão e esporte, os nervos ficam à flor da pele.
jeito assujeitado pós-moderno aquele sem iniciativa, aguar-
dando o próximo conselho do mercado, já impossibilitado 6. Argumentação por senso comum
em escolher qualquer coisa que seja. (consequência).
Argumentação fundamentada por meio do resgate de
3. Argumentação por exemplificação fatos ou ditos extraídos do senso comum, considerados
consenso geral. Modalidade mais frágil da argumentação,
Argumentação que utiliza algum relato real ou fictício representa defesa de opiniões massificadas, aquelas que
para exemplificar discussões extremamente teóricas. Esse defendem pontos de vistas incontestáveis.
procedimento é importante para ilustrar questões desen-
volvidas apenas no âmbito científico, no intuito de melhor Ex.:É cada vez mais importante ter cuidado com a com-
se fazer entender e convencer. panhia das crianças. Numa idade tão influenciável, podem
adquirir hábitos ruins, estimulados pelo contato com pes-
Ex.: Pode-se afirmar que três pensadores mudaram
soas nocivas. Nos dias de hoje nunca foi tão certo aque-
radicalmente a visão do homem ocidental. São eles: Karl
le ditado popular: diga-me com quem andas que te direi
Marx, Friedrich Nietzsche e Sigmund Freud. A discussão
que os une é a completa revisão do homem e do huma- quem és.
nismo, conceitos que giram em torno do império da razão.
Marx relê o homem a partir de suas condições de trabalho, 7. Argumentação por fuga retórica
Freud através da descoberta do inconsciente, Nietzsche
por meio da derrubada da verdade. Em outras palavras, O nome diz tudo. É a argumentação que traz poucos
pense naquele sujeito que trabalha oito horas por dia e fatos para discussão, valendo-se mais da apresentação retó-
prefere não pensar sobre seus problemas no casamento. rica, ou seja, uso de palavras e entonações rebuscadas e con-
Não pensa porque acredita ser essa a verdade sobre sua vincentes, a fim de fugir da questão central sem abandonar
vida. Aos poucos vai se desligando das responsabilidades o desejo de convencer. Observa-se muito isso em julgamen-
e um dia abandona o lar: ele se desfaz do trabalho que o tos, quando o advogado tenta mudar o foco da acusação,
acorrenta, da consciência restritiva, da verdade opressora. enaltecendo questões que não interessam ao processo.
Entretanto, não pode ser livre, esse é o humano desenhado
pelos pensadores.
GÊNEROS TEXTUAIS
4. Argumentação por comprovação
A palavra texto significa tecido, meio pelo qual se
Argumentação embasada em provas concretas extraí- imprime uma letra e estabelece a comunicação escrita. O
das da realidade, mediante comprovação de veracidade ou, advento da escrita remonta desde a pré-história, quando os
além disso, por fatos notórios. Sua eficácia está na concreti- homens desenhavam caracteres nas paredes das cavernas,
zação das questões argumentadas a partir de dados exatos. no desejo de fazer lembrar algum fato real ou místico.

7
LÍNGUA PORTUGUESA

Entretanto, foi a partir do século XVI, com a invenção da Atenciosamente


imprensa, por Gutemberg, que a grafia se tornou algo mais
popular entre os homens, já que com a gráfica era mais Patrícia Garcia
fácil reproduzir documentos em larga escala. Auxiliar de Correspondência
Devido a sua materialidade na página, o ato de
escrever foi adquirindo várias modalidades, poderia ser mais 3. MANUAL DE INSTRUÇÕES
poético, mais realista, mais ficcional ou informativo. Para
tanto, o conteúdo do que se quer escrever deve se adequar Gênero cuja função consiste em apresentar
a um gênero textual, uma forma específica de se escrever procedimentos que auxiliam na utilização de um
um texto, utilizando uma linguagem correspondente. equipamento. Dotado de linguagem clara, muitas vezes
Há os gêneros literários, formas ligadas à arte de vem acompanhado de imagens instrutivas.
escrever (romance, poesia, conto); tipos textuais, forma com
um texto se apresenta (narrativo, dissertativo, descritivo) e Ex.:
os gêneros textuais, com os mais variados tipos.
Precauções de Segurança
CLASSIFICAÇÃO DOS GÊNEROS TEXTUAIS
3.1 Informações importantes de segurança
1. CARTA PESSOAL
• Mantenha sempre as crianças e os animais longe do
Gênero epistolar utilizado entre indivíduos próximos, fogão, pois durante o uso ele torna-se quente. Cuidados
caracterizado por uma linguagem mais íntima e familiar, devem ser tomados para evitar o contato com as partes
além de ser originalmente apresentado em manuscrito. quentes do fogão. Use luvas térmicas de proteção no
Ex.: manuseio ou na retirada de alimentos do forno. • Utilize
sempre panelas com fundo plano e com os cabos virados
Florianópolis, 17 de julho de 1990 para dentro (f g.1).

• Não utilize panelas com fundo curvo (convexo) ou em


Querida Júlia,
anel.
Depois de algum tempo sem te escrever, hoje, nessa
• Esquente os alimentos com as embalagens abertas,
tarde chuvosa, comprei papel decorado para te fazer um
pois nas totalmente fechadas o calor aumenta a pressão
agrado. Como você vai, querida? Aqui no sul chove há dias,
interna, podendo causar acidentes. Ao sentir cheiro de gás
ando sem vontade de acordar cedo e Antônio não se oferece dentro de casa, tome as seguintes providências:
para me levar ao trabalho. Estou tão insatisfeita com esse
relacionamento! Não sei como me livrar dessa. 1.) Não mexa em interruptores elétricos;
Daqui a um mês iniciam minhas férias, pensei em 2.) Abra as janelas e as portas, permitindo maior
te visitar no Rio. O que você acha? ventilação do ambiente;
3.) Feche o regulador de pressão de gás no botijão;
Saudade sincera, 4.) Não acenda qualquer tipo de chama;
5.) Entre em contato com o Serviço Autorizado de Fábrica
Patrícia para verificar o problema.
2. CARTA COMERCIAL ( h t t p : / / w w w . c o l o m b o . c o m . b r /
produtos/228152/228152_1447765103336.pdf)
Gênero epistolar usado no âmbito empresarial,
exige linguagem formal e impessoal, sem indícios de 5. RECEITAS CULINÁRIAS
familiaridade.
Conjunto de orientações que auxiliam no processo de
Florianópolis, 17 de julho de 1990 preparo de um alimento.

Prezada Sra. Júlia Almeida, Ex.:


Receita de pudim de leite condensado
Após auditoria nas contas da empresa Detalhe &
Co.confirma-se os dados apresentados e o agendamento Ingredientes:
para a entrevista fiscal no dia primeiro de agosto de 2017, 2 latas de leite condensado
às 14hs. 2 latas (leite condensado) de leite
Lembramos ser necessário o porte de todos os 5 ovos
documentos originais. 2 xícaras (de chá) de açúcar
Segue, anexada, a lista de instruções. 2 1/2 xícaras (de chá) de água
1 pedaço de canela em pau

8
LÍNGUA PORTUGUESA

MODO DE PREPARO destinadas à matrícula no curso de Formação e Graduação


1. Coloque os ovos um a um no liquidificador e bata- de Oficiais de Carreira da Linha de Ensino Militar Bélico, em
os por 10 minutos. Acrescente o leite condensado e a medida conformidade com o prescrito no Capítulo VIII deste Edital.
do leite e deixe bater por mais 10 minutos.
2. Para fazer a calda coloque o açúcar e a canela em (http://www.espcex.eb.mil.br/downloads/Edital_
pau no caneco de alumínio, leve ao fogo e vá mexendo até CA_2017_Publ_Internet.pdf)
dourar. Assim que esteja dourado, acrescente as duas xícaras
e meia de água e deixe ferver até dissolver o açúcar. Vire a 8. CURRICULUM VITAE
calda na forma de pudim e em seguida vire o conteúdo do
liquidificador. Cubra a forma com papel alumínio. Coloque-a Currículo, em português, consiste num histórico
dentro da forma retangular, que estará preenchida com um escolar e profissional em que se apresenta uma síntese das
litro de água. Leve ao forno, em banho maria, á 280 graus qualificações e aptidões de um candidato, além de dados
por uma hora meia. Depois retire o papel alumínio e deixe pessoais.
dourar por mais meia hora. Desligue o forno e deixe esfriar,
colocando em seguida na geladeira. Depois de gelado, 9. TEXTO DE OPINIÃO
desenforme-o em um prato grande e sirva-o.
Gênero dissertativo-argumentativo no qual o autor
(http://gshow.globo.com/receitas-gshow/ apresenta seu posicionamento crítico frente um tema atual
receita/pudim-de-leite-condensado-da-magda- ou de interessa da sociedade.
568286414d3885754700003f.html)
Ex.:
6. E-MAIL
Ao comentar as mortes de crianças nos frequentes
Modalidade disponível na internet, o e-mail possibilita massacres nos Estados Unidos, o presidente Obama foi às
o envio e o recebimento de mensagens de forma eletrônica. lágrimas. O homem mais poderoso do mundo revelava
A linguagem depende a identidade do receptor e hoje é o seu lado sensível e compaixão, provocando admiração e
substituto das cartas pessoais e comerciais.
solidariedade. Afirmou que “não podemos deixar que esses
massacres se tornem normais”. Denunciou a chantagem da
7. EDITAL
indústria de armas sobre o Congresso, que se recusa a votar
o controle de armas, mas advertiu que “o povo não será
Comunicado oficial por meio do qual são anunciadas
mantido refém” da indústria. De fato, 85% da população
regras, determinações e avisos a pessoas interessadas ou
é a favor de que as autoridades chequem os antecedentes
de conhecimento geral.
de quem quer comprar arma. Obama pretende avançar no
Ex.: controle, tímido pelos padrões internacionais, através de
decretos, proibindo a venda de armas de guerra para civis e
EDITAL Nº 01 / SCONC, DE 28 DE ABRIL DE 2017 criando bancos de dados sobre os proprietários .
CONCURSO DE ADMISSÃO À ESCOLA PREPARATÓRIA
DE CADETES DO EXÉRCITO (http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/
artigos/as-armas-e-o-erro-de-avaliacao-
O Comandante da Escola Preparatória de Cadetes do e4lzkaye9rc5zo5h7940yglww)
Exército (EsPCEx), devidamente autorizado pelo Comando
do Exército – por intermédio do Departamento de Educação 10. RESUMO
e Cultura do Exército (DECEx) – amparado na Lei nº 9.786,
de 8 de fevereiro de 1999 – Lei de Ensino no Exército, faz Síntese de um acontecimento ou documento com a
saber que estarão abertas, no período de 01 de maio a 20 de finalidade de apresentar ideias gerais sobre seu sentido.
junho de 2017, as inscrições para o Concurso de Admissão à Geralmente é finalizado com a apresentação de algumas
EsPCEx, observadas as seguintes instruções: palavras chaves que norteiam o assunto.

CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS Ex.:

Art. 1º. O presente concurso será regido pelas Instruções RESUMO: Pretende‐se neste artigo abordar aspectos
Reguladoras do Concurso de Admissão e da Matrícula na teóricos que norteiam o Projeto Educação Patrimonial,
EsPCEx (IRCAM/EsPCEx – EB60-IR-15.001 - Port. nº 95/ além de apresentar a forma como o mesmo vem sendo
DECEx, de 26 de abril de 2017) e pela Port. nº 96/DECEx, de trabalhado nos últimos seis anos. Em 2010 o mesmo
26 de abril de 2017. recebeu a denominação “Projeto Educação Patrimonial VI:
Memórias da Rua”, contando com apoio da Diretoria de
Art. 2º. O concurso destina-se a selecionar candidatos Patrimônio da Secretaria Municipal de Cultura de Londrina‐
para o preenchimento de 400 (quatrocentas) vagas para o PR e financiamento do Programa Municipal de Incentivo a
sexo masculino e 40 (quarenta) vagas para o sexo feminino, Cultura – PROMIC. Esta iniciativa vem sendo desenvolvida,

9
LÍNGUA PORTUGUESA

ininterruptamente, desde 2005, demonstrando o interesse 13. NOTÍCIA


público pelo tema, garantindo ações educacionais e culturais
em conjunto com a população de Londrina. Na sua sexta Gênero textual de cunho jornalístico em que se
edição, o projeto visa dar continuidade a valorização e transmite informações e fatos diários a um público de larga
divulgação do patrimônio histórico‐cultural do município escala. Por isso a linguagem deve ser objetiva e impessoal,
a partir de ações que venham contribuir para a construção destituída de subjetividade.
de uma consciência voltada para sua preservação. É uma
proposta que parte das reflexões dos projetos anteriores, Ex.:
garantindo a continuidade de algumas ações e a uma
reavaliação e redirecionamento de outras. Este texto está CIDADE DO PANAMÁ — Dezenas de banhistas em
dividido em três partes: na primeira é apresentado alguns uma praia na Flórida, nos Estados Unidos, formaram uma
aspectos conceituais relativos a educação patrimonial. Na corrente humana para resgatar nove pessoas, sendo seis
segunda, tem‐se um pequeno histórico do projeto, com sua de uma mesma família, no último sábado, em uma área
dinâmica e seus resultados e, na terceira, é abordada sua fase muito afastada da costa. Aproximadamente 80 pessoas
atual. PALAVRAS‐CHAVE: Educação Patrimonial, Patrimônio contribuíram para o salvamento do grupo.
Cultural, PROMIC
— Eu honestamente pensei que iria perder minha
(http://web.unifil.br/eventos/psicologia/pdf/resumo- família naquele dia — afirmou Roberta Ursrey ao jornal
simples.pdf) “The Panama City News Herald”. — Eu estava, tipo, “Ah, meu
Deus, é assim que vou morrer”.
12. RESENHA Ela contou que ficou preocupada quando viu os dois
filhos nadando em uma área muito afastada da praia, já
Tal como o resumo, a resenha consiste numa gritando por socorro. A mãe, então, entrou na água para
apresentação breve e sucinta de determinado salvá-los, junto com o pai deles, um primo, a avó e mais
acontecimento ou documento. O que difere do outro três pessoas que se solidarizaram. No entanto, os nove
gênero é que na resenha o autor apresenta também uma começaram a também pedir socorro, pois, uma vez que
avaliação crítica do material resumido, de modo a guiar o alcançaram os garotos, não conseguiram mais sair e ficaram
leitor sobre o assunto em questão. submersos a 4,5 metros da superfície.
Nesse momento de desespero, as pessoas que estavam
Ex.: na praia de Panama City começaram a se mobilizar para
salvar a família. Com isso, formaram uma corrente humana
O diabo veste Prada – Por Ana Lucia Santana que ia desde a areia até a localidade do grupo à deriva,
localizado a 100 metros da costa. Uma mulher sofreu um
Este filme revela de forma genial os bastidores do infarto e precisou ser hospitalizada. Duas filhas de Roberta
universo fashion, particularmente os mecanismos que regem também estavam na corrente.
os editoriais de moda. Em O Diabo Veste Prada, inspirado Quando a americana Jessica Simmons percebeu que
na obra de Lauren Weisberger, o enredo gira em torno da havia um grupo se afogando, ela foi em direção a eles com
arrogante  Miranda Priestly,  alterego da poderosa Anna o marido e outras pessoas se uniram a eles para formar a
Wintour, editora de moda da Revista Vogue americana. corrente humana que salvou os nove banhistas.
— Eu automaticamente pensei que eles tivessem visto
Na trama, Miranda, interpretada magistralmente por um tubarão — contou Jessica. — Eu corri de volta para a
Meryl Streep, trabalha na Revista Runway, submetendo e areia e meu marido veio ao meu encontro. Foi então que vi
humilhando suas funcionárias e todos que, no mundo da que alguém estava se afogando.
moda, a temem e se submetem a ela, uma vez que a editora
parece comandar, de cima de seu trono Prét-à-Porter, os (https://oglobo.globo.com/sociedade/corrente-
destinos de grifes e estilistas, do próprio mercado fashion. humana-de-80-banhistas-salva-familia-em-praia-na-
Andrea, vivida por Anne Hathaway, é a jornalista florida-21576121)
recém-formada em busca de uma oportunidade de trabalho.
Trazendo em sua bagagem inúmeras expectativas e um total 14. POEMA
desconhecimento da esfera da moda, ela vai para Nova York
e, sem imaginar o que a aguarda, é contratada para atuar Composição em versos, caracterizado pelo trabalho
na Runway. aprimorado com a linguagem, notadamente lírico.

(http://www.infoescola.com/cinema/o-diabo-veste- Ex.:
prada/)
Amor é fogo que arde sem se ver – Luís de Camões

Amor é um fogo que arde sem se ver; 


É ferida que dói, e não se sente; 

10
LÍNGUA PORTUGUESA

É um contentamento descontente;  Era pena. O dr. Antero contava trinta anos, tinha saúde, e
É dor que desatina sem doer.  podia, se quisesse, fazer uma bonita carreira. Verdade é que
É um não querer mais que bem querer;  para isso fora necessário proceder a uma completa reforma
É um andar solitário entre a gente;  dos seus costumes. Entendia, porém, o nosso herói que o
É nunca contentar-se e contente;  defeito não estava em si, mas nos outros; cada pedido de
É um cuidar que ganha em se perder;  um credor inspirava-lhe uma apóstrofe contra a sociedade;
julgava conhecer os homens, por ter tratado até então com
É querer estar preso por vontade;  alguns bonecos sem consciência; pretendia conhecer as
É servir a quem vence, o vencedor;  mulheres, quando apenas havia praticado com meia dúzia
É ter com quem nos mata, lealdade.  de regateiras do amor.
O caso é que o nosso herói determinou matar-se, e para
Mas como causar pode seu favor  isso foi à casa da viúva Laport, comprou uma pistola e entrou
Nos corações humanos amizade, 
em casa, que era à rua da Misericórdia.
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Davam então quatro horas da tarde.
O dr. Antero disse ao criado que pusesse o jantar na
15. FÁBULA
mesa.
Composição literária curta, cujos personagens são — A viagem é longa, disse ele consigo, e eu não sei se há
geralmente animais com características humanas. Enquanto hotéis no caminho.
narrativa figurada, a fábula está sempre sustentada por Jantou com efeito, tão tranquilo como se tivesse de ir
uma lição de moral, apresentada ao fim da história. dormir a sesta e não o último sono. O próprio criado reparou
que o amo estava nesse dia mais folgazão que nunca.
Ex.: Conversaram alegremente durante todo o jantar. No fim
dele, quando o criado lhe trouxe o café, Antero proferiu
A Cigarra e a Formiga paternalmente as seguintes palavras:
— Pedro, tira de minha gaveta uns cinquenta mil-réis
Num dia soalheiro de Verão, a Cigarra cantava feliz. que lá estão, são teus. Vai passar a noite fora e não voltes
Enquanto isso, uma Formiga passou por perto. Vinha antes da madrugada.
afadigada, carregando penosamente um grão de milho que — Obrigado, meu senhor, respondeu Pedro.
arrastava para o formigueiro. - Por que não ficas aqui a — Vai.
conversar um pouco comigo, em vez de te afadigares tanto? Pedro apressou-se a executar a ordem do amo.
– Perguntou-lhe a Cigarra. - Preciso de arrecadar comida O dr. Antero foi para a sala, estendeu-se no divã, abriu
para o Inverno – respondeu-lhe a Formiga. – Aconselho- um volume do Dicionário filosófico e começou a ler.
te a fazeres o mesmo. - Por que me hei-de preocupar com
o Inverno? Comida não nos falta... – respondeu a Cigarra, (https://pt.wikisource.org/wiki/O_Anjo_Rafael/I)
olhando em redor. A Formiga não respondeu, continuou o
seu trabalho e foi-se embora. Quando o Inverno chegou, a 17. NOVELA
Cigarra não tinha nada para comer. No entanto, viu que as
Formigas tinham muita comida porque a tinham guardado Gênero literário mais curto que o romance e mais
no Verão. Distribuíam-na diariamente entre si e não tinham extenso que o conto, a novela é uma composição literária
fome como ela. A Cigarra compreendeu que tinha feito mal. marcada por enredo ativo e aventureiro, com muitos
Moral da história: Não penses só em divertir-te. personagens, como pouca complexidade dramática, já que
Trabalha e pensa no futuro. intenciona primeiramente o entretenimento. O texto O
Alienista, de Machado de Assis, é um exemplo do gênero
(http://fabulasinfantis.blogs.sapo.pt/902.html) novela.

16. CONTO 18. ROMANCE

Composição literária curta, em prosa, a qual gira Composição literária em prosa, cuja popularização é
em torno de um único conflito e número restrito de contemporânea à ascensão da burguesia, no século XIX,
personagens. tem com característica a apresentação de personagens
complexos, dramas sentimentais e sociais, além de mais de
Ex.: um núcleo narrativo.

O anjo Rafael – Machado de Assis

Cansado da vida, descrente dos homens, desconfiado


das mulheres e aborrecido dos credores, o dr. Antero da Silva
determinou um dia despedir-se deste mundo.

11
LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: Beba com moderação. Caso você tenha uma água amarga,
ofereça pra mim. Tentarei beber com moderação. E pode
Recordações do Escrivão Isaías Caminha - Lima Barreto confiar nos sacolés: nunca mataram ninguém. Se esbarrar
com um sacolé de cupuaçu, parabéns: você encontrou Deus
I A tristeza, a compreensão e a desigualdade de nível em sua forma líquida. Qual o melhor bloco? Impossível dizer.
mental do meu meio familiar, agiram sobre mim de modo Mas quanto mais velho o bairro, melhor o bloco. Quanto
curioso: deram-me anseios de inteligência. Meu pai, que era mais homens com camisa de time de futebol e chapéus de
fortemente inteligente e ilustrado, em começo, na minha marcas de cerveja, pior o bloco – a não ser que você tenha
primeira infância, estimulou-me pela obscuridade de suas esse fetiche específico. Não siga as caixas de som. Quanto
exortações. Eu não tinha ainda entrado para o colégio, menos caixas de som, melhor o som. Procure músicos a
quando uma vez me disse: Você sabe que nasceu quando pé. Fuja dos blocos que tiverem carros, trios ou quaisquer
Napoleão ganhou a batalha de Marengo? Arregalei os máquinas automotoras. Prefira máquinas como o trombone
olhos e perguntei: quem era Napoleão? Um grande homem, de vara (não se esqueça de tomar cuidado com a vara) e
um grande general... E não disse mais nada. Encostou-se o sousafone (aquela tuba que o músico enrola ao redor do
à cadeira e continuou a ler o livro. Afastei-me sem entrar corpo igual uma sucuri). Nos melhores blocos, não há corda
na significação de suas palavras; contudo, a entonação de pra proteger os músicos da multidão. Ou melhor: a corda
voz, o gesto e o olhar ficaram-me eternamente. Um grande é você. Proteja os músicos como se disso dependesse a sua
homem!... vida. É uma chance de estar no epicentro do som e ainda
O espetáculo do saber de meu pai, realçado pela fazer um puta serviço para o Carnaval de todos. Sem espaço
ignorância de minha mãe e de outros parentes dela, surgiu não há música. Sem cerveja, também não. Ofereça cerveja
aos meus olhos de criança, como um deslumbramento. aos músicos. Eles merecem. Capriche na fantasia, mas não
Pareceu-me então que aquela sua faculdade de explicar tudo, demais – se tudo der certo ela vai estragar. Faça planos, mas
aquele seu desembaraço de linguagem, a sua capacidade de não demais: se vir o amor da vida ou um sousafone, agora que
ler línguas diversas e compreendê-las constituíam, não só já sabe o que é, siga-o. Beije sem moderação, mas a palavra
uma razão de ser de felicidade, de abundância e riqueza, “não” continuará significando “não”. Carnaval não é estado
de exceção. Não insista. Não segure. Não empurre. Não seja
mas também um titulo para o superior respeito dos homens
chato. Evite pedir selfies pra comediantes que beberam água
e para a superior consideração de toda a gente. Sabendo,
amarga. Deixe-se levar. Perca-se dos seus amigos. Apaixone-se
ficávamos de alguma maneira sagrados, deificados... Se
sem moderação, desde que não dure muito tempo. Se você vir
minha mãe me parecia triste e humilde — pensava eu
a pessoa com outra pessoa, é de bom tom traçar uma linha
naquele tempo — era porque não sabia, como meu pai,
reta na direção oposta e não perguntar nada até quarta-feira
dizer os nomes das estrelas do céu e explicar a natureza da
(melhor mesmo é nunca mais perguntar nada). Importante:
chuva... Foi com estes sentimentos que entrei para o curso saiba voltar pra casa na hora certa. Nada de mágico acontece
primário. Dediquei-me açodadamente ao estudo. Brilhei, e depois das 8 da noite. Amanhã tem mais. Acorde cedo.
com o tempo foram-se desdobrando as minhas primitivas
noções sobre o saber. (http://vip.abril.com.br/comportamento/cronica-de-
carnaval-por-gregorio-duvivier/)
(BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías
Caminha. SP, Editora Ática, 1998, p.21)
TIPOLOGIA TEXTUAL
19. CRÔNICA
Texto, tecelagem ou modo de estruturar as palavras, é
Gênero textual cuja característica consiste em relatar um artefato usado para a comunicação. Antes de seu ad-
algum fato do cotidiano que, embora inicialmente vento havia apenas a oralidade como ferramenta de trans-
pareça banal, ao longo dos parágrafos vai adquirindo missão e, aqui, o modo mais eficiente de lembrar o que
complexidade. Com uma linguagem mais pessoal, muitas deveria ser emitido era a narração em versos, já que era
vezes o autor utiliza a primeira pessoa do singular, como se mais fácil memorizar através dos ritmos proporcionados.
estivesse numa conversa informal. Com o texto, já não era mais indispensável a presença
daquele que criava as ideias, pois a textualidade por si só
Ex.: já era uma presença material. E, assim, o verso da oralidade
foi sendo substituído pela linha reta da prosa. Quando a
Crônica de carnaval – Gregório Duvivier escrita foi popularizada, rapidamente foi se diversificando
o modo de usá-la, através dos gêneros textuais e literários,
Acorde cedo. Cedo mesmo. Vai parecer estranho. Logo modos externos de se apresentar uma linguagem. Além
vai ficar normal. Você não vai ter fome. Mas coma. Pra dos gêneros, há uma forma interna de organizar a grafia,
sobreviver. De preferência em pé. Não leve dinheiro demais. seja mais livre, impessoal ou argumentativa, e aqui estamos
Não leve documento nenhum. Não leve nada que não seja falando dos tipos textuais, modos de organização inter-
leve. Não leve nada a sério. Nem ninguém. Se for levar o na de um texto. Nesse sentido, frente à variedade infinita
celular, leve embrulhado num saco plástico. Beba água – sem de gêneros textuais, há apenas cinco tipos de textos: a nar-
moderação. Se beber uma água amarga, é Michael Douglas. ração, a descrição, a dissertação e a injunção.

12
LÍNGUA PORTUGUESA

1. O texto narrativo - Narrador Testemunha: o narrador relata os aconteci-


mentos em primeira pessoa, mas não é o protagonista, é
A narrativa é um texto cujo fim é relatar acontecimen- um personagem secundário que testemunha os fatos vivi-
tos, reais ou fictícios, dentro de um espaço e tempo espe- dos pelos protagonistas.
cíficos, vividos por personagens e estruturado por meio de
uma voz narrativa. Ex.:
É através da figura do narrador que os fatos são or-
ganizados e sua presença é fundamental. Seja num relato Encontramo-nos no dia seguinte, conforme o combina-
ficcional ou verídico, no texto narrativo somos apresenta- do, e fomos ver o apartamento no número 221-B da Baker
dos aos conflitos e aventuras de seres que representam a Street, que consistia em dois confortáveis quartos de dormir
realidade – as personagens – e geralmente tal tipo de texto e uma espaçosa sala de estar, alegremente mobiliada e ilu-
é marcado por diálogos, fluxos de pensamentos, emoções. minada por duas amplas janelas. Ele preenchia tão bem as
Diríamos, ainda, que é na narração nossa única possibilida- nossas necessidades e seu preço era tão módico, dividido por
de de adentrarmos nos pensamentos de alguém, pois pelo dois, que imediatamente o alugamos e recebemos a chave,
enredo apresentado pelo narrador temos acesso total ao Nessa mesma tarde mandei vir do hotel as minhas coisas,
que as personagens pensam. e na manhã seguinte Sherlock chegou com as suas várias
A semente da narração está na epopeia clássica, gêne- caixas e maletas. Durante um dia ou dois estivemos ocupa-
ro em que um aedo – narrador clássico – entretinha mul- dos com a arrumação dos nossos objetos pessoais. Feito isso,
tidões ao transmitir as aventuras dos grandes heróis. Sua começamos, pouco a pouco, a nos adaptar ao nosso novo
passagem à escrita transformou o verso em prosa, entre- ambiente.
tanto, sua função de prender a atenção do leitor/ouvinte é
a mesma. Antes do cinema e posterior ao teatro, o gênero (DOYLE, Arthur Conan. Um estudo em vermelho.
narrativo contém em suas páginas dramas e embates exis- In.http://www.kbook.com.br/livraria/wp-content/files_mf/
tenciais diversificados nos diversos gêneros que o utilizam: umestudoemvermelho.pdf)
narrativa história, conto, novela, romance, diários.
- Narrador Onisciente: considerado o narrador mais
1. 1. Elementos estruturais comum, transmite a história em terceira pessoa e não se
constitui em personagem no enredo. Sabe de todos os fa-
a) Narrador tos e sentimentos vividos pelas personagens, geralmente
narra a história utilizando tempo passado.
Também chamado de foco narrativo, o narrador é a voz
que relata a história. Temos acesso aos acontecimentos por Ex.:
meio do ponto de vista do narrador, que pode se apresen-
tar das seguintes formas: NA PLANÍCIE avermelhada os juazeiros alargavam duas
manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia intei-
- Narrador Protagonista: aquele que conta a história ro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam
em primeira pessoa, geralmente o relato de sua vida. Aqui pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do
assume duas funções, a de narrador e a de personagem rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia ho-
principal. ras que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazei-
ros apareceu longe, através dos galhos pelados da catinga
Ex.: rala. Arrastaram-se para lá, devagar, Sinha Vitória com o
filho mais novo escanchado no quarto e o baú de folha na
Não compreendo o que vi. E nem mesmo sei se vi, já que cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia
meus olhos terminaram não se diferenciando da coisa vista. pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de
Só por um inesperado tremor de linhas, só por uma anoma- pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra
lia na continuidade ininterrupta de minha civilização, é que Baleia iam atrás. Os juazeiros aproximaram-se, recuaram,
por um átimo experimentei a vivificadora morte. A fina mor- sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se
te que me fez manusear o proibido tecido da vida. É proibido no chão.
dizer o nome da vida. E eu quase o disse. Quase não me pude
(RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. In. http://www.let-
desembaraçar de seu tecido, o que seria a destruição dentro
tere.uniroma1.it/sites/default/files/528/GRACILIANO-RA-
de mim de minha época. Talvez o que me tenha acontecido
MOS-Vidas-secas-livro-completo.pdf)
seja uma compreensão - e que, para eu ser verdadeira, tenho
que continuar a não estar à altura dela, tenho que continuar
b) Personagem
a não entendê-la. Toda compreensão súbita se parece muito
com uma aguda incompreensão.
Do latim persona (máscara teatral), a personagem na
narrativa é o ser que viverá os acontecimentos organizados
(LISPECTOR, Clarice. Paixão segundo G.H In. pela voz do narrador. O encanto da personagem está em
http://www.carlaportugues.com.br/site/wp-content/ seu caráter verossimilhante, sua aproximação com a vida, e
uploads/2013/04/apaixaosegundogh.pdf)

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LÍNGUA PORTUGUESA

por isso é tão comum nos identificarmos com ela na leitura e) Enredo
de um texto. Há as personagens que sofrem ao longo da
história, aquelas que nos fazem repensar sobre questões É o próprio desenrolar dos acontecimentos. Divide-se em:
como ética e comportamento, aquelas que cometem os - Apresentação: início da narrativa em que são apresen-
crimes os quais condenamos. E, mais, somente na narrativa tadas as personagens e algumas circunstâncias da história.
podemos ter acesso a seus pensamentos, já que na vida
real nunca poderemos, de fato, saber verdadeiramente o - Complicação: quando os fatos apresentados são atra-
que o outro pensa. vessados por algum conflito, foco central da história.
Devido a sua complexidade, há os seguintes tipos de
personagens: - Clímax: momento da narrativa em que o conflito che-
ga a seu momento mais crítico.
- Protagonista: é a personagem mais desenvolvida em
uma narrativa e sua experiência é o foco a ser apresentado. - Desfecho: final da narrativa, quando o conflito é so-
lucionado.
- Coadjuvante: personagem secundário, ainda que au-
xilie no desenvolvimento do enredo. Geralmente possui 2. O texto descritivo
complexidade limitada pelo espaço ocupado na narrativa.
Descrição é um texto que tem como foco a apresen-
- Antagonista: personagem que traz conflito à história, tação das características de uma pessoa, objeto, lugar, em
opondo-se às ações desenvolvidas pelo protagonista, pois situação estática, sem interferência do tempo. Da mesma
possuem objetivos contrário. É o famoso “vilão” da história. forma que um pintor desenha com tinta as características
de uma paisagem, o escritor desenha com palavras as mes-
c) Tempo mas características. O objetivo de uma descrição é fazer
com que o leitor visualize mentalmente o que está sendo
O tempo é uma categoria essencial na narrativa, pois descrito, como se estivesse frente ao objeto. Veja o exem-
situa as personagens dentro de um espaço temporal deter- plo extraído de O Guarani, de José de Alencar:
minado. Numa narrativa o tempo pode surgir:
- Histórico ou cronológico: baseado no ritmo do ca- No ano da graça de 1604, o lugar que acabamos de
lendário, esse é o tempo físico e objetivo, cuja função é descrever estava deserto e inculto; a cidade do Rio de Janeiro
organizar temporalmente as ações das personagens. tinha-se fundado havia menos de meio século, e a civilização
não tivera tempo de penetrar o interior.
Ex.: Entretanto, via-se à margem direita do rio uma casa
larga e espaçosa, construída sobre uma eminência, e prote-
Mais um inverno passara e agora chegava a primavera. gida de todos os lados por uma muralha de rocha cortada
Lúcio acordou tarde demais, percebeu que já devia passar da a pique. A esplanada, sobre que estava assentado o edifício,
uma da tarde. formava um semicírculo irregular que teria quando muito
cinquenta braças quadradas; do lado do norte havia uma
- Psicológico ou metafísico: não mantém nenhuma re- espécie de escada de lajedo feita metade pela natureza e
lação com o tempo objetivo, centra-se na descrição interna metade pela arte.
das ações, por isso também é considerado tempo interior, Descendo dois ou três dos largos degraus de pedra da
o dos sentimentos e dos pensamentos. escada, encontrava-se uma ponte de madeira solidamente
construída sobre uma fenda larga e profunda que se abria
Ex.: na rocha. Continuando a descer, chegava-se à beira do rio,
que se curvava em seio gracioso, sombreado pelas grandes
Impossível não sentir saudade. As lembranças surgem gameleiras e angelins que cresciam ao longo das margens.
desavisadas, sem pedir permissão. Mais uma vez sua ima-
gem vem com seu sorriso frouxo, aquele sorriso que não va- (ALENCAR, José de. O Guarani. In. http://www.educa-
leria um copo d´água. Por mais que eu saiba de tudo o que cional.com.br/classicos/obras/O_guarani.pdf)
viera depois: as lágrimas, a humilhação, o abandono, ainda
sonho encontrá-lo no meio da rua e lhe dizer “olá, como vai”. Como podemos perceber no exemplo acima, a descri-
ção capta as impressões de modo a representar o descrito
d) Espaço como numa fotografia. O tempo cronológico não é impor-
tante aqui, pois a descrição sempre trata de um ser em um
É o lugar físico onde as personagens são situadas. Em momento congelado do tempo.
algumas narrativas o espaço é uma categoria privilegiada
por meio de extensas descrições, que podem ser naturais Características da descrição:
ou artificiais. No período romântico, os romances eram ini-
ciados com belíssimas descrições da natureza, já no perío- - Paisagem verbal;
do moderno as cidades com seu caos estrutural passaram - Presença de substantivos e adjetivos;
a ser alvo das lentes dos autores. - Utilização de enumeração e comparação;

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LÍNGUA PORTUGUESA

- Verbos flexionados no presente ou no pretérito; escrever em primeira pessoa do singular, nem apresentar
- Advérbios ou locuções adverbiais localizadores; considerações subjetivas a respeito do assunto. Além do
- Pronomes demonstrativos. mais, terá de analisar o tema, apresentá-lo ao leitor de
forma clara, desenvolver aspectos pertinentes e lógicos
Tipos de descrição: do assunto, inserir problematicidade aos fatos e, por fim,
concluir sua análise de modo a esclarecer a ideia central
- Descrição subjetiva: descrição realizada a partir do defendida a cada linha.
ponto de vista das personagens, através de suas impres- Muitas pessoas têm receio sobre esse tipo textual, con-
sões subjetivas. siderado difícil. Entretanto, é importante esclarecer que é
um dos gêneros de mais fácil aprendizado, uma vez que
Ex.: não exige criatividade, somente obediência à estrutura. E
por que tal estrutura é tão específica? Justamente para uni-
Isabel abriu o armário e, por fim, encarou o vestido ficar o modo de realizar análises científicas e formais em
branco. As pérolas irregulares surgiam agora como olhos uma esfera acadêmica.
terríveis a mirar o seu fracasso, o véu, outrora símbolo de
pureza e castidade, silenciava o grito mudo de uma noiva Estrutura do Texto Dissertativo:
abandonada. Toda essa renda, pensava Isabel, toda a humi-
lhação contida em cada bordado. - Introdução: apresentação do tema, que pode ser ex-
posto por meio de uma contextualização histórica. É uma
- Descrição objetiva: descrição realizada de forma mais das partes mais importantes de uma dissertação, pois é o
concreta, apresenta maior compromisso com a realidade, momento de gerar interesse no leitor no tocante ao assun-
deixando de lado impressões subjetivas. to tratado. Já que uma dissertação pressupõe problemati-
Ex.: zação de um tema, pode-se na introdução adiantar alguns
aspectos que serão tratados ao longo do desenvolvimento.
Entrou um homem no recinto. Cabelos negros, tez clara,
nariz afilado, lábios cheios. Um pouco baixo, um pouco gor-
Ex.:
do, tinha a testa proeminente e as orelhas finas.
A cidade e as serras: entre a natureza e a civilização
Importante lembrar que a descrição pode ocorrer tan-
to em textos ficcionais (romances, contos, novelas) como
Desde a origem do conceito de homem e de civilização,
também em textos não-ficcionais (jornais, textos científi-
o ser humano tenta superar suas limitações físicas em dire-
cos, etc…).
ção à produção de utensílios que mantivessem sua sobre-
vivência. A partir da pedra lascada, da descoberta do fogo
3) Texto dissertativo
e da invenção da linguagem, o homem vai marcando sua
O texto dissertativo é o texto que pretende descrever passagem da natureza à cultura. Podemos dizer que é um
e analisar, de maneira impessoal e objetiva, um tema espe- processo que marca a própria história da vida. Entretanto,
cífico obedecendo à seguinte estrutura: introdução, desen- quando se supera totalmente os vínculos com a natureza, o
volvimento e introdução. Muito utilizado na esfera acadê- que resta? Parece ser essa questão que Eça de Queiros tenta
mica e científica, a dissertação visa um olhar analítico sobre responder em seu livro póstumo A cidade e as Serras (1901).
qualquer questão e não envolve enredo nem personagens Afinal, pode o homem abandonar totalmente seu estado de
como requer uma narrativa. Pelo contrário, a maior carac- natureza? Qual o limite do excesso de cultura?
terística desse tipo de texto é a impessoalidade, ou seja, o
olhar formal daquele que tece as considerações. No exemplo citado acima a relação entre natureza e
Por exemplo, uma aluna do curso de Biologia decide cultura na literatura é apresentada enquanto um problema
apresentar como trabalho de conclusão de curso uma dis- na introdução. Esse procedimento é importante para des-
sertação sobre a reprodução das plantas. Certamente não tacar a validade do tema tratado, além de sugerir questões
apresentará como resultado final uma narrativa ficcional pertinentes que serão desenvolvidas. Percebe-se também a
sobre o assunto. Antes, fará leituras e pesquisa, buscará contextualização histórica do problema, o que demonstra
evidências concretas, realizará experimentos científicos. E o saber formal sobre o assunto.
texto ideal para a apresentação dos dados é o dissertativo, - Desenvolvimento: as questões apresentadas superfi-
cuja estrutura – introdução, desenvolvimento e conclusão cialmente na introdução serão desdobradas no desenvol-
– dará conta de todos os passos do processo. Assim sendo, vimento. Esse é momento de demonstrar saber histórico
o produto final, desprovido de subjetividade, poderá ser e filosófico sobre o tema, sem demonstrar subjetividade
creditado como um trabalho objetivo, sem interferências nas considerações. Um mecanismo importante no desen-
pessoais do seu autor. volvimento de uma dissertação é o que se denomina de
Da mesma forma, se é pedido a um aluno escrever uma elementos de coesão, conectivos (tais como, entretanto,
dissertação sobre a Revolução Francesa, terá ele de obede- portanto, contudo, além disso, além do mais…) que criam
cer à estrutura exigida pela tipologia textual. Não poderá uma relação lógica entre as frases do texto. Há várias for-

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LÍNGUA PORTUGUESA

mas de se estruturar o desenvolvimento, mas o mais efe- 4) O texto injuntivo/instrucional


tivo é organizá-lo por meio do raciocínio lógico – causa e
consequência, assim, o autor consegue criar uma reflexão Injunção significa ordem, instrução. O texto injuntivo tem
objetiva traçando o início do problema e sua eventual con- por finalidade, assim, orientar o leitor na concretização de
sequência. Por ser um texto de caráter acadêmico, é impor- uma ação, indicando procedimentos para realizar uma ação,
tante demonstrar saber formal através da intertextualida- tal como a montagem de um objeto ou a receita de um bolo.
de, menção ou citação de autoridades do assunto. A linguagem apresentada nesses textos deve ser sim-
ples e objetiva. E já que a injunção pressupõe instrução,
Ex.: os verbos costumam estar no modo imperativo (faça, abra,
leia…). Veja um exemplo:
Muitos sociólogos vão em direção ao mito do Prometeu,
aquele que roubou o fogo da inteligência dos deuses a fim de Receita de panqueca
ofertá-lo ao homem e manter sua sobrevivência. Aliás, como
superar as auguras do clima e da fome sem a civilização 1) Bata todos os ingredientes líquidos e o sal no liqui-
e suas descobertas? O homem existiria ainda sem sua tec- dificador.
nologia? Justamente a primeira parte da história ocidental, 2) Quando estiver homogêneo, acrescente a farinha aos
narrada por José Fernandes, parte desse ponto de vista. O poucos e bata mais.
narrador a cada página vai descrevendo a admiração pe- 3) Pegue uma concha da mistura e despeje em uma
las conquistas da humanidade. Seja no projeto de ler uma frigideira média em fogo médio. Espalhe virando a frigideira
infinita enciclopédia ou na dependência dos artefatos da ci- para que fique uma massa fina.
vilização, o príncipe da Grã-Ventura deposita nesses valores 4) Quando um lado estiver dourado, vire e doure o ou-
sua teoria máxima: Suma Felicidade: Suma Ciência X Suma tro. Sirva com qualquer molho e recheio.
Potência. Pode-se considerar essa personagem um perfeito (http://gshow.globo.com/receitas-gshow/receita/mas-
representante de uma linha humanística que busca a felici- sa-de-panqueca-facil-51008c054d3885489100004e.html)
dade através da produção de próteses tecnológicas: só possui
valor o que está fora do homem.
No exemplo acima percebemos os verbos flexionados
no modo imperativo, apresentando uma linguagem direta
- Conclusão: momento das considerações finais, aqui
o autor retoma o tema tratado ao longo do texto e deve e simples. Outro exemplo de texto injuntivo muito comum
apresentar uma síntese das ideias apresentadas. Importan- é a bula de remédios, cuja função é também orientar seu
te iniciar a conclusão com uma frase que aponta para esse leitor a realizar corretamente o procedimento.
momento (Portanto, Enfim, Em virtude dos fatos mencio- Muitos linguistas diferenciam o texto injuntivo do
nados, Dado o exposto) a fim de preparar o leitor para o prescritivo, devido o caráter coercitivo do segundo. En-
encerramento da análise. quanto os textos injuntivos apenas orientam, tal como ve-
mos em bulas e receitas, os textos prescritivos asseguram
Ex.: uma obrigação no respeito aos procedimentos apresenta-
dos, como em editais de concursos e contratos.
Diante das questões tratadas anteriormente, pode-se
afirmar que A cidade e as serras representa justamente um
acerto de contas do homem com sua história. Se Prometeu
realmente roubou o fogo dos deuses para salvar o humano, 2. DOMÍNIO DA ORTOGRAFIA OFICIAL
mal sabia ele que o homem usaria essa oferta para destruir (EMPREGO DAS LETRAS; EMPREGO DA
a si mesmo. A civilização é essencial à manutenção da vida,
entretanto, sem o diálogo com a natureza a vida se esvai em ACENTUAÇÃO GRÁFICA).
reações automáticas e robóticas frente ao tempo. Deve ser
por isso que o livro se finda com a modernização das serras.
Se não podemos nos desligar da cultura, que não abandone-
mos nossa essência elementar: a natureza. Ortografia (do latim ortho – correto e grafos – grafia)
significa a escrita correta das palavras de uma língua.
O texto dissertativo-argumentativo Tal denominação pressupõe regras específicas para a
linguagem escrita que, muitas vezes, confunde o falante
Modalidade comum em concursos públicos e vestibula- devido a uma série de regras e exemplos.
res, o texto dissertativo-argumentativo tem como caracterís- Quado falamos de linguagem verbal devemos
tica a estrutura e a impessoalidade da dissertação e a defesa entender que há a língua oral, aquela que aprendemos
do ponto de vista da argumentação. Ou seja, a exigência de desde o nascimento e vamos absorvendo de modo natural;
textos assim classificados é defender uma ideia, de maneira e a língua escrita, que é a passagem para outro mecanismo
impessoal, através de uma estrutura caracterizada por uma de comunicação. Através da alfabetização se aprende a
introdução, um desenvolvimento e uma conclusão. transformar os sons (fonemas) que emitimos em letras e
assim as primeiras palavras começam a ser escritas.
Desde a origem da grafia se testemunham modos
distintos de escrever um vocábulo e a ortografia surgiu
com a função de organizar e apresentar uma forma

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LÍNGUA PORTUGUESA

correta, já que a unificação gráfica é fundamental para a Cortesia Xadrez


manutenção de uma língua. Imagine se cada região de
um país escrevesse de modo diferente, as pessoas não se Besouro Giz
entenderiam com clareza. Querosene Surdez
Escrever é transformar o som que falamos em letras e tal
processo pode confundir numa língua como o português, Obséquio Cicatrizar
que possui várias letras diferentes para um mesmo som
(como é o caso do som [ze] que pode ser representado por 3) Uso do X/CH
“s”, “z” e “x”).
Usa-se o “x” nos seguintes casos:
Orientações Ortográficas
- Depois da sílaba -me: mexer, mexicano, mexerico.
1) Uso do H: - Depois da sílaba -en: enxada, enxame. Exceção: o
A letra “h” é usada: verbo “encher” e seus derivados se escreve com “ch” -
- No início de palavras: homem, humildade, enchente, encharcar .
humano, habilidade, hábil, hesitar, humor, história, hostil, - Depois de ditongo: ameixa, caixa, peixe
heterogêneo, hipócrita, hegemonia. - Em palavras de origem indígena ou africada: xingar, xará.
- Em dígrafos “ch”, “lh”, “nh”: flecha, ninho, alho,
fachada, chalé, alheio. Grafia com “x” Grafia com “ch”
- Palavras compostas: super-homem, mini-hotel,
sobre-humano, hiper-humano. Cheque – nota equivalente
Xeque – lance do xadrez
- Ao fim de algumas interjeições: Ah! Uh! Oh! ao dinheiro
Taxar – pôr taxa Tachar – rotular
2) Uso do S/Z
Chá - bebida Xá – soberano persa
Usamos o “s” nos seguintes casos: Inexorável Chuchu
- Depois de ditongos: coisa, maisena. Êxito Chofer
- Sufixos “ês”, “esa”, “isa” indicando profissão, origem
ou título: portuguesa, francês, poetisa. Exausto Chacina
- Sufixos “oso”, “osa” indicando qualidade, quantidade Êxodo Chalé
ou circunstância: gostosos, feioso, bondoso, oleoso.
- Na conjugação dos verbos querer e pôr: puseram, Xícara Cheio
quiseram. Xenófobo Chamego
- Entre vogais, emitindo o som de [ze]: casa, asa,
Xereta Chope
casamento.
Xerocópia Chute
Utiliza-se o “z” em:
- Sufixo “izar”, formador de verbos: contabilizar, 4) Uso do G/J
concretizar, batizar.
- Em substantivos abstratos criados a partir de adjetivos: Usamos o “J” nos seguintes casos:
sensato – sensatez, belo- beleza, magro – magreza, grande - Palavras oriundas do indígena ou da língua africana:
– grandeza. pajé, jerimum, canjica, jabá, jiló.
- Conjugação do verbo viajar no modo subjuntivo: que
eu viaje, eles viajem.
Grafia com “s” Grafa com “z”
Catequese Coalizão Utiliza-se o “g” em:
Gás Bazar - Substantivos terminados em “-gem”: ferrugem,
lavagem, serragem, coragem, vagem.
Análise Verniz - Palavras terminadas em “-ágio”, “-égio”, “-ígio”,
Crise Cicatriz “-ógio”, “-úgio”: refúgio, litígio, relógio, adágio, vestígio.
Curiosidade Azeite
Grafia com “g” Grafia com “j”
Decisão Buzina
Tigela Jiboia
Hesitar Azedo
Agiotagem Canjica
Desejo Zebra
Abranger Jiripoca
Colisão Proeza
Usuário Cuscuz
Apogeu Jiló
Gênese Jipe

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LÍNGUA PORTUGUESA

Gerigonça Sujidade EXERCÍCIOS

Gim Jeito 01.(ITA-SP) Dadas as palavras: 1) reaver, 2)


inabilitado, 3) habilidade, constatamos que está (estão)
Gengibre Jiripoca
devidamente grafada(s)
Gíria Laje a)apenas a palavra nº 1
b)apenas a palavra nº 2
Angélico Traje
c)apenas a palavra nº 3
d)todas as palavras
5) Emprego do S/SC/SS/SC/XC/XS com som de [sse] e)nenhuma das palavras
Emprega-se o “s”: 02.(CESCEA) Marque a única opção em que todas as
- Em substantivos derivados de verbos terminar em palavras estejam completas com x.
“-andir”, “-ender”, “-verter” e “-pelir”: a)en__oval, __ingar, cai__eiro, en__ugar, __ícara
Expandir – Expansão b)pu__ar, a__atar, en__ovia, in__ado, a__icalhar
Pretender – Pretensão c)pi__e, dei__ar, en__ugar, __adrez, bai__o
Suspender – Suspensão d)__u__u, amei__a, cartu__o, deslei__ada, trou__a
Perverter – Perversão e)pe__incha, co__a, broche, en__ada, en__arcado

Emprega o “ç”: 03.(F. São Marcos-SP) Assinale a alternativa cujas


- Em substantivos que derivam dos verbos terminados palavras estão todas corretamente grafadas:
em “ter” e “torcer”: a)pajé, xadrês, flecha, misto, aconchego
Ater- Atenção b)abolição, tribo, pretensão, obsecado, cansaço
Torcer – Torção c)gorjeta, sargeta, picina, florescer, consiliar
Manter – Manutenção d)xadrez, ficha, mexerico, enxame, enxurrada
Contorcer – Contorção e)pajé, xadrês, flexa, mecherico, enxame

Emprega-se o “SC”: 04.(NCE-RJ/UFRJ) O item abaixo que apresenta


palavra erradamente grafada é:
- Em palavras de origem erudita: a)alteza - duqueza - baroneza;
Imprescindível, plebiscito, miscível, miscigenação, b)riqueza - dureza - fineza;
transcender, ascensorista, ascensão, fascículo, fascínio. c)princesa - baixeza - burguesa;
Usa-se o “sç”: d)freguesa - beleza - dureza;
- Em algum verbos quando conjugados: e)certeza - camponesa - japonesa.
Nascer – nasço
Crescer – cresço 05.(UNIMEP-SP) Assinale a alternativa que contém
o período cujas palavras estão grafadas corretamente:
a)Ele quiz analisar a pesquisa que eu realizei.
Utiliza-se o “ss”: b)Ele quiz analizar a pesquisa que eu realizei.
- Em substantivos originados de verbos terminados em c)Ele quis analisar a pesquisa que eu realizei.
“-gredir”, “cutir”, “ceder”, “mitir”: d)Ele quis analizar a pesquiza que eu realisei.
Agredir – agressão e)Ele quis analisar a pesquiza que eu realizei.
Discutir – discussão
Progredir – progressão 06.(UM-SP) Aponte a alternativa correta:
Ceder – cessão a)exceção, excesso, espontâneo, espectador
Exceder – excesso b)excessão, excesso, espontâneo, espectador
c)exceção, exceço, expontâneo, expectador
Usa-se o “xc” e o “xs”: d)excessão, excesso, espontâneo, expectador
- Em dígrafos que apresentam o mesmo som que [sse]: e)exceção, exceço, expontâneo, expectador
Excedente, Excelente, Exceção.
07.(Univ. Alfenas-MG) Assinale a alternativa em
que todas as palavras estão grafadas corretamente.
a)disenteria, páteo, siquer, goela
b)capoeira, empecilho, jabuticaba, destilar
c)boliçoso, bueiro, possue, crânio
d)borburinho, candieiro, bulir, privilégio
e)habitue, abutoe, quase, constróe

(Exercícios retirados de http://www.


gramaticaparaconcursos.com/2013/06/respostas-de-
ortografia-exercicios.html)

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LÍNGUA PORTUGUESA

GABARITO Usa-se hífen em

1–d a) quando o segundo termo iniciar com a letra “h”:


2–a Super-homem
3–d Pré-história
4–a
5–c b) quando a primeira palavra terminar com a
6–a MESMA LETRA que inicia a segunda:
7–b Anti-inflacionário
contra-ataca
sub-bibliotecário
USO DO HÍFEN inter-regional

Hífen é um sinal gráfico cuja função principal é união de c) quando a primeira palavra terminar com a letra
mais de um radical, ou seja, criação de palavras compostas. “b” e a segunda iniciar com “r”:
Parece simples o seu uso, mas após a reforma ortográfica Sub-reino
surgiram muitas dúvidas a respeito do emprego deste sinal. ab-rogar
Vejamos os casos em que o uso de hífen é obrigatório:
d) depois de pré-, pós e pró:
a) Como elemento de ligação entre pronomes Pré-natal
oblíquos e verbos: Pós-parto
Vou visitá-la mais tarde. e) circum, pan, após as letras “h”, “m”, “n”:
Vendi-o porque não o usava mais. circum-navegação

b) A fim de realizar separação de sílabas: f) Com os prefixos “além”, “aquém”, “recém” e


“sem”:
Escola – es-co-la
recém-casados
Aluno – a-lu-no
além-mar
c) Em substantivos compostos: há uma espécie
g) Com o advérbio “mal” antes de vogal, h ou L:
de formação de palavras chamada de “formação por
Mal-humorado
justaposição”, em que a partir de duas palavras se cria uma
Mal-estar
terceira com significado distinto, sem que com essa junção Mal-limpo
provoque perda fonética:
guardar – significado 1
chuva – significado 2
guarda-chuva – significado 3
ACENTUAÇÃO GRÁFICA.

contar – significado 1
gota – significado 2 As palavras podem conter uma ou mais sílabas.
conta-gotas – significado 3 E ao pronunciá-las, temos a tendência em proferi-las
intensificando uma sílaba frente as outras. Por exemplo,
d) Em formação composta de palavras que indicam quando alguém fala a palavra “casa”, pronunciará com
espécies vegetais e zoológicas: mais força uma das sílabas, no caso [ka]. Por que fazemos
erva-mate, couve-flor, formiga-grande isso? Simplesmente porque a oralidade não é um sistema
de uma única entonação. Tal como a música, precisamos
e) Em palavras compostas cujo primeiro termo é destacar partes de sons para manter a atenção do ouvinte.
numeral: Imagine se falássemos todas as palavras utilizando uma
Primeiro-ministro, quarta-feira, segundo-tenente única modulação?
Esta sílaba que entoamos com maior ênfase a
chamamos de sílaba tônica, já que é nela que recai a
g) Nomes de lugares compostos por mais de
tonicidade, o som que mais se destaca ao pronunciar uma
um radical, se iniciados por “grã”, “grão”, verbos ou
palavra. A gramática também nomeia esse acento tônico
estejam ligados por artigo.
como prosódico, pois está ligado à emissão dos sons na
Passa-Vinte, Grã- Bretanha, Trás-os-Montes
fala. Todas as palavras com mais de uma sílaba possuem
uma – e somente uma – sílaba tônica, como podemos
O USO DO HÍFE E O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO
verificar nesses exemplos: úmido, ideia, cadeira, jacaré.
Importante destacar que o acento tônico é um
Com a Reforma Ortográfica da Língua Portuguesa fenômeno fonético, pois referente à fala. Entretanto,
houve algumas modificações no tocante ao uso do hífen. quando passamos a linguagem para outro registro, o
Atentemos às regras que permaneceram: da escrita, muitas vezes há a necessidade de enfatizar

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LÍNGUA PORTUGUESA

tal acento na própria grafia, já que pode surgir erro de - ditongos abertos -ói, -éu, -éi, seguindo ou não de
tonicidade. Na origem da grafia, muitas palavras que não “s”: herói, troféu, fiéis.
eram do uso comum dos falantes passaram a receber o PAROXÍTONAS:
acento gráfico a fim de reforçar textualmente o modo de
pronunciá-las. Assim sendo, há palavras que não recebem Acentuam-se as paroxítonas terminadas em:
acento gráfico, como porta, cortina, urubu, e outras que - r: ímpar, cadáver
sim, como tônico, amável, paralelepípedo.
- l : réptil, têxtil
Se em uma palavra há uma sílaba mais forte, como
chamamos as pronunciadas com menos intensidade? A - n: éden, hífen
gramática denomina sílabas átonas as mais fracas, que - x – xérox, tórax
podem ser pretônicas ou postônicas dependendo de sua - ps – bíceps, fórceps
posição frente a sílaba tônica. - ã, ãs, ão, ãos – órgão, órfã, órgãos
Em uma palavra com mais de uma sílaba, portanto, - um, uns, om, ons – álbum, fóruns, prótons
haverá sempre uma com maior destaque fonético, a sílaba - us – vírus, bônus
tônica. Entretanto, a ênfase em uma sílaba possui também - i, is, júri, tênis
regras impostas pela própria fala. Por maior que seja um - ei, eis – jóquei, jóquei
vocábulo, há apenas três modos de emitir tonicidade:
ênfase na última sílaba (oxítona), penúltima (paroxítona) As paroxítonas e os erros de prosódia
ou antepenúltima (proparoxítona):
Algumas palavras são acentuadas ou pronunciadas de
- OXÍTONAS: palavras que apresentam a última sílaba
maneira equivocada, não respeitando sua tonicidade. É o
tônica, tais como jacaré, também, amor, rapaz.
que chamamos de erros de entonação ou de prosódia, e que
- PAROXÍTONAS: Paroxítona significa literalmente, geralmente transformam paroxítonas em proparoxítonas:
“ao lado da oxítona”, e são as palavras que possuem a
penúltima sílaba tônica, como táxi, caráter, heroico, porta. Correto Errado
Vale destacar que a língua portuguesa é basicamente
paroxítona, devido à maior quantidade de palavras com rubrica rúbrica
essa característica. recorde récorde

-PROPAROXÍTONAS: fenômeno menos comum, são libido líbido


as palavras que apresentam a antepenúltima sílaba tônica. pudico púdico
Alguns exemplos de proparoxítonas: exército, pêndulo,
quilômetro. filantropo filântropo
A Língua Portuguesa também apresenta palavras com
uma única sílaba, as quais chamamos de monossílabos. PROPAROXÍTONAS
Estes são pronunciados com menor ou maior ênfase e, por
Por se tratar de um fenômeno mais raro de
isso, podem ser átonos ou tônicos:
entonação das palavras, temos a tendência de pronunciar
erroneamente as palavras com a antepenúltima sílaba
- Monossílabos átonos: sãos os enunciados com tônica. Por isso mesmo todas as proparoxítonas devem ser
menor intensidade e, por serem constituídos por uma acentuadas para evitar esse equívoco.
única sílaba, são dependentes foneticamente da palavra a
qual se apoiam, tornando-se praticamente uma sílaba da Exemplos:
mesma. As preposições, conjunções, artigos e pronomes xícara, úmido, colocávamos, término, lógico.
oblíquos átonos integram esse grupo. Vejamos as palavras Obs. Caso a vogal tônica for fechada ou nasal usa-se o
“amá-lo”. O pronome oblíquo “lo” é átono e é acoplado acento circunflexo:
foneticamente á palavra amar. côncavo, estômago, sonâmbulo.

- Monossílabos tônicos: proferidos com maior ênfase, ACENTUAÇÃO DOS MONOSSÍLABOS:


possuem independência fonética: má, mim, eu, tu, mar, céu.
Acentuam-se os monossílabos terminados em:
Vejamos agora as regras de acentuação gráfica: a) a, as: má, já, lá, cá, pás
b) e, es: crê, vês, pé
1) OXÍTONAS: c) o, os: nós, nós, dó, pô-lo

Acentuam-se todas as oxítonas terminadas em ACENTUAÇÃO DOS DITONGOS E A NOVA


- a, e, o – seguidos ou não de “s”: sofás, crachás, ORTOGRAFIA
jacarés, filé, purê, dominó, cipós, metrô….
- ditongo nasal -ém, -éns: mantém, ninguém, Segundo o Novo Acordo Ortográfico do Português,
parabéns, amém… não são mais acentuados ditongos abertos em palavras
paroxítonas:

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LÍNGUA PORTUGUESA

Como era Como é agora O Novo Acordo Ortográfico do Português aboliu alguns
acentos diferenciais, tais como em pelo (preposição) e pêlo
heróico heroico (substantivo), pára (verbos) e para (preposição):
idéia ideia O pelo do gato está crescendo muito.
Vá pelo caminho mais curto.
jibóia jiboia Ele para para pensar.
apóia apoia
paranóico paranoico TREMA

ACENTUAÇÃO DOS HIATOS O trema, sinal de dois pontos usado sobre a letra “u”,
era utilizado para marcar a pronúncia da vogal em palavras
Chamamos de hiato o encontro de duas vogais em marcadas pelo encontro vocálico, tais como “lingüiça” e
uma palavra que, no entanto, não fazem parte da mesma “freqüentar”. Entretanto, segundo a Nova Ortografia, não
sílaba. A maior parte dos hiatos não são acentuados, mas se deve mais usar essa marcação. A partir de agora as
alguns levam acento para evitar erros de pronúncia. palavras são assim grafadas:
Acentuam-se as vogais “i” e “u” que formam hiato com Frequentar, linguiça, linguística, bilíngue, cinquenta,
a sílaba anterior: aguentar.
cafeína
balaústre
saúde EXERCÍCIOS
saída
saúva 1. (EPCAR) Assinale a série em que todos os
vocábulos devem receber acento gráfico:
No entanto, há uma exceção. Não são acentuados os a) Troia, item, Venus
hiatos seguidos por dígrafo “nh”, tal como rainha, moinho, b) hifen, estrategia, albuns
ruim, amendoim, ainda. c) apoio (subst.), reune, faisca
Também evitamos acentuação em hiatos que não d) nivel, orgão, tupi
formam sílaba com letra diferente de “s”, como em juiz, e) pode (pret. perf.), obte-las, tabu
cair, sair, contribuiu.
Segundo o Novo Acordo Ortográfico do Português, 2. (BB) Opção correta:
não são mais acentuados os hiatos que vêm após ditongos: a) eclípse
baiuca, feiura, bocaiuva. Também os “ôos” e “êes” não b) juíz
levam mais acento: enjoo, voo, creem, veem.
c) agôsto
d) saída
EMPREGO do TIL
e) intúito
O til [~] é um sinal e não um acento. No Português o til
3. (BB) “Alem do trem, voces tem onibus, taxis e
aparece sobre as vogais “a” e “o” para indicar nasalização,
aviões”.
som que sai pela boca e nariz. Tal sinal não se sobrepõe em
a) 5 acentos
sílabas tônicas somente, podendo também estar em sílabas
b) 4 acentos
pretônicas ou átonas: Exemplos: órgão, órfã, balõezinhos…
c) 3 acentos
d) 2 acentos
O ACENTO DIFERENCIAL
e) 1 acento
Como o próprio nome diz, o acento diferencial tem
4. (BB) Monossílabo tônico:
como função marcar uma diferença. Há muitas palavras no
a) o
português que são homógrafas, ou seja, que possuem a
b) lhe
mesma grafia e, por isso, é necessário um sinal distintivo
c) e
para que não surjam equívocos. Vejamos:
d) luz
e) com
a) Pôde – Pretérito perfeito do indicativo
Pode – Presente do indicativo
5. (BB) Leva acento:
a) pêso
b) Pôr – Verbo
b) pôde
Por – preposição
c) êste
d) tôda
É facultativo o uso do acento diferencial para distinguir
e) cêdo
as palavras forma e fôrma. Imagine a frase: qual a forma da
fôrma de torta que você comprou?

21
LÍNGUA PORTUGUESA

6. (BB) Não leva acento: com dígrafos (ch, nh, lh, rr) e encontros consonantais (ps,
a) atrai-la pn). Assim sendo devemos entender as regras de separação
b) supo-la silábica conforme as características de cada unidade.
c) conduzi-la
d) vende-la a) Sílabas com encontros vocálicos: Não se separam
e) revista-la ditongos e tritongos. Ex. Moi-ta, a-ve-ri-guou.

7. (UF-PR) Assinale a alternativa em que todos os b) Sílabas com dígrafos ch, lh, nh, gu, qu: dígrafos
vocábulos são acentuados por serem oxítonos: constituem um único fonema, por isso não devem ser
a) paletó, avô, pajé, café, jiló separados. Ex.: cha-ve, a-lho, que-rer.
b) parabéns, vêm, hífen, saí, oásis
c) você, capilé, Paraná, lápis, régua c) Encontros consonantais: quando iniciarem palavras
d) amém, amável, filó, porém, além não podem ser separados. Ex.: psi-có-lo-go, pneu-má-ti-
e) caí, aí, ímã, ipê, abricó co.
d) Hiatos: Ao contrário dos ditongos e tritongos,
(Exercícios retirados de http://professorricardoandrade. separam-se os hiatos, já que indicam pausa entre as vogais.
blogspot.com.br/2010/08/80-questoes-de-acentuacao- Ex.: sa-ú-de, fi-el.
grafica.html)
e) Sílabas com os dígrafos rr, ss, sç, sc, xç: são
GABARITO separados. Ex.: car-ro, as-sa-do, ex-ce-ção.
1–b A TONICIDADE DAS SÍLABAS
2–d
3–a Quando pronunciamos uma palavra emitimos
4–d intensidade de entonação, principalmente quando o
5–b vocábulo possui mais de uma sílaba. Certamente há
6–c
variação de tonicidade, ou seja, usamos mais força vocal
7-a
numa sílaba e menos em outra. Por isso mesmo se diz que
cada palavra possui uma sílaba mais forte, a qual chamamos
ESTUDO DA SÍLABA tônica e outras mais fracas, as átonas.
Quando entramos na escola e iniciamos os primeiros
EMPREGO DAS INICIAIS MAIÚSCULAS E
passos no aprendizado da escrita, temos acesso
MINÚSCULAS
primeiramente às vogais (a, e. i, o, u) e às consoantes (b,
c, d, f….). O segundo passo é unir essas letras entre si a fim
A linguagem oral e a escrita requerem algumas
de formar pequenas unidades sonoras, pois é a partir delas
habilidades diferentes. Há empregos que só utilizamos
que as palavras serão construídas. Chamamos de sílabas
na linguagem oral, como entonação e dramaticidade. A
esses grupos fonológicos (sons) que formam as palavras.
escrita também possui suas particularidades, tal como o
Uma vez que as palavras são verdadeiros organismos emprego das iniciais maiúsculas e minúsculas, isso porque
complexos no tocante a sua formação, há diversas formas muitas vezes é através da letra que indicamos informações
de construção de uma sílaba. Vejamos sua classificação: simples, como início de frase, nome de pessoas, etc…
Vejamos então algumas regras:
a) Monossílabas: palavras que possuem uma única
sílaba. Ex.: mãe, meu, mar, céu. Emprego de iniciais maiúsculas

b) Dissílabas: palavras que possuem duas sílabas. Ex.: a) Nomes próprios, tais como nomes de pessoas, de
casa, feijão, amor, leitão. lugares (topônimos), entidades mitológicas, designações
políticas e religiosas, altos conceitos nacionalistas:
c) Trissílabas: palavras que possuem três sílabas. Ex.:
úmido, salvador, torneira. Exemplos:
Maria, Florianópolis, Apolo, Igreja Apostólica Romana,
d) Polissílabas: palavras que possuem quatro ou mais Partido dos Trabalhadores, Nação, Brasil.
sílabas. Ex.: paralelepípedo, antropomorfismo.
b) Início de frase, período, versos e citações diretas:
Algumas regras de separação silábica Exemplos:
“Minha terra tem palmeiras, 
Se sílaba é um grupo de letras que, juntas, constituirão Onde canta o Sabiá; 
uma unidade sonora, há modos dessas letras se unirem. As aves, que aqui gorjeiam, 
Haverá sílabas com mais de uma vogal (ditongos e tritongos), Não gorjeiam como lá.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Nosso céu tem mais estrelas,  Exemplos:


Nossas várzeas têm mais flores,  catarinense, libanês, franco-alemão, paulista
Nossos bosques têm mais vida,  e) substantivos comuns que acompanham nomes
Nossa vida mais amores.” (Gonçalves Dias, “Canção próprios: oceano Atlântico, planeta Terra
do Exílio” f) Alguns sinais de pontuação, com os dois pontos
Exemplos:
Já nos dizia Clarice Lispector: “Amar os outros é a única Só desejo uma coisa: que você seja feliz.
salvação individual que conheço: ninguém estará perdido
se der amor e às vezes receber amor em troca.”

Muitos se perguntam qual é o destino da vida. Mas tal


pergunta nem Freud respondeu.
3. DOMÍNIO DOS MECANISMOS DE COESÃO
TEXTUAL (EMPREGO DE ELEMENTOS
DE REFERENCIAÇÃO, SUBSTITUIÇÃO E
c) Festas Religiosas, período histórico, data ou REPETIÇÃO, DE CONECTORES E OUTROS
acontecimento importantes: ELEMENTOS DE SEQUENCIAÇÃO TEXTUAL;
Exemplos: EMPREGO/CORRELAÇÃO DE TEMPOS E
Período Barroco, Festa de São João, Proclamação da MODOS VERBAIS).
República, Dia dos Pais
d) Nos títulos de livros, jornais, produções artísticas,
literárias e científicas:
Exemplos: COESÃO E COERÊNCIA TEXTUAL
Dom Casmurro, Monalisa, Folha de São Paulo, Til.
e) Nome de vias e lugares públicos: Leia o texto abaixo:
Exemplos:
Rua Quinze de Novembro, Praça de República, Rua “A juventude nos dias de hoje anda em perigo. Todos os
João Nilo Morfim dias vemos a juventude entrar em caminhos perigosos, a ju-
f) Pronomes e expressões de tratamento ventude parece não ter preocupação com o futuro. O futuro da
Exemplos: juventude está em perigo. Há uma solução para a juventude.
Excelentíssimo Senhor, Vossa Senhoria
g) Siglas, símbolos e abreviaturas internacionais: Concluindo o texto, pode-se dizer que a juventude está
ONU, PSDB, Sra. mais consciente nos dias de hoje.”

h) Nomes de corpos celestes Podemos concluir que se trata de um texto devido à


Exemplos: união de frases. Entretanto, percebemos facilmente que
Marte, Plutão, Saturno não passa de uma construção rudimentar, já que os enun-
ciados parecem apenas “colados” entre si, sem relacionar
i) Nomes de artes, ciências e disciplinas:
nenhuma relação de sentido. Além do mais, a leitura se
Língua Portuguesa, Cubismo, Matemática, Dadaísmo
torna cansativa, pois há excesso de repetição de palavras.
j) Nomes de agremiações, repartições, edifícios,
E para finalizar, o segundo parágrafo entra em contradição
estabelecimentos públicos e particulares:
com o primeiro, dando a entender que o autor não tem
Teatro Pedro Ivo, Ministério Público, Tribunal de Justiça
certeza do que está falando.
Emprego de iniciais minúsculas
Um texto é mais que uma “colagem” de frases entre si. Deve
interligar os elementos de forma lógica, evitando repetição de
a) nomes de dias e meses da semana termos, usando conectivos que una de maneira inteligente os
Exemplos: enunciados. Ou seja, para ser um texto, é necessário coesão.
terça-feira, domingo, março, dezembro Além disso, é fundamental que as ideias estejam caminhando
b) palavras compostas, mesmo as formadas com nome numa única direção, sem defender pontos de vistas contrários.
próprio Uma boa redação apresenta coerência em suas posições. Ve-
Exemplos: jamos a construção acima agora respeitando essas condições:
joão-de-barro, pé de moleque
c) No meio de nome de obras: “A juventude, nos dias de hoje, anda em perigo. Isso
Exemplos: porque todos os dias vemos adolescentes enveredando
O retrato de um artista quando jovem; Memórias por caminhos perigosos, sem a devida preocupação com o
Póstumas de Brás Cubas futuro. Ou seja, nossas crianças, recém-saídas da infância,
d) Palavras que designam nacionalidade ou origem: parecem periclitantes. Entretanto, por mais que isso nos
assuste, ainda há esperança: para todo mal há uma solução.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Após as ideias citadas acima, pode-se concluir que ainda que pareça incerto o destino de nossos jovens, através de
projetos educacionais pode-se, com certeza, torná-los seres mais conscientes.”
Qual a diferença entre os dois textos? Enquanto que no primeiro as frases parecem jogadas sem a devida preocupação
com a conexão de elementos e de ideias, no segundo evitou-se a repetição de palavras através da substituição por sinô-
nimos. Além do mais, usou-se conectivos tais como “isso porque”, “ou seja”, “entretanto”, que criou entre os enunciados
uma relação de sentido, seja de explicação ou discordância. Houve, assim, preocupação com a coesão textual, mecanismo
responsável pela harmonia no texto, o que se dá por meio do do uso de palavras e conectivos que transformam um con-
junto de frases em uma composição.

Outrossim, percebemos que o segundo parágrafo não peca por contradição de ideias, e isso é essencial. A coerência é
a relação lógica das posições argumentativas apresentadas, sem cometer o erro de defender direções distintas.

Vamos aprender algumas técnicas para construir um bom texto.

- COESÃO TEXTUAL

Vejamos alguns mecanismo responsáveis por tornar um texto coeso:

a) coesão referencial: tem como função usar elementos referenciais, tais como pronomes pessoais e possessivos a fim
de se referir ao mesmo ser.
A juventude está em perigo. Seu futuro está incerto. Ela precisa de cuidados.
Dentre a coesão referencial temos a anafórica, em que um termo remete a uma palavra já citada e a catafórica, quan-
do a expressão antecede o vocábulo que será apresentado.
Conheço os jovens da atualidade. Eles estão em perigo. (anafórico)
O problema essencial é este: a falta de consciência prejudica o futuro. (catafórico)

b) Coesão lexical: se dá através do uso de sinônimos e palavras dentro do mesmo campo semântico do termo-chave,
com o objetivo de evitar repetições.
A juventude precisa de cuidados. Nossos adolescentes estão enveredando por caminhos perigosos.
A coesão por substituição é fundamental em qualquer texto, que gira em torno de um tema, uma palavra-chave. É mui-
to comum o escritor, no ato de escrever, não ter a noção precisa da repetição, por isso a revisão deve ser um ato contínuo.

c) Coesão por elipse: muitas vezes podemos ocultar um elemento já subtendido através do enunciado anterior. Esse
recurso é chamado de elipse e é uma ótima ferramenta para se evitar repetição.
Muitos adolescentes estão optando por um estilo de vida nada saudável. Não se preocupam com o devir de seus destinos.
Percebemos que a palavra “adolescente” está elipsada na segunda frase, mas através do contexto é perfeitamente
compreendida.

d) Coesão por conjunção: a conjunção tem como função unir orações entre si, criando entre elas uma relação de sentido.
Em vez de utilizarmos frases curtas, o correto é criar períodos compostos por mais de uma oração, ligados pela conjunção.

Estamos preocupados com os jovens, mas para todo o problema há uma solução.

Além dessas ferramentas de coesão, há uma série de conectivos responsáveis por tornar o texto uma cadeia significa-
tiva. Vejamos:

Causa/
Afirmação Oposição Adição Explicação Conclusão Comparação
consequência
Em outras Da mesma
É certo que Entretanto Além disso Por isso Portanto
palavras forma
Do mesmo
Certamente contudo Outrossim Por causa de Para ilustrar Dessa forma
modo
Não há Na outra
todavia Não só Visto que Pois Logo
dúvidas ponta
É inegável No entanto Ainda mais De fato A exemplo de Assim sendo Bem como
Melhor
Sabe-se que Apesar de Mais também De forma que Em suma Assim como
dizendo

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LÍNGUA PORTUGUESA

- COERÊNCIA TEXTUAL
4. DOMÍNIO DA ESTRUTURA
Se a coesão textual é responsável pela harmonia das MORFOSSINTÁTICA DO PERÍODO
palavras dentro de um texto, a coerência garante a concor- (RELAÇÕES DE COORDENAÇÃO ENTRE
dância entre as ideias apresentadas. O maior pecado de um
texto é a defesa de ideias díspares, já que demonstra falta ORAÇÕES E ENTRE TERMOS DA ORAÇÃO;
de conhecimento e segurança do autor no tocante a seu RELAÇÕES DE SUBORDINAÇÃO ENTRE
ponto de vista. Todo o texto deve apresentar uma única ORAÇÕES E ENTRE TERMOS DA ORAÇÃO;
direção argumentativa. EMPREGO DOS SINAIS DE PONTUAÇÃO;
CONCORDÂNCIA VERBAL E NOMINAL;
A revisão de um texto é essencial para que se evite REGÊNCIA VERBAL E NOMINAL; EMPREGO
a temida contradição
Vejamos alguns tipos de coerência:
DO SINAL INDICATIVO DE CRASE;
COLOCAÇÃO PRONOMINAL).
a) coerência gramatical: se dá através do devido uso
dos elementos de coesão, interligando de forma lógica os
termos em questão.
ESTRUTURA E FORMAÇÃO DAS PALAVRAS
(1) Ainda que haja preocupação, (2) é dever do Estado
garantir a segurança de todos os jovens. Um tema fundamental na gramática diz respeito à estrutura
das palavras. Podemos imaginar que uma palavra é um termo
Há uma relação coerente entre as orações (1) e (2), pois indivisível, mas estamos enganados. Tal como uma célula, um
a conjunção em destaque harmoniza perfeitamente ideias vocábulo é o resultado de uma construção e organização de
opostas. componentes, ordenados de maneira lógica. Chamamos de
estrutura o modo de organização de uma palavra. Tal como
b) coerência semântica: é base da cadeia argumen- uma casa, o vocábulo possui uma sustentação, a qual carrega
tativa do texto. Quando se inicia a escritura a partir de um sua força significativa e outros componentes secundários, com
ponto de vista, é extremamente proibido defender uma informações acessórias. Vejamos:
direção que negue ou desdiga a posição antes afirmada.
Cas-a
(1) O mundo está em perigo. (2) Por isso mesmo deve- Cas-eiro
mos ter cuidado. Cas-amento
Livr-o
As frases (1) e (2) estão caminhando na mesma direção, Livr-aria
apresentando harmonia das ideias. Livr-eiro

c) coerência referencial: certifique que os exemplos Gat-a


citados estejam confirmando sua argumentação. Mui- Alun-a
tas vezes, no desejo de demonstrar conhecimento sobre
determinado assunto, apresentamos exemplos que nada Gat-o-s
acrescentam ao texto. Alun-o-s

(1) A condição humana foi um assunto tratado com Nos exemplos acima percebemos que as palavras
afinco pela filósofa Hannah Arendt. (2) Um grande exemplo possuem elementos que se repetem entre si, seja no núcleo
dessa questão na contemporaneidade é nosso condiciona- significativo (cas/ livr) ou em informações de gênero (a/o)
mento ao uso de celulares e aplicativos. (3) Somos animais e número (s). Isso nos indica que uma palavra é formada a
domésticos inseridos num novo mundo virtual. partir de elementos com funções específicas e que surgem
em outros vocábulos com a mesma função. Chamamos
O exemplo apresentado na frase (2) confirma o que foi de morfemas essas unidades mínimas significativas
dito em (1). Por fim, em (3) temos uma conclusão coerente responsáveis pela formação de uma palavra.
com a discussão tecida nos enunciados anteriores.
Vejamos a lista de morfemas:
A maneira mais efetiva de manter a coerência de
um texto é escrevê-lo a partir da argumentação de a) Raiz: é o morfema originário e contém o sentido
CAUSA e CONSEQUÊNCIA. básico de uma palavra. Podemos dizer que está na raiz o
princípio histórico de uma palavra, que ao longo do tempo
foi modificada pelos usos do homem.

Um exemplo disso é a palavra MAGRO. Sua raiz


significativa não está explícita no vocábulo, já que este vem
do Latim MACER (Com pouca gordura).

25
LÍNGUA PORTUGUESA

Importante destacar que começa na raiz a viagem *Desinências nominais: de gênero e número
histórica de uma palavra, cujo fim justamente desemboca
em sua estrutura atual. No caso do exemplo acima, se a
Masculino/Singular Feminino/Plural
raiz de Magro é MACER, ao longo dos anos sua forma foi
modificando até chegar no modo atual. Agora não está Desinência
o a
mais visível a raiz da palavra, já que esta se transformou no de Gênero
radical MAGR, núcleo significativo da palavra.
Desinência
b) Radical: Consiste no núcleo significativo de uma palavra, / S
responsável justamente por sua significação. Devido a essa de Número
função, o radical de um vocábulo dá origem a muitos outros,
criando o que chamamos de grupo semântico. Vejamos: Ex.:
Flor Menina
Florista Aluno
Floricultura Verdades
Floreio
* Desinências verbais: responsáveis pelas flexões de
Percebemos rapidamente a repetição de um termo em tempo e modo; número e pessoa.
todas as palavras e é justamente assim que identificamos - Desinência modo-temporal: indica o modo e o
um radical, através do reconhecimento da unidade mínima tempo do verbo.
formadora de várias palavras:
Pedra Ex.:
Pedreiro a) cantaria: desinência de futuro do pretérito do
Pedregulho indicativo
Pedrinha b) cantasse: desinência de pretérito imperfeito do
subjuntivo
Imagine se para cada ser referido nas expressões acima c) cantará: desinência de futuro do presente do
precisássemos criar uma palavra completamente distinta indicativo
uma da outra? Jamais lembraríamos de tantos termos.
Por isso é válido lembrar: a linguagem é um sistema - Desinência número-pessoal: indica o número e a
econômico de comunicação e, assim, reaproveita todos pessoa do verbo.
os seus elementos para “economizar” termos e facilitar
Ex.:
a memorização através de um vocabulário prático.
a) cantas: desinência de 2º pessoa do singular
c) Vogal temática: Ainda que um radical isolado possa
constituir uma palavra (no caso de flor, por exemplo), na maior b) cantamos: desinência de 1º pessoa do plural
parte das vezes ele necessita de um elemento que o complete. Essa c) cantais: desinência de 2º pessoa do plural.
é a função da vogal temática, morfema que se junta ao radical a
fim de completá-lo e receber outros morfemos, se necessário. e) Vogal / Consoante de ligação: morfemas cuja
Livro função é facilitar a pronúncia de uma palavra (chamamos
Casa de motivos eufônicos, “boa pronúncia”).
Estante Vogal de ligação: Na união do tema com algum sufixo
Porta muitas vezes verificamos a presença de uma vogal de
Revista ligação. Ex.; gasômetro, inseticida.
Consoante de ligação: cafeteira.
No tocante aos verbos, a vogal temática completa o radical
e informa a conjugação verbal: f) Afixos: são morfemas secundários que se acoplam
Cant-a-r (verbo de 1º conjugação) ao radical a fim de formar palavras derivadas. Dividem-se
Vend-e-r (verbo de 2º conjugação) em:
Part-i-r (verbo de 3º conjugação) a) Prefixos: inseridos antes do radical. Ex.: Infeliz,
Chamamos de tema a união do radical com a vogal Desfazer, recolocar
temática. b) Sufixos: inseridos depois do radical. Ex.: Felizmente,
Importante! Beleza, Insensatez.
A vogal temática não tem como função apresentar
informação de gênero, isso será tarefa das desinências FORMAÇÃO DAS PALAVRAS
nominais, como veremos a seguir.
Palavras existem para nomear os seres que povoam
d) Desinências: são os morfemas responsáveis pelas o mundo. Nesse sentido, sempre testemunhamos a
flexões em uma palavra. Dividem-se em: formação de novas palavras, já que de tempos em tempos
surgem novos objetos e situações a serem definidas. Há
dois processos de formação das palavras: a derivação e a
composição. O que difere essas duas formas é a presença
de um único radical (derivação) ou mais (composição).

26
LÍNGUA PORTUGUESA

Tipos de derivação: quando falamos em derivação estamos tratando de formação de palavras através do auxílio de
um afixo. Assim sendo, temos a derivação prefixal, sufixal, prefixal e sufixal e a parassintética.

1) Derivação prefixal: formação de palavra derivada a partir da inserção de um prefixo.

Ex.:

Feliz – Palavra Primitiva


Infeliz – Palavra Derivada

Leal- Palavra Primitiva


Desleal - Palavra Derivada

Moral – Palavra Primitiva


Amoral – Palavra Derivada

Fazer – Palavra Primitiva


Refazer – Palavra Derivada

Quadro de Prefixos

PREFIXOSGREGOS PREFIXOS LATINOS SIGNIFICADO EXEMPLOS


a, an des, in privação, negação anarquia, desleal, inativo
anti contra oposição, ação contrária antibiótico, contraditório
duplicidade, de um e outro
anfi ambi anfiteatro, ambivalente
lado, em torno
apo ab afastamento, separação apogeu, abstrair
di bi(s) duplicidade dissílabo, bicentenário
dia, meta trans movimento através diálogo, transfusão
e(n)(m) i(n)(m)(r) movimento para dentro encéfalo, induzir, irromper
movimento para dentro,
endo intra endovenoso, intracelular
posição interior
movimento para fora,
e(c)(x) e(s)(x) explícito, excesso, estendido
mudança de estado
epicentro, supervisor,
epi, super, hiper supra posição superior, excesso
supracitado
excelência, perfeição,
eu bene eufonia, benéfico
bondade
hemi semi divisão em duas partes hemisfério, semiárido
hipo sub posição inferior hipotermia, subsolo
para ad proximidade, adjunção paralelo, adjunto
peri circum em torno de periférico, circunferência

2) Derivação Sufixal: formação de palavra derivada através da adição de um sufixo, ao fim do radical.

Ex.:

Feliz – Palavra Primitiva


Felizmente – Palavra Derivada

Real – Palavra Primitiva


Realeza – Palavra Derivada

27
LÍNGUA PORTUGUESA

Leal – Palavra Primitiva Formação por composição


Lealdade – Palavra Derivada
Composição é o modo de formação de palavras a
Vejamos algumas listas de sufixos partir da união de dois ou mais radicais. Aqui a língua
trabalha com o sistema de reaproveitamento de material
Sufixos – Aumentativo linguístico já existente para o processo de criação de novas
expressões.
Há as seguintes formas de formação por composição:
Sufixo Exemplo justaposição, aglutinação, redução, hibridismo,
aça, -aço, uça ricaço, dentuça onomatopeia e estrangeirismo.
Composição por Justaposição: unem-se dois ou mais
-alha, -alhão Fornalha, grandalhão, radicais sem perda fonética ou gráfica das palavas primitivas.
-anzil corpanzil Ex.: girassol, guarda-chuva, passatempo, autoescola,
segunda-feira, couve-flor.
-ão, -eirão, Carrão, vozeirão
-aréu fogaréu Composição por aglutinação: unem-se dois ou mais
radicais, mas aqui há perda fonética ou gráfica das palavras
Sufixos – Diminutivos primitivas.
Ex.: aguardente (água ardente), fidalgo (filho de algo),
planalto (plano alto), embora (em bora hora).
Sufixo Exemplo
- ebre casebre Composição por redução: referência a alguns termos a
partir da forma reduzida de sua denominação.
- ejo vilarejo Ex.: auto (automóvel), micro (microcomputador), bici
- acho riacho (bicicleta).
- inho carrinho
Composição por hibridismo: composição de palavras
- eta saleta através da junção de morfemas oriundos de línguas
diferentes.
Sufixos – Profissão Ex.: automóvel = auto (grego) móvel (latim)

Composição por onomatopeia: criação de expressões


Sufixo Exemplo que tentam reproduzir sons emitidos por objetos e animais.
- ista pianista Ex.: tic-tac, miau, toc-toc.
- tor instrutor
Composição por estrangeirismo: inserção de palavras
- eiro porteiro estrangeiras no vocabulário.
- ário bibliotecário Ex.: Shopping, abajour, soutien, delivery.

- dor vendedor
EXERCÍCIOS
3) Derivação Prefixal e sufixal: formação de palavra
derivada a partir do acréscimo de um prefixo e um sufixo. 1. (IBGE) Assinale a opção em que todas as palavras
Entretanto, se retirarmos um desses sufixos o vocábulo se formam pelo mesmo processo:
ainda terá sentido. a) ajoelhar / antebraço / assinatura
Ex.: b) atraso / embarque / pesca
Infelizmente – feliz / felizmente c) o jota / o sim / o tropeço
Deslealdade – Desleal / lealdade d) entrega / estupidez / sobreviver
e) antepor / exportação / sanguessuga
4) Derivação Parassintética ou parassíntese: formação
de palavra derivada através da adição de um prefixo e um 2. (BB) A palavra “aguardente” formou-se por:
sufixo simultaneamente. Neste caso, se retirarmos um dos a) hibridismo
afixos a palavra perderá sentido completo. b) aglutinação
Ex.: c) justaposição
Entristecer d) parassíntese
Desalmado d) parassíntese

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LÍNGUA PORTUGUESA

3. (AMAN) Que item contém somente palavras 9. (FFCL SANTO ANDRÉ) As palavras couve-flor,
formadas por justaposição? planalto e aguardente são formadas por:
a) desagradável - complemente a) derivação
b) vaga-lume - pé-de-cabra b) onomatopeia
c) encruzilhada - estremeceu c) hibridismo
d) supersticiosa - valiosas d) composição
e) desatarraxou - estremeceu e) prefixação

4. (UE-PR) “Sarampo” é: 10. (FUVEST) Assinale a alternativa em que uma das


a) forma primitiva palavras não é formada por prefixação:
b) formado por derivação parassintética a) readquirir, predestinado, propor
c) formado por derivação regressiva b) irregular, amoral, demover
d) formado por derivação imprópria c) remeter, conter, antegozar
e) formado por onomatopeia d) irrestrito, antípoda, prever
e) dever, deter, antever
5. (EPCAR) Numere as palavras da primeira coluna
conforme os processos de formação numerados à direita. 11. (LONDRINA-PR) A palavra resgate é formada
Em seguida, marque a alternativa que corresponde à por derivação:
sequência numérica encontrada: a) prefixal
( ) aguardente 1) justaposição b) sufixal
( ) casamento 2) aglutinação c) regressiva
( ) portuário 3) parassíntese d) parassintética
( ) pontapé 4) derivação sufixal e) imprópria
( ) os contras 5) derivação imprópria
( ) submarino 6) derivação prefixal
12. (CESGRANRIO) Assinale a opção em que nem
( ) hipótese
todas as palavras são de um mesmo radical:
a) 1, 4, 3, 2, 5, 6, 1
a) noite, anoitecer, noitada
b) 4, 1, 4, 1, 5, 3, 6
b) luz, luzeiro, alumiar
c) 1, 4, 4, 1, 5, 6, 6
c) incrível, crente, crer
d) 2, 3, 4, 1, 5, 3, 6
d) festa, festeiro, festejar
e) 2, 4, 4, 1, 5, 3, 6
e) riqueza, ricaço, enriquecer
6. (CESGRANRIO) Indique a palavra que foge ao
processo de formação de chapechape: 13. (SANTA CASA) Em qual dos exemplos abaixo
a) zunzum está presente um caso de derivação parassintética?
b) reco-reco a) Lá vem ele, vitorioso do combate.
c) toque-toque b) Ora, vá plantar batatas!
d) tlim-tlim c) Começou o ataque.
e) vivido d) Assustado, continuou a se distanciar do animal.
e) Não vou mais me entristecer, vou é cantar.
7. (UF-MG) Em que alternativa a palavra sublinhada
resulta de derivação imprópria? 14. (UF-MG) Em todas as frases, o termo grifado
a) Às sete horas da manhã começou o trabalho principal: exemplifica corretamente o processo de formação de
a votação. palavras indicado, exceto em:
b) Pereirinha estava mesmo com a razão. Sigilo... Voto a) derivação parassintética - Onde se viu perversidade
secreto ... Bobagens, bobagens! semelhante?
c) Sem radical reforma da lei eleitoral, as eleições b) derivação prefixal - Não senhor, não procedi nem
continuariam sendo uma farsa! percorri.
d) Não chegaram a trocar um isto de prosa, e se c) derivação regressiva - Preciso falar-lhe amanhã, sem falta.
entenderam. d) derivação sufixal - As moças me achavam maçador,
e) Dr. Osmírio andaria desorientado, senão bufando de raiva. evidentemente.
e) derivação imprópria - Minava um apetite surdo pelo
8. (AMAN) Assinale a série de palavras em que todas jantar.
são formadas por parassíntese:
a) acorrentar, esburacar, despedaçar, amanhecer
b) solução, passional, corrupção, visionário
c) enrijecer, deslealdade, tortura, vidente
d) biografia, macróbio, bibliografia, asteroide
e) acromatismo, hidrogênio, litografar, idiotismo

29
LÍNGUA PORTUGUESA

15. (UF-MG) Em “O girassol da vida e o passatempo 20. (UNISINOS) O item em que a palavra não está
do tempo que passa não brincam nos lagos da lua”, há, corretamente classificada quanto ao seu processo de
respectivamente: formação é:
a) um elemento formado por aglutinação e outro por a) ataque - derivação regressiva
justaposição b) fornalha - derivação por sufixação
b) um elemento formado por justaposição e outro por c) acorrentar - derivação parassintética
aglutinação d) antebraço - derivação prefixal
c) dois elementos formados por justaposição e) casebre - derivação imprópria
d) dois elementos formados por aglutinação
e) n.d.a 21. (FUVEST) Nas palavras: atenuado, televisão,
percurso temos, respectivamente, os seguintes
16. (UF-SC) Aponte a alternativa cujas palavras processos de formação das palavras:
são respectivamente formadas por justaposição, a) parassíntese, hibridismo, prefixação
aglutinação e parassíntese: b) aglutinação, justaposição, sufixação
a) varapau - girassol - enfaixar c) sufixação, aglutinação, justaposição
b) pontapé - anoitecer - ajoelhar d) justaposição, prefixação, parassíntese
c) maldizer - petróleo - embora e) hibridismo, parassíntese, hibridismo
d) vaivém - pontiagudo - enfurece
e) penugem - plenilúdio - despedaça 22. (UF-UBERLÂNDIA) Em qual dos itens abaixo
está presente um caso de derivação parassintética:
17. (UF SÃO CARLOS) Considerando-se os vocábulos a) operaçãozinha
seguintes, assinalar a alternativa que indica os pares de b) conversinha
derivação regressiva, derivação imprópria e derivação c) principalmente
sufixal, precisamente nesta ordem: d) assustadora
embarque e) obrigadinho
histórico
cruzes! 23. (OBJETIVO) “O embarque dos passageiros
porquê será feito no aterro”. Os dois termos sublinhados
fala representam, respectivamente, casos de:
sombrio a) palavra primitiva e palavra primitiva
a) 2-5, 1-4, 3-6 b) conversão e formação regressiva
b) 1-4, 2-5, 3-6 c) formação regressiva e conversão
c) 1-5, 3-4, 2-6 d) derivação prefixal e palavra primitiva
d) 2-3, 5-6, 1-4 e) formação regressiva e formação regressiva
e) 3-6, 2-5, 1-4
24. (UFF-RIO) O vocábulo catedral, do ponto de
18. (VUNESP) Em “... gordos irlandeses de rosto vista de sua formação é:
vermelho...” e “... deixa entrever o princípio de a) primitivo
uma tatuagem.”, os termos grifados são formados, b) composto por aglutinação
respectivamente, a partir de processos de: c) derivação sufixal
a) derivação prefixal e derivação sufixal d) parassintético
b) composição por aglutinação e derivação prefixal e) derivado regressivo de catedrático
c) derivação sufixal e composição por justaposição
d) derivação sufixal e derivação prefixal 24. (PUC) Assinale a classificação errada do processo
e) derivação parassintética e derivação sufixal de formação indicado:
a) o porquê - conversão ou derivação imprópria
19. (FURG-RS) A alternativa em que todas as palavras b) desleal - derivação prefixal
são formadas pelo mesmo processo de composição é: c) impedimento - derivação parassintética
a) passatempo - destemido - subnutrido d) anoitecer - derivação parassintética
b) pernilongo - pontiagudo - embora e) borboleta - primitivo
c) leiteiro - histórico - desgraçado
d) cabisbaixo - pernalta - vaivém 25. (UF-PR) A formação do vocábulo sublinhado na
e) planalto - aguardente - passatempo expressão “o canto das sereias” é:
a) composição por justaposição
b) derivação regressiva
c) derivação prefixal
d) derivação sufixal
e) palavra primitiva

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LÍNGUA PORTUGUESA

26. (ES-UBERLÂNDIA) Todos os verbos seguintes são 32. (TRE-ES) Quem possui inveja é:
formados por parassíntese (derivação parassintética), a) invejozo
exceto: b) invejeiro
a) endireitar c) invejado
b) atormentar d) invejoso
c) enlouquecer e) invejador
d) desvalorizar
e) soterrar 33. (ETF-SP) Assinalar a alternativa que indique
corretamente o processo de formação das palavras
27. (FUVEST) Assinalar a alternativa em que a sem-terra, sertanista e desconhecido:
primeira palavra apresenta sufixo formador de advérbio a) composição por justaposição, derivação por
e, a segunda, sufixo formador de substantivo: sufixação, derivação por prefixação e sufixação
a) perfeitamente varrendo b) composição por aglutinação, derivação por sufixação
b) provavelmente erro e derivação por parassíntese
c) lentamente explicação c) composição por aglutinação, derivação por sufixação
d) atrevimento ignorância e derivação por sufixação
e) proveniente furtado d) composição por justaposição, derivação por
sufixação e composição por aglutinação
28. (FUVEST) As palavras adivinhar - adivinho e e) composição por aglutinação, derivação por sufixação
adivinhação - têm a mesma raiz, por isso são cognatas. e derivação por prefixação
Assinalar a alternativa em que não ocorrem três
cognatos: 34. (FUVEST) Assinalar a alternativa que registra a
a) alguém - algo - algum palavra que tem o sufixo formador de advérbio:
b) ler, leitura - lição a) desesperança
c) ensinar - ensino, ensinamento b) pessimismo
d) candura - cândido - incandescência c) empobrecimento
e) viver - vida - vidente d) extremamente
29. (FCMSC-SP) As palavras expatriar, amoral, e) sociedade
aguardente, são formadas por:
a) derivação parassintética, prefixal, composição por 35. (CESGRANRIO) Os vocábulos aprimorar
aglutinação e encerrar classificam-se, quanto ao processo de
b) derivação sufixal, prefixal, composição por formação de palavras, respectivamente, em:
aglutinação a) parassíntese - prefixação
c) derivação prefixal, prefixal, composição por b) parassíntese - parassíntese
justaposição c) prefixação - parassíntese
d) derivação parassintética, sufixal, composição por d) sufixação - prefixação e sufixação
aglutinação e) prefixação e sufixação - prefixação
e) derivação prefixal, prefixal, composição por
justaposição 36. (PUC) Considerando o processo de formação
de palavras, relacione a coluna da direita com a da
30. (MACK) As palavras entardecer, desprestígio e esquerda:
oneroso, são formadas, respectivamente, por: ( 1 ) derivação imprópria ( ) desenredo
a) prefixação, sufixação e parassíntese ( 2 ) prefixação ( ) narrador
b) sufixação, prefixação e parassíntese ( 3 ) prefixação e sufixação ( ) infinitamente
c) parassíntese, sufixação e prefixação ( 4 ) sufixação ( ) o voar
d) sufixação, parassíntese e prefixação ( 5 ) composição por justaposição ( ) pão de mel
e) parassíntese, prefixação e sufixação
a) 3, 4, 2, 5, 1
31. (FUVEST) Foram formadas pelo mesmo processo b) 2, 4, 3, 1, 5
as seguintes palavras: c) 4, 1, 5, 3, 2
a) vendavais, naufrágios, polêmicas d) 2, 4, 3, 5, 1
b) descompõem, desempregados, desejava e) 4, 1, 5, 2, 3
c) estendendo, escritório, espírito
d) quietação, sabonete, nadador 37. (ETF-SP) Assinalar a alternativa em que as duas
e) religião, irmão, solidão palavras são formadas por parassíntese:
a) indisciplinado - desperdiçar
b) incineração - indescritível
c) despedaçar - compostagem
d) endeusado - envergonhar
e) descamisado - desonestidade

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LÍNGUA PORTUGUESA

(Exercícios retirados de http://www.mundovestibular.com.br/articles/6110/1/Exercicios-Processo-de-Formacao-das-


Palavras/Paacutegina1.html)

GABARITO

1-B
2-B
3-B
4-C
5-E
6-E
7-D
8-A
9-D
10 - E
11 - C
12 - B
13 - E
14 - A
15 - C
16 - D
17 - C
18 - D
19 - B
20 - E
21 - A
22 - D
23 - E
24 - C
25 - B
26 - D
27 - E
28 - C
29 - A
30 - E
31 - D
32 - D
33 - A
34 - D
35 - A
36 - B
37 - D

CLASSES DE PLAVRAS

ADJETIVO

Na origem das palavras, pode-se dizer que o homem primeiramente sentiu a necessidade de nomear os objetos a sua
volta e suas próprias ações. Então surgiram os substantivos e os verbos. Entretanto, os seres foram apresentando caracte-
rísticas diversas e, apesar de fazerem parte de um mesmo grupo, eram diferentes porque possuíam qualidades diferentes.
Por exemplo, há no grupo das flores: as belas e as feias, as cheirosas, as vermelhas e as azuis. Como distingui-las? A partir
dessa questão surgiram os adjetivos, essa classe de palavras que tem como função qualificar os seres.
Adjetivos são as palavras que designam qualidades, provisórias ou permanentes, qualificando e particularizando os
seres. São satélites de um substantivo expresso ou subtendido, com o qual concordam em gênero e número.

Exemplos:
A casa está perfeita.
Os carros foram considerados adequados para a competição.
Aquela mulher é lindíssima.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Nos exemplos acima percebemos o adjetivo enquanto uma palavra referente ao substantivo, concordando com suas va-
riações de gênero (masculino e feminino / singular e plural).

Vejamos uma lista de adjetivos:

belo
feio
frio
quente
azul
verde
inteligente
ignorante
rápido
devagar
gracioso
desajeitado
mau
bom
triste
feliz

- Adjetivos Gentílicos:
Também chamados de adjetivos pátrios, os adjetivos gentílicos designam a origem de um indivíduo de acordo com seu
local de residência ou nascimento. Vejamos os adjetivos gentílicos referentes aos estados brasileiros:

Acre = acreano Manaus = manauense


Alagoas = alagoano Marajó = marajoara
Amapá = amapaense Maranhão = maranhense
Amazonas = amazonense ou baré Mato Grosso = mato-grossense
Aracaju = aracajuano ou aracajuense Mato Grosso do Sul = mato-grossense do sul
Bahia = baiano Natal = natalense ou papa-jerimum
Belém = belenense Niterói = niteroiense
Belo Horizonte = belo-horizontino Nova Iguaçu = iguaçuano
Boa Vista = boa-vistense Pará = paraense
Bragança = bragantino Paraíba = paraibano
Brasil = brasileiro Paraná = paranaense
Brasília = brasiliense Pernambuco = pernambucano
Cabo Frio = cabo-friense Petrópolis = petropolitano
Campinas = campineiro ou campinense Piauí = piauiense
Campos = campista Porto Alegre = porto- alegrense
Campos do Jordão = jordanense Porto Velho = porto-velhense
Cananeia = cananeu Recife = recifense
Ceará = cearense Ribeirão Preto = riberopretano

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LÍNGUA PORTUGUESA

Cuiabá = cuiabano Rio Branco = branquense


Dois Córregos ( SP ) = duocorreguense Rio de Janeiro ( cidade ) = carioca
Espírito Santo = espírito-santense ou capixaba Rio de Janeiro ( estado ) = fluminense
Fernando de Noronha = noronhense Rio Grande do Norte = rio-grandense do norte
Florianópolis = florianopolitano Rio Grande do Norte = potiguar
Fortaleza = fortalezense Rio Grande do Sul = gaúcho
Foz do Iguaçu = iguaçuense Rondônia = rondoniano ou rondoniense
Goiânia = goianiense Salvador = salvadorense ou soteropolitano
Goiás = goiano Santa Catarina = catarinense ou barriga verde
Guarulhos = guarulhense Santarém = santarense
Ilhéus = ilheense São Luís = são-luisense
Jabuticabal = jabuticabense São Paulo ( cidade ) = paulistano
Jacareí = jacariense São Paulo ( estado ) = paulista
Jaú = jauense São Vicente = vicentino
João Pessoa = pessoense Sergipe = sergipano
Juiz de Fora = forense Sertãozinho = sertanesino
Lajes = lajiano Teresina = teresinense
Leme = lemense Três Corações = tricordiano
Macapá = macapaense Vitória = vitoriense
Maceió = maceioense Xavantes = xavantino

(Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/portugues/adjetivos-gentilicos-e-patrios)

Classificação dos adjetivos


Antes de qualquer classificação gramatical, adjetivos possuem uma classificação semântica, ou seja, segundo sua ampli-
tude de qualificação de um ser. Por isso mesmo, eles se distinguem em:
a) adjetivos explicativos: apresentam característica intrínseca ao próprio ser.
Exemplo. Todo homem é mortal.
b) adjetivos restritivos: limitam as características do ser, exprimindo qualidades não essenciais.
Exemplo: Quando cheguei em casa a flor já estava murcha.

CLASSIFICAÇÕES MORFOLÓGICAS DO ADJETIVO

- I. SEGUNDO SUA ESTRUTURA


Quanto ao seu processo de formação, os adjetivos dividem-se em:

ADJETIVO SIMPLES Formado por um único radical Bonito, esperto, carioca, engraçado
ADJETIVO COMPOSTO Formado por mais de um radical Franco-brasileiro, verde-oliva, amarelo-canário
ADJETIVO PRIMITIVO O que dá origem a outros adjetivos Bela, bom, feliz
Derivados de substantivos, verbos ou de
ADJETIVO DERIVADO Inteligentíssimo, ciumenta, bondoso
outros adjetivos

II. QUANTO À SUA FLEXÃO

a) Gênero
Por ser palavra satélite do substantivo, o adjetivo varia seguindo as flexões apresentadas pelo nome. Nesse aspecto, os
adjetivos se dividem em:

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LÍNGUA PORTUGUESA

- Biformes: apresentam flexão de gênero, variando em A parede verde-mar


feminino e masculino As paredes verde-mar.

A bela moça. IMPORTANTE!


O belo moço. Os adjetivos azul-marinho, azul-celeste, ultravioleta e
qualquer outro iniciado por “cor-de...” são sempre invariáveis.
A tranquila professora. Já os adjetivos surdo-mudo e pele-vermelha terão am-
O tranquilo professor. bos elementos flexionados.
- Uniformes: possuem uma única forma para o mascu- c) Grau
lino e feminino. Além das variações de gênero e número, os adjetivos
podem variar de grau, a fim de indicar a intensidade da
A moça feliz.
qualidade referida. Há dois graus possíveis: o comparativo
O aluno feliz.
e o superlativo.
A competente funcionária.
O competente funcionário. Grau Comparativo:
Caso o adjetivo seja composto, manterá seu caráter uni- No grau comparativo, uma mesma qualidade é atribuí-
forme. da a mais de um ser ou quando mais de uma qualidade é
O problema político-social invade o Brasil. destinada a um único ser.
A solução político-social é uma utopia. São tão inteligente quanto você. - Grau comparativo
de igualdade
b) Número: Os adjetivos apresentam variação de nú- Neste grau utilizamos termos como “quanto”, “como”,
mero seguindo as flexões numéricas dos substantivos. “quão”.
João é mais inteligente que José. - Grau comparativo
O carro novo. de superioridade.
Os carros novos. Aqui são usadas as expressões “mais (adjetivo) que”/
O homem feliz. “mais (adjetivo) do que”.
As mulheres felizes. José é menos inteligente do que João. - Grau compa-
A boa mãe. rativo de inferioridade.
Os bons pais. No grau comparativo de inferioridade são utilizadas as ex-
pressões “menos (adjetivo) que” / “menos (adjetivo) do que”.
Entretanto, há palavras usadas como adjetivo que são
originalmente substantivos. Vejamos o exemplo: Atenção: há o chamado grau comparativo de supe-
O vinho estava muito agradável. (vinho = substantivo) rioridade irregular, o qual faz uso de formas sintéticas:
Comprei um paletó vinho. (vinho =adjetivo) - (mais grande) : maior – João é maior do que Pedro
- (menos grande): menor – Pedro é menor que João
Nesses casos, os adjetivos não sofrem flexão de número: - (mais bom): melhor – A professora de Química é me-
lhor que a de Filosofia.
Paletó vinho. - (menos bom): pior – A professora de Filosofia é pior
Paletós vinho.
do que a Química.
Tartaruga ninja
Grau superlativo
Tartarugas ninja.
No grau superlativo a qualidade atribuída a um ou mais
seres é realizada em escala bem mais elevada.
Comício monstro. a) Grau superlativo relativo: é a realizada a caracterização
Comícios monstro. de um ser em maior ou menor grau que os demais seres.

Número dos adjetivos compostos: - Grau superlativo relativo de superioridade: utiliza-se a


expressão “o mais” (adjetivo).
Chamamos de adjetivos compostos aqueles formados Ex.: Catarina é a aluna mais aplicada da turma.
por mais de um radical, ligados normalmente por hífen. A re- Sérgio é o mais rápido na pista.
gra geral nos diz que devemos flexionar somente o segundo
vocábulo, deixando o primeiro no masculino e no singular. - Grau superlativo de inferioridade: utiliza-se a expres-
A clínica médico-veterinária. são “o menos” (adjetivo).
Os cidadãos franco-brasileiros. Ex.: O funcionário é o menos interessado da equipe.
Vivian é a professora menos irritada da escola.
No entanto, quando o segundo termo se tratar de um
substantivo adjetivado, todo o adjetivo composto perma-
necerá invariável.

35
LÍNGUA PORTUGUESA

b) Grau superlativo absoluto: qualifica um ou mais de águia aquilino


sere , entretanto, sem comparação, em grau muito elevado.
de alma anímico
- Grau superlativo absoluto analítico: a atribuição de De aluno Discente
grau se dá através dessa soma: palavra intensificadora
(muito, bastante…) + adjetivo. De anjo Angelical
Ex.: A comida está muito saborosa. De ano Anual
O clima está extremamente quente.
De aranha Aracnídeo
- Grau superlativo absoluto sintético: construído por De astro Sideral
meio de uma única palavra cuja estrutura é a seguinte: Ad- de bispo episcopal
jetivo + Sufixo (-íssimo, -imo, ílimo, -érrimo):
Ex.: João é divertido – João é divertidíssimo. de boca bucal, oral
Maria é elegante. - Maria é elegantérrima de bode hircino
Quanto ao grau superlativo absoluto sintético, há o que
chamamos de sintéticos eruditos, formas ligadas à raiz his- de boi bovino
tórica da palavra. Vejamos alguns: de bronze brônzeo ou êneo
de cabra caprino
Adjetivo Superlativo absoluto sintético
de cão canino
acre acérrimo
de carneiro arietino
agradável agradabilíssimo
de cavalo equino, cavalar ou hípico
alto altíssimo, supremo ou sumo
de chumbo plúmbeo
amável amabilíssimo
de chuva pluvial ou chuvoso
amargo amaríssimo
de cidade urbano
amigo amicíssimo
de cinza cinéreo
antigo antiquíssimo
de criança infantil ou pueril
áspero aspérrimo
de cobre cúprico
atroz atrocíssimo
de coelho cunicular
benéfico beneficentíssimo
de dedo digital
benévolo benevolentíssimo
de diamante diamantino ou adamantino
bom boníssimo
de enxofre sulfúrico
célebre celebérrimo
de esmeralda esmeraldino
cruel crudelíssimo
de fábrica fabril
difícil dificílimo
de frente dianteiro
doce dulcíssimo ou docíssimo
de fogo ígneo
fácil facílimo
de gesso gípseo
feliz felicíssimo
de guerra bélico
humilde humílimo ou humildíssimo
de hoje hodierno
Locução adjetiva de ilha insular
Chamamos de locução adjetiva o conjunto de duas ou de intestino celíaco ou entérico
mais palavras que apresentam a função de adjetivo.
de lago lacustre
Observe a lista abaixo: de lebre leporino
de lobo lupino
Locução Adjetiva Adjetivo correspondente
de lua lunar ou selênico
de abdômen abdominal
de madeira lígneo
de abelha apícola
de marfim ebóreo ou ebúrneo
De abutre vulturino

36
LÍNGUA PORTUGUESA

de pato anserino 6. Nas orações “Esse livro é melhor que aquele” e “Este
livro é mais lindo que aquele”, Há os graus comparativos:
de pombo columbino a) de superioridade, respectivamente sintético e analítico;
de prata argênteo ou argírico b) de superioridade, ambos analíticos;
c) de superioridade, ambos sintéticos;
de quadril ciático d) relativos;
de vaca vacum e) superlativos.
De baço Esplênico
7. Selecione a alternativa que completa corretamente as
lacunas da frase apresentada:
“Os acidentados foram encaminhados a diferentes clíni-
EXERCÍCIOS cas ____________________” .
a) médicas-cirúrgicas;
1. Assinale a alternativa em que o adjetivo que qualifi- b) médica-cirúrgicas;
cao substantivo seja explicativo: c) médico-cirúrgicas;
a) dia chuvoso; d) médicos-cirúrgicas;
b) água morna; e) médica-cirúrgicos.
c) moça bonita;
d) fogo quente; 8. Sabe-se que a posição do adjetivo, em relação ao
e) lua cheia. substantivo, pode ou não mudar o sentido do enunciado.
Assim, nas frases “Ele é um homem pobre” e “Ele é um po-
2. Assinale a alternativa que contém o grupo de adjetivos bre homem”.
gentílicos, relativos a “Japão”, “Três Corações” e “Moscou”: a) 1ª fala de um sem recursos materiais; a 2ª fala de um
a) Oriental, Tricardíaco, Moscovita; homem infeliz;
b) Nipônico,Tricordiano, Soviético; b) a 1ª fala de um homem infeliz; a 2ª fala de um ho-
c) Japonês, Trêscoraçoense, Moscovita; mem sem recursos materiais;
d) Nipônico, Tricordiano, Moscovita; c) em ambos os casos, o homem é apenas infeliz, sem
e) Oriental, Tricardíaco, Soviético. fazer referência a questões materiais;
d) em ambos os casos o homem é apenas desprovido
3. Ainda sobre os adjetivos gentílicos, diz-se que quem de recursos;
nasce em “Lima”, “Buenos Aires” e “Jerusalém” é: e) o homem é infeliz e desprovido de recursos mate-
a) Limalho-Portenho-Jerusalense; riais, em ambas.
b) Limenho-Bonaerense-Hierosolimita;
c) Límio-Portenho-Jerusalita; 9.O item em que a locução adjetiva não corresponde ao
d) Limenho-Bonaerense-Jerusalita; adjetivo dado é:
e) Limeiro-Bonaerense-Judeu; a) hibernal - de inverno;
b) filatélico - de folhas;
4.No trecho “os jovens estão mais ágeis que seus pais”, c) discente - de alunos;
temos: d) docente - de professor;
a) um superlativo relativo de superioridade; e) onírico - de sonho.
b) um comparativo de superioridade;
c) um superlativo absoluto; 10. Assinale a alternativa em que todos os adjetivos têm
d) um comparativo de igualdade. uma só forma para os dois gêneros:
e) um superlativo analítico de ágil. a) andaluz, hindu, comum;
b) europeu, cortês, feliz;
5. Relacione a 1ª coluna à 2ª: c) fofo, incolor, cru;
1 - água de chuva ( ) Fluvial d) superior, agrícola, namorador;
2 - olho de gato ( ) Angelical
e) exemplar, fácil, simples.
3 - água de rio ( ) Felino
4 - Cara-de-anjo ( ) Pluvial
(Exercícios retirados de http://www.portuguesconcurso.
Assim temos: com/2009/07/adjetivos-exercicios-com-gabarito.html)
a) 1 – 4 – 2 – 3;
b) 3 – 2 – 1 – 4;
c) 3 – 1 – 2 – 4; GABARITO
d) 3 – 4 – 2 – 1;
e) 4 – 3 – 1 – 2. 1. D
2. D
3. B
4. B

37
LÍNGUA PORTUGUESA

5. D d) Advérbios de afirmação: confirmam a ação do ver-


6. A bo – sim, positivamente, certamente, efetivamente.
7. C Certamente farei a avaliação.
8. A Sim, amo muito você.
9. B
10. E e) Advérbios de negação: negam a ação do verbo –
nunca, não, jamais, nada
A O funcionário não concluiu o relatório.
DVÉRBIOS Nunca o deixarei.

Leia as frases abaixo: f) Advérbios de dúvida: não confirmam ação do verbo


a) João cantou na festa. – talvez, possivelmente.
b) João cantou muito bem na festa. Talvez viaje nas férias.
Possivelmente ela virá nos visitar.
Percebemos que ainda que se trate da mesma infor-
mação (João cantou em uma festa), no segundo exemplo g) Advérbios de tempo: temporalizam a ação do ver-
os termos destacados apresentam uma circunstância que bo – agora, cedo, já, tarde, depois, antes, sempre, ontem,
modifica o modo do verbo. Além de cantar, João cantou hoje, amanhã.
muito bem. Amanhã voltarei ao trabalho.
Há outras formas desse processo, vejamos: Acordei cedo neste fim de semana,
Ontem recebi flores de meu amado.
Aqui também há uma modificação de circunstância h) Advérbios interrogativos: inserem perguntas cujas
referente ao verbo “receber”. Através da palavra “ontem”, respostas serão advérbios – onde (lugar), como (modo),
temporalizamos a ação, inserindo-a em um determinado por que (causa), quando (tempo).
contexto. Justamente essa é a função da classe gramatical Onde você mora?
chamada advérbios. Quando você vem me visitar?

Advérbios são palavras invariáveis que modificam e LOCUÇÃO ADVERBIAL


inserem circunstância aos verbos, adjetivos e a outros
advérbios. Já que o advérbio é a classe que insere circunstância a
Quando falamos em circunstância tratamos dos dife- um verbo, haverá situações que outras classes exercerão a
rentes contextos em que se pode modificar um verbo, um mesma função, geralmente através da construção preposi-
adjetivo ou outro advérbio. Por isso o advérbio possui uma ção + substantivo.
extensa classificação. Chamamos de locução de adverbial o conjunto de pa-
lavras que exercem a mesma função semântica de um ad-
CLASSIFICAÇÃO DOS ADVÉRBIOS: vérbio. Vejamos alguns exemplos:
a) Tempo: à noite, à tarde, às vezes, de dia, de manhã,
a) Advérbios de modo: modo de ação do verbo – bem, de vem em quando, em breve.
mal, melhor, pior, depressa, devagar, rapidamente e todos b) Lugar: à direita, à esquerda, ao lado, de cima, de
os adjetivos femininos terminados em -mente. fora, de dentro, embaixo, em cima.
O carro corria depressa. c) Modo: às pressas, à vontade, às claras, em geral, em
Joana estava mal na festa. silêncio, em vão.
Por que Maria anda tão devagar? d) Afirmação: Com certeza, de fato, na verdade, sem
O aluno leu lindamente o poema. dúvida.
e) Negação: De modo algum, de forma alguma, de ma-
b) Advérbios de lugar: localizam a ação do verbo – neira nenhuma.
aqui, lá, acolá, longe, fora, dentro, perto, acima, abaixo.
Aqui neva muito.
A professora mora longe da escola. EXERCÍCIOS
Você vive perto de seus familiares?
1. (ITA-2003) A questão a seguir refere-se ao texto
c) Advérbios de intensidade: intensificam ou minimi- abaixo.
zam a ação do verbo, do adjetivo ou outro advérbio – muito, (…) As angústias dos brasileiros em relação ao portu-
pouco, menos, mais, bastante, tão, todo, completamente. guês são de duas ordens. Para uma parte da população,
Maria é a mais bela da sala. a que não teve acesso a uma boa escola e, mesmo assim,
Trabalhei muito no fim de semana. conseguiu galgar posições, o problema é sobretudo com
Cantou muito bem na festa. a gramática. É esse o público que consome avidamente
os fascículos e livros do professor Pasquale, em que as re-

38
LÍNGUA PORTUGUESA

gras básicas do idioma são apresentadas de forma clara e GABARITO


bem-humorada. Para o segmento que teve oportunidade
de estudar em bons colégios, aprincipaldificuldade é com 1d
clareza. É para satisfazer a essa demanda que um novo tipo 2a
de profissional surgiu: o professor de português especiali- 3b
zado em adestrar funcionários de empresas. Antigamente,
os cursos dados no escritório eram de gramática básica e
se destinavam principalmente a secretárias. De uns tempos ARTIGO
para cá, eles passaram a atender primordialmente gente de
nível superior. Em geral, os professores que atuam em fir- Chamamos de artigo as palavras que se antepõem ao
mas são acadêmicos que fazem esse tipo de trabalho espo- substantivo, indicando seu gênero e número, além de de-
radicamente para ganhar um dinheiro extra. “É fascinante, terminá-lo ou generalizá-lo. São classificados em defini-
porque deixamos de viver a teoria para enfrentar a língua dos e indefinidos:
do mundo real”, diz Antônio Suárez Abreu, livre-docente
pela Universidade de São Paulo (…) a) Artigos definidos: o, a, os, as. Possuem a função de
(JOÃO GABRIEL DE LIMA. Falar e escrever, eis a questão. satélite do substantivo, determinando-o e inserindo-o num
Veja, 7/11/2001, n. 1725) contexto já conhecido pelo leitor ou ouvinte, indicado fa-
miliaridade.
O adjetivo “principal” (em a principal dificuldade é com Exemplos:
clareza) permite inferir que a clareza é apenas um elemento A discussão a respeito do cenário político atual ainda
dentro de um conjunto de dificuldades, talvez o mais significa- persiste.
tivo. Semelhante inferência pode ser realizada pelos advérbios: O funcionário da empresa foi contratado para sanar a
a) avidamente, principalmente, primordialmente. crise.
b) sobretudo, avidamente, principalmente. Nos exemplos acima, além de informar o gênero (fe-
c) avidamente, antigamente, principalmente. minino/masculino) e número (singular/plural), o artigo de-
d) sobretudo, principalmente, primordialmente. termina o nome, pressupondo um conhecimento anterior.
e) principalmente, primordialmente, esporadicamente.
b) Artigos indefinidos: um, uma, uns, umas. Denotam
2. Observe as palavras: serem indefinidos, não identificáveis através do discurso.
I. Hoje. Além do mais, uma das funções desse tipo de artigo é in-
II. Aqui. serir o substantivo como um simples representante de de-
III. Rapidamente. terminado grupo:
IV. Bastante. Uma mulher foi encontrada dentro de um trem aban-
V. Com certeza. donado.
Classificam-se, respectivamente, como: Contratou-se mais um funcionário na empresa.
a) advérbios de tempo, lugar, modo, intensidade e afir- Já nas frases acima, apesar das informações de gênero e
mação. número, o artigo não denota familiaridade do substantivo
b) advérbios de modo, tempo, intensidade, afirmação acompanhado, inserindo-o numa relação de indistinção.
e negação.
c) advérbios de dúvida, tempo, lugar, modo e intensidade. Utilizamos o artigo definido nas seguintes situações:
d) advérbios de tempo, lugar, modo, afirmação e dúvida.
e) advérbios de dúvida, afirmação, lugar, modo e inten- a) Com nomes próprios ligados a lugares: O Brasil é
sidade. um país lindo.
A Bahia é minha terra natal.
3. Entende-se por advérbio: Atenção!
a) Unidade que significa ação ou processo, podendo ex- Dentre essa regra dos lugares e nomes próprios, há al-
pressar o modo, o tempo, a pessoa e o número. guns que atraem e outros que repelem o artigo.
b) Expressão modificadora do verbo, denota uma cir-
cunstância de lugar, tempo, modo, intensidade, condição, Nomes de lugares que repelem artigo definido: Por-
entre outras, e desempenha, sintaticamente, a função de tugal, Roma, Atenas, Curitiba, São Paulo, Paris
adjunto adverbial.
c) Classe de palavras responsável por delimitar ou qua- b) Também utiliza-se o artigo definido frente a no-
lificar o substantivo. mes de cidades, quando qualificadas:
d) Classe que designa os nomes dos objetos, pode ser A mágica Páris ainda encanta a muitos.
dividida em próprios e comuns. A histórica Roma possui ainda seus enigmas.
e) Palavra anteposta aos substantivos com reduzido va-
lor semântico. c) Após a expressão “ambos”: Ambas as alunas foram
advertidas na escola.
(Exercícios retirados de http://exercicios.mundoeduca- Foram entrevistados ambos os políticos.
cao.bol.uol.com.br/exercicios-gramatica/exercicios-sobre-
-adverbio.htm)

39
LÍNGUA PORTUGUESA

c) Determinando numeral na construção formada em no na nos nas


por TODO + Numeral + Substantivo: Todas as quinze
alunas foram ouvidas. pe-
por pelo pela pelas
los
d) Após os pronomes TODO/TODA, a fim de indicar
totalidade: Toda a cidade será reconstruída. USO DOS ARTIGOS INDEFINIDOS
Vale destacar que sem esse artigo o mesmo pronome
denota “qualquer um”. Ex.: Todo homem é mortal. Neste caso, é sempre usado para marcar aproximação,
Também é utilizado o artigo definido nas seguintes si- sem informação exata, tal como em:
tuações: a) aproximação numérica: Devo ter economizado uns
cinquenta reais.
e) Frente as estações do ano: A primavera está quase b) indicando pares de objetos: Comprei umas botas
chegando. Ele não gosta do Outono. confortáveis.
c) referir-se ao autor no lugar da obra: Meu sonho é
f) Antecedendo o adjetivo no grau superlativo rela- ver um Picasso de perto.
tivo: João comprou os mais belos livros para Maria. d) em comparações: João é um Lord.

g) Em frente a palavra “outro”, determinando-o: Formas combinadas do artigo indefinido


João tem duas alunas: Maria e Lúcia. Maria é aplicada e a O artigo indefinido por unir-se às preposições em e de.
outra nem tanto. Vejamos:
h) Com expressões de medida: A maçã custa cinco
reais o quilo. num numa nuns numas
dum duma duns dumas
Não utilizamos o artigo definido nos seguintes con-
textos:
Além do mais, o artigo tem função substantivadora, ou
a) antes de meses do ano: seja, transforma em substantivo qualquer classe gramatical
Março chegou com muita chuva. que anteceder.
Ele quer viver. (verbo)
b) antes de pronomes de tratamento iniciados por Eu não sei o que é o viver (substantivo).
pronomes possessivos
Vossa Senhoria não entendeu a questão.
EXERCÍCIOS
c) antes de expressões que indicam matéria de es-
tudo: 1. (ITA) Determine o caso em que o artigo tem valor
Vou estudar Matemática para a avaliação. qualificativo:
a) Estes são os candidatos que lhe falei.
Importante!
b) Procure-o, ele é o médico! Ninguém o supera.
Em algumas construções o uso do artigo definido é
c) Certeza e exatidão, estas qualidades não as tenho.
facultativo, tais como em:
d) Os problemas que o afligem não me deixam descui-
dado.
* Antes dos pronomes possessivos seu, sua: O seu
carro foi consertado. e) Muito é a procura; pouca é a oferta.
A sua sala está linda!
2. (Uberlândia) Em uma destas frases, o artigo defi-
* Antes de nomes próprios de pessoas: Maria saiu / nido está empregado erradamente. Em qual? a) A velha
A Maria saiu. Roma está sendo modernizada.
Vale ressaltar que neste caso, o artigo definido denota b) A “Paraíba” é uma bela fragata.
familiaridade com a pessoa mencionada. c) Não reconheço agora a Lisboa de meu tempo.
d) O gato escaldado tem medo de água fria.
Formas combinadas do artigo definido e) O Havre é um porto de muito movimento.
É possível um artigo contrair-se a uma preposição,
quando ocupa função de complemento ou adjunto: (Exercícios retirados de https://cursinhodapoliusp.files.
wordpress.com/2012/05/lista-de-exercc3adcios-pron-art-
-e-num.pdf)
Artigo
Preposições o a os aas GABARITO
a ao às aos às
1-b
de do das dos das 2-d

40
LÍNGUA PORTUGUESA

SUBSTANTIVO Obs.: Palavras como “fada”, “Deus’, “anjo” são substanti-


Substantivos são as palavras que dão nomes aos se- vos concretos, pois não se tratam de sentimentos abstratos.
res, sentimentos, lugares, qualidades, lugares etc…Devido
a essa função de nomeação, afirma-se que os substantivos h) Substantivo coletivo: aquele que designa um con-
são núcleo de um sintagma nominal, cujos satélites são os junto de seres.
adjetivos, artigos, numerais e pronomes. Ou seja, o subs- Assembleia: grupo de pessoas
tantivo determina a variação de gênero e número dessas Banca: grupo de examinadores
outras classes gramaticais: Banda: grupo de instrumentistas
Ex. [A minha bela filha] foi promovida. - (como o subs- Bando: grupo de desordeiros
tantivo está no singular, as outras classes que o circundam Batalhão: grupo de soldados
também estão. Caravana: grupo de viajantes
[As minhas belas filhas] foram promovidas. (aqui as Cavalgada: grupo de cavaleiros
classes satélites concordam em gênero e número com o Comunidade: grupo de cidadãos
substantivo). CorjaouCholdra: grupo de malandros
Chamamos a parte entre colchetes de sintagma nomi- Chusma: grupo de gente
nal, uma vez que é o nome (o substantivo) o núcleo com a Concílio: grupo de bispos
informação semântica predominante. Conclave: grupo de cardeais reunidos para eleger o
Os substantivos são uma classe variável em gênero, papa
número e grau. Congresso: grupo de parlamentares
Corpo docente: grupo de professores
1) Tipos de Substantivos Elenco: grupo de atores, artistas
Exército: grupo de soldados
Por ser uma classe tão ampla, divide-se os substantivos Falange: grupo de soldados ou anjos
em: comum, próprio, simples, composto, primitivo, deriva- Família: grupo dos parentes
do, concreto, abstrato e coletivo. Farândola: grupo de mendigos
Horda: grupo de bandidos invasores
a) Substantivo Comum: designam os seres integrantes Junta: grupo de médicos, credores, examinadores
da mesma espécie de modo genérico. Júri: grupo de jurados
Ex.: gente, trabalhador, aluno, funcionário, pedra. Legião: grupo de soldados, anjos ou demônios
Malta: grupo de malfeitores
b) Substantivo Próprio: iniciados por letra maiúscu- Multidão: grupo grande de pessoas
la, são os substantivos que particularizam os seres de uma Orquestra: grupo de instrumentistas
mesma espécie. Plateia: grupo de espectadores
Ex.: Paulo, Brasil, Jorge Amado, Vidas Secas. Plêiade: grupo de artistas correlacionados
PopulaçãoouPovo: grupo de pessoas de uma determi-
c) Substantivo simples: aquele que possui um único nada região
radical. Prelatura: grupo de bispos
Ex.: chuva, guarda, moleque, cabeça Prole: grupo de filhos
Quadrilha: grupo de bandidos ou grupo de dança cole-
d) Substantivo composto: o substantivo que possui tiva das festas juninas
mais de um radical, formado por duas ou mais palavras. Tertúlia: grupo de parentes ou amigos
Ex.: guarda-chuva, quebra-cabeça, guarda-roupa. Time: grupo de jogadores
e) Substantivo primitivo: aquele que não deriva de Tripulação: grupo de marinheiros ou aviadores
outras palavras, mas que pode dar origem a outras. Tropa: grupo de soldados
Ex.: pedra, flor, casa, mesa. Turma: grupo de alunos de uma mesma classe

e) Substantivo derivado: substantivos que derivam de 2) Gênero dos substantivos


outras palavras. Os substantivos variam de gênero (masculino e femini-
Ex.: pedreiro (pedra), floricultura (flor), casamento no) e podem ser:
(casa).
a) biformes: apresentam duas formas, uma para o
f) Substantivo concreto: designa seres com existência masculino e outra para o feminino.
concreta, independente, real. Ex.: menino/menina, garoto/garota, aluno/aluna, pro-
Ex.: casa, martelo, cadeira, cavalo. fessor/professora.

g) Substantivo abstrato: substantivo que nomeia sen- b) uniformes: apenas uma forma especifica os dois gê-
timentos, ações, emoções, qualidades. Esse tipo de subs- neros. Os substantivos uniformes podem ser:
tantivo depende de “alguém” que os sinta ou possua para - epicenos: denomina animais e determina um único
existir, não podem existir de maneira independente. gênero.
Ex.: amor, ódio, saudade, alegria, beleza, amizade, beijo. Ex.: borboleta, barata, cobra-macho, cobra-fêmea.

41
LÍNGUA PORTUGUESA

- comum de dois gêneros: palavra invariável cujo gêne- d) substantivos terminados em – l:


ro é indicado através da presença do artigo que o antecede. Substantivos terminados em -al, -el, -ol, ul – substitui-se
Ex.: o repórter/a repórter, o pianista/a pianista, o jorna- o “l”, por “is”:
lista/a jornalista. Ex.: Anzol – anzóis
- sobrecomuns: apresenta um único gênero, mas se re- Capinzal – capinzais
fere ao masculino e ao feminino. Móvel - móveis
Ex.: testemunha, verdugo, algoz, criança. Tribunal – tribunais
Substantivos oxítonos terminados em -il: substitui-se o
Importante: substantivos de gênero incerto “l” por “s”:
Ex.: Fuzil – fuzis
Alguns substantivos mudam de significado frente o ar- Barril – barris
tigo que o antecede. Além disso, são comuns alguns erros Funil – funis
no tocante à indicação de gênero de determinados nomes. Civil – civis
Vejamos: Canil – canis

Substantivos de gênero masculino Substantivos paroxítonos terminados por – il: substitui-


-se “il” por “eis”:
O dó, Ex.: Ágil – ágeis
O herpes, Difícil – difíceis
O eclipse, Fóssil – fósseis
O pernoite, Projétil – projéteis
O champanha,
O proclama e) Substantivos terminados em -s:
O grama (peso) - Quando oxítonos formam plural com o acréscimo de “es”:
O cabeça (chefe) Ex.:Ananás – ananases
O capital (dinheiro) Revés – reveses
O cólera (raiva) Revés – reveses

Substantivos do gênero feminino - Quando paroxítonos ou proparoxítonos são invariáveis:


Ex.: Lápis
A cal, Ônibus
A libido, Pires
A faringe, Atlas
A pane,
A grama (capim) f) Alteração de vogal tônica: alguns substantivos alte-
A cabeça (parte da cabeça) ram o timbre quando flexionados no plural.
A capital (centro administrativo) Ex.: Esforço – EsfOrços
A cólera (doença) Jogos – JOgos
Imposto – ImpOstos
3) Número dos substantivos Reforço – RefOrços
Os substantivos variam de número (singular e plural) e Tijolo – TijOlos
apresentam as seguintes regras de flexão:
a) regra geral: acrescenta-se “s” ao fim da palavra. g) Substantivos terminados em -ão:
Ex.: casa/casas, aluno/alunos, gato/gatos. - Em sua grande maioria se substitui “ão” por “ões”:
Ex.: Ladrão – ladrões
b) substantivos terminados em -m: substitui-se tal Vilão – vilões
letra por “-ns” Eleição – eleições
Ex.: Álbum – álbuns Verão – verões
Personagem – personagens Lição – lições
Som – sons Missão – missões

c) substantivos terminados em -r, -z e -n: acrescen- - Poucas palavras substituem “ão” por “ães”:
ta-se “es”: Ex.: Alemão – alemães
Ex.:Cartaz – cartazes Capitão – capitães
Algoz – algozes Charlatão – charlatães
Caráter – caracteres Capelão – capelães
Feitor – feitores Catalão – catalães
Abdômen – Abdômenes - Todas as paroxítonas e algumas oxítonas acrescentam
apenas o “s”:

42
LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.:Acórdão – Acórdãos 3. Assinale a alternativa em que está correta a formação


Cidadão – cidadãos do plural:
Cortesão – cortesãos a) cadáver – cadáveis;
Benção – bençãos b) gavião – gaviães;
Órfão – órfãos c) fuzil – fuzíveis;
Órgão – órgãos d) mal – maus;
Sótão – sótãos e) atlas – os atlas.

h) Substantivos compostos separados por hífen : 4. Indique a alternativa em que todos os substantivos
- palavra variável + palavra variável: ambos vão para o são abstratos:
plural. a) tempo – angústia – saudade – ausência – esperança–
Ex.: guarda-florestal – guardas-florestais imagem;
couve-flor – couves-flores b) angústia – sorriso – luz – ausência – esperança –ini-
segunda-feira – segundas-feiras mizade;
mão-boba – mãos-bobas c) inimigo – luz – esperança – espaço – tempo;
d) angústia – saudade – ausência – esperança – inimizade;
- Verbo ou advérbio + substantivo ou adjetivo: apenas e) espaço – olhos – luz – lábios – ausência – esperança.
a segunda palavra vai para o plural.
5. Assinale a alternativa em que todos os substantivos
Ex.: Guarda-chuva – guarda-chuvas são masculinos:
Sempre-viva – sempre-vivas a) enigma – idioma – cal;
Beija-flor – beija-flores b) pianista – presidente – planta;
c) champanha – dó(pena) – telefonema;
- Palavras repetidas ou onomatopaicas: apenas o se- d) estudante – cal – alface;
gundo elemento vai para o plural. e) edema – diabete – alface.
Ex.: Teco-teco – teco-tecos
Pingue-pongue – pingue-pongues 6. Sabendo-se que há substantivos que no masculino
têm um significado; e no feminino têm outro, diferente.
- Palavras unidas por preposição: apenas o primeiro ele- Marque a alternativa em que há um substantivo que não
mento vai para o plural. corresponde ao seu significado:
Ex.: Estrela-do-mar – estrelas-do-mar
- Substantivo + elemento especificador: chamamos de a) O capital = dinheiro;
elemento especificador o substantivo que denota a função A capital = cidade principal;
específica do primeiro do substantivo do. Aqui apenas o
primeiro elemento vai para o plural: b) O grama = unidade de medida;
Ex.: Caneta-tinteiro – canetas-tinteiro A grama = vegetação rasteira;
Navio-escola – navios-escola
Pombo-correio- pombos-correio. c) O rádio = aparelho transmissor;
A rádio = estação geradora;
d) O cabeça = o chefe;
EXERCÍCIOS A cabeça = parte do corpo;

1. Numa das seguintes frases, há uma flexão de plural e) A cura = o médico.


grafada erradamente: O cura = ato de curar.
a) os escrivães serão beneficiados por esta lei.
b) o número mais importante é o dos anõezinhos. 7. Marque a alternativa em que haja somente substan-
c) faltam os hifens nesta relação de palavras. tivos sobrecomuns:
d) Fulano e Beltrano são dois grandes caráteres. a) pianista – estudante – criança;
e) os répteis são animais ovíparos. b) dentista – borboleta – comentarista;
c) crocodilo – sabiá – testemunha;
2. Assinale o par de vocábulos que fazem o plural da d) vítima – cadáver – testemunha;
mesma forma que “balão” e “caneta-tinteiro”: e) criança – desportista – cônjuge.
a) vulcão, abaixo-assinado;
b) irmão, salário-família;
c) questão, manga-rosa;
d) bênção, papel-moeda;
e) razão, guarda-chuva.

43
LÍNGUA PORTUGUESA

8. Aponte a seqüência de substantivos que, sendo ori- Grau normal: casa


ginalmente diminutivos ou aumentativos, perderam essa Grau analítico aumentativo: casa grande
acepção e se constituem em formas normais, independen- Grau analítico diminutivo: casa pequena
tes do termo derivante: Grau sintético aumentativo: casarão
a) pratinho – papelinho – livreco – barraca; Grau sintético diminutivo: casinha
b) tampinha – cigarrilha – estantezinha – elefantão;
c) cartão – flautim – lingüeta – cavalete; Quando tratamos do grau sintético aumentativo, al-
d) chapelão – bocarra – cidrinho – portão; guns sufixos são usados para essa função:
e) palhacinho – narigão – beiçola – boquinha.
9. Dados os substantivos “caroço”, “imposto”, “coco” e
“ovo”, conclui-se que, indo para o plural a vogal tônica soa- Sufixo Exemplos
rá aberta em: aça barcaça
a) apenas na palavra nº 1;
b) apenas na palavra nº 2; alha muralha
c) apenas na palavra nº 3; alhão grandalhão
d) em todas as palavras;
e) N.D.A. ão carrão
zarrão homenzarrão
10. Marque a alternativa que apresenta os femininos de
eirão vozeirão
“Monge”, “Duque”, “Papa” e “Profeta”:
a) monja – duqueza – papisa – profetisa; uça dentuça
b) freira – duqueza – papiza – profetisa; aréu povaréu
c) freira – duquesa – papisa – profetisa;
d) monja – duquesa – papiza – profetiza; astro poetastro
e) monja – duquesa – papisa – profetisa. alhaz facalhaz
(Exercícios retirados de http://www.portuguesconcurso. aço filmaço
com/2009/07/substantivo-exercicios-com-gabarito.html) orra cabeçorra

No tocante ao grau analítico aumentativo, é função de


GABARITO
alguns adjetivos dar ideia de aumento:
1. D grande
2. C imenso
3. E enorme
4. D gigante
5. C gigantesco
6. E descomunal
7. D grandíssimo
8. C
colossal
9. E
10. E
Já no grau diminutivo sintético, temos os seguintes sufixos:

GRAU DOS SUBSTANTIVOS – AUMENTATIVO E DI- Sufixo Exemplos


MINUTIVO
ilha cartilha
Substantivos são palavras que nomeiam os seres. E inho carrinho
como estes são múltiplos, com características diversas, o
substantivo precisa ser uma classe variável, alternando sua eto libreto
forma conforme gênero e número. E uma vez que os seres eta saleta
também possuem tamanhos distintos, uma variante possí-
vel do substantivo é o grau, podendo ser aumentativo ou ebre casebre
diminutivo. acho riacho
Há duas formas de realizar o grau aumentativo e o di-
ote filhote
minutivo: através do processo sintético (unindo ao radical
da palavra um sufixo correspondente ao aumentativo ou im espadachim
diminutivo) e o analítico (a partir da união de um adjetivo ejo lugarejo
que denota aumento ou diminuição). Vejamos:
eco, eca Jornaleco, soneca

44
LÍNGUA PORTUGUESA

No grau analítico diminutivo dispomos dos seguintes c) De estímulo: Força! Ânimo!


adjetivos: e) De surpresa: Caramba! Vixe!
pequeno f) De dor: Ai! Ui!
reduzido g) De alívio: Ufa!
minúsculo h) De desejo: Tomara! Oxalá!
pequenino i) De medo: Credo! Cruzes!
miúdo j) De concordância: Claro! Tá!
k) De desaprovação: Francamente! Xi!
l) De cumprimento: Alô!Olá!
EXERCÍCIOS m) De socorro: Socorro! Ajuda!
n) De afastamento: Sai! Xô!
1. Assinale a alternativa em que o substantivo em
destaque está flexionado no grau aumentativo ou di- NUMERAL
minutivo.
a) O médico disse-me que o problema era ocoração. Numeral é a classe gramatical que indica a quantidade
b) Atendi o vendedor noportão. de seres, assim como seu ordenamento em uma determi-
c) Oriachoé límpido. nada série. É considerado um satélite do substantivo dentro
d) Oferrãodo marimbondo é sua defesa. de um sintagma nominal já que determina o número dos
e) Muitascartilhasescolares foram encontradas no lixo. nomes e sua ordem em um enunciado. Veja os exemplos:
2. O plural diminutivo de “mulher” e “cão” é: a) Encontrei dois gatos no acampamento.
a) mulherzinhas e cãozinhos.
b) É para ingerir um terço da medicação.
b) mulherezinhas , cãezinhos.
c) Joana ficou em terceiro lugar no concurso.
c) mulherezinhas e cãosinhos.
Classificação dos numerais
d) mulheresinhas e cãezinhos.
e) mulhersinhas e cãesinhos.
Os numerais são classificados em cardinais, ordinais,
(Exercícios retirados de http://saladelinguaportuguesa- multiplicativos, fracionários e coletivos.
blog.blogspot.com.br/2014/05/exercicios-sobre-substanti-
vo-com.html) a) Numerais cardinais: apresentam a quantidade dos
seres em geral.
Ex.: um, dois, três, dez, vinte, cem, mil.
GABARITO
b) Numerais ordinais: indicam a ordem, posição de
1–C determinado ser.
2-B Ex.: primeiro, segundo, terceiro, quinto, décimo, vigé-
simo.

c) Numerais multiplicativos: determinam a quantida-


INTERJEIÇÃO de de vezes que um elemento foi multiplicado, fazendo re-
ferência a um aumento proporcional desse elemento.
A linguagem é um sistema de comunicação. E quando
Ex.: triplo, quádruplo, cêntuplo.
nos comunicamos com o outro, muitas vezes as palavras e
seus significados são insuficientes, no tocante à expressão
das emoções. Aí surgem as interjeições, palavras invariá- d) Numerais fracionários: indicam a segmentação, di-
veis que não constituem parte essencial numa frase, mas visão de um elemento através de frações.
têm como função exprimir sentimentos, emoções, reações Ex.: um terço, um quinto, dois terços, dois vinte avos.
do falante. Geralmente estão em frases exclamativas.
e) Numerais coletivos: referem-se, no singular, a um
Exemplos: conjunto de seres, apresentando um número exato dos
Ah! Uh-uh! Ui! (encontros vocálicos) mesmos.
Nossa! Jesus! (palavras) Ex.: uma dúzia, uma dezena, um cento.
Meu pai amado! Que pena! (locuções interjetivas= con-
junto de palavras com função de interjeição)

Classificação das interjeições e locuções interjetivas

a) De alegria: Viva! Opa!


b) De advertência: Atenção! Cuidado!

45
LÍNGUA PORTUGUESA

Veja o quadro explicativo:

Números Cardinais Ordinais Multiplicativos Fracionários Coletivos


1 um primeiro
duo, dueto,
2 dois segundo duplo ou dobro meio ou metade
dupla
3 três terceiro triplo ou tríplice terço trio
4 quatro quarto quádruplo quarto quarteto
5 cinco quinto quíntuplo quinto quinteto
6 seis sexto sêxtuplo sexto sexteto
7 sete sétimo séptuplo sétimo
8 oito oitavo óctuplo oitavo
9 nove nono nónuplo nono novena
dezena, déca-
10 dez décimo décuplo décimo
da
undécimo ou décimo undécimo ou onze
11 onze undécuplo
primeiro avos
duodécimo ou décimo duodécimo ou
12 doze duodécuplo dúzia
segundo doze avos
13 treze décimo terceiro treze avos
14 catorze décimo quarto catorze avos
15 quinze décimo quinto quinze avos
dezesseis
16 décimo sexto dezesseis avos
(dezasseis)
dezessete
17 décimo sétimo dezassete avos
(dezessete)
18 dezoito décimo oitavo dezoito avos
dezenove
19 décimo nono dezenove avos
(dezanove)
20 vinte vigésimo vinte avos
21 vinte e um vigésimo primeiro vinte e um avos
30 trinta trigésimo trinta avos
40 quarenta quadragésimo quarenta avos
50 cinquenta quinquagésimo cinquenta avos
60 sessenta sexagésimo sessenta avos
70 setenta septuagésimo setenta avos
80 oitenta octogésimo oitenta avos
90 noventa nonagésimo noventa avos
100 cem centésimo cêntuplo centésimo centena, cento
200 duzentos ducentésimo duzentos avos
300 trezentos tricentésimo trezentos avos
400 quatrocentos quadrigentésimo quatrocentos avos
500 quinhentos quingentésimo quinhentos avos
600 seiscentos seiscentésimo seiscentos avos

46
LÍNGUA PORTUGUESA

Números Cardinais Ordinais Multiplicativos Fracionários Coletivos


700 setecentos septigentésimo setecentos avos
800 oitocentos octigentésimo oitocentos avos
900 novecentos nongentésimo novecentos avos
1 000 mil milésimo milésimo milhar
10 000 dez mil dez milésimos dez mil avos
100 000 cem mil cem milésimos cem mil avos
1 000 000 um milhão milionésimo milionésimo
um bilhão
1 000 000 000 bilhonésimo bilhonésimo
(mil milhões)
1 000 000 000 um trilhão trilhonésimo (bilioné- trilionésimo (bilio-
000 (um bilhão) simo) nésimo)

Flexão dos numerais

Por ser uma classe gramatical do substantivo, o numeral pode apresentar variação de gênero e número, a fim de esta-
belecer concordância.

a) Variação dos numerais cardinais: os cardinais apresentam pouca variação de gênero, limitando-se aos seguintes
casos: um, uma, dois, duas, e centenas a partir de duzentos, duzentas, trezentos, trezentas etc… Quanto à variação de nú-
mero, verificamos os casos de milhão, milhões, bilhão, bilhões, trilhão, trilhões.

b) Variação dos numerais ordinais: apresentam variação de gênero e número. Ex.: primeiro, primeira, primeiros, pri-
meiras, segundo, segunda, segundos, segundas…

c) Variação dos numerais multiplicativos: são invariáveis quando não se tratar de adjetivos, qualificando um subs-
tantivo.
Ex.: João tem o duplo do salário de Maria. (numeral invariável)
Maria tem dupla função na empresa. (adjetivo variável).

d) Variação dos numerais fracionários: podem apresentar variação de gênero e número, variação esta condicionada
pelo cardinal que anteceder o fracionário.
Ex.: Comprei um quarto do terreno.
Comprei dois quartos do lote.

Foi vendido um terço do prédio.


Foi vendida uma terça parte da empresa.

e) Variação dos numerais coletivos: variam apenas em número. Ex.: uma dúzia, duas dúzias, um cento, dois centos.

EXERCÍCIOS

1) Identifique se o termo destacado é numeral ou artigo indefinido.


a) Você só tem uma vida. Cuide bem dela.
b) Ele não fala uma palavra de chinês!
c) Aqueles invasores podem representar uma ameaça para os índios.
d) A decomposição desse material pode demorar um século.

47
LÍNGUA PORTUGUESA

2) Alguns substantivos ou adjetivos podem ser empre- existir paralelamente é, devido ao estágio primitivo de nos-
gados para indicar quantidades numéricas. Identifique es- so conhecimento científico, uma questão de fé. Sem essa fé
sas palavras em cada texto e escreva seu significado. eu não poderia ter uma convicção firme e inabalável acerca
a) Após uma década de perseguição, Maomé e seus se- do valor independente do conhecimento.
guidores migraram para Medina, a cerca de 300 quilôme- Essa atitude de certo modo religiosa de um homem
tros de Meca. O profeta veio a governar a cidade e, vários engajado no trabalho científico tem influência sobre toda
anos depois, ele e um pequeno exército de fiéis retornaram sua personalidade. Além do conhecimento proveniente da
a Meca. (National Geographic) experiência acumulada, e além das regras do pensamento
b) Há pouco mais de um século, os imigrantes trouxe- lógico, não existe, em princípio, nenhuma autoridade cujas
ram agitação para a cidade de São Paulo. Sua grande rique- confissões e declarações possam ser consideradas “Verda-
za é a sua diversidade cultural, constituída de mais de 70 de “ pelo cientista. Isso leva a uma situação paradoxal: uma
grupos étnicos e nacionais. (Folha de S. Paulo) pessoa que devota todo seu esforço a objetivos materiais
c) Numa vaquejada que houve na fazenda vieram todos se tornará, do ponto de vista social, alguém extremamente
os vaqueiros daquelas bandas. Meu pai matou meia dúzia individualista, que, a princípio, só tem fé em seu próprio
julgamento, e em nada mais. É possível afirmar que o indi-
de vacas e abriu pipas de vinho branco para quem quisesse
vidualismo intelectual e a sede de conhecimento científico
beber. Nunca se tinha dado festa igual.(Graciliano Ramos)
apareceram simultaneamente na história e permaneceram
d) A educação indígena diferenciada e bilíngue no Acre inseparáveis desde então. “
ainda tem um longo caminho a percorrer. A maior parte (Einstein, in: “O Pensamento Vivo de Einstein”, p. 13
dos professores só leciona do 1º ao 5º ano, mas já há um e 14, 5a. edição, Martin Claret Editores)
grupo ensinando do 6º ao 9º ano.(O Estado de S. Paulo)
e) Durante o Festival Toonik Tyme, os inuits, habitantes Observe:
do ártico canadense, revivem seus costumes milenares.
I. “Essa atitude de certo modo religiosa de ‘um’ homem
3) (UFPI)Aponte a alternativa em que os numerais estão engajado no trabalho...”
bem empregados. II. “Pedro comprou ‘um’ jornal”
a) Ao papa Paulo Seis sucedeu João Paulo Primeiro. III. “Maria mora no apartamento ‘um’.”
b) Após o parágrafo nono virá o parágrafo décimo. IV. “Quantos namorados você tem?” ‘Um’.
c) Depois do capítulo sexto, li o capitulo décimo pri-
meiro. A palavra “um” nas frases acima é, no plano morfológi-
d)Antes do artigo dez vem o artigo nono. co, respectivamente:
e) O artigo vigésimo segundo foi revogado. a) artigo indefinido em I e numeral em II, III e IV.
b) artigo indefinido em I e II e numeral em III e IV.
c) artigo indefinido em I e III e numeral em II e IV.
4) (Unitau)
d) artigo indefinido em I, II, III e IV.
“Vivemos numa época de tamanha insegurança externa e) artigo indefinido em III e IV e numeral em I e II.
e interna, e de tamanha carência de objetivos firmes, que
a simples confissão de nossas convicções pode ser impor- (Exercícios retirados de http://tudodeconcursosevesti-
tante, mesmo que essas convicções, como todo julgamen- bulares.blogspot.com.br/2013/01/numeral-classificacao-e-
to de valor, não possam ser provadas por deduções lógicas. -flexao.html)
Surge imediatamente a pergunta: podemos considerar
a busca da verdade - ou, para dizer mais modestamente, GABARITO
nossos esforços para compreender o universo cognoscí-
vel através do pensamento lógico construtivo - como um 1 -Numeral, Artigo, Artigo, Numeral
objeto autônomo de nosso trabalho? Ou nossa busca da 2. década(dez anos), século(cem anos), meia dúzia(seis),
verdade deve ser subordinada a algum outro objetivo, bilíngue( duas línguas), milenares(mil anos).
de caráter prático, por exemplo? Essa questão não pode 3-D
ser resolvida em bases lógicas. A decisão, contudo, terá 4-B
considerável influência sobre nosso pensamento e nosso
julgamento moral, desde que se origine numa convicção
profunda e inabalável Permitam-me fazer uma confissão: PREPOSIÇÃO
para mim, o esforço no sentido de obter maior percepção
Preposição é a classe invariável cuja função é ligar dois
e compreensão é um dos objetivos independentes sem os termos entre si, subordinando um ao outro, criando uma
quais nenhum ser pensante é capaz de adotar uma atitude relação de sentido.
consciente e positiva ante a vida. Chamamos de regente o termo que antecede a prepo-
Na própria essência de nosso esforço para compreen- sição e regido o que a sucede
der o fato de, por um lado, tentar englobar a grande e
complexa variedade das experiências humanas, e de, por Ex.:
outro lado, procurar a simplicidade e a economia nas hipó- 1) Esta é uma casa de barro.
teses básicas. A crença de que esses dois objetivos podem Termo regente: casa
Termo regido: barro

48
LÍNGUA PORTUGUESA

2) Voltou para casa a pé de uma duma


Termo regente: casa
Termo regido: pé em um num
Podemos perceber nos exemplos acima que, além de em uma numa
unir dois termos entre si, as preposições “de” e “a” também
criam uma relação de sentido entre as palavras interligadas. em o no
No primeiro, “de barro” informa o material do qual é feita a em a na
casa e, no segundo, o instrumento da caminhada.
As preposições são dividades em essenciais e acidentais.
As preposições essenciais (aquelas que somente funcio- Preposição antecedendo o sujeito do verbo
nam como preposição) são: Não é correto realizar a contração da preposição “de”
A – ante – até- após- com- contra- de- desde – em –
com o artigo que determina o sujeito de um verbo:
entre – para – perante - - por – sem – sob – sobre - trás
Está na hora de a menina começar a estudar (e não “da
menina começar a estudar”)
Já as acidentais consistem em palavras advindas de ou-
tras classes gramaticais que podem atuar como preposições:
Valores semânticos da preposição
Como – conforme – consoante – exceto – mediante –
salvo – segundo – senão
Lugar Está em Brasília
EMPREGO DAS PREPOSIÇÕES Origem Veio do Sul
Considerando que as preposições unem termos entre Causa Morreu de fome
si, criando uma relação de sentido, elas podem se unir a Assunto O livro é sobre política
outras classes gramaticais, tais como artigo e pronome, a
fim de promover esse elo significativo. Neste caso, haverá Meio Veio de avião
os processos que chamamos de contração e combinação. Posse O livro é do João

Combinação
Matéria A mesa é de madeira
Chamamos de combinação a união da preposição a ou- Companhia Vim com Pedro
tra classe gramatical, sem perda fonética ou estrutural. Ou Ausência Estou sem ânimo
seja, a união mantém a estrutura das duas classes unidas.
Modo Fique à vontade
Preposição Classe gramatical Combinação Tempo Dias após dia
a O (artigo) ao Instrumento Cortou a linha com a tesoura
a Os (artigo) aos Especialidade Ela é formada em Medicina
a Onde (pronome) aonde Oposição Ele é contra a reforma
Finalidade O livro é para educar-se
Contração
Aqui a união da preposição com outra classe gramatical
Locução Prepositiva
garante perda fonética e transformação da estrutura das
É a união de duas ou mais palavras com a função de
classes unidas.
preposição.

Preposição Classe Gramatical Contração


A despeito de
a a à
A fim de
de o do
Através de
de a da
Perto de
por a pela
Ao encontro de
por o pelo
Antes de
em aquele naquele
Acerca de
em aquela naquela
Embaixo de
de entre dentre
Em cima de
de um dum
De acordo com

49
LÍNGUA PORTUGUESA

EXERCÍCIOS d) “Trancava-me no quarto fugindo do aperreio, matan-


do-as com jornais.”
01. Indique a alternativa correta quanto ao valor se- e) “Andavam por cima do papel estendido com outras
mântico das preposições nas frases abaixo. já pregadas no breu.”
a) Morreu de pneumonia. (doença)
b) Falava de política. (modo) (Exercícios retirados de http://www.gramaticaparacon-
c) Morava numa casa de madeira. (matéria) cursos.com/2014/05/preposicoes-exercicios.html)
d) Veio de ônibus. (companhia)
e) Ele chegou de Lisboa. (nacionalidade) GABARITO

02. (Ufac) “O que desejava... Ah! Esquecia-se. Agora 1–c


se descordava da viagem que tinha feito pelo sertão, a 2–a
cair de fome.”(Graciliano Ramos). A alternativa em que a 3–e
preposiçãodeexpressa a mesma ideia que possui em “...a 4–e
cairdefome” é: 5–b
a) De tanto gritar, sua voz ficou rouca. 6–c
b) De grão em grão, a galinha enche o papo.
c) De noite todos os gatos são pardos. VERBO
d) Chegaram cedo de Cruzeiro do Sul.
e) Trazia no bolso uma caneta de prata. Verbo é a classe gramatical que indica ações, estados,
emoções e fenômenos climáticos.
03. (Fameca-SP) As relações expressas pelas prepo-
sições estão corretas na sequência: Ex.:
I. Saí com ela. a) O médico operou o doente. (ação)
II. Ficaram sem um tostão. b) Rodrigo está doente. (estado)
III. Esconderam o lápis de Maria. c) Maria permanece chorosa. (estado, emoção)
IV. Ela prefere viajar de navio. d) Chove muito em Brasília. (fenômeno climático)
V. Estudou para passar.
a) falta; companhia; posse; meio; fim 1) As flexões do verbo
b) companhia; falta; posse; fim; meio O verbo é uma classe complexa, pois apresenta uma sé-
c) companhia; posse; falta; meio; fim rie de variações e flexões. Pode variar em número, pessoa,
d) companhia; falta; meio; posse; fim tempo, modo e voz:
e) companhia; falta; posse; meio; fim
a) Flexão de número:
04. (UFPA) No trecho: “(O Rio) não se industrializou, Singular (um sujeito)
deixou explodir a questão social, fermentada por mais Plural (mais de um sujeito)
de dois milhões de favelados, e inchou, à exaustão, uma
máquina administrativa que não funciona...”, a prepo- b) Flexão de pessoa:
sição a (que está contraída com o artigo a) traduz uma 1º pessoa (emissor: eu, nós)
relação de: 2º pessoa (receptor: tu, vós)
a) fim 3º pessoa (assunto: ele, ela, eles, elas)
b) causa
c) concessão c) Flexão de modo:
d) limite Indicativo
e) modo Subjuntivo
Imperativo
05 (INATEL) Assinale a alternativa em que a norma d) Flexão de tempo
culta não aceita a contração da preposição de: Pretéritos
a) Aos prantos, despedi-medela.
Presente
b) Está na horadacriança dormir.
Futuro
c) Falavadascolegas em público.
d) Retirei os livrosdasprateleiras para limpá-los.
e) Flexão de voz
e) O localdachacina estava interditado.
Voz ativa
06. (CESGRANRIO) Assinale a opção em que a pre- Voz passiva
posição com traduz uma relação de instrumento: Voz reflexiva
a) “Teria sorte nos outros lugares, com gente estranha.”
b) “Com o meu avô cada vez mais perto de mim, o San- 2) A estrutura do verbo
ta Rosa seria um inferno.” Radical CANT – VEND – PART
c) “Não fumava, e nenhum livro com força de me prender.” Vogal Temática: A – E – I
Desinências – R – MOS – S

50
LÍNGUA PORTUGUESA

Chamamos de tema a união do radical com a vogal temática, que possui a função de apresentar a conjugação do verbo.
- Verbos de 1º conjugação: (vogal temática a) – cantar, amar, sonhar, falar
- Verbos de 2º conjugação: (vogal temática e) – comer, vender, escreve
- Verbos de 3º conjugação: (vogal temática i) – partir, sorrir, exibir

Observação: verbos como por, compor são considerados de 2º conjugação devido a sua forma arcaica poer.
A conjugação verbal influencia a flexão dos verbos. Vejamos:

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-o Vend-o Part-o
Cant-a-s Vend-e-s Part-es
Cant-a Vend-e Part-e
Cant-a-mos Vend-e-mos Part-i-mos
Cant-a-is Vend-e-is Part-is
Cant-a-m Vend-e-m Part-em

3) Modos verbais
Indicam o modo com o qual o falante se posiciona frente a ação verbal. Por isso os modos são:
a) Indicativo: indica certeza, ação certa
b) Subjuntivo: hipótese, dúvida
c) Imperativo: ordem, pedido.

4) Tempos verbais
Os tempos verbais se referem ao tempo em que a ação foi realizada. Surgem nos modos indicativo e subjuntivo.
O modo indicativo, por indicar ação certa, é o que mais apresenta flexões de tempo:
- Presente do Indicativo: o verbo é conjugado no tempo presente em que a ação é feita
- Pretérito Perfeito do Indicativo: ação já foi finalizada em tempo passado.
- Pretérito mais que perfeito do Indicativo – ação foi feita em tempo remoto
- Pretérito Imperfeito do Indicativo – ação tida como hábito no tempo passado
- Futuro do Presente: ação que será realizada no futuro
- Futuro do Pretérito: ação condicionada por outra ação verbal.

Vejamos os diversos tempos verbais nos verbos das três conjugações:

- Presente do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-o Vend-o Part-o
Cant-a-s Vend-e-s Part-es
Cant-a Vend-e Part-e
Cant-a-mos Vend-e-mos Part-i-mos
Cant-a-is Vend-e-is Part-is
Cant-a-m Vend-e-m Part-em

51
LÍNGUA PORTUGUESA

- Pretérito Perfeito do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-ei Vend-i Part-i
Cant-a-ste Vend-e-ste Part-i -ste
Cant-ou Vend-e -u Part-i-u
Cant-a-mos Vend-e-mos Part-i-mos
Cant-a-stes Vend-e-stes Part-i -stes
Cant-a-ra-m Vend-e - ram Part-i-ram

- Pretérito mais que perfeito do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-a- ra Vend-e- ra Part-i- ra
Cant-a-ra -s Vend-e-ra -s Part-i -ra -s
Cant-a -ra Vend-e - ra Part-i -ra
Cant-á- ra -mos Vend-e-ra -mos Part-i-ra -mos
Cant-a- re-is Vend-e-re -is Part-i-re -is
Cant-a- ra -m Vend-e-ra-m Part-i-ra -m

- Pretérito Imperfeito do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-a -va Vend-ia Part-ia
Cant-a-va-s Vend-ia-s Part-ia-s
Cant-a -va Vend-ia Part-ia
Cant-á-va- mos Vend-ía-mos Part-ía-mos
Cant-á-ve -is Vend-íe-is Part-íe-is
Cant-a-va -m Vend-ia-m Part-ia-m

- Futuro do Presente do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-a -re-i Vend-e -re-i Part-i -re- i
Cant-a-rá-s Vend-e-rá-s Part-i -rá -s
Cant-a - rá Vend-e-rá Part-i -rá
Cant-á-re- mos Vend-e -re-mos Part-i -re -mos
Cant-a-re-is Vend-e -re -is Part-i – re -is
Cant-a-rão Vend-e- rão Part-i -rão

52
LÍNGUA PORTUGUESA

- Futuro do pretérito do Indicativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Cant-a -ria Vend-e -ria Part-i -ria
Cant-a-ria -s Vend-e-ria -s Part-i -ria -s
Cant-a - ria Vend-e-ria Part-i -ria
Cant-a-ría - mos Vend-e -ría -mos Part-i -ría -mos
Cant-a-ríe-is Vend-e -ríe -is Part-i – ríe -is
Cant-a-ria- m Vend-e- ria -m Part-i -ria-m

5) O Modo Subjuntivo
É o que apresenta a ação verbal enquanto hipótese, dúvida. Apresenta três tempos, o presente do subjuntivo, o imper-
feito do subjuntivo e o futuro do subjuntivo.

a) Presente do subjuntivo
Indica hipótese e sua construção se dá através da substituição da vogal temática pela vogal de subjuntivo. Em verbos
de primeira conjugação se substitui a vogal temática “a” por “e”, nos verbos de segunda e terceira conjugação se substitui
as vogais “e” e “i” por “a”:

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Que eu cant-e Que eu vend-a Que eu part-a
Que tu cant-e- s Que tu vend-a -s Que tu part-a -s
Que ele cant-e Que ele vend-a Que ele part-a
Que nós cant-e- mos Que nós vend-a -mos Que nós part-a -mos
Que vós cant-e-is Que vós vend-a-is Que vós part-a -is
Que eles cant-e- m Que eles vend-a -m Que eles part-a-m

b) Imperfeito do Subjuntivo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


se eu cant-a-sse se eu vend-e-sse se eu part-i-sse
se tu cant-a-sse- s se tu vend-e-sse -s se tu part-i-sse -s
se ele cant-a-sse se ele vend-e-sse se ele part-i-sse
se nós cant-á-sse- mos se nós vend-ê-sse -mos se nós part-í-sse -mos
se vós cant-á-sse-is se vós vend-ê-sse-is se vós part-í-sse -is
se eles cant-a-sse- m se eles vend-e-sse -m se eles part-i-sse-m

c) Futuro do Subjuntivo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


quando eu cant-a-r quando eu vend-e-r quando eu part-i-r
quando tu cant-a-re- s quando tu vend-e-re -s quando tu part-i-re -s
quando ele cant-a-r quando ele vend-e-r quando ele part-i-r
quando nós cant-a-r- mos quando nós vend-e-r -mos quando nós part-i-r -mos
quando vós cant-a-rdes quando vós vend-e-rdes quando vós part-i-rdes
quando eles cant-a-re- m quando eles vend-e-re -m quando eles part-i-re-m

53
LÍNGUA PORTUGUESA

6) Modo Imperativo

O modo imperativo está ligado à ideia de ordem e pedido. Aqui temos o Modo Imperativo Afirmativo e o Imperativo
Negativo. A construção do Imperativo Afirmativo se dá reaproveitando desinências do modo indicativo e subjuntivo. Além
do mais, vale lembrar que este modo não é flexionado na 1º pessoa do singular.
2º pessoa do singular (tu) – presente do indicativo sem o “s”
3º pessoa do singular (você) – presente do subjuntivo
1º pessoa do plural (nós) – presente do subjuntivo
2º pessoal do plural (vós) – presente do indicativo sem o “s”
3º pessoa do plural (vocês) – presente do subjuntivo

Observação: por ser ordem direta não usamos o ele, eles, e sim o você (s), que possui a mesma flexão.

Imperativo Afirmativo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Canta tu Vende tu Parte tu
Cante você Venda você Parta você
Cantemos nós Vendamos nós Partamos nós
Cantai vós Vendei vós Parti vós
Cantem vocês Vendam vocês Partam vocês

Imperativo Negativo

No Imperativo Negativo usamos a mesma flexão do presente do subjuntivo

1º conjugação 2º conjugação 3º conjugação


Não cantes tu Não vendas tu Não partas tu
Não cante você Não venda você Não parta você
Não cantemos nós Não vendamos nós Não partamos nós
Não canteis vós Não vendais vós Não partais vós
Não cantem vocês Não vendam vocês Não partam vocês

7) Formas Nominais dos Verbos


Nas formas nominais dos verbos não temos flexão de modo e tempo. Podem exercer a função de verbo ou nome:
a) Infinitivo: cantar, amar, vender, partir, sorrir
b) Gerúndio: cantando, vendendo, partindo, amando, comendo
c) Particípio: vendido, comprado, amado, partido

8) Classificação dos Verbos:


a) Regulares: Verbos que apresentam flexões regulares, usando as desinências tradicionais. Ex.: cantar, amar, comer,
vender, partir
b) Irregulares: Verbos que apresentam flexões próprias, não utilizando as desinências regulares. Ex.: trazer, ir, fazer, dar,
poder

Presente do Indicativo

Trazer Fazer Poder


Trago Faço Posso
Trazes Fazes Podes
Traz Faz Pode
Trazemos Fazemos Podemos
Trazeis Fazeis Podeis
Trazem Fazem Podem

54
LÍNGUA PORTUGUESA

Pretérito Perfeito

Trazer Fazer Poder


Trouxe Fiz Pude
Trouxeste Fizeste Pudeste
Trouxe Fez Pôde
Trouxemos Fizemos Pudemos
Trouxestes Fizestes Pudestes
Trouxeram Fizeram Puderam

Pretérito mais que perfeito

Trazer Fazer Poder


Trouxera Fizera Pudera
Trouxeras Fizeras Puderas
Trouxera Fizera Pudera
Trouxéramos Fizéramos Pudéramos
Trouxéreis Fizéreis Pudéreis
Trouxeram Fizeram Puderam

Pretérito Imperfeito

Trazer Fazer Poder


Trazia Fazia Podia
Trazias Fazias Podias
Trazia Fazia Podia
Trazíamos Fazíamos Podíamos
Trazíeis Fazíeis Podíeis
Traziam Faziam Podiam

Futuro do Presente

Trazer Fazer Poder


Trarei Farei Poderei
Trarás Farás Poderás
Trará Fará Poderá
Traremos Faremos Poderemos
Trareis Fareis Podereis
Trarão Farão Poderão

c) Principais: em uma locução verbal (conjunto de dois verbos) são os verbos que apresentam a informação principal
referente à ação. Ex.: comprar, amar, vender...

d) Auxiliares: em uma locução verbal, são os verbos com pouco força semântica que apresentam informação gramati-
cal de tempo e pessoa. Ex.: ser, ir, estar…

55
LÍNGUA PORTUGUESA

Ser

Presente do Indicativo Pretérito Perfeito do Indicativo Pretérito mais que perfeito do In-
dicativo
Sou Fui Fora
És Foste Foras
É Foi Fora
Somos Fomos Fôramos
Sois Fostes Fôreis
São Foram Foram

Pretérito Imperfeito do Indicativo Futuro do Presente do Indicativo Futuro do Pretérito do Indicativo


Era Serei Seria
Eras Serás Serias
Era Será Seria
Éramos Seremos Seríamos
Éreis Sereis Seríeis
Eram Serão Serão

Presente do Subjuntivo Imperfeito do Subjuntivo Futuro do Subjuntivo


Que eu seja Se eu fosse Quando eu for
Que tu sejas Se tu fosses Quando tu fores
Que ele seja Se ele fosse Quando ele for
Que nós sejamos Se nós fôssemos Quando nós formos
Que vós sejais Se vós fôsseis Quando vós fordes
Que eles sejam Se eles fossem Quando eles forem

Imperativo Afirmativo Imperativo Negativo


Sê tu Não sejas tu
Seja você Não seja você
Sejamos nós Não sejamos nós
Sede vós Não sejais vós
Sejam vocês Não sejam vocês

Estar

Presente do Indicativo Pretérito Perfeito do Indicativo Pretérito mais que perfeito do In-
dicativo
Estou Estive Estivera
Estás Estiveste Estiveras
Está Esteve Estivera
Estamos Estivemos Estivéramos
Estais Estivestes Estivéreis
Estão Estiveram Estiveram

56
LÍNGUA PORTUGUESA

Pretérito Imperfeito do Indicativo Futuro do Presente do Indicativo Futuro do Pretérito do Indicativo


Estava Estarei Estaria
Estavas Estarás Estarias
Estava Estará Estaria
Estávamos Estaremos Estaríamos
Estáveis Estareis Estaríeis
Estavam Estarão Estariam

Presente do Subjuntivo Imperfeito do Subjuntivo Futuro do Subjuntivo


Que eu esteja Se eu estivesse Quando eu estiver
Que tu estejas Se tu estivesses Quando tu estiveres
Que ele esteja Se ele estivesse Que ele estiver
Que nós estejamos Se nós estivéssemos Quando nós estivermos
Que vós estejais Se vós estivésseis Quando vós estiverdes
Que eles estejam Se eles estiveram Quando eles estiverem

Imperativo Afirmativo Imperativo Negativo


Está tu Não estejas tu
Esteja você Não esteja você
Estejamos nós Não estejamos nós
Estai vós Não estejais vós
Estejam vocês Não estejam vocês

e) Anômalos: verbos que, quando conjugados, apresentam radicais distintos do radical primitivo.
Ex.: Eu sou, Eu era, Eu Fui…

Ir

Presente do Indicativo Pretérito Perfeito do Indicativo Pretérito mais que perfeito do In-
dicativo
Vou Fui Fora
Vais Foste Foras
Vai Foi Fora
Vamos Fomos Fôramos
Ides Fostes Fôreis
Vão Foram Foram

Pretérito Imperfeito do Indicativo Futuro do Presente do Indicativo Futuro do Pretérito do Indicativo


Ia Irei Iria
Ias Irás Irias
Ia Irá Iria
Íamos Iremos Iríamos
Íeis Ireis Iríeis
Iam Irão Iriam

57
LÍNGUA PORTUGUESA

Presente do Subjuntivo Imperfeito do Subjuntivo Futuro do Subjuntivo


Que eu vá Se eu fosse Quando eu for
Que tu vás Se tu fosses Quando tu fores
Que ele vá Se ele fosse Quando ele for
Que nós vamos Se nós fôssemos Quando nós formos
Que vós vades Se vós fôsseis Quando vós fordes
Que eles vão Se eles fossem Quando eles foram

Imperativo Afirmativo Imperativo Negativo


Vai tu Não vás tu
Vá você Não vá você
Vamos nós Não vamos nós
Ide vós Não vades vós
Vão vocês Não vão vocês

f) Defectivos: verbos que não apresentam conjugação completa, em algumas pessoas verbais. Ex,: Polir, banir

Polir – Presente do Indicativo Banir – Presente do Indicativo


x x
x x
x x
Polimos banimos
Polis banis
x c

g) Abundantes: verbos que apresentam duas formas equivalentes no particípio, uma regular e um
irregular. Ex.: Aceitar = aceito, aceitado

Verbos abundantes da 1.ª conjugação


Verbo aceitar: aceitado (regular) e aceito (irregular)
Verbo entregar: entregado (regular) e entregue (irregular)
Verbo ganhar: ganhado (regular) e ganho (irregular)
Verbo matar: matado (regular) e morto (irregular)
Verbo pagar: pagado (regular) e pago (irregular)
Verbo pegar: pegado (regular) e pego (irregular)
Verbo salvar: salvado (regular) e salvo (irregular)

Verbos abundantes da 2.ª conjugação


Verbo acender: acendido (regular) e aceso (irregular)
Verbo eleger: elegido (regular) e eleito (irregular)
Verbo envolver: envolvido (regular) e envolto (irregular)
Verbo morrer: morrido (regular) e morto (irregular)
Verbo prender: prendido (regular) e preso (irregular)
Verbo revolver: revolvido (regular) e revolto (irregular)
Verbo suspender: suspendido (regular) e suspenso (irregular)
Verbos abundantes da 3.ª conjugação
Verbo expelir: expelido (regular) e expulso (irregular)
Verbo : exprimir exprimido (regular) e expresso (irregular)
Verbo extinguir: extinguido (regular) e extinto (irregular)
Verbo frigir: frigido (regular) e frito (irregular)
Verbo imprimir: imprimido (regular) e impresso (irregular)

58
LÍNGUA PORTUGUESA

Verbo incluir: incluído (regular) e incluso (irregular) EXERCÍCIOS


Verbo submergir: submergido (regular) e submerso (ir-
regular) 01.(MED – SANTOS) Assinale a frase inteiramente cor-
reta:
h) Verbos Intransitivos: verbos que não necessitam de a) Se você requisesse e seu advogado intervisse, talvez
complemento. Ex.: viajar, dormir, morrer, nascer. reavesse todos os seus bens.
i) Verbos Transitivo Diretos: Verbos que necessitam b) Se você requeresse e seu advogado interviesse, tal-
de complemento, mas sem a necessidade de preposição. vez reouvesse todos os seus bens.
Ex.: Comprar, vender, falar c) Se você requizesse e seu advogado intervesse, talvez
j) Verbos Transitivos Indiretos: Verbos que se ligam reaveria todos os seus bens.
ao complemento com o auxílio de preposição. Ex.: precisar d) Se você requisesse e seu advogado intervesse, talvez
(de), necessitar (de) reaveria todos os seus bens.
k) Verbos de Ligação: verbos com pouca força semân- e) Se você requeresse e seu advogado intervisse, talvez
tica que ligam o sujeito a seu predicativo (qualidade). Ex.: reouvesse todos os seus bens.
ser, estar, permanecer, ficar, continuar, andar…
l) Verbos unipessoais: verbos que apresentam uma 02.(MED – SANTOS) A forma que pode estar no futuro
única pessoa verbal. Ex.: Latir, miar, coaxar. do subjuntivo é:
m) Verbos impessoais: verbos que não possuem sujei- a) Quando virdes a realidade dos fatos…
to. São eles os que indicam fenômenos climáticos (chover, b) Se irmos diretamente ao assunto…
nevar), haver (no sentido de existir), fazer (indicando tem- c) Quando vos verdes em idênticas situações…
po decorrido). Assim sendo permanecem na 3º pessoa do d) Se susterdes a palavra…
singular. e) Se vós imposerdes a vossa idéia…
n) Verbos pronominais: verbos que exigem pronome.
Ex.: queixar-se, arrepender-se. 03.(UFF) Assinale a frase em que há um erro de conju-
gação verbal:
a) Requeiro-lhe um atestado de bons antecedentes.
Locução Verbal
b) Ele interviu na questão.
c) Eles foram pegos de surpresa.
Chamamos de locução o conjunto de palavras que
d) O vendeiro proveu o seu armazém do necessário.
exercem a função de uma única. No caso de locução verbal,
e) Os meninos desavieram-se por causa do jogo.
é quando dois verbos cumprem a função que poderia ser
exercida por um só verbo.
04.(UFF) Assinale a série em que estão devidamente
classificadas as formas verbais destacadas:
Ex.: “Ao chegar da fazenda, espero que já tenha terminado
Eu comprarei esta casa. - Aqui verificamos um único a festa”.
verbo, cujo radical nos dá a informação temporal e as desi-
a) futuro do subjuntivo, pretérito perfeito do subjuntivo
nências informações gramaticais (pessoa, tempo e número).
b) infinitivo, presente do subjuntivo
Eu vou comprar esta casa. - Já neste caso temos a pre-
c) futuro do subjuntivo, presente do subjuntivo
sença de dois verbos: um auxiliar: “vou”, o qual contém a
d) infinitivo, pretérito imperfeito do subjuntivo
informação de tempo e pessoa, e “comprar” que possui a
e) infinitivo, pretérito perfeito do subjuntivo
informação semântica.
Em uma locução verbal sempre verificamos dois verbos:
um auxiliar + um principal. Veja outros exemplos: 05.(ENG – MACK) Só muito mais tarde vim, a saber, que
a chuva os ___________ na estrada e que não _________ nin-
a) Ainda estou estudando para a avaliação. guém que ______________.
Estou – verbo auxiliar a) detera; houve; os ajudasse;
Estudando – verbo principal b) detivera; houve; os ajudasse;
c) detera; teve; ajudasse eles;
b) João veio chorando. d) detivera; houve; ajudasse eles;
Veio – verbo auxiliar e) detivera; teve; os ajudasse.
Chorando – verbo principal
06.(FEB) “Ele ___________ o carro a tempo, mas não
c) Pode acontecer mais disso. ____________ a irritação e ___________ – se com o outro mo-
Pode – Verbo auxiliar torista”.
Acontecer – verbo principal a) freou – conteve – desaveio
b) freiou – conteu – desaveu
c) freou – conteve – desaviu
d) freiou – conteve – desaveio
e) N. D. A.

