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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

ESCOLA DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS


CURSO DE DIREITO
FILOSOFIA GERAL E JURÍDICA
PROF. DR. MÁRCIO RICARDO STAFFEN
ACADÊMICO(A): LUCAS BERNARDES SANTANA.

AVALIAÇÃO 1 – M1

MODELO DE ANÁLISE EMPÍRICO-RETÓRICA DO DISCURSO

O modelo de Análise Empírico-Retórica do Discurso (AERD) foi


desenvolvido pelo Dr. Isaac Reis, na tese de doutorado sob o título: “Limites à
legitimidade da jurisdição constitucional: análise retórica das cortes
constitucionais do Brasil e Alemanha”. Com inspiração neste modelo, que ora
se apresenta, pretende-se analisar a Apelação Cível nº 1001521-
57.2017.8.26.0360, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
respeitando os alicerces traçados por esse modelo, mas adaptando-o conforme
as necessidades prementes do caso que se apresenta. Tentar-se-á de forma
eminentemente didática demonstrar a estrutura desse modelo de análise
embasado na teoria da argumentação retórica.

1 Justificativa para uma pesquisa retórica

Neste contexto da exposição, se faz pertinente retomar o termo Retórica,


que não raras vezes, é objeto de escárnio e acentuados sentidos negativos. No
entanto, em que pese esses adjetivos a “Retórica de Aristóteles não era
produto da mera idealização de princípios nascidos com ele e por ele
convencionados para persuadir e convencer pessoas”, mas sim o resultado de
experiências de oradores que analisaram e codificaram seus preceitos com a
intenção de que as técnicas de persuasão fossem usadas corretamente
(JUNIOR, 2005, p. 16).
Adeodato diz, “é possível afirmar que a retórica está em crescimento,
pois tem se mostrado adequada para compreender o mundo caótico em que
vivemos” (ADEODATO, 2018, p. 31), ademais, a retórica é a favor do
pluralismo, da democracia e da liberdade intelectual ilimitada (MANELI, 2004,
p. 59), mas ainda assim, é vista por alguns autores como desnecessária e
carregada de discurso vazio. Por fim, é rechaçada pela comunidade científica
como comprometedora da objetividade e da neutralidade (Reis, 2014, p. 2
PDF).

A Retórica precisa de um movimento que a liberte desses conceitos


ultrapassados, pois não mais se limita a estratégias de persuasão, sendo
preciso ressignificar esta teoria da perspectiva depreciativa oriunda dos
estudos platônicos (Reis, 2014, p. 4 PDF).
Reabilitá-la no Direito, significa compreendê-la a partir do seu contexto
histórico-social. Conforme Reis, a justificativa da importância da retórica está
no fato de que

atualmente vive-se em comunidades fragmentadas, nas quais


questões fundamentais não parecem encontrar consensos
duradouros, nas quais a incerteza sobre o futuro predomina e não
obstante, exige de todos, decisões cotidianas que afetam não
somente a vida individual, mas a de todos.
Esse paradoxo, de viver em uma sociedade pulverizada
axiologicamente, mas que, ao mesmo tempo, pelo simples fato de ser
uma comunidade, necessita tomar decisões coletivas que, para
serem efetivas, precisam gozar de alguma legitimidade, serviria por si
só para justificar a importância da retórica nos dias atuais.(REIS,
2013, p. 30)

