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Estabelece o Decreto nº. 20.910/1932 que todo e qualquer direito contra a Fazenda
pública seja qual for a sua natureza prescreve em cinco anos contado do fato de que se
originar e que a prescrição somente poderá ser interrompida uma vez:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e
qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual
for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual
se originarem.
Assim, há vedação legal para a interrupção da prescrição por mais de uma vez: o
art. 8º do Decreto nº. 20.910/1932.
Ainda o Decreto-lei nº. 4.597/1942 dispõe que compete à Justiça dos Estados decretar
a prescrição quinquenal alegada de todo e qualquer direito contra o Estado e que a
prescrição do Decreto nº. 20.910/1932, somente pode ser interrompida uma vez:
Art. 3º A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910,
de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr,
pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para
a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do
último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada
em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.
Art., 4º As disposições do artigo anterior aplicam-se desde logo a todas as dívidas,
direitos e ações a que se referem, ainda não extintos por qualquer causa, ajuizados ou
não, devendo prescrição ser alegada e decretada em qualquer tempo e instância,
inclusive nas execuções de sentença.
“O princípio, que hoje rege, é o da igual criação da prescrição. Corre ela contra
quem quer que seja: brasileiros e estrangeiros, residentes no Brasil e não-residentes
no Brasil, homens e mulheres, dirigentes e dirigidos, comerciantes e não-comerciantes,
pessoas jurídicas de fins econômicos e pessoas jurídicas de fins não-econômicos,
inclusive religiosos e culturais. União, Estados-membros, Territórios, Distrito Federal
e Municípios. Segundo o princípio da isonomia (Constituição de 1946), art. 141, § 1º,
os legisladores não podem estabelecer privilégios imunizantes” (in PONTES DE
MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado, v. 6, São Paulo:
Bookseller, 2000, p. 127 e seguintes)."
Mesmo na falta de lei fixadora do prazo prescricional, não pode o servidor público ou
o particular ficar perpetuamente sujeito a sanção administrativa por ato ou fato
praticado há muito tempo.
Ficamos com a posição dos que, como Hely Lopes Meirelles (1996:589), entendem
que, no silêncio da lei, a prescrição administrativa ocorre em cinco anos, nos termos
do Decreto nº. 20.910/32” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.
23ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 740/741).
Numa primeira visão, temos a hipótese em que, por força de expressa disposição legal,
a Administração tem o poder de exercitar o seu poder punitivo. (..)
Há também quem entenda que, no silêncio da lei, o prazo será de cinco anos, com
fundamento no Dec. nº. 20.910/1932. Este último pensamento nos parece o de mais
precioso fundamento jurídico: se a prescrição judicial de ações contra a Fazenda
ocorre em cinco anos, não seria razoável ser mais extenso o prazo na via
administrativa (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito
Administrativo. 25ª ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 957/958).
Como bem ressalta José dos Santos Carvalho Filho, por outro lado, a interrupção da
prescrição é matéria da teoria geral do direito e, como tal, regida pela Parte Geral do
Código Civil e pela regra geral do art. 202. Dessa forma, também os prazos
prescricionais definidos no direito administrativo, como, por exemplo, os prazos da
prescrição quinquenal previsto no Decreto nº. 20.910/1932 e os da improbidade
administrativa, só se interrompem uma vez e, ocorrente o fato interruptivo, fica
prejudicado o lapso que fluiu anteriormente, reinicia-se a contagem e o novo prazo é
peremptório e não mais se sujeita à paralisação:
“Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-
á:
“O Código Civil vigente criou a inovação de que a interrupção só pode ocorrer uma
vez. Essa norma não estava prevista no Código Civil de 1916, sob o manto do qual
podia haver várias interrupções do prazo prescricional. Resulta, pois, que, uma vez
presente o fato interruptivo, o novo prazo é peremptório e não mais se sujeita à
paralisação.