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LÍNGUA PORTUGUESA

07.(FEB) Assinale a alternativa que completa adequada- f) Pronomes Possessivos;


mente as lacunas: g) Pronomes de Tratamento.
“Visto que a democratização do ensino é uma necessi-
dade, a escola pública ___________ de ser realmente apoiada PRONOMES PESSOAIS
e defendida, embora muitos _______________ pois abaixa-
mento de nível”. Pronomes pessoais são os que substituem as pessoas
a) tenha – contestem – haveria do discurso (emissor, receptor, assunto) e se dividem em:
b) tem – contestam – há
c) tem – contestam – haveria a) Pronomes pessoais do caso reto: substituem o
d) tem – contestem – haveria nome e exercem a função de sujeito do verbo (ou seja, de-
e) N.D.A. termina a flexão verbal).
Ex.: Nós compramos muitos presentes.
08.Se ele _________, não ___________ de rogado, ___________
que não os receberei. b) Pronomes pessoais do caso oblíquo: substituem o
a) vir – te faças – diz-lhe substantivo e complementam o verbo (não determinando,
b) vier – te faz – diz-lhe assim, a flexão verbal).
c) vir – te faça – dizer-lhe Ex.: Você encontrou Maria nas últimas semanas? Faz
d) vier – te faças – dize-lhe tempo que não a vejo.
e) ier – te faças – diga-lhe Atente à tabela abaixo para entender melhor sobre os
pronomes pessoais.
(Exercícios retirados de http://www.coladaweb.com/
exercicios-resolvidos/exercicios-resolvidos-de-portugues/ Pessoas verbais Pronomes Pronomes pes-
verbos) pessoais do soais do caso
caso reto oblíquo
1º pessoa do sin- Eu Me, mim, comigo
GABARITO
gular
1–b 2º pessoa do sin- Tu Te, ti, contigo
2–a gular
3–b 3º pessoa do sin- Ele, Ela O, a, lhe, se, si,
4–e gular consigo
5–b
6–a 1º pessoa do plural Nós Nos, conosco
7–d 2º pessoa do plural Vós Vos, convosco
8–d
3º pessoa do plural Eles, Elas Os,as, lhes, se, si
consigo
PRONOMES
Uso dos pronomes pessoais
Pronomes são as palavras que acompanham o nome
Os pronomes pessoais do caso reto não podem exercer
(substantivo) ou o substituem. Devido a essa dupla função
a função de complemento verbal:
são classificados em:
Ex.: Esse presente é para eu? (INCORRETO)
* Pronomes substantivos: são os que substituem o
Essa é uma atribuição típica do pronome oblíquo:
nome, exercendo a função de sujeito ou complemento verbal
Ex.: Esse presente é para mim?
Ex.: Joana adora fazer compras. Ela está sempre nas
principais lojas da cidade.
Além do mais, vale lembrar que somente os prono-
mes oblíquos podem ser precedidos por preposição:
* Pronomes adjetivos: são os que acompanham o
Ex.: Esta festa é para ti.
nome, exercendo a função-satélite de adjunto adnominal.
Ex.: Minha casa está à venda.
Entretanto, o pronome reto pode surgir precedido
por preposição quando cumprir sua função de sujeito
Os pronomes são uma classe variável, em gênero e nú-
do verbo. Compare as duas frases:
mero e se dividem em:
a) Ele pediu um favor para mim.
a) Pronomes Pessoais;
b) Ele pediu para eu comprar o presente.
b) Pronomes Indefinidos;
Na frase (a) o pronome é oblíquo pois completa um
c) Pronomes Demonstrativos;
verbo, já na (b) está antecedendo um verbo, na função de
d) Pronomes Interrogativos;
sujeito.
e) Pronomes Relativos;

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LÍNGUA PORTUGUESA

Pronomes oblíquos e a transitividade verbal

Afirmou-se aqui que os pronomes oblíquos cumprem a função de completar o verbo. Entretanto, há verbos que são
transitivos indiretos, ou, seja, que exigem preposição antes do complemento. Assim sendo, vale destacar que alguns pro-
nomes oblíquos substituirão complementos de verbos transitivos diretos (sem preposição) e outros, transitivos indiretos
(com preposição):

Pronomes que substituem objetos diretos (completam verbo sem preposição): o, a, os, as, lo, la, los, las, no, na,
nos, nas.
Ex.: Comprei o carro. Comprei-o.
Encontraram a menina desaparecida. Encontraram-na.
Pronomes que substituem objetos indiretos (completam verbo com preposição): lhe, te.
Ex.: Enviei ao professor os documentos. Enviei-lhe os documentos.

PRONOMES POSSESSIVOS

São os que indicam a ideia de posse, informando a pessoa verbal do possuidor.

Pessoa
Pronome possessivo
verbal
Eu meu, minha (singular); meus, minhas (plural)
Tu teu, tua (singular); teus, tuas (plural)
Ele, Ela seu, sua (singular); seus, suas (plural)
Nós nosso, nossa (singular); nosso, nossas (plural)
Vós vosso, vossa (singular); vossos, vossas (plural)
Eles, Elas seu, sua (singular); seus, suas (plural)

PRONOMES DEMONSTRATIVOS

Como indica a denominação, os pronomes demonstrativos têm por função indicar ou localizar algum termo do discurso.
Podem ser variáreis (esse, essa, este, aquela) ou invariáveis (isso, aquilo). Vejamos o quadro.

Conforme localização da pessoa verbal Pronome demonstrativo correspondente


Este (s) – Este carro é novo.
Próximo do emissor (eu, nós) Esta (s)– Esta caneta está ruim.
Isto – Isto é um cachimbo.
Esse (s) – Esse carro é seu?
Próximo do receptor com quem se fala (tu, você) Essa (s)– Bonita essa sua blusa.
Isso – O que é isso que você tem em mãos?
Aquele (s)– Aquele cartaz chama a atenção de todos.
Longe do emissor e do receptor Aquela (s) – Você conhece aquela moça?
Aquilo – O que é aquilo?

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LÍNGUA PORTUGUESA

PRONOMES DE TRATAMENTO

São pronomes usados em situações formais, indicando conduta respeitosa.

Pronome de Tratamento Abreviatura Emprego


Você V./VV Usado em situações informais.
Utilizado com pessoas mais velhas,
Senhor (es) e Senhora (s) Sr, Sr.ª (singular) e Srs., Srª.s. (plural)
ou como forma de respeito
Pessoas com alta autoridade, como
Vossa Excelência V. Ex.ª/V. Ex.ªs por exemplo: Presidente da Repúbli-
ca, Senadores, Deputados.
Vossa Magnificência V. Mag.ª/V. Mag.ªs Reitores das Universidades.
Em correspondências e textos escri-
Vossa Senhoria V. S.ª/V. S.ªs
tos.
Vossa Majestade VM/VVMM Reis e Rainhas
Vossa Alteza V.A.(singular) e V.V.A. A. (plural) Príncipes, princesas, duques.
Vossa Santidade V.S. Utilizado para o Papa
Vossa Eminência V. Ex.ª/V. Em.ªs Usado para Cardeais.
Vossa Reverendíssima V. Rev.m.ª/V. Rev.m.ªs Sacerdotes e religiosos em geral.

PRONOMES INDEFINIDOS

Como o próprio nome indica, os pronomes indefinidos sãos aqueles que substituem ou acompanham um substantivo
a partir de uma ideia de indefinição, imprecisão. São empregados na 3º pessoa do discurso. Podem ser variáveis ou inva-
riáveis.

Pronomes Indefinidos Variáveis Pronomes Indefinidos Invariáveis


algum, alguma, alguns, algumas, nenhum, nenhuma, nenhuns,
nenhumas, muito, muita, muitos, muitas, pouco, pouca, pou-
cos, poucas, todo, toda, todos, todas, outro, outra, outros,
quem, alguém, ninguém, tudo, nada, outrem,
outras, certo, certa, certos, certas, vário, vária, vários, várias,
algo, cada.
tanto, tanta, tantos, tantas, quanto, quanta, quantos, quantas,
qualquer, quaisquer, qual, quais, um, uma, uns, umas.

Pronomes Relativos

Os pronomes relativos são os que substituem um substantivo já mencionado anteriormente em um enunciado.

Ex.: João é o homem que foi contratado pela empresa. (o pronome “que” faz referência a João)
Suzana foi a comissária a qual tranquilizou minha mãe. (“a qual” substituiu Suzana).

Pronomes relativos variáveis Pronomes relativos invariáveis


o qual, a qual, os quais, as quais, cujo, cuja, cujos, cujas,
quem, que, onde
quanto, quanta, quantos, quantas.

Exemplos com pronomes relativos:


a) Essa é a professora de quem falamos tanto.
b) Ele cumpriu tudo quanto prometera.
c) Essa é a casa onde moro,
d) Aqueles foram os alunos os quais viajaram para Madri.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Pronome relativo CUJO

O pronome cujo é variável de gênero (cujo, cuja) e de número (cujos, cujas) e substitui um termo dando uma ideia de
posse.
Ex.: Ela é mãe da aluna. A mãe foi conversar com a diretora.
Ela é a aluna cuja mãe foi conversar com a diretora.

Importante!

Não é correto inserir artigo após o pronome relativo “cujo”.

Ex.: Aquelas são as alunas cujos os trabalhos foram premiados. INCORRETO


Aquelas são as alunas cujos trabalhos foram premiados. CORRETO.

PRONOMES INTERROGATIVOS

São empregados em frases interrogativas cujas respostas se referem a substantivos.

Ex.: O que você comprou? Comprei meias. (o pronome interrogativo “o que” terá como resposta um substantivo
- “meias”)

Pronomes Interrogativos Variáveis Pronomes Interrogativos Invariáveis


qual, quais, quanto, quantos, quanta, quantas. quem, que.

EXERCÍCIOS

1. (IBGE) Assinale a opção que apresenta o emprego correto do pronome, de acordo com a norma culta:
a) O diretor mandou eu entrar na sala.
b) Preciso falar consigo o mais rápido possível.
c) Cumprimentei-lhe assim que cheguei.
d) Ele só sabe elogiar a si mesmo.
e) Após a prova, os candidatos conversaram entre eles.

2. (IBGE) Assinale a opção em que houve erro no emprego do pronome pessoal em relação ao uso culto da língua:
a) Ele entregou um texto para mim corrigir.
b) Para mim, a leitura está fácil.
c) Isto é para eu fazer agora.
d) Não saia sem mim.
e) Entre mim e ele há uma grande diferença.

3. (U-UBERLÂNDIA) Assinale o tratamento dado ao reitor de uma Universidade:


a) Vossa Senhoria
b) Vossa Santidade
c) Vossa Excelência
d) Vossa Magnificência
e) Vossa Paternidade

4. (BB) Colocação incorreta:


a) Preciso que venhas ver-me.
b) Procure não desapontá-lo.
c) O certo é fazê-los sair.
d) Sempre negaram-me tudo.
e) As espécies se atraem.

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LÍNGUA PORTUGUESA

5. (EPCAR) Imagine o pronome entre parênteses no lu- 11. (MACK) Assinale a alternativa que apresenta erro de
gar devido e aponte onde não deve haver próclise: colocação pronominal:
a) Não entristeças. (te) a) Você não devia calar-se.
b) Deus favoreça. (o) b) Não lhe darei qualquer informação.
c) Espero que faças justiça. (se) c) O filho não o atendeu.
d) Meus amigos, apresentem em posição de sentido. (se) d) Se apresentar-lhe os pêsames, faço-o discretamente.
e) Ninguém faça de rogado. (se) e) Ninguém quer aconselhá-lo.

6. (TTN) Assinale a frase em que a colocação do prono- 12. (EPCAR) O que é pronome interrogativo na frase:
me pessoal oblíquo não obedece às normas do português a) Os que chegaram atrasados farão a prova?
padrão: b) Se não precisas de nós, que vieste fazer aqui?
a) Essas vitórias pouco importam; alcançaram-nas os c) Quem pode afiançar que seja ele o criminoso?
que tinham mais dinheiro. d) Teria sido o livro que me prometeste?
b) Entregaram-me a encomenda ontem, resta agora a e) Conseguirias tudo que desejas?
vocês oferecerem-na ao chefe.
c) Ele me evitava constantemente!... Ter-lhe-iam falado 13. (TFT-MA) “O individualismo não a alcança.” A colo-
a meu respeito? cação do pronome átono está em desacordo com a norma
d) Estamos nos sentido desolados: temos prevenido-o culta da língua, na seguinte alteração da passagem acima:
várias vezes e ele não nos escuta. a) O individualismo não a consegue alcançar.
e) O Presidente cumprimentou o Vice dizendo: - Fostes b) O individualismo não está alcançando-a.
incumbido de difícil missão, mas cumpriste-la com denodo c) O individualismo não a teria alcançado.
e eficiência. d) O individualismo não tem alcançado-a.
e) O individualismo não pode alcançá-la.
7. (FTU) A frase em que a colocação do pronome átono
está em desacordo com as normas vigentes no português
14. (SANTA CASA) Há um erro de colocação pronominal em:
padrão do Brasil é:
a) “Sempre a quis como namorada.”
a) A ferrovia integrar-se-á nos demais sistemas viários.
b) “Os soldados não lhe obedeceram as ordens.”
b) A ferrovia deveria-se integrar nos demais sistemas
c) “Todos me disseram o mesmo.”
viários.
c) A ferrovia não tem se integrado nos demais sistemas d) “Recusei a idéia que apresentaram-me.”
viários. e) “Quando a cumprimentaram, ela desmaiou.”
d) A ferrovia estaria integrando-se nos demais sistemas
viários. 15. (BB) Pronome empregado incorretamente:
e) A ferrovia não consegue integrar-se nos demais sis- a) Nada existe entre eu e você.
temas viários. b) Deixaram-me fazer o serviço.
c) Fez tudo para eu viajar.
8. (FFCL-SANTO ANDRÉ) Assinale a alternativa correta: d) Hoje, Maria irá sem mim.
a) A solução agradou-lhe. e) Meus conselhos fizeram-no refletir.
b) Eles diriam-se injuriados.
c) Ninguém conhece-me bem. 16. (UC-MG) Encontramos pronome indefinido em:
d) Darei-te o que quiseres. a) “Muitas horas depois, ela ainda permanecia esperan-
e) Quem contou-te isso? do o resultado.”
b) “Foram amargos aqueles minutos, desde que resol-
9. (CESGRANRIO) Indique a estrutura verbal que contra- veu abandoná-las.”
ria a norma culta: c) “A nós, provavelmente, enganariam, pois nossa parti-
a) Ter-me-ão elogiado. cipação foi ativa.”
b) Tinha-se lembrado. d) “Havia necessidade de que tais idéias ficassem se-
c) Teria-me lembrado. pultadas.”
d) Temo-nos esquecido. e) “Sabíamos o que você deveria dizer-lhe ao chegar
e) Tenho-me alegrado. da festa.”

10. (MACK) A colocação do pronome oblíquo está in- 17. (SANTA CASA) Do lugar onde ......., ....... um belo pa-
correta em: norama, em que o céu ...... com a terra.
a) Para não aborrecê-lo, tive de sair. a) se encontravam - divisava-se - se ligava
b) Quando sentiu-se em dificuldade, pediu ajuda. b) se encontravam - divisava-se - ligava-se
c) Não me submeterei aos seus caprichos. c) se encontravam - se divisava - ligava-se
d) Ele me olhou algum tempo comovido. d) encontravam-se - divisava-se - se ligava
e) Não a vi quando entrou. e) encontravam-se - se divisava - se ligava

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LÍNGUA PORTUGUESA

18. (UF-RJ) Numa das frases, está usado indevidamente 25. (FMU) Suponha que você deseje dirigir-se a perso-
um pronome de tratamento. Assinale-a: nalidades eminentes, cujos títulos são: papa, juiz, cardeal,
a) Os Reitores das Universidades recebem o título de reitor e coronel. Assinale a alternativa que contém a abre-
Vossa Magnificência. viatura certa da “expressão de tratamento” correspondente
b) Sua Excelência, o Senhor Ministro, não compareceu ao título enumerado:
à reunião. a) Papa ............... V. Sa
c) Senhor Deputado, peço a Vossa Excelência que con- b) Juiz ................. V. Ema
clua a sua oração. c) Cardeal ........... V.M.
d) Sua Eminência, o Papa Paulo VI, assistiu à solenidade. d) Reitor ............... V. Maga
e) Procurei o chefe da repartição, mas Sua Senhoria se e) Coronel ............ V. A.
recusou a ouvir as minhas explicações.
26. (FGV) Assinale o item em que há erro quanto ao
19. (UF-MA) Identifique a oração em que a palavra certo emprego dos pronomes se, si ou consigo:
é pronome indefinido: a) Feriu-se quando brincava com o revólver e o virou
a) Certo perdeste o juízo. para si.
b) Certo rapaz te procurou. b) Ele só cuidava de si.
c) Escolheste o rapaz certo. c) Quando V. Sa vier, traga consigo a informação pedida.
d) Marque o conceito certo. d) Ele se arroga o direito de vetar tais artigos.
e) Não deixe o certo pelo errado. e) Espere um momento, pois tenho de falar consigo.

20. (CARLOS CHAGAS) “Se é para ....... dizer o que penso, 27. (PUC) Assinale a alternativa que preencha correta-
creio que a escolha se dará entre ....... .” mente as lacunas da frase ao lado: “............................ da terra
a) mim, eu e tu natal, ....................... para as antigas sensações adormecidas.”
b) mim, mim e ti a) Nos lembrando - despertamos-nos
c) eu, mim e ti b) Nos lembrando - despertamo-nos
c) Lembrando-nos - despertamos-nos
d) eu, mim e tu
d) Nos lembrando - nos despertamos
e) eu, eu e ti
e) Lembrando-nos - despertamo-nos
21. (MACK) A única frase em que há erro no emprego
28. (FATEC) Indique em que alternativa os pronomes es-
do pronome oblíquo é:
tão bem empregados:
a) Eu o conheço muito bem. a) Deixou ele sair.
b) Devemos preveni-lo do perigo. b) Mandou-lhe ficar de guarda.
c) Faltava-lhe experiência. c) Permitiu-lhe, a ele, fazer a ronda.
d) A mãe amava-a muito. d) Procuram-o por toda a parte.
e) Farei tudo para livrar-lhe desta situação. e) n.d.a
22. (BRÁS CUBAS) “Alguém, antes que Pedro o fizesse, 29. (FATEC) Assinale o mau emprego do pronome:
teve vontade de falar o que foi dito.” Os pronomes assina- a) Aquela não era casa para mim, comprá-la com que
lados dispõem-se nesta ordem: dinheiro?
a) de tratamento, pessoal, oblíquo, demonstrativo b) Entre eu e ela nada ficou acertado.
b) indefinido, relativo, pessoal, relativo c) Estava falando com nós dois.
c) demonstrativo, relativo, pessoal, indefinido d) Aquela viagem, quem não a faria?
d) indefinido, relativo, demonstrativo, relativo e) Viram-no mas não o chamaram.
e) indefinido, demonstrativo, demonstrativo, relativo
30. (SANTA CASA) Os técnicos .......... bem para os jogos, mas,
23. (PUC) Na frase: “Chegou Pedro, Maria e o seu filho .......... contra nova derrota, pediam que treinasse ainda mais.
dela”, o pronome possessivo está reforçado para: a) o haviam preparado - se tentando precaver
a) ênfase b) haviam preparado-o - se tentando precaver
b) elegância e estilo c) haviam preparado-o - tentando precaver-se
c) figura de harmonia d) haviam-no preparado - se tentando precaver
d) clareza e) haviam-no preparado - tentando precaver-se
e) n.d.a
31. (SANTA CASA) Nas frases abaixo:
24. (FUVEST) Assinale a alternativa onde o pronome 1. Os miúdos corriam barulhentos, me pedindo dinheiro.
pessoal está empregado corretamente: 2. Dizia ele cousas engraçadas, coçando-se todo.
a) Este é um problema para mim resolver. 3. Ficarei no lugar onde encontro-me. Tem sombra.
b) Entre eu e tu não há mais nada. 4. Quando me vi sozinho, tremi de medo.
c) A questão deve ser resolvida por eu e você.
d) Para mim, viajar de avião é um suplício.
e) Quanto voltei a si, não sabia onde me encontrava.

65
LÍNGUA PORTUGUESA

A ênclise e a próclise foram corretamente empregadas: 38. (FMU) Assinale a única alternativa em que haja erro
a) nas orações I e II no emprego dos pronomes:
b) nas orações III e IV a) Vossa Excelência e seus convidados.
c) nas orações I e III b) Mandou-me embora mais cedo.
d) nas orações II e IV c) Vou estar consigo amanhã.
e) em todas as orações d) Vós e vossa família estais convidados para a festa.
e) Deixei-o encarregado da turma.
32. (SANTA CASA) Devemos .......... da tempestade.
a) resguardar-mo-nos 39. (UF-SC) Observe os períodos abaixo:
b) resguardar-nos 1. Nunca soubemos quem roubava-nos nas medidas.
c) resguardarmos-nos 2. Pouco se sabe a respeito de novas fontes energéticas.
d) resguardarmo-nos 3. Nada chegava a impressioná-lo na juventude.
e) resguardar-mos 4. Dar-lhe-emos novas oportunidades.
5. Eles apressaram-se a convidar-nos para a festa.
33. (FAAP) Assinale a alternativa em que a colocação
pronominal não corresponde ao que preceitua a gramática: a) Estão corretas I, II, III
a) Há muitas estrelas que nos atraem a atenção. b) Estão corretas II, III, V
b) Jamais dar-te-ia tanta explicação, se não fosses pes- c) Estão corretas III, IV, V
soa de tanto merecimento. d) Estão corretas II, III, IV
c) A este compete, em se tratando do corpo da Pátria, e) Estão corretas I, III, IV
revigorá-lo com o sangue do trabalho.
d) Não o realizaria, entretanto, se a árvore não se man- 40. (SÃO JUDAS) Assinale a alternativa errada quanto à
tivesse verde sob a neve. colocação pronominal:
e) n.d.a a) Apesar de se contrariarem não me fariam mudar de
idéia.
34. (CARLOS CHAGAS) Os projetos que .......... estão em b) Que Deus te acompanhe por toda a parte.
ordem; ........... ainda hoje, conforme .......... . c) Isso não me admira: eu também contrariei-me com
a) enviaram-me, devolvê-los-ei, lhes prometi o caso.
b) enviaram-me, os devolverei, lhes prometi d) Conforme foi decidido espero que todos se compe-
c) enviaram-me, os devolverei, prometi-lhes netrem de seu dever.
d) me enviaram, os devolverei, prometi-lhes e) n.d.a
e) me enviaram, devolvê-los-ei, lhes prometi
41. (FECAP) Assinale a frase gramaticalmente correta:
35. (CARLOS CHAGAS) Quando .......... as provas, .......... a) Quando recebe-o em minha casa, fico feliz.
imediatamente. b) Tudo fez-se como você mandou.
a) lhes entregarem, corrijam-as c) Por este processo, teriam-se obtido melhores resul-
b) lhes entregarem, corrijam tados.
c) lhes entregarem, corrijam-nas d) Em se tratando disto, podemos contar com ele.
d) entregarem-lhes, corrijam-as e) Me levantei assim que você saiu.
e) entregarem-lhes, as corrijam
42. (UNB) Assinale a melhor resposta - O resultado das
36. (CARLOS CHAGAS) Quem .......... estragado que .......... combinações: “põe + o”, “reténs + as”, “deduz + a”, é:
de ........ . a) pões-lo, reténs-la, dedu-la
a) o trouxe - encarregue-se - consertá-lo b) põe-no, retém-nas, dedu-la
b) o trouxe - se encarregue - consertá-lo c) pões-lo, retém-las, deduz-la
c) trouxe-o - se encarregue - o consertar d) põe-no, retém-las, dedu-la
d) trouxe-o - se encarregue - consertá-lo e) põe-lo, retém-las, dedu-la
e) trouxe-o - encarregue-se - o consertar
43. (UM-SP) Ninguém atinge a perfeição alicerçado na
37. (BRÁS CUBAS) Apontar a sentença que deverá ser busca de valores materiais, nem mesmo os que consideram
corrigida: tal atitude um privilégio dado pela existência. Os prono-
a) Poderá resolver-se o caso imediatamente. mes destacados no período acima classificam-se, respec-
b) Sabes o que se deverá dizer ao professor? tivamente, como:
c) Poder-se-á resolver o caso imediatamente. a) indefinido - demonstrativo - relativo - demonstrativo
d) Sabe o que deverá dizer-se ao professor? b) indefinido - pessoal oblíquo - relativo - indefinido
e) Poderá-se resolver o caso imediatamente. c) de tratamento - demonstrativo - indefinido - de-
monstrativo
d) de tratamento - pessoal oblíquo - indefinido - de-
monstrativo
e) demonstrativo - demonstrativo - relativo - demons-
trativo

66
LÍNGUA PORTUGUESA

44. (UEPG-PR) “Toda pessoa deve responder pelos com- Pronome


promissos assumidos.” A palavra destacada é: Pronome
oblíquo
a) pronome adjetivo indefinido Pronome pessoa pessoal do
átono
b) pronome substantivo indefinido caso reto
correspondente
c) pronome adjetivo demonstrativo
d) pronome substantivo demonstrativo 1° pessoa do singular eu me
e) nenhuma das alternativas acima é correta 2° pessoa do singular tu te

(Exercícios retirados de http://www.mundovestibular. 3° pessoa do singular ele o, a, lhe


com.br/articles/9073/1/Exercicios-de-Pronomes/Paacute- 1° pessoa do plural nós nos
gina1.html) 2° pessoa do plural vós vos
3° pessoa do plural eles as, as, lhes
GABARITO
1) PRÓCLISE: quando o pronome oblíquo antecede o
1 - D 23 - D verbo em posição sintática.
2 - A 24 - D Eu a vi ontem.
3 - D 25 - D Ninguém me concedeu vantagens.
4 - D 26 - E Usa-se o pronome em posição proclítica nas seguintes
5 - D 27 - E situações:
6 - D 28 - C
7 - B 29 - B a) Com advérbios e expressões negativas:
8 - A 30 - E Nada o assustou.
9 - C 31 - D Ninguém o viu ontem.
10 - B 32 - B Nunca o abandonarei.
11 - D 33 - B Aqui se encontra paz.
12 - B 34 - E Talvez a ame para sempre.
13 - D 35 - C
14 - D 36 - B b) Com conjunções subordinativas: (que, se, quan-
15 - A 37 - E do, embora, logo, que)
É importante que a trate bem.
16 - A 38 - C
Não sei se o amo.
17 - A 39 - D
Não retornei a ligação, embora a amasse demais.
18 - D 40 - C
19 - B 41 - D
c) Com pronomes relativos, indefinidos e demons-
20 - C 42 - D
trativos:
21 - E 43 - A
Isso lhe trouxe muita sorte.
22 - E 44 - A A professora que me encontrou se chamava Maria.
Tudo o encantava.
COLOCAÇÃO PRONOMINAL
d) Em frases exclamativas:
Quando iniciamos o estudo dos pronomes, atentamos Deus o guarde!
que há os pronomes pessoais do caso reto e os pessoais Macacos me mordam!
do caso oblíquo. O que diferencia um do outro é a posição
frente ao verbo: enquanto os retos (eu, tu, ele, nós, vós, eles) e) Com palavras proparoxítonas:
ocupam a posição de sujeito, os oblíquos exercem a função Nós o compreendíamos.
de complemento e podem estar dispostos antes (PRÓCLI-
SE), no meio (MESÓCLISE) e depois do verbo (ÊNCLISE). f) com verbos no gerúndio antecedidos pela prepo-
A colocação pronominal se refere ao estudo da disposi- sição EM:
ção dos pronomes em relação ao verbo. Em se tratando de educação, ele é uma referência.
Primeiramente vejamos os pronomes envolvidos nessas
regras de colocação: g) com palavras interrogativas:
Quando o encontrarei novamente?
Quem a magoou desse jeito?

2) MESÓCLISE: quando o pronome oblíquo é colocado


entre o radical do verbo e as desinências. Só é usado em
duas situações:
a) Na forma verbal futuro do presente:
Falar-te-ei verdades.

67
LÍNGUA PORTUGUESA

Comprar-lhe-á um carro. 4.Em que alternativa NÃO há erro na colocação do


Procurar-me-ão sem descanso. pronome?
a) Preciso vê-lo, me disse o rapaz.
b) Na forma verbal futuro do pretérito: b) Este é um trabalho que absorve-se muito.
Falar-te-ia verdades. c) Far-se-á tudo para que se salvem.
Comprar-lhe-ia um carro. d) Não arrepender-se-ia de haver dito a verdade.
Procurar-me-iam sem descanso. e) Em pondo-se o sol os pássaros debandam.
3) ÊNCLISE: Quando o pronome se encontra depois do
verbo. É na ênclise a localização natural do complemento, 5. O pronome pessoal oblíquo átono está bem colo-
seguindo a sequência sujeito verbo complemento. Em- cado em um só dos períodos. Qual?
pregamos a ênclise nas seguintes situações: a) Isto me não diz respeito! Respondeu-me ele, afeta-
damente .
a) Períodos iniciados por verbos: (Não é correto ini- b) Segundo deliberou-se na sessão, espero que todos
ciar frase com pronome oblíquo) apresentem-se na hora conveniente
Convidaram-me para a festa. c) Os conselhos que dão-nos os pais, levamo-los em
Avistou-o de longe. conta mais tarde.
Encontraram-na triste. d) Amanhã contar-lhe-ei por que peripécias consegui
não envolver-me.
b) Imperativo afirmativo:
Distribua-os agora. (Exercícios retirados de http://helenaconectada.blogs-
Cale-se já. pot.com.br/2011/09/colocacao-pronominal-exercicios.html)

c) Orações reduzidas de infinitivo:


Quero amar-te para sempre. GABARITO
Desejo beijá-lo assim que chegar.
1c
d) Verbos no gerúndio NÃO antecedidos pela pre- 2d
posição “em” ou por expressões negativas: 3b
Ele vive enganando-se. 4c
5a

EXERCÍCIOS
REGRAS DE PONTUAÇÃO
1. (OMEC) Assinale a frase em que há pronome en-
clítico: Na língua falada, quando estamos conversando
a) Far-me-ás um favor? com alguém, é comum utilizarmos pausas para marcar
b) Nada te direi a respeito. a entonação do discurso. Respiramos, damos um ritmo
c) Convido-te para a festa. coerente na locução pois nenhum falante se comunica em
d) Não me fales mais nisso. compasso acelerado. Entretanto, quando se faz a passagem
e) Dir-se-ia uma incoerência. da oralidade para a escrita há um problema essencial: como
marcar ritmos e pausas entre as frases se agora não temos
2. (MACKENZIE) Assinale a alternativa que apresen- mais como instrumento a voz e o silêncio?
ta erro de colocação pronominal: Na língua escrita utilizamos os sinais de pontuação
a) Você não devia calar-se. entre as orações como recurso para estabelecer pausas e
b) Não lhe darei qualquer informação. inflexões de voz na leitura.
c) O filho não o entendeu. Veja os exemplos abaixo:
d) Se apresentar-lhe os pêsames, faça-o discretamente. a) Presenteei minha sobrinha, não meu filho,
e) Ninguém quer aconselhá-lo. b) Presenteei, minha sobrinha não, meu filho.
As frases acima, ainda que possuam as mesmas
3. (MED. SANTO ANDRÉ) Assinale a alternativa em palavras, mudam de sentido somente pelo uso das vírgulas.
que todos os pronomes pessoais estão colocados corre- Por isso, é muito importante sabermos utilizar os sinais de
tamente, segundo o uso clássico da língua portuguesa: pontuação para que não cometamos erros de ambiguidade
a) Eu o vi, não lhe falei, darei-te o livro. ou duplo sentido.
b) Eu o vi, falei-lhe, nada lhe direi.
c) Nada dir-lhe-ei, não o estimo, Deus ajude-nos. 1. USO DA VÍRGULA
d) Deus nos ajude! Não quero te ofender, mas vai-te
embora. A vírgula é um sinal que indica pausa entre orações ou
e) Me dá o livro, que eu te devolvo assim que o ler. palavras elencadas. Apresenta a seguintes funções:

68
LÍNGUA PORTUGUESA

a) separar termos de mesma função sintática dentro Ex.:


de uma oração: Alguns pontos básicos da pesquisa é:
Assim que cheguei, comi, bebi o vinho, dormi um - conceito de sujeito grego;
pouco. - humanismo renascentista;
- o drama barroco;
b) Separar um aposto: - cidadão pós-revolução francesa.
Maria, irmã de João, viajou ao Canadá.
Outra função é separar orações de sentido oposto ou
c) Isolar um vocativo: num período em que as orações coordenadas já tiverem
Maria, entre agora! exigido vírgula:
Alguns homens são bons; outros, maus. (SENTIDO
d) Para marcar elipse verbal: OPOSTO)
João comprou duas camisas, eu, três. Muitos estudantes aprendem, leem, estudam; às vezes
também cansam.
e) Para indicar expressões explicativas:
Algumas pessoas estão ficando misantropas, ou seja, 3) DOIS PONTOS:
isolando-se em si mesmas. Utilizamos dois pontos:

f) Para separar topônimos frente a datas e a) quando apresentamos uma citação ou fala:
endereços: Como diria Hamlet: “Ser ou não ser, eis a questão”.
Florianópolis, 25 de maio de 2017.
b) quando se apresenta expressão enumerativa:
g) Para separar orações coordenadas sem conjunção Desejo os seguintes itens: macarrão, ovos, queijo e carne.
ou simplesmente palavras:
Ontem comprei roupas, sapatos, brincos e uma bolsa. c) para completar aposto resumitivo:
Eu viajei, dormi, descansei. Comer, rezar, amar: todos esses verbos me apetecem.

h) isolar orações subordinadas adjetivas explicativas: 4) PONTO DE EXCLAMAÇÃO:


João, que esteve aqui ontem, é irmão de Pedro. Utilizado em interjeições ou frases de grande
expressividade:
IMPORTANTE! NÃO SE USA VÍRGULA NOS Olá!
SEGUINTES CASOS: Como você está linda!
Socorro!
a) Entre o sujeito e o verbo de uma oração: Podemos utilizar mais de um ponto de exclamação
João, comprou um carro. (INCORRETO) para realçar emoção ou surpresa:
João comprou um carro. (CORRETO) Amo tanto a vida!!!!
Além do mais, utiliza-se após sinal de interrogação
b) Entre o verbo e seus complementos: para marcar expressividade ou surpresa em uma pergunta:
João comprou, um carro. (INCORRETO) Por que você é tão difícil?!
João comprou um carro. (CORRETO)
5) PONTO FINAL
c) Entre o complemento nominal e o nome Pode-se afirmar que o ponto final é uma pausa
completado, ou entre satélites do substantivo (numeral, mais prolongada, que encerra uma relação lógica entre
pronome, adjetivo e artigo): elementos numa frase. Utilizamos nos seguintes casos:
Tenho medo, de altura. (INCORRETO).
Tenho medo de altura (CORRETO) a) encerrar definitivamente um enunciado:
Meus três, lindos, carros foram fotografados pela Muitas pessoas amam; outras odeiam, entretanto, isso
revista (INCORRETO) faz parte da natureza humana.
Meus três lindos carros foram fotografados pela revista.
(CORRETO) b) separar parágrafos:
A crise financeira brasileira parece não ter data para
d) Antes de etc… acabar. No entanto, muitos brasileiros estão fazendo das
A expressão etc é uma abreviatura de um termo em próprias dificuldades ferramenta para mudar de vida.
latim et cetera, que significa e outras coisas. Já que está O segredo dos dias de hoje é a audácia: feliz daquele
aglutinado a conjunção e não se utiliza vírgula. que arrisca mais.
Vi filmes franceses, persas etc…
6) PONTO DE INTERROGAÇÃO
2) PONTO E VÍRGULA O ponto de interrogação possui uma função específica:
A função básica deste sinal é separar termos marcar mudança de entonação de voz frente a uma
enumerados: pergunta. Usamos em perguntas diretas:

69
LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: EXERCÍCIOS
Afinal, como você conseguiu chegar até aqui?
Além desse comum uso, também se costuma utilizar 1. Assinale a opção em que a supressão das vírgulas
para marcar surpresa ou indignação: alteraria o sentido do anunciado:
Como assim? a) os países menos desenvolvidos vêm buscando,
O quê? Você não fez a prova? ultimamente, soluções para seus problemas no acervo
cultural dos mais avançados;
7) RETICÊNCIAS b) alguns pesquisadores,que se encontram
São usadas para marcar retirada de um trecho ou comprometidos com as culturas dos países avançados,
mesmo para dar ideia de continuidade: acabam se tornando menos criativos;
Segundo Foucault: “a liberdade é um sintoma moderno, c) torna-se, portanto, imperativa uma revisão modelo
quiçá um conceito, além de mecanismo ideológico….” presente do processo de desenvolvimento tecnológico;
Vimos muitas coisas no museu: esculturas, pinturas,
d) a atividade científica, nos países desenvolvidos, é tão
instalações…
natural quanto qualquer outra atividade econômica;
e) por duas razões diferentes podem surgir, da
8) ASPAS
Utiliza-se para indicar fala de alguém, expressões interação de uma comunidade com outra, mecanismos de
estrangeiras, conceitos e ironia: dependência.
Ex.:
E nos perguntou Freud: “O que quer uma mulher?” (fala 2. Assinale a opção em que está corretamente indicada
de alguém) a ordem dos sinais de pontuação que devem preencher as
A expressão “soledad” é um termo espanhol e indica a lacunas da frase abaixo:
ideia de solidão. (expressão estrangeira) “Quando se trata de trabalho científico ___ duas coisas
Ainda não entendi o conceito de “devir” de Deleuze. devem ser consideradas ____ uma é a contribuição teórica
(conceito) que o trabalho oferece ___ a outra é o valor prático que
Dizem que ele é um moço “bem-educado”. (ironia) possa ter.
a) dois pontos, ponto e vírgula, ponto e vírgula
b) dois pontos, vírgula, ponto e vírgula;
9) PARÊNTESES c) vírgula, dois pontos, ponto e vírgula;
Sua função básica é inserir uma explicação de algum d) pontos vírgula, dois pontos, ponto e vírgula;
termo enunciado anteriormente: e) ponto e vírgula, vírgula, vírgula.
Ex.:Ainda que todos saibam o conceito de “devir”
(transformação, mudança, vir-a-ser), poucos aplicam na 3. Assinale o exemplo em que há emprego incorreto
vida prática. da vírgula:
a) como está chovendo, transferi o passeio;
10) TRAVESSÃO b) não sabia, por que todos lhe viravam o rosto;
Comumente vemos o travessão para indicar diálogos c) ele, caso queira, poderá vir hoje;
em um texto: d) não sabia, por que não estudou;
Ex.: e) o livro, comprei-o por conselho do professor.
- Você não me ama? 4. Assinale o trecho sem erro de pontuação:
- Sim, amo mais que tudo. a) vimos pela presente solicitar de V.Sas., que nos
Mas também é usado após a fala para introduzir informe a situação econômica da firma em questão;
comentário do narrador. b) cientificamo-lo de que na marcha do processo de
Ex.: restituição de suas contribuições, verificou-se a ausência da
- Você não me ama? - perguntou Maria, insegura. declaração de beneficiários;
- Sim, mais que tudo. - respondeu João tranquilamente. c) o Instituto de Previdência do Estado, vem solicitar de
V.Sa. o preenchimento da declaração;
Também é usado com a mesma função da vírgula ou d) encaminhamos a V.Sa., para o devido preenchimento,
parênteses: o formulário em anexo;
e) estamos remetendo em anexo, o formulário.
Machado é o maior escritor realista – já nos diziam
nossos professores.
5. Assinale as frases em que as vírgulas estão incorretas:
a) ora ríamos, ora chorávamos;
b) amigos sinceros, já não os tinha;
c) a parede da casa, era branquinha branquinha;
d) Paulo, diga-me o que sabe a respeito do caso;
e) João, o advogado, comprou, ontem, uma casa.

(Exercícios retirados de http://www.portuguesconcurso.


com/2009/07/pontuacao-exercicios.html)

70
LÍNGUA PORTUGUESA

GABARITO: ela é constituída por duas orações: 1 – Maria disse; 2 – que


iria à festa. Importante atentar que a segunda oração com-
1. B pleta o sentido da primeira.
2. C
3. D Geralmente contamos o número de orações num enun-
4. D ciado segundo o número de verbos. No entanto, vale lem-
5. C brar que quando houver uma locução verbal teremos a
presença de uma única oração:

ANÁLISE SINTÁTICA Maria saiu. (1 verbo – 1 oração)


Ainda que tenha estudado, não fui bem na prova. (2
O QUE É SINTAXE? verbos – 2 orações)
Amanhã vou comprar seu presente. (1 locução verbal –
Inicialmente, quando estudamos as palavras, fazemos 1 oração)
de maneira isolada, a partir de cada classe gramatical sepa-
radamente. É o que se chama de morfologia. Entretanto, 3. PERÍODO
as palavras só existem e são úteis se estão em conjunto Podemos dizer que o período une a frase e oração, já
que é um enunciado de sentido completo que gira em tor-
num enunciado e, então, temos a sintaxe, que é justamen-
no de um ou mais verbos.
te o estudo das palavras segundo sua ordem de apresen-
Atente aos exemplos:
tação numa frase.
a) Fogo!
INTRODUÇÃO À ANÁLISE SINTÁTICA: FRASE. ORA- Aqui se trata apenas de uma frase, já que não presença
ÇÃO. PERÍODO. de verbo.
1. FRASE b) Maria foi às compras.
Iniciando o estudo das palavras numa relação de orde- Aqui temos uma frase (já que é completa) e também
namento e de sentido o primeiro tópico a ser entendido é um período, uma vez que notamos a presença de um verbo
o conceito de frase. (portanto, de uma oração).
Frase é todo enunciado de sentido completo, possuin-
do ou não um verbo. A função básica da frase é expressar IMPORTANTE!
uma informação e possui como característica estrutural ser UM PERÍODO É SEMPRE CONSTITUÍDO POR UMA
finalizada pelo ponto final, de exclamação ou de interroga- OU MAIS ORAÇÕES, POIS A PRESENÇA DO VERBO É
ção. Vejamos os exemplos: FUNDAMENTAL.
a) Maria foi à festa. (frase verbal declarativa) Caso o período possua apenas uma oração, chamamos
b) Fogo! (frase nominal, sem verbos) de período simples ou oração absoluta. E se possuir mais
c) Que menina bonita! (frase exclamativa) de um verbo é definida como período composto.
d) Quem? Eu? (frase interrogativa)
e) Saia já daí! (frase imperativa) SINTAXE DO PERÍODO SIMPLES

Ainda que apenas na primeira e na última frase visuali- Chamamos de período simples o enunciado formado
zemos a presença de um verbo, todos os exemplos citados por uma oração absoluta, ou seja, um único verbo:
acima se tratam de frase, pois cumprem a função de enviar a) Compre aquela blusa, por favor!
uma mensagem de sentido completo. b) Choveu muito ontem.
c) Precisa-se de operários.
2. ORAÇÃO d) A menina ganhou a boneca.
Oração é um enunciado que gira em torno de um ver- Em todos os exemplos citados percebemos a presença
bo. Não é necessário ter sentido completo e finalizar no de um único verbo e essa é justamente a condição de um
ponto final, mas deve ter sentido, que pode ser completa- período simples: ser formado por uma única oração que,
do por outra oração. por ser única, chamamos de absoluta.
Veja os exemplos: Já que possui um único verbo, o período simples é me-
nos complexo que o período composto. Assim seu estudo
a) Maria foi à festa. se dedica às palavras (as quais chamamos de “termos”) que
b) Maria disse que iria à festa. o constituem. A análise do período simples se dedica aos
seguintes aspectos:
No primeiro exemplo, temos uma frase e também uma
oração já que notamos a presença de um verbo na cons- a) Termos essenciais da oração
trução do sentido completo. Já na frase b) temos uma frase - Sujeito
(Maria disse que foi à festa) já que tem sentido completo e - Predicado

71
LÍNGUA PORTUGUESA

b) Termos integrantes da oração TERMOS ESSENCIAIS DA ORAÇÃO


- Objeto Direto
- Objeto Indireto Termos essenciais da oração são os que constroem a
- Complemento Nominal estrutura básica do período. Para que qualquer enuncia-
- Predicativo do Sujeito do oracional tenha sentido, é fundamental um agente que
- Agente da Passiva condicione a flexão verbal e o verbo propriamente dito. Por
isso, os termos essenciais são:
c) Termos Acessórios da oração a) Sujeito: termo da oração sobre o qual se declara algo
- Adjunto Adnominal e interage com o verbo definindo sua flexão de número e
- Adjunto Adverbial pessoa;
- Aposto
b) Predicado: é tudo o que se diz sobre o sujeito, pos-
suindo como número um verbo.
Atente ao exemplo:
EXERCÍCIOS
João viajou no último feriado.
1. Assinale as alternativas que não apresentam uma João = sujeito da oração. Além de ser o assunto do
frase: enunciado, é o elemento que exigirá a flexão do verbo (3º
a) Que golaço! pessoa do singular)
b) Vocês assistiram à transmissão do jogo pela tevê? viajou no último feriado = predicado, informação a res-
c) Em vez de nadar, preferiram jogar bola., peito do sujeito (João), iniciado por um verbo.
d) O futebol povo paixão pelo tem brasileiro.
e) Correram para a garagem e entraram no carro. Os termos essenciais da oração possuem classificações
f) O sobre verde era gramado céu. específicas. Vejamos uma a uma:
g) Clara passeava com as crianças no jardim.
h) Mão Luisinho trêmula. - TIPOS DE SUJEITO
a) Sujeito simples: composto por um único núcleo,
2. Assinale com um X as frases nominais: mesmo estando no plural.
a) Que medo!
b) Ele chutou a porta. Ex.:
c) Coitadinho do garoto!
d) O povo odeia os governantes corruptos. (1) Maria esqueceu de pagar o presente.
e) Transmitirei o recado a sua namorada. (2) Os lindos filhos de Maria começaram a escola ontem.
f) Coragem, companheiro!
g) Que voz estranha! Tanto no primeiro exemplo quanto no segundo perce-
h) A lanterna produzia boa claridade. bemos que o verbo é condicionado por um único núcleo:
i) Luisinho, não! Maria (1); filhos (2).
j) As risadas não eram normais. b) Sujeito composto: caracterizado pela presença de
k) Que alívio! mais de um núcleo, geralmente unido pela conjunção e:

Ex.:
3) Assinale com um X as frases verbais (orações):
(1) Maria e Antônio são refugiados.
a) Quanta gente hoje!
(2) O aluno estrangeiro e a professora brasileira par-
b) Apresse-se, garota!
ticiparam da mostra cultural.
c) O filme foi bom. c) Sujeito oculto: quando o sujeito não está presente
d) Não aguento essa poluição! na oração, mas é facilmente compreendido pela flexão ver-
e) Partiremos daqui a pouco. f) Sempre juntos, sempre bal ou contexto.
amigos. Ex.:
g) Seu colega telefonou.
h) Na praia, grande descontração.
(1) Saí de casa. (eu saí)
i) Deus te guarde!
(2) Saímos de casa (nós saímos)
j) Que ideia absurda!
(3) Saíste de casa. (Tu saíste)
k) As ovelhas são mansas e pacientes.

(Exercícios retirados de https://pt.scribd.com/ João não pretende sair de casa. Está cansado. (Na se-
doc/215584825/EXERCICIOS-FRASE-E-ORACAO-docx) gunda oração percebemos, pelo contexto, que o “estar
cansado” se refere a João, mencionado na primeira frase.
GABARITO
1 – d, f, h d) Sujeito indeterminado: quando não é possível
2 – a, c, f, g, i, k identificar o sujeito, marcado por verbos na 3º pessoa do
3 – b, d, e, g, i, k plural,

72
LÍNGUA PORTUGUESA

(1) Roubaram a proprietária da loja. 2) No período: “Ser amável e ser egoísta são coisas
(2) Encontraram a menina. distintas”, o sujeito é:
a) indeterminável
b)”ser amável”
Também há a presença de sujeito indeterminado em
c) “coisas distintas”
verbos na 3º pessoal do singular mais a partícula se ,
d) “ser amável e ser egoísta”
a qual chamamos de índice de indeterminação do e) n.d.a
sujeito.
3) Na oração: “Reprovaram alguns autores esta his-
Ex.: tória”, qual é o núcleo do sujeito?
a) história
Precisa-se de vendedores. b) alguns autores
Vive-se bem em Florianópolis. c) reprovaram
d) autores
e) Sujeito inexistente: falamos em sujeito inexistente e) n.d.a
quando a oração contiver apenas predicado. Há casos em
que o predicado é marcado por verbos impessoais (que 4) “Em 1949 reuniram-se em Perúgia, Itália, a convi-
não têm sujeito e, por isso, não variam em flexão de pessoa te da quase totalidade dos cineastas italianos, seus co-
e número): legas de diversas partes do mundo.” O núcleo do sujeito
de “reuniram-se” é:
- Verbos que indicam fenômenos climáticos: chover, a) cineastas
ventar, escurecer, nevar, amanhecer, anoitecer… b) convite
Ex.: c) colegas
Nevou muito no sul. d) totalidade
Sempre chove nessa época do ano. e) se

- Verbo haver no sentido de existir: 5) Aponte a alternativa em que ocorre sujeito inde-
Ex.: terminado:
a) Na prova, havia, pelo menos, quatro questões difíceis.
Houve muitos protestos na última semana.
b) Revelou-se a necessidade de auxílio aos desabrigados.
Há pessoas no recinto.
c) Aconteceram, naquela casa, fenômenos inexplicáveis.
d) Come-se bem naquele restaurante.
- Verbo haver e fazer indicando tempo: e) Resolvemos não apoiar o candidato.
Faz vinte anos que não o vejo.
Não o vejo há anos. 6) Qual a alternativa em que há sujeito indetermi-
- Verbo fazer indicando fenômeno da natureza: nado?
Ex.: a) Comecei a estudar muito tarde para o exame.
Faz frio nesse período do ano. b) Em rico estojo de veludo, jazia uma flauta de prata.
c) Soubesse que o proprietário estava doente.
- Verbo ser indicando tempo ou distância: d) Houve muitos feridos no desastre.
Ex.: e) Julgaram-no incapaz de exercer o cargo.
São seis horas.
São doze metros de comprimento. 7) Assinale a frase em que há sujeito indeterminado:
a) Compram-se jornais velhos.
EXERCÍCIOS b) Confia-se em suas palavras
c) Chama-se José o sacerdote.
1) Em relação ao trecho: “Pregada em larga tábua d) Choveu muito.
de pita, via-se formosa e grande borboleta, com asas e) É noite.
meio abertas, como que disposta a tomar voo”, pode-
mos afirmar que o sujeito principal da oração é: 8) Aponte a alternativa em que a palavra se é índice
a) simples, tendo por núcleo implícitoalguém. de indeterminação do sujeito:
b) composto, tendo por núcleosformosa e grande. a) Resolver-se-ão os exercícios.
c) simples, tendo por núcleoasas. b) Não se reprovarão estes alunos.
d) indeterminado, tendo por índice de indeterminação c) Trabalha-se com afinco naquela empresa.
do sujeito a partículase. d) Vendem-se relógios.
e) simples, tendo por núcleoborboleta. e) Plastificam-se documentos.

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LÍNGUA PORTUGUESA

9) Nas orações: “Considera-se a pesquisa revelado- GABARITO


ra” e “Fala-se muito na pesquisa sobre os jovens”, te- 1-e
mos, respectivamente: 2 -d
a) sujeito paciente e sujeito agente 3 -d
b) sujeito paciente e sujeito indeterminado 4 -c
c) sujeito agente e sujeito agente 5 -d
d) sujeito indeterminado e sujeito indeterminado 6 -e
e) sujeito indeterminado e sujeito paciente 7 -b
8 -c
10) Aponte a alternativa em que ocorre sujeito ine- 9 -b
xistente: 10 -d
a) Alguém chegou atrasado à reunião. 11 -e
b) Telefonaram para você. 12 -e
c) Existiam, pelo menos, cinquenta candidatos. 13- d
d) Deve fazer dez anos que ele desapareceu 14 -a
e) Consertou-se o relógio.
- TIPOS DE PREDICADO
11) Qual a oração sem sujeito?
a) Falaram mal de você. A) Predicado Nominal: quando na oração o nome
b) Ninguém se apresentou. (substantivo, adjetivo) oferece mais informação semântica
c) Precisa-se de professores. do que o verbo. Para identificar esse tipo de predicado bas-
d) A noite estava agradável. ta apenas reconhecer na oração um verbo de ligação entre
e) Vai haver um campeonato. o sujeito e o complemento.
12) Assinale a oração sem sujeito:
Ex.:
a) Convidaram-me para a festa.
Maria é bonita.
b) Diz-me muita coisa errada.
João permanece quieto.
c) O dia está quente.
Pedro continua triste.
d) Alguém se enganou.
e) Vai fazer bom tempo amanhã.
Nos exemplos acima percebemos que o verbo cumpre
a função de ligar o sujeito à característica a ele referida.
13) Em todas as alternativas, o termo sublinhado
Chamamos de predicativo do sujeito a referência que su-
exerce a função de sujeito, exceto em:
a)Quemsabe de que será capaz a mulher de teu sobrinho? cede o verbo de ligação.
b) Raramente se entrevêo céunesse aglomerado de b) Predicado Verbal: quando o verbo apresenta a in-
edifícios. formação essencial sobre o sujeito, e aqui os verbos preci-
c) Amanheceuum dia lindo, e por isso todos correram sam indicar ação:
à piscina.
d) Era somenteuma velha, jogada num catre preto de Ex.:
solteiro. Pedro comprou uma casa na zona sul.
e) É precisoque haja muita compreensão para com João sempre corre aos domingos.
os amigos Letícia canta no coral da cidade.

14) Há crianças sem carinho. c) Predicado Verbo-Nominal: quando a oração apre-


Disseram-me a verdade. senta um verbo de ação e um predicativo do sujeito.
Construíram-se represas.
Ex.:
Os sujeitos das orações acima são, respectivamente: Pedro comprou a casa apressado.
a) inexistente, indeterminado, simples João falou à Maria desolado.
b) indeterminado, implícito, indeterminado
c) simples, indeterminado, indeterminado Percebemos que nos exemplos acima temos verbos de
d) inexistente, inexistente, simples ação (com forte carga semântica) e predicativos (apressado
e) indeterminado, simples, inexistente e desolado) que também se referem ao sujeito.

(Exercícios retirados de http://www.gramaticaparacon- Vale lembrar que verbos com dupla transitividade: tran-
cursos.com/2013/11/sujeito-exercicios.html?m=1) sitivos diretos e indiretos também integram predicado ver-
bo-nominal.
Enviei uma carta para Pedro.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Verbos transitivos são os que se ligam ao complemen- 06. Assinale a alternativa em que apareça predicado
to sem o auxílio de preposição: verbo-nominal.
Ex.: Comprei uma casa a) A chuva permanecia calma.
Encontrei a chave b) A tempestade assustou os habitantes da vila.
c) Paulo ficou satisfeito.
Verbos transitivos indiretos são os que se ligam ao d) Os meninos saíram do cinema calados.
complemento com o auxílio de preposição. e) Os alunos estavam preocupados.
Ex.: Preciso de você
Fui à Bahia 07. Observe a oração abaixo e assinale a alternativa
CORRETA:
Verbos transitivos diretos e indiretos (bitransitivos) são “A inspiração é fugaz, violenta.”
os que para terem seu sentido completo necessitam da Podemos afirmar que o predicado é:
presença de um complemento iniciado por artigo e outro a) Verbo-nominal, porque o verbo é de ligação e vem
por preposição: seguido de dois predicativos.
Enviei uma carta para Pedro b) Nominal, porque o verbo é de ligação.
c) Verbal, porque o verbo é de ligação e são atribuídas
duas características ao sujeito.
EXERCÍCIOS d) Nominal, porque o verbo tem significação completa
e apresenta adjuntos adnominais e dois predicativos.
01. Assinale a alternativa em que aparece predicado e) Verbo-nominal porque apresenta um predicativo se-
verbo-nominal: guido do objeto direto.
a) “Nesse samba te proclamo majestade do universo.”
b) O homem doou os agasalhos aos necessitados. 08. Sobre o exemplo: “A lua brilhou alegre no céu”, afir-
c) Após o toque permaneceram na sala os alunos. mamos:
d) “Brasil és no teu berço dourado o índio civilizado.”
I. O verbo brilhar é intransitivo.
e) “Lutar com palavras é a luta mais vã.”
II. O verbo brilhar é transitivo direto.
III. O verbo brilhar é transitivo indireto.
02. Onde há predicado verbo-nominal?
IV. O predicado é nominal.
a) Devolva os documentos ao diretor.
V. O predicado é verbal.
b) Renata ficou feliz.
c) Ela confia em você. VI. O predicado é verbo-nominal.
d) A notícia deixou-o preocupado. a) Estão corretas I e VI.
e) Os viajantes partiram ontem. b) Estão corretas I e V.
c) Estão corretas II e V.
03. O professorentrou apressado. Os grifos indicam: d) Está correta apenas IV.
a) predicado nominal. e) Estão corretas III e VI.
b) predicado verbo-nominal.
c) predicado verbal. 09. Ocorre predicado verbo-nominal em:
d) objeto direto. a) A tua resposta não é verdadeira.
e) objeto indireto b) O cão vadio virou a lata de lixo.
c) Viraram moda os jogos eletrônicos.
04. Identifique a alternativa errada em relação à classifi- d) Todos permaneçam em seus lugares.
cação dos predicados das orações a seguir: e) Pensativo e triste vinha o rapaz.
a) Todos nós consideramos a sua atitude infantil (predi-
cado verbo-nominal) 10. Indique a alternativa em que o predicado é verbo-
b) A multidão caminhava pela estrada poeirenta. (predi- -nominal:
cado verbo-nominal) a) O soldado foi encontrado morto.
c) A criançada continua emocionada. (predicado nominal) b) Aquele homem tornou-se milionário.
d) A criançada continua no jardim. (predicado nominal). c) Hoje é dia 20 de novembro.
e) Demitiram o secretário da instituição. (predicado verbal) d) Alguns jogadores estão contundidos.
e) Os alunos parecem desinteressados.
05. Analise as orações e assinale a alternativa correta:
I. Paulo está adoentado. 11. Assinale uma das alternativas em que aparece um
II. Paulo está no hospital. predicado verbo-nominal:
a) Os viajantes chegaram cedo ao destino.
a) O predicado é verbal em I e II. b) Demitiram o secretário da instituição.
b) O predicado é nominal em I e II. c) Nomearam as novas ruas da cidade.
c) O predicado é verbo-nominal em I e II. d) Compareceram todos atrasados à reunião.
d) O predicado é verbal em I e nominal em II. e) Estava irritado com as brincadeiras.
e) O predicado é nominal em I e verbal em II.

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LÍNGUA PORTUGUESA

12. Assinale a alternativa correta em relação à classifica- TERMOS INTEGRANDES DA ORAÇÃO


ção dos predicados das orações abaixo:
I- Saíram ele e ela. São os termos que “integram” a oração, completando o
II- Sua terra está completamente mudada. seu sentido. Sem sua presença a frase permanece incom-
III- Achei calma a aluna. pleta. Vejamos os diversos tipos:

a) I predicado verbal; II - predicado nominal; III - predi- a) Objeto Direto: completa o verbo transitivo direto,
cado verbo-nominal. sem o auxílio de preposição.
b) I predicado nominal; II predicado verbo-nominal; III Olhei o quadro.
predicado verbal. Vendi a casa de praia.
c) I predicado verbo-nominal; II predicado verbal; III
predicado nominal. b) Objeto Indireto: completa verbo transitivo indireto,
d) I predicado verbo-nominal; II predicado nominal; III com o auxílio de preposição.
predicado verbal. Preciso de amor.
e) I predicado nominal; II - predicado verbal; III - predi- Necessito de tempo.
cado verbo-nominal.
c) Complemento Verbal: completa o sentido de um
13. Assinale a alternativa correta em relação à classifica- substantivo abstrato ou adjetivo.
ção dos predicados das orações abaixo: Tenho medo de avião.
I- Olhei a aluna na janela. Ela é favorável à reforma política.
II- Aqui se trabalha. Nos exemplos acima, o substantivo abstrato “medo” e
III- Ninguém saiu hoje satisfeito. o adjetivo “favorável” ficariam incompletos e sem sentido
a) I predicado verbal; II - predicado verbal; III - predica- sem a presença dos complementos nominal.
do verbo-nominal.
b) I - predicado nominal; II predicado verbal; III predica- d) Agente da Passiva: complemento preposicionado
do verbo-nominal. que representa o agente de ação de um verbo que está na
c) I predicado verbo-nominal; II predicado verbal; III voz passiva.
predicado nominal. Eu comprei um carro. (Aqui o verbo está na voz ativa. O
d) I predicado verbo-nominal; II predicado nominal; III agente da ação do verbo coincide com o sujeito da oração.)
predicado verbal. O carro foi comprado por João. (percebemos que neste
e) I - predicado nominal; II - predicado verbal; III - pre- caso o agente da ação de comprar não é o sujeito da ora-
dicado verbo-nominal. ção – que aqui é “o carro”, mas sim João, classificado aqui
como agente da passiva.
14. Aponte a frase de sujeito simples e predicado ver-
bo-nominal.
a) A jovem passeava tranquilamente. EXERCÍCIOS
b) Mariana fez o concurso esperançosa.
c) Existem grandes possibilidades. 01 - A análise sintática é definida pela relação que se
d) Paulo e Marcelo estudam animados. estabelece entre palavras ou grupos de palavras dentro de
e) Os cientistas retomaram da gruta às pressas. um contexto. Relacione a 2ª coluna de acordo com a 1ª,
observando a correta classificação dos termos destacados.
15. Assinale a alternativa em que há uma oração com A seguir, assinale a alternativa CORRETA:
predicado 1. Objeto direto
verbo-nominal: 2. Objeto indireto
a) O mar estava calmo naquela manhã. 3. Complemento nominal
b) Nenhum navio partiu ontem. 4. Agente da passiva
c) Achei esse sujeito muito antipático. ( ) “ A fome pode determinara supressãode uma delas.”
d) O homem ficou furioso com a brincadeira. ( ) “ A destruição não atingeo princípio universal e co-
e) Ele terminou o trabalho ontem à tarde. mum.”
(Exercícios retirados de http://solinguagem.blogspot. ( ) “ Uma das tribos será exterminadapela outra.”
com.br/2012/02/exercicios-de-predicado.html) ( ) ... e necessitamde mais alimento.
a) 3, 1, 4, 2
GABARITO b) 1, 2, 3, 4
c) 2, 4, 1, 3
1A - 2D - 3B - 4D - 5E - 6D - 7 B - 8A - 9E - 10A - 11D - d) 4, 3, 2, 1
12A - 13A - 14B - 15C e) 3, 4, 1, 3

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LÍNGUA PORTUGUESA

02. Em: Tinha grande amorà humanidade/ As ruas fo- 09. Assinale, dentre as alternativas abaixo, a que contém
ram lavadaspela chuva/ Ele é ricoem virtudes.Os termos objeto direto preposicionado:
destacados são, respectivamente: a) “Desesperado, deixou o cravo, pegou do papel escri-
a) complemento nominal, agente da passiva, comple- to e rasgou–o”.
mento nominal b) Não desconfiei do candidato e corrigi o trabalho por
b) objeto indireto, agente da passiva, objeto indireto inteiro.
c) complemento nominal, objeto indireto, complemen- c) Poucos jornais se referiram ao episódio.
to nominal d) O jovem de hoje também necessita de espiritualidade.
d) objeto indireto, complemento nominal, agente da e) Pela estrada ia passando um comboio de caminhões–
passiva tanques.
e) objeto direto, objeto indireto, complemento nominal
10. Assinale a frase que contém agente da passiva:
03. Assinale o item em que a função não corresponde a) Fiquei ouvindo aquilo por longo tempo.
ao termo em destaque: b) Dei cinco reais pelo cachorrinho.
a) Comer demais é prejudicialà saúde.(complemento c) As colheitas foram levadas pela chuva.
nominal) d) Sempre saía a esmo pelos caminhos.
b) Jamais me esquecereide ti. (objeto indireto) e) Agrada–me por todas as formas.
c) Ele foi cercadode amigos sinceros. (agente da passiva)
d) Não tens interessepelos estudos. (complemento nominal) (Exercícios retirados de http://odemartins.blogspot.
e) Ele tinha receiode tudo a sua volta.. (objeto indireto) com.br/2014/04/termos-integrantes-da-oracao-exercicio.
html)
04. Em todas as alternativas abaixo, há objeto direto
preposicionado, exceto em:
GABARITO
a) Acho que ela não consegue amar a ninguém.
b) Dedicou–se a estudos matemático.
1A - 2A - 3E - 4B - 5B - 6A - 7B - 8B - 9A - 10C
c) Para sair com a turma o diretor escolheu a nós.
d) Ofenderam a mim e não a ele.
e) O professor elogiou a todos.
TERMOS ACESSÓRIOS DA ORAÇÃO
05. O agente da passiva foi corretamente destacado em São termos que são dispensáveis na oração, mas acres-
todas as opções, exceto em: centam informação ou circunstância referente ao substan-
a) O presídio tinha sido cercadopelos soldados. tivo ou ao verbo, enriquecendo seu sentido. São conside-
b) Ela é a única responsávelpela festa. rados termos acessórios:
c) O time foi derrotadopelo campeão da cidade. a) Adjunto Adnominal
d) O mestre foi homenageadopelos alunos. b) Adjunto Adverbial
e) A casa foi destruídapela inundação. c) Aposto

06. Assinale a frase em que o objeto direto é pleonástico: a) Adjunto Adnominal: como a própria denominação
a) A borboleta negra, encontrei–a à noite. adianta, o adjunto adnominal é o termo que acompanha o
b) Eu a sacudi de novo. nome (o substantivo) na função de satélite, concordando
c) Fiquei a olhar o cadáver com simpatia. com ele em gênero e número. Podem ser adjuntos adno-
d) Um golpe de toalha rematou a aventura. minais as classes gramaticais: artigo, pronomes, numerais,
e) Vi dali o retrato de meu pai. adjetivos ou locuções adjetivas.
Ex.:
07. “A recordaçãoda cenapersegue–meaté hoje”. Os ter-
mos em destaque são: A linda professora publicou seu livro.
a) objeto indireto – objeto indireto;
b) complemento nominal – objeto direto; Substantivos: professora/ livro
c) complemento nominal – objeto indireto; Adjuntos adnominais: A/linda/seu
d) objeto indireto – objeto direto;
e) agente da passiva – objeto indireto. A casa da Maria foi vendida.
Substantivo: Maria
08. Dentre as opções abaixo assinale aquela em que há Adjuntos Adnominais: A/da Maria
objeto direto preposicionado:
a) Passou aos filhos a herança recebida dos pais; Qual a diferença entre complemento Nominal e Ad-
b) Amou a seu pai, com a mais plena grandeza da alma; junto Adverbial?
c) Amou sua mulher como se fosse a única;
d) Naquele tempo era muito fácil viajar para os infernos; O complemento nominal é um termo integrante e sua
e) Em dias ensolarados, gosto de ver nuvens flutuarem presença garante o sentido da frase:
nos céus de agosto. Tenho necessidade (de que?) de amor.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Já o adjunto adnominal auxilia na produção de sentido, 3. Nos trechos:


mas pode ser descartado pois não causa prejuízo ao enten-
dimento do enunciado. “Marciano subiu ao forro da igreja e acabou com elasa pau.”
Os meus três lindos filhos de criação já se formaram. “Não posso ver o mostrador assimàs escuras.”
(Qual é a informação básica? Filhos se formaram
As expressões destacadas dão, respectivamente,
b) Adjunto Adverbial: termos que inserem uma infor- ideia de:
mação de circunstância a verbo. Como nos diz a denomi-
nação, são os advérbios ou locuções adverbiais presentes a) modo, especificação
na oração. b) lugar, modo
Comi muito hoje. c) instrumento, modo
d) instrumento, origem
e) origem, modo
Verbo: comi
Adjunto Adverbial de intensidade: muito
4. Na oração: “José de Alencar, romancista brasilei-
Adjunto adverbial de tempo: hoje ro, nasceu no Ceará”, o termo destacado exerce a fun-
Vejamos as circunstâncias possíveis de um adjunto ad- ção sintática de:
verbial: a) aposto
- circunstância de tempo: Ontem li o livro. b) vocativo
- circunstância de modo: Cantou bem. c) predicativo do objeto
- Circunstância de lugar: Vivo perto daqui. d) complemento nominal
- Circunstância de intensidade: Chorou bastante. e) n.d.a.
- Circunstância de modo: Morreu de sede. 5. Na oração: “Cláudia,uma mulher simplesmente
- Circunstância de companhia: Viajei com Pedro. notável, é a melhor mãe que uma criança poderia ter”,
- Circunstância de instrumento: Cortou com a faca. o termo destacado exerce a função sintática de:
a) complemento nominal
3) Aposto: termo que possui a função de explicar, es- b) aposto explicativo
clarecer um termo previamente citado, apresentado na c) vocativo
oração entre vírgulas. d) aposto especificativo
Ex: e) ajunto adnominal

6. Dê a função sintática do termo destacado em:


João saiu às pressas.
“Não digo nada de minha tia materna,Dona Emeren-
João, irmão de Maria, saiu às pressas.
ciana”.
a) sujeito
Roma é cidade eterna. b) adjunto adverbial
Roma, que é capital de Itália, é a cidade eterna. c) objeto direto
d) vocativo
e) objeto indireto
EXERCÍCIOS
(Exercícios retirados de http://www.gramaticaparacon-
1. Na oração “Você ficará tuberculoso,de tuberculo- cursos.com/2013/12/termos-acessorios-da-oracao-exerci-
semorrerá”, as palavras destacadas são, respectivamente: cios.html)
a) adjunto adverbial de modo, adjunto adverbial de
causa GABARITO
b) objeto direto, objeto indireto 1 -c
c) predicativo do sujeito, adjunto adverbial 2 -b
d) ambas predicativos 3-c
e) n.d.a. 4 -a
5 -b
6 -d
2. Aponte a alternativa em que há adjunto adverbial
de causa.
a) Compro os livros com o dinheiro. SINTAXE DO PERÍODO COMPOSTO
b) O poço secou com o calor.
c) Estou sem amigos. PERÍODO COMPOSTO
d) Vou ao Rio.
e) Pedro é efetivamente bom. Período composto é o enunciado de sentido completo
que gira em torno de dois ou mais verbos.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: Nos exemplos acima percebe-se que as conjunções em


1) O funcionário chegou e assinou o documento. destaque não apenas liga as duas orações, cria um sentido
2) Maria disse que não iria à festa. específico entre elas. Por isso mesmo, a gramática estabe-
lece uma classificação específica a partir da relação de sen-
Nos exemplos acima verificamos a relação entre as tido criado pelas conjunções.
duas orações. Entretanto, percebemos que, no exemplo 1
a segunda oração não completa o sentido do verbo da CLASSIFICAÇÃO DAS ORAÇÕES COORDENADAS
primeira, ambos os segmentos são independentes. Já na SINDÉTICAS
frase 2 a segunda oração possui a função de completar o
sentido do verbo dizer. a) Oração coordenada sindética aditiva: estabelece
Por isso mesmo, afirma-se que há períodos em que uma relação de adição entre as orações, a partir das con-
as orações estão unidas num enunciado em situação de junções coordenativas aditivas e, nem ...nem, não só...como
independência (exemplo 1). Denominamos esse período também, não só…mas também etc...
de período composto por coordenação. Além disso, há Ex.
casos em que as duas orações não podem ser separadas, A economia cresceu e progrediu.
pois uma completa a outra (exemplo 2), e isso se trata de A economia não só cresceu mas também progrediu.
um período composto por subordinação. Nem estudou nem descansou.
Ex.:
3) Penso, logo existo. b) Oração coordenada sindética adversativa: trans-
Trata-se de um período composto por coordenação já mite uma ideia de contradição e oposição, através das con-
que é possível transformar as duas orações em frases in- junções coordenativas adversativas mas, porém, entretanto,
dependentes: contudo, todavia etc…
Penso. Logo existo. Ex.:
Fui dormir tarde, mas consegui acordar cedo.
4) Perguntei se ele me amava. Gosto muito de você, porém preciso deixá-lo.

Vemos aqui um caso de período composto por subor- c) Oração coordenada sindética alternativa: estabe-
dinação, pois se separarmos as orações tornando-as pe- lece uma relação de alternância com a oração anterior. São
ríodos simples, o enunciado perderá o sentido: usadas as conjunções coordenativas alternativas ou...ou…,
já...já, quer...quer, ora...ora.
Perguntei. Se você me amava. Ex.:
Ou durmo, ou estudo.
Cada um desses períodos apresenta características e Ora durmo, ora estudo.
manifestações distintas.
d) Oração coordenada sindética conclusiva: cria uma
PERÍODO COMPOSTO POR COORDENAÇÃO relação de conclusão com a oração anterior, oferecendo a
ideia de resultado. São utilizadas as conjunções coordena-
Denomina-se período composto por coordenação o tivas conclusivas pois, logo, portanto, por conseguinte, con-
enunciado de sentido completo composto por duas ou sequentemente.
mais orações coordenadas, ou seja, independentes. Nes- Penso, logo existo.
ses casos não há uma oração que se sobreponha à outra e, Estudo, por conseguinte obterei o resultado almejado.
por isso mesmo, não há uma oração principal, ambas são.
Por serem autônomas, as orações coordenadas podem e) Oração coordenada explicativa: estabelece uma
ser unidas apenas por vírgulas e aí são denominadas de ideia de explicação com a oração anterior, esclarecendo-a.
assindéticas, já que não apresentam nenhuma palavra de São usadas as conjunções coordenativas porque, isto é, ou
conexão entre si, como no exemplo: seja, a saber.
Ex.:
Vi, vim, venci. Viajei logo, porque tinha pressa.
Fiquei muito triste, uma vez que ele descumpriu o trato
Ainda que sejam independentes, as orações coordena- combinado.
das podem ser unidas também a partir de um elemento
conectivo, recebendo a denominação de orações coor- IMPORTANTE
denadas sindéticas. A classe gramatical que cumpre essa
função de conectá-las é a conjunção. Esta não apenas une Excetuando as orações coordenadas sindéticas adi-
as orações, estabelece entre elas uma relação de sentido. tivas, todas as demais exigem o uso de vírgula antes da
Vejamos: conjunção coordenativa:
a) O ciclista acordou tarde e comeu.
b) O ciclista acordou tarde, mas comeu. Trabalhou muito, mas não concluiu a tarefa.
c) O ciclista acordou tarde, logo comeu. Ou esqueça, ou lute.
d) O ciclista acordou tarde porque comeu. Está batalhando, pois ambiciona progredir.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Ela chegara atrasada, porque houve greve na linha do PERÍODO COMPOSTO POR SUBORDINAÇÃO
metrô.
Denomina-se período composto por subordinação o
período integrado por duas ou mais orações em que se
EXERCÍCIOS verifica entre elas uma relação de dependência semântica
e sintática. Ou seja, caso se retire uma das orações o enun-
1.A oração “Não se verificou, todavia, uma transplanta- ciado perde o sentido.
ção integral de gosto e de estilo” tem valor: Ex.:
a) conclusivo Perguntei se ele viria.
b) adversativo Chorou tanto que não conseguiu abrir os olhos.
c) concessivo
d) explicativo Quando falamos em orações subordinadas se enten-
e) alternativo de a presença de uma oração principal e uma oração
subordinada que completará a mensagem da primeira.
2. “Estudamos, logo deveremos passar nos exames”. A As orações subordinadas dividem-se em:
oração em destaque é: a) Orações Subordinadas Substantivas: completam a
a) coordenada explicativa oração principal exercendo a função de substantivo;
b) coordenada adversativa b) Orações Subordinadas Adjetivas: completam a ora-
c) coordenada aditiva ção principal exercendo a função de adjetivo;
d) coordenada conclusiva c) Orações Subordinadas Adverbiais: completam a ora-
e) coordenada alternativa ção principal exercendo a função de advérbio.
3. No verso, “Tenta chorar e os olhos sente enxutos”, o
I – ORAÇÕES SUBORDINADAS SUBSTANTIVAS
conectivo oracional indica:
a) junção de ideias, logo é conjunção aditiva
b) disjunção de ideias, logo é conj. Alternativa Como dito acima, são as que integram a oração princi-
c) contraste de ideias, logo é conj. Adversativa pal exercendo a função de substantivo.
d) oposição de ideias, logo é conj. Concessiva Como assim?
e) sequência de ideias, logo é conj. Conclusiva. Atente ao exemplo abaixo:

4. Fez isso ______ não conseguiu o resultado. a) Falei verdades a João.


___A_________________B_______________ b) Trabalho é fundamental.
Qual das alternativas abaixo preenche a lacuna, indican- c) Trabalho é fundamental.
do que B é um fato anterior a A?
a) entretanto Nos períodos simples acima percebemos que as pala-
b) pois vras destacadas exercem a função de substantivo e podem
c) porém ser substituídas por isso.
d) enquanto a) Falei isso a João.
e) e. b) Trabalho é isso.
c) Isso é trabalho.
5.”Deus não fala comigo, e eu sei que Ele me escuta.” O
conectivo “e” pode ser substituído, sem contrariar o senti- Realizando uma análise sintática, classificamos os ter-
do, por: mos destacados como objeto direto (a), predicativo do su-
a) ou. jeito (b) e sujeito (c).
b) no entanto Mas o ser humano pode produzir frase mais complexas,
c) porém constituídas por períodos compostos por mais de um ver-
d) porquanto bo, e os mesmos exemplos citados anteriormente podem
e) nem ser assim reescritos:
a) Falei que não me casaria a João.
(Exercícios retirados de http://questoesconcursos.
b) Trabalho é agir com responsabilidade.
blogspot.com.br/2011/04/questoes-de-oracoes-coorde-
c) É importante trabalhar.
nadas-para.html)
O que foi feito? Substituímos os substantivos dos enun-
GABARITO
1.b – 2.d – 3.a – 4.b – 5.b ciados por verbos equivalentes e construímos orações su-
bordinadas substantivas.

Classificação das orações subordinadas substantivas

a) Oração Subordinada Substantiva Subjetiva: quan-


do exerce a função sintática de sujeito do verbo da oração
principal.

80
LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: Ex.:

1) Sua participação foi importante. (sujeito) Mandei-a nadar um pouco.


Foi importante sua participação. (sujeito) Ouvi João chorar o dia inteiro.

Foi importante que você tenha participado da reu- Por isso mesmo, chamamos de orações desenvolvidas
nião. (oração subordinada substantiva subjetiva). as caracterizadas por verbos flexionados e reduzidas com
verbos apresentados no infinitivo.
2) A leitura é fundamental. (sujeito)
É fundamental a leitura. (sujeito) c) Orações Subordinadas Substantivas Objetivas In-
diretas: exercem a função de objeto indireto, completando
É fundamental que você leia. (oração subordinada verbos transitivos indiretos.
substantiva subjetiva) Ex.:
- Estrutura das orações subordinadas substantivas Minha aluna necessita (de) que seus pais a auxiliem.
subjetivas: A coordenação insiste em que os pais auxiliem a aluna.
Nos exemplos acima percebe-se que tanto o verbo ne-
* Verbos de ligação mais predicativo: cessitar quanto o insistir são verbos transitivos indiretos,
exigindo como complemento oração ou palavra antecedi-
É importante – É fundamental – É essencial – Foi im- do por preposição.
prescindível – Permanece preocupante – Está comprovado
d) Oração Subordinada Completiva Nominal: exerce
Ex.: a função de completar o sentido de um NOME, geralmente
É fundamental que as crianças estudem um substantivo abstrato ou adjetivo.
* Expressões iniciadas por verbos na voz passiva:
Ex.:
Sabe-se – Conta-se – Percebe-se – Soube-se – É sabido
Senti receio de que ele viesse alterado.
– Comenta-se – Foi comprado – Foi anunciado
Tive medo de o avião atrasar por mais tempo.
Ela foi favorável a que João participasse do projeto.
Ex.:
Conta-se que muitos alunos não realizaram a prova.
e) Oração Subordinada Substantiva Predicativa:
cumpre a função de predicativo do sujeito, qualificando o
* Verbos como: cumprir – convir – importar – acon- sujeito enquanto “completa” um verbo de ligação.
tecer – ocorrer Ex.:
Ex.: Minha preocupação é que ele não chegue a tempo.
Convém que você estude mais. O fundamental é que ela se recuperou bem.
b) Oração Subordinada Substantiva Objetiva Direta: f) Oração Subordinada Substantiva Apositiva: exerce a
exerce a função de objeto direto, completando verbo tran- função de aposto, esclarecendo algum termo da oração principal.
sitivo direto.
Ex.:
Ex.: Meu desejo era esse: que ele não voltasse mais.
Sempre apresentou essa desconfiança: que Joana não
Maria não sabe que João viajou. estava cumprindo o contrato.
O deputado perguntou se todos já haviam chegado.

Chamamos de conjunção integrante a conjunção que a EXERCÍCIOS


qual inicia a subordinada substantiva objetiva direta. Isso por-
que a ela cabe a atribuição de iniciar o complemento verbal. 1. (UNAMA) No seguinte grupo de orações desta-
cadas:
Peço que você saia.
1. É bom que você venha.
Orações Substantivas Objetivas Diretas Reduzidas: 2. Não esqueças que és falível.

Podem integrar/completar o verbo transitivo direto da Temos orações subordinadas, respectivamente:


oração principal orações subordinadas marcadas pelo ver- a) objetiva direta, subjetiva.
bo reduzido de infinitivo: b) subjetiva, objetiva direta.
c) objetiva direta, adverbial temporal.
d) subjetiva, predicativa.
e) predicativa, objetiva direta.

81
LÍNGUA PORTUGUESA

2. (UFBA) Em todos os períodos a oração subordina- 9. (MACK-SP) No período: «Sabe-se que Jacó pro-
da funciona como sujeito da oração principal, exceto em: pôs a Labão que lhe desse todos os filhos das cabras...»,
a) É claro que eles virão. a alternativa que contém a análise correta das orações,
b) Acontece que ela mentiu. na sequência em que vêm no período é:
c) Sabe-se que é um golpe. a) principal; subordinada substantiva subjetiva; subordi-
d) O certo é que tudo morre. nada substantiva objetiva direta.
e) Agora parece que é dia. b) coordenada sindética aditiva; subordinada substanti-
va objetiva direta; subordinada substantiva apositiva.
3. (FMU-SP) No seguinte período: «Aí eu tive o fer- c) absoluta; subordinada substantiva objetiva direta;
vor de que ele carecesse de minha proteção, toda a subordinada substantiva objetiva direta. d) principal; su-
vida», a expressão destacada é: bordinada substantiva subjetiva; subordinada substantiva
a) oração subordinada substantiva apositiva. objetiva indireta.
b) oração subordinada substantiva objetiva indireta. e) coordenada assindética; subordinada substantiva
c) oração subordinada substantiva completiva nominal. subjetiva; subordinada substantiva objetiva direta.
d) oração subordinada substantiva predicativa.
10. (PUCCAMP-SP) «Se ele confessou não sei.» A
4. (UFPR) Qual o período em que há oração subordi- oração destacada é:
nada substantiva predicativa? a) subordinada adverbial temporal.
a) Meu desejo é que você passe nos exames vestibu- b) subordinada substantiva objetiva direta.
lares. c) subordinada substantiva objetiva indireta.
b) Sou favorável a que o aprovem. d) subordinada substantiva subjetiva.
c) Desejo-te isto: que sejas feliz. e) subordinada substantiva predicativa
d) O aluno que estuda consegue superar as dificuldades
do vestibular. (Exercícios retirados de https://ocondedemontecristo.
e) Lembre-se de que tudo passa neste mundo. files.wordpress.com/2011/03/un25.pdf)

5. (UFPR) Reconheça a oração subordinada substan- GABARITO


tiva subjetiva: 1 - b 4 - a 7 - b 10 - b 13 - 11 2 - d 5 - d 8 - c 11 - d
a) Veja se está tudo em ordem.
b) Perguntou quem era.
c) Que ele não compareceu, souberam. II – ORAÇÕES SUBORDINADAS ADJETIVAS
d) É necessário que tenhamos paciência.
São as orações que equivalem a adjetivos, na função
e) n.d.a.
de qualificar ou esclarecer um termo da oração principal.
Vejamos:
6. (UEM-PR) «Parecia que o morro se tinha distancia-
do muito.» No período acima, a oração subordinada é: a) Encontrei aquele menino bonito. (adjetivo)
a) substantiva objetiva direta. b) Encontrei aquele menino que é bonito. (oração su-
b) substantiva subjetiva. bordinada adjetiva)
c) adjetiva explicativa.
d) substantiva predicativa Nos exemplos acima percebemos como a oração desta-
e) adverbial consecutiva. ca em (b) equivale ao adjetivo do exemplo anterior.

7. (UFPR) Julieta ficou à janela na esperança de que Vale destacar que as orações subordinadas adjetivas,
Romeu voltasse. A oração em destaque é:
por exercerem a função de adjetivo, cumprem tam-
a) subordinada substantiva subjetiva.
b) subordinada substantiva completiva nominal. bém a atribuição de adjunto adnominal.
c) subordinada substantiva predicativa.
d) subordinada adverbial causal. Essas orações são iniciadas por pronomes relativos:
e) subordinada adjetiva explicativa. que, o qual, a qual, as quais, os quais
Ex.:
8. (PUCCAMP-SP) Assinale o período em que a ora- Vi o jogador que vive em Madri.
ção destacada é substantiva apositiva: Vi o jogador o qual vive em Madri
a) Não me disseram onde moravas.
b) A rua onde moras é muito movimentada. Classificação das orações subordinadas adjetivas
c) Só me interessa saber uma coisa: onde moras.
d) Morarei onde moras. Pensemos no adjetivo. Enquanto classe gramatical qua-
e) n.d.a. lificadora, pode especificar uma qualidade referente ao
substantivo ou simplesmente apresentar ou esclarecer uma
característica geral:

82
LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: 2) Identifique a alternativa que se encontra uma oração


a) Maria é a aluna sueca. (Aqui o adjetivo restringe o subordinada adjetiva restritiva.
substantivo, reduzindo-o a grupo dos estudantes suecos). A) Sei que ainda não disse tudo.
b) Todo homem é mortal. ( Já aqui o adjetivo apenas B) Este é o apartamento que comprei.
explica uma qualidade geral). C) Ela chegou, lavou as mãos e saiu.
D) Assim que chegou, dormiu.
Da mesma forma, as orações subordinadas adjetivas
podem reduzir o campo semântico ou simplesmente escla- 3) Identifique a alternativa que se encontra uma oração
recê-lo e daí vem sua classificação: subordinada adjetiva explicativa.
a) Oração Subordinada Adjetiva Restritiva: orações A) Eram músicas que contagiavam.
que cumprem a função de particularizar e restringir um ter- B) Os homens, que são seres racionais, merecem nosso
mo da oração principal. diálogo.
C) A televisão apresenta cenas que agridem.
Ex.:
D) Viajaram a lugares por onde nunca sonharam passar.
Encontrei o repórter que vive em Tóquio.
Admiro os alunos que estudam Português.
Foi entrevistada a atriz que recebeu o Oscar. (Exercícios retirados de http://provasdeportugues.
Nos exemplos acima todas as orações destacadas são blogspot.com.br/2014/06/atividades-de-oracoes-subordi-
adjetivas restritivas, já que qualificam o nome reduzindo nadas_25.html)
seu campo semântico.
GABARITO
b) Oração Subordinada Adjetiva Explicativa: ao con-
trário da anterior, não apresenta qualificação restritiva, ape-
1 -D
nas explica uma ideia na função de esclarecer um termo já
2 -B
citado. Essa oração costuma aparecer entre vírgulas. 3–B
Ex.:
Lilian, que é economista, prevê a continuação da inflação. ORAÇÕES SUBORDINADAS ADVERBIAIS
O Ramadã, que é o período de jejum dos muçulma-
nos, inicia na próxima segunda. Chamamos de orações subordinadas adverbiais aque-
las que se acoplam à oração principal denotando uma
Diferenças entre as conjunções integrantes e circunstância, função típica dos advérbios. Quando desen-
pronomes relativos: o caso da palavra “QUE” volvidas, são sempre introduzidas por conjunções subordi-
nativas adverbiais e classificadas segundo as circunstâncias
que exprimem.
Vimos que a palavra “que” pode ser uma con- Ex.:
junção integrante nas orações subordinadas a) Saiu para trabalhar à noite. (o termo destacado é
substantivas e pronome relativo nas subordi- uma locução adverbial de tempo, já que oferece uma cir-
nadas adjetivas. Como entender a diferença? cunstância ao verbo “trabalhar”)
É fácil: o “que” conjunção integrante completa b) Saiu para trabalhar quando anoiteceu. (a locução
verbos transitivos e o “que” pronome relativo adverbial foi substituída por uma oração, que exerce a
sucede um nome (e não um verbo) cumprindo mesma função, apresenta uma circunstância temporal).
a função de iniciar a qualificação do mesmo. As orações subordinadas adverbiais dividem-se em:
causais, consecutivas, concessivas, conformativas, compa-
rativas, finais, proporcionais, condicionais e temporais. Ve-
EXERCÍCIOS jamos cada uma delas:
1)Quanto à classificação das orações subordinadas ad- 1) Oração subordinada adverbial causal: expressa a
jetivas abaixo, a correta opção é: ideia de causa, iniciada pelas conjunções subordinativas
Os paisque cuidam dos seus filhosmerecem aplausos. porque, como, uma vez que, visto que, posto que etc…
Esta equipe,cujo técnico não incentiva seus atletas,sem- Ex.:
pre perde. a) Como estava chovendo, o aluno não foi treinar.
A casa,onde mora, parece abandonada. b) A escola não realizou o concurso, visto que não ha-
A) restritiva, restritiva, explicativa via o material necessário.
B) explicativa, explicativa, explicativa
C) explicativa, restritiva, explicativa 2) Oração subordinada adverbial consecutiva: indica
D) restritiva, explicativa, explicativa. a ideia de consequência, precedida pelas conjunções su-
bordinativas que, de sorte que, de modo que etc…
Ex.:
a) Estudou tanto que gabaritou a prova.

83
LÍNGUA PORTUGUESA

b) Estava tão nervosa de modo que não conseguiu i) Oração subordinada adverbial temporal: indica
chegar até o fim da prova. uma circunstância de tempo à oração principal, iniciada pe-
las conjunções subordinativas quando, enquanto, logo que,
3) Oração subordinada adverbial concessiva: expres- assim que, depois que etc…
sa uma circunstância contrária a apresentada na oração Ex.:
principal, iniciada pelas conjunções subordinativas embora, a) Quando chegou, iniciou os procedimentos.
ainda que, conquanto que etc… b) Realizou a entrevista assim que o convidado apa-
Ex.: receu.
a) Embora estivesse chovendo, foi correr na avenida.
b) Conquanto Maria estivesse atrasada, conseguiu IMPORTANTE! ORAÇÕES SUBORDINADAS AD-
realizar a prova. VERBIAIS EM SUA FORMA REDUZIDA
4) Oração subordinada adverbial conformativa: in- Orações reduzidas são aquelas que apresentam ver-
dica conformidade com a informação expressa na oração bos reduzidos de infinitivo, sem flexão, ou no gerún-
principal, precedida pelas conjunções subordinativas con- dio Algumas subordinadas adverbiais podem apre-
forme, consoante, como, segundo etc… sentar verbos com essa característica:
Ex.:
a) Conforme informou a previsão do tempo, choveu a) Subordinadas adverbiais finais: Estou batalhando
bastante no sul do Brasil. para você ter um futuro melhor.
b) Segundo dissera o professor, a prova fora adiada b) Subordinadas adverbiais condicionais: Se você
em tempo. chegar em tempo, poderemos estudar.
5) Oração subordinada adverbial comparativa: tem c) Subordinadas adverbiais temporais: Acordando
como função estabelecer uma comparação com a oração amanhã, ligue para sua mãe.
principal, iniciada pelas conjunções subordinativas como, d) Subordinadas adverbiais consecutivas: Não con-
que, tanto como, tal como, do que etc… seguiu ler o discurso sem gaguejar.
Ex.:
a) Ele estuda tanto como sua irmã. (estuda)
b) João treina tal como Pedro estuda. EXERCÍCIOS
Percebemos na frase a) que quando o verbo de compa-
ração é o mesmo da oração principal, ele pode estar oculto. 1.(MACK) “Na ‘Partida Monção’, não há uma atitude
inventada. Há reconstituição de uma cenacomo elade-
6) Oração subordinada adverbial final: Exprime fina- via ter sido na realidade.” A oração “como ela devia ter
lidade referente à ação do verbo da oração principal, pre- sido na realidade” é:
cedida pelas conjunções subordinativas para que, a fim de a) adverbial conformativa
que, que, porque etc… b) adverbial proporcional
Ex.: c) adjetiva
a) Os jogadores treinaram muito para que pudessem d) adverbial causal
vencer o campeonato. e) adverbial consecutiva
b) Os alunos se prepararam muito para que conseguis-
sem aprovar o projeto. 2.(FUVEST) No período: “Era tal a serenidade da tar-
de, que se percebia o sino de uma freguesia distante,
7) Oração subordinada adverbial proporcional: ex- dobrando a finados.”, a segunda oração é:
pressa a ideia de proporção junto ao verbo apresentado na a) subordinada adverbial causal
oração principal, iniciada pelas conjunções subordinativas b) subordinada adverbial consecutiva
à medida que, à proporção que, quanto mais...tanto mais, c) subordinada adverbial concessiva
quanto mais..tanto menos etc… d) subordinada adverbial comparativa
Ex.: e) subordinada adverbial subjetiva
a) Quanto mais se trabalha, mais se engrandece.
b) À medida que envelheço, mais bela fico. 3.(PUC) Assinale a alternativa em que a subordinada
não traduza idéia de consequência, comparação, con-
cessão e causa:
8) Oração subordinada adverbial condicional: apre- a.Porquanto, não fosse um ancião convencional, enter-
senta uma condição para que se efetive a ação expressa rou-se de sobrecasaca e polainas.
pelo verbo da oração principal, precedida pelas conjunções b.Desde que era um ancião convencional, enterrou-se
subordinativas se, caso, desde que, contanto que etc… de sobrecasaca e polainas.
Ex.: c.Ele era um ancião tão convencional que se enterrou
a) Caso Maria compareça, faremos a reunião. de sobrecasaca e polainas.
b) Assinaremos o contrato se o presidente concorde d. Ele era um ancião mais convencional do que o que se
com os termos. enterrou de sobrecasaca e polainas.
e.Ele era um ancião convencional, na medida em que se
enterrou de sobrecasaca e polaina.

84
LÍNGUA PORTUGUESA

4.(FUVEST) Na frase “Entrando na faculdade, procu- d.O momento foi tão intensoque ele teve medo- subor-
rarei emprego.”, a oração subordinada indica idéia de: dinada adverbial consecutiva
a) concessão e.Solta, que você está me machucando- coordenada
b) lugar sindética explicativa
c) oposição
d) consequência 10.(FUVEST) No período: “Ainda que fosse bom jo-
e) condição gador, não ganharia a partida”, a oração destacada en-
cerra idéia de:
5. (EFOA-MG)“Quando vejo certos colegasmostrando a) causa
com orgulho aquela rodela imbecil no pescoço ...” O perío- b) condição
do que apresenta uma oração com a mesma classificação c ) concessão
da destacada na citação acima é: d) proporção
a) “Mal o sol fugia, começavam as toadas das cantigas.” e) fim
b) “Caso o encontre, dê-lhe o recado.”
c) “Dado que a polícia venha, prenderemos o assassino.” 11.(PUC) No período: “Apesardisso a palestra de Seu
d) “Uma vez que cheguem os reforços, atacaremos a Ribeiro e D. Glória é bastante clara”, a palavra grifada
praça.” veicula uma idéia de:
e) “Contar-lhe-ei o caso, conquanto você guarde segredo.” a) concessão
b) condição
6.(UFE-PA) No trecho “Cecília ... viu do lado oposto c) comparação
do rochedo Peri,que a olhava com uma admiração ar- d) modo
dente”, a oração grifada expressa uma e) consequência
a) causa
b) lugar 12. (CESGRANRIO) Assinale o período em que ocor-
c) oposição
re a mesma relação significativa indicada pelos termos
d) explicação
destacados em: “A atividade científica é tão natural-
e) condição
quanto qualquer outra atividade econômica.”
a) Ele era tão aplicado, que em pouco tempo foi pro-
7.(UF SANTA MARIA-RS) Leia, com atenção, os pe- movido.
ríodos abaixo: b) Quanto mais estuda, menos aprende.
Caso haja justiça social, haverá paz. c) Tenho tudo quanto quero.
Embora a televisão ofereça imagens concretas, ela não d) Sabia a lição tão bem como eu.
fornece uma reprodução fiel da realidade. e) Todos estavam exaustos, tanto que se recolheram
Como todas aquelas pessoas estavam concentradas, logo.
não se escutou um único ruído.
Assinale a alternativa que apresenta, respectivamente, (Exercícios retirados de http://soslportuguesa.blogs-
as circunstâncias indicadas pelas orações sublinhadas: pot.com.br/2011/06/questoes-sobre-oracoes-subordina-
a) tempo, concessão, comparação das_24.html)
b) tempo, causa, concessão
c) condição, consequência, comparação GABARITO
d) condição, concessão, causa
e) concessão, causa, conformidade 1-a, 2-b, 3-e, 4-e, 5-a, 6-d, 7-d, 8-b, 9-b, 10-c, 11-a, 12-d

8.(UNIMEP) I - Mário estudou muito e foi reprova-


do! II - Mário estudou muito e foi aprovado. Em I e II, a CONCORDÂNCIA NOMINAL E VERBAL
conjunção “e” tem, respectivamente, valor:
a) aditivo e conclusivo Quando estudamos as palavras, inicialmente analisamos
b) adversativo e aditivo sua estrutura e características isoladamente. No entanto,
c) aditivo e aditivo quando as palavras entram em relação entre si, precisam
d) adversativo e conclusivo estabelecer uma relação lógica. Além do mais, é essencial
e) concessivo e causal que haja, entre os vocábulos que estejam se referindo ao
mesmo ente, concordância de gênero e número, pois não
9. (UC-MG) A classificação da oração grifada está é correto afirmar que cinco carros VELHO foram VENDIDO.
correta em todas as opções, exceto em: A sintaxe nos oferece regras de concordância nominal
a.Ela sabiaque ele estava fazendo o certo- subordinada e verbal para evitar erros como o citado no exemplo acima.
substantiva objetiva indireta
b.Era a primeira vezque ficava assim tão perto de uma
mulher- subordinada substantiva subjetiva
c.Mas não estava neles modificar um namoroque nas-
cera difícil,cercado,travado- subordinada adjetiva

85
LÍNGUA PORTUGUESA

CONCORDÂNCIA NOMINAL A aluna e o irmãos eram aplicados.


Eram aplicados a aluna e o irmão.
Consiste na concordância entre o substantivo e seus Era aplicada a aluna e o irmão.
respectivos determinantes e qualificadores (que chamamos Era aplicado o irmão e a aluna.
de satélites): adjetivo, pronome, artigo e numeral.
3) quando um substantivo for determinado por
1) Regra geral: mais de um satélite:
O substantivo determina o gênero e número de seus
satélites. a) caso esteja no plural o substantivo determinado,
Ex.: seus satélites permanecem no singular, sem o auxílio de
artigo,
Minha mãe, minhas duas irmãs, estas três lindas Ex.:
primas, todas elas vêm à festa. Estou estudando as línguas francesa e italiana.
Mãe – Substantivo, impõe seu gênero e número a seu b) se o substantivo está no singular deve-se usar o
satélite artigo, como auxílio à determinação.
Minha – pronome, satélite, concorda com o substantivo Estou estudando a língua francesa e a italiana.

Irmãs – Substantivo feminino flexionado no plural 4) É preciso, é bom, é necessário, é proibido


Minhas – pronome, satélite, concorda em gênero e
número a) Ficam no masculino e singular caso o substantivo
Duas – numeral, satélite, concorda em gênero não esteja determinado por artigo.
Ex.:
Primas – Substantivo, núcleo, feminino e plural É proibido entrada de pedestres.
Estas – pronome, concorda com o substantivo É necessário água no mundo.
Três - satélite É bom água com gás.
Lindas – adjetivo, satélite, concorda em gênero e
número com o substantivo b) Caso o substantivo vier precedido por determinante
haverá concordância em gênero e número:
2) Quando um determinante (satélite) se refere a É proibida a entrada de pedestres.
mais de um substantivo É necessária a água no mundo.
É boa a água com gás.
a) se estiver depois dos substantivos, o satélite
concorda com o substantivo mais próximo (e aqui será 5) O verbo no particípio sempre concorda com o
classificado como adjunto adnominal); ou concordará com substantivo:
todos os substantivos (na função de predicativo): Foram comprados os ternos.
Foram compradas as camisas.
Ex.:
Ganhei uma calça e camisa importada. (concordância
6) Meio
com o mais próximo)
a) Só não é flexionado quando se tratar de um advérbio,
Ganhei uma calça e camisa importados (concordância
já que este é uma classe invariável.
com todos os substantivos, utilizando o gênero e número
predominante)
Ex.:
Comprei quadros e tela artística. (concordância com o Comi meia maçã. (numeral)
mais próximo) Cheguei em casa meio dia e meia. (numeral)
Comprei quadro e tela artísticos (concordância com Meias verdades não me interessam. (adjetivo)
todos os substantivos) Bebi meia garrafa de vinho. (numeral)
Estou meio envergonhada. (advérbio)
b) se surgir antes dos substantivos, concorda com o
mais próximo apenas. Caso os nomes sejam substantivos 7) Anexo, incluso, apenso, junto
próprios, concordará com todos eles. Concordam com o substantivo a que se referem:
Ex.:
Ex.: Seguem anexos os relatórios.
Meu pai e tios vieram mais cedo. Vieram anexas as planilhas.
Ganhei nova camisa e sapatos. Seguem inclusas as despesas.
Ele chegou em péssimo momento e hora.
Os exemplares João e Maria. Exceção: caso anexo vier precedido da preposição em
ele se mantém no singular.
c) caso o determinante ocupar a função de predicativo
do sujeito, teremos as seguintes construções:

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LÍNGUA PORTUGUESA

Ex.: EXERCÍCIOS
Segue em anexo os relatórios
1) O adjetivo não está corretamente empregado na
8) A olhos vistos, pseudo, menos concordância em:
Sempre se mantêm invariáveis. a) Eis teu romance: fantástico enredo e personagens,
Ex.: mas estilo pobre e imaturo.
Cresceu a olhos vistos. b) No porto vimos com espanto as esquadras inglesas
Tratam-se de pseudomédicos. e soviéticas unidas.
Ela é menos agradável do que sua irmã. c) Precisa-se de moça e rapaz devidamente habilitados.
d) Fiel aos deveres paternal e fraternal, ambos
9) TAL QUAL silenciavam.
Tal concorda com o termo precedente (ou e) A flor e o fruto saboroso não existem.
imediatamente posposto a ele) e qual com o termo
subsequente. 2) Assinale a frase incorreta considerando que o
Ex.: adjetivo em função de predicativo deve concordar no
Tal mãe quais filhas. plural:
Ele é belo tal quais os irmãos. a) O caipira e sua mulher ficam desconfiados.
b) Tenho o réu e seu comparsa como mentiroso.
10) Muito/ bastante c) Lúcio e Vera caminhavam amuados, lado a lado.
d) Tenho por mentirosos o réu e seu cúmplice.
a) Quando determinarem um substantivo (e portanto, e) Julguei-os capacitados, o aluno e a aluna.
tratarem-se de pronomes) variam em número:
Ex.: 3) Quanto à concordância nominal, preencha as
Comprei bastantes camisas. lacunas das frases:
Vi muitos filmes. (I) Era talvez meio-dia e .......................quando fora preso.
(II) Decepção é ..............................para fortalecer o
b) Quando expressarem circunstância ao verbo (função sentimento patriótico.
típica dos advérbios) permanecem invariáveis. (III) Apesar da superpopulação do alojamento, havia
Ex.: acomodações.............................para os homens.
Comemos muito na festa. (IV) Os documentos dos candidatos
Corri bastante. seguiram............................ às fichas de inscrição.
(V) As fisionomias dos homens eram as mais desoladas
11) GRAMA ................................naquele cortejo.
Caso represente unidade de massa permanece no a) meia - bom - bastantes - anexos - possíveis
singular. b) meio - bom - bastantes - anexo - possíveis
Ex: c) meia - boa - bastante - anexo - possível
Comprou um grama de ouro. d) meio - boa - bastante - anexos - possível
e) meia - bom - bastantes - anexo – possível
12) Numerais
Se antecede o substantivo é ordinal (primeiro, 4) Observando a concordância nominal nas frases:
segundo); quando posposto é cardinal (um, dois) (I) É necessário compreensão.
Ex.: (II) A compreensão é necessária.
Li somente a primeira página do relatório. (III) Compreensão é necessário.
Li somente a página um do relatório. (IV) Para quem a compreensão é necessário?
Verificamos que:
13) POSSÍVEL a) apenas a I e a IV estão erradas
Unido a expressões como “o mais”, “o menos”, “o b) apenas a II e a III estão erradas
melhor”, “o pior” concorda com o artigo. c) apenas a IV está errada
Ex.: d) apenas a II está certa
Vi obras o mais belas possível. e) todas estão certas
Vi obras as mais belas possíveis.
5) Quanto ............................. interferências ................
14) Obrigado, mesmo, próprio ................ , melhor ......................a) menas, existirem, serão
Ex: b) menas, existirem, será
Concordam com o substantivo determinado. c) menas, existir, será
Muito obrigada, disse Maria. d) menos, existir, serão
Ela mesma fez a tarefa. e) menos, existirem, será
Isso são questões próprias do sistema.

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LÍNGUA PORTUGUESA

6) Qual alternativa preenche as lacunas abaixo 11)Ocorre erro de concordância nominal na


corretamente? alternativa:
Segue _____ uma cópia do soneto composto pela ______ a) No livro de registros faltava a folha duzentos.
-poetisa, no qual a autora tenta imitar o grande Bilac, b) É necessária segurança para se viver bem.
usando as ______ imagens. c) A janela estava meio aberta.
a) anexo, pseudo, mesmas d) Eu e você estamos quites.
b) anexa, pseuda, mesmas
c) anexa, pseudo, mesma (Exercícios retirados de http://portuguesvestibular.
d) anexa, pseudo, mesmas blogspot.com.br/2012/10/exercicios-de-concordancia-
e) anexo, pseuda, mesmas nominal.html)

7)(Uelondrina 1997) - Assinale a letra correspondente GABARITO


à alternativa que preenche corretamente as lacunas da 1) D 2) B 3) A 4) C 5) E 6) D 7) C 8) A 9) B 10) A 11)
frase apresentada. B
As delegações .......... que .......... participar dos jogos
chegarão amanhã.
a) latinas-americanas - vêem CONCORDÂNCIA VERBAL
b) latinas-americanas - vem
c) latino-americanas - vêm Chamamos de concordância verbal quando o verbo se
d) latinos-americanas - vêm flexiona para concordar com o sujeito.
e) latinos-americanas – vem
1) Regra geral
8) (Ita 1997) - Assinale a opção que completa O verbo concorda em número e pessoa com o sujeito.
corretamente as lacunas do texto a seguir: Ex.:
“Todas as amigas estavam _______________ ansiosas Eu comprei um carro. (verbo está na 1º pessoa do
_______________ ler os jornais, pois foram informadas singular para concordar com o sujeito “eu”).
de que as críticas foram ______________ indulgentes Eles compraram um carro. (o verbo está na 3º pessoa
______________ rapaz, o qual, embora tivesse mais aptidão do plural para concordar com o sujeito “eles”).
_______________ ciências exatas, demonstrava uma certa 2) Sujeito coletivo: o verbo fica no singular.
propensão _______________ arte.” Ex.:
a) meio - para - bastante - para com o - para - para a A população veio em massa ao protesto.
b) muito - em - bastante - com o - nas - em Caso esteja especificado por um adjunto adnominal
c) bastante - por - meias - ao - a - à (que está no plural) também pode ir para o plural.
d) meias - para - muito - pelo - em - por Ex.:
e) bem - por - meio - para o - pelas – na A multidão de ciclistas vieram à festa.
A multidão de ciclistas veio à festa.
9) (Mackenzie) -
I - Não te molestaram, portanto cale a boca. 3) Partitivos: metade, a maior parte, maioria: o
II - Foi encontrado há seis anos atrás. verbo pode permanecer no singular ou plural
III - Vimos, agora, trazer-lhe nosso apoio. Ex.:
IV - Os homens de bem, nada reclamaram. Metade das mães veio à homenagem.
V - Permitiu-se a alguns luxos. Metade das mães vieram à homenagem.
A maior parte dos eleitores veio à urna.
Quanto à correção gramatical das frases anteriores, A maior parte dos eleitores vieram à urna.
afirma-se que:
a) todas estão corretas, com exceção da III. 4) Pronome de Tratamento: o verbo é flexionado
b) todas estão incorretas, com exceção da III. apenas na 3º pessoa.
c) todas estão corretas, com exceção da II. Ex.:
d) todas estão incorretas, com exceção da V. Vossa Senhoria assinou o contrato?
e) todas estão corretas, com exceção da V. Vossas Senhorias assinaram o contrato?

10) Indique a frase sem concordância nominal: 5) Pronome relativo “que”: já que este pronome tem
a) Já é meio-dia e meia. como função substituir um substantivo ou outro pronome,
b) Bastante alunos estranham este plural. o verbo concorda com o termo ao qual ele se refere.
c) Os alimentos estão meio caros. Ex.:
d) Paguei caro aquelas coisas raras. Fomos nós que compramos a casa.
Foi ele que fez a planilha.

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6) Pronome relativo “quem”: geralmente fica na 3º A areia, a casa, o edifício impressionaram a todos.
pessoa do singular, mas pode concordar com termo ao
qual ele se refere. 15) Um e outro, nem um nem outro: nessas
Ex.: expressões o verbo pode tanto ir para o plural quanto
Fomos nós quem comprou a casa. permanecer no singular.
Fomos nós quem compramos a casa. Ex.:
Um e outro veio ao evento.
7) Algum de nós, poucos de vós, quantos de, quais Nem um nem outro vieram ao evento.
de…: o verbo pode concordar com o pronome interrogativo
ou com o pessoal. 16) Quando o sujeito composto estiver ligado por
Ex.: “ou”:
Poucos de vós me visitarão. Ex.:
Poucos de vós me visitareis. Caso o verbo der a ideia de exclusão fica no singular, e
no plural no sentido de inclusão.
8) Quando o sujeito só surge no plural: caso não vier
antecedido por artigo, fica no singular. Eu ou você vencerá a competição. (exclusão)
Eu ou você somos essenciais ao projeto (inclusão)
Ex.:
Estados Unidos é um país poderoso. 17) Verbos impessoais: permanecem no singular, já
Os Estados Unidos são um país poderoso. que são verbos sem sujeito.

9) Mais de um, menos de, cerca de…: concorda com Haver, no sentido de existir:
o numeral. Ex.:
Ex.: Houve muitos acidentes na pista ontem.
Mais de um cidadão veio ao evento.
Menos de trinta pessoas vieram ao evento. Fazer, indicando tempo passado
Cerca de vinte pessoas saíram mais cedo. Ex.:
Faz muitos anos que não o vejo
10) A maioria, a maior parte, grande parte: O mais
comum é usar o verbo no singular, em concordância lógica. 18) Sujeito expresso e infinitivo pessoal
Mas também pode ser usado no plural. a) Permanece no infinitivo se o sujeito estiver
Ex.: representado por pronome oblíquo átono:
A maioria das adolescentes usa muito o celular. Ex.:
A maioria das adolescentes usam muito o celular. Apreciei-o cantar.

11) Quando os núcleos do sujeito estão compostos b) quando o infinitivo pessoal integrar uma locução
por pessoas gramaticais diferentes: o verbo permanece verbal: não é flexionado, no caso de ser o verbo principal
no plural, obedecendo à seguinte ordem de prioridade: (1º, da locução
2º e 3º pessoa). Ex: Acabei de comprar o livro de geografia.
Ex.:
Tu e João comprastes muitos presentes.
Eu e tu nos tornamos amigos. EXERCÍCIOS

01. Analise as frases abaixo:


12) Sujeito composto constituído por sinônimos: o
I –Ela tomou atitudes o mais sensatas possível.
verbo fica no singular ou no plural.
II –Era meio-dia e meio quando um e outro estudante
Ex.:
esforçado viram caros livros na livraria.
Felicidade e alegria faz bem à saúde.
III –É necessário, sob qualquer aspecto, a atenção de
Felicidade e alegria fazem bem à saúde.
todos os alunos.
IV –Comprei livros e frutas maduras.
13) Sujeito resumido por “tudo”, “nada”, “ninguém”: V –Havia ali sapatos e camisas importados.
o verbo fica no singular VI –Os militares vigiam alertas, pois chegam a eles
Ex.: meias notícias de que o primeiro e segundo batalhões
Luxo, riqueza, sucesso: nada disso me envaidece. pretendem mesmo entrar em greve.
14) Núcleos do sujeito em relação de gradação: o Julgue os itens com base nas frases analisadas e
verbo pode concordar com o mais próximo ou ir para o assinale a alternativa correta:
plural. A. A frase I está incorreta e há duas possibilidades de
Ex.: corrigi-la.
A areia, a casa, o edifício impressionou a todos.

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B. Há apenas duas frases incorretas entre todas. 06. Assinale a alternativa incorreta quanto à
C. A frase IV, por apresentar substantivo masculino, concordância verbal:
poderia ter o adjetivo também no masculino. A) Soavam seis horas no relógio da matriz quando eles
D. Há apenas um erro de concordância na frase II. chegaram.
E. Em virtude de o substantivo estar determinado, na B) Apesar da greve, diretores, professores, funcionários,
frase III, deveria ser usado “necessária”. ninguém foi demitido.
C) José chegou ileso ao seu destino, embora houvesse
02. Levando em consideração as regras de muitas ciladas em seu caminho.
concordância nominal, assinale a alternativa correta: D) O advogado referiu-se aos artigos 37 e 38 que
A. Quando a senhora terminou de abrir as malas, já era ampara sua petição.
meio-dia e meio, mas tinha ainda menos fome. E) Nestes tempos, precisa-se de políticos íntegros.
B. A própria sogra presenciou a abertura das malas;
sim, ela mesmo! 07. Observe a concordância verbal nas frases a
C. Anexo àquela carta, destinada ao pai da moça que seguir e assinale a alternativa correta:
fora atropelada, foram enviadas as joias. I- Qual de nós contaremos a verdade?
D. Ao final da tarde, a senhora mostrava-se meio II- Boa parte dos funcionários recebeu aumento salarial.
cansada, tal quais suas pobres filhas. III- No relógio da escola bateu dez horas, foi quando os
E. O delegado fizera bastante ameaças, dizendo que as alunos saíram para o recreio.
mentiras custariam caras aos suspeitos. IV- Não devem haver muitas áreas verdes neste bairro.

03. Assinale a alternativa correta quanto à A) Somente a frase I está correta.


concordância verbal. B) Somente a frase II está correta.
A) Queria voltar a estudar, mas faltava-lhe recursos C) As frases I e II estão corretas.
para tanto D) As frases II e III estão corretas.
B) Foi então que começaram a chegar um pessoal E) As frases III e IV estão corretas.
estranho.
C) Outras razões, certamente, deve haver para ele ter 08. De acordo com as regras de concordância verbal
desistido. do padrão escrito culto, assinale a alternativa incorreta.
D) Não haviam exceções neste caso, mas houveram em A) A maioria dos brasileiros já viveu situações violentas
outros. no cotidiano.
E) Basta-lhe dois ou três dias para resolver isso. B) Sem dúvida, deve haver formas de combater
pacificamente a violência.
04.“ De repente da calma fez-se o vento / Que C) No artigo em análise, tratam-se de questões
dos olhos desfez a última chama / E da paixão fez- referentes à origem histórica da violência.
se o pressentimento / E do momento imóvel fez-se o D) Faz séculos que se verificam situações de opressão
drama.” na sociedade brasileira.
(Vinícius de Morais) E) Sempre se ouvirão pessoas bradando contra o
comodismo.
Com a palavra VENTO no plural, reescreveríamos,
obrigatoriamente, os versos iniciais da seguinte forma: 09. Apenas uma alternativa preenche corretamente
A) De repente da calma fizeram-se os ventos / Que dos os espaços das sentenças abaixo. Assinale-a:
olhos desfizeram a última chama “Aquelas mulheres olhavam _______ porque queriam
B) De repente da calma fez-se os ventos / Que dos aproveitar a liquidação e comprar ________ vestidos
olhos desfizeram a última chama _________”.
C) De repente da calma fizeram-se os ventos / Que dos A. alertas, bastantes, bege.
olhos desfez a última chama B. alerta, bastante, beges.
D) De repente da calma fez-se os ventos / Que dos C. alerta, bastantes, bege.
olhos desfez a última chama D. alertas, bastante, beges.
E) De repente da calma fazem-se os ventos / Que dos E. alerta, bastantes, beges.
olhos desfaz a última chama
10. A frase em que a concordância nominal está
05. Só não está correta a concordância verbal na correta é:
alternativa: A) A vasta plantação e a casa grande pintadas há pouco
A) Os alunos parecia gostarem do assunto da prova. tempo eram os sinais da prosperidade familiar.
B) Em tempos antigos havia mais homens machistas B) Eles, com ar entristecidos, dirigiram-se ao salão
do que hoje. onde se encontravam as vítimas do acidente.
C) Pede-se que todos permaneçam em seus lugares. C) Não lhe pareciam útil aquelas plantas esquisitas que
D) Nestas salas já se assistiram a grandes eventos. ele cultivava em sua chácara.
E) Foram eles quem pediu ao professor uma prova mais D) Quando foi encontrado, ele apresentava feridos a
difícil. perna e o braço direitos, mas estava totalmente lúcido.

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E) Esses livro e caderno não são meus, mas poderá ser 16. Assinale a alternativa em que a nova redação
necessário para a pesquisa que estou fazendo. das frases abaixo está de acordo com a norma culta.
“Não existe estudo científico” / “Há diversas
11. Assinale a alternativa errada: explicações”.
A) O escritor e o mestre alemães admiravam o belo A) Não devem existir estudos científicos / podem haver
quadro. diversas explicações.
B) Estudaram o idioma francês e o espanhol. B) Não devem haver estudos científicos / pode existir
C) Os deputados e o ministro alagoanos votaram diversas explicações.
contra o projeto. C) Não há estudos científicos / existe diversas
D) Os argumentos e as opiniões expostos não explicações.
agradaram à plateia. D) Não existem estudos científicos / pode haver
E) Considero fácil as questões e testes propostos na diversas explicações.
prova. E) Não pode existir estudos científicos / deve haver
diversas explicações.
12. Assinale a alternativa correta quanto à
concordância verbal. 17. A frase em que a concordância verbal NÃO
A) Queria voltar a estudar, mas faltavam-lhe recursos. respeita a norma culta é:
B) Foi então que começaram a chegar um pessoal A) Não bastam, para entendermos o século XXI,
estranho. referências às conquistas tecnológicas e científicas.
C) Devem haver outras razões para ele ter desistido. B) Foram herdados do passado muitos traços dos
D) Não haviam exceções neste caso. comportamentos atuais, inclusive o que permitiu, neste
E) Basta-lhe dois ou três dias para resolver isso. século, a perseguição aos judeus.
C) Quanto mais separados os saberes, mais se
13. A alternativa que contém forma verbal fortalecerão, com toda certeza, os que estão no poder.
INADEQUADA à norma culta é:A) Já faz dois meses que D) Colocam-se em questão, neste século, aspectos
não nosvemos. importantes acerca da sobrevivência do planeta.
B) Tratam-se de assuntos triviais, pensem em coisas E) Decorre do bem-estar (de que ninguém mais quer
sérias! abrir mão) vários dos problemas que hoje atingem a
C) Choveu três dias sem parar um minuto. humanidade.
D) Nessa cidade, faz frio e calor no mesmo dia.
E) Pelo que nos consta, deveriam existir duas páginas 18. A opção em que há erro de concordância verbal,
ilegíveis. segundo as normas da língua culta, é:
A) Descobriram-se muitos inventos novos na última
14. A única frase em que NÃO há erro de década.
concordância verbal é: B) É preciso que se realizem esforços para se atingir um
A) É da maioria dos estudantes que depende, pelo que plano de desenvolvimento integrado.
nos falaram os professores, as alterações do calendário C) Foi necessário que se estendesse as providências até
escolar. alcançar os menos favorecidos.
B) Acredito que deve haver, ao que tudo indica, D) Nada se poderia realizar sem que se tomassem
acomodações para mais de um terço dos convidados. novas medidas.
C) Se tiver de ser decidido, no último instante, as E) Desenvolveu-se o novo projeto de que todos
questões ainda não discutidas, não me responsabilizo mais estavam necessitados.
pelo projeto.
D) Houvesse sido mais explícitos com relação às 19.Indique a alternativa em que há erro:
normas gerais, os coordenadores de programa teriam A) Os fatos falam por si sós.
evitado alguns abusos. B) A casa estava meio desleixada.
E) Será que não foi suficiente, neste tempo todo, as C) Os livros estão custando cada vez mais caros.
provas de fidelidade que lhes demos? D) Seus apartes eram sempre os mais pertinentes
possíveis.
15. Assinale a alternativa ERRADA: E) Era a mim mesma que ele se referia, disse a moça.
A) Nas festividades havia muitos convidados.
B) Precisa-se de doadores de sangue. (Exercícios retirados de http://solinguagem.blogspot.
C) Assistiam-se a bons espetáculos naquele teatro. com.br/2016/05/lista-de-exercicios-concordancia-verbal.
D) Buscam-se novas saídas para a crise econômica. html)
E) Foram eles quem pediu por esta reviravolta.
GABARITO
1E - 2D - 3C - 4A - 5D - 6D - 7B - 8C - 9C - 10D - 11E
- 12A - 13B - 14B - 15C - 16D - 17E - 18C - 19C.

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LÍNGUA PORTUGUESA

SINTAXE DE REGÊNCIA VTI: ver


Ex.: As crianças assistiram ao jogo no domingo.
Regência é uma relação de subordinação entre
palavras. Algumas, para fazerem sentido, necessitam do Querer:
auxílio de preposições para encadearem perfeitamente VTD: desejar
a ordem dos termos em uma oração. Ou seja, quando Ex.: Querem muito o jogo novo.
falamos de subordinação entre palavras, subentendemos
um termo regente (verbo ou nome) que exigirá ou não a VTI: ter afeição, carinho
presença de um conectivo (termo regido) para se ligar a Ex.: Ela quer muito a seu pai.
seu complemento.
Esquecer/lembrar:
1. REGÊNCIA VERBAL VTD: quando não pronominais
É a relação de dependência que se estabelece entre Ex.: Meu filho esqueceu a chave de casa.
o verbo e seus complementos. Quando o assunto é
complemento verbal, vale lembrar o conceito de verbo VTI: quando pronominais
transitivo, justamente aquele “transita”, que necessita Ex.: Meu filho se esqueceu da chave de casa.
de complemento para efeito de sentido. Dentre essa
categoria, há duas formas de o verbo transitivo se ligar a Pagar/Perdoar:
seu integrante:
VTD: quando o complemento se tratar de coisa.
a) Forma direta: quando o verbo não necessita de Ex.:Perdoou a dívida.
preposição, e por isso o denominamos de verbo transitivo Pagou a conta da loja.
direto:
Ex.: VTI: quando o complemento se tratar de pessoa.
O relator denunciou o empresário. Ex.: A mãe perdoou ao filho.
Compramos presentes para todos. Pagamos ao gerente.

b) Forma indireta: há verbos mais fracos Obedecer:


gramaticalmente e, por isso, necessitam um “elemento VTI: sempre exige a preposição a
extra” para completar seu sentido. Esse elemento de Ex.: O aluno obedeceu ao professor.
ligação chamamos de preposição, termo responsável pela O aluno obedeceu às regras.
união do verbo a seu complemento de forma indireta. Por
isso chamamos tal categoria de verbo transitivo indireto: Responder:
VTI: quando houver apenas um complemento.
Ex.: Ex.: Respondi às questões da prova.
Preciso de mais tempo.
Aspiro ao cargo de coordenador. OBS.: Quando possuir mais de um objeto teremos a
seguinte forma:
O estudo de regência visa, sobretudo, esclarecer quais Respondi as questões ao professor.
verbos e em quais sentidos exigem a presença ou não
de preposição. Além do mais, há verbos que mudam de Implicar:
significado frente a presença da preposição. VTD: acarretar
Ex.:A situação implica reflexões.
Aspirar:
VTD: sorver, respirar: VTI: sentir antipatia
Ex.: A garota aspirou o ar do campo. Ex.: João implica com o cunhado.
VTI: almejar, desejar Namorar:
Ex.: Aspiro à vaga de assessora. VTD: sempre transitivo direto
Ex.: Minha filha está namorando João
Visar:
VTD: olhar ou dar visto Preferir:
Ex.: A funcionária visou com atenção os requerentes.
Verbo com dupla transitividade: alguém prefere uma
VTI: almejar, desejar coisa (objeto direto) a outra (objeto indireto):
Ex.: Todos visam ao sucesso da empresa. Ex.: Preferem maçã à uva.
Informar, comunicar, avisar:
Assistir:
VTD: ajudar, prestar auxílio
Ex.: O médico assistiu os doentes.

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LÍNGUA PORTUGUESA

Verbos com dupla transitividade 4. (IBGE) Assinale a opção em que todos os adjetivos
devem ser seguidos pela mesma preposição:
a) Informa-se algo a alguém a) ávido / bom / inconsequente
Ex.: Ele informou a fuga aos policiais. b) indigno / odioso / perito
c) leal / limpo / oneroso
b) Informa-se alguém de algo d) orgulhoso / rico / sedento
Ex.: Ele informou os policiais da fuga e) oposto / pálido / sábio

Enviar: 5. (UF-FLUMINENSE) Assinale a frase em que está


usado indevidamente um dos pronomes seguintes: o, lhe.
Verbo com dupla transitividade: envia-se algo a a) Não lhe agrada semelhante providência?
alguém b) A resposta do professor não o satisfez.
Ex.: O estagiário enviou o documento aos interessados c) Ajudá-lo-ei a preparar as aulas.
d) O poeta assistiu-a nas horas amargas, com extrema
Morar, residir, situar-se: dedicação.
e) Vou visitar-lhe na próxima semana.
VTI: sempre regem a preposição “em”
6. (BB) Regência imprópria:
Ex.: Minha professora mora em Brasília. a) Não o via desde o ano passado.
b) Fomos à cidade pela manhã.
Ir, voltar, chegar: c) Informou ao cliente que o aviso chegara.
d) Respondeu à carta no mesmo dia.
Solicitam a preposição “a”, “de” e “para”: e) Avisamos-lhe de que o cheque foi pago.
Ex.: Vou a Roma
Vou para Roma.
7. (BB) Alternativa correta:
Vou de Roma a Veneza.
a) Precisei de que fosses comigo.
b) Avisei-lhe da mudança de horário.
c) Imcumbiu-me para realizar o negócio.
EXERCÍCIOS
d) Recusei-me em fazer os exames.
e) Convenceu-se nos erros cometidos.
1. (IBGE) Assinale a opção que apresenta a regência
verbal incorreta, de acordo com a norma culta da língua:
a) Os sertanejos aspiram a uma vida mais confortável. 8. (EPCAR) O que devidamente empregado só não
b) Obedeceu rigorosamente ao horário de trabalho do seria regido de preposição na opção:
corte de cana. a) O cargo ....... aspiro depende de concurso.
c) O rapaz presenciou o trabalho dos canavieiros. b) Eis a razão ....... não compareci.
d) O fazendeiro agrediu-lhe sem necessidade. c) Rui é o orador ....... mais admiro.
e) Ao assinar o contrato, o usineiro visou, apenas, ao d) O jovem ....... te referiste foi reprovado.
lucro pretendido. e) Ali está o abrigo ....... necessitamos.

2. (IBGE) Assinale a opção que contém os pronomes 9. (UNIFIC) Os encargos ....... nos obrigaram são aqueles
relativos, regidos ou não de preposição, que completam ....... o diretor se referia.
corretamente as frase abaixo: Os navios negreiros, ....... a) de que - que
donos eram traficantes, foram revistados. Ninguém b) a cujos - cujos
conhecia o traficante ....... o fazendeiro negociava. c) por que – que
a) nos quais / que d) cujos - cujo
b) cujos / com quem e) a que - a que
c) que / cujo
d) de cujos / com quem e) cujos / de quem 10. (FTM-ARACAJU) As mulheres da noite ....... o poeta
faz alusão ajudam a colorir Aracaju, ....... coração bate de
3. (IBGE) Assinale a opção em que as duas frases se noite, no silêncio.
completam corretamente com o pronome lhe: A alternativa que completa corretamente as lacunas da
a) Não ..... amo mais. / O filho não ..... obedecia. frase acima é:
b) Espero-..... há anos. / Eu já ..... conheço bem. a) as quais / de cujo
c) Nós ..... queremos muito bem. / Nunca ..... perdoarei, b) a que / no qual
João. c) de que / o qual
d) Ainda não ..... encontrei trabalhando, rapaz. / d) às quais / cujo
Desejou-..... felicidades. e) que / em cujo
e) Sempre ..... vejo no mesmo lugar. / Chamou-..... de
tolo.

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LÍNGUA PORTUGUESA

(Exercícios retirados de http://professorricardoandrade.blogspot.com.br/2010/08/100-questoes-de-regencia.html)

GABARITO
1 - D 2 -D 3 – C 4 – D 5 - E 6 - E 7 - A 8 - E 9 - E 10 – D

REGÊNCIA NOMINAL

É a relação de subordinação entre um nome (termo regente) e seus complementos. Há termos nominais que apresentam
uma relação indireta com seus complementos, através da preposição.
Ex.: Tenho horror a avião.
Ela está muito orgulhosa do filho.

O estudo da regência nominal abrange as diversas formas de um nome ligar-se a seus complementos. Vejamos a tabela
explicativa.
Regência dos substantivos

Medo de Obediência a Horror a


Doutor em Impaciência com Bacharel em
Respeito a, com, para com, por Capacidade para Atentado a, contra
Dúvida acerca de, em, sobre Admiração a, por Ojeriza a, por
Aversão a, para, por Cuidado com Proeminência sobre

Regência dos adjetivos

Vazio de Suspeito de Sito em


Insensível a Liberal com Natural de
Descontente com Diferente de Desejoso de
Contrário a Indeciso em Sensível a
Relacionado com Relativo a Hábil em
Habituado a Idêntico a Impróprio para
Semelhante a Satisfeito com, de, em, por Contíguo a
Contemporâneo a, de Compatível com Capaz de, para
Hábil em Próximo a Relacionado com
Benéfico a Grato a, por Ávido de
Relacionado com Propício a Prestes a
Prejudicial a Preferível a Fanático por
Favorável a Generoso com Fácil de
Análogo a Ansioso de, por, para Passível de
Essencial a, para Alheio a, de Escasso de
Paralelo a Agradável a Equivalente a

Regência dos Advérbios

Perto de Longe de

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LÍNGUA PORTUGUESA

EXERCÍCIOS 8) Dentre as frases abaixo, uma apenas apresenta a


regência nominal correta. Assinale-a:
1)(Cescea) As palavras ansioso, contemporâneo e a) Ele não é digno a ser seu amigo.
misericordioso regem, respectivamente, as preposições: b) Baseado laudos médicos, concedeu-lhe a licença.
a) a – em – de – para. c) A atitude do Juiz é isenta de qualquer restrição.
b) de – a – de. d) Ele se diz especialista para com computadores
c) por – de – com. eletrônicos.
d) de – com – para com. e) O sol é indispensável da saúde.
e) com – a – a.
9) (CTFMG) A regência nominal está conforme a norma
2)(TJ – SP) Indique onde há erro de regência nominal: culta em:
a) Ele é muito apegado em bens materiais. a) O filho tornou-se um profissional apto para exercer
b) Estamos fartos de tantas promessas. ao cargo de diretor.
c) Ela era suspeita de ter assaltado a loja. b) A estrangeira mostrava muita devoção a pesquisa
d) Ele era intransigente nesse ponto do regulamento. do HIV, naquele hospital.
e) A confiança dos soldados no chefe era inabalável. c) A população simpatizava-se com as propostas
apresentadas pelo Governo.
3)Assinale a opção em que todos adjetivos podem ser d) O homem deve obediência aos princípios harmônicos
seguidos pela mesma preposição: que a natureza lhe oferece.
a) ávido, bom,inconsequente
b) indigno, odioso, perito 10) (TJ – SP) Indique onde há erro de regência nominal:
c) leal, limpo, oneroso a) Ele é muito apegado em bens materiais.
d) orgulhoso, rico, sedento b) Estamos fartos de tantas promessas.
e) oposto, pálido, sábio c) Ela era suspeita de ter assaltado a loja.
d) Ele era intransigente nesse ponto do regulamento.
4)As palavras ansioso, contemporâneo e misericordioso e) A confiança dos soldados no chefe era inabalável.
regem, respectivamente, as preposições:
a) a – em – de – para. (Exercícios retirados de http://
b) de – a – de. tudodeconcursosevestibulares.blogspot.com.br/2013/01/
c) por – de – com. regencia-nominal-regras.html)
d) de – com – para com.
e) com – a – a.
GABARITO
5)Indique onde há erro de regência nominal:
a) Ele é muito apegado em bens materiais. 1) C 2) A 3) D 4) C 5) A 6) A
b) Estamos fartos de tantas promessas. 7)à, à, de, a, com 8) C 19) D 10) A
c) Ela era suspeita de ter assaltado a loja.
d) Ele era intransigente nesse ponto do regulamento.
e) A confiança dos soldados no chefe era inabalável. CRASE

6) Diante das orações que seguem, analise-as e indique


aquela que não se adéqua ao uso da preposição “a”: Vejamos as frases:
a) Estou ávido * boas notícias.
b) Esta canção é agradável * alma. Comprei uma casa.
c) O respeito é essencial * boa convivência. Preciso de você.
d) Mostraram-se indiferentes * tudo.
e) O filme é proibido * menores de dezoito anos. Percebemos que na primeira frase o verbo “comprar”
não exige preposição, ao contrário de “precisar”. Há, assim,
7) Tendo em vista a relação de dependência manifestada verbos que regem preposição e outros não. Além do mais,
entre um nome (termo regente) e seu respectivo alguns verbos exigem preposição “a”, no sentido de “para”:
complemento (termo regido), reescreva as orações a seguir, Vou a Brasília. (para Brasília)
atribuindo-lhes a devida preposição. Vou à casa de Joana (para a casa de Joana).
a) O fumo é prejudicial * saúde.
b) Financiamentos imobiliários tornaram-se acessíveis Por que no segundo exemplo temos uma preposição
marcada pelo acento grave? Como podemos visualizar, se
* população.
o “a” preposição chocar com o artigo feminino “a”, a forma
c) Seu projeto é passível * reformulações.
correta seria “vou a a casa de Joana”. Para evitar tal re-
d) Esteja atento * tudo que acontece por aqui.
petição sem sentido, há o fenômeno chamado crase, que
e) Suas ideias são compatíveis * as minhas.
significa fusão, contração de duas vogais idênticas.

95
LÍNGUA PORTUGUESA

Se crase é a fusão da preposição “a” e o artigo “a” só - Quando usar crase:


pode ocorrer frente a palavras femininas
REGRA GERAL: Haverá crase quando o termo
Sempre surgem dúvidas de quando usar o acento de antecedente exigir a preposição “a” e o consequente
crase nas orações. Por isso mesmo, vamos aprender seus o artigo “a”
principais usos e também quando não usar.
Comprei a blusa – (o termo antecedente “comprei” não
- Quando não usar crase: exige a preposição “a”. Aqui só temos o artigo feminino “a”)
Vou a Pernambuco – (o termo consequente não exige
a) diante de palavras masculinas: isso é certo. Uma o artigo feminino, só há aqui a preposição “a” regida pelo
vez que crase é fusão de uma preposição e um artigo fe- verbo “ir”)
minino, não poderá anteceder palavras masculinas que exi-
gem o artigo “o”. Agora:
Ela veio a pé. (pé – palavra masculina)
Passeei pela fazenda a cavalo (cavalo – palavra mas- Fui à cidade.
culina)
Neste caso o verbo “ir” exigiu a preposição “a” e o
b) antes de verbos: já que o artigo feminino possui substantivo “cidade” atraiu o artigo feminino “a”. Aqui te-
como função determinar um substantivo, não faria sentido mos um exemplo clássico de crase.
crase em frente a verbos, classe que não exige determina-
ção de artigos. Sempre ocorre crase em :
Ela começou a cantar quando ele chegou (cantar – ver-
bo no infinitivo) a) Indicação de horas:
Cheguei no evento às cinco horas da tarde.
c) frente a nomes de cidades:
Vou a Roma nas férias. b) Expressões “à moda de”, “à maneira de”:
Ele quis ir a Paris, mas não pôde. Fiz uma janta à (moda de) Fogaça.
Quis um cenário à (maneira de) Salvador Dali.
Entretanto, caso especifiquemos a cidade com alguma
qualificação utilizaremos o sinal de crase. c) Expressões adverbiais femininas:
Vou à Roma de Fellini. O avião desceu em terra firme à noite. (tempo)
O seu sonho é ir à Paris de Victor Hugo. Fizeram o trabalho às pressas. (modo).

d) Entre substantivos que se repetem: USO FACULTATIVO DE CRASE


Nos confrontamos cara a cara.
Frente a frente nos debatemos. 1) Diante de nomes próprios femininos:
Enviei um bilhete a Lúcia.
e) Diante de substantivos no plural: Enviei um bilhete à Lúcia.
A homenagem foi concedida a pessoas de honra.
O convite foi enviado a funcionários de longa data. 2) Antes de pronomes femininos possessivos:
Dedicou o trabalho a sua avó.
f) Antes de pronomes pessoais, demonstrativos, in- (Sua vó gostou da homenagem)
definidos , de tratamento e relativos:
Enviei a Vossa Excelência os convites. Dedicou o trabalho à sua avó.
Isso não interessa a ninguém. (A sua vó gostou da homenagem)

g) Frente a nomes femininos consagrados: 3) Após a preposição ATÉ:


A crítica fazia referência a Maria Madalena. Viajei até a cidade.
h) Antes da palavra “casa” se não estiver especificada: Fui a pé até à cidade.
Com pressa ele retornou a casa.
CASOS ESPECIAIS DE CRASE
i) Em frente a palavra terra quando esta significar
“terra firme”: 1) Crase com pronomes demonstrativos “aquele”,
Após o naufrágio, voltou a terra. “aquela”, “aquilo”:
Vejamos as frases abaixou:
No sentido de planeta Terra ocorre crase – O foguete Aquele rapaz foi escolhido para o cargo.
retornou à Terra. Fiz referência à carta de João.

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LÍNGUA PORTUGUESA

No primeiro caso aquele rapaz não vem depois de ne- 02. Qual das alternativas completa corretamente os es-
nhum verbo ou nome que exija a preposição “a”. No se- paços vazios?
gundo exemplo há crase porque quem faz referência “a” I. E entre o sono e o medo, ouviu como se fosse de ver-
algo. E agora: dade o apito de um trem igual ____ que ouvira em Limoeiro.
(J. Lins do Rego)
Fiz referência àquele rapaz. II. Habituara-se ______ boa vida, tendo de um tudo, re-
galada. (J. Amado)
Ainda que seja palavra masculina, o pronome demons- III. Depois do meu telegrama (lembram: o telegrama
trativo aquele inicia-se com a vogal “a” e para evitar re- em que recusei duzentos mil-réis ___ (pirata), a “Gazeta”
petição de sons como em “Fiz referência a aquele rapaz” entrou a difamar-me. (G. Ramos)
utiliza-se acento de crase. IV. Os adultos são gente crescida que vive sempre di-
zendo pra gente fazer isso e não fazer _____.
Mais alguns exemplos: (Millôr Fernandes)
Enviamos a carta àqueles alunos. a) àquele, aquela, aquele, aquilo
Falei àquela professora. b) àquele, àquela, aquele, aquilo
c) àquele, àquela, aquele, àquilo
2) Antes das expressões qual e quais: d) àquele, àquela, àquele, aquilo
Haverá crase caso o correspondente masculino for “ao e) aquele, àquela, aquele, aquilo
qual”, “aos quais”:
Esta é a blusa à qual me referi. 03. (CESCEM) Sentou-se ___ máquina e pôs-se ___ rees-
Aqueles são os sapatos aos quais me referi. crever uma ___ uma as páginas do relatório.
a) a / a / à
3) Frente a topônimos (nomes de lugares) b) a / à / à
Atente às frases abaixo: c) à / a / a
Vou à Bahia. d) à / à / à
Vou a São Paulo. e) à / à / a

Por que há crase no primeiro exemplo e não no se- 04. (FASP) Assinale a alternativa com erro de crase:
gundo? a) Você já esteve em Roma? Eu irei à Roma logo.
Ainda que pareça complexo, é muito simples não errar b) Refiro-me à Roma antiga, na qual viveu César.
nesses casos: é só substituir o verbo “ir” pelo verbo “voltar”, c) Fui à Lisboa de meus avós, pois gosto da Lisboa de
se exigir a preposição “da” é sinal de que ocorrerá crase: meus avós.
Vou à Bahia. d) Já não agrada ir a Brasília. A gasolina…
Volto da Bahia. e) nenhuma das alternativas está errada.

Vou a São Paulo. 05. (ESAN) Das frases abaixo, apenas uma está correta,
Volto de São Paulo. quanto à crase. Assinale-a:
a) Devemos aliar a teoria à prática.
Vou à França. b) Daqui à duas semanas ele estará de volta.
Volto da França. c) Puseram-se à discutir em voz alta.
d) Dia à dia, a empresa foi crescendo.
Vou a Salvador. e) Ele parecia entregue à tristes cogitações.
Volto de Salvador.
06. (ABC – MED.) Nas alternativas que seguem, há três
frases, que podem estar corretas ou não. Leia-as atenta-
EXERCÍCIOS mente e marque a resposta certa:

01. Assinale a alternativa em que o uso da crase é obri- I.   O seu egoísmo só era comparável à sua feiura.
gatório: II.  Não pôde entregar-se às suas ilusões.
a) Um rapazito de paletó entrou na rua e foi perguntar III. Quem se vir em apuros, deve recorrer à justiça.
à Machona pela Nhá Rita. (Aluísio Azevedo) a) Apenas a frase I está correta.
b) José Cândido não tinha nem a cor nem o título con- b) Apenas a frase II está correta.
venientes à sua filha. (R. Braga) c) Apenas as frases I e II estão corretas.
c) Mas o peru se adiantava até à beira da mata. (G. d) Apenas as frases II e III estão corretas.
Rosa) e) As três frases estão corretas.
d) Todos, às vezes, precisam ficar bêbados, e por isso
bebem. (R. Braga)
e) (…) evitei acompanhar Dr. Siqueira em suas visitas
vespertinas à nossa bem amada. (J. Amado)

97
LÍNGUA PORTUGUESA

07. (FUND. LUSÍADA) Assinale a alternativa que com-


pleta corretamente o período: ____ noite estava clara e os 5. REESCRITURA DE FRASES E PARÁGRAFOS
namorados foram _____ praia ver a chegada dos pescadores DO TEXTO (SUBSTITUIÇÃO DE PALAVRAS OU
que voltavam ____ terra. DE TRECHOS DE TEXTOS).
a) Á / à / à
b) A / à / à
c) A / a / à
d) À / a / à “Ideias confusas geram redações confusas”. Esta frase
e) A / à / a leva-nos a refletir sobre a organização das ideias em um
texto. Significa dizer que, antes da redação, naturalmen-
08. (ITA) Analisando as sentenças: te devemos dominar o assunto sobre o qual iremos tratar
I.   A vista disso, devemos tomar sérias medidas. e, posteriormente, planejar o modo como iremos expô-lo,
II.  Não fale tal coisa as outras. do contrário haverá dificuldade em transmitir ideias bem
III. Dia a dia a empresa foi crescendo. acabadas. Portanto, a leitura, a interpretação de textos e a
IV. Não ligo aquilo que me disse. experiência de vida antecedem o ato de escrever.
Podemos deduzir que: Obtido um razoável conhecimento sobre o que iremos
a) Apenas a sentença III não tem crase. escrever, feito o esquema de exposição da matéria, é ne-
b) As sentenças III e IV não têm crase. cessário saber ordenar as ideias em frases bem estrutura-
c) Todas as sentenças têm crase. das. Logo, não basta conhecer bem um determinado as-
d) Nenhuma sentença tem crase. sunto, temos que o transmitir de maneira clara aos leitores.
e) Apenas a sentença IV não tem crase. O estudo da pontuação pode se tornar um valioso alia-
do para organizarmos as ideias de maneira clara em frases.
09. (ABC – MED.) A alternativa em que o acento indica- Para tanto, é necessário ter alguma noção de sintaxe. “Sin-
tivo de crase não procede é: taxe”, conforme o dicionário Aurélio, é a “parte da gramá-
a) Tais informações são iguais às que recebi ontem. tica que estuda a disposição das palavras na frase e a das
b) Perdi uma caneta semelhante à sua. frases no discurso, bem como a relação lógica das frases
c) A construção da casa obedece às especificações da entre si”; ou em outras palavras, sintaxe quer dizer “mistu-
Prefeitura. ra”, isto é, saber misturar as palavras de maneira a produ-
d) O remédio devia ser ingerido gota à gota, e não de zirem um sentido evidente para os receptores das nossas
uma só vez. mensagens. Observe:
e) Não assistiu a essa operação, mas à de seu irmão.  
1)A desemprego globalização no Brasil e no na está La-
10.  (FUVEST) Indique a forma que não será utilizada tina América causando.
para completar a frase seguinte: 2) A globalização está causando desemprego no Brasil e
“Maria pediu ____ psicóloga que ____ ajudasse ____ re- na América Latina.
solver o problema que ___ muito ____ afligia.”
a) preposição (a) Ora, no item 1 não temos uma ideia, pois não há uma
b) pronome pessoal feminino (a) frase, as palavras estão amontoadas sem a realização de
c) contração da preposição a e do artigo feminino a (à) “uma sintaxe”, não há um contexto linguístico nem relação
d) verbo haver indicando tempo (há) inteligível com a realidade; no caso 2, a sintaxe ocorreu de
e) artigo feminino (a) maneira perfeita e o sentido está claro para receptores de
língua portuguesa inteirados da situação econômica e cul-
(Exercícios retirados de http://www.coladaweb.com/exer- tural do mundo atual.
cicios-resolvidos/exercicios-resolvidos-de-portugues/crase)
A Ordem dos Termos na Frase
GABARITO Leia novamente a frase contida no item 2. Note que
ela é organizada de maneira clara para produzir sentido.
1–D Todavia, há diferentes maneiras de se organizar gramatical-
2–D mente tal frase, tudo depende da necessidade ou da von-
3–C tade do redator em manter o sentido, ou mantê-lo, porém,
4–A acrescentado ênfase a algum dos seus termos. Significa di-
5–A zer que, ao escrever, podemos fazer uma série de inversões
6–E e intercalações em nossas frases, conforme a nossa von-
7–E tade e estilo. Tudo depende da maneira como queremos
8–A transmitir uma ideia, do nosso estilo. Por exemplo, pode-
9–D mos expressar a mensagem da frase 2 da seguinte maneira:
10 - E

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LÍNGUA PORTUGUESA

No Brasil e na América Latina, a globalização está cau- Todavia, ao repetir qualquer um dos termos da oração
sando desemprego. por três vezes ou mais, então é necessário usar a vírgula,
mesmo que estejamos usando a ordem direta. Esta é a re-
Neste caso, a mensagem é praticamente a mesma, gra básica nº1 para a colocação da vírgula. Veja:
apenas mudamos a ordem das palavras para dar ênfase a A globalização, a tecnologia e a “ciranda financeira”
alguns termos (neste caso: No Brasil e na A. L.). Repare que, causam desemprego…
para obter a clareza tivemos que fazer o uso de vírgulas. (três núcleos do sujeito)
Entre os sinais de pontuação, a vírgula é o mais usado e
o que mais nos auxilia na organização de um período, pois A globalização causa desemprego no Brasil, na América
facilita as boas “sintaxes”, boas misturas, ou seja, a vírgula Latina e na África.
ajuda-nos a não “embolar” o sentido quando produzimos (três adjuntos adverbiais)
frases complexas. Com isto, “entregamos” frases bem orga-
nizadas aos nossos leitores. A globalização está causando desemprego, insatisfação
e sucateamento industrial no Brasil e na América Latina.
O básico para a organização sintática das frases é a (três complementos verbais)
ordem direta dos termos da oração. Os gramáticos estru-
turam tal ordem da seguinte maneira: 2)Em princípio, não devemos, na ordem direta, sepa-
rar com vírgula o sujeito e o verbo, nem o verbo e o seu
SUJEITO + VERBO + COMPLEMENTO VERBAL + CIR- complemento, nem o complemento e as circunstâncias, ou
CUNSTÂNCIAS seja, não devemos separar com vírgula os termos da ora-
A globalização + está causando + desemprego + no ção. Veja exemplos de tal incorreção:
Brasil nos dias de hoje.
O Brasil, será feliz. A globalização causa, o desemprego.
Nem todas as orações mantêm esta ordem e nem to-
das contêm todos estes elementos, portanto cabem algu- Ao intercalarmos alguma palavra ou expressão entre
mas observações: os termos da oração, cabe isolar tal termo entre vírgulas,
assim o sentido da ideia principal não se perderá. Esta é
1) As circunstâncias (de tempo, espaço, modo, etc.) a regra básica nº 2 para a colocação da vírgula. Dito em
normalmente são representadas por adjuntos adverbiais outras palavras: quando intercalamos expressões e frases
de tempo, lugar, etc. Note que, no mais das vezes, quan- entre os termos da oração, devemos isolar os mesmos com
do queremos recordar algo ou narrar uma história, existe vírgulas. Vejamos:
a tendência a colocar os adjuntos nos começos das frases: A globalização, fenômeno econômico deste fim de sécu-
“No Brasil e na América…” “Nos dias de hoje…” “Nas lo XX, causa desemprego no Brasil.
minhas férias…”, “No Brasil…”. e logo depois os verbos e ou-
tros elementos: “Nas minhas férias fui…”; “No Brasil existe…” Aqui um aposto à globalização foi intercalado entre o
sujeito e o verbo.
Observações:
a) tais construções não estão erradas, mas rompem Outros exemplos:
com a ordem direta; A globalização, que é um fenômeno econômico e cultural,
b) é preciso notar que em Língua Portuguesa, há mui- está causando desemprego no Brasil e na América Latina.
tas frases que não têm sujeito, somente predicado. Por Neste caso, há uma oração adjetiva intercalada.
exemplo: Está chovendo em Porto Alegre. Faz frio em Fri- As orações adjetivas explicativas desempenham fre-
burgo. São quatro horas agora; quentemente um papel semelhante ao do aposto explicati-
vo, por isto são também isoladas por vírgula.
c) Outras frases são construídas com verbos intransiti-
vos, que não têm complemento:
A globalização causa, caro leitor, desemprego no Brasil…
O menino morreu na Alemanha. (sujeito + verbo + ad- Neste outro caso, há um vocativo entre o verbo e o seu
junto adverbial) complemento.
A globalização nasceu no século XX. (idem)
d) Há ainda frases nominais que não possuem verbos: A globalização causa desemprego, e isto é lamentável,
cada macaco no seu galho. Nestes tipos de frase, a ordem no Brasil…
direta faz-se naturalmente. Usam-se apenas os termos Aqui, há uma oração intercalada (note que ela não per-
existentes nelas. tence ao assunto: globalização, da frase principal, tal ora-
ção é apenas um comentário à parte entre o complemento
Levando em consideração a ordem direta, podemos verbal e os adjuntos).
estabelecer três regras básicas para o uso da vírgula:
1)Se os termos estão colocados na ordem direta não Observação: a simples negação em uma frase não exi-
haverá a necessidade de vírgulas. A frase (2) é um exemplo ge vírgula: A globalização não causou desemprego no Brasil
disto: e na América Latina.
A globalização está causando desemprego no Brasil e na
América Latina.

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LÍNGUA PORTUGUESA

3)Quando “quebramos” a ordem direta, invertendo-a, 1-) “Embora” é uma conjunção concessiva (apresen-
tal quebra torna a vírgula necessária. Esta é a regra nº3 da ta uma exceção à regra). A outra conjunção concessiva é
colocação da vírgula. “conquanto”.
RESPOSTA: “E”.
No Brasil e na América Latina, a globalização está cau-
sando desemprego… 2-) (PRODEST/ES – ASSISTENTE ORGANIZACIONAL –
No fim do século XX, a globalização causou desemprego VUNESP/2014 - adaptada) Considere o trecho: “Se o se-
no Brasil… nhor não se importa, vou levar minha sobrinha ao dentista,
mas posso quebrar o galho e fazer sua corrida”. Esse trecho
Nota-se que a quebra da ordem direta frequentemente está corretamente reescrito e mantém o sentido em:
se dá com a colocação das circunstâncias antes do sujeito. (A) Uma vez que o senhor não se importe, vou levar mi-
Trata-se da ordem inversa. Estas circunstâncias, em gramá- nha sobrinha ao dentista, assim que possa quebrar o galho
tica, são representadas pelos adjuntos adverbiais. Muitas
e fazer sua corrida.
vezes, elas são colocadas em orações chamadas adverbiais
(B) Já que o senhor não se importa, vou levar minha
que têm uma função semelhante a dos adjuntos adverbiais,
isto é, denotam tempo, lugar, etc. Exemplos: sobrinha ao dentista, porque posso quebrar o galho e fazer
sua corrida.
Quando o século XX estava terminando, a globalização (C) À medida que o senhor não se importe, vou levar
começou a causar desemprego. minha sobrinha ao dentista, logo que possa quebrar o ga-
Enquanto os países portadores de alta tecnologia de- lho e fazer sua corrida.
senvolvem-se, a globalização causa desemprego nos países (D) Caso o senhor não se importe, vou levar minha so-
pobres. brinha ao dentista, no entanto posso quebrar o galho e
Durante o século XX, a Globalização causou desempre- fazer sua corrida.
go no Brasil. (E) Para que o senhor não se importe, vou levar minha
sobrinha ao dentista, todavia posso quebrar o galho e fazer
Observação: quanto à equivalência e transformação de sua corrida.
estruturas, um exemplo muito comum cobrado em provas
é o enunciado trazer uma frase no singular e pedir a passa- 2-) “Se o senhor não se importa, vou levar minha so-
gem para o plural, mantendo o sentido. Outro exemplo é a brinha ao dentista, mas posso quebrar o galho e fazer sua
mudança de tempos verbais. corrida”
O primeiro período é introduzido por uma conjunção
Fonte de pesquisa: condicional (“se”); o segundo, conjunção adversativa. As
http://ricardovigna.wordpress.com/2009/02/02/estu- conjunções apresentadas que têm a mesma classificação,
dos-de-linguagem-1-estrutura-frasal-e-pontuacao/ respectivamente, e que, por isso, poderiam substituir
adequadamente as destacadas no enunciado são “caso”
e “no entanto”. Acredito que, mesmo que você não saiba
QUESTÕES a classificação das conjunções, conseguiria responder à
questão apenas utilizando a coerência: as demais alterna-
1-) (TRF/3ª REGIÃO - ANALISTA JUDICIÁRIO - FCC/2014 tivas não a têm.
- adaptada)
Reunir-se para ouvir alguém ler tornou-se uma prática RESPOSTA: “D”.
necessária e comum no mundo laico da Idade Média. Até
a invenção da imprensa, a alfabetização era rara e os livros,
propriedade dos ricos, privilégio de um pequeno punhado ESTRUTURA TEXTUAL
de leitores.
Embora alguns desses senhores afortunados ocasio- Primeiramente, o que nos faz produzir um texto é a ca-
nalmente emprestassem seus livros, eles o faziam para um pacidade que temos de pensar. Por meio do pensamento,
número limitado de pessoas da própria classe ou família. elaboramos todas as informações que recebemos e orien-
(Adaptado de: MANGUEL, Alberto, op.cit.) tamos as ações que interferem na realidade e organização
de nossos escritos. O que lemos é produto de um pensa-
Mantêm-se a correção e as relações de sentido estabe- mento transformado em texto.
lecidas no texto, substituindo-se Embora (2.º parágrafo) por Logo, como cada um de nós tem seu modo de pen-
(A) Contudo. sar, quando escrevemos sempre procuramos uma maneira
(B) Desde que. organizada do leitor compreender as nossas ideias. A fina-
(C) Porquanto. lidade da escrita é direcionar totalmente o que você quer
(D) Uma vez que. dizer, por meio da comunicação.
(E) Conquanto. Para isso, os elementos que compõem o texto se sub-
dividem em: introdução, desenvolvimento e conclusão. To-
dos eles devem ser organizados de maneira equilibrada.

100
LÍNGUA PORTUGUESA

Introdução Sua proporção em relação à totalidade do texto deve


ser equivalente ao da introdução: de 1/5. Essa é uma das
Caracterizada pela entrada no assunto e a argumenta- características de textos bem redigidos.
ção inicial. A ideia central do texto é apresentada nessa eta- Os seguintes erros aparecem quando as conclusões fi-
pa. Essa apresentação deve ser direta, sem rodeios. O seu cam muito longas:
tamanho raramente excede a 1/5 de todo o texto. Porém,
em textos mais curtos, essa proporção não é equivalente. - O problema aparece quando não ocorre uma explo-
Neles, a introdução pode ser o próprio título. Já nos textos ração devida do desenvolvimento, o que gera uma invasão
mais longos, em que o assunto é exposto em várias pági- das ideias de desenvolvimento na conclusão.
nas, ela pode ter o tamanho de um capítulo ou de uma par- - Outro fator consequente da insuficiência de funda-
te precedida por subtítulo. Nessa situação, pode ter vários mentação do desenvolvimento está na conclusão precisar
parágrafos. Em redações mais comuns, que em média têm de maiores explicações, ficando bastante vazia.
de 25 a 80 linhas, a introdução será o primeiro parágrafo. - Enrolar e “encher linguiça” são muito comuns no tex-
to em que o autor fica girando em torno de ideias redun-
Desenvolvimento dantes ou paralelas.
- Uso de frases vazias que, por vezes, são perfeitamen-
A maior parte do texto está inserida no desenvol- te dispensáveis.
vimento, que é responsável por estabelecer uma ligação - Quando não tem clareza de qual é a melhor conclu-
entre a introdução e a conclusão. É nessa etapa que são são, o autor acaba se perdendo na argumentação final.
elaboradas as ideias, os dados e os argumentos que sus-
tentam e dão base às explicações e posições do autor. É ca- Em relação à abertura para novas discussões, a con-
racterizado por uma “ponte” formada pela organização das clusão não pode ter esse formato, exceto pelos seguintes
ideias em uma sequência que permite formar uma relação fatores:
equilibrada entre os dois lados. - Para não influenciar a conclusão do leitor sobre temas
polêmicos, o autor deixa a conclusão em aberto.
O autor do texto revela sua capacidade de discutir um
- Para estimular o leitor a ler uma possível continuidade
determinado tema no desenvolvimento, e é através desse
do texto, o autor não fecha a discussão de propósito.
que o autor mostra sua capacidade de defender seus pon-
- Por apenas apresentar dados e informações sobre o
tos de vista, além de dirigir a atenção do leitor para a con-
tema a ser desenvolvido, o autor não deseja concluir o assunto.
clusão. As conclusões são fundamentadas a partir daqui.
- Para que o leitor tire suas próprias conclusões, o autor
Para que o desenvolvimento cumpra seu objetivo, o es-
enumera algumas perguntas no final do texto.
critor já deve ter uma ideia clara de como será a conclusão.
Daí a importância em planejar o texto. A maioria dessas falhas pode ser evitada se antes o
Em média, o desenvolvimento ocupa 3/5 do texto, no autor fizer um esboço de todas as suas ideias. Essa técni-
mínimo. Já nos textos mais longos, pode estar inserido em ca é um roteiro, em que estão presentes os planejamen-
capítulos ou trechos destacados por subtítulos. Apresentar- tos. Naquele devem estar indicadas as melhores sequên-
-se-á no formato de parágrafos medianos e curtos. cias a serem utilizadas na redação; ele deve ser o mais
Os principais erros cometidos no desenvolvimento são enxuto possível.
o desvio e a desconexão da argumentação. O primeiro está
relacionado ao autor tomar um argumento secundário que Fonte de pesquisa:
se distancia da discussão inicial, ou quando se concentra http://producao-de-textos.info/mos/view/Caracter%-
em apenas um aspecto do tema e esquece o seu todo. O
C3%ADsticas_e_Estruturas_do_Texto/
segundo caso acontece quando quem redige tem muitas
ideias ou informações sobre o que está sendo discutido,
não conseguindo estruturá-las. Surge também a dificul-
dade de organizar seus pensamentos e definir uma linha
lógica de raciocínio.

Conclusão

Considerada como a parte mais importante do texto,


é o ponto de chegada de todas as argumentações elabo-
radas. As ideias e os dados utilizados convergem para essa
parte, em que a exposição ou discussão se fecha.
Em uma estrutura normal, ela não deve deixar uma
brecha para uma possível continuidade do assunto; ou seja,
possui atributos de síntese. A discussão não deve ser en-
cerrada com argumentos repetitivos, como por exemplo:
“Portanto, como já dissemos antes...”, “Concluindo...”, “Em
conclusão...”.

101
LÍNGUA PORTUGUESA

ANOTAÇÕES

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102
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

1. A didática e o processo de ensino e aprendizagem. ............................................................................................................................ 01


1.1 Organização do processo didático: planejamento, estratégias, metodologias, avaliação, organização da rotina
anual, semestral e diário. ................................................................................................................................................................................ 01
1.2 A sala de aula como espaço de aprendizagem e interação. ..................................................................................................... 01
1.3 A didática como fundamento epistemológico do fazer docente. ........................................................................................... 01
1.4 Contrato Didático. 1.5 Relação professor aluno. ............................................................................................................................ 01
2. Principais teorias da aprendizagem: Inatismo, comportamentalismo, behaviorismo, interacionismo, cognitivismo. .....25
2.1 As bases empíricas, metodológicas e epistemológicas das diversas teorias de aprendizagem. ................................ 25
2.2 Contribuições de Piaget, Vygotsky e Wallon para a psicologia e pedagogia. ................................................................... 25
2.3 Teoria das inteligências múltiplas de Gardner. ............................................................................................................................... 25
2.4 Temas contemporâneos: bullying, o papel da escola, a escolha da profissão, transtornos alimentares na adoles-
cência, família, escolhas sexuais. .................................................................................................................................................................. 25
3 Currículo: Propósitos da Educação Básica; Objetivos Educacionais; Conteúdos: procedimentais, atitudinais, conceituais
e factuais; .................................................................................................................................................................................................................... 47
Atividade de ensino e de aprendizagem; Avaliação como ato de investigar e intervir nos resultados de aprendizagem
dos alunos; Acesso, permanência e sucesso do aluno na escola; ........................................................................................................ 60
Gestão da aprendizagem. .................................................................................................................................................................................... 69
5 O Professor: formação e profissão; A pesquisa na prática docente; A dimensão ética da profissão. ................................ 72
6 Educação Integral e de tempo integral. ...................................................................................................................................................... 85
7. Escola comum inclusiva. Aprendizagem significativa; Agrupamentos produtivos e circulação dos conhecimentos;
Recursos didáticos; Planejamento voltado para o desenvolvimento das capacidades dos alunos; O Projeto Pedagógico
e o trabalho coletivo; O Currículo centrado nas expectativas de aprendizagem; Organizadores de situações de aprendi-
zagem (competências e habilidades que os alunos deverão constituir; conteúdos curriculares selecionados; atividades
do aluno e do professor; avaliação e apoio pedagógico); A organização do tempo em sala de aula considerando a
diversidade dos alunos, os objetivos das atividades propostas e as características dos próprios conteúdos; Estratégias
diversificadas de avaliação da aprendizagem como norteadoras do planejamento de propostas de intervenção peda-
gógica, considerando o desenvolvimento de diferentes capacidades dos alunos; O registro como ferramenta impres-
cindível para o planejamento da ação educativa; O respeito às diversas crenças e opções políticas dos membros da
equipe escolar e das famílias, como condição para o fortalecimento da instituição enquanto equipamento público, laico,
democrático e de qualidade................................................................................................................................................................................ 88
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

 Acham-se presentes na sala 50 alunos.


1. A DIDÁTICA E O PROCESSO DE ENSINO E • Juízos de valor são juízos que estabelecem valores
APRENDIZAGEM. ou normas.
1.1 ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO Exemplo:
DIDÁTICO: PLANEJAMENTO, ESTRATÉGIAS,  A democracia é a melhor forma de governo.
METODOLOGIAS, AVALIAÇÃO,  Os velhos merecem nosso respeito.
ORGANIZAÇÃO DA ROTINA ANUAL,
A partir dessa diferenciação, concluímos que podemos ser
SEMESTRAL E DIÁRIO.
metodologistas sem ser didáticos, mas não podemos ser di-
1.2 A SALA DE AULA COMO ESPAÇO DE
dáticos sem ser metodologistas, pois não podemos julgar sem
APRENDIZAGEM E INTERAÇÃO.
conhecer. Por isso, o estudo da metodologia é importante por
1.3 A DIDÁTICA COMO FUNDAMENTO uma razão muito simples: para escolher o método mais ade-
EPISTEMOLÓGICO DO FAZER DOCENTE. quado de ensino precisamos conhecer os métodos existentes.
1.4 CONTRATO DIDÁTICO.
1.5 RELAÇÃO PROFESSOR ALUNO. Educação escolar, pedagogia e Didática
A educação escolar constitui-se num sistema de ins-
trução e ensino com propósitos intencionais, práticas siste-
matizadas e alto grau de organização, ligado intimamente
A didática, o processo de aprendizagem e a organi- as demais práticas sociais. Pela educação escolar democra-
zação do processo didático. tizam-se os conhecimentos, sendo na escola que os traba-
lhadores continuam tendo a oportunidade de prover esco-
A didática é uma disciplina técnica e que tem como larização formal aos seus filhos, adquirindo conhecimentos
objeto específico a técnica de ensino (direção técnica da científicos e formando capacidades de pensar criticamente
aprendizagem). A Didática, portanto, estuda a técnica de os problemas e desafios postos pela realidade social.
ensino em todos os aspectos práticos e operacionais, po- A Pedagogia é um campo de conhecimentos que in-
dendo ser definida como: vestiga a natureza das finalidades da educação numa de-
“A técnica de estimular, dirigir e encaminhar, no decur- terminada sociedade, bem como os meios apropriados
so da aprendizagem, a formação do homem”. (AGUAYO) para a formação dos indivíduos, tendo em vista prepará-los
para as tarefas da vida social.
Didática Geral e Especial Uma vez que a prática educativa é o processo pelo qual
A Didática Geral estuda os princípios, as normas e as são assimilados conhecimentos e experiências acumulados
técnicas que devem regular qualquer tipo de ensino, para pela prática social da humanidade, cabe à Pedagogia asse-
qualquer tipo de aluno. gura-lo, orientando-o para finalidades sociais e políticas, e
A Didática Geral nos dar uma visão geral da atividade criando um conjunto de condições metodológicas e orga-
docente. nizativas para viabiliza-lo.
A Didática Especial estuda aspectos científicos de uma O caráter pedagógico da prática educativa se verifica
determinada disciplina ou faixa de escolaridade. A Didática como ação consciente, intencional e planejada no proces-
Especial analisa os problemas e as dificuldades que o en- so de formação humana, através de objetivos e meios es-
sino de cada disciplina apresenta e organiza os meios e as tabelecidos por critérios socialmente determinados e que
sugestões para resolve-los. Assim, temos as didáticas espe- indicam o tipo de homem a formar, para qual sociedade,
ciais das línguas (francês, inglês, etc.); as didáticas especiais com que propósitos. Vincula-se pois a opções sociais. A
das ciências (Física, Química, etc.). partir daí a Pedagogia pode dirigir e orientar a formulação
de objetivos e meios do processo educativo.
Didática e Metodologia Podemos, agora, explicar as relações entre educação
Tanto a Didática como a metodologia estudam os mé- escolar. Pedagogia e ensino: a educação escolar, manifes-
todos de ensino. Há, no entanto, diferença quanto ao pon- tação peculiar do processo educativo global: a Pedagogia
to de vista de cada uma. A Metodologia estuda os métodos como determinação do rumo desse processo em suas fina-
de ensino, classificando-os e descrevendo-os sem fazer juí- lidades e meios de ação; o ensino como campo específico
zo de valor. da instrução e educação escolar. Podemos dizer que o pro-
A Didática, por sua vez, faz um julgamento ou uma crí- cesso de ensino-aprendizagem é, fundamentalmente, um
tica do valor dos métodos de ensino. Podemos dizer que a trabalho pedagógico no qual se conjugam fatores externos
metodologia nos dá juízos de realidades, e a Didática nos e internos. De um lado, atuam na formação humana como
dá juízos de valor. direção consciente e planejada, através de objetivos/con-
• Juízos de realidade são juízos descritivos e cons- teúdos/métodos e formas de organização propostos pela
tatativos. escola e pelos professores; de outro, essa influência exter-
Exemplos: na depende de fatores internos, tais como as condições
 Dois mais dois são quatro. físicas, psíquicas e sócio-culturais do alunos.