Nesse sentido, propõe-se a ser mais do que um simples método de


técnicas persuasivas, pretende-se compreender tanto o discurso jurídico e seus
topoi argumentativos, quanto a comunidade que se destina. A seguir,
apresentar-se-á a estrutura teórica e metodológica do modelo de análise
AERD.
A concepção da proposta do modelo AERD se caracterizou por ser um
instrumento flexível e adaptável diante das necessidades do caso concreto.
Como salienta Reis (2013, p. 66), o modelo deveria ser construído diante das
hipóteses relativas a elementos específicos, por isso estava sujeita a
subjetividade do analista, até mesmo porque, a objetividade não é uma
pretensão do modelo, pois não busca por resultados idênticos. Por outra via, é
importante estar atento para compatibilidades teórica e metodológica, no caso
do modelo ora apresentado, não é compatível com teorias formalistas, também
não é o modelo adequado para buscar as intenções ocultas no discurso. A
AERD, segundo Reis, é compatível com teorias que buscam compreender o
Direito a partir da prática social, ou seja, de situações reais; buscando
identificar e mostrar elementos retóricos de uma decisão; e representar por
meio de diagramas ou gráficos, os dados coletados (Reis, 2018, p. 122-123).
Considerando que a AERD procura retirar, ou melhor, identificar os
elementos retóricos do discurso, infere-se que assume os elementos
tradicionais da Retórica e por outro viés, aproxima-se de uma abordagem do
discurso compatível com o que é proposto, isto é, se aproxima da Análise do
Discurso (AD). As duas abordagens, AERD e AD, possuem ponto em comum
ao não considerarem a linguagem como algo neutro, nessas abordagens, a
linguagem é um fenômeno de construção social interferindo e transformando a
vida dos sujeitos.
Outro aspecto pelo qual essas abordagens se aproximam, dá-se na
maneira de compreender o texto, em outras palavras, se voltam para o texto
em si e não na busca de sentidos ocultos do orador. Nesse ponto é
interessante destacar, que o discurso difere da mensagem, pois nele há uma
atividade simultânea entre orador e receptor 1, por outro lado, a mensagem
pode ser reconhecida como um meio de transmissão de códigos. (Reis, 2013,
p. 68).
Dito isso, percebe-se que o que importa no discurso para a AERD é o
texto em si, mas ao se questionar como é possível validar esse modelo, Reis
responde que

O critério de validade de uma análise é, obviamente, pragmático, i. e.,


depende da sua inserção em uma comunidade de pesquisadores que
a reconheçam como tal, sobretudo em comparação com outra
análises. Isso depende ainda de dois fatores: que a análise leve em
conta a contribuição de análises anteriores e que os seus resultados
sejam publicados, de modo a submetê-la à crítica pública. (REIS,
2013, p. 70)

1
Conforme Atienza, a “dialética em que a argumentação tem lugar entre participantes
(proponente e oponente) assume um papel dinâmico: entre eles há uma interação constante”
(ATIENZA, 2017, p. 40), ao que parece, o discurso pressupõe uma atividade dialética,
exatamente por essa simultaneidade entre os atores envolvidos.
O autor ainda salientou que um modelo de análise só pode ser
comparado com um modelo de sua própria espécie, isso quer dizer que a
AERD, só poderá ser comparada com outra AERD (Reis, 2013, p.69). Nesses
termos, a AERD é “consequência metodológica de uma tripartição da Retórica”,
a qual objetiva reavivá-la como um campo promissor para a pesquisa no Direito
e dessa forma, defendê-la dos inúmeros reducionismos nos quais ela é
enquadrada (Reis, 2018, 124).
O autor informou que a tripartição da Retórica adotada para o modelo
AERD é de autoria de diferentes autores, dentre eles, João Adeodato. A
tripartição consiste nos seguintes níveis: (i) Retórica como cosmovisão (R1),
relacionada com a linguagem; (ii) Retórica como estratégia de persuasão (R2),
envolvendo a tópica, as teorias da argumentação, o uso de figuras de
linguagem, além de ser o melhor para encontrar os topoi mais utilizados no
discurso; (iii) Retórica como instrumento de análise do discurso (R3),
colocando-a no centro do debate em comunidades específicas que poderão
validá-la como método.
No modelo proposto, o R3 é o nível que mais importa para o modelo
AERD, justamente para dar a Retórica um grau de destaque na comunidade
científica. Para a pesquisa que se propõe, acrescenta-se o R2, pois
possibilitará identificar os topoi mais empregados no discurso. Resta agora,
classificar as estratégias retóricas que serão empregadas no modelo.
Em relação ao R2, o autor destacou que podem ser ensinadas algumas
metodologias para encontrar o topoi mais utilizados e mais eficazes no
discurso, por exemplo, as táticas ou gestos. Exemplificando:

a) Estratégia de falar por sujeito geral, indefinido ou indefinível: o


autor fala como se fosse representante autorizado de outras pessoas,
instituições ou mesmo de toda a sociedade. Ex.: "O povo não aguenta
mais conchavos."
b) Estratégia da vagueza: consiste em utilizar expressões e termos
vagos que, por isso, angariem mais acordo e simpatia. Exatamente
por isso, é muito usado por candidatos em campanha política. Ex.: "O
futuro do país depende da educação."
c) Estratégia do argumento de autoridade: o autor busca provar
uma tese, utilizando-se de atitudes ou opiniões de uma pessoa, grupo
ou instituição que goza de prestígio e credibilidade entre o auditório,
ainda que as condições que a tornem autoridade pudessem ser, em
outro momento, questionadas. Ex. "De acordo com os preclaros
ensinamentos do insigne jurista X..."
d) Estratégia do discurso incompreensível: segundo
Schopenhauer, é possível fragilizar o adversário oferecendo-lhe, com
ar grave, um pensamento absurdo, mas que soe douto e profundo.
Essa era, segundo ele, a estratégia de vários filósofos alemães -
referindo-se provavelmente a Hegel: "Como se sabe, em tempos
recentes, alguns filósofos adotaram este estratagema frente a todo
público alemão, com êxito brilhantíssimo". (REIS, 2013, p. 34-35)

Além dessas estratégias, o orador precisaria levar em consideração o


auditório para que pudesse alcançar a adesão esperada do público, acerca
disso foi discutido amplamente no capítulo 2.
Na sequência, é preciso estabelecer as categorias retóricas que serão
empregadas na pesquisa: Logos, Pathos e Ethos. Como o discurso que será
analisado é uma decisão jurídica, alguns aspectos não serão considerados,
como: gestos, roupas e entonação da voz, por exemplo. Na categoria Logos,
procurar-se-á dar impressão de objetividade, coerência, e lógica interna do
discurso, por exemplo: a CRFB/88, as leis, os códigos e os princípios.
A categoria Ethos, levará em conta as características do orador, seu
posicionamento frente aos costumes ou instituições, à sua função, e alguns
exemplos podem ser destacados, como: argumentos de autoridade e da
legitimidade do orador, além de citação de fontes do direito. Na categoria
Pathos, serão encontrados os meios de persuasão por meio de musicalidade,
ritmo, silêncio, repetições, parênteses, pontuações, além do apelo à emoção do
auditório.
O procedimento ou como deve-se operar a AERD, seguirá os seguintes
passos:2
1º Momento: Aproximação contextual

1) Definir o corpus de pesquisa, isto é, se é uma decisão ou um grupo de


decisões;
2) Conhecer o contexto em que está inserida a decisão;

2º Momento: Leitura da decisão

1) Leitura exploratória: conhecer a decisão;


2
Segue-se o manual de Isaac Reis, apresentado no artigo: Análise Empírico-Retórica do
Discurso: fundamentos, objetivos e aplicação, 2018, p. 121-150, que está referenciado na
seção própria para este fim.
2) Primeira leitura retórica: identificar as estratégias retóricas (Ethos,
Pathos e Logos);
3) Segunda leitura retórica: o momento de produzir os indicadores de
cada dimensão;

3º Momento: Contabilização

1) Contabilização das ocorrências: verificar a ocorrência de cada


indicador e apontar a localização na decisão;
2) Mapa retórico: representar graficamente os dados coletados;
3) Análise retórica stricto sensu.

3 Aplicação do modelo de análise tópico-retórico

Retomando as estratégias anteriormente referidas esse modelo se


propõe a dar ênfase no elemento “Retórica como estratégia de persuasão”,
respeitando os limites desta estratégia e por considerar que a análise do
discurso se dará por leitura, ou seja, é o texto escrito que será analisado,
estratégias como gesticulações não poderão serem analisadas. Segue abaixo
a lista das estratégias:

1º Estratégia – Retórica como estratégia de persuasão (R2)

1) Verbalização descentralizada (V1): falar por sujeito geral, indefinido ou


indefinível;

2) Verbalização expressando vagueza (V2): empregar termos vagos;

3) Verbalização expressando autoridade (V3): utilizar opiniões ou atitudes de


quem possui prestígio;

4) Verbalização incompreensível (V4): uma verbalização sem conexão,


absurda, mas que soe como se sábio fosse.