“Isso porque o art. 202 do Código Civil, impôs regra sem dúvida mais severa quanto
ao momento e o ato judicial apto a produzir a interrupção do lapso prescricional,
regra essa equivalente à que constava do § 1º do art. 219 do CPC, na sua redação
originária.
Quer agrade ou não essa regra introduzida em 2003 pelo Novo Código Civil, fato é
que ela deve sobrepor-se ao § 1º do art. 219 do CPC, seja porque se trata de lei
posterior (a Lei nº 10.406/02, ante a Lei nº 8.952/94), seja porque se trata de lei
especial (pois a prescrição é matéria de direito material e, por isto mesmo, o
tratamento dado pelo Código Civil sobrepõe-se, nessa matéria, ao dado pelo Código
de Processo Civil)”. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Décima Nona
Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº. 2009.002.29689. Relator designado:
Desembargador Marcos Alcino de Azevedo Torres. Julgado em 21.06.2011).
Outra não é a conclusão da doutrina jurídica que reconhece que a regra do art. 8º do
Decreto nº. 20.910/1932 de que a interrupção da prescrição ocorre somente uma vez,
que era restrita desde 1932 para a Fazenda Pública, a partir do seu encarte no art. 202 do
Código Civil de 2002, passa a ser a regra geral, aplicável a toda espécie de
pretensão independentemente de quem seja a pessoa fevorecida pelo prazo
prescricional. Como assevera com proficiência, Leonardo Carneiro da Cunha:
“De acordo com o art. 8º do Decreto nº. 20.910/1932, a prescrição das pretensões
formuladas em face da Fazenda Pública somente poderá ser interrompida uma vez.
Essa regra, que se afigurava restrita para a Fazenda Pública, aplica-se, atualmente, a
toda e qualquer pretensão, em razão da regra encartada no art. 202 do Código Civil
de 2002, a dispor que
Então, a interrupção da prescrição por uma única oportunidade era norma que se
aplicava tão somente à prescrição quinquenal das pretensões formuladas em face da
Fazenda Pública, passando, a partir do vigente Código Civil, a ser a regra geral,
aplicável a toda e qualquer pretensão, independentemente de quem seja a pessoa
favorecida pelo prazo prescricional” (CUNHA, Leonardo Carneiro da. A prescrição e
as pretensões formuladas em face da Fazenda Pública. In: MIRANDA, Daniel Gomes
& CUNHA, Leonardo Carneiro da & ALBUQUERQUE JÚNIOR, Roberto Paulino de.
Prescrição e decadência: estudos em homenagem a Agnelo Amorim Filho. Salvador:
Ed. Podivm, 2013, p. 327/328).
É, pois, o ato de sua instauração, e não todo o seu curso, que interrompe a prescrição
de que tratam os incisos II, nº 1, dos arts. 57 do Estatuto e 303 de seu Regulamento.
Ocorre, contudo, que uma vez interrompida a prescrição pela instauração do processo
disciplinar, o fluxo quinquenal tornou a contar-se, contra a Administração Pública, a
partir daquela mesma data, tudo nos termos do art. 173 do Código Civil então
vigente.
Mas a decisão final nesse processo administrativo somente veio a ser prolatada em 11
de dezembro de 2002 (fl. 42), quase sete anos após a abertura do procedimento, em
total inobservância dos prazos determinados no próprio Estatuto dos Servidores
Estaduais (arts. 68, caput e § 1º, 70, 73 e 74 do Decreto-Lei nº 220/75). (Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Décima Nona Câmara Cível. Agravo de
Instrumento nº. 0030399-61.2010.8.19.0000. Relator: Desembargador Marcos Alcino
de Azevedo Torres. Julgado em 14 de dezembro de 2010).
Outra não é a solução quando se examinam os textos legais sobre a matéria. Por
exemplo, na lei administrativa do Estado do Rio de Janeiro, os arts. 57, § 2º e 68 do
Decreto-lei nº. 220/1975, preveem que só existe uma interrupção do prazo
prescricional: a que decorre do prazo legal previsto para o encerramento válido do
inquérito administrativo, que é de 180 dias.