1
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A Pedagogia sendo ciência da e para a educação, es- forme idades e os mecanismos psicológicos presentes na
tuda a educação, a instrução e o ensino. Para tanto com- assimilação ativa de conhecimentos e habilidades. A psi-
põe-se de ramos de estudo próprios como a Teoria da cologia aborda questões como: o funcionamento da ati-
Educação, a Didática, a Organização Escolar e a História da vidade mental, a influência do ensino no desenvolvimento
Educação e da Pedagogia. Ao mesmo tempo, busca em ou- intelectual, a ativação das potencialidades mentais para a
tras ciências os conhecimentos teóricos e práticos que con- aprendizagem, organização das relações professor-alunos
correm para o esclarecimento do seu objeto, o fenômeno e dos alunos entre si, a estimulação e o despertamento do
educativo. São elas a Filosofia da Educação, Sociologia da gosto pelo estudo etc.
Educação, Psicologia da Educação, Biologia da Educação, A Estrutura e Funcionamento do Ensino inclui questões
Economia da educação e outras. da organização do sistema escolar nos seus aspectos políti-
A Didática é o principal ramo de estudos da Pedago- cos e legais, administrativos, e aspectos do funcionamento
gia. Ela investiga os fundamentos, condições e modos de interno da escola como a estrutura organizacional e ad-
realização da instrução e do ensino. A ela cabe converter ministrativa, planos e programas, organização do trabalho
objetivos sócio-políticos e pedagógicos em objetivos de pedagógico e das atividades discentes etc.1
ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses
objetivos, estabelecer os vínculos entre ensino e aprendi- O Processo Didático Pedagógico de Ensinar e Aprender
zagem, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades
mentais dos alunos. A Didática está intimamente ligada à Didática é considerada como arte e ciência do ensi-
Teoria da Educação e à Teoria da Organização Escolar e, de no, o objetivo deste artigo é analisar o processo didático
modo muito especial, vincula-se a Teoria do Conhecimento educativo e suas contribuições positivas para um melhor
e à Psicologia da Educação. desempenho no processo de ensino-aprendizagem. Como
A Didática e as metodologias específicas das matérias arte a didática não objetiva apenas o conhecimento por
de ensino formam uma unidade, mantendo entre si rela- conhecimento, mas procura aplicar os seus próprios prin-
ções recíprocas. A Didática trata da teoria geral do ensi- cípios com a finalidade de desenvolver no individuo as ha-
no. As metodologias específicas, integrando o campo da bilidades cognoscitivas, tornando-os críticos e reflexivos,
Didática, ocupam-se dos conteúdos e métodos próprios desenvolvendo assim um pensamento independente.
de cada matéria na sua relação com fins educacionais. A Nesse Artigo abordamos esse assunto acerca das visões
Didática, com base em seus vínculos com a Pedagogia , de Libâneo (1994), destacando as relações e os processos
generaliza processos e procedimentos obtidos na investi- didáticos de ensino e aprendizagem, o caráter educativo
gação das matérias específicas, das ciências que dão em- e crítico desse processo de ensino, levando em considera-
basamento ao ensino e a aprendizagem e das situações ção o trabalho docente além da organização da aula e seus
concretas da prática docente. Com isso, pode generalizar componentes didáticos do processo educacional tais como
para todas as matérias, sem prejuízo das peculiaridades objetivos, conteúdos, métodos, meios de ensino e avaliação.
metodológicas de cada uma, o que é comum e fundamen- Concluímos o nosso trabalho ressaltando a importância da
tal no processo educativo escolar. didática no processo educativo de ensino e aprendizagem.
Há uma estreita ligação da Didática com os demais
campo do conhecimento pedagógico. A Filosofia e a His- Processos Didáticos Básicos, Ensino e Aprendizagem.
tória da Educação ajudam a reflexão em torno das teorias
educacionais, indagando em que consiste o ato educativo, A Didática é o principal ramo de estudo da pedagogia,
seus condicionantes externos e internos, seus fins e objeti- pois ela situa-se num conjunto de conhecimentos pedagó-
vos; busca os fundamentos da prática docente. gicos, investiga os fundamentos, as condições e os modos
A Sociologia da Educação estuda a educação com pro- de realização da instrução e do ensino, portanto é consi-
cesso social e ajuda os professores a reconhecerem as rela- derada a ciência de ensinar. Nesse contexto, o professor
ções entre o trabalho docente e a sociedade. Ensina a ver a tem como papel principal garantir uma relação didática
realidade social no seu movimento, a partir da dependên- entre ensino e aprendizagem através da arte de ensinar,
cia mútua entre seus elementos constitutivos, para deter- pois ambos fazem parte de um mesmo processo. Segundo
minar os nexos constitutivos da realidade educacional. A Libâneo (1994), o professor tem o dever de planejar, dirigir
partir disso estuda a escola como “fenômeno sociológico”, e controlar esse processo de ensino, bem como estimular
isto é, uma organização social que tem a sua estrutura in- as atividades e competências próprias do aluno para a sua
terna de funcionamento interligada ao mesmo tempo com aprendizagem.
outras organizações sociais(conselhos de pais, associações A condição do processo de ensino requer uma clara
de bairros, sindicatos, partidos políticos). A própria sala de e segura compreensão do processo de aprendizagem, ou
aula é um ambiente social que forma, junto com a escola seja, deseja entender como as pessoas aprendem e quais
como um todo, o ambiente global da atividade docente as condições que influenciam para esse aprendizado. Sen-
organizado para cumprir os objetivos de ensino. do assim Libâneo (1994) ressalta que podemos distinguir
A Psicologia da Educação estuda importantes aspec- a aprendizagem em dois tipos: aprendizagem casual e a
tos do processo de ensino e da aprendizagem, como as aprendizagem organizada.
implicações das fases de desenvolvimento dos alunos con- 1 Fonte: www.pedagogiadidatica.blogspot.com.br

2
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

a. Aprendizagem casual: É quase sempre espontânea, professor transmite os conteúdos de forma que os alunos
surge naturalmente da interação entre as pessoas com o assimilem esse conhecimento, auxiliando no desenvolvi-
ambiente em que vivem, ou seja, através da convivência mento intelectual, reflexivo e crítico.
social, observação de objetos e acontecimentos. Por meio do processo de ensino o professor pode al-
b. Aprendizagem organizada: É aquela que tem por cançar seu objetivo de aprendizagem, essa atividade de
finalidade específica aprender determinados conhecimen- ensino está ligada à vida social mais ampla, chamada de
tos, habilidades e normas de convivência social. Este tipo prática social, portanto o papel fundamental do ensino é
de aprendizagem é transmitido pela escola, que é uma or- mediar à relação entre indivíduos, escola e sociedade.
ganização intencional, planejada e sistemática, as finalida-
des e condições da aprendizagem escolar é tarefa específi- O Caráter Educativo do Processo de Ensino e o En-
ca do ensino (LIBÂNEO, 1994. Pág. 82). sino Crítico.
Esses tipos de aprendizagem tem grande relevância na
assimilação ativa dos indivíduos, favorecendo um conheci-
De acordo com Libâneo (1994), o processo de ensino,
mento a partir das circunstâncias vivenciadas pelo mesmo.
ao mesmo tempo em que realiza as tarefas da instrução
O processo de assimilação de determinados conheci-
de crianças e jovens, também é um processo educacional.
mentos, habilidades, percepção e reflexão é desenvolvido
No desempenho de sua profissão, o professor deve ter
por meios atitudinais, motivacionais e intelectuais do aluno,
em mente a formação da personalidade dos alunos, não
sendo o professor o principal orientador desse processo de
assimilação ativa, é através disso que se pode adquirir um apenas no aspecto intelectual, como também nos aspec-
melhor entendimento, favorecendo um desenvolvimento tos morais, afetivos e físicos. Como resultado do trabalho
cognitivo. escolar, os alunos vão formando o senso de observação, a
Através do ensino podemos compreender o ato de capacidade de exame objetivo e crítico de fatos e fenôme-
aprender que é o ato no qual assimilamos mentalmente nos da natureza e das relações sociais, habilidades de ex-
os fatos e as relações da natureza e da sociedade. Esse pressão verbal e escrita. A unidade instrução-educação se
processo de assimilação de conhecimentos é resultado da reflete, assim, na formação de atitudes e convicções frente
reflexão proporcionada pela percepção prático-sensorial e à realidade, no transcorrer do processo de ensino.
pelas ações mentais que caracterizam o pensamento (Li- O processo de ensino deve estimular o desejo e o gos-
bâneo, 1994). Entendida como fundamental no processo to pelo estudo, mostrando assim a importância do conhe-
de ensino a assimilação ativa desenvolve no individuo a cimento para a vida e o trabalho, (LIBÂNEO, 1994).
capacidade de lógica e raciocínio, facilitando o processo de Nesse processo o professor deve criar situações que
aprendizagem do aluno. estimule o indivíduo a pensar, analisar e relacionar os as-
Sempre estamos aprendendo, seja de maneira siste- pectos estudados com a realidade que vive. Essa realização
mática ou de forma espontânea, teoricamente podemos consciente das tarefas de ensino e aprendizagem é uma
dizer que há dois níveis de aprendizagem humana: o refle- fonte de convicções, princípios e ações que irão relacionar
xo e o cognitivo. O nível reflexo refere-se às nossas sensa- as práticas educativas dos alunos, propondo situações reais
ções pelas quais desenvolvemos processos de observação que faça com que os individuo reflita e analise de acordo
e percepção das coisas e nossas ações físicas no ambiente. com sua realidade (TAVARES, 2011).
Este tipo de aprendizagem é responsável pela formação de Entretanto o caráter educativo está relacionado aos
hábitos sensório motor (Libâneo, 1994). objetivos do ensino crítico e é realizado dentro do pro-
O nível cognitivo refere-se à aprendizagem de deter- cesso de ensino. È através desse processo que acontece a
minados conhecimentos e operações mentais, caracteriza- formação da consciência crítica dos indivíduos, fazendo-os
da pela apreensão consciente, compreensão e generaliza- pensar independentemente, por isso o ensino crítico, cha-
ção das propriedades e relações essenciais da realidade,
mado assim por implicar diretamente nos objetivos sócio-
bem como pela aquisição de modos de ação e aplicação
-políticos e pedagógicos, também os conteúdos, métodos
referentes a essas propriedades e relações (Libâneo, 1994).
escolhidos e organizados mediante determinada postura
De acordo com esse contexto podemos despertar uma
frente ao contexto das relações sociais vigentes da prática
aprendizagem autônoma, seja no meio escolar ou no am-
social, (LIBÂNEO, 1994).
biente em que estamos.
Pelo meio cognitivo, os indivíduos aprendem tanto È através desse ensino crítico que os processos men-
pelo contato com as coisas no ambiente, como pelas pa- tais são desenvolvidos, formando assim uma atitude in-
lavras que designam das coisas e dos fenômenos do am- telectual. Nesse contexto os conteúdos deixam de serem
biente. Portanto as palavras são importantes condições de apenas matérias, e passam então a ser transmitidos pelo
aprendizagem, pois através delas são formados conceitos professor aos seus alunos formando assim um pensamento
pelos quais podemos pensar. independente, para que esses indivíduos busquem resolver
O ensino é o principal meio de progresso intelectual os problemas postos pela sociedade de uma maneira cria-
dos alunos, através dele é possível adquirir conhecimentos tiva e reflexiva.
e habilidades individuais e coletivas. Por meio do ensino, o

3
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A Organização da Aula e seus Componentes Didáti- dos objetivos, conteúdos da disciplina, recursos disponíveis
cos do Processo Educacional e das características dos alunos e de cada aluno e situações
didáticas especificas.
A aula é a forma predominante pela qual é organizado Dentro da organização da aula destacaremos agora
o processo de ensino e aprendizagem. É o meio pelo qual seus Componentes Didáticos, que são também abordados
o professor transmite aos seus alunos conhecimentos ad- em alguns trabalhos como elementos estruturantes do en-
quirido no seu processo de formação, experiências de vida, sino didático. São eles: os objetivos (gerais e específicos),
conteúdos específicos para a superação de dificuldades os conteúdos, os métodos, os meios e as avaliações.
e meios para a construção de seu próprio conhecimento,
nesse sentido sendo protagonista de sua formação huma- Objetivos
na e escolar.
É ainda o espaço de interação entre o professor e o São metas que se deseja alcançar, para isso usa-se de
indivíduo em formação constituindo um espaço de troca diversos meios para se chegar ao esperado. Os objetivos
mútua. A aula é o ambiente propício para se pensar, criar, educacionais expressam propósitos definidos, pois o pro-
desenvolver e aprimorar conhecimentos, habilidades, ati- fessor quando vai ministrar a aula já vai com os objetivos
tudes e conceitos, é também onde surgem os questiona- definidos. Eles têm por finalidade, preparar o docente para
mentos, indagações e respostas, em uma busca ativa pelo determinar o que se requer com o processo de ensino, isto
esclarecimento e entendimento acerca desses questiona- é prepará-lo para estabelecer quais as metas a serem alcan-
mentos e investigações. çadas, eles constituem uma ação intencional e sistemática.
Por intermédio de um conjunto de métodos, o educa- Os objetivos são exigências que requerem do professor
dor busca melhor transmitir os conteúdos, ensinamentos e um posicionamento reflexivo, que o leve a questionamen-
conhecimentos de uma disciplina, utilizando-se dos recur- tos sobre a sua própria prática, sobre os conteúdos os ma-
sos disponíveis e das habilidades que possui para infundir teriais e os métodos pelos quais as práticas educativas se
no aluno o desejo pelo saber. concretizam. Ao elaborar um plano de aula, por exemplo,
Deve-se ainda compreender a aula como um conjun- o professor deve levar em conta muitos questionamentos
to de meios e condições por meio das quais o professor acerca dos objetivos que aspira, como O que? Para que?
orienta, guia e fornece estímulos ao processo de ensino em Como? E Para quem ensinar?, e isso só irá melhorar didati-
função da atividade própria dos alunos, ou seja, da assimi- camente as suas ações no planejamento da aula. 
lação e desenvolvimento de habilidades naturais do alu- Não há prática educativa sem objetivos; uma vez que
no na aprendizagem educacional. Sendo a aula um lugar estes integram o ponto de partida, as premissas gerais para
privilegiado da vida pedagógica refere-se às dimensões o processo pedagógico (LIBÂNEO, 1994- pág.122). Os ob-
do processo didático preparado pelo professor e por seus jetivos são um guia para orientar a prática educativa sem
alunos. os quais não haveria uma lógica para orientar o processo
Aula é toda situação didática na qual se põem objeti- educativo.
vos, conhecimentos, problemas, desafios com fins instruti- Para que o processo de ensino-aprendizagem aconte-
vos e formativos, que incitam as crianças e jovens a apren- ça de modo mais organizado faz-se necessário, classificar
der (LIBÂNEO, 1994- Pág.178). Cada aula é única, pois ela os objetivos de acordo com os seus propósitos e abran-
possui seus próprios objetivos e métodos que devem ir de gência, se são mais amplos, denominados objetivos gerais
acordo com a necessidade observada no educando. e se são destinados a determinados fins com relação aos
A aula é norteada por uma série de componentes, que alunos, chamados de objetivos específicos.
vão conduzir o processo didático facilitando tanto o de- a. Objetivos Gerais: exprimem propósitos mais amplos
senvolvimento das atividades educacionais pelo educador acerca do papel da escola e do ensino diante das exigências
como a compreensão e entendimento pelos indivíduos em postas pela realidade social e diante do desenvolvimento
formação; ela deve, pois, ter uma estruturação e organiza- da personalidade dos alunos (LIBANÊO, 1994- pág. 121).
ção, afim de que sejam alcançados os objetivos do ensino. Por isso ele também afirma que os objetivos educacionais
Ao preparar uma aula o professor deve estar atento às transcendem o espaço da sala de aula atuando na capaci-
quais interesses e necessidades almeja atender, o que pre- tação do indivíduo para as lutas sociais de transformação
tende com a aula, quais seus objetivos e o que é de caráter da sociedade, e isso fica claro, uma vez que os objetivos
urgente naquele momento. A organização e estruturação têm por fim formar cidadãos que venham a atender os an-
didática da aula têm por finalidade proporcionar um traba- seios da coletividade.
lho mais significativo e bem elaborado para a transmissão b. Objetivos Específicos: compreendem as intencio-
dos conteúdos. O estabelecimento desses caminhos pro- nalidades específicas para a disciplina, os caminhos tra-
porciona ao professor um maior controle do processo e çados para que se possa alcançar o maior entendimento,
aos alunos uma orientação mais eficaz, que vá de acordo desenvolvimento de habilidades por parte dos alunos que
com previsto. só se concretizam no decorrer do processo de transmissão
As indicações das etapas para o desenvolvimento da e assimilação dos estudos propostos pelas disciplinas de
aula, não significa que todas elas devam seguir um crono- ensino e aprendizagem. Expressam as expectativas do pro-
grama rígido (LIBÂNEO, 1994-Pág. 179), pois isso depende fessor sobre o que deseja obter dos alunos no decorrer do

4
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

processo de ensino. Têm sempre um caráter pedagógico, b. A relação professor-aluno no processo de ensino e
porque explicitam a direção a ser estabelecida ao trabalho aprendizagem:
escolar, em torno de um programa de formação. (TAVARES, O professor no processo de ensino é o mediador entre
2001- Pág. 66). o indivíduo em formação e os conhecimentos prévios de
uma matéria. Tem como função planejar, orientar a direção
Conteúdos dos conteúdos, visando à assimilação constante pelos alu-
nos e o desenvolvimento de suas capacidades e habilida-
Os conteúdos de ensino são constituídos por um con- des. É uma ação conjunta em que o educador é o promo-
junto de conhecimentos. É a forma pela qual, o professor tor, que faz questionamentos, propõem problemas, instiga,
expõem os saberes de uma disciplina para ser trabalhado faz desafios nas atividades e o educando é o receptor ativo
por ele e pelos seus alunos. Esses saberes são advindos e atuante, que através de suas ações responde ao proposto
do conjunto social formado pela cultura, a ciência, a téc- produzindo assim conhecimentos. O papel do professor é
nica e a arte. Constituem ainda o elemento de mediação
levar o aluno a desenvolver sua autonomia de pensamento.    
no processo de ensino, pois permitem ao discente através
da assimilação o conhecimento  histórico, cientifico, cultu-
Métodos de Ensino
ral acerca do mundo e possibilitam ainda a construção de
convicções e conceitos.
O professor, na sala de aula, utiliza-se dos conteúdos Métodos de ensino são as formas que o professor or-
da matéria para ajudar os alunos a desenvolverem com- ganiza as suas atividades de ensino e de seus alunos com
petências e habilidades de observar a realidade, perceber a finalidade de atingir objetivos do trabalho docente em
as propriedades e características do objeto de estudo, relação aos conteúdos específicos que serão aplicados. Os
estabelecer relações entre um conhecimento e outro, ad- métodos de ensino regulam as formas de interação entre
quirir métodos de raciocínio, capacidade de pensar por si ensino e aprendizagem, professor e os alunos, na qual os
próprios, fazer comparações entre fatos e acontecimentos, resultados obtidos é assimilação consciente de conheci-
formar conceitos para lidar com eles no dia-a-dia de modo mentos e desenvolvimento das capacidades cognoscitivas
que sejam instrumentos mentais para aplicá-los em situa- e operativas dos alunos.
ções da vida prática (LIBÂNEO 2001, pág. 09). Neste con- Segundo Libâneo (1994) a escolha e organização os mé-
texto pretende-se que os conteúdos aplicados pelo pro- todos de ensino devem corresponder à necessária unidade
fessor tenham como fundamento não só a transmissão das objetivos-conteúdos-métodos e formas de organização do
informações de uma disciplina, mas que esses conteúdos ensino e as condições concretas das situações didáticas. Os
apresentem relação com a realidade dos discentes e que métodos de ensino dependem das ações imediatas em sala
sirvam para que os mesmos possam enfrentar os desafios de aula, dos conteúdos específicos, de métodos peculiares
impostos pela vida cotidiana. Estes devem também pro- de cada disciplina e assimilação, além disso, esses méto-
porcionar o desenvolvimento das capacidades intelectuais dos implica o conhecimento das características dos alunos
e cognitivas do aluno, que o levem ao desenvolvimento quanto à capacidade de assimilação de conteúdos confor-
critico e reflexivo acerca da sociedade que integram. me a idade e o nível de desenvolvimento mental e físico e
Os conteúdos de ensino devem ser vistos como uma suas características socioculturais e individuais.
relação entre os seus componentes, matéria, ensino e o co- A relação objetivo-conteúdo-método procuram mos-
nhecimento que cada aluno já traz consigo. Pois não basta trar que essas unidades constituem a linhagem funda-
apenas a seleção e organização lógica dos conteúdos para mental de compreensão do processo didático: os objeti-
transmiti-los. Antes os conteúdos devem incluir elementos vos, explicitando os propósitos pedagógicos intencionais
da vivência prática dos alunos para torná-los mais signifi-
e planejados de instrução e educação dos alunos, para a
cativos, mais vivos, mais vitais, de modo que eles possam
participação na vida social; os conteúdos, constituindo a
assimilá-los de forma ativa e consciente (LIBÂNEO, 1994
base informativa concreta para alcançar os objetivos e de-
pág. 128). Ao proferir estas palavras, o autor aponta para
terminar os métodos; os métodos, formando a totalidade
um elemento de fundamental importância na preparação
da aula, a contextualização dos conteúdos. dos passos, formas didáticas e meios organizativos do en-
sino que viabilizam a assimilação dos conteúdos, e assim, o
a. Contextualização dos conteúdos atingimento dos objetivos.
A contextualização consiste em trazer para dentro da No trabalho docente, os professores selecionam e or-
sala de aula questões presentes no dia a dia do aluno e ganizam seus métodos e procedimentos didáticos de acor-
que vão contribuir para melhorar o processo de ensino e do com cada matéria. Dessa forma destacamos os princi-
aprendizagem do mesmo. Valorizando desta forma o con- pais métodos de ensino utilizado pelo professor em sala
texto social em que ele está inserido e proporcionando a de aula: método de exposição pelo professor, método de
reflexão sobre o meio em que se encontra, levando-o a trabalho independente, método de elaboração conjunta,
agir como construtor e transformador deste. Então, pois, método de trabalho em grupo. Nestes métodos, os conhe-
ao selecionar e organizar os conteúdos de ensino de uma cimentos, habilidades e tarefas são apresentados, expli-
aula o professor deve levar em consideração a realidade cadas e demonstradas pelo professor, além dos trabalhos
vivenciada pelos alunos. planejados individuais, a elaboração conjunta de atividades

5
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

entre professores e alunos visando à obtenção de novos bons alunos e punição para os desinteressados, além disso,
conhecimentos e os trabalhos em grupo. Dessa maneira os professores confiam demais em seu olho clínico, dispen-
designamos todos os meios e recursos matérias utilizados sam verificações parciais no decorrer das aulas e aqueles
pelo professor e pelos alunos para organização e condu- que rejeitam as medidas quantitativas de aprendizagem
ção metódica do processo de ensino e aprendizagem (LI- em favor de dados qualitativos (LIBÂNEO, 1994).
BÂNEO, 1994 Pág. 173). O entendimento correto da avaliação consiste em con-
siderar a relação mútua entre os aspectos quantitativos e
Avaliação Escolar qualitativos. A escola cumpre uma função determinada so-
cialmente, a de introduzir as crianças, jovens e adultos no
A avaliação escolar é uma tarefa didática necessária mundo da cultura e do trabalho, tal objetivo não surge es-
para o trabalho docente, que deve ser acompanhado pas- pontaneamente na experiência das crianças, jovens e adul-
so a passo no processo de ensino e aprendizagem. Através tos, mas supõe as perspectivas traçadas pela sociedade e
da mesma, os resultados vão sendo obtidos no decorrer controle por parte do professor. Por outro lado, a relação
do trabalho em conjunto entre professores e alunos, a fim pedagógica requer a independência entre influências ex-
de constatar progressos, dificuldades e orientá-los em seus ternas e condições internas do aluno, pois nesse contexto
trabalhos para as correções necessárias. Libâneo (1994). o professor deve organizar o ensino objetivando o desen-
A avaliação escolar é uma tarefa complexa que não se volvimento autônomo e independente do aluno (LIBÂNEO,
resume à realização de provas e atribuição de notas, ela 1994).2
cumpre funções pedagógico-didáticas, de diagnóstico e de
controle em relação ao rendimento escolar. Didática e Organização Do Ensino
A função pedagógico-didática refere-se ao papel da
avaliação no cumprimento dos objetivos gerais e especí- Um breve resgate histórico da Didática no Brasil é de
ficos da educação escolar. Ao comprovar os resultados do fundamental importância para compreender o lugar que
processo de ensino, evidencia ou não o atendimento das essa área do conhecimento ocupa na formação do pro-
fessor hoje. Isso porque entendemos que a organização
finalidades sociais do ensino, de preparação dos alunos
curricular dos cursos de licenciatura nas novas propostas
para enfrentar as exigências da sociedade e inseri-los ao
para os cursos de licenciaturas expressa a relação social
meio social. Ao mesmo tempo, favorece uma atitude mais
básica do sistema nesse momento histórico. Data de 1972
responsável do aluno em relação ao estudo, assumindo-o
o I Encontro Nacional de Professores de Didática realizado
como um dever social. Já a função de diagnóstico permite
na Universidade de Brasília, período pós-64, momento his-
identificar progressos e dificuldades dos alunos e a atuação
tórico em que o planejamento educacional é considerado
do professor que, por sua vez, determinam modificações
“área prioritária”, integrado ao Plano Nacional de Desen-
do processo de ensino para melhor cumprir as exigências
volvimento, e a educação passa a ser vista como fator de
dos objetivos. A função do controle se refere aos meios e
desenvolvimento, investimento individual e social. Nesse
a frequência das verificações e de qualificação dos resulta- momento discute-se a necessidade de formar um novo
dos escolares, possibilitando o diagnóstico das situações professor tecnicamente competente e comprometido com
didáticas (LIBÂNEO, 1994). o programa político-econômico do país. E a formação do
No entanto a avaliação na pratica escolar nas escolas professor passa a se fazer por meio de treinamentos, em
tem sido bastante criticada sobre tudo por reduzir-se à sua que são transmitidos os instrumentos técnicos necessários
função de controle, mediante a qual se faz uma classifica- à aplicação do conhecimento científico, fundado na quali-
ção quantitativa dos alunos relativa às notas que obtive- dade dos produtos, eficiência e eficácia. A racionalização
ram nas provas. Os professores não tem conseguido usar do processo aparece como necessidade básica para o al-
os procedimentos de avaliação que sem dúvida, implicam cance dos objetivos do ensino e o planejamento tem papel
o levantamento de dados por meio de testes, trabalhos central na sua organização.
escritos etc. Em relação aos objetivos, funções e papel da Dez anos depois, em 1982, realiza-se no Rio de Janeiro
avaliação na melhoria das atividades escolares e educati- o I Seminário A Didática em Questão num período marca-
vas, tem-se verificado na pratica escolar alguns equívocos. do pela abertura política do regime militar instalado em
(LIBÂNEO, Pág. 198- 1994). 1964 e pelo acirramento das lutas de classe no país.
O mais comum é tomar a avaliação unicamente como Nesse momento histórico, enfatiza-se a necessidade
o ato de aplicar provas, atribuir notas e classificar os alunos. de formar educadores críticos e conscientes do papel da
O professor reduz a avaliação à cobrança daquilo que o educação na sociedade, e mais, comprometidos com as ne-
aluno memorizou e usa a nota somente como instrumento cessidades das camadas populares cada vez mais presen-
de controle. Tal ideia é descabida, primeiro porque a atri- tes na escola e cedo dela excluídos. A dimensão política do
buição de notas visa apenas o controle formal, com obje- ato pedagógico torna-se objeto de discussão e análise, e a
tivo classificatório e não educativo; segundo porque o que contextualização da prática pedagógica, buscando compreen-
importa é o veredito do professor sobre o grau de adequa- der a íntima relação entre a prática escolar e a estrutura social
ção e conformidade do aluno ao conteúdo que transmite. 2 Fonte: www.meuartigo.brasilescola.uol.com.br - Elieide Pereira dos
Outro equívoco é utilizar a avaliação como recompensa aos Santos/Isleide Carvalho Batista/Mayane Leite da Silva Souza

6
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

mais ampla, passa a ser fundamental. Esses desafios marcaram transmitir ao futuro professor um conteúdo mais crítico; (...)
a década de oitenta como um período de intenso movimento é preciso romper com o eixo da transmissão-assimilação em
de revisão crítica e reconstrução da Didática no Brasil. que se distribui um saber sistematizado falando sobre ele. .
Ao longo da década de oitenta, as produções teóricas Desse movimento resultaram alterações na organiza-
dos educadores expressam tentativas de dar conta dessa ção das escolas, nos cursos de formação de professores,
nova situação. Tomando como parâmetro a questão da re- nas produções acadêmicas dos estudiosos da área e fun-
lação teoria-prática, podemos identificar processos distin- damentalmente na prática pedagógica dos professores de
tos que procuram ampliar a discussão da Didática, iniciada todos os níveis de ensino. Nesse período, os professores
por Candau (1984), em reação ao modelo pedagógico cen- intensificaram suas iniciativas para fazer frente às contra-
trado no campo da instrumentalidade. dições do sistema e produziram saberes pedagógicos nas
A autora propõe uma Didática Fundamental, que, nas suas próprias práticas.
palavras de Freitas (1995, p.22), “(...) mais do que um enfo- Nesse contexto, uma pesquisa-ensino longitudinal
que propriamente dito, foi um amplo movimento de rea- realizada por Martins (1998) acompanhando durante dez
ção a um tipo de didática baseada na neutralidade”. anos as iniciativas dos professores de todos os níveis de
Desta forma, o movimento que inicialmente incluiu ensino, além da produção da área, resultou na sistematiza-
uma crítica e uma denúncia ao caráter meramente instru- ção de três momentos fundamentais, com ênfases especí-
mental da Didática avançou em seguida para a busca de ficas, nas discussões e práticas da didática na formação de
alternativas e reconstrução do conhecimento da área. E, professores. Esses momentos, que não se anulam, mas se
em oposição ao modelo pedagógico centrado no campo interpenetram, devem ser entendidos como uma parte de
da instrumentalidade, grupos de educadores passam a dis- um todo, quais sejam: (i) a Dimensão política do ato peda-
cutir a importância de formar uma consciência crítica nos gógico (1985/88); (ii) a organização do trabalho na escola
professores para que estes coloquem em prática as formas (1989/93); (iii) a produção e sistematização coletivas de co-
mais críticas de ensino, articuladas aos interesses e neces- nhecimento (1994/2000).
sidades práticas das camadas populares, tendo em vista O primeiro momento a Dimensão política do ato pe-
garantir sua permanência na escola pública. dagógico é marcado por intensa movimentação social no
Propostas expressivas como a Pedagogia Históricocrí- Brasil, que consolida novas formas de organização e mobi-
tica, de Dermeval Saviani (1983), base teórica da Pedagogia lização quando os grupos sociais se definem como classe.
Crítico-social dos Conteúdos, sistematizada por José Carlos Passa-se, então, a dar ênfase à problemática política. Os
Libâneo (1985), caminham nessa direção. Do ponto de vista professores, no seu dia-a-dia, na sala de aula e na escola
didático, o ensino orienta-se pelo eixo da transmissão-assimi- reclamam da predeterminação do seu trabalho por instân-
lação ativa de conhecimentos. Dirá Libâneo (1985 p. 127-128): cias superiores, estão querendo participar e essa participa-
A pedagogia crítico-social dos conteúdos valoriza a ins- ção tem um caráter eminentemente político. A centralida-
trução enquanto domínio do saber sistematizado e os meios de do planejamento passa a ser questionada.
de ensino, enquanto processo de desenvolvimento das capa- Já no final da década de oitenta e início dos anos no-
cidades cognitivas dos alunos e viabilização da atividade de venta, avança-se para as discussões em torno da organiza-
transmissão/assimilação ativa de conhecimentos. ção do trabalho na escola (1989/93), segundo momento.
Nessa proposta, o elemento central está calcado na Ocorre uma intensificação da quebra do sistema organiza-
concepção segundo a qual a aprendizagem se faz funda- cional da escola. Os professores já se compreendem e se
mentalmente a partir do domínio da teoria. A prática de- posicionam como trabalhadores, assalariados; organizam-
corre da teoria. Daí a importância do racional, do cognitivo, -se em sindicatos, participam de movimentos reivindicató-
do pensamento. Nessa concepção, a ação prática é guiada rios. Na escola, vão quebrando normas, tomando iniciativas
pela teoria. Valoriza-se o pensamento sobre a ação. que consolidem novas formas de organização da escola e
Por outro lado, grupos mais radicais se voltam para a da relação professor, aluno e conhecimento.
alteração dos próprios processos de produção do conhe- À medida que se verificam alterações no interior da
cimento; das relações sociais. A Pedagogia dos Conflitos organização escolar, por iniciativa de seus agentes, intensi-
Sociais, de Oder José dos Santos (1992), base teórica da fica-se a busca da produção e sistematização coletivas de
Sistematização coletiva do conhecimento, proposta por conhecimento e a ênfase na problemática do aluno como
Martins (1998), caminha nessa direção. sujeito vai se aprofundando. No período 1994/2000, o alu-
Passa-se a discutir a importância de se romper com o no passa a ser concebido como um ser historicamente si-
eixo da transmissão-assimilação dos conteúdos, ainda que tuado, pertencente a uma determinada classe, portador de
críticos, buscando um processo de ensino que altere, na uma prática social com interesses próprios e um conheci-
prática, suas relações básicas na direção da sistematização mento que adquire nessa prática, os quais não podem mais
coletiva do conhecimento. Dirá Martins, (2009, p.175) ser ignorados pela escola.
Um dos pontos-chave da nova proposta pedagógica Esse período se relaciona com os anteriores através da
encontra-se na alteração do processo de ensino e não ape- problemática da interdisciplinaridade, que passa a ser uma
nas na alteração do discurso a respeito dele. (...) não basta questão importante.

7
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Com efeito, o movimento histórico do final do século Com relação à articulação da disciplina Didática com as
passado provocou uma alteração na concepção de conhe- escolas de Educação Básica, observa-se uma variação sig-
cimento que deu um passo à frente em relação aos mo- nificativa nas iniciativas desses cursos. Há uma busca pela
delos anteriores. Trata-se de um processo didático pau- aproximação da universidade com as escolas de Educação
tado numa concepção de conhecimento que tem a prá- Básica em que esses egressos irão atuar. Contudo, pode-se
tica como elemento básico, fazendo a mediação entre a observar que a lógica subjacente à organização desses cur-
realidade e o pensamento. Nessa concepção a teoria não sos, via de regra, valoriza a preparação do futuro professor
é entendida como verdade que vai guiar a ação prática, com recursos técnicos, tendo em vista posterior aplicação na
mas como expressão de uma relação, de uma ação sobre a prática de ensino no espaço escolar. Essa lógica se verifica
realidade, que pode indicar caminhos para novas práticas; nas disciplinas que compõem o currículo, incluindo as que
nunca guiá-la. Desse princípio básico, delineia-se um mo- focalizam o ensino, tais como: Didática Geral, didática espe-
delo aberto de Didática que vai além de compreender o cífica, metodologias específicas por área de conhecimento.
processo de ensino em suas múltiplas determinações para Em decorrência, no que tange à articulação da Didáti-
intervir nele e reorientá-lo na direção política pretendida ca, geral e/ou específicas, com as práticas pedagógicas de-
(MARTINS, 2008, p.176); ela vai expressara ação prática dos senvolvidas nas escolas de Educação Básica, numa primeira
professores, sendo uma forma de abrir caminhos possíveis leitura dos programas e pela entrevista com professores,
para novas ações. verifica-se que o espaço da escola de Educação Básica são
Acompanhando esse movimento, nesse momento his- tidos como forma de ilustração, exemplos práticos que rea-
tórico, algumas questões se colocam: quais são as priorida- firmam os conteúdos trabalhados nas disciplinas; ou ain-
des estabelecidas pelos cursos de licenciaturas para a for- da, como espaço de aplicação dos preceitos teóricos tra-
mação de professores nesse início de século? Que espaço balhados na universidade. Com efeito, o que se observa é
da didática ocupa nesse processo de formação? que a formação de professores está centrada no aprender
a aprender habilidades específicas que garantam compe-
A didática nas propostas curriculares das licenciaturas tência no fazer. Há uma valorização da prática, não mais
como campo de problematização, explicação e compreen-
Com relação à didática nesse processo de formação
são dos processos de ensinar e aprender, tendo em vista a
em desenvolvimento nas universidades investigadas, o que
sua transformação, mas sim como espaço de demonstração
se verifica numa primeira aproximação com a estruturação
de habilidades e competências técnicas no exercício pro-
desses cursos é a perda de espaço dessa área do conheci-
fissional. Isso implica valorização de procedimentos espe-
mento e a mudança na sua abordagem. Em outros termos,
cíficos, vinculados às áreas de conteúdo e trabalhadas nas
a didática tende a priorizar aspectos específicos do fazer
metodologias e didáticas específicas. Verifica-se que a didá-
pedagógico, perdendo a dimensão de totalidade conquis-
tica geral, enquanto área do conhecimento que tem como
tada na década de oitenta do século passado.
objeto de estudo o processo de ensino numa dimensão de
Os dados coletados nos projetos pedagógicos dos cur-
sos de licenciaturas das universidades investigadas mos- totalidade, buscando compreendê-lo em suas múltiplas
tram que a maioria dos cursos deixa de oferecer a discipli- determinações para intervir nele e reorientá-lo na direção
na Didática Geral e volta a trabalhar o processo de ensino pretendida, (MARTINS, 2008, p.176) vem perdendo espaço.3
– seu objeto de estudo – em disciplinas específicas volta-
das para as metodologias das áreas de conhecimento. Essa Planejamento da ação didática.
tendência também se manifesta na produção acadêmica
da última década, conforme estudo realizado sobre o es- Na prática pedagógica atual o processo de planeja-
tado do conhecimento (MARTINS e ROMANOWSkI, 2008). mento do ensino tem sido objeto de constantes indaga-
Em uma universidade pública do interior do Estado, ções quanto à sua validade como efetivo instrumento de
por exemplo, dos 15 (quinze) cursos oferecidos, apenas os melhoria qualitativa do trabalho do professor. As razões de
cursos de Física, Química e Música apresentam a disciplina tais indagações são múltiplas e se apresentam em níveis
de Didática Geral. Ela é encontrada também no curso de diferentes na prática docente.
Pedagogia com outras denominações: A vivência do cotidiano escolar nos tem evidenciado
a) Didática: Trabalho Pedagógico Docente; situações bastante questionáveis nesse sentido. Percebeu-
b) Didática: Organização do Trabalho Pedagógico; -se, de início, que os objetivos educacionais propostos nos
c) Didática: Avaliação e Ensino. currículos dos cursos apresentam-se confusos e desvincu-
Também no curso de Filosofia encontramos uma dis- lados da realidade social. Os conteúdos a serem trabalha-
ciplina denominada Didática e Teoria da Educação. Nos dos, por sua vez, são definidos de forma autoritária, pois
demais cursos, o processo de ensino – objeto de estudo os professores, via de regra, não participam dessa tarefa.
da didática – é desenvolvido através das didáticas espe- Nessas condições, tendem a mostrarem-se sem elos signi-
cíficas, metodologias específicas, nas disciplinas de práti- ficativos com as experiências de vida dos alunos, seus inte-
cas de ensino e nas propostas de estágio supervisionado. resses e necessidades.
Isso se repete com alguma variação, nas demais universi- 3 Fonte: www.webartigos.com – Texto adaptado de Lourival De Oliveira
dades investigadas. Santos

8
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Percebe-se também que os recursos disponíveis para o possibilitará ao professor maior segurança para lidar com
desenvolvimento do trabalho didático tendem a ser consi- a relação educativa que ocorre na sala de aula e na escola
derados como simples instrumentos de ilustração das au- como um todo. Nesse sentido, o “planejamento adequa-
las, reduzindo-se dessa forma a equipamentos e objetos, do”, bem como o seu resultado – “ o bom plano de ensino”
muitas vezes até inadequados aos objetivos e conteúdos – se traduzirá pela ação pedagógica direcionada de for-
estudados. ma a se integrar dialeticamente no concreto do educando,
Com relação à metodologia utilizada pelo professor, buscando transformá-lo.
observa-se que esta tem se caracterizado pela predomi- Numa perspectiva crítica da educação, a instituição es-
nância de atividades transmissoras de conhecimentos, com colar tem o significado de local de acesso ao saber sistema-
pouco ou nenhum espaço para a discussão e a análise tizado historicamente acumulado. De acordo com SAVIANI
crítica dos conteúdos. O aluno sob esta situação tem se (1984, p. 9), a escola existe “para propiciar a aquisição dos
mostrado mais passivo do que ativo e, por decorrência, seu instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elabora-
pensamento criativo tem sido mais bloqueado do que esti- do (ciência), bem como o próprio acesso aos rudimentos
mulado. A avaliação da aprendizagem, por outro lado, tem desse saber”. Os conteúdos que constituem esse saber ela-
sido resumida ao ritual das provas periódicas, através das borado não poderão ser considerados de forma estática
quais é verificada a quantidade de conteúdos assimilada e acabados, pois trata-se de conteúdos dinâmicos e, por
pelo aluno. isso, articulados dialeticamente com a realidade histórica.
Completando esse quadro de desacertos, observa-se Nesses termos, precisam ser conduzidos de forma que, ao
ainda que o professor, assumindo sua autoridade institu- mesmo tempo em que transmitam a cultura acumulada,
cional, termina por direcionar o processo ensino-aprendi- contribuam para a produção de novos conhecimentos.
zagem de forma isolada dos condicionantes históricos pre- Produzir conhecimentos nessa concepção tem o sig-
sentes na experiência de vida dos alunos. nificado de processo de reflexão permanente sobre os
No contexto acima descrito, o planejamento do ensino conteúdos aprendidos, buscando analisá-los sob diferen-
tem se apresentado como desvinculado da realidade social, tes pontos de vista. Significa ainda desenvolver a atividade
caracterizando-se como uma ação mecânica e burocrática de curiosidade científica, de investigação da realidade, não
do professor, pouco contribuindo para elevar a qualidade aceitando como conhecimentos perfeitos e acabados os
da ação pedagógica desenvolvida no âmbito escolar. conteúdos transmitidos na escola.
No meio escolar, quando se faz referência a planeja- Nessa concepção, a questão do planejamento do en-
mento do ensino, a ideia que passa é aquela que identifi- sino não poderá ser compreendida de maneira mecânica,
ca o processo através do qual são definidos os objetivos, desvinculada das relações entre escola e realidade his-
o conteúdo pragmático, os procedimentos de ensino, os tórica. Em vista disso, os conteúdos a serem trabalhados
recursos didáticos, a sistemática de avaliação da aprendi- através do currículo escolar precisarão estar estreitamente
zagem, bem como a bibliografia básica a ser consultada relacionados com a experiência de vida dos alunos. Essa re-
no decorrer de um curso, série ou disciplina de estudo. lação, inclusive, mostra-se como condição necessária para
Com efeito, este é o padrão de planejamento adotado pela que, ao mesmo tempo em que ocorra a transmissão de
grande maioria dos professores e que, em nome da efi- conhecimentos, proceda-se a as reelaboração com vistas à
ciência do ensino disseminada pela concepção tecnicista produção de novos conhecimentos. O resultado dessa rela-
de educação, passou a ser valorizado apenas em sua di- ção dialética será a busca da aplicação dos conhecimentos
mensão técnica. aprendidos sobre a realidade no sentido de transformá-la.
Ao que parece, essa situação dos componentes do pla- Sob essa perspectiva, podemos concluir que a tarefa
no de ensino de uma maneira fragmentária e desarticulada de planejar passa a existir como uma ação pedagógica es-
do todo social é que tem gerado a concepção de planeja- sencial ao processo de ensino, superado sua concepção
mento incapaz de dinamizar e facilitar o trabalho didático. mecânica e burocrática no contexto do trabalho docente.
Consideramos, contudo, que numa perspectiva trasforma-
dora, ou seja, o processo de planejamento visto sob uma Planejamento do ensino: um processo integrador
perspectiva crítica de educação, passa a extrapolar a simple entre escola e contexto social
tarefa de se elaborar um documento contendo todos os
componentes tecnicamente recomendáveis. Consideramos que uma nova alternativa para um pla-
nejamento de ensino globalizante, que supere sua dimen-
Planejamento: ação pedagógica essencial são técnica, seria a ação resultante de um processo inte-
grador entre escola e contexto social, efetivada de forma
A partir dos desacertos observados na atual prática crítica e transformadora. Isso significa dizer que as ativi-
pedagógica em nossas escolas, sentimos que o processo dades educativas seriam planejadas tendo como ponto
de planejamento do ensina precisa ser repensado. A visão de referência a problemática sócio-cultural, econômica e
negativa desse processo demonstrada pela grande maioria política do contexto onde a escola está inserida. O plane-
dos professores não pode ser considerada como uma si- jamento do ensino nessa perspectiva estaria voltado emi-
tuação irreversível. Entendemos que um planejamento di- nentemente para a transformação da sociedade de classes,
rigido para uma ação pedagógica crítica e transformadora no sentido de torná-la mais justa e igualitária.

9
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Na prática, como se efetivaria essa forma de planeja- Nessa fase é importante ter-se em vista que um pro-
mento? cesso de ensino transformador não poderá deixar-se
Nossa proposta tem como fundamento os princípios conduzir por objetivos que explicitem somente a simples
do planejamento participativo, forma de trabalho comuni- aquisição de conhecimentos. Na definição dos objetivos,
tário que se caracteriza pela integração de todos os setores portanto, será essencial a especificação dos diferentes ní-
da atividade humana, numa ação globalizante, com vistas à veis de aprendizagem a serem atingidos: a aquisição, a ree-
solução de problemas comuns1. laboração dos conhecimentos aprendidos e a produção de
Essa forma de ação implica uma convivência de pes- novos conhecimentos.
soas que discutem, decidem, executam e avaliam ativida- É importante ressaltar ainda que, num processo educa-
des propostas coletivamente. A partir dessa convivência, o tivo que se propõe transformador, os objetivos de ensino
processo educativo passa a desenvolver mais facilmente precisarão estar voltados eminentemente para a reelabo-
seu papel transformador, pois, à medida que discutem, as ração e produção de conhecimentos. Para tanto, deverão
pessoas refletem, questionam, conscientizam-se de pro-
expressar ações, tais como a reflexão crítica, a curiosidade
blemas coletivos e decidem-se por se engajar na luta pela
científica, a investigação e a criatividade.
melhoria de suas condições de vida.
Os conteúdos a serem estudados, como já fazem par-
No contexto escolar o planejamento participativo ca-
te do currículo escolar previamente estruturado, deverão
racteriza-se pela busca da integração efetiva entre escola e
passar por uma análise crítica com vistas à identificação
realidade social, primando pelo inter-relacionamento entre
teoria e prática. A participação de professores, alunos, es- daquilo que representa o essencial e o que representa o
pecialistas, pais e demais pessoas envolvidas no processo secundário a ser aprendido. Nesse caso, o critério básico
educativo, seria o ponto de convergência das ações dire- para se efetivar essa distinção deverá ser a própria reali-
cionadas para a produção do conhecimento, tendo como dade concreta dos educandos, a partir da qual o saber sis-
referencial a realidade histórica. tematizado poderá ser selecionado com vistas a funcionar
Para efeito de análise desse processo integrador, po- como instrumento de compreensão crítica da dinâmica
deremos sistematizá-lo em fases ou etapas inter-relaciona- dessa mesma realidade. A partir dessa definição, a organi-
das. A primeira será aquela onde se procederá ao estudo zação do chamado conteúdo programático far-se-á consi-
real da escola em suas relações com o contexto social em derando-se os objetivos propostos em termo de aquisição,
que se insere. O estudo em questão deverá ser desenvol- reelaboração e produção de conhecimentos.
vido de forma global, analisando-se os condicionantes só- Conforme já referido anteriormente, o saber sistema-
cio-culturais, e econômicos e políticos de diferentes níveis tizado, atual conteúdo dos currículos escolares, tem sido
presentes nas relações escola-sociedade. produzido longe da escola. A partir desse saber, que na
No bojo desse estudo será naturalmente configurado o nossa conjuntura educacional não poderá ser ignorado,
universo sócio-cultural da clientela escolar, possibilitando deverão ser gerados novos conhecimentos a partir dos
assim a caracterização dos interesses e necessidades dos conteúdos impostos pelos currículos escolares, estariam de
educandos para os quais a ação pedagógica estará sendo fato consolidando seu poder de contribuir para a transfor-
planejada. Nesse sentido, pesquisar os alunos objetivando mação da sociedade.
identificar o que eles já conhecem, ao que aspiram e como Daí a importância de se ressaltar a relação intrínseca
vivem, será uma tarefa imprescindível. existente entre objetivos propostos e conteúdos a serem
Segundo SNYDERS (1974), os alunos possuem uma ex- estudados. Em última instância, a organização dos conteú-
periência que não poderá ser ignorada pela escola, expe- dos estará intimamente relacionada com o objetivo maior
riência das situações de vida, das relações pessoais, bem da educação escolar, que é propiciar a aquisição do saber
como uma significativa multiplicidade de informações e
sistematizado (ciência), tido como instrumento fundamen-
conhecimentos, embora de forma fragmentada e disper-
tal de libertação do homem (SAVIANI, 1984).
sa. Portanto, a identificação dos temas ou problemas que
Tendo como ponto de referência os objetivos propos-
se mostram mais importantes para os educandos constitui
tos e os conteúdos a serem estudados, passa-se à articula-
fator relevante na definição do material da realidade a ser ção dos procedimentos que deverão concretizá-los. Esses
estudado no decorrer do processo de ensino. procedimentos deverão ser selecionados de forma a aten-
O resultado desse primeiro momento do planejamento derem os diferentes níveis de aprendizagem desejados,
seria um diagnóstico sincero da realidade concreta do alu- bem como a natureza da matéria de ensino proposta.
no, elaborado de forma consciente e comprometida com Tendo em vista que a reelaboração e produção de co-
seus interesses e necessidades. Concluído esse diagnósti- nhecimentos serão os níveis desejáveis de aprendizagem,
co, o passo seguinte seria, a partir dele, proceder-se à or- o critério básico para a seleção dos procedimentos de en-
ganização do trabalho didático propriamente dito. Assim, sino será a criatividade. Assim, a tarefa do professor nesse
a definição dos objetivos a serem perseguidos, a sistemati- momento será articular uma metodologia de ensino que se
zação do conteúdo programático e a seleção dos procedi- caracterize pela variedade de atividades estimuladoras da
mentos de ensino a serem utilizados, constituem as ações criatividade dos alunos. Nessa tarefa, inclusive, a participa-
básicas dessa segunda etapa do planejamento. ção dos educandos será bastante enriquecedora. Descobrir

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

suas expectativas, saber por que estão na escola, qual seu implícita a relação educador-educando sob todos os as-
projeto de vida, são questões que levarão ao entendimento pectos cooperativa, pois existe uma totalidade a ser preser-
do aluno, ajudando na compreensão de sua linguagem, de vada e esta se explicita pela participação e não pela divisão.
suas dificuldades, de seu nível de aspiração. Dessa forma, professores e especialistas não terão que
Complementando esse momento de organização da agir de modo compartimentado. O trabalho pedagógico
metodologia de ensino, o passo seguinte será a sistemati- deverá estar voltado para o engajamento permanente de
zação do processo de avaliação de aprendizagem. todos os elementos envolvidos no processo, cada um con-
A avaliação nessa concepção de planejamento não po- tribuindo dentro de suas potencialidades e limitações.
derá ter o sentido de processo classificatório dos resultados Em síntese, na efetivação dessa forma de planejamento
do ensino. Num processo educativo onde a metodologia é importante que ressaltem suas principais diretrizes: - a
de ensino privilegia a criatividade dos alunos, a avaliação ação de planejar implica a participação ativa de todos os
terá um caráter de acompanhamento desse processo, num elementos envolvidos no processo de ensino; - deve prio-
julgamento conjunto de professores e alunos. Dessa forma, rizar a busca da unidade entre teoria e prática; o plane-
não deverá existir preocupação com a verificação da quan- jamento deve partir da realidade concreta (aluno, escola,
tidade de conteúdos aprendidos, mas tão somente com a contexto social...); - deve estar voltado para atingir o fim
qualidade da reelaboração e produção de conhecimentos mais amplo da educação.
empreendida por cada aluno, a partir da matéria estudada. Em face do exposto, podemos concluir que a concep-
Concluindo essa discussão, faz-se necessário enfatizar ção de planejamento de ensino aqui esboçada justifica-se
que a caracterização de momentos ou etapas no planeja- pelo simples fato de que, como a educação, a ação de pla-
mento do ensino não deverá ser entendida como o desen- nejar não pode ser encarada como uma atividade neutra.
volvimento de partes distintas e estanques dentro desse De outra parte, a opção do professor por um ensino crítico
processo, pois não é possível compartimentar-se uma ação e transformador somente se concretizará através de uma
que por sua própria natureza é contínua, dinâmica e globa- sistemática de planejar seu trabalho de forma participati-
lizante. Assim como a educação pretendida através dessa va e problematizadora, que ouse dar oportunidade para
ação, o planejamento deverá ser integrador em toda a sua o aluno reelaborar os conteúdos do saber sistematizado,
extensão. Essa abordagem integradora, com efeito, é que com vista à produção de novos conhecimentos.
proporcionará um ensino voltado para a formação de pes- Sob essa perspectiva, o planejamento do ensino de-
soas críticas, questionadoras e atuantes. Entendemos que verá ser assumido pelo professor como uma ação peda-
uma educação integradora, onde professores e alunos pro- gógica consciente e comprometida com a totalidade do
duzam conhecimentos a partir da participação da escola na processo educativo transformador, o qual, emergindo do
sociedade e vice-versa, estará formando efetivamente um social, a ele retorna uma ação dialética.4
educando com possibilidades de contribuir concretamente
para a transformação da sociedade. Após analisarmos os aspectos do processo de plane-
Tal perspectiva, contudo, exigirá uma postura docente jamento, faremos agora uma síntese do didatismo no pla-
que seja comprometida não só com o pedagógico, mas nejamento.
também com o social. Exigirá, pois, um compromisso do Quando falamos em planejar o ensino, ou a ação didá-
professor com uma educação política e não ideológica2. tica, estamos prevendo as ações e os procedimentos que o
Nestes termos, um planejamento do ensino nos moldes professor vai realizar junto a seus alunos, e a organização
aqui discutidos só poderá ser efetivado a partir de uma das atividades discentes e da experiência de aprendiza-
escola cujo engajamento com o contexto social seja, pe- gem, visando atingir os objetivos educacionais estabele-
los menos pretendido. Para tanto, será imprescindível que cidos. Nesse sentido, o planejamento de ensino torna-se a
nessa escola convivam pessoas comprometidas com essa operacionalização do currículo escolar.
postura política a fim de que um processo transformador
possa ser desencadeado. Assim, no que se refere ao aspecto didático, segundo
Um outro aspecto a ressaltar é que um planejamento HAIDT (1995), planejar é:
participativo implica a eliminação da divisão do trabalho • Analisar as características da clientela (aspirações,
pedagógico existente na escola. Se o fundamento básico necessidades e possibilidades dos alunos);
desse processo é a integração entre a escola e o contex- • Refletir sobre os recursos disponíveis;
to social, e seu objetivo maior é a educação do indivíduo • Definir os objetivos educacionais considerados
para a vida social, a coparticipação apresenta-se como ati- mais adequados para a clientela em questão;
tude norteadora de toda a ação pedagógica. Assim, não • Selecionar e estruturar os conteúdos a serem assi-
será possível a convivência de um discurso de participação milados, distribuídos ao longo do tempo disponível para o
com uma prática da divisão e da competição. Nesse senti- seu desenvolvimento;
do, não haverá lugar para a defesa de posições de grupos • Prever e organizar os procedimentos do professor,
distintos, como, por exemplo, de professores de diferentes bem como as atividades e experiências de construção do
séries, disciplina ou cursos; de supervisores e orientadores; conhecimento consideradas mais adequadas para a conse-
de diretores; de alunos. Na concepção participativa está cução dos objetivos estabelecidos;
4 Por Antonia Osima Lopes

11
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

• Prever e escolher os recursos de ensino mais ade- A mediação na sala de aula é também pragmática, pois
quados para estimular a participação dos alunos nas ativi- pretende que o aluno aprenda de modo imediato. Nos dois
dades de aprendizagem; casos, em que mediar é agir de modo pragmático, todo
• E prever os procedimentos de avaliação mais con- conflito pode ser “solucionado”, e o aluno pode “aprender”.
dizentes com os objetivos propostos. Para compreendermos a mediação na sala de aula, é
O planejamento didático também é um processo que preciso, em primeiro lugar, estabelecermos que o estudan-
envolve operações mentais, como: analisar, refletir, definir, te está sempre no plano do imediato, e o professor está,
selecionar, estruturar, distribuir ao longo do tempo, e pre- ou deveria estar, no plano do mediato. Assim, entre eles
ver formas de agir e organizar. O processo de planejamen- se estabelece uma mediação que visa, como já o dissemos,
to da ação docente é o plano didático. Em geral, o plano a superação do imediato no mediato. Em outras palavras,
didático assume a forma de um documento escrito, pois o estudante deve superar a sua compreensão imediata e
é o registro das conclusões do processo de previsão das ascender a outra que é mediata. E isso só pode ocorrer pela
ação do professor que medeia com o aluno, estabelecendo
atividades docentes e discentes.
com ele uma tensão que implica negar o seu cotidiano.
Outro aspecto a ser lembrado é que o plano é ape-
Por outro lado, o aluno tentará trazer o professor para o
nas um roteiro, um instrumento de referência e, como tal,
cotidiano vivido por ele, aluno, negando, assim, o conheci-
é abreviado, esquemático, sem colorido e aparentemente
mento veiculado pelo professor. Nessa luta de contrários –
sem vida. Compete ao professor que o confeccionou dar- professor e aluno, conhecimento sistematizado pela huma-
-lhe vida, relevo e colorido no ato de sua execução, im- nidade e experiência cotidiana – é que se dá a mediação;
pregnando-o de sua personalidade e entusiasmo, enrique- e ela ocorre nos dois sentidos, tanto do professor para o
cendo-o com sua habilidade e expressividade.5 aluno quanto do a É uma luta de contrários.
Esse modo de compreender a mediação não aceita a
A sala de aula e a aprendizagem ideia do professor mediador do conhecimento, tampouco
a noção de professor facilitador da aprendizagem.
Quando entendida na perspectiva do senso comum, Essas duas acepções são equivocadas, porque, em pri-
a relação ensino-aprendizagem é linear; assim, quando há meiro lugar, o professor não é o único mediador, pois o
ensino, deve necessariamente haver aprendizagem. aluno também medeia, e, em segundo lugar, a mediação
Ao inverso, quando não houve aprendizagem, não não se estabelece com o conhecimento e sim entre o aluno
houve ensino. Desse modo, o ensino é subordinado à e o professor. Trata-se de uma automediação no segundo
aprendizagem. Essa subordinação é expressa em concep- sentido atribuído por Mészáros; ou seja, a mediação entre
ções que compreendem o professor como facilitador da o homem e os outros homens: aluno para o professor. Em
aprendizagem, ou ainda como mediador do conhecimento. outros termos, a mediação, na escola, é um processo que
Aqui a proposta é discutir referências teóricas e me- ocorre a sala de aula e promove a superação do imediato
todológicas que possam revelar uma concepção não linear no mediato por meio de uma tensão dialética entre pólos
da relação em foco, bem como criticar as concepções de opostos.
professor facilitador e professor mediador. A relação entre o homem e a natureza é ‘automediado-
A mediação no campo educacional é geralmente con- ra’ num duplo sentido.
siderada como o produto de uma relação entre dois ter- Primeiro, porque é a natureza que propicia a mediação
mos distintos que, por meio dela podem ser homogenei- entre si mesma e o homem; segundo, porque a própria ativi-
zados. Essa homogeneização elimina a diferença entre eles dade mediadora é apenas um atributo do homem, localiza-
e, por conseguinte, a possibilidade de conflito entre am- do numa parte específica da natureza. Assim, na atividade
produtiva, sob o primeiro desses dois aspectos ontológicos a
bos. Portanto, quando se compreende a mediação como
natureza faz a mediação entre si mesma e a natureza; e, sob
o resultado, como um produto, a necessária relação entre
o segundo aspecto ontológico - em virtude do fato de ser a
dois termos se reduz à sua soma, o que resulta na sua anu-
atividade produtiva inerentemente social - o homem faz a
lação mútua, levando-os ao equilíbrio. Essa ideia concebe mediação ente si mesmo e os demais homens. (Mészáros,
a mediação como o resultado da aproximação entre dois 1981, p.77-78)
termos que, embora distintos no início, quando totalmente Sendo a mediação na sala de aula uma automediação,
separados, tendem a igualar-se à medida que se aproxi- não podemos abrir mão da relação direta entre professor
mam um do outro. e aluno. Desse modo, não podemos substituí-la por fal-
Em estudos desse contexto discute-se o conceito de sos mediadores, como por exemplo, a exibição de filmes
mediação local, indicando que mediar implica solucionar quando a temática não corresponde àquela tratada pelo
conflitos por meio de ações educativas. Assim, a media- professor, ou a execução aleatório de atividades de ensi-
ção restringe-se a uma ação pragmática, circunscrita a uma no. Os professores que se utilizam com frequência desses
situação de conflito. Este entendimento da mediação não recursos nutrem a esperança de que essas práticas sejam
é muito distante daquele em que ela é compreendida na capazes de estabelecer mediações que eles, os professores,
situação da sala de aula. talvez não se sintam seguros para desenvolver. Alguns pro-
fessores precisam ser lembrados de que sala de aula não é
5 Fonte: www.educador.brasilescola.uol.com.br – Por Eliane da Costa
Bruini
sala de cinema nem oficina de terapia ocupacional.

12
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Os professores que se utilizam desses artifícios o fazem na vida cotidiana. Esse equívoco ocorre, por exemplo, quando o
muitas vezes no intuito de facilitar a aprendizagem; porém, professor de História, ao abordar a Revolução francesa, preocu-
sendo a relação entre o ensino e a aprendizagem uma luta pa-se com detalhes da vida privada de Maria Antonieta ou com a
de contrários, não há como facilitá-la. Ao inverso, o profes- moda ditada por Luís XV. Ainda exemplificando, o mesmo pode
sor deve dificultar a vida cotidiana do aluno inserindo nela ocorrer com o professor de Literatura que expõe aos alunos os
o conhecimento, e, dessa forma, negando-a. Pois, na vida períodos literários e seus principais expoentes sem apresentar as
cotidiana não há conhecimento e sim experiência. Desse relações entre os autores, bem como entre os períodos literários,
modo, não há como facilitar o que é difícil. Aprender é di- ocultando assim a historicidade inerente à literatura.
fícil. será sempre necessário que ela [criança] se fatigue a A erudição balofa pode também estar presente nas
fim de aprender e que se obrigue a privações e limitações disciplinas ligadas às ciências naturais; ela tem levado os
de movimento físico isto é que se submeta a um tirocínio professores a acreditar que quanto maior a quantidade de
psicofísico. Deve-se convencer a muita gente que o estudo informações mais os alunos sabem.
é também um trabalho e muito fatigante com um tirocínio A segunda atividade desenvolvida pelo professor é a
organização, ou seja, diante da seleção feita a partir de um
particular próprio, não só muscular-nervoso mas intelectual:
tema é preciso organizar esta seleção para apresentá-la
é um processo de adaptação, é um hábito adquirido com
aos alunos. Desde o momento em que fazemos a seleção
esforço, aborrecimento e mesmo sofrimento. (Gramsci, 1985,
já não podemos falar mais em temas; devemos preocupar-
p. 89)
-nos com os conceitos que os constituem. Agora o que o
Como assinala Gramsci, a aprendizagem depende do professor deve fazer é organizar os conceitos e as relações
esforço pessoal de cada estudante. É claro que o professor entre eles. Esse processo, de acordo com Lefebvre (1983),
sempre poderá intervir, de modo direto, neste processo, implica dois movimentos: a retrospecção e a prospecção.
auxiliando o aluno. Ele deve esforçar-se para que os estu- A retrospecção permite que o estudante compreenda
dantes aprendam, mas não pode minimizar nem esconder o processo de formação e desenvolvimento do conceito
as dificuldades inerentes à aprendizagem. abordado e a prospecção possibilita o entendimento do
Quando se compreende a relação ensino-aprendiza- estado atual do conceito a partir das relações que o concei-
gem na sala de aula como mediação, o ensino e aprendi- to estudado estabelece com outros, tanto com aqueles que
zagem são opostos entre si e se relacionam por meio de o corroboram quanto com os que a ele se opõem. A pros-
uma tensão dialética. Desse modo, esses termos, apesar de pecção do conceito permite o estabelecimento de relações
negarem-se mutuamente, se completam, mas, como já o interdisciplinares, a que temos chamado de interdisciplina-
dissemos, essa unidade não se estabelece de modo linear. ridade conceitual para distingui-la daquela que é corrente
Neste artigo, conceituaremos primeiro o ensino e, pela na escola, a interdisciplinaridade temática. Não podemos
sua negação, conceituaremos aprendizagem. Sabemos da ensinar por meio do tema, devemos fazê-lo por meio do
dificuldade de conceituar esses dois termos, pois de modo conceito. Evitamos o uso da expressão conteúdo de ensino
geral os estudiosos da área de educação e os professores, em virtude da sua imprecisão. Quando a organização do
talvez por influência das pedagogias contemporâneas, não ensino é baseada nos processos de retrospecção e pros-
o fazem; pois preocupam-se quase exclusivamente com pecção de conceitos, o fundamental são as relações que se
o “como ensinar”, ou mais precisamente como facilitar a estabelecem nos dois processos. No primeiro, elas dizem
aprendizagem dos alunos. respeito ao desenvolvimento do conceito, à oposição entre
A ideia principal que informa o nosso conceito de en- a sua origem e o estado atual, no segundo, elas tratam dos
sino é a de que ele expressa a relação que o professor es- vínculos entre conceitos. Assim, podemos afirmar que en-
tabelece com o conhecimento produzido e sistematizado sinar é fazer relações. Por isso, ensinar é tão difícil quanto
pela humanidade. Assim, o ensino constitui-se de três ativi- aprender.
dades distintas a serem desenvolvidas pelo professor. A terceira tarefa do professor é transmitir aos alunos
A primeira consiste em, diante de um tema, selecionar aquilo que foi previamente selecionado e organizado. Des-
sa forma, a transmissão é a única etapa do processo de
o que deve ser apresentado aos alunos; por exemplo, no
ensino que ocorre efetivamente na sala de aula. Em que
tema “Revolução Francesa”, próprio da História, selecionar
pese o preconceito sobre a palavra transmissão, não abri-
o que é mais importante ensinar aos alunos da 5ª série (no-
mos mão dela, porque é isso o que o professor faz na sala
menclatura brasileira). Já o professor do 1º ano do Ensino
de aula. É na transmissão do conhecimento que ocorrem as
Médio deve defrontar-se com a mesma pergunta; a mesma
mediações entre professores e alunos.
situação se coloca ao professor universitário encarregado
Se o ensino é a relação que o professor estabelece com
de abordá-lo. Dessa forma, o docente deve preocupar-se
o conhecimento, a aprendizagem ao contrário é a relação
em compatibilizar a seleção do conhecimento a ser ensina- que o estudante estabelece com o conhecimento e, por-
do com a possibilidade de aprendizagem dos alunos. Nos tanto, é nela que a mediação se efetiva: pela superação do
dias de hoje, é bastante comum que a seleção seja abran- imediato no mediato.
gente; e isso pode levar os professores a apresentarem aos Não é possível discutir a aprendizagem como fizemos
seus alunos informações supérfluas, que, quando confun- com o ensino, porque ela é de cunho singular e, dessa for-
didas com conhecimento, não lhes permitem fazer as sínte- ma, ocorre de modo diverso em cada estudante. A discus-
ses necessárias para a superação do cotidiano, produzindo são da aprendizagem na perspectiva deste texto, ou seja,
neles uma “erudição balofa” que pode ao contrário encerrá-los

13
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

em oposição ao ensino, ainda deve ser elaborada e, certa- A questão central é que o aluno aprenda a aprender
mente, não poderá sê-lo pela psicologia, mas sim pela filo- habilidades específicas, definidas como competências, que
sofia. A única possibilidade, ainda que remota no âmbito da são previamente definidas nos programas de aprendizagem
psicologia, estaria no desenvolvimento do pensamento de em sintonia com as demandas do mercado de trabalho.
Vigotski, desde que compreendido numa perspectiva filosó- Assim, verifica-se que a expressão “aprender a apren-
fica, pois a psicologia como ciência tem por objeto o com- der” do final do século XIX e início do século XX retorna
portamento, e aprender não é o mesmo que comportar-se, em outras bases. Não mais centrada no sujeito psicológico,
em que pese o esforço das pedagogias contemporâneas em mas no sujeito produtivo, na perspectiva neoliberal. Articu-
desenvolver esta associação. Do nosso ponto de vista, o que la-se ao aprender fazer da segunda metade do século XX.
a psicologia, no seu estado atual, pode fazer é controlar a (MARTINS, 2008).
aprendizagem, o que é diferente de compreendê-la. Sobre essa tendência, Saviani (2007), referindo-se ao
Quando a relação ensino-aprendizagem é tomada na final do século XX, registra que os movimentos em prol da
perspectiva da mediação no seu sentido original, ao mes- educação popular perderam o vigor.
mo tempo em que não há uma relação direta entre en- Durante a década de 1990, o autor destaca os movi-
sino e aprendizagem, não há também uma desvinculação mentos da Escola Cidadã, vinculados ao Instituto Paulo
desses dois processos. Ou seja, para haver aprendizagem, Freire; a Escola Plural em Belo Horizonte, inspirados no
necessariamente deve haver ensino. Relatório Jacques Delors, publicado com título “Educação:
Porém, eles não ocorrem de modo simultâneo. Dessa um tesouro a descobrir”, que desenvolve propostas na
forma, o professor pode desenvolver o ensino – selecionar, perspectiva do aprender a aprender, aprender a conhecer,
organizar e transmitir o conhecimento – e o aluno pode aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a ser.
não aprender. Para que o aluno aprenda, ele precisa desen- Além disso, Saviani (2007) escreve que o lema “apren-
volver sua síntese singular do conhecimento transmitido, der a aprender” está ligado às ideias escolanovistas, mas
e isso se dá pelo confronto, por meio da negação mútua, na perspectiva da constante atualização para ampliar as
desse conhecimento com a vida cotidiana do aluno. Como possibilidades de empregabilidade. Com efeito, trata-se
da flexibilidade do trabalhador para ocupar vários tipos de
cada aluno tem um cotidiano, e o conhecimento é aprendi-
trabalho, o que exige educação ao longo da vida para res-
do por meio da síntese já explicitada, o conhecimento não
ponder aos desafios das mudanças constantes da reorga-
pode ser aprendido igualmente por todos os alunos, em-
nização dos processos produtivos, com inserção de novas
bora aquele transmitido pelo professor seja único. Assim,
tecnologias e de novos processos de gestão das empresas.
a relação ensino-aprendizagem na perspectiva aqui apre-
Refletindo sobre esse momento histórico, Santos (2005)
sentada expressa o vínculo dialético entre unidade e di-
aponta um novo modo de exigência da organização do tra-
versidade. Por isso, o conhecimento transmitido pelo pro-
balho, em que além da força produtiva, do tempo para a
fessor pode ser uno e aquele aprendido pelo aluno pode
produção, há especulação das capacidades cognitivas dos
ser diverso. A unidade e a diversidade são opostos que se
trabalhadores para a melhoria do processo de produção.
completam, ou e é próprio do humano.6 Tais exigências solicitam capacidades de adaptabilida-
de, flexibilidade, iniciativa e inovação para a melhoria dos
A didática e o docente resultados da cadeia de produção.
Estas capacidades atrelam-se a um tipo de cognição e
Tendência da didática nos processos de formação de
aprendizagem para o imprevisível, para a solução de pro-
professores no momento atual
blemas, planejar, tomar decisões, uso estratégico dos re-
cursos, regulação do processo, relacionados ao aprender
Numa primeira aproximação com os dados da pes-
quisa, podemos dizer que enquanto no período de 1985 a a aprender.
1988 a didática trouxe como ênfase a dimensão política do Nesse sentido, entendemos que a perda de espaço da
ato pedagógico; no período de 1989 a 1993 a área trouxe Didática, numa dimensão mais ampla, e a valorização das
para o centro das discussões a questão da organização do didáticas específicas e metodologias específicas das áreas
trabalho na escola e no período de 1994 a 2000 focalizou a de conhecimento nas atuais propostas de formação de
questão da produção e sistematização coletiva de conheci- professores expressam o novo momento do capitalismo
mento (MARTINS, 1998). no qual “as novas formas de exploração e controle da força
Nesse início de século, esboça-se um quarto momen- de trabalho exigem um novo tipo de trabalhador, uma vez
to caracterizado pela ênfase na aprendizagem: “aprender a que a produtividade repousa cada vez mais na utilização
aprender”, que tem sua centralidade no aluno como sujeito, do trabalho complexo” (SANTOS, 2005, p.42).
não mais como um ser historicamente situado, portador de Ainda que os indicadores sejam desfavoráveis para a
um conhecimento que adquire na prática laboral, mas um área, ampliar a compreensão desse momento da didática
sujeito intelectualmente ativo, criativo, produtivo, capaz de é o nosso desafio. Auscultar e sistematizar os processos de
dominar os processos de aprender (MARTINS, 2004). formação de professores e o lugar da didática no conjunto
dessas ações.7
6 Fonte: Revista Lusófona de Educação/ Texto adaptado de José Luís
Vieira de Almeida e Teresa Maria Grubisich 7 Texto adaptado de Pura Lúcia Oliver Martin; Joana Paulin Romanowski

14
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Quanto a organização do ensino veremos abaixo os Uma primeira aproximação com os dados revelam que
entraves que a educação infantil tem enfrentado em busca as instituições de educação superior estão em processo de
de maiores investimentos e valorização deste nível de en- alteração de suas propostas de cursos de licenciaturas, tendo
sino, por se tratar da primeira etapa que o indivíduo tem em vista as determinações legais do Parecer 09/2001 e Re-
com as instituições de ensino, a educação infantil deveria soluções 01/2002 e 02/2002, aprovados pelos Conselho Na-
ser inclusa no ensino obrigatório previsto na Constituição cional de Educação. Há um movimento que busca atender à
Federal de 1988. Será abordada também a significativa nova proposta para os cursos de formação de professores não
melhoria ao atendimento do ensino fundamental segunda atrelada ao bacharelado com iniciativas dos seus agentes, que
etapa da educação básica e de acordo com a Lei 9394/96, vão desde a criação de uma coordenação geral para os cursos
em seu artigo nº 32 obrigatório, e gratuito com duração de Licenciaturas, fóruns de Licenciaturas até simples ajustes e
de nove anos e matrícula a partir dos seis anos de idade, redistribuição de carga horária das disciplinas.
levando em consideração o antigo Fundo de Valorização Uma das universidades particulares, aqui identificada
do Ensino Fundamental (FUNDEF), e veremos também so- pela letra A, por exemplo, criou uma coordenação geral
bre a educação de jovens e adultos (EJA), um programa do dos cursos de Licenciaturas, que tem um papel articulador
governo federal destinado a erradicar o analfabetismo no nas discussões e proposições para esses cursos. A coor-
Brasil, pois são inúmeros os esforços nesse sentido, atual- denadora das Licenciaturas da universidade A informa que
mente o governo tem investido no programa Brasil Alfabe- das 800 horas regulamentadas para estágios, 400 são dis-
tizado (educação de jovens e adultos), programa este que tribuídas durante o curso, enquanto as outras 400 horas
pode ser desenvolvido em parcerias com instituições não são destinadas ao estágio supervisionado.
governamentais, além, das secretarias estaduais e munici- Nas palavras da coordenadora: Em média, 10% de
pais de educação. cada uma das disciplinas devem articular suas disciplinas
com prática. Quando ele aprende morfologia, por exem-
Prioridades estabelecidas para a formação dos plo, de que forma essa aprendizagem é aplicada na prática.
professores nos cursos de licenciaturas (...) Também temos grupos de estudo interdisciplinar onde
nossos alunos são levados à reflexão.
Para compreender a tendência atual da formação de
Observamos uma iniciativa de trabalhar a relação teo-
professores e o lugar da didática nessa formação, traba-
ria e prática ao longo do curso e no interior de cada dis-
lhando com a concepção da teoria como expressão de uma
ciplina que compõe o currículo. Além disso, o grupo está
determinada prática e não de qualquer prática, desenvol-
buscando uma integração das disciplinas de fundamentos
vemos uma pesquisa tomando como campo de investi-
comum a todas as licenciaturas, já que tais disciplinas eram
gação os cursos de licenciatura de cinco universidades de
trabalhadas de forma isolada e em tempos diferentes de
grande porte do estado do Paraná.
acordo com o colegiado de cada curso.
Por meio de análise documental e entrevistas semies-
Com relação à proposta de práticas de ensino e de
truturadas, numa abordagem qualitativa de pesquisa bus-
estágio, percebemos que a instituição busca manter essa
camos analisar as tensões e prioridades dessas universida-
des nos processos de formação de professores. integração, articulando teoria e prática entre as disciplinas
Assim, nosso estudo apoia-se no entendimento de que de fundamentos e a ação do aluno na escola.
a prática não é dirigida pela teoria, mas a teoria vai expres- Há uma preocupação de estabelecer a estreita relação
sar a ação prática dos sujeitos. São as formas de agir que entre as disciplinas teóricas com as didáticas específicas e
vão determinar as formas de pensar dos homens. metodologias específicas por área de conhecimento.
“A teoria pensa e compreende a prática sobre as coi- Contudo numa perspectiva de aplicação prática: “de
sas, não a coisa. Daí, a sua única função é indicar caminhos que forma a aprendizagem de determinado conteúdo é
possíveis, nunca governar a prática.” (BRUNO 1989, p.18). aplicado na prática...”.
A base do conhecimento é a ação prática que os homens Já o contato direto com a escola – o estágio – mantém
realizam através de relações sociais, mediante instituições. o formato usual dessas práticas, qual seja: a observação, a
O pressuposto básico é que “o homem não reflete sobre participação em sala de aula junto ao professor regente e
o mundo, mas reflete a sua prática sobre o mundo” (BER- finalmente a regência. Esses estágios ocorrem em escolas
NARDO, 1977, v. 1, p.86). conveniadas e preferencialmente públicas.
Dessa forma, “(...) o conhecimento é sempre o conhe- Com efeito, a criação de uma coordenação geral das
cimento de uma prática, nunca da realidade natural ou so- licenciaturas, forma encontrada pela instituição A para
cial” (SANTOS 1992, p.29). reorganizar as licenciaturas tendo em vista as novas exi-
Desse ponto de vista, buscamos analisar os cursos de gências do CNE, tem favorecido alguns avanços na busca
formação de professores procurando entender à tendência da articulação teoria e prática. Os agentes envolvidos ten-
da sua organização. Procedemos a um mapeamento das pro- tam minimizar a dicotomia teoria-prática existentes nessa
postas curriculares dos cursos para, em seguida, buscar junto formação. Contudo, observa-se que não se altera a lógica
aos agentes envolvidos no planejamento e desenvolvimento da aplicação prática e a valorização do como aplicar esse
dessas propostas as formas e práticas dessa formação. conhecimento na prática.

15
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Já na Universidade B criou-se o espaço do Fórum de Li- A coordenadora explica:


cenciaturas para discutir as novas exigências do CNE, bus- Os colegiados foram achando suas peculiaridades. Você
cando a observância das horas exigidas. Nesse espaço os tem matéria de instrumentação no ensino de matemática,
professores discutem seus projetos de curso, as disciplinas matérias como laboratório de física e ciências e tem ensino
que integram o currículo de cada licenciatura e a integra- de biologia. O mais bonito foi que eles foram chegando, sem
ção entre elas. Observa-se uma preocupação de adequar imposição, a certos denominadores comuns. Eles estudam
as horas exigidas na nova legislação e também de viabili- toda a legislação pertinente à educação, os PCNs e fazem
zar a inserção do aluno nas escolas onde irão atuar desde uma ligação com a escola básica. Essa disciplina envolve to-
o primeiro semestre do curso. Essa busca de inserção dos dos os professores da série. (...) era sempre o que se quis:
alunos desde o início do curso tem sido a marca dessa ins- que as licenciaturas pensassem sempre em educação básica
tituição. Na fala de um coordenador de curso: e em ensino. Não se bacharelassem.
O aluno tem a formação pedagógica desde o primeiro Com relação aos estágios, estes acontecem da metade
período. Ele sempre vai ter algo relacionado com a forma-
do curso para o final e, segundo a coordenadora, alguns
ção pedagógica e a escola. Todo um eixo que é ministrado
cursos estão indo muito bem, enquanto outros têm encon-
pelo pessoal da educação e depois tem outra vertente que é
trado muitas dificuldades. Nas palavras dela:
ministrada pelos próprios professores da área específica com
Isso é um calcanhar de Aquiles. (...) o estágio é da segun-
experiência na área da escola e da licenciatura.
Observa-se que essa solução encontrada pelo grupos da metade do curso para frente. Então em alguns cursos está
de professores e coordenadores de curso discutidas no Fó- indo muito bem e em alguns cursos está indo muito mal. (...)
rum de Licenciaturas mantido pela instituição constitui um Pelo pouco que eu sei a universidade já tem uma caminha-
avanço na busca de articulação teoria-prática. da de conquistas com a escola. (...) Primeiro a universidade
Contudo, a ênfase da formação pedagógica continua conquistou as escolas e depois foi para dentro das escolas.
no final do curso, o estágio a partir do 5º Período. A base Observa-se uma preocupação e um movimento no
epistemológica da organização desses cursos mantém a sentido de aproximar os professores em formação com
concepção da teoria como guia da ação prática. as escolas de educação básica, e cada curso a seu modo
Já nas instituições públicas, as alterações ficam a cargo vai buscando essa aproximação. No entanto a prática ali
dos departamentos e é mais evidente a manutenção da ci- desenvolvida não avança no sentido de promover uma
são: pedagógico e conteúdos específicos, teoria e prática. reflexão a partir das iniciativas dos professores na busca
Uma das universidade públicas, aqui identificada pela le- de equacionar os problemas que enfrentam nesse espaço
tra c, embora tenha criado uma coordenação geral para os escolar. Além disso, a manutenção dos estágios no final
cursos de licenciaturas, manifesta dificuldade de viabilizar do curso indica a manutenção da lógica das escolas como
a integração almejada. Assim ela se expressa: espaço de aplicação dos conteúdos das disciplinas teóricas.
Convocamos o CEP, convidamos pessoas das licenciatu- Dentre as universidades públicas pesquisadas, a Uni-
ras, convidamos coordenadores, convocamos também o pes- versidade D é a que deixa clara a manutenção do esquema
soal da educação, o pessoal de métodos, chamamos todas as três mais um. A maioria dos coordenadores de cursos afir-
pessoas e algumas pessoas ficaram. mou que para atender a resolução foram criadas discipli-
Porém, outras saíram do processo dizendo: “essa lei não nas práticas e ampliada a carga horária de estágio nos dois
vai pegar”, é o que ocorre sempre por aí. últimos anos. A coordenadora do curso de Letras aponta
Não obstante essas dificuldades, observamos que a que a carga horária das disciplinas teóricas foi reduzida em
instituição faz um movimento para articular teoria e prá- função do aumento das horas de estágio.
tica, inserindo, nas disciplinas de conteúdo específico da A maioria regista que o currículo foi alterado e as mu-
área, uma articulação com a prática de ensino daquela danças estão em processo de implantação a partir de 2009.
área. A coordenadora explica: Na fala de um coordenador fica clara a preocupação
Quanto àquele intem, a prática como componente cur- com os fundamentos teóricos nos anos iniciais para pos-
ricular, existem mil e uma interpretações de como fazer aqui terior formação pedagógica, implicando opção do aluno
(...) toda disciplina nós sabemos que tem uma dimensão prá- após dois anos e meio de curso. Assim ele se expressa:
tica, tudo isso é perfeito, tudo bem, tudo certo. Você vai me Aqui na Universidade nós oferecemos duas habilitações:
convencer que vai criar dentro da disciplina (...) uma ponte bacharelado e licenciatura... como uma recomendação da
com a educação básica. própria estrutura curricular tivemos de pensar nos núcleos
No entanto, não se pode ter garantia de que o profes- de formação de base e depois nos núcleos de formação es-
sor individualmente vá fazer isso, embora seja o desejável. pecífica. Os dois primeiros anos são comuns para qualquer
Então, a comissão achou por bem criar uma disciplina de uma das habilitações e na passagem da segunda para a ter-
1ª a 4ª séries denominada disciplina articuladora, que con- ceira série o aluno faz a opção pela sua habilitação – bacha-
templa 400 horas. Esta deverá estar articulada à escola de relado ou licenciatura.
educação básica e ficou a cargo da cada colegiado de cur- Não obstante essa lógica dos três mais um, há uma
so a definição da ementa e sua forma de realização. Cada tentativa de distribuir a prática, que antes era concentrada
curso buscou a articulação com a prática das escolas, res- em dois semestres de estágio no final do curso, ao longo
peitando as peculiaridades de cada área do conhecimento. do curso. Nas palavras do coordenador:

16
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Com o aumento da carga horária, procuramos contem- o esclarecimento do fenômeno educativo no contexto his-
plar às 800 horas e distribuir melhor a prática ao longo do tórico-social; a formação técnico-prática visando a prepa-
curso. Tanto é que a oficina 1 e 2 surge com essa finalidade. ração profissional específica para a docência, incluindo a
Ela tem um caráter prático que é de criar a identidade do Didática as metodologias específicas das matérias, a Psico-
estudante com a área de atuação. (...) Nós dividimos os es- logia da Educação, a pesquisa educacional e outras.
tágios em estágio I e 2 que é de formação mais conceitual; o A organização dos conteúdos da formação do profes-
estágio 3 que tem a finalidade da regência de classe, tem a sor em aspectos teóricos e práticos de modo algum signi-
finalidade de integrar teoria e prática na licenciatura. fica considera-los isoladamente. São aspectos que devem
Observa-se que a tentativa de tratar da prática ao lon- ser articulados. As disciplinas teórico-científicas são neces-
go do curso mantém a lógica do esquema três mais um sariamente referidas a prática escolar, de modo que os es-
garantindo a articulação teoria e prática no último estágio tudos específicos realizados no âmbito da formação acadê-
do curso. mica sejam relacionados com os de formação pedagógica
Também a Universidade pública e, para atender as 800 que tratam das finalidades da educação e dos condicio-
horas de estágio regulamentadas pelo CNE, evidencia que nantes históricos, sociais e políticos da escola. Do mesmo
alguns cursos tendem a aumentar a quantidade de disci- modo, os conteúdos das disciplinas específicas precisam
plinas que promovem a prática dos alunos, enquanto ou- ligar-se às suas exigências metodológicas. As disciplinas de
tros procuram desenvolver no interior das disciplinas de formação teórico-prática não se reduzem ao mero domínio
conteúdos específicos algum tipo de relação com a prática de técnicas e regras, mas implicam também os aspectos
de ensino. Há uma ênfase na formação teórica sólida para teóricos, ao mesmo tempo que fornecem à teoria os pro-
garantir uma prática consequente. blemas e desafios da prática. A formação profissional do
Nas palavras de uma coordenadora: professor implica, pois, uma contínua interpenetração en-
Nós temos 240 horas de estágio de docência e 240 horas tre teoria e prática, a teoria vinculada aos problemas reais
de estágio na função propriamente dita do pedagogo nas postos pela experiência prática orientada teoricamente.
dimensões de organizações de trabalhos pedagógicos de Nesse entendimento, a Didática se caracteriza como
passes escolares e não escolares e temos outras dimensões
mediação entre as bases teórico-científicas da educação
que é a questão da pesquisa (...) o pedagogo pesquisador. (...)
escolar e a prática docente. Ela opera como que uma pon-
Além desses estágios que dá um total de 480 horas, nós te-
te entre o “o que” e o “como” do processo pedagógico
mos algumas disciplinas facilmente ligadas à prática... Não
escolar. Para isso recorre às contribuições das ciências au-
abrimos mão de uma sólida formação teórica. Essa lógica
xiliares da Educação e das próprias metodologias específi-
está presente na totalidade dos cursos e os estágios concen-
cas. É, pois, uma matéria de estudo que integra e articula
tram-se no final dos cursos. Observa-se que as ações para
conhecimentos teóricos e práticos obtidos nas disciplinas
adequar os cursos às novas normas ficam a cargo dos co-
de formação acadêmica, formação pedagógica e formação
legiados de cursos e não há um espaço, uma coordenação
técnico-prática, provendo o que é comum, básico e indis-
geral onde essas discussões possam ocorrer, tendo em vista
pensável para o ensino de todas as demais disciplinas de
uma integração entre os cursos.
conteúdo.
Com efeito, as discussões nesses espaços – fóruns,
A formação profissional para o magistério requer, as-
coordenações de Licenciaturas – indicadas pelos entrevis-
sim, uma sólida formação teórico-prática. Muitas pessoas
tados, as formas como encaminham a ampliação de tempo
acreditam que o desempenho satisfatório do professor
de estágio na determinação das 800 horas, nos possibili-
na sala de aula depende de vocação natural ou somente
tam perceber a estrutura do pensamento educacional que
da experiência prática, descartando-se a teoria. É verdade
está na base da organização desses cursos e a forma como
que muitos que muitos professores manifestam especial
concebem e encaminham a articulação teoria e prática na
tendência e gosto pela profissão, assim como se sabe que
formação do professor.
mais tempo de experiência ajuda no desempenho profis-
Nesse sentido, percebemos que ainda é marcante a
sional. Entretanto, o domínio das bases teórico-científicas
concepção de que uma formação teórica sólida garante
e técnicas, e sua articulação com as exigências concretas do
uma prática consequente. Os encaminhamentos, com raras
ensino, permitem maior segurança profissional, de modo
exceções, invariavelmente situam o momento da prática
que o docente ganhe base para pensar sua prática e apri-
nos anos finais do curso, antecedida pela formação teórica.
more sempre mais a qualidade do seu trabalho.8
A Didática e a formação profissional do professor
A Didática e o Trabalho Docente
A formação do professor abrange, pois, duas dimen-
Como vimos anteriormente à didática estuda o proces-
sões: a formação teórico-científica, incluindo a formação
so de ensino no seu conjunto, no qual os objetivos, con-
acadêmica específica nas disciplinas em que o docente
teúdos fazem parte, de modo a criar condições que garan-
vai especializar-se e a formação pedagógica, que envol-
tam uma aprendizagem significativa dos alunos. Ela ajuda o
ve os conhecimentos da Filosofia, Sociologia, História da
Educação e da própria Pedagogia que contribuem para 8 Fonte: www.pedagogiadidatica.blogspot.com.br

17
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

professor na direção, orientação das tarefas do ensino e da uma aprendizagem significativa. No entanto para que o
aprendizagem, dando a ele uma segurança profissional. Se- professor atinja efetivamente seus objetivos, é preciso que
gundo Libâneo (1994), o trabalho docente também chamado ele saiba realizar vários processos didáticos coordenados
de atividade pedagógica tem como objetivos primordiais: entre si, tais como o planejamento, a direção do ensino da
• Assegurar aos alunos o domínio mais seguro e du- aprendizagem e da avaliação (LIBÂNEO, 1994).
radouro possível dos conhecimentos científicos;
• Criar as condições e os meios para que os alunos A Profissão Docente e sua Repercussão Social
desenvolvam capacidades e habilidades intelectuais de Segundo Libâneo (1994) o trabalho docente é a parte
modo que dominem métodos de estudo e de trabalho in- integrante do processo educativo mais global pelo qual os
telectual visando a sua autonomia no processo de aprendi- membros da sociedade são preparados para a participação
zagem e independência de pensamento; da vida social. Com essas palavras Libâneo deixa bem claro
• Orientar as tarefas de ensino para objetivo educa- o importante e essencial papel do professor na inserção e
tivo de formação da personalidade, isto é, ajudar os alunos construção social de cada individuo em formação. O edu-
a escolherem um caminho na vida, a terem atitudes e con- cador deve ter como principal e fundamental compromisso
vicções que norteiem suas opções diante dos problemas e com a sociedade formar alunos que se tornem cidadãos
situações da vida real (LIBÂNEO, 1994, Pág. 71). ativos, críticos, reflexivos e participativos na vida social.
Além dos objetivos da disciplina e dos conteúdos, é O docente no processo de ensino e aprendizagem é a
fundamental que o professor tenha clareza das finalidades ponte de mediação entre o aluno em formação e o meio
que ele tem em mente, a atividade docente tem a ver dire- social no qual está inserido; uma vez que ele vai através de
tamente com “para que educar”, pois a educação se realiza instruções, conteúdos e métodos orientar aos seus alunos
numa sociedade que é formada por grupos sociais que tem a viver socialmente.    Sendo a educação um fenômeno
uma visão diferente das finalidades educativas. social necessário à existência e funcionamento de toda a
Para Libâneo (1994), a didática trata dos objetivos, sociedade, exige-se a todo instante do professor as com-
condições e meios de realização do processo de ensino, petências técnicas e teóricas para a transmissão desses
conhecimentos que são essenciais para a manutenção e
ligando meios pedagógico-didáticos a objetivos sócio-po-
progresso social.
líticos. Não há técnica pedagógica sem uma concepção
O processo educacional, notadamente os objetivos,
de homem e de sociedade, sem uma competência técnica
conteúdos do ensino e o trabalho do professor são regidos
para realiza-la educacionalmente, portanto o ensino deve
por uma série de exigências da sociedade, ao passo que a
ser planejado e ter propósitos claros sobre suas finalidades,
sociedade reclama da educação a adequação de todos os
preparando os alunos para viverem em sociedade.
componentes do ensino aos seus anseios e necessidades.
É papel de o professor planejar a aula, selecionar, orga-
Porém a prática educativa não se restringe as exigências da
nizar os conteúdos de ensino, programar atividades, criar
vida em sociedade, mas também ao processo de promo-
condições favoráveis de estudo dentro da sala de aula, es- ver aos indivíduos os saberes e experiências culturais que
timular a curiosidade e criatividade dos alunos, ou seja, o o tornem aptos a atuar no meio social e transformá-lo em
professor dirige as atividades de aprendizagem dos alu- função das necessidades econômicas, sociais e políticas da
nos a fim de que estes se tornem sujeitos ativos da própria coletividade (LIBÂNEO, 1994 pág.17). O professor deve for-
aprendizagem. mar para a emancipação, reflexão, criticidade e atuação so-
Entretanto é necessário que haja uma interação mú- cial do indivíduo e não para a submissão ou o comodismo.
tua entre docentes e discentes, pois não há ensino se os Com este conteúdo podemos perceber o importante
alunos não desenvolverem suas capacidades e habilidades papel que a didática desempenha no processo de ensino
mentais. e aprendizagem. Como vimos ela proporciona os meios, as
Podemos dizer que o processo didático se baseia no condições pelos quais a prática educacional se concretiza.
conjunto de atividades do professor e dos alunos, sob a Ela orienta o trabalho do professor fazendo-o significati-
direção do professor, para que haja uma assimilação ati- vo para que possa guiar de forma competente, expressiva
va de conhecimentos e desenvolvimento das habilidades e coerente as práticas de ensino. Através dos componen-
dos alunos. Como diz Libâneo (1994), é necessário para o tes que constituem o processo de ensino, visa propiciar os
planejamento de ensino que o professor compreenda as meios para a atividade própria de cada aluno, busca ainda
relações entre educação escolar, os objetivos pedagógi- formá-los para serem indivíduos críticos, reflexivos capazes
cos e tenha um domínio seguro dos conteúdos ao qual de desenvolverem habilidades e capacidades intelectuais.9
ele leciona, sendo assim capaz de conhecer os programas
oficiais e adequá-los ás necessidades reais da escola e de Contrato Didático
seus alunos.
Um professor que aspira ter uma boa didática neces- Quais as obrigações mútuas, explícitas e implícitas que
sita aprender a cada dia como lidar com a subjetividade pais, alunos e professores exercem entre si? Elas são com-
do aluno, sua linguagem, suas percepções e sua prática de patíveis? Qual é a legitimidade e a eficácia das medidas de
ensino. Sem essas condições o professor será incapaz de
elaborar problemas, desafios, perguntas relacionadas com 9 Fonte: www.meuartigo.brasilescola.uol.com.br - Elieide Pereira dos
os conteúdos, pois essas são as condições para que haja Santos/Isleide Carvalho Batista/Mayane Leite da Silva Souza

18
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

que cada um deles acredita dispor? Essas questões surgem • Em casos de quebra das regras, o professor poderá
de forma crucial para a família e para os educadores de relembrar os alunos que aquela regra infringida, foi res-
uma “criança com dificuldade”, mas elas podem permane- saltada por eles, ou seja, eles estão indo contra o próprio
cer muito tempo ignoradas pelo restante da sociedade. discurso.
O conceito de contrato didático surgiu em 1980 duran- Esta é apenas mais uma ferramenta a ser usada neste
te uma enquete clínica e estatística com estudantes com complexo processo de ensino e aprendizagem, ferramenta
dificuldades em Matemática (1975-1980), realizada pelo esta que é o início deste processo que será construído ao
Centro de Observação e Pesquisas sobre o Ensino de Ma- decorrer de todas as aulas.10
temática (Corem, sigla em francês) da Universidade de Bor-
deaux, como parte de minhas pesquisas sobre situações Relação professor-aluno.
matemáticas.
Segundo Brousseau, o contrato didático é um conjun- A relação professor-aluno tem sido uma das principais
to recíproco de comportamentos esperados entre alunos e preocupações do contexto escolar. Nas práticas educativas, o
que se observa é que, por não se dar a devida atenção à te-
professor, sendo mediados pelo saber. Com isso, ele pode
mática em questão, muitas ações desenvolvidas no ambiente
ser entendido como um instrumento que auxilia na análise
escolar acabam por fracassar. Daí a importância de estabelecer
das relações professor, aluno e saber.
uma reflexão aprofundada sobre esse assunto, considerando
Como a maioria dos estudos acerca das práticas edu- a relevância de todos os aspectos que caracterizam a escola.
cacionais (metodologias de ensino, psicologia do ensino, Ao levar em consideração a escola como a única ins-
entre outras), foi visto que o ensino focado apenas no tituição demarcada, com a possibilidade da construção
conteúdo não contribui para uma formação completa dos sistematizada do conhecimento pelo aluno, foi de funda-
alunos, ou seja, é necessário analisar e compreender to- mental importância a criação de algumas possibilidades e
dos os componentes que constituem esta construção do condições favoráveis, nas quais alunos e professores pu-
saber. Um dos componentes cruciais para esta construção deram refletir sobre sua prática e passaram a atuar num
é a organização do ambiente escolar, disposto em regras clima mais condizente com a realidade de uma escola. Isso
e deveres de cada um dos integrantes deste processo de se deu porque, quanto mais instrumentalizados se sentiam
ensino e aprendizagem. melhor acontecia o desenvolvimento das ações realizadas
Contudo, existem regras que são explícitas (aque- por esses sujeitos. Assim, pôde-se perceber que é sempre
las que são explicitadas pelo professor) e implícitas (que imprescindível rever alguns aspectos da realidade atual da
acompanham a formação de cada indivíduo dentro do am- escola, no sentido de propiciar condições favoráveis, que
biente escolar). Com isso, o contrato didático vem tanto possibilitem o interesse de professores e alunos, para que
para explicitar as regras de modo a determinar a função de constantemente pensem sobre essa realidade. Só dessa
cada um dos participantes no processo de ensino e apren- forma poderão conquistar o reconhecimento e a valoriza-
ção de suas ações, por parte de toda a comunidade escolar.
dizagem quanto para ressaltar as regras que deveriam ser
Sabe-se que existe uma preocupação por parte de
conhecidas por todos.
muitos estudiosos e pesquisadores em contribuir para um
Mas como estabelecer este contrato didático sem que
trabalho mais rico e significativo nas escolas.
os alunos o vejam de forma unilateral, ou como uma impo-
Mas, ao se fazer uma análise do atual contexto escolar,
sição de seu professor? Afinal, se este contrato for estabe-
nota-se que ainda são muito perceptíveis no cotidiano da
lecido com um caráter autoritário, poderá ser um inimigo
escola, as reclamações e insatisfações por parte dos profes-
para a construção do saber, pois estará prejudicando a re-
sores em relação aos alunos e vice-versa. Ou seja, a relação
lação professor-aluno.
professor-aluno parece ser permeada por animosidades
Com isso, para melhor compreensão tanto das regras ou conflitos. Diante de tantos desconfortos pedagógicos,
quanto da importância do contrato didático, algo que houve alguns impasses: Entender ou repreender? Orientar
pode ser interessante é a construção deste contrato didáti- ou ignorar?
co com a participação dos alunos. A partir daí, tomou-se a decisão de olhar de frente o
A construção do contrato pode ser feita através de um problema e o aproveitar para um tema de pesquisa a ser
debate ou uma dinâmica, em que os alunos exporão as re- investigado: Como a relação professor-aluno pode contri-
gras que acham importantes para o bom funcionamento buir no processo ensino-aprendizagem?
das aulas. Estas ideias deverão ser mediadas pelo profes-
sor, para que não se perca o foco do que deve ser discutido O professor e sua prática
e para que seja dada a chance de todos falarem.
É possível retirar duas vantagens de um contrato didá- Muitos professores que atuam nas escolas não se dão
tico estabelecido desta forma: conta da importante dimensão que tem o seu papel na vida
• Valorização do saber do estudante, proporcionando dos alunos. Nesse sentido, um dos aspectos que se quer
uma maior interação entre ele e o professor, colaborando
para a participação dos alunos nas aulas. 10 Fonte: www.educador.brasilescola.uol.com.br/Simone Alves/Vânia
Barros

19
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

ressaltar neste artigo é a importância da formação do pro- geral, que ajudam a melhor realizar o trabalho e melhorar a
fessor e da compreensão que ele deve ter em relação a capacidade reflexiva sobre o que e como mudar (LIBÂNEO,
esse assunto. Pois, não há como acontecer na escola uma 2005, p. 76)
educação adequada às necessidades dos alunos sem con- Assim, se percebe que pensar sobre a formação de pro-
tar com o comprometimento ativo do professor no proces- fessores é conceber que o professor nunca está acabado e
so educativo. que os estudos teóricos e as pesquisas são fundamentais,
Entretanto, ao aproximar-se da figura de alguns pro- no sentido de que é por intermédio desses instrumentos
fessores, percebe-se que muitos, baseados no senso co- que os professores terão condições de analisar criticamen-
mum, acreditam que ser professor é apropriar-se de um te os contextos históricos, sociais, culturais e organizacio-
conteúdo e apresentá-lo aos alunos em sala de aula. nais, nos quais ocorrem as atividades docentes, podendo
Mudar essa realidade é necessário para que uma nova assim intervir nessa realidade e transformá-la.
relação entre professores e alunos comece a existir dentro
das escolas. Para tanto, é preciso compreender que a tarefa O processo de interação e de mediação na relação
docente tem um papel social e político insubstituível, e que professor-aluno
no momento atual, embora muitos fatores não contribuam Em todo processo de aprendizagem humana, a inte-
para essa compreensão, o professor necessita assumir uma ração social e a mediação do outro tem fundamental im-
postura crítica em relação a sua atuação recuperando a es- portância. Na escola, pode-se dizer que a interação profes-
sência do ser “educador”. sor-aluno é imprescindível para que ocorra o sucesso no
E para o professor entender o real significado de seu processo ensino aprendizagem. Por essa razão, justifica-se
trabalho, é necessário que saiba um pouco mais sobre sua a existência de tantos trabalhos e pesquisas na área da
identidade e a história de sua profissão. educação dentro dessa temática, os quais procuram des-
Teríamos que conseguir que os outros acreditem no que tacar a interação social e o papel do professor mediador,
somos. Um processo social complicado, lento, de desencon- como requisitos básicos para qualquer prática educativa
tros entre o que somos para nós e o que somos para fora [...] eficiente.
De acordo com as abordagens de Paulo Freire, per-
Somos a imagem social que foi construída sobre o ofício de
cebe-se uma vasta demonstração sobre esse tema e uma
mestre, sobre as formas diversas de exercer este ofício.
forte valorização do diálogo como importante instrumento
Sabemos pouco sobre a nossa história (ARROIO, 2000,
na constituição dos sujeitos. No entanto, esse mesmo autor
p.29).
defende a ideia de que só é possível uma prática educativa
Fazendo uma correlação com esse ponto de vista, não
dialógica por parte dos educadores, se estes acreditarem no
se pode deixar de destacar e valorizar os fenômenos histó-
diálogo como um fenômeno humano capaz de mobilizar o
rico-sociais presentes na atividade profissional do profes-
refletir e o agir dos homens e mulheres. E para compreender
sor. Nessa perspectiva, jamais poderá ser compreendido o
melhor essa prática dialógica, Freire acrescenta que
trabalho individual do professor desvinculado do seu papel
[...], o diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o
social, dessa forma estar-se-ia descaracterizando o sentido
encontro em que se solidarizam o refletir e o agir de seus
e o significado do trabalho docente. sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e huma-
Considerando a emergência de se trabalhar a identida- nizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar idéias de
de do professor, percebe-se uma vasta bibliografia sobre um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca
a profissão docente, a qual tem apresentado muitas ideias de idéias a serem consumidas pelos permutantes. (FREIRE,
e questionamentos, principalmente sobre a formação dos 2005, p. 91).
professores, e, mais especificamente, sobre a formação re- Assim, quanto mais o professor compreender a dimen-
flexiva dos professores. são do diálogo como postura necessária em suas aulas,
No entanto, percebe-se que ainda não existe um con- maiores avanços estará conquistando em relação aos alu-
senso quanto ao significado exato do que seja o professor nos, pois desse modo, sentir-se-ão mais curiosos e mobi-
reflexivo, embora haja muitos estudos e pesquisas nessa lizados para transformarem a realidade. Quando o profes-
linha teórica. sor atua nessa perspectiva, ele não é visto como um mero
Segundo Pimenta (2002), faz-se necessário compreen- transmissor de conhecimentos, mas como um mediador,
der com mais profundidade o conceito de professor re- alguém capaz de articular as experiências dos alunos com o
flexivo, pois o que parece estar ocorrendo é que o termo mundo, levando-os a refletir sobre seu entorno, assumindo
tornou-se mais uma expressão da moda, do que uma meta um papel mais humanizador em sua prática docente.
de transformação propriamente dita. Já para Vygotsky, a ideia de interação social e de me-
Para Libâneo, é fundamental perguntar: que tipo de diação é ponto central do processo educativo. Pois para
reflexão o professor precisa para alterar sua prática, pois o autor, esses dois elementos estão intimamente relacio-
para ele nados ao processo de constituição e desenvolvimento dos
A reflexão sobre a prática não resolve tudo, a experiên- sujeitos. A atuação do professor é de suma importância
cia refletida não resolve tudo. São necessárias estratégias, já que ele exerce o papel de mediador da aprendizagem
procedimentos, modos de fazer, além de uma sólida cultura do aluno. Certamente é muito importante para o aluno a

20
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

qualidade de mediação exercida pelo professor, pois desse Os estudos de Wallon propõem algumas reflexões a
processo dependerão os avanços e as conquistas do aluno respeito da constituição do adolescente. Tais reflexões
em relação à aprendizagem na escola. fornecem pistas fundamentais aos professores que atuam
Organizar uma prática escolar, considerando esses com essa faixa etária. Segundo o autor, a juventude inicia-
pressupostos, é sem dúvida, conceber o aluno um sujeito -se com uma crise marcada por mudanças na estruturação
em constante construção e transformação que, a partir das da personalidade. É um momento no qual o adolescente
interações, tornar-se-á capaz de agir e intervir no mundo, volta-se para questões que estão mais diretamente ligadas
conferindo novos significados para a história dos homens. ao seu lado pessoal, moral e existencial.
Quando se imagina uma escola baseada no processo Nesse sentido, a afetividade torna-se um dos fatores
de interação, não se está pensando em um lugar onde cada preponderantes no processo de relacionamento do ado-
um faz o que quer, mas num espaço de construção, de va- lescente consigo mesmo e com os outros, contudo, isso
lorização e respeito, no qual todos se sintam mobilizados a ocorre a partir de um caráter cognitivo já estabelecido, ou
pensarem em conjunto.
seja, ele consegue gerir uma exigência racional nas rela-
Na teoria de Vygotsky, é importante perceber que
ções afetivas.
como o aluno se constitui na relação com o outro, a escola
Normalmente é uma fase marcada por muitos ques-
é um local privilegiado em reunir grupos bem diferencia-
tionamentos, fortes exigências, novas experiências e cons-
dos a serem trabalhados. Essa realidade acaba contribuin-
do para que, no conjunto de tantas vozes, as singularida- tantes preocupações. Diante de tantas alterações físicas e
des de cada aluno sejam respeitadas. emocionais, muitas vezes não conseguindo conter ou ca-
Portanto, para Vygotsky, a sala de aula é, sem dúvi- nalizar tanta energia, iniciam-se os confrontos com pais,
da, um dos espaços mais oportunos para a construção de professores e até com colegas.
ações partilhadas entre os sujeitos. A mediação é, portanto, Considera-se esse período o mais marcado pelas trans-
um elo que se realiza numa interação constante no proces- formações, talvez seja essa uma das razões pelas quais
so ensino aprendizagem. exista um enorme desejo de se romper com os modelos
Pode-se dizer também que o ato de educar é nutrido pré-estabelecidos.
pelas relações estabelecidas entre professor-aluno. Para Galvão (1995), o desenvolvimento do adolescente
é marcado por muitos conflitos, que são próprios do ser
A Afetividade humano, alguns são importantes para o crescimento, ou-
tros provocam muito desgaste e transtornos emocionais.
A escola pode ser considerada como um dos espaços Sendo assim, a escola precisa criar um ambiente mais es-
essencialmente propícios, e talvez único, capaz de desen- timulante e afetivo que possibilite a esse adolescente enxer-
volver e elevar o indivíduo intelectual e culturalmente den- gar-se nesse processo. Por esse motivo, a mediação do pro-
tro de uma sociedade. Entretanto, as relações estabelecidas fessor é uma contribuição que irá ajudar o aluno do segundo
no contexto escolar entre alunos e professores têm exigido segmento do Ensino Fundamental a dar sentido ao seu existir
bastante atenção e preocupação por parte daqueles que e ao seu pensar. É importante que se ressalte que, quando se
encaram a escola como espaço de construção e reconstru- fala em proporcionar uma relação professor-aluno baseada
ção mútua de saberes. no afeto, de forma alguma, confunde-se aqui afeto com per-
Nesse sentido, acredita-se que uma das tarefas das missividade. Pelo contrário, a ação do professor deve impor
equipes pedagógicas de qualquer escola, é a criação de es- limites e possibilidades aos alunos, fazendo com que estes
tratégias eficazes, no sentido de promover uma formação percebam o professor como alguém que, além de lhe trans-
continuada, a qual possibilite uma relação pedagógica sig- mitir conhecimentos e preocupar-se com a apropriação dos
nificativa e responsável entre professores e alunos, garan- mesmos, compromete-se com a ação que realiza, perceben-
tindo a todos a melhoria no processo ensino aprendizagem. do o aluno como um ser importante, dotado de ideias, senti-
Entende-se que cada ser humano, ao longo de sua mentos, emoções e expressões.
existência, constrói um modo de relacionar-se com o outro, Assim, todo educador que deseja adequar sua prática
baseado em suas vivências e experiências. pedagógica à teoria Walloniana deve buscar desenvolver ati-
Dessa forma, o comportamento diante do outro de-
vidades que envolvam os alunos de forma integrada, ou seja,
pende da natureza biológica, bem como da cultura que o
deve orientar sua prática para que desenvolva a expressivi-
constituiu enquanto sujeito. Nessa perspectiva, é de fun-
dade, a emoção, a personalidade e o pensamento criativo.
damental importância entender que a sala de aula é um
Para finalizar e contribuir com as reflexões acerca da
espaço de convivências e relações heterogêneas em ideias,
afetividade na escola, Freire salienta
crenças e valores.
Como prática estritamente humana jamais pude enten-
Na teoria de Henri Wallon, encontramos subsídios im-
der a educação como experiência fria, sem alma, em que os
portantes no que diz respeito à dimensão afetiva do ser
sentimentos e as emoções, os desejos, os sonhos devessem
humano e como ela é significativa na construção da pessoa
ser reprimidos por uma espécie de ditadura racionalista.
e do conhecimento. Para esse teórico, a afetividade e a in-
teligência são inseparáveis, uma vez que uma complemen- Nem tampouco jamais compreendi a prática educativa
ta a outra. como uma experiência a que faltasse rigor em que se gera a
necessária disciplina intelectual (FREIRE, 1996, p. 146).

21
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Isso vem reforçar a ideia de que os professores, quando acontecimentos sociais. Eles começam a se tornar mais ati-
buscam aprofundar seus conhecimentos sobre a importân- vos, envolvendo-se em trabalhos na comunidade e passam
cia da afetividade na escola, estão, na verdade, procurando a respeitar as regras da sociedade.
entender tanto de seres humanos, quanto de conteúdos e Calligaris (2000), um outro estudioso do tema, ajuda-
técnicas educativas. -nos a compreender algumas ideias. Segundo ele, a cultura
Enfim, a teoria de Wallon considera as questões afeti- atual impõe aos adolescentes uma moratória.
vas como molas propulsoras que promovem o avanço e o Isso significa que o adulto sempre está adiando o mo-
desenvolvimento dos indivíduos. Assim, é necessário con- mento de o adolescente demonstrar que está apto e res-
ceber a sala de aula como um rico espaço de relações entre ponsável, conseguindo mostrar o que já aprendeu.
alunos e professores. Para muitos professores, é difícil, quase impossível,
Levando em conta esse cenário de oposição e intera- conviver nesse meio sem expressar um forte desejo em en-
ção em que, muitas vezes, o convívio harmônico é quase tender melhor essa fase tão importante da vida. Segundo a
impossível, faz-se necessário salientar mais uma vez o diá-
psicologia, no desenvolvimento humano, todo rompimen-
logo como um instrumento importante nessas relações.
to entre o que está estabelecido e o que é necessário ainda
a ser definido é um processo doloroso e, ao mesmo tem-
Jovens alunos: Quem são?
po, delicado. É assim que se apresentam as mudanças que
Analisar essa fase da vida, a adolescência, é, sem dúvida, ocorrem nessa passagem.
uma demonstração de cuidado, atenção e preocupação com Na escola, esse momento é muito impreciso e normal-
os alunos que compõem o mundo estudantil das escolas. mente vem acompanhado de sentimentos contraditórios
E para entender melhor algumas questões ligadas à como: sensibilidade X indiferença, energia X fragilidade,
adolescência, é preciso compreender esse fenômeno, con- entusiasmo X desânimo, alegria X tristeza, firmeza X inse-
siderado a partir do século XX, fase que acabou se expan- gurança, delicadeza X irreverência entre outros.
dindo de tal forma, que hoje pode-se considerar que mui- Segundo Matos (2003), nessa fase, o jovem oscila em
tos jovens manifestam comportamento de adolescente. seu modo de ser, ora age como criança, ora como adulto.
Segundo Carvajal (1998), existem três fases distintas Essa ambiguidade também ocorre por parte dos adultos,
para esse momento da adolescência. Portanto esse período pois, em muitas situações, eles permitem um “quase tudo”,
não é linear e há diversos aspectos a serem considerados. em outras utilizam excesso de rigor, exigindo do jovem res-
A primeira fase considerada por esse autor é a “pube- ponsabilidade de adulto. Isso só confirma que a imprecisão
ral”, marcada pelo aparecimento das modificações fisioló- não está apenas no jovem, mas também naqueles que com
gicas, as quais são acompanhadas das mudanças psíquicas. eles convivem.
Nesse estágio, os adolescentes irritam-se facilmente, tor- Para os professores, entender esse período de transfor-
nam-se arredios, explosivos e preferem manter-se isolados. mação da vida humana é fundamental para o bom relacio-
Já manifestam o desejo de que o tratem como adulto. Para namento com os alunos, bem como para a organização de
Carvajal (1998, p. 78) “O púbere começa a desempenhar o novas práticas pedagógicas. Essa percepção e compreen-
papel mais importante do adolescente: aquele que busca são do comportamento do jovem auxiliarão os professores
uma identidade”. na criação de projetos inovadores mais voltados para a cul-
A segunda fase é chamada de “adolescência nuclear” e tura juvenil dos alunos.
é denominada por Carvajal como o núcleo da adolescên- Segundo Calligaris (2000), “Nossos adolescentes e jo-
cia. Marcada como etapa de surgimento do grupo, o qual vens amam, estudam, brigam. Batalham com seus corpos,
passa a ser foco de interesse do jovem. Nessa fase, tudo que se esticam e se transformam.” Cabe à escola então,
gira em torno dos interesses do grupo, chegando ao ponto
despertar o interesse e os sonhos desses jovens, do contrá-
de o jovem curvar-se às leis ditadas pelos companheiros.
rio só poderá constatar que todo espaço é desinteressante
Aqui, ao contrário da fase anterior, surge, no adolescente,
para quem para de sonhar.
a necessidade de se compartilharem todas as coisas com
Sabe-se que um dos objetivos da educação é promo-
os seus pares eleitos, pois ele tem necessidade de sentir-se
aceito pelos colegas. ver o desenvolvimento intelectual e pessoal do aluno, en-
Aparecem novos códigos de comportamento, que, tão por que não concentrar esforços em projetos e ações
muitas vezes, ditam as regras a serem seguidas. Momen- educativas que incentivem a participação desses adoles-
to marcado pela oposição ao mundo, desencadeando um centes-jovens, preparando-os para uma atuação crítica e
jeito diferente de ser. Esse período oferece modelos identi- criativa na sociedade?
ficatórios como: punks, darks, hippies, metaleiros e outros. Infelizmente ainda prevalece, no senso comum, a ideia
Isso mostra o quanto, essa fase é marcada por um momen- de que os jovens significam problemas para a sociedade.
to de rica expressão, originalidade e criatividade. Na verdade, o que está sendo esquecido é que essa faixa
A terceira e última fase é denominada pelo autor, como etária faz parte de um contexto social bem maior, o qual
“adolescência juvenil”. está passando por várias transformações e crises em vários
Esse conceito já qualifica o início da vida adulta. Os setores. Essas transformações acabam provocando mudan-
adolescentes começam a manifestar um comportamen- ças no comportamento de todas as pessoas, gerando crises
to mais independente e surgem as preocupações com os de valores e uma crescente desigualdade social.

22
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Na educação, observa-se por parte de muitos educa- essas reflexões têm provocado um deslocamento no eixo-
dores uma preocupação com esses problemas, contudo é -pedagógico, mudando a valorização de como e quem en-
preciso acreditar que a educação, muito além de promover sina, para a preocupação de quem aprende e de como se
o acúmulo de conhecimentos, possibilita aos adolescentes aprende.
novas formas de se posicionarem diante da realidade. No entanto, para o professor entender melhor o con-
Nesse sentido, um dos maiores desafios que ora se im- texto atual e refletir criticamente sobre suas ações, faz-se
põe para a escola, é propiciar um trabalho voltado para necessária uma breve retomada sobre as tendências peda-
o desenvolvimento da capacidade de pensar dos alunos, gógicas que influenciaram e vêm influenciando o ensino e
pois segundo Guillot (2008, p.165), “o mundo concreto é a aprendizagem ao longo da história educacional.
irrigado pelas novas tecnologias.” No entanto, esse mesmo As tendências pedagógicas foram evoluindo e foram
autor nos chama a atenção para o seguinte fato: não é por divididas em cinco abordagens, dentre as quais algumas
meio de uma série apresentada na televisão 24h que os colocaram como seu maior objetivo o refletir, o pensar e o
alunos irão compreender a cultura de que precisam para fazer do professor.
se tornarem homens e mulheres livres e responsáveis. Para A primeira abordagem a ser retomada é a “Tradicional”.
tanto, mais uma vez se reconhece a importância e o papel Nessa teoria, o processo ensino-aprendizagem era total-
fundamental do professor, enquanto elemento articulador mente centrado no professor. Tinha como objetivo princi-
capaz de organizar patamares de encontro entre aquilo por pal formar o aluno ideal, contudo não se levava em conta
que o aluno demonstra ter interesse e o que a escola real- seus interesses.
mente precisa trabalhar. Para Mizukami (1986, p.12), nessa abordagem, quanto
O que se deseja propor com essa reflexão é que, numa mais rígido o ambiente escolar, mais concentrado e volta-
ação coletiva, professores repensem a organização de suas do para a aprendizagem o aluno se mantinha. O professor
atividades docentes, partindo em busca de práticas que era visto como mero repassador de conteúdo e o aluno
sensibilizem os jovens a participarem ativamente da cons- como um ser passivo no processo. As habilidades desen-
trução de seus conhecimentos e de suas vidas escolares. volvidas no aluno eram a memorização e a repetição.
Para que os alunos possam aprender de fato, buscan-
Em seguida, vem a abordagem “Comportamentalista”.
do desenvolver um espírito cada vez mais crítico e criativo,
Teoria baseada no empirismo que vê o aluno como pro-
não se pode ignorar o mundo no qual esses jovens vivem. E
duto do meio. E o experimento é a base do conhecimen-
para que essas proposições venham a se efetivar na prática,
to, que, segundo Skinner, estudioso dessa abordagem, o
acredita-se que é essencial começar ouvindo os alunos, co-
comportamento resulta de um condicionamento operante.
nhecendo melhor suas opiniões, anseios e sonhos.
A resposta esperada do aluno ocorre quando ela é estimu-
Mobilizar a juventude estudantil, demonstrando-lhes a
lada por meio de reforços.
importância e o valor de um envolvimento ativo no traba-
O professor é aquele que planeja, organiza e controla
lho educativo é, sem dúvida, redesenhar uma nova escola.
os meios para atingir seus objetivos, os quais são estrutu-
Ensino-aprendizagem: Como entender esse processo? rados em pequenos módulos, conhecidos como estudos
programados.
Muitos pesquisadores consideram o ensino e a apren- A abordagem “Humanista” apresenta seu enfoque no
dizagem termos indissociáveis na construção do conheci- aluno. Segundo Mizukami (1986), a ênfase dessa teoria
mento. Assim, não se pode compreender a importância do ocorre por meio das relações interpessoais e do crescimen-
primeiro, sem reconhecer o significado a que o segundo to que delas resulta.
nos remete nessa construção. Nessa teoria, a preocupação maior do professor deve
Sabe-se que esses conceitos sofreram várias transfor- ser a de dar assistência aos alunos, ele deve agir como um
mações no decorrer da história de produção de conheci- facilitador da aprendizagem. O conhecimento resulta das
mento pelo homem. Nesse sentido, o processo ensino- experiências do aluno, o qual é capaz de buscar por si só
-aprendizagem tem sido caracterizado de diferentes for- os conhecimentos.
mas, ora procura dar ênfase à figura do professor como A quarta abordagem é a “Cognitivista”. Segundo Mizu-
detentor do saber, responsável pela transmissão do conhe- kami (1986, p.59), essa abordagem percebe a aprendiza-
cimento, ora vem destacar o papel do aluno como sujeito gem de forma científica, como um produto do meio, resul-
aprendiz, construtor de seu conhecimento. tante dos fatores externos. Preocupa-se com as relações
Por seguirem trajetórias paralelas, os estudos e as pes- sociais sem deixar de privilegiar a capacidade do aluno em
quisas sobre o como se ensina e o como se aprende de- assimilar as informações.
monstram que hoje não existe uma forma única para com- Nessa teoria, o professor, além de planejar os conteú-
preender esse processo. dos, preocupa-se em trabalhá-los da melhor forma, ade-
Entretanto, nas últimas décadas, percebe-se uma quando-os ao desenvolvimento dos alunos. Aqui o pro-
crescente contribuição por parte das investigações rea- fessor é visto como um coordenador e o aluno como um
lizadas na área da psicologia, as quais vêm propondo uma sujeito ativo em seu processo de aprendiz.
mudança significativa para as práticas escolares, visto que

23
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Na abordagem “Sócio-Cultural”, a relação professor - Esse é um dos momentos mais importantes, pois, de-
aluno ocorre de forma horizontal e não impositivamente. pendendo do encaminhamento desse passo, os alunos
Isso significa que as relações autoritárias são abolidas des- manifestarão interesse ou não pelo que vai ser estudado.
sa teoria. Na Problematização, escolher as perguntas mais importan-
A ação pedagógica do professor e do aluno volta-se tes é uma forma de garantir a participação ativa dos alunos
para uma prática histórica real. Segundo Freire (1975), o no processo. É um momento de confronto entre os conhe-
educador e o educando são sujeitos do processo educati- cimentos apresentados pelo professor e os trazidos pelos
vo, ambos crescem juntos nessa perspectiva. alunos. Quanto maiores e mais ricas as experiências apre-
O professor e o aluno trabalham procurando desmis-
sentadas, melhores serão as análises entre teoria e prática.
tificar a cultura dominante. Dessa forma, à medida que os
A problematização é um dos momentos mais ricos do
alunos participam do processo de construção do conheci-
planejamento da aula, pois a partir desse passo se define o
mento, mais críticas se tornarão suas consciências.
que realmente precisa ser estudado e aprofundado. Nesse
Com essa rápida retomada das principais teorias que
contribuíram historicamente no processo ensino-aprendi- momento, o aluno deve receber várias informações para
zagem, é possível perceber que sempre houve uma preo- que possa estabelecer relações com a sua realidade.
cupação, por parte da sociedade, em adequar as teorias às Em seguida, para que o aluno crie, recrie e incorpore o
realidades de cada período histórico. conteúdo que está sendo trabalhado em sua vida, é preciso
Hoje, levando em consideração que a sociedade exige sistematizá-lo, é o momento da Instrumentalização.
uma nova consciência humana, busca-se, com a pedago- Na instrumentalização, o professor, por meio de uma
gia “Histórico-Crítica” discutida e apresentada por Saviane, ação bastante mediada, irá junto com os alunos identificar
uma forma de superar as dificuldades até então encontra- os princípios práticos e teóricos do conteúdo estudado.
das na construção efetiva do conhecimento. Num quarto momento, ocorre a Catarse, compreende-
Saviane sustenta, nessa concepção de ensino-aprendi- -se que aqui o aluno é capaz de apresentar um posiciona-
zagem, uma teoria dialética, na qual a construção se dá mento mais elaborado da Prática Social, integrando os co-
num movimento dinâmico entre o conhecimento empírico nhecimentos que já conhecia com os científicos. Conside-
e o conhecimento científico. ra-se que esse é o momento de apropriação do conteúdo.
Com base nos estudos desenvolvidos por Saviane den- Para Gasparin (2005, p. 130), no momento da Catar-
tro da Pedagogia Histórico-Crítica, Gasparin (2005) apre- se social feita com base em necessidades criadas pelo ho-
senta de forma organizada uma proposta para o desenvol- mem. Nesse momento, esse conhecimento possui uma
vimento eficaz de ensino e aprendizagem. Trata-se de um
função explícita: a transformação social.
método pedagógico totalmente voltado para a transfor-
Assim, o aluno vai percebendo que ele também é autor
mação social.
da história, visto que, de posse da compreensão do conhe-
Pois, por maior avanço que possa ter ocorrido no con-
texto educacional, percebe-se ainda que os conteúdos cimento, passa a entender melhor a sua realidade.
escolhidos, a metodologia utilizada e a postura profissio- Num último momento, conhecido como Prática Social
nal adotada por muitos educadores revelam uma visão de Final, o aluno finalmente vai colocar seus conhecimentos
mundo nem sempre condizente com as propostas peda- em prática. Pode-se dizer que o horizonte de expectativas
gógicas vigentes. dos alunos vai ser ampliado. A Prática Social Inicial vai ser
Na tentativa de romper com algumas práticas que ain- agora alterada. E o aluno passa a perceber a realidade de
da privilegiam o exercício da repetição e da memorização forma diferente, entendendo melhor seu entorno, sendo
nas escolas, Gasparin (2005) busca fundamentar uma pro- capaz de reformulá-lo caso seja necessário.
posta, baseada também na teoria Histórico-Cultural de Vi- Nessa teoria, professor e aluno modificam-se.
gotsky, a qual considera e privilegia os conhecimentos que Assim, o aluno vai percebendo que ele também é autor
os alunos já trazem de casa, bem como estimula a aquisi- da história, visto que, de posse da compreensão do conhe-
ção daqueles que os discentes precisam saber. cimento, passa a entender melhor a sua realidade.11
Dentro dessa metodologia, o autor apresenta cinco
passos, tendo início com a Prática Social Inicial. Nesse pri-
meiro passo, o aluno precisa sentir-se estimulado e respei-
tado, só assim sentirá segurança em expressar o que sabe e
o que deseja aprender. É o momento em que se iniciam as
discussões sobre o conteúdo a ser trabalhado e construído.
A partir das colocações que vão sendo apresentadas
pelos alunos, dos questionamentos realizados e das infor-
mações que recebem sobre o conteúdo que será trabalha-
do pelo professor, constrói-se o segundo passo, que é a 11 Fonte: www.diaadiaeducacao.pr.gov.br - Por Rita de Cássia
Problematização. Soares Lopes

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

verificação para, então, enunciarem uma teoria que contri-


2. PRINCIPAIS TEORIAS DA APRENDIZAGEM: bua para o progresso científico. Cabe aqui a lembrança de
INATISMO, COMPORTAMENTALISMO, que a função da ciência, de modo geral, consiste em facili-
BEHAVIORISMO, INTERACIONISMO, tar e melhorar a vida do homem.
COGNITIVISMO. Na maioria das vezes, as teorias da aprendizagem são
2.1 AS BASES EMPÍRICAS, METODOLÓGICAS estudadas de maneira fragmentada, ou seja, trabalhando-
E EPISTEMOLÓGICAS DAS DIVERSAS -se ora um autor, ora outro, e nunca todos juntos de forma
a permitir comparações entre uma teoria e outra. Visan-
TEORIAS DE APRENDIZAGEM.
do auxiliar em tarefas dessa natureza, este texto pretende
2.2 CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET, VYGOTSKY E
justamente abordar num mesmo documento os principais
WALLON PARA A PSICOLOGIA E PEDAGOGIA.
autores que representam os dois grandes grupos teóricos
2.3 TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS relativos à aprendizagem: o das teorias comportamentais e
DE GARDNER. o das teorias cognitivas.
2.4 TEMAS CONTEMPORÂNEOS: BULLYING, Na medida do possível, foram evitados termos técnicos
O PAPEL DA ESCOLA, A ESCOLHA DA que assustariam qualquer leitor mesmo da área da educa-
PROFISSÃO, TRANSTORNOS ALIMENTARES ção. Não há necessidade de aprofundar estudos acerca de
NA ADOLESCÊNCIA, FAMÍLIA, ESCOLHAS como ocorre ou deixa de ocorrer qualquer aprendizagem,
SEXUAIS. mas conhecer ao menos superficialmente os fundamentos
teóricos de cada linha ajuda bastante qualquer profissional
que desenvolva processos de ensino e aprendizagem nos
dias de hoje, sobretudo devido à exigência constante de se
Sabe-se que a aprendizagem é um processo contínuo, ter que improvisar e alterar planos a todo instante, a fim de
que pode ocorrer em qualquer situação. Nesse sentido, po- poder acompanhar as mudanças.
demos dizer que um dos fatores essenciais do aprendizado Na aprendizagem escolar, existem os seguintes ele-
é a cultura, pois ela molda o sujeito por meio de suas rela- mentos centrais para que o desenvolvimento escolar ocor-
ções com o meio. ra com sucesso: o aluno, o professor e a situação de apren-
Muitas pessoas confundem construção de conheci- dizagem.
mento com aprendizagem. Entretanto, aprender é algo As teorias de aprendizagem buscam reconhecer a di-
muito mais amplo, pois é a forma de o sujeito aumentar nâmica envolvida nos atos de ensinar e aprender, partindo
seu conhecimento. Nesse sentido, a aprendizagem faz com do reconhecimento da evolução cognitiva do homem, e
que o sujeito se modifique, de acordo com a sua experiên- tentam explicar a relação entre o conhecimento pré-exis-
cia (LA ROSA, 2003). tente e o novo conhecimento. A aprendizagem não seria
Entretanto, o ser humano passa por mudanças que não
apenas inteligência e construção de conhecimento, mas,
se referem à aprendizagem e sim aos processos maturati-
basicamente, identificação pessoal e relação através da in-
vos, tais como: aquisição da linguagem, engatinhar, andar
teração entre as pessoas.
ou até mudanças em decorrência de doenças físicas ou psi-
cológicas. Sendo assim, a aprendizagem é uma mudança O conceito de aprendizagem tem vários significados
significativa que ocorre baseada também nas experiências não compartilhados. Algumas definições incluem: condi-
dos indivíduos. Todavia, para ser caracterizada como tal, é cionamento, aquisição de informação, mudança comporta-
necessária a solidez, ou seja, ela deve ser incorporada defi- mental, uso do conhecimento na resolução de problemas,
nitivamente pelo sujeito. construção de novos significados e estruturas cognitivas e
revisão de modelos mentais.
Principais teorias de aprendizagem Segue abaixo um resumo das características de cada
Existe uma infinidade de tipos diferentes de aprendiza- teoria da aprendizagem, destacando os pontos considera-
gem. O que diferencia uma aprendizagem de outra diz res- dos relevantes pelos pesquisadores responsáveis por cada
peito ao modo como cada uma se manifesta e ao próprio enunciado:
processo como cada uma é adquirida. Uma aprendizagem
é sempre uma aquisição, embora as explicações para essa Principais teorias: Inatismo
aquisição sejam variadas e muitas delas até contraditórias. Os cientistas e os filósofos criaram abordagens deno-
O fenômeno da aprendizagem é sempre algo concreto, minadas inatistas que valorizam os fatores endógenos e
e acontece mesmo que ninguém tenha interesse em ex- as abordagens ambientalistas que dão atenção especial à
plicá-lo. A aprendizagem existe independentemente das ação do meio e da cultura sobre a conduta humana.
diversas teorias que procuram entendê-la quer descreven- A visão de desenvolvimento enquanto processo de
do suas características, quer propondo elementos para que apropriação pelo homem da experiência históricosocial é
possa vir a ser repetida. relativamente recente. Durante longos anos, o papel da in-
As teorias da aprendizagem são elaboradas devido à teração de fatores internos e externos no desenvolvimento
insistência de pesquisadores que, observando fatos reais não era destacado. Enfatizava-se ora os primeiros, ora os
de aprendizagens, levantam suas hipóteses e procuram sua segundos. (DAVIS, 1994, p.26)

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O inatismo e o ambientalismo são teorias psicológicas (1904-1990) que a popularizou, através de experimentos
formuladas acerca da constituição do psiquismo humano. com ratos. Em seus experimentos, os ratos eram condicio-
Elas vêm revelar diferentes concepções das dimensões bio- nados a determinadas ações, com recompensas boas ou
lógicas e culturais do indivíduo assim como a forma que ruins pelos seus atos. Assim, se moldava o comportamento
ele aprende, se desenvolve e as possibilidades de ação na destes a partir de um sistema de estímulo, resposta e re-
educação. compensa.
A abordagem Inatista traz a concepção de que a práti- Nesta teoria, o comportamento deve ser estudado e
ca pedagógica não advém de circunstâncias contextualiza- sistematizado para que se possa modificá-lo. De acordo
das, ela baseia-se nas capacidades básicas do ser humano. com esta teoria, a maneira como o indivíduo aprende é
Ou seja, a personalidade, a forma de pensar, seus hábitos, uma grandeza possível de ser mensurada tal e qual um fe-
seus valores, as reações emocionais e o comportamento nômeno físico. Nesta teoria, a aprendizagem, independen-
são inatos, isto é, nascem com o indivíduo e seu destino já te da pessoa, deverá seguir as seguintes etapas:
vem prédeterminado. – Identificação do problema
Os eventos que ocorrem após o nascimento não são – Questionamentos acerca dos problemas
essenciais ou importantes para o desenvolvimento. – Hipóteses
Segundo Rousseau, a natureza, dizem-nos, é apenas o – Escolha das hipóteses
hábito. Que significa isso? Não há hábitos que só se adqui- – Verificação
rem pela força e não sufocam nunca a natureza? É o caso, – Generalização. O cérebro a utilizará ao identificar
por exemplo, do hábito das plantas, cuja direção vertical se problemas futuros semelhantes
perturba. Em se lhe devolvendo a liberdade, a planta con-
serva a inclinação que a obrigam a tomar; mas a seiva não Principais teorias: Construtivismo
muda, com isto, sua direção primitiva; e se a planta conti- O construtivismo é uma abordagem psicológica de-
nuar a vegetar, seu prolongamento voltará a ser vertical. O senvolvida a partir da teoria da epistemologia genética,
mesmo acontece com os homens. elaborada por Jean Piaget. Nesta teoria, o indivíduo apren-
Nesta teoria, a prática escolar não importa e nem de- de a partir da interação entre ele e o meio em que ele vive.
safia o aluno, já que está restrito àquilo que o educando O professor é visto como um mediador do conhecimento.
já conquistou. O desenvolvimento biológico é que é de- Jean Piaget desenvolveu sua teria a partir de várias
terminante para a aprendizagem. O processo de ensinar outras existentes no período, como a do cognitivismo.
e aprender só pode acontecer à medida que o educando Para ele, o desenvolvimento da aprendizagem em crianças
estiver maduro para aprender. A educação terá o papel de ocorre pelas seguintes etapas:
aprimorar o educando. – Sensório –motor(0 a 2 anos): as ações representam
Na concepção inatista, a prática pedagógica não tem ori- o mundo para a criança. Chorar, chupar o dedo, morder.
gem contextualizada, daí a ênfase no conceito de educando – Pré-operatório (2 a 7 anos): a criança lida com ima-
em geral. Os postulados inatistas justificam práticas peda- gens concretas
gógicas espontaneístas, do reforço das características inatas, – Operações concretas (7 a 11 anos): a criança já é ca-
onde o sucesso escolar está no educando e não na escola. paz de efetuar operações lógicas.
– Operações formais (11 em diante) a criança já efetua
Principais teorias: Humanístico operações lógicas com mais de uma variável.
A ideia que norteia esta teoria está baseada no princí-
pio do ensino centrado no aluno. Este possui liberdade para Principais teorias: interacionismo.
aprender, e o crescimento pessoal é valorizado. O pensa- A teoria interacionista foi desenvolvida por Jean Vy-
mento, sentimentos e ações estão integrados. O autor hu- gotsky. Em sua abordagem, o conhecimento é, antes de
manista mais conhecido é Rogers. A teoria humanista: tudo, impulsionado pelo desenvolvimento da linguagem
• Vê o ser que aprende primordialmente como pessoa; no ser humano. Sua teoria também considera que a intera-
• Valoriza a auto-realização e o crescimento pessoal; ção entre o indivíduo e o meio em que ele está inserido são
• Vê o indivíduo como fonte de seus atos e livre para essenciais ao processo de aprendizagem e, inclusive, entra
fazer escolhas; em acordo com as etapas do desenvolvimento propostas
• A aprendizagem não se limita a um aumento de co- por Jean Piaget na teoria construtivista.
nhecimentos, ela influi nas escolhas e atitudes do aprendiz; Entretanto, para Vygotsky, é o próprio movimento de
• O aprendiz é visto como sujeito, e a auto-realiza- aprender e buscar conhecimento que irá gerar a aprendiza-
ção é enfatizada. gem efetiva. Este processo deve ocorrer de fora para den-
tro, ou seja, do meio social para o indivíduo.
Principais teorias: Behavorismo ou Comportamental Todas estas teorias exerceram ( e ainda exercem) pro-
O behavorismo, ou teoria comportamental, foi de- fundas influências na maneira como organizamos os pro-
senvolvido nos Estados Unidos da América John Watson cessos educacionais em todo o mundo. Ao longo dos anos,
(1878-1958) e na Rússia por Ivan Petrovich Pavlov (1849- cada teoria foi mais adequada para as necessidades de seu
1936). Embora as bases desta teoria tenham sido desenvol- tempo, visto que a escola e o mundo do trabalho também
vidas por estes pesquisadores, foi Burrhus Frederic Skiiner sofreram grandes mudanças.

26
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A partir dos anos 90, o conceito de inteligências múl- evolutiva entre o sujeito e o seu meio, ou seja, a criança
tiplas, desenvolvido por Howard Gardner, propunha que o reconstrói suas ações e idéias quando se relaciona com no-
ser humano era dotado de várias inteligências diferentes e vas experiências ambientais. Para ele, a criança constrói sua
complementares entre si. Isto explicaria, por exemplo, por- realidade como um ser humano singular, situação em que
que algumas pessoas apresentariam maior facilidade para o cognitivo está em supremacia em relação ao social e o
aprender matemática e ciências exatas, enquanto outros afetivo.
seriam mas rápidos para aprender esportes ou atividades  Na perspectiva construtivista de Piaget, o começo do
artísticas, como o desenho e a música. conhecimento é a ação do sujeito sobre o objeto, ou seja,
o conhecimento humano se constrói na interação homem-
Principais teorias: cognitivismo -meio, sujeito-objeto. Conhecer consiste em operar sobre
As teorias cognitivas tratam da cognição, de como o o real e transformá-lo a fim de compreendê-lo, é algo que
indivíduo “conhece”; processa a informação, compreende e se dá a partir da ação do sujeito sobre o objeto de co-
dá significados a ela. Dentre as teorias cognitivas de apren-
nhecimento. As formas de conhecer são construídas nas
dizagem mais antigas, destacam-se a de Tolman, a da Ges-
trocas com os objetos, tendo uma melhor organização em
talt e a de Lewin. As mais recentes e de bastante influência
momentos sucessivos de adaptação ao objeto. A adapta-
no processo instrucional são as de Bruner, Piaget, Vygotsky
ção ocorre através da organização, sendo que o organis-
e Ausubel. O enfoque cognitivista:
Encara a aprendizagem como um processo de armaze- mo discrimina entre estímulos e sensações, selecionando
namento de informações; aqueles que irá organizar em alguma forma de estrutura. A
Auxilia na organização do conteúdo e de suas idéias a adaptação possui dois mecanismos opostos, mas comple-
respeito de um assunto, em uma área particular de conhe- mentares, que garantem o processo de desenvolvimento:
cimento; a assimilação e a acomodação. Segundo Piaget, o conhe-
Busca definir e descrever como os indivíduos perce- cimento é a equilibração/reequilibração entre assimilação
bem, direcionam a atenção, coordenam as suas interações e acomodação, ou seja, entre os indivíduos e os objetos do
com o ambiente; mundo.
Como aprendem, compreendem e reutilizam informa-  A assimilação é a incorporação dos dados da realida-
ções integradas em suas memórias a longo prazo; de nos esquemas disponíveis no sujeito, é o processo pelo
Como os indivíduos efetuam a transferência dos co- qual as idéias, pessoas, costumes são incorporadas à ativi-
nhecimentos adquiridos de um contexto para o outro; dade do sujeito. A criança aprende a língua e assimila tudo
Para Vygotsky (1896-1934), o desenvolvimento cog- o que ouve, transformando isso em conhecimento seu. A
nitivo é produzido pelo processo de interiorização da in- acomodação é a modificação dos esquemas para assimilar
teração social com materiais fornecidos pela cultura. As os elementos novos, ou seja, a criança que ouve e começa
potencialidades do indivíduo devem ser levadas em conta a balbuciar em resposta à conversa ao seu redor gradual-
durante o processo de ensino-aprendizagem; mente acomoda os sons que emite àqueles que ouve, pas-
O sujeito é não apenas ativo, mas interativo, pois forma sando a falar de forma compreensível.
conhecimentos e constitui-se a partir de relações intra e  Segundo FARIA (1998), os esquemas são uma neces-
interpessoais; sidade interna do indivíduo. Os esquemas afetivos levam à
Para Piaget (1981), a construção do conhecimento se construção do caráter, são modos de sentir que se adquire
dá através da interação da experiência sensorial e da razão; juntamente às ações exercidas pelo sujeito sobre pessoas
A interação com o meio (pessoas e objetos) são ou objetos. Os esquemas cognitivos conduzem à formação
necessários para o desenvolvimento do indivíduo; da inteligência, tendo a necessidade de serem repetidos (a
Enfatiza o processo de cognição à medida que o ser se situa no
criança pega várias vezes o mesmo objeto). Outra proprie-
mundo e atribui significados à realidade em que se encontra;
dade do esquema é a ampliação do campo de aplicação,
Preocupa-se com o processo de compreensão, trans-
também chamada de assimilação generalizadora (a criança
formação, armazenamento e uso da informação envolvida
não pega apenas um objeto, pega outros que estão por
na cognição. 12
As contribuições de Piaget, Vygotsky e Wallon para perto). Através da discriminação progressiva dos objetos,
a Psicologia e Pedagogia, as bases empíricas, metodo- da capacidade chamada de assimilação recognitiva ou re-
lógicas e epistemológicas das diversas teorias de apren- conhecedora, a criança identifica os objetos que pode ou
dizagem; não pegar, que podem ou não dar algum prazer à ela.
  FARIA (op.cit.) salienta que os fatores responsáveis pelo
Teoria do Desenvolvimento de Jean Piaget desenvolvimento, segundo Piaget, são: maturação; expe-
 Formado em Biologia, Piaget especializou-se nos riência física e lógico-matemática; transmissão ou expe-
estudos do conhecimento humano, concluindo que, as- riência social; equilibração; motivação; interesses e valores;
sim como os organismos vivos podem adaptar-se gene- valores e sentimentos. A aprendizagem é sempre provoca-
ticamente a um novo meio, existe também uma relação da por situações externas ao sujeito, supondo a atuação do
12 Fonte: www.pedagogiadidatica.blogspot.com.br/ www.
sujeito sobre o meio, mediante experiências. A aprendiza-
smeduquedecaxias.rj.gov.br gem será a aquisição que ocorre em função da experiên-
Texto adaptado de Ana Lucia Portella Staub cia e que terá caráter imediato. Ela poderá ser: experiência

27
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

física - comporta ações diferentes em função dos objetos e como a imitação. Imitando, a criança desdobra, lentamen-
consiste no desenvolvimento de ações sobre esses objetos te, a nova capacidade que está a construir (pela participa-
para descobrir as propriedades que são abstraídas deles ção do outro ela se diferenciará dos outros) formando sua
próprios, é o produto das ações do sujeito sobre o objeto; subjetividade. Pela imitação, a criança expressa seus dese-
e experiência lógico-matemática – o sujeito age sobre os jos de participar e se diferenciar dos outros constituindo-se
objetos de modo a descobrir propriedades e relações que em sujeito próprio.
são abstraídas de suas próprias ações, ou seja, resulta da  Wallon propõe estágios de desenvolvimento, assim
coordenação das ações que o sujeito exerce sobre os obje- como Piaget, porém, ele não é adepto da idéia de que a
tos e da tomada de consciência dessa coordenação. Essas criança cresce de maneira linear. O desenvolvimento hu-
duas experiências estão inter-relacionadas, uma é condição mano tem momentos de crise, isto é, uma criança ou um
para o surgimento da outra. adulto não são capazes de se desenvolver sem conflitos. A
Para que ocorra uma adaptação ao seu ambiente, o in- criança se desenvolve com seus conflitos internos e, para
divíduo deverá equilibrar uma descoberta, uma ação com ele, cada estágio estabelece uma forma específica de in-
outras ações. A base do processo de equilibração está na teração com o outro, é um desenvolvimento conflituoso.
assimilação e na acomodação, isto é, promove a reversibili-  No início do desenvolvimento existe uma preponde-
dade do pensamento, é um processo ativo de auto-regula- rância do biológico e após o social adquire maior força.
ção. Piaget afirma que, para a criança adquirir pensamento Assim como Vygotsky, Wallon acredita que o social é im-
e linguagem, deve passar por várias fases de desenvolvi- prescindível. A cultura e a linguagem fornecem ao pensa-
mento psicológico, partindo do individual para o social. mento os elementos para evoluir, sofisticar. A parte cog-
Segundo ele, o falante passa por pensamento autístico, nitiva social é muito flexível, não existindo linearidade no
fala egocêntrica para atingir o pensamento lógico, sendo desenvolvimento, sendo este descontínuo e, por isso, sofre
o egocentrismo o elo de ligação das operações lógicas da crises, rupturas, conflitos, retrocessos, como um movimen-
criança. No processo de egocentrismo, a criança vê o mun- to que tende ao crescimento.
do a partir da perspectiva pessoal, assimilando tudo para si  De acordo com GALVÃO (op.cit.), no primeiro ano de
vida, a criança interage com o meio regida pela afetivida-
e ao seu próprio ponto de vista, estando o pensamento e a
de, isto é, o estágio impulsivo-emocional, definido pela
linguagem centrados na criança.
simbiose afetiva da criança em seu meio social. A crian-
Para Piaget, o desenvolvimento mental dá-se esponta-
ça começa a negociar, com seu mundo sócio-afetivo, os
neamente a partir de suas potencialidades e da sua intera-
significados próprios, via expressões tônicas. As emoções
ção com o meio. O processo de desenvolvimento mental é
intermediam sua relação com o mundo.
lento, ocorrendo por meio de graduações sucessivas atra-
 Do estágio sensório-motor ao projetivo (1 a 3 anos),
vés de estágios: período da inteligência sensório-motora;
predominam as atividades de investigação, exploração e
período da inteligência pré-operatória; período da inteli-
conhecimento do mundo social e físico. No estágio sen-
gência operatória-concreta; e período da inteligência ope-
sório-motor, permanece a subordinação a um sincretismo
ratório-formal.
subjetivo (a lógica da criança ainda não está presente).
  Neste estágio predominam as relações cognitivas da crian-
 Teoria do Desenvolvimento de Henry Wallon ça com o meio. Wallon identifica o sincretismo como sendo
 A criança, para Wallon, é essencialmente emocional e a principal característica do pensamento infantil. Os fenô-
gradualmente vai constituindo-se em um ser sócio-cogni- menos típicos do pensamento sincrético são: fabulação,
tivo. O autor estudou a criança contextualizada, como uma contradição, tautologia e elisão.
realidade viva e total no conjunto de seus comportamen-   Na gênese da representação, que emerge da imita-
tos, suas condições de existência. ção motora-gestual ou motricidade emocional, as ações da
  Segundo GALVÃO (2000), Wallon argumenta que as criança não mais precisarão ter origem na ação do outro,
trocas relacionais da criança com os outros são fundamen- ela vai “desprender-se” do outro, podendo voltar-se para
tais para o desenvolvimento da pessoa. As crianças nascem a imitação de cenas e acontecimentos, tornando-se habili-
imersas em um mundo cultural e simbólico, no qual ficarão tada à representação da realidade. Este salto qualitativo da
envolvidas em um «sincretismo subjetivo», por pelo menos passagem do ato imitativo concreto e a representação é
três anos. Durante esse período, de completa indiferencia- chamado de simulacro. No simulacro, que é a imitação em
ção entre a criança e o ambiente humano, sua compreen- ato, forma-se uma ponte entre formas concretas de sig-
são das coisas dependerá dos outros, que darão às suas nificar e representar e níveis semióticos de representação.
ações e movimentos formato e expressão. Essa é a forma pela qual a criança se desloca da inteligên-
 Antes do surgimento da linguagem falada, as crianças cia prática ou das situações para a inteligência verbal ou
comunicam-se e constituem-se como sujeitos com signi- representativa.
ficado, através da ação e interpretação do meio entre hu-  Dos 3 aos 6 anos, no estágio personalístico, aparece
manos, construindo suas próprias emoções, que é seu pri- a imitação inteligente, a qual constrói os significados dife-
meiro sistema de comunicação expressiva. Estes processos renciados que a criança dá para a própria ação. Nessa fase,
comunicativos-expressivos acontecem em trocas sociais a criança está voltada novamente para si própria. Para isso,

28
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

a criança coloca-se em oposição ao outro num mecanis- da fala do outro, tornando-a sua. Os sistemas simbólicos
mo de diferenciar-se. A criança, mediada pela fala e pelo organizam os signos em estruturas, estas são complexas e
domínio do “meu/minha”, faz com que as idéias atinjam articuladas. Essas duas mudanças são essenciais e eviden-
o sentimento de propriedade das coisas. A tarefa central ciam o quanto são importantes as relações sociais entre os
é o processo de formação da personalidade. Aos 6 anos sujeitos na construção de processos psicológicos e no de-
a criança passa ao estágio categorial trazendo avanços na senvolvimento dos processos mentais superiores. Os sig-
inteligência. No estágio da adolescência, a criança volta-se nos internalizados são compartilhados pelo grupo social,
a questões pessoais, morais, predominando a afetividade. permitindo o aprimoramento da interação social e a comu-
Ainda conforme GALVÃO, é nesse estágio que se intensifica nicação entre os sujeitos. As funções psicológicas superio-
a realização das diferenciações necessárias à redução do res aparecem, no desenvolvimento da criança, duas vezes:
sincretismo do pensamento. Esta redução do sincretismo primeiro, no nível social (entre pessoas, no nível interpsico-
e o estabelecimento da função categorial dependem do lógico) e, depois, no nível individual (no interior da criança,
meio cultural no qual está inserida a criança.
no nível intrapsicológico). Sendo assim, o desenvolvimento
 
caminha do nível social para o individual.
Teoria do Desenvolvimento de Lev S. Vygotsky
 Como visto, exige-se a utilização de instrumentos para
Para Vygotsky, a criança nasce inserida num meio social,
transformar a natureza e, da mesma forma, exige-se o pla-
que é a família, e é nela que estabelece as primeiras relações
nejamento, a ação coletiva, a comunicação social. Pensa-
com a linguagem na interação com os outros. Nas interações
cotidianas, a mediação (necessária intervenção de outro en- mento e linguagem associam-se devido à necessidade de
tre duas coisas para que uma relação se estabeleça) com o intercâmbio durante a realização do trabalho. Porém, antes
adulto acontece espontaneamente no processo de utilização dessa associação, a criança tem a capacidade de resolver
da linguagem, no contexto das situações imediatas. problemas práticos (inteligência prática), de fazer uso de
Essa teoria apoia-se na concepção de um sujeito interati- determinados instrumentos para alcançar determinados
vo que elabora seus conhecimentos sobre os objetos, em um objetivos. Vygotsky chama isto de fase pré-verbal do de-
processo mediado pelo outro. O conhecimento tem gênese senvolvimento do pensamento e uma fase pré-intelectual
nas relações sociais, sendo produzido na intersubjetividade e no desenvolvimento da linguagem.
marcado por condições culturais, sociais e históricas.  Por volta dos 2 anos de idade, a fala da criança tor-
Segundo Vygotsky, o homem se produz na e pela na-se intelectual, generalizante, com função simbólica, e o
linguagem, isto é, é na interação com outros sujeitos que pensamento torna-se verbal, sempre mediado por signifi-
formas de pensar são construídas por meio da apropriação cados fornecidos pela linguagem. Esse impulso é dado pela
do saber da comunidade em que está inserido o sujeito. A inserção da criança no meio cultural, ou seja, na interação
relação entre homem e mundo é uma relação mediada, na com adultos mais capazes da cultura que já dispõe da lin-
qual, entre o homem e o mundo existem elementos que guagem estruturada. Vygotsky destaca a importância da
auxiliam a atividade humana. Estes elementos de mediação cultura; para ele, o grupo cultural fornece ao indivíduo um
são os signos e os instrumentos. O trabalho humano, que ambiente estruturado onde os elementos são carregados
une a natureza ao homem e cria, então, a cultura e a histó- de significado cultural.
ria do homem, desenvolve a atividade coletiva, as relações   Os significados das palavras fornecem a mediação
sociais e a utilização de instrumentos. Os instrumentos são simbólica entre o indivíduo e o mundo, ou seja, como diz
utilizados pelo trabalhador, ampliando as possibilidades de VYGOTSKY (1987), é no significado da palavra que a fala e
transformar a natureza, sendo assim, um objeto social. o pensamento se unem em pensamento verbal. Para ele, o
 Os signos também auxiliam nas ações concretas e nos pensamento e a linguagem iniciam-se pela fala social, pas-
processos psicológicos, assim como os instrumentos. A ca-
sando pela fala egocêntrica, atingindo a fala interior que é
pacidade humana para a linguagem faz com que as crian-
pensamento reflexivo.
ças providenciem instrumentos que auxiliem na solução de
 A fala egocêntrica emerge quando a criança transfere
tarefas difíceis, planejem uma solução para um problema e
formas sociais e cooperativas de comportamento para a
controlem seu comportamento. Signos e palavras são para
esfera das funções psíquicas interiores e pessoais. No iní-
as crianças um meio de contato social com outras pessoas.
Para Vygotsky, signos são meios que auxiliam/facilitam cio do desenvolvimento, a fala do outro dirige a ação e a
uma função psicológica superior (atenção voluntária, me- atenção da criança. Esta vai usando a fala de forma a afetar
mória lógica, formação de conceitos, etc.), sendo capazes a ação do outro. Durante esse processo, ao mesmo tempo
de transformar o funcionamento mental. Desta maneira, as que a criança passa a entender a fala do outro e a usar
formas de mediação permitem ao sujeito realizar opera- essa fala para regulação do outro, ela começa a falar para
ções cada vez mais complexas sobre os objetos. si mesma. A fala para si mesma assume a função auto-re-
  guladora e, assim, a criança torna-se capaz de atuar sobre
Segundo Vygotsky, ocorrem duas mudanças qualita- suas próprias ações por meio da fala. Para Vygotsky, o sur-
tivas no uso dos signos: o processo de internalização e a gimento da fala egocêntrica indica a trajetória da criança:
utilização de sistemas simbólicos. A internalização é rela- o pensamento vai dos processos socializados para os pro-
cionada ao recurso da repetição onde a criança apropria-se cessos internos.

29
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

 A fala interior, ou discurso interior, é a forma de linguagem interna, que é dirigida ao sujeito e não a um interlocutor
externo. Esta fala interior, se desenvolve mediante um lento acúmulo de mudanças estruturais, fazendo com que as estruturas
de fala que a criança já domina, tornem-se estruturas básicas de seu próprio pensamento. A fala interior não tem a finalidade
de comunicação com outros, portanto, constitui-se como uma espécie de “dialeto pessoal”, sendo fragmentada, abreviada.
 A relação entre pensamento e palavra acontece em forma de processo, constituindo-se em um movimento contínuo
de vaivém do pensamento para a palavra e vice-versa. Esse processo passa por transformações que, em si mesmas, podem
ser consideradas um desenvolvimento no sentido funcional. VYGOTSKY (op.cit.) diz que o pensamento nasce através das
palavras. É apenas pela relação da criança com a fala do outro em situações de interlocução, que a criança se apropria das
palavras, que, no início, são sempre palavras do outro. Por isso, é fundamental que as práticas pedagógicas trabalhem no
sentido de esclarecer a importância da fala no processo de interação com o outro.
Segundo VYGOTSKY (1989), a aprendizagem tem um papel fundamental para o desenvolvimento do saber, do conhe-
cimento. Todo e qualquer processo de aprendizagem é ensino-aprendizagem, incluindo aquele que aprende, aquele que
ensina e a relação entre eles. Ele explica esta conexão entre desenvolvimento e aprendizagem através da zona de desen-
volvimento proximal (distância entre os níveis de desenvolvimento potencial e nível de desenvolvimento real), um “espaço
dinâmico” entre os problemas que uma criança pode resolver sozinha (nível de desenvolvimento real) e os que deverá
resolver com a ajuda de outro sujeito mais capaz no momento, para em seguida, chegar a dominá-los por si mesma (nível
de desenvolvimento potencial).13

Gardner: Teoria das inteligências múltiplas

13 Fonte: www.coral.ufsm.br – Por Cintia Maria Basso

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A teoria das inteligências múltiplas foi estudada pelo Inteligência Musical


psicólogo Howard Gardner como um contrapeso para o A música é uma arte universal. Todas as culturas têm
paradigma da inteligência única. Ele propôs que a vida hu- alguma forma de música, mais ou menos elaborada, le-
mana requer o desenvolvimento de vários tipos de inteli- vando Gardner e seus colegas a entenderem que há uma
gências. Portanto, Gardner não entra em conflito com a de- inteligência musical latente em todos. Algumas áreas do
finição científica de inteligência como sendo “a capacidade cérebro executam funções relacionadas ao desempenho e
de resolver problemas ou fazer coisas importantes”. à composição da música. Como qualquer outro tipo de in-
Howard Gardner e seus colegas da prestigiada Univer- teligência, você pode treinar e melhorar. Os mais favoreci-
sidade de Harvard advertiram que a inteligência acadêmica dos neste tipo de inteligência são aqueles capazes de tocar
(obtida através de qualificações e méritos educacionais) instrumentos, ler e compor peças musicais com facilidade.
não pode ser o fator decisivo para determinar a inteligência
de uma pessoa. Gardner e seus colegas poderiam dizer que Inteligência corporal e sinestésica
Stephen Hawking  não tem mais inteligência do que Leo As habilidades motoras do corpo são necessárias para
Messi, mas cada um desenvolve um tipo diferente. utilizar ferramentas ou para expressar certas emoções, é
A pesquisa de Howard Gardner identificou e definiu essencial para o desenvolvimento em qualquer cultura. A
oito tipos diferentes de inteligência. Vamos ver com mais capacidade de usar ferramentas é considerada uma inteli-
detalhes cada uma das inteligências propostas pela Teoria gência sinestésica corporal. Além disso, a capacidade intui-
das Inteligências Múltiplas de Gardner. tiva da inteligência corporal é utilizada para expressar sen-
timentos através do corpo. São particularmente brilhantes
Inteligência linguística neste tipo de inteligência: dançarinos, atores, atletas e até
A capacidade de dominar a linguagem e se comunicar mesmo cirurgiões e artistas plásticos, porque todos eles
com outros é importante em todas as culturas. Desde pe- precisam usar racionalmente as suas capacidades físicas.
queno o ser humano aprende a usar a língua nativa para
ser capaz de se comunicar de forma eficaz. A inteligência Inteligência intrapessoal
linguística não só se refere à capacidade de comunicação
A inteligência intrapessoal se refere à inteligência que
oral, mas a outras formas de comunicação como a escrita,
nos permite compreender e se controlar internamente. As
gestual, etc. Quem domina melhor essa capacidade de co-
pessoas que se destacam neste tipo de inteligência são ca-
municação possui uma inteligência linguística superior. Al-
pazes de acessar seus sentimentos e refletir sobre eles. Essa
gumas profissões enfatizam esse tipo de inteligência como,
inteligência também lhes possibilita aprofundar a visão e
por exemplo, os políticos, escritores, poetas, jornalistas…
compreender as razões sobre o porquê de uma pessoa ser
do jeito que é.
Inteligência lógico-matemática
Durante décadas a inteligência lógico-matemática foi
Inteligência Interpessoal
considerada um tipo de inteligência bruta. Ela assumiu o
eixo principal do conceito de inteligência, e foi usada como A inteligência interpessoal nos permite ficar conscien-
um ponto de referência para detectar o quão inteligente tes de coisas que os nossos sentidos não conseguem captar.
era uma pessoa. Como o próprio nome indica, este tipo É uma inteligência que nos possibilita interpretar palavras,
de inteligência está ligada à capacidade de raciocínio ló- gestos, objetivos e metas subentendidos em cada discurso.
gico e resolução de problemas matemáticos. A velocidade A inteligência interpessoal aprimora a nossa capacidade de
para resolver estes problemas é o indicador que determi- empatia. É uma inteligência muito valiosa para as pessoas
na quanta inteligência lógico-matemática a pessoa tem. O que trabalham com grandes grupos. Sua capacidade de
famoso teste de quociente de inteligência (QI) é baseado detectar e compreender as circunstâncias e problemas dos
neste tipo de inteligência e, em menor proporção, na in- outros será maior com a inteligência interpessoal. Profes-
teligência linguística. Cientistas, economistas, acadêmicos, sores, psicólogos, terapeutas, advogados e educadores são
engenheiros e matemáticos muitas vezes se destacam nes- perfis que têm uma pontuação muito elevada neste tipo de
te tipo de inteligência. inteligência descrita na teoria das inteligências múltiplas.

Inteligência Espacial Inteligência naturalista


A capacidade de observar o mundo e os objetos em A inteligência naturalista detecta, diferencia e cate-
diferentes perspectivas está relacionada a este tipo de in- goriza as questões relacionadas com a natureza, como
teligência, em que se destacam os profissionais de xadrez espécies animais e vegetais ou fenômenos relacionados
e artes visuais (pintores, designers, escultores…). Pessoas ao clima, geografia ou fenômenos naturais. Este tipo de
que se destacam nessa inteligência, geralmente têm habili- inteligência foi adicionado mais tarde ao estudo original
dades que lhes permitem criar imagens mentais, desenhar de Inteligências múltiplas de Gardner, em 1995. Gardner
e identificar detalhes, além de um sentimento pessoal de achou necessário incluir nesta categoria porque é uma das
estética. Com essa inteligência desenvolvida, encontramos inteligências essenciais para a sobrevivência do ser huma-
pintores, fotógrafos, designers, publicitários, arquitetos,  e no e de outras espécies.
outras profissões que exigem criatividade…

31
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Contextualizando características: a intenção do autor em ferir o alvo, a repe-


Gardner afirma que todas as pessoas possuem cada tição da agressão, a presença de um público espectador
um dos oito tipos de inteligência, embora cada tipo seja e a concordância do alvo com relação à ofensa. ‘’Quando
mais desenvolvido em algumas pessoas do que em outras, o alvo supera o motivo da agressão, ele reage ou ignora,
todos os oito tipos tem a mesma importância e não há uma desmotivando a ação do autor’’, explica a especialista.
mais valiosa que a outra. Em geral, precisamos utilizá-las
para enfrentar a vida, independentemente da ocupação O bullying não é um fenômeno recente.
realizada. Afinal, a maioria dos trabalhos requer o uso da O bullying sempre existiu. No entanto, o primeiro a
maioria dos tipos de inteligência. A educação ensinada na relacionar a palavra a um fenômeno foi Dan Olweus, pro-
sala de aula é um procedimento destinado a avaliar os dois fessor da Universidade da Noruega, no fim da década de
primeiros tipos de inteligência: linguística e lógica mate- 1970. Ao estudar as tendências suicidas entre adolescentes,
mática. No entanto, esta educação é totalmente inadequa- o pesquisador descobriu que a maioria desses jovens tinha
da para educar os alunos na plenitude do seu potencial. sofrido algum tipo de ameaça e que, portanto, o bullying
A necessidade de mudança no paradigma educacional foi era um mal a combater.
trazida à discussão pela Teoria das Inteligências Múltiplas
de Gardner.14 A popularidade do fenômeno cresceu com a influência
dos meios eletrônicos, como a internet e as reportagens
Temas contemporâneos: bullying, o papel da esco- na televisão, pois os apelidos pejorativos e as brincadeiras
la, a escolha da profissão, transtornos alimentares na ofensivas foram tomando proporções maiores. “O fato de
adolescência, família, escolhas sexuais. ter consequências trágicas - como mortes e suicídios - e
a impunidade proporcionaram a necessidade de se discu-
tir de forma mais séria o tema”, aponta Guilherme Schelb,
Bullying
procurador da República e autor do livro Violência e Crimi-
Bullying é uma situação que se caracteriza por agres-
nalidade Infanto-Juvenil (164 págs., Thesaurus Editora tel.
sões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira
(61) 3344-3738).
repetitiva, por um ou mais alunos contra um ou mais
Sozinha, a escola não consegue resolver o problema,
colegas. O termo bullying tem origem na palavra ingle-
mas é normalmente nesse ambiente que se demonstram
sa bully, que significa valentão, brigão. Mesmo sem uma
os primeiros sinais de um praticante de bullying. “A ten-
denominação em português, é entendido como ameaça, dência é que ele seja assim por toda a vida, a menos que
tirania, opressão, intimidação, humilhação e maltrato.  seja tratado”, diz
“É uma das formas de violência que mais cresce no  O que leva o autor do bullying a praticá-lo.
mundo”, afirma Cléo Fante, educadora e autora do livro Fe- Querer ser mais popular, sentir-se poderoso e obter
nômeno Bullying: Como Prevenir a Violência nas Escolas e uma boa imagem de si mesmo. Isso tudo leva o autor do
Educar para a Paz(224 págs., Ed. Verus, tel. (19) 4009-6868 bullying a atingir o colega com repetidas humilhações ou
). Segundo a especialista, o bullying pode ocorrer em qual- depreciações. É uma pessoa que não aprendeu a transfor-
quer contexto social, como escolas, universidades, famílias, mar sua raiva em diálogo e para quem o sofrimento do
vizinhança e locais de trabalho. O que, à primeira vista, outro não é motivo para ele deixar de agir. Pelo contrário,
pode parecer um simples apelido inofensivo pode afetar sente-se satisfeito com a opressão do agredido, supondo
emocional e fisicamente o alvo da ofensa. ou antecipando quão dolorosa será aquela crueldade vivi-
Além de um possível isolamento ou queda do rendi- da pela vítima.
mento escolar, crianças e adolescentes que passam por
humilhações racistas, difamatórias ou separatistas podesm O espectador também participa do bullying.
apresentar doenças psicossomáticas e sofrer de algum tipo É comum pensar que há apenas dois envolvidos no
de trauma que influencie traços da personalidade. Em al- conflito: o autor e o alvo. Mas os especialistas alertam para
guns casos extremos, o bullying chega a afetar o estado esse terceiro personagem responsável pela continuidade
emocional do jovem de tal maneira que ele opte por solu- do conflito.
ções trágicas, como o suicídio. O espectador típico é uma testemunha dos fatos, pois
Nem tudo é bullying. não sai em defesa da vítima nem se junta aos autores.
Discussões ou brigas pontuais não são bullying. Confli- Quando recebe uma mensagem, não repassa. Essa atitude
tos entre professor e aluno ou aluno e gestor também não passiva pode ocorrer por medo de também ser alvo de ata-
são considerados bullying. Para que seja bullying, é neces- ques ou por falta de iniciativa para tomar partido.
sário que a agressão ocorra entre pares (colegas de classe
ou de trabalho, por exemplo). Todo bullying é uma agres- Também são considerados espectadores os que atuam
são, mas nem toda a agressão é classificada como bullying como plateia ativa ou como torcida, reforçando a agressão,
Para Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional rindo ou dizendo palavras de incentivo. Eles retransmitem
e professora da Faculdade de Educação da Universidade imagens ou fofocas. Geralmente, estão acostumados com
Estadual de Campinas (Unicamp), para ser dada como a prática, encarando-a como natural dentro do ambiente
bullying, a agressão física ou moral deve apresentar quatro escolar. ‘’O espectador se fecha aos relacionamentos, se
14 Fonte: www.psiconlinews.com exclui porque acha que pode sofrer também no futuro.