2º Estratégia – Retórica como instrumento de análise do discurso (R3)


1) Dimensão Ethos (E) -

E1 – Demonstração de erudição: citações de obras, literatura, história,


música; ok

E2 – Enfatizar o valor da CRFB/88 ou a importância do caso: conectar as


garantias com o poder (legislativo, executivo ou judiciário); demonstrar
números para responsabilizar os demais Poderes;

E3 – Elogios e adjetivações: entre os participantes e entre os membros do


tribunal; julgados dos próprios pares; órgãos não estatais; Cortes, leis, casos
estrangeiros;

E4 – Legitimidade ou competência do tribunal: mostrar credibilidade da


corte; citação de ações constitucionais;

E5 – Uso da 1ª Pessoa do singular ou opiniões pessoais: exaltar os


próprios julgados, referir às suas próprias decisões, a pronomes de tratamento
(eminente, Vossa Excelência);

2) Dimensão Pathos (P)

P1 – Personificação ou prosopopeia: atribuir características humanas a


seres inanimados;

P2 – Ênfase no estilo da escrita ou perguntas retóricas: pontuações,


destacar com negrito ou itálico; fazer perguntas que já sabe a resposta;
expressões em língua estrangeira, latim; Figuras de linguagem; repetição de
palavras para fortalecer o que está sendo dito; Brocado jurídico;

P3 – Remissão à opinião pública: fazer com que a população se sinta parte


do tribunal; referências a jornais, programas de TV; utilizar exemplos do
cotidiano;

P4 – Uso linguagem hiperbólica: exageros; palavras rebuscadas;

3) Dimensão Logos (L)


L1 – Codificações: leis, CRFB/88, convenções, tratados;

L2 – Topoi hermenêutico: métodos de interpretação;

L3 – Topoi com base em princípios e fontes do Direito: relação com os


princípios gerais do direito, conceitos, correntes, doutrinas;

L4 – Deduções: premissas ocultas, entinemas;

3.1 MAPA RETÓRICO - TRANSCRIÇÕES

Portanto, após a contextualização realizada, e a leitura atenta do acórdão


proferido na Apelação Cível nº 1001521-57.2017.8.26.0360, do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, preencha as informações necessárias
constantes na tabela abaixo, considerando cada elemento da Retórica,
conforme os indicadores dispostos ethos (E), phatos (P) e logos (L), transcreva
o trecho do voto que confirma cada modalidade de indicador e sua respectiva
página:
Mapa Retórico

Indicador Transcrição Página

E1: Demonstração de Antônio Chaves classifica a 17


esterilização em 4 espécies:
erudição eugênica, cosmetológica,
terapêutica e de limitação
de natalidade (CHAVES,
Antônio. Direito à vida e ao
próprio corpo. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2ª
edição revista e
ampliada,1994.)

E2:Enfatizar o valor da
Ethos CRFB/88 ou o caso

E3: Elogios e
adjetivações

E4: Legitimidade ou
competência do tribunal
E5: Uso da 1ª pessoa do
singular e opiniões
pessoais

Indicador Transcrição Página

P1: Personificação ou
prosopopeia

P2: Ênfase na escrita ou


perguntas retóricas

P3: Remissão à opinião


pública

P4: Uso da linguagem


Pathos hiperbólica

Indicador Transcrição Página

L1: Codificações

L2:Topoi hermenêuticos

Logos L3: Topoi Princípios e


Fontes

L4: Deduções

3.2 MAPA RETÓRICO - PARECER


Após a leitura, análise do julgado e transcrições das ocorrências ilustrativas do
uso da Retórica, apresente as manifestações com maior ênfase que restaram
utilizadas para a persuasão.

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