Portanto, não poderia uma decisão judicial pretender aceitar uma nova hipótese de
interrupção da prescrição por um segundo processo administrativo disciplinar, se tal
criação de nova hipótese de interrupção da prescrição não tem previsão em lei.
Se fosse assim o direito seria fácil, para toda sorte de abusos por parte da administração
pública. Bastaria que essa administração pública abrisse indefinidamente, por exemplo,
novos processos disciplinares, para apurar os mesmos fatos em relação ao mesmo
servidor para se criar um direito imprescritível de exercício eterno do jus puniendi
por parte da administração. Não é o que diz o art. 68 do Decreto nº. 220/1975, in verbis:
Não houvesse o legislador se filiado à tese da unicidade interruptiva, estaria ele como
que fazendo com uma mão e desmanchando com a outra. É que o instituto da
prescrição visa, basicamente, realizar o interesse público, promover a estabilização do
direito.
Ora, dando ao negligente chance interruptiva mais de uma vez, estaria o legislador, na
melhor das hipóteses, neutralizando esses objetivos, e, ao mesmo tempo, contrariando
o interesse público e a segurança jurídica.
Art. 74. Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Estadual,
direta e indireta, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data
da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que
tiver cessado.
(MS 12.994/DF, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, Terceira Seção, julgado em 24
de setembro de 2008).
O magistério de Antônio Luís da Câmara Leal é claro ao dispor que somente a lei
(formal e material) pode atribuir o efeito de cessar o curso da prescrição em
andamento. Portanto, estabelecendo como exemplo a legislação administrativa do
Estado do Rio de Janeiro, em nenhum momento os arts. 57, § 2º e 68 do Decreto-lei nº.
220/1975 previram qualquer hipótese de uma segunda interrupção da prescrição
da pretensão punitiva disciplinar do Estado do Rio de Janeiro em relação aos seus
servidores, e, como tal, não há que se falar no âmbito de tal legislação em qualquer
legalidade de uma segunda interrupção da prescrição da pretensão punitiva. Como se vê
em Câmara Leal, in verbis:
Exemplificando mais uma vez com a lei administrativa disciplinar do Estado do Rio de
Janeiro. O curso da prescrição começa a fluir da data do evento punível
disciplinarmente e interrompe-se pela abertura de inquérito administrativo, devendo este
ser concluído no prazo máximo de 180 dias, passando a partir daí a voltar a correr o
fluxo prescricional, sem qualquer possibilidade de nova interrupção (arts. 57, § 2º e 68
do Decreto-lei nº. 220/1975).
Em outra situação, se decidido por decisão judicial a antecipação de tutela para parar
um processo administrativo iníquo, até a cognição exauriente do juízo em decisão de
mérito, tal decisão importa, claro, em suspensão do transcurso do prazo prescricional
para o exercício da pretensão punitiva do Estado.
(..)3. Segurança concedida. Agravo regimental prejudicado (MS 12.994/DF, Rel. Min.
ARNALDO ESTEVES LIMA, Terceira Seção, julgado em 24 de setembro de 2008).
Concluindo, podemos dizer que as decisões judiciais que, por vezes, acatam a eventual
pretensão da administração pública de que poderia interromper pela segunda vez
uma prescrição de processo administrativo, não encontram amparo no direito
brasileiro, nem na doutrina jurídica e nem na jurisprudência mansa e pacífica na matéria
do STF, do STJ e, no âmbito da legislação do Estado do Rio de Janeiro, do próprio
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Notas e Referências:
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça - STJ. MS 12.994/DF. Rel. Min. ARNALDO
ESTEVES LIMA, Terceira Seção, julgado em 24 de setembro de 2008.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25ª ed. São
Paulo: Atlas, 2012.
COSTA, José Armando da. Prescrição disciplinar. Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2006.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 23ª ed. São Paulo: Atlas,
2010.
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