32
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Se for pela internet, por exemplo, ele ?apenas? repassa exclusão, por exemplo, é tão dolorida quanto ou até mais’’,
a informação. Mas isso o torna um coautor’’, explica a pes- explica Telma Vinha, doutora em Psicologia Educacional e
quisadora Cléo Fante, educadora e autora do livro Fenôme- professora da Faculdade de Educação da Universidade Es-
no Bullying: Como Prevenir a Violência nas Escolas e Educar tadual de Campinas (Unicamp).
para a Paz (224 págs., Ed. Verus, tel. (19) 4009-6868). Os jovens também podem repetir esse mesmo raciocí-
 Como identificar o alvo do bullying. nio e a escola deve permanecer alerta aos comportamen-
O alvo costuma ser uma criança ou um jovem com bai- tos moralmente abusivos.
xa autoestima e retraído tanto na escola quanto no lar. ‘’Por
essas características, dificilmente consegue reagir’’, afirma Existe diferença entre o bullying praticado por me-
o pediatra Lauro Monteiro Filho, fundador da Associação ninos e por meninas?
Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adoles- De modo geral, sim. As ações dos meninos são mais
cência (Abrapia). Aí é que entra a questão da repetição no expansivas e agressivas, portanto, mais fáceis de identificar.
bullying, pois se o aluno procura ajuda, a tendência é que Eles chutam, gritam, empurram, batem.
a provocação cesse. Já no universo feminino o problema se apresenta de
forma mais velada. As manifestações entre elas podem
Além dos traços psicológicos, os alvos desse tipo de ser fofocas, boatos, olhares, sussurros, exclusão. “As garo-
violência costumam apresentar particularidades físicas. As tas raramente dizem por que fazem isso. Quem sofre não
agressões podem ainda abordar aspectos culturais, étnicos sabe o motivo e se sente culpada”, explica a pesquisadora
e religiosos. norte-americana Rachel Simmons, especialista em bullying
“Também pode ocorrer com um novato ou com uma feminino.
menina bonita, que acaba sendo perseguida pelas cole- Ela conta que as meninas agem dessa maneira por-
gas”, exemplifica Guilherme Schelb, procurador da Repú- que a expectativa da sociedade é de que sejam boazinhas,
blica e autor do livro Violência e Criminalidade Infanto-Ju- dóceis e sempre passivas. Para demonstrar qualquer sen-
venil (164 págs., Thesaurus Editora tel. (61) 3344-3738). timento contrário, elas utilizam meios mais discretos, mas
não menos prejudiciais. “É preciso reconhecer que as garo-
Consequências para o aluno que é alvo de bullying. tas também sentem raiva. A agressividade é natural no ser
O aluno que sofre bullying, principalmente quando humano, mas elas são forçadas a encontrar outros meios
não pede ajuda, enfrenta medo e vergonha de ir à escola. - além dos físicos - para se expressar”, diz Rachel.
Pode querer abandonar os estudos, não se achar bom para  O que fazer em sala de aula quando se identifica um
integrar o grupo e apresentar baixo rendimento. caso de bullying?
Uma pesquisa da Associação Brasileira Multiprofissio- Ao surgir uma situação em sala, a intervenção deve ser
nal de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia) revela imediata. “Se algo ocorre e o professor se omite ou até
que 41,6% das vítimas nunca procuraram ajuda ou falaram mesmo dá uma risadinha por causa de uma piada ou de
sobre o problema, nem mesmo com os colegas. um comentário, vai pelo caminho errado. Ele deve ser o
primeiro a mostrar respeito e dar o exemplo”, diz Aramis
As vítimas chegam a concordar com a agressão, de Lopes Neto, presidente do Departamento Científico de Se-
acordo com Luciene Tognetta, doutora em Psicologia Es- gurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasi-
colar e pesquisadora da Faculdade de Educação da Uni- leira de Pediatria.
versidade Estadual de Campinhas (Unicamp). O discurso O professor pode identificar os atores do bullying:
deles segue no seguinte sentido: “Se sou gorda, por que autores, espectadores e alvos. Claro que existem as brin-
vou dizer o contrário?” cadeiras entre colegas no ambiente escolar. Mas é neces-
Aqueles que conseguem reagir podem alternar mo- sário distinguir o limiar entre uma piada aceitável e uma
mentos de ansiedade e agressividade. Para mostrar que agressão. “Isso não é tão difícil como parece. Basta que o
não são covardes ou quando percebem que seus agresso- professor se coloque no lugar da vítima. O apelido é engra-
res ficaram impunes, os alvos podem escolher outras pes- çado? Mas como eu me sentiria se fosse chamado assim?”,
soas mais indefesas e passam a provocá-las, tornando-se orienta o pediatra Lauro Monteiro Filho.
alvo e agressor ao mesmo tempo.
Veja os conselhos dos especialistas Cléo Fante e José
Bullying com agressão física e o bullying com agres- Augusto Pedra, autores do livro Bullying Escolar (132 págs.,
são moral. Ed. Artmed, tel; 0800 703 3444):
Ambas as agressões são graves e causam danos ao • Incentivar a solidariedade, a generosidade e o res-
alvo do bullying. Por ter consequências imediatas e facil- peito às diferenças por meio de conversas, campanhas de
mente visíveis, a violência física muitas vezes é considerada incentivo à paz e à tolerância, trabalhos didáticos, como
mais grave do que um xingamento ou uma fofoca. atividades de cooperação e interpretação de diferentes pa-
‘’A dificuldade que a escola encontra é justamente por- péis em um conflito;
que o professor também vê uma blusa rasgada ou um ma- • Desenvolver em sala de aula um ambiente favorá-
terial furtado como algo concreto. Não percebe que uma vel à comunicação entre alunos;

33
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

• Quando um estudante reclamar de algo ou denun-  O que fazer para evitar o bullying?
ciar o bullying, procurar imediatamente a direção da escola. A Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à
Infância e Adolescência (Abrapia) sugere as seguintes ati-
 O papel do professor em conflitos fora da sala de tudes para um ambiente saudável na escola:
aula. • Conversar com os alunos e escutar atentamente
O professor é um exemplo fundamental de pessoa que reclamações ou sugestões;
não resolve conflitos com a violência. Não adianta, po- • Estimular os estudantes a informar os casos;
rém, pensar que o bullying só é problema dos educadores • Reconhecer e valorizar as atitudes da garotada no
quando ocorre do portão para dentro. É papel da escola combate ao problema;
construir uma comunidade na qual todas as relações são • Criar com os estudantes regras de disciplina para a
respeitosas. classe em coerência com o regimento escolar;
‘’Deve-se conscientizar os pais e os alunos sobre os • Estimular lideranças positivas entre os alunos, pre-
efeitos das agressões fora do ambiente escolar, como na venindo futuros casos;
internet, por exemplo’’, explica Adriana Ramos, pesquisa- • Interferir diretamente nos grupos, o quanto antes,
dora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e para quebrar a dinâmica do bullying.
coordenadora do curso de pós-graduação ‘’As relações in- Todo ambiente escolar pode apresentar esse proble-
terpessoais na escola e a construção da autonomia moral’’, ma. “A escola que afirma não ter bullying ou não sabe o
da Universidade de Franca (Unifran). que é ou está negando sua existência”, diz o pediatra Lauro
‘’A intervenção da escola também precisa chegar ao Monteiro Filho, fundador da Associação Brasileira Multi-
espectador, o agente que aplaude a ação do autor é fun- profissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abra-
damental para a ocorrência da agressão’’, complementa a pia). O primeiro passo é admitir que a escola é um local
especialista. passível de bullying. É necessário também informar profes-
  sores e alunos sobre o que é o problema e deixar claro que
O professor também é alvo de bullying?
o estabelecimento não admitirá a prática.
Conceitualmente, não, pois, para ser considerada
bullying, é necessário que a violência ocorra entre pares,
“A escola não deve ser apenas um local de ensino for-
como colegas de classe ou de trabalho. O professor pode,
mal, mas também de formação cidadã, de direitos e de-
então, sofrer outros tipos de agressão, como injúria ou di-
veres, amizade, cooperação e solidariedade. Agir contra o
famação ou até física, por parte de um ou mais alunos.
bullying é uma forma barata e eficiente de diminuir a vio-
lência entre estudantes e na sociedade”, afirma o pediatra.
Mesmo não sendo entendida como bullying, trata-se
de uma situação que exige a reflexão sobre o convívio en-  Como agir com os alunos envolvidos em um caso de
tre membros da comunidade escolar. Quando as agressões bullying?
ocorrem, o problema está na escola como um todo. Em O foco deve se voltar para a recuperação de valores
uma reunião com os educadores, pode-se descobrir se a essenciais, como o respeito pelo que o alvo sentiu ao sofrer
violência está acontecendo com outras pessoas da equipe a violência. A escola não pode legitimar a atuação do autor
para intervir e restabelecer as noções de respeito. da agressão nem humilhá-lo ou puni-lo com medidas não
relacionadas ao mal causado, como proibi-lo de frequentar
Se for uma questão pontual, com um professor ape- o intervalo.
nas, é necessário refletir sobre a relação entre o docente
e o aluno ou a classe. ‘’O jovem que faz esse tipo de coisa Já o alvo precisa ter a autoestima fortalecida e sentir
normalmente quer expor uma relação com o professor que que está em um lugar seguro para falar sobre o ocorrido.
não está bem. Existem comunidades na internet, por exem- “Às vezes, quando o aluno resolve conversar, não recebe
plo, que homenageiam os docentes. Então, se o aluno se a atenção necessária, pois a escola não acha o problema
sente respeitado pelo professor, qual o motivo de agredi- grave e deixa passar”, alerta Aramis Lopes, presidente do
-lo?’’, questiona Adriana Ramos, pesquisadora da Univer- Departamento Científico de Segurança da Criança e do
sidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria.
do curso de pós-graduação “As relações interpessoais na
escola e a construção da autonomia moral”, da Universida- Ainda é preciso conscientizar o espectador do bullying,
de de Franca (Unifran). que endossa a ação do autor. ‘’Trazer para a aula situações
hipotéticas, como realizar atividades com trocas de pa-
O professor é uma autoridade na sala de aula, mas essa péis,  são ações que ajudam a conscientizar toda a turma.
autoridade só é legitimada com o reconhecimento dos alu- A exibição de filmes que retratam o bullying, como ‘’As
nos em uma relação de respeito mútua. ‘’O jovem está em melhores coisas do mundo’’ (Brasil, 2010), da cineasta Laís
processo de formação e o educador é o adulto do conflito Bodanzky, também ajudam no trabalho. A partir do mo-
e precisa reagir com dignidade’’, afirma Telma Vinha, dou- mento em que a escola fala com quem assiste à violên-
tora em Psicologia Educacional e professora da Faculdade cia, ele para de aplaudir e o autor perde sua fama’’, explica
de Educação da Unicamp. Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade Estadual de

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso de pós-gra- Mais agressões ou ações impulsivas entre os envolvi-
duação ‘’As relações interpessoais na escola e a construção dos podem ser evitadas com espaços para diálogo. Uma
da autonomia moral’’, da Universidade de Franca (Unifran). conversa individual com cada um funciona como um de-
Bullying contra alunos com deficiência sabafo e é função do educador mostrar que ninguém está
Conversar abertamente sobre a deficiência é uma ação desamparado.
que deve ser cotidiana na escola. O bullying contra esse ‘’Os alunos e os pais têm a sensação de impotência e
público costuma ser estimulado pela falta de conhecimen- a escola não pode deixá-los abandonados. É mais fácil res-
to sobre as deficiências, sejam elas físicas ou intelectuais, e, ponsabilizar a família, mas isso não contribui para a resolu-
em boa parte, pelo preconceito trazido de casa.  ção de um conflito’’, diz Telma Vinha, doutora em Psicolo-
gia Educacional e professora da Faculdade de Educação da
De acordo com a psicóloga Sônia Casarin, diretora do Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
S.O.S. Down - Serviço de Orientação sobre Síndrome de
A especialista também aponta que a conversa em con-
Down, em São Paulo, é normal os alunos reagirem nega-
junto, com todos os envolvidos, não pode ser feita em tom
tivamente diante de uma situação desconhecida. Cabe ao
de acusação. ‘’Deve-se pensar em maneiras de mostrar
educador estabelecer limites para essas reações e buscar
como o alvo do bullying se sente com a agressão e chegar
erradicá-las não pela imposição, mas por meio da cons-
a um acordo em conjunto. E, depois de alguns dias, vale
cientização e do esclarecimento.
perguntar novamente como está a relação entre os envol-
vidos’’, explica Telma.
Não se trata de estabelecer vítimas e culpados quando
o assunto é o bullying. Isso só reforça uma situação po- É também essencial que o trabalho de conscientização
larizada e não ajuda em nada a resolução dos conflitos. seja feito também com os espectadores do bullying, aque-
Melhor do que apenas culpar um aluno e vitimar o outro les que endossam a agressão e os que a assistem passiva-
é desatar os nós da tensão por meio do diálogo. A violên- mente. Sem que a plateia entenda quão nociva a violência
cia começa em tirar do aluno com deficiência o direito de pode ser, ela se repetirá em outras ocasiões.
ser um participante do processo de aprendizagem. É tarefa  
dos educadores oferecer um ambiente propício para que Bullying na Educação Infantil.
todos, especialmente os que têm deficiência, se desenvol- Se houver a intenção de ferir ou humilhar o colega re-
vam. Com respeito e harmonia. petidas vezes caracteriza-se o bullying. Entre as crianças
 Como deve ser uma conversa com os pais dos alunos menores, é comum que as brigas estejam relacionadas às
envolvidos no bullying? disputas de território, de posse ou de atenção - o que não
É preciso mediar a conversa e evitar o tom de acu- caracteriza o bullying. No entanto, por exemplo, se uma
sação de ambos os lados. Esse tipo de abordagem não criança apresentar alguma particularidade, como não con-
mostra como o outro se sente ao sofrer bullying. Deve ser seguir segurar o xixi, e os colegas a segregarem por isso ou
sinalizado aos pais que alguns comentários simples, que darem apelidos para ofendê-la constantemente, trata-se
julgam inofensivos e divertidos, são carregados de ideias de um caso de bullying.
preconceituosas. “Estudos na Psicologia afirmam que, por volta dos dois
‘’O ideal é que a questão da reparação da violência anos de idade, há uma primeira tomada de consciência de
passe por um acordo conjunto entre os envolvidos, no qual ‘quem eu sou’, separada de outros objetos, como a mãe.
todos consigam enxergar em que ponto o alvo foi agre- E perto dos três anos, as crianças começam a se iden-
tificar como um indivíduo diferente do outro, sendo pos-
dido para, assim, restaurar a relação de respeito’’ explica
sível que uma criança seja alvo ou vítima de bullying. Essa
Telma Vinha, professora do Departamento de Psicologia
conduta, porém, será mais frequentes num momento em
Educacional da Faculdade de Educação da Universidade
que houver uma maior relação entre pares, mais cotidia-
Estadual de Campinas (Unicamp).
na’’, explica Adriana Ramos, pesquisadora da Universidade
Muitas vezes, a escola trata de forma inadequada os Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do curso
casos relatados por pais e alunos, responsabilizando a fa- de pós-graduação As relações interpessoais na escola e a
mília pelo problema. É papel dos educadores sempre dia- construção da autonomia moral”, da Universidade de Fran-
logar com os pais sobre os conflitos - seja o filho alvo ou ca (Unifran).
autor do bullying, pois ambos precisam de ajuda e apoio  Quais são as especificidades para lidar com o bullying
psicológico. na Educação Infantil?
 O que fazer em casos extremos de bullying? Para evitar o bullying, é preciso que a escola valide os
A primeira ação deve ser mostrar aos envolvidos que a princípios de respeito desde cedo. É comum que as crian-
escola não tolera determinado tipo de conduta e por quê. ças menores briguem com o argumento de não gostar uma
Nesse encontro, deve-se abordar a questão da tolerância das outras, mas o educador precisa apontar que todos de-
ao diferente e do respeito por todos, inclusive com os pais vem ser respeitados, independentemente de se dar bem
dos alunos envolvidos. ou não com uma pessoa, para que essa ideia não persista
durante o desenvolvimento da criança.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

 Bullying virtual ou cyberbullying estamos regredindo ao ponto de uma criança da 4º série


É o bullying que ocorre em meios eletrônicos, com  não saber ler e escrever, contribuindo para o alto índice
mensagens difamatórias ou ameaçadoras circulando de analfabetos no Brasil. Jovens estão concluindo o ciclo
por e-mails, sites, blogs (os diários virtuais), redes so- de aprendizagem sem ter uma identidade, ou seja, são en-
ciais e celulares. É quase uma extensão do que os alunos golidos pela sociedade capitalista que exige cada vez mais
dizem e fazem na escola, mas com o agravante de que as qualificação para preencher uma vaga de trabalho.
pessoas envolvidas não estão cara a cara. O mundo atual, com tantas mudanças e novas deman-
Dessa forma, o anonimato pode aumentar a crueldade das, exige, dos indivíduos, habilidades e atitudes diferen-
dos comentários e das ameaças e os efeitos podem ser tão tes das observadas em épocas anteriores. Surgem alguns
graves ou piores. “O autor, assim como o alvo, tem dificul- questionamentos, de qual seria o papel da Escola hoje,
dade de sair de seu papel e retomar valores esquecidos ou como instrumento de Ensino e de que forma a mesma uti-
formar novos”, explica Luciene Tognetta, doutora em Psico- liza métodos para levar este conhecimento aos alunos. Sa-
logia Escolar e pesquisadora do Departamento de Psicolo- ber equilibrar a aceleração global, o aprender dos alunos e
gia Educacional da Faculdade de Educação da Universidade a satisfação dos professores é uma tarefa que nasce neste
Estadual de Campinhas (Unicamp). contexto novo. 
1 – A Função da Escola
Esse tormento que é a agressão pela internet faz com A Escola é um dos lugares socialmente instituídos para
que a criança e o adolescente humilhados não se sintam a criança se inserir na cultura urbana, para que se relacione
mais seguros em lugar algum, em momento algum. Marce- com o outro e com o conhecimento. É parte de uma di-
lo Coutinho, especialista no tema e professor da Fundação nâmica, onde o sujeito organiza e interpreta suas relações
Getulio Vargas (FGV), diz que esses estudantes não perce- com o mundo interno e externo. É nela que aprendemos,
bem as armadilhas dos relacionamentos digitais. “Para eles, a ler e a escrever, dois objetos socioculturais fundamentais
é tudo real, como se fosse do jeito tradicional, tanto para numa sociedade letrada. Não ler e escrever, hoje, significa
fazer amigos como para comprar, aprender ou combinar não dispor dos instrumentos básicos para inserção e parti-
um passeio.”
cipação social, para a constituição da cidadania.
 
A Escola tem um papel realmente importante na vida
Como lidar com o cyberbullying?
de uma pessoa porque é na Escola começa a ter uma Edu-
. Trabalhar com a ideia de que nem sempre se conse-
cação profissional de qualidade e também é por ela que
gue apagar aquilo que foi para a rede dá à turma a noção
todo mundo começa a formar a sua própria opinião e as-
de como as piadas ou as provocações não são inofensivas.
sim poder tomar decisões por contar própria sem contar
‘’O que chamam de brincadeira pode destruir a vida do
outro. É também responsabilidade da escola abrir espaço que a Escola é responsável por formar profissionais para
para discutir o fenômeno’’, afirma Telma Vinha, doutora em o mercado de trabalho. Por meio dela os jovens podem
Psicologia Educacional e professora da Faculdade de Edu- decidir qual vai ser o seu futuro.
cação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ela se situa de forma cada vez mais evidente em meio
Caso o bullying ocorra, é preciso deixar evidente para a um interesse de classes distintas com necessidades dis-
crianças e adolescentes que eles podem confiar nos adul- tintas. É vista com vários olhos, tanto como objeto educa-
tos que os cercam para contar sobre os casos sem medo de cional quanto um refúgio. Muitos pais pensam que a Escola
represálias, como a proibição de redes sociais ou celulares, se torna um meio de estar se livrando dos seus filhos e
uma vez que terão a certeza de que vão encontrar ajuda. querem a Escola dêem a Educação adequada para eles. A
‘’Mas, muitas vezes, as crianças não recorrem aos adultos incoerência social da Escola é fruto da Incoerência social da
porque acham que o problema só vai piorar com a inter- Sociedade, frutos da ganância e ambição de muitos.
venção punitiva’’, explica a especialista.15 Como função social a Escola é um local onde visa a
Papel da escola inserção do cidadão na sociedade, através da interelação
Desde sua criação a Escola tem um papel fundamental pessoal e da capacitação para atuar no grupo que convive.
na sociedade, o qual seu objetivo era doutrinar o proces- Forma cidadãos críticos e bem informados, em condições
so de desenvolvimento educacional das crianças até a fase de compreender e atuar no mundo em que vive.
adulta, a fim de se criar uma rotina regrada, alienada e sub- “É na Escola que se constrói parte da identidade de
missa aos padrões estabelecidos por entidades privadas. ser e pertencer ao mundo; nela adquirem-se os modelos
E com isso, se adequar facilmente ao ambiente industrial. de aprendizagem, a aquisição de princípios éticos e morais
Ao longo desse tempo, foram usado diversos mode- que permeiam a sociedade; na Escola depositam-se expec-
los de ensino, desde a inserção de matérias específicas à tativas, bem como as dúvidas, inseguranças e perspectivas
manifestações e reformas constitucional até chegar aos em relação ao futuro e às suas próprias potencialidades”.
moldes usados hoje, tanto de Escolas publicas como em (BORSA, 2007, pª 02).
instituições privadas, de ensino fundamental I e II, médio A Escola tem um compromisso com a Educação, de-
e técnico. O que parece ser um processo de evolução é na vendo atuar forma abrangente, não só tendo como objeti-
verdade um declínio da formação intelectual da sociedade vo a instrução. Deve manter uma visão holística, procuran-
15 Fonte: www.novaescola.org.br do avaliar, para melhorar, todos os aspetos dos quais o ser

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

humano é constituído. Deve prover os indivíduos não só, consciência critica e cidadã, capaz de identificar as forças
nem principalmente, de conhecimentos, idéias, habilidades de opressão que estão ao seu redor. O professor desenvol-
e capacidades formais, mas também, de disposições, ati- ve maior autoridade sobre o seu próprio trabalho e pen-
tudes, interesses e pautas de comportamento. Assim,  tem samento.
como objetivo básico a socialização dos alunos para prepa- 2.1 – A Educação segundo os Grandes Pensadores.  
rá-los para sua incorporação no mundo do trabalho e que Platão (427 – 347 a.C.). O objetivo final da Educação era
se incorporem à vida adulta e pública. a formação do homem moral, vivendo em um Estado justo.
A Escola não foi inventada nem para o aluno, nem para Aristóteles (384 – 322 a.C.). Cabe a Educação a forma-
o professor, nem para o político, nem para o pedagogo, ção do caráter do aluno.
nem para o sociólogo. A Escola foi inventada para que os Jean – Jacques Rousseau (1712 – 1778). A reforma da
que não sabem possam aprender com os que sabem. Ou educação é que possibilitaria uma reforma do sistema polí-
seja, para o Ensino. tico e social. A educação não somente mudaria as pessoas
A possibilidade de formar o cidadão para o mercado de
particulares, mas também a toda a sociedade, pois trata-se
trabalho e para a vida está diretamente ligada à freqüência
de educar o cidadão para que ele ajude a forjar uma nova
Escolar, à superação das exigências impostas nas institui-
sociedade.
ções, às adaptações aos ritos de passagem. Portanto, as
Johann Heinrich Pestalozzi (1746 – 1827). A escola
Escolas contribuem para que as sociedades se perpetuem,
idealizada por Pestalozzi deveria ser não só uma extensão
pois transmitem valores morais que integram as socieda-
des. Mas elas também podem exercer um papel decisivo do lar, como inspirar-se no ambiente familiar, para oferecer
nas mudanças sociais. uma atmosfera de segurança e afeto.
2 - A formação do aluno Johann Friedrich Herbart (1776 – 1841). Em Herbart, o
A educação contemporânea não deve se limitar a formar processo educativo se baseia, em seus objetivos e meios,
alunos para dominar determinados conteúdos, mas sim que na Ética e na Psicologia, respectivamente. A principal fun-
saibam pensar, refletir, propor soluções sobre problemas e ção da educação em uma sociedade é a aquisição de idéias
questões atuais, trabalhar e cooperar uns com os outros. A por parte dos alunos.
escola deve favorecer a formação de seres críticos e partici- Karl Marx (1818-1883). Via na função da Escola a tarefa
pativos, conscientes de seu papel nas mudanças sociais. de preparar os alunos para a vida política e social do seu
A Escola deve passar aos alunos uma visão panorâmi- país. É um ideal revolucionário que contribuiu para forma-
ca sobre o mundo em que vivemos, devemos aprender na ção de “monstros” sociais como o comunismo soviético.
Escola uma visão global de todas as ciências que envolve Émile Durkheim (1858-1917). Ensinar o aluno a cultu-
o conhecimento do universo com astronomia, geografia, ra daquela sociedade em que ele vive, educando-o para o
botânica, zoologia, química, física, línguas, matemática. trabalho e pregar a moral daquele grupo. A Escola deve
A Escola também deve preparar o aluno para o con- disciplinar o homem para a vida.
vívio com outros humanos, ensinando-os a arte da tole- Karl Mannheim (1893-1947). A Escola existe em uma
rância, dos limites sociais, do direito, das regras sociais de visão conservadora para ensinar sobre temas importantes,
convivência, do princípio da hierarquia. preparar o aluno para a vida e para uma carreira profissio-
O conhecimento produzido pela humanidade traduz- nal, estimulando-o no desempenho das suas tarefas.
-se, na Escola, nas diferentes disciplinas (História, Geogra- John Dewey (1859 – 1952). A Escola é um espaço onde
fia, Ciências, Línguas) e deve receber um tratamento didá- as pessoas se encontram para educar e ser educadas. O
tico adequado para que possa ser assimilado, entendido e objetivo da Escola deveria ser ensinar a criança a viver no
recriado pelos alunos. mundo. A Escola deve proporcionar práticas conjuntas pro-
Educar uma pessoa que já é educada torna-se uma
mover situações de cooperação, em vez de lidar com as
tarefa árdua, porque, no momento em que uma criança
crianças de forma isolada.
chega à sala de aula, já é portadora de certos conhecimen-
Maria Montessori (1870 – 1952). Os princípios funda-
tos que adquiriu junto a sua comunidade. Transformar e/
mentais do sistema Montessori são: a atividade, a indivi-
ou acrescentar mais conhecimentos é a tarefa do profissio-
dualidade e a liberdade. Enfatizando os aspectos bioló-
nal da Educação que trabalha com esse indivíduo. Isso se
torna difícil, pois apenas se faz o papel de mediador, não gicos, pois, considerando que a vida é desenvolvimento,
de transformador de conhecimentos. A criança apenas irá achava que era função de educação favorecer esse desen-
complementar sua sabedoria. volvimento.  Os estímulos externos formariam o espírito da
Uma escola deve favorecer a formação de cidadãos criança, precisando, portanto ser determinados. 
conscientes e atuantes, possibilitar o desenvolvimento da Alexander Neill (1883 – 1973). A criança tinha a possibi-
capacidade de pensar, raciocinar, descobrir e resolver pro- lidade de escolher e decidir o que aprender e como apren-
blemas, de forma envolvente e que possibilite a satisfação der, respeitando seu ritmo e interesse.
interna de seus alunos. Célestin Freinet (1896 – 1966): Por acreditar que o inte-
Alunos e professores ao pesquisarem em conjunto resse da criança não estava na Escola e sim fora dela, Frei-
aprendem a criticar, a ver mais claramente, a pensarem net idealizou uma atividade (aula – passeio) com o objetivo
em um nível mais elevado. O aluno pode desenvolver uma de trazer motivação, ação e vida para a Escola.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Jean Piaget (1896 – 1980). A Escola deve partir dos es- É preciso ser revisto nas escolas, é a falta condição ne-
quemas de assimilação da criança, propondo atividades cessária para um ambiente harmonioso, condições neces-
desafiadoras que provoquem desequilíbrios e reequilibra- sárias para o desenvolvimento de um projeto pedagógico
ções sucessivas, promovendo a descoberta e a constru- capaz de lidar com os novos desafios da educação, da glo-
ção do conhecimento. A Escola tem um papel essencial balização e tecnologia.
na construção desse ser; ela deveria dirigir o ensino não O aluno deve sair da sala de aula com alguma bagagem
para etapas intelectuais já alcançadas, mas sim, para eta- para a sua vida, a contribuição do educador é mostrar o ca-
pas ainda não alcançadas pelos alunos, funcionando como minho, pois tudo o que o ser humano é na vida tem a ver
incentivadora de novas conquistas, do desenvolvimento com que aprende na escola que não é apenas de transmitir
potencial do aluno. conhecimentos numerosos ao aluno, mas principalmente
Lev Vygotsky (1896 – 1934). A Escola é o lugar onde de criar nele um estado interior e profundo, uma espécie
a intervenção pedagógica intencional desencadeia o pro- de polaridade de espírito que oriente em sentido definido,
cesso ensino-aprendizagem. É preciso que a Escola e seus não apenas durante a infância, mas por toda a vida. 16
educadores atentem que não tem como função ensinar Escolha da profissão
aquilo que o aluno pode aprender por si mesmo e sim, Ao longo da vida escolar, principalmente no ensino
potencializar o processo de aprendizagem do estudante. médio, os alunos têm um único objetivo: a escolha de uma
A função da Escola é fazer com que os conceitos espontâ- profissão.
neos, informais, que as crianças adquirem na convivência Alguns estudantes crescem determinados desde a in-
social, evoluam para o nível dos conceitos científicos, siste- fância, sabendo em que irão trabalhar, mas muitos, em ra-
máticos e formais, adquiridos pelo ensino. zão da pouca idade e experiência de vida, não conseguem
Anísio Teixeira (1900 – 1971). A escola é local propício definir o caminho a seguir.
para a construção desta consciência social. Nela o indiví- Realmente não é uma decisão fácil, mas algumas ati-
duo adquire valores; nela há condições para formar o ser tudes podem ajudar, o fundamental é conhecer as diversas
social. profissões existentes no mercado, bem como especializa-
Paulo freire (1921 – 1997). Propõe uma pratica de sala ções, ou seja, as diferentes opções que existem.
de aula que pudesse desenvolver a criticidade dos alunos. Para isso, buscar informações sobre uma profissão, não
Edgar Morin (1921 -). O papel da Escola passa pela por- só no que diz respeito ao exercício da mesma, mas como
ta do conhecimento. É ajudar o ser que está em formação está o mercado de trabalho, a faixa salarial para o profis-
a viver, a encarar a vida. O papel da educação é de ensi- sional que a exerce, o campo de atuação profissional, como
nar a enfrentar a incerteza da vida; é de ensinar o que é a mesma é aceita e inserida na sociedade, é fundamental.
o conhecimento, instruir o espírito a viver e a enfrentar as Cada escolha até mesmo aquelas que parecem não ter
dificuldades do mundo. importância, implica em consequências na existência de
Emília Ferreiro (1936 -). Implantou os mecanismos cog- qualquer pessoa. Por isso, é fundamental que toda esco-
nitivos relacionado à leitura e à escrita. Segunda ela o de- lha seja realizada conscientemente porque ela irá definir o
senvolvimento da leitura e da escrita começa muito antes futuro. Cada vez que uma escolha é feita, o caminho está
da escolarização. sendo redefinido.
A escola precisa ser escola, e assim se tornar um lugar Cada decisão tomada é capaz de te aproximar ou te
de desenvolvimento humano, de humanização. A escola afastar do que você deseja. O futuro é consequência das
deve ser uma referência de esperança. A violência no am- escolhas realizadas no presente e por essa razão, é funda-
biente escolar ganhou evidência. Falta de limites, agressão, mental refletir quais são os aspectos que motivam a sua
falta de valores humanos, omissão com os estudos, ausên- escolha. Qualquer decisão envolve uma certa dificuldade e
cia de interesse em saber. A escola tem uma grande impor- escolher uma profissão é um tanto complicado no contex-
tância na vida do aluno, levando-o a desvendar que têm to atual, já que nos deparamos com diversas opções e um
direitos e deveres a exercer. mercado de trabalho tão dinâmico.
Quase todos os alunos reclamam porque são obriga-   A profissão é um aspecto de grande importância na
dos a vir à escola, desconhecendo ou rompendo com o vida de qualquer pessoa, visto o tempo e energia que são
reconhecimento de sua importância. Nela o aluno tem o investidos ao exercê-la, influenciar no desenvolvimento so-
tempo de brincar, escrever, desenvolver aptidões e habili- cial e pessoal, como também está diretamente relacionado
dades que um dia servirão para uma futura profissão. Es- ao desempenho e satisfação no trabalho. A escolha da pro-
cola e aluno são ligados uns ao outro; só existe escola se fissão supera em importância qualquer outra decisão que
houver alunos. Se os alunos são parte do problema, devem a pessoa faz durante a vida, porque essa escolha impacta o
ser parte da solução. ambiente de vida, as possibilidades internas e externas de
Os novos desafios, os paradoxos do progresso, as no- desenvolvimento e crescimento, posição social, nível cultu-
vas formas de trabalho, de organização social, as drogas, ral, futuros ganhos materiais e até mesmo a duração de sua
a violência, a exclusão, as diferenças sociais, a preservação saúde. É uma decisão que vai afetar a vida de uma pessoa
do meio ambiente, são problemas que exigem novas solu- em todos os aspectos. Escolher a profissão faz parte de um
ções e muito mais empenho da educação. 16 Fonte: www.webartigos.com – Por Jaime Roberto Thomaz

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

projeto de vida, que de certo modo vai determinar o estilo  Invista em autoconhecimento
de vida, a educação e até mesmo as pessoas que ele terá Quais são suas habilidades, seus valores, sua missão,
que conviver no trabalho e na sociedade. seus interesses, suas características pessoais, seus pontos
 De acordo com Mello (2003) no livro “O Desafio da Es- fortes e fracos?  É por meio do autoconhecimento que você
colha Profissional”, geralmente, a pessoa que faz a escolha pode desenvolver aspirações profissionais realistas e com-
da profissão é quase sempre um adolescente ou um adul- patíveis com o seu perfil e ter satisfação na sua atuação
to jovem, ou seja, alguém que ainda não está consciente profissional. Vamos aos exemplos: se você é uma pessoa
e maduro – psicológica, emocional e socialmente – para muito comunicativa é pouco provável que você goste de
atuar numa profissão que não tenha interação com outras
uma decisão responsável e criteriosa que não diz respeito
pessoas ou ainda, se você não é uma pessoa detalhista vai
só a escolha da profissão, mas também a sua vida futura e
gostar de trabalhar analisando dados.
as consequências das decisões tomadas. Ou seja, escolher
Pesquise sobre o mercado de trabalho
uma profissão se trata de uma árdua tarefa da juventude, Quais as áreas mais promissoras? Um estudo recente
onde o jovem além de lidar com as angústias pessoais vi- da Fundação for Young Australians FYA divulgou o relatório
venciadas durante essa fase, se depara com uma sociedade The New Work Order, no qual aponta que: “mais de 60%
globalizada que impõe um mercado de trabalho em mu- estudantes Australianos estão aprendendo profissões que
dança constante, aumentando ainda mais a dificuldade da deixarão de existir devido aos avanços tecnológicos e auto-
definição profissional. Durante esse processo, o jovem está mação, a probabilidade é que esses jovens serão afetados
muito inseguro não só por temer o futuro tão incerto, lidar radicalmente pela automação nos próximos 10 a 15 anos.”
com tantas pressões, mas com medo de fracassar. O jovem Tenha certeza que aqui no Brasil não será muito diferente.
ao se deparar com a escolha da profissão, não está levando Busque informações sobre as profissões
em consideração apenas seus interesses e aptidões, mas O  que é? O que faz? Como faz? Quais competências
também a maneira como percebe o mundo, como ela pró- são exigidas para exercer a profissão? Quais as áreas de
pria se vê, as informações que possui sobre as profissões, atuação?
as influências externas do meio social e principalmente, da Converse com profissionais da (s) área (s) que desperta-
família. Toda escolha por mais banal que pareça ser, envol- ram interesse para entender os desafios atrelados a profissão
ve alguns conflitos que são basicamente estimulados pelas É válido ressaltar que toda profissão tem seus aspectos
emoções, interesses, desejos e valores. E escolher uma pro- positivos e negativos, seus encantos e desafios. Caminhos
perfeitos não existem!
fissão de forma satisfatória leva em conta não só os dese-
Escolha a profissão que você mais se identifica
jos, capacidades, aptidões e aspirações desse jovem como
Depois de fazer algumas reflexões sobre si mesmo e
também a compreensão das limitações e dificuldades que
ter conhecimento das profissões e mercado de trabalho,
ele possui. analise que profissões mais se adaptam as suas caracterís-
Infelizmente, muitas vezes o jovem é levado ou por ticas pessoais e faça a sua escolha. É muito comum ouvir-
que não dizer “obrigado” a tomar uma decisão precipitada mos das pessoas mais próximas: isso dá dinheiro? Exceto
em relação a sua escolha profissional devido a pressão da o trabalho voluntário que te dá outras recompensas, toda
família (normalmente, os pais dão muitos palpites e criam profissão tem remuneração, portanto TODA profissão dá
expectativas que muitas vezes até contrariam a decisão/ dinheiro (pode ser pouco, mas te dá). Então, consideran-
expectativa dessa pessoa), conveniências sociais, estrutura do que você tem que dedicar uma parte significativa da
inadequada do sistema e da estrutura educacional porque sua vida trabalhando é recompensador fazer aquilo que
não está suficientemente maduro para tal escolha. Falta à se gosta e/ou se identifica e entender o retorno financeiro
esse jovem conhecimentos realistas sobre si próprio e em como consequência do seu trabalho.
outros casos também, falta tempo útil para decidir com cal- “Os dois dias mais importantes da sua vida são: o dia
ma e mesmo diante desse cenário turbulento, essa pessoa em que você nasceu e o dia em que você descobre o por-
terá que decidir o rumo que irá seguir profissionalmente. quê.” (Mark Twai)17
Sem dúvida, trata-se de um momento muito desafiador.
Por que? Porque simplesmente, lhe faltam informações Transtornos alimentares na adolescência
básicas para escolher adequadamente sua profissão e Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), en-
tende-se por distúrbio ou transtorno alimentar qualquer
qualquer passo errado pode implicar em perda de: tem-
alteração do comportamento alimentar que pode provocar
po, dinheiro, esforços oportunidades e causar uma gran-
prejuízos à saúde de um indivíduo. Estas alterações podem
de frustração. É óbvio que não se pode garantir o sucesso,
dever-se a fatores metabólicos ou psicológicos.
mas a pessoa precisa ao menos se assegurar das melhores
chances para alcançá-lo. Transtornos alimentares (TA) constituem quadros psi-
Compreendendo o mega desafio que é escolher uma quiátricos que se caracterizam por alterações de compor-
profissão, selecionamos algumas ações que podem te aju- tamento alimentar e podem estar associados à morbimor-
dar a tomar essa decisão: talidade, podendo ocasionar desde prejuízos emocionais e
17 Fonte: www.inspirandojovens.com.br

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

sociais até consequências fisiopatológicas relacionadas aos anos 13, não existindo dados estatísticos para o Brasil. A
sistemas metabólico e endócrino. Dentre os transtornos bulimia nervosa é mais comum, com prevalência entre 1 e 2%
alimentares mais conhecidos, destacam-se a Anorexia e a entre meninas jovens, sendo que em relação ao sexo ocor-
Bulimia Nervosa (SALZANO et al., 2011). re em uma proporção de 10:1 em favor do sexo feminino
(CROW, 2009; AALTO-SETALA et al., 2001; WALDMAN, 1998).
A anorexia nervosa é conceituada como inanição deli-
berada e auto-imposta e atitude psicopatológica distorcida
No Brasil, os estudos que avaliaram comportamento
em relação à imagem, à alimentação e ao peso, caracteri-
de risco também acharam prevalências preocupantes. O
zada de uma implacável busca de magreza e por um medo
único estudo nacional de base populacional é o de Nunes
mórbido de engordar, levando a sérios graus de emagreci-
mento (MANUAL DIAGNÓSTICO E ESTATÍSTICO DE TRANS- et al. (2003), que avaliou uma amostra representativa de
TORNOS MENTAIS, 2002; CASTRO et al.,1995). mulheres de Porto Alegre por meio do Teste de Atitudes
Alimentares (EAT-26) e do Teste de Investigação Bulímica
Já na Bulimia Nervosa, as características essenciais con- de Edinburgo (BITE), encontrando 16,5% da população
sistem em eventos recorrentes de ingestão compulsiva de com sintomas de TA, segundo o EAT-26, e 2,9%, segundo
grande quantidade de alimentos, seguidas do uso de mé- o BITE. Avaliando 1.807 crianças e adolescentes de 7 a 19
todos compensatórios inadequados para evitar o ganho de anos, em Minas Gerais, Vilela et al. encontraram 13,3% com
peso como condutas purgativas (autoindução de vômitos sintomas de TA, segundo o EAT-26, e 1,1%, segundo o BITE
ou uso indiscriminado de laxantes, diuréticos, inibidores de (VILELLA et al., 2004; NUNES et al., 2003).
apetite ou enemas) ou não purgativas (jejuns e exercícios
físicos excessivos) (HUSE et al., 2003). O DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual, IV edi-
tion) define que a idade média para o início da Anorexia
Os transtornos alimentares Anorexia Nervosa e Bulimia
nervosa é de 17 anos, com alguns picos aos 14 e aos 18
Nervosa compartilham aspectos psicopatológicos comuns,
anos. O inicio do transtorno raramente ocorre em mulheres
entre eles a preocupação com o peso e a imagem corpo-
ral, bem como o medo de engordar. Essa ideia leva os pa- com mais de 40 anos. Já a Bulimia Nervosa, também se-
cientes a se engajarem em dietas restritivas e a utilizarem gundo o DSM-IV começa no final da adolescência ou inicio
métodos inapropriados para alcançar um corpo idealizado. da vida adulta (TASSIANA et al., 2010).
Logo, os pacientes têm um controle considerado patológi-
co do peso corporal, associado a distúrbios da percepção Os adolescentes são o principal alvo para o desenvolvi-
do formato de seus corpos, induzindo a um comportamen- mento dos Transtornos Alimentares. A adolescência é uma
to alimentar seriamente perturbado (CLAUDINO, 2002; fase de transição entre criança e idade adulta, extrema-
SAIKALI, 2004). mente conturbada onde o mesmo irá lidar com conflitos
de identidade e adaptações até mesmo comportamentais,
Dos transtornos alimentares estudados, a Anorexia nesse momento pode-se começar ou intensificar a preocu-
Nervosa foi a primeira a ser descrita já no século XIX e, pação com a estética corporal, medo de engordar ou o de-
igualmente, a pioneira a ser adequadamente classificada sejo de emagrecer. Por esse episódio ser bastante sensível
e ter critérios operacionais reconhecidos já na década de
ao surgimento da desordem, pode-se tornar um desequilí-
1970. Historicamente os Transtornos Alimentares causa-
brio exacerbado resultando em um transtorno influenciado
vam curiosidade tanto nos médicos como na população
por não conseguirem ter um entendimento maior do que por vários fatores biopsicossociais. O tratamento é muito
aconteciam com essas jovens mulheres (CORDAS, 2002). impreciso, pois os transtornos envolvem o emocional do
indivíduo e abrange os agravos decorrentes da doença, ne-
Atualmente, tem-se discutido a grande influência dos cessitando da intervenção multiprofissional, que são fun-
fatores socioculturais que impõem um ideal de beleza as- damentais para a reestruturação psicológica do indivíduo,
sociado ao culto às dietas com restrição de energia e ao levando-o a superar fatores sociais, culturais, biológicos
corpo esquálido, como gatilhos no desenvolvimento dos que levaram à origem da desordem.
transtornos alimentares, porém apesar de ainda desconhe-
cida, sabe-se que a etiologia dos transtornos alimentares O elevado número de adolescentes realizando práticas
traz em sua gênese uma associação de fatores sociais, psi- alimentares inadequadas ressalta a atenção que este tema
cológicos e biológicos. requer da comunidade acadêmica, reafirmando-o como
questão emergente no cenário sanitário brasileiro. Por ser
A prevalência dos TA está entre mulheres jovens, afe-
um tema relevante, o presente estudo tem o objetivo iden-
tando 3,2% daquelas entre 18 e 30 anos. As taxas de pre-
tificar através da literatura os principais transtornos da ali-
valência de TA, dependendo do quadro – síndromes com-
mentação na adolescência.
pletas ou parciais –, variam de 0,5% a 5%. A prevalência da
anorexia e bulimia nervosas têm aumentado nos últimos

40
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Alguns sinais e sintomas de um distúrbio alimentar Devido aos complexos aspectos biopsicológicos que
podem ser: envolvem os transtornos alimentares em adolescentes, a
• Recusa constante em comer  abordagem e o acompanhamento dessas condições pro-
• Esta negação perante certos alimentos pode indiciar duzem melhores resultados quando conduzidos por equi-
uma possível alteração do comportamento alimentar, po- pe multidisciplinar, que conte com médico, nutricionista,
dendo chegar a consequências mais graves. Observe o seu enfermeira, psicólogo e psiquiatra com experiência na
filho e repare se essas recusas são cada vez mais frequentes. avaliação e tratamento de adolescentes com distúrbios ali-
• Preocupação/obsessão pelo corpo e imagem corporal  mentares, incluindo dinâmica familiar. Educadores físicos
• Repare se o seu filho começa subtilmente a mu- e terapeutas ocupacionais podem ser bastante úteis para
dar a forma de vestir (optar por vestuário cada vez mais complementar o tratamento.
largo, por exemplo) ou se de repente começa a não querer
olhar-se ao espelho por não gostar do que vê. É importante Devem ser avaliados vários níveis de tratamento, de-
entender como e quando começaram estas atitudes de re- pendendo das características clínicas e da gravidade do
jeição do próprio corpo, normalmente associadas a fatores caso (ambulatorial, intensivo, internado em hospital, par-
sociais e emocionais. cialmente internado ou tratamento residencial). Os fatores
• Episódios recorrentes de compulsão alimentar  que justificam internação de adolescentes com transtornos
• Normalmente estas situações de voracidade ali- alimentares estão listados na Tabela 1.
mentar são seguidas de atitudes de indução de vómito e/
ou uso de fármacos como laxantes e diuréticos, de forma Devido às taxas de recaída, recorrências, “crossover”
a tentar “compensar” a ingestão exagerada de tantas calo- (mudanças de anorexia nervosa para bulimia nervosa ou
rias. Tenha atenção se o seu filho começa a passar muito vice-versa) e comorbidades, o tratamento deve ter fre-
tempo na casa de banho, fechado e imediatamente após quência, intensidade e duração suficientes para prover in-
as refeições. tervenção efetiva.
• Dores de garganta ou problemas de dentição 
• No caso da bulimia nervosa é recorrente relata- Avaliação da saúde mental é fundamental para o tra-
rem-se casos de problemas graves do trato esofágico devi- tamento de adolescentes com transtornos alimentares. O
do à constante indução de vómito. Os dentes também são tratamento pode ser necessário durante anos seguidos. Es-
drasticamente afetados devido à erosão provocada pelo tudos publicados suportam evidências de que o tratamen-
suco gástrico dos vómitos. to baseado na relação familiar é eficaz para adolescentes e
• Lesão da pele do dorso da mão ou calos nas mãos  foi publicado um manual que descreve tal método. A tera-
• A indução frequente do vómito (levar a mão à pia cognitivo comportamental é usada em adultos com AN,
boca) provoca o aparecimento de calosidades e ulceração, porém há escassez de estudos em adolescentes. Existem,
denominado de “Sinal de Russel”. ainda, evidências de que alguns antidepressivos, como o
• Esconder comida  cloridrato de fluoxetina, podem ser úteis para reduzir o ris-
• Um adolescente com um distúrbio alimentar, seja co de recaídas dos sintomas em adolescentes mais velhos,
ele qual for, tem a necessidade de esconder alimentos por portadores de AN, nos quais o peso foi restabelecido.
variadas razões. No caso da anorexia nervosa ocorre escon-
derem alimentos e, simplesmente, nunca os ingerir. Enquan- O tratamento mais eficaz para adolescentes mais ve-
to na bulimia nervosa esses alimentos escondidos (maiorita- lhos com BN é a terapia cognitivo comportamental focada
riamente hipercalóricos) são acumulados e consumidos mais na mudança de atitudes alimentares específicas e com-
tarde, de forma desmedida. Na obesidade também se veri- portamentos que perpetuam o distúrbio alimentar. Anti-
fica esta situação de esconder alimentos ou mentir/omitir o depressivos mostraram ser efetivos na redução do comer
que realmente se consome ao longo do dia. compulsivo e de comportamentos purgativos em 50% a
75% dos casos. Além disso, psicoterapia individual, assim
Tratamento como terapia comportamental têm mostrado alguns be-
nefícios em adolescentes bulímicos. O uso de medicação
O tratamento deve ser individualizado, de acordo com também pode ser útil em adolescentes mais velhos, com
as características e necessidades de cada paciente. A pri- sintomas de depressão ou TOC.
meira prioridade é melhorar o estado clínico e diminuir os
riscos para a saúde física. A reabilitação nutricional é um O tratamento da osteopenia associado à anorexia
objetivo primário, porém, devido à relação alterada com a ainda não está resolvido, mas a conduta atual recomen-
comida, normalmente esses pacientes dizem que não pre- da incluir recuperação do peso corporal e volta dos ciclos
cisam de nutricionista. O objetivo do profissional é ajudar a menstruais, cálcio (1300 a 1.500 mg/dia), vitamina D (400
voltar a um peso normal, através de hábitos saudáveis, sus- Ul/dia) e exercícios cuidadosos de musculação. Apesar de
pender o uso de laxantes e diuréticos, traçar metas realistas se prescrever reposição hormonal, frequentemente, para
e saudáveis em relação à alimentação e exercícios e ajudar tratar a osteopenia, não há estudos prospectivos suficien-
a reconhecer pensamentos em relação à comida e peso, tes que demonstrem sua eficácia, além de poder acelerar o
além de mostrar o risco que tais comportamentos podem fechamento de cartilagem de crescimento e comprometer
trazer para a saúde. a estatura final.

41
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O uso de drogas antipsicóticas atípicas, devido à como o bem mais importante de qualquer sociedade.
sua propensão a levar a ganho de peso, assim como suas Escola – instituição social que tem o encargo de edu-
propriedades ansiolíticas, tem sido considerado potencial- car, segundo planos sistemáticos, os indivíduos nas dife-
mente útil. Dados publicados a partir de pequenos estudos rentes idades da sua formação, casa ou estabelecimento
feitos em adultos com AN tomando olanzapina ainda são onde se ministra o ensino.
inconsistentes. Estudo recente examinando a risperidona Escola é uma instituição educativa fundamental onde
(dose média de 3 mg durante média de três semanas) em são organizadas, sistematicamente, atividades práticas de
41 adolescentes com AN não mostrou benefício. O uso de carácter pedagógico.
medicações para tratar comorbidades (ansiedade, depres- Para Gary Marx, (in Azevedo, 1994,p.147) a escola é
são) parece útil em alguns casos. verdadeiramente uma instituição de último recurso, após
a família,
Vale ressaltar as comobidades entre os transtornos do comunidade e a igreja terem fracassado.
comportamento no adolescente. Por exemplo, anorexia Comunidade é um conjunto de pessoas que vive num
nervosa e bulimia estão frequentemente associadas a de- determinado lugar e ligado por um ideal e objetivos comuns.
pressão, abuso de substâncias e transtornos do déficit de Participação – de acordo com a etimologia da palavra,
atenção/ hiperatividade. participação origina-se do latim “participatio” (pars + in + ac-
Além disso, com o crescente aumento da prevalência tio) que ignifica ter parte na ação. Para ter parte na ação é ne-
de obesidade entre crianças e adolescentes aumentou o cessário ter acesso ao agir e às decisões que orientam o agir. “
número de indicações de cirurgia bariátrica como opção Executar uma ação não significa ter parte, ou seja, res-
terapêutica. Os episódios de compulsão e purgação au- ponsabilidade sobre a ação. E só será sujeito da ação quem
toinduzida ocorrem em 5% a 30% dos adolescentes obe- puder decidir sobre ela”
sos que procuram cirurgia, o que reforça a necessidade de A participação é «um modo de vida» que permite re-
seguimento próximo e com equipe multidisciplinar, já que solver favoravelmente a tensão sempre existente entre o
esta não é uma contraindicação absoluta. individual e o coletivo, a pessoa e o grupo, na organização.
Reverter um quadro de transtorno alimentar geralmen-
A participação deve ser vista como um processo per-
te requer tratamento físico e psicológico. Algumas vezes,
manente de estabelecer um equilíbrio dinâmico entre: a
uma internação é necessária para estabilizar o paciente an-
autoridade delegada do poder central ou local na escola;
tes que o tratamento comece.
as competências profissionais dos professores (enquanto
Herpertz-Dahlmann (2009) afirma que o primeiro pas-
especialistas do ensino) e de outros trabalhadores não do-
so é o reconhecimento pelo adolescente de seu transtorno
centes; os direitos dos alunos enquanto «autores» do seu
alimentar e os problemas psicológicos que o permeiam.
próprio crescimento; e a responsabilidade dos pais na edu-
Tanto ele como a família devem ser informados sobre as
cação dos seus filhos.19
consequências e riscos à saúde, e as opções terapêuticas
Considerando que toda criança faz parte de uma fa-
devem ser discutidas em detalhe. Uma relação de confian-
ça, sem julgamentos, entre todos os profissionais da equi- mília e que toda família, além de possuir características
pe de saúde e o paciente é necessária para o sucesso do próprias, está inserida em uma comunidade, hoje, ambas,
tratamento.18 família e comunidade, estão incumbidas, juntamente com
a escola, da formação de um mesmo cidadão, portanto são
Família peças fundamentais no processo educativo e, porque não,
na elaboração do projeto pedagógico da escola e na ges-
Sendo a escola uma instituição organizada e integrada tão da mesma.
na comunidade, ela deve desempenhar uma função pró-    Quando a escola recebe os educandos, de onde eles
-ativa de súbita importância na formação, transformação e vêm? Quem os encaminha? Eles vêm de uma sociedade, de
desenvolvimento do capital social. uma  família, e os pais e responsáveis realizam seu encami-
Pensar a escola de hoje é refletir a sociedade nas ver- nhamento.
tentes social, económico e pessoal.      Não são os educandos seres viventes em um núcleo
A relação escola, família e comunidade carece de me- familiar e social, onde recebem orientação moral, vivenciam
lhoria, pois constata-se quase que um divórcio entre elas. experiências e reforçam seus conhecimentos? Tudo isso é
As escolas, muitas vezes, não fomentam nem facilitam o in- educação. Para estabelecer uma educação moral, crítica e
tercâmbio de experiências com outras escolas e com o meio comprometida com o meio social, é primordial a integração
em que estão inseridas, não promovem a procura de solu- entre escola, família e sociedade. Pois, o ser humano é um
ções inovadoras, nem proporcionam uma participação efe- ser social por excelência. Podemos pensar na responsabili-
tiva dos pais e encarregados de educação na gestão escolar. dade da escola na vida de uma pessoa. E ainda, partindo
Escola é a principal instituição para a transmissão e desse princípio, é um equívoco desvincular a família no pro-
aquisição de conhecimentos, valores e habilidades, por isso cesso da educação escolar. A escola vem reforçar os valores
deve ser tida recebidos em casa, além de transmitir conhecimentos. Age
18 Fonte: www.portaleducacao.com.br/www.moreirajr.com.br/ também na formação humana, salientando a autonomia, o
www.portoeditora.pt/Joana Nogueira 19 http://www.portaldoconhecimento.gov.cv

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

equilíbrio e a liberdade - que está condicionada a limites e e morais sem precedentes. Essa é uma constatação que
respeito mútuo. Por que não, a escola trabalhar com a famí- norteia os arredores dos setores educacionais, pois é na
lia e a sociedade em prol de um bem comum? escola que essa crise pode aflorar mais, ficando em maior
A parceria entre família, sociedade e escola só tem a evidência.
contribuir para o desenvolvimento do educando. Assim, a Nesse sentido, A LDB – Lei de Diretrizes e Bases da
escola passa a ser um espaço que se relaciona com a vida e Educação ( lei 9394, de dezembro de 1996) formaliza e ins-
não uma ilha, que se isola da sociedade. Com a participação titui a gestão democrática nas escolas e vai além. Dentre
da família no meio escolar, cria-se espaços de escuta, voz algumas conquistas destacam-se:
e acesso às informações que dizem respeito a seus filhos, A concepção de educação, concepção ampla, estenden-
responsáveis tanto pela materialidade da escola, bem como do a educação para além da educação escolar, ou seja, com-
pelo ambiente no qual seus filhos estão inseridos. É preciso prometimento com a formação do caráter do educando.
que os pais se impliquem nos processos educativos de seus Nunca na escola se discutiu tanto quanto hoje assun-
filhos no sentido de motivá-los afetivamente ao aprendiza- tos como falta de limites, desrespeito na sala de aula e des-
do. O aprendizado formal ou a educação escolar, para ser motivação dos alunos. Nunca se observou tantos professo-
bem sucedida não depende apenas de uma boa escola, de res cansados e muitas vezes, doentes física e mentalmente.
bons professores e bons programas, mas principalmente de Nunca os sentimentos de impotência e frustração estive-
como o educando é tratado na sociedade e em casa e dos ram tão marcantemente presentes na vida escolar.
estímulos que recebe para aprender. É preciso entender que Por essa razão, dentro das escolas as discussões que
o aprender é um processo contínuo que não cessa quando procuram compreender esse quadro tão complexo e, mui-
ele está em casa. Qualquer gesto, palavra ou ação positi- tas vezes, caótico, no qual a educação se encontra mergu-
va de qualquer membro da sociedade ou da  família pode lhada, são cada vez mais frequentes. Professores debatem
motivá-la, porém, qualquer palavra ou ação que tenha uma formas de tentar superar todas essas dificuldades e confli-
conotação negativa pode gerar um bloqueio no aprendiza- tos, pois percebem que se nada for feito em breve não se
do. É claro que, como qualquer ser humano, ele precisa de conseguirá mais ensinar e educar.
limites, e que não pode fazer tudo que quiser, porém os limi- Entretanto, observa-se que, até o momento, essas dis-
tes devem ser dados de maneira clara, sem o uso de palavras cussões vêm sendo realizadas apenas dentro do âmbito da
rudes, que agridam ou desqualifiquem-no. escola, basicamente envolvendo direções, coordenações e
     Uma pessoa agredida, com palavras ou ações, além grupos de professores. Em outras palavras, a escola vem,
de aprender a agredir, perde uma boa parte da motiva- gradativamente, assumindo a maior parte da responsabili-
ção para aprender, pois seus sentimentos em relação a si dade pelas situações de conflito que nela são observadas.
mesma e aos outros ficam confusos, tornando-a insegu- Assim, procuram-se novas metodologias de trabalho,
ra com relação às suas capacidades, e consequentemente muitos projetos são lançados e inúmeros recursos também
gerando uma baixa autoestima. Outro aspecto que mere- lançados pelo governo no sentido de não deixar que o alu-
ce ser lembrado é o que se refere à comparação com ou- no deixe de estudar. Porém, observa-se que se não houver
tros irmãos que foram bem sucedidos; os pais ou respon- um comprometimento maior dos responsáveis e das insti-
sáveis devem evitar a comparação, pois cada um é único e tuições escolares isso pouco adiantará.
tem seu próprio ritmo de aprendizado e sua maneira sin-
gular de ver o mundo e a sociedade em que esta inserido. Escolhas sexuais.
      É preciso ainda ressaltar que o conhecimento e o aprendi- Em nossa cultura a informação relativa à sexualidade
zado não são adquiridos somente nos bancos escolares, mas e sua valorização são frequentemente recebidas distorci-
é construído pelo contato com o social, dentro da família, e das durante o processo de socialização. Muitas vezes as
no mundo ao seu redor. Fazer do aprendizado um prazer é normas neste campo são contraditórias e confusas e, no
tarefa não só dos professores, mas também, de pais, da so- ser humano, a sexualidade se combina com outros fatores
ciedade e de qualquer profissional interessado no bem-estar psicológicos não estritamente sexuais, como a visão que
de quem aprende.20 alguém tem de si mesmo, a valoração de outros neste ter-
Pensar em educação de qualidade hoje, é preciso ter reno, etc.
em mente que a família esteja presente na vida escolar de Compreende-se, portanto, que o comportamento se-
todos os alunos em todos os sentidos. Ou seja, é preciso xual humano vem determinado tanto por fatores biológi-
uma interação entre escola e família. Nesse sentido, escola cos como culturais. Daí que, “para ser completa e eficaz,
e família possuem uma grande tarefa, pois nelas é que se principalmente quando faz parte de um programa educa-
formam os primeiros grupos sociais de uma criança. cional, a educação sexual deve abranger tanto o compo-
Envolver os familiares na elaboração da proposta pe- nente informativo quanto o formativo” (FIGUEIRÓ, 2006).
dagógica pode ser a meta da escola que pretende ter um É clara em nossa sociedade a existência de uma divisão
equilíbrio no que diz respeito à disciplina de seus educan- de atitudes segundo o sexo. A sexualidade, assim entendi-
dos. A sociedade moderna vive uma crise de valores éticos da, não é apenas um componente a mais da personalidade,
20 Texto adaptado de Claudia Puget Ferreira / Fabiola Carma- mas a forma geral em que o indivíduo se manifesta perante
nhanes Anequim / Valéria Cristina P.Alves Bino

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

si mesmo e perante outros, o que mostra a existência de A complexidade do tema fez com que muitos estu-
um perigo real de transtornar o desenvolvimento e matu- diosos (NUNES, 1987; CABRAL (1999); FOUCAULT (1990);
ração normal da sexualidade de um indivíduo. Durante o CHAUÍ (1985), entre inúmeros outros, se debruçassem so-
processo de socialização podem gerar-se atividades inade- bre o assunto sugerindo, cada qual, um conceito próprio,
quadas, temores, insatisfações e desconcerto que alterem ora único, ora semelhante aos demais, sobre o sexo e a
o desenvolvimento e amadurecimento integral e sadio da sexualidade humana.
pessoa, dando lugar a condutas sexuais desajustadas.
É exatamente este aspecto da educação sexual que, Definindo Sexo e Sexualidade
conforme Egypto (2003, p. 9), ainda assusta principalmen- Sexo é coisa muito simples. Eu explico os essenciais em
te os profissionais da educação, pois trabalhar a sexua- poucas linhas. [...]. Pra se entender o sexo há de se entender
lidade com os alunos exige “revisão de conceitos, supe- a música que ele toca. [...] A música que o corpo quer tocar
ração de preconceitos e estereótipos, um olhar reflexivo se chama prazer. [...]. Os instrumentos da orquestra-corpo
sobre a própria sexualidade, lidar com tabus, medos, ver- são os seus órgãos [...] todos têm uma utilidade. Além disso,
gonha [...]”. esses mesmos órgãos e membros são lugares de prazer. [...]
O sexo, dentro do contexto biológico, tem por finali- Entre os órgãos da orquestra-corpo estão os órgãos sexuais.
dade a perpetuação das espécies. É por isso que o impulso Não há nada de especial que os distinga dos outros. Como
sexual é algo tão forte. Conforme a citação constante no os demais órgãos eles são fontes de prazer. Os prazeres do
Livro de Gênesis (Bíblia Sagrada, Gn. 1.22,28), a energia se- sexo são variados. Vão desde uma sensação muito suave
xual é a energia biológica mais poderosa que existe, pois é que mais parece uma coceira de bicho-de-pé e que chega
a única energia natural capaz de gerar Vida. a provocar riso, até um prazer enorme, explosão vulcânica,
Conforme coloca Focault (1990), a espécie humana é que tem o nome de orgasmo, e que deixa aqueles que por
a única que usa o sexo não só para procriar, mas como ele passaram semimortos. [...]. Mas eles anunciam o fim da
fonte de prazer, expressão de amor e, até, como uma for- brincadeira. [...] Complicados são os pensamentos dos seres
ma de poder. Comumente, na sociedade ocidental ele (o humanos sobre ele (o sexo). Os homens por razões que não
sexo) aparece coberto por tabus, como algo vergonhoso, entendo, passaram a considerar o sexo uma coisa vergonho-
impuro, feio, proibidos, e vários outros sinônimos total- sa (ALVES, 1999, p. 91-6).
mente opostos ao sentido de brincadeira que lhe atribui Nunes (1987) afirma que, enquanto aquisição evolutiva
Alves (1999). do ser humano – pertencente ao Reino Animal - o sexo
Porém, por ser inerente ao ser humano, sua interdição limita-se às características genitais. Porém, a espécie huma-
nada mais faz além de instigar a curiosidade sobre tudo o na apresenta a sexualidade, uma qualidade cultural e signi-
que diz respeito à sexualidade. ficativa do sexo, construída desde a infância, sendo o sexo
A sociedade capitalista usa este desejo de saber como genital um parâmetro para a formação pessoal e social da
uma estratégia que lhe garante um controle social sem criança, muito além da manifestação instintiva.
precedentes. Foucault em suas teses elucida esta estratégia Por se tratar de uma construção socio-histórica,
afirmando que a sociedade capitalista não obriga o sexo a abordar a questão da sexualidade exige uma reflexão
silenciar-se; contrariamente, incita sua manifestação, abrin- sobre a forma como os desejos, sentimentos, sensações,
do espaço para a exposição de opiniões, pensamentos e concepções de variadas instâncias sociais moldam os re-
atitudes (REIS, 1992). lacionamentos.
Nas relações de poder, a sexualidade não é o elemento Sendo assim, refletir sobre sexualidade implica primei-
mais rígido, mas um dos dotados da maior instrumentali- ro, refletir sobre si mesmo, para buscar entender o outro
dade; utilizável no maior número de manobras, e podendo em suas dimensões diversificadas. Sendo assim, “a sexua-
servir de ponto de apoio, de articulação às mais variadas lidade supõe mais do que corpos, nela estão envolvidos
estratégias (FOUCAULT, 1990, p. 98). fantasias, valores, linguagens, rituais, comportamentos, re-
Foucault (1990) salienta que a vontade de saber sobre presentações mobilizados ou postos em ação para expres-
a própria sexualidade se torna artifício básico de controle sar desejos e prazeres” (LOURO, 2007, p.209).
disciplinar da população, pois os dispositivos saber-poder Dessa forma, por se tratar de algo cultural e socialmen-
são exercidos de forma ampla. O poder estando em tudo, te construído, não é estática e definida, mas mutável e plu-
principalmente no próprio homem, faz com que o mesmo ral (LOURO 1997; FIGUEIRÓ, 2009). A sexualidade humana,
busque o autocontrole para conter sua sexualidade e a assim, compreende um conjunto de fenômenos biológicos,
dos seus. psicológicos e sociológicos de grande importância para a
Para o autor, o conceito de sexualidade, diante de tal pessoa e para a sociedade, estando vinculada à afetividade
realidade, não pode se limitar à racionalidade, ou a expli- e aos valores, sua esfera vai além da função reprodutora e
cações mecânicas, simplistas, inadequadas à compreensão da mera genitalidade ficando englobada no âmbito mais
da realidade. Tal concepção requer reflexões que transpas- amplo do erotismo.
sem os aspectos biológicos que, ainda nos tempos atuais, Assim entendido, é relevante esclarecer que numa
constituem-se como fundamento das informações exausti- concepção biológica, o sexo constitui apenas um dos
vamente fornecidas aos sujeitos. aspectos que permeiam a sexualidade humana, e sendo

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

assim configura-se um reducionismo a abordagem em de- instintiva expressa de acordo com o desenvolvimento e nor-
terminismos biológicos para justificar preconceitos, mitos e malidade psicossexual, com parâmetros socioculturais do lu-
tabus que foram criados histórica e socialmente em torno gar e época em que vivemos. Tem caráter modificável, plás-
desse tema. tico, permutante. Envolve personalidade, maturidade física e
Daí que segundo Nunes (1987) tratar de sexualidade psicológica e a formação (SOUZA, 2007, p. 415-6).
na escola requer domínio prévio de uma concepção cientí- Destaca-se, do exposto que, as concepções sobre sexo
fica e humanista da mesma, sobrepujando o senso comum e sexualidade podem variar de acordo com a sociedade, a
- estágio elementar da cognição social - com abordagem história, o grupo social e as diversas ciências humanas que
histórica e cultural da sexualidade humana, abalizada por se relacionam ao ramo que a estuda, daí a importância de
uma minuciosa compreensão científica do desenvolvimen- um resgate histórico da sexualidade, em especial no mun-
to psicológico e sexual do sujeito. do ocidental.
Na mesma ótica Cabral (1999), ao manifestar-se sobre
sexo, expõe a visão sócio-construtivista de que o indivíduo, A escola, o professor e a educação sexual
por nunca estar pronto ou acabado, inclusive biologica- Nesta produção alinha-se ao pensamento de Figuei-
mente, sofre constantes influências dos costumes do meio ró (1996, apud FIGUEIRÓ, 2009), que a orientação sexual,
em que vive, sendo, portanto, produto do ambiente e da conforme proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais/
cultura. PCN (BRASIL, 1999), refere-se mais especificamente sobre
Também Chauí (1985) reitera que a sexualidade é uma a sexualidade do indivíduo em relação à sua identidade se-
elaboração histórica, que tem sua manifestação social de xual, que vai sendo construída ao longo da infância, e como
acordo com o ambiente em que se formaram suas raízes. a pessoa se comporta ao longo de sua vida e, sendo assim,
Nesse sentido Foucault (1990) conceitua o sexo como deve ser trabalhada pautada na pluralidade, que deve ser
uma manifestação física ligada ao uso do sistema repro- desenvolvida nas escolas. Daí ser relevante esclarecer que
dutor, com fim único de procriação. As demais manifesta- aqui, com base em diversos autores/as (VITIELLO, 1994; SU-
ções, tais como: o beijo, a carícia, o olhar, o pensamento, PLICY et al, 2004; FIGUEIRÓ, 2009, entre outros), adota-se
o sonho, o desejo, estariam na área da sexualidade, uma o termo Educação Sexual ao invés de Orientação Sexual
qualidade global do homem. devido ao sentido mais amplo e para não haver confusão
Acrescenta, ainda: com a orientação do desejo afetivo-sexual.
O sexo, esta instância que parece dominar-nos, esse se- [...] o próprio termo educação sexual é mais adequa-
gredo que nos parece subjacente a tudo o que somos, esse do, na medida em que se abre espaço para que a pessoa
ponto que nos fascina pelo poder que manifesta e pelo sen- que aprende seja considerada sujeito ativo do processo de
tido que oculta, ao qual pedimos revelar o que somos e li- aprendizagem e não mero receptor de conhecimentos e/
berar-nos o que nos define, o sexo nada mais é do que um ou de orientações, como sugerem as outras terminologias:
ponto ideal tornado necessário pelo dispositivo de sexuali- orientação, informação , instrução. [...] A educação sexual
dade e por seu funcionamento. (...) O sexo é, ao contrário, o refere-se a toda ação ensinoaprendizagem sobre a sexua-
elemento mais especulativo, mais ideal e igualmente mais lidade humana, seja no nível do conhecimento de informa-
interior, num dispositivo de sexualidade que o poder orga- ções básicas, seja no nível do conhecimento e/ou discussões
niza em suas captações dos corpos, de sua materialidade, e reflexões sobre valores, normas, sentimentos, emoções e
de suas forças, suas energias, suas sensações, seus prazeres. atitudes relacionadas à vida sexual (FIGUEIRÓ, 2001, apud
(FOUCAULT, 1990, p. 145). FIGUEIRÓ, 2009, p. 37).
Para Bernardi (1985), a sexualidade é analisada, psico- Relevante do contexto que a adolescência é uma etapa
logicamente, como sendo multiforme polivalente e sím- fundamental no processo de crescimento e desenvolvimen-
bolo do desejo. O deleite sexual pode ser atingido sem o to humano, marcada por modificações físicas e compor-
contato genital, uma vez que qualquer região do corpo é tamentais influenciadas por fatores socioculturais e fami-
suscetível ao prazer sexual. A sexualidade difere do instin- liares (SOARES et al., 2008). A sexualidade, por seu lado, é
to, não objetivando o parceiro ou o coito. elemento constitutivo do sujeito adolescente, já que é um
Louro (1999), diz que a sexualidade não se restringe ao atributo inerente ao ser humano, que se manifesta indepen-
corpo, mas envolve o aspecto psíquico da pessoa, através dentemente de qualquer ensinamento. Sendo assim ela re-
de suas crenças, ideologias e imaginações, deixando de ser presenta a forma como o indivíduo se comporta, pensa ou
preocupação individual, devendo passar por uma investi- age. Faz parte da sua construção e expressão da personali-
gação e a uma análise histórica e sociológica cuidadosa, a dade, resultado da integração dos componentes biológico,
fim de atingir uma atmosfera crítica e política. psicológico, social e cultural (SOUSA; CAMURÇA, 2009).
Conceito interessante que ilustra adequadamente a di- Assim, segundo Osório (1992) na adolescência, por se
ferença entre os dois termos: tratar de um período onde está sendo finalizada a perso-
Sexo – é uma energia positiva que impulsiona a vida. nalidade do individuo aparece a maioria das dúvidas so-
É como a pessoa se percebe. Não é safadeza, sacanagem, bre sexualidade e é também nesse momento que a sexua-
órgão genital, nem atividade coital (transa). Sexualidade – é lidade se encaixa principalmente como fator estruturador
uma conduta adquirida, de base biológica, com sua fonte da sua identidade.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Nesse sentido, as modificações no comportamento A pergunta que nos vem à mente neste momento é:
que ocorrem no adolescente podem interferir no processo a escola e os educadores estão preparados para desem-
natural do seu desenvolvimento, fazendo com que ele sinta penhar tais funções? Em um mundo cheio de transforma-
necessidade de experimentar comportamentos que os dei- ções, nos questionamos se nossas funções, tais como as
xam mais vulneráveis a riscos para a sua saúde, inclusive no conhecemos (como pais e educadores), estão de acordo
aspecto da sexualidade (SOUZA et al, 2007). com a realidade social. Parece-nos fundamental a reavalia-
Esse é um período que exige muita atenção por parte ção desses conceitos e promover ações práticas que pos-
dos pais, profissionais de saúde e da escola, pois muitas sam suprir as necessidades educacionais e de orientação
vezes, os jovens não têm consciência dos problemas que nas escolas, pois,
uma relação sexual „inconsequente‟ pode acarretar. Assim, [...] Como parte da sociedade, reflete as suas transforma-
é clara a necessidade de abordar esse tema com os ado- ções. Nesse sentido, os movimentos sociais são um impor-
lescentes, buscando assegurar a a vivência responsável da tante vetor de abertura. Movimentos organizados em torno
sexualidade (VITIELLO, 1995) . de demandas da liberdade sexual, do direito à sexualidade,
Segundo Vitiello (1995) educar significa formar alguém, da igualdade de direito entre os sexos, promovem uma ação
proporcionando condições para que este cresça consciente sígnica considerável, no desmonte de mitos, na destruição de
e responsável pelos seus atos. A Educação para a sexualida- tabus, na ressignificação das práticas, na formatação de no-
de, nesse sentido, é ferramenta fundamental para subsidiar vas condutas, enfim na formação de uma consciência crítica
discussões sobre as práticas e comportamentos dos jovens da sexualidade como dimensão significativa da sociabilida-
em relação aos riscos que envolvem a sexualidade, além de e, por extensão, da prática pedagógica[...] A sexualidade,
de promover a prevenção de problemas futuros e propor- como fenômeno educativo, implica não apenas um esforço
cionar o conhecimento sobre o próprio corpo. Entretanto, de mudança pedagógica, mas um esforço de mudança cul-
a educação sexual não tem como finalidade apenas infor- tural. E essa mudança nem o professor, nem sua formação
mar, mas, também, desenvolver as habilidades necessárias dão conta dela exclusivamente, pois envolve um processo
à utilização dessas informações para o exercício saudável social e cultural em nível societário, em nível organizacional
de tudo que se relaciona ao corpo (FIGUEIRÓ, 2009). (CARVALHO, 2004, p. 7).
Entende-se do exposto, portanto, que educar vai além Se a invisibilidade é a forma dominante da sexualida-
do informar, especialmente quando se trata de educação de na escola, é importante buscar a visibilidade, alimentar
sexual. Educar é modificar atitudes, e para isso necessita-se a fogueira das discussões, num clima mais aberto, franco,
muito mais que apenas interar-se de tópicos sobre sexua- respeitoso e contínuo. Entendendo assim, a partir do es-
lidade. Todos os educadores consideram que a formação tudo, da pesquisa, do debate democrático da sexualidade
do indivíduo é o principal objetivo da educação. Quando humana, o professor será capaz de elaborar respostas às
se fala em formar, não se deseja que o educando seja uma suas próprias dúvidas, questionamentos e angústias.
cópia fiel de seu mestre ou de qualquer outro molde, alme- Os Adultos encontram sempre certa dificuldade na
ja-se dar condições e meios para que cresça interiormente. abordagem deste assunto, pois acabam por reproduzir pa-
Quando se fala em educação sexual se faz para um drões e concepções cristalizadas no seu convívio social, ao
fim determinado, existem objetivos a serem atingidos. É mesmo tempo, por ser um assunto tão fascinante e íntimo,
uma preparação para a vida, e deverá ser responsável pela encontramos muita dificuldade de determinar o quê, quan-
transmissão de conhecimentos que formem valores, atitu- do, onde e como conversar sobre ele.
des, e que o indivíduo possa expressar seus sentimentos e Quando se abrem as portas para as discussões, vários
a sua sexualidade de maneira livre, mas com responsabili- temas polêmicos podem fazer parte dos assuntos escolhi-
dade, respeitando a individualidade de cada um. Como em dos pelos jovens, entre eles as drogas, a sexualidade e a
outras áreas do conhecimento humano a sexualidade é um mídia, a virgindade, a AIDS, DST, o assédio sexual, gravidez
processo de aprendizagem contínua. precoce e outros tópicos de interesse que poderão emer-
Diante das reflexões efetivadas o papel da escola na gir. Tudo vai depender da postura do educador diante des-
questão da sexualidade passa a ser fundamental na medida sas indagações e é isto que fará a diferença.
em que grande parte do tempo do adolescente é concen- A partir do momento em que o professor evolui em
trado dentro dos „muros da educação‟. Os discursos sobre sua conduta, são frequentemente tomados por sentimento
sexualidade, aliados às transformações físicas que ocorrem de culpa que faz com que se mantenham os modelos exis-
principalmente na puberdade, geram dúvidas e angústias tentes onde são propostas referências ideais de comporta-
que podem ser respondidas e amenizadas com a discussão mentos e costumes.
da sexualidade humana e suas múltiplas influências nas di- Então como trabalhar este tema na escola? Segundo
ferentes fases da vida. Egypto (2003, p. 9) [...] Trabalhar com a questão da sexuali-
As tradicionais funções dos pais de iniciação à edu- dade com crianças e adolescentes exige revisão de conceitos,
cação de hábitos de higiene, alimentação, socialização, superação de preconceitos e estereótipos, um olhar reflexivo
orientação sexual e desenvolvimento da personalidade das sobre a própria sexualidade, lidar com tabus, medos, vergo-
crianças e dos jovens passam a ser responsabilidade, tam- nhas. Exige dedicação e estudo. Há também as dúvidas: e se
bém, dos educadores. me perguntarem coisas que eu não souber? O que vou dizer

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

sobre o sexo na adolescência? O aborto? A homossexualida- vas e técnicas mais ativas como psicodrama (dramatização
de? E o que os pais vão pensar? Como eles vão receber esse - mostrar assuntos através do teatro) para manter a aten-
trabalho. ção dos jovens e levá-los a pensar e discutir os assuntos
A importância da escola não está relacionada apenas também fora da escola.
no conteúdo pedagógico que transmite; vai muito além de Falar de educação sexual implica necessariamente falar de
outros aprendizados que não estão escritos nas propostas sexualidade. Além disso, qualquer trabalho de educação deve
pedagógicas de cada escola e que são requisitados pelo levar em consideração a perspectiva histórica sobre a questão.
adolescente em sua vida escolar. Neste sentido, no Brasil a educação sexual escolar surge
Ainda segundo CARVALHO (2004, p.8): marcadamente por práticas médico-higienistas influenciadas
É nesse sentido que este trabalho se orienta, colocan- pela medicina social surgida na Europa do século XVIII.
do-se como subsídio para a discussão da sexualidade na Sem dúvida que a força destas concepções não é a
escola, para trocas, colaborando - quem sabe - para avanços mesma daquele século XIX, porém elas estão ainda pre-
no entendimento e compreensão dessa problemática peda- sentes na escola, de uma forma ou de outra nos dias atuais.
gógica. Fundamental, portanto, é a conscientização dos pro- A escola ainda reforça os papéis sociais/sexuais, pune os
fessores no sentido do trabalhar com o inesperado, com o “delitos”, ensina e prescreve os preceitos da higiene de for-
desconhecido [...]. ma científica, entendendo que com esta atitude educativa
A adolescência é uma fase bastante peculiar e de pre- resolverá os “problemas de higiene” (sexual) individual dos
paração para a aquisição de um novo papel perante a fa- alunos, sem discutir as questões sócio-político-econômicas
mília e a sociedade ficando apta para usufruir sua sexuali- que os provocaram.21
dade, firmando sua identidade sexual e buscando um par,
já com a possibilidade de gerar filhos.
A sexualidade cerceia a vida de todas as pessoas des-
de o nascimento até a morte, através de inúmeras infor-
mações que recebemos a todo instante. Dessa forma es- 3. CURRÍCULO: PROPÓSITOS DA EDUCAÇÃO
tamos sempre sendo educados sexualmente, seja na rua, BÁSICA; OBJETIVOS EDUCACIONAIS;
em casa, com os amigos, em programas de televisão, em CONTEÚDOS: PROCEDIMENTAIS,
revistas, navegando na internet. Todas essas informações ATITUDINAIS, CONCEITUAIS E FACTUAIS.
trazem também uma série de ideias e valores a respeito
da sexualidade, o que nos permite considerá-la como um
processo de aprendizagem contínua, e que a educação se-
xual se refere a todas as formas de transmissão de valores Questões referentes ao currículo têm-se constituído
e informações sobre sexualidade, nas múltiplas e variadas em frequente alvo da atenção de autoridades, professores,
dimensões. gestores, pais, estudantes, membros da comunidade. Quais
O que se percebe é que as informações veiculadas nos as razões dessa preocupação tão nítida e tão persistente?
diversos meios de comunicação são por vezes contraditó- Será mesmo importante que nós, profissionais da edu-
rias, transmitindo ideias e mostrando modelos de compor- cação, acompanhemos toda essa discussão e nela nos en-
tamentos masculino e feminino confusos em termos se- volvamos? Não será suficiente deixarmos que as autorida-
xuais e sociais. des competentes tomem as devidas decisões sobre o que
Como lembra Egypto (2003, p.13): deve ser ensinado nas salas de aula?
Sempre fomos educados sexualmente, ainda que não Para examinarmos possíveis respostas a essas pergun-
pareça. E quando não falamos sobre sexo também estamos tas, talvez seja necessário esclarecer o que estamos en-
dizendo que sexo é uma coisa proibida, que não se fala dis- tendendo pela palavra currículo, tão familiar a todos que
so abertamente, que não é um assunto que caiba a escola. trabalhamos nas escolas e nos sistemas educacionais. Por
Estamos reprimindo, omitindo, mas, de alguma forma, esta- causa dessa familiaridade, talvez não dediquemos muito
mos educando as pessoas sexualmente. tempo a refletir sobre
Na perspectiva apresentada entende-se que a elabora- o sentido do termo, bastante frequente em conversas
ção de cursos, eventos, palestras e seminários sobre a se- nas escolas, palestras a que assistimos, textos acadêmicos,
xualidade e seus diferentes enfoques devem ser planejados notícias em jornais, discursos de nossas autoridades e pro-
com a participação dos profissionais, de pais, educadores e postas curriculares oficiais.
representantes estudantis. À palavra currículo associam-se distintas concepções,
O enfoque deve ser dado de acordo com o contexto que derivam dos diversos modos de como a educação é
social de cada região, respeitando-se as tradições locais e concebida historicamente, bem como das influências teó-
a idade do público alvo. Por exemplo, não adianta discutir ricas que a afetam e se fazem hegemônicas em um dado
inicialmente a anticoncepção com crianças que ainda não momento. Diferentes fatores sócio-econômicos, políticos e
sabem o básico da atividade sexual. Deve-se ter em mente culturais contribuem, assim, para que currículo venha a ser
uma atividade progressiva, didática, não agressiva e não entendido como:
preconceituosa. Usar material audiovisual, atividades criati- 21 Fonte: www.diaadiaeducacao.pr.gov.br

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

(a) os conteúdos a serem ensinados e aprendidos; Que consequências tais aspectos, sobre os quais mui-
(b) as experiências de aprendizagem escolares a serem tas vezes não pensamos, podem estar provocando nos alu-
vividas pelos alunos; nos? Não seria importante identificá-los e verificar como,
(c) os planos pedagógicos elaborados por professores, nas práticas de nossa escola, poderíamos estar contribuin-
escolas e sistemas educacionais; do para um currículo oculto capaz de oprimir alguns de
(d) os objetivos a serem alcançados por meio do pro- nossos(as) estudantes (por razões ligadas a classe social,
cesso de ensino; gênero, raça, sexualidade)?
(e) os processos de avaliação que terminam por influir Julgamos importante ressaltar que, qualquer que seja
nos conteúdos e nos procedimentos selecionados nos di- a concepção de currículo que adotamos, não parece haver
ferentes graus da escolarização. dúvidas quanto à sua importância no processo educati-
Sem pretender considerar qualquer uma dessas ou de vo escolar. Como essa importância se evidencia? Pode-se
outras concepções como certa ou como errada, já que elas afirmar que é por intermédio do currículo que as “coisas”
refletem variados posicionamentos, compromissos e pon- acontecem na escola. No currículo se sistematizam nossos
tos de vista teóricos, podemos afirmar que as discussões esforços pedagógicos.
sobre o currículo incorporam, com maior ou menor ênfa- O currículo é, em outras palavras, o coração da escola,
se, discussões sobre os conhecimentos escolares, sobre os o espaço central em que todos atuamos, o que nos torna,
procedimentos e as relações sociais que conformam o ce- nos diferentes níveis do processo educacional, responsá-
nário em que os conhecimentos se ensinam e se aprendem, veis por sua elaboração. O papel do educador no proces-
sobre as transformações que desejamos efetuar nos alunos so curricular é, assim, fundamental. Ele é um dos grandes
e alunas, sobre os valores que desejamos inculcar e sobre artífices, queira ou não, da construção dos currículos que
as identidades que pretendemos construir. Discussões so- se materializam nas escolas e nas salas de aula. Daí a ne-
bre conhecimento, verdade, poder e identidade marcam, cessidade de constantes discussões e reflexões, na escola,
invariavelmente, as discussões sobre questões curriculares sobre o currículo, tanto o currículo formalmente planejado
(Silva, 1999a). e desenvolvido quanto o currículo oculto. Daí nossa obri-
Como estamos concebendo, então, a palavra currículo gação, como profissionais da educação, de participar crítica
neste texto? Procurando resumir os aspectos acima men- e criativamente na elaboração de currículos mais atraentes,
cionados, estamos entendendo currículo como as expe- mais democráticos, mais fecundos.
riências escolares que se desdobram em torno do conheci- Nessas reflexões e discussões, podemos e devemos
mento, em meio a relações sociais, e que contribuem para recorrer aos documentos oficiais, como a Lei de Diretrizes
a construção das identidades de nossos/as estudantes. e Bases, as Diretrizes Curriculares Nacionais, as Propostas
Currículo associa-se, assim, ao conjunto de esforços peda- Curriculares Estaduais e Municipais.
gógicos desenvolvidos com intenções educativas. Neles encontraremos subsídios fundamentais para o
Por esse motivo, a palavra tem sido usada para todo e nosso trabalho. Podemos e devemos também recorrer aos
qualquer espaço organizado para afetar e educar pessoas, estudos que vêm sendo feitos, em nosso país, por pesqui-
o que explica o uso de expressões como o currículo da mí- sadores e estudiosos do campo. Tais estudos têm-se inten-
dia, o currículo da prisão etc. Nós, contudo, estamos em- sificado, principalmente a partir da década de 1990, têm
pregando a palavra currículo apenas para nos referirmos às sido apresentados em inúmeros congressos e seminários,
atividades organizadas por instituições escolares. Ou seja, bem como publicados em periódicos de expressiva circu-
para nos referirmos à escola. lação nacional.
Cabe destacar que a palavra currículo tem sido também Recentes análises desses estudos destacam como as
utilizada para indicar efeitos alcançados na escola, que não preocupações dos pesquisadores têm-se deslocado das
estão explicitados nos planos e nas propostas, não sendo relações entre currículo e conhecimento escolar para as
sempre, por isso, claramente percebidos pela comunidade relações entre currículo e cultura (Moreira, 2002a). Que as-
escolar. Trata-se do chamado currículo oculto, que envolve, pectos têm provocado essa virada? Por que o foco tão forte
dominantemente, atitudes e valores transmitidos, sublimi- em questões culturais? Resumidamente, cabe reconhecer,
narmente, pelas relações sociais e pelas rotinas do cotidia- hoje, a preponderância da esfera cultural na organização
no escolar. Fazem parte do currículo oculto, assim, rituais de nossa vida social, bem como na teoria social contem-
e práticas, relações hierárquicas, regras e procedimentos, porânea.
modos de organizar o espaço e o tempo na escola, modos Stuart Hall (1997, p.97), conhecido intelectual caribe-
de distribuir os alunos por grupamentos e turmas, mensa- nho radicado na Grã-Bretanha e um dos fundadores do
gens implícitas nas falas dos(as) professores(as) e nos livros centro de pesquisas que foi o berço dos Estudos Culturais,
didáticos. São exemplos de currículo oculto: a forma como na Universidade de Birmingham (Inglaterra), é especial-
a escola incentiva a criança a chamar a professora (tia, Fu- mente incisivo nessa perspectiva.
lana, Professora etc); a maneira como arrumamos as cartei- Por bem ou por mal, a cultura é agora um dos elementos
ras na sala de aula (em círculo ou alinhadas); as visões de mais dinâmicos – e mais imprevisíveis – da mudança his-
família que ainda se encontram em certos livros didáticos tórica no novo milênio. Não deve nos surpreender, então,
(restritas ou não à família tradicional de classe média). que as lutas pelo poder sejam, crescentemente, simbólicas

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

e discursivas, ao invés de tomar, simplesmente, uma forma necessárias para que isso aconteça. Relevância sugere co-
física e compulsiva, e que as próprias políticas assumam pro- nhecimentos e experiências que contribuam para formar
gressivamente a feição de uma política cultural. sujeitos autônomos, críticos e criativos que analisem como
Ainda, é inegável a pluralidade cultural do mundo em as coisas passaram a ser o que são e como fazer para que
que vivemos e que se manifesta, de forma impetuosa, em elas sejam diferentes do que hoje são (Avalos, 1992; Santos
todos os espaços sociais, inclusive nas escolas e nas salas e Moreira, 1995).
de aula. Essa pluralidade frequentemente acarreta confron- Que implicações esses pontos de vistas têm para a prá-
tos e conflitos, tornando cada vez mais agudos os desafios tica curricular?
a serem enfrentados pelos profissionais da educação. No Julgamos que uma educação de qualidade, como a
entanto, essa mesma pluralidade pode propiciar o enri- que defendemos, requer a seleção de conhecimentos re-
quecimento e a renovação das possibilidades de atuação levantes, que incentivem mudanças individuais e sociais,
pedagógica. assim como formas de organização e de distribuição dos
Antes, porém, de analisarmos as relações entre currí- conhecimentos escolares que possibilitem sua apreensão e
culo e cultura, examinaremos o outro tema central das dis- sua crítica. Tais processos necessariamente implicam o diá-
cussões sobre currículo logo com os saberes disciplinares assim como com outros
– o conhecimento escolar. Procuraremos realçar sua saberes socialmente produzidos.
importância para todos os que se envolvem no processo Referimo-nos a conhecimentos escolares relevantes e
curricular e destacaremos o processo de sua elaboração significativos.
em diferentes níveis do sistema educativo. Mas talvez não tenhamos, até o momento, esclarecido
Subjacente aos nossos comentários está a crença de suficientemente o que estamos denominando de conheci-
que a escola precisa preparar-se para bem socializar os co- mento escolar. Que aspectos o caracterizam?
nhecimentos escolares e facilitar o acesso do(a) estudante Quem o constrói? Onde? Inicialmente, cabe ressaltar
a outros saberes. Subjacente aos nossos comentários está que concebemos o conhecimento escolar como uma cons-
a crença de que os conhecimentos que se constroem e que trução específica da esfera educativa, não como uma mera
circulam nos diferentes espaços sociais constituem direito
simplificação de conhecimentos produzidos fora da escola.
de todos (Arroyo, 2006).
Consideramos, ainda, que o conhecimento escolar tem ca-
racterísticas próprias que o distinguem de outras formas
Esclarecendo o que entendemos por conhecimento escolar
de conhecimento. Ou seja, vemos o conhecimento escolar
Que devemos entender por conhecimento escolar?
como um tipo de conhecimento produzido pelo sistema
Reiteramos que ele é um dos elementos centrais do currí-
escolar e pelo contexto social e econômico mais amplo,
culo e que sua aprendizagem constitui condição indispen-
produção essa que se dá em meio a relações de poder es-
sável para que os conhecimentos socialmente produzidos
tabelecidas no aparelho escolar e entre esse aparelho e a
possam ser apreendidos, criticados e reconstruídos por to-
sociedade (Santos, 1995).
dos/as os/as estudantes o país. Daí a necessidade de um
ensino ativo e efetivo, com um/a professor/a comprome- O currículo, nessa perspectiva, constitui um dispositivo
tido(a), que conheça bem, escolha, organize e trabalhe os em que se concentram as relações entre a sociedade e a
conhecimentos a serem aprendidos pelos(as) alunos(as). escola, entre os saberes e as práticas socialmente construí-
Daí a importância de selecionarmos, para inclusão no currí- dos e os conhecimentos escolares. Podemos dizer que os
culo, conhecimentos relevantes e significativos. primeiros constituem as origens dos segundos. Em outras
Mas, para que nossos pontos de vista sejam bem palavras, os conhecimentos escolares provêm de saberes
compreendidos, é preciso esclarecer o que estamos con- e conhecimentos socialmente produzidos nos chamados
siderando como qualidade e relevância na educação e no “âmbitos de referência dos currículos”. Que são esses âm-
currículo. A nosso ver, uma educação de qualidade deve bitos de referência? Podemos considerá-los como corres-
propiciar ao(à) estudante ir além dos referentes presentes pondendo:
em seu mundo cotidiano, assumindo-o e ampliando-o, (a) às instituições produtoras do conhecimento cien-
transformando-se, assim, em um sujeito ativo na mudan- tífico (universidades e centros de pesquisa); (b) ao mundo
ça de seu contexto. Que se faz necessário para que esse do trabalho; (c) aos desenvolvimentos tecnológicos; (d) às
movimento ocorra? A nosso ver, são indispensáveis co- atividades desportivas e corporais; (e) à produção artística;
nhecimentos escolares que facilitem ao(à) aluno(a) uma (f) ao campo da saúde; (g) às formas diversas de exercício
compreensão acurada da realidade em que está inserido, da cidadania; (h) aos movimentos sociais (Terigi, 1999).
que possibilitem uma ação consciente e segura no mundo Nesses espaços, produzem-se os diferentes saberes
imediato e que, além disso, promovam a ampliação de seu dos quais derivam os conhecimentos escolares. Os conhe-
universo cultural. cimentos oriundos desses diferentes âmbitos são, então,
Entendemos relevância, então, como o potencial que selecionados e “preparados” para constituir o currículo
o currículo possui de tornar as pessoas capazes de com- formal, para constituir o conhecimento escolar que se en-
preender o papel que devem ter na mudança de seus con- sina e se aprende nas salas de aula. Ressalte-se que, além
textos imediatos e da sociedade em geral, bem como de desses espaços, a própria escola constitui local em que de-
ajudá-las a adquirir os conhecimentos e as habilidades terminados saberes são também elaborados, ensinados e

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

aprendidos. Exemplifique-se com a gramática escolar, his- Ao observarmos com cuidado os livros didáticos, po-
toricamente criada pela própria escola, na escola e para a demos verificar que eles não costumam incluir, entre os
escola (Chervel, 1990). conteúdos selecionados, os debates, as discordâncias, os
Que importância tem para nós, professores e gestores, processos de revisão e de questionamento que marcam os
compreender o que se chama de conhecimento escolar? conhecimentos e os saberes em muitos de seus contextos
De que modo conhecer essa noção modifica nossa prática? originais. Dificilmente encontramos, em programas e em
Cientificamo-nos de que os conhecimentos ensinados na materiais didáticos, menções às disputas que se travam, por
escola não são cópias exatas de conhecimentos socialmen- exemplo, no avanço do próprio conhecimento científico.
te construídos. Devemos avaliar o processo de descontextualização
Assim, não há como inserir, nas salas de aula e nas es- que vimos discutindo como totalmente nocivo ao processo
colas, os saberes e as práticas tal como funcionam em seus curricular? A nosso ver, certo grau de descontextualização
contextos de origem. Para se tornarem conhecimentos es- se faz necessário no ensino, já que os saberes e as práticas
colares, os conhecimentos de referência sofrem uma des- produzidos nos âmbitos de referência do currículo não po-
contextualização e, a seguir, um processo de recontextuali- dem ser ensinados tal como funcionam em seu contexto
zação. A atividade escolar, portanto, supõe uma certa rup- de origem. Todavia, precisamos estar atentos para o risco
tura com as atividades próprias dos campos de referência. de perda de sentido dos conhecimentos, possível de acon-
Essa constatação certamente afeta o trabalho pedagó- tecer se trabalharmos com uma forte descontextualização
gico. Como? Cientes das transformações por que passam (Terigi, 1999).
os conhecimentos de referência até se tornarem conheci- Conhecimentos totalmente descontextualizados, apa-
mentos escolares, não iremos mais supor que a escola pos- rentemente “puros”, perdem suas inevitáveis conexões
sa ser organizada, para o ensino de Ciências, por exemplo, com o mundo social em que são construídos e funcionam.
como um pequeno laboratório, similar aos que existem em Conhecimentos totalmente descontextualizados não per-
outros locais. A investigação científica, tal como se desen- mitem que se evidencie como os saberes e as práticas en-
volve em um laboratório de pesquisas, é bem distinta da volvem, necessariamente, questões de identidade social,
sequência de passos estipulados em um manual didático interesses, relações de poder e conflitos interpessoais. Co-
de experiências científicas escolares. nhecimentos totalmente descontextualizados desfavore-
Outro exemplo pode ser encontrado no campo das ati- cem, assim, um ensino mais reflexivo e uma aprendizagem
vidades desportivas. A prática do desporto apresenta, em mais significativa.
locais de treinamento de atletas profissionais, caracterís- Não seria oportuno, então, que buscássemos, na esco-
ticas bem diferenciadas das experiências oferecidas ao(à) la, verificar se e como tais questões se expressam nos livros
estudante nas aulas de Educação Física. Torna-se sem sen- didáticos com que trabalhamos?
tido, portanto, qualquer tentativa de transformar tais aulas Como, tendo em vista o que vimos apresentando, po-
em momentos de preparação de futuros atletas. deríamos pensar em novas estratégias de crítica e de uti-
Os dois exemplos citados permitem-nos perceber lização dos livros? Como poderíamos preencher algumas
como a concepção de conhecimento escolar que propo- das “lacunas” neles observadas? Não seria pertinente pro-
mos pode influir na seleção e na organização das expe- curarmos complementar os conhecimentos incluídos nos
riências de aprendizagem a serem vividas por estudantes livros com informações e discussões referentes aos proces-
e docentes. sos de construção dos conhecimentos de referência, tais
Em síntese, a visão de conhecimento escolar por nós como ocorrem em outros espaços sociais?
adotada, bem como o reconhecimento de que devemos Que interesses, conflitos e disputas os têm marcado?
trabalhar com conhecimentos significativos e relevantes, Como podemos nos informar melhor sobre tais processos?
terão certamente efeitos no processo de elaboração do A quem podemos recorrer? Julgamos que o debate dessas
projeto político-pedagógico da escola. e de outras questões similares pode, na escola, estimular
Mas em que consistem os mencionados processos de novas e criativas formas de se trabalhar tanto o livro didá-
descontextualização e recontextualização do conhecimen- tico quanto outros materiais e outras fontes que nos auxi-
to escolar? Que processos são empregados na “fabricação” liam no complexo processo de favorecer a aprendizagem
dos conhecimentos escolares? de nossos(as) estudantes.
Mencionaremos alguns deles, apoiando-nos em Teri- Em segundo lugar, ressaltamos a subordinação dos co-
gi (1999). Em primeiro lugar, destacamos a descontextua- nhecimentos escolares ao que conhecemos sobre o desen-
lização dos saberes e das práticas, que costuma fazer com volvimento humano. Ou seja, os conhecimentos escolares
que o conhecimento escolar dê a impressão de “pronto”, costumam ser selecionados e organizados com base nos
“acabado”, impermeável a críticas e discussões. O proces- ritmos e nas sequências propostas pela psicologia do de-
so de produção, com todos os seus conflitos e interesses, senvolvimento.
tende a ser omitido. Qual a consequência dessa omissão? É bastante comum, em nossas salas de aula, o esforço
O estudante acaba aprendendo simplesmente o produto, o do(a) professor(a) por escolher atividades e conteúdos que
resultado de um longo trajeto, cuja complexidade também se mostrem adequados à etapa do desenvolvimento em
se perde. que supostamente se encontra o(a) aluno(a). Em muitos

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

casos, a consequência é ignorarmos o quanto muitos(as) Vejamos, então, como abordar, nas decisões curricula-
de nossos(as) estudantes conseguem “queimar etapas” e res, a diversidade cultural que marca nossa sociedade.
aprender, de modo que nos surpreende, conhecimentos
que julgávamos acima de seu alcance. Para o adolescen- Cultura, diversidade cultural e currículo
te familiarizado com as inúmeras possibilidades oferecidas Que entendemos pela palavra cultura? Talvez seja útil
pela internet, o acesso a informações e saberes se faz, fre- esclarecermos, inicialmente, como a estamos concebendo,
quentemente, de modo não linear e não gradativo. Será já que seus sentidos têm variado ao longo dos tempos,
que, na escola, estamos sabendo tirar suficiente proveito particularmente no período da transição de formações so-
das vantagens resultantes do uso de novas tecnologias? ciais tradicionais para a modernidade (Bocock, 1995; Canen
Como poderíamos aproveitá-las melhor? Em terceiro lugar, e Moreira, 2001).
os conhecimentos escolares tendem a se submeter aos Acreditamos que tal esclarecimento pode subsidiar a
ritmos e às rotinas que permitem sua avaliação. Ou seja, discussão das relações entre currículo e cultura.
tendemos a ensinar conhecimentos que possam ser, de al- O primeiro e mais antigo significado de cultura encon-
gum modo, avaliados. Mas, é claro, nem todos os conteú- tra-se na literatura do século XV, em que a palavra se refere
dos são avaliados da mesma forma. Os que historicamente a cultivo da terra, de plantações e de animais. É nesse senti-
têm sido vistos como os mais “importantes” costumam ser do que entendemos palavras como agricultura, floricultura,
avaliados segundo padrões vistos como mais “rigorosos”, suinocultura.
ainda que não se problematize quem ganha e quem per- O segundo significado emerge no início do século XVI,
de com essa “hierarquia”. Chega-se mesmo a aceitar, sem ampliando a ideia de cultivo da terra e de animais para
questionamentos, que as vozes de docentes de determi- a mente humana. Ou seja, passa-se a falar em mente hu-
nadas disciplinas sejam ouvidas, nos Conselhos de Classe, mana cultivada, afirmando-se mesmo que somente alguns
com mais intensidade que as de docentes de disciplinas em indivíduos, grupos ou classes sociais apresentam mentes e
que o processo de avaliação não se centra em provas ou maneiras cultivadas e que somente algumas nações apre-
testes escritos. sentam elevado padrão de cultura ou civilização. No século
Em quarto lugar, o processo de construção do conheci- XVIII, consolida-se o caráter classista da ideia de cultura,
mento escolar sofre, inegavelmente, efeitos de relações de evidente na ideia de que somente as classes privilegiadas
poder. Recorrendo mais uma vez ao Conselho de Classe: da sociedade europeia atingiriam o nível de refinamento
a “hierarquia” que se encontra no currículo, com base na que as caracterizaria como cultas.
qual se valorizam diferentemente os conhecimentos esco- O sentido de cultura, que ainda hoje a associa às ar-
lares e se “justifica”a prioridade concedida à matemática tes, tem suas origens nessa segunda concepção: cultura, tal
em detrimento da língua estrangeira ou da geografia, de- como as elites a concebem, corresponde ao bem apreciar
riva, certamente, de relações de poder. Nessa hierarquia, música, literatura, cinema, teatro, pintura, escultura, filoso-
se supervalorizam as chamadas disciplinas científicas, se- fia. Será que não encontramos vestígios dessa concepção
cundarizando-se os saberes referentes às artes e ao corpo. tanto em alguns de nossos atuais currículos como em tex-
Nessa hierarquia, separam-se a razão da emoção, a teoria tos que se escrevem sobre currículo? Para alguns docen-
da prática, o conhecimento da cultura. tes, o estudo da literatura, por exemplo, ainda tende a se
Nessa hierarquia, legitimam-se saberes socialmente restringir a escritores e livros vistos como clássicos. Para
reconhecidos e estigmatizam-se saberes populares. Nes- alguns estudiosos da cultura e da educação, os grandes
sa hierarquia, silenciam-se as vozes de muitos indivíduos autores, as grandes obras e as grandes ideias deveriam
e grupos sociais e classificam-se seus saberes como in- constituir o núcleo central dos currículos de nossas escolas.
dignos de entrarem na sala de aula e de serem ensinados Já no século XX, a noção de cultura passa a incluir a cul-
e aprendidos. tura popular, hoje penetrada pelos conteúdos dos meios
Nessa hierarquia, reforçam-se relações de poder favo- de comunicação de massa.
ráveis à manutenção das desigualdades e das diferenças Diferenças e tensões entre os significados de cultura
que caracterizam nossa estrutura social. elevada e de cultura popular acentuam-se, levando a um
De que modo a compreensão dos processos de cons- uso do termo cultura que se marca por valorizações e
trução do conhecimento escolar é útil ao(à) professor(a)? avaliações. Será que algumas de nossas escolas não con-
Se o(a) professor(a) entende como o conhecimento escolar tinuam a fechar suas portas para as manifestações culturais
se produz, saberá melhor distinguir em que momento os associadas à cultura popular, contribuindo, assim, para que
mecanismos implicados nessa produção estão favorecendo saberes e valores familiares a muitos(as) estudantes sejam
ou atravancando o trabalho docente. Em outras palavras, a desvalorizados e abandonados na entrada da sala de aula?
compreensão do processo de construção do conhecimen- Poderia ser diferente? Como? Um terceiro sentido da pala-
to escolar facilita ao professor uma maior compreensão do vra cultura, originado no Iluminismo, a associa a um proces-
próprio processo pedagógico, o que pode estimular novas so secular geral de desenvolvimento social. Esse significado
abordagens, na tentativa tanto de bem selecionar e orga- é comum nas ciências sociais, sugerindo a crença em um
nizar os conhecimentos quanto de conferir uma orientação processo harmônico de desenvolvimento da humanida-
cultural ao currículo. de, constituído por etapas claramente definidas, pelo qual

51
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

todas as sociedades inevitavelmente passam. Tal processo lutas em torno dos diferentes significados sobre o social e
acaba equivalendo, por “coincidência”, aos rumos seguidos sobre o político. É por meio do currículo que certos grupos
pelas sociedades europeias, as únicas a atingirem o grau sociais, especialmente os dominantes, expressam sua visão
mais elevado de desenvolvimento. de mundo, seu projeto social, sua “verdade”. O currículo re-
Há ainda reflexos dessa visão no currículo? Parece- presenta, assim, um conjunto de práticas que propiciam a
-nos que sim. Em alguns cursos de História, por exemplo, produção, a circulação e o consumo de significados no es-
as referências se fazem, dominantemente, às histórias dos paço social e que contribuem, intensamente, para a cons-
povos “desenvolvidos”, o que nos aliena dos esforços e trução de identidades sociais e culturais. O currículo é, por
dos rumos seguidos na maioria dos países que formam o consequência, um dispositivo de grande efeito no processo
chamado Terceiro Mundo Em um quarto sentido, a palavra de construção da identidade do(a) estudante.
“culturas” (no plural) corresponde aos diversos modos de Não se mostra, então, evidente a íntima relação entre
vida, valores e significados compartilhados por diferentes currículo e cultura? Se, em uma sociedade cindida, a cultura
grupos (nações, classes sociais, grupos étnicos, culturas re- é um terreno no qual se processam disputas pela preser-
gionais, geracionais, de gênero etc) e períodos históricos. vação ou pela superação das divisões sociais, o currículo
Trata-se de uma visão antropológica de cultura, em que é um espaço em que esse mesmo conflito se manifesta.
se enfatizam os significados que os grupos compartilham, O currículo é um campo em que se tenta impor tanto a
ou seja, os conteúdos culturais. Cultura identifica-se, assim, definição particular de cultura de um dado grupo quanto o
com a forma geral de vida de um dado grupo social, com as conteúdo dessa cultura.
representações da realidade e as visões de mundo adota- O currículo é um território em que se travam ferozes
das por esse grupo. A expressão dessa concepção, no cur- competições em torno dos significados. O currículo não é
rículo, poderá evidenciar-se no respeito e no acolhimento um veículo que transporta algo a ser transmitido e absorvi-
das manifestações culturais dos(as) estudantes, por mais do, mas sim um lugar em que, ativamente, em meio a ten-
desprestigiadas que sejam. sões, se produz e se reproduz a cultura. Currículo refere-se,
Finalmente, um quinto significado tem tido conside- portanto, a criação, recriação, contestação e transgressão
rável impacto nas ciências sociais e nas humanidades em
(Moreira e Silva, 1994).
geral. Deriva da antropologia social e também se refere a
Como todos esses processos se “concretizam” no cur-
significados compartilhados.
rículo? Pode-se dizer que no currículo se evidenciam esfor-
Diferentemente da concepção anterior, porém, ressalta
ços tanto por consolidar as situações de opressão e discri-
a dimensão simbólica, o que a cultura faz, em vez de acen-
minação a que certos grupos sociais têm sido submetidos,
tuar o que a cultura é. Nessa mudança, efetua-se um mo-
quanto por questionar os arranjos sociais em que essas
vimento do que para o como. Concebe-se, assim, a cultura
situações se sustentam.
como prática social, não como coisa (artes) ou estado de
Isso se torna claro ao nos lembrarmos dos inúmeros
ser (civilização).
e expressivos relatos de práticas, em salas de aulas, que
Nesse enfoque, coisas e eventos do mundo natural
contribuem para cristalizar preconceitos e discriminações,
existem, mas não apresentam sentidos intrínsecos: os sig-
nificados são atribuídos a partir da linguagem. Quando um representações estereotipadas e desrespeitosas de cer-
grupo compartilha uma cultura, compartilha um conjunto tos comportamentos, certos estudantes e certos grupos
de significados, construídos, ensinados e aprendidos nas sociais. Em Conselhos de Classe, algumas dessas visões,
práticas de utilização da linguagem. A palavra cultura im- lamentavelmente, se refletem em frases como: “vindo de
plica, portanto, o conjunto de práticas por meio das quais onde vem, ele não podia mesmo dar certo na escola!”. Ao
significados são produzidos e compartilhados em um gru- mesmo tempo, há inúmeros e expressivos relatos de prá-
po. São os arranjos e as relações envolvidas em um evento ticas alternativas em que professores(as) desafiam as rela-
que passam, dominantemente, a despertar a atenção dos ções de poder que têm justificado e preservado privilégios
que analisam a cultura com base nessa quinta perspectiva, e marginalizações, procurando contribuir para elevar a au-
passível de ser resumida na ideia de que cultura representa toestima de estudantes associados a grupos subalterniza-
um conjunto de práticas significantes. Não será pertinente dos. Ou seja, no processo curricular, distintas e complexas
considerarmos também o currículo como um conjunto de têm sido as respostas dadas à diversidade e à pluralidade
práticas em que significados são construídos, disputados, que marcam de modo tão agudo o panorama cultural con-
rejeitados, compartilhados? Como entender, então, as rela- temporâneo.
ções entre currículo e cultura? Cabe também ressaltar a significativa influência exerci-
Se entendermos o currículo, como propõe Williams da, junto às crianças e aos adolescentes que povoam nos-
(1984), como escolhas que se fazem em vasto leque de sas salas de aula, pelos “currículos” por eles “vividos” em
possibilidades, ou seja, como uma seleção da cultura, po- outros espaços sócio-educativos (shoppings, clubes, asso-
demos concebê-lo, também, como conjunto de práticas ciações, igrejas, meios de comunicação, grupos informais
que produzem significados. Nesse sentido, considerações de convivência, etc), nos quais se fazem sentir com inten-
de Silva (1999b) podem ser úteis. Segundo o autor, o currí- sidade muitos dos complexos fenômenos associáveis ao
culo é o espaço em que se concentram e se desdobram as processo de globalização que hoje vivenciamos.

52
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Nesses outros espaços extraescolares, os currículos Nosso propósito é que os currículos desenvolvidos tor-
tendem a se organizar com objetivos distintos dos currícu- nem evidente que elas não são naturais; são, ao contrário,
los escolares, o que faz com que valores como padroniza- “invenções/construções” históricas de homens e mulhe-
ção, consumismo, individualismo, sexismo e etnocentrismo res, sendo, portanto, passíveis de serem desestabilizadas e
possam entrar em acirrada competição com outras metas, mesmo transformadas. Ou seja, o existente nem pode ser
visadas por escolas e famílias. Vale perguntar: como temos, aceito sem questionamento nem é imutável; constitui-se,
nas salas de aula, reagido a esse “confuso” panorama em sim, em estímulo para resistências, para críticas e para a
que a diversidade se faz tão presente? Como temos nos formulação e a promoção de novas situações pedagógicas
esforçado para desestabilizar privilégios e discriminações? e novas relações sociais.
Como temos buscado neutralizar influências “indesejá-
veis”? Como temos, na escola, dialogado com os “currícu- Princípios para a construção de currículos multicultural-
los” desses outros espaços? mente orientados
Em resumo, o complexo, variado e conflituoso cenário Passemos aos nossos princípios. Insistimos, inicialmen-
cultural em que estamos imersos se reflete no que ocorre te, na necessidade de uma nova postura, por parte do pro-
em nossas salas de aula, afetando sensivelmente o trabalho fessorado e dos gestores, no esforço por construir currícu-
pedagógico que nelas se processa. Voltamos a perguntar: los culturalmente orientados. Propomos, a seguir, que se
como as diferenças derivadas de dinâmicas sociais como reescrevam os conhecimentos escolares, que se evidencie
classe social, gênero, etnia, sexualidade, cultura e religião a ancoragem social desses conhecimentos, bem como que
têm “contaminado” nosso currículo, tanto o currículo for- se transforme a escola e o currículo em espaços de crítica
mal quanto o currículo oculto? Como temos considerado, cultural, de diálogo e de desenvolvimento de pesquisas.
no currículo, essa pluralidade, esse caráter multicultural Esperamos que nossos princípios possam nortear a escolha
de nossa sociedade? Como articular currículo e multicul- de novos conteúdos, a adoção de novos procedimentos e
turalismo? Que estratégias pedagógicas podem ser sele- o estabelecimento de novas relações na escola e na sala
cionadas? Temos, professores e gestores, reservado tempo de aula.
e espaço suficientes para que essas discussões aconteçam
nas escolas? Como nossos projetos político-pedagógicos
A necessidade de uma nova postura
têm incorporado tais preocupações? Como temos aten-
Elaborar currículos culturalmente orientados demanda
dido ao que determina a Lei nº 10639/2003, que torna
uma nova postura, por parte da comunidade escolar, de
obrigatório, nos estabelecimentos de ensino fundamental
abertura às distintas manifestações culturais. Faz-se indis-
e médio, o ensino sobre História e Cultura afro-brasileira?
pensável superar o “daltonismo cultural”, ainda bastante
De que modo os professores se têm inteirado das lutas e
presente nas escolas. O professor “daltônico cultural” é
conquistas dos negros, das mulheres, dos homossexuais e
aquele que não valoriza o “arco-íris de culturas” que en-
de outros grupos minoritários oprimidos? Sem pretender
contra nas salas de aulas e com que precisa trabalhar, não
oferecer respostas prontas a serem aplicadas em quais-
tirando, portanto, proveito da riqueza que marca esse pa-
quer situações, move-nos a intenção de apresentar alguns
princípios que possam nortear a construção coletiva, em norama. É aquele que vê todos os estudantes como idên-
cada escola, de currículos que visem a enfrentar alguns dos ticos, não levando em conta a necessidade de estabelecer
desafios que a diversidade cultural nos tem trazido. Fun- diferenças nas atividades pedagógicas que promove (Stoer
damentamo-nos, nesse propósito, em estudos, pesquisas, e Cortesão, 1999).
práticas e depoimentos de docentes comprometidos com O daltonismo cultural a que nos referimos expressa-
uma escola cada vez mais democrática. Nossa intenção é -se, por exemplo, na visão da professora de uma escola
convidar o profissional da educação a engaja-se no ins- normal que desencoraja uma pesquisadora interessada em
tigante processo de pensar e desenvolver currículos para compreender o tratamento dado, na escola, a questões re-
essa escola. ferentes a racismo na formação docente. “Lamento, mas
Desejamos, com os princípios que vamos sugerir, in- aqui você não terá material para seu estudo. Não temos
tensificar a sensibilidade do(a) docente e do gestor para a problema nenhum de racismo aqui. Eu, por exemplo, ao
pluralidade de valores e universos culturais, para a necessi- entrar em sala, trato todos os meus alunos como se fossem
dade de um maior intercâmbio cultural no interior de cada brancos” (Paraíso, 1997). O daltonismo é tão intenso que
sociedade e entre diferentes sociedades, para a conveniên- chega a impedir que a professora reconheça a presença da
cia de resgatar manifestações culturais de determinados diversidade (e de suas consequências) na escola.
grupos cujas identidades se encontram ameaçadas, para a Em casos como esse, pode ser útil, em um primeiro
importância da participação de todos no esforço por tornar momento, buscarmos sensibilizar o corpo docente para a
o mundo menos opressivo e injusto, para a urgência de se pluralidade e para a diversidade. Como fazê-lo? Que es-
reduzirem discriminações e preconceitos. tratégias empregar nessa tarefa, para que se possa ter a
O objetivo maior concentra-se, cabe destacar, na con- maior adesão possível dos que ainda não perceberam a
textualização e na compreensão do processo de constru- importância de tais aspectos? Nessa perspectiva, é impor-
ção das diferenças e das desigualdades. tante articular o aprofundamento teórico com vivências de

53
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

experiências em que os/as profissionais da educação são lúcida dos diferentes e conflitantes motivos implicados nos
convidados/as a se colocar “em situação” e analisar as suas fatos históricos, antes vistos como “objetivos” e tratados
próprias reações. com base em uma única versão, aceita sem questionamen-
Como se sentiriam e reagiriam, por exemplo, se, como to. A consequência é que a análise se amplia e se enriquece
algumas pessoas negras ainda têm sido, fossem impedi- pelo confronto de pontos de vista.
dos(as) de entrar pela “porta da frente” em um edifício re- Além dessa ampliação da análise, muitos docentes têm
sidencial ou em um hotel de luxo? Outra estratégia possível também procurado incluir no currículo outras Histórias: a
diz respeito ao resgate de histórias de vida e análise de das mulheres, a dos povos indígenas, a dos negros, por
estudos de caso reais, trazidos pelos próprios educadores exemplo. Tais inclusões preenchem algumas das lacunas
ou registrados em pesquisas realizadas sobre tal temática. mais encontradas nas propostas curriculares oficiais, tra-
Talvez alguns docentes se estimulem a apresentar e a dis- zendo à cena vozes e culturas negadas e silenciadas no
cutir situações em que se viram, eles próprios, discrimina- currículo. Segundo Torres Santomé (1995), as culturas ou
dos, ou em que presenciaram pessoas sendo depreciadas e vozes dos grupos sociais minoritários e/ou marginaliza-
desrespeitadas. Como se comportaram nesses momentos? dos que não dispõem de estruturas de poder costumam
Em resumo, a ruptura do daltonismo cultural e da visão ser excluídas das salas de aula, chegando mesmo a ser de-
monocultural dinâmica escolar é um processo pessoal e formadas ou estereotipadas, para que se dificultem (ou de
coletivo que exige desconstruir e desnaturalizar estereó- fato se anulem) suas possibilidades de reação, de luta e de
tipos e “verdades” que impregnam e configuram a cultura afirmação de direitos.
escolar e a cultura da escola. Cabe evitar atribuir qualquer caráter exótico às mani-
Após a adoção de uma nova postura frente à pluralida- festações culturais de grupos minoritários. Ademais, sua
de, outros princípios e propósitos podem mostrar-se úteis presença no currículo não deve assumir o tom fortuito, “tu-
na formulação dos currículos. rístico”, tão criticado por Torres Santomé (1995). É preciso
que os estudos desenvolvidos venham a catalisar, junto aos
Vejamos alguns deles. membros das culturas negadas e silenciadas, a formação de
uma autoimagem positiva. Para esse mesmo propósito, pode
O currículo com um espaço em que se reescreve o co- ser útil a discussão, em diferentes disciplinas, dos rumos de
nhecimento escolar diferentes movimentos sociais (negros, mulheres, indígenas,
Sugerimos que se procure, no currículo, reescrever o homossexuais), para que se compreendam e se acentuem
conhecimento escolar usual, tendo-se em mente as diferen- avanços, dificuldades e desafios. Líderes desses grupos po-
tes raízes étnicas e os diferentes pontos de vista envolvidos dem ser convidados a participar das atividades. Exposições e
em sua produção. No processo de construção do conhe- cartazes podem ilustrar trajetórias e conquistas.
cimento escolar, que já abordamos, se “retiram” os inte- Cabe esclarecer que não estamos argumentando a favor
resses e os objetivos usualmente envolvidos na pesquisa e do efeito Robin Hood (McCarthy, 1998), segundo o qual se
na produção do conhecimento de origem (Terigi, 1999). O tira de um para dar ao outro, ou seja, não estamos recomen-
conhecimento escolar tende a ficar, em decorrência desse dando que simplesmente se substitua um conhecimento
processo, “asséptico”, “neutro”, despido de qualquer “cor” por outro. O que estamos sugerindo é que se explorem e
ou “sabor”. se confrontem perspectivas, enfoques e intenções, para que
O que estamos desejando, em vez disso, é que os in- possam vir à tona propósitos, escolhas, disputas, relações de
teresses ocultados sejam identificados, evidenciados e poder, repressões, silenciamentos, exclusões.
subvertidos, para que possamos, então, reescrever os co- O trabalho com notícias difundidas pela mídia, fre-
nhecimentos. Desejamos que o aluno perceba o quanto, quentemente derivadas de leituras distintas e até mesmo
em Geografia, os conhecimentos referentes aos diversos contraditórias dos fatos, assim como com músicas, vídeos
continentes foram construídos em íntima associação com o e outras produções culturais, permite ilustrar com clareza
interesse, de certos países, em aumentar suas riquezas pela os confrontos que pretendemos ver explicitados. Exami-
conquista e colonização de outros povos. nando diferentes interpretações, os(as) alunos(as) poderão
Em conformidade com essa proposta, encontram-se melhor perceber, por exemplo, os objetivos e os jogos, por
já numerosos(as) professores(as) de História que não mais vezes escusos, implicados em muitas medidas de nossos
se contentam em ensinar aos(às) estudantes apenas a vi- políticos e governantes. Certamente a análise atenta e a
são do dominante, do vencedor. Já se fazem frequentes, discussão crítica de notícias referentes à decisão de invadir
em suas aulas na escola fundamental, discussões como: o Iraque, tomada pelo presidente George Bush, após os
o Brasil foi descoberto ou invadido pelos portugueses? A ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, poderão
Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel, pretendeu de fato ajudar o(a) aluno(a) a contrapor à versão oficial norte-a-
beneficiar os escravos? Domingos Fernandes Calabar deve mericana uma outra versão dos acontecimentos em pauta.
ser mesmo considerado um traidor? Em 1964 houve uma A leitura crítica de jornais permite também verificar
revolução ou um golpe? Esses e outros inúmeros pontos como, na França, se tenta impedir que meninas muçulma-
controversos de nossa História são discutidos por docen- nas frequentem as salas de aula usando seus véus. A jus-
tes e alunos(as), o que faz brotar uma análise bem mais tificativa é que as escolas francesas são seculares e que os

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

símbolos religiosos, portanto, devem ser banidos de suas de socialização e lhe confere identidade e relativa autono-
práticas. Proibições similares têm ocorrido também na Ale- mia é exatamente a possibilidade de promover análises e
manha, vetando-se às professoras o uso do véu. O que não interações das influências plurais que as diferentes culturas
se divulga é como tal medida acaba por solapar importante exercem, de forma permanente, sobre as novas gerações.
elemento da identidade dessas jovens, desrespeitando o O responsável definitivo da natureza, do sentido e da
direito à diferença que deve pautar toda sociedade que se consistência do que os alunos e as alunas aprendem em sua
quer democrática, plural e inclusiva. vida escolar é este vivo, fluido e complexo cruzamento de
Ou seja, a compreensão dos diferentes pontos de vis- culturas que se produz na escola, entre as propostas da cul-
ta envolvidos na contenda permite que o(a) aluno(a) des- tura crítica, alojada nas disciplinas científicas, artísticas e fi-
construa o olhar do poder hegemônico e infira que outros losóficas; as determinações da cultura acadêmica, refletidas
olhares descortinam outros ângulos, outras razões, outros nas definições que constituem o currículo; os influxos da
interesses. cultura social, constituída pelos valores hegemônicos do ce-
Leva-o(a) a compreender melhor alguns dos elementos nário social; as pressões do cotidiano da cultura institucional,
que promovem a persistência, no mundo de hoje, do ódio, presente nos papéis, nas normas, nas rotinas e nos ritos pró-
da violência, do racismo, da xenofobia, do fundamentalis- prios da escola como instituição específica; e as característi-
mo. Não será indispensável que a escola procure denunciar cas da cultura experiencial, adquirida individualmente pelo
e colocar em xeque essa persistência? aluno através da experiência nos intercâmbios espontâneos
Professores dos primeiros anos do ensino fundamen- om seu meio (Pérez Gómez, 1998, p.17).
tal podem também estimular o(a) aluno(a) a reescrever Conceber a dinâmica escolar nesse enfoque supõe re-
conhecimentos, saberes, mitos, costumes, lendas, contos. pensar seus diferentes componentes e romper com a ten-
Inúmeras histórias infantis, por exemplo, têm sido reescri- dência homogeneizadora e padronizadora que impregna
tas com base no emprego de pontos de vista distintos dos suas práticas. Para Moreira e Candau (2003, p.161), a escola
usuais. O caso dos Três Porquinhos pode surpreender se a sempre teve dificuldade em lidar com a pluralidade e a di-
figura do Lobo representar o especulador imobiliário que ferença. Tende a silenciá-las e neutralizá-las. Sente-se mais
tão bem conhecemos. As atitudes da Cigarra e da Formiga
confortável com a homogeneização e a padronização. No
podem ser reavaliadas, tendo-se em mente a forma como
entanto, abrir espaços para a diversidade, a diferença e para
se concebem e se organizam trabalho e lazer na sociedade
o cruzamento de culturas constitui o grande desafio que está
contemporânea. O desfecho do passeio de Chapeuzinho
chamada a enfrentar.
Vermelho à casa da avó pode ser outro, caso imaginemos
A escola precisa, assim, acolher, criticar e colocar em con-
novos perfis e novas relações para os personagens da his-
tato diferentes saberes, diferentes manifestações culturais e
tória (Garner, 1996, 1999). Ou seja, de novos patamares po-
diferentes óticas. A contemporaneidade requer culturas que
demos perceber novos horizontes, novas trajetórias, novas
se misturem e ressoem mutuamente, que convivam e se mo-
possibilidades.
difiquem. Que se modifiquem modificando outras culturas
O que estamos sugerindo é que nos situemos, na prá-
tica pedagógica culturalmente orientada, além da visão das pela convivência ressonante. Ou seja, um processo contínuo,
culturas como inter-relacionadas, como mutuamente gera- que não pare nunca, por não se limitar a um dar ou receber,
das e influenciadas, e procuremos facilitar a compreensão mas por ser contaminação, ressonância (Pretto, 2005).
do mundo pelo olhar do subalternizado. No currículo, tra-
ta-se de desestabilizar o modo como o outro é mobilizado O currículo como um espaço em que se explicita a anco-
e representado. “O olhar do poder, suas normas e pressu- ragem social dos conteúdos
postos, precisa ser desconstruído” (McCarthy, 1998, p. 156). Sugerimos, como outra estratégia (intimamente rela-
Ou seja, trata-se de desafiar a ótica do dominante e cionada à anterior), que se desenvolva nos(as) estudantes
de promover o atrito de diferentes abordagens, diferentes a capacidade de perceber o que tem sido denominado de
obras literárias, diferentes interpretações de eventos histó- ancoragem social dos conteúdos (Moreira, 2002b). Preten-
ricos, para que se favoreça ao(à) aluno(a) entender como o demos que se propicie uma maior compreensão de como
conhecimento socialmente valorizado tem sido escrito de e em que contexto social um dado conhecimento surge e
uma dada forma e como pode, então, ser reescrito. Não se difunde. Nesse sentido, vale examinar como um deter-
se espera, cabe reiterar, substituir um conhecimento por minado conceito foi proposto historicamente, por que se
outro, mas sim propiciar aos(às) estudantes a compreen- tornou ou não aceito, por que permaneceu ou foi subs-
são das relações de poder envolvidas na hierarquização tituído, que tipos de discussões provocou, de que forma
das manifestações culturais e dos saberes, assim como nas promoveu o avanço do conhecimento na área em pauta
diversas imagens e leituras que resultam quando certos e, ainda, como esse avanço propiciou benefícios (ou não)
olhares são privilegiados em detrimento de outros. à humanidade (ou a certos grupos da humanidade). Não
Nessa perspectiva, é importante que consideremos a seria estimulante envolvermos nossos(as) estudantes nas
escola como um espaço de cruzamento de culturas e sabe- lutas travadas em torno da aceitação do modelo heliocên-
res. A escola deve ser concebida como um espaço ecológi- trico do universo? Não seria enriquecedor acompanharmos
co de cruzamento de culturas (Pérez Gómez, 1998). A res- e situarmos na história o surgimento e as transformações
ponsabilidade específica que a distingue de outros espaços dos modelos de átomo, discutindo suas contribuições para

55
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

o avanço da ciência e da tecnologia? O que estamos pro- herança colonial que continua a se infiltrar no currículo.
pondo é que se evidenciem, no currículo, a construção Não se está diante de uma confirmação de que visões da
social e os rumos subsequentes dos conhecimentos, cujas cultura como mente cultivada ou como desenvolvimento
raízes históricas e culturais tendem a ser usualmente “es- social atrelado aos padrões europeus continuam presentes
quecidas”, o que faz com que costumem ser vistos como nos currículos escolares?
indiscutíveis, neutros, universais, intemporais. Trata-se de O mesmo autor (Willinsky, 2002) nos oferece outro
questionar a pretensa estabilidade e o caráter histórico do exemplo que também se harmoniza com o princípio que
conhecimento produzido no mundo ocidental, cuja hege- estamos defendendo. Perguntamos se é possível dividir-
monia tem sido incontestável. Trata-se, mais uma vez, de mos a realidade humana em culturas, raças, histórias, tra-
caminhar na contramão do processo de transposição didá- dições e sociedades claramente diferentes e conseguirmos
tica, durante o qual usualmente se costumam eliminar os suportar, com dignidade, as consequências dessas classifi-
vestígios da construção histórica dos saberes. cações. Insiste, então, no questionamento do caráter apa-
Procurando ilustrar nosso ponto de vista com outros rentemente natural, científico mesmo, dessas divisões. Para
exemplos, sugerimos perguntas que, no ensino das Ciên- isso, acrescenta, há que se compreender a dinâmica histó-
cias Naturais, podem se revelar bastante pertinentes. Eis rica das categorias por meio das quais temos sido rotula-
algumas delas: (a) onde situar as origens da ciência: em dos, identificados, definidos e situados na estrutura social.
culturas europeias ou culturas não europeias?; (b) em que Para isso, há que se focalizar, no currículo, a construção
medida a ciência moderna pode ser considerada ociden- dessas categorias. Somente assim iremos desafiar seus sig-
tal?; (c) existem ou podem vir a existir ciências, elaboradas nificados e abrir espaço, na escola e na sala de aula, para a
em outras culturas, que também “funcionem”, que também diversidade.
expliquem a realidade?; (d) por que a escola insiste em Ou seja, Willinsky rejeita a ideia de que existe uma ver-
apresentar a ciência ocidental como a única possibilidade?; dade, uma essência ou um núcleo em qualquer categoria.
(e) que conflitos se encontram subjacentes aos processos Incentiva-nos, nas diferentes disciplinas curriculares, a tor-
de construção e de difusão do conhecimento científico?; (f) nar evidente e a desestabilizar a construção histórica de
que debates têm sido gerados pela introdução, na comuni- categorias que nos têm marcado, tais como raça, nação,
dade científica, de novas teorias?; (g) por que a escola insis- sexualidade, masculinidade, feminilidade, idade, religião
te em apresentar uma teoria consensual da ciência, subes- etc. Com essa estratégia, pretende explicitar como o mun-
timando as divergências referentes a temáticas priorizadas, do tem sido dividido.
metodologias, fundamentos teóricos, objetivos? (Apple, Aceitando e seguindo a orientação de Willinsky, pode-
1982; Harding, 1996). Acreditamos que a exploração de ríamos planejar coletivamente, na escola, nas distintas dis-
questões como essas, em um curso de Ciências Naturais, ciplinas, a análise, durante determinado período de tempo,
tanto ajuda a desafiar a suposta neutralidade cultural da de como a ideia de raça, por exemplo, vem sendo empre-
ciência quanto a iluminar perspectivas e possibilidades in- gada para garantir privilégios e legitimar atos de opressão.
suspeitadas de desenvolvimento científico. Exemplifiquemos. Em Ciências, poderíamos problemati-
O princípio que estamos defendendo nos instiga tam- zar o caráter supostamente científico da categoria, até hoje
bém a relacionar os conteúdos curriculares às experiências evocado em muitos textos. Em História, poderíamos exami-
culturais dos(as) estudantes e ao mundo concreto, o que nar como a categoria tem justificado processos de coloniza-
permite analisar quem lucra e quem perde com as formas ção, de rotulação, de hierarquização de grupos e culturas, de
de emprego desses conhecimentos. Experiência desenvol- escravidão, de restrição a migrações. Em Geografia, podería-
vida por um pesquisador canadense, John Willinsky (2004), mos explicitar como a categoria raça se tem acrescentado,
pode ser associada a esse enfoque. Bastante crítico da for- de modo harmônico, às razões apresentadas para conquis-
ma como habitualmente se analisam obras poéticas nas sa- tas, novas distribuições de espaços, novos mapas.
las de aula, despindo-as de seus propósitos culturais e esté- Em Literatura, a discussão de representações das raças
ticos, o autor, ao ser desafiado por um estudante para dar em diferentes textos literários propiciaria verificar o que es-
uma unidade de Literatura em uma turma de ensino médio, sas representações têm valorizado, distinguido, incluído e
abandonou a antologia tradicionalmente empregada. excluído. Em Educação Física, poderíamos desmistificar a
Optou, então, por formular, com os(as) alunos(as), uma imagem do negro como o “atleta perfeito”, como o corpo
antologia alternativa que abrigasse as diferentes vozes e que melhor se presta para o salto, a corrida, o jogo, a dan-
identidades que hoje povoam o Canadá e que pudesse ça, o movimento.
trazer à cena cultura, vida, dor, sangue, paixão, sensibilida-
de, assim como desafiar relações de poder que garantem O currículo como espaço de reconhecimento de nossas
a continuidade de diferenças e desigualdades no mundo identidades culturais
contemporâneo (Moreira, 2004). O que os(as) estudantes Um aspecto a ser trabalhado, que consideramos de
escolheram para compor a nova antologia abriu as portas especial relevância, diz respeito a se procurar, na escola,
da sala de aula para suas posições históricas, experiências, promover ocasiões que favoreçam a tomada de consciên-
visões de mundo. Ainda: denunciou a persistente hegemo- cia da construção da identidade cultural de cada um de
nia da cultura de origem europeia, claramente expressa na nós, docentes e gestores, relacionando-a aos processos

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

sócio-culturais do contexto em que vivemos e à história de que estamos desafiados a trabalhar nas relações sociais
nosso país. O que temos constatado é a pouca consciência e, particularmente, na educação. Nossa maneira de nos
que, em geral, temos desses processos e do cruzamento de situarmos em relação aos outros tende a construir-se em
culturas neles presente. Tendemos a uma visão homoge- uma perspectiva etnocêntrica. Quem são os nós? Tendemos
neizadora e estereotipada e nós mesmos e de nossos alu- a incluir na categoria nós todas aquelas pessoas e aqueles
nos e alunas, em que a identidade cultural é muitas vezes grupos sociais que têm referenciais semelhantes aos nos-
vista como um dado, como algo que nos é impresso e que sos, que têm hábitos de vida, valores, estilos e visões de
perdura ao longo de toda nossa vida. Desvelar essa realida- mundo que se aproximam dos nossos e os reforçam. Quem
de e favorecer uma visão dinâmica, contextualizada e plu- são os outros? Tendem a ser os que entram em choque com
ral das identidades culturais é fundamental, articulando-se nossas maneiras de nos situarmos no mundo, por sua clas-
as dimensões pessoal e coletiva desses processos. Cons- se social, etnia, religião, valores, tradições, sexualidade etc.
titui um exercício fundamental tornarmo-nos conscientes Como temos entendido esse outro? Para Skliar e Dus-
de nossos enraizamentos culturais, dos processos em que chatzky (2001), principalmente de três formas distintas: o
misturam ou se silenciam determinados pertencimentos outro como fonte de todo mal, o outro como sujeito pleno de
culturais, bem como sermos capazes de reconhecê-los, no- um grupo cultural, o outro como alguém a tolerar.
meá-los e trabalhá-los. A primeira perspectiva, segundo os autores, marcou
Como favorecer essa tomada de consciência? Alguns predominantemente as relações sociais durante o século
exercícios podem ser propostos, buscando-se criar oportu- XX e pode se revestir de diferentes formas, desde a eli-
nidades em que o profissional da educação se estimule a minação física do outro, até a coação interna, mediante a
falar sobre como percebe a construção de sua identidade. regulação de costumes e moralidades. Nesse modo de nos
Como vêm sendo criadas nossas identidades de gênero, situarmos diante do outro, assumimos uma visão binária
raça, sexualidade, classe social, idade, profissão? Como te- e dicotômica. Em um lado separamos os bons, os verda-
mos aprendido a ser quem somos, como profissionais da deiros, os autênticos, os civilizados, cultos, defensores da
educação, brasileiros(as), homens, mulheres, casados(as), liberdade e da paz. Em outro, deixamos os outros: os maus,
os falsos, os bárbaros, os ignorantes e os terroristas. Se nos
solteiros(as), negros(as), brancos(as), jovens ou idosos(as)?
identificamos com os primeiros, o que temos a fazer é eli-
Nesses momentos, tem sido bastante frequente a afir-
minar, neutralizar, dominar ou subjugar os outros. Caso nos
mação “nunca pensei na formação da minha identidade
sintamos representados como integrantes do pólo oposto,
cultural”, ou então “me considero uma órfã do ponto de
ou internalizamos a nossa maldade e nos deixamos salvar,
vista cultural”, expressão usada por uma professora jovem,
passando para o lado dos bons, ou nos confrontamos vio-
querendo se referir à dificuldade de nomear os referentes
lentamente com eles.
culturais configuradores de sua trajetória de vida.
Como essa primeira perspectiva se traduz na escola?
A socialização em pequenos grupos, entre os(as) edu-
Mostra-se presente quando: (a) atribuímos o fracasso es-
cadores(as), dos relatos sobre a construção de suas identi-
colar dos(as) alunos(as) às suas características sociais ou
dades culturais pode se revelar uma experiência profunda- étnicas; (b) diferenciamos os tipos de escolas segundo a
mente vivida, muitas vezes carregada de emoção, que dila- origem social dos(as) estudantes, considerando que alguns
ta tanto a consciência dos próprios processos de formação têm maior potencial que outros e, para desenvolvermos
identitária do ponto de vista cultural, quanto a sensibili- uma educação de qualidade, não podemos misturar es-
dade para favorecer esse mesmo dinamismo nas práticas tudantes de diferentes potenciais; (c) nos situamos, como
educativas que organizamos. Nesses processos, podemos professores(as), diante dos(as) alunos(as), com base em es-
nos dar conta da complexidade envolvida na configuração tereótipos e expectativas diferenciadas segundo a origem
dos distintos traços identitários que coexistem, por vezes social e as características culturais dos grupos de referên-
contraditoriamente, na construção das diferenças de que cia; (d) valorizamos exclusivamente o racional e desvalori-
somos feitos (Moita Lopes, 2003). zamos os aspectos afetivos presentes nos processos edu-
cacionais; (e) privilegiamos somente a comunicação verbal,
O currículo como espaço de questionamento de nossas desconsiderando outras formas de comunicação humana,
representações sobre os “outros” como a corporal, a artística etc.
Junto ao reconhecimento da própria identidade cul- Ao considerarmos o outro como sujeito pleno de uma
tural, outro elemento a ser ressaltado relaciona-se às re- marca cultural, estamos concebendo-o como membro de
presentações que construímos dos outros, daqueles que uma dada cultura, vista como uma comunidade homogê-
consideramos diferentes. As relações entre nós e os outros nea de crenças e estilos de vida. O outro, ainda que não
estão carregadas de dramaticidade e ambiguidade. Em so- seja a fonte de todo mal, é diferente de nós, tem uma es-
ciedades nas quais a consciência das diferenças se faz cada sência claramente definida, distinta da que nos caracteriza.
vez mais forte, reveste-se de especial importância aprofun- Na área da educação, essa visão se expressa, por exemplo,
darmos questões como: quem incluímos na categoria nós? quando nos limitamos a abordar o outro de forma genérica
Quem são os outros? Quais as implicações dessas questões e “folclórica”, apenas em dias especiais, usualmente incluí-
para o currículo? Como nossas representações dos outros dos na lista dos festejos escolares, tais como o Dia do Índio
se refletem nos currículos? Esses são temas fundamentais ou Dia da Consciência Negra.

57
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Já a expressão o outro como alguém a tolerar convida contar em nossa comunidade e como fazer para que outros
tanto a admitir a existência de diferenças quanto a acei- recursos venham, de alguma forma, a tornar-se familiares a
tá-las. Nessa admissão, contudo, reside um paradoxo. Se nossos(as) alunos(as).
aceitamos, por princípio, todo e qualquer diferente, de- Nessa perspectiva, há um ponto que desejamos des-
veríamos aceitar os grupos cujas marcas são comporta- tacar. Ao intentarmos transformar a escola em um espaço
mentos anti-sociais ou opressivos, como os racistas. Que cultural, estamos convidando cada professor(a), como inte-
consequências a adoção dessa perspectiva pode ter para lectual que é, a desempenhar o papel de crítico(a) cultural.
a prática pedagógica? Julgamos que a simples tolerância Estamos considerando que a atividade intelectual implica
pode nos situar em uma posição débil, evitando que tome- o questionamento do que parece inscrito na natureza das
mos posição em relação aos valores que dominam a cul- coisas, do que nos é apresentado como natural, questiona-
tura contemporânea. Pode impedir que polemizemos, le- mento esse que visa, fundamentalmente, a mostrar que as
vando-nos a assumir a conciliação como valor último. Pode coisas não são inevitáveis. A atividade intelectual centra-se,
incentivar-nos a não questionar a “ordem”, vendo-a como assim, na crítica da cultura em que estamos imersos. Como
comportamentos a serem inevitavelmente cultivados. se expressa essa atividade na prática curricular?
Poderíamos acrescentar outras formas de nos situar Julgamos que cabe à escola, por meio de suas ativida-
diante dos outros. des pedagógicas, mostrar ao aluno que as coisas não são
No entanto, acreditamos que a tipologia proposta por inevitáveis e que tudo que passa por natural precisa ser
Skliar e Duschatzky (2000) expressa as posições mais pre- questionado e pode, consequentemente, ser modificado.
sentes na nossa sociedade hoje, evidenciando a complexi- Cabe à escola levá-lo a compreender que a ordem social
dade das questões relacionadas à alteridade e à diferença. em que está inserido define-se por ações sociais cujo poder
O que desejamos destacar é que o modo como con- não é absoluto. O que existe precisa ser visto como a condi-
cebemos a condição humana pode bloquear nossa com- ção de uma ação futura, não como seu limite. Nossos ques-
preensão dos outros. Portanto, é importante promovermos tionamentos devem, então, provocar tensões e desafiar o
processos educacionais nos quais identifiquemos e des- existente (Moreira, 1999). Podem não mudar o mundo, mas
podem permitir que o aluno o compreenda melhor.
construamos nossas suposições, em geral implícitas, que
Como nos diz Bauman (2000), “para operar no mundo
não nos permitem uma aproximação aberta e empática à
(por contraste a ser ‘operado’ por ele) é preciso entender
realidade dos outros (Taylor, 2001).
como o mundo opera” (p. 242).
A crítica de diferentes artefatos culturais na esco-
O currículo como um espaço de crítica cultural
la pode, por exemplo, levar-nos a identificar e a desafiar
Apresentamos agora outro princípio, fortemente re-
visões estereotipadas da mulher propagadas em anún-
lacionado aos anteriores: sugerimos que se expandam os
cios; imagens desrespeitosas de homossexuais difundidas
conteúdos curriculares usuais, de modo a neles incluir al-
em programas cômicos de televisão; preconceitos contra
guns dos artefatos culturais que circundam o(a) aluno(a). A
povos não ocidentais evidentes em desenhos animados;
ideia é tornar o currículo um espaço decrítica cultural. Como mensagens encontradas em revistas para adolescentes do
fazê-lo? Um dos caminhos é abrir as portas, na escola, a sexo feminino (e da classe média) que incentivam o uso
diferentes manifestações da cultura popular, além das que de drogas, o consumismo e o individualismo; estímulos à
compõem a chamada cultura erudita. Músicas populares, erotização precoce das meninas, visíveis em brinquedos e
danças, filmes, programas de televisão, festas populares, programas infantis; presença e aceitação da violência em
anúncios, brincadeiras, jogos, peças de teatro, poemas, re- filmes, jogos e brinquedos. Outros exemplos poderiam ser
vistas e romances precisam fazer-se presentes nas salas de citados, reforçando-nos o ponto de vista de que os produ-
aula. Da mesma forma, levando-se em conta a importância tos culturais à nossa volta nada têm de ingênuos ou puros;
de ampliar os horizontes culturais dos(as) estudantes, bem ao contrário, incorporam intenções de apoiar, preservar ou
como de promover interações entre diferentes culturas, produzir situações que favorecem certos grupos e outros
outras manifestações, mais associadas aos grupos domi- não. Tais artefatos, como se tem insistentemente acentua-
nantes, precisam ser incluídas no currículo. do, desempenham, junto com o currículo escolar, impor-
A intenção é que a cultura dos estudantes e da comu- tante papel no processo de formação das identidades de
nidade possa interagir com outras manifestações e outros nossas crianças e nossos adolescentes, devendo constituir-
espaços culturais como museus, exposições, centros cultu- -se, portanto, em elementos centrais de crítica em proces-
rais, música erudita, clássicos da literatura. Se aceitarmos sos curriculares culturalmente orientados.
a inexistência, no mundo contemporâneo, de qualquer
“pureza cultural” (McCarthy, 1998), se pretendermos abrir O currículo como um espaço de desenvolvimento de
espaço na escola para a complexa interpenetração das cul- pesquisas
turas e para a pluralidade cultural, tanto as manifestações Como intelectual que é, todo(a) profissional da edu-
culturais hegemônicas como as subalternizadas precisam cação precisa comprometer-se com o estudo e com a
integrar o currículo e ser objeto de apreciação e crítica. Tal- pesquisa, bem como posicionar-se politicamente. Precisa,
vez fosse útil, para o desenvolvimento do que sugerimos, assim, situar-se frente aos problemas econômicos, sócio-
que discutíssemos, na escola, com que recursos podemos -políticos, culturais e ambientais que hoje nos desafiam e

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

que desconhecem as fronteiras entre as nações ou entre as Os quatro pilares da educação compõem-se dos se-
classes sociais. Sem esse esforço, será impossível propiciar guintes saberes: aprender a conhecer, aprender a fazer,
ao(à) aluno(a) uma compreensão maior do mundo em que aprender a viver juntos e aprender a ser.
vive, para que nele possa atuar autonomamente. Sem esse Pensar nos conteúdos escolares é, principalmente na
esforço, será impossível a proposição de alternativas viá- atualidade, bastante difícil. Discutí-los e refletir a respeito
veis, decorrentes de reflexões e investigações cuidadosas e desse assunto trata-se de uma tarefa delicada, mas digna e
rigorosas. Daí a necessidade de um posicionamento claro e necessária de enfrentamento. Os conteúdos a serem en-
de um comprometimento com a pesquisa. sinados na escola são o eixo de desdobramento da prática
Será possível e desejável que nós, profissionais da edu- escolar. Concretizá-los demanda conhecimento e decisão
cação infantil e do ensino fundamental, venhamos a nos sobre “o que” se quer ensinar ou “o que” o aluno precisa
envolver com pesquisa? Julgamos que sim. Propomos que saber. Como conhecer e decidir a respeito do que é impor-
todo (a) profissional da educação venha, de algum modo, tante em um mundo com tantas e aceleradíssimas novas
a participar de pesquisas sobre sua prática pedagógica ou
descobertas e fatos?
administrativa, sobre a disciplina que ensina, sobre os sa-
Podemos partir desta questão para discutirmos sobre
beres docentes, sobre o currículo, sobre a avaliação, sobre
conteúdos de aprendizagem. Torná-los concretos numa
a educação em geral, sobre a sociedade em que vivemos
prática pedagógica requer uma reflexão a respeito da con-
ou sobre temas diversificados (não incluídos no currículo).
Consideramos que gestores e docentes precisam organizar cepção social que se atribui ao ensino. O que isso quer di-
os tempos e os espaços escolares para abranger as ativida- zer? O que se ensina depende da ideologia e do aluno que
des de pesquisa aqui propostas. É fundamental que, nesse se quer formar.
esforço, se verifiquem os recursos necessários e os recursos Por exemplo, se numa determinada escola o objetivo
com que se pode contar. A comunidade em que a escola se é formar um aluno universitário, os conteúdos mais valo-
situa pode e deve participar tanto do planejamento como rizados por ela estariam relacionados ao saber, ou seja, a
da implementação dos estudos. A Secretaria de Educação decisão seria pelos conteúdos conceituais. Caso a intenção
deve ser chamada a colaborar. seja formar um profissional, a decisão será pelos conteúdos
A pesquisa do(a) professor(a) da escola básica certa- relacionados ao fazer, os procedimentais. Já sob a ideolo-
mente difere da pesquisa levada a cabo na universidade e gia de formação de um aluno participante na sociedade,
nos centros de pesquisa, o que, entretanto, não a torna in- decidir-se-á pelos conteúdos atitudinais ou os relaciona-
ferior. A participação em pesquisa pode mesmo contribuir dos ao ser.
para que o trabalho do profissional da educação venha a Esta decisão sobre qual ou quais conteúdos são mais
ser mais valorizado. importantes, não se deve pautar apenas em relacioná-los
Estamos defendendo, em resumo, que se torne o cur- em itens quando da elaboração do planejamento, mas de
rículo, em cada escola, um espaço de pesquisa. A pesquisa, contemplálos na avaliação assumida como um critério útil
concebida em um sentido mais amplo, reiteramos, não está para detectar a coerência entre o que o professor faz e o que
restrita à universidade. Como professores(as)/ intelectuais se diz. Até porque muitos conteúdos estão implícitos na prá-
que atuamos na escola, precisamos enfrentar esse desa- tica escolar dentro ou fora da sala de aula. Há muitas coisas
fio, tornando-nos pesquisadores(as) dos saberes, valores que se aprendem na escola e não foram pensadas ou rela-
e práticas que ensinamos e/ou desenvolvemos, centran- cionadas como conteúdos nos seus diversos planejamentos.
do nosso ensino na pesquisa. Nesse processo, poderemos Antes de nos atermos à reflexão a respeito dos dife-
aperfeiçoar nosso desempenho profissional, poderemos rentes tipos de conteúdos, vamos pensar um pouco so-
nos situar melhor no mundo, poderemos, ainda, nos enga- bre a aprendizagem. De acordo com Zabala (1996) e pelos
jar na luta por melhorá-lo.
princípios construtivistas, “aprendizagem é a construção
Nesse processo, poderemos despertar nos alunos e nas
pessoal que o aluno realiza com a ajuda que recebe de ou-
alunas o espírito de pesquisa, de busca, de ter prazer no
tras pessoas”. Para que ocorra tal aprendizagem há que se
aprender, no conhecer coisas novas. Não deveríamos, então,
refletir sobre as atividades e os conteúdos neste processo.
começar, já na próxima reunião de professores(as) de nossa
escola, a refletir sobre como tornar o currículo um espaço de Ou seja:
estudos e de pesquisas? Estamos certos de que essa discus- 1) As atividades permitem ao professor conhecer os
são pode ser extremamente estimulante e proveitosa.22 conhecimentos prévios dos alunos?
2) Os conteúdos são significativos e funcionais para o
A Aprendizagem de Conteúdos Factuais, Concei- aluno?
tuais, Procedimentais e Atitudinais 3) São adequados para o nível de desenvolvimento dos
Todos os conteúdos estão veiculados aos quatro pila- alunos?
res da educação, uma vez que estes não podem ser indis- 4) São desafios acessíveis para os alunos?
sociados um do outro. Podemos trabalhar todos eles de 5) Provocam conflito cognoscitivo e atividade mental no
maneira a compreender como funcionam, e posteriormen- aluno que o faça relacionar conteúdos novos aos prévios?
te incluí-los em definitivos aos nossos saberes. 6) São motivadores?
22 Fonte: www.portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ 7) Estimulam a autoestima e o autoconceito?
indag3.pdf 8) Ajudam o aluno a aprender a aprender?

59
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Importante! Essas questões devem estar presentes a “afetar”). Isso não quer dizer que professores e escola não
cada planejamento didático ou de aula do professor. É por os devam levar em consideração, pelo contrário, experiên-
intermédio delas que ele reflete e avalia constantemente cias com elaboração de regras pelo grupo, assembléias,
sua atuação pedagógica. demonstração de coerência nos atos dos professores, por
Assim, no livro O construtivismo na sala de aula, no exemplo, devem ser vividas no ambiente escolar. Somente
capítulo Os enfoques Didáticos, escrito por Antoni Zabala através dessas atividades experienciais é possível, de uma
(1996), o autor organiza os conteúdos e as atividades de forma clara, o estabelecimento de vínculos afetivos.
aprendizagem dividindo-os em quatro diferentes tipos: O quadro abaixo poderá ajudar na compreensão dos
conteúdos e das atividades de aprendizagem sobre os
Conteúdos referentes a fatos (factuais) quais discutimos:
São conteúdos com estratégias de aprendizagem sim-
ples (memorização por repetição verbal). Há conhecimentos
que precisamos ter memorizados, por exemplo, nomes de
rios, datas, locais etc, e não há outra maneira de aprendê-
-los se não pela memorização. Estes, se relacionados a ou-
tros conteúdos, suas estratégias de aprendizagem deixam
de ser simplesmente mecânicas. O tempo dedicado a estes
conteúdos será, geralmente, de curta duração e diferente
para diferentes alunos.

Conteúdos referentes a conceitos e princípios (con-


ceituais)
São conteúdos que exigem a atividade cognoscitiva do
aluno para realmente conhecer conceitos e princípios. A Pode-se trabalhar em sala de aula todos os conteúdos
escola, durante muito tempo e não compatível com a con- de maneiras proveitosas, não tentando separá-los, pois
cepção construtivista de ensino e aprendizagem, pautou-se como pode-se perceber todos estão correlacionados com
ou pauta-se em seus planejamentos apenas na aprendiza- a construção como um todo, nenhum deles é mais impor-
tante que o outro a importância é encontrada no conjunto
gem desses conteúdos. Muitas vezes, de forma mecânica e
da obra, como citam os ditados populares.23
por repetição verbal, o que não garante a significatividade
da aprendizagem. Um bom exemplo é “decorar a tabuada”.
As estratégias de aprendizagem dos conteúdos con-
ceituais devem colocar o aluno diante de experiências ou ATIVIDADE DE ENSINO E DE
situações que potencializem a atividade cognoscitiva ou APRENDIZAGEM; AVALIAÇÃO COMO ATO DE
que lhe permita compreender os conceitos e princípios INVESTIGAR E INTERVIR NOS RESULTADOS
em pauta. DE APRENDIZAGEM DOS ALUNOS; ACESSO,
Há para esses conteúdos uma exigência de estraté- PERMANÊNCIA E SUCESSO DO ALUNO NA
gias de aprendizagem mais complexas. Há também uma ESCOLA.
necessidade de maior tempo para, inclusive, novas “leitu-
ras” (visitas, comparações entre elementos do que se está
aprendendo etc).
Aprendizagem e avaliação.
Conteúdos procedimentais A sociedade sempre viu a necessidade de entender
Trata-se de aprendizagens de ações (desenhar, ler ma- como acontece o desenvolvimento infantil. E com isso vá-
pas ou gráficos, medir). O que sabemos fazer em um caso rios pensadores iniciaram estudos que revelassem a ocor-
e o que sabemos em outro. Mas não se trata de apren- rência desse desenvolvimento.
der ações pela descrição e sim pela realização destas. As Atualmente com base nos estudos desses pensado-
estratégias de aprendizagem dos conteúdos consistem na res, mas especificadamente na Psicologia, surge a psico-
execução compreensiva e nas repetições contextualizadas logia do desenvolvimento que serve como apoio para pais
e significativas e não mecânicas. e professores descobrirem a melhor forma de auxiliar a
criança a desenvolver-se, buscando compreender determi-
Conteúdos referentes a valores, normas e atitudes nados comportamentos, prevê-los e em algumas ocasiões
(atitudinais) modificá-los.
Desenvolver esses conteúdos não é uma tarefa cuja À medida que o tempo passa o desenvolvimento toma
realização garanta a obtenção de objetivos. O conheci- novas faces, novos aspectos, refletindo as modificações fí-
sicas, orgânicas e mentais sentidas pelas crianças no de-
mento de valores, normas e atitudes não assegura as suas
correr dos anos. Em décadas passadas acreditava-se que as
introjeções por abranger aspectos subjetivos como os cog-
nitivos, os comportamentais e os afetivos (no sentido de 23 Fonte: www.principo.org

60
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

crianças eram «adultos em miniatura” e deviam ser trata- Atribui importância ao modo como o material a ser
dos como tal, porém a atualidade não foge muito essa rea- aprendido é disposto, assim como Gestalt, valorizando o
lidade, preocupados em ajudar na aprendizagem, a socie- conceito de estrutura e arranjos de ideias. “Aproveitar o
dade acaba acarretando à vida das crianças de atividades e potencial que o indivíduo traz e valorizar a curiosidade na-
compromissos. Indo contra esse pensamento social, Santos tural da criança são princípios que devem ser observados
afirma que: “A criança é considerada hoje, não como um pelo educador” (BRUNER, 1991, p. 122).
adulto, mas como um ser que apresenta, em cada fase de A escola não deve perder de vista que a aprendizagem
sua evolução, caracteres próprios e reações especificas que de um novo conceito envolve a interação com o já apren-
lhes dão uma fisionomia psicológica particular”. Fortifican- dido. Portanto, as experiências e vivências que o aluno traz
do a afirmação de Santos, Freud, Erikson e Piaget já haviam consigo favorecem novas aprendizagens. Bruner chama
feito pesquisas e publicações sobre o desenvolvimento hu- a atenção para o fato de que as matérias ou disciplinas
mano, atribuindo a cada fase um momento do desenvolvi- tais como estão organizadas nos currículos, constituem-se
mento intelectual, pois em cada idade a criança apresenta muitas vezes divisões artificiais do saber. Por isso, várias
características novas que não devem sofrer nenhum tipo disciplinas possuem princípios comuns sem que os alunos
de violência que pretendam o adiantamento das etapas de – e algumas vezes os próprios professores – analisem tal
desenvolvimento da criança. fato, tornando o ensino uma repetição sem sentido, em
A aprendizagem é um processo contínuo que ocorre que apenas respondem a comandos arbitrários, Bruner
durante toda a vida do indivíduo, desde a mais tenra infân- propõe o ensino pela descoberta. O método da descober-
cia até a mais avançada velhice. Normalmente uma criança ta não só ensina a criança a resolver problemas da vida
deve aprender a andar e a falar; depois a ler e escrever, prática, como também garante a ela uma compreensão da
aprendizagens básicas para atingir a cidadania e a partici- estrutura fundamental do conhecimento, possibilitando
pação ativa na sociedade. Já os adultos precisam aprender assim economia no uso da memória, e a transferência da
habilidades ligadas a algum tipo de trabalho que lhes for- aprendizagem no sentido mais amplo e total.
neça a satisfação das suas necessidades básicas, algo que Segundo Bock (2001), a preocupação de Bruner é que a
lhes garanta o sustento. As pessoas idosas embora nossa criança aprenda a aprender corretamente, ainda que “cor-
sociedade seja reticente quanto às suas capacidades de retamente” assuma, na prática, sentidos diferentes para as
aprendizagem podem continuar aprendendo coisas com- diferentes faixas etárias. Para que se garanta uma apren-
plexas como um novo idioma ou ainda cursar uma faculda- dizagem correta, o ensino deverá assegurar a aquisição
de e virem a exercer uma nova profissão. e permanência do aprendido (memorização), de forma a
O desenvolvimento geral do individuo será resultado facilitar a aprendizagem subsequente (transferência). Este
de suas potencialidades genéticas e, sobretudo, das habili- é um método não estruturado, portanto o professor deve
dades aprendidas durante as várias fases da vida. A apren- estar preparado para lidar com perguntas e situações di-
dizagem está diretamente relacionada com o desenvolvi- versas. O professor deve conhecer a fundo os conteúdos
mento cognitivo. a serem tratados. Deve estar apto a conhecer respostas
As passagens pelos estágios da vida são marcadas por corretas e reconhecer quando e porque as respostas alter-
constante aprendizagem. nativas estão erradas. Também necessita saber esperar que
“Vivendo e aprendendo”, diz a sabedoria popular. As- os alunos cheguem à descoberta, sem apressa-los, mas ga-
sim, os indivíduos tendem a melhorar suas realizações nas rantindo a execução de um programa mínimo. Deve tam-
tarefas que a vida lhes impõe. A aprendizagem permite ao bém ter cuidado para não promover um clima competitivo
sujeito compreender melhor as coisas que estão à sua vol- que gere, ansiedade e impeça alguns alunos de aprender.
ta, seus companheiros, a natureza e a si mesmo, capacitan- O modelo de ensino e aprendizagem de David P. Au-
do-o a ajustar-se ao seu ambiente físico e social. subel (1980) caracteriza-se como um modelo cognitivo
A teoria da instrução de Jerome Bruner (1991), um au- que apresenta peculiaridades bastante interessantes para
têntico representante da adordagem cognitiva, traz con- os professores, pois centraliza-se, primordialmente, no
tribuições significativas ao processo ensino-aprendizagem, processo de aprendizagem tal como ocorre em sala de
principalmente à aprendizagem desenvolvida nas escolas. aula. Para Ausubel, aprendizagem significa organização e
Sendo uma teoria cognitiva, apresenta a preocupação com integração do material aprendido na estrutura cognitiva,
os processos centrais do pensamento, como organização estrutura esta na qual essa organização e integração se
do conhecimento, processamento de informação, raciocí- processam.
nio e tomada de decisão. Considera a aprendizagem como Psicólogos e educadores têm demonstrado uma cres-
um processo interno, mediado cognitivamente, mais do cente preocupação com o modo como o indivíduo apren-
que como um produto direto do ambiente, de fatores ex- de e, desde Piaget, questões do tipo: “Como surge o co-
ternos ao aprendiz. Apresenta-se como o principal defen- nhecer no ser humano? Como o ser humano aprende? O
sor do método de aprendizagem por descoberta (insight). conhecimento na escola é diferente do conhecimento da
A teoria de Bruner apresenta muitos pontos semelhan- vida diária? O que é mais fácil esquecer?” atravessaram as
tes às teorias de Gestalt e de Piaget. Bruner considera a investigações científicas. Assim, deve interessar à escola
existência de estágios durante o desenvolvimento cogniti- saber como criança, adolescentes e adultos elaboram seu
vo e propõe explicações similares às de Piaget, quanto ao conhecer, haja vista que a aquisição do conhecimento é a
processo de aprendizagem. questão fundamental da educação formal.

61
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A psicologia cognitiva preocupa responder estas ques- potencializada o processo ensino-aprendizagem não de-
tões estudando o dinamismo da consciência. A aprendi- pende das políticas públicas em curso, mas do projeto de
zagem é, portanto, a mudança que se preocupa com o eu formação cultural que possui o corpo docente e seu com-
interior ao passar de um estado inicial a um estado final. promisso com objeto de estudo.
Implica normalmente uma interação do individuo com o Como o ato pedagógico de ensino-aprendizagem
meio, captando e processando os estímulos selecionados. constitui-se, ao longo prazo, num projeto de formação hu-
O ato de ensinar envolve sempre uma compreensão mana, propomos que esta formação seja orientada por um
bem mais abrangente do que o espaço restrito do professor processo de autonomia que ocorra pela produção autôno-
na sala de aula ou às atividades desenvolvidas pelos alunos. ma do conhecimento, como forma de promover a demo-
Tanto o professor quanto o aluno e a escola encon- cratização dos saberes e como modo de elaborar a crítica
tram-se em contextos mais globais que interferem no pro- da realidade existente.
cesso educativo e precisam ser levados em consideração Isto quer dizer que só há crítica se houver produção
na elaboração e execução do ensino. autônoma do conhecimento elaborado através de uma prá-
Ensinar algo a alguém requer, sempre, duas coisas: uma tica efetiva da pesquisa. Entendemos que é pela prática da
visão de mundo (incluídos aqui os conteúdos da apren- pesquisa que exercitamos a reflexão sobre a realidade como
dizagem) e planejamento das ações (entendido como um forma de sistematizar metodologicamente nosso olhar so-
processo de racionalização do ensino). A prática de plane- bre o mundo para podermos agir sobre os problemas.
jamento do ensino tem sido Isto quer dizer que não pesquisamos por pesquisar e
questionada quanto a sua validade como instrumento nem refletimos por refletir. Tanto a reflexão quanto à pes-
de melhoria qualitativa no processo de ensino como o tra- quisa são meios pelos quais podemos agir como sujeitos
balho do professor: transformadores da realidade social. Isto indica que nosso
trabalho, como professores, é o de ensinar a aprender para
[...] a vivência do cotidiano escolar nos tem evidenciado que o conhecimento construído pela aprendizagem seja
situações bastante questionáveis neste sentido. Percebe-se, um poderoso instrumento de combate às formas de injus-
de início, que os objetivos educacionais propostos nos
tiças que se reproduzem no interior da sociedade.
currículos dos cursos apresentam confusos e
Piaget (1969), foi quem mais contribuiu para com-
desvinculados da realidade social. Os conteúdos a serem
preendermos melhor o processo em que se vivencia a
trabalhados, por sua vez, são definidos de forma
construção do conhecimento no indivíduo.
autoritária, pois os professores, via de regra, não partici-
Apresentamos as idéias básicas de Piaget (l969, p.14)
pam dessa tarefa. Nessas condições, tendem a
sobre o desenvolvimento mental e sobre o processo de
mostrar-se sem elos significativos com as experiências
construção do conhecimento, que são adaptação, assimi-
de vida dos alunos, seus interesses e necessidades
lação e acomodação.
(Lopes, 2000, p. 41).
Piaget diz que o individuo está constantemente intera-
gindo com o meio ambiente. Dessa interação resulta uma
De modo geral, no meio escolar, quando se faz refe-
rência a planejamento do ensino – aprendizagem, este se mudança contínua, que chamamos de adaptação.
reduz ao processo através do qual são definidos os ob- Com sentido análogo ao da Biologia, emprega a pala-
jetivos, o conteúdo programático, os procedimentos de vra adaptação para designar o processo que ocasiona uma
ensino, os recursos didáticos, a sistemática de avaliação mudança contínua no indivíduo, decorrente de sua cons-
da aprendizagem, bem como a bibliografia básica a ser tante interação com o meio.
consultada no decorrer de um curso, série ou disciplina Esse ciclo adaptativo é constituído por dois subproces-
de estudo. Com efeito, este é o padrão de planejamento sos: assimilação e acomodação. A assimilação está rela-
adotado pela maioria dos professores e que passou a ser cionada à apropriação de conhecimentos e habilidade.
valorizado apenas em sua dimensão técnica. O processo de assimilação é um dos conceitos funda-
Em nosso entendimento a escola faz parte de um con- mentais da teoria da instrução e do ensino. Permite-nos
texto que engloba a sociedade, sua organização, sua estru- entender que o ato de aprender é um ato de conhecimento
tura, sua cultura e sua história. Desse modo, qualquer pro- pelo qual assimilamos mentalmente os fatos, fenômenos e
jeto de ensino – aprendizagem está ligado a este contexto relações do mundo, da natureza e da sociedade, através do
e ao modo de cultura que orienta um modelo de homem estudo das matérias de ensino. Nesse sentido, podemos
e de mulher que pretendemos formar, para responder aos dizer que a aprendizagem é uma relação cognitiva entre o
desafios desta sociedade. Por esta razão, pensamos que é sujeito e os objetos de conhecimento.
de fundamental importância que os professores saibam A acomodação é que ajuda na reorganização e na
que tipo de ser humano pretendem formar para esta so- modificação dos esquemas assimilatórios anteriores do
ciedade, pois disto depende, em grande parte, as escolhas indivíduo para ajustá-los a cada nova experiência, acomo-
que fazemos pelos conteúdos que ensinamos, pela me- dando-as às estruturas mentais já existentes. Portanto, a
todologia que optamos e pelas atitudes que assumimos adaptação é o equilíbrio entre assimilação e acomodação,
diante dos alunos. De certo modo esta visão limitada ou e acarreta uma mudança no indivíduo.

62
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A inteligência desempenha uma função adaptativa, Outros autores - Bloom, Hastings e Madaus (1971) -
pois é através dela que o indivíduo coleta as informações também relacionam a avaliação com a verificação de ob-
do meio e as reorganiza, de forma a compreender melhor jetivos educacionais. Em função da finalidade da avaliação,
arealidade em que vive, nela agi, transformando. Para Pia- consideram três tipos de avaliação: uma preparação inicial
get (1969, p.38), a inteligência é adaptação na sua forma para a aprendizagem, uma verificação da existência de di-
mais elevada, isto é, o desenvolvimento mental, em sua or- ficuldades por parte do aluno durante a aprendizagem e o
ganização progressiva, é uma forma de adaptação sempre controle sobre se os alunos atingiram os objetivos fixados
mais precisa à realidade. É preciso ter sempre em mente previamente. Os tipos de avaliação referidos representam,
que Piaget usa a palavra adaptação no sentido em que é respectivamente, a avaliação diagnóstica, a avaliação for-
usado pela Biologia, ou seja, uma modificação que ocorre mativa e a avaliação certificativa.
no indivíduo em decorrência de sua interação com o meio. Também Noizet e Caverni (1985) e Cardinet (1993) se
Portanto, é no processo de construção do conhecimen- referem à avaliação como um processo de verificação de
to e na aquisição de saberes que devemos fazer com que objetivos, em que a produção escolar dos alunos é compa-
o aluno seja motivado a desenvolver sua aprendizagem e rada a um modelo. Para o último autor, o processo de ava-
ao mesmo tempo superar as dificuldades que sentem em liação contribui para a eficácia do ensino, porque consiste
assimilar o conhecimento adquirido.24 na observação e interpretação dos seus efeitos. No limite,
permite orientar as decisões necessárias ao bom funciona-
Avaliação da aprendizagem: conceitos e procedi- mento da escola.
mentos. De Ketele (1993) referencia, também, a avaliação ao
Uma das tarefas que mais realizamos na nossa vida co- processo de verificação de objetivos previamente defini-
tidiana é a tarefa de avaliar, nos seus mais variados senti- dos. Segundo este autor, é no próprio processo de ensino-
dos, que pode ir desde a análise simples de “que roupa usar -aprendizagem que surge a avaliação, funcionando como
para sair”, avaliando se está frio ou calor, ou até mesmo um mecanismo que verifica se os objetivos pretendidos
que atividades desenvolveremos hoje. No nosso dia-a-dia, são efetivamente atingidos.
de acordo com as necessidades, possibilidades e desejos, Atribuindo à descrição do processo um papel impor-
estamos fazendo escolhas ou tomando decisões, caracteri- tante na avaliação, Stufflebeam (1985) refere que é pre-
zando o que denominamos de uma avaliação informal. Esta ciso, primeiro, identificar as necessidades educacionais e
é a avaliação que fazemos, quase que automaticamente, só depois elaborar programas de avaliação centrados no
mas existe outro tipo de avaliação - avaliação formal ou processo educativo, para que seja possível aperfeiçoar este
sistemática - que é regulamentada por outros dados. Ela processo. O modelo C.I.P.P., sugerido por este autor, pro-
exige objetivos bem definidos, critérios selecionados e está cura definir a avaliação como um processo racional onde
direcionada para um processo ou um resultado de uma si- existe um contexto (C), uma entrada ou input (I), um pro-
tuação, atividade ou um dado específico, e deve levar em cesso (P) e um produto (P). A informação recolhida com a
consideração o contexto onde ela se realiza. É neste tipo de avaliação permite aos agentes educativos reunirem dados
avaliação que se insere a avaliação educacional. para tomarem decisões, subsequentemente.
No sistema educacional, a avaliação é usada para a co- Comparar a avaliação a um sistema de comunicação é
leta de informação, necessária aos diversos componentes a perspectiva apresentada por outros autores, como Cardi-
do sistema (os responsáveis pela determinação das políti- net (1993), que considera a avaliação como um sistema de
cas educacionais; os diretores de escolas; os professores; os comunicação entre professores e alunos, por meio de um
alunos) em sua tomada de decisões. processo sistemático de coleta de informação.
A avaliação educacional pode ser considerada como Para além da verificação de objetivos, Scriven (1967)
um dos temas que, ao serem abordados, sempre requerem considera que na avaliação há uma descrição com um jul-
um exercício de “olhar para o passado” para entender o que gamento, ou seja, são apreciados os objetivos de ensino.
reserva o futuro. “Enfim, terá de ser o instrumento do re- Este autor foi o primeiro a definir os conceitos de avaliação
conhecimento dos caminhos percorridos e da identificação formativa e somativa, que serão abordados mais adiante.
dos caminhos a serem perseguidos” (Luckesi, 1995, p. 43). Perrenoud (1978, 1982), por seu lado, considera que
a avaliação participa na gênese da desigualdade existente
Os diversos conceitos de avaliação ao nível da aprendizagem e do êxito dos alunos. Segun-
Começou-se a falar na avaliação aplicada à educação do ele, avaliação escolar, na sua forma corrente, é uma
com Tyler (1949), considerado como o pai da avaliação avaliação de referência normativa. A função reprodutora
educacional. Ele a encara como a comparação constante da escola, para o autor, concretiza-se através de práticas
entre os resultados dos alunos, ou o seu desempenho e avaliativas de referência normativa que reproduzem as
objetivos, previamente definidos. A avaliação é, assim com- desigualdades sociais.
preendida, o processo de determinação da extensão com Entende-se, hoje, que a avaliação é uma atividade sub-
que os objetivos educacionais se realizam. jetiva, envolvendo mais do que medir, a atribuição de um
24 Fonte: www.webartigos.com - Texto adaptado de Maria Se- valor de acordo com critérios que envolvem diversos pro-
bastiana Gomes Mota e Francisca Elisa de Lima Pereira blemas técnicos e éticos.

63
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Características e funções  da avaliação


A avaliação caracteriza-se de acordo com vários aspectos:
Quanto à forma pode ser: (i) escrita, com respostas curtas (as que requerem a marcação de alternativas de respostas)
ou discursivas (aquelas em que os alunos constroem e redigem uma resposta); (ii) oral; (iii) por observação e anotações
sobre o objeto; (iv) por análise documental; (v) por monitoramento do objeto de estudo, estando ele sob influência da
inserção ou retirada de um fator ambiental.
Quanto às funções:
De acordo com a sua finalidade, pode-se identificar os seguintes tipos de avaliação:
• somativa - realizada em uma única oportunidade, relativa aos processos ocorridos num período de tempo passa-
do; por isso também é uma avaliação final, cujas funções se destinam a verificar se os objetivos inicialmente estabelecidos
são os resultados alcançados ao término de um processo, sendo que sua aplicação está geralmente voltada para a certifi-
cação, promoção ou seleção;
• formativa - é contínua pois se realiza ao longo de todo o processo educacional e tem como finalidade permitir
o acompanhamento e análise dos pontos fortes e fracos desse processo, para que se possa aperfeiçoá-lo quando ainda
estiver ocorrendo.
• diagnóstica  - é inicial, quando aplicada no início do processo que se quer avaliar, tendo, por exemplo, a função de
identificar o estágio de aprendizagem ou desenvolvimento em que os alunos se encontram, esclarecendo aquilo que eles já
detêm dos pré-requisitos necessários ao ingresso numa nova etapa de ensino. Também pode ocorrer num momento durante o
processo de ensino e aprendizagem quando, por exemplo, buscam-se as causas do fracasso que possa ocorrer na aprendizagem.
Quanto a quem avalia: de acordo com quem a realiza, existem três tipos de avaliação: a autoavaliação, a heteroava-
liação e a avaliação mista ou coavaliação:
Autoavaliação: neste caso, quem emite o juízo de valor sobre o que é examinado é o próprio objeto da avaliação, ou
seja, o avaliador é o próprio avaliado.
A autoavaliação tem um enorme potencial formativo e permite que as pessoas e as organizações conheçam suas po-
tencialidades e limitações, além de permitir a reflexão sobre a própria realidade, que é um passo essencial no processo de
sua transformação.
Por exemplo, a autoavaliação docente é um bom ponto de partida para a melhora dos processos de ensino-aprendi-
zagem; a avaliação da aprendizagem pelos próprios alunos permite que eles descubram seus erros, o que gera mais facil-
mente o conflito cognitivo necessário para toda aprendizagem.
A heteroavaliação: ao contrário da autoavaliação, a heteroavaliação é realizada por uma outra pessoa ou por uma
equipe. Pode ser executada, por exemplo, pelo professor ao avaliar seus alunos, pelo diretor de uma escola ao avaliar o
trabalho docente, por uma Secretaria Municipal ou Estadual de Educação ou mesmo pelo Ministério da Educação, ao ava-
liarem escolas ou redes. 
É muito útil para conhecimento de aspectos do processo com os quais os avaliadores e os avaliados estão muito envol-
vidos, pois o avaliador lança um olhar externo sobre o objeto da avaliação, podendo assim contribuir com visões diferentes
das do avaliado sobre a função da educação, os padrões de desempenho desejável e os métodos de avaliação.
Como exemplo de heteroavaliações podem ser citadas as avaliações feitas pelos professores em sala de aula, os ves-
tibulares, as avaliações dos sistemas nacionais de educação ou as de programas educacionais, entre outras.
A coavaliação: neste processo participam tanto agentes externos (como os gestores e financiadores) quanto aqueles
que executam quotidianamente a educação formal. Este tipo de avaliação possibilita a formulação de diferentes pontos de
vista sobre a valoração do objeto avaliado e o contraste de resultados.
A avaliação dos sistemas de ensino, por exemplo, deve se basear também na avaliação das escolas por si próprias. Nes-
te caso, além de ser avaliada por agentes externos, cada escola deve se autoavaliar em função de seus programas, projetos,
materiais pedagógicos, recursos, professores, gestão, pessoal de apoio, alunos e infraestrutura.  “A avaliação deve passar
de um discurso de descrição e julgamento para um discurso de diálogo”  (Nevo, 1988).  Toda a comunidade da escola deve
ser preparada para poder combinar os produtos das heteroavaliações e autoavaliações.
Principais características da avaliação e seus focos intra e extraescolares

Principais Avaliação com foco em objetos Avaliação com foco em objetos


características dimensionais no âmbito da escola dimensionais em âmbitos extraescolares
Na maioria das vezes é aplicada na
Geralmente realizada por meio de testes forma de testes escritos e questionários
Quanto à forma escritos ou orais, podendo ser utilizadas socioeconômicos, mas também pode
outras formas ser realizada de outras formas, como a
investigação documental

64
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Geralmente a função somativa tem


sido enfatizada, mas acredita-se que Pode apresentar quaisquer funções
Quanto à função o ideal é a aplicação das outras duas inclusive reunindo as duas ou as três numa
funções (diagnóstica e formativa) em única avaliação
complementação a esta
Assim como a avaliação no âmbito
Quanto à relação Pode-se concretizar como autoavaliação,
escolar, pode apresentar as três relações
sujeito-objeto heteroavaliação ou coavaliação
entre sujeito e objeto
Quanto ao foco de Os processos e resultados das ações de Os processos e resultados da educação
interesse ensino-aprendizagem enquanto fenômeno social
Investiga e atende aos interesses O universo que investiga e os interesses
Quanto à amplitude/ da comunicade escolar imediata (pais, a que atende amiúde são muito extensos,
extensão alunos, diretores, professores, corpo de voltando-se para a sociedade como um
funcionários da escola) todo ou para parcelas da mesma

Os diversos tipos de avaliação educacional


O mais tradicional objeto da avaliação educacional é o aluno, que, durante todo o ano escolar, é avaliado por seus
professores. No entanto, os focos de interesse da avaliação são cada vez mais diversificados, tornando mais frequentes e
mesmo comuns, no cotidiano da sociedade, as referências à avaliação de cursos, de escolas, de instituições, de professores,
de diretores, de rendimento dos alunos, de desempenho dos sistemas de ensino, de materiais didáticos, de currículos, de
experiências e inovações educacionais, etc. Considerando o desenvolvimento e a produção acadêmica da área, é possível
afirmar que quase todos os aspectos da educação e também fatores a ela relacionados são passíveis de se tornar objeto
de avaliação.
A existência deste leque tão grande de interesses e possibilidades na área da avaliação educacional torna imprescindí-
vel, em qualquer projeto de avaliação, a delimitação e a definição precisa do objeto a ser avaliado. A precisão e qualidade
da resposta à pergunta o que avaliar definem o nível e a abrangência da avaliação, assim como os indicadores a serem
considerados, os dados a serem coletados e como todas as informações serão analisadas.
 Assim, o processo de avaliação pode abranger o sistema educacional de um país, ou uma rede de ensino, ou um grupo
de escolas, ou uma escola, ou uma turma de alunos, ou até mesmo um único aluno.    
 O entendimento de que todo processo educacional é composto por diferentes aspectos e sofre influências de fatores
externos a ele faz com que os projetos de avaliação sejam abrangentes e tenham diversos objetos de interesse, para os
quais existem instrumentos específicos de avaliação, como por exemplo: a aprendizagem dos alunos, os condicionantes
socioeconômicos e culturais dos alunos, o perfil do professorado, a prática docente, as condições de funcionamento das
escolas, as características da gestão escolar e o clima organizacional, entre outros.
Por isso, é tendência atual da avaliação educacional o desenvolvimento de projetos que buscam articular, compatibi-
lizar e utilizar distintos modelos, ferramentas e instrumentos, de modo a melhor apreender os multifacetados aspectos do
processo educacional, objeto da avaliação.25

Avaliação da Aprendizagem
A avaliação é parte integrante do processo ensino/aprendizagem e ganhou na atualidade espaço muito amplo nos
processos de ensino. Requer preparo técnico e grande capacidade de observação dos profissionais envolvidos.
 Segundo Perrenoud (1999), a avaliação da aprendizagem, no novo paradigma, é um processo mediador na construção
do currículo e se encontra intimamente relacionada à gestão da aprendizagem dos alunos.
Na avaliação da aprendizagem, o professor não deve permitir que os resultados das provas periódicas, geralmente de
caráter classificatório, sejam supervalorizados em detrimento de suas observações diárias, de caráter diagnóstico.
O professor, que trabalha numa dinâmica interativa, tem noção, ao longo de todo o ano, da participação e produtivi-
dade de cada aluno. É preciso deixar claro que a prova é somente uma formalidade do sistema escolar. Como, em geral, a
avaliação formal é datada e obrigatória, devem-se ter inúmeros cuidados em sua elaboração e aplicação. 
A avaliação, tal como concebida e vivenciada na maioria das escolas brasileiras, tem se constituído no principal meca-
nismo de sustentação da lógica de organização do trabalho escolar e, portanto, legitimador do fracasso, ocupando mesmo
o papel central nas relações que estabelecem entre si os profissionais da educação, alunos e pais. 
Os métodos de avaliação ocupam sem duvida espaço relevantes no conjunto das práticas pedagógicas aplicadas ao
processo de ensino e aprendizagem. Avaliar, neste contexto, não se resume à mecânica do conceito formal e estatístico; não
é simplesmente atribuir notas, obrigatórias à decisão de avanço ou retenção em determinadas disciplinas. 
25 Fonte: www.educacaopublica.rj.gov.br – Por Maria Cândida Trigo

65
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Para Oliveira (2003), devem representar as avaliações Havendo sempre, no processo de ensino/aprendiza-
aqueles instrumentos imprescindíveis à verificação do gem, um caminho a seguir entre um ponto de partida e um
aprendizado efetivamente realizado pelo aluno, ao mesmo ponto de chegada, naturalmente que é necessário verificar
tempo que forneçam subsídios ao trabalho docente, dire- se o trajeto está a decorrer em direção à meta, se alguns
cionando o esforço empreendido no processo de ensino pararam por não saber o caminho ou por terem envereda-
e aprendizagem de forma a contemplar a melhor abor- do por um desvio errado.
dagem pedagógica e o mais pertinente método didático É essa informação, sobre o progresso de grupos e de
adequado à disciplina – mas não somente -, à medida que cada um dos seus membros, que a avaliação tenta recolher
consideram, igualmente, o contexto sócio-político no qual e que é necessária a professores e alunos.
o grupo está inserido e as condições individuais do aluno, A avaliação descreve que conhecimentos, atitudes ou
sempre que possível. aptidões que os alunos adquiriram, ou seja, que objetivos
A avaliação da aprendizagem possibilita a tomada de do ensino já atingiram num determinado ponto de percur-
so e que dificuldades estão a revelar relativamente a outros.
decisão e a melhoria da qualidade de ensino, informando
Esta informação é necessária ao professor para pro-
as ações em desenvolvimento e a necessidade de regula-
curar meios e estratégias que possam ajudar os alunos a
ções constantes.
resolver essas dificuldades e é necessária aos alunos para
se aperceberem delas (não podem os alunos identificar
Origem da avaliação claramente as suas próprias dificuldades num campo que
Avaliar vem do latim a + valere, que significa atribuir desconhecem) e tentarem ultrapassá-las com a ajuda do
valor e mérito ao objeto em estudo. Portanto, avaliar é atri- professor e com o próprio esforço. Por isso, a avaliação tem
buir um juízo de valor sobre a propriedade de um processo uma intenção formativa.
para a aferição da qualidade do seu resultado, porém, a A avaliação proporciona também o apoio a um proces-
compreensão do processo de avaliação do processo ensi- so a decorrer, contribuindo para a obtenção de produtos
no/aprendizagem tem sido pautada pela lógica da mensu- ou resultados de aprendizagem.
ração, isto é, associa-se o ato de avaliar ao de “medir” os As avaliações a que o professor procede enquadram-
conhecimentos adquiridos pelos alunos.  -se em três grandes tipos: avaliação diagnostica, formativa
A avaliação tem sido estudada desde o início do século e somativa.
XX, porém, segundo Caro apud Goldberg & Souza (1982),
desde 1897 existem registros dos relatos de J. M. Rice so- Evolução da avaliação
bre uma pesquisa avaliativa utilizada para estabelecer a re- A partir do início do século XX, a avaliação vem atra-
lação entre o tempo de treinamento e o rendimento em vessando pelo menos quatro gerações, conforme Guba e
ortografia, revelando que uma grande ênfase em exercícios Lincoln, apud Firme (1994). São elas: mensuração, descriti-
não levava necessariamente a um melhor rendimento. va, julgamento e negociação.
As duas primeiras décadas deste século, de acordo – Mensuração – não distinguia avaliação e medida.
com Borba & Ferri (1997), foram marcadas pelo desenvol- Nessa fase, era preocupação dos estudiosos a elaboração
vimento de testes padronizados para medir as habilidades de instrumentos ou testes para verificação do rendimento
e aptidões dos alunos e influenciados, principalmente nos escolar. O papel do avaliador era, então, eminentemente
Estados Unidos, pelos estudos de Robert Thorndike. técnico e, neste sentido, testes e exames eram indispen-
Nessa época, as pesquisas avaliativas voltavam-se par- sáveis na classificação de alunos para se determinar seu
ticularmente para a mensuração de mudanças do com- progresso.
portamento humano. Caro apud Goldberg & Souza (1982) – Descritiva – essa geração surgiu em busca de melhor
entendimento do objetivo da avaliação. Conforme os es-
aponta várias destas pesquisas realizadas nos anos 20 para
tudiosos, a geração anterior só oferecia informações sobre
medir efeitos de programas de diversas áreas sobre o com-
o aluno.
portamento das pessoas.
 Precisavam ser obtidos dados em função dos objetivos
 Eram realizados experimentos relativos à produtivida-
por parte dos alunos envolvidos nos programas escolares,
de e à moral dos operários, à eficácia de programas de saú- sendo necessário descrever o que seria sucesso ou dificul-
de pública, à influência de programas experimentais uni- dade com relação aos objetivos estabelecidos.
versitários sobre a personalidade e atitudes dos alunos, etc.  Neste sentido o avaliador estava muito mais concen-
A avaliação da aprendizagem tem seus princípios e ca- trado em descrever padrões e critérios. Foi nessa fase que
racterísticas no campo da Psicologia, sendo que as duas surgiu o termo “avaliação educacional”. 
primeiras décadas do século XX foram marcadas pelo de- – Julgamento – a terceira geração questionava os tes-
senvolvimento de testes padronizados para medir as habi- tes padronizados e o reducionismo da noção simplista de
lidades e aptidões dos alunos. avaliação como sinônimo de medida; tinha como preocu-
A avaliação é uma operação descritiva e informativa pação maior o julgamento.
nos meios que emprega, formativa na intenção que lhe  Neste sentido, o avaliador assumiria o papel de juiz,
preside e independente face à classificação. De âmbito incorporando, contudo, o que se havia preservado de fun-
mais vasto e conteúdo mais rico, a avaliação constitui uma damental das gerações anteriores, em termos de mensura-
operação indispensável em qualquer sistema escolar. ção e descrição.

66
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

 Assim, o julgamento passou a ser elemento crucial do  Estes mecanismos permitem que o professor detecte e
processo avaliativo, pois não só importava medir e descre- identifique deficiências na forma de ensinar, possibilitando
ver, era preciso julgar sobre o conjunto de todas as dimen- reformulações no seu trabalho didático, visando aperfei-
sões do objeto, inclusive sobre os próprios objetivos.  çoa-lo.
– Negociação – nesta geração, a avaliação é um pro- Para Bloom, Hastings e Madaus (1975), a avaliação for-
cesso interativo, negociado, que se fundamenta num pa- mativa visa informar o professor e o aluno sobre o ren-
radigma construtivista. Para Guba e Lincoln apud Firme dimento da aprendizagem no decorrer das atividades es-
(1994) é uma forma responsiva de enfocar e um modo colares e a localização das deficiências na organização do
construtivista de fazer. ensino para possibilitar correção e recuperação.
A avaliação é responsiva porque, diferentemente das A avaliação formativa pretende determinar a posição
alternativas anteriores que partem inicialmente de variá- do aluno ao longo de uma unidade de ensino, no sentido
veis, objetivos, tipos de decisão e outros, ela se situa e de- de identificar dificuldades e de lhes dar solução. 
senvolve a partir de preocupações, proposições ou contro-
– Função somativa – Tem como objetivo, segundo Mi-
vérsias em relação ao objetivo da avaliação, seja ele um
ras e Solé (1996, p. 378) determinar o grau de domínio do
programa, projeto, curso ou outro foco de atenção. Ela é
aluno em uma área de aprendizagem, o que permite ou-
construtivista em substituição ao modelo científico, que
torgar uma qualificação que, por sua vez, pode ser utilizada
tem caracterizado, de um modo geral, as avaliações mais
prestigiadas neste século. como um sinal de credibilidade da aprendizagem realizada.
Neste sentido, Souza (1993) diz que a finalidade da Pode ser chamada também de função creditativa. Tam-
avaliação, de acordo com a quarta geração, é fornecer, so- bém tem o propósito de classificar os alunos ao final de
bre o processo pedagógico, informações que permitam aos um período de aprendizagem, de acordo com os níveis de
agentes escolares decidir sobre as intervenções e redirecio- aproveitamento.
namentos que se fizerem necessários em face do projeto A avaliação somativa pretende ajuizar do progresso
educativo, definido coletivamente, e comprometido com realizado pelo aluno no final de uma unidade de apren-
a garantia da aprendizagem do aluno. Converte-se, então, dizagem, no sentido de aferir resultados já colhidos por
em um instrumento referencial e de apoio às definições avaliações do tipo formativa e obter indicadores que per-
de natureza pedagógica, administrativa e estrutural, que se mitem aperfeiçoar o processo de ensino. Corresponde a
concretiza por meio de relações partilhadas e cooperativas.  um balanço final, a uma visão de conjunto relativamente a
um todo sobre o qual, até aí, só haviam sido feitos juízos
Funções do processo avaliativo  parcelares. 
As funções da avaliação são: de diagnóstico, de verifi-
cação e de apreciação. Objetivos da avaliação 
– Função diagnóstica - A primeira abordagem, de acor- Na visão de Miras e Solé (1996, p. 375), os objetivos da
do com Miras e Solé (1996, p. 381), contemplada pela ava- avaliação são traçados em torno de duas possibilidades:
liação diagnóstica (ou inicial), é a que proporciona infor- emissão de “um juízo sobre uma pessoa, um fenômeno,
mações acerca das capacidades do aluno antes de iniciar uma situação ou um objeto, em função de distintos crité-
um processo de ensino/aprendizagem, ou ainda, segundo rios”, e “obtenção de informações úteis para tomar alguma
Bloom, Hastings e Madaus (1975), busca a determinação decisão”.
da presença ou ausência de habilidades e pré-requisitos,  Para Nérici (1977), a avaliação é uma etapa de um
bem como a identificação das causas de repetidas dificul- procedimento maior que incluiria uma verificação prévia.
dades na aprendizagem.  A avaliação, para este autor, é o processo de ajuizamento,
A avaliação diagnóstica pretende averiguar a posição
apreciação, julgamento ou valorização do que o educando
do aluno face a novas aprendizagens que lhe vão ser pro-
revelou ter aprendido durante um período de estudo ou de
postas e a aprendizagens anteriores que servem de base
desenvolvimento do processo ensino/aprendizagem.
àquelas, no sentido de obviar as dificuldades futuras e, em
 Segundo Bloom, Hastings e Madaus (1975), a avalia-
certos casos, de resolver situações presentes. 
– Função formativa - A segunda função á a avaliação ção pode ser considerada como um método de adquirir e
formativa que, conforme Haydt (1995, p. 17), permite cons- processar evidências necessárias para melhorar o ensino e
tatar se os alunos estão, de fato, atingindo os objetivos a aprendizagem, incluindo uma grande variedade de evi-
pretendidos, verificando a compatibilidade entre tais ob- dências que vão além do exame usual de ‘papel e lápis’.
jetivos e os resultados efetivamente alcançados durante o  É ainda um auxílio para classificar os objetivos signifi-
desenvolvimento das atividades propostas. cativos e as metas educacionais, um processo para deter-
  Representa o principal meio através do qual o estu- minar em que medida os alunos estão se desenvolvendo
dante passa a conhecer seus erros e acertos, assim, maior dos modos desejados, um sistema de controle da quali-
estímulo para um estudo sistemático dos conteúdos. dade, pelo qual pode ser determinada etapa por etapa do
 Outro aspecto destacado pela autora é o da orienta- processo ensino/aprendizagem, a efetividade ou não do
ção fornecida por este tipo de avaliação, tanto ao estudo processo e, em caso negativo, que mudança devem ser fei-
do aluno como ao trabalho do professor, principalmente tas para garantir sua efetividade. 
através de mecanismos de feedback.

67
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Modelo tradicional de avaliação versus modelo mais adequado


Gadotti (1990) diz que a avaliação é essencial à educação, inerente e indissociável enquanto concebida como proble-
matização, questionamento, reflexão, sobre a ação.
Entende-se que a avaliação não pode morrer. Ela se faz necessária para que possamos refletir questionar e transformar
nossas ações.
O mito da avaliação é decorrente de sua caminhada histórica, sendo que seus fantasmas ainda se apresentam como
forma de controle e de autoritarismo por diversas gerações. Acreditar em um processo avaliativo mais eficaz é o mesmo
que cumprir sua função didático-pedagógica de auxiliar e melhorar o ensino/aprendizagem. 
A forma como se avalia, segundo Luckesi (2002), é crucial para a concretização do projeto educacional. É ela que sina-
liza aos alunos o que o professor e a escola valorizam.

Tabela 1 – Comparação entre a concepção tradicional de avaliação com uma mais adequada
Modelo tradicional de avaliação Modelo adequado
Foco na promoção – o alvo dos alunos é a promoção. Nas Foco na aprendizagem – o alvo do aluno deve ser a
primeiras aulas, se discutem as regras e os modos pelos aprendizagem e o que de proveitoso e prazeroso dela
quais as notas serão obtidas para a promoção de uma série obtém.Implicação – neste contexto, a avaliação deve
para outra.Implicação – as notas vão sendo observadas e ser um auxílio para se saber quais objetivos foram
registradas. Não importa como elas foram obtidas, nem por atingidos, quais ainda faltam e quais as interferências
qual processo o aluno passou. do professor que podem ajudar o aluno.
Foco nas provas – são utilizadas como objeto de pressão Foco nas competências – o desenvolvimento das
psicológica, sob pretexto de serem um ‘elemento motivador competências previstas no projeto educacional
da aprendizagem’, seguindo ainda a sugestão de Comenius devem ser a meta em comum dos professores.
em sua Didática Magna criada no século XVII. É comum Implicação – a avaliação deixa de ser somente um
ver professores utilizando ameaças como “Estudem! Caso objeto de certificação da consecução de objetivos,
contrário, vocês poderão se dar mal no dia da prova!” ou mas também se torna necessária como instrumento
“Fiquem quietos! Prestem atenção! O dia da prova vem aí e de diagnóstico e acompanhamento do processo de
vocês verão o que vai acontecer…”Implicação – as provas aprendizagem. Neste ponto, modelos que indicam
são utilizadas como um fator negativo de motivação. Os passos para a progressão na aprendizagem, como a
alunos estudam pela ameaça da prova, não pelo que a Taxionomia dos Objetivos Educacionais de Benjamin
aprendizagem pode lhes trazer de proveitoso e prazeroso. Bloom, auxiliam muito a prática da avaliação e a
Estimula o desenvolvimento da submissão e de hábitos de orientação dos alunos.
comportamento físico tenso (estresse).
Os estabelecimentos de ensino estão centrados nos Estabelecimentos de ensino centrados na
resultados das provas e exames – eles se preocupam qualidade – os estabelecimentos de ensino devem
com as notas que demonstram o quadro global dos preocupar-se com o presente e o futuro do aluno,
alunos, para a promoção ou reprovação.Implicação – o especialmente com relação à sua inclusão social
processo educativo permanece oculto. A leitura das médias (percepção do mundo, criatividade, empregabilidade,
tende a ser ingênua (não se buscam os reais motivos para interação, posicionamento, criticidade).Implicação –
discrepâncias em determinadas disciplinas). o foco da escola passa a ser o resultado de seu ensino
para o aluno e não mais a média do aluno na escola.
O sistema social se contenta com as notas – as notas são Sistema social preocupado com o futuro –
suficientes para os quadros estatísticos. Resultados dentro já alertava o ex-ministro da Educação, Cristóvam
da normalidade são bem vistos, não importando a qualidade Buarque: “Para saber como será um país daqui há 20
e os parâmetros para sua obtenção (salvo nos casos de anos, é preciso olhar como está sua escola pública
exames como o ENEM que, de certa forma, avaliam e no presente”. Esse é um sinal de que a sociedade
“certificam” os diferentes grupos de práticas educacionais e já começa a se preocupar com o distanciamento
estabelecimentos de ensino).Implicação – não há garantia educacional do Brasil com o dos demais países. É
sobre a qualidade, somente os resultados interessam, mas esse o caminho para revertermos o quadro de uma
estes são relativos. Sistemas educacionais que rompem com educação “domesticadora” para “humanizadora”.
esse tipo de procedimento tornam-se incompatíveis com Implicação – valorização da educação de resultados
os demais, são marginalizados e, por isso, automaticamente efetivos para o indivíduo.
pressionados a agir da forma tradicional.

Adaptado de Luckesi (2002)

68
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A avaliação da aprendizagem como processo cons-


trutivo de um novo fazer  GESTÃO DA APRENDIZAGEM.
O processo de conquista do conhecimento pelo alu-
no ainda não está refletido na avaliação. Para Wachowicz
& Romanowski (2002), embora historicamente a questão
tenha evoluído muito, pois trabalha a realidade, a prática Gestão e Aprendizagem são duas palavras que instau-
mais comum na maioria das instituições de ensino ainda é ram conexões interessantes estabelecendo diálogos entre
um registro em forma de nota, procedimento este que não elas e abrindo possibilidades com interlocutores diversos
tem as condições necessárias para revelar o processo de no contexto da educação brasileira.
aprendizagem, tratando-se apenas de uma contabilização O denominador comum a ambas é com certeza, a vida
dos resultados. humana processo vivo, dinâmico, concreto e não uma abs-
Quando se registra, em forma de nota, o resultado ob- tração metafórica. Vida de cada pessoa e de pessoas em in-
tido pelo aluno, fragmenta-se o processo de avaliação e in- teração, em contínuo exercício de múltiplas aprendizagens
troduz-se uma burocratização que leva à perda do sentido e “ensinagens”, vida de pessoa e pessoas que precisam ser
do processo e da dinâmica da aprendizagem. gestadas em muitas dimensões e à luz de valores que con-
Se a avaliação tem sido reconhecida como uma função ferem significado.
diretiva, ou seja, tem a capacidade de estabelecer a direção “Todo ser humano é inconcluso e é aí que se funda a
do processo de aprendizagem, oriunda esta capacidade de educação como processo permanente”, diz Paulo Freire e é
sua característica pragmática, a fragmentação e a burocra- nesta perspectiva que Gestão e Aprendizagem inauguram
tização acima mencionadas levam à perda da dinamicidade contornos para que a vida aconteça.
do processo. Aprendizagem entendida como processo ativo e inte-
Os dados registrados são formais e não representam rativo contemplando o ensino como dimensão implícita ao
a realidade da aprendizagem, embora apresentem conse- conceito. “Mestre, não é aquele que ensina, mas o que de
quências importantes para a vida pessoal dos alunos, para repente, aprende” já anunciava Guimarães Rosa em Gran-
a organização da instituição escolar e para a profissionali- des Sertões/Veredas.
zação do professor. Gestão como processo igualmente dinâmico: planeja,
Uma descrição da avaliação e da aprendizagem pode- organiza e avalia o processo de educação e de vida, opor-
ria revelar todos os fatos que aconteceram na sala de aula. tunizando tempos e espaços, imprimindo rumo e operacio-
Se fosse instituída, a descrição (e não a prescrição) seria nalizando intenções.
uma fonte de dados da realidade, desde que não houvesse Gestão e Aprendizagem no cenário concreto da educa-
uma vinculação prescrita com os resultados. ção brasileira: Possibilidade? Desafio?
A isenção advinda da necessidade de analisar a apren- A educação brasileira nos dias atuais tem sido contem-
dizagem (e não julgá-la) levaria o professor e os alunos a plada com uma avalanche de reportagens trazidas à tona
constatarem o que realmente ocorreu durante o processo: pela mídia em suas múltiplas manifestações, tais como jor-
se o professor e os alunos tivessem espaço para revelar os nais, revistas, rádio e televisão, equacionando informações
fatos tais como eles realmente ocorreram, a avaliação seria que de um lado, enfatizam a importância da escola, do pro-
real, principalmente discutida coletivamente. fessor e do processo de educação como alavanca de de-
No entanto, a prática das instituições não encontrou senvolvimento social e econômico e de outro lado, ques-
uma forma de agir que tornasse possível essa isenção: as tionam a qualidade, a eficiência do que está acontecendo
prescrições suplantam as descrições e os pré-julgamentos nas salas de aula pelo Brasil afora, atingindo diretamente a
impedem as observações. todos os que batalham nesta área.
A consequência mais grave é que essa arrogância Todo professor/gestor tem sido atingido por estas
não permite o aperfeiçoamento do processo de ensino e inquietações e as informações trazidas pelos diferentes
aprendizagem. E este é o grande dilema da avaliação da meios de comunicação apresentam indicadores comuns
aprendizagem. referendados por estudos, pesquisas e experiências de
O entendimento da avaliação, como sendo a medida sucesso nos diferentes países do mundo, com ênfase nas
dos ganhos da aprendizagem pelo aluno, vem sofrendo nações que nos últimos anos deram saltos significativos
denúncias há décadas, desde que as teorias da educação na educação.
escolar recolocaram a questão no âmbito da cognição. Essas análises indicam prioridades a serem adotadas
Pretende-se uma mudança da avaliação de resultados pela educação brasileira em duas dimensões:- políticas pú-
para uma avaliação de processo, indicando a possibilidade blicas em nível macro e sistêmico e a outra em nível micro
de realizar-se na prática pela descrição e não pela prescri- de atuação local e de compromisso de cada cidadão.
ção da aprendizagem.26 Do ponto de vista macro e sistêmico, são enfatizados:
- necessidade de investimentos financeiros bem administra-
dos; - elaboração de um currículo nacional como referência
26 Fonte: www.gestiopolis.com – Por Maria Elisabeth de conteúdos e de aprendizagens; - ênfase na meritocracia
Pereira Kraemer

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

como forma de incentivo ao trabalho de professores e ges- Como líder, ele clareia possibilidades, articula ativida-
tores; - importância do monitoramento e avaliação em to- des, age e interage de forma proativa no coletivo, sabendo
dos os níveis do processo de educação. delegar tarefas possíveis mas, principalmente, não abrindo
Na perspectiva micro de cada professor/gestor, os es- mão de ser o condutor do projeto político pedagógico da
tudos e pesquisas divulgados têm indicado como ações escola e da interlocução com a comunidade e com os ór-
que mais otimizam a educação: - o compromisso e a cren- gãos do governo.
ça em cada aluno, disseminando uma cultura do sucesso e Há que se destacar aqui, estas duas dimensões da ges-
não do fracasso escolar; a melhor qualificação do professor tão escolar:
como um grande impacto na sala de aula; - a sábia utiliza- -a dimensão interna: - relativa à organização dos es-
ção de material e metodologia adequados; - o monitora- paços e tempos das atividades escolares, de modo que se
mento e a avaliação constantes e sistemáticos das ações oportunizem condições de planejamento, trabalho, partici-
escolares; o envolvimento e a cobrança contínua dos pais e pação, tomada de decisões e de monitoramento e avalia-
ção do processo;
de toda sociedade civil em favor da qualidade da educação
- dimensão externa: diz respeito à função social da
ofertada por cada escola e a importância da direção/gestão
escola quanto à produção e reprodução do conhecimento
para oportunizar espaços e tempos de aprendizagens.
da humanidade, bem como das demandas que a sociedade
Estes dados de contexto deixam clara a margem de
trazem para a escola e a necessária interação.
possibilidades para ações conseqüentes e delineiam priori- Com isto, o diretor está garantindo a razão de ser da
dades para o saber/fazer educação. escola que não pode ser descaracterizada e nem mesmo
minimizada. Por exemplo, é saudável que ele delegue ati-
Ensino/Aprendizagem/Gestão vidades como organização do almoxarifado da escola, ou
O processo de educação entendido na perspectiva do ainda a confecção do horário de professores, desde que
humano inconcluso e a ser construído está pautado na con- existam critérios e um monitoramento a serem respeitados
cepção de pessoa como ser ativo, interativo, crítico que se nesta execução alinhada aos rumos da escola. Em hipótese
posiciona como sujeito concreto em suas múltiplas relações. alguma, ele pode delegar a questão da aprendizagem, dos
Nesta perspectiva, alguns eixos operacionais devem ser métodos, das formas de avaliação, que devem ser conduzi-
contemplados possibilitando a dialética do saber fazer arti- das no coletivo com os responsáveis em questão.
culado onde as pessoas ensinam/aprendem e devem gerir Ao contemplar a essência do ethos escolar, o diretor
processos no nível da vida pessoal, em projetos e instituições. está garantindo a excelência ou o fracasso que sua institui-
Em se tratando do diretor escolar existem muitos es- ção está promovendo, articulando a equipe escolar, como
tudos e pesquisas que indicam a importância desta função um time ou uma orquestra na condução dos seus objetivos.
como articuladora e responsável pelo processo de educa- A todo momento, ele traz à tona, o significado da educação
ção em curso. nos espaços e nos tempos desenvolvidos na escola, para
O diretor, enquanto elemento agregador e catalisador que não perca o rumo, a vibração, as crenças e os valores
potencializa a relação de forças existentes nas dimensões vivenciados nos eixos da ação escolar.
internas e externas de uma escola, oportunizando inova- A preocupação com o processo de construção do co-
ções, mudanças que se fazem ou não necessárias no en- nhecimento e a qualidade em que ele está ocorrendo deve
frentamento dos desafios. pontuar a sistematização de seu trabalho.
A existência de uma gestão colegiada personificada por
uma equipe diretiva não anula de forma alguma o papel Eixos de trabalho
fundante da atuação e da responsabilidade de um diretor. - Planejar
Em qualquer nível de gestão, a preocupação com o
Há uma afirmação muito interessante de que “a escola
planejamento é indicador de um conceito de pessoa, de
tem a cara do diretor”. Esta é uma expressão popular que
aprendizagem e de educação pautados na perspectiva di-
reitera esta importância reconhecendo o verdadeiro papel
nâmica e que conferem à ação educativa, possibilidades de
de liderança por ele desempenhado.
mudança, alteração de rumos e busca de resultados.
Com esta ênfase, não se minimiza e nem mesmo se Para qualquer pessoa que se veja em processo, o ato
descarta a participação de todos os demais segmentos da de planejar é uma prerrogativa inteligente e não apenas
escola, mas sinaliza-se a necessidade de gestão do pro- um exercício burocrático de preenchimento de formulários
cesso escolar como um todo, que não se restringe ao bom e entregas obrigatórias. Significa que o gestor tem claro
andamento de cada uma das salas de aula. que a realidade não funciona sem intervenções, ou ainda,
No coletivo escolar, as diferentes salas de aula precisam se ela for sempre igual, como exigir resultados diferentes
estar atreladas a um projeto pedagógico consequente que e neste sentido, não pode abrir mão do próprio pensar em
se refere à escola como um todo e serem oportunizadas e detrimento de que outros pensem por ele.
viabilizadas enquanto tempos e espaços em movimento. Exercer de forma consciente a atividade de planeja-
O diretor para alavancar de forma positiva o projeto mento apresenta significados altamente positivos, porque
pedagógico da escola, precisa em primeiro lugar, acreditar ele oportuniza o registro de diagnósticos e demandas,
na educação, nas pessoas enquanto processos de vida, e na equaciona respostas, organizando, sequenciando e dosan-
escola enquanto um espaço fundamental de vida humana. do atividades a serem feitas que constituem a sinalização

70
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

de direções a seguir e das pontes necessárias entre o que Na questão relativa aos Espaços, a escola organizada
se tem e o que se quer. Os planos permitem ainda, mo- demonstra uma forma de ser e de estar consubstanciada
nitorar e acompanhar a realidade e ajudam a sistematizar nos fundamentos de educação. A organização espacial
experiências. de uma sala de aula de forma rígida, “encarteirada” por
Mas é importante ainda destacar que a atividade do exemplo, identifica relações sociais nas quais a única voz
planejamento tem como requisito fundamental, a partici- autorizada de conhecimento é a do professor. Quando se
pação coletiva, pois os desafios da realidade atual pedem repensam os espaços para alterá-los, as relações humanas
interdisciplinaridade, e as Ciências hoje, assumem com são modificadas e novas fontes de conhecimento se abrem
tranquilidade a impossibilidade de um pensar isolado na para todos. Novas estruturas sociais são configuradas e
construção dos conhecimentos. possibilidades de ambientes diversificados são abertas
Em se tratando de escola, o caráter do coletivo assu- sempre com a participação de todos.
me ainda uma importância maior, porque educação para a Nas atividades escolares propostas há que se contem-
Cidadania só pode ser feita na Cidadania, que acontece no
plar o trabalho individual e coletivo com uso de tecnolo-
respeito à identidades e alteridades mutantes.
gias assistivas que permitam a remoção de barreiras para
Na gestão, o Planejar como um dos eixos de traba-
todo e qualquer tipo de aluno, reiterando a construção do
lho, alerta para que esta atividade esteja acontecendo em
conhecimento e não apenas as relações lineares de mera
todos os níveis da escola e o diretor precisa acompanhar
transmissão de informações.
também a ação docente. Afinal de contas, os professores
estão estudando e planejando de forma individual e tam- O diretor escolar precisa estar atento para que cada
bém coletiva? Envolvem os alunos nas propostas de plane- professor trabalhe os tempos e os espaços educacionais,
jamento? Desenvolvem metodologias ativas evidenciando oportunizando situações de aprendizagem e não eliminan-
clareza no que é Ensino e no que é Aprendizagem? Estão do as diferenças em favor de uma suposta homogeneiza-
afinados com a proposta da escola? ção dos alunos. Cada educador deve investir nas diferenças
e na riqueza de um ambiente de aprendizagem que tem
- Organizar Tempos e Espaços significados, experiências e conhecimentos para oportuni-
No cotidiano da escola, a organização das atividades zar situações para o aluno aprender a partir do que sabe e
de ensino e de aprendizagem precisam estar alinhadas chegar até onde for capaz de progredir.
com a proposta da escola e neste sentido, a metodologia
adotada deve ser coerente com o processo de construção - Avaliar
de conhecimento. O trabalho de gestão escolar em qualquer dos níveis
Os ambientes devem ser colaborativos e ativos, com da escola deve contemplar a necessidade de acompanha-
ênfase na aprendizagem e com atividades que trabalhem mento do processo em termos de monitoramento e de
as diferenças, os ritmos, utilizando diferentes linguagens avaliação.
na construção do conhecimento. O diretor escolar com sua equipe precisam explicitar a
A aprendizagem torna-se o centro das atividades es- compreensão de avaliação que perpassa o cotidiano da es-
colares e o sucesso dos alunos, a meta da escola, inde- cola. Neste sentido, para ser coerente com os fundamentos
pendentemente do nível de desempenho a que cada um de educação, a avaliação deve ser entendida como processo
seja capaz de chegar são essenciais para que se adotem que inclui produtos, com certeza, mas que não se limita a eles.
práticas escolares acolhedoras e inclusivas. O sentido desse O diretor escolar deve estar atento para os diagnós-
acolhimento não é o da aceitação passiva das possibilida- ticos de necessidades a serem trabalhadas, monitorando
des de cada aluno, mas o de ser receptivo a todos eles, pois com toda sua equipe as atividades de ensino e de apren-
as escolas existem, para formar gerações, e não apenas al-
dizagem. Quando se exercita a avaliação como processo,
guns de seus futuros membros, os que mais se encaixam
alteram-se significativamente os rituais engessados por-
em seus modelos.
ventura existentes no ambiente escolar. O tipo de aula do
A organização dos tempos evidencia os conceitos de
professor, a forma como ele divide o tempo, o jeito de or-
pessoa humana e educação em que a escola se pauta e
ganizar os espaços, enfim toda relação com o aluno ganha
deve ser coerente com a proposta de uma educação para
todos. Os tempos escolares precisam ser pensados como significado.
meios de construção do conhecimento. Eles precisam ser O diretor e todos os professores percebem que a ava-
planejados com flexibilidade nos horários de aula, nos ca- liação como processo vai reconfigurar a interação com a
lendários, na organização de módulos, enquanto trabalho família, o planejamento dos conteúdos, a forma de organi-
significativo com os ritmos de aprendizagem. zar as turmas, e só assim a proposta da escola vai se dese-
Módulos diferenciados, aulas geminadas, novas com- nhando de forma coerente com os valores explicitados no
posições de horas e de ritmos mostram a preocupação que seu Projeto Político Pedagógico.
a escola deve ter para que todos efetivamente aprendam. A avaliação de caráter meramente classificatório, por
Este planejamento dos tempos deve ser feito com a par- meio de notas, provas e outros instrumentos similares, tem
ticipação de todos, inclusive dos alunos que aprendem a mantido a repetência e a exclusão nas escolas. A avaliação
administrar agendas e organizar a própria vida. contínua e qualitativa da aprendizagem com a participação

71
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

do aluno e tendo, inclusive, a intenção de aprimorar o ensi- O professor da escola comum só melhora, proporcio-
no e torná-lo cada vez mais adequado à aprendizagem de nando um ensino de qualidade quando descobre que to-
todos os alunos diminuiria substancialmente o número dos dos os alunos são especiais, ou seja, quando reconhece o
que são indevidamente avaliados e categorizados como trabalho com as diferenças nas turmas escolares.
deficientes, nas escolas comuns. A escola de qualidade é uma escola inclusiva e o dire-
tor, juntamente com os professores e os pais não podem
Gestão escolar e escola de qualidade abrir mão desse projeto, pois a atenção às diferenças vai
No mundo atual, repleto de incertezas e desafios, o contribuir para a construção de uma sociedade mais justa,
diretor escolar, os professores, pais e toda comunidade exigindo a transformação de práticas excludentes que es-
demandam uma escola de qualidade. Essa escola precisa tão presentes na maioria das escolas comuns da sociedade,
ser de “qualidade”, não apenas para o presente, mas que impedindo a construção de uma cidadania por inteiro e a
prepare para o futuro. construção de uma sociedade mais justa.
Estudos e pesquisas têm sinalizado que o perfil do ci- Gestão, Aprendizagem e Ensino: possibilidades e desa-
dadão do século 21, deve atender a algumas características fios, com certeza!27
básicas tais como, a criatividade, o relacionamento e a in-
teratividade com outras pessoas, a capacidade de lideran-
ça, a vontade de estudar e pesquisar sempre, entre outros
requisitos. Esta configuração não pode ser outorgada e
5. O PROFESSOR: FORMAÇÃO E PROFISSÃO;
nem mesmo gestada em uma escola autoritária, mas sim
A PESQUISA NA PRÁTICA DOCENTE; A
construída em espaços de conhecimento, de socialização
DIMENSÃO ÉTICA DA PROFISSÃO.
e de cidadania.
Esta escola de qualidade, precisa ser equacionada de
forma concreta, porque não existe a escola de “qualidade”
de forma genérica, universal. Há que se “referenciar” a qua-
Ser professor: formação, saberes e desafios para a
lidade e os indicadores ainda presentes na sociedade atual
profissão
estão fortemente relacionados à cultura escolar tradicional,
Sabemos que a formação formal de um professor ini-
que enfatiza crenças de que aprendizagem equivale a con-
cia-se nas instituições credenciadas para isso e que ele
teúdos prontos transmitidos pelo professor e absorvidos
praticamente não é um agente produtor de seus próprios
pela memorização.
saberes, já que não participa ou colabora nas escolhas das
No entanto, essas crenças já foram derrubadas pelo
disciplinas, ou seja, do conteúdo do currículo do seu curso.
desenvolvimento da neurociência e outras contribuições. Sendo passivo, segue os modelos que a instituição dá, de
As pesquisas de ponta indicam que aprendizagem é um acordo com o momento histórico - político - social em que
processo complexo, que envolve aspectos intelectuais, afe- se encontra.
tivos, sociais, entre outros, e deve ser ativa e interativa na Basta lembrarmo-nos que há alguns anos atrás, tínha-
construção de conhecimentos. Nesse processo, cada ser mos professores instruídos pelas universidades, atuando
humano é um ser em movimento, sempre inconcluso, e a de uma forma que exigia somente o domínio da técnica,
escola precisa ter clareza dessa visão de pessoa, de educa- pois sua função principal era mediar a relação Estado e co-
ção e de sociedade. munidade, transmitindo os ideais daquele, no meio desta,
Por isso, uma escola de qualidade é, também, uma es- conforme Guimarães(2004) “esse processo se deu na estei-
cola atenta às diferenças, ou seja, uma escola que enxerga ra de maior produtividade escolar, por meio da racionaliza-
cada aluno em sua identidade, promovendo a interação e ção ou, mais propriamente, da burocratização do trabalho
garantindo a efetiva aprendizagem. É nesse contexto que e da participação do processo ensino/aprendizagem.”
a compreensão e a defesa de uma escola para todos, alu- Após mudanças políticas, viu-se uma brecha para que
nos com deficiência ou não, se tornam tão necessárias si- discussões em torno desse tema questionassem essa forma
nalizando que inclusão é o privilégio de conviver com as de ensinar, tendo destaque, segundo Guimarães “o enfo-
diferenças e a intolerância é uma das principais causas de que de formação de professores denominado ensino com
desumanidade. pesquisa” A partir desse momento vemos que os saberes
Uma escola para todos não significa o barateamento docentes voltam-se para o lado mais humano, preocupan-
de conteúdos porque a sua função não é a de ministrar do-se com o indivíduo como sujeito ativo, embora não
conteúdos prontos de alto nível para alguns alunos, mas, abandonasse aspecto daquela prática baseada na técnica .
sim, desenvolver cidadania para se viver em um mundo Segundo Guimarães “essa prática presente na maioria
plural e existem dimensões cognitivas, afetivas, sociais a das escolas reproduz, em grande parte, a estrutura dos cur-
serem contempladas. sos de formação e os processos formativos hoje predomi-
O professor da escola comum, quando começa a tra- nantes nas licenciaturas??.
balhar com as diferenças, abandona a postura tradicional 27 Fonte: www.pmf.sc.gov.br/Maria Terezinha Teixeira dos
de educação que acredita que todos os alunos são iguais. Santos

72
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A formação do docente também dar-se de forma con- Esses saberes são originados desde o momento em
tinuada, Guimarães citando Pérez Gomes afirma que “com- que se decide por esta profissionalidade, ou seja, quando
preende-se que formação inicial e contínua se vinculam, passa a viver situações educacionais cotidianas. O profis-
constituindo-se num continuum formativo”, como, muitas sional da educação, mais especificamente o professor pre-
vezes, as formações continuada que os professores par- cisa estar em comunhão com o seu local de trabalho, assim
ticipam são promovidos pelas secretarias de educação, a como qualquer outro profissional, para que haja, um rendi-
formação deste profissional traduz o que Guimarães (2004) mento de metas, onde os objetivos sejam realizados. Desta
chama de “ideário do custo-benefício e da viabilidade para maneira coloca-se a questão de se trabalhar em gestão,
o mercado” ou seja, a atuação do docentes nas escolas tor-
que acontece a partir do momento em que os profissionais
nas-se semelhante as dos modelos empresariais.
passam a realizarem ações em comunhão, ao mesmo tem-
E é nesse ponto que entra outra questão a de identida-
po em que assumem compromisso com a Escola.
de docente. Mas, antes é preciso lembrar que a formação
continuada também depende muito do interesse do pro- Deste modo é necessário que o ambiente de traba-
fissional, que deve ir a busca do aperfeiçoamento, partici- lho seja aconchegante, construtivista e democrático, pois
pando de conferências, palestras, cursos e outros. Enfim, é onde entra a concepção do novo Currículo Escolar que
procurar atualizar seus saberes didáticos, pedagógicos e vem juntamente com a visão democrática para ser aplica-
disciplinares. do, esperando assim que haja um maior acompanhamento
No entanto, é justamente quando ele investe menos da sociedade em relação à educação, ou seja, passe a au-
nele mesmo, acomodando a sua prática, o seu saber fazer. mentar a ligação já existente entre a Escola e a Sociedade.
Com isso, a identidade docente acaba sendo menospre- Contudo sabe-se que se o local de trabalho não é apro-
zada, não tendo status de profissão que mereça prestígio, vado pelo profissional, pode ocorrer uma série de situações
como diz Guimarães (2004) ela é vista, “a identidade da desagradáveis, como a incoerência de ações, impedindo
profissão docente como um “que fazer” de baixa aspiração que o modelo de gestão seja concretizado. Esse ambiente
profissional, a ser desenvolvido por pessoas cordatas e ge- é refletido tanto na formação do professor quanto na Ins-
nerosas??. Ainda segundo o autor “tornar o professor um tituição de ensino.
“profissional” passa, necessariamente, por maior qualifica- Um aspecto que também caracteriza a docência é a
ção”, pois citando Perrenoud, ele afirma também que “uma falta de preocupação pela forma como os docentes e os
sociedade só estará pronta a pagar a profissionalização discentes se integram no ensino. A inserção profissional no
pelo seu preço justo quando as tarefas cumpridas lhe pare-
ensino é o período de tempo que abarca os primeiros anos,
cerem bastantes importantes para merecerem tal esforço??.
nos quais os professores tratam de realizar a transição de
Com isso, podemos concluir que a identidade docente não
estudantes a docentes. É um período de tensões e apren-
é o que se espera que ela seja, pois não é como uma teo-
ria que se cria, e sim como a profissão de docente é vista dizagens intensivas, em contextos geralmente desconheci-
e interpretada pela sociedade. Afirma Guimarães citando dos, e durante o qual os professores principiantes devem
Sacristán, “a profissionalidade docente é (...) a afirmação adquirir conhecimento profissional, além de conseguirem
do que é especifico na ação docente, isto é, o conjunto de manter o equilíbrio pessoal.
comportamento, conhecimento, destrezas, atitudes e valo- (...) definimos a inserção com a transição de um pro-
res que constituem a especificidade de ser professor”. fessor em formação até chegar a ser um profissional au-
Não podemos deixar de levar em consideração que tônomo. A inserção pode ser mais bem entendida como
identidade docente aqui citada é a identidade que Guima- uma parte de um contínuo processo de desenvolvimento
rães diz aproximar-se do conceito de identidade para os profissional dos professores. (Vonk, 1996, p.115).
outros, que por sua vez, aproxima-se do conceito de pro- A representatividade social que a formação docente
fissionalidade docente. Também não podemos deixar de apresenta quanto ao bom desempenho do professor dian-
lembrar que a identidade profissional de quem ensina não te de seu cenário de atuação profissional, considerando
é gerada espontaneamente nos cursos de formação, mas as crescentes demandas nas exigências sociais, tem sido
que ala constitui-se no professor durante toda sua trajetó- um dos pontos nos quais se situa o discurso dos espaços
ria de vida pessoal, universitária e profissional. educacionais. Quanto se trata de discutir a necessidade
Os saberes necessários para a prática docente são adqui- do professor se atualizar, muitas são as justificativas que
ridos por fases, onde a primeira se dá com a própria vivencia
surgem tentando programar e solidificar, cada vez mais,
do profissional, já a segunda acontece durante a formação
uma atuação concreta para o trabalho docente. Por se tra-
profissional de forma sistemática e a terceira é concretizada
tar de um momento em que acontecem avanços advindos
com a prática, ou seja, após o término da formação, que é
onde o professor vai mostrar o que aprendeu juntamente do desenvolvimento econômico e das múltiplas alterações
com os saberes construídos ao longo de sua vida. que decorrem no meio social, a organização do trabalho
(...) o saber docente se compõe, na verdade, de vários educativo alcança novos paradigmas e alterações diversas,
saberes provenientes de diferentes fontes. Esses saberes reclamando o reencontro de seres pensantes e atuantes na
são os saberes disciplinares, curriculares, profissionais e ex- perspectiva de construir respostas educacionais que cor-
periências. (Tardif, 2002. p.33) respondam aos objetivos sócio-educacionais vigentes.

73
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Art. 61. A formação de profissionais da educação, de Os vários setores da atividade humana passam por sig-
modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e mo- nificativas mudanças que se concretizam em novas con-
dalidades de ensino e às características de cada fase do figurações da ordem econômica e política relacionada ao
desenvolvimento do educando, terá como fundamentos: conhecimento, às vinculações pessoais, às comunicações,
I - a associação entre teorias e práticas, inclusive me- entre outras, que trazem conseqüências muito diretas para
diante a capacitação em serviço; a educação escolar. (GUIMARÃES, 2004, p.27).
II - aproveitamento da formação e experiências ante- Segundo Guimarães (2004) essas mudanças afetam
riores em instituições de ensino e outras atividades. (LDB diretamente os professores, não somente no âmbito do
1996) conhecimento, mas também da ética, estando em jogo en-
Nesse pressuposto, a formação continuada se faz elo tendimentos, convicções e atitudes necessárias ao proces-
entre a profissão e a construção da identidade do educa- so de preparação de crianças e jovens. O professor tem por
dor a formalizar a dinâmica social do trabalho docente, es- obrigação estar atento e aberto às mudanças tecnológicas.
pecialmente pelo seu caráter conjunto e pela interação da Do contrário o choque de mundo entre o docente e o dis-
classe educativa visando à melhoria da qualidade do ensi- cente (que já é grande) pode formar um abismo que torne
no, rumo ao alcance dos seus objetivos, os quais retratam a aprendizagem uma utopia.
como função social para a escola a instrumentalização de A atividade profissional do professor pode ser carac-
um ensino no qual se vivencie a garantia de uma educação terizada como uma atividade de mediação não só entre o
para a vida, ou seja, o que se aprenda na escola seja útil na aluno e a cultura, mas também entre a escola, pais e alunos,
vida fora da instituição. Estado e comunidade, etc. Esse caráter de mediação (...)
Assim a profissão docente, mesmo diante das mudan- justifica os investimentos de organismos diversos na con-
ças ocorridas na educação nas últimas décadas, ainda é figuração de uma identidade do professor na sociedade.
muito desvalorizada e desacreditada. Fato esse que já co- (GUIMARÃES, 2004, p. 32).
meça no curso de formação inicial, onde muitos escondem Os pais, as crianças, os adolescentes mudaram. A so-
ou sentem receio de falar que estão cursando Pedagogia ciedade mudou. Vivemos rodeados pelas drogas, pedofilia,
(por exemplo) na universidade. prostituição, delinquência, desestruturamento familiar. O
Atualmente, a educação tem se tornado alvo de aten- docente convive com diferentes realidades dentro da es-
ção das políticas públicas, pois se percebeu que a mesma cola, ignorá-las levaria nossa educação a um processo de
é imprescindível para o crescimento e desenvolvimento de estagnação ainda maior do que o presenciado atualmente.
toda nação. De acordo com Guimarães (2004) as atividades desen-
O investimento na formação é um ponto de partida volvidas pelo professor são amplas e complexas e ecoam
que apresenta possibilidades de melhoria da profissiona- de maneiras diferentes para cada aluno, de acordo com
lidade e de um significado diferente para a profissionali- a singularidade dos contextos, da experiência e da histó-
zação e o profissionalismo docentes, bem como possibili- ria de vida de cada um. É imprescindível que o professor
dade para a ressignificação da sua identidade profissional conheça a realidade em que o aluno se encontra, onde o
nesse contexto pródigo em mudança de natureza variada. mesmo deve trazê-la para sua sala de aula, para que o edu-
(GUIMARÃES, 2004, p. 27). cando a reconheça e lhe dê a importância de um mundo
Vários projetos e novos modelos educacionais foram que precisa ser mudado e não ignorado, instigando-o a
implantados na escola. Mudanças também ocorreram den- sentir prazer em aprender.
tro das universidades, na formação do docente. E o pro-
fessor que há anos leciona como fica diante de tantas mu- Ser professor na contemporaneidade
danças? É preciso capacitá-lo e prepará-lo para que essa Nas ultimas duas décadas muitas transformações ocor-
quebra de paradigma ocorra, mas sem causar danos ao reram no panorama da educação brasileira e na profissão
profissional. do professor. Muitas são as discussões sobre esta profis-
Afirmar o direito da pessoa humana à educação é as- são que esbarra em concepções sobre o trabalho que o
sumir uma responsabilidade muito mais pesada do que as- professor exerce, muitas vezes relacionado a uma atividade
segurar a cada um a capacidade de ler, escrever e contar. É meramente técnica, subordinada ao conhecimento produ-
garantir a toda criança o inteiro desenvolvimento de suas zido pelos cientistas. Essas concepções estão relacionadas
funções mentais e a aquisição de conhecimentos e valores à perspectiva tradicionalmente praticada pelas instituições
morais correspondentes ao exercício de suas funções, até de formação de professores, que deixa evidente a dicoto-
adaptação à vida social atual (PIAGET 2007) mia entre o trabalho docente em relação às atividades de
O professor não pode parar no tempo, nota-se que há pesquisa.
uma necessidade de estar na constante busca de se aperfei- Outra discussão relevante está na tradicional concep-
çoar através de pós-graduação, palestras, pesquisas, lendo ção da vocação do professor, que historicamente teve o
livros. Como profissional da educação o mesmo sabe que seu trabalho caracterizado como missão. Ser professor
os saberes são temporais, que estão em constantes mudan- sempre foi uma tarefa difícil, que exige deste profissional
ças, desse modo achar que sabe de tudo para ser um bom ser um modelo de virtudes, capaz de mudar os comporta-
profissional é um erro que não pode mais cometido. mentos e atitudes.

74
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Houve um tempo que ser professor era comparado a O processo de construção da identidade é assunto na
ser sacerdote do saber, era a manifestação de uma voca- pauta de discussões de sociólogos, psicólogos e antropó-
ção ou missão transcendente, não o exercício de um ofí- logos a respeito da definição e o próprio processo de for-
cio, uma profissão. Entretanto se educar é missão, é dom mação da identidade. Segundo esses estudiosos tal forma-
torna-se incoerente e desnecessário exigir que o professor ção é um processo interno ao indivíduo, mas que ocorre de
invista em sua formação acadêmica e continuada. acordo com sua cultura e categoria social, e tem início na
Nesse sentido a profissão docente apresenta duas es- fase infantil, já que as crianças assimilam traços e caracte-
pecificidades que nos parecem diferenciá-la das demais. A rísticas de pessoas e objetos externos.
especificidade acadêmica que trata dos saberes e do saber Dito isto, é possível definir identidade como um con-
fazer, que remete à transmissão, ao ensino de conhecimen- junto de características pelas quais alguém pode ser reco-
tos, técnicas e seu emprego, o profissionalismo. Por outro nhecido.
lado, há a especificidade pedagógica / humanista que nos Sob a ótica sociológica, identidade pode ser definida
como características distintivas do carácter de uma pessoa
remete à vocação do formar cidadãos pensantes transfor-
ou o carácter de um grupo que se relaciona com o que eles
madores de realidades. Com isso, e baseado nas ideias de
são e com o que tem sentido para eles. Giddens, (2004)
Morin (2001) é possível classificar a profissão de professor
afirma que, o nome é um marcador importante da identi-
como uma profissão complexa, caracterizada pela incerte-
dade individual, e dar um nome é também importante do
za e pela ambiguidade das funções. ponto de vista da identidade do grupo. O gênero, a orien-
Diante das implicações, dos desafios e conflitos que tação sexual, a nacionalidade ou a etnicidade, e a classe
permeiam a função docente, e perante a complexidade da social são as principais fontes de identidade.
educação no contexto da sociedade contemporânea, glo- A identidade pessoal é singular ao sujeito através de in-
balizada, multiculturalista, imersa numa realidade comple- terações sociais, da consciência e das estruturas sociais em
xa, requer do professor ações e conhecimento polivalente. que o sujeito está inserido. Todavia, a identidade pessoal
Pedro Demo (2004) em uma reportagem para a revista não é estática, há a possibilidade de mudança de acordo
Profissão Mestre, afirma que ser profissional da educação com as sucessivas fases da vida. Vianna (1999, p. 52) ressalta
hoje é acima de tudo saber continuamente renovar sua A identidade é um processo de construção histórica rea-
profissão. justada ao longo das diferentes etapas da vida e de acordo
Entende-se então que o professor enquanto profissio- com o contexto no qual a pessoa atua, uma construção que
nal deve ser um eterno aprendiz e sendo capaz de refletir exige constantes negociações entre tempos diversos do sujei-
sobre sua prática diária, pois na verdade, não só no tra- to e ambientes ou sistemas nos quais ele está inserido.
balho, mas em todos os aspectos da vida. Com isso cons- Percebe-se aqui que a aquisição da identidade pessoal
tata-se que o professor nunca está pronto, acabado, mas, precede à profissional, perpassando pela social e se solidi-
sempre em processo de (re) construção de saberes. fica a partir de identificações infantis que são retomadas
Dessa forma, ao refletir sobre a função do professor na adolescência. Entretanto, a identidade profissional do
como um profissional da educação que contribui para uma professor não deve ser confundida com a identidade social.
transformação qualitativa da sociedade, há de se conside- Partindo dessa perspectiva, Pimenta (2002, p. 07) define
rar a presença da responsabilidade político-social na do- Que a identidade profissional do professor se constrói
cência, haja vista que, a formação do cidadão perpassa pela a partir da significação social da profissão [...] constrói-se
dimensão da formação política, pois esta propicia formar também, pelo significado que cada professor, enquanto ator
cidadãos críticos e transformadores. e autor, confere à atividade docente de situar-se no mundo,
Como dito anteriormente, ser professor não é uma de sua história de vida, de suas representações, de seus sa-
beres, de suas angústias e anseios, do sentido que tem em
vocação, embora alguns a tenham, não é uma técnica,
sua vida: o ser professor. Assim, como a partir de sua rede de
embora requer uma excelente operacionalização técni-
relações com outros professores, nas escolas, nos sindicatos,
co-metodológica. É ser um profissional de ensino, com-
e em outros agrupamentos.
petente, legitimado por um conhecimento específico exi-
A construção da identidade profissional docente passa
gente e complexo. por dificuldades relevantes em sua constituição, seja em
relação às dificuldades impostas pelo novo contexto edu-
Identidade profissional do professor cacional e social da contemporaneidade, seja pelo legado
A imagem do professor passa por mudanças significa- histórico da profissão. Afirmar-se enquanto profissional da
tivas no decorrer do tempo e isso faz com que este rede- educação é algo relativamente novo entre os próprios pro-
fina seu papel e sua função de acordo com as mudanças fessores, talvez pelo fato de historicamente ser dissemina-
que alteram as relações de seu trabalho. E em paralelo com da a ideia de que a imagem do professor é uma extensão
a degradação da sua imagem social o professor enfrenta a da família, que deve dedicar-se com afinco a cuidar e zelar
profissão com uma atitude de desilusão e de renúncia. A pelo bem estar das crianças e jovens.
imagem social não é fator determinante na aquisição da Souza (2005) indica duas concepções sobre a profissão
identidade profissional do professor. Contudo, é um dos do professor, uma em que são valorizados os conhecimen-
aspectos que favorecem a elaboração coletiva da identida- tos formais, codificados e transmissíveis, atestados por tí-
de profissional do professor. tulos universitários, e outra em que a profissão é construída

75
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

no processo de trabalho, experiência, qualidades pessoais, Arroyo (2000) apresenta um dos entraves que o pro-
trabalho em grupo e solidariedade nas relações de traba- fessor enfrenta na contemporaneidade é a descaracteriza-
lho. As duas dimensões resultam em formas identitárias ção e desprofissionalização do professor. E ele enfatiza a
distintas com relação ao ser professor. A forma como o do- redução dos mestres a ensinantes. Para este autor, é fun-
cente reconhece a profissão difere entre a própria catego- damental um redimensionamento do ofício do professor
ria. Dito desta forma, o autor salienta que parece haver um e de sua identidade e esta nova identidade “tende a ser
consenso entre os docentes de que a profissionalização do afirmada frente à nova descaracterização da escola e da
professor é construída na articulação entre a experiência, a ação educativa” (p. 22). Esse aspecto fatalmente repercute
didática e a flexibilidade de transitar em diferentes assun- na identidade profissional, podendo ser fator de crise.
tos de uma determinada área de conhecimento. A crise de identidade e a crise da profissão docente
Diante do exposto até aqui, pressupõe-se que a cons- apresenta uma relação muito estreita, com limites muito
trução e afirmação da identidade do professor enquanto tênues entre os aspectos que as caracterizam. Assim como
profissional é processual, subjetiva, correspondente às tra-
o professore se demonstra confuso em muitos aspectos,
jetórias individuais e sociais, com a possibilidade de cons-
em muitos momentos surgi um profissional com a profis-
trução / desconstrução / reconstrução, atribuindo sentido
sionalidade abalada, mal definida, em conflito com uma
ao trabalho e centrado na imagem social que se tem da
autoimagem pouco expressiva e desvalorizada.
profissão e legitimada a partir da relação de pertencimento
Nesse contexto, a profissão docente necessita de um
a uma determinada profissão.
processo de profissionalização para a partir dele, deixar
Crise da identidade profissional: descaracterização aflorar uma profissionalidade bem resolvida, e consequen-
e desprofissionalização temente, uma identidade mais clara e definida que reper-
Partindo do pressuposto que toda profissão afirma cutirá significativamente no devir das práticas docentes
uma identidade, identidade profissional do professor é e das atividades diárias existentes no contexto escolar e
uma maneira de ser professor. Nesse sentido, ao expor cri- educativo.
se da identidade profissional do professor, é expor uma
crise na maneira e no jeito de ser professor. Desafios de ser professor na contemporaneidade
Esse caminho aparenta ser excessivamente tortuoso, se Nas últimas décadas, em decorrência das mudanças
não for considerada que a ação profissional do docente sociais, econômicas e culturais, o mundo todo tem pres-
está condicionada por uma série de outros fatores e in- tado mais atenção na educação, especialmente a que se
serida num processo muito mais amplo que o seu espaço desenvolve nos sistemas escolares, submetendo-a a uma
/ tempo de atuação. Vale evidenciar a não pretensão de análise pública constante, e educar tem se tornado uma ta-
ignorar os problemas advindos das dificuldades na inte- refa cada vez mais exigente e de enorme responsabilidade.
ração social com os grupos onde trabalha, a insatisfação E isso requer equilíbrio e coerência entre orientação forma-
com as condições de trabalho, a desvalorização social, tiva, procedimentos pedagógicos adaptados e expectativas
sentimentos de insegurança em relação à sua integridade dos implicados no processo, o professor e o aluno.
física afetam diretamente o trabalho do professor. Contu- Desempenhar essa tarefa com compromisso e quali-
do, tais aspectos não podem ser os únicos indicadores na dade exige, da parte do professor, reunir um conjunto de
análise de uma suposta crise de identidade profissional do saberes e competências que lhe permitam a construção de
professor. Crenças, valores éticos e morais, representações um ensino de qualidade. Os saberes do professor são cons-
construídas / reconstruídas sobre ser professor são outros truídos ao longo de toda uma carreira e vida do professor,
indicadores. razão que justifica que não sejam contemporâneos uns dos
Assim posto, é preciso considerar que a formação de
outros, uma vez que se vão adquirindo ao longo do tempo.
um professor, e consequentemente a construção de sua
São assim saberes temporais, em cuja construção intervêm
identidade profissional, resulta de um processo de constru-
dimensões identitárias, de socialização profissional, fases e
ção de múltiplas identidades que repercutem direta e sig-
mudanças, que se constituem num conjunto de conhe-
nificativamente no fazer docente. Concomitante a isso, não
cimentos, competências, habilidades e atitudes. Na ótica
se pode perder de vista outras implicações desse processo,
como por exemplo, as políticas públicas e a forma como o de Tardif (2008), o saber docente “relaciona-se com a pes-
Estado lida com seus professores. soa, com a sua identidade, com a sua experiência de vida,
As reformas políticas educacionais implantadas pelo com a sua história profissional, com as suas relações com
Estado elaboradas sem nenhuma participação dos profes- os alunos na sala de aula e com os outros”.
sores cabendo a eles apenas executar, sem direito a refletir Diante disso, não se pode falar em aprendizagem sem
e discutir sobre relações que trarão conseqüências diretas falar no professor. O contexto social na contemporanei-
para o seu trabalho vêm causando mudanças no cotidiano dade impõe a prática educativa um número de demandas
docente. O fazer do professor, sua autonomia e a identida- muito grande, levando assim o educador do século XXI a
de docente, que também está intimamente atrelada à ins- repensar a sua atuação ema sala de aula e os enormes de-
tituição escolar, vêm sofrendo com essas decisões políticas safios profissionais que enfrenta a fim de atender as exi-
da educação. gências do contexto atual.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Ao professor têm sido colocadas demandas de natu- competências. Possuir conhecimentos ou capacidades es-
rezas bastante distintas. Em se tratando do ponto de vista pecíficas não é garantia de que um profissional seja “com-
social ele tem tido que aprender a conviver mais intensa- petente”, porque apesar de muitos profissionais possuírem
mente com os interesses e pensamento dos alunos e pais conhecimentos e capacidades importantes, nem sempre
no cotidiano escolar e a ter uma maior interação com a sabem mobilizá-los de modo adequado no momento
comunidade onde a escola está inserida. No campo institu- oportuno levando em consideração o contexto atual.
cional, ele tem sido solicitado a participar mais ativamente O professor do presente não pode ser apenas alguém
nas definições dos rumos pedagógicos e políticos da es- que aplica conhecimentos produzidos por outrem, mas te-
cola, a definir recortes adequados no universo de conhe- nha de ser um sujeito que assume a sua prática pedagó-
cimentos a serem trabalhados em suas aulas, a elaborar e gica a partir dos significados que ele próprio lhe atribui.
gerir projetos de trabalho. Quanto ao aspecto pessoal, tem Alguém que, porque teve uma míriade de vivências com
sido chamado a tomar decisões de modo mais intenso so- significados determinantes, é capaz de estruturar e orientar
bre seu próprio percurso formador e profissional, a romper a sua prática, selecionar determinados conteúdos, dar prio-
paulatinamente com a cultura de isolamento profissional, a ridade a certas atividades e aprimorar a competência de
partir da ampliação da convivência com colegas em horá- aprender a decifrar várias linguagens, percorrer diferentes
rios de discussões coletivas e nos trabalhos em projetos, a motivações humanas, ampliar o seu leque de experiências.
debater e reivindicar condições que permitam viabilizar a Alguém que é, sobretudo, capaz de cultivar as diferenças,
essência do próprio trabalho. criar oportunidades para expandir o conhecimento, am-
pliar a convivência e a sensibilidade na formação do aluno
Os pilares da educação e suas implicações à prática pe- e se configura como modelo de competências e de uma
dagógica cultura de excelência numa diversidade de imagens e re-
O século XXI deixa evidente que os notáveis progressos presentações.
científicos, tecnológicos e econômicos ocorridos, relacio- Estes conhecimentos tem se tornado como desafio a
nados a diferentes aspectos da globalização, provocaram ser vencido pelo professor a fim de que este se torne um
profissional competente, o que no contexto educativo atual
profunda mudança ideológica, cultural, social e profissional
comporta da sua parte, ter a capacidade de articular, mo-
revelada em fenômenos de exclusão social, persistindo as
bilizar e colocar em ação os conhecimentos adquiridos, as
desigualdades de desenvolvimento no mundo, os países
habilidades e os valores necessários pautados nos pilares
que quiserem prosperar devem se comprometer com a
da educação para que obtenha um desempenho eficien-
educação e entender as transformações, porque elas vão
te e eficaz das atividades que a natureza do seu trabalho
ditar as competências, exigidas não só em conhecimentos
requer. São estas competências e o desenvolvimento pes-
e habilidades no trabalho, mas também relacionadas ao ca-
soal que no decurso da formação devem ser estimulados
ráter e à personalidade.
numa perspectiva crítico-reflexiva que o levará o professor
Diante da tamanha aceleração no contexto social para
a compreender as suas responsabilidades.
Delors, a prática pedagógica deve preocupar-se em de-
Vale ressaltar aqui a relevância da formação inicial, con-
senvolver quatro aprendizagens fundamentais, que serão tinuada e em serviço como elemento de desenvolvimento
para cada indivíduo os pilares do conhecimento: apren- pessoal e profissional do professor da contemporaneidade.
der a conhecer que indica o interesse, a abertura para o A formação inicial e continuada do professor é o pri-
conhecimento, que verdadeiramente liberta o indivíduo meiro passo para vencer os desafios da educação contem-
da ignorância; aprender a fazer que mostra a coragem de porânea e deve ser vista como uma necessidade de mu-
executar, de correr riscos, de inovar, de reinventar, de er- dança do paradigma de ensino, de um modelo passivo,
rar mesmo na busca de acertar; aprender a conviver que baseado na aquisição de conhecimentos, para um modelo
traz o desafio da convivência que atualmente tem se tor- baseado no desenvolvimento de competências e compe-
nado algo bastante difícil e apresenta o respeito a todos tências que atendam as necessidades dos alunos levando
e o exercício de ética e solidariedade como caminho do em conta as mudanças aceleradas da sociedade em que
entendimento e de boas relações; e, finalmente, aprender este está inserido, com a finalidade de o levar a aprender, a
a ser, que, talvez, seja o mais importante por explicitar o adquirir competências, a aprender a aprender.
papel do cidadão e o objetivo de viver. Para conseguir desenvolver tais competências, Freire
Os pilares são quatro, e os saberes e competências a se (2008) defende que “é preciso que o formando, desde o
adquirir são apresentados, aparentemente, divididos, po- princípio da sua experiência formadora, se assuma como um
rém essas quatro vias não podem, no entanto, dissociar-se sujeito da produção do saber, se convença definitivamente
por estarem intimamente ligadas, constituindo interação de que ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar as
com o fim único de uma formação holística do indivíduo. possibilidades para a sua produção ou a sua construção”.
A competência está na capacidade do sujeito para Outro desafio que atualmente é colocado ao profes-
mobilizar saberes, conhecimentos, habilidades e atitudes, sor tem a ver com a multiplicidade do conhecimento e dos
resolver problemas e tomar decisões adequadas e não no seus processos, exigindo assim do professor que saiba,
fato de alguém possuir um elevado número de saberes ou sobretudo, dominar e compreender as novas linguagens

77
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

e experiências, bem como saber articulá-las com outra projeto pedagógico coerente e participativo, a preparação
competência, baseada no processo de mediação e diálogo profissional nos aspectos intelectual, emocional, comunica-
com os alunos. Processo em que o professor deve ter um cional, eticamente e com boa remuneração, condições de
papel essencial, para que a partir da sua intermediação to- trabalho adequadas para estes profissionais, tempo para os
dos possam informar, comunicar, discutir, participar, criar, profissionais pesquisarem e estudarem, assim como a im-
estimular o acesso a novas linguagens, como forma de am- portância do aspecto afetivo na relação professor-aluno, a
pliar o grau de compreensão e autonomia das vivências interdisciplinaridade e a busca de soluções para os dilemas
dos sujeitos. enfrentados.
Maior exigência quanto a responsabilidades, alteração Para Nóvoa (2006) dilema, entre outros conceitos, são
do papel do professor como fonte única de transmissão, decisões que só se consegue ponderar através do conhe-
dificuldade de determinar o papel da escola e da educa- cimento e através dos valores. Pautado nessa afirmativa,
ção escolar, reformas políticas que trazem implícitos os cabe ao professor reestruturar seu trabalho, perante as ex-
papéis e deveres desses profissionais e que mudam cons- pectativas e pressões da condição social contemporânea,
tantemente, mudanças nas expectativas sociais e na função que solicita a qualidade do ensino oferecido, enfrentando
social da escola, sentimento de culpa, baixa autoestima e os dilemas com os quais o trabalho docente se depara.
desvalorização docente, abalo na segurança e autoconfian- Diante disso, é possível crer que o professor se sente só
ça do professor com relação aos conteúdos que mudam em alguns momentos de sua trajetória por conta do con-
constantemente, mudanças na relação professor-aluno, flito entre as suas concepções sobre ser professor e sobre
depreciação econômica e social da profissão, são desafios a relevância do seu trabalho e as expectativas dos demais
presentes no dia-a-dia do professor contemporâneo. Além sujeitos que “atuam” na esfera escolar.
desses, conduzir as novas gerações a um futuro em que
priorizem as virtudes em detrimento dos vícios e prejuízos A Formação e a Prática
morais, do crime e da violência, a um futuro mais promis- Há algumas décadas, acreditava-se que, quando ter-
sor, este é o maior desafio do educador atualmente. minada a graduação, o profissional estaria apto para atuar
Partindo da hipótese central dos desafios contempo- na sua área o resto da vida. Hoje a realidade é diferente,
râneos à afirmação identitária e de poder da profissão do- principalmente para o profissional docente. Este deve estar
cente, pode-se antever como diversos aspectos externos consciente de que sua formação é permanente, e é integra-
(formação contínua, intervenção do Estado, representações da no seu dia-a-dia nas escolas. 
sociais dos sujeitos envolvidos com a escola) e de natureza O professor não deve se abster de estudar, o prazer
interna (relação professor-professor, professor-aluno, pro- pelo estudo e a leitura deve ser evidente, senão não irá
fessor-comunidade de pais, relações entre vida pública e conseguir passar esse gosto para seus alunos“O professor
vida privada) implicam drasticamente na forma de consti- que não aprende com prazer não ensinará com prazer. “
tuição do “ser professor”. Snyders. (1990)
Percebe-se que, os tempos e espaços educacionais se São grandes os desafios que o profissional docente
modificaram e ampliaram, alterando profundamente os pa- enfrenta, mas manter-se atualizado e desenvolver práticas
péis e ações do professor, que passa, tal qual numa fábrica pedagógicas eficientes, são os principais.
taylorista, a ter seus tempos e seus fazeres controlados por Nóvoa (2002, p. 23) diz que: “O aprender contínuo é
sujeitos externos ao processo escolar. essencial se concentra em dois pilares: a própria pessoa,
Ao relacionar esses diversos aspectos pode-se visua- como agente, e a escola, como lugar de crescimento pro-
lizar a rede de dilemas que se entrelaçam no processo de fissional permanente.” Para esse estudioso português, a
formação de professores e na sua profissionalização. Po- formação continuada se dá de maneira coletiva e depende
rém, apesar desse confuso contexto, percebe-se a existên- da experiência e da reflexão como instrumentos contínuos
cia de um núcleo identitário entre os professores que se de análise.
traduz na crença de que o professor tem que ensinar com
responsabilidade social. A relação sócio-interacionista
O professor deve estar envolvido no processo, pois A teoria do desenvolvimento intelectual de Vygotsky,
como destaca Villela (2006) o trabalho docente se torna sustenta que todo conhecimento é construído socialmen-
mais intenso à medida que assume novos requisitos sobre te, no âmbito das relações humanas. Essa teoria, tem por
as condições, a natureza e a organização do ensino, o que base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de
se caracteriza como um desafio para os professores. um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da lin-
Destaca-se ainda a necessidade de olhar às coisas de guagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo
outra forma, a fim de considerar novas perspectivas, para essa teoria considerada, histórico-social.
que seja possível adotar posturas mais abertas e mais O conhecimento que permite o desenvolvimento men-
compreensivas em relação aos desafios postos no traba- tal se dá na relação com os outros. Nessa perspectiva o
lho docente. Dentre tais desafios, destacam-se as tecno- professor constrói sua formação, fortalece e enriquece seu
logias acessíveis, disponíveis e adequadas, a infraestrutura aprendizado. Por isso é importante ver a pessoa do profes-
confortável, uma organização inovadora que possua um sor e valorizar o saber de sua experiência.

78
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Para Nóvoa (1997, p.26): “A troca de experiências e a Nesse sentido, Schön (1997, p. 87) nos diz que:
partilha de saberes consolidam espaços de formação mútua, (…) Nessa perspectiva o desenvolvimento de uma práti-
nos quais cada professor é chamado a desempenhar, simul- ca reflexiva eficaz tem que integrar o contexto institucional.
taneamente, o papel de formador e de formando.” O professor tem de se tornar um navegador atendo à bu-
O trabalho em equipe e o trabalho interdisciplinar se rocracia. E os responsáveis escolares que queiram encorajar
revelam importantes. Quando as decisões são tomadas em os professores a tornarem-se profissionais reflexivos devem
conjunto, desfavorece, de certa forma, a resistência às mu- criar espaços de liberdade tranqüila onde a reflexão seja
danças e todos passam a ser responsáveis para o sucesso possível. Estes são os dois lados da questão – aprender a
da aprendizagem na escola. ouvir os alunos e aprender a fazer da escola um lugar no
O trabalho interdisciplinar evita que os professores qual seja possível ouvir os alunos – devem ser olhados como
conduzam seus trabalhos isoladamente, em diferentes di- inseparáveis.”
reções, pois a produção de práticas educativas eficazes, A proposta prático-reflexiva, propõe-se a levar em
surge de uma reflexão da experiência pessoal partilhada conta esta série de variáveis do processo didático, seja
entre os colegas. aproveitando, seja buscando um processo de metacogni-
O sucesso profissional do professor, o espaço ideal ção, onde o professor perceba os efeitos de sua atuação na
para seu crescimento, sua formação continuada, pode ser aprendizagem de seus alunos.
também seu local de trabalho.
Formação e Valorização
O Professor como Prático-Reflexivo A real valorização do magistério precisa ter três alicer-
Estudos apontam que existe a necessidade de que o ces sólidos: boa formação inicial, boa formação continuada
professor seja capaz de refletir sobre sua prática e direcio- e boas condições de trabalho, salário e carreira.
ná-la segundo a realidade em que atua, voltada aos inte- A Universidade ocupa um papel essencial, mas não o
resses e às necessidades dos alunos. único, para a formação do professor. Ás universidades cabe
Nesse sentido, Freire, (1996, p.43) afirma que: “É pen- o papel de oferecer o potencial físico, humano e pedagógi-
sando criticamente a prática de hoje ou de ontem é que se co para a formação acontecer no melhor nível de qualidade.
pode melhorar a próxima prática.” Não é raro encontrarmos profissionais que responsa-
Para entendermos melhor esse aspecto, devemos re- bilizam a instituição pelo desajuste entre as informações
correr a Schön. recebidas e sua aplicabilidade. A formação só será comple-
Donald Schön, foi idealizador do conceito de Professor ta quando esses profissionais se auto produzirem. Nóvoa
Prático-Reflexivo, percebeu que em várias profissões, não (S/D) diz: “Os professores têm de se assumir como produto-
apenas na prática docente, existem situações conflitantes, res da sua profissão.”
desafiantes, que a aplicação de técnicas convencionais, O desenvolvimento profissional corresponde ao curso
simplesmente não resolvem problemas. superior somado ao conhecimento acumulado ao longo da
Não se trata aqui de abandonar a utilização da técnica vida. Uma boa graduação é necessária, mas não basta, é
na prática docente, mas haverá momentos em que o pro- essencial atualizar-se sempre, isso remete a necessidade da
fessor estará em situações conflitantes e ele não terá como formação continuada no processo da atuação profissional,
guiar-se somente por critérios técnicos pré-estabelecidos. ou seja, há a necessidade da construção do saber, no pro-
Para Nóvoa (1997, p.27): cesso de atuação profissional.
“ As situações conflitantes que os professores são obriga- A valorização e melhor remuneração que o profissio-
dos a enfrentar (e resolver) apresentam características úni- nal docente almeja, depende em boa parte de formação e
cas, exigindo portanto características únicas: o profissional atuação profissional.
competente possui capacidades de autodesenvolvimento re-
flexivo (…) A lógica da racionalidade técnica opõe-se sempre O professor pesquisador e sua prática.
ao desenvolvimento de uma práxis reflexiva.”    Observa-se que ao longo do tempo a metodo-
Os bons profissionais lançam mão de uma série de es- logia aplicada pelos professores de diversas áreas vem
tratégias não planejadas, cheias de criatividade, para resol- sofrendo transformações significativas, reduzindo aos
ver problemas no dia-a-dia. poucos o método de ensino tradicional e tecnicista no
Schön identifica nos bons profissionais uma combina- desenvolvimento de suas aulas e incorporando novos
ção de ciência, técnica e arte. É esta dinâmica que possi- métodos de ensino. Diante desses aspectos observamos
bilita o professor agir em contextos instáveis como o da que a partir da implementação de práticas inovadoras, o
sala de aula. O processo é essencialmente meta cognitivo,
professor vem se habituando a novas tecnologias, bus-
onde o professor dialoga com a realidade que lhe fala, em
cando deferentes formas de ensino e pesquisa a serem
reflexão permanente.
aplicadas tanto em sala de aula, como também fora dela.
Ora, para maior mobilização do conceito de reflexão na
formação de professores é necessário criar condições de tra-
Tem-se conhecimento que a maior parte dos profes-
balho em equipe entre os professores. Sendo assim, isso su- sores não procura a pesquisa educacional para instruir
gere que a escola deve criar espaço para esse crescimento. e melhorar as suas práticas (MITCHEL, 1985; COOKSON,

79
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

1987; GURNEY. 1989; DOIG. 1994). Em decorrência dis- Diante desse fato nos vem o seguinte questiona-
so o envolvimento dos acadêmicos nos movimentos mento: existe distinção entre professor e pesquisador?
dos professores como pesquisador tem sido, na sua Em uma análise mais criteriosa observamos que são
maioria, para produzir uma literatura acadêmica sobre profissões que se interligam e que podem ser trabalha-
a pesquisa de professores (MITCHEL, 1985; COOKSON, das em conjunto, tanto um professor pode ser um pes-
1987; GURNEY. 1989; DOIG. 1994) ou para produzir ma- quisador como um pesquisador pode ser um professor.
nuais e livros-textos para professores sobre como pes- O professor é visto como aquele que coloca em
quisar (KEMMIS E METAGGART, 1988; ALTRICHTER ET prática o que diz os pesquisadores que seguem mode-
AL., 1993), não usando o conhecimento que eles vêm los clássicos, desconhecendo a prática da sala de aula.
gerando, através de suas pesquisas, para informar seus Quando um professor é também um pesquisador ele
próprios trabalhos nas universidades. Em geral os pes- agrega ao seu currículo um ponto positivo, pois conse-
quisadores têm usado o processo de pesquisa-ação gue aliar prática e teoria. Todo professor deve inovar em
para estudar suas próprias práticas, tendo em vista que sua aula, trazendo novas experiências e ensinando aos
a pesquisa-ação educacional é uma estratégia para o seus alunos vários processos de aprendizagem. Tal pro-
desenvolvimento de professores e pesquisadores de cesso deve ser instigado desde sua formação acadêmica
modo que possam utilizar suas pesquisas para aprimo- para ser base propulsora de um ensino de qualidade.
rar seu ensino e, em decorrência, o aprendizado de seu As qualidades necessárias para um bom professor
alunado. está nas dimensões que envolvem suas qualidades emo-
Segundo Brown (2001), pesquisa-ação é um termo cionais, políticas, éticas, reflexivas e críticas, sobretudo
que se aplica a projetos em que os pesquisadores bus- as de caráter do saber. De acordo com Fazenda (2008)
cam efetuar transformações em suas próprias práticas. é importante que o professor tenha quatro tipos dife-
Portanto, qualquer tipo de reflexão sobre a ação é cha- rentes de competências, caracterizadas por ele como:
mada de pesquisa-ação. competência intuitiva onde o professor não se contenta
Dentro desse contexto, o professor busca aprimorar em executar o planejamento elaborado - ele busca sem-
seus métodos de ensino por meio da reflexão e pesqui- pre alternativas novas e diferenciadas para seu trabalho;
sa, centralizando seus trabalhos e buscando o aperfei- competência intelectiva na qual o professor privilegia
çoamento de sua prática docente. todas as atividades que procuram desenvolver o pensa-
O presente artigo tem como objetivo analisar e mento reflexivo; competência prática onde o professor
discutir acerca do conceito de professor pesquisador, diferentemente do intuitivo, copia o que é bom, pouco
tendo em vista as necessidades e finalidades para sua cria, mas, ao selecionar, consegue boas cópias, alcança
formação e prática docente. Para tal reflexão este estu- resultados de qualidade e competência emocional. Ele
do consiste em uma revisão bibliográfica na literatura trabalha o conhecimento sempre com base no autoco-
acerca deste assunto. nhecimento. Expõe suas ideias por meio do sentimento,
provocando uma sintonia mais imediata.
Professor: educador ou pesquisador? Segundo Ivani Fazenda (2008)
Desde o passado, a profissão docente sempre foi de Aprender a pesquisar, fazendo pesquisa, é próprio
grande importância, como processo de socialização da de uma educação interdisciplinar, que, segundo nossos
cultura e dos conhecimentos sistematizados nas dife- dados, deveria se iniciar desde a pré-escola. Uma das
rentes sociedades. Atualmente os professores tem que possibilidades de execução de um projeto interdiscipli-
lidar não só com alguns saberes, como era no passado, nar na universidade é a pesquisa coletiva, em que exista
mas também com a tecnologia e com a complexidade uma pesquisa nuclear que catalise as preocupações dos
social que exige cada vez mais reflexões e respostas diferentes pesquisadores, e pesquisas-satélites em que
imediatas aos problemas postos no cotidiano vivencia- cada um possa ter o seu pensar individual e solitário.
do por eles mesmos e pelos alunos. Na pesquisa interdisciplinar, está a possibilidade de que
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases – LDB (1996), no cada pesquisador possa revelar a sua própria potencia-
artigo 43, a educação superior deve incentivar o traba- lidade, a sua própria competência. (p. 10)
lho de pesquisa e investigação científica buscando de- A pesquisa no processo educacional está interligada
senvolver a ciência, a tecnologia, criação e difusão da ao aprendizado e reflexões sobre as práticas cotidianas
cultura. Desse modo, desenvolver o entendimento do fazendo a ponte entre os saberes populares e acadêmi-
homem do meio em que vive, promovendo a divulga- cos, entre o que os alunos estudam e como percebem
ção dos conhecimentos científicos e técnicos que com- dados deste estudo no âmbito familiar e grupos socie-
põem o patrimônio da humanidade e comunicar o sa- tários. Neste sentido Zeichner apud Pimenta (2003) res-
ber através do ensino, publicações ou outras formas de salta a importância de preparar professores para que as-
comunicação. sumam uma atitude reflexiva em relação ao seu ensino

80
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

e às condições sociais que o influenciam, reconhecendo diferentemente do pesquisador teórico. Em relação aos
nessa tendência de formação reflexiva uma estratégia objetivos, a pesquisa do professor tem caráter instru-
para melhorar a formação de professores. mental e utilitário, enquanto a pesquisa acadêmica em
Ser educador é formar seres pensantes que perce- educação em geral está conectada com objetivos sociais
bam que podem transformar as suas vidas e a de outras e políticos mais amplos. (Garcia 2009, p. 177).
pessoas. Paulo Freire (1985), em seus estudos relata que O professor deve se preocupar em atingir da melhor
o indivíduo deve saber sobre a sua realidade, para só forma possível, seus objetivos buscando uma reflexão
então buscar transformá-la. junto aos alunos, sobre os desafios que permeiam o
O espaço de aprendizado é, portanto, um meio para professor no contexto atual. Neste sentido os objetivos
a construção da consciência crítica, na interligação entre da pesquisa devem ser claros e possuir uma relevância
o aprendizado a partir da realidade vivenciada e a inter- acadêmica e social. A pesquisa é sempre uma investi-
pretação da sua condição de exploração. Trata-se de in- gação para conhecimento da realidade, entendimento
terpretar para transformar e neste ponto a educação é a sobre a mesma e quando necessário à busca de sua
base para os sujeitos refletirem sobre seus processos e sua transformação. Demo (2011) define que:
condição como sujeito atuante na sociedade, diante disso, Primeiro, é preciso distinguir a pesquisa como prin-
o capitulo seguinte aborda uma conceituação e reflexão a cípio científico e a pesquisa como princípio educativo.
cerca do direcionamento do professor pesquisador. Nós estamos trabalhando a pesquisa principalmente
como pedagogia, como modo de educar, e não apenas
Conceituando e refletindo o professor pesquisador como construção técnica do conhecimento. Bem, se nós
Lima (2007), define o professor como o profissio- aceitamos isso, então a pesquisa indica a necessidade
nal que ministra, relaciona ou instrumentaliza os alunos da educação ser questionadora, do indivíduo saber pen-
para as aulas ou cursos em todos os níveis educacio- sar. É a noção do sujeito autônomo que se emancipa
nais, segundo concepções que regem esse profissional através de sua consciência crítica e da capacidade de
da educação e o pesquisador, como aquele que exerce fazer propostas próprias. (Demo 2011, p. 22).
a atividade de buscar reunir informações sobre um de- O professor precisa assumir a responsabilidade
terminado problema ou assunto e analisá-las, utilizando de repassar o conhecimento acadêmico e aperfeiçoá-
-lo através da pesquisa tendo em vista que é uma das
para isso o método científico com o objetivo de aumen-
melhores estratégias para o aprendizado do alunado.
tar o conhecimento de determinado assunto, descobrir
Miranda (2006) considera que o professor pesquisador
algo novo ou contestar teorias anteriores.
relaciona a prática que se torna um meio fundamen-
No que se refere ao papel do pesquisador ou do
tado e destinado aos conhecimentos, desde que esses
professor-pesquisador ele afirma que “desde sua for-
conhecimentos passem a ser orientados e apropriados
mação deve estar relacionado ao contexto e às práticas
pela ação e reflexão do professor, que são elementos
pedagógicas e de ensino, então a ação reflexiva sobre a
fundamentais visando à melhoria da formação da prá-
prática docente e a importância da utilização da pesqui-
tica docente.
sa para tal, terá um sentido”, Lima (2007).
Tal afirmação nos leva a ideia de que a pesquisa deve Formação na prática docente
ser parte integrante do processo de formação acadêmi- Falar sobre a formação docente requer a considera-
ca dos professores e consequentemente se refletirá no ção de vários aspectos e elementos componentes desta
seu processo de ensino. Ela é um componente necessário formação. Ao referirmos à formação docente estamos
tanto para o aperfeiçoamento e inovação das aulas quan- nos voltando não só para os aspectos constituintes da
to para o próprio aprendizado continuado do docente. formação formal, importante e expressiva na consti-
Garcia (2009), afirma que o professor pesquisador tuição dos saberes necessários à prática pedagógica,
seria aquele professor que busca questões relativas à mas também àqueles que compõem e acompanham
sua prática com o objetivo de aperfeiçoá-las. A partir de modo informal todo o processo formativo como é
disto são apresentadas diferenças entre a “pesquisa do o caso da cultura e das representações que os docentes
professor” e a “pesquisa acadêmica ou científica”. No trazem consigo e que, muitas vezes, são desconsidera-
que diz respeito à finalidade ela aponta que: das pela origem de sua existência.
A pesquisa acadêmica tem a preocupação com a A importância de realizar reflexões acerca das dife-
originalidade, a validade e a aceitação pela comunidade rentes dimensões da formação e da prática docente e
científica. A pesquisa do professor tem como finalidade o saberes se faz por vários motivos, entre elas, as traje-
conhecimento da realidade para transformá-la, visando tórias formativas dos professores, a não valorização da
à melhoria de suas práticas pedagógicas e à autonomia cultura e das representações docentes como elementos
do professor. Em relação ao rigor, o professor pesquisa de formação e posteriormente da produção da prática
sua própria prática e encontra-se, portanto, envolvido, pedagógica.

81
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

De acordo com Pérez Gómez (1997) os modelos de virtude do bem e da obrigação, mas na discussão e na es-
formação vigentes em que se estabelece uma relação colha. “Nós nos deliberamos e decidimos sobre tudo aquilo
linear e hierárquica entre o conhecimento científico e que, para ser e existir depende de nossa vontade e de nos-
as suas aplicações práticas, criando uma relação igual- sa ação.” (Chauí, 2005, p.312).
mente linear entre tarefas de ensino e processos de Ética e a moral são indispensáveis para o desenvolvi-
aprendizagem. O modelo de aquisição do conhecimen- mento educacional e na construção do caráter do homem,
diante das pressões decorrentes do modo de viver que a
to implícito é fator de orientação de ações e condutas
sociedade exige para a boa convivência, que são os valores
do professor na sala de aula, funcionando, muitas vezes,
éticos. O trabalho de trazer à tona a discussão sobre a éti-
como ponto de referência para identificação do que é ca e a moral como condição da identidade do educador é
aprender e, consequentemente, de como ensinar. um instrumento indispensável na conquista da valorização
Na educação atual se busca um professor que pos- deste profissional e de um ambiente de trabalho salutar e
sa desmistificar o processo de ensino-aprendizagem, amistoso.
estando disposto a modificar sua prática pedagógica A sociedade brasileira contemporânea tem enfrentado
para melhora-la. Cabe ao professor estimular a curio- o problema de como educar para o respeito às diferenças
sidade de seu aluno, deixando-o livre para aventurar-se e para o respeito a todos os seres humanos. Combatendo a
no mundo do saber, respeitando sua autonomia e sua violência, essa é uma das principais questões éticas. Atual-
dignidade, sendo tolerante com suas dificuldades, facili- mente são espantosos os casos de ações violentas e des-
tando a superação da mesma. respeito nas escolas, agressões de todas as formas, além
Neste sentido, percebe-se a importância da forma- do uso de drogas, ameaças, descriminação, desrespeito
ção de um professor reflexivo/pesquisador para forma- aos professores e aos alunos.
Daí surge à questão, como a ética poderá nos auxiliar
ção de um profissional capaz de analisar sua própria
para a construção de uma educação contra a violência? O
prática e através desta análise aprimorar sua prática pe-
artigo 2º da LDB considera que, inspirada nos princípios
dagógica no sentido de formar cada vez mais pessoas da liberdade e nos ideais de solidariedade humana, é fina-
capazes de pensar, formar para o pensamento e não lidade da educação nacional o pleno desenvolvimento do
simplesmente para a recepção de informações. educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
Formar seres críticos caracteriza o desfecho final qualificação para o trabalho.
de todo o processo de ensino e aprendizagem, assim o O artigo 1º diz que a educação abrange os processos
professor não se atem apenas aos métodos tecnicista de formativos que se desenvolvem em varias esferas (família,
ensino preparando assim indivíduos capazes de refletir convivência, trabalho, escola, movimento sociais e etc.). A
as suas ações.28 educação voltada para a cidadania e os programas educa-
cionais voltados para esse fim, e para que o homem possa
Ética na profissão se relacionar entre si se faz necessário a crença na tole-
Ética é a “ciência da moral, que estuda os comporta- rância, a marca do bom senso, da razão e da civilidade e
mentos morais do homem para com uma força metafísica e ainda a crença na possibilidade de formar este homem en-
a sociedade, e tem como finalidade garantir a integridade de sinando-o a tolerância e a civilidade dentro do espaço e do
um grupo através do regimento da conduta dos seus mem- tempo na escola.
bros, de acordo com princípios de conveniência geral”. Se- Em nossos tempos, a LDB institui que a escola é um
gundo Isabel Baptista, doutorada em filosofia da educação espaço de formação de cidadão, difusão de valores que
pela faculdade de letras da Universidade do Porto, a ética inspirem cidadania e ética, mas não pressupõe que a esco-
pode ser entendida ainda, como uma reflexão de caráter fi- la, local onde esta formação acontece (ao menos parcial-
losófico sobre os princípios e valores que devem orientar o mente, como diz a lei), seja um espaço ético, operando por
ser humano - noções como o bem, o mal ou a justiça. Ainda meios éticos que inspirem valores éticos.
segundo a autora, a moral significa “uma formalização de Em sua obra “Pedagogia da Autonomia”, Paulo Freire
normas de conduta que terão de estar de acordo ou subordi- (2006), recomenda a proposta de uma prática educativa
nadas àquilo que entendemos por valores éticos, obrigando que reflita sobre o compromisso e a responsabilidade do
no fundo, a considerar o primado da Ética sobre a Moral”. educador, em relação à sala de aula, os limites da ética, do
A ética e moral no campo educacional devem ser en- que é “ser ético”.
tendidas como processo de reflexão e ação no que diz res- Na introdução do tema, Paulo Freire chama a atenção
para o omportamento ético do professor, pautando nos
peito à identidade do educador, bem como suas origens e
saberes por ele propostos e que são imprescindíveis à prá-
o papel que vem atuando na educação e dentro das rela-
tica educativa, e a obrigatoriedade de que o docente ob-
ções sociais ao longo do tempo. A definição de Aristóteles
serve estas virtudes.
no campo da ética não se resume apenas na reflexão da
Em se tratando da prática pedagógica e a ética do do-
28 Fonte: www.webartigos.com/www.inesul.edu.br/www.cdr4a-
pgn.wordpress.com/ www.efdeportes.com/ Alcindo Ferreira Prado/Jeci-
cente, bem como as virtudes que o docente precisa apre-
lene Barreto Coutinho/Osvaldineide Pereira de Oliveira Reis/Osvaldo sentar como comportamento ético, precisam encontrar-se
Arsenio Villalba/Maria Gilmara Mesquita Bezerra Gomes adequadas a um modelo de educação na sociedade.

82
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Tem a ver com que diz respeito à guia da ação, fundada aprendizagem nos variados tempos e espaços. Compreen-
nos princípios do respeito da solidariedade e da justiça, na der a profissão docente pressupõe entender a complexida-
direção do bem coletivo. de do ensino como prática social que constitui o seu eixo.
Para impedir confusões entre à ética e a moral. Pode- Como prática social o ensino é dinâmico, multidimen-
-se dizer que a ética se diferencia da moral por não possui sional, interativo, sempre inédito e imprevisível. É uma prá-
caráter normativo, ela tem um caráter reflexivo que possi- tica que recebe influências de aspectos econômicos, psico-
bilita que as ações morais possam ser julgadas com base lógicos, técnicos, culturais, éticos, políticos, institucionais,
em seus princípios como: o respeito, a justiça, a liberdade. afetivos e estéticos (Caldeira e Azzi, 1997; Candau, 1998;
O respeito é princípio nuclear da ética – dele decorrem Pimenta, 1997). Sem perder de vista esta compreensão, o
os outros. Respeitar implica, em primeiro lugar, o reconhe- presente trabalho focalizará as dimensões ética e afetiva
cimento da presença do outro como semelhante, em sua presentes no ensino, partindo da compreensão que a Didá-
humanidade. Contudo, para respeitar alguém é necessário tica tem dentre seus objetivos, oferecer subsídios teórico-
antes de qualquer coisa admitir que esse alguém exista e -práticos para uma compreensão crítica e contextualizada
reconhecer sua existência. Algo que parece fácil e simples, do ensino. A tomada de consciência da presença da ética e
no entanto, guarda grandes complexidades. Muitas vezes da afetividade no trabalho do professor faz parte da traje-
passamos pelas pessoas sem reconhecê-las, não escuta- tória da Didática em direção à apreensão do ensino em sua
mos o que ela tem a nos dizer, falamos o que queremos multidimensionalidade.
sem sequer mostrar interesse no discurso do outro, os ou- Desta forma, tendo como objetivo identificar evidên-
tros “eus” existentes no outro, tem ideias e sentimos pró- cias das dimensões ética e afetiva, como elementos inte-
prios deles. grantes da docência e intervenientes no processo de ensi-
Não sou eu, mas são como eu e minha existência de- no, esta pesquisa tomando por base, a abordagem qualita-
pende também do reconhecimento deles. tiva, utilizou como fonte de dados a observação participan-
O educando no curso de sua trajetória rumo ao apren- te, a roda de conversa e os trabalhos escritos apresentados
der, busca garantir o seu desenvolvimento. Todos os seres pelos alunos.
humanos têm o direito à aprendizagem e ao desenvolvi-
mento; e é em busca desse aprendizado significativo e do
Reflexões sobre as dimensões ética e afetiva como
seu desenvolvimento que o educando dirige-se à escola, pú-
elementos integrantes do ensino
blica ou privada, com tudo pelo lugar que ocupa na pratica
Uma das características mais marcantes do trabalho
educativa, o educador tem como compromisso ser solidário
docente é o fato de ser interativo. O ensino dirige-se a se-
para com o educando, o que significa ensinar com eficiência
res humanos, ao mesmo tempo seres individuais e sociais.
para ele aprender bem e, por aprender bem, cresça.
Tardif (2002) entende que o objeto do trabalho docente são
O que consiste em uma pratica educativa pautada por
os seres humanos que possuem características peculiares.
uma conduta ética centrada no atendimento das neces-
O professor trabalha com sujeitos individuais e heterogê-
sidades do educando como aprendiz dos mais variados
neos, com diferentes histórias, ritmos, interesses neces-
conteúdos escolares. O que não significa de jeito algum,
instruir teoricamente procedimentos éticos aos educando; sidades e afetividades. Isso torna as situações de ensino
como “ensinar lições de moral”; todavia praticar condutas complexas, únicas, imprevisíveis e incabíveis em generali-
éticas com eles, é no exercício profissional de educadores, zações ou esquemas predefinidos de ação.
próximo ao educando, que podemos agir junto com eles Além de individual, o objeto do trabalho docente é
ao qual carece estar acordado nosso sentimento ético. Em também social. Sua origem de classe, etnia e gênero o ex-
vista a uma ação benfeitora, ou seja, afetuosa (o que sig- põe a diferentes influências e experiências que repercutem
nifica “agir com o outro” no seu modo de ser e na sua ne- em sala da aula, provocando diferentes reações e expecta-
cessidade). tivas no professor e nos alunos. Neste sentido, Tardif (2002,
A ideia de um código ético voltado para a educação p. 130) alerta para a noção de que o objeto do trabalho do-
vem despertar os educadores à verdadeira essência do cente escapa constantemente ao controle do trabalhador, ou
bem, do fazer o bem e fazê-lo bem feito, os educadores seja, do professor. O aluno oferece resistências, apresenta
precisam conhecer a ética para então passar a agir etica- variações de humor, de motivação, dificuldades, emoções
mente dentro e fora da sua profissão como um ser pensan- não tem um comportamento linear, previsível. Pode estar
te e agente ativo na construção da cidadania.29 aparentemente atento, mas seu pensamento apresenta-se
distante, pode não participar com intervenções orais, mas
Dimensão ética e afetiva da docência acompanhar o desenvolvimento da aula e estabelecendo
A profissão docente, suas características, a forma de suas relações. Além disso, todas as experiências pessoais
desempenhá-la, sua importância e as exigências que re- e sociais estão mediando o acontece em sala de aula. Não
caem sobre ela, variam de acordo com as diferentes con- é, portanto, uma situação de fácil controle, como seria se o
cepções e valores atribuídos à educação, ao ensino, e à objeto fosse inanimado, material, que permanece amanhã,
do mesmo jeito que se deixou hoje (se não houver interfe-
29 Por Nivea Maria Coutinho Soares e Deborah dos Santos rência de outro sujeito no objeto).

83
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

As características destacadas evidenciam a presença Nesse tipo de atividade, a personalidade do trabalha-


das dimensões ética e afetiva no desenvolvimento do ensi- dor, suas emoções, sua afetividade fazem parte integrante
no. É fundamental perceber que, ao trabalhar um conteú- do processo de trabalho: a própria pessoa, com suas qua-
do, desenvolver uma atividade ou aplicar um instrumento lidades, seus defeitos, sua sensibilidade, em suma, tudo o
de avaliação estas questões estarão inevitavelmente inter- que ela é, torna-se de uma certa maneira, um instrumento
ferindo no processo. de trabalho. Nesse sentido ela é um componente tecnoló-
O professor em formação dever ser orientado a per- gico das profissões de interação. Essa tecnologia emocio-
ceber que a dimensão afetiva, presente nos processos de nal é representada por posturas físicas, por maneiras de
ensino e de aprendizagem, pode funcionar como elemento estar com os alunos. (TARDIF, 2002, p. 142).
facilitador ou bloqueador da aprendizagem. Assim é que rapidamente os alunos diferenciam seus
Uma boa parte do trabalho docente é de cunho afeti- professores pelas características pessoais: o introvertido,
vo, emocional. Baseia-se em emoções, em afetos, na capa- sério, o mais extrovertido, brincalhão, o carismático, amigo,
cidade não somente de pensar nos alunos, mas igualmen- frio, distante, organizado, competente, seguro. São pecu-
te de perceber e sentir suas emoções, seus temores, suas liaridades pessoais que integram o exercício da docência e
alegrias, seus próprios bloqueios afetivos. (TARDIF, 2002, afetam o trabalho que o professor desenvolve, por meio de
p. 130). suas decisões, atitudes, escolhas, a forma como enfrenta os
O clima afetivo desencadeado em sala de aula tem problemas que se apresentam, atestando que a dimensão
interferência direta no que nela ocorre. Em função, dis- ética faz-se necessariamente presente.
so é que se gosta ou não de assistir a determinada aula, Outra manifestação da ética no trabalho do profes-
sente-se à vontade ou constrangido para expor dúvidas e sor suscitada por Tardif (2002) diz respeito ao fato de que,
participar das atividades, tem-se ou não prazer em estudar trabalhando com grupos, o professor não pode deixar de
determinado assunto ou matéria, aprende-se a gostar ou atingir os indivíduos. Segundo o autor esse problema nun-
não gostar de uma disciplina, sente-se motivação, interes- ca é resolvido de maneira satisfatória do ponto de vista
se, aborrecimento, ou tédio para as atividades escolares ou ético, pois os professores nunca podem atender às neces-
sidades singulares de todos os alunos assumindo padrões
acadêmicas.
gerais de uma organização de massa. (2002, p. 146). Alguns
Consoante o autor em pauta, pelas peculiaridades do
professores procuram adotar no seu dia-a-dia, estratégias
objeto de trabalho docente, a prática pedagógica dos pro-
próprias de atendimento, distribuição da atenção e acom-
fessores consiste em gerenciar relações sociais e envolve
panhamento de seus alunos, estando sempre atentos a
tensões, dilemas, negociações e estratégias de interação.
essa tensão entre o individual e o coletivo. Outros ignoram
Por exemplo, o professor tem que trabalhar com gru-
essa particularidade da docência e seguem seu trabalho de
pos, mas também tem de se dedicar aos indivíduos; deve
modo homogêneo, sem se preocupar com as individua-
dar sua matéria, mas de acordo com os alunos, que vão
lidades. Os dois casos estão afetados pela ética, uma vez
assimilá-la de maneira muito diferente; deve agradar aos
que envolvem decisões, valores, relações de poder, são
alunos mas sem que isso se transforme em favoritismo;
atitudes que se pautam em concepções e trazem repercus-
deve motivá-los, sem paparicá-los; deve avaliá-los, sem sões para a formação do aluno.
excluí-los, etc. Ensinar é, portanto, fazer escolhas constan- Outra questão ética apresentada pelo autor, refere-se
temente em plena interação com os alunos. Ora, essas es- à forma como o professor torna acessível ao aluno, o co-
colhas dependem da experiência dos professores, de seus nhecimento a ser trabalhado. O professor tem um domínio
conhecimentos, convicções e crenças, de seu compromisso de conhecimentos diferente dos alunos e a forma como
com o que fazem, de suas representações a respeito dos interage com eles ao trabalhar esse conhecimento envolve
alunos e, evidentemente, dos próprios alunos. (TARDIF, um problema ético para o qual nem sempre dispensa a de-
2002, p. 132). vida atenção. A abordagem que dá ao conhecimento a ser
Por ser um trabalho interativo, o ensino exige investi- aprendido demonstra preocupação com a base cognitiva
mento pessoal do professor para garantir o envolvimen- que o aluno traz, ou não leva em consideração esse aspec-
to do aluno, para despertar seu interesse e participação, e to? Apresenta o conteúdo de forma a despertar o interes-
para evitar desvios que possam prejudicar o trabalho. Por se do aluno? Relaciona com a realidade? Dá um enfoque
esse motivo Tardif (2002) acentua que a personalidade do fragmentado ou interdisciplinar? O trabalho com o conteú-
professor é um componente de seu trabalho, o que ele de- do expressa valores, concepções, opções; compromete-se
nomina de trabalho investido, ou seja, no desempenho de com um determinado tipo de visão de ensino; contribui
seu trabalho o professor, empenha e investe o que ele é para a formação de determinadas aprendizagens.
como pessoa. Tendo como objeto de trabalho o ensino, a disciplina
Aquilo que nos parece ser a característica do trabalho Didática deve contribuir para que o licenciando compreen-
investido ou vivido é a integração ou absorção da persona- da que as atitudes do professor e o modo como se relacio-
lidade do trabalhador no processo de trabalho quotidiano na com a docência, com o conhecimento e com os estu-
enquanto elemento central que contribui para a realização dantes, seus valores, seus interesses e gostos são também
desse processo. (...) elementos formadores.

84
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

(...) os ofícios ou profissões de relações humanas apon-


tam para questões de poder, de maneira intrínseca, mas 6. EDUCAÇÃO INTEGRAL E DE TEMPO
também para problemas de valor, seus próprios objetos INTEGRAL.
são seres humanos capazes de emitir juízos de valor e pos-
suem, como seres humanos, direitos e privilégios. Nesse
sentido, a dimensão ética não é um elemento periférico nas
A educação brasileira vem se modificando ao longo
ocupações e profissões de relações humanas, mas está no dos anos na tentativa de acompanhar as constantes mu-
próprio cerne do trabalho. (TARDIF, 2002, p. 145) danças econômicas, políticas e sociais pelas quais nossa
Pimenta e Anastasiou (2002) também apresentam sociedade vem passando. É sabido, entretanto, que nem
elementos que contribuem para a compreensão da ética sempre a educação evolui a tempo e a contento a fim de
como integrante do trabalho docente, já que pressupõe se adequar aos novos paradigmas sociais e culturais que
intencionalidades, objetivos, definição de caminhos para o se apresentam. E é exatamente por isso que o trabalho no
alcance desses objetivos: campo educacional constitui-se de um constante desafio
Assim, de um lado, é preciso considerar que a atividade para os profissionais que nele atuam.
profissional de todo professor possui uma natureza peda- O século XXI consolidou demandas que foram histo-
ricamente construídas em todas as esferas sociais, inclu-
gógica, isto é, vincula-se a objetivos educativos de forma-
sive na educacional. A organização social atual exige uma
ção humana e a processos metodológicos e organizacio-
escola multifuncional, com profissionais mais completos,
nais de transmissão e apropriação de saberes e modos de integrais, que, além de dominar o conteúdo especializado,
ação. O trabalho docente está impregnado intencionalida- sejam preparados para lidar com os desafios da contem-
de, pois visa à formação humana por meio de conteúdos e poraneidade. Esses profissionais devem estar capacitados
habilidades, de pensamento e ação, o que implica escolhas, para atuar na formação integral dos discentes, preparan-
valores, compromissos éticos. Isso significa introduzir ob- do-os para a vida em sociedade e para exercerem a cida-
jetivos de natureza conceitual, procedimental e valorativa, dania em todas as suas vertentes.
em relação aos conteúdos da matéria que ensina; transfor- É nesse novo paradigma social que o discurso de educar
mar o saber científico ou tecnológico em conteúdos for- integralmente, de preparar os educandos, física, afetiva, cul-
mativos; selecionar e organizar conteúdos de acordo com tural e cognitivamente ganha força e atinge todos os âmbi-
tos da esfera política, concretizando-se nos documentos ofi-
critérios lógicos ou psicológicos, função das características
ciais que regulamentam a educação no País. Assim, vemos
dos alunos e das finalidades do ensino; utilizar métodos e
as ideias do educador brasileiro Anísio Teixeira (1962) serem
procedimentos de ensino específicos, inserindo-os numa retomadas de forma contundente, pelo menos no discurso
estrutura organizacional em que participe de decisões e oficial. Para Anísio Teixeira, a efetivação da educação integral
ações coletivas. Por isso, para ensinar, o professor necessita está subordinada à ampliação do tempo, sendo a escola de
de conhecimentos e práticas que ultrapassem o campo de tempo integral a solução para melhorar a qualidade do ensi-
sua especialidade. (PIMENTA E ANASTASIOU, 2002, p. 16) no e atender às demandas da sociedade atual.
Pelo exposto, constata-se que o trabalho que o pro- Contemporâneo de Anísio Teixeira, Gadotti (2009) con-
fessor desenvolve abrange a dimensão ética e a dimensão testa a premissa de que a educação integral está subordi-
afetiva. Neste sentido, no desempenho de seu trabalho, nada ao tempo integral. Para o autor, educar integralmente
jamais estará apenas apresentando um conhecimento neu- deve ser o objetivo primordial da escola, seja ela de tempo
tro, impermeável. Sua posição, decisões, escolhas, compor- parcial ou integral. Contudo, a expansão do tempo integral
no Brasil, na maioria das vezes, é uma tentativa de suprir
tamentos, atitudes, seus sentimentos, emoções e a forma
necessidades sociais básicas não abarcadas pelo Estado.
como gerencia a sala de aula, os conteúdos e as interações A educação integral é uma concepção da educação que
interpessoais influenciam o desenvolvimento, a aprendiza- não se confunde com o horário integral, o tempo integral
gem e a formação de seus alunos.30 ou a jornada integral. Alguns projetos de escola de tempo
integral surgiram, como é o caso dos Cieps, para compen-
sar deficiências do meio familiar, da própria sociedade. Os
Cieps foram criados, tanto no estado quanto no município
do Rio de Janeiro, nas décadas de 1980 e de 1990, como
um ‘Programa Especial de Educação’. [...] O projeto origi-
nal dos Cieps previa até a construção de residências, na
própria escola, para os alunos mais pobres e suas famílias,
numa clara confusão entre o papel da escola e as políticas
sociais. A escola não pode fazer tudo o que a sociedade
não está fazendo; ela não pode substituir todas as políticas
sociais. A escola precisa cumprir bem a sua função de ensi-
30 Fonte: www.uece.br/Carmensita Matos Braga Passos nar (Gadotti, 2009, p. 29-30).

85
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Retomando os documentos oficiais, o Plano Nacional Como concepção, a proposta de Educação Integral
de Educação (PNE), aprovado pela Lei n. 10.172/2001, es- deve ser assumida por todos os agentes envolvidos no
tabelece a obrigatoriedade do ensino fundamental, asse- processo formativo das crianças, jovens e adultos. Nesse
gurando o acesso e a permanência de todas as crianças na contexto, a escola se converte em um espaço essencial
escola até a conclusão dessa etapa. O documento ainda para assegurar que todos e todas tenham garantida uma
ratifica que o cumprimento dessa prioridade: formação integral. Ela assume o papel de articuladora das
[...] inclui o necessário esforço dos sistemas de ensino diversas experiências educativas que os alunos podem vi-
para que todos obtenham a formação mínima para o exer- ver dentro e fora dela, a partir de uma intencionalidade cla-
cício da cidadania e para o usufruto do patrimônio cultural ra que favoreça as aprendizagens importantes para o seu
da sociedade moderna. O processo pedagógico deverá ser desenvolvimento integral.
adequado às necessidades dos alunos e corresponder a um
ensino socialmente significativo. Prioridade de tempo inte- Vantagens da educação integral
gral para as crianças das camadas sociais mais necessitadas Entre as vantagens da educação em tempo integral,
(Brasil - PNE, 2001, p. 35). destacam-se:
A Constituição Federal (1988), o Estatuto da Criança e - Melhoria no desempenho dos alunos
do Adolescente (Lei 8.069/1990) e a Lei de Diretrizes e Bases Nesse regime de ensino há períodos destinados para
da Educação Nacional (LDB) (Lei 9.394/1996) são documen- que o aluno estude para as provas e faça os trabalhos do
tos legais que estabelecem o direito à educação integral a dia, sempre com o apoio de profissionais. Isso pode levar à
todas as crianças e adolescentes do País. A LDB também melhoria no desempenho do aluno.
- Utilização do tempo ocioso
preconiza a progressiva implantação do ensino em tempo
Muitas vezes o jovem que sai da escola e vai para casa
integral nas instituições nacionais de ensino público:
não utiliza o seu tempo para atividades de culturais ou
Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental in-
de estudo. Nas escolas com educação integral, há melhor
cluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala
aproveitamento desse tempo que seria ocioso, podendo
de aula, sendo progressivamente ampliado o período de
afastá-lo, inclusive, do envolvimento com atividades que
permanência na escola. [...]§ 2º. O ensino fundamental será
levem a problemas de risco social.
ministrado progressivamente em tempo integral, a critério
- Contato com atividades de lazer, esportes e cultura
dos sistemas de ensino (Brasil - LDB Lei 9.394/1996).
Nas escolas com educação em tempo integral há uma
série de atividades recreativas, esportivas e culturais vol-
Diferenciando educação integral de educação de tadas aos alunos que, de outro modo, talvez não tivessem
tempo integral acesso a elas e com a vantagem extra de que elas são pen-
A Educação Integral é uma concepção que compreen- sadas pedagogicamente.
de que a educação deve garantir o desenvolvimento dos - Melhoria na relação familiar
sujeitos em todas as suas dimensões – intelectual, física, Muitas vezes, depois de um dia atribulado no trabalho,
emocional, social e cultural e se constituir como projeto os pais chegam em casa e precisam conferir e ajudar os
coletivo, compartilhado por crianças, jovens, famílias, edu- filhos a fazer seus deveres. Essas cobranças podem levar a
cadores, gestores e comunidades locais. conflitos e desgastar a relação familiar. Já quando o jovem
já estudou e fez os deveres na escola, esse período poderá
A Educação Integral: ser utilizado apenas para atividades mais prazerosas junto
- é uma proposta contemporânea porque, alinhada as à família.
demandas do século XXI, tem como foco a formação de su- - Desenvolvimento da autonomia
jeitos críticos, autônomos e responsáveis consigo mesmos Na educação integral há desenvolvimento da autono-
e com o mundo; mia dos jovens, que não dependerão apenas dos pais para
- é inclusiva porque reconhece a singularidade dos estudarem e fazerem suas atividades escolares. O convívio
sujeitos, suas múltiplas identidades e se sustenta na frequente com outros jovens e adultos também colabora
construção da pertinência do projeto educativo para to- para o desenvolvimento de habilidades sociais.
dos e todas;
- é uma proposta alinhada com a noção de sustenta- Desafios da educação integral
bilidade porque se compromete com processos educativos Como vimos, a educação em tempo integral possui di-
contextualizados e com a interação permanente entre o versas vantagens. Agora, veremos alguns de seus principais
que se aprende e o que se pratica; desafios.
- promove a equidade ao reconhecer o direito de to- - Novo papel dos pais
dos e todas de aprender e acessar oportunidades educati- A educação integral valoriza a autonomia do aluno.
vas diferenciadas e diversificadas a partir da interação com Entretanto, alguns pais ressentem-se de participarem me-
múltiplas linguagens, recursos, espaços, saberes e agentes, nos da rotina de seus filhos. É importante lembrar que a
condição fundamental para o enfrentamento das desigual- presença dos pais é fundamental para o desenvolvimento
dades educacionais. dos jovens. Por isso, é preciso encontrar outras formas de

86
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

participar do dia a dia dos filhos já que a educação integral - Oferece educação bilíngue
ocupa-se apenas de uma esfera de seu desenvolvimento. Além de não ter que se deslocar para outra institui-
Os pais não devem pensar que a escola os substituirá. ção, o período integral permite inserir atividades durante
- Falta de um projeto pedagógico específico as aulas de idiomas que as tornam mais eficientes. Em vez
O projeto pedagógico de uma escola com educação de aprender apenas gramática, por exemplo, o aluno pode
integral precisa ser muito bem definido para que o período usar o inglês em uma aula de ciências. A criança já cresce
estendido não seja maçante para o aluno, mas o auxilie em com um bom conhecimento de inglês ou espanhol para
seu desenvolvimento completo enquanto cidadão. que, no futuro, possa estudar, se desejar,  em uma univer-
Ao contrário do que diz o senso comum, passar mais sidade fora do país. 
tempo na escola não é sinônimo de educação integral. A - Supre a carência de lazer e cultura
educação em tempo integral precisa estar baseada em Uma grade curricular estendida e planejada oferece
aprendizagens significativas que levem a uma educação de atividades artísticas e culturais diversificadas. “Isso amplia a
qualidade e que forme integralmente os jovens alunos. capacidade da criança de estabelecer relações que a farão
- Falta de estrutura de algumas escolas entender melhor o mundo”, afirma Tatiana Almendra. 
Para que a educação integral funcione, é preciso que - Permite mais prática de esportes
Com um número maior de aulas de educação física,
as escolas tenham estruturas físicas adequadas. Nesse tipo
o aluno tem acesso a diversas modalidades de esportes,
de proposta, as escolas precisam ter locais específicos para
sempre respeitando seu desenvolvimento motor e a capa-
práticas esportivas, por exemplo. Assim, é preciso que a
cidade de atuar em grupo. 
escola esteja bem adaptada para esse modelo antes de
- Estimula a criatividade e o pensamento crítico
lançá-lo. É importante que os pais conheçam as instalações Uma carga horária maior permite a realização de pro-
escolares antes de realizar a matrícula. jetos interdisciplinares mais complexos, que desafiam a
criança a resolver situações-problema em lugar de decorar
Educação em Tempo Integral conceitos. Os alunos podem, por exemplo, aplicar concei-
O termo Educação em Tempo Integral ou Escola de tos de física na construção de “engenhocas”. Dessa forma,
Tempo Integral diz respeito àquelas escolas e secretarias de haverá maior desenvolvimento de sua capacidade criativa.
educação que ampliaram a jornada escolar de seus estu- - Oferece educação digital
dantes, trazendo ou não novas disciplinas para o currículo A criança aprende a usar o computador não apenas
escolar. A maioria das unidades de ensino que adota esse como mais um instrumento de comunicação e de pesqui-
modelo geralmente implementam a extensão do tempo sa. No currículo da Móbile Integral, por exemplo, os estu-
em turno e contraturno escolar – durante metade de um dantes, por meio do uso de robôs e de jogos, aprendem a
dia letivo, os estudantes estudam as disciplinas do currículo “falar” com o computador, aproximando-se gradualmente
básico, como português e matemática, e o outro período é da linguagem de programação.
utilizado para aulas ligadas às artes ou esporte. - Oferece educação alimentar
Na perspectiva da educação integral, o conceito de A criança aprende a comer de forma saudável e conhe-
tempo integral suscita várias discussões, uma vez que há ce uma variedade maior de alimentos por ter acesso a uma
algumas correntes dos movimentos sociais ligados à edu- alimentação planejada por uma equipe de especialistas. 
cação que defendem que apenas a ampliação do tempo
de estudo não garante o resultado ambicionado pela edu- Entre os desafios podemos citar:
cação integral no ensino e aprendizagem dos estudantes - Falta estrutura física;
– resultado este que deseja garantir o pleno desenvolvi- - Falta integração de disciplinas;
mento das crianças e adolescentes. - Falta de profissionais: faltam porteiros, inspetores de
alunos, merendeiras, pessoal administrativo.
- Aumentar o número de horas não resolve: é preciso
Vantagens da Educação em Tempo Integral
dar reforço escolar, atividades esportivas e culturais;
- Melhora o aproveitamento do tempo
- Dificuldades na implementação do ensino integral: se
Além das brincadeiras livres, as crianças participam de
terá professores suficientes, se o projeto pedagógico está
outras que proporcionam aprendizados importantes. “A
alinhado.
escola integral qualifica a interação e o tempo da criança”, Esses são alguns, há muito outros fatores que interfe-
diz Tatiana Almendra, diretora da Móbile Integral, iniciativa rem na construção de uma proposta de educação integral
que tem como base a experiência de sucesso de mais de 40 em tempo integral, que proporcione aos alunos o direito
anos da instituição e que terá um corpo de professores de- à formação integral, direito que se traduz na possibilidade
dicados exclusivamente ao novo projeto, dialogando com de percorrer seu processo educativo, de adquirir e cons-
os mesmos princípios educacionais. truir conhecimentos e de desenvolver potencialidades para
- Favorece o desenvolvimento social  interpretar a complexa realidade em que se vive, ao assu-
As crianças aprendem, brincam e interagem entre elas. mir a condição de sujeito interativo. A concretização desse
Estudos mostram que, quando os alunos resolvem desafios direito exige outra compreensão do que seja o processo
de forma colaborativa, o desenvolvimento social e emocio- de ensino-aprendizagem e de como ele se articula com a
nal é mais estimulado, além da criatividade. totalidade da formação humana.

87
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Apesar dos problemas, consideramos que a implantação do tempo integral, pautado na educação integral, constitui-
-se de um avanço na tentativa de melhorar a qualidade do ensino no Brasil. Contudo, os paradigmas impostos para que
esta educação se realize estão equivocados. Conforme defendido por Borges (2012) e Paro (1988), o papel da escola é
prioritariamente pedagógico. Outras funções podem coexistir desde que não interfiram, prejudiquem ou impossibilitem o
cumprimento da função primeira da escola: a pedagógica. Ademais, a escola de tempo integral não deve ser um lugar para
deixar a criança porque a rua é um risco, mas sim porque essa criança precisa ter acesso ao conhecimento científico e cultu-
ral acumulado pela humanidade, desenvolver suas potencialidades e ser devidamente preparada para atuar na sociedade,
ciente dos seus direitos, deveres e das regras que permitem a convivência social.31

7. ESCOLA COMUM INCLUSIVA.


APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA; AGRUPAMENTOS PRODUTIVOS E CIRCULAÇÃO
DOS CONHECIMENTOS; RECURSOS DIDÁTICOS; PLANEJAMENTO VOLTADO PARA
O DESENVOLVIMENTO DAS CAPACIDADES DOS ALUNOS; O PROJETO PEDAGÓGICO
E O TRABALHO COLETIVO; O CURRÍCULO CENTRADO NAS EXPECTATIVAS
DE APRENDIZAGEM; ORGANIZADORES DE SITUAÇÕES DE APRENDIZAGEM
(COMPETÊNCIAS E HABILIDADES QUE OS ALUNOS DEVERÃO CONSTITUIR;
CONTEÚDOS CURRICULARES SELECIONADOS; ATIVIDADES DO ALUNO E DO
PROFESSOR; AVALIAÇÃO E APOIO PEDAGÓGICO); A ORGANIZAÇÃO DO TEMPO EM
SALA DE AULA CONSIDERANDO A DIVERSIDADE DOS ALUNOS, OS OBJETIVOS DAS
ATIVIDADES PROPOSTAS E AS CARACTERÍSTICAS DOS PRÓPRIOS CONTEÚDOS;
ESTRATÉGIAS DIVERSIFICADAS DE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM COMO
NORTEADORAS DO PLANEJAMENTO DE PROPOSTAS DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA,
CONSIDERANDO O DESENVOLVIMENTO DE DIFERENTES CAPACIDADES DOS ALUNOS;
O REGISTRO COMO FERRAMENTA IMPRESCINDÍVEL PARA O PLANEJAMENTO
DA AÇÃO EDUCATIVA; O RESPEITO ÀS DIVERSAS CRENÇAS E OPÇÕES POLÍTICAS
DOS MEMBROS DA EQUIPE ESCOLAR E DAS FAMÍLIAS, COMO CONDIÇÃO PARA O
FORTALECIMENTO DA INSTITUIÇÃO ENQUANTO EQUIPAMENTO PÚBLICO, LAICO,
DEMOCRÁTICO E DE QUALIDADE.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva foi elaborada segundo os preceitos de
uma escola em que cada aluno tem a possibilidade de aprender, a partir de suas aptidões e capacidades, e em que o conhe-
cimento se constrói sem resistência ou submissão ao que é selecionado para compor o currículo, resultando na promoção
de alguns alunos e na marginalização de outros do processo escolar.
A compreensão da educação especial nesta perspectiva está relacionada a uma concepção e a práticas da escola co-
mum que mudam a lógica do processo de escolarização, a sua organização e o estatuto dos saberes que são objeto do
ensino formal. Como modalidade que não substitui a escolarização de alunos com deficiência, com transtornos globais de
desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação, essa educação supõe uma escola que não exclui alunos que não
atendam ao perfil idealizado institucionalmente.
A educação especial perpassa todos os níveis, etapas e demais modalidades de ensino, sem substituí-los, oferecendo
aos seus alunos serviços, recursos e estratégias de acessibilidade ao ambiente e aos conhecimentos escolares. Nesse con-
texto, deixa de ser um sistema paralelo de ensino, com níveis e etapas próprias.
Sinalizando um novo conceito de educação especial, a Política enseja novas práticas de ensino, com vistas a atender as
especificidades dos alunos que constituem seu público alvo e garantir o direito à educação a todos.
Aponta para a necessidade de se subverter a hegemonia de uma cultura escolar segregadora e para a possibilidade de
se reinventar seus princípios e práticas escolares.
A Constituição Federal, em seu artigo 205, afirma que a educação é um direito de todos, e que tem o objetivo de
proporcionar o pleno desenvolvimento da pessoa, preparando-a para o exercício da cidadania e qualificando-a para o
trabalho; o parágrafo I do artigo 206 preconiza que o ensino será ministrado tendo como uma de suas bases o princípio da
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola e o parágrafo III do artigo 208 afirma que o Estado garantirá
um atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
Isto posto fica claro e imperativo que as práticas de ensino devem abranger e acolher as peculiaridades de cada um, sendo
ele portador de deficiência ou não.
31 Fonte: www.educacaointegral.org.br/ www.seer.ufrgs.br/ www.scielo.br/www.blog.wpensar.com.br/ vejasp.abril.com.br/

88
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Para que esta teoria se firme na prática a escola deve inacabadas e, portanto, os alunos não são categorizáveis,
trabalhar no sentido de apresentar mudanças que possi- não podem ser reunidos e fixados em categorias, grupos,
bilitem a todos, indistintamente, um ensino de qualida- conjuntos, que se definem por certas características arbi-
de, respeitando as especificidades, diferenças e ritmos de trariamente escolhidas.
aprendizagem de cada aluno. O fato é que, sob a ótica da É incorreto, portanto, atribuir a certos alunos identida-
inclusão não é o aluno que tem que se adaptar ao ensino, des que os mantêm nos grupos de excluídos, ou seja, nos
mas sim a escola que deve oferecer as ferramentas para grupos dos alunos especiais, com necessidades educacio-
que este aluno chegue ao conhecimento. Diante disto, o nais especiais, portadores de deficiências, com problemas
professor, baseando-se na visão da escola voltada para to- de aprendizagem e outros tais. É incabível fixar no outro
dos, deve buscar e adequar os meios para ensinar a todos uma identidade normal, que não só justifica a exclusão dos
os alunos, independente das suas necessidades mentais, demais, como igualmente determina alguns privilegiados.
físicas, psicológicas e sociais. A educação inclusiva questiona a artificialidade das
A inclusão rompe com os paradigmas que sustentam identidades normais e entende as diferenças como re-
o conservadorismo das escolas, contestando os sistemas sultantes da multiplicidade, e não da diversidade, como
educacionais em seus fundamentos. Ela questiona a fixação comumente se proclama. Trata-se de uma educação que
de modelos ideais, a normalização de perfis específicos de garante o direito à diferença e não à diversidade, pois as-
alunos e a seleção dos eleitos para frequentar as escolas, segurar o direito à diversidade é continuar na mesma, ou
produzindo, com isso, identidades e diferenças, inserção e/ seja, é seguir reafirmando o idêntico.
ou exclusão. De fato, a diversidade na escola comporta a criação de
O poder institucional que preside a produção das iden- grupos de idênticos, formados por alunos que têm uma mes-
tidades e das diferenças define como normais e especiais ma característica, selecionada para reuni-los e separá-los.
não apenas os alunos, como também as suas escolas. Os Ao nos referirmos a uma escola inclusiva como aberta
alunos das escolas comuns são normais e positivamente à diversidade, ratificamos o que queremos extinguir com a
valorados. Os alunos das escolas especiais são os negativa- inclusão escolar, ou seja, eliminamos a possibilidade de agru-
mente concebidos e diferenciados.
par alunos e de identificá-los por uma de suas características
Os sistemas educacionais constituídos a partir da opo-
(por exemplo, a deficiência), valorizando alguns em detri-
sição - alunos normais e alunos especiais - sentem-se aba-
mento de outros e mantendo escolas comuns e especiais.
lados com a proposta inclusiva de educação, pois não só
criaram espaços educacionais distintos para seus alunos, a
A escola comum na perspectiva inclusiva
partir de uma identidade específica, como também esses
A escola das diferenças é a escola na perspectiva inclu-
espaços estão organizados pedagogicamente para manter
siva, e sua pedagogia tem como mote questionar, colocar
tal separação, definindo as atribuições de seus professores,
em dúvida, contrapor-se, discutir e reconstruir as práticas
currículos, programas, avaliações e promoções dos que fa-
que, até então, têm mantido a exclusão por instituírem uma
zem parte de cada um desses espaços.
Os que têm o poder de dividir são os que classificam, organização dos processos de ensino e de aprendizagem
formam conjuntos, escolhem os atributos que definem os incontestáveis, impostos e firmados sobre a possibilidade
alunos e demarcam os espaços, decidem quem fica e quem de exclusão dos diferentes, à medida que estes são direcio-
sai destes, quem é incluído ou excluído dos agrupamentos nados para ambientes educacionais à parte.
escolares. A escola comum se torna inclusiva quando reconhece
Ambientes escolares inclusivos são fundamentados as diferenças dos alunos diante do processo educativo e
em uma concepção de identidade e diferenças, em que as busca a participação e o progresso de todos, adotando no-
relações entre ambas não se ordenam em torno de oposi- vas práticas pedagógicas. Não é fácil e imediata a adoção
ções binárias (normal/especial, branco/negro, masculino/ dessas novas práticas, pois ela depende de mudanças que
feminino, pobre/rico). Neles não se elege uma identidade vão além da escola e da sala de aula. Para que essa escola
como norma privilegiada em relação às demais. possa se concretizar, é patente a necessidade de atualiza-
Em ambientes escolares excludentes, a identidade nor- ção e desenvolvimento de novos conceitos, assim como a
mal é tida sempre como natural, generalizada e positiva redefinição e a aplicação de alternativas e práticas pedagó-
em relação às demais, e sua definição provém do processo gicas e educacionais compatíveis com a inclusão.
pelo qual o poder se manifesta na escola, elegendo uma Um ensino para todos os alunos há que se distinguir
identidade específica através da qual as outras identidades pela sua qualidade. O desafio de fazê-lo acontecer nas sa-
são avaliadas e hierarquizadas. las de aulas é uma tarefa a ser assumida por todos os que
Esse poder que define a identidade normal, detido compõem um sistema educacional. Um ensino de qua-
por professores e gestores mais próximos ou mais dis- lidade provém de iniciativas que envolvem professores,
tantes das escolas, perde a sua força diante dos princí- gestores, especialistas, pais e alunos e outros profissionais
pios educacionais inclusivos, nos quais a identidade não que compõem uma rede educacional em torno de uma
é entendida como natural, estável, permanente, acabada, proposta que é comum a todas as escolas e que, ao mes-
homogênea, generalizada, universal. Na perspectiva da mo tempo, é construída por cada uma delas, segundo as
inclusão escolar, as identidades são transitórias, instáveis, suas peculiaridades.

89
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O Projeto Político Pedagógico é o instrumento por do sistema. Em contrapartida, existe um espaço e um tem-
excelência para melhor desenvolver o plano de trabalho po a serem construídos por todas as pessoas que fazem
eleito e definido por um coletivo escolar; ele reflete a sin- parte de uma instituição escolar, porque a escola não é
gularidade do grupo que o produziu, suas escolhas e es- uma estrutura pronta e acabada a ser perpetuada e repro-
pecificidades. duzida de geração em geração. Trata-se do INSTITUINTE.
Nas escolas inclusivas, a qualidade do ensino não se A escola cria, nas possibilidades abertas pelo INSTI-
confunde com o que é ministrado nas escolas-padrão, con- TUINTE, um espaço de realização pessoal e profissional que
sideradas como as que melhor conseguem expressar um confere à equipe escolar a possibilidade de definir o seu
ideal pedagógico inquestionável, medido e definido objeti- horário escolar, organizar projetos, módulos de estudo e
vamente e que se apresentam como modelo a ser seguido outros, conforme decisão colegiada.
e aplicado em qualquer contexto escolar. Assim, confere autonomia a toda equipe escolar, acre-
As escolas-padrão cabem na mesma lógica que define ditando no poder criativo e inovador dos que fazem e pen-
as escolas dos diferentes, em que as iniciativas para me- sam a educação.
lhorar o ensino continuam elegendo algumas escolas e va-
lorando-as positivamente, em detrimento de outras. Cada O Projeto Político Pedagógico, Autonomia e Gestão
escola é única e precisa ser, como os seus alunos, reconhe- Democrática
cida e valorizada nas suas diferenças. A constatação de que a realidade escolar é dinâmica e
depende de todos dá força e sentido à elaboração do PPP,
Mudanças na escola entendido não apenas como um mero documento exigido
Para atender a todos e atender melhor, a escola atual pela burocracia e administração escolar, mas como registro
tem de mudar, e a tarefa de mudar a escola exige trabalho de significados a serem outorgados ao processo de ensino
em muitas frentes. Cada escola, ao abraçar esse trabalho, e de aprendizagem, que demanda tomada de decisões e
terá de encontrar soluções próprias para os seus problemas. acompanhamento de ações consequentes.
As mudanças necessárias não acontecem por acaso e O PPP não pode ser um documento paralelo que não
diz respeito, que não atravessa o cotidiano escolar e fica
nem por Decreto, mas fazem parte da vontade política do
restrito à categoria de um arquivo ou de uma alegoria, de
coletivo da escola, explicitadas no seu Projeto Político Pe-
caráter residual. Ele altera a estrutura escolar e escrevê-lo e
dagógico – PPP e vividas a partir de uma gestão escolar
arquivá-lo nos registros da escola só serve para acomodar
democrática.
a consciência dos que não têm um verdadeiro compromis-
É ingenuidade pensar que situações isoladas são su-
so com uma escola de todos, por todos e para todos.
ficientes para definir a inclusão como opção de todos os
Nossa legislação educacional é clara no que toca à exi-
membros da escola e configurar o perfil da instituição.
gência de a escola ter o seu PPP; ela não pode se furtar ao
Não se desconsideram aqui os esforços de pessoas bem
compromisso assumido com a sociedade de formação e de
intencionadas, mas é preciso ficar claro que os desafios das
desenvolvimento do processo de educação, devidamente
mudanças devem ser assumidos e decididos pelo coletivo
planejado.
escolar. A exigência legal do PPP está expressa na LDBEN - Lei
A organização de uma sala de aula é atravessada por Nº. 9.394/96 que, em seu artigo 12, define, entre as atri-
decisões da escola que afetam os processos de ensino e de buições de uma escola, a tarefa de “[...] elaborar e executar
aprendizagem. Os horários e rotinas escolares não depen- sua proposta pedagógica”, deixando claro que ela precisa
dem apenas de uma única sala de aula; o uso dos espaços fundamentalmente saber o que quer e colocar em execu-
da escola para atividades a serem realizadas fora da classe ção esse querer, não ficando apenas nas promessas ou nas
precisa ser combinado e sistematizado para o bom apro- intenções expostas no papel.
veitamento de todos; as horas de estudo dos professores Ao sistematizar estas escolhas e decisões, o PPP, a par-
devem coincidir para que a formação continuada seja uma tir de um estudo da demanda da realidade escolar cria as
aprendizagem colaborativa; a organização do Atendimen- condições necessárias para a elaboração do planejamento
to Educacional Especializado - AEE não pode ser um mero e o desenvolvimento do trabalho da sua equipe e da ava-
apêndice na vida escolar ou da competência do professor liação processual das etapas e metas propostas.
que nele atua. Para Gadotti e Romão (1997), o Projeto Político Pe-
Um conjunto de normas, regras, atividades, rituais, dagógico deve ser entendido como um horizonte de
funções, diretrizes, orientações curriculares e metodológi- possibilidades para a escola. O Projeto imprime uma di-
cas, oriundo das diversas instâncias burocrático-legais do reção nos caminhos a serem percorridos pela escola. Ele
sistema educacional, constitui o arcabouço pedagógico e se propõe a responder a um feixe de indagações de seus
administrativo das escolas de uma rede de ensino. Trata-se membros, tais como: qual educação se quer e qual tipo de
do que está INSTITUÍDO e do que Libâneo e outros autores cidadão se deseja, para qual projeto de sociedade? O PPP
(2003) analisaram pormenorizadamente. Nesse INSTITUÍ- propõe uma organização que se funda no entendimento
DO, estão os parâmetros e diretrizes curriculares, as leis, os compartilhado dos professores, alunos e demais interes-
documentos das políticas, os regimentos e demais normas sados em educação.

90
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Todas as intenções da escola, reunidas no Projeto Polí- O salto da escola dos diferentes para a escola das di-
tico Pedagógico, conferem-lhe o caráter POLÍTICO, porque ferenças demanda conhecimento, determinação, decisão.
ele representa a escolha de prioridades de cidadania em As propostas de mudança variam e dependerão de
função das demandas sociais. O PPP ganha status PEDAGÓ- disposição, discussões, estudos, levantamento de dados
GICO ao organizar e sistematizar essas intenções em ações e iniciativas a serem compartilhadas pelos seus membros,
educativas alinhadas com as prioridades estabelecidas. enfim, de gestões democráticas das escolas, que favoreçam
O caráter coletivo e a necessidade de participação de essa mudança.
todos é inerente ao PPP, pois ele não se resume a um mero Muitas decisões precisam ser tomadas pelas escolas
plano ou projeto burocrático, que cumpre as exigências ao elaborarem seus Projetos Político Pedagógicos, entre
da lei ou do sistema de ensino. Trata-se de um documen- as quais destacamos algumas, que estão diretamente re-
to norteador das ações da escola que, ao mesmo tempo, lacionadas com as mudanças que se alinham aos propósi-
oportuniza um exercício reflexivo do processo para tomada tos da inclusão: fazer da aprendizagem o eixo das escolas,
de decisões no seu âmbito.
garantindo o tempo necessário para que todos possam
O professor, portanto, ao contribuir para a elaboração
aprender; reprovar a repetência; abrir espaço para que a
do PPP, bem como ao participar de sua execução no coti-
cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o
diano da escola, tem a oportunidade de exercitar um ensi-
espírito crítico sejam praticados por seus professores, ges-
no democrático, necessário para garantir acesso e perma-
tores, funcionários e alunos, pois essas são habilidades mí-
nência dos alunos nas escolas e para assegurar a inclusão,
o ensino de qualidade e a consideração das diferenças dos nimas para o exercício da verdadeira cidadania; valorizar
alunos nas salas de aula. Exercer esse papel como um d e formar continua mente o professor , para que ele possa
os mentores do PPP não é uma obrigação formal, mas o atualizar-se e ministrar um ensino de qualidade.
resultado de um envolvimento pessoal do professor. Nesse É frequente a escola seguir outros caminhos, adotando
sentido, vem antes a sua disposição de participar, porque práticas excludentes e paliativas, que as impedem de dar o
contribuir é reconhecer a importância de sua colaboração salto qualitativo que a inclusão demanda. Elas se apropriam
para que o projeto se execute. de soluções utilitárias, prontas para o uso, alheias à realida-
Embora a escola não seja independente de seu sistema de de cada instituição educacional. Essas práticas admitem:
de ensino, ela pode se articular e interagir com autonomia ensino individualizado para os alunos com deficiência e/ou
como parte desse sistema que a sustenta, tomando deci- problemas de aprendizagem; currículos adaptados; termi-
sões próprias relativas às particularidades de seu estabele- nalidade específica; métodos especiais para ensino de pes-
cimento de ensino e da sua comunidade. Entretanto, mes- soas com deficiência; avaliação diferenciada; categorização
mo outorgada por lei, a autonomia escolar é construída e diferenciação dos alunos; formação de turmas escolares
aos poucos e cotidianamente. Do ponto de vista cultural e buscando a homogeneização dos alunos.
educacional, encontram-se poucas experiências de cons- No nível da sala de aula e das práticas de ensino, a
trução da autonomia e do cultivo de hábitos democráticos. mobilização do professor e/ou de uma equipe escolar em
A democracia, frequentemente proclamada, mas nem torno de uma mudança educacional como a inclusão não
sempre vivenciada nas redes de ensino, tem no PPP a opor- acontece de modo semelhante em todas as escolas. Mes-
tunidade de ser exercida, e essa oportunidade não pode mo havendo um Projeto Político Pedagógico que oriente
ser perdida, para que consiga espalhar-se por toda a insti- as ações educativas da escola, há que existir uma entrega,
tuição. Gadotti e Romão (1997) manifestam suas posições uma disposição individual ou grupal de sua equipe de se
sobre a construção da democracia na escola e afirmam que expor a uma experiência educacional diferente das que es-
esse tipo de gestão constitui um passo relevante no apren- tão habituados a viver. Para que qualquer transformação
dizado da democracia.
ou mudança seja verdadeira, as pessoas têm de ser tocadas
Os professores constroem a democracia no cotidiano
pela experiência.
escolar por meio de pequenos detalhes da organização da
As mudanças não ocorrem pela mera adoção de prá-
prática pedagógica. Nesse sentido, fazem a diferença: o
ticas diferentes de ensinar. Elas dependem da elaboração
modo de trabalhar os conteúdos com os alunos; a forma
dos professores sobre o que lhes acontece no decorrer da
de sugerir a realização de atividades na sala de aula; o con-
trole disciplinar; a interação dos alunos nas tarefas escola- experiência educacional inclusiva que eles se propuseram a
res; a sistematização do AEE no contra-turno; a divisão do viver. O que vem dos livros e o que é transmitido aos pro-
horário; a forma de planejar com os alunos; a avaliação da fessores nem sempre penetram em suas práticas.
execução das atividades de forma interativa. A experiência a que nos referimos não está relacionada
Embora já tenhamos uma Constituição, estatutos, le- com o tempo dedicado ao magistério, ao saber acumula-
gislação, políticas educacionais e decretos que propõem e do pela repetição de uma mesma atividade utilitária, ins-
viabilizam novas alternativas para a melhoria do ensino nas trumental. Estamos nos referindo ao saber da experiência,
escolas, ainda atendemos a alunos em espaços escolares que é subjetivo, pessoal, relativo, adquirido nas ocasiões
semi ou totalmente segregados, tais como as classes espe- em que entendemos e atribuímos sentidos ao que nos
ciais, as turmas de aceleração, as escolas especiais, as aulas acontece, ao que nos passa, ao que nos sucede ao viver a
de reforço, entre outros. experiência (BONDÍA, 2002).

91
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O reconhecimento de que os alunos aprendem segun- Ao contrário do que se pensa e se faz, as práticas es-
do suas capacidades não surge de uma hora para a outra, colares inclusivas não implicam um ensino adaptado para
só porque as teorias assim afirmam. alguns alunos, mas sim um ensino diferente para todos, em
Acolher as diferenças terá sentido para o professor e que os alunos tenham condições de aprender, segundo suas
fará com que ele rompa com seus posicionamentos sobre próprias capacidades, sem discriminações e adaptações.
o desempenho escolar padronizado e homogêneo dos alu- A ideia do currículo adaptado está associada à exclusão
nos, se ele tiver percebido e compreendido por si mesmo na inclusão dos alunos que não conseguem acompanhar o
essas variações, ao se submeter a uma experiência que lhe progresso dos demais colegas na aprendizagem. Currícu-
perpassa a existência. O professor, então, desempenhará los adaptados e ensino adaptado negam a aprendizagem
o seu papel formador, que não se restringe a ensinar so- diferenciada e individualizada. O ensino escolar é coleti-
mente a uma parcela dos alunos que conseguem atingir o vo e deve ser o mesmo para todos, a partir de um único
desempenho exemplar esperado pela escola. Ele ensina a currículo. É o aluno que se adapta ao currículo, quando se
todos, indistintamente. admitem e se valorizam as diversas formas e os diferentes
Opor-se a inovações educacionais, resguardando-se níveis de conhecimento de cada um.
no despreparo para adotá-las, resistir e refutá-las simples- As propostas curriculares, quando contextualizadas,
mente, distancia o professor da possibilidade de se formar reconhecem e valorizam os alunos em suas peculiaridades
e de se transformar pela experiência. Oposições e contra- de etnia, de gênero, de cultura. Elas partem das vidas e
posições à inclusão incondicional são frequentes entre os experiências dos alunos e vão sendo tramadas em redes
professores e adiam projetos do ensino comum e especial de conhecimento, que superam a tão decantada sistema-
focados na inserção das diferenças nas escolas. tização do saber. O questionamento dessas peculiaridades
É nos bancos escolares que se aprende a viver entre os e a visão crítica do multiculturalismo trazem uma perspec-
nossos pares, a dividir as responsabilidades, a repartir ta- tiva para o entendimento das diferenças, a qual foge da
refas. Nesses ambientes, desenvolvem-se a cooperação e a tolerância e da aceitação, atitudes estas tão carregadas de
produção em grupo com base nas diferenças e talentos de preconceito e desigualdade.
cada um e na valorização da contribuição individual para A garantia de acesso, participação e aprendizagem de
a consecução de objetivos comuns de um mesmo grupo. todos os alunos nas escolas contribui para a construção de
A interação entre colegas de turma, a aprendizagem uma nova cultura de valorização das diferenças. Este fascí-
colaborativa, a solidariedade entre alunos e entre estes e o culo destacou em seus tópicos a importância de se rever a
professor devem ser estimuladas. Os professores, quando organização pedagógica e administrativa das escolas para
buscam obter o apoio dos alunos e propõem trabalhos di- que estas possam tornar-se espaços inclusivos.
versificados e em grupo, desenvolvem formas de compar- Do ponto de vista da escola comum, ressaltou-se o
tilhamento e difusão dos conhecimentos nas salas de aula. papel do Projeto Político Pedagógico como instrumento
A formação de turmas tidas como homogêneas é um orientador desses espaços e a participação e comprome-
dos argumentos de defesa dos professores, gestores e es- timento dos professores na elaboração e execução desse
pecialistas em favor da qualidade do ensino, que precisa Projeto. Quanto à Educação Especial, reiteramos a neces-
ser refutado, porque se trata de uma ilusão que compro- sidade de esta modalidade de ensino ser parte integrante
mete o ensino e exclui alunos. do PPP, para que seus serviços possam ser implementados
A avaliação de caráter classificatório, por meio de no- na perspectiva da educação inclusiva, com prevê a Política
tas, provas e outros instrumentos similares, mantém a re- Nacional da Educação Especial.
petência e a exclusão nas escolas. O entrelaçamento dos serviços de Educação Especial,
A avaliação contínua e qualitativa da aprendizagem, entre os quais o Atendimento Educacional Especializado,
com a participação do aluno, tendo, inclusive, a intenção conjuga igualdade e diferenças como valores indissociáveis
de avaliar o ensino oferecido e torná-lo cada vez mais ade- e como condição de acolher a todos nas escolas.
quado à aprendizagem de todos os alunos conduz a outros As ações para consolidação do AEE exigem firmeza e
resultados. envolvimento de todos os que estão se empenhando para
A adoção desse modo de avaliar com base na qualida- que as escolas se tornem ambientes educacionais plena-
de do ensino e da aprendizagem já diminuiria substancial- mente inclusivos.
mente o número de alunos que são indevidamente avalia- Nessa caminhada em favor de uma escola para todos,
dos e categorizados como deficientes nas escolas comuns. a educação especial brasileira tem tomado decisões e ini-
Os professores em geral concordam com novas alter- ciativas que surpreendem pela ousadia de suas propostas e
nativas de se avaliar os processos de ensino e de aprendi- coerência de seus posicionamentos com o que nossa Cons-
zagem e admitem que as turmas são naturalmente hete- tituição de 1988 prescreve como direito à educação.
rogêneas. A possibilidade de inventar o cotidiano (CERTEAU,
Sentem-se, contudo, inseguros diante da possibilidade 1994) tem sido a saída adotada pelos que colocam sua
de fazer uso dessas alternativas em sala de aula e inovar as capacidade criadora para inovar, romper velhos acordos,
rotinas de trabalho, rompendo com a organização pedagó- resistências e lugares eternizados na educação. É a de-
gica pré-estabelecida. terminação e um forte compromisso com a melhoria da

92
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

qualidade da educação brasileira que está subjacente a to- Ao refletir sobre a abrangência do sentido e do significa-
das essas mudanças que estão propostas pela Política atual do do processo de Educação inclusiva, estamos considerando
da Educação Especial.32 a diversidade de aprendizes e seu direito à equidade. Trata-
-se de equiparar oportunidades, garantindo-se a todos - in-
Desafios na educação inclusiva no cenário da educação clusive às pessoas em situação de deficiência e aos de altas
brasileira habilidades/superdotados, o direito de aprender a aprender,
A educação brasileira tem diante de si o desafio de aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver. (CAR-
possibilitar o acesso e a permanência dos alunos com ne- VALHO, 2005).
cessidades educacionais especiais na escola, na perspectiva No Brasil, a regulamentação mais recente que norteia a
inclusiva. No entanto, compreender quais são as políticas organização do sistema educacional é o Plano Nacional de
públicas de educação inclusiva em documentos legais é Educação (PNE 2011-2020). Esse documento, entre outras
fundamental para identificar os avanços e recuos presentes metas e propostas inclusivas, estabelece a nova função da
no sistema educativo. Educação especial como modalidade de ensino que perpas-
O esforço pela inclusão social e escolar de pessoas com sa todos os segmentos da escolarização (da Educação Infan-
necessidades especiais no Brasil é a resposta para uma si- til ao ensino superior); realiza o atendimento educacional
tuação que perpetuava a segregação dessas pessoas e cer- especializado (AEE); disponibiliza os serviços e recursos pró-
ceava o seu pleno desenvolvimento. Até o início do século prios do AEE e orienta os alunos e seus professores quanto à
21, o sistema educacional brasileiro abrigava dois tipos de sua utilização nas turmas comuns do ensino regular.
serviços: a escola regular e a escola especial - ou o alu- O PNE considera público alvo da Educação especial na
no frequentava uma, ou a outra. Na última década, nosso perspectiva da Educação inclusiva, educandos com defi-
sistema escolar modificou-se com a proposta inclusiva e ciência (intelectual, física, auditiva, visual e múltipla), trans-
um único tipo de escola foi adotado: a regular, que acolhe torno global do desenvolvimento (TGD) e altas habilidades.
todos os alunos, apresenta meios e recursos adequados Se o aluno apresentar necessidade específica, decor-
e oferece apoio àqueles que encontram barreiras para a rente de suas características ou condições, poderá reque-
rer, além dos princípios comuns da Educação na diversi-
aprendizagem.
dade, recursos diferenciados identificados como necessi-
A Educação inclusiva compreende a Educação especial
dades educacionais especiais (NEE). O estudante poderá
dentro da escola regular e transforma a escola em um es-
beneficiar-se dos apoios de caráter especializado, como o
paço para todos. Ela favorece a diversidade na medida em
ensino de linguagens e códigos específicos de comunica-
que considera que todos os alunos podem ter necessida-
ção e sinalização, no caso da deficiência visual e auditiva;
des especiais em algum momento de sua vida escolar.
mediação para o desenvolvimento de estratégias de pen-
Há, entretanto, necessidades que interferem de manei-
samento, no caso da deficiência intelectual; adaptações do
ra significativa no processo de aprendizagem e que exi-
material e do ambiente físico, no caso da deficiência física;
gem uma atitude educativa específica da escola como, por
estratégias diferenciadas para adaptação e regulação do
exemplo, a utilização de recursos e apoio especializados comportamento, no caso do transtorno global; ampliação
para garantir a aprendizagem de todos os alunos. dos recursos educacionais e/ou aceleração de conteúdos
A Educação é um direito de todos e deve ser orientada para altas habilidades.
no sentido do pleno desenvolvimento e do fortalecimen- A Educação inclusiva tem sido um caminho importante
to da personalidade. O respeito aos direitos e liberdades para abranger a diversidade mediante a construção de uma
humanas, primeiro passo para a construção da cidadania, escola que ofereça uma proposta ao grupo (como um todo)
deve ser incentivado. ao mesmo tempo em que atenda às necessidades de cada
Educação inclusiva, portanto, significa educar todas as um, principalmente àqueles que correm risco de exclusão
crianças em um mesmo contexto escolar. A opção por este em termos de aprendizagem e participação na sala de aula.
tipo de Educação não significa negar as dificuldades dos Além de ser um direito, a Educação inclusiva é uma res-
estudantes. Pelo contrário. Com a inclusão, as diferenças posta inteligente às demandas do mundo contemporâneo.
não são vistas como problemas, mas como diversidade. É Incentiva uma pedagogia não homogeneizadora e desenvol-
essa variedade, a partir da realidade social, que pode am- ve competências interpessoais. A sala de aula deveria espe-
pliar a visão de mundo e desenvolver oportunidades de lhar a diversidade humana, não escondê-la. Claro que isso
convivência a todas as crianças. gera novas tensões e conflitos, mas também estimula as ha-
Preservar a diversidade apresentada na escola, encon- bilidades morais para a convivência democrática. O resulta-
trada na realidade social, representa oportunidade para o do final, desfocado pela miopia de alguns, é uma Educação
atendimento das necessidades educacionais com ênfase nas melhor para todos. (MENDES, 2012).
competências, capacidades e potencialidades do educando. As barreiras que podem impedir o acesso de alguns
alunos ao ensino e à convivência estão relacionadas a di-
32 Fonte: Texto adaptado de Edilene Aparecida Ropoli/Maria versos componentes e dimensões da escolarização. Ocor-
Teresa Eglér Mantoan/Maria Terezinha da Consolação Teixeira dos San-
tos/Rosângela Machado/ Maria Terezinha da Consolação Teixeira dos
rem, também, impedimentos na ação dos educadores. Ve-
Santos jamos os principais pontos revelados na experiência com
www.webartigos.com educadores no exercício da Educação inclusiva, para todos.

93
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Educadores reconhecem, cada vez mais, a diversidade flexibilizações e/ou adequações da prática pedagógica de-
humana e as diferenças individuais que compõem seu gru- verão estar a serviço de uma única premissa: diferenciar os
po de alunos e se deparam com a urgência de transformar meios para igualar os direitos, principalmente o direito à
o sistema educacional e garantir um ensino de qualidade participação, ao convívio.
para todos os estudantes. Não basta que a escola receba a O desafio, agora, é avançar para uma maior valorização
matrícula de alunos com necessidades educacionais espe- da diversidade sem ignorar o comum entre os seres huma-
ciais, é preciso que ofereça condições para a operacionali- nos. Destacar muito o que nos diferencia pode conduzir à
zação desse projeto pedagógico inclusivo. A inclusão deve intolerância, à exclusão ou a posturas fundamentalistas que
garantir a todas as crianças e jovens o acesso à aprendiza- limitem o desenvolvimento das pessoas e das sociedades,
gem por meio de todas as possibilidades de desenvolvi- ou, que justifiquem, por exemplo, a elaboração de currículos
mento que a escolarização oferece. paralelos para as diferentes culturas, ou para pessoas com
As mudanças são imprescindíveis, dentre elas a rees- necessidades educacionais especiais. (BLANCO, 2009).
truturação física, com a eliminação das barreiras arquitetô- Além disso, para que o projeto inclusivo seja colo-
nicas; a introdução de recursos e de tecnologias assistivas; cado em ação, há necessidade de uma atitude positiva e
a oferta de profissionais do ensino especial, ainda em nú- disponibilidade do professor para que ele possa criar uma
mero insuficiente. Além da compreensão e incorporação atmosfera acolhedora na classe. A sala de aula afirma ou
desses serviços na escola regular são necessárias alternati- nega o sucesso ou a eficácia da inclusão escolar, mas isso
vas relativas à organização, ao planejamento e à avaliação não quer dizer que a responsabilidade seja só do professor.
do ensino. O professor não pode estar sozinho, deverá ter uma rede
Outro ponto importante refere-se à formação dos pro- de apoio, na escola e fora dela, para viabilizar o processo
fessores para a inclusão. A transformação de paradigma na inclusivo.
Educação exige professores preparados para a nova prática, Para crianças com necessidades educacionais especiais
de modo que possam atender também às necessidades do uma rede contínua de apoio deveria ser providenciada, com
ensino inclusivo. O saber está sendo construído à medida variação desde a ajuda mínima na classe regular até progra-
mas adicionais de apoio à aprendizagem dentro da escola e
que as experiências vão acumulando-se e as práticas ante-
expandindo, conforme necessário, à provisão de assistência
riores vão sendo transformadas. Por isso, a formação con-
dada por professores especializados e pessoal de apoio exter-
tinuada tem um papel fundamental na prática profissional.
no. (Declaração de Salamanca, 1994).
 A inclusão de pessoas com necessidades especiais faz
Os sistemas de apoio começam na própria escola, na
parte do paradigma de uma sociedade democrática, com-
equipe e na gestão escolar. O aluno com necessidades
prometida com o respeito aos cidadãos e à cidadania. Esse
especiais não é visto como responsabilidade unicamente
paradigma, na escola, apresenta-se no projeto pedagógico
do professor, mas de todos os participantes do processo
que norteará sua ação, explicitará sua política educacional,
educacional. A direção e a coordenação pedagógica de-
seu compromisso com a formação dos alunos, assim como,
vem organizar momentos para que os professores possam
com ações que favoreçam a inclusão social. manifestar suas dúvidas e angústias. Ao legitimar as ne-
É o projeto pedagógico que orienta as atividades es- cessidades dos docentes, a equipe gestora pode organizar
colares revelando a concepção da escola e as intenções da espaços para o acompanhamento dos alunos; compartilhar
equipe de educadores. Com base no projeto pedagógico a entre a equipe os relatos das condições de aprendizagens,
escola organiza seu trabalho; garante apoio administrativo, das situações da sala de aula e discutir estratégias ou pos-
técnico e científico às necessidades da Educação inclusi- sibilidades para o enfrentamento dos desafios. Essas ações
va; planeja suas ações; possibilita a existência de propostas produzem assuntos para estudo e pesquisa que colaboram
curriculares diversificadas e abertas; flexibiliza seu funcio- para a formação continuada dos educadores.
namento; atende à diversidade do alunado; estabelece re- A família compõe a rede de apoio como a instituição
des de apoio, que proporcionam a ação de profissionais primeira e significativamente importante para a escolariza-
especializados, para favorecer o processo educacional. ção dos alunos. É a fonte de informações para o professor
É na sala de aula que acontece a concretização do pro- sobre as necessidades específicas da criança. É essencial
jeto pedagógico - elaborado nos diversos níveis do sistema que se estabeleça uma relação de confiança e cooperação
educacional. Vários fatores podem influenciar a dinâmica entre a escola e a família, pois esse vínculo favorecerá o
da sala de aula e a eficácia do processo de ensino e apren- desenvolvimento da criança.
dizagem. Planejamentos que contemplem regulações or- Profissionais da área de saúde que trabalham com o
ganizativas diversas, com possibilidades de adequações ou aluno, como fisioterapeutas, psicopedagogos, psicólogos,
flexibilizações têm sido uma das alternativas mais discu- fonoaudiólogos ou médicos, também compõem a rede.
tidas como opção para o rompimento com estratégias e Esses profissionais poderão esclarecer as necessidades de
práticas limitadas e limitantes. crianças e jovens e sugerir, ao professor, alternativas para o
Para estruturar as flexibilizações na escola inclusiva é atendimento dessas necessidades.
preciso que se reflita sobre os possíveis ajustes relativos Na perspectiva da Educação inclusiva, os apoios cen-
à organização didática. Qualquer adaptação não poderá trais reúnem os serviços da Educação especial e o Atendi-
constituir um plano paralelo, segregado ou excludente. As mento Educacional Especializado (AEE). São esses os novos

94
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

recursos que precisam ser incorporados à escola. O aluno Prática de Ensino/Aprendizagem/Conhecimento


tem direito de frequentar o AEE no período oposto às au- Quando entendida na perspectiva do senso comum,
las. O sistema público tem organizado salas multifuncio- a relação ensino-aprendizagem é linear; assim, quando
nais ou salas de apoio, na própria escola ou em instituições há ensino, deve necessariamente haver aprendizagem.
conveniadas, com o objetivo de oferecer recursos de aces- Ao inverso, quando não houve aprendizagem, não
sibilidade e estratégias para eliminar as barreiras, favore- houve ensino. Desse modo, o ensino é subordinado à
cendo a plena participação social e o desenvolvimento da
aprendizagem. Essa subordinação é expressa em con-
aprendizagem.
cepções que compreendem o professor como facilita-
Art. 1º. Para a implementação do Decreto no 6.571/2008,
os sistemas de ensino devem matricular os alunos com defi-
dor da aprendizagem, ou ainda como mediador do co-
ciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas ha- nhecimento.
bilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regu- Aqui a proposta é discutir referências teóricas e
lar e no Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofer- metodológicas que possam revelar uma concepção não
tado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de linear da relação em foco, bem como criticar as concep-
Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou ções de professor facilitador e professor mediador.
de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas A mediação no campo educacional é geralmente
sem fins lucrativos; Art. 2º. O AEE tem como função com- considerada como o produto de uma relação entre dois
plementar ou suplementar a formação do aluno por meio termos distintos que, por meio dela podem ser homo-
da disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e geneizados. Essa homogeneização elimina a diferença
estratégias que eliminem as barreiras para sua plena parti- entre eles e, por conseguinte, a possibilidade de conflito
cipação na sociedade e desenvolvimento de sua aprendiza- entre ambos. Portanto, quando se compreende a me-
gem; Parágrafo Único. Para fins destas Diretrizes, conside-
diação como o resultado, como um produto, a neces-
ram-se recursos de acessibilidade na Educação aqueles que
sária relação entre dois termos se reduz à sua soma, o
asseguram condições de acesso ao currículo dos alunos com
deficiência ou mobilidade reduzida, promovendo a utiliza-
que resulta na sua anulação mútua, levando-os ao equi-
ção dos materiais didáticos e pedagógicos, dos espaços, dos líbrio. Essa ideia concebe a mediação como o resultado
mobiliários e equipamentos, dos sistemas de comunicação da aproximação entre dois termos que, embora distin-
e informação, dos transportes e dos demais serviços. (CNB/ tos no início, quando totalmente separados, tendem a
CNE, 2009). igualar-se à medida que se aproximam um do outro.
Ainda que não apresente números consideráveis, a Em estudos desse contexto discute-se o conceito
inclusão tem sido incorporada e revela ações que podem de mediação local, indicando que mediar implica solu-
ser consideradas práticas para apoiar o professor. Ter um cionar conflitos por meio de ações educativas. Assim, a
segundo professor na sala de aula, é um exemplo, seja pre- mediação restringe-se a uma ação pragmática, circuns-
sente durante todas as aulas ou em alguns momentos, nas crita a uma situação de conflito. Este entendimento da
mais diversas modalidades: intérprete, apoio, monitor ou mediação não é muito distante daquele em que ela é
auxiliar. Esse professor poderá possuir formação específi- compreendida na situação da sala de aula.
ca, básica ou poderá ser um estagiário. A participação do
A mediação na sala de aula é também pragmática,
professor do AEE poderá ocorrer na elaboração do plane-
pois pretende que o aluno aprenda de modo imediato.
jamento e no suporte quanto à compreensão das condi-
ções de aprendizagem dos alunos, como forma de auxiliar
Nos dois casos, em que mediar é agir de modo prag-
a equipe pedagógica. mático, todo conflito pode ser “solucionado”, e o aluno
Outra atividade evidenciada pela prática inclusiva para pode “aprender”.
favorecer o educador é a adoção da práxis - no ensino, Para compreendermos a mediação na sala de aula,
nas interações, no espaço e no tempo - que relacione os é preciso, em primeiro lugar, estabelecermos que o es-
diferentes conteúdos às diversas atividades presentes no tudante está sempre no plano do imediato, e o profes-
trabalho pedagógico. São esses procedimentos que irão sor está, ou deveria estar, no plano do mediato. Assim,
promover aos alunos a possibilidade de reorganização do entre eles se estabelece uma mediação que visa, como
conhecimento, à medida que são respeitados os diferentes já o dissemos, a superação do imediato no mediato. Em
estilos e ritmos de aprendizagem. outras palavras, o estudante deve superar a sua com-
Vale ressaltar que a Educação inclusiva, como prática preensão imediata e ascender a outra que é mediata. E
em construção, está em fase de implementação. São mui- isso só pode ocorrer pela ação do professor que medeia
tos os desafios a serem enfrentados, mas as iniciativas e as
com o aluno, estabelecendo com ele uma tensão que
alternativas realizadas pelos educadores são fundamentais.
implica negar o seu cotidiano. Por outro lado, o aluno
As experiências, agora, centralizam os esforços para além
da convivência, para as possibilidades de participação e de
tentará trazer o professor para o cotidiano vivido por
aprendizagem efetiva de todos os alunos.33 ele, aluno, negando, assim, o conhecimento veiculado
pelo professor. Nessa luta de contrários – professor e
33 Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/ Texto adaptado de
Daniela Alonso aluno, conhecimento sistematizado pela humanidade e

95
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

experiência cotidiana – é que se dá a mediação; e ela será sempre necessário que ela [criança] se fatigue a
ocorre nos dois sentidos, tanto do professor para o alu- fim de aprender e que se obrigue a privações e limitações
no quanto do a É uma luta de contrários. de movimento físico isto é que se submeta a um tirocínio
Esse modo de compreender a mediação não aceita a psicofísico. Deve-se convencer a muita gente que o es-
ideia do professor mediador do conhecimento, tampou- tudo é também um trabalho e muito fatigante com um
co a noção de professor facilitador da aprendizagem. tirocínio particular próprio, não só muscular-nervoso mas
Essas duas acepções são equivocadas, porque, em intelectual: é um processo de adaptação, é um hábito ad-
primeiro lugar, o professor não é o único mediador, pois quirido com esforço, aborrecimento e mesmo sofrimento.
o aluno também medeia, e, em segundo lugar, a media- (Gramsci, 1985, p. 89)
ção não se estabelece com o conhecimento e sim entre Como assinala Gramsci, a aprendizagem depende
o aluno e o professor. Trata-se de uma automediação no do esforço pessoal de cada estudante. É claro que o
segundo sentido atribuído por Mészáros; ou seja, a me- professor sempre poderá intervir, de modo direto, neste
diação entre o homem e os outros homens: aluno para processo, auxiliando o aluno. Ele deve esforçar-se para
o professor. Em outros termos, a mediação, na escola, que os estudantes aprendam, mas não pode minimizar
é um processo que ocorre a sala de aula e promove a nem esconder as dificuldades inerentes à aprendizagem.
superação do imediato no mediato por meio de uma Quando se compreende a relação ensino-apren-
tensão dialética entre pólos opostos. dizagem na sala de aula como mediação, o ensino
e aprendizagem são opostos entre si e se relacionam
A relação entre o homem e a natureza é ‘automedia- por meio de uma tensão dialética. Desse modo, esses
dora’ num duplo sentido. termos, apesar de negarem-se mutuamente, se com-
Primeiro, porque é a natureza que propicia a me- pletam, mas, como já o dissemos, essa unidade não se
diação entre si mesma e o homem; segundo, porque a estabelece de modo linear.
própria atividade mediadora é apenas um atributo do Neste artigo, conceituaremos primeiro o ensino e,
homem, localizado numa parte específica da natureza. pela sua negação, conceituaremos aprendizagem. Sa-
Assim, na atividade produtiva, sob o primeiro desses dois bemos da dificuldade de conceituar esses dois termos,
pois de modo geral os estudiosos da área de educação
aspectos ontológicos a natureza faz a mediação entre si
e os professores, talvez por influência das pedagogias
mesma e a natureza; e, sob o segundo aspecto ontológico
contemporâneas, não o fazem; pois preocupam-se qua-
- em virtude do fato de ser a atividade produtiva ineren-
se exclusivamente com o “como ensinar”, ou mais preci-
temente social - o homem faz a mediação ente si mesmo
samente como facilitar a aprendizagem dos alunos.
e os demais homens. (Mészáros, 1981, p.77-78)
A ideia principal que informa o nosso conceito de
ensino é a de que ele expressa a relação que o professor
Sendo a mediação na sala de aula uma automedia-
estabelece com o conhecimento produzido e sistema-
ção, não podemos abrir mão da relação direta entre
tizado pela humanidade. Assim, o ensino constitui-se
professor e aluno. Desse modo, não podemos substituí-
de três atividades distintas a serem desenvolvidas pelo
-la por falsos mediadores, como por exemplo, a exibição
professor.
de filmes quando a temática não corresponde àquela A primeira consiste em, diante de um tema, selecio-
tratada pelo professor, ou a execução aleatório de ati- nar o que deve ser apresentado aos alunos; por exem-
vidades de ensino. Os professores que se utilizam com plo, no tema “Revolução Francesa”, próprio da História,
frequência desses recursos nutrem a esperança de que selecionar o que é mais importante ensinar aos alunos
essas práticas sejam capazes de estabelecer mediações da 5ª série (nomenclatura brasileira). Já o professor do
que eles, os professores, talvez não se sintam seguros 1º ano do Ensino Médio deve defrontar-se com a mes-
para desenvolver. Alguns professores precisam ser lem- ma pergunta; a mesma situação se coloca ao professor
brados de que sala de aula não é sala de cinema nem universitário encarregado de abordá-lo. Dessa forma,
oficina de terapia ocupacional. o docente deve preocupar-se em compatibilizar a se-
Os professores que se utilizam desses artifícios o fa- leção do conhecimento a ser ensinado com a possibili-
zem muitas vezes no intuito de facilitar a aprendizagem; dade de aprendizagem dos alunos. Nos dias de hoje, é
porém, sendo a relação entre o ensino e a aprendiza- bastante comum que a seleção seja abrangente; e isso
gem uma luta de contrários, não há como facilitá-la. Ao pode levar os professores a apresentarem aos seus alu-
inverso, o professor deve dificultar a vida cotidiana do nos informações supérfluas, que, quando confundidas
aluno inserindo nela o conhecimento, e, dessa forma, com conhecimento, não lhes permitem fazer as sínteses
negando-a. Pois, na vida cotidiana não há conhecimen- necessárias para a superação do cotidiano, produzindo
to e sim experiência. Desse modo, não há como facilitar neles uma “erudição balofa” que pode ao contrário en-
o que é difícil. Aprender é difícil. cerrá-los na vida cotidiana. Esse equívoco ocorre, por

96
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

exemplo, quando o professor de História, ao abordar a Se o ensino é a relação que o professor estabelece
Revolução francesa, preocupa-se com detalhes da vida com o conhecimento, a aprendizagem ao contrário é a
privada de Maria Antonieta ou com a moda ditada por relação que o estudante estabelece com o conhecimen-
Luís XV. Ainda exemplificando, o mesmo pode ocorrer to e, portanto, é nela que a mediação se efetiva: pela
com o professor de Literatura que expõe aos alunos os superação do imediato no mediato.
períodos literários e seus principais expoentes sem apre- Não é possível discutir a aprendizagem como fize-
sentar as relações entre os autores, bem como entre os mos com o ensino, porque ela é de cunho singular e,
períodos literários, ocultando assim a historicidade ine- dessa forma, ocorre de modo diverso em cada estudan-
rente à literatura. te. A discussão da aprendizagem na perspectiva deste
A erudição balofa pode também estar presente nas texto, ou seja, em oposição ao ensino, ainda deve ser
disciplinas ligadas às ciências naturais; ela tem levado os elaborada e, certamente, não poderá sê-lo pela psico-
professores a acreditar que quanto maior a quantidade logia, mas sim pela filosofia. A única possibilidade, ain-
de informações mais os alunos sabem. da que remota no âmbito da psicologia, estaria no de-
A segunda atividade desenvolvida pelo professor é senvolvimento do pensamento de Vigotski, desde que
a organização, ou seja, diante da seleção feita a partir de compreendido numa perspectiva filosófica, pois a psi-
um tema é preciso organizar esta seleção para apresen- cologia como ciência tem por objeto o comportamento,
tá-la aos alunos. Desde o momento em que fazemos a e aprender não é o mesmo que comportar-se, em que
seleção já não podemos falar mais em temas; devemos pese o esforço das pedagogias contemporâneas em
preocupar-nos com os conceitos que os constituem. desenvolver esta associação. Do nosso ponto de vista,
Agora o que o professor deve fazer é organizar os con- o que a psicologia, no seu estado atual, pode fazer é
ceitos e as relações entre eles. Esse processo, de acordo controlar a aprendizagem, o que é diferente de com-
com Lefebvre (1983), implica dois movimentos: a retros- preendê-la.
pecção e a prospecção. Quando a relação ensino-aprendizagem é tomada
A retrospecção permite que o estudante compreen- na perspectiva da mediação no seu sentido original, ao
da o processo de formação e desenvolvimento do con- mesmo tempo em que não há uma relação direta entre
ensino e aprendizagem, não há também uma desvincu-
ceito abordado e a prospecção possibilita o entendi-
lação desses dois processos. Ou seja, para haver apren-
mento do estado atual do conceito a partir das relações
dizagem, necessariamente deve haver ensino.
que o conceito estudado estabelece com outros, tanto
Porém, eles não ocorrem de modo simultâneo. Des-
com aqueles que o corroboram quanto com os que a
sa forma, o professor pode desenvolver o ensino – se-
ele se opõem. A prospecção do conceito permite o esta-
lecionar, organizar e transmitir o conhecimento – e o
belecimento de relações interdisciplinares, a que temos
aluno pode não aprender. Para que o aluno aprenda,
chamado de interdisciplinaridade conceitual para distin-
ele precisa desenvolver sua síntese singular do conhe-
gui-la daquela que é corrente na escola, a interdiscipli-
cimento transmitido, e isso se dá pelo confronto, por
naridade temática. Não podemos ensinar por meio do
meio da negação mútua, desse conhecimento com a
tema, devemos fazê-lo por meio do conceito. Evitamos
vida cotidiana do aluno. Como cada aluno tem um coti-
o uso da expressão conteúdo de ensino em virtude da diano, e o conhecimento é aprendido por meio da sín-
sua imprecisão. Quando a organização do ensino é ba- tese já explicitada, o conhecimento não pode ser apren-
seada nos processos de retrospecção e prospecção de dido igualmente por todos os alunos, embora aquele
conceitos, o fundamental são as relações que se estabe- transmitido pelo professor seja único. Assim, a relação
lecem nos dois processos. No primeiro, elas dizem res- ensino-aprendizagem na perspectiva aqui apresentada
peito ao desenvolvimento do conceito, à oposição entre expressa o vínculo dialético entre unidade e diversida-
a sua origem e o estado atual, no segundo, elas tratam de. Por isso, o conhecimento transmitido pelo professor
dos vínculos entre conceitos. Assim, podemos afirmar pode ser uno e aquele aprendido pelo aluno pode ser
que ensinar é fazer relações. Por isso, ensinar é tão difícil diverso. A unidade e a diversidade são opostos que se
quanto aprender. completam, ou e é próprio do humano.34
A terceira tarefa do professor é transmitir aos alunos
aquilo que foi previamente selecionado e organizado. Conhecimento na Escola
Dessa forma, a transmissão é a única etapa do proces- Parto do entendimento de que a escola não é mera
so de ensino que ocorre efetivamente na sala de aula. reprodutora de programas oficiais, como as pesquisas
Em que pese o preconceito sobre a palavra transmissão, baseadas no cotidiano escolar assim o demonstraram
não abrimos mão dela, porque é isso o que o professor - Espeleta & Rockwell (1986), Penin (1989). Há diversas
faz na sala de aula. É na transmissão do conhecimento
34 Fonte: Revista Lusófona de Educação - Texto adaptado de
que ocorrem as mediações entre professores e alunos. José Luís Vieira de Almeida e Teresa Maria Grubisich

97
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

resistências e transformações a serem consideradas. A classes sociais dominantes. Por exemplo, quando a bur-
cotidianidade, para Ciampi (1992), só tem sentido autô- guesia ascendeu ao poder no século XVIII, acabou pro-
nomo no processo histórico. A vida cotidiana, portanto, pagando seu ideal de sociedade para “os quatro cantos
é carregada de historicidade. do mundo”. Daí a necessidade de discutir os conceitos
Ao considerar essa premissa, pode-se dizer que a de cidadania, de democracia e outros conceitos tão pre-
escola possui uma autonomia relativa. Segundo Dubet sentes nas propostas educacionais.
(2001), não é uma caixa preta neutra como a teoria da Ainda em relação a essa questão, pode-se pergun-
reprodução havia denominado. As contradições do co- tar: até que ponto as condições de trabalho contribuem
tidiano revelam uma vivacidade que não pode ser ig- para o desenvolvimento de uma prática pedagógica que
norada. Se por um lado há conformismo, de outro há possibilite a formação de um cidadão com instrumentos
resistências, acomodações e transformações. para compreender e cooperar na transformação social?
O poder central e a sociedade esperam e tentam Como superar uma prática que não se limite a reprodu-
definir papéis para a organização escolar. Nem sempre zir sugestões de livros didáticos?
As precárias condições de trabalho no magistério do
o que é proclamado se realiza por completo. Na maio-
Ensino Básico impõem alguns limites a uma prática que
ria das vezes, os profissionais de ensino não se sentem
corresponda a tantos anseios. O desprestígio social, as
representados em mudanças que são propostas pelo
longas jornadas de trabalho, a falta de vínculo devido à
governo. Daí os embates, revelados ou não, entre o pro-
correria de uma escola à outra e os salários aviltantes
clamado e o realizado. são alguns dos elementos que dificultam o trabalho do-
Nesse sentido verifica-se que entre os diversos cente no atual sistema escolar do país.
objetivos proclamados nas introduções das propos- Mesmo assim, muitos professores mobilizam os
tas curriculares e nos projetos pedagógicos da maioria seus saberes para garantir um conhecimento significa-
das escolas, aparece sempre o de formar um ‘cidadão tivo. Acreditam e se empenham na busca de novas es-
crítico’. “Uma das tarefas da escola é a de formar um tratégias e na construção dos espaços que garanta um
cidadão-trabalhador capaz de interferir criticamente na ensino de qualidade.
realidade para transformá-la” - Libâneo (1998, p. 18). Em Diante disso, cabe outra reflexão: como as escolas
que medida isso está sendo realizado? E, ainda, qual é o estão organizando os seus espaços e disponibilizando
conceito de cidadania que está sendo proposto? recursos para facilitar o trabalho do professor? Essa
Vou além nessa discussão, e recorro a Charlot para preocupação é pertinente para quem quer garantir um
lembrar de que é preciso explicitar a relação entre ho- ensino que seja ‘significativo’ para o aluno. Em relação
mem e a sociedade que se quer projetar. Não se pode à organização do espaço escolar, Abdalla constata que:
esquecer que o homem é socialmente determinado. “quando a escola permite relações mais flexíveis e menos
Querer ocultar as opções de classe revela, simplesmen- autoritárias, o professor aprende a explorar possibilida-
te, uma tentativa de maquiagem ideológica a favor dos des, trocar experiências com seus pares, trabalhar com o
grupos dominantes. “(...) a escolha pedagógica de um coletivo” (2002, p. 7).
tipo de homem é inevitavelmente, como já dissemos, Dessa forma, cada profissional precisa ter o compro-
uma escolha de classe” - (Charlot, 1979, p. 276). misso e a responsabilidade para desenvolver seu traba-
Dessa forma, pode-se dizer que se faz necessário lho. Ao mesmo tempo em que pode ser cobrado, preci-
explicitar o projeto de sociedade do país. Afinal, qual é sa ser estimulado a colocar em prática novas estratégias
o papel que a escola deve ter na formação dos alunos? e a refletir sobre os conteúdos que “devem” ser traba-
Retomando Charlot, diria que não é possível pensar em lhados. Na medida em que as regras estiverem claras, o
reformas para a educação escolar sem considerar essas ambiente estará mais propenso ao desenvolvimento de
questões: “Educar a criança, sem saber o que se quer que um trabalho pedagógico consistente.
O saber escolar pode ter uma importância funda-
ela se torne, é abandoná-la ao acaso das influências con-
mental para a formação dos alunos e, consequentemen-
traditórias, isto é, de fato, submetê-la às influências do-
te, para a constituição da sociedade, mas é preciso colo-
minantes da classe dominante” - (Charlot, 1979, p. 265).
cá-lo dentro da realidade social, mostrar que esse saber
É preciso considerar esse dado e não fazer reformas
é uma realização humana e social. Só assim a criança
educacionais calcadas em idéias metafísicas sobre a na- terá uma melhor compreensão e uma ação mais conse-
tureza humana. Não é possível negar a historicidade do quente sobre o mundo.
homem e o fato de que a sociedade capitalista está divi- “O saber só é cultural na medida em que aparece
dida em classes. Pensar o homem como generalidade é para a criança como criação humana e social. Isso quer
retirar a sua essência e omitir a sua concreticidade. dizer que o saber não poderia ser ensinado sem que, ao
Assim, pode-se dizer que a proclamação de valo- mesmo tempo, se ressaltassem sua significação huma-
res culturais universais para ser trabalhada na educação, na e social e seu modo de elaboração humano e social”
não passa de uma tentativa de ocultar os interesses das (Charlot, 1979, p. 280).

98
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A tarefa da escola, porém, não é das mais fáceis na A prática docente, por sua vez, tem uma dimensão
atual conjuntura. Esse quadro suscita a seguinte ques- política. A atividade de ensinar não se restringe à sala de
tão: Como essa instituição está se inserindo nessa socie- aula. Há um compromisso social do professor que trans-
dade plena de contradições? cende esse espaço escolar. O que se faz diante dos alu-
Vivemos diversas “temporalidades” circunscritas ao nos e colegas de trabalho tem uma repercussão que vai
mesmo espaço. Ao mesmo tempo em que há recantos além. De uma forma ou de outra, em maior ou menor
de grandes cidades onde ocorre um congestionamento escala, o professor está contribuindo para a formação
de tráfego aéreo de helicóptero para o transporte de da sociedade que temos. Daí a necessidade de se ter um
executivos, por outro lado, temos rincões, dessa mesma compromisso social e profissional.
cidade, onde o indivíduo mal consegue se abrigar e se Não é possível se refugiar no comodismo a fim de
alimentar satisfatoriamente. Não são exigências fáceis e garantir uma pretensa “imparcialidade”. Há consequên-
a escola e o professor têm que lidar a todo instante com cias decorrentes das nossas escolhas. Não é possível
essas e outras questões contemporâneas. negar as responsabilidades que se tem em relação aos
Além disso, a rapidez propiciada pela tecnologia, a alunos e a sociedade em geral. Em nossas ações não
quantidade enorme de informações que circula diaria- cabe o discurso da neutralidade.
mente, bem ou mal, compõe o universo dos jovens que Quando o docente ensina um conteúdo, elabora
frequentam as escolas. Diante disso, como a escola e o uma estratégia ou avalia o seu trabalho, está sempre
professor conseguem propiciar elementos para que os investindo numa dimensão formativa. Segundo Zabala:
alunos façam relações conjunturais e estruturais? Como “(...) educar quer dizer formar cidadãos e cidadãs, que não
enfrentar o “presenteísmo” latente na formação desses estão parcelados em compartimentos estanques, em ca-
jovens? pacidades isoladas (...)” (1998, p.28/9).
“Com a globalização da economia, aumentaram-se Os alunos têm necessidade de adquirir habilidades
as responsabilidades da escola e do docente”- (Naracato, e competências para enfrentar o dia-a-dia. Não basta a
Varani e Carvalho, 2000, p. 96). preocupação com apropriações de conteúdos restritos.
Há diversas cobranças em relação à aprendizagem O ser humano só se desenvolve em sua plenitude quan-
dos alunos. O discurso corrente é de que o aluno preci- do articula bem as suas múltiplas potencialidades. E o
sa ser flexível para atender, por exemplo, às constantes
conhecimento escolar é fundamental nesse processo.
mudanças do mercado de trabalho. Mas será que ob-
O ato educativo, portanto, não é um ato isolado ou
jetivos como esses precisam ser a “viga-mestra” para o
neutro. Pode-se optar por não ter filiações partidárias,
processo de ensino-aprendizagem?
mas o comportamento pessoal e profissional de todo
Mesmo concordando que: “nem cabe á educação
professor possui, sim, uma dimensão política. Recorro a
um papel transformador revolucionário, nem pode a
Libâneo para corroborar essa idéia de que: “(...) a prática
pedagogia se erigir em uma posição de crítica social” -
educativa, e especialmente os objetivos e conteúdos do
(Schmied-Kowarzik, 1983, p.132), é preciso reconhecer
ensino e o trabalho docente, estão determinados por fins
ter a escola um papel importante na compreensão do
cotidiano. O conhecimento escolar pode ajudar os alu- e exigências sociais, políticas e ideológicas” - (1994, p.18).
nos a ampliar as suas “ferramentas” de atuação sobre Assim, reafirmo que o professor precisa ter compro-
suas vidas e, consequentemente, sobre a sociedade. Por misso e responsabilidade social. O seu trabalho não se
um lado, a instituição escolar não pode desprezar o co- restringe à sala de aula. A sua postura perante os alunos,
nhecimento que o aluno traz, por outro, não pode ficar a forma como trabalha os conteúdos de sua disciplina e
restrito a ele. as interações que articula na sociedade provocam inter-
A escola tem um papel fundamental na construção ferências maiores ou menores. A escola e o professor,
do conhecimento dos jovens. O seu conhecimento tem bem ou mal, estão ajudando a preparar os alunos para
especificidades. Não é mera transposição da produção enfrentar o cotidiano. Pode-se dizer, então, que não há
científica e nem elaboração do senso comum. Provavel- neutralidade em nenhuma de suas atitudes, somos par-
mente, o aluno não terá oportunidade de se apropriar te fundamental nessa composição coletiva. Novamen-
desse conhecimento em outro espaço. A convivência, as te, retomo Libâneo para afirmar que: “(...) No trabalho
interações e as “apreensões” que se desenvolvem ali se- docente, sendo manifestação da prática educativa, estão
rão fundamentais para a sua construção humana. presentes interesses de toda ordem – sociais, políticos,
econômicos, culturais – que precisam ser compreendidos
Discutindo a prática docente pelos professores” - (Libâneo, 1994, p. 21).
Como já mencionei anteriormente, a escola e o pro- Porém, é bom lembrar que essas relações sociais são
fessor não podem tudo, mas ambos têm tarefas impor- passíveis de transformação. Ou seja, os indivíduos po-
tantes e difíceis de realizar num mundo cheio de contra- dem transformar a sua realidade. O homem é produto e,
dições e tomado pela rapidez dos avanços tecnológicos. ao mesmo tempo, produtor de sua história.

99
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O homem é um ser inacabado, sendo assim, não é lo); programas de capacitação de professores (o mais
possível estabelecer condutas naturais a priori, pode- recente é o Ensino Médio Em Rede, programa de capa-
-se falar em condição humana e não em características citação baseado em atividades feitas nas escolas e via
universais da natureza humana. Talvez aí resida uma da Internet); aparelhamento parcial das escolas com equi-
“chaves” para se propor uma mudança consistente nas pamentos eletrônicos e de informática. Tudo feito no
propostas pedagógicas. sentido de alcançar uma “melhor qualidade do ensino” e
Não se pode falar em mudanças sem se discutir a de atender às exigências de um “novo professor”.
visão de homem intrínseca às propostas educacionais. Aprofundando um pouco mais essa questão, vale a
Vem daí a necessidade de considerar o homem com ser pena refletir sobre o papel do Estado em relação à edu-
social e determinado historicamente. Nesse sentido, fa- cação. A respeito da interferência do Estado na tentativa
lar em natureza humana é um escapismo. de “impor” diretrizes curriculares, é importante ressaltar
Faz-se necessário uma ressalva: não há nesse espaço o que diz Luís Fernando Cerri em relação ao processo de
a pretensão de responsabilizar os professores por todas “participação” dos professores nos PCNs:
as mazelas do ensino e da consequente aprendizagem
dos estudantes. As responsabilidades existem e não é “O professor é submetido, na recepção desses docu-
possível omiti-las. Mas o Estado e outros agentes so- mentos, a uma comunicação que no aspecto verbal é de-
ciais nem sempre cumprem as suas funções previstas mocrática, autonomizadora, crítica e flexível, mas no ato
no “contrato social”. A questão não pode ser individua- de impor-se como “verdade pedagógica” desconfirma o
lizada, a análise deve ser politicamente contextualizada. docente, reduzindo-o a mero executor e ignorante do seu
Volto a enfatizar que o professor mobiliza diversos próprio ofício. (...)” - (2004, p. 217).
saberes em sua prática cotidiana. É preciso refutar os
discursos que visam à racionalização e o controle do É preciso discutir a «imposição» desses «caminhos»
trabalho docente. Não é através do aumento de um do- para a prática docente. Levando em conta que o profes-
mínio externo que o trabalho do professor e a educação sor mobiliza e produz saberes, ele não pode ser visto e
serão (re) valorizados. O trabalho desse profissional não tratado como simples executor de tarefas. Seu trabalho
se restringe à execução de atividades elaboradas em ou- requer investimentos na formação e sem essa dimensão
tras instâncias, fora da escola. Esse processo de coman- profissional não é possível garantir um processo educa-
do externo retira a autonomia profissional ao permitir tivo onde o sujeito seja capaz de apreender conteúdos
essa interferência e o professor passa a ser visto como significativos e de ampliar os instrumentos para, junto
um “simples executor de tarefas”. Segundo Nóvoa: “A com outros elementos, transformar a sua realidade. Em
racionalização, proletarização e privatização do ensino relação a isso, Antonio Nóvoa afirma que:
são aspectos diferentes de uma mesma agenda política (...) é preciso rejeitar as tendências que apontam no
que tende a olhar para a educação segundo uma lógica sentido de separar a concepção da execução, tendências
economicista” (...) - (1998, p. 27). que põem nas mãos dos professores pacotes curriculares
Esse processo de controle citado acima esteve em pré-desenhados prontos a serem aplicados, que procu-
alta na década de 1970, quando o Brasil viveu o período ram sobrecarregar o quotidiano dos professores com ac-
do regime militar (1964 – 1985). Mas com o processo tividades que lhes retiram o tempo necessário à reflexão
de globalização, principalmente, a partir dos anos 90, e à produção de práticas inovadoras.” - (1998, p. 31).
assistimos novamente uma tentativa de controle ex- Comungo da ideia de não ser possível separar con-
terno do trabalho docente. Aqui no Brasil, por conta cepção e execução. Isso pode dar a falsa impressão de
de cumprimentos de acordos internacionais, devido a existir uma hierarquia, onde o “trabalho intelectual” se-
empréstimos feitos com a justificativa da necessidade ria superior ao “trabalho executor”. Essa questão vem na
de investimentos no sistema educacional, os governos esteira da ideia de que a universidade produz conheci-
de todas as esferas da federação instituíram reformas mento e a escola somente o reproduz.
educacionais no Ensino Básico do setor público, onde a Dessa forma pode-se considerar que a escola e o
preocupação de fundo era atender às exigências de me- trabalho docente não estão soltos no ar. Apesar de seus
tas do Banco Mundial para ter acesso ao financiamento limites, é um trabalho que contribui para a formação
externo disponível para educação. social que temos. As nossas falas, nossos gestos, nos-
Nesse sentido, foram adotadas ações na área do sos silêncios, provocam consequências nos alunos que,
currículo como os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacio- por sua vez, fazem repercutir na sociedade. Por isso se
nais); avaliações centrais como as do SAEB (Sistema de faz necessário uma reflexão ativa sobre a nossa prática
Avaliação do Ensino Básico do governo Federal), ENEM educativa. Sobre esse caráter intencional do trabalho
(Exame Nacional do Ensino Médio), SARESP (Sistema de docente, Franco afirma o seguinte:
Avaliação de Rendimento Escolar do Estado De São Pau-

100
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

“No limite, pode-se afirmar que a atividade docente que Não é possível se restringir a um conhecimento
se organiza de modo “mecânico”, “casual”, “espontâneo”, sem isolado. Os conteúdos desenvolvidos não podem ficar
explicitação das intencionalidades, deixa de ser práxis edu- restritos aos conhecimentos estanques de disciplinas
cativa, deixa de ser atividade docente” - (p.7, 2003). fragmentadas. O aluno precisa fazer relações, não pode
A escola e o professor não podem deixar de refletir ter uma visão compartimentada do conhecimento. A
criticamente sobre as finalidades de seus trabalhos. Não respeito de conteúdos Zabala menciona o seguinte:
podem se restringir ao simples cumprimento do ano le-
tivo e dos rituais burocráticos. “(...) os conteúdos de aprendizagem não se reduzem
Já se sabe há algum tempo que as condições pro- unicamente às contribuições das disciplinas ou matérias tra-
fissionais dos professores do Ensino Básico da rede pú- dicionais. Portanto, também serão conteúdos de aprendiza-
blica não são satisfatórias. Há muito tempo os docentes gem todos aqueles que possibilitem o desenvolvimento das
reivindicam uma jornada de trabalho compatível com as capacidades motoras, afetivas, de relação interpessoal e de
necessidades de formação, número de alunos que pos- inserção social”. - (1998, p. 30).
sibilite uma organização melhor das atividades em sala
de aula e salários que permitam uma sobrevivência ín- Sendo assim, o conteúdo não pode se limitar ao
tegra para o exercício da docência. conhecimento imediato e restrito da “matéria”. Não
A duras penas, muitos professores enfrentam essas basta a preocupação com as “especificidades” de cada
barreiras e procuram garantir um ensino significativo disciplina. O “específico” deve levar os alunos a adqui-
para os seus alunos. Não é possível alienar-se e confor- rir conhecimentos que os ajudem a fazer ligações com
mar-se com essa situação. Lembro ainda que a atividade outras disciplinas, com a sua vida e com o mundo. Se o
do magistério, como outras, carrega uma dimensão po- conteúdo trabalhado não conseguir provocar interações
lítica que, direta ou indiretamente, atinge a sociedade. nos alunos, provavelmente ele será rapidamente descar-
Quando se perde essa dimensão, a prática educativa tado, não estará cumprindo uma função educativa.
deixa de ter relevância social. As interações vividas dentro da educação escolar
Atualmente, diversos autores tais como Alarcão podem ser fundamentais para a formação dos jovens.
(2001), Pimenta (2002) têm colocado em pauta essas Os adultos podem ser modelos essenciais para a educa-
discussões. Num momento em que a educação é “(re) ção desses jovens, talvez esse seja um dos papéis cen-
valorizada” nos discursos políticos e que o professor trais da educação.
passa a ser o centro de diversos debates em torno da
qualidade do ensino, se faz necessário uma reflexão As concepções pedagógicas
crítica do trabalho docente. Como já dissemos ante- Depois de sistematizar reflexões relativas à escola e
riormente, os docentes não podem assumir, individual- à prática docente, passo agora a propor algumas discus-
mente, a culpa pela situação de crise vivida pelo sistema sões sobre a pedagogia. Primeiro, é preciso lembrar que
educacional. Há responsabilidades sim, mas elas devem
se trata de uma área permeável a diversas influências. A
ser analisadas dentro de um contexto político maior.
todo instante surgem “novas soluções” para os proble-
Existem tarefas que são prerrogativas do poder públi-
mas de ensino, especialmente nas área pública. A cada
co e o professor isoladamente não conseguirá articular
nova gestão as Secretarias de Educação lançam refor-
mudanças abrangentes. Ele não pode ter uma visão in-
mas que não conseguem modificar substancialmente a
gênua da trajetória histórica. Nesse sentido, é importan-
qualidade do ensino. Para constatar isso basta observar
te observar o que José Carlos Libâneo afirma sobre o
os próprios índices oficiais do governo. Por exemplo, o
exercício do magistério:
desempenho dos alunos nas avaliações centrais como
(...) como toda profissão, o magistério é um ato político SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino Básico), SARESP
porque se realiza no contexto das relações sociais onde se (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado
manifestam os interesses das classes sociais. O compromisso de São Paulo) e outros mais.
ético-político é uma tomada de posição frente aos interesses A transposição de modelos de reformas vindos de
sociais em jogo na sociedade. - (1994, p. 47). fora e feitos sem uma devida crítica só pode redundar
em fracasso. Aliás, isso não é novidade. Há tempos se
Essa é outra dimensão importante da prática docen- discutem as ingerências de planos externos. O difícil é
te. O professor trabalha no coletivo, quer seja com seus aceitar a insistência e a persistência desses modelos em
pares, mais coordenação, direção e funcionários, no en- diversas Secretarias de Educação e nos mais diferentes
caminhamento do projeto pedagógico da escola; quer planos de governo.
seja com seus alunos, no desenvolvimento do processo Nesses programas de reformas não há uma articu-
de ensino-aprendizagem dentro da sala de aula e na sua lação entre os investimentos. Os diversos projetos “im-
unidade escolar. postos” ao sistema educacional só contribuem para con-

101
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

fundir e dificultar as iniciativas que surgem nas escolas. A Além disso, não se pode esquecer que o homem não é
busca pelo cumprimento de “tarefas” faz com que a equipe refém de determinismos. Não é possível defini-lo a priori.
escolar “se esqueça” de realizar suas funções básicas para É um ser que vai se construindo e se constituindo a cada
garantir uma aprendizagem significativa para os seus alunos. dia, a todo instante, no seu fazer. As suas ações carregam
Talvez seja necessário refletir sobre a trajetória do pen- um sentido coletivo. Ele é produto e, ao mesmo tempo,
samento pedagógico. Analisando tanto a pedagogia tradi- produtor da sua história e da humanidade.
cional quanto a nova, Charlot (1979) chama a atenção para o Uma das questões de fundo que ainda permanece, é
fato de que ambas trabalham com a concepção de homem e que só alguns se apropriam dessas realizações. Ou seja, o
de cultura a partir da idéia de natureza humana: produto do trabalho humano ainda está a serviço de pou-
“A pedagogia tradicional define o homem como o Sábio, cos. Todos os avanços técnicos e científicos estão “subloca-
isto é, como aquele que atualizou em si a natureza huma- dos”. O trabalho, como está posto, não propicia a realiza-
na no que ela tem de mais nobre. A pedagogia nova visa ção: ao contrario, escraviza o homem.
ao homem que, no seio da sociedade, soube conservar sua
Sem considerar essas questões de cunho antropológi-
bondade, sua espontaneidade e sua plasticidade naturais.”-
co, como falar em projetos educacionais? Como falar em
(1979, p. 264).
reformas educacionais? A questão não é só mudar méto-
Como já foi mencionado anteriormente, não se pode
dos, inovar técnicas, mexer na avaliação, propor um “novo”
perder de vista que o homem é um ser social e de que a
nossa sociedade está dividida em classes sociais. Desconsi- currículo, e outras mudanças aparentes. Afinal, qual é o
derar esses dados é negar a trajetória histórica do homem. projeto de sociedade que se pretende? É uma das pergun-
Além disso, não se pode tentar a simples “ideologiza- tas simples que permanecem sem uma resposta satisfató-
ção” da pedagogia com o fim de recuperar uma “verdadeira ria. Sem aprofundar essas questões não se pode avançar
essência” intrínseca à pedagogia, ou seja, sua pseudo-fun- nas discussões pedagógicas e tentar propor modificações
ção transformadora do ser humano e do social. no sistema educacional.
Nesse sentido, Bernard Charlot (1979) aponta uma saí- Levando em conta os dados aqui sistematizados, diria
da que, segundo o autor, estaria na compreensão do “ho- que é preciso insistir numa reflexão e ação mais acuradas
mem como ser social”. Ele chama a atenção para a necessi- sobre as diversas facetas que envolvem o trabalho escolar.
dade de se refletir sobre algumas questões cruciais como: A escola e a prática docente são alvos de inúmeras
qual é o projeto de homem e de sociedade que se quer? intervenções. A todo instante o poder público estabele-
O autor trabalha com a ideia de que para se sair de ce normas que, na maioria das vezes, não são cumpridas.
uma pedagogia ideológica seria necessário compreender Quando muito, formam os “projetos pedagógicos” que
o homem como ser social. O homem só é determinado so- não saem do papel. São meros documentos para apresen-
cialmente e não por “condicionantes da natureza humana”. tações oficiais.
Acredito que a falta de um projeto mais abrangente, Ao contrário dos projetos “impostos” de fora, as inicia-
que leve em consideração a definição de homem como ser tivas surgidas nas escolas, se estimuladas, podem criar uma
social e historicamente determinado, seja um dos fatores mobilização vigorosa no cotidiano escolar. Podem ser um
que contribuem para essa “mutação” constante que per- elemento a mais para a valorização da educação. E podem
siste nas propostas pedagógicas. Aliás, talvez um dos pon- servir, até, de reflexão para o estabelecimento de políticas
tos cruciais dessa questão esteja nos interesses “da política voltadas para o sistema educacional. Não dá para falar em
menor”. Aquela que traz a proposta de reformas superfi- retomada da qualidade da educação pública desconside-
ciais, para evitar as questões de fundo. rando esse dado.
Deve-se reconhecer, por outro lado, que não se trata de A educação escolar precisa perder a “mania de grande-
uma tarefa fácil a definição de um projeto de homem e de
za”, de falar uma língua que esteja distante de seu público,
sociedade. Ainda mais num momento de crise. Afinal, desde
precisa assumir os seus limites e centrar os esforços em
o final do século XX fala-se em crise de paradigmas, prin-
cumprir bem a tarefa de ajudar os alunos a desenvolver
cipalmente nas áreas de conhecimento afeitas às ciências
os seus conhecimentos. De posse desses, eles terão mais
humanas. Nesse período, Fukuyama chegou a falar em “fim
da história”. E muitos embarcaram nesse discurso fatalista. instrumentos para atuar na sociedade em que vivem. Es-
Porém, não é preciso falar muito para verificar que sas “ferrramentas”, diga-se de passagem, podem ser fun-
essa “profecia” não ocorreu. A tão decantada globaliza- damentais para a transformação das condições limitadoras
ção associada ao neoliberalismo, não conseguiu cumprir da realização humana.
as promessas de redenção dos males sociais que persistem Nesse sentido, vale a pena refletir sobre o que diz Mo-
em todos os cantos do planeta. Aqui e ali se sucedem os rin: “A educação deve contribuir para a autoformação da
conflitos étnicos, nacionais e de outros interesses. pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a vi-
Se a educação escolar não pode empunhar a bandeira ver) e ensinar como se tornar cidadão”. - (Morin, 2002, p.65).
da transformação, por ter uma raiz “conservadora”, não se A escola não pode esquecer princípios como esses.
pode negar, por outro lado, que é um dos instrumentos Sem o estabelecimento de um diálogo profícuo com o
para a composição social, para a busca da superação das “mundo dos jovens”, ela deixará de cumprir um de seus
limitações do cotidiano. Só isso já constitui um papel im- papéis, ou seja, contribuir para a inserção dos jovens no
portante à educação escolar. mundo dos adultos.

102
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

O professor, por sua vez, não pode deixar de ter um para a vida em sociedade. No tocante a inserção de alunos
compromisso profissional, ele precisa assumir que tem uma com necessidades especiais, particularmente os deficientes
tarefa importante na sociedade. Não pode mudar o mundo, auditivos. A escola deve rever e manter uma força renova-
mas é um elemento fundamental no desenvolvimento cultu- dora, que faça com que os alunos ampliem a participação
ral da sociedade. Há que se investir numa prática coletiva e na sociedade.
solidária, pois só assim o seu trabalho terá sentido. Independente da diferença, hoje os deficientes já fa-
Por fim, diria que a pedagogia não pode se restringir a zem parte do corpo social e, devem ser estimulados a exer-
buscar soluções em outras áreas. Suas flutuações teóricas citar sua condição de cidadania desenvolvendo expectati-
contribuem para a falta de consistência das diversas propos- vas em relação ao conjunto da sociedade.
tas de mudanças. A impressão que fica é a de que se muda a Partindo desse pressuposto é que se pensou em reali-
todo instante para permanecer no mesmo, ou para piorar os zar uma pesquisa cujo objetivo é discutir os procedimen-
pequenos avanços praticados no interior das escolas. tos de inclusão, desenvolvidos pelas escolas para alunos
Entendo que não se pode esquecer de colocar em dis- com deficiência. A discussão remete ao processo histórico,
cussão as questões antropológicas que são fundamentais político e social vivenciados pela escola para a inclusão e
para os projetos de reformas pedagógicas. As mudanças integração de alunos com a referida deficiência enfocando
não podem permanecer calcadas na idéia de natureza hu- aspectos que dificulta a interação de professores com re-
mana. É preciso partir da idéia de que o homem é um ser lação ao atendimento para pessoas com necessidades es-
social e de que vivemos numa sociedade capitalistas de peciais, com isso o preconceito e a falta de conhecimento
classes sociais. Tentar ocultar isso é “propor mudanças para ainda são fatores que contribuem negativamente para o
permanecer no mesmo”.35 processo da educação inclusiva.
Vivência do processo inclusivo de alunos com neces- O espaço inclusivo
sidades especiais O processo de inclusão de deficientes nas escolas
A educação é um fator importante de transformação passou e passa por grandes e constantes transformações
social e um universo diversificado. Os alunos devem es-
históricas, política e econômica. Hoje é sabido que os prin-
tar preparados para o atendimento a essa diversidade que
cípios teóricos – metodológico da inclusão escolar está
proporcionará uma mudança no quadro atual da educação.
focado numa concepção de educação de qualidade para
A chamada educação inclusiva é oriunda de uma transfor-
todos. Porém, não foi sempre assim, os desafios da inclu-
mação na perspectiva educacional porque não se limita a
são à educação remete desde as civilizações mais remotas
ajudar somente aos alunos que apresentam dificuldades
da humanidade.
na escola, mas, apoia á todos os membros da comunidade
Os Gregos e os Romanos são os primórdios na arte de
escolar e que fazem parte do processo de ensino e apren-
ensinar, foram eles que iniciaram o processo participativo
dizagem.
A situação que cerca a vida dos deficientes é identifica- de pessoas em escolas, porém vale salientar que apenas
da através do mecanismo de segregação, marginalização e os nobres tinham tal privilégio, pois só quem frequentava
exclusão. A trajetória da Educação Especial coincide com a a escola era considerada uma pessoa educada. Todos que
busca da conquista dos direitos humanos. Historicamente ali estavam devia saber filosofia, política, dança e luta. En-
os sistemas educacionais vêm exigindo uma melhor com- tretanto no Brasil pode-se dizer que foram os jesuítas que
preensão no que diz respeito ao entendimento do saber iniciaram o processo educacional. Porém é de grande valia
especializado que garante o atendimento ao portador de citar que a educação no percurso histórico sofreu várias
deficiência. Assim o acesso e a permanência na escola é um transformações.
principio que está na Constituição Federal Brasileira desde Segundo, Progestão - Módulo I (2001), a escola não é
1988, data de sua última promulgação, o qual assegura a uma instituição solta no espaço. Ela tem uma história que
todos igualdade de condições. foi – e continua sendo – construída por aqueles que, em al-
A sociedade atual pede educadores em que vivemos gum momento de suas vidas, por ela passaram. Muitas ve-
precisamos com um modelo social que apresente e busque zes, a escola é uma conquista de determinada comunidade,
soluções para as necessidades dos educandos, principal- que lutou para ter um espaço de acesso ao conhecimento
mente aos que possuam diferenças. A intenção maior é na para seus filhos. Ter uma escola é um passo importante,
verdade, a de criar possibilidades que diminuam a distância mas não o único. A escola é fundamental para formação e
entre o que se aprende e o que se ensina. Desse modo, transformação da cidadania. Assim nenhum indivíduo in-
necessita-se de pessoas com espírito critico e capaz de agir dependente de qualquer natureza pode ficar excluído de
com autonomia. seus benefícios.
Um dos processos de agregação social remete desde Quanto à inclusão de deficientes, os principais pionei-
a Antiguidade, e a escola é uma fonte inesgotável, que o ros se encontravam nos EUA, o Canadá, a Espanha e a Itália,
homem busca ajuda para realizar suas práticas sociais, cul- os quais implantaram classes inclusivas e de escolas inclu-
turais e econômicas. Ela é uma fonte que garante a apren- sivas. Se bem que boa parte da literatura que aborda às
dizagem de habilidades e conteúdos que são necessários práticas inclusivas na educação começa a surgir na década
35 Fonte: www.conteudoescola.com.br – Texto adaptado de de 90, basicamente relatando experiências que vem ocor-
José Martins Ribeiro rendo a partir do final dos anos 80 aos dias de hoje.

103
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A educação inclusiva hoje tem outra conotação em a ida adulta produtiva. As escolas devem ajudá-los a se
muitos países e a cada dia ganha novos adeptos, não só tornarem economicamente ativos e prover-lhes as habi-
preocupados com a literatura, mas com a participação ati- lidades necessárias no dia-a-dia, oferecendo treinamento
va. O mundo vive a era da globalização e as mudanças são em habilidades que respondam às demandas sociais e de
importantes e necessárias, afinal tudo está em constante comunicação e a expectativas da ida adulta. Isto requer
evolução, e com a educação de pessoas com necessidades tecnologias apropriadas de treinamento, bem como a con-
especiais não foi diferente. Foi e é de fundamental impor- tenção da experiência direta em situações de vida real fora
tância a mudança para atender os deficientes nas escolas, da escola.
mesmo sabendo que não é na escola que a educação toma Os currículos para os alunos com necessidades educa-
seu rumo principal, a educação pode acontecer em qual- cionais especiais em classes mais adiantadas devem incluir
quer lugar que não há sombra alguma do sistema educa- programas transicionais específicos apoio para ingressa-
cional envolvido. rem no ensino superior sempre que possível e subsequente
Para que haja a inclusão de pessoas especiais, a escola treinamento profissional que prepare para atuarem como
deve se planejar de acordo com cada necessidade especial, membros contribuintes independentes em suas comunida-
e assim garantir o acesso de pessoas com necessidades des após terminarem estudos. Estas atividades devem ser
especiais no processo de aprendizagem e conhecimento. executadas com a participação ativa de conselheiros pro-
Contudo a concepção de escola inclusiva se fundamente fissionais, agências de colocação, sindicatos, autoridades
no reconhecimento das diferenças humanas e na apren- locais e diferentes serviços e entidade interessados.
dizagem centrada nas potencialidades dos alunos, ao in- Neste sentido, caberá a cada escola, preparar o aluno
vés da imposição de rituais pedagógicos pré-estabelecidos para o sucesso profissional e vida independente; Preparar
que acabem por legitimar a desigualdade social e negar as a própria escola para incluir nela o aluno portador de de-
diversidades. ficiência; Onde e como? Essa preparação deverá ocorrer
As escolas, nessa perspectiva devem responder às ne- em sala de aula, em setores operacionais da escola e na
cessidades educacionais especiais de seus alunos, consi- comunidade. Deverá haver ação conjunta do diretor e dos
derando a complexidade e heterogeneidade de estilos e
professores da escola das autoridades educacionais, dos
ritmos de aprendizagem.
profissionais de educação especial e/ou de reabilitação
A escola inclusiva não aparece da noite para o dia, mas
dos líderes do movimento dos portadores de deficiência e
vão se configurando mediante um longo processo, portan-
representantes da comunidade.
to, é preciso tomar consciência dos objetivos que se tenta
Portanto um dos pontos importantes da educação in-
alcançar e o tipo de estratégias que se deve impulsionar. A
clusiva é a atitude positiva da gestão escolar, o trabalho co-
mudança de cada escola deve partir de sua cultura própria
laborativo por toda equipe, parceria entre escola e família,
e orientar-se no sentido de sua transformação. Por esse
a organização de recursos e a atenção às necessidades de
motivo, nem todas as escolas mais tradicionais, com uma
organização mais hierárquica, em que os professores tra- cada aluno formam uma estrutura básica para melhorar a
balham de forma individual e na qual predomina a exigên- qualidade da educação, alterando o modo como os alunos
cia acadêmica. Outras têm mais experiências com alunos são tratados e avançando na compreensão de que as difi-
com problemas, apresentam uma organização mais flexível culdades de aprendizagem podem ser os resultados de um
e seus professores são mais cooperativos para resolver os sistema acolhedor.
problemas. (...) só a partir das condições reais de escola, é A escola precisa sem sombra de dúvida criar meios que
possível melhorar a organização interna e contribuir para possibilite a integração de pessoas com deficiência, viabi-
criar uma cultura mais favorável á mudança educacional. lizando um espaço propício que atenda o acesso de por-
(COLL, 2004, p. 45). tadores de deficiência especiais. Sendo assim, a instituição
A inclusão também reflete uma nova abordagem na escolar deve criar ambiente motivador, que potencialize a
elaboração das políticas públicas que reforçam a concep- aceitação, a afetividade, acessibilidade e a autonomia dos
ção de transversalidade da educação especial nos progra- alunos com necessidades especiais, neste sentido, é im-
mas educacionais, reforça ainda, as relações dessa mo- prescindível para a formação de confiança dos alunos em
dalidade de educação com as demais áreas, assegurando geral, e em particular, dos alunos com deficiência. O aluna-
assim, a necessidade dos alunos e a oportunidade da sa- do na medida em que se sente acolhido, respeitados, valo-
tisfação de suas necessidades educacionais especiais nos rizado, ganham mais confiabilidade em sua competência e
sistemas de ensino. assim estarão preparados a enfrentarem os desafios que a
A organização do sistema educacional orientada nos escola poderá apresentar.
princípios da educação inclusiva possibilita quebrar esse As salas de recursos multifuncionais, por exemplo, são
paradigma de exclusão, desafiando os preconceitos e dar espaços da escola onde se realiza o atendimento educacio-
visibilidade às pessoas com deficiência e oportunidade nal especializado para alunos com necessidades educacio-
para que estas construam seu próprio futuro e sejam antes nais especiais, por meio do desenvolvimento de estratégias
de tudo construtores de sua própria história. de aprendizagem centrada em um novo fazer pedagógico
A Declaração de Salamanca(1994) assevera que os jo- que favoreça a construção de conhecimentos pelos alunos,
vens com necessidades educacionais especiais devem re- subsidiando-os para que desenvolva o currículo e participe
ceber ajuda para fazer uma eficaz transição da escola para da vida escalar.

104
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A sala de recursos multifuncionais é, portanto, um es- Novos Conceitos, Novas Emoções


paço de suma importância para o atendimento aos porta- Como você sabe, mudar nossos valores, nossas atitu-
dores de necessidades especiais, e esta deve está organi- des e nossos comportamentos é um processo complexo,
zada com materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos pois envolve nossa história cognitiva e emocional, especial-
e profissionais com formação para o atendimento às ne- mente quando entramos em contato com novas informa-
cessidades educacionais especiais. No atendimento, é fun- ções e novos conceitos.
damental que o professor considere às diferentes áreas Assim, ao abordar a questão da deficiência em relação
do conhecimento, os aspectos relacionados ao estágio de à nossa sociedade, é muito natural que se manifestem sen-
desenvolvimento cognitivo dos alunos, o nível de escolari- timentos como medo, pena, raiva, repulsa. Tais sentimen-
dade, os recursos específicos para sua aprendizagem e as tos estão muito ligados ao desconhecimento e às idéias
atividades de complementação e suplementação curricular. preconcebidas que existem com relação às pessoas com
Uma escola inclusiva não pode deixar de lado o supor- deficiência.
te principal para que aconteça o sucesso de todo o profes- Este manual tem por objetivo oferecer sugestões de
sor, esse por sua vez deve estar completamente certo do atividades que você, professor, pode desenvolver em sala
seu papel. de aula, visando favorecer que os alunos envolvidos no
Sobre o papel do professor inclusivo, Soares (1995) es- processo de construção de um sistema educacional inclusi-
creve: vo possam manifestar e tratar, dignamente, seus sentimen-
O papel ativo do sujeito na construção do conhe- tos a esse respeito.
cimento se assenta na concepção de que todos os seres Lembramos que é fundamental que as atividades su-
humanos são organismos proativos, com planos e orienta- geridas sejam coerentes com o nível de compreensão e de
dos por objetivos, que através de suas interações com os interesse de seus alunos e que possibilitem a vivência e a
contextos de vida, criam e transformam as suas realidades reflexão sobre os vários tipos de deficiência.
pessoais e interpessoais (p. 139).
Numa escola inclusiva uns dos personagens que não Aceitação sem imposição
pode faltar é o professor, o qual é um grande colaborador
Apesar de a inclusão de crianças com necessidades
no processo de aprendizagem, e que também faz parte do
educacionais especiais na rede regular de ensino ser um
processo inclusivo da escola. O professor inclusivo deve es-
direito garantido pela Constituição Federal, isso não é su-
tar aberto as diferença e mudanças, para que possa facilitar
ficiente para garantir a construção e o desenvolvimento de
o processo de ensino aprendizagem a partir da produção
um sistema educacional inclusivo. Para tanto, é necessário
do seu conhecimento, dessa forma caracteriza-se como um
que a comunidade escolar se disponha a aceitar e a partici-
profissional ativo e atuante, em constante interação com o
par desse processo, que é mais complexo do que somente
mundo, no qual os processos de descobertas, de intuição e
inserir a criança com deficiência, fisicamente, numa sala de
de criatividade representam elementos privilegiados desta
construção. aula comum.
É muito importante que o professor acate cada por- O movimento de transformação não pode ser imposto,
tador de deficiência especial, com seu próprio jeito de ser mas também não pode depender exclusivamente de de-
e aprender, respeitando, dessa forma seus interesses. Um cisões pessoais e das reações emocionais de um ou outro
professor com métodos, técnicas e objetivos fechados para profissional.
todos os deficientes está mais que ultrapassado. Adequar Inicia-se na atuação dos dirigentes educacionais e ali-
os métodos de ensino às necessidades dos alunos deficien- cerça-se nas ações dos professores que, como líderes, são
tes é um extraordinário fator para o sucesso da aprendi- agentes de essencial importância na transformação do sis-
zagem. Pois nenhum método de ensino é suficientemente tema educacional.
eficaz por si só da variedade de experiências e comporta-
mento dos alunos. Conversando com os alunos
Os professores inclusivos precisam ser criativos, aten- Antes de se iniciar um trabalho com alunos com defi-
ciosos, sensível, paciente e perseverante para nunca de- ciência em classes comuns do sistema regular de ensino, é
sistirem de ensinar aqueles que têm dificuldade de apren- necessário que se desenvolva um trabalho de sensibiliza-
der, pois um educador busca alcançar cada aluno em suas ção e acolhimento para a convivência na diversidade com
diferenças. Vale lembrar que o aprendizado possui ritmos os demais alunos, enfatizando a importância das diferen-
diferentes, as crianças e jovens não são iguais: as informa- ças entre indivíduos, de maneira geral.
ções disponíveis a cada um são distintas; as estratégias A diversidade constitui a base do desenvolvimento das
de pensamento e ação, bem como os recursos utilizados, relações humanas, já que somos todos diferentes uns
são diferentes. Essa diversidade que caracteriza a diferen- dos outros, o que não faz de ninguém melhor ou pior
ça entre indivíduos de certo grupo, é toda como funda- como pessoa e cidadão.
mental para a própria interação que irá se dá em sala de Os comportamentos de rejeição e de superproteção à
aula: sem essa desigualdade não seria possível a troca das diferença devem ser desvelados, discutidos, compreendi-
capacidades cognitivas pelo esforço partilhado, na busca dos e modificados, inclusive como parte da ação educativa
de soluções comuns. da escola, que é formar cidadãos ativos, conscientes, críti-
cos e responsáveis.

105
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Como qualquer outro conteúdo pedagógico, é impor- São experiências que não têm nenhum caráter prescri-
tante que você inicie um diálogo a partir das vivências con- tivo, de modelos ou receitas, mas têm o intuito de sociali-
cretas de seus alunos a respeito das pessoas com deficiência. zar atividades, que poderão ser objeto de análise, resguar-
dadas as especificidades de cada situação.
._Você conhece alguém com deficiência? Quem é essa
pessoa? Atividades
._Como você se relaciona com ela? As atividades apresentadas foram realizadas e aprova-
._Que tipo de sentimentos ela desperta em você? das por professores de classes comuns, em conjunto com
._O que acharia de ter colegas com deficiência na classe? professores de classes especiais.
._Acredita que seria legal, que teria o que aprender As atividades podem ser basicamente de dois tipos:
com ele ou o que lhe ensinar? 1. as simulações, que favorecem a ampliação percep-
tual do que é conviver com características e consequências
Conversando com os pais de deficiências, como por exemplo:
Da mesma forma que é fundamental preparar os alunos ._corrida de obstáculos - alguns participantes podem
para abrir espaço e receber seus colegas com deficiência, simular a deficiência física, fixando revistas atrás dos joe-
também é muito importante sensibilizar e envolver seus lhos (com fita crepe), ou prendendo nas costas, também
pais, para compreenderem, aceitarem e colaborarem para com fita crepe, um ou ambos os braços. Outros ainda po-
que essa mudança se concretize com vantagens para todos. dem simular a deficiência visual, amarrando uma venda
De maneira geral, os membros da família desejam nos olhos e cuidando com que não passe por ela qualquer
cumprir com o seu papel de educadores, no âmbito infor- claridade;
mal de ensino. Para isso, eles necessitam de informação, de ._cinema mudo - os participantes podem simular a de-
orientação, de se sentirem parte do processo. ficiência auditiva, assistindo a trechos de filmes sem som e
A implementação de grupos de pais tem sido uma procurando acompanhar o que as pessoas estão falando,
ação bastante positiva no sentido de fortalecer as relações bem como compreender a história. Outros participantes
da escola com a família, e de estimular famílias a serem podem também simular os problemas implícitos na co-
participantes e cooperativas no processo de desenvolvi- municação não verbal entre pessoas surdas e pessoas ou-
mento de seus filhos. vintes: procurar compreender uma mensagem transmitida
Para tanto, é importante que se planeje a realização de exclusivamente por meio de gestos;
reuniões sistemáticas de grupos de pais, nas quais se possa 2. as que envolvem mais a reflexão intelectual sobre
conversar sobre o processo de ensino e aprendizagem dos o assunto, tais como:
alunos, abordando a questão de suas necessidades. ._discussão em grupo sobre filmes, peças, desenhos,
Pais, professores e dirigentes costumam concordar, etc., que tenham como personagens, principais ou secun-
quando se queixam de que as reuniões não funcionam, ape- dários, pessoas com deficiência;
sar das razões apresentadas por cada um serem diferentes. ._redação sobre um personagem existente ou criado
Se formos, entretanto, analisar seu conteúdo, fica mais pelos participantes;
fácil termos a compreensão do porquê de assim se sentirem! ._familiarização com alguns equipamentos usados por
Geralmente, os dirigentes da unidade escolar falam so- pessoas com deficiência por meio da introdução de alguns
bre as regras da escola, sobre o sistema de controle dos deles dentre outros objetos usados comumente por todos
alunos, bem como se queixam aos pais quanto ao mau (como escova de dente, sapatos, talheres, etc.). Pode-se so-
desempenho e/ou comportamento de seus filhos. Assim, licitar aos participantes que procurem identificar a função
todos são obrigados a permanecer sentados, durante ho- social de cada objeto;
ras, ouvindo repreensões vazias e indevidas, já que esse ._coleta de notícia sobre o tema em jornais e revistas.
procedimento historicamente jamais produziu efeitos no Obs.: É muito importante que os participantes sejam in-
processo de ensino e aprendizagem de qualquer professor centivados a dizer como se sentiram durante as atividades,
e aluno! principalmente naquelas em que são simuladas vivên-
Outra atividade também bastante comum nas reu- cias de deficiências, pois sabemos que essas podem se
niões, é submeter os pais presentes à “broncas” da direção, constituir em experiências muito enriquecedoras e mar-
dirigidas àqueles que faltaram, o que torna o momento cantes para a pessoa.
ainda mais maçante, sem sentido e irritante. Compartilhar esses sentimentos com os demais tem
Como queremos que a família reflita, repense e se en- sido sempre bastante proveitoso para todos.
volva com o processo de ensino e aprendizagem dessa
forma? Não poderíamos aproveitar esse tempo para rea- Conhecendo e tornando familiares os equipamentos - As
lizar palestras de profissionais especializados, para discutir “coisas” que nos ajudam.
questões relacionadas ao desenvolvimento do aluno, para
dialogar a respeito das peculiaridades e necessidades das Coloque numa caixa de papelão diversos objetos que
crianças, buscando, em conjunto, identificar formas de par- usamos em nossas atividades e tarefas do dia-a-dia, como
ticipação da família? por exemplo, um par de escova de dentes, um par de ócu-
Acreditamos que sim. Por isso, apresentaremos, a se- los, uma chuteira, equipamentos de mergulho, uma régua,
guir, sugestões de atividades que podem favorecer tais um apacete, talheres, etc. Inclua também alguns equipa-
processos. mentos usados por pessoas com deficiência: um aparelho

106
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

auditivo,um livro em Braille, uma bengala longa, uma mu- Temas para redação
leta, um aparelho ortopédico, etc. Reúna um pequeno gru- Os alunos devem discutir as situações seguintes, que po-
po de alunos e peça a cada um deles que selecione e retire dem ser usadas como temas de redação e de dramatização:
um objeto da caixa. Você pode incentivar uma discussão 1._Ronaldo está muito feliz porque inventaram “o reló-
sobre como aqueles objetos podem ser úteis. Essa idéia é gio” e a escrita em Braille, pois essas invenções o ajudam a
adequada principalmente para crianças pequenas, e tem fazer muitas coisas. Um dia, um grande inventor convidou
por objetivo ajudá-las a perceber as limitações sob uma Ronaldo para visitar seu laboratório. Ele queria descobrir
ótica mais positiva, por meio da familiarização com equi- alguma coisa nova para ajudar as pessoas cegas. “Do que
pamentos de apoio usados por pessoas com deficiência. você precisa?”, perguntou o inventor. “O céu é o limite. Va-
Quando os objetos usados pelas pessoas com defi- mos descobrir a maior invenção do mundo!” Escreva sobre
ciência são intercalados com os objetos usados pelas pes- as coisas que Ronaldo pediria ao inventor e faça um dese-
soassem deficiência, as crianças aprendem que, da mesma nho dessas invenções.
forma que elas usam a escova de dentes para fazer a tare- 2._Ronaldo e Patrícia estão indo para a escola. Dois
fa de realizar a higiene bucal, as pessoas com deficiência meninos caminham atrás deles. Ronaldo e Patrícia ouvem
visual usam o alfabeto Braille para ler e a bengala longa um deles dizer: .Lá está Patrícia com o “quatro-olhos”. O
para selocomover; as pessoas surdas usam o aparelho para outro menino responde: “O que você quer dizer com essa
ouvir; as pessoas com deficiência física usam muletas para história de “quatro-olhos”? Ronaldo não enxerga nada!”. Es-
se locomover,etc. creva sobre o que acontece depois. O que Patrícia e Ronal-
Essa atividade pode ser complementada com uma ou- do fazem?
tra, durante a qual as crianças escolhem um objeto usado 3._Salete e Bete estão voltando da escola. Elas vêem
por pessoas com deficiência e fazem um desenho de al- Marcos e Borges na frente. Salete, que é nova na escola,
guém que o esteja utilizando. pergunta quem é aquele menino na cadeira de rodas. Bete
Geralmente, quando as crianças travam um primeiro fala sobre Marcos e um pouco sobre paralisia cerebral. As
contato com uma pessoa que usa um equipamento dife- meninas alcançam Marcos e Borges. Salete ouve Marcos
falando e diz: “Ei, você tem deficiência mental também? Eu
rente, elas se sentem tão curiosas e atraídas por esse obje-
não entendo o que você diz!”
to “estranho”. Proporcione uma oportunidade para que os
4._Durante uma feira de animais, um veterinário foi fa-
alunos conheçam cadeiras de rodas, próteses de membros,
zer uma palestra na classe de Marcos. Ele trouxe diversos
bengalas, muletas, botas, aparelhos ortopédicos e de sur-
slides e fotografias de bichos. Jane perguntou a Marcos
dez, bengalas para cegos, livros em Braille, regletes (obje-
se ele gostaria de ser veterinário. Ele respondeu que seria
tos para escrever em Braille.)
muito divertido, mas que isso seria muito difícil para ele.
Você pode pedir emprestados esses equipamentos a
Jane pensou então: “O que esse menino na cadeira de rodas
entidades e instituições de sua cidade e aos educadores
vai ser quando crescer?”
especiais, os quais poderão ajudar você a conhecer mais 5._Numa tarde, chovia muito na hora do recreio, e o
sobre seu uso, assim como lhe dar noções da língua de professor Ricardo pediu que as crianças escolhessem um
sinais, etc. jogo e não corressem, enquanto ele iria por alguns minutos
O contato inicial das crianças com os equipamentos é até a sala do diretor. Marcos achou que, já que o professor
interessante, pois ele permite que elas façam perguntas, não tinha mencionado cadeira de rodas, seria divertido ter
que os toquem e que descubram o que são e para que os colegas como platéia e torcida. O professor ouviu a ba-
servem, sem constranger ou prejudicar o usuário. Quando, gunça e voltou depressa.
posteriormente, pessoas com deficiência visitarem a esco- Entrou na sala e disse: “Marcos, venha cá imediatamente”.
la, as crianças já estarão familiarizadas com os equipamen- 6._Uma manhã, o carro da professora de Márcia engui-
tos e prestar ão mais atenção à pessoa do que aos objetos çou. Como ela morava muito longe da escola e não havia
que ela usa. ônibus que ela pudesse tomar, telefonou ao diretor avisando
Promova atividades de simulação, durante as quais, os que não iria, e uma professora substituta foi para seu lugar.
alunos poderão vivenciar uma deficiência. Essas experiên- Quando o sinal tocou, a professora entrou imedia-
cias permitem que eles percebam as dificuldades das pes- tamente na sala. Ela conversou com os alunos sobre as
soas com deficiência e como elas eventualmente podem atividades do dia e começou a aula de matemática. Tia
se sentir. Laura não sabia que Márcia era surda, e por isso ela tam-
bém não sabia que deveria estar de frente para Márcia
Folhetos e materiais impressos na hora de falar. Ela deu instrução para a atividade, en-
As organizações de pessoas com necessidades educa- quanto escrevia no quadro. Quando Patrícia ia avisá-la,
cionais especiais e as instituições prestadoras de serviço a ela voltou-se para Márcia e disse: “Vamos logo. Não fique
essas pessoas costumam ter material impresso, como fo- aí sonhando. Comece já!”.
lhetos, para serem distribuídos. 7._A professora de Márcia, Tia Clara, está muito con-
Você pode conseguir esses folhetos e distribuir para os tente por tê-la em sua sala de aula. Ela tem ensinado
alunos que poderão levá-los para casa e mostrá-los a seus muito a seus alunos sobre deficiência auditiva e todos os
familiares e amigos. alunos aprenderam um pouco da língua de sinais, com
muita facilidade!

107
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Tia Clara está muito contente porque os alunos podem Eterno Amor - O filme é uma bela historia de amor
se comunicar com Márcia usando a língua de sinais e Már- adaptada do livro Um Long Dimanche de Fíançaiiies, de
cia tornou-se parte integrante do grupo. Um dia, entrou Sébastien Japrisot, que tem como pano de fundo a Primei-
um novo aluno na classe. Braz já está na escola há qua- ra Guerra Mundial. Eterno Amor é do mesmo diretor de O
tro dias e as crianças têm lhe ensinado alguns sinais. Mas, Fabuloso Destino Poulain e traz no elenco Audrey Tatou
numa manhã antes da aula, Braz disse a Patrícia e Marina: (também de Amélia Poulain) como protagonista. Mathilde,
“Eu não quero aprender essa coisa. Quem é que vai querer a personagem de Tatou, tem deficiência física, em virtu-
aprender esses sinais bobos? É uma perda de tempo e a gen- de de poliomielite adquirida na infância. Mas a deficiência
te deveria estar aprendendo outras coisas mais importantes”. nunca foi obstáculo para impedi-la de correr atrás de seu
8. “Hoje está fazendo quase quarenta graus”, diz Bár- amor e não mediu esforços para conseguir o que realmen-
bara. As outras crianças, Patrícia, Márcia e Jane concordam te desejava.
que este é o dia mais quente do ano. “Você tem um elástico Feliz Ano Velho - Vencedor de seis prêmios no Festival
ou uma fita para eu prender meu cabelo?”, perguntou Jane. de Gramado, inclusive o de melhor roteiro, narra história de
Patrícia diz que felizmente ela tem os cabelos curtos e as- um universitário, que mesmo sendo mergulhador, fica te-
sim não sente tanto calor. Jane prende o cabelo e Márcia traplégico após um mergulho em um lago raso. Na cadeira
faz sinais. “Boa idéia, eu também vou prender os meus ca- de rodas, recorda a sua adolescência.
belos”. Bárbara olha para Márcia. “Não, você não deve fazer Filhos do Silêncio - Oscar e Globo de Ouro de melhor
isso!”, ela diz. “Por que não?”, pergunta Patrícia, “Ela tem os atriz e Urso de Prata no Festival de Berlim para direção. His-
cabelos compridos e hoje está muito quente”. Bárbara sus- tória de um professor de linguagem dos sinais para surdos
surra no ouvido de Patrícia que Márcia deveria deixar os ca- que apaixona-se por uma surda-muda que tem dificulda-
belos soltos. “Assim o aparelho de ouvido dela não aparece, des de relacionamento com as pessoas.
se ela prender o cabelo, como Jane fez, todo mundo vai ver Forrest Gump: o Contador de Histórias - Oscar de
o aparelho!!!”, ela diz. melhor filme, ator, diretor, roteiro, montagem e efeitos es-
peciais. O filme mostra como um rapaz com QI abaixo da
Filmes média, consegue, por acaso, viver um período da história
dos EUA. No filme há participação de um amputado das
Há um número cada vez maior de vídeos que podem ser
pernas.
exibidos na sua escola, com personagens com deficiência.
Janela da Alma - Um documentário sobre a deficiên-
Fique atento, pois muitos passam na televisão e você
cia visual, no qual dezenove pessoas com diferentes graus
pode recomendar a seus alunos que os assistam. Esses per-
- da miopia à cegueira total - falam como vêem os outros e
sonagens podem ser objeto de uma discussão em grupo.
como percebem e sentem o mundo. Personalidades como
Relacionamos, abaixo, alguns desses filmes:
Marieta Severo (atriz), Hermeto Pascoal (músico), Arnaldo
À Primeira Vista - Virgil, um homem que ficou cego Godoy (vereador), Evgen Bvacar (fotógrafo e professor de
após um acidente na infância, é convencido por Amy, que estética da Surbone), José Saramago (prêmio Nobel), Wim
por ele se apaixona, a fazer um novo tratamento especial. Wenders (cineasta), Oliver Sachs (neurologista), e muitos
Essa cirurgia é realizada com sucesso e ele recomeça tudo outras fazem surpreendentes e inesperadas revelações so-
de novo, reaprendendo a enxergar à luz do dia e a conhe- bre a visão.
cer a força do amor. King Gimp - Vencedor do Oscar de documentário de
Além dos Meus Olhos - Após alguns anos de casados, curta-metragem, retrata a condição de vida de um jovem
James e Ethel, que são cegos descobrem que não podem com paralisia cerebral.
ter filhos. Quando decidem adotar uma criança, eles têm Lágrimas do Silêncio - Nessa história a personagem,
que enfrentar uma série de barreiras legais - e provar que surda, entrega a filha aos cuidados da avó, até recuperar-
são capazes de cuidar de alguém. -se emocionalmente após a morte do marido. Durante esse
Amargo Regresso - Um retrato realista dos efeitos da tempo, a avó apega-se de tal forma à neta, que requer sua
guerra do Vietnã nas famílias dos soldados americanos. guarda em processo na justiça.
Enquanto seu marido luta no Vietnã, mulher se apaixona León e Olvido - O filme que nos ensina a conhecer
por um soldado paraplégico, amargurado pelas memórias a síndrome de Down - Olvido é uma mulher de 21 anos.
traumáticas da guerra. León, seu irmão, tem síndrome de Down. Faz 4 ou 5 anos
Castelos de Gelo - Patinadora adolescente é desco- que ficaram órfãos e, como única herança, eles têm a casa
berta por famosa treinadora, que transforma a garota em onde moram e um carro velho. Entre eles começa desen-
campeã mundial. No auge da fama, ela sofre acidente, que volver-se, de modo cada vez mais desesperado, um confli-
a deixa cega, tendo de recomeçar do zero, com a ajuda do to: Olvido quer que León aceite morar em um internato ou
namorado. que vá e volte sozinho da escola e se ocupe, pelo menos,
Dançando no Escuro - Uma imigrante tcheca leva uma de suas coisas e de algumas tarefas domésticas; por sua
vida cheia de dificuldades trabalhando nos Estados Unidos, vez, León faz todo o possível para que suas atividades, res-
vivendo numa caravana, com seu filho de doze anos. Ao ponsabilidades e tarefas sejam mínimas e sua irmã cuide
descobrir que está perdendo a visão lentamente, tenta a dele de corpo e alma. O desespero de Olvido vai aumen-
todo custo esconder o fato de todos, principalmente do tando e a tenacidade de León será continuamente posta à
seu filho, porque ela descobre, também, que a doença é prova. Para ambos ocorrem situações muito extremas, das
genética. quais será difícil que eles saiam ilesos.

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Meu Pé Esquerdo - Oscar de melhor ator e atriz coad- Sonata de Outono - Esse filme narra a história de um
juvante. História real do escritor e pintor irlandês Christy pianista e sua relação com as filhas, das quais, uma sofre de
Brown, seqüelado de paralisia cerebral, desde bebê, que doença neurológica degenerativa.
conseguiu pintar e escrever usando para isto, apenas o seu Testemunha do Silêncio - Um casal de irmãos assiste
pé esquerdo. ao assassinato dos pais. O menino tem nove anos e é au-
Mr. Holland: Adorável Professor - Um homem que tista. A polícia pede ajuda a Jake Rainer, um dos melhores
trabalha como professor para sustentar a família, tem um psicólogos especializados no tratamento de crianças autis-
desejo de compor uma sinfonia. Quando sua esposa dá a tas em todo o mundo, para desvendar o crime.
luz ao filho do casal, ele descobre que a criança é surda. Tudo pela Vida - A relação insuportável que uma artis-
Esta descoberta o faz sofrer muito e, então, ele decide or- ta de novela que sofre um acidente, tem com as suas enfer-
ganizar um concerto para pessoas com deficiência auditiva. meiras, que a acompanham no tratamento de recuperação
Nell - Um médico e uma psicóloga que tentam inte- na casa dos pais. Então, começa uma amizade entre a atriz
grar e adequar uma pessoa criada sem qualquer contato e uma dessas enfermeiras.
com o mundo até os trinta anos, sem deixar que ela perca Uma Lição de Amor - O filme acompanha a trajetó-
sua individualidade. Essa pessoa é Nell, que durante sua ria de Sam Dawson, um adulto com a idade mental, a ino-
vida, inclusive,riou sua própria linguagem. cência e a sinceridade de uma criança de sete anos. Um
O Homem Elefante - A história de John Merrick (John homem que o destino quis que se tornasse pai solteiro de
Hurt), um desafortunado cidadão da Inglaterra vitoriana, que Lucy. Embora tivesse dificuldades, com a ajuda de amigos
era portador do caso mais grave de neurofibromatose múlti- muito especiais, Sam conseguiu fazer dos primeiros anos
pla registrado, tendo noventa por cento do seu corpo defor- de vida de Lucy, uma infância repleta de amor e alegria.
mado. Essa situação o leva ser atração em circos de aberra- Uma Mente Brilhante - Um gênio da matemática que,
ções, vítima dessa doença que o deforma, esse homem tenta aos vinte e um anos, formulou um teorema que provou
a todo custo recuperar a sua dignidade (história real). sua genialidade e o tornou aclamado no meio onde atuava.
O Oitavo Dia - Prêmio de melhores atores em Can- Mas aos poucos, o belo e arrogante John Nash se trans-
nes. Ao vagar sem rumo pelas estradas da França, um em- forma em um sofrido e atormentado homem, que chega
presário estressado, por pouco atropela um jovem com da até mesmo a ser diagnosticado como esquizofrênico pelos
Síndrome de Down. O empresário leva-o no seu carro e a médicos, que o tratam. Porém, após anos de luta para se
partir daí nasce uma profunda amizade entre os dois. recuperar, ele consegue retornar à sociedade e acaba sen-
O Óleo de Lorenzo - O filme é baseado em fatos reais. do premiado com o prêmio Nobel.
Conta a história de Lorenzo e da luta dos seus pais para
salvá-lo de uma rara doença, recusando o prognóstico mé- Livros
dico de uma doença incurável, com perspectiva de vida de Cada vez mais estão sendo publicados livros com per-
dois anos. sonagens com deficiência, ou sobre essas pessoas e os di-
Perfume de Mulher - Um ex-capitão cego e amargu- versos tipos de deficiências. Você pode adquiri-los e formar
rado e um jovem contratado para acompanhá-lo em um uma pequena biblioteca sobre o assunto, mas é importante
tour pela Itália. Essa é a história do filme, que mostra a estar atento para recusar aqueles onde as pessoas com de-
amizade entre os dois. O ex-capitão descobre mulheres ficiência são tratadas de forma estereotipada, isto é, com
atrativas, usando seu apurado olfato. O filme mostra va- qualidades sobre-humanas ou então como .coitadinhos.
riados cenários da Itália para ilustrar a condição de um ho- dignos de pena.
mem que está condenado à cegueira, mas pouco disposto
a aceitar suas limitações. Livro de recortes
Prisioneiros do Silêncio - Uma mãe descobre as ma- Os alunos mais velhos também podem ser estimulados
neiras de comunicar-se com seu filho autista, após levá-lo a coletar e colecionar fotografias e recortes de jornais com
à uma instituição especializada. matérias sobre pessoas com deficiência.
Rain Man - Rapaz viaja a asilo a fim de aproximar-se
do irmão autista e herdar toda a fortuna paterna sozinho. Visitas bem-vindas
Em sua viagem de volta, os dois redescobrem os antigos Acreditamos que depois de ter desenvolvido algumas
sentimentos e passam a viver juntos e sem ressentimentos. dessas atividades, seria uma boa idéia convidar pessoas
Sempre Amigos - O filme conta a história de dois adultas, com deficiência, para conversar com a comunida-
meninos e da amizade entre eles. Kewin sofre de distrofia de escolar sobre sua vivência, suas dificuldades e as so-
muscular, e é superdotado. Max, com treze anos, tem pou- luções que encontraram para problemas enfrentados na
ca Inteligência, é muito arredio e não tem amigos, é forte vida. Geralmente, os alunos aproveitam muito bem essas
e grande. Uma grande amizade entre eles se inicia quando oportunidades para fazer todo tipo de pergunta e satisfa-
Kewin e sua mãe se tornam vizinhos de Max. zer sua curiosidade natural.
Simples como amar - Mãe superprotetora que não E as pessoas com deficiência, na sua maioria, têm
aceita a recuperação da filha jovem com leve problema muito prazer neste contato e sentem-se gratificadas em
mental, que volta de uma escola especial, dizendo que ar- participar dessas atividades e poder conversar com a co-
ranjou um namorado. A mãe é contra esse relacionamento, munidade sobre suas necessidades especiais, bem como
mas o amor pode falar mais alto. sobre os suportes que lhes permitem viver na comunidade.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Também as pessoas sem deficiência se beneficiam desta recursos e serviços de que necessitam para que possam
convivência, aprendendo o quanto podemos crescer num acessar, freqüentar e participar dos espaços comuns da
ambiente permeado pela diversidade humana. vida em sociedade.
Especificamente no que se refere ao campo da Educa-
Envolvendo a comunidade ção, entretanto, pretendemos aqui nos aprofundar, deta-
O próximo passo, depois da preparação da turma para lhando com maior objetividade as competências e atribui-
receber colegas com deficiência, é proporcionar uma re- ções, bem como as ações que se encontram envolvidas na
união onde os pais e familiares dos seus alunos possam busca da construção de um sistema educacional inclusivo.
também compartilhar desse novo conhecimento. Nessa re-
união com a família, os alunos poderão relatar as suas ex- Adaptações Curriculares de Grande Porte - Adaptações
periências, os adultos com deficiência poderão falar sobre Significativas
sua experiência de vida, bem como os alunos com deficiên-
cia poderão falar sobre a mudança de atitude dos colegas Sabe-se que cada aluno tem:
de turma, depois de passarem pelo programa anterior de  sua própria história de vida;
sensibilização. Geralmente, as eventuais resistências dos  sua própria história de aprendizagem anterior
pais com relação ao ingressode alunos com deficiência (conjunto de saberes já construídos e aprendidos);
na escola comum são eliminadas quando percebem que  características pessoais em seu modo de aprender.
seus filhos estão compreendendo e convivendo de modo Há os que aprendem melhor por meio da via visual (leitura,
saudável e construtivamente com a deficiência em seu co- filmes, observação, etc.), há os que necessitam maior utili-
tidiano escolar. Obs: (é bom ressaltar que tudo isso deve zação do concreto, bem como os que já operam bem no
ser processo, seja com a presença do aluno ou não, e que nível abstrato...
não seja condi-ção prévia para o ele freqüentar a escola,
para não ser confundido com a concepção à política de Enfim, cada um é diferente do outro, tanto em termos
integração).36 de suas características físicas, sociais, culturais, como de
seu funcionamento mental.
Sabe-se, também, que não há aprendizagem se não
- Adaptações Curriculares
houver um ensino eficiente. Para que haja um ensino pro-
No ajuste do sistema educacional para o acolhi-
dutivo e eficiente, entretanto, há que se considerar as ca-
mento de todos
racterísticas e peculiaridades de cada aluno, que devem
O processo de construção de um sistema educacio-
direcionar as respostas educacionais que o sistema dará a
nal inclusivo é, como já o dissemos anteriormente, res-
cada um e a todos os alunos.
ponsabilidade de todos os que fazem parte da sociedade.
Adaptações Curriculares, portanto, são respostas edu-
Cabe à população, de maneira geral, a conscientização cativas que devem ser dadas pelo sistema educacional, de
de que as pessoas com deficiência fazem parte da socieda- forma a favorecer a todos os alunos e, dentre estes, os que
de, e portanto têm o direito de serem atendidas em suas apresentam necessidades educacionais especiais:
necessidades especiais, no corre-corre de nosso cotidiano.  o acesso ao Currículo;
Da mesma forma, cabe à população interagir digna-  a participação integral, efetiva e bem-sucedida em
mente com as pessoas que apresentam necessidades es- uma programação escolar tão comum quanto possível;
peciais. À administração municipal cabe mapear as pes-  a consideração e o atendimento de suas peculiari-
soas com deficiência existentes na comunidade, identificar dades e necessidades especiais, no processo de elaboração:
suas necessidades especiais, planejar a implementação 1. do Plano Municipal de Educação;
dos ajustes necessários para que se possa acolhê-las e a 2. do Projeto Pedagógico da Unidade Escolar;
elas responder efetivamente, garantindo orçamento para 3. do Plano de Ensino do Professor.
a implementação desses ajustes. Cabe às áreas de aten- As necessidades especiais revelam que tipos de estra-
ção pública (Educação, Saúde, Assistência Social, Trabalho, tégias, diferentes das usuais, são necessárias para permitir
Cultura, Esporte e Lazer, Planejamento e Orçamento, etc.) que todos os alunos, inclusive as pessoas com deficiência,
se ajustarem, de forma a garantir o acesso e a possibilida- participem integralmente das oportunidades educacionais,
de de participação das pessoas com deficiência em todos com resultados favoráveis, dentro de uma programação
os recursos e serviços disponíveis à população. Aos profis- tão normal quanto possível.
sionais cabem as ações técnicas, em cooperação transdis- Algumas dessas estratégias compreendem ações que
ciplinar; aos órgãos de representação, o diagnóstico das são da competência e atribuição das instâncias político-ad-
necessidades, o planejamento de ações que promovam a ministrativas superiores, já que exigem modificações que
inclusão e a fiscalização da ação pública no ajuste da socie- envolvem ações de natureza política, administrativa, finan-
dade; às famílias, a cooperação com os órgãos públicos, ceira, burocrática, etc. A essas, denomina-se Adaptações
profissionais e população em geral, no sentido de acessar Curriculares de Grande Porte.
o espaço comum e dele participar; às pessoas com defi- Outras, compreendem modificações menores, de com-
ciência, conviver digna e respeitosamente na diversidade, petência específica do professor. Elas constituem peque-
explicitando quais são suas necessidades e solicitando os nos ajustes nas ações planejadas a serem desenvolvidas
36 Fonte: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/sensibili- no contexto da sala de aula. A essas, então, se denomina
zacao.pdf Adaptações Curriculares de Pequeno Porte.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Para atender ao conjunto de necessidades educacio-  ser precedidas de uma criteriosa avaliação do alu-
nais especiais do alunado, Adaptações Curriculares de no, considerando sua competência acadêmica;
Grande e/ou de Pequeno Porte podem se mostrar necessá-  fundamentar-se na análise do contexto escolar e
rias em três diferentes níveis do planejamento educacional: familiar do aluno, para a busca de identificação dos ele-
 no âmbito do Plano Municipal de Educação e no mentos adaptativos necessários para o desenvolvimento
do Projeto Pedagógico, tanto do Município como da Uni- do aluno;
dade Escolar;  contar com a participação de uma equipe de apoio
 no âmbito do Plano de Ensino, elaborado pelo multiprofissional no processo de estudo de cada caso, aná-
professor; lise e tomada de decisão;
 no âmbito da Programação Individual de Ensino,  ser registradas documentalmente, integrando o
também elaborada pelo professor. acervo de informações sobre o aluno;
As Adaptações Curriculares no âmbito do Projeto Pe-  evitar, sempre, que as programações individuais
dagógico devem focalizar principalmente a organização sejam definidas, organizadas e realizadas com prejuízo
escolar e a disponibilização de serviços de apoio. Elas de- para o aluno, ou seja, para o seu desempenho, promoção
vem propiciar as condições para que as demais adaptações escolar e socialização.
que se façam necessárias para atender às necessidades es-
peciais de alunos possam também ser implementadas. De maneira geral, as adaptações curriculares de grande
Exemplos de adaptações curriculares promovidas já no porte serão úteis para atender à necessidade especial do
âmbito do Projeto Pedagógico são: aluno quando houver discrepância entre suas necessidades
 a abertura, por parte das instâncias administrati- e as exigências do currículo regular, à medida que se am-
vas, para a flexibilização curricular (de objetivos, de con- plia a complexidade das atividades acadêmicas, no avanço
teúdos, de método de ensino, de estratégias de avaliação, da escolarização.
de temporalidade, de organização), em função do conheci- Não se trata aqui de “abrir mão” da qualidade do ensi-
mento da diversidade de seus alunos; no, ou de empobreceras expectativas educacionais para os
 conseqüentemente, definição de objetivos gerais alunos, mas de permitir a alunos com deficiência que apre-
que levem em conta a diversidade do alunado na unidade sentam necessidades educacionais especiais o alcance de
escolar; objetivos educacionais que lhe sejam viáveis e significati-
 planejamento da realização de análise institucio- vos, em ambiente inclusivo, na convivência com seus pares.
nal, sistemática, do contexto escolar, de forma a identificar
os elementos que interferem na instituição de um ambien- Competências e Atribuições
te escolar inclusivo. No âmbito das atribuições formais, cabe à Secretaria
Municipal de Educação, juntamente com a Direção das
Esta cartilha tratará das Adaptações Curriculares de Unidades Escolares, a responsabilidade de:
Grande Porte, ou seja, daqueles ajustes cuja implementa- 1. mapear a população que será atendida pela rede
ção depende de decisões e de ações técnico-político-ad- escolar;
ministrativas, que extrapolam a área de ação específica do 2. identificar as necessidades especiais presentes
professor, e que são da competência formal de órgãos su- nessa população;
periores da Administração Educacional Pública. 3. identificar quais são as adaptações curriculares de
Há que se adotar alguns cuidados rigorosos antes de grande porte que devem ser providenciadas, de forma a
se indicar a efetivação permitir o acesso e a participação de todos os alunos no
de Adaptações Curriculares de Grande Porte. É impor- cotidiano escolar;
tante que se considere: 4. planejar a implementação dessas adaptações, in-
 a real necessidade do aluno; cluindo providências a serem tomadas a curto, a médio e
 a relação entre o nível de competência curricular a longo prazos;
do aluno e a proposta curricular regular; 5. implementar as adaptações de acesso ao currículo
 o caráter processual do desenvolvimento huma- e as curriculares de grande porte que lhe são de atribuição
no e da aprendizagem, permanecendo aberto para subse- e responsabilidade.
qüentes alterações nas decisões tomadas. Cabe à Direção das Unidades Escolares, a responsabi-
Assim, a implementação de adaptações curriculares de lidade de:
grande porte devem: 1. permitir e prover suporte administrativo, técnico
Há que se enfatizar a importância de que qualquer e científico para a flexibilização do processo de ensino, de
adaptação curricular de grande porte recomendada sirva modo a atender à diversidade;
sempre para o melhor aproveitamento e enriquecimento 2. adotar propostas curriculares diversificadas e
da escolaridade do aluno. abertas, em vez de adotar concepções rígidas e homoge-
É necessário enfatizar também que sempre se deve neizadoras do currículo;
adotar, no estudo de caso, critérios que evitem adaptações 3. flexibilizar a organização e o funcionamento da es-
curriculares de grande porte desnecessárias, especialmente cola, de forma a atender à demanda diversificada dos alunos;
as que implicam em supressão de conteúdos, eliminação 4. viabilizar a atuação de professores especializados e
de disciplinas, ou de áreas curriculares complexas. de serviços de apoio para favorecer o processo educacional.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Leva-se aqui em consideração, o fato de que difi- Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
cilmente as adaptações que se fazem necessárias para a nos com deficiência auditiva:
construção de um sistema educacional inclusivo sejam  provisão de salas-ambiente adequadas para o
possíveis de serem realizadas todas, de imediato. Sabe-se treinamento auditivo, o treino da fala, do ritmo, etc.
que não seria realista supor que todas as modificações fí-  aquisição de instrumentos e de equipamentos
sicas e estruturais, a aquisição de equipamentos e recursos que favoreçam a comunicação e a participação do aluno
diversos, bem como promover a capacitação continuada nas atividades da vida escolar: treinadores de fala, tablado,
de todos os professores, pudessem, de um dia para o ou- softwares educativos específicos, etc.
tro, estar disponíveis.  provisão de ensino da Língua Brasileira de Sinais
Por outro lado, não seria ético estender o processo a tanto para o aluno com deficiência auditiva, como para o
perder de vista no tempo, terminando em um nada... ou professor do ensino comum, e também para as crianças da
seja, na manutenção de um sistema educacional segrega- sala que o quiserem.
tório e ineficiente. É para isso que o planejamento estra-
tégico, tanto da parte do Município, como da parte das
Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
unidades escolares, se faz essencial.
nos com deficiência física:
Tudo se torna possível se metas objetivas e realistas
forem estabelecidas e ações consistentes forem planejadas  adaptação do edifício escolar: rampa simples com
e realizadas. inclinação adequada, rampa deslizante, elevador, banheiro,
Assim, pode-se levar um ano, dois, três, cinco, mas de- pátio de recreio, barras de apoio, alargamento de portas, etc.
ve-se caminhar firme e decididamente na construção do  aquisição de instrumentos e de equipamentos que
sistema que a população brasileira deseja e merece. favoreçam a comunicação e a participação do aluno nas
atividades da vida escolar:
Categorias de Adaptações Curriculares de Grande Porte • mobiliário: cadeiras, mesas e carteiras adaptadas em
Há várias modalidades de Adaptações Curriculares de função das características do aluno;
Grande Porte, definidas pelos elementos curriculares nos • material de apoio para locomoção: andador, colete,
quais se inserem. abdutor de pernas, faixas restritoras, etc.;
• material de apoio pedagógico: pranchas ou presilhas
Adaptações de Acesso ao Currículo para prender o papel na carteira, suporte para lápis, presi-
De responsabilidade da instância político-administra- lha de braço, tabuleiros de comunicação, sinalizadores me-
tiva, tem-se dentre as adaptações de acesso ao currículo: cânicos, tecnologia microeletrônica, sistemas aumentativos
 a criação de condições físicas, ambientais e mate- ou alternativos de comunicação (baseados em elementos
riais para o aluno, em sua unidade escolar: representativos, em desenhos lineares, sistemas que com-
 a adaptação do ambiente físico escolar; binam símbolos pictográficos, ideográficos e arbitrários,
 a aquisição do mobiliário específico necessário; sistemas baseados na ortografia tradicional, de linguagem
 a aquisição dos equipamentos e recursos mate- codificada, etc.), computadores que funcionam por conta-
riais específicos; to, cobertura de teclado, etc.
 a adaptação de materiais de uso comum em sala
de aula; Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
 a capacitação continuada dos professores e de- nos com altas habilidades (superdotação):
mais profissionais da educação;  provisão de ambientes favoráveis para a aprendi-
 a efetivação de ações que garantam a inter-disci-
zagem, como: ateliê, laboratórios, bibliotecas, etc.
plinaridade e a transsetorialidade.
 aquisição de materiais e equipamentos que facili-
Como exemplo de adaptações desse tipo, podemos citar: tem o trabalho educativo: lâminas, pôsteres, murais, com-
putadores, softwares específicos, etc.
Para atender a necessidades especiais comuns em alu- Como se pode constatar, as providências aqui expostas
nos com deficiência visual: são fundamentais para tornar o sistema educacional de um
 organização especial das escolas, de forma a Município realmente aberto e acolhedor para todos, já que
facilitar a mobilidade e evitar acidentes: colocação de ex- tratam de respostas objetivas para necessidades especiais
tintores de incêndio em posição mais alta, colocação de da maioria dos alunos com diferentes deficiências.
corrimão nas escadas, etc. Dada a complexidade que contextualiza estas adapta-
 aquisição de instrumentos e equipamentos que ções e suas implicações para a vida futura do aluno, faz-
favoreçam a comunicação escrita do aluno e sua participa- -se essencial que sejam produto de decisões tomadas não
ção nas diversas atividades da vida escolar: máquina braile, por uma só pessoa, mas por uma equipe de apoio que,
reglete, sorobã, bengala longa, livro falado, softwares edu- se recomenda, seja constituída por representantes da Se-
cativos em tipo ampliado, letras de tamanho ampliado, le- cretaria Municipal de Educação e da Direção da Unidade
tras em relevo, com textura modificada, material didático de Ensino que o aluno focalizado freqüenta, por profissio-
e de avaliação em tipo ampliado e em relevo, pranchas ou nais técnicos especializados e os professores envolvidos no
presilhas para prender o papel na carteira, lupas, computa- atendimento ao aluno, mesmo fora da escola, da família e,
dor com sintetizador de voz e periféricos adaptados, recur- sempre que possível, do próprio aluno com necessidades
sos óticos, bolas de guizo, etc. educacionais especiais.

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Adaptação de Objetivos de ajuda para o uso do dinheiro; onde procurar ajuda? A


A Adaptação de Objetivos se refere à possibilidade quem procurar, em situações na comunidade? De quem
de se eliminarem objetivos básicos, ou de se introduzirem solicitar informações e orientação?
objetivos específicos, complementares e/ou alternativos, Todas essas aprendizagens poderiam constituir obje-
como forma de favorecer que alunos com deficiência pos- tivos de ensino mais significativos para a vida do aluno,
sam conviver regularmente, em sua vida escolar, com seus fazendo da escola um equipamento social mais eficaz na
pares, beneficiando-se o máximo possível das possibilida- missão de socializar o conhecimento já produzido pelo ho-
des educacionais disponíveis. mem, e de favorecer o desenvolvimento da cidadania.
Uma criança com deficiência mental geralmente apre- A decisão de eliminar o domínio das operações com
senta dificuldades para operar no nível abstrato. Isso, en- fração como objetivo de ensino para esse aluno não pode,
tretanto, não pode ser justificativa para que se limite a entretanto, ser decisão somente do professor. Ela tem de
trabalhar com ela conteúdos básicos, do tipo ensino da ser fundamentada na análise ampla do benefício que pode-
discriminação de cores, por anos e anos a fio, mantendo- rá representar para o aluno, tendo como parâmetro a mis-
são da educação. Implica, além disso, procedimentos deta-
-os como objetivos praticamente permanentes no plano de
lhados e cuidadosos de tomada de decisão que recomenda
ensino para o aluno.
a participação de uma equipe de apoio multiprofissional.
Sabemos que há, em cada linguagem científica (ma- Não podemos esquecer que a decisão de se ajustar
temática, ciências, geografia, história, etc.) conteúdos que objetivos de ensino para um determinado aluno não pode
serão importantes para esse aluno no seu processo de de- jamais ser provocada por já termos nos cansado de tentar
senvolvimento do maior nível possível de autonomia na ensinar para alguém que apresenta dificuldades.
administração de sua própria vida. Jamais, também, ela pode ser determinada pelos in-
Assim, um aluno com deficiência mental, com 10 anos teresses do professor, ou da escola, ou da burocracia, etc.
de idade, deveria estar freqüentando a 4a série do Ensino ESSA DECISÃO DEVE SER SEMPRE DETERMINADA PELA
Fundamental, juntamente com as demais crianças dessa ANÁLISE CRÍTICA DE COMO A ESCOLA PODERÁ MELHOR
faixa etária. CUMPRIR COM OS OBJETIVOS EDUCACIONAIS A QUE
No plano de ensino para esse nível de escolaridade, SE PROPÕE, ALIADO AO QUE FOR DE MAIOR BENEFÍCIO
encontra-se, por exemplo, como um dos objetivos, que o PARA O ALUNO EM QUESTÃO.
aluno aprenda a fazer operações com frações.
Para se trabalhar este conteúdo em uma sala do ensino Adaptação de Conteúdos
regular, entretanto, o aluno já deverá ter construído conhe- A terceira Adaptação de Grande Porte é a constituída
cimento sobre quantidade, representação gráfica de quan- de adaptação de conteúdos específicos, complementares
tidade, operações matemáticas básicas, noções básicas da e/ou alternativos, e da eliminação de conteúdos básicos do
teoria de conjuntos (conhecimento do todo e das partes currículo, determinadas pelas adaptações de objetivos já
que o constituem, operações de adição, de subtração, de realizadas.
divisão e de multiplicação de partes e de todos). Assim, se um determinado objetivo for eliminado do
Ora, constata-se que o conteúdo correspondente ao plano de ensino, o conteúdo a ele correspondente será
objetivo em questão encaminhará para a necessidade de também eliminado do processo de ensino e aprendizagem.
se operar, em algum momento, no nível da abstração... Da mesma forma, se novos objetivos forem introduzidos
Haverá, dentre alunos com deficiência mental, os que no plano de ensino para um determinado aluno, os con-
conseguirão dominar muitos dos itens envolvidos nessas teúdos a eles correspondentes passarão também a fazer
parte do processo de ensino e aprendizagem.
operações. Outros encontrarão maior dificuldade desde os
Dessa forma, o professor de uma classe poderá ter de
itens iniciais. Cada um, enfim, apreenderá maior ou menor
trabalhar com um plano de ensino básico para a classe,
nível de conhecimento, dentro do continuum pretendido,
e versões um pouco modificadas desse plano de ensino,
dependendo de suas características pessoais, de sua histó- destinadas a atender a necessidades especiais de um ou
ria de aprendizagem, e dos procedimentos do ensino ado- outro aluno, conforme orientação da equipe de apoio (da
tados. Haverá casos, entretanto, em que aprender a realizar qual ele, professor, também faz parte.)
operações com frações poderá exigir tantos anos de de-
safio e de dificuldades que anulará sua própria função no Adaptações do Método de Ensino e da Organização
desenvolvimento educacional. Didática
Haveria, na área da matemática, conceitos e operações Uma quarta Adaptação Curricular de Grande Porte é a
que lhe seriam mais úteis para o exercício da cidadania e a Adaptação de Método de Ensino e Organização Didática.
aquisição de uma vida com maior qualidade? Haverá casos de alunos cujas necessidades especiais
Veja, um aluno com deficiência mental, que enfrenta exigirão, para sua satisfação, a adoção de métodos bastan-
grandes dificuldades para apreender e operar com conhe- te específicos de ensino. Esses alunos deverão ser orienta-
cimentos abstratos, poderia se beneficiar do ensino das dos por profissionais especializados.
placas de ônibus, de forma que se possa tornar menos de- Ainda nessa categoria encontra-se a organização dife-
pendente para sua locomoção na cidade; da mesma for- renciada da sala de aula, necessária para garantir o aten-
ma, poderia se beneficiar com a aprendizagem do reco- dimento das necessidades especiais de um determinado
nhecimento e utilização do dinheiro, do controle de troco, aluno, o que demanda decisão política, ações executivase
ou mesmo da identificação das situações em que precisa gastos da parte de instâncias administrativas superiores.

113
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Uma outra Adaptação de Grande Porte importante, Adaptação de Sistema de Avaliação


nessa categoria, é a decisão político-administrativa sobre “As adaptações significativas na avaliação estão vin-
o número máximo de alunos que uma sala de aula deve culadas às alterações nos objetivos e conteúdos que foram
comportar. Levantamentos informais em nossa realidade acrescentados no Plano de Ensino ou dele eliminados. Desse
têm mostrado que o número de 25 crianças (sendo destes, modo, influenciam os resultados que levam, ou não, à pro-
um máximo de 2 alunos com deficiência) é o ideal, em ter- moção do aluno e evitam a ‘cobrança’ de conteúdos e habi-
mos de viabilizar uma administração competente da classe lidades que possam estar além de suas atuais possibilidades
inclusiva. Entretanto, um número de até 30 crianças permi- de aprendizagem e aquisição.” (Brasil, 1999, p. 40).
te um bom trabalho de ensino, respeitado o número máxi- Essa categoria de modificação no sistema regularmen-
mo de 2 (dois) alunos com deficiência, na sala. Mais do que te utilizado tem de ser entendida no contexto da função da
isso inviabiliza o acompanhamento individual que o ensino avaliação. Devemos nos lembrar que o principal papel de
responsável requer. um processo de avaliação não é identificar quem é “o me-
Outra adaptação de grande importância é a definição lhor” da classe, ou quem é “o pior” da classe, como nos ha-
da sistemática de trabalho cooperativo entre os professo- bituamos a fazer na história de nossa prática educacional...
res da educação regular e especial. Cada Município deverá Em vez disso, o principal papel da avaliação é dar indi-
testar as diferentes formas possíveis de trabalho coopera- cação de conteúdos ou processos ainda não apreendidos
tivo e integrado de forma a identificar qual delas melhor pelo aluno que devem ser retomados em nosso processo
atende às peculiaridades de cada rede de ensino. de ensinar. Tais informações, esclarecidas por meio de um
No que se refere ao momento de atuação, os professo- processo responsável de avaliação contínua, permitem que
res do ensino regular e especial devem atuar cooperativa- reajustemos constantemente nosso plano e nossas ações
mente durante todo o processo educacional de um aluno de ensino de forma a atender às necessidades dos alunos
com deficiência, desde a fase do planejamento do ensino em seu processo de aprender.
à execução do ensino, ao processo de avaliação e ao enca- Neste contexto, fica mais fácil compreender as adap-
minhamento do aluno para níveis posteriores de escolari- tações no método de avaliação. Veja, professor, um aluno
dade. Assim, ambos devem participar desde a constituição
cego terá grande dificuldade para fazer uma prova escrita,
da equipe de apoio ao processo de inclusão, na qual cada
já que não dispõe de recurso visual necessário para isso.
caso deve ser estudado e onde se deve decidir as adapta-
Por outro lado, dificilmente um professor do ensino re-
ções de grande porte que devem ser implementadas para
gular domina a leitura em braile. A dificuldade, entretanto,
atender às necessidades especiais nele detectadas.
de se proceder à avaliação do aluno pode ser facilmente
resolvida, se for facultado ao professor solicitar que o alu-
Quanto ao como atuar, diversos têm sido os modelos
no cego faça sua prova em braile e, assim que a terminar,
adotados:
leia sua prova em voz alta para o professor! Dessa forma,
1. professor de educação especial apoiando o aluno
com deficiência na sala comum; ele não se diferenciará dos demais, no sentido que estará
2. educador “itinerante” na unidade escolar, perma- igualmente “fazendo” a prova, como também tornará fácil
necendo disponível para assessorar os professores nas di- ao professor acessar o conteúdo produzido pelo aluno.
ficuldades encontradas para a administração do ensino na Essa poderia, na verdade, ser uma Adaptação Curricu-
diversidade: estabelecimento de pequenos ajustes nos ob- lar de Pequeno Porte, já que o professor pode fazer isso
jetivos de ensino, na didática, nos processos e procedimen- com autonomia e com muita facilidade.
tos de avaliação, na garantia do acesso do aluno com ne- Entretanto, a regulamentação existente em algumas
cessidades educacionais especiais ao ensino na sala regular; localidades exige que uma decisão desse tipo seja apro-
3. aluno com deficiência recebendo ensino indivi- vada pelas instâncias administrativas supe-riores, o que faz
dualizado em sala de recursos, no horário inverso. A de- dela, então, uma Adaptação Curricular de Grande Porte.
cisão de qual seria o momento mais adequado deve ser Outra adaptação se refere à decisão administrativa de
tomada em conjunto pelo professor e a equipe técnica da se garantir a homogeneidade etária das turmas de alu-
escola; nos. Assim, a decisão de se manter o aluno com necessida-
4. aluno com necessidades educacionais especiais des educacionais especiais em turma cujos alunos estejam
freqüenta, no período contrário, sala de recursos; na mesma faixa etária que a dele requer decisões dessas
5. o professor intérprete da Língua Brasileira de Si- mesmas instâncias, já que se diferencia das normas estipu-
nais/Língua Portuguesa dará apoio ao professor da classe ladas nos critérios de aprovação de alunos.
comum e aos alunos surdos nela matriculados. Há que se contar com a determinação e a responsabili-
dade políticoadministrativa para que o processo seja efeti-
As possibilidades são inúmeras, e encontram-se aber- vado com seriedade, com critérios claros, bem fundamen-
tas para a criatividade local. O essencial, entretanto, é que, tados, sob a responsabilidade formal do sistema.
seja qual for o modelo implementado, que ele sirva para Fazer adaptações no sistema de avaliação não pode
proporcionar aos alunos uma convivência comum, saudá- ser tomado como “brecha” para aprovação indiscriminada
vel, respeitosa, e de boa qualidade em todos os aspectos: e inconseqüente de alunos, nem para “empurrar’ o aluno
humano, moral, social e técnico-científico. com necessidades especiais para as séries mais avançadas,
até que ele “saia” do sistema.

114
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Pelo contrário, abrir a possibilidade de se adaptar o sis- Adaptações Curriculares de Pequeno Porte - Adap-
tema de avaliação para determinado aluno em função de tações não Significativas
suas necessidades educacionais especiais é uma das prin- Atribuições e Responsabilidades dos Professores
cipais vias para se conseguir avaliar a aprendizagem desse No ajuste do sistema educacional para o acolhi-
aluno com responsabilidade e profissionalismo, e poder, mento de todos
então, promover os ajustes que se tornam necessários no As Adaptações Curriculares de Pequeno Porte (Adap-
processo de ensino para garantir seu desenvolvimento tações Não Significativas) são modificações promovidas no
educacional. currículo, pelo professor, de forma a permitir e promover a
participação produtiva dos alunos que apresentam neces-
Adaptação de Temporalidade sidades especiais no processo de ensino e aprendizagem,
Uma última categoria de Adaptação Curricular de na escola regular, juntamente com seus parceiros coetâ-
Grande Porte encontrasse representada nas Adaptações da neos. São denominadas de Pequeno Porte2 (Não Significa-
Temporalidade. Elas, constituem ajustes no tempo de per- tivas) porque sua implementação encontra-se no âmbito
manência de um aluno em uma determinada série, desde de responsabilidade e de ação exclusivos do professor,
que não se distancie do critério de respeito à faixa etária não exigindo autorização, nem dependendo de ação de
dos alunos. Podem, também, constituir ajustes na caminha- qualquer outra instância superior, nas áreas política, admi-
da de um aluno de uma série para outra, ainda que não nistrativa, e/ou técnica.
esgotado o plano de ensino da classe anterior. Elas podem ser implementadas em várias áreas e mo-
Na realidade, alunos com necessidades educacionais mentos da atuação do professor: na promoção do acesso
especiais devem ter um Plano Individualizado de Ensino, ao currículo, nos objetivos de ensino, no conteúdo ensi-
quando se fizer necessário, podendo ser elaborado com nado, no método de ensino, no processo de avaliação, na
apoio do ensino especial no início de sua vida escolar, e por temporalidade.
ela atualizado continuamente, em função de seu desenvol- A primeira instância na qual o professor deve promo-
vimento e aprendizagem. ver as adaptações que favorecerão a experiência produtiva
da escolaridade para todos os seus alunos é na elaboração
Esse Plano é o ponto fundamental de sua vida escolar,
do Plano de Ensino. Ao fazer isso, o professor deve estar
norteador das ações de ensino do professor e das ativida-
aberto para a constatação da diversidade presente no seu
des escolares do aluno. O Plano deverá, também, ser se-
grupo de alunos e para a ela responder no âmbito da sua
qüencialmente seguido, independentemente da série em
ação pedagógica.
que o aluno se encontre, já que o critério de inserção do
Seu planejamento, assim, deverá considerar a diversi-
aluno na sala de aula regular é a faixa etária do grupo.
dade, estando alerta para as características individuais, o
Em síntese, é importante que o aluno com necessi-
que envolve:
dades educacionais especiais vivencie sua escolaridade De maneira geral, as Adaptações de Pequeno Porte po-
juntamente com seus pares. dem ocorrer nas mesmas categorias que as Adaptações de
O aluno com deficiência ou com altas habilidades, cujas Grande Porte, diferenciando-se principalmente no que se
necessidades educacionais especiais requerem a efetivação refere à instância que por elas é responsável.
de adaptações no Currículo proposto para o ensino regu- Veja, um professor não poderá decidir e realizar, por
lar, deverá contar com um Plano de Ensino Individualizado, sua própria decisão e iniciativa, a adaptação de todos os
elaborado por equipe de apoio multiprofissional envolvida banheiros de uma escola, de forma que os alunos que se
no seu atendimento educacional. locomovem com cadeiras de rodas possam deles se utilizar.
Esse Plano será o norteador das ações pedagógicas Obviamente que o professor irá perceber a necessidade,
dos professores, seja qual for a série na qual ele estiver discutir sobre ela com a direção da unidade escolar, mas
formalmente matriculado. é à Direção que cabe envidar esforços junto às Secretarias
Tais providências dependem, obviamente, de decisões Estadual e Municipal de Educação no sentido de promover
superiores, o que exige que as instâncias da administração a referida adaptação.
educacional se movimentem na direção de regulamentá-
-las e implementá-las, JÁ QUE SÃO RESPOSTAS EDUCA-  a organização do espaço e dos aspectos físicos da
CIONAIS PRIMORDIAIS PARA O SUCESSO DAS AÇÕES DOS sala de aula;
PROFESSORES NAS SALAS DE AULA.  a seleção, a adaptação e a utilização de equipa-
Lembremos que a decisão pela construção de um sis- mentos e mobiliários de forma a favorecer a aprendizagem
tema educacional inclusivo já foi tomada em nosso País, e de todos os alunos;
encontra-se apoiada em nossa legislação.  o planejamento das estratégias de ensino que pre-
Sua efetivação, entretanto, depende dos profissionais tende adotar em função dos objetivos pedagógicos e con-
da educação. seqüentes conteúdos a serem abordados;
Cabe ao professor ensinar na diversidade, com compe-  a pluralidade metodológica tanto para o ensino
tência, tarefa já habitual para ele. como para a avaliação;
Juntos, construiremos um sistema educacional mais  a flexibilização da temporalidade.
digno, justo e acolhedor, na diversidade.37 Assim, nas mesmas áreas poderão se mostrar neces-
37 Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ sárias tanto Adaptações de Grande Porte, as quais deverão
me000448.pdf ser implementadas pelas instâncias político-administrativas

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TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

superiores, como Adaptações de Pequeno Porte, as quais Para o trabalho em grupo, por exemplo, o professor
deverão ser implementadas pelos professores de acordo poderá considerar mais producente agrupar as carteiras
com suas funções e atribuições formais. de modo que uma fique “olhando” para a outra, ou seja,
Haverá alunos que necessitarão de Adaptações de reajustar a posição das carteiras, duas a duas, ou quatro a
Grande Porte em algumas áreas, e nelas não necessitarão quatro. Esta providência é um ajuste mínimo, que pode em
das de Pequeno Porte. Da mesma forma, haverá alunos que muito favorecer o envolvimento dos alunos nas atividades
não necessitarão de Adaptações de Grande Porte, mas que, propostas. Dentre eles, entretanto, pode haver algum que
para usufruir os benefícios da escolaridade, necessitarão de apresente a necessidade de contar com um espaço dia-
Adaptações de Pequeno Porte em algumas, ou mesmo em metralmente maior para se deslocar e poder deslizar para
todas as categorias. o assento da carteira sem maiores riscos, ou com maior
Em síntese, as adaptações deverão ser implementadas, autonomia. Nesse caso, o professor pode garantir que se
garantindo a cada aluno as respostas educacionais de que abra um espaço mais amplo ao lado da carteira que esse
necessita, sejam elas quais forem, bem como de qual natu- aluno vai ocupar.
reza e complexidade o forem. Obviamente que no caso de uma sala de aula que con-
ta com um espaço maior, a distância entre uma carteira e
Ajustes que Cabem ao Professor Realizar outra pode ser de tal monta que torna desnecessário se
No que se refere aos ajustes que cabem ao professor promover ajustes em sua localização. Como isto, entretan-
desenvolver e implementar para garantir o acesso do aluno to, é exceção e não regra em nossa realidade educacional,
com necessidades especiais a todas as instâncias do currí- a efetivação de ajustes na utilização do espaço pode se
culo escolar, encontram-se, de maneira geral: mostrar frequentemente necessária.
 criar condições físicas, ambientais e materiais para A organização do próprio agrupamento pode ser
a participação do aluno com necessidades especiais na sala variada, tanto no que se refere ao tamanho dos grupos,
de aula; quanto aos critérios de homogeneidade e de heterogenei-
 favorecer os melhores níveis de comunicação e de dade. Isto pode permitir condições para a ocorrência de
interação do aluno com as pessoas com os quais convive respostas diferenciadas, seja em função dos objetivos pro-
na comunidade escolar; postos, da natureza dos conteúdos a serem abordados, das
 favorecer a participação do aluno nas atividades necessidades dos alunos, suas características e interesses.
escolares; A organização das atividades de aprendizagem em peque-
 atuar para a aquisição dos equipamentos e recur- nos grupos estimula a cooperação e a comunicação entre
sos materiais específicos necessários; os alunos, o que é interessante para um aluno com neces-
 adaptar materiais de uso comum em sala de aula; sidades educacionais especiais.
 adotar sistemas alternativos de comunicação, para Cabe, também, ao professor, identificar os recursos di-
os alunos impedidos de comunicação oral, tanto no pro- dáticos especiais que alunos seus possam necessitar, para
cesso de ensino e solicitá-los junto à direção da escola, e com ela procurar
 aprendizagem como no processo de avaliação; soluções para o caso do recurso pretendido não se encon-
 favorecer a eliminação de sentimentos de inferio- trar ainda disponível na unidade escolar.
ridade, de menos valia, ou de fracasso. Além dessas adaptações de acesso, genéricas, tem-se
ainda como exemplos de adaptações mais específicas:
Necessidades Especiais e Adaptações Específicas  posicionar o aluno de forma a favorecer sua possi-
Uma das primeiras responsabilidades do professor, bilidade de ouvir o professor;
quanto à tarefa de garantir o acesso de todos os seus alu-  dispor o mobiliário da sala de forma a facilitar a loco-
nos ao conhecimento que lhe cabe socializar, é promover moção e o deslocamento do aluno, e evitar acidentes, quando
os ajustes na utilização do espaço. Eles podem ser impor- este precisar obter materiais ou informações do professor;
tantes para permitir que alunos, por exemplo, que apresen-  dar explicações verbais sobre todo o material
tam dificuldades para se locomover ou que não possuem abordado em sala de aula de maneira visual;
visão funcional, possam se deslocar sem maiores riscos  ler, por exemplo, o conteúdo que escreve na lousa;
pela sala de aula para buscar material no armário, para in-  oferecer suporte físico, verbal e instrucional para a
teragir com a professora, quando esta se encontra distante, locomoção do aluno, no que se refere à orientação espacial
ou para se reunir a colegas, para trabalho em grupo. e à mobilidade;
Um ajuste na organização do espaço(mudar a dis-  utilizar os recursos e materiais adaptados dispo-
posição física de mobiliário) pode se mostrar necessário, níveis: pranchas, presilhas para evitar o deslizamento do
mesmo para um aluno que apresente uma necessidade es- papel na carteira, lupa, material didático de tipo ampliado,
pecial temporária, de forma a permitir que todos possam livro falado, equipamento de informática, materiais des-
se locomover livremente pela sala de aula e participar pro- portivos como bola de guizo, etc.
dutivamente das atividades. Um exemplo dessa situação
é a chegada de um aluno que tenha a perna ou o braço Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
engessados, ou um aluno que esteja em período pósope- nos com deficiência auditiva
ratório, o que exige dele uma movimentação mais lenta e Antes de abordar especificamente a questão da pro-
mais cuidadosa. moção do acesso educacional, por meio de respostas ade-

116
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

quadas para o atendimento das necessidades especiais Considerando que toda aprendizagem é mediada pela
mais comuns em alunos surdos, faz-se necessário relem- linguagem, ela será muito melhor sucedida se a língua uti-
brar alguns aspectos essenciais de sua educação. lizada for compartilhada por todos os que se encontram no
Sabe-se que uma das principais vias de construção de processo educacional.
conhecimento sobre a realidade, de que o homem dispõe, Assim, aprender a língua portuguesa torna-se impor-
é a interação social, instância em que a pessoa compartilha tante para o aluno surdo no Brasil como veículo de acesso
experiências linguísticas, mais ou menos significativas, por ao conhecimento sistematizado, embora essa não possa
meio das quais apreende o significado e a função social ser a única possibilidade a ele oferecida.
dos objetos e dos fenômenos sociais. A modalidade oral e a modalidade escrita da língua
Ora, o aluno surdo não dispõe da via auditiva para re- portuguesa devem ser oferecidas sem serem impostas nem
ceber e responder aos estímulos que constituem parte da automatizadas, principalmente durante a educação infan-
comunicação social. Assim, seu acesso ao conhecimento til. Ambas, entretanto, devem ser oferecidas paralelamente
encontra-se intimamente ligado ao uso comum de um có-
à língua de sinais, configurando uma educação bilíngue
digo linguístico prioritariamente visual, sem o qual ele
(caso essa seja a opção dos pais.)
fica limitado a acessar somente as características físicas do
Cabe, entretanto, lembrarmos que se, por algum moti-
objeto e não as conceituais, já que é na comunicação que o
homem é exposto ao conjunto de significados associado a vo, o aluno não foi beneficiado pelo ensino da modalidade
cada objeto ou fenômeno social. oral durante a educação infantil, e se estiver, principalmen-
Vamos pensar, por exemplo, em uma criança que tenha te, com defasagem idade/série no período da alfabetiza-
vivido em uma comunidade que ainda não foi alcançada ção, deve-se priorizar o uso da língua de sinais e da língua
com os instrumentos da vida moderna; assim, nunca teve portuguesa escrita.
contato com um telefone. Não podemos nos esquecer também de que a língua
Quando, um dia, por alguma razão, sair da comunida- portuguesa será, para o aluno surdo, uma segunda língua,
de e for até uma vila ou a uma cidade, pode ter a oportu- como o é para um estrangeiro que venha para o Brasil,
nidade de encontrar um; pode perguntar a alguém sobre apresentando para ele as dificuldades que são comuns na
o que é aquilo, para que serve, como funciona, bem como aquisição de uma nova língua (como para qualquer outra
pode experimentar usá-lo. Assim, poderá rapidamente pessoa... para você, por exemplo!)
compreender sobre o que é o objeto, para que serve e No sistema educacional regular, a língua portuguesa,
como utilizá-lo, mesmo que intensamente surpreendida. além de se constituir disciplina do currículo, é o elemento
Caso essa mesma criança, entretanto, seja surda e te- que organiza e faz a mediação no processo de desenvolvi-
nha desenvolvido um conjunto de sinais compartilhado mento das demais áreas do conhecimento curricular, uma
somente por algumas pessoas de sua família, o processo vez que é nessa língua que o professor faz sua explanação
poderá ser totalmente diferente! e apresenta o material gráfico.
Imaginemos que, por alguma razão, ela tenha saído de É necessário destacar que, seja qual for a área de co-
sua comunidade pela primeira vez, e tenha ido à mesma nhecimento, um texto estará sempre presente no ambiente
vila com alguém que não conhece bem os sinais necessá- educacional, seja ele materializado na forma oral, na for-
rios para com ela se comunicar. Ao deparar com o aparelho ma escrita, ou na forma sinalizada. Assim, a conversa inicial
telefônico, ele será provavelmente mais um objeto desco- entre professor e alunos, a ordem para fazer alguma ativi-
nhecido para ela. dade, o enunciado de operações e/ou problemas matemá-
Deixando de lado os aspectos emocionais que certa- ticos, as piadas, a experiência desenvolvida no laboratório,
mente estarão presentes nessa situação (especialmente
o livro didático, enfim, inúmeras situações cotidianas em
pelo contato vulnerável com uma grande quantidade de
sala de aula constituem textos significativos, estruturados
coisas por ela desconhecidas), imaginemos o que o obje-
to significaria para ela... sua textura, sua cor, seu tamanho, na língua portuguesa.
seu formato, a sensação dele em suas mãos... mas, como O aluno surdo poderá ter dificuldade de compreensão
iria apreender para que serve esse objeto? Ela pode até desses textos, o que aponta para a necessidade de se uti-
imitar outras pessoas que tenham usado o telefone e fazer lizar a língua de sinais, ou outros códigos visuais. A não
o mesmo gesto. E daí? Que feedback ela teria para esse utilização desses códigos poderá levá-lo à indiferença, ao
gesto? Nenhum, além da percepção proveniente dos seus isolamento, à agressividade ou ao erro. É assim que se
órgãos dos sentidos, não é verdade? Pois então, ela neces- constrói, muitas vezes, a gradativa exclusão do aluno sur-
sitaria da comunicação para poder apreender e construir do, marginalizado por um fracassoque não é dele, mas sim
conhecimento acerca desse objeto. E assim seria, com tudo do contexto que está sendo incapaz de lhe possibilitar o
o mais que constitui a realidade em que vive. aprendizado significativo da língua oficial de seu País.
Por estar biologicamente impedida de adquirir, de Nem sempre o método utilizado pelos professores
forma natural (sem ensino sistematizado e formal), a lín- possibilita ao aluno surdo o acesso às experiências cogniti-
gua portuguesa, a primeira língua da criança surda tor- vas do meio acadêmico. É comum encontrar tentativas de
na-se uma língua constituída de sinais, construída geral- se ensinar a língua portuguesa para alunos surdos, sem o
mente no ambiente familiar, e muitas vezes somente nele respeito ao conteúdo vivencial envolvido, desconsideran-
significativa. É comum sermos informados que “só a mãe do-se seu contexto de produção e reduzindo a língua a um
é que consegue falar com ele; só ela é quem entende o que sistema abstrato, com formas prontas, que se tenta fazer o
ele está querendo”. aluno assimilar, por meio de “treinos” e repetições.

117
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Nesse sistema, a preocupação maior do professor pa- auditiva, etc.; utilizar textos escritos complementados com
rece ser apresentar a estrutura gramatical, garantindo que elementos que favoreçam sua compreensão: linguagem
o aluno unicamente “fixe” a ordenação e a seqüenciação gestual, língua de sinais;
correta das palavras sem maior compromisso com o ensino
da língua viva, elaborada, criativa e comunicativa. Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
A língua de sinais organiza as idéias dos surdos de for- nos com deficiência mental
ma lógica diferente da organização construída por meio do Como é de conhecimento de todos, a deficiência men-
uso da língua portuguesa. tal não é um quadro único, padronizado e caracterizado
Assim, o surdo acaba produzindo uma estrutura gra- igualmente em todos os alunos que a apresentam.
matical diferente, que se reflete nas atividades escritas. Não Geralmente constitui uma dificuldade de abstração, ou
é apenas o fato de o surdo não receber informações audi- seja, uma dificuldade de operar no nível das idéias, do ra-
tivas que interfere nas suas práticas lingüístico-discursivas ciocínio, sem contar com a presença do estímulo concreto.
em português, mas também, o fato de a língua de sinais Essa dificuldade pode se apresentar em vários níveis,desde
estar participando ativamente no processo de elaboração as que se resolvem com algum suporte do professor ou de
discursiva. Ela, portanto, não pode ser desconsiderada ao algum colega, até as que necessitam de intenso e constan-
se elaborar qualquer juízo de valor e critério de avaliação te suporte em diferentes instâncias da vida: pessoal, social,
da produção escrita de alunos surdos. educacional, profissional, etc.
Ao se deparar com um texto elaborado por uma pes- A dificuldade de abstração tem conseqüências práticas
soa surda, o professor deverá manter uma atitude diferen- importantes na vida cotidiana da criança, inclusive na pró-
ciada que não parta das aparentes limitações iniciais, e sim pria aprendizagem do respeito a limites próprios à vida em
das possibilidades que as especificidades dessa construção comunidade.
contemplam; que não busque o desvio da normalidade, Tais circunstâncias não podem ser ignoradas pelo
mas as marcas implícitas e explícitas da diferença lingüísti- professor, já que dele depende o acesso da criança com
ca subjacente. Segue um exemplo de uma situação em que deficiência mental a conhecimentos que lhe permitam o
o aluno mostrou ter conhecimento do elemento geográfi- desenvolvimento e o exercício da cidadania e a apreensão
co focalizado, mesmo não tendo conseguido expressar es- do conhecimento produzido e sistematizado pelo homem.
seconhecimento nos padrões lingüísticos formais da língua Como falar de exercício de cidadania para crianças com
portuguesa: deficiência mental?
Pergunta: O que é uma ilha? Essa é uma questão que freqüentemente circula nas
Resposta: Terra água lado. falas de professores.
O fato de se chamar a atenção para a consideração Nesta conversa perguntaríamos: será que manifestar
desses aspectos diferenciados nas produções escritas dos as necessidades e desejos não é exercer a cidadania? Não
surdos não exime o professor de proceder com as corre- seria exercício da cidadania escolher o produto que vai ad-
ções necessárias, reforçando o modelo correto por inter- quirir no supermercado, na quitanda, tomando como base
médiode exercícios complementares significativos, em sala a análise do preço e da qualidade?
de aula ou extraclasse. Da mesma forma, não seria promoção de cidadania:
A avaliação deve respeitar o progresso individual, con- favorecer com que a criança possa locomover-se com o
siderando-se sempre o estágio inicial do processo educa- maior grau de autonomia possível em sua comunidade?
tivo do aluno surdo. E assim por diante... A escola regular precisa se organi-
Tendo refletido sobre essas questões, fundamentais zar para acolher também os alunos com deficiência mental.
para a compreensão do processo de aprendizagem do Além dos ganhos que eles podem obter em seu processo de
aluno surdo, vamos considerar algumas providências que desenvolvimento e de construção do conhecimento sobre a
podem facilitar seu acesso ao currículo como um todo: realidade, a convivência com parceiros coetâneos, na diver-
apresentar referências importantes e relevantes sobre um sidade que constitui a escola, favorece sua socialização.
texto (o contexto histórico, o enredo, os personagens, a O processo de apropriação do conhecimento pelo alu-
localização geográfica, a biografia do autor, etc.) em lín- no se fundamenta nos conhecimentos que ele já traz con-
gua de sinais, oralmente, ou utilizando outros recursos, an- sigo, representados tanto pelos conceitos cotidianos ad-
tes de sua leitura; promover a interpretação de textos por quiridos informalmente, como pelos que adquiriu em sua
meio de material plástico (desenho, pintura, murais, etc.) escolaridade anterior, quando ela ocorreu. Já quando entra
ou de material cênico (dramatização e mímica); utilizar um na escola sem ter tido qualquer escolarização anterior traz
sistema alternativo de comunicação adaptado às possibi- consigo conceitos espontâneos, fragmentados, ligados à
lidades e necessidades do aluno: língua de sinais, leitura vida diária. Tais conceitos devem ser reorganizados e am-
orofacial, linguagem gestual, etc.posicionar o aluno na sala pliados, com a introdução dos conhecimentos formais.
de aula de forma que possa ver os movimentos do rosto Assim, faz-se essencial que o professor adote, como
(orofaciais) do professor e de seus colegas; utilizar a escrita primeiro passo de sua relação com esse aluno (bem como
e outros materiais visuais para favorecer a apreensão das com qualquer outro), a prática de identificar os conheci-
informações abordadas verbalmente; utilizar os recursos e mentos que ele já possui como ponto de partida do pro-
materiais adaptados disponíveis: treinador de fala, tablado, cesso de ensinar, base para a ampliação e aquisição de no-
softwares educativos, solicitar que o aluno use a prótese vos conhecimentos, em qualquer unidade temática.

118
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Além dessa providência, fundamental para a promoção Explicitar e discutir sobre sentimentos de superiorida-
do acesso do aluno ao conteúdo curricular, há outras mais de, de rejeição dos demais colegas e de isolamento, fa-
específicas sugeridas a seguir: vorecendo a instalação de um clima mais favorável para a
 posicionar o aluno de forma que possa obter a ocorrência de interações e o estabelecimento de relações
atenção do professor; sociais estáveis;
 estimular o desenvolvimento de habilidades de explicitar e discutir sobre sentimentos de mágoa e
comunicação interpessoal; comportamentos de esquiva dos colegas, com o mesmo
 encorajar a ocorrência de interações objetivo do item anterior;
estimular o envolvimento em atividades cooperativas;
 identificar e oferecer o suporte de que a criança
estimular a persistência na tarefa;
necessita para freqüentar, em segurança, os espaços co-
estimular o desenvolvimento de pesquisas.
muns que constituem a comunidade em que vive?
 assegurar-lhe conhecimento para utilização do di- Categorias de Adaptações Curriculares de Pequeno Porte
nheiro, ou para a busca da ajuda de que necessita para não As Adaptações Curriculares de Pequeno Porte, de atri-
ser enganado? buição e responsabilidade exclusivas do professor, em
 estimular o desenvolvimento de habilidades de suas ações na sala de aula, podem se dar nas mesmas ca-
autocuidado; tegorias que as de Grande Porte, com a diferença de que
 estimular a atenção do aluno para as atividades estas são da alçada da instância político-administrativa, já
escolares; que envolvem decisões que fogem do âmbito de compe-
 estimular a construção de crescente autonomia do tência do professor.
aluno, ensinando-o a pedir as informações de que neces- Optamos por apresentar cada categoria, exemplifi-
sita, a solicitar ajuda, enfim, a se comunicar com as demais cando, a seguir, alguns dos ajustes que o professor pode
pessoas de forma que estas sejam informadas de sua ne- promover para atender a necessidades especiais de alunos
cessidade e do que esteja necessitando; com deficiência.
 oferecer um ambiente emocionalmente acolhedor
para todos os alunos. Adaptação de Objetivos
Estas adaptações se referem a ajustes que o professor
pode fazer nos objetivos pedagógicos constantes de seu pla-
Para atender a necessidades especiais comuns em alu-
no de ensino de forma a adequá-los às características e con-
nos com deficiência física
dições do aluno com necessidades educacionais especiais.
A grande maioria dos alunos com deficiência física
O professor pode priorizar determinados objetivos
apresenta como necessidade especial para o acesso ao para um aluno, caso essa seja a forma de atender às suas
currículo ajustes no ambiente físico, tais como: necessidades educacionais. Assim, o professor pode inves-
 utilizar os recursos ou equipamentos disponíveis tir mais tempo, ou utilizar maior variedade de estratégias
que favoreçam a comunicação dos que estiverem impedi- pedagógicas na busca de alcançar determinados objetivos,
dos de falar: sistemas de símbolos (livro de signos, dese- em detrimento de outros, menos necessários, numa escala
nhos, elementos pictográficos, ideográficos e/ou outros, de prioridade estabelecida a partir da análise do conheci-
arbitrários, criados pelo próprio professor juntamente com mento já apreendido pelo aluno, e do grau de importância
o aluno, ou criado no ambiente familiar, etc.), auxílios físi- do referido objetivo para o seu desenvolvimento e a apren-
cos ou técnicos (tabuleiros de comunicação, sinalizadores dizagem significativa do aluno.
mecânicos, tecnologia de informática); Como um exemplo desse tipo de adaptação, o profes-
 utilizar textos escritos complementados por mate- sor poderá priorizar o ensino de formas alternativas de co-
rial em outras linguagens e sistemas de comunicação (de- municação para um aluno com paralisia cerebral espástica
senhos, fala, etc.). severa, impossibilitado de segurar o lápis mesmo quando
 posicionar o aluno de forma a facilitar-lhe o des- ele for engrossado por fita adesiva, em detrimento do en-
locamento na sala de aula, especialmente no caso dos que sino da escrita com lápis, em papel. Um aluno com parali-
utilizam cadeiras de rodas, bengalas, andadores, etc.; sia cerebral espástica severa terá enorme dificuldade para
executar os movimentos que são necessários para escre-
 utilizar recursos ou equipamentos que favore-
ver no papel. Ficar exigindo dele tais movimentos é não só
çam a realização das atividades propostas em sala de aula:
frustrante e estressante, como totalmente desnecessário,
pranchas para escrita, presilhas para fixar o papel na cartei- já que ele pode se comunicar por outras vias, tais como
ra, suporte para lápis (favorecendo a preensão), presilha de gestualmente (montando a mensagem que deseja comu-
braço, cobertura de teclado, etc. nicar por meio da utilização do livro de signos), por meio
da digitação em teclado aumentado de computador, etc.
Alguns poderão apresentar também uma deficiência Escrever, para um aluno com paralisia cerebral espástica
mental, o que deverá ser identificado para que as respostas severa, pode ser um objetivo de extrema dificuldade para
educacionais atendam a todas as suas necessidades. ser alcançado; comunicar-se, entretanto, pode ser um ob-
jetivo totalmente viável, desde que o professor encontre a
Para atender a necessidades especiais comuns em alu- forma adequada para as características desse aluno, deter-
nos com altas habilidades (superdotação) minantes das necessidades educacionais especiais.

119
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

No caso de alunos surdos, não oralizados, deve-se Será que ficar copiando um tema da lousa favorece a
considerar a necessidade de se alterarem objetivos vincula- aprendizagem?
dos à oralidade, adequando-os às formas de comunicação Será que esta seria a única forma de abordar esse as-
do aluno. sunto?
O professor poderá também acrescentar objetivos Ou ainda, será que repetir, em voz alta, o que está escri-
complementares relacionados aos objetivos postos para o to na lousa ajuda a dar significado ao conteúdo focalizado?
grupo. Esse pode ser o caso da ampliação dos componen- Será que o professor não poderia variar um pouco as
tes curriculares, procedimento comum no ensino de alunos estratégias de que se utiliza, em função da natureza dos
com deficiência mental, e dos programas de aprofunda- conteúdos que vai abordar?
mento ou de enriquecimento curricular, propostos para Será que uma estratégia única funciona bem com todos
alunos com superdotação. os alunos?
Será que ele não poderia adotar estratégias diferentes
Adaptação de Conteúdos com alunos ou grupos que delas necessitassem, de forma
Os tipos de adaptação de conteúdo podem ser a prio- que todos os alunos da classe pudessem ter a mesma opor-
rização de tipos de conteúdos, a priorização de áreas ou tunidade para apreender o conhecimento que ele está que-
unidades de conteúdos, a reformulação da seqüência de rendo socializar?
conteúdos, ou ainda, a eliminação de conteúdos secundá- Essas, dentre muitas outras, seriam questões que pode-
rios, acompanhando as adaptações propostas para os ob- riam muito bem se aplicar à análise de qualquer processo
jetivos educacionais. de ensino. Seriam também questões que podem sinalizar
Assim, o conteúdo a ser trabalhado com o aluno será ajustes que vão se mostrando necessários para atender a
sempre delineado pelos objetivos postos no plano de ensi- características específicas dos diferentes alunos em seu pro-
no. Entretanto, a ordem em que o conteúdo e suas subdi- cesso de apreender e construir conhecimento.
visões são apresentados, a prioridade que o professor dará Muitas vezes, para responder efetivamente às necessi-
às diferentes unidades, áreas, itens dades educacionais especiais de alunos, faz-se necessário
e subitens do plano de ensino, bem como a ênfase modificar nossos procedimentos de ensino, tanto introdu-
que dará a um item do conteúdo, em detrimento de outro, zindo atividades alternativas às previstas, como introduzin-
é de sua competência decidir, sempre em função das do atividades complementares àquelas que havíamos origi-
necessidades especiais presentes. nalmente planejado.
Assim, por exemplo, ao partir de um objetivo de ensino
Adaptações do Método de Ensino e da Organização Di- “ao final desta aula os alunos deverão ser capazes de des-
dática crever pelo menos três tipos de folhas”, o professor pode
Adaptar o método de ensino às necessidades de cada planejar utilizar-se de um álbum de folhas, por meio do qual
aluno é, na realidade, um procedimento fundamental na possa mostrar para os alunos os tipos que planejou ensinar.
atuação profissional de todo educador, já que o ensino não Para alunos com baixa visão, ou para alunos cegos,
ocorrerá, de fato, se o professor não atender ao jeito que será certamente necessário que o professor descreva ver-
cada um tem para aprender. Faz parte da tarefa de ensinar bal e minuciosamente as características de cada folha; pode
procurar as estratégias que melhor respondam às caracte- também ser necessário favorecer com que eles manipulem
rísticas e às necessidades peculiares a cada aluno. folhas, mesmo que feitas em argila, de forma que possam
Há professores que adotam sempre o mesmo ritual em perceber suas características; já para alunos surdos, cuja
sala de aula: ao chegar, fazem a chamada, levam aquele perda auditiva impede a realização de associações e análi-
“papo” introdutório de boas-vindas e de identificação da ses da mesma forma que as pessoas ouvintes, recursos vi-
data e do dia da semana, recolhem as tarefas, corrigem suais alternativos devem ser sempre utilizados para que não
as tarefas e passam então para a “apresentação” do novo haja prejuízo na aprendizagem; assim, o professor pode ter
conteúdo; escrevem a matéria na lousa, instruindo os alu- de utilizar textos escritos, além de mostrar as características
nos para copiá-la. Após terminar a atividade de passar a do objeto em questão; pode, também, ter que usar dife-
matéria começam a ler o que está escrito na lousa. Após rentes formas de comunicação, como por exemplo: gestos,
terminada a leitura, muitas vezes tida como explicação, mímica, dramatização, desenhos, ilustrações, fotografias,
passam exercícios para os alunos fazerem. Enquanto eles recursos tecnológicos (vídeo, TV, retroprojetor, computa-
fazem a atividade, o professor às vezes vai andando pela dor, slides, etc.), leitura labial.
classe, cuidando para que a disciplina e o silêncio se man-
tenham. Após o tempo que acha adequado, passa à corre- Para alunos com baixa audição, ou para aqueles que
ção dos exercícios, às vezes na lousa, às vezes individual- utilizam prótese auditiva (aparelho para ouvir), talvez o pro-
mente, pedindo a cada aluno que leve seu caderno até a fessor só precise se lembrar de checar se o aluno está usan-
mesa do professor. do a prótese, se ela se encontra ligada e adequadamente
Quais os problemas que você veria neste tipo de pro- colocada.
cedimento? Certamente está pensando: Para alunos com grande dificuldade de abstração, a
Será que ele sabe qual o nível de conhecimento de utilização do material concreto, bem como a promoção de
cada aluno sobre esse assunto para poder planejar quais oportunidades diversificadas de se abordar o mesmo as-
os passos a adotar? sunto pode ser importante (exercícios de identificação das

120
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

folhas, de associação de ideias, de qualificação das carac-  possibilitar que o aluno com severo comprometi-
terísticas); para crianças com dificuldades de atenção con- mento dos movimentos de braços e mãos se utilize do livro
centrada, usar jogos dos quais elas gostem para introdução de signos para se comunicar, em vez de exigir dele que
e elaboração de ideias acerca dos diferentes tipos de folha escreva com lápis, ou caneta, em papel;
existentes poderia ser motivador e estimular a atenção ne-  possibilitar que o aluno cego realize suas avalia-
cessária para os detalhes de suas características. ções na escrita braile, lendo-as então, oralmente, ao pro-
Alunos com superdotação podem necessitar de opor- fessor;
tunidades para desenvolver estudos de observação, de  nas provas escritas do aluno surdo, levar em con-
descrição sistemática e mesmo experimentos em laborató- sideração o momento do percurso em que ele se encontra,
rio focalizando as folhas, sua função vital, suas proprieda- no processo de aquisição de uma 2ª língua, no caso, a lín-
des, características, etc. gua portuguesa.
Alunos com deficiência mental podem necessitar tan-
to de atividades alternativas às originalmente propostas, Nas etapas iniciais de sua aprendizagem, ela prova-
como de atividades complementares. velmente estará muito mais marcada pelas características
Tais respostas, entretanto, somente poderão ser ade- da língua de sinais, enquanto que nas etapas finais, esta-
quadas às necessidades dos alunos, se o professor man- rá mais próxima do português, ainda que com peculiari-
tiver uma postura de atenção às peculiaridades que cada dades. O professor, em sua avaliação, deve observar se a
um apresenta em seu processo de aprendizagem. mensagem tem coerência lógica, apresentando um enredo
O uso de atividades que impliquem em diferentes com princípio, meio e fim, em vez de se ater unicamente à
graus de dificuldade pode permitir diferentes possibilida- seqüência estrutural das orações. O professor poderá ob-
des de execução e de expressão para alunos com diferen- servar uma estrutura de frase menos complexa, um menor
tes níveis de desenvolvimento e de conhecimento. número de verbos por enunciado, um menor número de
Outros ajustes que também podem se mostrar ade- orações e de encadeamento de frases, menos adjetivos,
quados para responder a necessidades educacionais espe- advérbios e pronomes, com uma maior incidência de pa-
ciais de alunos são: uso de tipos variados de atividades, tais lavras significativas. Poderá ainda observar um vocabulário
como desenvolvimento de pesquisa, elaboração e desen- mais restrito, tanto no que se refere ao número de palavras
volvimento de projeto, oficinas, visitas, esclarecimento do diferentes, como ao número total de palavras utilizadas.
significado de palavras que lhes sejam desconhecidas, etc. Soma-se a isso uma limitação na complexidade de relações
Uma outra adaptação no método de ensino é a modifi- semânticas apresentadas (objeto, sua localização, a quem
cação do nível de complexidade das atividades. Nem todos pertence, etc.), sendo mais freqüente o uso de substantivos
os alunos conseguem apreender um determinado conteú- significativos e de verbos no presente. Essas características
do se ele não lhe for apresentado passo a passo, mesmo serão mais acentuadas em alunos que se encontram nas fa-
que o “tamanho” dos passos precise ser diferente de um ses mais iniciais da aprendizagem do português. Sua iden-
aluno para outro. tificação, entretanto, deve servir de sinalizador para novos
Assim, o professor tanto pode precisar eliminar com- ajustes no planejamento do ensino para esse aluno.
ponentes da cadeia que constitui a atividade, como dar
nova sequência à tarefa, dividindo a cadeia em passos A importância da avaliação, sua finalidade e objetivos
menores, com menor dificuldade entre um e outro, etc. ou, para quê e por quê avaliar.
Outra categoria de adaptação no método de ensino A avaliação, enquanto processo, tem como finalida-
encontra-se representada pela adaptação de materiais uti- de uma tomada de posição que direcione as providências
lizados. São vários os recursos e materiais que podem ser para a remoção das barreiras identificadas, sejam as que
úteis para atender às necessidades especiais de vários tipos dizem respeito à aprendizagem e/ou à participação dos
de deficiência, seja ela permanente, ou temporária. educandos, sejam as que dizem respeito a outras variáveis
O professor poderá também ter de fazer modificações extrínsecas a eles e que possam estar interferindo em seu
na seleção de materiais que havia inicialmente previsto em desenvolvimento global.
função dos resultados que esteja observando no proces- A tradicional finalidade de controle, por meio da ava-
so de aprendizagem do aluno. O ajuste de suas ações pe- liação como aferição realizada no dia da prova ou dos exa-
dagógicas tem sempre de estar atrelado ao processo de mes, é substituída por práticas de contínuas observações,
aprendizagem do aluno. registros e análises do que for coletado, em todos os espa-
ços de aprendizagem, particularmente, na escola.
Adaptação do Processo de Avaliação Para planejar o seu fazer pedagógico e estabelecer ob-
Outra categoria de ajuste que pode se mostrar neces- jetivos, o professor precisa conhecer as necessidades de
sária para atender a necessidades educacionais especiais seus alunos.
de alunos é a adaptação do processo de avaliação, seja por Mas sua tarefa como permanente avaliador não se en-
meio da modificação de técnicas, como dos instrumentos cerra na identificação das referidas necessidades pois, a
utilizados. Alguns exemplos desses ajustes: partir do seu conhecimento, dentre outras, fazem-se ne-
 utilizar diferentes procedimentos de avaliação, cessárias, na escola, providências para:(a)reorientar o pro-
adaptando-os aos diferentes estilos e possibilidades de ex- cesso ensinoaprendizagem;(b) garantir formação continua-
pressão dos alunos; da de todos os que trabalham na comunidade escolar; (c)

121
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

encaminhar os educandos aos atendimentos de que neces- A avaliação implica, sempre, na relação entre quem ava-
sitam, em benefício de sua aprendizagem e participação;(d) lia(avaliador ou avaliadores) e quem é avaliado, cabendo ao(s)
prover os recursos necessários à melhoria da qualidade de primeiro(s)apreciar, refletir, analisar determinados aspectos-
sua resposta educativa e (e)criar as condições necessárias à o que será avaliado- considerados como significativos.
inclusão, a partir da mudança de atitudes frente às diferen- Se há avaliação, há julgamento. Este se processa em
ças, pois a valorização da diversidade está na base de todos um contexto de valorização, o que requer os devidos cui-
os movimentos pela inclusão (Dens7, 1998). dados com o uso do poder e com a maior ou menor in-
Considerando-se que os professores, em sua maioria, fluência da subjetividade no ato de julgar.
não têm acesso garantido à literatura sobre avaliação e às Em outras palavras, no processo avaliativo que é inten-
questões que o tema tem suscitado, é de compreender que cional haverá, sempre, uma tríade composta de avaliador,
avaliem de forma inadequada, ainda que desejando fazer avaliado e do (s) aspecto (s) que, nele, se quer conhecer,
o melhor. Eles próprios mostram-se insatisfeitos com o uso compreensivamente, indo-se muito além da simples toma-
de medidas, embora sem saber com clareza, como avaliar, da de informações.
o que avaliar e qual a função da avaliação, inclusive de suas Para melhor julgar as complexas relações que se es-
próprias atividades, na prática pedagógica. tabelecem entre os componentes da tríade, tendo como
Demo(1988) refere-se à avaliação qualitativa; Hof- finalidade melhorar o que precisa ser mudado, fazem-se
fmann (1993)à avaliação mediadora; Giné (1999) à avalia- necessárias e urgentes algumas providências como:
ção psicopedagógica; Fonseca (1999) à avaliação psicope- • a ressignificação da função da avaliação, pelo profes-
dagógica dinâmica; Hadji (2001) à avaliação instituída, to- sor e pelos demais avaliadores;
dos enfatizando os reais objetivos da avaliação que devem • a participação do aprendiz que, em vez do medo dos
estar comprometidos com o projeto pedagógico. resultados, terá interesse em auto-avaliar-se, bem como
Apropriadamente Hadji (op.cit.), como já comentado em colaborar no processo avaliativo, na certeza de que ele
anteriormente, afirma que a avaliação deve ser formativa contribuirá para seu progresso;
porque informativa, subsidiando as mudanças que se fa- • a participação da família;
zem necessárias para garantir o sucesso na aprendizagem
• a escolha cuidadosa de procedimentos e instrumentos;
e no processo educativo.
• se for o caso de se usarem indicadores, que sirvam
Este é mais um de seus objetivos: subsidiar com in-
como pistas, como sinalizadores e não como itens de um
formações acerca das potencialidades e dificuldades dos
instrumento no qual se assinala a presença ou a ausência
alunos, das condições em que ocorre sua aprendizagem
do fato ou fenômeno observado ou, o que seria pior, para
seja na escola, como um todo, seja na sala de aula que
atribuir-lhes pontos;
freqüenta.
E, como diz Castro (1992) citado por Melchior(op.cit.) • a utilização das análises em ações de melhoria do que
“a avaliação não deve ser vista como uma caça aos incom- tiver sido avaliado.
petentes, mas como busca de excelência pela organização Todos esses cuidados servirão para o aprimoramento
escolar como um todo”(p.17). do projeto político pedagógico da escola e, em decorrên-
Em síntese, a função da avaliação e que a torna uma das cia, de suas ofertas educativas, particularmente quanto à
mais importantes práticas para a elaboração do projeto po- intensidade dos apoios que precisam ser oferecidos aos
lítico-pedagógico de qualquer escola é a de transformação. alunos, ao longo de sua escolarização.
Atualmente, propõe-se avaliar a avaliação como princí- No âmbito educacional escolar, a avaliação deve ter
pio, tendo como finalidades e objetivos promover mudan- sempre a característica de processo, de um caminho e não
ças, para melhor, seja: nas atitudes dos educadores frente de um lugar, porque implica numa sequência contínua e
à facilidade em aprender ou em relação às dificuldades de permanente de apreciações e de análises qualitativas, com
muitos alunos; nos processos utilizados para a constru- enfoque compreensivo. Assim sendo, convém evitar as ati-
ção de conhecimentos ou nas atividades desenvolvidas, tudes maniqueístas dos juízos de valor em termos de bom/
buscando-se alternativas diversificadas, sempre visando a mau, certo/errado, que descaracterizam os objetivos a se-
atingir todos os níveis de concretização da intencionalida- rem alcançados.
de educativa. Dessas afirmativas podem ser extraídas outras:
Como menciona L uckesi(1996) (op.cit)”epistemologi- (a) na escola todos são avaliadores e avaliados, sem
camente a avaliação não existe por si, mas para a atividade que possamos estabelecer e determinar quem são uns e
a qual serve, e ganha as conotações filosóficas, políticas e outros porque, na verdade todos são avaliadores e tudo o
técnicas da atividade que subsidia”. que fazem pode ser considerado como objeto de avaliação;
Em outras palavras, a avaliação, definitivamente, há (b) as apreciações, como análises qualitativas, devem
que servir para auxiliar e orientar os educadores na tomada envolver todos os atores, bem como suas ações, suas his-
de decisões que contribuam para o aprimoramento de res- tórias, suas interações, necessidades, expectativas e, ainda,
postas adequadas às necessidades dos alunos. os contextos em que se inserem;
(c) a avaliação não deve ser reduzida a um momento
Avaliadores e avaliados ou quem avalia, a quem avalia, escolhido para este fim, nem às técnicas a serem utilizadas;
o que avalia, como e com que. (d) na condição de processo contínuo, permanente e
A avaliação faz parte do nosso dia-a-dia e aplica-se a compartilhado, a avaliação não diz respeito ao aluno e ape-
qualquer prática, seja ela educacional, social ou outra. nas a ele;

122
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

(e) devem ser analisados todos os aspectos do proces- Caso prevaleça a referência criteriada, também esses
so de ensino e de aprendizagem, o que implica, necessa- alunos estarão em desvantagem pois, por mais que se te-
riamente, avaliar o contexto em que se realiza: o “clima” da nham desenvolvido e aprendido, provavelmente não terão
escola e da sala de aula, os recursos didáticos, o mobiliário, conseguido atingir todos os objetivos do ensino ministrado,
o projeto curricular, os objetos do conhecimento, os espa- usados como critérios para aferição do rendimento escolar.
ços físicos, os apoios, dentre outros; Como a maioria das provas e exames fundamentam-se
(f) no caso da identificação de necessidades educacio- em procedimentos estatísticos e se baseiam em compara-
nais, elas tanto dizem respeito ao aprendiz quanto ao con- ções dos avaliados entre si e/ou no julgamento do quanto
a maioria dos alunos conseguiu alcançar em determinados
texto em que a aprendizagem ocorre e
objetivos, esses procedimentos, consideradas as verdadei-
(g) a identificação dessas necessidades deve impul-
ras finalidades da avaliação, pouco ou nada subsidiam na
sionar a comunidade escolar às providências cabíveis para
definição de mudanças.
satisfazê-las. Numa breve retrospectiva histórica do trabalho que
Segundo as Diretrizes Nacionais para a Educação Espe- ainda vem sendo desenvolvido por muitas equipes de ava-
cial na Educação Básica (op.cit.) liadores da educação especial, além das considerações aci-
“Para a identificação das necessidades educacionais ma, referentes à avaliação normativa e à criteriada, cabem
especiais dos alunos e a tomada de decisões quanto ao algumas outras:
atendimento necessário, a escola deve realizar, com asses- (Ysseldyke, 1991; Giné, 1999; Fonseca,1999, Edler Car-
soramento técnico, avaliação do aluno no processo de en- valho, 2000):
sino e de aprendizagem, contando, para tal com: • a administração de testes psicológicos8, dentre ou-
I- a experiência de seu corpo docente, diretores, coor- tros procedimentos, tem feito parte da avaliação, qualifica-
denadores, orientadores e supervisores educacionais; da como diagnóstica;
II- o setor responsável pela educação especial do res- • o uso desses instrumentos, de referência normativa9,
pectivo sistema; é exclusivo de psicólogos profissionais que, geralmente,
III- a colaboração da família e a cooperação dos ser- não fazem parte dos quadros das Secretarias de Educação,
viços de saúde, Assistência Social, Trabalho, Justiça e Es- o que sempre dificultou sua presença “oficial” na rede pú-
porte, bem como do Ministério Público, quando necessário blica governamental de ensino10;
• os resultados da avaliação diagnóstica, pretensamen-
(Art.6°).
te úteis aos professores, para auxiliá-los na compreensão
das necessidades dos alunos e elaboração de planos de
Os avaliadores ou quem avalia.
educacionais, não têm servido a esses objetivos;
Quando os professores, em geral, avaliam a aprendi- • diferentemente do que se pensava e gostaria, as in-
zagem de seus alunos o fazem como aferição, o que já foi formações obtidas têm servido para aumentar os precon-
objeto de análise anterior, neste texto. ceitos e reforçar a falsa idéia que um quociente intelec-
A ideia de que a avaliação é medida dos desempe- tual – Q I-, e/ou Idade Mental – IM - baixos, por exemplos,
nhos dos alunos está fortemente enraizada no imaginário são determinantes de aprendizagens igualmente baixas ou
dos educadores e dos aprendizes. Tanto, que a presença qualitativamente pobres;
de alunos com deficiências em turmas regulares faz com • a maioria dos testes utilizados, de base clínica, pouco
que muitos professores, dentre outras inquietações que o contribuem para a tomada de decisões nos aspectos cur-
trabalho com esses educandos lhes acarretam, manifestem riculares ou de prática pedagógica, principalmente se não
as dificuldades que sentem em “dar provas”, corrigi-las e forem ressignificados – particularmente na interpretação
atribuir notas, usando os mesmos critérios que são usados dos dados que oferecem-, com vistas à educação escolar;
para os “outros” ditos normais. • de igual modo, os contextos da aprendizagem tan-
Estão aí configurados dois importantes aspectos: o to em casa como e, principalmente, na escola nem sem-
instrumento de avaliação propriamente dito – a prova- e pre são devidamente considerados, fazendo com que os
a nota-como tipo de avaliação de referência normativa e diagnósticos sejam formulados com base nos resultados
criteriada (Hadji, op.cit.p.17/18). absolutos dos testes usados, nas informações colhidas em
breves entrevistas e nas observações do comportamento
O professor do ensino comum percebe que o instru-
do avaliado, circunscritas ao espaço restrito das salas de
mento pode ser inadequado para determinados alunos
exames usadas pelos avaliadores;
com necessidades educacionais especiais (embora reco- • as condições em que a avaliação diagnóstica ocorre,
nheça que também o é, para os outros) e preocupa-se em geralmente são artificiais, fora do cotidiano dos avaliados,
como adaptá-lo para, de algum modo, conhecer o que o o que interfere em sua performance;
aluno aprendeu. • o próprio linguajar do avaliador, que segue instru-
Se na concepção de avaliação do professor predomi- ções padronizadas, pode ser outra limitação que mascara o
nar a referência normativa, segundo a qual a avaliação da potencial real do avaliado;
aprendizagem permite situar uns indivíduos em relação a • mesmo sendo examinado por vários profissionais da
outros, os alunos com deficiências ou com distúrbios de educação especial, eles dificilmente se reúnem para a dis-
aprendizagem estarão em desvantagem ao serem compa- cussão dos casos e para construir sugestões para o traba-
rados com os outros colegas. lho pedagógico;

123
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

• a formação inicial e a continuada de nossos professo- toda uma outra narrativa sendo construída para a avaliação
res e gestores não os instrumentalizou para a compreensão da aprendizagem, no ensino regular, a educação especial
das informações resultantes da aplicação dos testes psico- também precisa rever a sua. Não é justo para o aluno, nem
lógicos(não só os de inteligência, mas os de personalidade, satisfaz o profissional apenas encaminhá-lo, ficando-se, na
dentre outros); maioria dos casos, sem saber o que ocorrerá com ele du-
• o mesmo aplica-se à formação dos psicólogos que, rante seu atendimento nas referidas salas.
quando não têm o curso de formação de professores, tam- Em termos mais abrangentes, a proposta de educação
bém se sentem constrangidos em fornecer orientações de inclusiva ainda exige inúmeros debates entre todos os edu-
natureza pedagógica, pois sua formação é, predominante- cadores. As interpretações do que seja essa proposta são
mente, voltada para práticas terapêuticas; muito controvertidas, mesmo para os que atuam na educa-
• de modo geral, na tradição da educação especial, ção especial e que criticam suas práticas excludentes.
a avaliação diagnóstica, geralmente realizada em equipe Prevalece o equívoco de que educação inclusiva é uma
multiprofissional, com médico, psicólogo e assistente so- proposta dirigida, apenas, ao alunado da educação especial.
cial, tem servido para a triagem, isto é para informar se o Todas essas questões, em torno das quais não há con-
aluno deverá ser ou não encaminhado para atendimento senso, representam sérios impasses, particularmente, para
educacional especializado, em classes e escolas especiais; as finalidades e objetivos que se esperam da avaliação.
• mesmo com os avanços quanto à composição das Para evitar mal-entendidos, cumpre sublinhar que não
referidas equipes, nela inserindo-se pedagogos, fonoau- se pretende desvalorizar a contribuição que os profissio-
diólogos, terapeutas ocupacionais e psicopedagogos, a nais das equipes de diagnóstico da educação especial
problemática permanece. Além da dificuldade de dispor podem oferecer. Eles proporcionam informações comple-
desses profissionais em todas as redes (mesmo nas não- mentares, que não substituem a avaliação contextualizada,
-governamentais), as queixas quanto à utilização dos resul- de cunho psicopedagógico e dinâmico e que deve ocorrer
tados, sem serem para triagem, ainda perduram; nos ambientes de aprendizagem da escola.
• apesar de todos os esforços para modernizar as práti- Com esse enfoque, os avaliadores são todos os que li-
cas avaliativas no ensino regular, os professores continuam
dam com o avaliado, além de que todos podem ser sujeitos
a organizar listas de alunos que não-aprendem11, para
avaliadores ou sujeitos avaliados, buscando-se identificar
avaliação diagnóstica, em busca de uma patologia que ex-
as necessidades que apresentam e que precisam ser supri-
plique e justifique o fracasso do aluno;
das, pela escola.
• essas listas representam um enorme desafio às equi-
Sugere-se que, na fase de transição entre os procedi-
pes pois não conseguem avaliar todos os alunos, no tempo
mentos de avaliação ainda em uso pela equipe da educa-
desejado pela escola. E, quando os educandos são de ou-
tras cidades, onde não há equipes, estas precisam deslo- ção especial e a adoção, na escola, do “modelo propos-
car-se do município onde residem para, em poucos dias, to”, a equipe de avaliadores da educação especial trabalhe
avaliar alunos, que acabam rotulados e inseridos em classi- articulada com a coordenação pedagógica das escolas. À
ficações, no mínimo perversas; medida em que estas puderem assumir a identificação das
• conscientes das “conseqüências” de seus “laudos” e necessidades educacionais especiais dos alunos – com a
inspiradas no ideário da inclusão muitas equipes de edu- participação efetiva dos seus professores -, a equipe de
cação especial têm optado por manter os alunos no ensino avaliadores da educação especial passará a contribuir,
regular, recomendando que sejam atendidos nas salas de como assessoramento especializado.
recursos. Espera-se que, após análises e reflexões críticas mude-
A partir dessas considerações, cumpre lembrar que a -se o enfoque e revejamse as práticas avaliativas de modo
permanência da avaliação como diagnóstico clínico pode a: (a) substituir os instrumentos referidos a normas por ou-
pressionar a criação de salas de recursos, como já acontece tros que permitam analisar as variáveis implícitas no con-
em algumas redes de ensino. Tais salas desviando-se de texto onde o aprendiz está; (b)valorizar a contribuição dos
suas finalidades, organizam-se como, as classes especiais, professores, preparando-os para avaliar as necessidades
agora com outro nome. especiais de seus alunos em relação às demandas e aos
Outros agravantes: apoios que lhes oferece; (c) utilizar o diálogo e as observa-
a) nas salas de recursos, nem sempre se desenvolve a ções como importantes ferramentas de trabalho; (d) com-
programação desejada para a satisfação das necessidades partilhar a análise dos dados obtidos, relativizando-os com
educacionais identificadas e em parceria com os professo- os múltiplos fatores que interferem na aprendizagem (e)
res do ensino regular, e envolver o próprio avaliado e sua família e (f)se necessário
b) muitas classes especiais têm sido rebatizadas como para a satisfação das necessidades educacionais do avalia-
salas de recursos, desviando-se, igualmente, de suas fina- do, complementar as informações, com a participação de
lidades. outros profissionais.
Faz-se necessário, portanto, discutir o sentido e signifi-
cado dessas classes especiais e salas de recursos. Os avaliados.
Com esses comentários não se pretende criticar a Ainda com base na história da educação especial,
existência dessas mas, sim, evidenciar a necessidade de constata-se que, embora poucos, há alunos chegam à es-
repensarmos o processo de encaminhamento de alunos. cola trazendo um laudo médico que os insere numa de-
Ou, dizendo com outras palavras, do mesmo modo que há terminada condição de deficiência (mental, sensorial, física,

124
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

motora, múltipla) ou de portadores de condutas típicas de Qualquer dessas 3 (três) decisões de avaliação, que
síndromes psiquiátricas, neurológicas ou com quadros psi- têm prevalecido na história da educação especial destina-
cológicos graves. Costumam ser matriculados na educação -se, em última instância, a informar se o avaliado é ou não
especial, sem passar pela equipe de diagnóstico da educa- é para a educação especial (triagem, portanto) e em que
ção especial, exceto se surgem algumas dúvidas quanto à grau de profundidade manifestam-se suas necessidades,
modalidade de atendimento, na qual devem ser matricu- fruto das limitações impostas por suas deficiências.
lados. Neste caso, são examinados para maior aprofunda- Sublinhe-se, uma vez mais, que os pedidos de diagnós-
mento diagnóstico. tico alcançam números consideráveis de alunos, de modo
que se formam longas listas de espera. Quando chega a
Outros chegam para a primeira matrícula na escola e,
vez (para alguns, meses depois), os exames são realizados
se há alguma suspeita de futuras dificuldades de aprendi-
por equipes cuja composição profissional varia, principal-
zagem, passam pelo diagnóstico, previamente. mente, segundo os recursos humanos disponíveis.
O que a prática tem evidenciado é que, sendo muito No caso das Secretarias de Educação de estado ou de
grande a demanda para as equipes de diagnóstico, em ge- municípios brasileiros, algumas dessas equipes contam
ral com número insuficiente de profissionais, esses futuros com psicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos e profissio-
alunos costumam ficar numa fila, esperando até serem exa- nais de órgãos de saúde, quando há parcerias entre estes e
minados. Ou simplesmente desistem. os órgãos de educação.
O maior contingente de alunos para a avaliação diag- As Organizações não-governamentais, geralmente, dis-
nóstica vem do ensino comum, geralmente porque há sus- põem de equipes próprias que realizam a avaliação diag-
peita de alguma deficiência, de distúrbios de aprendiza- nóstica do alunado de suas escolas especiais. Muitas vezes,
gem, ou porque incomodam, pelo comportamento. em parceria, contribuem com as secretarias de educação.
Embora possa vir dos pais, ou de outras pessoas que Quanto às duas outras decisões - de planejamento edu-
convivem com o aluno, a decisão de seu encaminhamento cacional (com as adequações necessárias) e progresso dos
para a avaliação, tem sido, usualmente, tomada pelo pro- alunos (sob o enfoque global de seu desenvolvimento)- são
fessor da classe comum, que busca uma assistência adi- as que, hoje, devem nortear as práticas avaliativas escolares
cional, oferecida pelos especialistas da educação especial. em geral e, particularmente, na educação especial.
Ysseldyke (op.cit.) menciona 5 (cinco) tipos de deci- A intensificação das reflexões em torno da educação
inclusiva tem gerado algumas mudanças nessas direções,
são que antecedem a avaliação realizada pelas equipes de
embora muito haja por fazer, em todos os países e também
diagnóstico: encaminhamento para tratamento, triagem,
no Brasil, por suas dimensões continentais e pelos elevados
classificação, planejamento educacional e análise do pro- índices de desigualdade social existentes .
gresso do aluno. Não se trata da proposição de mudanças superficiais,
Os 3 (três) primeiros tipos são os mais comuns, sendo como troca de cosméticos que só se evidenciam na apa-
que a análise do progresso do aluno é, de todos, o que rência; tão pouco pretende-se estimular a adoção de uma
menos ocorre. nova proposta porque “imposta”.
Encaminha-se para a avaliação em busca de tratamen- Realmente crucial é a mudança de atitudes dos avalia-
to para o aluno pois, ainda se supõe que haja alguma pa- dores em relação aos avaliados e ao que pretendem ava-
tologia que explique suas dificuldades. Assim sendo é nele liar, bem como sua atualização referente à base teórica e
que está o “defeito” que precisa ser conhecido e tratado. O metodológica das práticas avaliativas. Imprescindível, ain-
aluno com “defeito” fica como o responsável solitário por da, a assunção, pelos avaliadores, da idéia que avaliação é
seu fracasso. processo contínuo, compartilhado que não se explica pela
As decisões de triagem estão relacionadas com as de necessidade de triagem, de encaminhamento e muito me-
encaminhamento. Como durante décadas a educação es- nos de classificação. Justifica-se se, e apenas se, na escola,
pecial foi considerada como compensatória e como espaço servir para a identificação das necessidades educacionais
de pedagogia terapêutica, o encaminhamento para a ava- especiais objetivando contribuir para o planejamento edu-
liação tinha como expectativa o tratamento12 em escolas cacional e para o progresso de todos.
Os avaliados têm o direito de ter suas características
ou classes especiais.
conhecidas, entendendo-se que suas deficiências e limi-
Ao serem avaliados, tem-se considerado a maneira
tações não são atributos imutáveis, numa visão fatalista e
como os sujeitos executam as tarefas padronizadas nos determinística. “Este raciocínio se estende, também, às po-
testes que lhes são aplicados. Espera-se que o avaliado tencialidades identificadas que podem ser enquadradas e
forneça todas as informações que viabilizem ao avaliador conformadas a padrões mínimos de desempenho”. (Delou,
compreender seu desempenho tanto nas tarefas, quanto 2002, Apud Delou 2001).
no seu dia-a-dia. Espera-se, também, que as informações Conhecer, compreensivamente, as características dos
obtidas permitam decidir se é ou não é caso para classes avaliados irá contribuir para que as decisões acerca do pla-
ou escolas especiais. Ou, na melhor das hipóteses, para as nejamento educacional incluam todas as providências que
classes comuns com apoio das salas de recursos. permitam a remoção de barreiras para a aprendizagem e
Quanto às decisões de classificação, relaciona-se com para a participação.
as outras duas, sendo mais dirigidas à intensidade com que Finalmente, os dados do processo de avaliação servi-
se manifestam as necessidades dos alunos, evitando-se as rão para acompanhar os progressos dos alunos, compa-
tradicionais categorizações por graus de excepcionalidade. rando-o com ele mesmo.

125
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

A avaliação dos progressos dos avaliados está intima- Também se incluem, nessa condição, outros alunos
mente ligada à oferta educativa, nela incluídos os apoios de como os que apresentam condutas típicas de distúrbios
que necessita. Os eixos de análise ampliam-se. Além do ren- invasivos do desenvolvimento e os de altas habilidades/
dimento- entendido como o que o aluno aprendeu na es- superdotados.
colaconsideram-se todas as suas aquisições, as conquistas Cabe, de nossa parte, uma referência explícita a este
que fez, o desenvolvimento de suas habilidades, indepen- grupo pois supõe-se, equivocadamente, que, por serem
dentemente de que as tenha logrado na escola ou fora dela. superdotados, conseguirão sozinhos e sem apoios, satisfa-
No caso da avaliação do aprendizado acadêmico, cer- zer suas necessidades educacionais que também são espe-
ciais por lhes serem específicas e diferenciadas das demais.
tamente importante, há que se ter o cuidado de que o
As condições pessoais desses alunos precisam ser, igual-
conteúdo da avaliação corresponda ao conteúdo escolar,
mente, avaliadas para as providências cabíveis por parte da
observado não só em provas ou exames, mas no que o escola, no sentido de oferecer-lhes os apoios suplementa-
avaliado demonstra no dia a dia, por meio de suas pro- res de que necessitam.
duções cognitivas, atitudinais ou procedimentais. Até aqui Dentre os dados apresentados no relatório, cumpre
o avaliado foi o aluno. No entanto, professores, gestores mencionar que, na época, 20% de todas as crianças pode-
e outros profissionais que convivem com o aprendiz tam- riam apresentar necessidades educacionais especiais, tem-
bém devem ser avaliados, preferentemente por processos porárias ou permanentes, em sua trajetória escolar. Desses
de auto-avaliação estimulados na escola. Não como num 20% estimou-se, para a população inglesa, que apenas 2%
tribunal e, sim, em busca do aprimoramento pessoal e pro- seriam decorrentes de deficiências, das quais um percen-
fissional. tual muito baixo, em grau severo.
Trata-se de uma prática complexa, mas se entendida Esses, dentre outros aspectos apresentados no Rela-
como benéfica, não será impossível. tório provocaram inúmeras reflexões com implicações nos
procedimentos de avaliação e posterior organização do
As necessidades educacionais especiais dos alunos como atendimento educacional escolar: se por um lado o im-
objeto da avaliação. pacto educacional provocado pela deficiência depende,
As expressões “necessidades especiais” e “necessida- principalmente, do estágio do desenvolvimento global al-
des educacionais especiais” são usadas, particularmente, cançado pela criança, por outro lado, as dificuldades en-
frentadas, mesmo pelas mais severamente comprometidas,
pelos que trabalham em educação especial para substituir
dependem dos estímulos e dos apoios que lhes são ofere-
várias outras, atribuídas ao alunado por ela atendido.
cidos em casa e na escola. O mesmo aplica-se às necessi-
O conceito de necessidades educacionais especiais- dades educacionais especiais dos alunos com distúrbios de
13foi, definitivamente, consagrado no Relatório Warnock, aprendizagem, sem serem deficientes.
em 197814. Para os objetivos e funções da educação, a A ênfase desloca-se, pois, do “aluno com defeito” para
importância de denominar as pessoas segundo catego- situar-se na resposta educativa da escola, sem que isso re-
rias classificatórias de deficiência ou de desajustamento presente negação da problemática vivida pelo educando.
social foi questionada, o que representou, à época, uma Essas considerações permitem concluir que diagnosti-
abordagem inovadora em educação especial, evitando-se car a natureza da deficiência considerando-a como o úni-
a terminologia da deficiência, entendida como de cunho co critério de abordagem para as desvantagens escolares,
pejorativo. “comunica” pouco acerca das necessidades educacionais a
Os conceitos de deficência (disability) e o de desvan- serem supridas, na escola. Dizendo de outro modo, não
tagem educacional (educational handicap)- associados às existem critérios objetivos e confiáveis para relacionar a
dificuldades de aprendizagem foram examinados, alegan- deficiência - enquanto atributo isolado do indivíduo - e as
do-se que não há uma relação bi-unívoca entre inabilidade dificuldades de aprendizagem que enfrenta, pois a maioria
física, mental, sensorial e as dificuldades educacionais en- destas é devida às condições educacionais incapazes de
frentadas pelos alunos. suprir-lhe as necessidades que, nem sempre, decorrem de
Em outras palavras, o Relatório deixa evidente que a deficiência, com base orgânica.
O trecho que se segue, extraído e traduzido do livro
presença da deficiência não implica, sempre, em dificul-
Special Needs in Ordinary Schools, parece bastante escla-
dades de aprendizagem. De outro lado, inúmeros alunos
recedor:
apresentam distúrbios de aprendizagem sem serem, ne- Desejamos apontar uma abordagem mais positiva para
cessariamente, portadores de deficiência. Mas, ambos os o que adotamos o conceito de necessidades educacionais
grupos têm necessidades educacionais especiais, exigindo especiais, não como nomenclatura aplicada a uma deter-
recursos que não são utilizados na “via comum” da educa- minada deficiência que se supõe que uma criança possa
ção escolar, para alunos das mesmas idades. ter, mas em relação a tudo o que lhe diz respeito: tanto
Segundo as estatísticas apresentadas no documento, suas habilidades e quanto suas inabibilidades – na verda-
é muito grande a proporção de alunos com dificuldades de todos os fatores que imprimem uma direção no seu
de aprendizagem. Ambos os grupos- pessoas com ou sem progresso educativo (DES, 1978, p.37, citado por Norwi-
deficiência- encaixam-se na condição de “necessidades ch,1990, p.7).
educacionais especiais” exigindo respostas educativas ade- Nas entrelinhas dessa citação estão implícitas algumas
quadas, além de medidas preventivas para evitar que, na mensagens críticas, seja em relação ao modelo médico de
escola, os “casos” se originem ou se intensifiquem. avaliação diagnóstica para inserir pessoas em determinadas

126
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

categorias, seja para advertir que pessoas de altas habi- E, no âmbito escolar, a expressão passa a ser necessi-
lidades/superdotadas, também apresentam necessidades dades educacionais especiais, amplamente usada por pro-
educacionais especiais. fissionais da educação especial. Devido a isso estabeleceu-
Ainda do Relatório Warnock consta que, para atender -se a relação entre as necessidades educacionais especiais
às necessidades, dentre outros recursos educacionais, é e a deficiência, embora, todos os alunos, indiscriminada-
preciso: preparo e competência profissional dos educa- mente, sintam e manifestem necessidades educacionais,
dores, inclusive para organizar adequações curriculares; alguns temporariamente e outros de forma mais duradou-
aumentar a quantidade do material didático existente in- ra, dependendo de suas características biopsicossociais e
corporando-se, como rotina, a aquisição de recursos di- da ajuda e apoio que recebem.
dáticos específicos para alunos cegos, surdos, com para- Se, por um lado, é pertinente, como direito de cidada-
lisia cerebral, dentre outros; promover as adaptações dos nia, conhecer as necessidades dos diferentes alunos, por
equipamentos escolares, removendo-se todas as barreiras outro lado, teme-se que, com outra maquiagem, os proce-
arquitetônicas e oferecer apoio psicopedagógico ao aluno dimentos de identificação das necessidades educacionais
especiais reproduzam o modelo médico de avaliação. E as-
e orientação a seus familiares.
sim será, tanto mais quanto as necessidades educacionais
No Brasil, a expressão necessidades especiais foi lega-
especiais forem concebidas como “déficits” que precisam
lizada no Art. 58 da LDB 9394/96 em seu Capítulo V, refe- ser diagnosticados, e, posteriormente, inseridos numa ca-
rente ao alunado da educação especial. tegorização, que rotula e gera preconceitos16.
Considerando-se que a nova L DB veio à luz no auge Feita essa longa digressão em torno da expressão - ne-
de todo um movimento em prol de uma escola inclusiva cessidades educacionais especiais - que, por ser genérica e
- uma escola de boa qualidade para todos -, a expressão abrangente, tem gerado polêmicas, cabem algumas reflexões
tornou-se mais abrangente, aplicando-se, não só aos alu- em torno das referidas necessidades, propriamente ditas.
nos com deficiências, como a todos aqueles “excluídos” Podemos descrevê-las a partir de vários recortes epis-
por diversas razões. temológicos baseados nos conceitos e teorias de educa-
Na Resolução CNE/CEB N°2 de 11 de setembro de ção, de desenvolvimento e de aprendizagem e que man-
2001, o Art.5 deixa clara essa abrangência na medida em têm, entre si, inúmeras interfaces, como explicitado por
que se consideram como educandos com necessidades Luckesi (op.cit.):
especiais todos os que, durante o processo educacional A educação escolar é uma instância educativa que tra-
apresentarem dificuldades de aprendizagem vinculadas, balha com o desenvolvimento do educando, estando aten-
ou não, a uma causa orgânica específica; os que apresen- ta às habilidades cognoscitivas sem deixar de considerar
tam dificuldades de comunicação e sinalização diferencia- significativamente a formação das convicções. Junto com
das dos demais alunos e os de altas habilidades (p.70). o desenvolvimento das habilidades cognoscitivas, dão-se
Dentre outras razões, com a substituição dos termos: também, a formação de múltiplas convicções, assim como
“excepcional”, “deficiente”, “portador de deficiência”, “pes- de habilidades motoras. A escola não poderá descuidar
soa com deficiência” e outros, pela expressão “necessida- dessas convicções e habilidades. “À escola cabe trabalhar
des especiais”, objetiva-se a substituição do paradigma para o desenvolvimento das habilidades cognoscitivas do
reducionista organicista- centrado na deficiência do sujei- educando em articulação com todas as habilidades, hábi-
to- para o paradigma interacionista - que exige uma leitura tos e convicções do viver. Habilidades como analisar, com-
dialética e incessante das relações sujeito/mundo. preender, sintetizar, extrapolar, julgar, escolher, decidir etc...
Sob este enfoque interacionista, necessidades espe- (p.126).
Assim, as necessidades educacionais (referentes à edu-
ciais traduzem as exigências experimentadas por qualquer
cação escolar) podem se manifestar como exigências de
indivíduo e que devem ser supridas pela sociedade.
mediação nos aspectos cognitivos, lingüísticos, afetivos,
Enquanto que na expressão “pessoa portadora de de-
motores, psicomotores, práxicos e sociais, para o desen-
ficiência” destaca-se a pessoa que “carrega” (porta, possui) volvimento de competências e de habilidades, inclusive nas
uma deficiência, pretende-se que a expressão “necessida- condutas adaptativas, estas mais concernentes aos alunos
des especiais” evidencie a responsabilidade social de pre- com deficiências.
ver e prover meios de evitá-las ou de satisfazê-las. Os grifos na citação, nossos, pretendem destacar a
Cumpre ressaltar que, na mudança para o paradigma abordagem das habilidades e competências que devem ser
interacionista, devemos considerar, também, os alunos de construídas e/ou desenvolvidas desde a escola, graças aos
altas habilidades/superdotados, evitando-se “cair na cilada processos de ensino e de aprendizagem.
em que tantos textos especializados em Educação Especial Segundo Perrenoud17 (1999 b) a competência traduz-
caem (Delou, 2002), na medida em que se referem às ne- -se por saber e fazer, envolvendo “diversos esquemas de
cessidades especiais apenas ou quase que só em relação a percepção, pensamento, avaliação e ação que suportam in-
pessoas com deficiência. ferências, antecipações, transposições analógicas ...”(p.24 e
Usando-se uma imagem da Psicologia da Forma, a de- 27). Ainda com esse autor (ibid, p.26), as habilidades fazem
ficiência ou a superdotação deixam de ser as “figuras” pas- parte das competências.
sando a ser o “fundo” de um contexto no qual a sociedade Em relação a estas, do documento intitulado Matrizes
tem o principal papel, seja na produção das necessidades Curriculares de Referência para o Sistema de Avaliação de
especiais de determinadas pessoas ou grupos, seja na sa- Educação Básica –SAEB- (1999) constam inúmeras compe-
tisfação dessas necessidades. tências cognitivas agrupadas em “três níveis distintos de

127
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

ações e operações mentais que se diferenciam pela quali- Recentemente houve mais uma revisão calcada no con-
dade das relações estabelecidas entre o sujeito e o objeto ceito ecológico da deficiência, isto é, relacionando a pessoa
do conhecimento”(p.10). ao seu ambiente. Com esse enfoque faz-se necessário ava-
Os níveis são: o básico, o operacional e o global. No liar os apoios que são oferecidos para as pessoas evoluírem
nível básico, encontram-se as ações mentais que possibi- nas suas habilidades adaptativas. Trata-se de uma proposta
litam a apreensão das características e propriedades dos importante, na medida em que desloca o eixo da avaliação
objetos, propiciando a construção de conceitos. Citam-se da pessoa, propriamente dita, para a existência e qualidade
como exemplos de competências nesse nível: observar dos apoios de que necessita.
para levantar dados; identificar, reconhecer, indicar, apon- Segundo essa proposta, o processo de avaliação envol-
tar, dentre diversos objetos, aquele que corresponde a uma ve as habilidades intelectivas, as adaptativas, as afetivo-e-
descrição; localizar um objeto descrevendo sua posição. mocionais, físicas/de saúde e as condições ambientais, para
No nível operacional, as competências traduzem-se determinar o nível e a intensidade dos apoios a que as pes-
por ações mentais coordenadas que pressupõem o esta- soas fazem juz para prosseguirem, com sucesso, seu pro-
belecimento de relações entre os objetos, possibilitando: cesso educativo, de desenvolvimento e de aprendizagem.
classificar, organizando objetos de acordo com um critério, Convém lembrar que o desempenho de alguém, em
incluindo classes e subclasses; seriar, organizando obje- qualquer tarefa, é influenciado pelas exigências da própria
tos de acordo com suas semelhanças ou diferenças; fazer tarefa, pela história do indivíduo e pelos fatores inerentes
antecipações sobre o resultado de experiências; justificar ao meio em que é realizada a avaliação, quaisquer que se-
acontecimentos. jam os instrumentos de avaliação utilizados, já padroniza-
No nível global, encontram-se ações e operações men- dos, ou não.
tais mais complexas que exigem a aplicação dos conheci-
mentos a situações diferentes e à resolução de problemas As necessidades educacionais extrínsecas aos alunos
inéditos. As seguintes competências, à guisa de exemplos, como objeto de avaliação.
inserem-se no nível global: analisar determinados objetos Considerando-se que o desenvolvimento e a aprendi-
com base em princípios, valores; explicar causas e efeitos
zagem têm natureza interativa, ao identificar as necessi-
de determinados fatos e fenômenos; fazer generalizações
dades educacionais de qualquer aluno, traduzidas como
a partir de leis ou de relações descobertas ou estabelecidas
manifestações de dificuldades, há que analisar:
em situações diferentes.
- o processo de ensino e de aprendizagem;
Quanto às habilidades referentes às condutas adaptati-
- o contexto em que se realiza e - as ajudas e apoios
vas, elas têm sido o foco da avaliação (Tamarit, 1999), usan-
do-se procedimentos de caráter ideográfico, tais como as que se oferecem aos alunos para que progridam, envolven-
observações, entrevistas e elencos de indicadores que são do professores, especialistas e as famílias.
analisados, qualitativamente. No processo de ensino e de aprendizagem que ocorre
Sob o ângulo de análise das condutas adaptativas, nas escolas, destacam-se três elementos-chave: os próprios
cabe referir o trabalho construído no Estado do Rio de Ja- alunos que constróem seus conhecimentos, os objetos do
neiro (2000)18 e que apresenta um inventário de habilida- conhecimento, organizados sob a forma de conteúdos pro-
des adaptativas. Inspirado em documentos oficiais brasilei- gramáticos e os educadores que atuam como mediadores
ros e na orientação da Associação Americana de Retardo entre os sujeitos/ alunos e os objetos do conhecimento.
Mental (1992), o texto aponta um conjunto de indicadores Essa tríade não existe no vácuo pois a interação entre
que permitem avaliar as habilidades de alunos suspeitos de os elementos ocorre em contextos como as salas de aula,
deficiência mental ou que manifestam padrões adaptativos as escolas que, por sua vez pertencem a um sistema edu-
diferenciados. cacional de determinada sociedade.
Existem inúmeras escalas que permitem tais avaliações, Algumas vezes são oferecidos apoios e ajudas que per-
como a de comportamentos adaptativos organizada pela mitirão facilitar a dinâmica entre as variáveis do processo
Associação Americana de Retardo Mental, na década de 70 de ensino e de aprendizagem. Infelizmente constata-se
e na qual, constam duas partes: uma voltada para as habi- que são, ainda, insuficientes.
lidades adaptativas e a outra para a avaliação da conduta. Importante ressaltar que, sob esse enfoque, não se
Essa escala foi revisada em 1992, mantendo-se a subdi- pretende negar ou banalizar a existência de dificuldades de
visão: uma parte contendo habilidades para a vida em co- aprendizagem e de participação, devidas às características
munidade e residencial e a outra referente à vida na escola, dos próprios alunos.
num total de 10 (dez) habilidades adaptativas. A proposta é analisar tais dificuldades relacionando-
Na contribuição organizada pela Coordenação da -as às respostas educativas da escola, ou seja, às medidas
Educação Especial da Secretaria de Estado da Educação organizacionais providas pelo sistema, pela escola e pela
do Rio de Janeiro (op.cit.), foram utilizadas essas 10 (dez) professora em sala de aula, envolvendo recursos humanos,
habilidades adaptativas indicadoras de níveis de desenvol- financeiros e materiais para fazer frente a tais dificuldades.
vimento e aprendizagem em: comunicação; auto-cuidado; A expansão do enfoque das necessidades educacionais
vida familiar; social; uso comunitário; autonomia; saúde e para além das dificuldades de aprendizagem de determi-
segurança, funcionalidades acadêmicas; lazer e trabalho. O nados alunos, leva à identificação das necessidades dos
documento inclui, ainda, como dimensões de análise: as sistemas educativos, das escolas e das salas de aula para
manifestações psicológico - emocionais dos alunos e as promoverem a aprendizagem e a participação de todos e
condições de suporte e apoio do meio ambiente. com todos.

128
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Em outras palavras e parafraseando Manjón (1995): - Inúmeras são as “fontes” para as entrevistas, educa-
Uma necessidade educacional especial pode tomar dores, gestores da escola, funcionários como merendeiras,
diversas formas. Pode tratar-se da necessidade de provi- familiares e os próprios alunos. As entrevistas podem ser
são de meios especiais de acesso ao currículo, através, por dirigidas ou não, sempre seguidas de registro.
exemplo, de equipamento especial ou de técnicas de en- Qualquer instrumento ou procedimento de avaliação
sino especializadas; ou bem pode se tratar da necessida- deve envolver indicadores que facilitem a análise dos con-
de de modificar o currículo, ou da necessidade de prestar textos em que as pessoas se desenvolvem e não apenas
atenção particular ao contexto social e ao clima emocional conhecer suas características, evitando-se comparar pes-
nos quais se desenvolve a educação(p.12 e 13). soas umas com as outras.
As informações colhidas ao longo do processo, sejam
Procedimentos e instrumentos de avaliação as referentes às avaliações, sejam as decorrentes delas e
Existe, no mercado, uma série de instrumentos de ava- que redirecionam as ações pedagógicas devem ser guarda-
liação já padronizados e que têm sua importância e utilida- das convenientemente. Dentre outras razões, por se cons-
de. Não se pretende desconsiderá-los, mas questionar o que tituírem em inestimável material para estudos e pesquisas
permitem oferecer como subsídios à prática pedagógica. acerca dos instrumentos e procedimentos utilizados, além
Sugere-se que as equipes de avaliação construam seus de permitirem acompanhar os progressos obtidos.
próprios instrumentos, como, aliás, e felizmente, já ocorre em
algumas redes de educação. Sob a forma de diários de clas- A questão do quando avaliar
se, relatórios, fichas ou similares contendo indicadores, os Considerando-se que a avaliação é um processo de co-
avaliadores registram suas observações para analisá-las em leta de dados com pelo menos dois propósitos: identificar
equipe da qual os professores devem fazer parte, sempre. necessidades e tomar decisões, devem-se analisar, perma-
Os questionários também têm sido usados como ins- nentemente, todos os elementos constitutivos do processo
trumento de coleta de dados. de ensino e de aprendizagem.
Mesmo rigorosamente construídos, estruturados ou O que se tem constatado, na educação especial, é que
a época da avaliação foi concebida para anteceder o en-
semi-estruturados, sempre deixam algumas dúvidas quan-
caminhamento para classes ou escolas especiais, embora
to à fidedignidade e validade das informações.
dados de pesquisa (Anache,1997)evidenciem que as crian-
Quanto aos procedimentos de avaliação, pode-se con-
ças têm sido encaminhadas, antes da avaliação ocorrer ou
siderar a observação, como o mais recomendado para a
terminar. Isso ratifica que pouco tem contribuído para a
coleta de informação e de análise dos dados do contexto
ação pedagógica da escola Com as idéias e ideais da escola
educacional escolar.
inclusiva essa prática de diagnosticar antes que o aluno fre-
Convém atentar para as exigências dos processos de
qüente esta ou aquela modalidade de atendimento escolar
observação20, pois não se trata de tarefa fácil, principalmen-
tem sido reduzida, embora ainda perdure. Depoimentos
te em nossa cultura. A presença de avaliadores/ observado- dos professores (tanto os da educação especial quanto os
res na sala de aula tem sido vivida pelos professores como do ensino regular) evidenciam sua frustração pela demora
ameaçadora e persecutória, principalmente se for imposta. dos resultados e porque se sentem como meros especta-
Mas as observações (sistemáticas ou ocasionais) devem dores desse processo. Alegam que, dificilmente, recebem
envolver outros espaços de aprendizagem, além da sala de orientações sobre os alunos, independentemente de per-
aula: o recreio, a merenda, a chegada e saída da escola. manecerem em classes comuns do ensino regular ou de
Devem ser seguidas de registros, recomendando-se serem encaminhados para a educação especial.
que sejam feitos fora do contexto de observação mas, ime- Este documento, trata da avaliação sob um outro enfo-
diatamente após. que: como processo permanente e contínuo, que deve ocor-
Além das observações de comportamentos relacionais rer na escola, compartilhado por todos os que nela atuam,
entre pessoas, cabem como procedimentos: particularmente pelos integrantes da equipe pedagógica.
- a análise da produção escolar dos alunos, usando-se Objetiva recolher informações que permitam identificar
como fontes seus cadernos, folhas de exercícios, desenhos as necessidades educacionais de inúmeros alunos que apre-
e outros trabalhos que realiza em sala de aula, sem perder sentam facilitadades ou dificuldades de aprendizagem e no
de vista a necessidade de contextualizá-los; seu desenvolvimento pessoal, analisando-as compreensiva-
- a análise de documentos pois eles permitem conhe- mente, com ênfase para os fatores que, eventualmente, es-
cer a orientação filosófica, a base teórica e operacional so- tejam impedindo ou dificultando-lhes a participação.
bre as quais a escola se organiza e se planeja; A análise qualitativa das informações reunidas servi-
- entrevistas, igualmente complexas, mas necessárias. rão como subsídios para a tomada de decisões, no caso
Importante descaracterizá-las como obtenção de dados de dos alunos para: o sucesso de sua aprendizagem aca-
pesquisa pois, como comentado anteriormente, há uma di- dêmica, o desenvolvimento de suas habilidades e com-
ferença teórico-metodológica entre as práticas de pesquisa petências e, no caso da escola para: o aprimoramento
e as de avaliação. Sob esse prisma a entrevista deve ocorrer de seu projeto político-pedagógico com ênfase para a
em clima de solidariedade, sob a forma de relações dialó- formação continuada dos que trabalham na comunidade
gicas entre avaliador e avaliado. Espera-se que ambos es- escolar e para a organização das ajudas de que os alunos
tejam compartilhando informações para o mesmo objetivo; necessitam para progredir.

129
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

Tal como enfatiza Giné (op.cit.) convém destacar que Esses foram alguns exemplos de Adaptações Curricu-
se trata de um processo contínuo e não mais um conjunto lares de Pequeno Porte, respostas educacionais que o pro-
de atos pontuais, por mais sofisticados que sejam os ins- fessor pode e deve dar para favorecer a aprendizagem dos
trumentos utilizados. Como processo compartilhado que alunos que apresentarem necessidades educacionais espe-
ocorre no interior das escolas, a avaliação tem caracterís- ciais em sua sala de aula. Eles, entretanto, não esgotam as
ticas predominantemente pedagógicas contemplando os necessidades, nem tampouco as possibilidades de ação.
elementos que intervêm no processo de ensino aprendiza- O essencial é:
gem: o aluno, o contexto escolar (escola e sala de aula) e o 1. Que o professor esteja constantemente atento a
contexto familiar. seu aluno, para identificar de que conhecimentos ele já dis-
As atuais equipes de avaliação diagnóstica da educa- põe (relacionados com o tema de cada unidade de conteú-
ção especial precisarão repensar suas práticas e seus espa- do), e que necessidades educacionais apresenta;
ços de atuação, pois as informações deverão ser obtidas 2. Que o professor use de sua criatividade para criar
formas alternativas de ensinar, que respondam às necessi-
na própria escola onde as avaliações, compartilhadas com
dades identificadas;
os que lá trabalham, devem contemplar todas as relações
3. Que o professor use continuamente da avaliação
que se estabelecem em seu interior e os próprios alunos,
para identificar o que precisa ser ajustado no processo de
observados em suas características pessoais e interações
ensinar.38
com pessoas e com os objetos do conhecimento.
Esta proposta não descarta a possibilidade da parti- Educação e respeito à diversidade.
cipação dos mesmos profissionais que têm atuado, numa O tema Educação e diversidade: justiça social, inclusão
abordagem clínica. Ao contrário, torna imprescindível a es- e direitos humanos constitui o eixo central da educação e
treita colaboração, entre eles e os outros mediadores da objeto da política educacional. Diz respeito à efetivação da
aprendizagem, em especial os professores e os pais. educação pública democrática, laica e com qualidade so-
As atuais práticas classificatórias devem ser substituí- cial nas instituições educativas de todos os níveis, etapas
das. O uso de testes psicológicos deve restringir-se a si- e modalidades.
tuações muito especiais, pois a importante participação do A diversidade, como dimensão humana, deve ser en-
psicólogo deverá assumir outra vertente, abandonando-se tendida como a construção histórica, social, cultural e polí-
as posições centradas no diagnóstico do aluno, apenas. tica das diferenças que se expressa nas complexas relações
Convidam-se tais profissionais a considerar, em suas prá- sociais e de poder.
ticas avaliativas, que o desenvolvimento e a aprendizagem Uma política educacional pautada na diversidade traz
humana têm natureza social, ocorrendo em contextos de- para o exercício da prática democrática a problematização
terminados nos quais são complexas e contínuas as rela- sobre a construção da igualdade social e as desigualdades
ções das pessoas com objetos e entre si. existentes. Esta construção pressupõe o reconhecimento
Com essas observações, a questão do quando avaliar da diversidade no desenvolvimento sócio-histórico, cultu-
acarreta outras, referentes ao que avaliar, numa abrangên- ral, econômico e político da sociedade.
cia bem maior e num trabalho compartilhado, predomi- No contexto das relações de poder, os grupos huma-
nantemente fora dos gabinetes e das salas de exames. nos não só classificam as diferenças como, também, hierar-
Certamente essa proposta requererá um tempo para quizam-nas, colocando-as em escalas de valor e subalterni-
a transição, durante o qual as atuais equipes possam rever zam uns em relação a outros. Nesse processo, as diferenças
suas práticas e a fundamentação teórica que as embasa, são descaracterizadas e transformadas em desigualdades.
relacionando-as com as contribuições teórico-metodológi- Os movimentos sociais, que atuam na perspectiva
transformadora, reeducam a si e a sociedade e contribuem
cas contidas na proposta de educação inclusiva.
para a mudança do Estado brasileiro no que se refere ao
direito à diversidade. Ao mesmo tempo, afirmam que a ga-
Adaptação na Temporalidade do Processo de Ensino e
rantia a esse direito não se opõe à luta pela superação das
Aprendizagem
desigualdades sociais. Pelo contrário, colocam em questão
O último tipo de adaptação que se sugere é a adap- a forma desigual pela qual as diferenças vêm sendo histori-
tação na temporalidade do processo de ensino e apren- camente tratadas na sociedade, nas instituições educativas
dizagem, tanto aumentando, como diminuindo o tempo e nas políticas públicas em geral. Alertam, ainda, para o
previsto para o trato de determinados objetivos e os con- fato de que, ao desconhecer a riqueza e a complexidade
seqüentes conteúdos. O professor pode organizar o tempo da diversidade, pode-se incorrer no erro de reforçar o pa-
das atividades propostas, levando-se em conta que ativi- pel estruturante do racismo e, desse modo, tratar as dife-
dades exclusivamente verbais to-marão mais tempo de renças de forma discriminatória, aumentando ainda mais a
alunos surdos. Por outro lado, atividades exclusivamente desigualdade que se propaga pela conjugação de relações
escritas é que tomarão mais tempo para alunos cegos. Ati- assimétricas de classe, étnico-raciais, gênero, diversidade
vidades que exigem abstração, como por exemplo, unida- religiosa, idade, orientação sexual, cidade/campo e pela
des no estudo da matemática, demandarão não somente condição física, sensorial ou intelectual.
mais tempo, como também maior frequência de suporte 38 Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/
para os alunos com deficiência mental. me000449.pdf

130
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

As questões da diversidade, do trato ético e democrá- Essa compreensão traduz a prevalência do modelo de hu-
tico das diferenças, da superação de práticas pedagógicas manidade, que nega a diversidade e reforça um determina-
discriminatórias e excludentes se articulam com a constru- do padrão de humano: branco, masculino, de classe média,
ção da justiça social, a inclusão e os direitos humanos. adulto, heterossexual, ocidental e sem deficiência. Nessa
Assim, as políticas educacionais voltadas ao direito e ao concepção homogeneizante e hegemônica de direitos hu-
reconhecimento à diversidade estão interligadas à garan- manos, a diversidade é colocada como um problema e não
tia dos direitos sociais e humanos e à construção de uma como um dos principais eixos da experiência humana.
educação inclusiva. Faz-se necessária a realização de políti- A garantia do direito à diversidade na política educacio-
cas, programas e ações concretas e colaborativas entre os nal e a efetivação da justiça social, da inclusão e dos direitos
entes federados, garantindo que os currículos, os projetos humanos implicam a superação de toda e qualquer prática
político-pedagógicos, os planos de desenvolvimento insti- de violência e discriminação, proselitismo e intolerância re-
tucional, dentre outros, considerem e contemplem a rela- ligiosa. Para tal, a educação nos seus níveis, etapas e mo-
ção entre diversidade, identidade étnico racial, igualdade dalidades deverá se pautar pelo princípio da laicidade, en-
social, inclusão e direitos humanos. tendendo-o como um dos eixos estruturantes da educação
Essas políticas deverão viabilizar a participação da so- pública e democrática. A laicidade é efetivada não somente
ciedade no debate e na elaboração das propostas a serem por meio dos projetos político-pedagógicos e dos planos de
implementadas. Para isso, faz-se necessária a construção desenvolvimento institucionais, mas, também, pelo exercício
de canais de diálogo, participação e parceria, envolvendo cotidiano da gestão e pela prática pedagógica.
os movimentos sociais. A garantia de participação da so- A implementação de políticas públicas que garantam o
ciedade é fundamental para a democratização dos fóruns direito à diversidade em articulação com a justiça social, a
de decisão e das políticas públicas, cujo processo de im- inclusão e os direitos humanos demanda a realização e im-
plementação requer efetivo controle social e transparência. plementação de políticas setoriais e intersetorias: educação,
Em uma perspectiva democrática e inclusiva, deve-se trabalho, saúde, cultura, ciência e tecnologia, moradia, terra,
compreender que diversidade, justiça social e combate às território, previdência social, planejamento, dentre outros.
desigualdades não são antagônicos. Principalmente em Requer, portanto, o diálogo com os movimentos sociais e
sociedades pluriétnicas, pluriculturais e multirraciais, mar- organizações da sociedade civil, protagonistas das lutas pela
cadas por processos de desigualdade, elas deverão ser ei- garantia da igualdade social e valorização da diversidade.
xos da democracia e das políticas educacionais voltadas à Cabe destacar, também, o papel da educação superior
garantia e efetivação dos direitos humanos. na garantia da articulação entre a graduação e a pós-gra-
Os movimentos sociais contribuem para a politização duação, por uma formação acadêmica inclusiva, centrada
das diferenças, da identidade e as colocam no cerne das nos processos de pesquisa e de produção de conhecimento.
lutas pela afirmação e garantia dos direitos. Ao atuarem Nesse contexto, é fundamental garantir a adoção de
dessa forma, questionam o tratamento dado pelo Estado políticas públicas, a efetivação do PNE, de outros planos
à diversidade, cobram políticas públicas e democráticas e nacionais e decenais, bem como a ampliação do financia-
a construção de ações afirmativas destinadas aos grupos mento, a efetivação do regime de colaboração entre os
historicamente discriminados. entes federados e maior articulação entre os sistemas de
As ações afirmativas, entendidas como políticas e prá- ensino, incluindo a instituição do SNE.
ticas públicas e privadas visam à superação das desigualda- Enfim, a Educação é um direito de todos e deve ser
des e injustiças, que incidem historicamente e com maior orientada no sentido do pleno desenvolvimento e do for-
contundência sobre determinados grupos sociais, étnicos talecimento da personalidade. O respeito aos direitos e li-
e raciais. Possuem um caráter emergencial, transitório, são berdades humanas, primeiro passo para a construção da
passíveis, portanto, de avaliação sistemática e só poderão cidadania, deve ser incentivado.
ser extintas se for devidamente comprovada a superação Educação inclusiva, portanto, significa educar todas as
da desigualdade que as originou. crianças em um mesmo contexto escolar. A opção por este
Na educação, as ações afirmativas dizem respeito à tipo de Educação não significa negar as dificuldades dos
garantia do acesso, da permanência e do direito à apren- estudantes. Pelo contrário. Com a inclusão, as diferenças
dizagem nos diferentes níveis, etapas e modalidades da não são vistas como problemas, mas como diversidade. É
educação aos grupos historicamente excluídos. Isto requer essa variedade, a partir da realidade social, que pode am-
o pleno reconhecimento do direito à diferença e o posicio- pliar a visão de mundo e desenvolver oportunidades de
namento radical na luta pela superação das desigualdades convivência a todas as crianças.
socioeconômicas, raciais, de gênero, orientação sexual, re- Preservar a diversidade apresentada na escola, encon-
gionais, de acesso à terra, moradia e oriunda da condição trada na realidade social, representa oportunidade para o
de deficiência, para o exercício dos direitos humanos. atendimento das necessidades educacionais com ênfase nas
A concepção de direitos humanos, numa perspectiva competências, capacidades e potencialidades do educando.
emancipatória, se contrapõe à compreensão abstrata de A adoção da práxis - no ensino, nas interações, no es-
humanidade ainda presente em muitos discursos, políticas paço e no tempo - que relacione os diferentes conteúdos
e práticas de educação meramente regulatórios, que man- às diversas atividades presentes no trabalho pedagógico
têm suposta neutralidade frente à luta pela inclusão social. é um dos procedimentos que irá promover aos alunos a

131
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

possibilidade de reorganização do conhecimento, à medi- d) Para a didática moderna, a mídia e o game, entre
da que são respeitados os diferentes estilos e ritmos de outros, colaboram para tornar a aprendizagem motivadora
aprendizagem. e envolvente. Para a didática tradicional, o professor detém
Vale ressaltar que a Educação inclusiva, como prática o poder do conhecimento. 
em construção, está em fase de implementação. São mui- e) A didática moderna é tecniscista e utiliza novos re-
tos os desafios a serem enfrentados, mas as iniciativas e as cursos pedagógicos como tecnologias e mídias, o que tam-
alternativas realizadas pelos educadores são fundamentais. bém ocorre na didática tradicional. 
As experiências, agora, centralizam os esforços para além
da convivência, para as possibilidades de participação e de 04. (IDECAN/2016 - SEARH – RN) Considerando as
aprendizagem efetiva de todos os alunos.39 abordagens: (1) Behaviorista, (2) Construtivista Intera-
cionista e (3) Sociointeracionista e suas influências no
processo de ensino‐aprendizagem, analise as afirma-
Exercícios tivas dadas quanto à relação professor/aluno, relacio-
nando‐as adequadamente.
01. (FEPESE/Prefeitura de Florianópolis – SC) Anali- ( ) O aluno é conduzido pelo professor que determina
se o texto abaixo: a velocidade e a forma de construção do conhecimento.
Os estudos epistemológicos de________ demonstra- ( ) O professor é um mediador do processo de cons-
vam que tanto as ações externas, quanto os processos trução do conhecimento que se dá através de interações
de pensamento implicam uma organização lógica. Ele sociais.
buscava conjugar duas variáveis - o lógico e o biológico ( ) O professor deve estimular o aluno a construir seu
– numa única teoria e, com isso, apresentar uma solu- conhecimento de forma autônoma, a partir de suas desco-
ção ao problema do conhecimento humano. bertas individuais.
Assinale a alternativa que completa corretamente a A sequência está correta em
lacuna do texto.
a) 1, 3, 2.
a) Wallon
b) 1, 2, 3.
b) Vigotski
c) 2, 3, 1.
c) Paulo Freire
d) 3, 2, 1.
d) Davidov
e) Piaget
05. (CESPE/2017 – SEDF) Teóricos como Piaget e
Vygotsky evidenciaram que a criança se desenvolve na
02. (CESPE/2016/ DPU) Acerca das teorias psicoló-
interação com o meio histórico-cultural em que vive.
gicas que fundamentam a aprendizagem humana, jul-
gue o item a seguir. Considerando essa informação e tendo em vista que a
Os estudos de Lev Vigotski acerca do pensamento criança precisa do outro, da natureza e da inter-relação
e da linguagem humana corroboram teses anteriores possível entre esses elementos, julgue o próximo item.
sobre a importância da imutabilidade do significado A criança exige cuidados e atendimento específi-
das palavras para o desenvolvimento do pensamento cos; por isso, é necessária uma conduta que a mantenha
na criança. sempre limpa e em contato com objetos de conheci-
( ) Certo mento escolarizados. Sua exposição demasiada a ele-
( ) Errado mentos não estruturados ou à natureza — barro, areia,
água, árvore, jardins — assim como a liberdade em ex-
03. (FUNIVERSA/2015 - Secretaria da Criança – DF) cesso podem não resultar em aprendizagem.
Assinale a alternativa que apresenta corretamente as ( ) Certo
diferenças fundamentais existentes entre a didática ( ) Errado
tradicional e a didática moderna.
06. (IMPARH/2015 - Prefeitura de Fortaleza – CE) A
a) A didática moderna sustenta a concepção de que o Teoria das Inteligências Múltiplas, proposta por Gard-
ensinar predomina sobre o aprender, enquanto na didática ner (1983) e colaboradores, gerou um notável interesse
tradicional o aprender é o objetivo principal.  no âmbito educacional. Sobre esta, assinale a alternati-
b) A didática moderna reforça a premissa de que o va INCORRETA.
professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes.
Para a didática tradicional, o educador e o educando cons- a) Afirma que todas as pessoas possuem os tipos de
troem o conhecimento em conjunto.  inteligência em algum grau, ou seja, todos os membros da
c) Na didática moderna, por meio dos recursos peda- espécie humana nascem com todas as capacidades defini-
gógicos, o educando recebe passivamente os conhecimen- das por Gardner, em algum nível.
tos. A didática tradicional deixa a responsabilidade da es- b) Ocupa-se, precipuamente, das relações entre inte-
colha para o educando.  ligência e mundo interno e procura responder à questão
39 Fonte: www.novaescola.org.br/ www.conceicaodocastelo. sobre o que ocorre na cabeça das pessoas quando atuam
es.gov.br de forma inteligente.

132
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

c) São categorizadas como: inteligência musical, inteli- 09. (IDHTEC/2016 - Prefeitura de Itaquitinga/PE)
gência cinestésico-corporal, inteligência lógico-matemática, Na organização do trabalho pedagógico, o conjunto de
inteligência linguística, inteligência espacial, inteligência in- atividades ligadas entre si e planejadas para ensinar um
terpessoal, inteligência intrapessoal e inteligência naturalista. conteúdo etapa por etapa, de forma gradual, de acordo
d) Cada uma das inteligências é definida como um po- com objetivos de aprendizagem é denominado: 
tencial biopsicológico para processar informação que se a) Contrato pedagógico.
pode afirmar em um contexto cultural concreto para resolver b) Projetos de intervenção. 
problemas ou criar produtos que têm valor para uma cultura. c) Atividades interativas. 
d) Sequência didática. 
07. (FUNIVERSA/2015 - Secretaria da Criança – DF) e) Transposição didática. 
Os objetivos são o ponto de partida do processo pe-
dagógico, pois representam as exigências da sociedade 10. (FUNCAB/2014 – SEE/AC) O Contrato didático
em relação à escola, ao ensino e aos alunos ao mesmo pode ser definido como:
tempo em que refletem as opções políticas dos agentes
educativos. Os objetivos gerais são explicitados em três a) um conjunto de regras determinadas pelo professor
níveis de abrangência: pelo sistema escola; pela escola; e pela escola que devem ser cumpridas pelos alunos
e pelo professor. Nesse contexto, o nível de abrangên- b) regras e atitudes determinadas pela escola em seu
cia pela escola  Projeto Político Pedagógico e em seu Regulamento Interno.
c) um documento com regras e atitudes que deve ser
a) dosa o grau de dificuldade para que se expressem assinado pelos pais ou pelos alunos maiores de idade que
desafios, problemas e questões estimulantes e viáveis. regulamenta o comportamento dos alunos na escola e em
b) concretiza, no ensino da matéria, a sua própria visão sala de aula, com vistas a punições efetivas, caso seja des-
de educação e de sociedade.  respeitado.
c) estabelece princípios e diretrizes de orientação do d) um conjunto recíproco de comportamentos espera-
trabalho escolar com base em um plano pedagógico di-
dos entre alunos e professor, sendo mediados pelo saber,
dático.
auxiliando na análise das relações professor, aluno e saber.
d) especifica conhecimentos, habilidades e capacida-
e) uma atitude docente que define que somente os
des fundamentais para assimilação e aplicação em situa-
alunos podem determinar o que desejam aprender e como
ções futuras.
as aulas devem ser ministradas.
e) expressa as finalidades educativas de acordo com
ideais e valores dominantes da sociedade. 
11. (CESPE/2017 - Prefeitura de São Luís/MA) No
contexto escolar, o fenômeno bullying é uma forma de
08. (Acesso Publico - Colégio Pedro II)  “Currículo é
uma construção social do conhecimento, pressupondo violência que tem chamado a atenção de educadores e
a sistematização dos meios para que esta construção pais pelas sérias implicações a ele associadas. A respeito
se efetive; a transmissão dos conhecimentos historica- desse fenômeno, é correto afirmar que
mente produzidos e as formas de assimilá-los, portan-
to, produção, transmissão e assimilação são processos a) a vítima típica é aquela que provoca e atrai reações
que compõem uma metodologia de construção coleti- agressivas.
va do conhecimento escolar, ou seja, o currículo pro- b) as características pessoais do agressor não são um
priamente dito.” fator que influencia ou estimula as ações agressivas.
In: VEIGA NETO, ALFREDO. De Geometrias, Currícu- c) ele tem relação direta com o clima organizacional
lo e Diferenças. IN: Educação e Sociedade, Dossiê Dife- da escola.
renças.2002.p.7. d) ele ocorre em contextos sociais específicos, e não
Considerando a concepção de currículo apresenta- em qualquer contexto social.
da no texto acima, é errado afirmar que:  e) é caracterizado pelo potencial de poder causar trau-
mas psíquicos, pelo desequilíbrio de poder entre agressor
a) O currículo formal é definido pelos professores nos e vítima e pela intencionalidade da ação.
conselhos de classe. 
b) Atitudes e valores transmitidos no cotidiano escolar
que não estão explicitados em documentos fazem parte do 12. (BIO-RIO/2015 - IF-RJ) No processo de pla-
currículo oculto da escola. nejamento de adaptações curriculares aos alunos
c) O educador tem papel fundamental no processo com necessidades especiais, há dimensões do currí-
curricular. culo que precisam ser levadas em consideração para
d) O currículo prescrito é definido pelos documentos que ele reflita um modo de entender a educação e
oficiais. a cultura escolar. No Brasil, este tópico é abordado
e) O currículo real é aquele que acontece em decor- legalmente nos Parâmetros Curriculares Nacionais:
rência de um projeto pedagógico e dos planos de ensino. Adaptações Curriculares. No documento brasileiro, as
adaptações curriculares:

133
TEMAS EDUCACIONAIS E PEDAGÓGICOS

a) ajustam as diferentes instancias curriculares, para 14. UTFPR/2017 – UTFPR) Segundo o documento
responder às necessidades dos professores, e assim fa- Política Nacional da Educação Especial na perspectiva
vorecer as condições que lhe são necessárias para que se da Educação Inclusiva, a educação especial está voltada
efetive o máximo possível de ensino e aprendizagem para para alunos com:
que assim os alunos especiais tenham tarefas semelhantes a) transtornos globais de desenvolvimento e altas ha-
a todos os demais alunos. bilidades e dificuldades de aprendizagem.
b) consideram que a diversidade esta presente em sala b) dificuldades de aprendizagem, transtornos globais
de aula e que as diferentes formas de aprender enriquecem de comportamento e deficiência.
o processo educacional favorecendo a igualdade e promo- c) transtornos globais de desenvolvimento, altas habi-
vendo atitudes pedagógicas com vistas a criar condições lidades/superdotação e deficiência.
de manutenção de um planejamento homogêneo. d) altas habilidades/superdotação, deficiência e trans-
c) implicam na planificação pedagógica e as ações do- tornos globais socioemocionais.
centes fundamentadas em critérios que definem o que o e) deficiência, superdotação e dificuldades de apren-
aluno deve aprender; como e quando aprender; que for- dizagem em mais de uma área.
mas de organização do ensino são mais eficientes para o
processo de aprendizagem; como e quando avaliar o aluno. GABARITO
e) auxiliam no intercambio com as instituições simila-
res para o controle oficial dos órgãos de fomento de como 1 E
avaliar cada instituição e os docentes que estão realizando
trabalhos diferenciados com cada aluno com necessidades 2 ERRADO
especiais. 3 D
e) impedem a evasão escolar e promovem escolas de
4 A
educadores especializados em alfabetização de alunos
especiais para avaliar o resultados dos testes destinados 5 ERRADO
a clientela que se pretende incluir na escola regular com 6 B
vistas a socialização dos familiares no processo educativo.
7 C
8 A
13. (NUCEPE/2015 - SEDUC-PI) O processo de inclu- 9 D
são escolar pode prever como uma das metodologias a in-
dividualização do ensino, através de planos específicos de 10 D
aprendizagem para o aluno. No entanto, deve-se evitar 11 E
12 C
a) fazer um currículo individual paralelo para alguns
alunos. Caso isto aconteça, estes alunos ficam à  margem 13 A
do grupo, pois as trocas significativas feitas em uma sala 14 C
de aula necessariamente acontecem em torno dos objetos
de aprendizagem.
b) levar em conta a diversidade, pois em uma sala de
aula as aprendizagens necessariamente acontecem em tor-
no dos objetos de aprendizagem que são pensados para
todos os alunos.
c) as flexibilizações curriculares no processo de inclu-
são educativa, pois é necessário pensá-las para um grupo
de alunos e as diversidades que o compõem, e não para
alguns alunos tomados isoladamente.
d) atender as outras diversidades que aparecem coti-
dianamente na comunidade. Deve-se atender individual-
mente quem realmente precisa, ou seja, os alunos com
deficiências.
e) trabalhar os temas com todos os alunos da turma,
pois alguns alunos, com determinados problemas, não pre-
cisam alcançar objetivos de natureza acadêmica, e sim de
natureza funcional.

134
HISTÓRIA DO ACRE

1. O processo de ocupação das terras acreanas, a ocupação indígena, a imigração nordestina e a produção da borracha,
a insurreição acreana e anexação do Acre ao Brasil. A chegada dos “paulistas” nas terras acreanas a partir dos anos 70
do século passado: êxodo rural, conflitos pela terra e invasões do espaço urbano...................................................................... 01
2. A evolução política do Acre: Território a Estado. Acre: desafios para um futuro sustentável............................................... 11
3. Trabalhos e produção nas diferentes nações indígenas, uso e posse da terra dos indígenas da Amazônia no auge
do ciclo da borracha, ocupação e utilização da terra, ocupação e disputa pela terra entre povos indígenas e grupos de
interesse socioeconômico e atividades econômicas mais relevantes no estudo da história da Amazônia e do Acre..... 12
HISTÓRIA DO ACRE

Enquanto que no vale do Juruá havia o predomínio,


1. O PROCESSO DE OCUPAÇÃO DAS TERRAS também não exclusivo, de grupos falantes da língua Pano.
ACREANAS, A OCUPAÇÃO INDÍGENA, A Importante considerarmos também que a divisão territorial
IMIGRAÇÃO NORDESTINA E A PRODUÇÃO expressa acima, por vales entre grupos linguísticos domi-
nantes parece ter sido semelhante àquela que os arqueó-
DA BORRACHA, A INSURREIÇÃO ACREANA
logos detectaram através das tradições ceramistas Quinari
E ANEXAÇÃO DO ACRE AO BRASIL. A
e Acuriá. Todavia, além dessa divisão aparentemente sim-
CHEGADA DOS “PAULISTAS” NAS TERRAS ples, havia também grupos falantes da língua Katuquina
ACREANAS A PARTIR DOS ANOS 70 nos afluentes localizados entre o médio Purus e o médio
DO SÉCULO PASSADO: ÊXODO RURAL, Juruá, ao norte do atual Estado do Acre, já em terras do
CONFLITOS PELA TERRA E INVASÕES DO Amazonas. Também existiam outros povos de língua Pano
ESPAÇO URBANO e Takana, ambos do mesmo tronco linguístico Pano, que
se encontravam mais ao sul, no alto curso do rio Acre, no
Abunã, no Xipanamu e no Madre de Dios até sua confluên-
cia com o rio Madeira. Para contextualizar os espaços ocu-
“Pré-História” e Sociedades Indígenas do Acre Contra- pados pelos povos nativos, não apenas nos limites do atual
pondo a história oficial, é fundamental ressaltarmos que o Estado do Acre, mas, também de áreas circunvizinhas que
povoamento humano do Acre teve início, provavelmente, integram a grande região indígena da Amazônia Sul Oci-
entre 20 e 10 mil anos atrás, quando grupos provenientes dental, podemos dizer que esses povos indígenas estavam
da Ásia chegaram a América do Sul após uma longa mi- distribuídos em cinco grandes grupos:
gração. Outro aspecto a mencionar é que a partir de 12 1. No médio curso do rio Purus, hoje Estado do Ama-
mil anos atrás, o clima do planeta começou a esquentar e zonas, habitavam povos de língua Aruan do tronco Aruak.
esse fato ocasionou um aumento da umidade e expansão Grupos poucos aguerridos eram geralmente submetidos
dos sistemas florestais. Assim, os últimos remanescentes por outros grupos mais fortes ou se refugiavam na terra
da megafauna desapareceram devido à retração das áreas firme, espalhando-se por diversos afluentes de ambas as
de pastagem e a expansão da floresta contribuindo para a margens do médio Purus. Dentre os grupos dessa região
proliferação de uma fauna terrestre de pequeno porte e da podemos citar os Jamamadi, os Kamadeni, além de outros
fauna aquática através do crescimento dos cursos de água já desaparecidos. Segundo recentes análises de linguísticas
que ficavam cada vez mais caudalosos. Nesse contexto essa família teria uma antiguidade em torno de 2 mil anos.
ocorreram profundas mudanças climáticas e ambientais e o 2. No alto curso do rio Purus e no baixo rio Acre es-
surgimento de novas formas de organização social, fazen- tavam estabelecidas diversas tribos do tronco linguístico
do com que os seres humanos daquela época passassem a Aruak. Subindo esses rios, do norte para o sul, habitavam
contar com recursos alimentares mais variados, em virtude os Apurinã, os Manchineri, os Kulina, os Canamari, os Piros,
do ambiente de florestas tropicais, além de, gradativamen- os Ashaninka, dentre outros. Esses grupos se espalhavam
te começarem a desenvolver as primeiras experiências de desde a confluência do Pauini com o Purus até a região
domesticação de plantas e animais. das encostas orientais do Andes, desde aproximadamente 5
Na América Central e nos Andes, tiveram início os cul- mil anos atrás, mantendo-se por longo tempo numa região
tivos de milho e de outras sementes, enquanto nas terras vasta e rica ecologicamente. Há registros de que muito antes
baixas da Amazônia foram desenvolvidas as primeiras ex- de resistir ao avanço dos homens brancos sobre suas terras, os
periências do plantio de raízes – especialmente da man- Aruak ou Antis, já haviam resistido com sucesso à chegada dos
dioca - que se tornou a base do cardápio alimentar desses falantes da língua Pano e a expansão das civilizações Andinas.
grupos. E, como parte dessas mudanças, surgiu, aproxi- 3. No alto curso do rio Acre, alto Iquiri, Abunã e outros
madamente há 5 mil anos, a “Cultura de floresta tropical”, afluentes do rio Madeira, em território boliviano, havia um
caracterizada por grupos que praticavam uma agricultura enclave de grupos falantes de língua takana e Pano. Destes,
ainda incipiente complementada pela caça, pesca e co- alguns eram bastante aguerridos, como os temidos Paca-
leta de frutos e sementes da floresta. Foi, também, nessa guara, outros mais sociáveis como os Kaxarari que manti-
fase da organização social dos grupos humanos que estes nham ativo contato com os Apurinã, apesar das diferenças
passaram a fabricar cerâmica e a ocupar certas áreas por linguísticas e culturais entre estes dois grupos. Mesmo per-
períodos mais prolongados. No Acre não foi diferente do tencendo ao tronco linguístico Pano, a língua Takana é de ori-
resto da Amazônia e aqui se multiplicaram os grupos ce- gem mais recente, tendo surgido entre 3 e 2 mil anos atrás.
ramistas horticultores. Importante destacarmos ainda que, 4. Na região intermediária entre o médio curso do Pu-
em linhas gerais, em meados do século XIX a ocupação dos rus e o Juruá, ao norte do Acre, habitavam os falantes da
povos nativos nos altos rios Purus e Juruá correspondia a língua Katukina, sobre os quais há raras informações. Con-
uma divisão territorial entre dois grupos linguísticos que forme alguns registros este grupo teria surgido há cerca de
apresentavam significativas diferenças. Segundo viajantes 2 mil anos. Eram grupos poucos numerosos que ficavam
e exploradores como Chandless, Serafim Salgado e Silva apertados entre os povos Aruak ao leste e os Pano a oeste,
Coutinho, no Purus havia o predomínio, mas não a exclu- restando a eles a exploração das terras firmes menos ricas
sividade, de grupos falantes das línguas Aruan e Aruak, do em suprimentos alimentares que as margens dos grandes
mesmo tronco linguístico. rios.

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HISTÓRIA DO ACRE

5. Em considerável espaço do médio e alto curso do rio O Encontro de Culturas e a Criação de uma Nova So-
Juruá, bem como a maior parte de seus afluentes – como ciedade Logo ao início das primeiras viagens de explora-
o Tarauacá, o Muru, o Envira, o Moa e daí por diante – ção, a partir de 1860, apesar da presença dos indígenas, o
era dominado por diversos e numerosos grupos falantes potencial de riqueza natural dos rios acreanos despertou
da língua Pano. Eram os Kaxinawá, Jaminawá, Amahuaca, a cobiça dos exploradores. Em 1870, teve início a corrida
Arara, Rununawá, Xixinawá, dentre outras denominações para a Amazônia e em poucos anos as margens dos rios
tribais. Estes faziam parte de um grupo linguístico muito acreanos tornaram-se cenários dos seringais. A demanda
antigo com cerca de 5 mil anos, mas que teria se originado internacional por borracha fazia com que o látex extraí-
em outra região, invadindo só mais recentemente as terras do da seringueira, depois de defumado e transformado
acreanas. em “pélas” fosse exportado para abastecer as indústrias
Devido ao seu caráter guerreiro, os Pano conquista- europeias e norte-americanas, cada vez mais ávidas por
ram seu território através da guerra contra tribos de ou- esse produto. A partir de 1878, a empresa seringalista al-
tras línguas, mas também contra grupos do mesmo tronco. cançava a boca do rio Acre subjugando todo o médio Pu-
Este fato torna explicável, em parte, a fragmentação que rus e já em 1880 ultrapassava a linha Cunha Gomes, limite
as muitas tribos Panos apresentavam quando finalmente final das fronteiras legais brasileiras. Nesse mesmo con-
os brancos começaram a chegar na região. É interessan- texto, caucheiros peruanos vindos do sudoeste cortavam
te fazer menção de que a simples divisão linguística dos a região das cabeceiras do Juruá e do Purus, enquanto
grupos nativos do Acre nos últimos 5 mil anos “esconde” que os primeiros seringalistas bolivianos começavam a
o caráter múltiplo de culturas indígenas e a complexa ter- se expandir pelo vale de Madre de Dios e invadiram as
ritorialidade estabelecida a partir das alianças e rivalidades terras acreanas pelo sul. Frente a essas investidas, os po-
tribais. Como a existente entre os Apurinã e os Manchineri, vos nativos da região viram-se cercados por brasileiros,
nos rios Purus e Iaco, onde foi estabelecido um amplo ter- peruanos e bolivianos sem ter para onde fugir ou como
ritório despovoado que servia para evitar contatos e con- resistir a enorme pressão que vinha do capital internacio-
flitos, tendo em vista as guerras permanentes entre esses nal que dependia da borracha amazônica. Para os índios
dois grupos Aruak. Por outro lado, há, também, registros inaugurou-se um novo tempo: de senhores das terras da
do estabelecimento de aldeias conjuntas de grupos Aruak Amazônia Sul-Ocidental passaram a ser vistos como en-
e Pano, para resistir ao avanço das ordens religiosas pelo traves a exploração da borracha e do caucho na região.
Vale do Ucayali a partir do século XVII. (RENARD-CASEVITZ, Com a penetração dos exploradores vieram também
1998, p. 202). as doenças dos brancos para as quais os índios não pos-
Ressaltamos também que embora os conflitos estives- suíam defesas. O sarampo, a gripe, a tuberculose, den-
sem presentes durante esses milhares de anos em que as tre outras doenças que se alastravam entre os grupos
aldeias foram compostas por grandes malocas coletivas, indígenas da região dizimando aldeias inteiras diante
esses povos nativos garantiram a sobrevivência do que a dos pajés que não sabiam como curar aquelas moléstias
natureza oferecia e dessa forma podiam realizar grandes desconhecidas. E a reação dos diferentes grupos indíge-
festas por ocasião das colheitas o que denota o caráter sutil nas existentes no Acre a chegada dos colonizadores foi
do equilíbrio econômico, ecológico e social na região. No variada como diversificadas eram as culturas presentes
limiar do século XIX, cada grupo familiar ou tribal possuía na região. Uma grande parte das tribos de língua Aruan
territórios claramente definidos e os relacionamentos entre e Aruak, como os Jamamadi, Apurinã, Manchineri e Asha-
esses grupos obedeciam não só as semelhanças étnicas e ninka optaram por colaborar em certa medida com os
culturais, mas também às alianças que foram sendo esta- brancos. Destes alguns se tornaram remadores, guias,
belecidas ao longo do tempo. mateiros e seringueiros.
Como também as extensas redes de comércio e co- Outras aldeias passaram a se relacionar com os serin-
municação que cortavam os diversos vales acreanos aonde gais negociando os produtos da caça ou de sua lavoura
chegavam notícias e produtos de áreas longínquas. A esse em troca de ferramentas, armas e objetos dos brancos.
respeito, Chandless, um viajante e descobridor europeu, Ressaltamos que grupos de língua Pano, em sua maioria,
em sua viagem ao rio Aquiri noticiou que os Apurinã co- resistiram à invasão de seus territórios ancestrais, procu-
mumente recebiam dos Kaxarari pedras trazidas dos rios rando evitar contatos ou relações de qualquer espécie
Abunã e Madeira para fabricar lâminas de machado, en- com os não índios. A perseguição que se abateu sobre
quanto que os Manchineri já possuíam diversos objetos os povos nativos do Acre foi grande e certos grupos na
de metal, provavelmente resultado do comércio realizado tentativa de se proteger passaram a esconder sua iden-
com os peruanos. Euclides da Cunha demonstrou ser pos- tidade, como um pequeno grupo de Jaminawá que pas-
sível sair do rio Javari e, utilizando a vasta rede indígena de sou a se dizer Katuquina. (BRANCO SOBRINHO, 1950). O
caminhos e varações chegar ao vale do rio Madeira depois encontro das culturas foi marcado pelo confronto que
de alguns dias de viagem. Era um tempo em que desde os se expressou de forma cruel e excludente. Entre os anos
grupos indígenas mais fortes e numerosos que ocupavam de 1880 a 1910 quando o ritmo da exploração da borra-
as várzeas dos rios até os menores grupos familiares que cha foi intenso, o extermínio aumentou fazendo com que
perambulavam pelas cabeceiras, todos possuíam liberdade inúmeros grupos se extinguissem a exemplo dos Cana-
e o direito à uma identidade própria. mari que desapareceram da grande floresta, ou os Takana

2
HISTÓRIA DO ACRE

que migraram para o sul até a Bolívia para nunca mais retornarem ao território acreano, ou ainda os Apurinã que tive-
ram seus vastos domínios reduzidos a ponto de não possuírem hoje nenhuma terra indígena demarcada no Estado do
Acre, parte de seu território ancestral.
Além disso, é inconteste que o estabelecimento da empresa extrativista da borracha alterou as formas de organização
social dos índios. Alguns pequenos grupos ainda conseguiram se refugiar nas cabeceiras mais isoladas dos rios, mas a
grande maioria foi pressionada a se modificar para não desaparecer. Passaram então a adotar o modelo de casa cabocla
amazônica, começaram a depender das ferramentas dos não índios e também foram perdendo suas línguas maternas e
aprendendo o português ou o espanhol. Inaugurou-se para os índios do Acre o tempo do cativeiro (CPI, 2002, p. 65).

Fortuna e Decadência do 1º Ciclo da Borracha Amazônica

Neste novo contexto vivia-se o espetáculo do esplendor da economia gumífera. “Em 1878, 100% da produção mundial
de borracha era brasileira. Em 1890 a participação decresceu para 90%. Entre 1895 e 1909, a Amazônia contribuiu para o
consumo mundial com 443.200 toneladas. A África, a América Central e Malásia com 374.510t. Havia, portanto, um saldo
para o Brasil de 68.960 toneladas” (REIS, 1941, p. 65).
No entanto esse quadro de prosperidade estava com os dias contados. Para a época era difícil imaginar que aquela
euforia fosse passageira, pois a “Amazônia possuía o maior reservatório de borracha natural de que se tem notícia e, além
disso, o domínio do mercado” (SOARES, 1927, p. 35). Pelo quadro abaixo de exportação brasileira de borracha, entre 1821
e 1947 fica visível a contribuição deste produto na pauta das exportações brasileiras. Por outro lado, também evidencia, a
partir de 1912, a perda do apogeu da produção, voltando a reanimar-se no contexto da Segunda Guerra Mundial.

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HISTÓRIA DO ACRE

Conforme esclarece Martinello, a expansão da borracha entre 1880 e 1920 foi imensa e sua participação na economia
brasileira crescente. Neste sentido, “entre os anos de 1880 e 1897 a borracha responde, em média por 11,8% da exportação
total brasileira; entre 1898 e 1910, por 25,7% entre 1911 e 1913, por 20%; entre 1914 e 1918, por 12%. Este significativo
volume exportado é acompanhado, também, pelos excepcionais preços internacionais do produto. Em 1840, 45 libras por
tonelada; em 1850, 41 libras; em 1860, 125 libras; em 1870, 182 libras; em 1905, 512 libras, preço que perdura até 1911. Não
havia, portanto, nada a temer. A riqueza da região parecia inesgotável” (MARTINELLO, 2004, p. 55-56).
No entanto essa euforia econômica não iria durar por muito tempo, pois as sementes transladadas por Wickham da
Amazônia por volta de 1876, proporcionaram aos ingleses o início do cultivo de seringueiras em bases racionais em suas
colônias do Oriente. E alguns anos mais tarde a produção destas desbancou a produção brasileira no cenário mundial, pois
a partir de 1913, a borracha cultivada no Oriente superava a produção amazônica com quase “48.000 toneladas en quanto
a brasileira decrescia para 39.560t”. O monopólio brasileiro da goma elástica estava definitivamente quebrado. A perda da
supremacia brasileira da borracha foi ocasionada por vários fatores tais como: altos custos da extração do produto, que
impossibilitavam a competição com as plantações do Oriente, pela inexistência de pesquisas agronômicas em larga escala
devidamente amparadas pelo setor público, pela falta de visão empresarial dos brasileiros ligados ao comércio da goma
elástica, pela carência de uma mão de obra barata da região, elemento essencial ao sistema produtivo, pela insuficiência
de capital financeiro aliada à distância e às condições naturais adversas da região. E, a acentuada queda nos preços inter-
nacionais da borracha fez com que ficasse cada vez mais difícil trazer nordestinos para o corte de seringa, o que por sua
vez gerou a necessidade cada vez maior do aproveitamento dos índios como mão de obra, tornando comum a prática dos
patrões-seringalistas de reunirem grupos dispersos de diversas etnias para trabalharem em seus seringais.

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HISTÓRIA DO ACRE

Alguns desses patrões notabilizaram-se como “ami- ro, sob a presidência de Getúlio Vargas, quanto à Segunda
gos” dos índios, a exemplo de Angelo Ferreira, famoso Guerra Mundial. E como parte da aludida “batalha” milha-
“amansador” de índios que reuniu muitos Kaxinawá, Jami- res de nordestinos foram deslocados do Nordeste para a
nawá e Kulina entre outros para trabalhar sob suas ordens. Amazônia numa nova onda emigratória capitaneada pelo
No entanto, a maioria dos patrões-seringalistas tratava os governo brasileiro, com apoio do capital internacional, ba-
índios muito pior que aos seringueiros. Como estes não sicamente norte-americano e inglês.
sabiam ler e poucos entendiam a língua do branco, eram Estrategicamente a participação do Brasil era funda-
lesados no peso da borracha, no preço da mercadoria, na mental para o desfecho do conflito global, na medida em
desvalorização de seus produtos, no pagamento da renda que se o Brasil se juntasse as potências do Eixo a América
anual da estrada de seringa. Dessa forma os índios acu- ficaria vulnerável e o Atlântico Sul fechado à navegação
mulavam enormes dívidas com os barracões dos seringais aliada. Com isso, além do risco que as partes vitais e po-
tornando-se “prisioneiros” dos seus patrões. Por outro pulosas do continente corriam, seria impossível continuar
lado, os pequenos grupos de indígenas que conseguiram suprindo as já debilitadas forças inglesas da África e evitar
se esconderem no centro da mata ou nas cabeceiras, os uma crescente influência alemã no Oriente Médio. Portan-
chamados índios “brabos”, foram caçados sistematicamen- to, a adesão do Brasil aos Aliados permitiu que o Atlântico
te para serem “amansados” e desta forma incorporados a Sul permanecesse aberto, além de este ter se tornado a
sociedade nacional. principal rota de abastecimento de matérias-primas para a
No entanto, alguns destes grupos conseguiram esca- indústria aliada, como também de suprimentos aos exérci-
par ao domínio dos não-índios e resistiram ao cerco cada tos aliados na África e no Oriente Médio.
vez mais apertado dos “civilizados”, perambulando sempre, A indefinição inicial do Brasil não apenas pelo filo-
sem se fixar, ultrapassando a região das cabeceiras aonde -nazismo de alguns segmentos das Forças Armadas, mas,
os brancos não chegavam. Com a crise da borracha sur- também, porque ao contrário dos americanos que até en-
giu no Acre uma economia baseada na produção de vários tão só haviam oferecido promessas e ilusões, os militares
produtos agrícolas como mandioca, arroz, feijão e milho e brasileiros tinham na Alemanha a sua mais segura e efi-
os seringais passaram a não produzir somente borracha. ciente fonte de armamentos. Porém a quebra da resistência
Importante mencionar também a exploração de couros e das Forças Armadas brasileiras que, ao invés de homens
peles e a criação das primeiras colônias agrícolas no entor- e soldados, solicitavam armamentos para defender, com
no a Rio Branco, as quais se constituíam alternativas de tra- suas próprias forças, suas costas e territórios, só aconteceu
balho para os seringueiros, além de possibilitar a melhoria quando as Forças Armadas perceberam que as chances de
do abastecimento de Rio Branco no que se referia aos pro- reequipamento do seu Exército passaram a depender uni-
dutos hortifrutigranjeiros. A partir dos anos 30 a castanha camente da indústria bélica americana, já que a guerra e o
passou a ser mais explorada e as madeiras e oleaginosas consequente bloqueio imposto pela Inglaterra impediam
também passaram a ser desenvolvidas. qualquer carregamento de armas para o Brasil, liquidando
praticamente com o ativo comércio de compensação entre
A Batalha da Borracha e o 2º Ciclo da Borracha os dois países.
Amazônica A partir de então, os planejadores do Pentágono pu-
deram por em prática seus planos de defesa da costa nor-
A eclosão da Segunda Guerra Mundial em 1939 pos- deste brasileira transformando Natal (RN) na mais impor-
sibilitou um novo alento a economia extrativa da borra- tante e movimentada base de suprimentos e tropas para os
cha em decorrência da “batalha da borracha”, quando a Aliados. A estratégia global estabelecida pelos EUA para a
Amazônia se tornou novamente a grande fornecedora de América Latina estava centrada no fato de que os EUA arca-
“látex” para os países aliados (França, Inglaterra e EUA) em vam com o ônus da guerra, envolvendo-se diretamente no
conflito com os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), conflito e aos demais países de América cabia integrar-se
através da assinatura dos Acordos de Washington, em 3 de economicamente ao esforço de guerra, em especial pelo
março de 1942, devido ao fato dos seringais da Malásia te- fornecimento de matérias-primas à indústria bélica ame-
rem sido tomados pelos japoneses. Para evitar a vitória da ricana e manter a qualquer custo a ordem interna para se
Alemanha no conflito mundial e tentando manter em dia o evitarem alterações nos compromissos políticos e econô-
seu estoque de borracha, os EUA buscavam armazenar 500 micos assumidos com os EUA. Para a concretização dessa
mil toneladas de borracha na tentativa de vencer a guerra. política, os EUA fizeram uso de uma ofensiva ideológica
Nesse contexto, a borracha era considerada o “nervo da através da disseminação da política da boa vizinhança e do
guerra”. panamericanismo para se contrapor a propaganda do na-
Como parte da “batalha da borracha”, novas levas de cional-socialismo que conquistava espaço no seio das clas-
nordestinos foram mobilizadas e transferidas para a Ama- ses dominantes latino-americanas. Portanto, a participação
zônia para produzir borracha visando atender o esforço de do Brasil no confronto mundial foi extremamente impor-
guerra. Importante considerarmos que neste contexto o tante pelo envio da Força Expedicionária a Itália, a revelia
Brasil mantinha acordos de caráter comercial, econômico- dos estrategistas militares, mas, sobretudo, pelas bases e
-financeiro e militar com a Alemanha e frente a esse fato as aeroportos instalados no Norte e Nordeste do país e que
pressões norte-americanas se fizeram sentir de forma efe- constituíram entrepostos de tropas e suprimentos que se
tiva quanto a uma tomada de posição do Estado brasilei- destinavam aos campos de batalha da África.

5
HISTÓRIA DO ACRE

No entanto foi no campo da cooperação econômica, E os povos nativos do Acre como ficaram neste pe-
como fornecedor de matérias-primas estratégicas como o ríodo?
ferro, o manganês e principalmente, borracha que o Brasil
ofereceu a sua maior contribuição a humanidade diante do Desde o estabelecimento da empresa extrativista da
avanço nazifascista. E, considerando o pânico que tomou borracha até, praticamente, a década de 1980, os índios do
conta dos estrategistas americanos quando “97% de suas Acre passaram por uma longa fase de degradação de suas
fontes de suprimentos foram cortadas pela invasão japo- culturas tradicionais. Além dos preconceitos social e his-
nesa da Malásia, Borneo e áreas vizinhas, e logo após Peaul toricamente construídos pelos não índios, a expropriação
Harbour, a Amazônia foi impelida a aumentar a produção de suas terras ancestrais e a carência de políticas públicas
de borracha”. Frente ao contexto da época, os governos voltadas para esses povos, mormente nos campos da edu-
brasileiro e norte-americano uniram-se para a mobilização cação e da saúde gerou uma grave condição econômica e
da “Batalha da Borracha” e os nordestinos com apoio na- social. Transformados compulsoriamente em seringueiros
cional e norte- -americano vieram para o Acre, mais uma ficaram a margem de qualquer legislação que os ampa-
vez, produzir borracha. rasse. Esse quadro só começou a passar por mudanças a
Para viabilizar essa meta foram criados vários órgãos partir da instalação da ajudância da FUNAI do Acre e sul
nacionais e estrangeiros referentes à arregimentação, do Amazonas em 1976, quando o “tempo dos direitos” co-
transferência, assistência e financiamento do sistema pro- meçou a ser descortinado para os índios do Acre, inician-
dutivo extrativista, porém no que pese as desavenças entre do uma longa e desigual luta pela demarcação das terras
as autoridades brasileiras e norte-americanas, o processo legadas por seus ancestrais. Importante destacarmos que
de abastecimento ficou sob a incumbência da RDC – Ru- a partir dos anos 1970, o jornal “O Varadouro” espécie de
bber Development Corporation e SAVA – Superintendên- “Pasquim” acreano denunciava fartamente os conflitos de
cia para o Abastecimento do Vale Amazônico. Ressaltamos terra envolvendo os índios, bem como o engajamento de
ainda que para a realização da “Batalha da Borracha” foram diversas entidades indigenistas não governamentais como
tomadas medidas quanto aos seguintes aspectos: a ques- a Comissão Pró-Indio (CPI-Acre), o Conselho Missionário
tão das distâncias, a desativação dos seringais amazônicos, Indigenista (COMIN), e o Conselho Indigenista Missionário
(CIMI), entre outras envolvidas na causa indígena, acres-
o suprimento de mão-de-obra e o problema dos trans-
centando-se a atuação de lideranças indígenas que passa-
portes. No que se refere a mobilização de mão-de-obra
ram a agir de forma organizada e articulada politicamente.
para a Amazônia foram implementados órgãos como o
Como partes dessas ações foram criadas as primeiras coo-
DNI (Departamento Nacional de Imigração), SEMTA (Ser-
perativas com o intuito de viabilizar a “quebra” do domínio
viço de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia) e
dos patrões-seringalistas sobre as comunidades indígenas.
CAETA (Comissão Administrativa de Encaminhamento de
No entanto, foi também nos anos 1970 que a expansão
Trabalhadores para a Amazônia). Isso tudo porque no pe- da fronteira capitalista atingiu o Acre, impelida por empre-
ríodo de 1920 a 1940 a taxa de crescimento demográfico sários do Centro-Sul bem como a implantação do projeto
da Amazônia chegou ao “percentual irrisório de 0,05%. A oficial de colonização destinado à formação de produtores
população do Pará decresceu 0,01% ao ano, a do Estado independentes ou da pequena propriedade, materializado
do Amazonas cresceu à taxa de 0,1% ao ano, enquanto que na distribuição de títulos de propriedade aos pequenos
no antigo território do Acre a população decresceu à taxa produtores vindos do Centro Sul e também do Nordeste.
de 8,8% ao ano, transformando-se numa zona de repulsão Pelo exposto fica evidente que para a economia extrativa
demográfica”. da borracha, o período de euforia econômica foi decorren-
Outros órgãos ligados à mobilização de trabalhadores te da “Batalha da Borracha”, que iniciou um novo capítulo
para a Amazônia foram o SESP (Serviço Especial de Saú- da história do nordestino na Amazônia.
de Pública) e o SNAPP (Serviço de Navegação do Porto Neste caminho, “eles não diziam como era a Amazônia
do Pará), este último responsável pelo abastecimento dos ou o Acre. Só apenas diziam que a gente vinha trabalhar na
seringais acreanos. Importante mencionarmos que as con- produção da borracha porque o produto estava sendo em-
dições de viagem a que esses nordestinos eram submeti- pregado como esforço de guerra, então, que poderíamos
dos se caracterizavam pela precária higiene, péssima ali- vir para a produção da borracha, como também ir para a
mentação e acomodações terríveis. Enquanto as condições guerra. Aqueles que viessem para a produção da borracha
de trabalho e vida nos seringais acreanos não sofreram não iriam para a guerra. Como eu tinha muita vontade de
modificações profundas em relação às existentes duran- conhecer a região amazônica me alistei para vir. Já próxi-
te o primeiro surto da borracha. Em termos de inovações mo à minha vinda, fui sorteado para o exército” (OLIVEI-
implantadas no período destacamos a introdução do con- RA, 1980, p. 2-3). Esse entre tantos outros depoimentos
trato padrão de trabalho entre o patrão-seringalista e os corrobora a contribuição fundamental desses nordestinos
seringueiros, que embora tenha sido criado para superar transformados em soldados que, fugindo do flagelo das
ou minimizar a exploração a que os seringueiros eram sub- secas, por espírito de aventura, ou impelidos por promes-
metidos, na realidade não foi cumprido pela grande maio- sas mirabolantes e apelos patrióticos foram aliciados pelo
ria dos patrões-seringalistas. Estado brasileiro Varguista. Por sua vez os jornais da época
se constituem registros históricos através das manchetes
que exaltavam o patriotismo e à contribuição dos soldados
da borracha para o desfecho da guerra em prol dos aliados.

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HISTÓRIA DO ACRE

Merece menção o sentimento por parte do nordestino de que ao vir para o Acre estava servindo a pátria brasileira,
cooperando com o esforço de guerra. Suas falas carregadas de subjetividade retratam a importância da produção gumífera
para a vitória dos países aliados.
A precariedade das condições em que se processava o deslocamento do Nordeste ao Acre, o enfrentamento da nova
realidade a ser vivida no seio da floresta, a exploração de suas forças físicas pelo sistema produtivo da borracha são tes-
temunhos de que esses nordestinos vieram em busca da riqueza, de dias melhores, mas o que encontraram foi pobreza.
Todavia após o término da Segunda Guerra Mundial, a saga do nordestino no Acre foi a de constituir a “legião dos es-
quecidos”, tanto do grande capital quanto do governo brasileiro e só muitos anos depois é que foram “reconhecidos” como
“soldados da borracha” e passaram a ter direito a uma aposentadoria de dois salários mínimos. Muito menor, portanto, que
a pensão paga aos pracinhas da Segunda Guerra, contrariando o que havia sido prometido durante a mobilização. Sem a
borracha do Acre, considerada no contexto da guerra como uma das melhores, teria sido bem mais difícil para os países
aliados vencerem o conflito mundial. No entanto, em 1946, ao assumir o governo do Território do Acre, José Guiomard dos
Santos assinala que os: Diante da crise social vigente, Guiomard Santos desapropriou terras do seringal Empresa criando
núcleos coloniais no entorno a Rio Branco.
Estes núcleos eram constituídos por lotes de terra doados aos trabalhadores que deixavam os seringais e deveriam
explorar simultaneamente o extrativismo, a agricultura familiar e a criação de pequenos animais. Para tanto os núcleos co-
loniais possuíam estruturas de apoio tais como escolas, postos de saúde e núcleos mecanizados para o beneficiamento da
produção. Dessa forma não só criava alternativa de trabalho para os ex-soldados da borracha, como também melhorava o
abastecimento da cidade no que se referia aos produtos agrícolas, na medida em que a capital acreana tinha se tornado o
espetáculo dos desenganados da falácia do “ouro negro”.
E à medida que a crise da economia extrativista da borracha se acentuava os seringalistas reivindicavam do governo
federal uma política de valorização da borracha. Nessa direção foram realizadas as conferências nacionais da Borracha, no
período de 1946 – 50. Entretanto, em que pese às políticas implementadas pelo governo brasileiro a produção da borracha
acreana não mais voltou aos patamares do período da guerra. 8. Paulistas no Acre e o Ciclo da Expansão da Fronteira Agro-
pecuária Os anos 1970 e 1980 desenharam outro contexto para o Acre com a vinda dos “paulistas”. A esse respeito, vale
destacar que o uso do léxico: “paulistas” embora venha sendo utilizado largamento para definir grandes empresários que
vieram investir nas terras acreanas ou transformá-las em mercadoria da especulação fundiária, na verdade se constituíam
uma minoria quantitativa, pois a maioria era composta de colonos e não de fazendeiros.
Portanto, fica evidente que a conceituação de “paulistas” foi utilizada de forma indiscriminada para designar não só os
empresários do Centro-Sul como também os migrantes rurais provenientes, na grande maioria, do Sul e Sudeste. Notório
ressaltarmos que embora dados do INCRA indiquem a atual existência de concentração de áreas nas mãos de grandes
proprietários, mesmo dentro dos projetos de colonização, este fato não ocorria na época da criação dos mesmos. Naquela
oportunidade esses espaços foram loteados e ocupados por famílias pobres e sem terras. Como podemos aferir da ob-
servação da tabela a seguir que retrata a frequência de famílias imigrantes do Centro Sul para o Acre entre 1979 e 1981.
Convém enfatizar que a política de colonização oficial do Acre iniciou-se em 1977, quando foram criados os Projetos de
Assentamentos Dirigidos – PAD’s Pedro Peixo e Boa Esperança. Posteriormente, foram implantados os PAD’s Humaitá e Qui-
xadá (1981) e Santa Luzia (1982). Gradativamente, foram criados outros oito projetos de assentamentos entre os vales dos
rios Juruá e Acre. E muito embora as primeiras 472 famílias trazidas pela colonização oficial tenham chegado a Rio Branco
em 1978, só foram assentadas em seus lotes em fins de 1979, sendo 149 no PAD Boa Esperança e 323 no PAD Peixoto.
Enquanto aguardavam os trâmites burocráticos junto ao INCRA, os migrantes sobreviviam sob condições precárias nos “Ar-
raiais de adaptação”, onde se alojavam em tendas de lona cedidas pelo Exército brasileiro. No entanto, frente à exiguidade
de recursos financeiros, infraestrutura deficitária e carência de apoio técnico os PAD’s se constituíram ações fragmentadas
que denotam a precariedade das políticas públicas em relação à questão fundiária no Acre. Por outro lado, a construção
do imaginário de “paulista” como o “bárbaro” que invadiu o Acre para apropriar-se das terras dos acreanos se explica pela
violência e repercussão que os conflitos pela terra assumiram no Acre.

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HISTÓRIA DO ACRE

A cristalização ideológica e cultural desse conceito e sua disseminação através da mídia local e das dissertações e teses
produzidas até então passou a afirmar que “paulistas” no Acre eram todos os migrantes chegados nos anos 70 e 80 do
século XX, independente da naturalidade dos mesmos, da unidade da federação brasileira de onde partiram ou de suas
condições socioeconômicas. E ser “paulista” no Acre se constituía forte ameaça à população acreana, até então formada
basicamente por índios, caboclos e descendentes de “cearenses” que apresentavam modos de vida que se diferenciavam
dos modos de vida dos migrantes trabalhadores rurais do centro-sul. Merece destaque também mencionarmos que se
tornou convencional denominar de “cearenses” os migrantes do primeiro e segundo surto da borracha. Tal fato se justifica
pelo fato de ter sido o Estado do Ceará que mais contribuiu com migrantes no Acre, daí a generalização desta terminologia
para todas as pessoas provenientes do Nordeste independente da unidade política de procedência.
Num certo sentido algo equivalente as designações de “paraíba” e “baiano” atribuídas ao migrante nordestino em São
Paulo frente aos estigmas construídos e xenofobia existente em relação a determinadas etnias e nacionalidades. A implan-
tação dos primeiros Projetos de Colonização no Acre apresentou uma tímida reforma fundiária e não uma reforma agrária
como havia sido proposto. O motivo se deu pelo fato do incentivo se limitar ao acesso à terra e não prover condições
dignas de vida necessárias através de ações como saúde, educação, habitação e produção. Frente a esses aspectos, IANNI
afirma que inserindo o processo de colonização do Acre, como parte da Amazônia, não foi diferente ao que Ianni analisa.
Os projetos de colonização Pedro Peixoto, Humaitá, Boa Esperança e Quixadá resultaram da transferência do caos so-
cial que estava ocorrendo em outras regiões do Brasil, principalmente no centro-sul. Importante destacarmos que aliado
à “transferência do caos social do centro-sul”, pressões sociais efetuadas por vários segmentos sociais contribuíram para
a criação dos projetos de colonização do Acre, entre os quais se destacaram os ex-seringueiros e posseiros expulsos dos
seringais por ocasião do processo de transferência das terras acreanas para os fazendeiros do centro-sul, na medida em
que, apesar de as ocuparem por muitos anos, não possuíam documentos de propriedade, tendo que desocupá-las para que
os novos proprietários tomassem posse fomentando o desenvolvimento da pecuária.

Seringueiros, Colonos e Brasivianos – Consequências Sociais da Pecuarização do Acre

Muito embora seringueiros e ribeirinhos acreanos não fizessem uma pressão direta e aberta, à medida que o exce-
dente de mão de obra ia sendo dispensado das áreas rurais, um contingente de desempregados se formava nos bairros
e no entorno das cidades acreanas ainda despreparadas para recebê-los. Diante desse fato, o governo do Estado do Acre
sentia-se pressionado a viabilizar alguma alternativa socioeconômica para resolver tal situação. Frente a esse quadro so-
cial, o governador Geraldo Mesquita pleiteou junto ao governo federal a desapropriação de áreas para serem destinadas
aos pequenos produtores rurais (acreanos expropriados ou em vias de expropriação dos seringais e fazendas, bem como
trabalhadores rurais do centro-sul expropriados das grandes fazendas mecanizadas de suas regiões de origem ou expulsos
da região de Itaipu).
Seus pleitos foram parcialmente atendidos pelo Presidente da República, tendo sido desapropriadas 292.000 ha de
terra do município de Sena Madureira e 408.000ha em Rio Branco. Para a ocupação destas áreas, o INCRA adotou a meto-
dologia dos Projetos de Assentamentos Dirigidos (PAD’s) e, em parceria com outros órgãos e autarquias, passou à execução
dos assentamentos. Convém mencionar que o governo estadual ao criar os PAD’s tinha em mente proporcionar o retorno
ao espaço rural dos que migraram para as periferias das cidades acreanas ou frear a vinda de outros seringueiros e possei-

8
HISTÓRIA DO ACRE

ros para a cidade. Contexto diferente ocorreu nos anos 80, na demarcação de suas terras ancestrais, configurando a
quando os seringueiros passaram a exercer fortes pressões construção de um outro tempo, o dos direitos. Acerca da
junto aos grandes fazendeiros e ao governo do Estado do história dos fazendeiros no Acre já existe uma larga produ-
Acre através dos movimentos denominados de “empates”, ção construída por historiadores, economistas, geógrafos
que consistiam em reunir um grande número de seringuei- e antropólogos. Portanto, nos interessa no âmbito desta
ros que impediam (empatavam) sem o uso de armas que historicidade, e, na perspectiva de “olhar” a história a partir
áreas de florestas fossem derrubadas. dos de baixo, “separar o joio do trigo”, pois se na época
Essas pressões dos seringueiros se explicam por seu mais acirrada dos conflitos havia fazendeiros que queima-
amadurecimento político ao perceber a necessidade de vam casas, expropriavam e matavam pequenos trabalha-
uma tomada de posição frente à expropriação que sofriam dores rurais. Muito atuais pecuaristas passaram a ser vis-
de suas posses. Outro dado importante elucidado por Maia tos com os mesmos olhos com que eram vistos aqueles
No processo de “limpeza humana” promovida pelos novos responsáveis por tantos estragos e misérias. É necessário
proprietários de terras há depoimentos pungentes tanto destacar que grandes fazendeiros e trabalhadores rurais
dos que migraram para os seringais da Bolívia quanto dos tinham propósitos diferentes.
que se dirigiram para a periferia das cidades. Os grandes fazendeiros vieram em função dos incen-
Por outro lado, à luta pela sobrevivência nas cidades tivos fiscais oferecidos pelo governo federal que naquela
acreanas - e nesse aspecto Rio Branco se constituía o maior oportunidade promovia o Plano de Desenvolvimento da
polo de atração dos que migravam das zonas rurais - impe- Amazônia, liberando impostos, fornecendo financiamentos
lia o ex-seringueiros a trabalhar no que aparecesse. e oferecendo apoio técnico. Com tantos atrativos e consi-
Na territorialidade da cidade, o ex-seringueiro passa derando a possibilidade de lucro que poderiam obter in-
mutações sociais diversas, todavia alguns aspectos perma- vestindo ou especulando com as terras acreanas, por que
necem inalterados. Era subalterno no seringal e essa situa- não vir para o Acre? Principalmente por que não era neces-
ção não vai mudar facilmente na cidade. Sua condição de sário fixar residência aqui, poderiam enviar seus gerentes,
ex-seringueiro funciona como mecanismo de limitação da capatazes e peões e continuar em seus Estados de origem,
ascensão social, pois o estereótipo formado do seringueiro que não necessariamente era São Paulo, como aponta a
na cidade é uma imagem que o liga ao analfabetismo, ao literatura já produzida sobre o assunto. Na visão destes, o
atraso, a pobreza, a indigência e a violência. Somada a dis- progresso de uma região passa pela produção e esta gira
criminação sobrevêm outras dificuldades ao ex-seringuei- em torno da pecuária. Começaram então a derrubar as flo-
ro. Como garantir o sustento de sua família? No espaço do restas para o plantio de capim e criação de gado para o
seringal, havia outras possibilidades como a caça, a pesca, corte.
uma pequena criação nos arredores da casa, um pequeno Que valores atribuíam à floresta? Para estes a floresta
roçado. Enquanto que na cidade se não tem dinheiro, não poderia até ser bela, mas não combinava com desenvolvi-
tem comida. Torna-se praticamente inevitável uma deses- mento. A compreensão que estes tinham de desenvolvi-
truturação familiar. mento contrastava com aquela construída pela população
O deslocamento do seringueiro para a cidade implicou rural do Acre. Para os fazendeiros a terra tem uma outra
na formatação de múltiplos sujeitos, e, embora o termo se- função que não de suporte para a floresta e o extrativismo,
ringueiro seja utilizado como uma categoria homogênea, mas de suporte principalmente para o pasto e o boi. Do
fundadora de um estereótipo cultural praticamente imu- outro lado o migrante trabalhador rural do centro sul era,
tável, de caráter quase genético, como sendo seres natu- na maioria das vezes, impelido pelo desejo de tornar-se
rais imbuídos de identidade particular, o ser seringueiro é proprietário de uma área rural O perfil desses que postu-
caracterizado pela mobilidade, flexibilidade e porosidade. lavam terras no Acre era muito variado envolvendo assa-
O estar seringueiro, geralmente suscita a imagem do não lariados agrícolas, parceiros, posseiros, pequenos arrenda-
ser seringueiro, ou ainda, a negação do ter sido seringuei- tários, pequenos produtores, dentre outros. Esse migran-
ro. Tudo isso interagindo, formando situações complexas te do centro-sul não se insere no contexto do migrante
e contraditórias. Na cidade é preciso negar o ser e o ter expropriador e desenraizado e no Acre frente à falta de
sido seringueiro, para garantir articulações com afazeres infraestrutura vigente na época, as malárias, a adaptação
urbanos. Porém, mais tarde, é preciso afirmá-lo para garan- ao novo clima, às novas formas de trabalho, a precarieda-
tir aposentadoria do FUNRURAL, ou negá-lo, novamente, de da vida, o descaso para firmar-se na nova terra tiveram
para não ser estereotipado como representações de atra- que experienciar a solidariedade do trabalhador acreano,
so, inoperância, preguiça, degenerescência física, moral e o rompimento com alguns dos seus preconceitos, a liber-
estética. dade de trabalhar em uma terra própria, a possibilidade
Num outro momento histórico, quando busca a reser- de criar os filhos longe dos riscos do meio urbano e enfim
va extrativista torna-se necessário reafirmar a identidade poder continuar sonhando.
de seringueiro refazendo todo o círculo para garantir es- Nesse processo como trabalhadores rurais esses mi-
paço no outro modo de vida que começa a se construir. grantes construíram novos modos de vida, construindo e
E, nesse contexto de transferência de terras, de estabeleci- reconstruindo suas identidades, além de influenciarem na
mento da pecuária e de conflitos fundiários, os povos nati- construção e reconstrução das identidades do trabalhador
vos do Acre, com apoio de largos segmentos da sociedade rural acreano. Merece destaque acentuarmos que para os
civil organizada, conseguiram obter resultados concretos seringueiros que migraram para a Bolívia para continuarem

9
HISTÓRIA DO ACRE

sendo seringueiros, apesar dos conflitos existentes quando O registro deste patrimônio, seja ele de natureza ma-
da conformação dos limites do Acre com o Peru e a Bolí- terial ou imaterial, contribui para a sua apropriação pela
via, o atravessar a fronteira de um lado para outro foi uma sociedade. Quando a comunidade utiliza-se do bem, ele
experiência histórica nos municípios vizinhos às fronteiras deixa de ser uma referência apenas do passado, tornan-
do Brasil com os países andinos, que marcou suas vidas. do-se também uma 2005, pelo Conselho do Patrimônio
No entanto, há que se ressaltar diferenças étnicas, cultu- Histórico do Estado. O tombamento foi apenas uma das
rais, linguísticas e, às vezes, religiosas. Quando se sai de ações do Governo do Estado na preservação da memória
um país para outro, se experimenta também uma mudança do antigo seringal, como veremos a seguir.
no sistema de poder, no sistema monetário e até de pre-
ços. No entanto, no espaço fronteiriço entre o Estado do Bom Destino: O Seringal que virou Patrimônio His-
Acre e o Departamento de Pando (Bolívia), as condições de tórico
isolamento e o distanciamento das populações bolivianas
eram tão evidentes, que esses sintomas não se fizeram sen-
Principal foco de vestígios da chamada Revolução
tir com intensidade para os chamados de “brasivianos”. Em
Acreana, o seringal Bom Destino foi transformado num
cada etapa desse deslocamento, os membros da família, os
grande museu, com infraestrutura turística para receber
compadres, os antigos vizinhos já chegados acolhiam os
que vinham depois e serão acolhidos mais adiante pelos visitantes locais como de outros lugares do Brasil e do
que se foram antes. A estrutura social de referência dessas Mundo. O sítio conta com uma pousada bem estruturada,
populações de fronteira não é o local visível. Ela se espalha com chalés, restaurante, salão de jogos, sala de conferên-
num amplo território, num raio de centenas de quilôme- cias e piscina natural. Toda essa infraestrutura foi pensada
tros, e é uma espécie de estrutura migrante, uma estrutura para agregar valor e garantir a preservação do sítio, como
social mediada pela migração e pela ocupação temporária, também qualificar as informações ao longo das trilhas que
ainda que duradoura, de pontos do espaço percorrido. levam aos vestígios do antigo seringal.
A fronteira do próprio homem, isto é, vencer suas próprias Um aspecto importante na história do Bom Destino,
dificuldades de convencimento dos familiares em abandonar diz respeito à sua localização. Distante apenas um dia de
um ambiente já construído, do trocar o certo pelo incerto, do caminhada do seringal Caquetá (fronteira com o Estado do
fazer tudo de novo e do refazer-se, na verdade é que consti- Amazonas), por um varadouro que ligava os dois seringais,
tuíram obstáculos ao deslocamento, haja vista que as paisa- o seringal Bom Destino tornou-se a base de abastecimen-
gens em si não eram totalmente desconhecidas. A violência to das tropas brasileiras ao longo do rio Acre.
externa dos agentes que provocaram os deslocamentos per- Consolidada a anexação dessas terras ao Brasil, através
manecia viva em suas mentes. O tormento para esses indiví- da assinatura do Tratado de Petrópolis, o Governo Fede-
duos, invisíveis para as elites, era atemporal, não espacial, e os ral tratou de organizar a administração do novo território
seguia mesmo quando estavam no outro lado. Dessa forma, dividindo o Acre em Departamentos: Alto Acre, Alto Purus
a fronteira que os impedia de deslocar-se não era a fronteira e Alto Juruá. Cada um destes Departamentos dividido em
geográfica, mas, sim, outras fronteiras, dentre elas a socioeco- Comarcas. No Vale do Acre, Bom Destino foi transformado
nômica, a política e, principalmente, a sociocultural. São elas em uma das quatro comarcas.
que impõem as necessidades de vencer, cotidianamente, suas Durante a Segunda Guerra Mundial o seringal Bom
próprias fronteiras. São lutas incessantes. Destino volta a ser referência de prosperidade, quando os
seringais de cultivo na Malásia são invadidos pelos japo-
O Estado do Acre e Seu Patrimônio neses. Para conseguir a tão preciosa mercadoria para os
esforços de guerra, os americanos financiam, junto com o
Na década de 70 o Estado do Acre solicitou ao Serviço
governo brasileiro, a retomada da exploração da borracha
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (atual IPHAN),
nos seringais da Amazônia.
o tombamento de duas referências históricas para os
Esta segunda grande fase do seringal não durou mui-
acreanos: a vila de Porto Acre, palco de inúmeras batalhas
durante a chamada Revolução Acreana, e a Casa Branca, to. Logo após o final da Segunda Guerra Mundial, os acor-
suposta intendência boliviana em Xapuri tomada por Pláci- dos entre o governo brasileiro e os americanos cessaram.
do de Castro em 06 de agosto de 1903. Ainda que o governo brasileiro garantisse o preço durante
A solicitação foi rejeitada, pois aqueles bens não se- algum tempo, não tardaria para que a economia extrativa
guiam o padrão adotado até então. Até aquele momento do látex não mais se sustentar.
os bens tombados como patrimônio histórico nacional, tra- Transformada em fazenda na década de 70, a antiga
çavam um perfil do Brasil barroco, rico, católico, europeu sede do seringal – voltada para o rio – foi abandonada em
(patrimônio em pedra e cal), com fraca presença índia ou detrimento de uma outra, agora de frente para a estra-
negra ou dos demais povos que contribuíram e ainda con- da de asfalto, a BR-364. O rio já não era o principal meio
tribuem para a formação da promoção deste patrimônio. de comunicação entre aquelas terras e o mundo. A antiga
O registro deste patrimônio, seja ele de natureza ma- sede começa a entrar num longo período de esquecimen-
terial ou imaterial, contribui para a sua apropriação pela to e decadência.
sociedade. Quando a comunidade utiliza-se do bem, ele
deixa de ser uma referência apenas do passado, tornando-
-se também uma promoção deste patrimônio.

10
HISTÓRIA DO ACRE

A Revitalização do Seringal Embora haja um ambiente favorável à preservação


destes, e de outros patrimônios culturais, é recomendável
Em 1991, uma equipe da então Coordenadoria do Pa- o tombamento, seja estadual, municipal ou federal, como
trimônio Histórico do Acre esteve na antiga sede de Bom forma eficaz na preservação e na promoção do patrimônio
Destino e constatou o seu abandono. Começava, ainda que local.
de forma tímida, o mapeamento dos vestígios que compu-
nham a antiga sede do seringal.
Em agosto de 1997 o jornal A Gazeta publicou uma
extensa matéria sobre o seringal Bom Destino. Falava da 2. A EVOLUÇÃO POLÍTICA DO ACRE:
sua importância para a compreensão da história acreana. TERRITÓRIO A ESTADO. ACRE: DESAFIOS
O seringal que havia sido escolhido como quartel-ge- PARA UM FUTURO SUSTENTÁVEL.
neral dos brasileiros, durante a Revolução Acreana, enfim,
tombara. O descaso do poder público e do proprietário da
atual fazenda Bom destino, havia posto abaixo todos os
vestígios de uma história ainda a ser contada. Movimento Autonomista - De Território a Estado
A denúncia causou forte impacto na opinião pública. O
Ministério Público Estadual exigiu uma posição do governo A evolução do Acre aparece como fenômeno típico de
do Estado. penetração moderna na história do Brasil, acompanhada
Somente em 1999, o Departamento do Patrimônio His- de importantes contribuições na projeção econômica do
tórico e Cultural – FEM começa a mapear todo o conjunto país. Exercendo papel de destaque na exportação nacional
de vestígios e ruínas presentes, não só na área da sede do até 1913, quando se iniciou da borracha nos mercados eu-
Seringal Bom Destino, como também em outros seringais ropeu e norte-americano, o Acre conheceu um período de
e colocações do entorno: Telheiro, São Jerônimo e Caque- grande prosperidade: na passagem do século, em menos
tá (percurso feito pelo antigo varadouro que ligava esses de um decênio contava com mais de 50.000 habitantes.
seringais durante a Revolução). Concomitantes a este in- Logo após a anexação do Acre ao Brasil, os acreanos
ventário foram iniciadas as obras de revitalização do antigo esperavam pela sua elevação a Estado o mais rápido possí-
chalé de Joaquim Victor, financiada com recursos oriundos
vel, uma vez que, nessa época (Auge do Ciclo da Borracha),
do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
o Acre representava 1/3 do PIB brasileiro. Porém isso não
(IPHAN).
aconteceu.
No início dos trabalhos, a vegetação cerrada escondia
Atendendo às disposições jurídicas do Tratado de Pe-
inúmeros vestígios e dificultava o acesso, mesmo àqueles
trópolis, o presidente Rodrigues Alves sancionou a lei que
que podiam ser percebidos, ainda que à distância, pelos vi-
criava o Território do Acre (1904), dividindo o Território em
sitantes. De todas as edificações do antigo seringal apenas
três departamentos: o do Alto Acre, o do Alto Purus e o
o pequeno chalé, residência do gerente resistiu ao abando-
no e a ação do tempo. Continuava de pé, mas necessitando do Alto Juruá, este último desmembrado para formar o do
de reparos urgentes. Alto Tarauacá em (1912). A administração departamental
Ao final desta primeira etapa, o Chalé de Joaquin Vic- exercia-se, até 1921, por prefeitos designados pela presi-
tor, agora transformado em sala-memória, parecia erguer- dência da república.
-se do passado. Essa subjugação causou intensas revoltas da popula-
Recuperado, nele foi montada uma exposição perma- ção. Foi o caso da revolta de Cruzeiro do Sul, em 1910, que
nente que conta recortes de sua história, inclusive, o seu depôs o Prefeito Departamental do Alto Juruá e proclamou
declínio e completo abandono. criado o Estado do Acre (a chamada Revolta do Alto Juruá).
Através de outros projetos, junto ao BNDS e com re- Cem dias depois, entretanto, as tropas federais atacaram os
cursos próprios, outros vestígios foram recuperados pelo revoltosos e restabeleceram a “ordem” e a tutela. Em 1913,
governo do Estado. Pontes, chalés, trincheira, dentre outros um movimento semelhante ocorreria no Purus, em Sena
vestígios, foram recuperados e agora fazem parte do Sítio Madureira, por motivos muito semelhantes. Em 1918 seria
histórico e Ambiental de Bom Destino, tombado como pa- a vez da luta autonomista chegar ao vale do Acre, em Rio
trimônio histórico no fim de 2005. A pesquisa feita sobre o Branco, que protestou intensamente contra a manutenção
seringal e sobre alguns personagens que transitaram na- daquela absurda situação de subjugação ao governo fede-
quele espaço, teve a participação de antigos moradores do ral. Porém ambas foram igualmente sufocadas à força pelo
seringal e do entorno. governo brasileiro.
A experiência desenvolvida no seringal Bom Destino A partir do fracasso das revoltas, a luta pela autono-
abriu precedentes para outras ações na área de patrimô- mia não recorreu mais às armas. Depois disso, a reforma
nio histórico e cultural. O Palácio Rio Branco, o Museu da política de 1920 - que unificou as quatro prefeituras de-
Borracha, ambos localizados no município de Rio Branco, partamentais em um único governo territorial - serviu para
a própria Sala Memória de Porto Acre, o Teatro Municipal acalmar o vale do Acre, que foi beneficiado pela reforma,
de Tarauacá (AC), o Colégio Santa Juliana, onde ali também já que para capital do Território foi escolhida Rio Branco.
fundaram um museu, o primeiro de Sena Madureira (AC) e Com a queda do Ciclo da Borracha (1920), o movimen-
o Museu Cidade do Xapuri, passaram a constituir um con- to autonomista foi perdendo força, ressurgindo apenas
junto de edificações que remetem à memória acreana. uma década mais tarde, quando a Revolução de 30 alte-

11
HISTÓRIA DO ACRE

rou completamente os rumos da república brasileira. Nesse


momento, os acreanos acreditaram que poderiam, enfim, 3. TRABALHOS E PRODUÇÃO NAS
conquistar a tão sonhada autonomia. Mas foi em vão. DIFERENTES NAÇÕES INDÍGENAS, USO
Com a constituição de 1934, o Acre só obteve o di- E POSSE DA TERRA DOS INDÍGENAS
reito de eleger dois deputados federais para representá-lo
DA AMAZÔNIA NO AUGE DO CICLO DA
na Câmara Federal, sem alterar o regime de indicação dos
BORRACHA, OCUPAÇÃO E UTILIZAÇÃO
governadores do território. Seguiu-se mais um longo pe-
ríodo em que as discussões autonomistas não passavam DA TERRA, OCUPAÇÃO E DISPUTA PELA
de conversas em intermináveis reuniões e de fundações de TERRA ENTRE POVOS INDÍGENAS E
agremiações políticas e jornais que tinham como bandeira GRUPOS DE INTERESSE SOCIOECONÔMICO
maior o autonomismo. Multiplicaram-se os simulacros de E ATIVIDADES ECONÔMICAS MAIS
partidos políticos: Legião Autonomista, Partido Construtor, RELEVANTES NO ESTUDO DA HISTÓRIA DA
Partido Autonomista, Partido Republicano do Acre Federal, AMAZÔNIA E DO ACRE.
Comitê Pró-autonomia, etc. Assim como se multiplicavam
os títulos de jornais com apelo autonomista, como por
exemplo: O Estado, O Autonomista, O Estado do Acre, etc.
Impulso mesmo o movimento autonomista só voltaria Acre: Novos Territórios e Territorialidades
a ter em meados da década de 50, quando o PSD, do ex-
-governador José Guiomard dos Santos, resolveu assumir Território pode ser definido como uma área construída
essa bandeira e elaborar um projeto de lei que transfor- por um ou mais indivíduos. Ele torna-se uma consequência
mava o Acre em Estado. Esse projeto causou grande movi- do espaço, uma vez que é uma apropriação humana. Nes-
mentação política em todo o Acre e chegou ao Congresso ta apropriação existem jogos de interesses, aspirações que
Nacional em 1957, provocando uma intensa disputa po- demarcam as diferenças existentes entre os grupos que
lítica entre o PTB de Oscar Passos e o PSD de Guiomard podem, inclusive, pertencer a um mesmo território. Sendo
Santos, tendo o primeiro se posicionado contra a lei de assim, o espaço é apropriado pelo território que pode se
transformação do Acre em Estado. caracterizar através dos discursos de identidade. Na visão
Depois de muitas disputas no Congresso Nacional, fi- de Gonçalves (2003), o território é ‘lugar’ porque ali se ar-
nalmente em 1962, durante a fase parlamentarista do go- raiga uma identidade em que se enlaça o real, o imaginário
verno João Goulart, foi assinada a lei 4.070 de autoria do e o simbólico. O ser cultural elabora sua identidade cons-
então deputado Guiomard Santos. Por uma ironia política, truindo um território fazendo-a sua morada. (...) As cultu-
o Presidente João Goulart era do PTB, o partido que, a nível ras, ao significar a natureza com a palavra, a convertem em
nacional, se colocava contra o tal projeto. Ainda assim o acto; ao nomeá-la, vão construindo territórios através de
mesmo foi aprovado e passou a vigorar a partir do dia 15 práticas culturais de apropriação e manejo da natureza (p.
de junho de 1962. 11).
O PTB, todavia, não foi de todo derrotado, já que nas Neste caso, a tendência da maioria dos territórios é o
primeiras eleições livres e diretas realizadas na história do de serem regulados, seja pelo uso de seus recursos ou pela
Acre, o PTB foi o grande vencedor, fazendo o primeiro go- jurisdição dos mesmos, o que permite afirmar a existên-
vernador constitucional do Acre, o Prof. José Augusto, e cia de atores reguladores, sendo o principal deles o Estado
todas as prefeituras municipais acreanas. (Federal, Estadual e/ ou Municipal). O conflito dos atores
Na década de 1960 iniciou-se o segundo ciclo de es- sobre o domínio de territórios não faz com que o território
forços para acelerar o progresso da área amazônica, com desapareça. É justamente através das tensões que novos
a criação da Superintendência do Desenvolvimento da territórios aparecem e produzem, inclusive, novos significa-
Amazônia (SUDAM,1966). Procurou-se melhor entrosar os dos. Com relação a território, a opinião mais oportuna para
subsetores regionais dentro do próprio Estado, concorren- este trabalho provém de Rego.
do para isso os ramais da Transamazônica, que ligaram Rio Para ele o território corresponde a uma determinada
Branco e Brasileia, no alto curso do Acre, e Cruzeiro do Sul, configuração de relações de poder, de domínio. (...) Essa
às margens do Juruá, cortando os vales do Purus e do Ta- configuração tem uma base formada pelas relações eco-
rauacá. Incrementou-se, pois, a política de planejamento nômicas (que supõe a base dos recursos naturais) e pelas
destinada a corrigir as distorções demográficas, econômi- relações políticas e culturais. Tem, portanto, uma dimen-
são objetiva e uma dimensão subjetiva. Compreende a
cas e políticas da integração nacional.
afirmação econômica, do modo de vida (de produção e
de subsistência) dos grupos sociais, dos seus valores, dos
seus costumes, das suas crenças, das suas instituições, das
formas de construção do seu poder coletivo (organização
social e poder de dominação ou capacidade de resistência
à dominação). O território é a expressão espacial da cumu-
lação de forças no nível econômico, político e cultural dos
grupos sociais que ocupam uma porção do espaço, cuja
resultante tem uma determinação cultural (REGO).

12
HISTÓRIA DO ACRE

Portanto, falar tanto de território como de territoriali- Oliveira (1976) constitui uma das discussões mais impor-
dade implica em observar as relações daquilo que foi expe- tantes da alteridade. Para o autor, a identidade étnica re-
rienciado por membros de um determinado grupo social. flete inicialmente o debate de “grupo étnico” exposto por
Para Rasfettin (1993), as relações sociais envolvem posturas Fredrick Barth (1969)5. Segundo este teórico um grupo ét-
de poder. Pensando desta maneira, acreditamos que o em- nico,
bate estabelecido através das relações provoca mudanças - Perpetua-se principalmente por meios biológicos;
significativas nas posturas dos sujeitos. De acordo com o - Compartilha valores culturais fundamentais, postos
autor, a territorialidade assume um bem particular, pois re- em prática em formas culturais num todo explícito;
flete o multidimensionamento do ‘vivido’ territorial pelos - Compõe um campo de comunicação e interação;
membros de uma coletividade, pela sociedade em geral. - Tem um grupo de membros que se identifica e é
Os homens vivem ao mesmo tempo o processo territorial identificado por outros como constituinte de uma catego-
e o produto territorial por intermédio de um sistema de ria distinguível de outras categorias da mesma ordem.
relações existenciais e/ ou produtivas (RASFETTIN, 1980, p. Ainda assim, Oliveira (1976) utiliza-se da concepção
158). de identificação étnica para caracterizar uma pessoa, seja
Territorialidade pode ser encarada como algo que é em uma perspectiva nacional, regional ou para algum tipo
“apropriado”, no sentido de que o território se torna um de instituição como é o caso da religião. A discussão das
local de “pertença” dos indivíduos. Partindo deste pressu- identidades que permearam o território acreano foi nota-
posto acreditamos que os sujeitos redefinem o território damente marcada por uma relação de contrastes que, na
mediante as suas aspirações e aos seus interesses. Esta maioria dos casos permitiu a afirmação do grupo, ao mes-
idéia vai ao encontro do pensamento de Andrade (1995) mo tempo, que configurou a negação de outros. Este foi o
onde territorialidade pode vir a ser encarada tanto como o caso do conflito entre os nordestinos que vieram trabalhar
que se encontra no território, estando sujeito à sua gestão na floresta e os índios. O olhar etnocêntrico dos primeiros
como, ao mesmo tempo, o processo subjetivo de conscien- fomentou um grande genocídio, já caracterizado nas pági-
tização de fazer parte de um território, de integrar-se a um nas da história acreana.
Estado. (...) A formação de um território dá às pessoas que Destacamos que o debate acerca de identidades já foi
nele habitam a consciência de sua participação, provocan- bastante evidenciado no texto sobre “Trajetórias Histó-
do o sentido da territorialidade que, de forma subjetiva, ricas”. Mas algumas outras considerações necessitam ser
cria uma consciência de confraternização entre elas (AN- feitas. Talvez a mais importante estabeleça a ligação das
DRADE, 1995). identidades aos territórios estabelecidos ou construídos
Para Oliveira (1999), a ideia de territorialidade reme- socialmente. Desta maneira, o debate sobre esta questão
te sempre a um processo de reorganização social na qual implica também no papel que os atores sociais tiveram na
pode existir a criação de novas unidades socioculturais, a formação das unidades territoriais. Tendo por base o senso
constituição de mecanismos políticos, o controle social so- comum é possível fazer a associação do indígena com as
bre os recursos naturais e a reelaboração da cultura. A ter- Terras Indígenas; do nordestino/seringueiro, das Reservas
ritorialidade envolve ao mesmo tempo harmonia de ideias Extrativistas ou Projetos de Assentamento Extrativistas aos
entre um determinado grupo, mas pode gerar exclusões e seringais; e os sírios e libaneses às sedes municipais e assim
uma série de tensões sociais. Logo, as territorialidades, que por diante.
resultam das relações sociais provocam estratégias de con- Entretanto, a questão é mais complexa. Sabemos, por
trole de um grupo sobre o outro através do fortalecimento exemplo, que Projetos de Assentamentos não são cons-
de forças econômicas, políticas e culturais. Neste caminho, tituídos apenas por indivíduos oriundos dos centros Sul
afirmamos que a dimensão de área não é suficiente para e Sudeste, tampouco os seringais que agregam grande
definir um território. Portanto, existe uma série de combi- parte de nordestinos, permitiu outros atores no proces-
nações de fatores pelos quais devem ser levados em con- so de extração do látex. Da mesma forma, as cidades que
sideração tais como os papéis dos territórios, a forma de podem, de certa maneira, sintetizar o grande mosaico de
organização destes, intercâmbio de elementos simbólicos identidades das unidades territoriais do Acre6. Frisamos a
e culturais, assim como as suas diretrizes políticas. Nos necessidade de observação na maneira como as unidades
próximos tópicos trataremos das consolidações e transfor- foram constituídas, assim como a forma pela qual os ato-
mações das unidades territoriais, utilizadas como forma de res fizeram a intervenção no processo de consolidação dos
estratégia de dominação ou como forma de rompimento territórios. Além disso, é preciso refletir sobre as “redes”
com padrões vigentes, permitindo maior consciência do estabelecidas por esses atores no processo de afirmação
território e maior organização por parte dos atores sociais. dos territórios construídos.
O Seringal como Estratégia de Dominação Fundante
Atores Formadores da Cultura Acreana: a Identida- No Zoneamento Ecológico – Econômico (fase I), definimos
de em Questão o seringal como uma unidade produtora na qual a prin-
cipal atividade econômica consistia na extração do látex
A formação da sociedade acreana envolve processos (ARAÚJO, 2000). A formação do seringal esteve vinculada
“identitários” distintos. Neste caso, a permanente constru- a uma estratégia internacional para a obtenção da matéria
ção do Acre inclui várias discussões de identidade, dentre – prima, amplamente cobiçada pelo mercado europeu e
as quais a étnica, campo clássico da Antropologia que para também norte – americano.

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HISTÓRIA DO ACRE

Por enquanto queremos apenas ressaltar que a unida- primeiro surto da borracha. Resta salientar que os seringais
de produtiva a que chamamos de ‘seringal’ não se resume só foram impulsionados novamente com o “aquecimento
somente a uma extensa área de terras, com muitas estradas da borracha” durante a 2ª Guerra Mundial, quando os ja-
de seringa, seringueiros e patrão. O seringal era um todo poneses dominaram os seringais asiáticos. A situação, já
complexo e sua estrutura refletia, (...) as exigências do meio bastante conhecida, fomentou novamente um forte fluxo
e a necessidade da produção de borracha para o mercado de pessoas do nordeste brasileiro e, em especial, do Ceará.
mundial (CALIXTO, et al., s/d, p. 69). Houve também o avivamento do sonho que minguou após
Falamos anteriormente que um dos grandes impac- o término da grande Guerra. Vítimas do esquecimento, es-
tos da instalação da unidade territorial foi o processo de tes “soldados da borracha” só voltaram a ser lembrados8
dizimação indígena durante o período áureo da borracha por ocasião dos conflitos sociais das décadas de 70 e 80
(1887–1912) ou para a subordinação destes ao seringal do século XX e da formação Temos (...) um processo de
após 1912, quando a produção de borracha da Amazônia desterritorialização na Amazônia, sequestrada, como disse
começou a entrar em declínio devido a forte concorrência Souza, em seu próprio habitat. Correntes migratórias (...)
com os seringais de cultivo do Ceilão e da Malásia. Gran- produziram marcas irretocáveis de culturas produzidas em
des contingentes de homens vieram para o Acre devido a outros meios geográficos. Vieram mulçumanos, pajés afri-
fatores como a seca, forte propaganda ideológica e pela canos, portugueses católicos, libaneses, cearense cabra –
estratégia internacional para a obtenção de mão – de – da – peste e mais que não sabemos, implantando aqui as
obra barata. Estes homens tinham pela frente o desafio suas pátrias, projetando as suas paisagens, os seus saberes,
de se “adaptarem” a um novo tipo de paisagem natural e crenças, culinárias e sobretudo os seus delírios.
“humana” e foram usados com o propósito de modificar a Quatro séculos depois, quando as frentes extrativistas
paisagem, antes ocupada apenas pelas malocas indígenas adentraram (...) novamente nos deparamos com relatos
floresta adentro. que constituem flagrantes do delírio de toda uma gente
A corrida pelo “ouro branco” produziu essas transfor- depositária de motivações, (...) para fins de enriquecimento
mações nos povos nativos modificando as suas organiza- ou (...) sobrevivência, focadas em outras paisagens, planos
ções sociais, propiciando enfermidades nunca antes vistas de sociabilidade, jogos de interesses” (ALMEIDA, 2006, p.
pelos índios, assim como a dependência econômica. Esta 95). Porque com o afastamento do extrativista de seu ter-
desarticulação se deu pela imposição física e ideológica e ritório e com o desmatamento, cada vez mais acentuados,
teve como consequência a inserção do índio a outro tipo ocorreram os empates. Empate era uma manifestação pa-
de sistema da qual nenhuma habilidade tinham. Para Al- cífica pelo qual seringueiros tentavam pacificamente evitar
meida (2006), isto é reflexo da formação da Amazônia mo- a derrubada, uma vez que dependiam do uso dos recursos
derna, calcada sob a égide do delírio e, muitas vezes, da naturais para a sua sobrevivência, especialmente da serin-
insensatez humana. Com isso, segundo a autora: O “olhar” gueira.
e desprezo que o colonizador tinha do índio é histórico e Foram então criadas as Reservas Extrativistas, conside-
matizado de preconceitos. rada por muitos como a Reforma Agrária dos seringueiros.
Esta foi a consideração de Castelo Branco ao apresen- Este reconhecimento de áreas tradicionalmente ocupadas
tar a forma como o colonizador tratava o indígena, ou seja, por eles só foi possível através de intenso fortalecimento
como animal “prejudicial e maléfico”, sendo o nativo con- político tais como a formação do Conselho Nacional de Se-
siderado como um ser inferior ao civilizado e, portanto, in- ringueiros e da aliança dos povos da floresta. A criação das
culto (CASTELO BRANCO, s/d). De outro lado, encontramos RESEX foi uma das formas de resistência à pressão provo-
o colonizador com a sua ambiguidade. Sob um ponto de cada pelo processo de pecuarização no Acre. Com relação
vista, estava o seringalista, administrador dos negócios na aos Projetos de Assentamento Extrativistas, estes tiveram
unidade produtora. De outro, o seringueiro, expropriado e como idéia inicial estabelecer uma espécie de assentamen-
atrelado as formas de poder e manutenção do seringal. O to diferente dos modelos convencionais da década de 70.
fato é que a construção do seringal, em seu início, provoca Pessoas que tinham perfil extrativista passaram a ocupar
muito bem esta relação de fronteira entre o patrão/ serin- determinadas áreas.
galista e o brabo/ seringueiro. Esta dicotomia também está A ideia central era a de criar condições sustentáveis no
manifestada na forma como o seringal era gerenciado, ou intuito de que as populações tradicionais pudessem explo-
seja, se por um lado a margem representava o espaço de rar de forma racional os recursos naturais existentes. Isso
poder, na qual concentrava o barracão, local onde o se- implicava na criação de uma nova categoria de território
ringueiro se endividava e também de onde emanavam as e uma tentativa do Instituto Nacional de Colonização e
ordens dos seringalistas. Reforma Agrária atentar para as possibilidades locais do
De outro, se localizava o centro, rico em hévea e onde território e do seu uso de forma comunal permitindo a
habitava o seringueiro, homem afastado da margem e subsistência das famílias residentes. Assentamentos Proje-
longe do rio, via de acesso para a sua chegada e a qua- tos de Assentamento Extrativista constituíram estratégias
se impossível saída. Era estratégica esta demarcação de para melhorar as condições de vida de populações “tra-
fronteiras. Era do barracão que o seringalista controlava o dicionais”. Devido a diversidade cultural foram propostos
seringueiro através de seus dispositivos, muitas vezes pu- em 2004 outras modalidades, levando em consideração as
nindo-o pelo descumprimento de suas ordens. Tamanho características socioculturais dos grupos residentes ou com
controle só é flexibilizado (mas não extinto) com a crise do afinidade ao território. Para Rego et al. (2004), os assen-

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tamentos de Reforma Agrária que foram fruto da política eram espécies de expedições com o intuito de escravizar
desenvolvimentista da década de 1970 foram implementa- ou mesmo dizimar os indígenas do território acreano. No
dos espacialmente de forma dispersa no estado do Acre. entanto, essas práticas não se restringiram apenas ao Acre,
Ainda assim, não foi levado em consideração as diferentes foram além de suas fronteiras. Neste caminho, Michael
identidades que compuseram os assentamentos e houve- Taussig (1993) apontou que esta prática era recorrente
ram vários tipos de interferência que provocaram a desar- em outros lugares da Amazônia e, muitas vezes, apenas o
ticulação do processo, dentre os quais destacam-se a das nome sofria variações.
grandes fazendas, seja no aspecto produtivo ou mesmo na As correrias associavam o indígena amazônico a um
reconcentração fundiária, o que provocou novas formas de sistema de escambo da pior espécie, relacionando – o sem-
apropriação e uso do território. pre a conquista. Entretanto, houveram alguns focos de re-
Os equívocos relacionados a implantação destes pro- sistência pelos indígenas. Neste sentido: Lembramos que
jetos de assentamento e as críticas direcionadas a este tipo as frentes de expansão se convertiam em duas. A primeira,
de unidade territorial provocou uma reflexão sobre pos- caucheira, não gerou nenhum movimento social e era avas-
síveis territorialidades que vislumbrem a relação entre o saladora no processo de desarticulação e destruição indí-
espaço físico e as identidades que permeiam a fração rural gena. Todavia, em oposição ao “nomadismo” da frente cau-
acreana. Para que isto fosse possível, alguns fatores foram cheira estava o “sedentarismo” dos seringais. Esta atividade
levados em consideração tais como: mudou o cenário do processo de ocupação indígena na
a) importância dos recursos florestais; região. Ela se torna a conquista da ocupação, metáfora que
b) povoamento por populações tradicionais; serve para destacar as mudanças culturais desenfreadas
c) desflorestamento e impacto ambiental, associados promovidas pelo contato e pela redefinição do território.
ao despovoamento; Para Aquino e Iglesias (1999): Nova procura pela mão-
d) alta concentração da propriedade de recursos na- -de-obra indígena só se deu após a Segunda Guerra Mun-
turais; dial. O período de espoliação dura até meados de 1970,
e) modo de vida próprio e identidade cultural; quando os índios passaram a ser aproveitados em uma ou-
f) concentração de agricultores familiares, especial- tra atividade econômica: a pecuária. A instituição de órgãos
mente no entorno de áreas de incidência de projetos de voltados para lidar com a questão indígena constituiu ou-
assentamento ou unidades de conservação; tro fator de fragilidade das organizações sociais dos povos
g) ameaça de danos em recursos ambientais, rios, la- indígenas. Este foi o caso da criação do Serviço de Proteção
gos, matas ciliares, vertentes, dentre outros e ao Índio, criado em 1910 que teve como finalidade ime-
h) separação da terra e dos recursos ambientais ou
diata a intenção de integrar o índio a sociedade nacional,
posse precária de agricultores familiares, ribeirinhos e se-
fomentan do um tipo de política paternalista aos territórios
ringueiros.
indígenas.
Neste sentido foram instituídas novas tipologias de
Calixto et all lembram que: O SPI contribuiu para o pro-
assentamentos com vista a Reforma Agrária, levando em
cesso de desarticulação cultural dos indígenas brasileiros.
consideração as territorialidades e a diversidade sócio –
Isso fica evidente durante o pós-guerra quando a institui-
cultural existente.
Portanto: Ainda assim, vale reforçar que para a manu- ção passa a autorizar a exploração em algumas áreas com
tenção dos assentamentos já criados, faz-se necessário um fins lucrativos. Este órgão foi extinto em 1967, sendo criada
novo modelo de gestão que contemple as relações cul- a Fundação Nacional do Índio. A FUNAI implementou a es-
turais com a finalidade de promoção do desenvolvimen- tratégia dos Governos militares de integração nacional pela
to sustentável. Terras Indígenas Com a crise da borracha, qual a maneira ideal de integrar o índio a sociedade seria
ocorrida a partir de 1912, houve uma interrupção do in- através da produção de suas áreas. Isto faria com que os
centivo pela busca da mão-de-obra nordestina. Neste caso, mesmos não se tornassem obstáculo ao novo processo de
intensificou-se o trabalho indígena, uma vez que passaram ocupação da Amazônia.
a fazer transportes de borracha, levar as “pélas” para as ci- Em 1980, ocorreu um processo de descentralização da
dades, abrir estradas de seringa, roçados e dentre tantas FUNAI e uma tentativa de restaurar a imagem desgastada
outras atividades ainda foram fortemente discriminados, durante o período da ditadura militar. Neste caminho, bus-
sendo chamados de caboclos. cou-se:
Desarticulados, acabaram sendo ludibriados pelos a) articulação com os governos estaduais e
seringalistas que tiravam proveitos destes através da ren- b) permissão de ação de outras esferas governamen-
da da borracha. Entretanto, o principal impacto estava na tais em Terras Indígenas.
proibição de práticas cerimoniais e ritualísticas, além da As últimas crises da borracha trouxeram como conse-
desarticulação da organização social (AQUINO & IGLESIAS, quências as invasões de Terras Indígenas, falta de subsídio
1994). Esta concepção também é aceita por Neves (2002) a principal atividade extrativista e conflitos sócio – ambien-
que expôs que nem o fim do primeiro surto da borracha tais. Neste caminho: Assim como as unidades territoriais
diminuiu a pressão a esses grupos que já estavam enfra- onde vivem seringueiros, as Terras Indígenas formam o que
quecidos e desarticulados politicamente. (ALMEIDA, 2006) considerou como “terras tradicionalmente
Os seringais, espalhados ao longo dos rios tornaram- ocupadas”. Isto implica afirmar que: Este é o caso também
-se unidades de dominação sobre as aldeias que contaram de outras categorias espalhadas Brasil a fora como as ter-
com algumas estratégias, dentre elas as correrias. Correrias ras de quilombo, “babaçuais livres”, “castanhais do povo”,

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dentre tantas outras que poderiam aqui ser mencionadas. há que se levar em consideração que o bem histórico, seja
Identificar, reconhecer ou regulamentar Terra Indígena no ele qual for, foi erguido por pessoas em algum lugar, em
Acre implica na incorporação definitiva de populações ét- algum momento de suas vidas. Estas pessoas utilizaram-se
nicas ditas “tradicionais” no estado – nação. de modos de fazer específicos do seu tempo e condições
Este processo de incorporação é tipicamente territorial materiais também muito delimitadas. A edificação, mesmo
(OLIVEIRA, 1999). As 34 Terras Indígenas existentes no Acre um palácio, ou uma igreja de qualquer século do milênio
possibilitou algumas estratégias de intervenção interes- passado, com toda a grandeza arquitetônica que os carac-
santes: a) o “fechamento” do corredor ecológico do oeste teriza, traz na sua história leituras sociais do seu tempo, as
da Amazônia (juntamente com a Estação Ecológica do Rio quais vivem num constante diálogo com a contempora-
Acre, Reserva Extrativista Chico Mendes, Parque Estadual neidade.
do Chandless e Parque Nacional da Serra do Divisor), b) A Casa de Chico Mendes, por exemplo, representa jus-
continuidade de sobrevivência de povos indígenas e c) re- tamente a diversidade, as tensões, os conflitos que caracte-
vitalização de alguns destes como foi o caso dos Nawa e rizam as referências históricas do Acre, sobretudo as atuais,
Contanawa na região do Juruá. mas também as do passado. É um patrimônio material
A formação das Terras Indígenas constitui uma legiti- vivo, e que não se encerra em si mesmo. Transformada em
mação central para a identidade dos índios que estão em sala memória, ela nos permite o diálogo com a diversida-
território acreano, tornando-se uma espécie de “compen- de, com a noção de tempo, espaço, lugar, território, enfim,
sação” histórica dos problemas que as diversas etnias en- uma infinidade de representações acerca da história acrea-
frentaram desde o século XIX. Este processo de “compen- na. Além de ter sido palco de um dos acontecimentos que
sação” também não foi nada fácil pelos conflitos de inte- mais mobilizaram a opinião pública brasileira, bem como
resses entre grupos existentes, assim como pela decisão a mundial, a morte de Chico Mendes nas condições ante-
política do Governo Federal, além da morosidade jurídica riormente postas, influíram nos rumos de políticas públicas
para a criação de TI’s no estado do Acre. ambientais por todo o planeta. Ainda podemos argumen-
Esta forma de permitir a permanência das identidades tar que a casa, o bem material, tornou-se um dos símbolos
indígenas através de seus territórios implicou também em da história acreana. História que incorpora, cada vez mais
outro debate sobre as sociedades emergentes no Acre. intensamente, outras influências que não apenas a tradição
Este foi o caso, por exemplo, dos Nawa instalados no Par- indígena ou nordestina, e que, mais do que nunca, apre-
que Nacional da Serra do Divisor que reivindicam o terri- senta requisitos para integrar o universo de bens, conside-
tório utilizando como argumento central a identidade ét- rados pelo Estado, patrimônio histórico e artístico nacional.
nica. Esta reivindicação por parte dos Nawa data de 1999, A Constituição Federal de 1988 (2003) entende como
momento em que assumiram definitivamente a sua iden- patrimônio cultural brasileiro: “os bens de natureza mate-
tidade, gerando uma incompatibilidade com o Instituto de rial e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,
Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA), uma vez que portadores de referência à identidade, à ação, à memória,
as famílias residem no norte do Parque Nacional da Serra dos diferentes grupos formadores da sociedade brasilei-
do Divisor. ra”. O entorno da casa, assim como quase toda a cidade
de Xapuri, ainda não foi modificado drasticamente. As ruas
O Patrimônio Histórico do Acre pavimentadas com tijolos, as casas imediatamente vizinhas
– com uma arquitetura similar à de Chico –, o bosque, nos
O conceito de patrimônio histórico evoca a imagem de fundos da casa, que leva ao rio e que um dia serviu de es-
um conjunto de monumentos antigos que devemos pre- conderijo para os assassinos de Chico Mendes, continuam
servar, seja porque constituem obras excepcionais, seja por lá. Um imenso apuí, localizado no limite esquerdo, impede
terem sido palco de eventos marcantes para a história na- que o sol castigue a casa durante a maior parte do dia, aca-
cional. No entanto, este conceito não atende à diversidade, bando por quase criar um microclima. Toda a paisagem do
às tensões, aos conflitos que formam a cultura de uma so- seu entorno imediato proporciona leituras da diversidade
ciedade. A dinâmica social há muito já engoliu essa idéia. O cultural que as concebeu. A Casa de Chico Mendes, o Palá-
patrimônio vai para além de elementos arquitetônicos, an- cio Rio Branco, ou mesmo a pracinha central da cidade de
tigos, mas se entrelaça em outras referências materiais ou Manoel Urbano, trazem em sua materialidade histórias que
não. Segundo FONSECA (2004), “os critérios adotados para permitem a compreensão das partes que compõe o todo,
o tombamento terminam por privilegiar bens que referem da diversidade que cria as sociedades.
os grupos sociais de tradição européia, que, no Brasil, são
aqueles identificados com as classes dominantes”. No en- Chico Mendes: Uma Casa, Um Museu.
tanto, hoje há um contexto favorável a uma ampliação do
conceito de patrimônio cultural e a maior abrangência de A casa de Chico Mendes é uma das imagens mais co-
políticas públicas de preservação, o que acaba por incluir nhecida do Estado do Acre. A morte do seringueiro, ecolo-
aspectos da cultura que há alguns anos não eram partíci- gista, líder comunitário e defensor incondicional da Ama-
pes do patrimônio brasileiro. É claro que os antigos sítios zônia, foi amplamente divulgada e discutida em vários paí-
ou monumentos históricos representam parte da memória ses da Europa e nos Estados Unidos, e como o assassinato
de um lugar. Determinam à noção de espaço, como tam- foi em sua casa, aquela imagem da casinha azul rodou o
bém a apreensão deste espaço pela sociedade. Entretanto mundo e foi vinculada à história dos conflitos nos seringais

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acreanos. Construída de forma semelhante em outras ci- A Cultura Acreana


dades do Acre, representa um modo específico e regional
de morar, cujo engenho dos construtores sintetiza a dialé- A identificação de bens culturais representativos dos
tica entre a ocupação dos brasileiros junto às fronteiras diferentes grupos sociais, bem como a construção de ins-
da Amazônia e os recursos disponibilizados pela floresta. trumentos e métodos adequados à sua pesquisa e valoriza-
A casa de Chico, mesmo na cidade, traz características da ção, é tema de antiga discussão no âmbito das instituições
construção no seringal. As moradias constituídas de um afins, principalmente depois da promulgação da Constitui-
primeiro retângulo principal formado por sala/varanda, um ção de 1988, que incorpora a visão antropológica da cultu-
ou dois quartos e corredor e um segundo retângulo inde- ra e das noções de bem cultural. Quando se fala em bens
pendente, onde fica a cozinha. Estes dois retângulos são li- culturais, se pressupõem sujeitos para os quais estes bens
gados por uma passarela, também em forma de retângulo. façam sentido. A riqueza daí extraída não pode ser mensu-
A presença da mulher provoca alterações na casa. Quando rada. O fazer, o falar, ou qualquer outra prática transmitida,
a casa é uma barraca para abrigar apenas o homem na “co- reconstruída, adaptada, traz na subjetividade, as marcas
locação” há apenas uma clareira, a barraca, o defumador, da construção das sociedades. O dinamismo talvez seja a
as “estradas de seringa” e os “varadouros”. Quando a mu- característica mais latente quando o assunto é a cultura,
lher chega, a casa não é apenas um abrigo, mas uma casa seja de natureza material ou imaterial. O Estado do Acre,
com sala, quarto e cozinha para abrigar e proteger a famí- objeto do nosso estudo, foi povoado por imigrantes que
lia. Na colocação passam a existirem cercados para peque- buscavam na borracha acreana a possibilidade de melhorar
nos animais, horta, fruteiras, roçado. A casa fica suspensa de vida. Muitos fugiam da seca, das guerras, da miséria ou,
sobre barrotes, evitando a umidade. simplesmente, buscavam aventuras e riquezas.
A adaptação do nordestino a seu novo lugar é eviden- No início do século XX, a região que viria a ser o Acre
ciada por um modelo de moradia simples, mas adequado à recebeu um grande número de pessoas vindas dos luga-
realidade e às necessidades cotidianas. Os materiais como res mais distantes. Não vinham somente do Nordeste do
paxiúba, palha e cavaco são extraídos da própria floresta, Brasil, mas deste eram a maioria. Cariocas, amazonenses,
nas proximidades da colocação. A paxiúba, por ser fibra paulistas, paranaenses, além de árabes, sírios, libaneses,
natural, faz o isolamento térmico. Sua coloração opaca portugueses, entre outros, com suas bagagens repletas de
não irradia calor; a trama da palha na cobertura e o encon- recordações de uma terra natal – que alguns nunca mais
tro das peças de paxiúba deixam frestas que possibilitam voltariam a ver –, aqui conviveram e se misturaram. Desde
a ventilação e iluminação natural no interior da casa. Os a chegada foram para os seringais “cortar seringa”; outros
vãos das portas e aberturas não são fechados e as paredes foram percorrer os rios com mercadorias, ou mesmo levar
não chegam até a cobertura, onde também não há forro. borracha para as praças de Belém e Manaus. A busca pela
Além de sua representatividade arquitetônica, construída borracha amazônica criou novos ofícios e, para eles, no-
com saberes transmitidos ao logo de tempos imemoriais, vos sujeitos. Eram seringueiros, marisqueiros, comboieiros,
a casa reveste-se de significados que remetem a questões guarda-livros, seringalistas, regatões. Daí também se esta-
socioambientais, que extrapolam as fronteiras estaduais. beleceu novas relações: o seringueiro era quem produzia a
Chico Mendes foi uma figura referencial da luta seringuei- borracha, mas era o patrão seringalista que dela se apro-
ra pela preservação da floresta, e converteu-se num ícone priava; o regatão negociava mais barato, mas nessas águas
ambientalista para todo o mundo. Da mesma forma, outros de tantos seringais este ofício era perigoso.
patrimônios, espalhados por todos os municípios, devem Ao longo do tempo os acreanos aprenderam a se re-
ser apropriados como a casa de Chico Mendes, para que lacionar e criaram formas de estreitar as relações. Através
possamos perceber a cultura acreana nas expressões mais das celebrações, festas, jogos, danças, modos de fazer, culi-
cotidianas, como no construir de uma casa ou uma ubá. nária, foram moldando novas práticas, mais adaptadas à
O inventário regionalizado, construído em parceria com as região. Elementos da cultura indígena, celebrações religio-
comunidades, surge como uma das principais formas de sas, modos de fazer, ofícios, enquadram-se neste tópico,
reconhecimento e consequente proteção deste patrimô- um universo riquíssimo de expressões culturais. A multipli-
nio. O levantamento e a organização do conjunto de in- cidade e a diversidade são justamente um dos principais
formações caracterizam os sítios históricos como bens his- pontos a serem discutidos. Através da identificação e re-
tórico-culturais ou paisagísticos, transformando-se numa conhecimento desta pluralidade, poderemos melhor com-
importante ferramenta de gestão e de sustentabilidade do preender a cultura acreana. Sugerimos um olhar especial
patrimônio. O patrimônio histórico material (edificado) tem para as referências culturais, por se constituírem elementos
recebido especial atenção das instituições governamentais. criadores, vivos, atrelados a um passado, mas ao mesmo
No Acre, como já sugerido, houveram investimentos nos tempo, modificadores da realidade.
espaços destinados à memória acreana. Museu da Bor- A distribuição por Regionais nos permite a visualiza-
racha, Palácio Rio Branco, seringal Bom Destino, Rua do ção das ações de fomento, onde ocorrem e de que forma
Comércio de Xapuri, Centro Cultural de Cruzeiro do Sul, poderemos abranger um universo maior de referências
Teatro de Tarauacá, entre outros, têm ajudado a contar as culturais. O carnaval e as Festas Juninas foram às únicas
muitas histórias do Acre. expressões identificadas em todos os municípios acreanos.
Ainda que não houvesse um inventário específico para que
pudéssemos melhor qualificar essas festas em cada lugar,

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HISTÓRIA DO ACRE

o carnaval e as Festas de Junho são celebradas nos lugares o estabelecimento de regras de comportamento a serem
mais distantes. No entanto, cada lugar, cada comunidade, adotadas pelos visitantes, de modo que a proteção/pre-
se apropria dessas festas de uma forma especial. No Santo servação do bem cultural se torne prática usual. Embora
Daime, por exemplo, não importando qual das correntes já se tenha um trabalho voltado para a indústria turística,
daimistas (Barquinha, Colônia Cinco Mil, Alto Santo), há com a exploração de diversas referências históricas e cultu-
uma celebração intensa durante todo o mês de junho. rais do Estado do Acre, este trabalho está ainda no come-
A Cavalhada, ao contrário das festas acima descritas, ço. Percebe-se que as regionais do Alto e Baixo Acre, bem
é praticada somente nos municípios de Manuel Urbano e como do Juruá, dispõe de uma quantidade muito grande
Sena Madureira. Revitalizada há alguns anos com a ajuda de informações acerca da história, como também no que
do DPHC-FEM, a Cavalhada perdeu diversos elementos diz respeito à conservação e fomento do patrimônio cul-
que a constituíam nas décadas de 40 e 60, anos em que a tural e ambiental, entretanto têm-se inúmeras lacunas nas
corrida pelas argolas ainda trazia semelhança daquela que demais regionais, principalmente se olharmos as mesmas
representava a guerra entre os cristãos e os mouros. Os informações a partir dos municípios. Dos vinte e dois muni-
partidos, outrora apenas o Azul e o Encarnado, agora são cípios do Acre somente a capital esboça uma política volta-
quatro. Os partidos Verde e Negro entraram na disputa. da para a preservação do patrimônio cultural, embora ain-
Na festa, o mais importante é a habilidade do cavaleiro em da não disponha de uma legislação específica que regule
retirar as argolas do travessão. Os cavaleiros disputam à esta preservação. Através dos planos-pilotos os municípios
carreira em duplas; um cavaleiro de cada time parte em di- poderão iniciar uma série de inventários que nos dê um
reção à sua argola. Vence aquele partido que retira mais ar- olhar mais aproximado do potencial e das prioridades no
golas (Figura 6). Além da Cavalhada, ao longo dos últimos que tange ao turismo. É bem verdade que as regiões que
sete anos o DPH realizou um intenso trabalho de identifi- dispõe de maior fluxo turístico são as mesmas que dispõe
cação de referências culturais, junto a diversas comunida- de um maior número de informações acerca das referên-
des. No contexto das ações do Patrimônio Histórico foram cias culturais, seja pelo acesso seja pela presença de outros
cumpridos planos de identificação e salvaguarda, através fatores que puderam viabilizar um trabalho de fomento à
das diversas pesquisas desenvolvidas. Povos indígenas, co- visitação turística e consequente preservação das referên-
munidades daimistas, grupos praticantes de ofícios e ce- cias locais. Diversos fatores se mostram decisivos para que
lebrações estão entre os objetos de pesquisa. Entretanto o crescimento do fluxo turístico seja de fato sustentável,
temos um campo extremamente vasto de possibilidades. É dentre eles podemos destacar: a Sinalização nas estradas
necessário que os municípios assumam seu papel na iden- de acesso e no entorno: com base em convenções inter-
tificação e salvaguarda das referências culturais, posto que nacionais, o Brasil dispõe de um sistema nacional de sinali-
as relações, assim como a atribuição de valor e significa- zação de estradas, elaborado pelo DNIT e Embratur, e que
dos, acontecem numa escala infinitamente menor do que inclui as referências a elementos de atração turística. No
se vem trabalhando nos dias de hoje. Acre, tem-se adotado uma sinalização turística bastante in-
teressante, utilizando-se de elementos da cultura indígena
Indicativos Para a Exploração Sustentável do Patri- (grafismo) para indicar, por exemplo, a Casa dos Povos da
mônio Floresta.
- Legislação específica: o conhecimento sobre a legis-
Durante a análise do patrimônio histórico e natural lação de proteção ao patrimônio cultural brasileiro é da
do Estado do Acre, constatou-se que apenas uma peque- maior importância, não só para o administrador/proprie-
na parte dos bens dispunha de alguma informação acerca tário da área, como para os visitantes. A divulgação dessas
das potencialidades turísticas ou mesmo da sua apreensão informações cabe às instituições públicas e/ou privadas
pelas comunidades. Do total de sítios e outros patrimô- com atuação no assunto, mas também ao administrador
nios levantados para a presente análise, cerca de 50% dos ou proprietário da área onde o bem cultural está situado.
bens tinham alguma informação sobre as potencialidades - Equipamentos básicos e adicionais: deve- -se evitar a
turísticas, fossem quanto à acessibilidade ou mesmo a implantação de equipamentos sem planejamento e estudo
existência de alguma infraestrutura, dentre eles estão os da área, sendo necessária a avaliação sobre a adequação
museus, os sítios históricos, ou mesmos os sítios arqueoló- das estruturas. Os materiais utilizados poderão variar se-
gicos. Tendo em mente a necessidade de dar cumprimento gundo a região do país, mas, preferencialmente, devem se-
à legislação específica de proteção ao patrimônio cultural guir alguns parâmetros, tais como durabilidade, integração
brasileiro, apresentamos alguns indicativos discutidos du- ao entorno, disponibilidade na região e harmonia com as
rante a Oficina de Interpretação de Sítios Arqueológicos estruturas pré-existentes. Deste modo, não se recomenda
para o Turismo Cultural, quando foram relacionados alguns uma padronização, mas sim um projeto integrado à pai-
critérios básicos para as atividades turísticas ligadas ao pa- sagem da região. O planejamento para a implantação de
trimônio material, quais sejam: equipamentos em uma área de visitação deve incluir os
- disponibilidade de informações corretas e concisas seguintes pontos: a) equipamento básico: são as áreas de
sobre o bem cultural em questão - o que é? O que signi- visitação que devem conter, necessariamente, sanitários
fica? Para que serve? Como? Quando e por quem foi fei- masculino e feminino, bebedouro, centro de informações
to? -, de maneira que possam ser repassadas ao público, e apoio ao visitante, lixeiras, ambulatório para primeiros
com o caráter de divulgação e de educação patrimonial; a socorros e área delimitada para estacionamento; b) equi-

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HISTÓRIA DO ACRE

pamento adicional: podem ser incluídas instalações como processos que ocorrem em um lado da fronteira não são
sala para projeção de filmes ou slides, palestras, bar/res- detidos pelo limite internacional, formando assim um es-
taurante, área para camping e outros. paço de interações Transfronteiriças. As migrações inter-
- Acessibilidade: a facilidade de acesso a um local vai nacionais mostram a penetração do povoamento brasileiro
determinar em parte a sua viabilidade como produto tu- no interior da faixa de fronteira boliviana, propagando um
rístico. É mais fácil desenvolver rotas e atrativos que se en- novo modo de relações sociais e que configuram um tipo
contram acessíveis ao público. Determinamos à acessibili- de interação tipicamente regional, marcado pela proximi-
dade em três graus: dade da área de origem e de destino. O comércio exterior
(a) fácil, mostra que a zona de fronteira tem um papel secundário
(b) média e nas relações comerciais entre os dois países. Vale destacar
(c) difícil. Fácil quer dizer que transporte público che- ainda a Iniciativa MAP (Madre de Dios/Peru, Acre/Brasil e
ga diretamente ao bem, ou tem algum tipo de transporte Pando/ Bolívia), um movimento de integração fronteiriça
disponível sempre para chegar ao local. Média quer dizer criada em 1999. Trata-se de um “espaço público” composto
que não tem transporte público que chegue diretamente por representantes de instituições públicas e privadas, pes-
ao local, ou precisa de mais de um meio de transporte para quisadores de diversas áreas e membros da sociedade civil
chegar. Acessibilidade difícil quer dizer que o local só pode da Amazônia Sul-Ocidental, denominado região MAP. A
ser visitado em certas épocas do ano (dependendo das iniciativa tem como interesse discutir alternativas e forma-
condições das estradas ou ramais), precisando de vários tar propostas integradas que promovam o desenvolvimen-
meios de transporte para chegar e devidamente agenda- to sustentável na região de fronteira. Espaço público aqui é
dos com antecedência. entendido como um espaço não estatal formado por vários
- Infraestrutura: o tipo de infraestrutura turística dispo- setores e redes sociais que somam seus esforços para o en-
nível aos visitantes, seja no próprio bem ou nos arredores. frentamento de problemáticas socioambientais, assumindo
Nesta categoria inserimos hospedagem e restaurantes. um papel de colaboradores para a formulação e gestão de
- Áreas de Interesse turístico: as características do bem políticas públicas, pelas vias do desenvolvimento susten-
que podem ser considerados atrativos turísticos como a tável, em resposta às demandas sociais na fronteira Brasil,
história, arquitetura, manifestação da cultura, beleza cêni- Bolívia e Peru. Passando a existir, a partir do momento em
ca, ou importância natural ou científica. que vários atores sociais com interesses diversos aceitam
- Informações adicionais: aqui detalhamos sugestões que o enfrentamento dos problemas socioambientais que
para desenvolver turisticamente o bem e os cuidados a os afetam devem ser feitos por meio do debate coletivo,
serem tomados. Conseguimos perceber um enorme po- da busca de soluções socialmente e coletivamente cons-
tencial turístico no que se refere ao patrimônio histórico/ truídas. Com isso, cria-se um espaço de negociação e dis-
cultural e paisagístico do Acre, entretanto, é preciso se uti- cussão privilegiando.
lizar de critérios bem determinados, para que a visitação
pública a qualquer que seja o bem, não lhe cause impacto Fonte do material
negativo. É recomendável a exploração turística em todas Disponível em:
as áreas da cultura, desde que a comunidade construa seus http://www.agencia.ac.gov.br/wp-content/
próprios mecanismos de proteção e fomento da diversida- uploads/2011/10/downloads_zee_vol.4_cultural_politico.
de cultural da região. pdf
A Secretaria de Estado de Turismo do Estado do Acre
(SETUR) tem trabalhado em rotas turísticas a caminho de
Xapuri e Porto Acre. Em Xapuri a Casa de Chico Mendes,
representa o maior atrativo, entretanto, tenta-se agregar
outros atrativos para que o turista possa conhecer outras
referências: o Museu do Xapuri e a Rua do Comércio, loca-
lizados próximos à Casa de Chico Mendes são passagens
obrigatórias. Além destes, a caminho de Xapuri foram tra-
balhados uma série de outros atrativos como: o amendoim
do Quinari, o Seringal Cachoeira entre outros. Da mesma
forma tenta-se agregar outros valores à visita ao Seringal
Bom Destino. A Rota da Revolução começa em Rio Branco,
passa pela Sala Memória de Porto Acre, e termina no Serin-
gal Bom Destino.

Acre: Integração Transfronteiriças com o Peru e a


Bolívia

A zona de fronteira do Brasil com a Bolívia é um im-


portante espaço de articulação e de comunicação entre as
lógicas territoriais dos dois Estados. As características e os

19
HISTÓRIA DO ACRE

QUESTÕES 03. (SEE-AC - História e Geografia de Estados e Mu-


nicípios - Professor – FUNCAB/2016) “A história dos po-
01. (SEE-AC - História e Geografia de Estados e Mu- vos indígenas no Acre a partir da chegada dos não índios
nicípios - Professor – FUNCAB/2016) “Quando, a partir é marcada por um tempo desfavorável. Os não índios, vi-
de 1860, começaram a acontecer as primeiras viagens de sando a exploração capitalista das riquezas dessas terras
exploração se constatou, não só a presença indígena, mas forçaram os indígenas a colaborar no processo de extra-
a grande riqueza natural dos rios acreanos, despertando a ção da goma elástica durante o período áureo da borracha.
cobiça dos exploradores. Já em 1870 tinha início uma ver- Os contatos se deram muitas vezes de forma conflituosa,
dadeira corrida do ouro que fez com que em poucos anos caracterizando as conhecidas “correrias”. (SILVA, Maria Ro-
os rios acreanos fossem tomados de assalto. Milhares de drigues da. Uma história de conflitos. In: Povos do Acre:
homens vindos de todas as partes do Brasil e do mundo história indígena da Amazônia Ocidental Rio Branco, FEM,
passaram a subir os rios estabelecendo imensos seringais 2002, p. 52)
em suas margens. Era a febre provocada pelo ouro negro,
a borracha extraída da seringueira que depois de defuma- O fragmento acima caracteriza o conflito entre o co-
da era exportada para abastecer as indústrias europeias e lonizador e os diferentes grupos étnicos pré-existentes no
norte-americanas, cada vez mais ávidas por esse produto.” território do Acre. A violência não física foi um dos instru-
(NEVES, Marcos Vinícius. História Nativa do Acre. In: Povos mentos utilizados no processo de colonização, sendo me-
do Acre: História indígena da Amazônia Ocidental. Gover- lhor exemplificado pela(o):
no do Estado do Acre, Rio Branco, 2002, p. 13) a) formação de um grupo de índios extirpados cultu-
O fragmento acima sobre o processo de colonização ralmente, perdendo com isso o modo de vida tradicional
da Amazônia Ocidental e, mais precisamente na região do e suas crenças. b) intenso genocídio dos grupos étnicos
Acre, deixa claro que: que não colaboraram no processo de extração da goma
a) existiu grande diversidade de conflitos entre os po- elástica.
vos nativos que inviabilizaram a formação do ciclo da bor- c) localização de grupos étnicos em áreas remotas,
racha. formando grupos indígenas denominados de arredios ou
b) ocorreu um intenso processo de desmatamento da brabos.
Amazônia com a consolidação dos seringais próximos aos d) patrocínio realizado pelos colonizadores às guerras
rios. interétnicas, principalmente dos grupos brasileiros contra
c) os povos nativos possuíam o monopólio do comér- os bolivianos.
cio da borracha no mercado internacional. e) criação de um organismo governamental, denomi-
d) os rios amazônicos foram fundamentais no processo nado FUNAI, que promoveu a separação territorial de gru-
de colonização, bem como no ciclo da borracha. pos étnicos distintos.
e) a colonização foi baseada na diversidade de peixes
que possuíam alto valor no mercado internacional. 04. (SEE-AC - História e Geografia de Estados e Mu-
nicípios - Professor – FUNCAB/2016) O processo de for-
02. (SEE-AC - História e Geografia de Estados e Mu- mação econômica do Acre ocorreu no contexto da expan-
nicípios - Professor – FUNCAB/2016) Nas últimas déca- são da frente pioneira extrativista cuja base era
das do século XIX e início do XX, a região amazônica sofreu a) a cassiterita.
grande influência dos principais acontecimentos mundiais. b) o pau-brasil para indústria madeireira.
Pode ser destacada a ampliação e a diversificação da pro- c) o látex para a produção de borracha.
dução industrial na Europa e nos Estados Unidos, porém d) a mineração de ouro.
ainda nas primeiras décadas do século XX, a região do Acre
sofreu um declínio econômico que representou também 05. (SEE-AC - História e Geografia de Estados e Mu-
a diminuição do ritmo de crescimento populacional. Este nicípios - Professor – FUNCAB/2016) Constitui o primei-
declínio econômico ocorreu, principalmente, pelo seguinte ro grupo étnico formador do povo acreano:
fator: a) o índio
a) consolidação da industrialização nos países da Amé- b) o caboclo amazônico
rica do Sul e Central. c) o nativo
b) transferência de mudas de seringueiras para as co- d) o nordestino
lônias inglesas na Ásia.
c) intenso desmatamento da Amazônia Ocidental devi-
do à agricultura da soja. GABARITO
d) processo de partilha da África e Ásia, patrocinadas
pelas potências europeias. 01. D
e) implementação da lei federal que proíbe a pesca nos 02. B
igarapés da Amazônia. 03. C
04. C
05. D

20
HISTÓRIA DO ACRE

ANOTAÇÕES

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HISTÓRIA DO ACRE

ANOTAÇÕES

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GEOGRAFIA DO ACRE

1. Aspectos geográficos e ecológicos da Amazônia e do Acre. Formação econômica do Acre. Processo de anexação do
Acre ao Brasil: tratados e limites........................................................................................................................................................................ 01
2. Municípios e populações do Acre: população e localização. Nova configuração do mapa. Microrregiões. Atuais mu-
nicípios.......................................................................................................................................................................................................................... 10
3. Relevo, vegetação, clima, solo, hidrografia, fluxo migratório, extrativismo e Zoneamento Ecológico do Acre. A paisa-
gem local e sua relação com outras paisagens (semelhanças e diferenças, permanências e transformações). ............... 14
4. Linguagem cartográfica: leitura de mapas................................................................................................................................................ 25
5. Modos de vida no campo e na cidade. ...................................................................................................................................................... 33
6. Papel da tecnologia na configuração de paisagens urbanas e rurais e na estruturação da vida em sociedade........... 40
7. Apropriação e transformação da natureza. Preservação e cuidados com o meio: como o homem usa a natureza e
constrói o seu espaço; o processo industrial e suas relações no município, no estado e no país........................................... 48
GEOGRAFIA DO ACRE

1. ASPECTOS GEOGRÁFICOS E ECOLÓGICOS


DA AMAZÔNIA E DO ACRE. FORMAÇÃO
ECONÔMICA DO ACRE. PROCESSO DE
ANEXAÇÃO DO ACRE AO BRASIL: TRATADOS
E LIMITES.

Amazônia
A Amazônia é uma imensa região natural, individualizada por elementos da natureza, como o clima, a vegetação, a hi-
drografia etc, que se estende por 6,5 milhões de quilômetros quadrados no norte da América do Sul.
É uma região internacional (Amazônia continental), também conhecida como Pan-Amazônia, pois ocupa parte do terri-
tório de vários países: Brasil, Peru, Colômbia, Equador, Venezuela, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Essa imensa
área verde representa um terço da reserva mundial de florestas latifoliadas, com clima equatorial (quente e úmido) e rica
hidrografia.
Nas regiões do Peru e da Bolívia, desenvol­veu-se uma das grandes civilizações pré-colombianas, cujos membros eram
denominados filhos do Sol ou incas.

Uma outra forma de regionalizar o Brasil, sem ser pela regionalização oficial do Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
tística (IBGE) em Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste, é a regionalização em áreas geoeconômicas, ou complexos
regionais, sendo eles: Amazônia, Nordeste e Centro-Sul.
O complexo regional da Amazônia é o maior territorialmente e simultaneamente o menos populoso dos três complexos.
Este contraste se dá em função das vastas áreas de mata ainda preservadas na região, dificultando a ocupação pela popu-
lação humana da área florestal a ser preservada.

Amazônia Legal
A Amazônia Legal é a porção localizada no território brasileiro, com quase 5 milhões de quilômetros quadrados
(4.978.247 km2), uma superfície que abrange 58,4% da área total do Brasil. É a Amazônia Legal.

1
GEOGRAFIA DO ACRE

por uma pequena parte no sudeste do Tocantins, soman-


do-se parte dos Estados do Mato Grosso e do Maranhão, o
clima e demais fatores serão basicamente aqueles encon-
tramos na região norte do Brasil. Sendo assim, é nítido o
predomínio do clima equatorial e tendo como vegetação a
floresta equatorial mais famosa do mundo, que é a floresta
amazônica.
Mais para o extremo norte e extremo sul da região já
há a mudança do clima para o tropical, no caso do extre-
mo sul havendo a transição para a vegetação do Cerrado.
No sentido Leste, adentrando o Estado do Maranhão há a
presença da Mata de Cocais que é uma vegetação de tran-
sição entre a floresta amazônica e a caatinga do semiárido.
A Mata de Cocais é uma região de grande diversidade de
Foi estabelecida em 1966, pelo governo federal, com palmeiras, entre elas o açaí, a carnaúba e o babaçu, que são
a criação da Sudam (Superintendência para o Desenvol­ importantes fontes de renda para a região.
vimento da Amazônia). A Sudam foi criada com o objetivo Fora da Zona Franca de Manaus, alguns destaques
de incentivar a indústria e a agropecuária, criar estradas, econômicos deste complexo regional são a produção de
promover o po­voamento etc. açaí, palmito (especialmente o do açaízero), bem como a
A Amazônia Legal inclui todas as forma­ções florestais extração de outros insumos vegetais e também minerais
da floresta equatorial (floresta de várzea e igapó, floresta (como a Bauxita no Estado do Pará, mineral usado para a
de terra firme e floresta semi-úmida) e áreas de transição produção do alumínio). Além disso, há um destaque para o
para a caatinga e o cerrado. ecoturismo na floresta amazônica.
A Amazônia Legal é formada pelos estados da região
Norte (Acre, Rondônia, Amazonas, Pará, Roraima, Amapá, Aspectos ambientais
Tocantins), pela porção ocidental do Maranhão e Mato Apesar das dificuldades para a ocupação humana de
Grosso. boa parte deste complexo regional, devido a densidade da
floresta amazônica, temos nesta área uma importante re-
Aspectos econômicos serva estratégica, não apenas pela diversidade de vegetal,
A economia da Amazônia apresenta um papel interme- animal e mineral que pode ser extraída da região, mas tam-
diário na economia, sendo inclusive a que mais se desen- bém pela importância ecológica da Amazônia para todo
volvia no Brasil no ano de 2009 (segundo o IBGE), apesar o mundo, bem como por suas fartas reservas de água e
das dificuldades de ocupação territorial e das grandes de- também a diversidade cultural que existe na região, inclu-
sigualdades dentro da região. Tem como um grande des- sive com tribos indígenas pouco conhecidas habitando o
taque econômico a Zona Franca de Manaus, que produz coração da floresta.
boa parte dos produtos eletroeletrônicos, dentre outros Entre os recursos hídricos, se destacam os grandes
produtos que são consumidos no Brasil. rios como o Rio Amazonas que nasce do encontro do Rio
A Zona Franca de Manaus é controlada pela SUFRA- Negro e do Rio Solimões. O encontro do Rio Negro e do
MA, órgão do Governo Federal que foi criado junto com a Rio Solimões é famoso por conta das águas que não se
própria Zona Franca, visando incentivar o desenvolvimento misturam devido a diferença nas densidades, fazendo com
econômico na Amazônia Ocidental. A Zona Franca de Ma- que o encontro de águas mantenha duas cores distintas de
naus foi criada em 1967, pelo decreto-lei nº 288/67, tendo água correndo juntas. Os rios são abundantes na região,
três polos diferentes. O primeiro que é o polo comercial e servindo como fonte de renda e como meio de transporte,
foi o primeiro polo de grande relevância na mesma, espe- sendo a navegação fluvial bem comum na área. Entretan-
cialmente antes da abertura econômica do Brasil, sendo o to, apesar de ter até a famosa pororoca, ondas criadas no
principal canal de importação e exportação de produtos encontro das águas dos rios com as águas oceânicas, a re-
para o mercado brasileiro até os anos e 1980. gião da Amazônia possui o menor litoral dentre as regiões
Na atualidade, com uma economia aberta ao mercado brasileiras.
internacional, o polo que sustenta a Zona Franca de Ma- Toda esta diversidade tem estado ameaçada pelo des-
naus é o polo industrial, que conta com diversos tipos de matamento causado em função do avanço do agronegócio
reduções de impostos (e até isenções em alguns casos) sobre a floresta, a grilagem de terras, a falta de um controle
para as indústrias que ali se instalem. efetivo do governo federal sobre as fronteiras (servindo de
Há ainda o polo agropecuário, voltado principalmente rota para o crime organizado e para a biopirataria), dentre
para a agricultura de subsistência, com excedentes ven- outros problemas que fazem com que o Brasil sofra du-
didos na própria cidade de Manaus, capital do Estado do ras críticas internacionais pelo descaso com a região que é
Amazonas. considerada estratégica para todo o mundo.
Por sua base ser a Região Norte (conforme a classifica-
ção do IBGE), ocupando todos os seus Estados (Amazonas,
Acre, Amapá, Rondônia, Roraima, Pará e Tocantins) exceto

2
GEOGRAFIA DO ACRE

Floresta amazônica
A floresta Amazônica possui aproximadamente 5,5 milhões de km², sendo que 60% no Brasil, e o restante (40%) na
Colômbia, Equador, Bolívia, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. No Brasil, a floresta é chamada de Ama-
zônia Legal e abrange os Estados do Amazonas, Amapá, Mato Grosso, oeste do Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima, Acre
e Tocantins.

Mapa da Amazônia Legal

A floresta Amazônica é densa e fechada, o que dificulta a sua penetração e ocupação, higrófita (adaptada a grande
umidade), perenifólia (apresenta folhas verdes nas copas durante o ano todo), e latifoliada (folhas grandes e largas).
Possui grande biodiversidade (variedade de espécies animais e vegetais).
Há milhões de anos, a área onde está localizada era um mar e, por isso, ela apresenta solos geologicamente pouco
férteis e arenosos. A floresta derruba seus galhos, frutos, folhas, animais morrem, etc. formando uma camada superficial de
matéria orgânica que se decompõe e transforma-se em húmus que, por sua vez, alimenta a vegetação.

Ciclo de carbono
Ela se auto sustenta, pois se mantém produzindo o seu próprio alimento e criando um ciclo de carbono relativamente
fechado. Por isso quando é queimada ou desmatada e se desenvolve a agricultura durante alguns anos, em grandes áreas,
a dinâmica da floresta é interrompida e os nutrientes depositados são consumidos.
É necessário muito tempo para ela se recuperar ou, pior, a floresta pode entrar em um processo de degradação com
processos erosivos intensos.
O ciclo de oxigênio também é algo polêmico por que alguns autores chamam a
Amazônia de pulmão do mundo, querendo dizer que ela produz muito oxigênio para o planeta todo, o que não é ver-
dade: apesar de produzir muito oxigênio, pelo processo da fotossíntese, este é consumido à noite e pela decomposição da
matéria orgânica.
A Amazônia é muito importante para o ambiente do planeta pois ela fixa o carbono da atmosfera, através do crescimen-
to das plantas e da fotossíntese, reduzindo, assim, o efeito estufa. Ela reduz a variação da temperatura junto ao Equador,
atuando como um aparelho de ar condicionado, caso a floresta não existisse a grande variação diária de temperatura po-
deria provocar deslocamentos intensos de vento o que mudaria o clima terrestre.

Diversidade e complexidade
Também não podemos esquecer que ela abriga um grande número de povos indígenas, sem falar em sua riqueza de
matéria prima variada (remédio, minerais, alimentos, etc). Em uma análise por satélite da Amazônia, foram identificados 104
sistemas de paisagens, o que revela uma alta diversidade e complexidade de ecossistemas.
A árvores da Amazônia variam entre 40 e 300 espécies diferentes por hectare. Das 250.000 espécies de plantas superio-
res da terra, 170.000 (68%) vivem exclusivamente nos trópicos, sendo 90.000 na América do Sul.

3
GEOGRAFIA DO ACRE

Podemos dividir a floresta Amazônica em três grandes - Formas de Dissecação – Esse é composto por colinas,
grupos: cristas e interfluvios tabulares.
1) Florestas de Igapó: ocorrem em solos que permane-
cem alagados durante cerca de seis meses, em áreas pró- Clima
ximas aos rios. As árvores podem atingir até 40 metros de O clima que predomina no Acre é o amazônico equa-
altura e raramente perdem as folhas - geralmente largas torial, que corresponde a uma elevada temperatura e uma
para captar a maior quantidade possível de luz solar. Nas grande concentração de umidade, condições ideais para
águas aparecem as folhas da vitória-régia - que chegam a proliferação da biodiversidade.
ter 4 metros de diâmetro. Ocorrem associadas aos rios de Quanto à temperatura, essa pode variar entre 24,5ºC e
água branca. 32ºC, nesse território há duas estações bem definidas, uma
2) Florestas de Várzea: as árvores são de grande por- possui característica de grande incidência de precipitação,
te (até 40 metros de altura) e apresentam características ou seja, estação chuvosa. Enquanto que a outra correspon-
semelhantes ao igapó - embora a várzea apresente maior de aos períodos de estiagem, ou estação seca.
número de espécies. Ocorrem associadas aos rios de água A estação seca ocorre a partir do mês de maio até outu-
preta. bro, é nesse período que ocorre uma diminuição na tempe-
3) Florestas de Terra Firme: apresentam grande porte, ratura, desencadeada pela influência de uma frente polar
variando entre 30 e 60 metros; o dossel é contínuo e bas- impulsionada por uma massa de ar polar atlântica.
tante fechado, tornando o interior da mata bastante úmido A estação chuvosa desenvolve a partir de novembro e
e escuro. Esta formação está presente nas terras altas da vai até abril, nesse período ocorre uma grande incidência
Amazônia e mescla-se com outros tipos de associações lo- de chuvas periódicas e abundantes. A umidade relativa do
cais, como os campos e os cerrados amazônicos. ar gira entorno de 80 e 90%, percentual elevado em relação
aos outros lugares brasileiros, e os índices pluviométricos
Fontes: são de 1.600 a 2.750 mm ao ano.
https://www.infoescola.com
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/ Vegetação
amazonia-brasileira-biodiversidade-e-clima-da-floresta- A cobertura vegetal do Estado do Acre é composta ba-
-amazonica.htm sicamente por três tipos de regiões fitoecológicas:
Apostila de Sétimo ano COC.Por: Renan Bardine - Domínio da Floresta Ombrófila Densa.
- Domínio da Floresta Ombrófila Aberta.
ACRE - Campinarana.
O Acre é um dos menores Estados brasileiros e um dos
mais isolados, por outro lado possui em seu território uma As principais tipologias florestais do Acre são:
imensa riqueza natural. Diante da biodiversidade presente - Floresta Aberta com bambu dominante, ocupa 9,4%
no Estado é importante compreender as características e de todo território acreano.
as relações entre os elementos naturais, tais como relevo, - Floresta Aberta com bambu e floresta aberta com pal-
clima, vegetação e hidrografia. meiras, abrange 26,2% do Estado.
- Floresta Aberta com palmeiras de áreas aluviais, repre-
Relevo senta 5,48% da área estadual.
A formação geológica e a estrutura geomorfológica do - Floresta Aberta com palmeiras, ocupa 7,77% do Acre.
Acre: - Floresta Aberta com palmeiras e floresta densa, ocupa
Depressão Amazônica: refere-se a uma extensa super- 12,12% da área.
fície rebaixada. O relevo é composto por colinas e monta- - Floresta Densa e floresta aberta com palmeiras ocu-
nhas nas áreas próximas à fronteira com o Peru. As altitu- pam 7,2% da área estadual.
des nas planícies atingem até 300 metros acima do nível - Floresta Aberta com palmeiras e floresta aberta com
do mar, já nas partes mais elevadas a altitude chega a 580 bambu ocupa 21,02% da área.
metros. - Floresta Aberta com bambu em área aluviais, ocupa
Planalto Rebaixado: significa desníveis nos platôs que 2,04% do território.
se encontram paralelos à planície do rio Amazonas, a alti- - Floresta Densa corresponde a 0,53% do território.
tude nesse local não ultrapassa 250 metros. - Floresta com bambu e floresta densa, ocupa 0,36% da
Planície Amazônica: se constitui a partir de faixas que área estadual.
se estabelecem às margens dos principais rios do Estado, - Floresta densa submontana, corresponde a 0,47% do
apresentam regiões alagadas, inundadas e uma grande território acreano.
concentração de lagos. - Áreas desmatadas, corresponde a 7% da área total do
A partir dessas estruturas geomorfológicas são forma- Estado.
dos os principais tipos de relevo. São eles:
- Formas Erosivas – Áreas esculpidas pelo rio (erosão Hidrografia
fluvial), com declividade em direção ao leito do rio. A rede hidrográfica é um importante meio de transpor-
- Formas de Acumulação – Correspondem às planícies te no Acre, uma vez que a maioria dos núcleos urbanos se
fluviais, áreas que quase sempre se encontram alagadas. encontra às margens de rios.

4
GEOGRAFIA DO ACRE

Os principais rios da parte central do Estado são os rios Acre: o endereço do peixe e do suíno
Tarauacá e Perus, a noroeste estão os rios Gregório, Tarau- Em 2012, foi inaugurada a primeira indústria de pro-
cá, Muru, Envira e Jurupari. A oeste, rio Juruá. cessamento de peixes do Acre: o Complexo de Piscicultura
As bacias hidrográficas que compõe a rede hidrográfi- Peixes da Amazônia S/A.
ca do Estado do Acre são: Bacia do Acre-Purus e Bacia do Com um investimento superior a R$ 100 milhões, o lo-
Juruá. cal abriga um centro de alevinagem, um frigorífico e uma
fábrica de processamento de ração.
Formação Econômica do Acre Diariamente, há uma produção de 8.500 quilos de pes-
Historicamente, a economia acreana baseia-se no extra- cado, que, além de abastecerem o mercado interno, são
tivismo vegetal, sobretudo na exploração da borracha, que fornecidos para outros estados brasileiros.
foi responsável pelo povoamento da região. Atualmente, Assim como o peixe, o suíno também vem se conso-
a madeira é o principal produto de exportação do estado, lidando na economia acreana. Na região do Alto Acre foi
que também é grande produtor de castanha-do-pará, fruto inaugurado em novembro o Dom Porquito – o mais mo-
do açaí e óleo da copaíba. derno frigorífico de suínos do Brasil em uso de tecnologia,
Os cultivos de mandioca, milho, arroz, feijão, frutas e segundo a Associação Brasileira de Suinocultura.
cana-de-açúcar são a base da agricultura. A indústria, por A capacidade inicial de abate é de 280 animais por dia,
sua vez, atua nos seguintes segmentos: alimentício, madei- com uma geração de 350 empregos diretos. No auge da
reiro, cerâmica, mobiliário e têxtil. produção, os números podem saltar para 700 suínos por
O Acre apresenta dois grandes polos econômicos: dia e mil empregos diretos.
o vale do rio Juruá, que tem a cidade de Cruzeiro do Sul
como principal núcleo urbano; e o vale do rio Acre, que O PAA e a mecanização agrícola
é mais industrializado, possui maior grau de mecanização Quando foi estabelecido pelo governo do Estado em
e modernização no campo, apresenta maior potencial nas 2011, o PAA alcançava apenas oito municípios. Mas agora
atividades agrícolas, grande produtor de borracha e ali- a garantia de compra da produção famíliar dos produtores
mentos (mandioca, arroz, milho, frutas, etc.), além de abri- rurais chegou aos 22 municípios do Acre.
gar a capital estadual, Rio Branco. O governador Tião Viana fez o lançamento da edição
2015 do programa com uma perspectiva de movimentação
Exportações e Importações do Acre: de mais de R$ 25 milhões, beneficiando mais de 480 enti-
dades e mais de dois mil agricultores.
Exportações: 21,9 milhões de reais. Com a mecanização agrícola, o governo auxilia os pro-
Madeira compensada e perfilada: 49%. dutores rurais familiares a ter condições de produzir sem
Madeira serrada ou em folha: 27%. fazer uso do fogo.
Frutas: 21%. O maquinário cedido pelo governo auxilia na arada-
Outros: 3%. gem, gradeamento e nivelamento de áreas que irão rece-
ber o plantio de várias culturas.
Importações: 1,1 milhão de reais. O procedimento proporciona melhores condições de
Aviões: 35%. trabalho e uma produção ainda maior, sem prejudicar o
Peças para motor: 23%. meio ambiente.
Manivelas: 14%.
Máquinas e equipamentos: 9%. Economia verde e inclusão social
Papel: 4%. De acordo com os últimos dados lançados pelo Institu-
Bronze: 4%. to Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), referentes ao pe-
Outros: 11%. ríodo de julho de 2014 a agosto de 2015, o estado apresen-
tou redução de 10% do desmatamento, indo na contramão
Desde a gestão passada (2011-2014), o governo do dos outros estados amazônicos, que juntos aumentaram a
Acre vem trabalhando alternativas que propiciem a conso- perda de florestas em 16%.
lidação de uma nova base econômica diversificada. O resultado é o reflexo de uma política continuada que
Um modelo fundamentado no fomento e desenvolvi- nos últimos dez anos reduziu em 62% o desmatamento, ao
mento de cadeias produtivas, por meio de parceria públi- mesmo tempo em que prepara novos projetos na econo-
co-privado-comunitária, envolvendo o governo, empresá- mia e promove a inclusão social. É a consolidação de um
rios e grandes, pequenos e médios produtores rurais. novo cenário econômico para o homem da cidade e do
Com o uso de alta tecnologia de forma sustentável, sur- campo.
gem novos e ousados projetos na suinocultura e piscicul-
tura. Há exatos 115 anos teve início a Revolução Acreana,
Outros programas como a mecanização agrícola e o inadequadamente assim denominada, posto a ausência
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) também fazem de significativas mudanças sociais e econômicas para os
parte desse rol de atividades, nas quais o resultado é a con- habitantes do Acre . Desta resultou a movimentação de
solidação de uma economia verde, que efetiva o surgimen- tropas (oficiais e paramilitares) de brasileiros contrapostos
to de uma nova classe econômica rural. ao exército boliviano nas fluídas fronteiras entre Bolívia e

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GEOGRAFIA DO ACRE

Brasil. E em decorrência das tensões bélicas e negociações conseguinte o Acre - decorre das transformações no Im-
diplomáticas foi assinado em 17 de novembro de 1903 o pério Colonial Português advindas da crise sucessória do
Tratado de Petrópolis, pelo qual o Acre passava a ser ofi- trono português em 1580. Isto porque, naquele ano, com
cialmente parte constitutiva do território do Brasil, graças a morte do Rei e Cardeal Dom Henrique, se iniciou a União
ao pagamento de indenização financeira, permuta de ter- Ibérica, que perdurou até 1640 e correspondeu ao momen-
ras, permissão de livre trânsito em águas brasileiras de em- to quando os reinos da península estiveram sob o controle
barcações bolivianas, bem como do compromisso de cons- da Dinastia Filipina. Graças a este período foram tempora-
trução da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. riamente esquecidas as fronteiras demarcadas pelo Tratado
Desde o episódio, que ficou conhecido nos periódicos de Tordesilhas (1494), que se ainda hoje vigorassem leva-
brasileiros como “Questão do Acre”, nem tudo na historio- riam o Brasil a ter apenas metade do seu espaço territorial
grafia local gira em torno desta anexação. De lá para cá, atual.
os olhares se deslocaram e passearam sobre as relações Não obstante a reunião de Portugal e Espanha, a Ama-
de produção da borracha, perpassaram os debates acerca zônia somente ganha atenção mais intensa nos anos de mil
dos movimentos e conflitos decorrentes da expansão de e seiscentos com vistas as preocupações ibéricas de ga-
fronteira agropecuária, chegando aos diálogos e propostas rantir sua propriedade e posse. E assim se incitava a trans-
sobre a sustentabilidade acreana. posições da linha divisória entre o Brasil português e o es-
Contudo, o incidente de nacionalização se tornou mar- panhol, levando-se então a desconsiderar o freio limitador
co inaugural do Acre em termos de História do Brasil. E a de Tordesilhas, gerando a edificação de fortes em locais
partir disto, em nosso país costumeiramente ao se estudar estratégicos a fim de barrar possíveis invasões estrangei-
a anexação do Acre temos dupla perspectiva dominante. ras (a exemplo da França Equinocial que gerou a fundação
Uma dentro do campo macronacional e outra no que po- de São Luís). No entanto, para além de fortalezas estimu-
deríamos denominar (malquerença de muitos historiado- laram-se o estabelecimento de ordens religiosas com al-
res) História Regional. Em caráter interno ao Brasil, quer nos deamentos, missões fixas e volantes, a fim de estabelecer
livros didáticos ou mesmo nos estudos sobre fronteiras, a vínculos de povoamento e catequese. E a medida em que
“Questão do Acre” aparece como conflito solucionado no a atuação religiosa era justificadora para expansão frontei-
período de Rio Branco a frente do Itamaraty e se insere no riça, traçava também os pilares das relações entre coloni-
contexto de consolidação dos limites da república face a zadores e nativos, pois conforme se lê em (GUZMAN, 2008)
criação de um novo ente federativo imprevisto na Consti- [...] a formação de uma política indigenista na região
tuição de 1891 (contrariando expectativas e investimentos amazônica na segunda metade do século XVII, teve por
do estado amazonense). base fundamentalmente a ação das ordens religiosas mis-
Enquanto em âmbito pouco mais particular, na inapro- sionárias (franciscanos e jesuítas). A legislação indigenis-
priada nomenclatura de História Regional (a nosso ver re- ta do século XVII distinguia duas categorias de índios. De
união da História do Amazonas e Acre) por longo tempo um lado, sociedades indígenas que colaboravam com os
vigorou a interpretação clássica de Tocantins , que gerou portugueses, sendo reconhecidas como vassalos do Rei de
partidários da ideia de que o conflito acreano teria se con- Portugal; de outro, aquelas consideradas arredias e que re-
figurado em função dos desejos dos sujeitos ali instalados sistiam ao contato e integração à sociedade colonial.
afim de tornar brasileira a região, ou seja, de um sentimen- Conjuntamente a isto se configuravam os “núcleos de
to de brasilidade vigoroso anterior à oficialização de efetiva apossamento” dando início a uma conquista territorial as-
nacionalidade e que teria motivado a “Revolução Acreana”, sentada no “comércio de drogas do sertão”, “aldeamento”
ao qual se somaram-fatores econômicos decorrentes da e “fortalezas” (TAVARES, 2011, p. 110). Este tripé se mante-
produção de borracha circunscrita aquela área. ve até que as influências do iluminismo atingissem a corte
Sem perder de vista estas perspectivas, entende-se que portuguesa, somente se alterando com Sebastião José de
o cerne da discussão historiográfica acreana tem sido sem- Carvalho e Melo no comando da Secretaria de Estado do
pre as formas e tentativas de integração do Acre ao Bra- Reino.
sil. Mas, que de modo equivocado tem sido desconectado Decorrentes das reformas pombalinas, se implementou
de uma trajetória histórica constituída desde o colonialis- um novo sistema de controle territorial na Amazônia (que
mo ibérico na América do Sul, em que se aceita pensar a então compreendia o Estado do Maranhão e Grão-Pará)
“Questão do Acre” como algo emergente apenas na for- pautado ainda por fortalezas, mas, acrescida do “povoa-
mação da república brasileira ou como mera obra de inter- mento nuclear” e a transformação de aldeamentos em vi-
venção patriótica dos homens comandados por Plácido de las. Ao qual se acrescentaria o “conhecimento geográfico”
Castro. Contudo, o nexo demanda estudar o Acre desde a (TAVARES, 2011, p. 111) da região e formação de unidades
conjuntura do Brasil enquanto colônia lusa e depois Impé- administrativas vinculadas aos estímulos à agricultura e em
rio independente (a medida em que se construía a integra- desfavor das ordens religiosas, sobretudo dos jesuítas (ex-
ção da Amazônia dentro destas formas de administração). pulsos das colônias portuguesas).
Entretanto ao recordarmos que o Acre, como hoje o co- Concomitante a gestão do Marques de Pombal, trans-
nhecemos é advento da República Oligárquica Brasileira, correram em terras europeias e na América do Sul conflitos
pode parecer anacronismo tentar associa-lo ao Brasil Co- entre Portugal e Espanha, dos quais resultara as assinaturas
lonial. Porém, há de se rememorar que a própria Amazônia dos Tratados de Madri, de El Pardo e de Santo Ildefonso
nos quadros territoriais brasileiros contemporâneos – e por (1777) cujos termos repercutiram na conformação das

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GEOGRAFIA DO ACRE

fronteiras da nação independente. Isto porque no começo [...] as quatro províncias do Norte – Pará, Maranhão,
do XVIII, em função das bandeiras, pecuária, fortificações Piauí e Ceará -, junto com a Cisplatina e [...] a Bahia, manti-
militares e mineração os limites territoriais brasileiros já se veram-se fiéis às cortes de Lisboa.
assemelhavam bastante aos atuais, mas: No plano internacional, as nações também se dividiam.
Restava fazer reconhecer de direito as novas fronteiras, Os vizinhos latino-americanos, num primeiro momento,
uma questão a ser resolvida principalmente com a Espa- recusaram-se a aceitar a nova situação, e colocaram sob
nha. Isso ocorreu com o Tratado de Madri, firmado entre suspeição esse país que, negando a voga das emancipa-
as Coroas portuguesa e espanhola, que reconheceu o prin- ções, optava por manter a monarquia e, ademais, por um
cípio de posse para quem fosse ocupante efetivo de uma imperador português como chefe do novo Estado. Os Es-
área. [...] tados Unidos, que já começavam a atuar como uma força
Apesar do acordo, as controvérsias a respeito das fron- hegemônica no continente americano, reconheceram em
teiras do Sul não cessaram. Um novo acordo, datado de maio de 1824 a emancipação brasileira. (STARLING; SCH-
1761, anulou o Tratado de Madri. Em sequência, o Tratado WARCZ, 2015, p. 229)
de Santo Ildefonso (1777) restituiu aos espanhóis as Sete A independência brasileira somente foi reconhecida
Missões. Os portugueses mantiveram suas pretensões à por Portugal em 1825, com mediação direta da Inglater-
Colônia do Sacramento, base estratégica para o contra- ra e diante de compensações financeiras à metrópole. Em
bando da prata trazida da Bolívia e do Peru pelo Rio Pa- caráter sul americano as relações com os países vizinhos
raná. Durante a presença de Dom João VI no Brasil, em foram delicadas, visto as desconfianças quanto a forma de
duas oportunidades as tropas portuguesas intervieram na governo adotada (único Império em meio as repúblicas) e
região. Mas, de um modo geral, as fronteiras brasileiras es- sobretudo ao dirigente do Brasil (ambiguamente herdeiro
tavam definidas. (FAUSTO, 1995, p.85) do trono metropolitano e líder da independência colonial).
Desta forma, Portugal no século XVIII ao fazer uso do A formação do Império também repercutiu na criação do
uti possidetis (princípio de Direito Internacional que asse- Uruguai como nação com papel inicial de “estado tampão”
vera ser a terra de quem a ocupa independente de sua pro- entre Brasil e Argentina.
priedade) lançou as bases para negociações futuras sobre Em âmbito nacional, as diferenças e dificuldades de
os limites do Brasil. Então, ao mesmo tempo em que Por- convívio político se manifestaram já na dissolução da As-
tugal garantiu a propriedade de parte da Amazônia, criou sembleia Constituinte e outorga da Carta Constitucional de
o marco fundante histórico-jurídico da configuração terri- 1824. Mas, em outros momentos também foram visíveis as
torial brasileira. divergências, especialmente acerca da compreensão entre
No século XIX, por força das independências das co- Deputados e Senadores sobre os projetos de integração
lônias ibéricas na América e da exploração da borracha, o para Amazônia, conforme se verificam nos relatos a respei-
sistema de controle territorial na Amazônia e as tentativas to da criação de linhas regulares de vapores para os rios
de integrá-la levaram a uma reorganização, pois: amazônicos:
Embora a região do rio Amazonas e de seus afluentes A incorporação da região amazônica ao conjunto do
fizesse parte oficialmente do conjunto da América portu- Estado nacional brasileiro não se resolve com a adesão das
guesa, desde o século XVIII, foi somente durante o século elites do Grão-Pará à independência em 1823. Essa escolha
XIX que ocorreu sua efetiva incorporação política e econô- em momento algum pode ser entendida como definitiva,
mica ao Império brasileiro. Nesse processo, os esforços da e, durante todo o século XIX, os responsáveis pela admi-
Corte do Rio de Janeiro para que a província do Grão-Pará nistração imperial tiveram de formular, mediante debate,
se unisse às demais, declarando oficialmente sua ruptura políticas capazes de desenvolver economicamente todo o
política com Portugal– o que logrou alcançar somente em Norte do País, garantindo, assim, sua plena soberania so-
1823 –, tiveram grande importância, mas de forma alguma bre aquele território. O processo decisório que decorreu
garantiram a essa região inserção favorável no contexto do dessa necessidade não foi simples nem uniforme. Ao longo
recém-criado Estado. Sua situação de quase absoluto des- de todo o período que vai de 1826, data da primeira ten-
povoamento, conjugada com o fato de que os principais tativa de introdução da navegação a vapor no rio Ama-
centros políticos e econômicos do Império estavam loca- zonas, até 1871, quando a companhia fundada por Irineu
lizados a milhares de quilômetros de Belém, a principal ci- Evangelista de Souza em 1852 passa definitivamente para
dade amazônica na época, tornava necessária a formulação o capital inglês, várias ideias foram formuladas, adotadas e
e a adoção de medidas que fortalecessem a influência do posteriormente abandonadas, em um processo decisório
novo regime na região. Entre essas medidas, a introdução que caminhou pari passu com a consolidação do Estado
da navegação a vapor no rio Amazonas e nos principais nacional brasileiro.
afluentes surgia como uma das mais importantes, por im- Nesse sentido, a aversão à presença de capitais estran-
pulsionar, simultaneamente, tanto o povoamento quanto o geiros na atividade de navegação, fortemente presente em
desenvolvimento econômico de todo o território localiza- todas as discussões da primeira metade do século, e res-
do às suas margens. (GREGÓRIO, 2009, p. 186) ponsável pelo malogro de várias tentativas de introdução
As preocupações em (re)forçar a autoridade imperial de linhas regulares de vapores nos rios amazônicos, caiu
não foram exclusividade amazônica, porquanto que não no debate parlamentar de 1864, não sem resistência de
tivesse ocorrido adesão interna unanime ao novo país, so- alguns deputados. O temor de perder a posse sobre tão
bretudo no que concernia: grande território cedeu ante a necessidade de consolidar e

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GEOGRAFIA DO ACRE

aumentar os ganhos conseguidos após anos de navegação deira – e o Brasil, em compensação, confirmava à Bolívia
subvencionada pelos cofres gerais. A ideia da existência de todas as terras abaixo da linha que ia da confluência do
um privilégio de exclusividade, nunca aceito plenamente rio Beni com o rio Mamoré, onde começava o rio Madeira,
ao longo de todos os debates, acabou surgindo na prática à altura da latitude 10º 20’, até a nascente do rio Javari.
durante o período de quatorze anos, que vai desde o início (CARNEIRO, 2016, p. 133)
das atividades da Companhia de Navegação e Comércio Embora a “definição das fronteiras brasileira” nos fins
do Rio Amazonas, em1853, até a fundação de suas primei- do período colonial conforme afirmou Fausto, devemos re-
ras concorrentes nacionais, em meados da década de 1860. cordar que a ideia não se aplicava no extremo oeste ama-
Posteriormente, voltaria a se fazer presente com a Amazon zônico, já que a posse destas terras era reivindicada por
Steamship Company, de capital inglês, responsável úni- brasileiros. Não tendo a contestação possessória se dado
ca pelas linhas amazônicas desde a década de 1870 até a de modo manso e pacífico, já que decorreu de estrata-
segunda década do século XX. Na prática, a livre concor- gemas diplomáticos e jurídicos. Neste sentido, é preciso
rência, tão defendida por vários deputados e senadores ao compreender que o Tratado de Ayacucho foi mais do que
longo de todas as discussões, não foi capaz de se estabe- tratativa limítrofe, representou garantia de não aliança en-
lecer eficazmente na região amazônica durante todo o Im- tre Bolívia e Paraguai contra o Brasil na Guerra da Tríplice
pério, o que não impediu, entretanto, que, graças ao boom Aliança. A fluidez e os conflitos fronteiriços entre países sul
da borracha, o comércio internacional amazônico atingisse americanos mais ocidentais causavam a ausência de regras
patamares nunca antes alcançados a partir da década de claras e específicas acerca dos limites territoriais entre pe-
1870. (GREGÓRIO, 2009, p. 209) ruanos e bolivianos. Circunstâncias que levaram o Brasil a
Como se percebe, a pauta de conexão da Amazônia ao fazer negociações em separado, tanto no Tratado de Aya-
Brasil cucho (1867), quanto no Tratado de Petrópolis (1903) e no
Imperial estava vinculada às limitações de acesso e fi- Tratado Brasil–Peru (1909) para solucionar a contenda.
nanciamento governamental para o desenvolvimento eco- Apesar do Tratado de Ayacucho afirmar o pertencimen-
nômico e social da região. Neste sentido, a demanda por to do Acre a Bolívia, o fluxo de brasileiros para a região
novos capitais colidia com as discussões sobre soberania persistiu até o começo do XX. Apesar das idas e vindas di-
e os receios de esbulho possessório. Tais preocupações se plomáticas, a exploração da borracha crescia e exigia in-
expandiam conforme crescia a importância da economia vestimentos, que repercutiram nas relações dentro de sua
amazônica na balança comercial brasileira, fazendo com cadeia produtiva. Assim, a criação de uma unidade fabri-
que durante a chamada terceira fase da economia da Ama- cante de borracha, ou seja, de um seringal, demandava não
zônia (PRADO, CAPELATO, 2006, p. 315) se desse o reorde- apenas o desbravamento territorial, mas também a forma-
namento de gente e dos espaços então “escassos” para a ção de uma estrutura, que obtinha recursos junto a estabe-
extração do látex, pois: lecimentos comerciais situados em Belém e Manaus.
Com o desenvolvimento da borracha essa mão de obra Tais casas aviadoras eram responsáveis pelo forneci-
local tornouse insuficiente. Os Governos da Região Amazô- mento de recursos para abertura dos seringais, financia-
nica, interessados no aumento da produção, foram obriga- mento do transporte de trabalhadores até a região dos se-
dos a mobilizar populações e concederam subsídios para ringais, além do contínuo envio de víveres e equipamentos.
os gastos de transportes e adiantamento de dinheiros para Em contrapartida, os seringalistas enviam a borracha como
as primeiras necessidades. [...] Os nordestinos – calcula- forma de pagamento e para comercialização por estas fir-
-se que em número de cem mil – penetraram no território mas, que as vendiam no mercado internacional.
onde as fronteiras do Brasil com a Bolívia e o Peru ainda Descrevendo esta vinculação eis que “numa cadeia de
não haviam sido definitivamente estabelecidas. Foram eles dependências, a falta de capitais obrigou a casa aviado-
os responsáveis pela anexação ao Brasil da região que pas- ra a subordinar-se ao capital estrangeiro, o seringalista a
sou a denominar-se Território do Acre, mediante a indeni- tornar-se devedor da casa aviadora e, num elo mais forte,
zação de dois milhões de libras à Bolívia e o compromisso o seringueiro a sujeitar-se ao seringalista.” (PRADO, CAPE-
de construir a estrada de ferro Madeira-Mamoré. (PRADO, LATO, 2006, p. 325)
CAPELATO, 2006, 317-318) Contudo, a obtenção do capital inicial dentre outros
Em que pesem as críticas (Klein, 2014, pp. 24-25) quan- aspectos exigia a regularização da existência do seringal.
to a estimativa do volume de migrantes nordestinos para a Com o advento do Brasil República as atuações brasileiras
região amazônica entre meados do XIX e as duas primeiras na região do Acre se tornaram mais ostensivas e buscaram
décadas do XX, a presença de brasileiros na parte mais oci- um caráter legalista, que se confirma com a leitura das edi-
dental é reafirmada (tanto em textos de História do Brasil, ções do Diário Oficial do governo do Amazonas entre os
quanto do Amazonas e Acre) como fator determinante a anos da década de 1890, isto porque a partir de 1893, o
incorporação das terras acreanas, contudo: reconhecimento dos seringais passou a ser feito em con-
O Brasil de forma sorrateira firmou com a Bolívia o Tra- formidade com o Regulamento do Registro de Terras do
tado de Ayacucho em 1867. Aproveitou que as fronteiras Amazonas, conduzindo a formação de corpo administra-
amazônicas entre a Bolívia e o Peru ainda não estavam ple- tivo e jurisdição pelo governo amazonense nas terras e
namente regulamentadas, para acirrar a discórdia entre os águas bolivianas. Era a ilegalidade de ocupação do territó-
dois países. A Bolívia abria mão dos limites estabelecidos rio alheio sendo regrada e criando comprovação ao serviço
pelo Tratado de Santo Ildefonso (1777) – a linha JavariMa- diplomático brasileiro que:

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GEOGRAFIA DO ACRE

[...] soube explorar bem essa inexatidão da redação dos consistiam em modalidades de arrendação territorial, feitas
tratados para defender o uti possidetis como princípio re- entre as metrópoles coloniais (então autodeclaradas “do-
gulador das fronteiras. [...] Obviamente que essa propos- nas” das áreas coloniais submetidas) a empresas ou grupos
ta se mostrou muito mais vantajosa ao Brasil, visto que a de acionistas por períodos de décadas. Estes grupamen-
maior parte dos territórios disputados já estavam plena- tos poderiam fazer exploração e lotear os territórios em
mente ocupadas por brasileiros, como são os casos das re- comento para diversas atividades econômicas – em geral
giões do Juruá e do Purus. (CARNEIRO, 2016, p. 134) de extrativismo vegetal e mineral, agricultura e pecuária -,
Assim, se por um lado o Acre não sendo brasileiro foi com poder de polícia tanto para cobrança de tributação,
pauta quanto para coerção física, política e social. As chartared
de dissimulação durante a política continental interna- companies funcionavam a revel de vontades e interesses
cional do Império Brasileiro, no alvorecer da República se das populações das áreas arrendadas.
tornaram latentes os interesses do governo estadual ama- Assim, diante da ameaça configurada na criação do Bolivian
zonense apesar das tergiversações brasileiras ( que ocorre- Syndicate porquanto lhe fosse atribuído o caráter de chartared
ram até 1902 com a chegada de Rio Branco ao Ministério company, torna-se compreensível entender como entrou para
das Relações Exteriores). a hemerografia e historiografia brasileira representando a ten-
Clareza disto se evidencia não só dos registros de serin- tativa de instituição de um enclave em área habitada por nacio-
gais acreanos como se fossem parte constitutiva do muni- nais e as margens de nossas fronteiras. Neste sentido, corrobo-
cípio amazonense de Floriano Peixoto, mas, principalmente ram as análises de Tocantins e Rio Branco que caracterizaram
a partir de 1899 com as manifestações de resistência às o Bolivian Syndicate, dando àquele grupo semelhanças de um
tentativas de implementação da soberania boliviana na estado nacional. Esta tese difundiu-se vez que:
região. Situações demonstradas em ações reativas tanto a [...] dentro do documento justificador do Tratado de Pe-
cobrança de tributações bolivianas sobre os habitantes do trópolis sagrou-se o argumento da ameaça ao Brasil com a
Acre, quanto à arrendação firmada pela Bolívia com o Bo- instalação de chartered company em sua fronteira, ao mes-
livian Syndicate. mo tempo em que se nega a plena soberania do Sindicato.
Junto aos seringalistas brasileiros no Acre e apoiados Dentro deste contexto, se fortaleceu o discurso do risco
a soberania face ao Bolivian Syndicate, que passou a ser
por autoridades do governo amazonense tais circunstân-
repetido posteriormente por Leandro Tocantins e outros
cias desencadearam levantes chefiados por José Carvalho
autores. (ALBUQUERQUE, 2015, p. 67)
com a “Junta Revolucionária” (1899), desemborcaram no
E assim, verifica-se a ideia contraposta de nacionalismo
“Estado Independente do Acre” (1899) sob o controle de Gal-
em defesa da soberania ameaçada. Entretanto, a assinatura
vez e financiamento do governador José Cardoso Ramalho
do Tratado de Petrópolis em 1903 ainda que respondesse
Júnior, na malfadada “Expedição dos Poetas” (1900), bem
a estes apelos não foi uma resolução unânime, ou total-
como na “Revolução Acreana” (1902-1903) comandada por mente bem aceita. Isto porque não atendeu plenamente
Plácido de Castro com a adesão dos seringalistas locais. as pretensões do governo amazonense, já que teria sido
E assim como o sentimento de nacionalismo difundido praticada “a violência contra o Amazonas” em decorrência
nas sublevações ocorridas em terras acreanas, também o do “atentado a Constituição Federal”. Pois a aquiescência
Bolivian Syndicate foi utilizado como instrumento de con- no Congresso Nacional de criar a figura de território federal
traponto ao exercício de soberania boliviana e notoriedade como forma de ordenamento administrativo para o Acre
à “Questão do Acre” em periódicos brasileiros. Se o des- estaria “tirando-o do Amazonas”(REIS, 1937, p. 25).
dobramento das “comissões demarcatórias mistas” (VER- Disto resultou ação indenizatória impetrada em 1904
GARA, 2012) pouco impacto gerou na mídia, as atenções no Supremo Tribunal Federal contra União. O processo, que
aumentaram com a denúncia do arrendamento divulgada teve inicialmente como advogado Rui Barbosa, ficou parali-
em 1899 em A Província do Para por Galvez, no entanto sado por anos, mas, com a Revolução de 1930 fez-se comis-
maior destaque na imprensa nacional se deu com o ingres- são de arbitramento entre a União e o governo amazonense
so aberto e direto do Itamaraty para resolução da causa. “tendo por fim avaliar os direitos inerentes ao Amazonas por
O grau de complexidade da “Questão do Acre” decorre motivo do Acre” (REIS, 1937, p. 28). Tendo se encerrado o
da conjuntura internacional da ascensão dos Estados Uni- conflito com o acordo de retirada da ação junto ao STF, me-
dos sobre as nações americanas e mutação do caráter de- diante compromisso de pagamento de indenização ao Ama-
fensivo ao expansivo da Doutrina Monroe, bem como da zonas. O que nos faz questionar o discurso do nacionalismo e
Guerra do Pacífico (1879 a 1883) que resultou na perda bo- defesa da soberania brasileira. Então, se a “Questão do Acre”
liviana de sua ligação com o Oceano Pacífico. Ao passo que durante muito tempo reverberou tais argumentações:
o neo colonialismo da virada do XIX ao XX impelia a busca [...] a historiografia recente tem apresentado outras in-
e crescimentos de áreas de influência (e domínio) das gran- terpretações ao fazer-se do Acre brasileiro. Neste sentido
des potenciais europeias. Eram tempos nos quais se viven- e face às elaborações de versões da incorporação territo-
ciava a partilha da África pelas metrópoles coloniais que rial pautada em personalidades heroicas ao gosto da cau-
adotavam o modelo das chamadas chartered companies. sa, narrador e público, nos cabe ainda recordar Francisco
Este conjunto de fatores em parte ajuda a entender Bento da Silva, que rompe com os comentários assentados
desconexão da “Questão do Acre” aos seus anteceden- nos aspectos diplomáticos, militares ou apologéticos, ao
tes históricos. Isto porque as “companhias de cartas” ou equiparar o Acre a “Sibéria Tropical”, graças aos desterros
“companhias majestáticas” ou “companhias privilegiadas” entre os anos de 1904 e 1910.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Apesar de Silva não se ocupar propriamente do período de passagem do Acre boliviano ao Brasil, dedicou sua análise
aquilo que seguiu a este processo, ao discorres sobre a composição da sociedade acriana para além dos migrantes vo-
luntários que ansiavam pela fuga a seca ou a riqueza da borracha. Silva desconstruiu a ideia de que a migração ao Acre
após o Tratado de Petrópolis fosse exclusivamente espontânea, visto que para lá também foram destinados os elementos
“indesejados” pelo governo da capital federal.” (ALBUQUERQUE, pp. 87-88)
Diante do exposto, observa-se que a incorporação do Acre ao território brasileiro foi produto de uma construção histórica
com origens no período colonial na América do Sul, que perpassou as emancipações políticas das ex-colônias ibéricas, desem-
borcando na amarração das fronteiras tri-nacionais (Brasil, Bolívia e Peru). Processo que em âmbito macronacional, assim como
regional se reinterpreta, recorta e permeia em benefício da criação de projetos identitários e interesses políticos. De tal sorte que
para além da “Questão do Acre” ou da “Revolução Acreana” existem lacunas sobre o antes com os indígenas que habitavam a
região, ou mesmo acerca do olhar dos vencidos na Guerra do Acre. Ainda há muito o que se fazer, falar e escrever.

Fonte:
https://brasilescola.uol.com.br/brasil/aspectos-naturais-acre.htm
http://www.agencia.ac.gov.br/acre-e-a-consolidacao-de-uma-nova-base-economica-diversificada/
revistas.ufac.br/revista/index.php/jamaxi/article
https://brasilescola.uol.com.br/brasil/economia-acre.htm

2. MUNICÍPIOS E POPULAÇÕES DO
ACRE: POPULAÇÃO E LOCALIZAÇÃO.
NOVA CONFIGURAÇÃO DO MAPA.
MICRORREGIÕES. ATUAIS MUNICÍPIOS.

A população acreana foi estimada em 869.265 habitantes, conforme divulgado nesta quarta-feira (29) pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As estimativas da população para estados e municípios, com data de referência
em 1º de julho de 2018, foram publicadas no “Diário Oficial da União”.

O Acre tem a terceira menor população do país, ficando atrás apenas de Roraima, onde tem uma estimativa de 576.568
e Amapá com 829.494 habitantes. Os três estados são os únicos que têm menos de 1 milhão de habitantes.
A taxa de crescimento em relação a 2017, quando a população somava pouco mais de 829, 6 mil, foi de 4,8%. Número
superior aos dados nacionais, cujo crescimento foi de 0,82%.

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GEOGRAFIA DO ACRE

O levantamento aponta que 46% da população acreana vive na capital, Rio Branco, chegando a 401.155 habitantes. Já
a segunda maior cidade do Acre, Cruzeiro do Sul, concentra 87.673 habitantes.
Sena Madureira também apresentou um número elevado em relação aos outros municípios do estado, com estimativa
de 45.177 pessoas. Entre os municípios com menor número de habitantes estão Santa Rosa do Purus, com 6.362 e Assis
Brasil, com 7.300.
As estimativas da população brasileira foram calculadas com base na Projeção de População, divulgada pelo IBGE em 25
de julho. Ela já indicava que os brasileiros somavam cerca de 208 milhões e apontava que a população crescerá até 2047,
quando chegará a 233 milhões e começará a encolher.

População dos municípios acreanos

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GEOGRAFIA DO ACRE

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GEOGRAFIA DO ACRE

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GEOGRAFIA DO ACRE

Fonte:
https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2018/08/30/com-8693-mil-habitantes-acre-tem-a-terceira-menor-popula-
cao-do-pais-segundo-ibge.ghtml
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ac/panorama

3. RELEVO, VEGETAÇÃO, CLIMA, SOLO,


HIDROGRAFIA, FLUXO MIGRATÓRIO,
EXTRATIVISMO E ZONEAMENTO
ECOLÓGICO DO ACRE. A PAISAGEM
LOCAL E SUA RELAÇÃO COM OUTRAS
PAISAGENS (SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS,
PERMANÊNCIAS E TRANSFORMAÇÕES).

Como já abordamos nos tópicos anteriores os temas supracitados, iremos abordar uma visão geral e breve das infor-
mações, complementando com o que for necessário.
Localização Geográfica: região Norte do Brasil
Limites geográficos: Amazonas (norte), Rondônia (leste), Bolívia (sudeste) e Peru (sul e sudoeste).
Área:152.581,4 km²
Fronteiras com os seguintes estados: Amazonas e Rondônia.
Clima: equatorial
Relevo: planície estreita ao norte e depressão no restante do território.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Vegetação: Floresta Amazônica Isolados). As etnias isoladas, sem contato com a sociedade,
Ponto mais alto: Serra do Divisor (609 metros). têm o seu território tradicional ao longo da fronteira inter-
Cidades mais populosas: Rio Branco (capital), Cruzeiro nacional Brasil-Peru.
do Sul e Sena Madureira.
Principais rios: Acre, Envira, Juruá e Purus. A colonização Nordestina e a borracha
Principais problemas ambientais: desmatamento, po- A formação da população acreana se dá no contexto
luição de rios e córregos. da expansão da empresa extrativista, na segunda metade
do XIX. Por esta época, a borracha se torna matéria prima
Fluxo Migratório indispensável à nascente da indústria de bens de consu-
mo duráveis na Europa e nos Estados Unidos, sob forma
A formação de povoamento nas terras acreanas, data principalmente de pneumáticos. O interesse internacional
das eras do gelo quando a Amazônia na tinha a forma volta-se rapidamente para Amazônia Brasileira, Boliviana
como é constituído hoje, se forma a partir de povos ca- e Peruana, daí resultando uma serie questões referentes à
çadores que vieram de outros continentes, em busca de fronteira.
alimentos, os chamados povos indígenas hoje, podemos
fazer ainda uma melhor divisão do povoamento das terras Segundo Celso Furtado, o número de 500.000 pessoas
acreanas. Primeiro a chegado dos índios a cerca de 15.000 era uma idéia aproximada do volume de migração de nor-
anos atrás, depois na virada do século, veio o seringuei- destinos para Amazônia. Parcelas consideráveis deste fluxo
ro, “homem civilizado”, que praticamente matou todos os de migrantes atingiram o Acre, que de acordo com Cravei-
povos da floresta. E que a maioria dos centros de povoa- ro Costa, teria na passagem do século, uma população es-
mento do nosso estado, inclusive aldeamentos indígenas, timada de 100.000 habitantes. O Acre representava assim,
se desenvolveram a margens de cursos de água. uma das áreas principais do extrativismo da borracha e sua
Em terceiro lugar temos o período que vai da crise da produção, já em 1905, coloca-se em primeiro lugar entre a
borracha em 1945 ate 1970, fase de tímido povoamento regiões produtoras do Brasil.
da Amazônia, em que o governo federal tenta incentivar A partir de 1880 grandes levas de imigrantes nordesti-
a colonização por meio da integração. Em quarto lugar há nos penetraram livremente nas terras acreanas. Os rios Pu-
chegada do sulista nesta região, através de incentivos do rus e Juruá, como afluentes do rio Amazonas, davam acesso
governo local, sobretudo pelo valor simbólico da terra, que direto aos Navios provenientes de Belém e Manaus, trazen-
era muito barata. Nesta fase ocorre à situação parecida do milhares de brasileiros e levando toneladas de borracha.
com a que ocorreu com os índios no início do povoamen- Já os bolivianos possuíam contra eles a direção de seus
to, só que vitima desta vez são extrativistas, que perdem rios mais explorados que levavam para o rio Madeira e não
espaço para os pecuaristas, são caçados, assassinados. para as terras acreanas, caminhos que passavam por gru-
pos indígenas, Panos muito aguerridos na defesa de seu
Os índios território e uma sociedade andina que apresentava gran-
A longa história do povoamento humano do Acre des dificuldades de povoamento na planície amazônica. Ao
provavelmente começa entre 20.000 e 12.000 anos atrás, surgirem às primeiras proclamações bolivianas de posse
quando os primeiros grupos humanos provenientes da do Acre, em 1895, os brasileiros já estavam ali situados há
Ásia chegaram de sua longa migração até a América do pelo menos 15 anos. Com grandes e produtivos seringais
Sul. Esses grupos humanos perseguiam as grandes mana- que comerciavam sua borracha com as casas aviadoras de
das de animais gregários que durante a idade do gelo se Manaus e Belém e através destas, com os centros consumi-
espalhavam pelas vastas savanas do mundo. A Amazônia dores mundiais na Inglaterra, França, Alemanha, Holanda
era então uma ampla extensão dessas savanas, com apenas e Estados Unidos. O povoamento brasileiro dos altos rios
algumas manchas de floresta ao longo dos rios que corta- Purus e Juruá era já um fato consumado.
vam as terras baixas. Ao final do século XIX houve no Acre, provocado pelo
Cerca de 6 milhões de índios habitavam à Amazônia início da demanda das indústrias norte-americanas e euro-
antes da chegada dos Portugueses em 1616. No Acre, na peias pela borracha, o primeiro movimento de imigração
segunda metade do século XIX, viviam cerca de 150 mil vindo do nordeste do Brasil, o chamado primeiro surto da
índios, distribuídos em 50 povos. Em 1989, o número de borracha, o que alavancou o processo de colonização e po-
índios no Acre era em de 5 mil. Em 1996, o número passou voamento destas regiões. Os novos Seringalistas se apro-
para 8.511. No ano de 2001, a FUNAI notificou a existên- priaram de áreas enormes de Floresta para extrair a matéria
cia de 10.478 índios em todo Estado do Acre, distribuídos prima para a borracha - o Látex das Seringas. Os índios nas
em 12 povos. Esse tímido aumento pode ser explicado pela áreas de Juruá e Purus tentaram defender as terras deles,
atuação de organizações indigenistas. mas, tendo só arco e flecha não conseguiram. Os novos
Existem no Acre hoje, 34 terras indígenas ocupadas por imigrantes fizeram as chamadas correrias, eles se juntavam
mais de 12.000 índios, que representam 2% da população em grupos de homens armados com espingardas e assal-
total do Estado. Esse contingente populacional pertence a tavam as aldeias indígenas. Eles matavam só os homens e
14 diferentes etnias, de línguas Pano, Aruak e Arawá: (Ya- raptavam as mulheres indígenas para conviver com eles.
minawa, Manchineri, Kaxinawá, Ashaninka, Shanenawa, Ka-
tukina, Arara,Nukini, Poyanawa, Nawa, Jaminawa-Arara e

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GEOGRAFIA DO ACRE

Assim foram extintos a maioria dos índios. Muitos tam- O processo da chegada do grande e do médio capital do
bém morreram das doenças como tuberculose e sarampo, Acre difere em linhas gerais de processo semelhantes em ou-
os quais não existiam antes entre os índios e foram trazidos tras áreas amazônicas. Predominantemente, a formação de
pelos novos imigrantes. A mão de obra dos índios submeti- grandes projetos agropecuários, madeireiros ou de extração
dos foi explorada para recolher o Látex e construir estradas. mineral, avançou sobre áreas de vazio demográfico e econô-
Este surto da borracha que fez enriquecer as cidades de mico ou sobre áreas em que as populações migrantes (frente
Manaus e Belém foi terminado pela produção Inglesa de camponesa) vinham se instalando ao longo dos anos recen-
borracha na Malásia. No ano 1913 a produção Inglesa - tes. No Acre, a chegada do capital, sob a forma de projetos
Malásica superou pela primeira vez a do Brasil. Em seguida de agropecuários, sobrepõe-se especialmente a uma organi-
muitos Seringais foram abandonados e muitos seringuei- zação econômica e demográfica pré-existente há pelo menos
ros voltaram ao nordeste. meio século e esta não é uma questão de simples moderni-
Houve um segundo surto da borracha durante a segun- zação ou algo semelhante, em que as formas de organização
da guerra mundial, quando os Japoneses, que eram aliados da economia extrativa atrasada, são substituídas por formas
com os Alemães ocuparam as plantações de Seringas na superiores de organização econômica e progresso material.
Malásia. Os países aliados contra a Alemanha tinham que A chegada de grandes grupos capitalistas ao Acre e o
achar outra fonte para adquirir a borracha, que era indis- difundido modelo de constituição de empresas agrope-
pensável para fazer guerra. Assim aconteceu a segunda cuárias, representou a trágica desarticulação de relações
vaga de imigração do nordeste. Desta vez eram os chama- econômicas e sociais, em que, bem ou mal, a população
dos soldados da borracha, sujeitos ao serviço militar que ti- acreana havia criado laços de identificação, a partir do
nham que escolher entre lutar na guerra ou trabalhar como afrouxamento das condições de subordinação da força-
seringueiro. Estes novos seringueiros já tinham dívidas an- -de-trabalho nos antigos seringais. E essa desarticulação
tes mesmo de começar a trabalhar. Eles tinham que entre- na foi, em nenhum momento, reconstituída pelos novos
gar borracha em troca do equipamento e dos alimentos donos de terra, pelo contrario, paralisaram a produção ex-
que precisavam. Este “Sistema de Aviamento” ditado pelos trativa e expulsaram violenta ou pacificamente e com ou
seringalistas fez com que eles nunca chegassem a obter sem indenização os trabalhadores, seringueiros, colonos
dinheiro e assim eles não poderiam voltar a terra deles nem ou posseiros que residiam nas áreas ocupadas.
pagar as dívidas depois da guerra. A borracha foi um dos Com a expropriação deste surgira um novo movimento
principais elementos que incentivaram o povoamento des- migratório. A expulsão das terras, na década de 70, pro-
sa região. vocou o surgimento de um grande êxodo populacional
O ponto principal a ser estabelecido e que vai refletir-se no Acre, mas de caráter profundamente diferente daque-
sobre a futura historia de vida da população, que é toda le ocorrido no inicio do século, na época com crise muita
esta mobilização de população ocorreu sob o controle pre- gente voltou para terras, agora os dos que ficaram vão para
dominante do capital mercantil, enquanto integrante da cidade, expulsos pelos grandes fazendeiros.
cadeia de interesses do próprio capital. Rio Branco, capital do Estado desde 1920, tinha na dé-
Durante toda a etapa histórica que vai da derrocada da cada de 50 aproximadamente 10.000 habitantes em seu pe-
borracha na década de 1910 ate fina da década de 60, o rímetro urbano, com perspectivas com integração com cen-
crescimento e reprodução da população e da força-de-tra- tro-sul foram feitas algumas adequações administrativas na
balho acreana ocorreu fundamentalmente nos marcos de cidade. Em 1970, a parte urbana do município já registrava
uma organização econômica voltada internamente para um total de 35.000 habitantes, com uma taxa de crescimento
atividades mercantis e de subsistência. Não se registraram, anual na década 60/70 de 6.8%, a mais alta do Estado, que
salvo no período da II Guerra Mundial, deslocamento po- em média crescia nesse período a uma taxa de 3%. E a partir
pulacionais significativos de fora do para o Acre, os movi- desse período que Rio Branco vai começar a crescer popula-
mentos internos foram reduzidos, implicando num cresci- cional mente, em 1979 estimava-se que a população residen-
mento populacional muito leve nesse período. te na área urbana atingiria 90.000 habitantes.
Essa grande expansão do crescimento populacional de
Chegado dos Sulistas no Acre chegada de Paulistas nas terras acreanas começa com in-
Na virada da década de 70, estão maduras as condições centivos produzidos pelo Governo Militar com a criação de
de integração do Acre ao novo ciclo de expansão nacio- vários órgãos com a SUDAM, o BASA, o INCRA, a SUFRA-
nal do modo de produção capitalista. As diversas fronteiras MA, o PROJETO RADAM e a FUNAI, além do programas
nacionais já vinham sendo atingidas por variadas frentes POLOAMAZONIA, o PROTERRA, o PIN e outros. Outro fator
demográficas e econômicas e a Amazônia já estava plena- importante para que a frente de expansão agropecuária se
mente identificada como um valioso espaço a ser ocupado. instalasse no Acre foi a política adotada pelo governador
Desde a transferência da capital federal para Brasília que acreano Francisco Wanderlei Dantas, no de 1971 a 1974,
esta tendência se delineava irreversivelmente e a retificação Dantas abriu as portas aos empresários do centro sul do
política econômica de meados da década de 60, fornecera Brasil que compraram terras baratas vendidas pelos serin-
elementos institucionais e financeiros para um novo ciclo galistas falidos. Alem disso, Dantas oferecia aos empresários
de expansão capitalista, no qual figurava a necessidade de os seus incentivos estaduais utilizando-se do dinheiro do
penetração intensiva de relações capitalistas no campo. BANACRE para financiar a criação de gado, colocando a dis-
posição de fazendeiros serviços de setores do governo e etc.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Evolução demográfica

Evolução demográfica do estado do Acre.

Principais centros urbanos

Rio Branco, capital e principal cidade do Acre, é um porto do rio Acre, afluente do Purus. Seu nome é uma homenagem
ao barão do Rio Branco, que resolveu a questão com a Bolívia e obteve o Acre para o Brasil.
Cruzeiro do Sul é a segunda cidade acreana e é um porto do rio Juruá.
No longo dessa historia e bem evidente um processo migratório muito grande para esta região desde milhares de anos
atrás, até décadas mais recentes, e, sobretudo de povos diversos que para cá vierem, primeiros índios, depois nordestinos
em especial os cearenses, em seguida uma corrente migratória do centro-sul, que chega por ultima com um poder capital
muito forte, desapropriando muitos que aqui ficaram dos períodos áureos da borracha.
Na formação da população acreana entraram além dos índios, os nordestinos - principalmente cearenses - que aí chegaram
maciçamente durante o período de ouro da borracha (1880-1913), também vieram paulistas, gaúchos, mato-grossenses e etc.
O que fica bem claro no processo de povoamento doa Acre são a três fases de chegada de povos, primeiro os índios,
logo depois os nordestinos e por ultimo uma frente povoadora vinda do centro-sul. E desta forma que se consolida a ocu-
pação e formação da população acreana.

Aspectos Sociais
Os fatores demográficos guardam estreita relação com os fatores históricos, sociais e econômicos de qualquer território.
No caso do Acre, sua história condicionou a ocupação humana através dos vales dos principais rios, desde os tempos em
que a borracha se constituiu como a mola econômica propulsora e a empresa seringalista o locus preferencial de apropria-
ção do espaço e reprodução social.
A população do Acre, originalmente composta por cerca de 50 etnias indígenas, recebeu, desde o final do século XIX,
migrações oriundas principalmente do Nordeste do Brasil, motivadas pela exploração econômica da borracha, e nas déca-
das de setenta e de oitenta do século xx, migrações do Sul e Sudeste, motivadas pelo oferecimento gratuito de terras por
parte do governo federal, para o desenvolvimento da pecuária e da agricultura.
Em busca da exploração do látex, na segunda metade do século xIx, uma primeira onda migratória fugindo da seca no
Nordeste levou à região contingentes de pessoas que se tornaram seringueiros. Uma segunda onda migratória voltou a
trazer para o Acre entre 50 mil e 60 mil nordestinos, como parte dos esforços brasileiros frente à Segunda Guerra Mundial,
quando foi reaquecida a demanda por borracha nativa, na metade do século passado.
A partir dos anos 1960 e 1970, dentro do marco das políticas federais de integração nacional – que se iniciam ainda nos
anos 1930 com a “Marcha para Oeste” – e da expansão da fronteira agrícola, o estado passou a receber um maior volume
populacional, vindo de várias regiões do país. Colonos e assentados do Centro-Oeste, Sudeste e Sul e ainda do Nordeste
impulsionaram o aumento populacional. Com quase 80 mil habitantes em 1940, o Acre passou a ter 215 mil em 1970, isto
é, quase o triplo. Em 1991, o estado já registrava 417.718 habitantes. Em 2000, o Censo Demográfico do IBGE apontou 556
mil habitantes. O de 2010 registrou 733 mil habitantes, isto é, um aumento de 31,6% em relação a 2000. Esse contingente
equivale a 0,38% da população

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GEOGRAFIA DO ACRE

Entre 1960 e 2000, a taxa média geométrica de crescimento anual, que registra o incremento médio de uma população
no ano, sempre ficou na casa dos 3%. No intervalo de 2000 a 2010 a mesma baixou para 2,77%, indicando pequena diminui-
ção no ritmo do crescimento populacional no estado, que continua muito acima do nacional, de 1,17% no mesmo período.
Com relação à densidade demográfica, os dados do Censo 2010 apontam que o Acre tem uma média de 4,47 habitan-
tes/km², enquanto a média da Região Norte é 4,12 hab./km² e a nacional é de 22,43 hab./km². Na Região Norte, o estado
detém a terceira menor densidade demográfica, perdendo apenas para o Amazonas (2,23 hab./km²) e Roraima (2,01 hab./
km²). O estado vizinho, Rondônia, conta com 6,58 hab./km². Vale salientar que apenas cinco municípios acreanos têm po-
pulação acima de 30 mil habitantes.
Embora continue crescendo, ainda que em ritmo menor, o contingente populacional acreano deixa de ser influenciado
pelos fluxos migratórios externos, após o “apogeu” desse fenômeno nas décadas de 1960 a 1980. Na fase atual, com as
novas estradas – principalmente a chamada Estrada do Pacifico, ligando as BRs 364 e 317 ao Oceano Pacifico a partir do
município de Assis Brasil – e a globalização das frentes de expansão do comércio e da procura por novos espaços territoriais
em desenvolvimento, a fragilidade do controle fronteiriço nas áreas remotas do Brasil tem incentivado uma migração ma-
joritariamente internacional, levando à chegada de pessoas de países com problemas de pobreza, guerras e perseguições
ao Acre. No entanto, continua havendo a migração floresta/campo-cidade dentro do próprio estado.

Urbanização e crescimento populacional urbano


A população urbana cresceu em ritmo mais acelerado que o da população rural. O grau de urbanização passou de 18%
em 1940 para 72% (ou 532.279 habitantes) em 2010, acompanhando a tendência regional, nacional e mesmo internacional.
Embora seja inferior ao nacional (82%), é expressivo para um estado com apenas 22 sedes municipais, que tem quase me-
tade do seu território definido legalmente como área protegida (unidades de conservação e terras indígenas). Apenas entre
2000 e 2010, a zona urbana viu o seu contingente populacional crescer em 43,75% (de 370.267 habitantes para 532.279),
enquanto que na zonal rural o aumento foi de apenas 7,5%.
O crescimento populacional urbano no Brasil é motivado, entre outros aspectos, pela atração da oferta de serviços
públicos, especialmente no campo da saúde e educação, e a geração de emprego e renda na área de serviços e indústria.
No caso do Acre, isso explica por que a capital, Rio Branco, responde sozinha por 45,8% de toda a população do estado:
336.038 habitantes (cf. Censo 2010). E, desse total, apenas 27.493 habitantes permanecem na zona rural do município. Ou
seja, o grau de urbanização da capital chega a quase 92%, ou 10% acima da média nacional. Depois de Rio Branco, o maior
grau de urbanização no estado é o de Cruzeiro do Sul, com 70,47%, com uma população de 78.507 habitantes residindo
na área urbana.
A análise demográfica demonstra que a urbanização acreana é majoritariamente um fenômeno rio-branquense, uma
vez que a capital é responsável por 57% desse processo. Há municípios, como Marechal Thaumaturgo, cuja população ur-
bana não chega a 28% do total, ou seja, 72% (10.258 pessoas) dos habitantes vivem na zona rural. Em termos de políticas
públicas, esse tipo de urbanização requer o planejamento de programas e ações que considerem a concentração de quase
metade da população num só município, com 92% de sua população ocupando a zona urbana. Por um lado, essa situação
facilita as operações das políticas para alcançar um maior número de beneficiários, por outro, impõe dificuldades para o
atendimento ao restante da população, que, nesse caso, está espraiada por outros 21 municípios, inclusive com várias áreas
de floresta de difícil acesso. O crescimento dos centros urbanos sem planejamento, mesmo em lugares pouco adensados,
prejudica a qualidade de vida e o meio ambiente local e encarece a implantação de infraestrutura básica.

Populações rurais, tradicionais e indígenas


Embora quase três quartos da população acreana vivam na zona urbana, essa abriga trajetórias familiares ainda com
fortes vínculos na antiga vida do seringal, da colônia e do assentamento, mesmo na própria cidade de Rio Branco. Nesse
sentido, importa caracterizar a população rural remanescente. É curioso observar que a população rural acreana vem cres-
cendo, ainda que de forma lenta, ao longo das décadas, à exceção do período 1980/1991, quando mais de 10 mil pessoas
abandonaram a zona rural. Em 2000, o Censo registrou mais de 187 mil habitantes na zona rural, um aumento superior a
28 mil pessoas em comparação a 1991. Em 2010, a população rural subiu para 201.280 habitantes, isto é, mais de 14 mil
pessoas engrossaram a zona rural no período.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Parte das pessoas que habitam a zona rural pode ser ca- a) pertencentes à família linguística Pano: Kaxinawá, Ya-
racterizada como população tradicional, isto é, ribeirinhos wanawá, Poyanawa, Jaminawa, Nukini, Shawãdawa, Jami-
e extrativistas de modo geral (seringueiros, castanheiros, nawa-Arara, Apolina-Arara, Katukina, Shanenawa, Nawa e
etc.), vivendo ou não dentro de unidades de conservação. Kontanawa;
Contudo, não há um levantamento claro e preciso sobre b) pertencentes à família linguística Aruak: Ashaninka
esse contingente populacional. As estatísticas existentes (Kampa) e Manchineri;
apresentam números distintos segundo as fontes. c) pertencentes à família linguística Arawa: Madija (Ku-
Por sua vez, as estatísticas baseadas em dados do Incra lina).
informam que em 2009 havia 30.295 famílias (ou 133.601
pessoas) habitando unidades de conservação ou assenta- O Censo de 2010 registra que 17.578 pessoas se decla-
mentos no estado (cf. Acre, 2009: 63), distribuídas da se- raram indígenas quando do momento da coleta das infor-
guinte forma: mações pelo IBGE no Acre. Dessas, 13.308 habitam terras
a) famílias em Florestas Estaduais/Nacionais: 505 indígenas e outras 4.270 moram fora dessas áreas. Dados
b) famílias em Reservas Extrativistas: 4.213 da Funasa indicam que há no estado 305 aldeias indígenas
c) famílias em diferentes tipos de assentamentos de re- (Seplan 2011: 24).
forma agrária: 22.298
d) famílias em pólos agroflorestais: 560 Zoneamento Ecológico-Econômico
O papel central do Zoneamento Ecológico-Econômico
Já os dados fornecidos pela Secretaria Estadual de Saú- na estruturação das políticas de desenvolvimento susten-
de (Gerência Técnica da Malária) indicam que a população tável no Acre foi estabelecido a partir de sua priorização
ribeirinha no ano de 2006 era de 85.385 pessoas (cf. Acre, política como instrumento de ordenamento territorial em
2009: 23). 1999. Desde então, foi realizado o ZEE do estado na esca-
Em outras palavras, as diferenças entre os números so- la 1:1.000.000 (1ª. fase) em 2000 e em 1:250.000 (2ª. fase)
bre as populações tradicionais têm a ver com a diferença em 2007, acompanhado da elaboração do Mapa de Gestão
de fonte. Provavelmente as categorias não sejam mutua- Territorial do Acre, instituído pela Lei Estadual 1.904/2007
mente excludentes, sendo que, por exemplo, as popula- (Governo do Acre / Sema 2006).
ções ribeirinhas podem ser ao mesmo tempo moradoras
de áreas protegidas ou pertencerem a algum tipo de as- Aspectos positivos
sentamento de reforma agrária. Em todo o caso, a fim de • A priorização política do ZEE pelo próprio governador
formular políticas adequadas, recomenda-se a realização em 1999 valorizou o instrumento como orientador do pla-
de estudos que identifiquem e caracterizem a população nejamento e das políticas públicas.
rural acreana de forma mais precisa. • O ZEE serviu de base para o estabelecimento da orien-
É possível que o relativo aumento no número de pes- tação estratégica do desenvolvimento do estado, que parte
soas que engrossaram a zona rural entre os anos 2000 e de um contínuo entre o uso intensivo de áreas abertas e o
2010, conforme dados do Censo, esteja associado à ex- manejo e a conservação das áreas florestadas.
pansão do número de assentamentos, ou a melhorias nes- • O ZEE manteve o seu papel de referência para as po-
ses, e também a políticas de revalorização das atividades líticas públicas ao longo do tempo, permitiu e subsidiou
extrativistas (consolidação das unidades de conservação, a formatação de vários programas e projetos, fundamen-
política de subsídios financeiros à extração da borracha, tou uma série de planejamentos, investimentos e decisões
garantia de aquisição da produção etc.). Contudo, somente governamentais (por exemplo, a criação de unidades de
um estudo pormenorizado seria capaz de indicar com mais conservação, a priorização de investimentos em cadeias
profundidade as reais causas. Para os interesses dessa ava- produtivas estratégicas e a realização de ações de regula-
liação, importa perceber que o contingente populacional rização fundiária).
rural está dividido em diversas categorias sociais, ocupan- • O processo metodológico estabelecido para o ZEE no
do praticamente todo o território acreano, mas com baixa Acre representou uma quebra do histórico “tecnicista” de
densidade demográfica. elaboração deste instrumento. Os processos iniciados até
As demais populações rurais referem-se às colônias de então nos outros estados eram de caráter excessivamen-
agricultores familiares, aos pequenos sítios e às médias e te acadêmico, resultando em diagnósticos enciclopédicos
grandes fazendas. O Censo Agropecuário de 2006 registra e de pouca aplicabilidade prática. Além disso, tratava-se
que havia no Acre 25.187 estabelecimentos agropecuários de processos extensos e caros. Já no Acre, a primeira fase
da agricultura familiar, ocupando uma área de 1,5 milhão do ZEE foi executada em menos de dois anos e custo total
de hectares, e 4.295 estabelecimentos de médios ou gran- abaixo de R$ 2 milhões.
des produtores, ocupando quase 2 milhões de hectares. • O ZEE contou com alguns elementos metodológicos
Isso quer dizer que, embora haja minifúndios no estado, inovadores, tais como a construção de um conceito abran-
as fazendas detêm a maioria das terras destinadas à agro- gente de desenvolvimento sustentável a partir da interpre-
pecuária, seguindo uma tendência regional e nacional de tação da realidade regional, destacando-se a proposta de
concentração fundiária. incorporar elementos culturais e políticos, a sistematização
Em relação aos povos indígenas do Acre, esses podem e espacialização das informações disponíveis sobre o esta-
ser divididos em dois grandes grupos: do a partir de fontes variadas, a agregação de elementos

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GEOGRAFIA DO ACRE

participativos e de governança social – com destaque para os processos de consulta em todos os municípios do estado e
a atuação da Comissão Estadual do ZEE no acompanhamento de todo o processo –, a tematização de conflitos espaciais e
sócio-ambientais entre grupos distintos, a realização dos etnozoneamentos nas Terras Indígenas e a concepção de diferen-
tes metodologias de difusão dos resultados do ZEE para públicos específicos.
• Na difusão, destaca-se a elaboração de resumos didáticos dos ZEEs, que foram disponibilizados às escolas e que para
muitos temas constituem os únicos materiais de referência para informações e contextualizações sobre a realidade do estado.
• Diferente de outras experiências, em que o ZEE consiste em um retrato estático e momentâneo, o processo acreano
teve continuidade, através do refinamento e da ampliação metodológica do próprio ZEE em escala maior (2ª. fase em escala
de 1 : 100.000), resultando na geração do Mapa de Gestão Territorial do estado e na definição de diretrizes estratégicas por
zonas / subzonas. Além disso, o ZEE é complementado por um conjunto de instrumentos de ordenamento territorial mais
específicos (cf. capítulo II.3.2).
• O processo de aprovação legal do ZEE a nível estadual e federal foi concluído em 2007.
• Estão em cursos as reflexões iniciais para o processo de atualização do ZEE, previsto para 2016.

Desafios
• O conjunto de instrumentos de ordenamento territorial associados ao ZEE estabelecidos Acre ao longo dos últimos
anos está se transformando em um instrumentário complexo, de difícil governança e assimilação pelos gestores e pela
sociedade (cf. figura 12). Além das zonas, sub-zonas e unidades de manejo com suas respectivas diretrizes, estabelecidas
no ZEE, posteriormente ainda foram agregadas outras duas categorias, as Zonas de Especiais de Desenvolvimento (ZEDs,
com foco nas áreas impactadas por obras de infraestrutura) e das Zonas de Atendimento Prioritário (ZAPs, focando em
populações vulneráveis), além dos instrumentos complementares descritos abaixo. Constatou-se que, embora os gestores
entrevistados conheçam o ZEE e se refiram a ele, as orientações específicas e a multiplicidade de instrumentos geram difi-
culdades no seu entendimento e na sua aplicação. 

• Muitas vezes a articulação e integração entre o ZEE e as demais iniciativas de ordenamento territorial são difíceis de
serem viabilizadas. Por exemplo, a incorporação efetiva das diretrizes do ZEE nos ordenamentos territoriais locais é frágil.
Isto vale com ênfase ainda maior para instrumentos de ordenamento sob responsabilidade de outras esferas administra-
tivas, tais como os planos de manejo e a gestão de áreas protegidas. A articulação com outros planos regionais e federais
enfrenta dificuldades similares. Cabe destacar que estes desafios não constituem particularidades do cenário acreano, sen-
do também verificadas, em proporções até maiores, nos demais estados da região.
O caráter dinâmico do ZEE ainda necessita de uma operacionalização mais efetiva. Do ponto de vista metodológico, não
está claro de que forma as evoluções socioeconômicas, novas diretrizes políticas etc. deverão ser incorporadas ao ZEE e de
que forma as diretrizes • estabelecidas devem interagir com novas realidades. A base de dados do ZEE não é atualizada de
forma contínua, de modo que a mesma retrata apenas o momento de elaboração da respectiva fase do ZEE, mas apresenta
limitações como instrumento de orientação de decisões permanente dos órgãos gestores.

20
GEOGRAFIA DO ACRE

O ZEE cumpre o seu papel indicativo de diretrizes estra- • Considerando as recentes iniciativas de diversificação
tégicas para as políticas públicas, mas apresenta limitações econômica e fomento a novas atividades, recomenda-se a
na orientação da implementação operacional. Para as polí- elaboração de ZEEs temáticos para temas estratégicos, tais
ticas cujo caráter espacial é menos imediato (por exemplo, como a expansão da piscicultura.
na área de saúde, educação, etc.), o papel orientador do • No âmbito da preparação do processo de revisão do
ZEE não está muito claro. Mesmo entendendo que a imple- ZEE em 2016, recomenda-se rever o conjunto de instru-
mentação destas políticas poderia se beneficiar das análi- mentos de ordenamento territorial que incidem no Acre,
ses e diretrizes regionalizadas do ZEE, na prática, as mes- buscando sistematizar e tornar mais didáticas estas ferra-
mas contam com instrumentos de planejamento distintos, mentas.
que não estabelecem conexão direta com as questões eco- • Recomenda-se priorizar a conclusão do ordenamento
lógicas e econômicas, e seus gestores não entendem o ZEE territorial da atual zona 3 (“áreas prioritárias para o orde-
como instrumento orientador. namento territorial”), de modo que a mesma possa ser ex-
• A interação com os gestores e os atores sociais locais cluída ou reduzida significativamente.
segue sendo um desafio para a implementação do ZEE. Os
gestores que não participaram pessoalmente do período A estruturação da paisagem, imagem da economia
de elaboração têm maior dificuldade de assimilá-lo como regional
orientador de suas decisões.
• As instâncias de participação e controle social do ZEE O urbano e a urbanização devem ser vistos sob a ótica
(Comissão Estadual do ZEE e câmaras técnicas), que foram da divisão social e territorial do trabalho. Ser urbano não
ativas durante os períodos de elaboração dos mesmos, não significa viver no espaço físico das cidades, já que a ques-
detêm papel ativo em sua implementação e encontram-se tão urbana é de magnitude diferente, pois ultrapassa as
esvaziadas. fronteiras físicas da cidade e uma realidade mista, regional.
• A criação e utilização continuada de mecanismos A urbanização, por seu turno, pode ser entendida como
efetivos de monitoramento da implementação do ZEE foi um espaço em permanente mutação, em que a cidade e
abordada na elaboração da 2ª. fase, mas não está sendo o campo são hoje realidades confluentes (SOUZA, 1995
operacionalizada (cf. Governo do Acre / Sema 2009). O p. 65). A integração entre o local e o regional não pode
sistema de indicadores de sustentabilidade municipal pro- ser ignorada, dado que não se trata apenas de diferenciar
posto para este fim não está sendo alimentado e não é dois entes geográficos, mas, sim, de visualizar o sistema
utilizado como orientador de políticas. integrado, que repercute nos lugares intra-urbanos. A vi-
são integrada de análise para a urbanização é resultante da
Recomendações interação entre elementos físicos e biológicos da natureza,
• Recomenda-se priorizar o avanço na construção de onde, os sistemas ambientais físicos possuem uma expres-
mecanismos de implementação e monitoramento efetivo são espacial na superfície terrestre. Os ecossistemas locais,
das dinâmicas territoriais. Uma possibilidade neste sentido assim, são integrados nesta organização mais abrangente
é instalação de uma instância de monitoramento e avalia- e de maior complexidade hierárquica, a urbanização, que,
ção periódica (por exemplo, no formato de um Observató- ao transformar intensamente as relações entre a natureza
rio de Gestão Territorial), que promova a revisão sistemáti- e a cidade, promove uma solidariedade indestrutível que
ca das políticas públicas prioritárias para a verificação dos não permite a adoção de atitudes isoladas. Dessa forma,
formatos de incorporação e do atendimento das diretrizes o significado dos lugares é explicado pela totalidade das
territoriais e temáticas do ZEE, identificando e propondo relações entre os elementos físicos, naturais, culturais, po-
ajustes e novos processos. líticos e econômicos que os constituem (CHIRISTOFOLETTI,
• Recomenda-se um tratamento diferenciado às políti- 1997 p.144).
cas que não apresentam um caráter territorial explícito no O desenvolvimento urbano das cidades está intrinseca-
âmbito do ZEE. Cabe analisar se a própria contemplação mente relacionado com as políticas de gestão administra-
destas políticas no âmbito do ZEE não deveria ser objeto tiva dos diferentes níveis na mais ampla gama de ações e é
de reflexão conceitual. reflexo destas na qualidade de vida e no espaço produzido.
• A base de dados do ZEE deve ser ampliada para uma BECKER (2004, p. 31) expõe a lógica perversa da realidade
base de dados de informações geoespaciais do estado, que regional, em que as cidades, tiveram um papel logístico es-
deve contar com manutenção e atualização contínua. sencial no processo de ocupação. A Amazônia tornou-se
• Tendo em vista o desafio de internalizar o conjunto uma floresta urbanizada, com 69,07% da população, em
de instrumentos e diretrizes na área do ordenamento ter- 1996, vivendo em núcleos urbanos e, apresentando ritmo
ritorial no estado, seria importante retomar e fortalecer as de crescimento superior ao das demais regiões do país a
iniciativas de internalização e difusão do ZEE no governo e partir de 1970, além de uma desconcentração urbana, na
na sociedade, com um foco específico nos gestores públi- medida que houve crescimento da população não mais
cos estaduais e municipais. Isto poderia acontecer através apenas nas capitais estaduais, mas nas cidades com menos
de um programa permanente de difusão. de 100.000 habitantes. “É verdade que as cidades se torna-
• É importante prever estratégias de dinamização das ram um dos maiores problemas ambientais da Amazônia
instâncias de controle social do ZEE com foco no período dada à velocidade da imigração e carência de serviços”,
de implementação do mesmo. (Op. Cit. p. 31). O privilégio atribuído a grandes grupos e

21
GEOGRAFIA DO ACRE

à violência da implantação acelerada da malha tecno-po- Enquanto o mundo estava concentrado na preservação
lítica, que tratou o espaço como isotrópico e homogêneo, das florestas, sob frequente clima de tensão entre grupos
com profundo desrespeito pelas diferenças sociais e eco- de interesses econômicos diversos, a trajetória da forma-
lógicas, tiveram efeitos extremamente perversos nas áreas ção das cidades na Amazônica e especificamente o Acre
onde foi implantada, destruindo, inclusive, gêneros de vida ficou distante do foco. A sustentabilidade urbana e a pro-
e saberes locais historicamente construídos. Essas são li- dução dos lugares intra-urbanos ficaram em patamares de
ções a aprender sobre como não planejar uma região. prioridade inferiores, sem a atenção que a questão urbana
(Op.Cit. p. 27). merecia desde o inicio dos grandes movimentos migrató-
As alterações nas massas nativas vegetais e hidrológi- rios que transformaram a paisagem do local e que se ini-
cas, causadas pela urbanização da floresta, provocam emi- ciaram a partir da década de 1970 em direção aos núcleos
nentes alterações no ecossistema, modificam o clima regio- já estabelecidos.
nal e ocasionam micro climas que descaracterizam a floresta
tropical úmida. O desequilíbrio ambiental regional influencia A paisagem do regional ao local
nas temperaturas urbanas nas cidades da região amazônica.
Deve-se ter em conta, também, que o contexto local climá- Paisagem regional produtiva
tico não pode ser dissociado do contexto climático regional. Os aspectos relacionados ao avanço dos investimen-
Atualmente, o asfaltamento do sistema viário retoma tos dos grandes capitais privados foram objeto de estu-
um impulso maior. Uma rede de conexões rodoviárias atra- do prioritário em pesquisas analíticas destacandose os
vessa o território a partir dos grandes eixos regionais, re- artigos relacionados à pecuária e ao desmatamento. A
presentados pela BR 364 e BR 317. Na consolidação da dimensão ambiental em território amazônico foi alvo de
abertura de um fluxo-corredor atravessando as cidades do preocupações globais durante o período de formulação
Acre que tem como porta de acesso a cidade de Rio Branco e estruturação da política ambiental; a partir da Eco 92 o
através da BR 364, que interliga as cidades de Porto Velho foco continuou na preservação da floresta, mas houve um
- Rio Branco - Cruzeiro do Sul, a estruturação do espaço concomitante avanço da atividade econômica pecuarista.
urbano e configuração espacial, sofrem impactos ambien-
Entretanto, o planejamento urbano não foi capaz de im-
tais locais, tais como a interferência no ciclo das águas, o
pedir na prática, uma urbanização predatória nas cidades,
crescimento desordenado das periferias, as altas taxas de
cujo custo ambiental foi a expansão periférica em um con-
impermeabilização do solo, o aumento de ilhas de calor
texto de miséria urbana associada a uma série de sequelas
urbanas e o aumento na horizontalidade da cidade. Estes
na sustentabilidade ambiental local. No contexto político-
fatores contribuem, de forma direta ou indireta, com a in-
-administrativo a democratização incumbiu aos municípios
tensificação do processo de aquecimento global.
As vias regionais têm relação com o crescimento ur- brasileiros responsabilidades de gestão para as quais mui-
bano e se constituem em um poderoso elemento na ex- tos deles não dispunham de instrumentos necessários para
pansão urbana, o que deveria, teoricamente, acarretar o desenvolvimento urbano local:
melhores possibilidades no atendimento às atividades e “O processo de descentralização em curso Brasil desde
demandas humanas. As vias regionais também atraem po- os anos 80 e consolidado pela Constituição de 1988 pos-
pulações de diferentes rendas, (VILLAÇA, 2009 p. 85), prin- sibilitou a disseminação de posturas municipalistas que
cipalmente nos pontos nodais e nos acessos às cidades já envolveram o colapso do planejamento aliado a uma frag-
consolidadas, apropriados para o surgimento de atividades mentação da ação pública circunscrita ao espaço local de-
comerciais, aumentando o valor do solo em seu entorno. A nominado por Melo (2000) de neolocalismo. Este autor se
preocupação com o desenvolvimento na Amazônia inclui apóia na reflexão teórica desenvolvida por Harvey (1989),
um olhar regional segundo a opinião da pesquisadora Ag- concluindo que o localismo americano pode ser detectado
nes Serre, que avalia o assunto da seguinte maneira: no Brasil dos anos 90, onde a guerra fiscal entre Estados e
“atualmente, a Amazônia tem uma população estimada municípios aponta para a frustração em termos de gera-
em vinte milhões, dos quais 60 % são urbanos. Isto significa ção de novos empregos de qualidade, além de uma clara
que estão localizados em zonas qualificadas de urbanas, ausência de coordenação de uma estratégia nacional de
distribuídas em poucas cidades muito grandes (ultrapas- desenvolvimento” (ROLNICK, et al., 2000, p.86)
sando a faixa de 500 mil habitantes) e dezenas de peque- Durante o período compreendido entre 1970 e 1980,
nas ou médias cidades (de 20 a 250 mil). A localização des- com a implantação de grandes fazendas pelos sulistas, a
sas cidades mostra uma concentração do povoamento ao qual foi ocasionada por uma intensa propaganda desenca-
longo dos eixos de circulação fluvial e dos eixos rodoviá- deada pelo governo federal, -política de integração nacio-
rios, que correspondem à Amazônia dos rios e à Amazônia nal-, grandes espaços da mata foram “abertos” pelas quei-
das estradas. Esse padrão linear tem suas raízes na história madas, o que também levou ao surgimento de fazendas
da região. Nas zonas qualificadas de urbanas, predomina a de gado extensivo. Segundo (TONI, 2007 p.107), a pecuária
ausência de infraestruturas, a falta de saneamento básico e respondeu a esses estímulos de natureza global e nacio-
a pobreza da população. Em geral, a moradia e a expansão nal, além de também contribuir para a própria evolução da
urbana não obedecem a qualquer consideração ambiental. economia regional e da distribuição demográfica da popu-
O desafio para as políticas públicas urbanas é conseguir lação amazônica. “Com o aumento da população e de sua
integrar na prática o conceito de desenvolvimento susten- taxa de urbanização, consolidou-se um mercado regional
tável.” de carne bastante vigoroso, que também estimula os in-

22
GEOGRAFIA DO ACRE

vestimentos em pecuária. Em escala regional e até mes- Dessa maneira, conforma-se um sistema integrado de
mo local, a abertura e pavimentação de estradas tem sido mudança regional e local para a Amazônia e para o Acre
outro fator que historicamente contribuiu para a expansão entre 1970 e 2000. A tensão criada entre a nova base eco-
em pecuária”. Segundo a pesquisa do mesmo autor (Op. nômica e o fator ambiental faz com que as partes não
Cit. p.54), a produção de látex é considerada uma atividade dialoguem e se contraponham. A pecuária traz consigo
de baixa lucratividade e, por este motivo, está sendo aban- uma pesada herança ambiental, que teve origem com as
donada pelos extrativistas. Por sua vez, a cadeia produtiva queimadas, com a retirada da cobertura nativa em troca
e comercialização do gado envolvem grande número de do pasto e, por último com as recentes consequências de-
atores e organizações, desde criadores, engordadores, par- tectadas no meio ambiente local e global. A mancha verde
ceiros, locadores de pasto, passando por transportadores, lei- imponente está se tornando cada vez menor em detrimen-
loeiros, meeiros, comerciantes, matadouros, frigoríficos, laticínios, to da frente pecuarista. Para TRIGUERO, (2005 p. 151), está
mercados, consumidores, curtumes até chegar em órgãos esta- comprovado que, entre agosto de 2002 e agosto de 2003,
duais de pesquisa, assistência técnica e fiscalização (Op. Cit. p.45). 23.750 km² sumiram do mapa. Foi a segunda maior des-
Enquanto o rebanho bovino aumentou 33% no Brasil, truição já registrada no intervalo de um ano. Só em 1995
de 153 milhões de cabeças para 205 milhões, o número de foram de 30 mil km² desmatados.
cabeças de gado na região da Amazônia Legal dobrou no Na análise de Adriana da Conceição3 sobre os impac-
mesmo período, passando de 37 milhões em 1996 para 73 tos da pecuária, baseado no conceito de pegada ecológica,
milhões em 2006, e um crescimento três vezes maior que onde, para cada item de consumo, existe uma certa de-
a média nacional. Atualmente, existem 3,5 bovinos para manda de quantidade de terras em uma ou mais catego-
cada habitante da região, formada por nove estados (Acre, rias de ecossistemas requeridas para fornecer o consumo
Amazonas Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondô- e absorver os resíduos, em seu estudo vemos claramente
nia, Roraima e Tocantins, (PLATONOW2, 2007). No Acre, o que o impacto relacionado ao consumo da carne bovina é
gado passou de 120.000 cabeças, em 1975, para 334.000 maior sobre a ocupação de terras e ecossistemas do que
em 1985 e, em 2006, segundo dados do Instituto Brasileiro degradações ambientais tais como consumo de gasolina
de Geografia e Estatística, IBGE, as cabeças de gado soma-
(0,47 ha), madeira (0, 017 ha) ou energia elétrica (0,38 ha).
ram de 2,4 milhões, enquanto se verificou um contingente
Esses valores são uma média baseada na população desta
populacional de 686.652 habitantes.
região, onde uma pessoa ocuparia 2,2 ha para suprir suas
Na expansão das fronteiras pecuaristas, a necessidade
necessidades. O estudo da média brasileira é de 3,1 ha/
de áreas de pastagem aumenta conforme o número de ca-
pessoa. Nota-se, por conseguinte, que a ocupação de ter-
beças de gado. Em se tratando de criação extensiva, ca-
ras pelo gado é um perigo para a biodiversidade da Terra.
racterística da região amazônica, a necessidade de novas
O gado constitui 20% do total da biomassa animal terrestre
terras exige a aquisição do entorno: trata-se de colônias
e a superfície que ocupa hoje em dia áreas antes habita-
agrícolas e seringais cujas populações são pressionadas
pelos grandes proprietários de fazendas de gado, em que das por espécies silvestres. Num dos cálculos feitos sobre
as famílias saem do “centro” para as “margens”, ou migram a eficiência na produção de carne temos que 1 kg de grãos
em direção à periferia das cidades. Entre 1970 e 1991, a po- possibilita a obtenção de 0, 140 kg de carne bovina (CH-
pulação urbana no Estado do Acre aumentou em 198.728 RISTOFIDIS4, 2001).
moradores. É o período em que o asfaltamento dos eixos O mapeamento da paisagem é um processo estrutural
das BR 364 e 317 assumiu prioridade, por meio de recur- que tem ressonância tanto no ambiente construído como
sos federais, acordos internacionais, planos e projetos. Para em sua representação social coletiva. Isso exige uma leitura
BECKER, (Op. Cit. p. 29), a conectividade que permitiu à re- mais dinâmica das estruturas espaciais e requer uma inscri-
gião a comunicação interna com o resto do país e com o ção do capital nas formas espaciais, uma inscrição que ad-
exterior, rompeu a condição de grande “ilha” da Amazônia, mita a influência da lógica da produção, além de requerer
pois facilitou a mobilidade e a urbanização. um modelo que transcenda o individual, que realize uma
A consequência desse processo teve, nas queimadas, orquestração de formas espaciais e práticas culturais, (ZU-
um forte instrumento utilizado para aumentar considera- KIN, 1991, p.84).
velmente as áreas de criação de gado. Este cenário mo- As questões de sustentabilidade humana refletidas nos
tivou a coletividade do local e ocasionou resistência dos espaços intraurbanos, quando não são consideradas no
seringueiros cuja forte identidade territorial se une contra seu devido tempo, trazem consequências negativas para a
a intervenção econômica do lugar. Constitui-se, dessa for- qualidade de vida e na identidade urbana, principalmente
ma, a união dos povos da floresta, representada por Chico em territórios frágeis dos contextos regionais amazônicos;
Mendes, que lidera o conhecido movimento do “empate”, “... a cidades e seu desenvolvimento estão associadas,
mediante o qual os seringueiros bloqueiam fisicamente o de maneira geral, a um passado histórico condicionado
avanço de frentes de desmatamento. Pode-se afirmar que uma série de fatores econômicos, políticos, sociais aplica-
o movimento de resistência de seringueiros e dos atingidos dos e decorridos diferentemente em cada centro urbano.
por barragens na Amazônia tem caminhado, embora de Não esquecendo de relacionar analisar os aspectos fisio-
maneira diferenciada, na direção de falarem em nome de gráficos e topográficos de cada lugar, o que influencia
suas regiões, buscando elaborar coletivamente novas pers- muito na dinâmica de seu progresso urbano. É importante
pectivas entre o regional e o local (VAINER, 1995 p.175). salientarmos que o próprio ambiente urbano se constrói

23
GEOGRAFIA DO ACRE

de maneira agressiva ao meio natural transformando-o em a instrumentalização que é feita do espaço, com a utilização
um ambiente construído, que muitas vezes não se intera- de recursos coletivos, serve ao aumento de produtividades
gem de maneira totalmente saudável”. (MELAÇO5, 2003, individuais e ao agravamento dos desequilíbrios, ainda que
p.01). mascarada com a substituição de um desequilíbrio por ou-
Em 1991, o Estado do Acre contava com uma popula- tro. Dessa maneira instrumentalizado, o território é causa
ção de 417.165 habitantes e, apresentava uma densidade da maior desigualdade entre firmas, instituições e, sobre-
demográfica de 2,7 hab/km². tudo entre os homens. Em lugar de se tornar o desejado
A mobilidade da força de trabalho, fortemente vincula- instrumento de igualdade individual e de fortalecimento
da à atividade econômica do ciclo do extrativismo e suas da cidadania, o território manterá o seu papel atualmente
respectivas crises, por um lado e à política de integração perverso, não apenas alojando, mas na verdade criando ci-
nacional com a expansão de fronteiras a partir de 1970, dadãos desiguais, não apenas pelo seu lugar na produção,
por outro, determinaram um longo e complexo comando mas também em função do lugar onde vivem”. SANTOS,
de interesses nacionais e internacionais nas relações sociais (2000, p. 105-106)
de produção e crescimento urbano, VILLAÇA, (2001 p. 43) De fato, o quadro urbano em Rio Branco apresentava-se
lembra HARVEY (1982) ao se referir ao trabalhador como em 1990 como uma cidade de características periféricas,
objeto dominado pelo capital: “A força de trabalho é uma com um núcleo central tradicional e institucional cercado
mercadoria, mas as condições que governam sua mobili- de cinco bairros de “classe alta”, quinze de “classe média”,
dade são muito especiais. É a única mercadoria que pode e o um entorno periférico, formado por um aglomerado
trazer-se a si própria para o mercado, com suas próprias de casas de madeira em aproximadamente 70% do seu
energias” e conclui que a mobilidade, neste sentido, só vale perímetro urbano8. Sem indústrias representativas para a
para o espaço regional, no nível intraurbano, o trabalhador economia da cidade na iniciativa privada, Rio Branco tinha
já esta no local de trabalho. É no espaço intraurbano que 90% da sua população empregada no governo, nas áreas
otimiza suas condições de consumo. federal, es tadual e municipal. Além desse contingente, ha-
via em torno de 20.000 aposentados oriundos do “exérci-
Estruturação da paisagem local to da borracha9” na cidade de Rio Branco. A visão SACHS,
A expansão do tecido urbano motivado pelos ciclos da (1993 p. 41) no tocante ao sistema urbano na governança
economia regional no Estado do Acre e incentivada pela revela-se com o seguinte trecho da sua obra:
consolidação do sistema de grandes eixos viários produz “As cidades são ecossistemas e, como tais, são fontes
a instabilidade do sistema urbano na medida que o de- potenciais de recursos. Muitos destes recursos estão la-
sequilíbrio espacial entre as atividades são provocadas: “À tentes, sub ou mal utilizados: solo urbano adequado ao
medida que novas cidades consumidoras se expandem, cultivo, resíduos recicláveis, potencial para a economia de
também cresce a competição por recursos e crescem as energia, de recursos financeiros e de água através de me-
pegadas ecológicas, a expansão desses rastros ecológicos lhor manutenção dos equipamentos, da infra-estrutura e
urbanos está ocorrendo simultaneamente com a erosão de das moradias”.
terras férteis, mares e áreas florestais intocadas” (ROGERS, No processo do desenho urbano como CARMONA,
2001, p. 30).
(2003 p. 283) enfatiza; os resultados são coletivos e amplos
Na análise das paisagens urbanas PANERAI, (2006 p.43),
em vez de resultados restritos e individuais e, a essência
se refere aos grandes eixos rodoviários como estrutura-
da ação está inserida em quatro contextos fundamentais:
dores das periferias e como herança de caminhos antigos
o global, o local, o contexto de mercado e o regulatório:
estabelecidos antes da urbanização. Afirma que estes ad-
“O desenho urbano é o processo de produzir melhores
quirem a sua própria leitura no sistema de organização.
lugares para as pessoas. A sua complexidade implica atitu-
Notamos que tanto a população urbana quanto a rural
aumentou no período de 1981 a 2006 na cidade de Rio des exploratórias, intuitivas e dedutivas nas condições es-
Branco. pecificas no tempo e no espaço, enfatiza papel do publico
Destacamos, ainda, que a influência da consolidação e privado para proporcionar uma sustentabilidade de alta
das estradas durante este período foi um fator que permitiu qualidade no desenho urbano e nas pessoas como trans-
e facilitou o deslocamento das famílias atraídas pela cida- formadoras do lugar”.
de na busca de conforto urbano, o que simboliza como os Para ROMERO, (2008 p.46) a escala macro climática, a
caminhos ajudaram na expansão espacial da malha urbana. regional, quando modificada pelos fatores orográficos a
Estes assentamentos populacionais periféricos eram geral- uma escala meso, que inclui o urbano, pode definir o clima
mente “invasões de terras” legalizadas posteriormente pela do entorno mais próximo, que também é definido pelas
administração pública. Não tinham infraestrutura mínima modificações de todas as variáveis me-
necessária como água, energia, saneamento, serviços de
limpeza, coleta de lixo, um esgoto, geralmente a céu aberto 9 Nome dados aos brasileiros (60.000), que entre 1943 e
e arruamentos executados pelos próprios moradores, com 1945 foram alistados, transportados para a Amazônia pelo
base em trilhas e “pinguelas6”. O processo urbano confor- Departamento de Imigração do Governo Getúlio Vargas,
me a colocação de SANTOS interage em vários contextos: com o objetivo de extrair borracha para os Estados Uni-
“......não há procura de uma verdadeira produtividade dos teorológicas do ambiente construído. ROMERO (2000,
espacial, entendida como forma de utilizar o território em p.12) contribui à questão ao se referir especificamente às
um processo verdadeiramente redistribuitivo. Ao contrário, florestas tropicais:

24
GEOGRAFIA DO ACRE

“o ecossistema de uma vegetação densa funciona por


um processo delicado, frágil. Exemplo disto são as florestas 4. LINGUAGEM CARTOGRÁFICA: LEITURA DE
tropicais do Brasil, onde a circulação de nutrientes é inten- MAPAS.
sa, tendo como elementos a cobertura vegetal espessa e
as chuvas abundantes. Deve-se lembrar, no caso específico
das florestas tropicais, a complexa dinâmica da vegetação e
das chuvas, que na paisagem se apresenta na exuberância A palavra cartografia tem origem na língua portuguesa,
da flora. A devastação intensa conduz à quase total perda tendo sido registrada pela primeira vez em 1839 numa cor-
dos nutrientes do solo, levados pelas chuvas da região”. respondência, indicando a ideia de um traçado de mapas e
A integração viária local como conexão de maiores ei- cartas. Hoje entendemos cartografia como a representação
xos rodoviários poderá ter seus impactos de diferentes ma- geométrica plana, simplificada e convencional de toda a
neiras na paisagem intra-urbana. CARMONA, (op.cit. p. 49) superfície terrestre ou de parte desta, apresentada através
exemplifica os custos ambientais causados pelos eixos viá- de mapas, cartas ou plantas.
rios, explicitamente no aspecto da poluição e do novo valor Por meio da cartografia, quaisquer levantamentos (am-
do solo nas suas margens, que beneficia os proprietários bientais, socioeconômicos, educacionais, de saúde, etc.)
latifundiários e proprietários da área geográfica de abran- podem ser representados espacialmente, retratando a di-
gência. A execução do sistema viário implica a utilização mensão territorial, facilitando e tornando mais eficaz a sua
de grandes quantidades de recursos pelo poder publico compreensão.
sem a participação dos atores privados e que geralmente Não se pode esquecer, no entanto, que os mapas, como
os ganhos não têm retorno para o erário. O benefício pode meios de representação, traduzem os interesses e objetivos
resultar individual e não coletivo ou social. Na colocação de quem os propõe, podendo se aproximar ou se afastar
de VILLAÇA, (op. cit.) encontramos o foco em relação às da realidade representada. Além disso, enfrentam, como
implicações intraurbanos: veremos mais adiante, as limitações e distorções que ine-
“As necessidades e as condições de deslocamento es- vitavelmente surgem quando da transposição da realidade
pacial dos seres humanos – o transporte – como força do- para o plano.
minante na estruturação espacial urbana, que atua dentro Todo produto cartográfico é sempre útil e válido para
de um quadro de relações sociais que, por sua vez, definem uma determinada aplicação, em um determinado instante
as necessidades e as condições de deslocamento, as ca- do tempo.
madas populares são mais prisioneiras do espaço do que
as camadas de mais alta renda, que tem uma mobilidade Geoide e elipsoide
bem maior. A política que privilegia o transporte individual Define-se a forma da Terra como geoide, que tem uma
está favorecendo o deslocamento dos proprietários de au- superfície irregular e, portanto, não corresponde a uma es-
tomóveis. ‘Os ricos podem comandar o espaço, enquanto fera. Mais precisamente, o geoide é uma superfície equi-
os pobres são prisioneiros dele, HARVEY’. As forças repre- potencial do campo da gravidade, ou seja, sobre essa su-
sentadas pelas necessidades e condições de locomoção perfície o potencial do campo da gravidade é constante,
colidem com espaços construídos herdados do passado coincidindo, portanto, com uma superfície de equilíbrio de
que, frequentemente, são de superação mais difícil que os massas d’água.
obstáculos topográficos”. Podemos visualizar, aproximadamente, essa superfície
Atualmente, no ano de 2009, o discurso político acrea- por meio do prolongamento do nível médio dos mares por
no se encontra fortalecido com a utilização consciente dos dentro dos continentes.
recursos no desenvolvimento sustentável, como consta no Como o geoide é uma superfície de características físi-
discurso divulgado no dia da Amazônia no site do Governo cas complexas, os cartógrafos buscaram a figura geomé-
do Estado do Acre10 cujo propósito é um modo de vida trica matematicamente definida que mais se aproximasse
sustentável fundamentado no desenvolvimento social e do geoide, possibilitando assim a realização de cálculos
econômico. Para BECKER, (Op.Cit. p. 31) a transformação relacionados a medições sobre a superfície terrestre (por
mais importante ocorrida foi a mudança na estrutura da exemplo, medições de coordenadas de pontos, distâncias,
sociedade expressa no despertar da região para a conquis- ângulos, áreas, etc.). Essa figura é o Elipsoide de Revolu-
ta da cidadania como fruto da conectividade, da mobilida- ção, definido pela rotação de uma elipse sobre o seu eixo
de populacional e da urbanização. A complexidade na aná- menor.
lise entre desenvolvimento e ambiente cria uma terceira via
que é a retórica político-ideológica. (VEIGA, 2008 p.109).

Fonte:
https://www.suapesquisa.com/geografia/acre.htm
Curso de Geografia da UFAC
http://imc.ac.gov.br/wp-content/uploads/2016/09/ava-
liacao_politicas_des_sust_Acre.pdf
http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/12155/1/
ARTIGO_EstruturacaoPaisagemRegional.pdf

25
GEOGRAFIA DO ACRE

Uma visão do geóide

Fonte: Knippers, Richard. Perspective view of the globe. In: geometric aspects of mapping. Enschede:
International Institute for Aerospace Survey and Earth Sciences, 2000. Disponível em: <http://kartoweb.itc.
nl>. Acesso em: out. 2002.
Nota: A superfície irregular contida na figura foi exagerada para fins de clareza didática

Na figura abaixo, vemos a elipse que gera o Elipsoide de Revolução, sendo “a” o eixo maior ou equatorial e “b” o eixo
menor ou polar, que medem respectiva e aproximadamente 6 378 km e 6 357 km.

26
GEOGRAFIA DO ACRE

Coordenadas geográficas
Para que cada ponto da superfície da Terra pudesse ser localizado no mapa, foi criado um sistema de linhas imaginárias
chamado Sistema de Coordenadas Geográficas. A coordenada geográfica de um determinado ponto da superfície da Terra
é obtida pela interseção de um meridiano e um paralelo.
Os meridianos são linhas imaginárias que cortam a Terra no sentido norte–sul, ligando um polo ao outro. Os paralelos
são linhas imaginárias que circulam a Terra no sentido leste–oeste. Paralelos e meridianos são definidos por suas dimensões
de latitude e longitude, respectivamente.

LATITUDE
Os paralelos nos indicam a latitude, que é a distância, em graus, da linha do Equador até o paralelo de um determinado
lugar. Os valores da latitude variam de 0º (linha do Equador) a 90º (polos), devendo ser indicada também a posição: no
hemisfério sul (S) ou no hemisfério norte (N).
A longitude é a distância, em graus, entre o meridiano de origem e o meridiano local. Por convenção, adotou-se como
origem o Meridiano de Greenwich (que passa pelo observatório de Greenwich na Inglaterra).
Os valores da longitude variam de 0º (Greenwich) a 180º a leste e a oeste de Greenwich.

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GEOGRAFIA DO ACRE

LONGITUDE
Os valores das longitudes são considerados negativos a oeste de Greenwich (hemisfério ocidental) e positivos a leste
de Greenwich (hemisfério oriental).

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GEOGRAFIA DO ACRE

Altitude
Todas as altitudes são contadas a partir do nível médio dos mares, determinado por medições feitas pelos marégrafos
em diferentes pontos do litoral. Nos mapas, a altitude é representada por uma escala de cores que varia do verde (baixas
altitudes) ao marrom (altitudes mais elevadas). São também utilizadas as curvas de nível, definidas por planos paralelos ao
nível do mar que interceptam o relevo em intervalos regulares definidos a cada 20 m, 50 m, etc., conforme os objetivos da
representação cartográfica. Cada curva de nível traz o valor, em metros, da distância do plano de interseção ao nível do mar.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Sistema de posicionamento global - GPS


Este sistema foi projetado para fornecer o posicionamento instantâneo e a velocidade de um ponto na superfície terres-
tre ou próximo dela, através das coordenadas geográficas. O GPS é baseado numa constelação de 24 satélites, distribuídos
por seis órbitas em torno da Terra.
A altitude da órbita, 20 200 km, foi calculada de modo que cada satélite passe sobre o mesmo ponto da Terra num
intervalo de 24 horas.
O GPS pode ser aplicado em vários ramos de atividade, nos quais a localização geográfica seja uma informação necessá-
ria. Foi originalmente concebido para ser utilizado nas navegações aérea, marítima e terrestre, e também para a localização
de expedições exploradoras. Tornou-se importante instrumento para a realização de levantamentos topográficos e geodé-
sicos, demarcação de fronteiras, unidades de conservação e terras indígenas, implantação de eixos rodoviários, bem como
para o monitoramento de caminhões de cargas, carros ou qualquer outro tipo de transporte.
O IBGE opera uma rede de estações GPS (Rede Brasileira de Monitoramento Contínuo) permanentes composta por
nove estações, sendo, portanto, uma ferramenta de suporte para a utilização desta tecnologia no Brasil e o principal elo de
ligação com os sistemas de referência internacionais.

Projeções cartográficas
Sabemos que a maneira mais adequada de representar a Terra como um todo é por meio de um globo.
Porém, precisamos de mapas planos para estudar a superfície do planeta. Transformar uma esfera em uma área plana
do mapa seria impossível se os cartógrafos não utilizassem uma técnica matemática chamada projeção.
No entanto, imagine como seria se abríssemos uma esfera e a achatássemos para a forma de um plano. Com isso, as
partes da esfera original teriam que ser esticadas, principalmente nas áreas mais próximas aos os polos, criando grandes
deformações de área. Então, para chegar a uma representação mais fiel possível, os cartógrafos desenvolveram vários mé-
todos de projeções cartográficas, ou seja, maneiras de representar um corpo esférico sobre uma superfície plana.
Como toda projeção resulta em deformações e incorreções, às vezes algumas características precisam ser distorcidas
para representarmos corretamente as outras. As deformações podem acontecer em relação às distâncias, às áreas ou aos
ângulos. Conforme o sistema de projeção utilizado, as maiores alterações da representação localizam-se em uma ou outra
parte do globo: nas regiões polares, nas equatoriais ou nas latitudes médias. É o cartógrafo define qual é a projeção que
vai atender aos objetivos do mapa.

A projeção mais simples e conhecida é a de Mercator (nome do holandês que a criou). Outras técnicas foram evoluindo
e muitas outras projeções tentaram desfazer as desigualdades de área perto dos polos com as de perto do equador, como
por exemplo a projeção de Gall. Como não há como evitar as deformações, classifica-se cada tipo de projeção de acordo
com a característica que permanece correta. Temos então:
Projeções equidistantes = distâncias corretas
Projeções conformes = igualdade dos ângulos e das formas dos continentes
Projeções equivalentes = mostram corretamente a distância e a proporção entre as áreas
A seguir são apresentados os três principais tipos de projeção.

Cilíndricas
Consistem na projeção dos paralelos e meridianos sobre um cilindro envolvente, que é posteriormente desenvolvido
(planificado). Uma das projeções cilíndricas mais utilizadas é a de Mercator, com uma visão do planeta centrada na Europa.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Cônicas
É a projeção do globo terrestre sobre um cone, que posteriormente é planificado. São mais usadas para representar as
latitudes médias, pois apenas as áreas próximas ao Equador aparecem retas.

Azimutais
É a projeção da superfície terrestre sobre um plano a partir de um determinado ponto (ponto de vista). Também cha-
madas planas ou zenitais, essas projeções deformam áreas distantes desse ponto de vista central. São bastante usadas para
representar as áreas polares.

Escalas cartográficas
Em um mapa, chamamos de escala cartográfica a relação entre as dimensões apresentadas no mapa e o objeto real por
ele representado.
Estas dimensões devem ser sempre tomadas na mesma unidade.
A forma de representação é a seguinte:
Escala = medida no mapa : medida no objeto real
ou
Escala = medida no mapa / medida no objeto real
Por exemplo, se um mapa apresenta a escala 1:50, significa que 1 cm no mapa é equivalente a 50 cm na área real.
Se quisermos indicar que cada centímetro de um mapa representa 1 metro na área real, utilizamos a escala 1:100 ou
ainda 1/100. Repare que convertemos 1 metro para centímetros (100 centímetros), pois ambas as medidas precisam estar
na mesma unidade.
A indicação da escala geralmente consta no mapa ou desenho apresentado. Por exemplo:

A escala também pode ser representada da forma gráfica, que é feita unidade por unidade, onde cada segmento mostra
a relação entre a longitude da representação e da área real. Por exemplo, observe a seguinte escala gráfica.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Essa representação está indicando que cada segmento da escala gráfica apresentada equivale a 400 quilômetros de
área real.
Quanto ao tamanho da representação, podemos usar a seguinte classificação:
Escala natural: representada numericamente como 1:1 ou 1/1. Ocorre quando o tamanho físico do objeto representado
no plano coincide com a realidade. 
Escala reduzida: quando o tamanho real é maior do que a área representada. Costuma ser usada em mapas de territó-
rios ou plantas de habitações. Exemplos: 1:2, 1:5, 1:10, 1:20, 1:50, 1:100, 1:500, 1:1000, 1:5000, 1:20000. 
Escala ampliada: quando o tamanho gráfico é maior do que o real. É usada para mostrar detalhes mínimos de determi-
nada área, principalmente de espaços de tamanhos reduzidos. Exemplos: 50:1, 100:1, 400:1, 1000:1.

Curvas de nível
As curvas de nível são linhas que unem pontos ou cotas de mesma altitude em intervalos iguais. Traçadas na carta, per-
mitem a visualização da declividade (inclinação) do relevo.
Esse conceito apareceu na Holanda, no século XVIII, sendo usado para cartografar o fundo do rio Merwede, sendo um
sistema matemático baseado em levantamentos geodésicos, no qual o marco zero metro é o mar.
Todas as curvas de nível em um mapa guardam entre si a mesma distância. Como a equidistância é constante, as curvas
se acham mais próximas em zonas de terreno mais abrupto e mais distantes em terrenos mais suaves. Além das curvas de
nível, é comum representarmos o relevo por cores hipsométricas.

Características das curvas de nível


A equidistância entre as curvas pode ser, de acordo com o caso, de 10, 20, 50 ou 100m.
As curvas mostram tanto a altitude como o formato do relevo.
Quando o relevo é muito abrupto, as curvas aparecem no mapa muito próximas umas das outras; quando o relevo é
suave, aparecem mais distanciadas.
Os rios nascem nas áreas mais altas e correm para as áreas mais baixas.

Fonte:
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv44152_cap2.pdf
“Mapas - Cartografia” em Só Geografia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2007-2018. Consultado em 11/12/2018 às
01:35. Disponível na Internet em http://www.sogeografia.com.br/Conteudos/GeografiaFisica/Cartografia/content2.php

32
GEOGRAFIA DO ACRE

- Interdependência econômica e social entre o campo e


5. MODOS DE VIDA NO CAMPO E NA a cidade, o rural e o urbano.
CIDADE. Desse contexto, entende-se que a caracterização da ci-
dade-campo, do urbano-rural, na atualidade é um proces-
so complexo. As mudanças recentes verificadas nas formas
de organização da sociedade assinalam transformações
Se na antiguidade os limites campo-cidade podiam que se engendram de forma não homogênea e linear no
ser considerados nítidos, na atualidade tal afirmativa não tempo-espaço, com estruturação e reestruturação de flu-
é mais verdadeira. Isso decorre, sobretudo, por uma série xos, relações e contradições em diferentes níveis de inten-
de transformações socioespaciais que ocorreram principal- sidades entre a cidade e o campo. Assim, talvez não seja
mente após a Revolução Industrial. mais possível uma distinção específica entre esses espaços,
Tem sido postulado que tais transformações acentua- sobretudo se tomado o aspecto das suas relações, ou “ain-
ram, em dado momento, a possibilidade de diferenciação da se essas distinções e oposições possam [...] ser reconhe-
entre o campo e a cidade, especialmente em razão dos cidas, elas não são suficientes para a análise da ‘questão
avanços técnicos provocados, que significaram a amplia- cidade-campo’ em termos mais completos”.
ção da centralização econômica e social da cidade, tornando Em decorrência, como entender então o que é urbano e
seu modo de vida e organização singulares em relação ao res- o que é rural na atualidade?  A resposta a esse questiona-
tante do espaço. Na verdade, entretanto, o advento da Revolu- mento passa necessariamente pelo esforço de sistematiza-
ção Industrial, devido a ampliação e intensificação de relações ção dos critérios ou atributos utilizados para tal definição/
entre o urbano e o rural, “introduziu uma confusão total”. caracterização e, mais do que isso, pela necessidade de
A distinção urbano e rural torna-se menos acentuada, compreensão das relações, contradições e complementa-
menos clara, a ponto de podê-la confundir, pois a intensi- riedades existentes entre o urbano e o rural.
ficação das atividades e relações capitalistas de produção e,
consequentemente, a maior interação, por meio de articula- Principais critérios e atributos utilizados para a defi-
ções e fluxos cada vez mais frequentes, faz com que a indús- nição do urbano e do rural
tria mantenha presença marcante no campo e o trabalhador Determinados critérios são usualmente empregados
rural na cidade (o trabalhador boia-fria é um exemplo). para a caracterização do urbano e, por oposição ou com-
Mais recentemente, com o aprofundamento das mu- plementação, do rural. Assim, muitos deles sempre estive-
danças decorrentes do processo de industrialização e da ram atrelados e permanecendo como marcas das cidades
constituição do meio técnico-científico-informacional , que desde a antiguidade. Outros são construções recentes na
propiciou uma reconfiguração e complexização no modo tentativa de desobscurecer a questão cidade-campo. Nes-
de organização socioespacial da sociedade, promovendo se sentido, sistematiza-se na sequência alguns critérios se-
alterações na composição das densidades espaciais, na di- lecionados.
nâmica de interligações e nas significações funcionais da Em uma abordagem normativa, o critério limites oficiais
cidade e do campo, o debate a respeito da questão da in- ou político-administrativos  revela o urbano e rural como
terpretação sobre o que é cidade e campo e sobre o que é adjetivos territoriais. Trata-se de adjetivar, por meio de le-
urbano e rural adquiriu importância no debate acadêmico, gislação, porções territoriais, criando uma dicotomia urba-
instigando muitos pesquisadores a aprofundarem o tema. no-rural similar àquela definida por muralhas na antigui-
Endlich  e Rosa & Ferreira indicam que esse debate foi dade. Esse critério expressa no plano territorial os limites
revigorado pela observância de alguns fatos novos que entre a cidade e campo, delineando unidades-espaciais ur-
marcam a reorganização da sociedade, tais como: banas e rurais. Esse critério se traduz pela expressão “cida-
- Atividades não tradicionais que passaram a desenvol- de≠campo (cidade diferente do campo)”.
ver-se no campo, denotando uma “resignificação” do rural: As limitações da utilização desse critério, no caso brasi-
desde a utilização de  novos produtos agropecuários, de- leiro, são bastante conhecidas e, consequentemente, esse
correntes do processo de industrialização da agricultura, critério é alvo de inúmeros questionamentos. Primeira-
especialmente após a “Revolução Verde”, e a questão do mente, porque o estabelecimento dos limites urbano-rural
assalariamento dos trabalhadores do campo; até  ativida- é realizado por meio administrativo e arbitrário, ou seja,
des caracterizadas por não serem tipicamente agropecuá- pela definição do perímetro da cidade realizado por lei mu-
rias, como aquelas vinculadas à prestação de serviços, ati- nicipal, sem considerar outros atributos.  Nesse sentido, o
vidades de entretenimento ou mesmo moradia; rural é entendido como o algo remanescente para além da
- Falta de critérios mais precisos para a definição do que área do perímetro urbano.
é cidade e por oposição o que é campo, que acaba revelan- De modo a melhor representar espacialmente esse cri-
do um processo de urbanização questionado. tério, apresenta-se abaixo a divisão política administrativa
- Processo de desmetropolização, através de uma rees- da região do Vale do Rio Pardo, localizada no centro do Es-
truturação produtiva apoiada na desconcentração espacial tado do Rio Grande do Sul, no Sul do Brasil. (figura 1) Nela
das atividades econômicas, sobretudo, com empresas bus- se destaca a delimitação dos territórios municipais com
cando novos mercados, proximidade das áreas produtoras suas respectivas áreas distritais e áreas urbanas. Estas cor-
de matérias primas e até mesmo incentivos fiscais; respondendo ao perímetro urbano das sedes municipais.

33
GEOGRAFIA DO ACRE

A partir desse critério têm-se a diferenciação da forma de extração da renda da terra, se urbana ou rural, e consequen-
temente tributação, se urbana (Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU) ou rural (Imposto sobre Propriedade Territorial
Rural – ITR). Por meio desse critério é possível também tecer algumas considerações acerca do aumento dos índices de
urbanização, já que os habitantes dessas unidades-espaciais são contabilizados nos censos demográficos como população
urbana ou rural.
Por meio dessa forma de quantificação, o Brasil apresenta sucessivos aumentos nas taxas de urbanização, alcançando
em 2011, 84,36% da população. Essa informação indica a existência de um processo constante de deslocamento da popu-
lação que vive em áreas não qualificadas como perímetro urbano para o interior das áreas assim qualificadas. Consequen-
temente, esse processo também contribui para os crescentes problemas urbanos, como o crescimento desordenado das
cidades, a “favelização” e a criação de áreas de transição, dentro de perímetros urbanos, mas sem equipamentos urbanos
essenciais. 

Figura 1. Exemplo da delimitação do urbano e rural, segundo limites oficiais ou político-administrativos.


Fonte: OBSERVADR, 2011

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GEOGRAFIA DO ACRE

Outro critério usualmente utilizado é a definição de um patamar demográfico. Nesse critério utiliza-se o número absolu-
to da população e define-se o urbano pela aglomeração de pessoas e o rural pela dispersão (figura 2). O patamar demográ-
fico é estipulado de forma arbitrária e, por isso, sujeito a contestações, principalmente pela simplificação da interpretação
do urbano ao tamanho de sua população.

Figura 2. Exemplo de delimitação do urbano e do rural, segundo o critério do patamar demográfico.Fonte: Girardi,
2008

A densidade demográfica, outro critério empregado para a definição do urbano e rural, utiliza a proporção do número
de habitantes em relação a uma determinada área, ao invés do número absoluto da população. Nesse caso, o urbano é
identificado pela maior densidade demográfica, enquanto o rural pela menor densidade demográfica (figura 3).

Figura 3. Exemplo de delimitação do urbano e do rural, segundo o critério da densidade demográfica.Fonte: Girardi,
2008

35
GEOGRAFIA DO ACRE

Paralelamente a esse critério, Sposito indica a concentração demográfica como um atributo das cidades, não somente
ao que se refere ao adensamento de pessoas, “mas de obras, objetos, de infraestruturas, de equipamentos, de edificações,
de acontecimentos, de ideias, de valores, de possibilidades, etc”. Assim, a cidade é considerada a partir de suas característi-
cas em comparação com o campo, podendo-se designar “cidade versus o campo”, numa perspectiva que demonstra que a
“cidade é o que o campo não é”. Porém, como salientam Bernardelli e a própria Sposito, a determinação de níveis de den-
sidade habitacional deve ser ponto de partida das análises e nunca ponto de chegada, pois a urbanização é um processo
complexo e não deve ser simplificado ao aspecto populacional.
A ocupação econômica da população é outro critério. Nessa perspectiva, o urbano está associado às atividades secundárias
e terciárias, enquanto o rural vincula-se essencialmente às atividades primárias.  Assim, o “caráter urbano amplia-se quanto
maior o nível e a quantidade de atividades não agrícolas presentes”, sendo essencial a presença de atividades do setor terciário.
Nesse contexto, a definição do urbano, e, por contraposição, do rural, estariam vinculadas ao estabelecimento de uma propor-
ção maior ou menor de habitantes ocupados economicamente com atividades secundárias e/ou de serviços (figura 4).

Figura 4. Exemplo de delimitação do urbano e do rural, segundo o critério da ocupação econômica da população.
Fonte: Girardi (2008)

A crítica a este critério refere-se a sua não suficiência para caracterizar e explicar o urbano e rural, sobretudo, no modo
de organização da sociedade atual, onde se verificam atividades não primárias sendo desenvolvidas no campo e, em alguns
casos, atividades primárias sendo desenvolvidas em áreas entendidas como cidade. Além disso, tal exemplificação pode
incorrer em críticas, por não considerar de uma forma mais completa a grande diversidade das formas e conteúdos tidos
no processo de organização socioespacial e econômico das regiões brasileiras.
De uma maneira geral, os critérios e atributos apresentados parecem não satisfazer a compreensão da atual realidade
urbana-rural. Nesses referenciais os conceitos de urbano e de cidade estão mesclados e confundem-se. Assim, a com-
preensão da essência da questão cidade-campo, e urbano-rural, requer a consideração de outras dimensões e abordagens
que extrapolam definições fundamentadas em estatísticas e em normatizações arbitrárias e, sobretudo, que possibilitem a
compreensão das novas formas de manifestação das práticas socioespaciais do mundo contemporâneo. 
Para além dos critérios e atributos: as relações e contradições entre o urbano e o rural
A consideração e a definição do urbano e do rural a partir dos critérios anteriormente mencionados, de “forma des-
contextualizada, sem analisar a historicidade presente nos fatos e processos, parece estático demais”. Essa afirmação está
relacionada com a necessidade de se entender a dinâmica da sociedade em sua totalidade, na qual a simples distinção e
oposição  urbano-rural não são suficientes.

36
GEOGRAFIA DO ACRE

Nesse sentido, se as perspectivas mencionadas ante- Assim, “embora possa ser mantida a preocupação com
riormente trazem, de forma generalizada, o entendimento a definição de cidade, o urbano a extrapola. O urbano irra-
da existência de uma oposição entre urbano e rural, a abor- dia-se a partir da cidade e atinge territorialmente os limites
dagem da “diferenciação social”, possibilita, enquanto pro- das influências dela”.
cedimento analítico, considerar os processos de “relação Não obstante, e com o entendimento de que o urba-
entre cidade e campo”. E dessa forma, revelar os sentidos e no e rural se referem a diferentes modos de vida, Endlich,
papéis desses espaços e consequentemente a “unicidade e ao analisar a perspectiva da sociedade urbana de Lefebvre,
complementaridade compreendida por esse par dialético”. indica que, com o avanço do capitalismo, os negócios dos
Assim, para além dos critérios e atributos para a defi- capitalistas tornam-se urbanos e cria-se um modo de vi-
nição do urbano e do rural, é importante a compreensão ver de base urbana, que se irradia pelos campos, por meio
dos movimentos e forças que os articulam e os produzem, da entrada de sistemas de objetos (eletricidade, objetos e
o que “exige não apenas a apreensão dos fatos, mas uma estruturas tecnológicas...) e de valores (hábitos, padrão de
teoria, no âmbito da qual os conceitos de urbano e rural consumo, modismos...).
constituem-se em ferramentas fundamentais para se com- Para Lefebvre, a relação cidade-campo torna a cidade
preender cidade e campo”. um centro de decisão e aparentemente de associação e,
Nesse contexto, pode-se citar a teoria dos lugares centrais desse modo, “a cidade em expansão ataca o campo, corrói-
de Christaller, que embora tenha promovido muitas polêmicas -o, dissolve-o”. Simultaneamente, a condição de vida urba-
e tentativas de verificação e refutação, indica uma forma de na penetra na condição de vida do campo, transformando
analisar as cidades e seu espaço de relação. Essa teoria pode características e elementos tidos como tradicionais, num
ser considerada uma abordagem metodológica e conceitual, e processo marcado, às vezes, por resistências.
estabelece à cidade o papel de lugar central, “um núcleo sus- Esta nova condição de vida urbana, se compreendida
ceptível de unificar, de dominar, de organizar a periferia”. em uma forma mais ampla, pode gerar uma nova configu-
Explicitando essa afirmativa, Beaujeu-Garnier indica que ração de sociedade, a sociedade urbana de Lefebvre. Pois
a cidade, enquanto “concentração de homens, de necessi- para esse autor, as comunidades rurais são compreendidas
dades, de possibilidades de toda a espécie [...], com uma por possuírem uma condição de vida que vem sendo su-
capacidade de organização e transmissão, é ao mesmo perada material e culturalmente, e, portanto, a urbanização
tempo sujeito e objeto”. É objeto por se constituir mate- tenderia a apagar a distinção cidade-campo, por meio de
rialmente [“o quadro urbano”], e é sujeito por “exercer in- “uma fusão da sociedade urbana com o campo”.
fluência nos seus habitantes”, mantendo ligações comple- De maneira geral, essas possibilidades de abordagens
xas com espaços que ultrapassam o seu quadro urbano. teóricas trazem perspectivas urbanas, por meio das quais,
Assim, o papel da cidade engloba a “noção de difusão se pode buscar a compreensão das transformações histó-
de um bem ou de um rendimento e a do limiar da sua po- rico-espaciais da sociedade. Reiterando algumas conside-
pulação”, indicando a tendência do urbano se alargar para rações, pode-se ressaltar que a quantificação e também a
além dos seus limites e consequentemente permitindo a qualificação do urbano e do rural não se resume à estipu-
separação dos conceitos de cidade e urbano, mesmo am- lação de critérios ou da simples ponderação de atributos.
bos possuindo conexões profundas. Essas abordagens teóricas indicam a apreensão de que
Mesmo considerando que a cidade é marcada pelo pode-se conceber cidade-campo e urbano-rural como ca-
predomínio de relações secundárias e de negociações e o tegorias diferenciadas (figura 5). As primeiras, campo e ci-
campo pelas relações primárias, Wirth afirma que os mo- dade, entendidas enquanto materialidade, meio, condição
dos de vida produzidos nesses espaços se interpenetram.  e produto da sociedade, espaços construídos/modificados
Para esse autor, o urbano e rural não devem ser interpre- que manifestam em seus conteúdos os processos contra-
tados como opostos ou como espaços e modos de vida ditórios de desenvolvimento histórico da sociedade. E as
separados e sem contato. O modo de vida produzido na segundas, o urbano e o rural, compreendidas enquanto
cidade, o urbano, é influenciado, em certa medida, pelo relações sociais, ou seja, formas abstratas, também condi-
modo de vida produzido no campo, o rural, e do mesmo ção e produto do desenvolvimento histórico da sociedade,
modo, o “urbanismo” é espraiado para além das fronteiras mas que extrapolam os limites morfológicos da cidade e,
da cidade, denotando a ideia de cultura urbana. Nas pala- no sentido inverso, os limites do campo.
vras do autor: “o urbanismo não está confinado a tais lo-
calidades, mas manifesta-se em graus variáveis onde quer
que cheguem as influências das cidades”.
Nessa concepção, a cidade apresenta-se como espaço
da diversidade de objetos e ações, e o urbano é entendido
como o modo de vida de quem vive na cidade, mas que ex-
trapola os limites físicos desta. Ao ponto do rural, em virtu-
de da influência do modo de vida urbano, ser considerado
como praticamente superado. Nesse contexto, as cidades
se acentuam como “elementos dominantes na nossa civi-
lização e [estendem] enormemente o modo de vida para
além dos [seus] limites”, no campo.

37
GEOGRAFIA DO ACRE

Figura 5. Categorias analíticas: campo-cidade e urbano-rural


Fonte: Elaboração dos autores

Essas formas abstratas, surgidas e derivadas da cidade ou do campo, mantêm constante embate entre si no tempo-es-
paço e acabam modificando pouco a pouco a configuração e o padrão de organização da sociedade, revelando, por exem-
plo, alterações nos “modos de vida” e, inclusive, possibilitando a constituição de uma nova condição de vida da sociedade,
na perspectiva da sociedade urbana de Lefebvre.
Nesse contexto, essas formas abstratas representam o não aparente da cidade e do campo, sendo que para empreendê-
-las é indispensável compreendê-las a partir de sua essência. E a essência é manifestada mediante sua interação com outros
objetos, fatos e processos que os cercam e influenciam, introduzindo modificações em seu conteúdo.
Assim, a compreensão da essência da cidade e do campo, suas relações, analogias e contradições, passa pela consi-
deração da intrínseca relação sociedade-natureza, onde através de um processo dialético, materializado pelo trabalho,
pelas relações sociais, pelos “sistemas técnicos e sistemas de ações”, a sociedade se organiza espacialmente e reproduz
seu espaço, num processo indissociável com a natureza. Acredita-se, portanto, que a compreensão do urbano e do rural,
enquanto relações derivadas da cidade e do campo, requer a consideração da dialética, onde a organização da sociedade
no tempo-espaço se desenvolve através de movimentos, de mudanças, de processo de transformações, considerando o
desenvolvimento das forças produtivas e a estruturação econômica e social.   
É a partir do olhar histórico e dialético sobre a cidade, o campo e suas relações que se percebe que nenhuma das suas
configurações são definitivas. Tudo tem uma forma anterior e uma forma posterior. Tudo está em movimento. Houve e
há processos de mudança, de transformação, onde novos elementos, novas funções, novas ruralidades e novas urbanida-
des são verificados. Há um encadeamento de processos, nos quais as influências das partes são totalizantes, tudo exerce
influência em tudo. Por isso, nada está acabado, não há uma configuração final, mas há uma sequência de processos que
acabam por configurar esses espaços e suas relações diferentemente a cada novo olhar, num contexto de desenvolvimento
histórico. Contudo, estas configurações não são tão simples quanto aparentam. Para compreendê-las torna-se necessário
entender como este processo se realiza, ou seja, o processo dialético de sua constante transformação.
Dessa forma, o espaço geográfico não só se transforma e se configura em campo ou cidade, mas mantém traços que
não são simplesmente puros de um ou de outro. Assim, no interior das relações urbanas ou rurais existem forças que se
embatem, pois mantém características de polos opostos. Estas forças tendem para a afirmação e para a negação de carac-
terísticas urbanas e rurais.
Logo, o entendimento e a compreensão do urbano e do rural passam pela lógica da afirmação, negação e negação da
negação. As relações tipicamente urbanas ou rurais apresentam contradições, enquanto um agrupamento de relações é
negado por não possuir característica que o outro possui, o outro agrupamento de relações que possui tal característica
é valorizado, portanto afirmado. Exemplo: o campo é afirmado por ter a capacidade de gerar alimentos para serem co-
mercializados e consumidos na cidade ou por proporcionar usos dificilmente possíveis de serem realizados nas cidades;
entretanto, é negado por carecer de serviços urbanos, típicos da cidade. Assim, um espaço é afirmado pelo que possui, mas
é negado pelo que não possui, num processo contraditório de presença e ausência. A afirmação de um espaço se dá pela
negação do outro espaço. Nota-se, nenhum deixa de existir por isso, pelo contrário.
Portanto, as diferenças entre esses espaços se apresentam de forma a complementá-los, mas não os tornando homo-
gêneos. Do ponto de vista da dialética, a cidade, por exemplo, é ao mesmo tempo o urbano e é o seu contrário, o rural. A
cidade não existe sem o rural e o campo não existe sem o urbano. Embora, haja oposição e diferenças entre a cidade e o

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GEOGRAFIA DO ACRE

campo, ambos só existem a partir de seu contrário. Isso equivale a dizer que uma afirmação não é absoluta, pois a afirma-
ção contém uma parte da negação, exemplo: o campo, produtor de alimentos para comercializar na cidade, contém em si
a necessidade dos serviços e características urbanas para existir, é a afirmação que contém parte da negação. Logo, por a
cidade e o campo e suas relações, o urbano e o rural, conterem afirmações e negações conflitantes, eles se transformam,
se modificam num terceiro termo que é a negação da negação, a síntese.
O movimento de afirmação-negação ajuda na compreensão das modificações que ocorrem nesses espaços, nas suas
relações e na permanência das suas características próprias. Há, pois, movimentos de territorialização de atividades urbanas
sobre o campo e consequentemente de desterritorialização de atividades rurais, mas há, também, a transformação do rural
e do urbano num sentido que, enquanto síntese dessas contradições, geram uma nova realidade.
Assim, coexistem no território um conjunto de relações que originam a emissão, mediação e receptação de fluxos mate-
riais e imateriais, tornando a oposição cidade-campo não absoluta, mas sim, relativizada e ganhadora de um sentido cada
vez maior de complementaridade.
Avançando nesse ponto, em que pese a oposição ainda remanescente entre a cidade e o campo, e entre suas relações,
verifica-se que a dificuldade da distinção, no plano das formas espaciais, da cidade e do campo, alargada pela ampliação
das áreas de transição entre as morfologias de relações urbana e rural, requer a consideração de uma nova forma de se
pensar a questão e, sobretudo, a forma espacial de análise.
Nesse aspecto, diversos autores propõem a consideração de uma superposição de formas espaciais caracterizadas por as-
pectos urbanos e rurais, formando um continuum espacial. Esse conceito, que não é recente, foi elaborado por Robert Redfiel
em meados de 1930 para explicar as variações e continuidades entre os aspectos culturais de populações urbanas e rurais.
A consideração dessa superposição “não pressupõe o desaparecimento da cidade e do campo como unidades espaciais
distintas, mas a constituição de áreas de transição e contato entre esses espaços que se caracterizam pelo compartilhamen-
to, no mesmo território, ou em micro parcelas territoriais justapostas e sobrepostas, de usos do solo, de práticas socioes-
paciais e de interesses políticos e econômicos associados ao mundo rural e ao urbano”.
Assim, essa proposição consegue conter contraditoriamente o urbano e o rural “superpostos, amalgamados e intrin-
secamente relacionados”. Essa superposição, além de superar a oposição entre o campo e a cidade, engloba todo o ritmo
de mudanças recentes que marcam a organização da sociedade, resultados da lógica da produção territorial da cidade no
modo de produção capitalista.
A noção do continuum implica considerar a existência de uma graduação entre o urbano e o rural, de modo que pode-
-se identificar diferentes níveis escalares de relações urbanas ou rurais, os quais seriam níveis de transição entre os extre-
mos urbano e rural (figura 6).

Figura 6. Níveis escalares do urbano-rural


Fonte: Elaboração dos autores

É nesse aspecto que o continuum se diferencia das perspectivas que buscam definir territórios como sendo unicamente
urbanos ou rurais, num sentido arbitrário de delimitação do que é urbano e do que é rural, como exposto anteriormente.
A perspectiva do continuum, entretanto, quando analisada com maior acuidade, permite a verificação da existência de
duas vertentes, as quais os autores, inclusive aqueles trazidos nesse texto, se filiam. A primeira vertente está inserida no
paradigma que procura compreender a passagem das sociedades tradicionais, pré-capitalistas, essencialmente rurais, para

39
GEOGRAFIA DO ACRE

uma sociedade moderna, capitalista, essencialmente urba- Uma das principais diferenças entre urbano e rural
na. Indica, desse modo, que o campo perderia sua identi- está, assim, nas práticas socioeconômicas. O espaço rural,
dade enquanto espaço de relações rurais, ou seja, a cidade, como já dissemos, engloba predominantemente atividades
enquanto fonte de valores dominantes estabeleceria seu vinculadas ao setor primário (extrativismo, agricultura e
domínio sobre todo o conjunto urbano-rural da sociedade. pecuária), ao passo que o espaço urbano costuma reunir
Já a segunda vertente está inserida no contexto em que, atividades vinculadas ao setor secundário (indústria e pro-
mesmo com a aproximação entre o rural e o urbano, não dução de energia) e terciário (comércio e serviços).
desaparecem suas particularidades. Nessa vertente ressal- Outra diferença entre urbano e rural está na amplitude
tam-se as semelhanças e diferenças entre o extremo urba- dos respectivos conceitos. Em termos de escala, a abran-
no e o extremo rural, demonstrando a continuidade de re- gência espacial do meio rural é muito maior, pois ele reúne
lações existentes entre o campo e a cidade, representando tantos as áreas transformadas e cultivadas (espaço agrário)
a reafirmação da existência das relações rurais. Assim, áreas pelo homem quanto o espaço natural, pouco transformado
com características próprias permaneceriam existindo, mas ou mantido totalmente sem intervenções antrópicas. Por
com grau de inserção à dinâmica social e econômica re- outro lado, a cidade, embora possua uma maior dinâmica
gional e global diferenciada. Para esta vertente, o processo econômica, apresenta-se em espaços mais circunscritos,
de desenvolvimento histórico gera maior interação entre mesmo com o crescimento desordenado dos espaços ur-
o urbano e o rural, porém não havendo homogeneização. banos na maioria dos países periféricos e emergentes.
De modo geral, o continuum, enquanto unidade espa- Em termos de hierarquia econômica, podemos dizer
cial, pode contribuir para o entendimento da dinâmica de que, originalmente, o campo exercia um papel preponde-
espaços em constante transformação. Ou seja, acredita-se rante sobre as cidades. Afinal, foi o desenvolvimento da
que a noção de continuum pode ser pensada para se en- agricultura e da pecuária que permitiu a formação das pri-
tender que tanto o urbano quanto o rural são partes da meiras civilizações e o seu posterior desenvolvimento. No
mesma sociedade, fazem parte da “totalidade”.  entanto, com o avanço da Revolução Industrial e as trans-
formações técnicas por ela produzidas, o meio rural viu-
Fonte:
-se cada vez mais subordinado ao urbano, uma vez que as
http://www.ub.edu/geocrit/b3w-1090.htm
práticas agropecuárias e extrativistas passaram a depender
cada vez mais das técnicas, tecnologias e conhecimentos
produzidos nas cidades.
6. PAPEL DA TECNOLOGIA NA
CONFIGURAÇÃO DE PAISAGENS URBANAS E Atualmente, o urbano e o rural formam uma relação
RURAIS E NA ESTRUTURAÇÃO DA VIDA EM socioeconômica e até cultural bastante ampla, muitas ve-
SOCIEDADE. zes se apresentando de forma não coesa e profundamente
marcada pelo avanço das técnicas e pelas transformações
produzidas a partir dessa conjuntura. Nessa relação, o es-
paço geográfico estrutura-se em toda a sua complexidade
Os espaços urbano e rural inserem-se como diferentes e transforma-se em reflexo e condicionante das relações
expressões materializadas no espaço geográfico, com- sociais e naturais, denunciando as marcas deixadas pelas
preendidas por suas distintas dinâmicas econômicas, cul- práticas humanas no meio em que se estabelecem.
turais, técnicas e estruturais. Embora componham meios O espaço rural é constituído pelas áreas não urbanas.
considerados distintos, suas inter-relações são bastante São espaços não ocupados por cidades ou adensamentos
complexas. Por isso, muitas vezes é difícil separar ou com- populacionais. A maior parte das atividades produtivas tí-
preender a especificidade de cada um desses conceitos. picas desse espaço está relacionada com a agricultura, pe-
O conceito de espaço urbano designa a área de elevado cuária e extrativismo.
adensamento populacional com formação de habitações Para compreender melhor a amplitude conceitual que
justapostas entre si, o que chamamos de cidade. Já o con- envolve o espaço rural, é preciso distinguir as expressões
ceito de espaço rural refere-se ao conjunto de atividades rural e agrário. Nem sempre as atividades realizadas no
primárias praticadas em áreas não ocupadas por cidades meio rural são agrárias. É cada vez mais comum a utiliza-
ou grandes adensamentos populacionais. ção do espaço rural para atividades turísticas, esportivas,
No entanto, para além dessa definição simples e intro- áreas de preservação ambiental, spas, clínicas, centros de
dutória, é interessante perceber que rural e urbano são, pesquisa, entre outros, que não estão vinculadas a ativida-
além de tudo, tipos diferentes de práticas cotidianas. As- des agrárias.
sim, podem existir práticas rurais no espaço das cidades
ou práticas urbanas no espaço do campo. Por exemplo: um Relação entre o espaço urbano e o rural
cultivo de hortaliças dentro do espaço de uma cidade (em- A distinção entre rural e urbano nas atividades econô-
bora isso seja cada vez mais raro nos grandes centros urba- micas realizadas na cidade e no campo e nas diferentes
nos) é um caso de prática rural no meio urbano. Da mesma práticas cotidianas tem sido reduzida. Cada vez mais há
forma, a existência de um hotel fazenda ou um resort em uma integração das práticas e elementos tidos como tipi-
uma zona afastada da cidade é um exemplo de prática ur- camente rurais no espaço das cidades ou práticas urbanas
bana no meio rural. no espaço do campo.

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GEOGRAFIA DO ACRE

O cultivo de hortaliças no ambiente urbano, por exem- vimento Sustentável - ODS, em especial o ODS 11 , que
plo, tem sido incentivado em vários lugares do mundo, da propõe tornar as cidades e os assentamentos humanos
mesma maneira que uma clínica de estética ou relaxamen- inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis. O envolvi-
to é encontrada em regiões afastadas dos centros urbanos. mento da comunidade internacional na implementação de
São atividades típicas do meio rural e urbano realocadas um objetivo com metas e indicadores dedicados à temática
nas cidades e no campo. urbana e aos assentamentos humanos demonstra o grande
Além disso, a concepção de que o espaço rural é um impacto da urbanização nos territórios nacionais.
ambiente de atraso no desenvolvimento também tem so- A urbanização é reconhecida como um fenômeno trans-
frido modificações. Altos níveis de mecanização, utilização formador e um dos principais vetores de transformação do
de tecnologia e especialização da mão de obra têm sido Século XX. Kayser (1972) aponta que a expansão do regime
vistos em muitas propriedades rurais. capitalista no último século transformou profundamente o
O espaço rural tem sido transformado pelo trabalho hu- sistema de relações cidade-campo de forma mais profun-
mano e pelas técnicas utilizadas da que a longa evolução dos séculos anteriores. Já Santos
(2007, p. 23) ressalta que “a urbanização é simultaneamen-
Modernização do meio rural te um resultado e uma condição do processo de difusão do
A modernização que gradativamente alcança o espaço capital”. Sposito (2010), por sua vez, destaca que em uma
rural é resultado da intensificação de capital empregado na retrospectiva é possível apontar a intensidade da urbani-
produção rural sob a forma de máquinas, defensivos quí- zação como uma das principais marcas do século passado.
micos, engenharia genética, serviços meteorológicos, além Se por um lado as populações, as atividades econômi-
de avançadas técnicas de irrigação, manejo de animais, cas, as interações sociais e culturais, bem como os impac-
preparação do solo e assessoria tecnológica e financeira. tos ambientais e sociais estão cada vez mais concentrados
Dessas transformações surge a categoria de empresas ru- nas cidades, por outro, novos elementos tem sido ressal-
rais, que em quase nada se assemelham às práticas que re- tados trazendo novas perspectivas para o rural. Diversos
montam ao surgimento das primeiras atividades agrícolas. autores (ABRAMOVAY, 2003; VEIGA, 2003; ENDLICH, 2010;
As utilizações de tecnologias, como as da Engenharia ROSA; FERREIRA, 2010) alertam para um novo conjunto de
Genética, têm contribuído para a configuração de um novo atividades, além das primárias, que vem sendo desenvol-
espaço rural vido no campo, além de outros, como Abramovay (2003),
As modificações ocorridas no meio rural não trazem que também tem destacado a recente valorização das re-
apenas benefícios. É crescente a preocupação sobre os im- giões interioranas devido a diversos fatores como a bio-
pactos dessas atividades na saúde e bem-estar das pes-
diversidade, o patrimônio paisagístico e o estilo de vida.
soas, bem como os danos causados ao meio ambiente.
Concomitantemente, a urbanização acelerada transformou
e continua transformando o parcelas do campo por meio
Novas questões do espaço rural
da inserção de novas técnicas e pela de demanda crescente
A modernização das atividades agrícolas trouxe no-
de alimentos e de recursos naturais.
vas questões que são objeto de análise e preocupação. A
No Brasil, o Decreto Lei n. 311, de 02.03.1938 associa
transformação ocorrida no espaço rural trouxe consequên-
cias como: a delimitação de zonas rurais e urbanas aos municípios.
- a elevação dos níveis de endividamento dos agricul- Contudo, muitas vezes as transformações econômicas e
tores; sociais alteram profundamente a configuração espacial dos
- a diminuição da biodiversidade; municípios sem que a legislação consiga acompanhar em
- o êxodo rural provocado pela redução da mão de obra tempo hábil as novas estruturas territoriais e o processo
no campo; de distribuição espacial das populações e das atividades
- poluição do solo causada pelo uso de fertilizantes. econômicas.
É verdade também que os limites oficiais entre zona
Além das consequências citadas, a modernização do urbana e zona rural, são em grande parte instrumentos
campo não solucionou o problema da fome mundial, pois definidos segundo objetivos fiscais que enquadram os do-
grande parte da produção agrícola modernizada é destina- micílios sem considerar necessariamente as características
da a abastecer os países ricos industrializados. territoriais e sociais do município e de seu entorno. Aten-
dem, portanto, aos objetivos das prefeituras, mas dificul-
Recentemente, na Terceira Conferência das Nações Uni- tam políticas públicas e investimentos preocupados com as
das sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentá- outras facetas e escalas da classificação rural-urbano.
vel - Habitat III, realizada em 2016, 167 países adotaram a Os dilemas do planejamento envolvem uma grande
Nova Agenda Urbana (NAU) que objetiva orientar a política preocupação com o tema. No Brasil, ela se manifesta tam-
para a urbanização pelos próximos 20 anos. A Nova Agen- bém nas escalas estadual e municipal com a necessidade
da Urbana aponta que, até 2050, a população urbana do de informações que subsidiem o planejamento e a gestão,
mundo irá praticamente dobrar, tornando a urbanização permitindo a coesão territorial, a redução das desigualda-
uma das tendências mais transformadoras do Século XXI. des territoriais, o desenvolvimento rural etc.
Em escala global, além da Nova Agenda Urbana tem Finalmente, o desafio consiste em não apenas perceber
grande destaque na Habitat III, a Agenda 2030 para o De- essas categorias que, hoje, apresentam-se de forma diver-
senvolvimento Sustentável e os Objetivos do Desenvol- sa, mas também em criar instrumentos de planejamento

41
GEOGRAFIA DO ACRE

que consigam manter a coesão dos territórios, respeitando Como tal é problemático falar de lugares como simples-
e desenvolvendo a sua diversidade, em especial, da federa- mente rurais ou urbanos, em vez disso é preciso considerar
ção brasileira e dos países de dimensões continentais. como eles se entrelaçam e se sobrepõem (CASTREE; KIT-
CHIN; ROGERS, 2013, p. 444).
As dimensões tradicionais da classificação rural/urbano A perspectiva do continuum rural-urbano também
Apesar de tradicionalmente estabelecidas como modos apresenta problemas. Rosa e Ferreira (2010) destacam
de qualificar as sociedades e o espaço, as categorias rural que o conceito tende a variar com a área do conhecimen-
e urbano estão sujeitas às transformações que vem sendo to assim como as categorias cidade, campo, rural e urba-
operadas no decorrer do tempo. Com efeito, a realidade no. Apesar disso, as autoras ressaltam que a ideia de um
histórica sobre tais categorias demonstra uma grande di- continuum deve ser considerada, mesmo que de manei-
versidade de estruturas e organizações. ra a repensar esse conceito e sem descartar as formas de
Williams (2011) destaca como o campo pode se refe- produção e consumo, as relações sociais e a configuração
rir tanto às práticas de caçadores, pastores, fazendeiros e espacial dos grupos.
empresários agroindustriais como a sua organização pode Pahl (1966) apontava para os perigos na aceitação ex-
se manifestar em tribo, feudo, campesinato, comuna rural, cessiva de uma falsa continuidade e destacava que ape-
latifúndios e plantations. As cidades também se manifes- sar das continuidades, era preciso considerar a existência
tam de forma bastante heterogênea, apesar de possuírem de descontinuidades acentuadas, como o confronto entre
determinadas características comuns e há, prossegue o au- o local e o nacional. Sposito (2010) aponta que uma das
tor, uma série de assentamentos humanos que desafiam as dimensões dessas descontinuidades é a territorial que se
estruturas tradicionais da cidade e do campo. manifesta, por exemplo, na tendência à extensão territorial
A formalização da distinção entre campo e cidade só se do processo de urbanização durante o Século XX. Essa ca-
fez necessária a partir do Século XIX quando a urbanização, racterística culminou na alteração das morfologias urbanas
até então um processo lento, acelerou-se com a Revolução e tornou menos nítida a distinção, na dimensão espacial,
Industrial (DAVOUDI; STEAD, 2002) . A partir de então as entre cidade e campo, pois aumentou a zona de transição
análises sobre diferenciação rural-urbano tem se baseado
entre os espaços urbanos e os espaços rurais.
em duas grandes linhas a dicotomia e o continuum.
Essas duas matrizes teóricas tem grande importância
A visão dicotômica dedicou-se a estabelecer uma opo-
no desenvolvimento do debate sobre o rural e o urbano,
sição entre dois polos autônomos, bem delimitados e ex-
mas o desafio consiste em como identificar e classificar o
cludentes. Sua origem, segundo Davoudi e Stead (2002),
rural e o urbano. No sentido prático, a definição de limites
remonta às transformações e problemas acarretados com
entre os espaços rurais e urbanos, seja para fins adminis-
o rápido processo de urbanização nos países europeus e
trativo-burocráticos seja para fins estatísticos tem sido feita
ondas migratórias na América do Norte, sendo, portanto,
baseada na seleção de um ou mais elementos.
predominantemente na virada do Século XIX. Os autores
destacam que essa divisão, fruto das transformações so- As técnicas e critérios existentes para operacionalizar e
ciais, levou a duas correntes: uma considerada anti-urbana classificar foram sistematizadas por Endlich (2010). São elas
na qual a vida rural era idealizada e seu desaparecimento a delimitação político-administrativa; o corte populacional;
lamentado e outra, pró-urbana, em que a urbanização era a densidade demográfica; a ocupação econômica da popu-
considerada o motor do progresso, inovação e moderni- lação. Além deles, destacam-se também a morfologia e o
zação. modo de vida (ANGULO; DOMÍNGUEZ apud BERNARDELLI,
Os críticos ao modelo dicotômico apontavam que era 2010).
possível encontrar áreas em uma cidade similares a áreas A delimitação administrativa ou político-administrativa
rurais e áreas na zona rural com características considera- é uma das formas tradicionalmente utilizadas na classifica-
das urbanas. Outra crítica recorrente era que a existência ção territorial aplicada em países como o Reino Unido, a
de dois polos estanques desconsiderava uma série de ocu- Tunísia, a África do Sul e o Brasil que utilizam limites oficiais
pações e assentamentos humanos que não se enquadra- na diferenciação, considerando o rural e o urbano como
vam em nenhuma das duas categorias. adjetivos territoriais (ENDLICH, 2010). No caso do Brasil,
O uso do conceito continuum rural-urbano remonta à por exemplo, apesar da sua importância para os municí-
meados da década de 1930 e se intensificou na década de pios, o critério político-administrativo, em parte das vezes
1960, como uma reação contra as dicotomias polarizadas não corresponde à realidade territorial daquela unidade fe-
(ROSA; FERREIRA, 2010; PAHL, 1966). De acordo com o Di- derativa. Por outro lado, pode dar indicativos da dinâmica
cionário Oxford de geografia humana, o continuum rural- de ocupação ou imobiliária daquele município.
-urbano é A classificação rural-urbano também tem sido feita por
Um conceito que postula que não há uma divisão agu- meio do tamanho populacional ou patamar demográfico.
da entre a vida urbana e rural, mas que os assentamentos Nesse caso o urbano é definido pela concentração popu-
existem ao longo de um contínuo de muito rural para alta- lacional enquanto o rural por sua dispersão. Endlich (2010)
mente urbano. O urbano não para simplesmente e começa aponta que o uso desse critério de forma isolada expressa
o rural, mas eles vazam através um do outro. Além disso, o urbano como mera aglomeração de pessoas, enquanto
é possível encontrar espaços em uma cidade que parecem Bernardelli (2010, p. 34) ressalta que o patamar numérico é
rurais, e lugares em áreas rurais que são bastante urbanos. uma “simplificação problemática da realidade”.

42
GEOGRAFIA DO ACRE

A densidade demográfica, por sua vez, consiste na re- te no papel das novas tecnologias de comunicação e do
lação do número de habitantes por determinada área. As transporte automotivo. Para a autora, a partir do Século XX,
categorias são expressas comumente pelo número de ha- esses elementos têm contribuído na redefinição das mor-
bitantes por quilômetro quadrado e é adotada pela Orga- fologia espaciais e na dificuldade de limitação entre o ru-
nização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ral e o urbano, seja pela extensão dos tecidos urbanos por
- OCDE (Organisation for Economic Co-Operation and De- meio de loteamentos seja pelas Tecnologias de Informação
velopment - OECD). Um dos desafios dessa metodologia é e Comunicação - TIC, pois permitem manter a integração
que a densidade não se apresenta de forma homogênea espacial sem necessariamente manter uma proximidade e
nas zonas urbanas (ENDLICH, 2010), assim como há algu- contiguidade com a mancha urbana central.
ma diferença nas zonas rurais. A diversificação das atividades do campo é outro ele-
A ocupação econômica da população, outra das formas mento que tem sido levantado com mais firmeza na bi-
utilizadas para classificação, define o rural e o urbano pela bliografia mais recente sobre o tema. Segundo os autores
natureza das atividades econômicas. Nessa visão o rural é (ABRAMOVAY, 2003; VEIGA, 2003; ENDLICH, 2010; ROSA;
caracterizado pelas atividades primárias, principalmente FERREIRA, 2010) pode-se observar uma diversificação das
agropecuárias e o urbano pelo percentual significativo de atividades alterando a perspectiva clássica do rural asso-
população ocupada em atividades secundárias e\ou terciá- ciado à ocupações consideradas tradicionais como a agri-
rias (ENDLICH, 2010). A diversificação das atividades nas cultura.
zonas consideradas rurais é um dos desafios apontados Para elaboração de políticas públicas e gestão territorial
pelos críticos dessa visão (ABRAMOVAY, 2003; ENDLICH. as categorias rural e urbano ainda tem grande importância
2010). e a demanda por informações tem se pautado nas parti-
A morfologia é outra forma de análise da questão ru- cularidades desses espaços. Queiroz (1978, p. 309) ressalta
ral-urbano. Por meio da análise das formas expressas pe- que “quer nos períodos mais antigos, quer nos períodos
las edificações, loteamentos, arruamento e uso do solo é contemporâneos, o rural e o urbano mantiveram qualida-
possível apreender padrões morfológicos que podem ser des que lhe são próprias”. Para o meio rural, por exemplo,
utilizados para classificar o território entre ocupações ru- Abramovay (2003, p. 13) destaca os “atributos territoriais
rais e urbanas (ÂNGULO; DOMÍNGUEZ apud BERNARDELLI, que definem, conceitualmente, a ruralidade” .
2010). Bernardelli (2010) destaca, no entanto, que privilegiar
O modo de vida, segundo Ângulo e Domínguez (apud as diferenças e desconsiderar as relações existentes entre
BERNARDELLI, 2010), é outro elemento que, relacionado à os espaços dificulta o estabelecimento de proposições e de
divisão do trabalho e à heterogeneidade social, pode ser políticas adequadas para os espaços urbanos e para os es-
considerado na classificação rural-urbano, bem como as paços rurais. A autora sugere que esses espaços sejam ana-
inter-relações urbanas e a geração de inovações. lisados apreciados por meio de particularidades e de suas
Se são muitas as formas utilizadas para delimitar e clas- dinâmicas, pelos papéis que desempenham, bem como por
sificar o território em urbano e rural, há também críticas à suas complementaridades.
delimitação espacial do urbano e do rural. Pahl (1966, p. A ideia de um continuum rural-urbano parece promis-
322, tradução nossa), por exemplo, afirma que “qualquer sora tendo em vista a dificuldade de distinção entre as
tentativa de ligar padrões particulares de relações sociais morfologias rural e urbana. Contudo, como aponta Spo-
a um meio geográfico específico é um exercício particu- sito (2010, p. 121), admitir esse continuum não pressupõe
larmente infrutífero”. Os critérios, como visto, também re- o desaparecimento da cidade e do campo enquanto “uni-
cebem críticas por não atenderem a uma dimensão mais dades espaciais distintas”, mas o reconhecimento de zonas
completa ou mais próxima da realidade, capturando ape- de transição entre esses espaços “pelo compartilhamento,
nas frações da realidade. no mesmo território ou em micro parcelas territoriais justa-
Ainda assim, o esforço das diversas unidades políticas postas e sobrepostas, de usos do solo, de práticas socioes-
e as diversas iniciativas para a delimitação do rural e do paciais e de interesses políticos e econômicos associados
urbano mostram que essa informação é relevante para o ao mundo rural e ao urbano”.
planejamento e gestão dos territórios. As dificuldades para Os fluxos de bens, pessoas, dinheiro, informações etc.
a classificação extrapolam o caráter parcial dos métodos entre os espaços rurais e os espaços urbanos é outra di-
utilizados e se articulam também com as rápidas transfor- mensão promissora e em voga. As relações urbano-rurais,
mações sociais sucedidas nas últimas décadas. segundo Rosa e Ferreira (2010), permitem observar as con-
Diversos autores vêm apontando os desafios na delimi- tinuidades e as descontinuidades entre o rural e o urbano e
tação do rural e do urbano na contemporaneidade. Sposito repensar o conceito do continuum, buscando compreender
(2010) destaca as descontinuidades territoriais e aponta o rural e o urbano como partes de uma mesma estrutura.
que no último século a expansão territorial do processo São capazes também de ressaltar vantagens comparativas
de urbanização foi muito mais intensa do que nos sécu- e diferenças desses espaços, mas que só podem ser ava-
los anteriores. As morfologias espaciais foram alteradas e liadas quando consideradas a articulação e a contiguidade
as áreas de transição ampliadas o que, segundo a autora, dessas duas categorias em permanente transformação.
acarreta uma maior dificuldade em distinguir os espaços À luz dos fatos apresentados, o rural e o urbano preci-
urbanos e os espaços rurais. Outro aspecto de desconti- sam ser compreendidos em sua diversidade, que podem
nuidade territorial, ainda segundo Sposito (2010), consis- ser avaliadas de forma plural em abordagens como a le-

43
GEOGRAFIA DO ACRE

gal, a morfológica, a demográfica, a cultural, a econômica, Nesse contexto, a noção e, principalmente, a sistemati-
entre tantos outras. A utilização de qualquer uma delas, zação dos gêneros de vida e suas investigações sobre temas
de forma isolada ou combinada, deve ser vista como uma como o de ritmo de trabalho, tipo de habitação e de cidades,
aproximação parcial da realidade. realizadas por inúmeros geógrafos franceses no pós-guerra,
O foco numa visão territorial e em diversas escalas es- desaguaram nos estudos e classificações formuladas a partir
paciais apresenta perspectivas promissoras tanto pelo sur- da noção de habitat rural largamente utilizada na França e
gimento de novas tecnologias e ferramentas capazes de no Brasil e que terão uma influência direta nas classificações
analisar paisagens complexas, quanto por elementos das feitas até hoje entre o espaço rural e urbano no País.
dimensões urbana e rural que ainda não foram investigados. De acordo com Derruau (1970), para o geógrafo, o ter-
mo habitat rural não é sinônimo de habitação. Para esse au-
Resgate histórico de uma abordagem geográfica tor, tampouco é dado a ele o sentido de área ou ecúmeno.
O debate sobre o rural e o urbano admite muitas in- Tal termo, prossegue esse autor, significa porção do espaço
terpretações e é composto de muitos elementos analíticos habitado que é ocupado por casas e suas dependências.
que compõe um mosaico vasto e diverso de interpretações. Assim, o estudo do habitat rural constitui o da disposição
Contudo, é reconhecida a necessidade de parâmetros que dos espaços habitados e seus problemas são decorrentes
diferenciem os espaços e os avaliem em termos estatísti- do grau de concentração e dispersão das habitações rurais
cos e geográficos para a produção de políticas públicas e simultaneamente à forma das aglomerações rurais, além
estudos mais aprofundados. Historicamente, a geografia e, daqueles relacionados à própria estrutura das casas rurais.
em especial aquela produzida no IBGE, produziu conceitos, Pierre George (apud ALMEIDA, 1995), amplia posterior-
métodos e critérios no tratamento e caracterização do rural mente o significado de habitat associando-o ao modo de
e do urbano que serão aqui revistos. distribuição dos lugares habitados no interior de uma de-
Analisar a contribuição da geografia sobre o tema rural- terminada região, sendo a noção de lugar, para esse autor,
-urbano não é tarefa fácil uma vez este último gravitou, em inseparável de seu conteúdo humano, fazendo com que o
grande parte, entre dois grupos de especialistas e pesqui- habitat possa ser interpretado como o modo de distribui-
sas – o da geografia agrária e o da geografia urbana – que
ção da população no interior de um espaço considerado.
traçaram por vezes suas trajetórias em campos estanques
Nesse sentido, partindo de um entendimento forte-
em termos conceituais e metodológicos.
mente vinculado ao mundo rural, conforme as formulações
Quando se retoma, contudo, à “velha tradição” dos es-
iniciais desse conceito, não somente a definição de gênero
tudos de habitat rural desenvolvido sobre o paradigma da
de vida, como a de habitat vai tomando um sentido mais
geografia da paisagem, pode-se encontrar aí um ponto de
amplo ao longo do tempo, fazendo com que Max Sorre
partida não só para se resgatar a história do pensamento
geográfico, como, principalmente, para retomar algumas (1952 apud ALMEIDA, 1995), ainda no contexto da França
pistas conceituais e metodológicas potencialmente válidas do pós-guerra, encaminhasse para um entendimento que
para analisar o mundo contemporâneo. ia além do mundo rural em direção ao urbano.
Com efeito, para trabalhar o conceito de habitat é Ele rompia, assim, com as classificações estritamente
necessário reportar à contribuição de Vidal de la Blache voltadas às situações características do espaço rural em di-
(1845-1918), cuja principal ligação feita entre a natureza e reção às “formas mais evoluídas do habitat urbano”, isto é,
a sociedade no espaço passava pelo desenvolvimento do às grandes cidades.
conceito de Genre de Vie, enquanto instrumento analítico Com efeito, esse autor preocupava-se naquela ocasião
que reconhece o mecanismo de integração entre o meio e com a necessidade de se criar uma nova tipologia de gêne-
a organização social de um grupo, com vistas ao seu sus- ro de vida, baseada nas novas realidades da vida urbano-
tento cotidiano (ALMEIDA, 1995). -industrial. Para Almeida (1995), Max Sorre preocupava-se,
Para Derruau (1970), o gênero de vida pode ser defini- em especial, com as questões ligadas à transição rural-ur-
do, sempre de modo coletivo, como o conjunto de ativida- bana que ampliava sua escala e tomava velocidade no pós-
des mediante as quais o grupo que as pratica assegura sua -guerra, deixando antever o que deveria ser o novo espaço
existência: a pesca, a caça, a coleta, a agricultura sedentária de entendimento do gênero de vida agora comprometido
e a vida pastoril sendo considerados diferentes gêneros de com as novas formas de habitat que surgiam na área peri-
vida ou se integram em outros mais complexos envolvendo férica das metrópoles.
mais de uma atividade. No Brasil e no IBGE, duas vertentes de pesquisa, rural e
A transposição do conceito de gênero de vida para urbana, se desenvolveram em torno das noções de habitat
o de habitat rural ocorre no esforço feito por la Blache e de gênero de vida, adaptando-os e ampliando-os para
(DERRUAU, 1970) no sentido de sistematizar e classificar poderem interpretar a complexa realidade territorial de um
os fenômenos que regem as atividades humanas e que país de dimensões continentais e enorme diversidade am-
passavam pela distinção entre aqueles ligados à ocupação biental/cultural.
improdutiva do solo, como é o caso das casas e caminhos; No que diz respeito à vertente da geografia agrária,
os associados aos fenômenos de domínio sobre plantas e alguns estudos clássicos sobre o habitat rural foram rea-
animais, como os campos de cultivo e áreas de criação e, lizados, entre outros, por Nilo Bernardes e Elza Keller que
finalmente, os associados à “economia destrutiva” das ati- estabeleceram parâmetros fundamentais para pesquisas
vidades associadas à exploração mineral e às que devasta- posteriores sobre as principais formas espaciais de habitat
vam a vida animal e vegetal. rural no contexto nacional.

44
GEOGRAFIA DO ACRE

Inicialmente, Bernardes (1963) chama atenção para cia da expressão e “certa confusão que paira a respeito”, a
o fato de que enquanto os geógrafos de língua francesa própria noção de estrutura agrária deveria se aproximar da
consagraram a expressão habitat, em outras línguas ela é o de “organização agrária” que abarcaria “um complexo de
correspondente em português, ao termo “povoamento” ou instituições” tais como a estrutura fundiária, o regime de
mais propriamente “forma de povoamento”. exploração da propriedade e o modo de utilização da terra.
No início da década de 1960 esse autor voltava-se para Outra referência aos estudos de habitat rural no Brasil
a necessidade de se estabelecer uma sistematização dos e, em especial, no Estado de São Paulo, foi a de Nice Lecoq
estudos sobre habitat rural no Brasil, visando à adaptação Müller que, ao sintetizar observações feitas sobre os sitian-
de classificações vindas do exterior, uma vez que as gran- tes paulistas no início da década de 1950, tanto nas áreas
des contribuições feitas até aquele momento para a siste- de povoamento antigo quanto nas de ocupação recente,
matização dos estudos do habitat se referiam, sobretudo, fez sua análise obedecendo ao critério morfológico ante-
às regiões extratropicais. riormente descrito por Demangeon (apud BERNARDES,
Em relação às dificuldades encontradas para efetuar a 1963, p. 533) e descrevendo as formas de dispersão entre
sistematização dos estudos de habitat rural no País, Ber- dispersão absoluta; dispersão coagular e dispersão linear.
nardes (1963, p. 530) elencava, entre outras, além da “falta Ao buscar uma aproximação com a estrutura agrária
de literatura especializada” e da precária documentação essa autora aponta uma estreita vinculação da forma de
cartográfica como fonte auxiliar de informação, as “prover- povoamento disperso com o regime de exploração da ter-
biais dificuldades decorrentes da extensão de nosso ter- ra. Nesse contexto, os sitiantes proprietários paulistas apre-
ritório” que “não permitem estudos aprofundados senão sentavam forte tendência para a forma linear ou coagular
por áreas relativamente pequenas, carecendo de criterioso originando muitas vezes os chamados “bairros rurais”, en-
confronto posterior”. quanto os sitiantes arrendatários e parceiros tinham ten-
A contribuição desse autor consistiu em adaptar o sis- dência a desenvolver formas de dispersão absoluta.
tema de classificação para o contexto nacional, identifican- Esses autores ampliaram, enfim, o campo conceitual de
do, no interior da forma dispersa de povoamento domi- discussão do habitat rural, abrigando também uma visão
nante no espaço rural brasileiro, aquelas zonas em que a
mais complexa e abrangente da estrutura agrária do País.
ocupação se processou de modo mais lento e, sobretudo,
Outra grande contribuição aos estudos do habitat rural
espontâneo, daquelas outras que, “pela interferência da
no Brasil e que está na origem das análises iniciais utilizan-
colonização induzida, processou-se um povoamento dina-
do sistemas classificatórios posteriormente utilizados para
micamente intenso e ordenado, fruto de um planejamento
delimitar para fins estatísticos os espaços rural e urbano no
em seus traços mais gerais” (BERNARDES, 1963, p. 530).
País, constitui a pesquisa sobre os tipos de povoamento ru-
Dentro desse quadro mais amplo de classificação dos
ral empreendido por Elza Keller (1970), conforme apontado
tipos de habitat rural que comportam a especificidade do
anteriormente.
contexto nacional, foi feita a análise, entre outras, das zo-
nas de floresta densa na Amazônia, nas quais o povoamen- Essa autora destaca a importância que assumem as
to, apesar de espontâneo, possui uma “dispersão franca- atividades agrícolas na vida econômica do País, alertando
mente linear” obediente à dependência dos cursos d’água para a necessidade de adaptações que devem ser feitas
enquanto única via de circulação regional. nos sistemas classificatórios desenvolvidos a partir da rea-
Nesse caso, rompia-se com interpretações clássicas lidade do campo europeu.
que associavam o povoamento espontâneo, muitas vezes, Para Keller (1970, p. 291) a pesquisa sobre as causas que
a uma disposição anárquica, conforme terminologia usada, levaram a determinado modo de ocupação do solo para a
entre outros, por Jean Tricart, uma vez que a influência de “explotação” agrícola constitui um dos capítulos mais in-
certos fatores físicos e culturais, segundo Bernardes (1963), teressantes e mais complexos da geografia humana pelas
impunha determinadas tendências à fisionomia do habitat, interrelações estabelecidas entre as influências das condi-
como no caso do ambiente florestal amazônico. ções naturais “mesclando-se nas mais diferentes formas
A associação entre as formas dispersas de povoamento, com as tradições étnicas, as condições históricas, os gêne-
medidas pelo afastamento das habitações rurais e a estru- ros de vida, os sistemas agrícolas, as estruturas agrárias e
tura fundiária, a proximidade de açudes, no sertão nordes- as formas de organização econômica”.
tino ou a compartimentação do relevo, entre outras, são Nesse contexto, ao assumir que as pesquisas sobre os
algumas das variedades de dispersão apontadas por Ber- tipos de povoamento rural não devem ter como objetivo
nardes em várias regiões do País, que ainda apresenta sua único o modo pelos quais se distribuem as casas rurais,
validade até os dias atuais. essa autora amplia o leque de dimensões que devem ser
Enfim, uma das grandes contribuições de Nilo Bernar- analisadas para se promover a análise das diferenciações
des foi a de correlacionar a grande variedade fisionômica regionais nas formas de povoamento.
do habitat no Brasil à estrutura agrária e para tal esse autor Para Keller (1970, p. 291), é o conjunto de relações es-
propõe, de um lado, a adoção de uma “noção mais larga tabelecidas no campo entre “os grupos de casas e os seus
de habitat, compreendendo não somente os fatos relativos habitantes”, reveladores de um valor demográfico e o “ter-
à habitação em si como também todo o arranjo de esta- ritório explorado”, que exprime um valor econômico e so-
belecimento rural” (BERNARDES, 1963, p. 543). Por outro cial no sentido da produção que, em seu conjunto, consti-
lado, prossegue Bernardes (1963, p. 543), dada à abrangên- tui o objeto geográfico dos estudos de habitat.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Nesse contexto, a noção do habitat e do povoamen- Bernardes (1956) e Edmon Nimer (1967) são referências,
to rural se amplia do ponto de vista geográfico, para sua dentre outros, de geógrafos que no IBGE avançaram em
concretização através da forma – dispersa ou aglomerada questões relativas à mudança nas formas de apropriação e
– que constitui elemento essencial da paisagem rural expri- uso da terra, à expansão de loteamentos que transforma-
mindo, muitas vezes, tanto fenômenos ligados à “evolução vam áreas rurais em áreas urbanas, além daqueles estudos
social” e demográfica, que “agrupa e fixa ao solo certo nú- focados na resistência a mudanças culturais que contribuí-
mero de indivíduos”, como aqueles ligados ao “valor eco- ram para ampliar as dimensões contempladas até então na
nômico e social”, enquanto sede de um estabelecimento descrição e tipificação do habitat rural.
rural (KELLER, 1970, p. 291). Cabe observar que embora as referências conceituais,
Desse modo, as pesquisas sobre o povoamento rural no caso dos estudos focados no contexto urbano e em
devem reunir, portanto, segundo Keller (1970, p. 292), a sua periferia, tenham um comprometimento mais indire-
casa, enquanto elemento central do habitat rural e teste- to quando comparado aos estudos focados nas mudanças
munha concreta da ocupação permanente da terra pelo operadas no habitat rural, não se pode deixar de mencio-
homem e, simultaneamente, núcleo do conjunto formado nar, contudo, a recorrência, nesses trabalhos, ao processo
pela explotação rural, na qual outros elementos constituem histórico de povoamento e às formas geográficas de for-
também objetos de interesse, tais como os campos de cul- mação de aglomerações, densidades e relações estabeleci-
tura, as pastagens, os pomares, os jardins e as hortas e, das entre o campo e a cidade.
finalmente, as estradas e os caminhos vicinais. Retratando as transformações espaciais decorrentes da
No que se refere mais de perto aos problemas ligados à expansão no Século XX da Cidade do Rio de Janeiro, Gei-
sistematização do habitat rural no Brasil essa autora chama ger (1952, p. 576) afirma que se assistiu, naquela ocasião,
atenção também da extrema escassez do material estatís- “tanto o crescimento da influência dos capitais, como o dos
tico e cartográfico existente na ocasião e utilizável como comerciantes da capital na baixada da Guanabara” que se
fontes de consulta para a caracterização dos tipos de po- impuseram “aos já despojados de sua antiga posição”.
voamento rural. Nesse sentido, o emprego das fórmulas Geiger (1952, p. 576) prossegue descrevendo a sequên-
matemáticas na determinação dos índices de dispersão ou cia das mudanças operadas nos atores, interesses e ativi-
de concentração, conforme realizado nos países europeus, dades nas áreas diretamente afetadas pela expansão da
afigurava-se difícil para aquela autora devido à forma com cidade: “foram aparecendo novos proprietários de terras,
que eram apresentados então os censos demográficos e gente da cidade, substituindo, na posse, aqueles que as
agrícolas. abandonavam voluntariamente ou forçados”.
Assim, no final da década de 1960 faltava aos dados Nesse contexto,
estatísticos um detalhamento em termos de habitantes os loteamentos transformaram áreas rurais em áreas
das casas rurais por lugar habitado, incluindo cada fazen-
urbanas principalmente, para o norte e noroeste do Rio
da e sítio isolado, além dos povoados e lugarejos, além de
de Janeiro e aumentaram o número de sítios pertencentes
“plantas cadastrais, de mapas topográficos de grande es-
a elementos da classe média da cidade. Muitas terras, em
cala e de fotografias aéreas que possibilitem a observação
ambas as margens da Guanabara e até no Município de Ita-
do conjunto dos estabelecimentos rurais” (KELLER, 1970, p.
boraí, estão esperando a valorização para também serem
294). Esse instrumental analítico, contudo, existia naquela
loteadas. (GEIGER, 1952, p. 576).
ocasião apenas para áreas muito restritas, além de não es-
tar ainda suficientemente acessível para um uso mais am- Analisando as mudanças ocorridas na utilização da ter-
plo. ra devido à expansão urbana de Curitiba em meados da
Para Demangeon (apud KELLER, 1970), embora o em- década de 1950, Bernardes (1956, p. 271) assinalava não
prego das fórmulas estatísticas tenha um valor relativo, as- só a especificidade das inúmeras colonas de migrantes ali
sim como a definição do habitat rural exclusivamente por existente como destaca também o número dos núcleos po-
seu aspecto cartográfico seja insuficiente, constituem, no voados, “via de regra dominados por imponentes igrejas”.
entanto, a primeira etapa indispensável aos estudos de po- Nesse sentido, as mudanças ocorridas naquela área
voamento rural. próxima à capital paranaense já alteravam de forma radical
Nesse contexto, a análise sistemática sobre os tipos de as colônias pioneiras ali instaladas anteriormente: algumas
povoamento rural no Brasil passou de uma fase em que se das primeiras colônias, aliás, não serão mais identificadas
destacavam alguns aspectos do habitat, em áreas limitadas pelo forasteiro, submergidas que foram pela propagação
do País, conhecidos, sobretudo, através de observações contínua da área urbana de Curitiba que vem absorvendo
realizadas em trabalhos de campo pela geografia regional o excedente daquela população de origem étnica diversa,
e nos quais o habitat era tratado como um dos aspectos que se vê transitando pelas estradas, pelas ruas dos arra-
da geografia da paisagem rural, para um momento subse- baldes, ou laborando em volta das casas ou nos pequenos
quente no qual começam a ser feitos estudos sistematiza- lotes: ítalos, teutos, eslavos, etc (BERNARDES, 1956, p. 271).
dos cobrindo todo o Território Nacional, isto é, envolvendo Uma linha de pesquisa que privilegiava as interações
não somente o habitat rural, como àqueles referenciados existentes entre a identidade cultural com as colônias e
ao espaço urbano e/ou à periferia das grandes cidades. aglomerações rurais existentes em torno dos núcleos ur-
No que se refere aos estudos relativos às formas de banos é encontrada, entre outros, no trabalho de Nimer
habitat dominantes nas periferias urbanas brasileiras, os e Binsztok (1967) acerca da distribuição da população em
trabalhos de Pedro Pinchas Geiger (1952), Lysia Cavalcanti áreas próximas à cidade de Castelo no Espírito Santo.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Chamando atenção para o predomínio do habitat dis- temporâneo. Nesse sentido, o conceito de habitat herdado
perso, os autores revelavam, que apesar de as habitações dos mestres europeus ainda se apresenta como um dos
se apresentam regularmente dispersas na zona rural de caminhos que pode ser trilhado, em sua perspectiva mul-
Castelo, sempre ao longo dos vales, em virtude da extrema tidimensional e multiescalar, para se pensar as complexas
divisão das propriedades e do grande número de meei- formas de povoamento presentes no País e, enfrentar a
ros e outros tipos de trabalhadores, a distância que separa sempre renovada tensão entre a delimitação do rural e do
uma habitação da outra é relativamente pequena. urbano na atualidade.
Em alguns vales, segundo Nimer e Binsztok (1967, p. A classificação das novas e sempre dinâmicas formas
63), de povoamento no Brasil, sejam elas decorrentes de pro-
a densidade de habitações é tão elevada que se pode cessos históricos de longo ciclo, sejam elas derivadas de
perceber uma tendência para o agrupamento. Entretanto o alterações naturais e humanas de ciclo mais curto ou mes-
habitat é sempre disperso. O único aglomerado rural exis- mo imediato, constitui um desafio a ser enfrentado em um
tente é a vila de Aracuí, porém a maioria de seus habitantes momento em que as técnicas de captação de informações
não são descendentes de italianos e alguns deles não exer- estatísticas e de imagem orbital aprimoraram em muito a
cem atividade rural. Entretanto, no Município de Conceição capacidade de se fazer uma leitura detalhada da malha ter-
do Castelo existem os povoados de Estrela do Norte, Venda ritorial, superando os recorrentes problemas enfrentados
Nova e a própria sede do município, onde predominam os pelos geógrafos do IBGE no passado na tarefa de delimitar
ítalo-brasileiros. o habitat rural e urbano no Brasil.
Os estudos voltados à caracterização dos habitat rurais A utilização desse poderoso instrumental analítico co-
e urbanos serviram de base, enfim, para desenvolver uma loca assim uma grande oportunidade para as escolhas con-
terceira vertente de estudos baseados na conceituação de ceituais a serem feitas e nas quais o conceito de habitat,
habitat focados, agora, na identificação, delimitação e clas- assim como os de ruralidade e territorialidade, compro-
sificação dos espaços rurais e urbanos enquanto “principal metidos tanto com diferenciações no processo de povoa-
tarefa geográfica” para a realização das operações censitá- mento do território, quanto na própria identidade cultural/
rias do IBGE (ALMEIDA, 1995, p. 12). ambiental construída ao longo desse processo, parecem
Esses estudos pressupunham, além do conhecimento indicar um rico campo de discussão não só na geografia,
empírico do campo, a definição de um sistema classifica- como na antropologia e na sociologia, além daquelas dis-
tório de aglomerados humanos baseado em um tratamen- ciplinas que gravitam em torno da questão ambiental e, em
to estatístico e cartográfico que apoia o planejamento das especial ao estudo da paisagem, como é o caso da geo-
operações censitárias e, consequentemente, a delimitação morfologia.
física dos espaços rurais e urbanos no Brasil. Finalmente não se pode deixar de mencionar que esse
Se para fins de divulgação das pesquisas censitárias, os conhecimento é especialmente relevante nos dias atuais,
espaços rurais e urbanos do País devem necessariamente dada a enorme diversidade de fontes, órgãos e entes le-
obedecer às determinações legais definidas, ainda na década gitimados a emitir normas jurídicas que coexistem no País
de 1930, para elaborar a divisão territorial do Brasil, o que se nesse início do Século XXI (FIGUEIREDO, 2006, p. 2). Com
propõe, na atualidade, é a delimitação de recortes geográficos efeito, existe, no Estado brasileiro atual, grande pluralidade
obedientes a critérios definidos a partir de uma conceituação, de fontes normativas, seja por razões territoriais, como no
metodologia e procedimentos operacionais comprometidos caso de federações tripartites e suas diversas competências
diretamente com as formas históricas de povoamento do Terri- legislativas, como o Brasil, seja pela divisão das funções es-
tório Nacional, aí, portanto, incluídas as diferentes “densidades tatais feita pela Constituição ou pela especialização técnica
humanas e econômicas” mediadas pelas técnicas e formas de para regular determinada matéria.
produção que caracterizam o espaço contíguo. No caso específico da legislação territorial/ambiental
Com efeito, a morfologia produzida pela dinâmica do ou, mais amplamente, naquela afeta à atuação direta do
povoamento vai colocando, ao longo do tempo, o desa- Estado sobre o território, pode-se dizer que existe, tam-
fio de alterar as definições e os critérios de classificação bém, na atualidade, uma necessidade crescente de se com-
da tipologia rural-urbana notadamente no que se refere patibilizar a legislação existente com as diversas escalas e
àqueles espaços que hoje em dia tiveram sua leitura e sua competências, legislativas e materiais, sobre as quais se
realidade geográfica alterada. pretende atuar.
Situam-se, nesse caso, aqueles adensamentos ou aglo- De acordo com Aragão (2003), novas formas de exer-
merados que no passado foram tipificados como rurais e, cício do poder (e de controle) sobre as atividades dos di-
na atualidade, constituem um segmento avançado da ex- ferentes segmentos sociais são projetadas, visando aten-
pansão urbana e cuja delimitação legal, devido a sua ri- der às injunções e complexidades da dinâmica territorial
gidez temporal, não consegue acompanhar as alterações contemporânea, com implicações diretas nas formas de
de maneira adequada e/ou não reflete necessariamente organizar a administração e a regulação do espaço político
interesses comprometidos com uma leitura estritamente nacional, em todas as suas esferas de atuação, municipal,
técnico-científica do território. estadual e federal.
Cabe registrar que “as novas formas de habitat estão Nesse sentido, se existe um domínio em que as regras
a nossa volta”, conforme observado por Almeida (1995, p. do direito não podem aspirar à perenidade e nem a uma
113), e estão, também, a desafiar a releitura do Brasil con- escala única de intervenção, esse é o domínio territorial, no

47
GEOGRAFIA DO ACRE

qual as transformações (principalmente tecnológicas) são natureza em vigor, o qual perpassa pelo modo de vida des-
hoje tão rápidas que obrigam a frequentes revisões não só sa sociedade, as sensações, o pensamento e as ações. Por-
dos sistemas classificatórios do território como, de modo tanto, pensar a natureza hoje, e a forma como o homem se
geral, das próprias regras administrativas, exigindo adap- relaciona com ela no contexto do modo de produção ca-
tações, num movimento continuo de intercomunicação do pitalista, nos remete ao passado, na ânsia de compreender
sistema jurídico com a dinâmica territorial em constante as mudanças que se processaram no modo da sociedade
transformação. pensar, interagir e produzir a natureza.
Desse modo, é sempre enriquecedor fazer um esforço
duplo e simultâneo no sentido de retornar e avançar no Homem-natureza: a dualidade está no pensamento ou
fabuloso legado dos geógrafos europeus e brasileiros que na relação?
se debruçaram sobre a Geografia no Brasil e, em especial, As raízes históricas do dualismo conceitual que envolve
sobre os estudos de habitat, no IBGE desde as primeiras a natureza remontam a Kant, pois para ele a natureza in-
décadas do Século XX, na tentativa de aprofundar o conhe- terior dos seres humanos compreendia suas paixões cruas,
cimento das diversas feições, densidades, aglomerados e enquanto a natureza exterior era o ambiente social e físico
“vazios relativos” que revelam a dinâmica do povoamento no qual os seres humanos viviam.
de um imenso, desigual e diverso território como o brasi- Essa concepção dual de natureza aponta uma nature-
leiro. za exterior, concebida como a natureza primitiva, ‘criada
Esse território na contemporaneidade apresenta enor- por Deus’ ...a matéria – prima da qual a sociedade é cons-
me complexidade legislativa e os estudos de habitat podem truída,... o reino dos objetos e dos processos que existem
auxiliar na diminuição da tensão derivada dos conflitos de fora da sociedade”, que seria as rochas, os rios, as árvores,
interesse e de competências entre os órgãos envolvidos enfim os elementos internalizados no processo de produ-
com a ação pública no campo e nas cidades. Esses conflitos ção social. E também a natureza concebida como universal,
estão, enfim, a desafiar a ação pública sobre a sociedade e ou seja, “a natureza humana, na qual está implícito que os
o território brasileiro na contemporaneidade. seres humanos e seu comportamento são absolutamente
tão naturais quanto os aspectos ditos ‘externos’ da nature-
Fonte: za”(Smith, 1988: 28).
https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/es- Francis Bacon (séc. XXVII), concebia a natureza como
paco-rural.htm algo exterior a sociedade humana, pressupondo uma sepa-
PENA, Rodolfo F. Alves.“Espaço urbano e rural”; Brasil ração entre natureza e sociedade, haja vista a relação entre
Escola. Disponível em <https://brasilescola.uol.com.br/ ambas ser concebida como mecânica, ou seja, o homem
geografia/espaco-urbano-rural.htm>. Acesso em 11 de exercia seu domínio sobre a natureza através das artes me-
dezembro de 2018. cânicas.
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/ Conforme afirma Smith, a concepção de natureza exte-
liv100643.pdf rior de Bacon não era arbitrária, pois ele já tinha, de certa
forma, a conexão entre indústria e ciência, devendo as artes
mecânicas estar a serviço da produção, e assim aumentar a
produtividade do processo de trabalho. Mas, Smith ressalta
7. APROPRIAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DA que mesmo que o desenvolvimento da indústria de produ-
NATUREZA. PRESERVAÇÃO E CUIDADOS ção em massa tenha conduzido a ciência à subordinação
COM O MEIO: COMO O HOMEM USA A ao capitalismo industrial de modo significativo, ela ainda
possuia uma certa autonomia, sobretudo nos centros de
NATUREZA E CONSTRÓI O SEU ESPAÇO; O
pesquisa pura. O mesmo acredita ainda que, por mais inti-
PROCESSO INDUSTRIAL E SUAS RELAÇÕES mamente ligada que a ciência esteja à industria, ela ainda
NO MUNICÍPIO, NO ESTADO E NO PAÍS. compartilha com Bacon e mesmo com Newton, da con-
cepção epistemológica de natureza exterior, mesmo que
na Ciência Moderna ela seja exterior e, ao mesmo tempo
universal.
A natureza está no homem e o homem está na natu- Quando do surgimento da Ciência Moderna, a univer-
reza, porque o homem é produto da história natural e a salidade da natureza se reveste de religiosidade. A ciência
natureza é condição concreta, então, da existencialidade passou a ser algo divino que devia ser buscado, pois era
humana. através da ciência e do domínio da natureza que o homem
A busca do conhecimento e do entendimento acerca resgataria a harmonia da natureza, realizando desse modo
da Terra e do Universo são premissas que norteiam e que a vontade de Deus.
acompanham a humanidade desde os antigos filósofos A Ciência Contemporânea também adotou o concei-
gregos até a ciência moderna. to universal de natureza, mas sem aquele cunho religioso.
A sociedade contemporânea tem vivenciado uma série Com Darwin, determinados fenômenos sociais passaram a
de problemas que envolvem o seu modo de relacionar-se ser tratados a partir das mesmas bases científicas em que
com a natureza no processo de produção e reprodução do eram tratados os eventos químicos, ou mesmo físicos, pois
espaço geográfico, colocando em questão o conceito de a Biologia passou a ser considerada “como sistematica-

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GEOGRAFIA DO ACRE

mente histórica ... Mas, de acordo com a teoria física da na- como forças da natureza. O homem constitui-se no elo
tureza universal, não é o mundo biológico e sim o mundo de ligação entre o instrumento do trabalho e o objeto do
físico que está na base da natureza”. (Smith, 1988:33-34). trabalho. A natureza é o Sujeito-Objeto do trabalho. Sua
Quando ocorre o surgimento da Teoria Quântica e a re- dialética consiste nisto: que os homens modificam sua
futação da Teoria Newtoniana por Einsten, surge o debate própria natureza à medida em que eles progressivamente
a respeito de o espaço e o tempo, ou a matéria, serem os eliminam a natureza exterior de seu e de sua exteriorida-
elementos básicos dos eventos físicos. Para Smith, talvez de, à medida em que mediatizam a natureza através de si
essa visão universal de natureza física seja a mais aceita, próprios e à medida em que fazem a própria natureza tra-
tendo em vista que a natureza é composta de matéria e, balhar para seus próprios objetivos” ( Schmidt apud Smidt,
portanto, possui uma natureza material. op. cit: 52).
O conceito de natureza contém em sua essência o dua- Para Gonçalves (1998:23), o conceito de natureza não é
lismo entre externalidade e universalidade, inter-relacio- natural, haja vista ser esta uma construção social, ou seja,
nando-se e contradizendo-se ao mesmo tempo. Mas nos foi criado pelo homem. Segundo ele toda sociedade, toda
questionamos se é possível conceber dualisticamente uma cultura cria, institui uma determinada idéia de natureza. “A
realidade que é única? Smith, ressalta nesse sentido, que natureza se define, em nossa sociedade, por aquilo que se
“O conceito de natureza é um produto social”. Para jus- opõe a cultura. A cultura é tomada como algo superior e
tificar sua afirmação o autor discute a conquista do ter- que conseguiu controlar e dominar a natureza. Daí se tomar
ritório americano, destacando que nesse caso o conceito a revolução neolítica, a agricultura, um marco da História,
tinha não só a função social, mas também política, pois “a posto que com ela o homem passou da coleta daquilo que
hostilidade da natureza exterior justificava sua dominação a natureza ‘naturalmente’ dá para a coleta daquilo que se
e a moralidade espiritual da natureza universal fornecia um planta, que se cultiva”.(Gonçalves, 1998:26-27).
modelo para o comportamento social”. O domínio da técnica da irrigação, resultou na “domes-
O autor acredita ainda que a concepção universal de ticação” da natureza através da agricultura e fixou os povos
natureza, hoje escamoteia a realidade à medida que atribui em determinados territórios, formando o berço das antigas
aos comportamentos sociais o status de eventos naturais, civilizações. Nesse contexto surge a concepção de domínio
justificando a normalidade destes comportamentos (guer- sobre a natureza porque “dominar a natureza seria domi-
ra, racismo, pobreza e riqueza etc) ao atribuí-los à vontade nar algo inconstante, imprevisível e instintivo”. Nessa re-
de Deus. Nesse sentido, não é a história da sociedade hu- lação de dominação, para alguns a natureza é o objeto a
mana a responsável por estes comportamentos, mas sim a ser dominado pelo sujeito, o homem. Para Gonçalves, essa
natureza. Desse modo, a ideologia da natureza se expressa visão de natureza-objeto versus homem-sujeito parece
na negação da possibilidade de socialização da natureza não considerar que o termo sujeito, além de significar um
universal, baseada não “na experiência histórica”, mas na ser ativo, dono de seu destino, também pode indicar que
própria contradição com a natureza exterior. podemos estar submetidos a determinadas circunstâncias.
Com Adam Smith, a teoria de formação do valor, que É a visão antropocêntrica de mundo, na qual o homem é o
até então concebia a natureza como fonte de valor e a agri- senhor de todas as coisas, que faz com que se esqueça que
cultura como meio de produção, passou-se a negar a prio- o termo sujeito, pode significar tanto aquele que age como
ridade do trabalho agrícola e também da natureza exterior. aquele que se submete. Essa visão de natureza separada
Desse modo, a natureza deixou de ser o elemento central do homem é característica do pensamento dominante no
da Teoria Econômica, pois passou a ser vista como um obs- mundo ocidental, cuja matriz filosófica advém da Grécia e
táculo ao desenvolvimento econômico. da Roma antigas, que se firmou contrapondo-se a outras
Para Karl Marx (século XIX), é preciso buscar a unidade formas de pensar e de agir.
entre natureza e história, ou entre natureza e sociedade, Com Platão e Aristóteles já havia um certo privilegiamento
pois a natureza não pode ser concebida como algo exterior do homem e das idéias e um certo desprezo por determinados
a sociedade, visto que esta relação é um produto histórico. elementos que se convencionou denominá-los como parte da
Marx adotou o conceito de metabolismo ou interação natureza física (pedras, plantas etc). O pensamento mítico dos
metabólica, para possibilitar a compreensão de que há retóricos e sofistas pensadores cedeu lugar ao pensamento
uma mediatização da sociedade com a natureza, e que a daqueles que passaram a compor a filosofia grega.
força motivadora dessa interação é o processo de trabalho, Com o avanço do Cristianismo no Ocidente, os deuses
pois tanto o Sujeito – o trabalhador, como o Objeto – a já não faziam parte desse mundo como na concepção dos
matéria-prima a ser transformada – são fornecidos pela na- pré-socráticos. Deus passou a ser o ser supremo e o ho-
tureza ao trabalho. mem, a sua imagem e semelhança. Para Platão, somente a
Para Marx, a natureza e suas leis subsistem indepen- idéia continha a perfeição, opondo-se à realidade do mun-
dentemente de consciência e desejos humanos, e tais leis do. O Cristianismo assimilou a visão aristotélico-platônica e
só podem ser formuladas com a ajuda de categorias so- durante a Idade Média apregoou a separação entre espírito
ciais. A natureza é dialética, e esta dialética se dá em função e matéria, ao difundir a perfeição de Deus em oposição
da interação do homem com a natureza: a imperfeição do mundo material. É portanto, decorrente
“A natureza se torna dialética produzindo os homens, dessa filosofia a separação entre corpo e alma, objeto e
tanto como sujeitos transformadores que agem conscien- sujeito, ou seja, a alma, o sujeito é que dá vida ao corpo,
temente em confronto com a própria natureza, quanto porém quando o corpo morre passa a ser apenas objeto.

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GEOGRAFIA DO ACRE

Com René Descartes, essa oposição homem-natureza, animais também vivem socialmente e que esta não é uma
espírito-matéria, sujeito-objeto se completa, passando a característica apenas do homem, portanto não podemos
fazer parte do pensamento moderno e contemporâneo. A separar o homem da natureza através dessa afirmação.
filosofia cartesiana atribuiu ao conhecimento um caráter Na opinião de Gonçalves, estamos longe da concepção
pragmático e este conhecimento “vê a natureza como um atomístico-individualista, visto que a reprodução da socie-
recurso”. dade capitalista pressupõe a existência de meios materiais
A visão antropocêntrica de mundo coloca o homem no para que o ciclo produtivo se efetue, e também para que
centro do universo, em oposição à natureza, ou seja, o su- haja a reprodução das classes sociais; que exista sempre
jeito em oposição ao objeto. O antropocentrismo e o prag- pessoas desprovidas desses meios materiais e necessitan-
matismo do pensamento cartesiano vincula-se ao mercan- do se submeter aos detentores do capital. Se nessa socie-
tilismo do período feudal, mas ainda conserva como heran- dade não há uma lei objetiva que governe essa luta que
ça medieval a separação entre espírito e matéria. define a reprodução das relações sociais, então, “não tem
O movimento filosófico iluminista do século XVIII, se sentido continuarmos pensando a partir do indivíduo, pois
encarregou de apagar esses traços religiosos medievais do a sociedade humana não é uma soma de indivíduos”(Op.
período renascentista, e a crítica da metafísica, ou seja, do cit. 48).
que está além da natureza, passou a ser feita em favor da Pensemos a natureza a partir de duas vertentes ociden-
Física. Na visão iluminista a natureza era concebida como tais: a visão antropocêntrica que concebe a natureza como
algo palpável. O mundo passou a ser compreendido a par- algo onde se manifesta a hostilidade, a luta, onde prevale-
tir do real, do concreto e não mais de dogmas religiosos. ce a “lei da selva”, que precisa de leis e de um Estado para
Com o desenvolvimento do capitalismo, e mais precisa- estabelecer a ordem. E a naturalista, que ver a natureza
mente com o surgimento da Revolução Industrial essas como algo harmonioso e bondoso, mas que ao criticar a
idéias acabaram se fortalecendo. primeira vertente se depara com o mesmo ponto de vista,
No século XIX, com o desenvolvimento da ciência e da ou seja, os homens destróem a natureza, trazendo à tona
técnica o pragmatismo triunfou. A natureza passou a ser a dicotomia sociedade-natureza, homem-natureza. Para
concebida cada vez mais como um objeto a ser possuído e Gonçalves, a grande dificuldade dessas duas vertentes “é
dominado. Aos olhos da Ciência a natureza foi subdividida romper com os pressupostos da filosofia positivista que é
em física, química, biologia, e o homem em economia, an- o de querer encontrar na natureza o paradigma ou modelo
tropologia, história etc. Nesse contexto, qualquer tentativa para a sociedade humana”. Essa tendência em buscar na
de pensar o homem e a natureza orgânica e integradamen- natureza o paradigma para a sociedade, caracteristicamen-
te se tornou falha, pois a separação não se efetuava ape- te faz parte da sociedade ocidental, e a filosofia positivista,
nas no nível do pensamento, mas também da “realidade hegemônica nos meios científicos dos séculos XVIII e XIX,
objetiva” construída pelo homem. A divisão social e técnica soube muito bem expressar esse fato. Pois, foi sob a ótica
do trabalho contribuiu para que houvesse o processo de positivista que a natureza passou a ser vista como algo ob-
fragmentação e dicotomização do fazer e do pensar da so- jetivo. (Op. cit. 62-63).
ciedade capitalista industrial. Essa dicotomia homem-natureza presente na socieda-
Segundo Gonçalves, de ocidental, vem sendo questionada, particularmente na
“A idéia de uma natureza objetiva e exterior ao homem, geografia, que tradicionalmente tratou essa questão de
o que pressupõe uma idéia de homem não-natural e fora forma dicotômica (geografia física e geografia humana)
da natureza, cristaliza-se com a civilização industrial inau- haja vista a questão ambiental atual exigir um novo pa-
gurada pelo capitalismo. As ciências da natureza se sepa- radigma onde homem e natureza façam parte do mesmo
ram das ciências do homem; cria-se um abismo colossal processo.
entre uma e outra e,...tudo isso não é só uma questão de
concepção de mundo...”(op.cit.35). O trabalho e a relação homem-natureza: o paradoxo
A Ciência Moderna também foi acometida pela concep- No princípio da humanidade, havia uma unicidade
ção de homem e natureza, cujo indivíduo era o referencial. orgânica entre o homem e a natureza, onde o ritmo de
Nas ciências ditas Naturais como a Física, o átomo; na Bio- trabalho e da vida dos homens associava-se ao ritmo da
logia, o organismo, a célula. Nas ciências Sociais, o indiví- natureza. No contexto do modo de produção capitalista,
duo era indivisível, um elemento reinante. este vínculo é rompido, pois a natureza, antes um meio de
No início do século XX, já não se concebe o átomo como subsistência do homem, passa a integrar o conjunto dos
uma unidade indivisível, mas como um sistema constituído meios de produção do qual o capital se beneficia.
de partículas que se interagem mutuamente. Na medida No processo de apropriação e de transformação dos re-
em que foi se desenvolvendo o estudo dos hábitos dos ani- cursos pelo homem, através do trabalho, ocorre o processo
mais, ficou mais difícil compreender a evolução da vida das de socialização da natureza. O trabalho torna-se então, o
espécies animais tendo como referência apenas o compor- mediador universal na relação do homem com a nature-
tamento de um indivíduo estudado em laboratório. Daí o za. ‘(…) o trabalho é, num primeiro momento, um processo
reconhecimento de que a convivência social já se fazia pre- entre a natureza e o homem, processo em que este reali-
sente no que denominávamos de natureza. Gonçalves cha- za, regula e controla por meio da ação, um intercâmbio de
ma atenção para isso quando faz referência àqueles que materiais com a natureza’ (Marx, 1967:188). Partindo desse
afirmam que “o homem é um ser social”. Segundo ele, os pressuposto, a separação do homem de suas condições

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GEOGRAFIA DO ACRE

naturais de existência não é “natural”, mas histórica, tendo a utilização irracional dos recursos naturais, o desperdício
em vista que a prática humana encontra-se vinculada a sua de matérias-primas, de energia e de trabalho, provocan-
história. do assim, a destruição da natureza e a conseqüente “crise
Para Casseti (1991:17), as transformações sofridas pela ecológica”.
natureza, através do emprego das técnicas no processo Para Bihr, essa “crise ecológica”, constitui-se “num dos
produtivo, são um fenômeno social, representado pelo aspectos desse ‘mundo às avessas’ que a alienação mercan-
trabalho, e as relações de produção mudam conforme as til e capitalista do ato social de trabalho institui”.(1998:129)
leis, as quais implicam a formação econômico-social e, por Assim, o processo de constituição da classe proletária,
conseguinte, as relações entre a sociedade e a natureza. que se dá a partir da separação das condições objetivas de
A sociedade contemporânea, consubstanciada numa produção, ou seja, dos meios de produção (especialmente
dinâmica complexa e contraditória, possui uma organiza- da terra e, através dela a natureza) e de sua inserção no tra-
ção interna, a qual representa um conjunto de mediações balho fabril, explica, em primeira instância, a subordinação
e relações fundamentadas no trabalho. Sob o capitalismo, do proletariado à lógica capitalista de exploração da nature-
o qual se identifica com a reprodução ampliada do capital za. Essa separação, pressupõe a perda do domínio sobre as
e que necessita da produção de mercadorias como veículo técnicas agrícolas e a compreensão dos processos naturais
de produção da mais-valia para possibilitar a sua expan- por parte do proletariado, distanciando-o assim da natureza.
são, a relação homem-meio apresenta-se como contradi- Na atividade produtiva, própria do capitalismo, prevale-
ção capital-trabalho, pois se pensarmos do ponto de vista ce a fragmentação e a atomização do trabalhador, reifican-
abstrato, os homens se relacionam com a natureza para a do (coisificando) o homem e suas relações. Dessa forma,
transformar em produtos. Se pensarmos do ponto de vista ela não realiza adequadamente a interação do homem com
real, o trabalho é um processo de produção/reprodução de a natureza.
mercadorias. O proletariado, despossuído dos meios de produção,
No capitalismo, portanto, o acesso aos recursos exis- só realiza a sua subjetividade na medida em que aliena sua
tentes na natureza passam por relações mercantis, visto capacidade de trabalho a quem detém as condições obje-
que sua apropriação pelo capital implica a eliminação de tivas, ou seja, ao capitalista.
sua “gratuidade natural”. Portanto, a incorporação da na- No modo de produção capitalista, o trabalhador é redu-
tureza e do próprio homem ao circuito produtivo é a base
zido a uma mercadoria, à medida que vende sua força de
para que o capital se expanda.
trabalho para o capitalista em troca de um salário. Assim, o
No processo de acumulação do capital, o trabalhador
trabalho “que deveria ser a forma humana de realização do
tem sido despojado do conjunto dos meios materiais de
indivíduo reduz-se à única possibilidade de subsistência do
reprodução de sua existência e forçado a transformar sua
despossuído”. (Antunes, 1997:124)
força de trabalho em mercadoria, a serviço do próprio ca-
A dimensão abstrata que o trabalho adquire, conduz ao
pital, em troca de um salário. O capital separa os homens
da natureza, em seu processo de produção/reprodução e mascaramento da sua dimensão concreta (de trabalho so-
impõe que o ritmo do homem não seja mais o ritmo da cialmente necessário) e, consequentemente, à fetichização
natureza, mas o ritmo do próprio capital. da mercadoria, incobrindo assim, “(...)as dimensões sociais
Sabemos que na relação capital x trabalho há um anta- do próprio trabalho, mostrando-as como inerentes aos
gonismo, haja visto que o capital nutre-se da exploração do produtos do trabalho”. (Op.cit.127)
trabalho do homem. Nesta relação, como o homem realiza Segundo Thomaz Jr.,
o trabalho capitalizado, ao entrar em contradição com o “O procedimento do cientificismo fetichizou os riscos a
capital, ele entra em contradição com a própria natureza. que a sociedade foi submetida, tendo em vista que o de-
Segundo Moreira, quando o capital busca cada vez mais senvolvimento incomensurado das ciências e das técnicas
a produtividade do trabalho e, assim, a elevação da taxa de põe em xeque o futuro da humanidade, socializando de
exploração do trabalho e da natureza, ele amplia a base de forma profunda e ampla todas as mazelas do produtivismo,
alienação do trabalho e da própria natureza, gerando uma conclamando a todos à preservação da natureza, todavia
dicotomia entre sociedade e natureza. virando as costas para o chamamento lançado pelos mo-
“A alienação do trabalho reproduz-se a todas as ins- vimento ecológicos e alguns partidos políticos comprome-
tâncias da sociedade capitalista: aliena-se o homem da na- tidos que se vinculam à tese da insubordinação da práxis
tureza, dos produtos, do saber, do poder e dos próprios social à lógica da reprodução do capital”. (1999:5)
homens. Se o poder sobre os homens nas ‘sociedades na- Nesse sentido, a luta de classe do proletariado (e de-
turais’ passa pelo controle da terra, sob o capital o poder mais segmentos da sociedade) deveria suscitar uma refor-
passa pela alienação do trabalho”. (1985:78) mulação profunda da sociedade e colocar em xeque a es-
A perda da identidade orgânica do homem com a na- trutura organizacional da sociedade capitalista, ampliando
tureza, se dá a partir do capital, que gera a contradição e a “luta anticapitalista”. Mas, para que esta luta ganhe uma
que, na contradição, gera a perda da identificação do ho- dimensão ecológica, se faz necessário uma “verdadeira re-
mem com a natureza e, consequentemente, a degradação volução cultural no movimento operário”. Dada a indife-
ambiental. rença do trabalhador com o trabalho que exerce.
O processo social de produção, cuja referência está na Já a tecnologia não é indiferente aos propósitos de sua
produção de valores de uso, submete a força de trabalho e criação, ou seja, ela está à serviço do capital e, portanto,
os meios de produção aos seus desígnios, impulsionando voltada para a produção de mais-valia. Assim, quanto mais

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GEOGRAFIA DO ACRE

aumenta a capacidade de extração de sobretrabalho, maior 03. (CREA-AC - Analista de Sistema - FUNCAB –
é a quantidade de recursos naturais explorados, de maté- 2016)
ria-prima transformada. O Acre está localizado no bioma denominado Amazô-
A crise ecológica requer um repensar sobre a forma nia. Notoriamente, a Amazônia possui uma enorme exten-
como está estruturada e como funciona a sociedade con- são territorial com grandes semelhanças e também com di-
temporânea. O modo como é gerida a natureza, o modo de ferenças. Entre as alternativas a seguir, assinale a que pode
produção e de consumo, os meios de produção, o modo de ser apresentada como uma das características da Floresta
vida, as técnicas aplicadas, a tecnologia utilizada e a ciência Amazônica.
a seu serviço, no sentido de reaproximar o homem da natu- A) Clima com baixíssimo índice pluviométrico.
reza (Bihr, 1999). Dito de outro modo, essa crise ecológica/ B) Vegetação herbácea com predomínio de coníferas.
ambiental evidenciada através de dois elementos caracte- C) Possui a maior amplitude térmica entre os biomas
rísticos da sociedade contemporânea: tecnologia e cresci- do Brasil.
mento, nos incita ao questionamento de um estilo de de- D) Os animais de grande porte formam a maior biodi-
senvolvimento internacionalizado, que revela-se enquanto versidade.
modelo de desenvolvimento ambientalmente predatório e E) Divisão entre áreas de inundação, como várzea, iga-
socialmente injusto, manifestado, principalmente nos pro- pó e terra firme.
cessos de modernização da agricultura, de urbanização e
de exploração desenfreada dos recursos naturais. 04. (CREA-AC - Analista de Sistema - FUNCAB –
2016)
Fonte: As capitais dos estados brasileiros são, normalmente,
http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn119-18.htm os municípios mais populosos. O Censo demográfico do
IBGE, realizado a cada dez anos, confirmou tal característica
para o estado do Acre. Dessa maneira, Rio Branco, possui,
QUESTÕES numericamente, a população dentro do seguinte intervalo:
A) inferior a 90 mil habitantes.
01. (SESAU-RO - SESAU-RO - Enfermeiro - FUNRIO B) entre 98 mil e 100 mil habitantes.
– 2017) C) entre 105 mil e 210 mil habitantes.
A história da construção da ferrovia Madeira-Mamoré D) entre 215 mil e 300 mil habitantes.
passa pela questão do Acre (1899-1902), que ocasionou a E) superior aos 315 mil habitantes.
assinatura de um importante tratado em 1903. Esse trata-
do define a compra da Região do Acre por 2 milhões de 05. (TJ-RO - Contador - FGV – 2015)
libras esterlinas e viabiliza a construção da Estrada de Ferro “Tratado de permuta de territórios e outras compen-
Madeira-Mamoré por parte do governo brasileiro, então sações entre o Brasil e a Bolívia assinado na cidade de
vivamente interessado na exploração da borracha do Acre Petrópolis em 17 de novembro de 1903, aprovado pelo
e do noroeste boliviano. Congresso Nacional em 12 de fevereiro de 1904, sancio-
Esse documento é conhecido como Tratado de: nado pelo presidente Rodrigues Alves em decreto de 18
A) Madri. de fevereiro, com troca mútua de ratificações em 10 de
B) Petrópolis. março, pelo qual se estabeleceram os limites entre Brasil
C) Paris. e Bolívia e a incorporação definitiva do Acre ao território
D) São Paulo. nacional.”(Disponível em http://cpdoc.fgv.br/sites/default/
E) Manaus. files/verbete s/primeira-republica/TRATADO%20DE%20PE-
TR%C3%93POLIS.pdf)
02. (CREA-AC - Analista de Sistema - FUNCAB – O tratado descrito no texto e a principal razão para
2016) sua sanção por parte do governo brasileiro são, respecti-
O Acre foi incorporado ao Brasil com a assinatura do vamente:
Tratado de Petrópolis. Nesse momento histórico o presi- A) Tratado de Madri - expansão do território nacional;
dente do Brasil era: B) Tratado de Petrópolis - interesse em explorar as se-
A) Getúlio Vargas. ringueiras no território anexado;
B) Deodoro da Fonseca. C) Tratado de Ayacucho - riquezas minerais descobertas
C) Rodrigues Alves. no território acreano;
D) Eurico Gaspar Dutra. D) Tratado de Petrópolis - alto valor indenizatório a ser
E) Jânio Quadros. pago pelo governo boliviano;
E) Tratado de Ayacucho - construção da ferrovia Madei-
ra-Mamoré.

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GEOGRAFIA DO ACRE

06. (SEDF - Professor de Educação Básica – Geografia - CESPE - 2017)


A cartografia temática é uma importante ferramenta para a integração e a análise geopolítica, pois permite representar,
sobre uma base geográfica, fatores intervenientes nos processos políticos, étnicos e culturais.
( ) Certo
( ) Errado

07. (SEDF - Professor de Educação Básica – Geografia - CESPE - 2017)


Julgue o item subsecutivo, relativo à cartografia.
A representação de uma superfície curva em uma superfície plana acarreta distorções relativas a áreas, formas, distân-
cias e ângulos, que podem ser resolvidas com o uso de uma projeção plano cartesiana.
( ) Certo
( ) Errado

08. (Prefeitura de Goiânia - GO - PE II – Geografia - CS-UFG– 2018)


Observe a figura a seguir.

Na figura são representados alguns métodos de generalização utilizados no processo de mapeamento cartográfico. A
generalização possui uma relação direta com
A) o título, pois define questões relacionadas ao o quê, onde e quando para referir à representação de uma informação.
B) a escala, pois indica a proporcionalidade entre a medida do terreno e da área representada.
C) a legenda, pois a comunicação cartográfica está relacionada à concepção da simbologia e sua correspondente sig-
nificação.
D) a projeção, pois indica o tipo de alteração que sofreu a área ao ser representada no mapa.

09. (IPHAN - Analista I - Área 2- CESPE – 2018)


Para geógrafos e cartógrafos, a escala como medição/cálculo ou como recortes do território é um conceito muito im-
portante: não há leitura em um mapa sem determinação da escala, assim como não há análise de fenômenos sem que seja
esclarecida a escala geográfica adotada. A esse respeito, julgue o item subsecutivo.
Uma mesma escala numérica poderá constar em mapas iguais, mas de tamanhos diferentes.
( ) Certo
( ) Errado

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GEOGRAFIA DO ACRE

10. (SEDUC-PA - Professor Classe I - Geografia -


CONSULPLAN – 2018) ANOTAÇÕES
O professor de Geografia solicitou que um dos alunos
fosse ao quadro para resolver duas questões de escala.
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• Questão 1: Em um mapa com escala 1:200.000 apre- ___________________________________________________


senta uma distância 20 cm entre os pontos A e B. Dessa ___________________________________________________
forma, a correta distância entre os dois pontos na realidade
é: Resolução 200.000 x 20 = 1 cm para cada 200.000 cm x ___________________________________________________
20 cm = 4.000.000 transformando para Km 400 km.
___________________________________________________
• Questão 2: As escalas abaixo podem ser classificadas
como, respectivamente: Resolução a) numérica e b) gráfica. ___________________________________________________

___________________________________________________
Com base na análise dos exercícios de escala, assinale a
alternativa correta. ___________________________________________________

A) Ambas as respostas estão corretas. ___________________________________________________


B) A primeira resposta está incorreta, e a segunda é uma
___________________________________________________
classificação correta das escalas.
C) A primeira resposta está correta, e a segunda apre- ___________________________________________________
senta a classificação incorreta das escalas.
D) Ambas as respostas estão incorretas, com erro de ___________________________________________________
cálculo na primeira e troca de escalas na segunda.
___________________________________________________

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GABARITO
___________________________________________________
01. B
02. C ___________________________________________________
03. E
04. E ___________________________________________________
05. B ___________________________________________________
06. Certo
07. Errado ___________________________________________________
08. B
09. Errado ___________________________________________________
10. B
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